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O milagre da Jabuticabeira

Num pequeno arraial do sertão mineiro, chamado jabuticabal, residia uma


família um tanto tradicional. Senhor Felício, era o chefe da família, casado com
dona Esperança e pai de um menino cujo nome era Felisberto.
Felício trabalhava no cultivo de sua própria terra, de onde tirava o sustento de
sua família e era apaixonado pelo que fazia. Seu prazer era levantar cedinho, ir
para horta estercar e regar a plantação.
Era um homem muito alegre, disposto e sempre bem-humorado. Nunca se via
Felício reclamando ou maldizendo a vida, pelo contrário, de sua boca ouvia-se
apenas palavras animosas e encorajadoras e alguns dos poucos moradores do
arraial, faziam questão de todo final de tarde bater uma prosinha com ele no
alpendre de sua casa.
Dona Esperança, sua esposa, era uma mulher pacifica e muito dedicada aos
afazeres domésticos. Cultivava um jardim tão lindo em frente de casa com muitas
rosas, lírios e margaridas, que deixavam os arredores extremamente perfumado,
mas, o que ela mais tinha ciúmes, era da jabuticabeira que ficava na entrada da
porteira.
Era uma família feliz, todos se davam muito bem, mas (...) Felisberto, mesmo
sendo obediente aos pais, tinha um grave problema, era um menino muito
irritado, com apenas doze anos de idade, às vezes agia como se tivesse dezoito
ou vinte. Era impaciente e qualquer coisa que não fosse do seu agrado, já era
motivo para sair murmurando e chutando o que estivesse pela frente.
O pai, senhor Felício, já havia percebido o temperamento difícil do filho e
estava ficando cada dia mais preocupado. Porém, não tomava nenhuma atitude,
esperava para ver se uma hora ou outra o menino tomava jeito.
Todos os dias, Felisberto chegava em casa reclamando da professora, dos
colegas, dos funcionários da escola e até do barulho dos poucos veículos que
passavam por ele. E o pai, só escutava — e pensava... penava...
Certo dia, o menino chegou em casa muito irritado e foi logo batendo a porta
com toda força. O senhor Felício, ao contemplar aquela cena, pacientemente
chamou o filho e falou-lhe:
— Sente-se aqui e vamos conversar abertamente, conte-me tudo e não tenha
medo, combinado?
Você anda irritado com tudo, ninguém pode te contrariar e seus amigos estão
se afastando aos poucos porque dizem que você não tem um pingo de paciência.
Meu filho, escute o meu conselho, quem quer ser bem tratado, tem que tratar
bem o outro. Agora me fale o que te tem deixado assim, cada dia que passa mais
nervoso e mal-humorado.
— Sinceramente meu pai, não sei explicar, acho que é da idade sabe, parece
que tudo que alguém fala ou faz de forma que eu não concorde, já me deixa
nervoso e até com raiva.
— Entendi meu filho! Vamos fazer uma experiência?
— Que tipo de experiência pai?
— Eu vou comprar um pacote de preguinhos e deixar lá no chão embaixo da
jabuticabeira que é a árvore preferida de sua mãe.
Toda vez que você ficar irritado e com vontade de xingar ou brigar com
alguém, bata um preguinho no tronco da jabuticabeira e dessa forma vai
descarregar a sua raiva e quando perceber que já está controlando bem seu
temperamento e não mais precisar bater pregos na árvore, vem me contar.
E assim ficou combinado.
O tempo foi passando e cada dia que ficava nervoso, Felisberto batia um
preguinho no tronco da jabuticabeira ao ponto de enchê-la de pregos em menos
de dois meses. Aos poucos, o menino foi aprendendo a controlar suas emoções
e já não castigava com tanta frequência a bela árvore. Até que um dia, ele
percebeu que havia aprendido a controlar a emoção e seus amigos voltaram a
ter prazer em brincar e passear com ele. Tanta alegria por essa conquista o fez
chegar em casa sorrindo e cantarolando e imediatamente disse a seu pai:
— Papai, eu já aprendi a me controlar e não preciso mais bater pregos na
jabuticabeira para me acalmar e acho que acabei com todo o pacote, mas o
importante é que resolveu o meu problema e estou tão feliz, muito feliz mesmo.
O senhor Felício olhou para o garoto e disparou:
— Muito bem filho, muito bem mesmo!
Agora você vai fazer o seguinte:
— Vá até a jabuticabeira e retire todos os preguinhos que você fincou nela e
traga todos eles num saquinho para mim.
Imediatamente, o garoto foi até a jabuticabeira e com toda paciência começou
a retirar os pregos um a um. Prosseguia tirando cada prego com cuidado e ao
mesmo tempo cantarolava e as vezes assoviava imitando o canto dos
passarinhos.
Ao terminar de retirar todos os preguinhos — o que levou um bom tempo,
Felisberto voltou correndo para casa entregando o saquinho com todos os
pregos que havia recebido do pai e muito contente e aliviado disse:
— Meu pai, aqui estão os preguinhos, não vou mais precisar deles pois me
sinto uma outra pessoa e quero te agradecer por me ajudar.
Ao ouvir as palavras do garoto, o senhor Felício, num tom agradável, falou:
— Fico feliz por você meu filho, mas triste pela jabuticabeira.
— Não entendo papai, mas por que ficou triste pela jabuticabeira? Ela está lá
bonitinha e do mesmo jeito.
— Será que está mesmo?
Felisberto! Você reparou direitinho no tronco da árvore após a retirada dos
pregos?
— Não percebi nada de diferente papai, por que perguntou isso?
Se você olhar com atenção para a jabuticabeira, vai ver que ela está toda
furada, toda marcada. Cada vez que ficava com raiva e batia um prego nela,
você a feria, a machucava e ela mesmo em silêncio, sofria sem reclamar. Você
foi curado emocionalmente pela jabuticabeira, mas para isso, teve que feri-la,
que sacrificá-la.
No lugar de cada prego que retirou, você deixou um furo, uma marca e isso
poderá permanecer por muito tempo e até para a vida toda da inocente
jabuticabeira.
— Me perdoe meu pai, o que posso fazer para reparar o meu erro?
— Agora não dá para fazer mais nada pela jabuticabeira filho, ela operou um
milagre na sua vida e se sacrificou por você, mas tu podes fazer o bem pelo seu
próximo.
Não se irrite por qualquer coisa, não guarde raiva e nem saia brigando por aí,
pelo contrário, quando sentir que foi ofendido, pare, pense e reflita. Lembre-se
que nossas palavras e ações podem ferir e muito a emoção de uma pessoa e
isso poderá trazer sérias consequências tanto para quem ofende quanto para
quem é ofendido. Entenda Felisberto, não precisamos de armas físicas para
machucar alguém, bastam apenas palavras para sangrar um coração.

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