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Teologia (Escatologia)

Será que haverá vida após a vida?


Revista "MUNDO e MISSÃO"

Renold J. Blank

De onde, cristãos e espíritas tiram a certeza de que a sua vida realmente


prosseguirá depois desta vida? "Temos que ter fé", dizem os cristãos. "Os
espíritos nos informaram", dizem os espíritas, proclamando que o fato da
aparição de espíritos é uma prova clara de que a vida depois da morte continua.

Só que tais pretensas aparições estão sendo questionadas, hoje, de muitos


lados. Psicologia e parapsicologia mostram que a absoluta maioria das assim
chamadas aparições de espíritos podem ser explicada, recorrendo a
capacidades inconscientes do ser humano. Conteúdos e imagens da pessoa
humana estão sendo projetados para fora e materializados, de tal maneira que
todas aquelas materializações, aparições e fenômenos, aparentemente
produzidos por espíritos, revelam-se, na realidade e diante do olho crítico da
ciência, como produtos dos vivos. São eles — e não os espíritos de mortos —
que produzem tais fenômenos. De possíveis fraudes e truques nem vamos falar.

E assim estamos de novo diante de nossas dúvidas. A aparente prova de uma


sobrevivência após a morte, apresentada pelo espiritismo, revela-se como
hipótese cada vez menos corroborada pelos fatos científicos.

Será que com isso devemos simplesmente permanecer no nível de "ter fé", como
muitos cristãos dizem? Ter fé é uma atitude profunda e maravilhosa, mas ter fé
não conta no mundo da ciência. A ciência quer fatos mensuráveis, observáveis
e comprováveis.

Será que existem tais fatos no que diz respeito à questão da existência de uma
vida depois da morte? As pressupostas provas do espiritismo desfazem-se e a
maioria dos cristãos, de antemão, recorrem ao nível do acreditar, porque a fé
não precisa de provas. Mas, são exatamente esses cristãos que, na realidade,
dispõem de uma base empírica indiscutível para a sua fé. Eles têm na mão uma
prova que resiste a qualquer questionamento científico. Esta prova, que chamo
"prova sociológica", consiste no fato de hoje falarmos ainda de Jesus Cristo.

Não só se fala d’Ele, mas um bilhão e meio de pessoas depositam nele toda a
sua confiança e toda a sua esperança. Elas fazem isso porque dizem que este
Jesus, depois de morto, teria voltado à vida. Sua ressurreição confirmaria, assim,
que há vida depois da morte, respondendo exatamente à nossa indagação
inicial. É este o núcleo de fé, no qual acreditam todos aqueles que se chamam
cristãos.
Mas, a partir de um enfoque científico-crítico, devemos também aqui voltar a
questionar: será que Jesus voltou mesmo? Será que todas as narrações sobre
a sua ressurreição não são invenção de seus seguidores, que quiseram
continuar com suas ideias?

Essa objeção ficaria impossível de ser refutada, caso este Jesus tivesse morrido
de uma morte qualquer, caso, por exemplo, tivesse sido decapitado ou liquidado
de alguma outra maneira. Mas, a história d’Ele não terminou assim: Jesus foi
crucificado e este fato tem um significado muito especial. Isso, porque, conforme
a concepção da época de Jesus, a cruz em nada significava um sinal de honra
ou de glória, assim como é hoje no mundo cristão. Ser crucificado, na época de
Jesus, era a maior vergonha imaginável. Ser crucificado significava o mais claro
sinal de um fracasso total.

Ser crucificado, implicava ser rejeitado e negado pelo próprio Deus, conforme o
texto chocante de Dt 21,23, onde podemos ler o seguinte: "Maldito por Deus,
quem pende na cruz".

Esse Jesus pendia na cruz e, consequentemente, era maldito pelo próprio Deus.
De um maldito por Deus, porém, nunca mais se pode falar. Era esta a concepção
social e religiosa da época. E como consequência dessa concepção, um
crucificado deixava de ter existido. Um crucificado não existia mais na memória
da sociedade e nunca tinha existido. De um crucificado, simplesmente, não se
podia mais falar e muito menos daquilo que tinha dito e feito.

Assim era a atitude da época também frente ao Jesus crucificado. A sua morte
era uma vergonha e o maior sinal imaginável de fracasso. Esta também era a
opinião de seus seguidores e, por causa disso, todos foram embora. Mesmo
através dos muitos filtros, pelos quais a tradição passava até ser escrita nos
Evangelhos, ainda transparece a decepção insondável de seus seguidores.

"Todos ficavam a distância" (Lc 23,49), porque todos, naquela hora, estavam
convencidos de que tinham se enganado.

E fora do grupo dos seus discípulos, todos estavam certos de que esse Jesus
teria sido um usurpador, um mentiroso talvez, mas, com certeza, não o Messias,
porque um Messias não pode ser maldito por Deus.

Assim, foram embora e sobre esse Crucificado caiu o veredicto que pairava
sobre todo crucificado: dele não se falava mais.

Se a história de Jesus tivesse terminado com a cruz, também hoje, ninguém


falaria d’Ele, porque, naquela época, depois da cruz, era simplesmente
impossível pronunciar o nome do crucificado. Só que hoje, nós falamos de Jesus.
Não só falamos, mas Ele se tornou a pessoa com a maior influência histórica de
todos os tempos.

Como tal fato é possível, frente ao veredicto apresentado acima?

A única explicação possível para tal fenômeno é que, depois de sua morte na
cruz, depois de seu óbvio fracasso aos olhos de todos, aconteceu algo tão
grandioso, tão chocante, tão absolutamente novo, que até foi possível voltar a
falar dele, "apesar" da cruz; apesar do veredicto bíblico e apesar da proscrição
social e religiosa. Deve ter acontecido algo que era maior que tudo isso. Maior
que toda a tradição de séculos, maior que todos os veredictos da época.

O que foi este acontecimento totalmente único?

Todas as testemunhas que, na época, voltaram a falar d’Ele, apesar da cruz, são
unânimes em confirmar que tal evento inimaginável realmente aconteceu. E
todas as testemunhas declaram o fato de que esse Jesus, depois de sua morte,
voltou vivo. Ele ressuscitou.

A ressurreição tornou-se a grande prova de que Jesus, contra todas as


aparências da cruz, não tinha fracassado, de que Ele era o Messias, de que
Deus estava com Ele e não com o Templo que o tinha crucificado. Se essa
ressurreição não tivesse acontecido, nada disso poderia ter sido provado.

Assim, porém, voltou-se a falar d’Ele, a sua mensagem continuou, apesar da


cruz, porque Ele ressuscitou da morte. Deus o ressuscitou, e de um ressuscitado
era possível voltar a falar.

Esta ressurreição, além de todo o seu significado teológico, traz assim uma
prova, empiricamente mensurável, de que, depois da morte, a vida continua.
Porque esse Jesus estava morto mesmo, mas voltou da morte e viveu. Se,
porém, podia voltar da morte, então a morte não significa a aniquilação da
pessoa.

A vida vai além daquilo que chamamos morte. A prova disso é o fato de que
Jesus voltou da morte, e a prova empírica que Ele realmente voltou é o fato de
hoje falarmos dele. Se Ele não tivesse ressuscitado, nunca, naquela época, teria
sido possível voltar a falar d’Ele. É esta a prova sociológica da ressurreição de
Jesus, que, por sua vez, se torna a prova de que, depois da morte, a vida
continua ...

Renold J. Blank, Doutor em Teologia e em Filosofia, é professor titular da


Pontifícia Faculdade de Teologia de São Paulo.

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