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DOZE HOMENS

E UMA SENTENÇA

De Reginald Rose

Tradução por Rafael Cavacchini


Lista de personagens:
- Presidente
O Presidente, também chamado de 1º jurado, é o responsável por manter o júri organizado.
Um homem que se impressiona com a autoridade que tem e se comporta de maneira
bastante formal. Não excessivamente brilhante, mas obstinado.

- 2º jurado
Um bancário tímido e hesitante que acha difícil manter uma opinião própria. Ele leva tempo
para se sentir confortável o suficiente para participar da discussão, sendo influenciável e
com tendências a adotar a opinião da última pessoa com quem falou.

- 3º jurado
O 3º jurado é empresário. Um homem forte, muito enérgico e extremamente obstinado,
dentro do qual pode ser detectado um traço de sadismo. Ele diz com orgulho que começou
seu negócio do zero e hoje emprega trinta e tantos funcionários. Entende-se desde o
começo que ele tem um relacionamento ruim com o próprio filho, com quem não fala mais.
A audiência é levada a crer que este é um fator que contribui para seu preconceito contra
o réu, acusado de esfaquear o próprio pai. Um homem mal-humorado, intolerante com
opiniões que não sejam as suas e que está acostumado a forçar seus desejos e pontos de
vista sobre os outros.

- 4º Jurado
O 4º jurado é corretor da bolsa de valores. Com um ar sério, lida com os fatos do caso de
forma lógica e concreta. Um orador experiente que se apresenta positivamente o tempo
todo, e que parece se considerar um pouco melhor do que o resto dos jurados.

- 5º jurado
O 5º jurado é um jovem ingênuo e muito assustado que leva muito a sério suas obrigações
neste caso. Porém, acha difícil falar quando os mais velhos têm a palavra.

- 6º jurado
Um homem honesto, mas simples, que toma suas decisões lenta e cuidadosamente. Ele
acha difícil criar opiniões positivas, mas ouve, digere e aceita as opiniões dos outros que
mais o atraem.

- 7º jurado
Um tipo de vendedor espalhafatoso, falastrão e alegre que tem coisas mais importantes a
fazer do que participar de um júri. Ele é rápido em mostrar temperamento e também rápido
em formar opiniões sobre coisas sobre as quais nada sabe. É um valentão e, claro, um
covarde.

- 8º jurado
Um homem quieto, pensativo e gentil. O 8º jurado vê todos os lados de cada questão e
busca constantemente a verdade. Um homem de força, temperada com compaixão que,
acima de tudo, quer que a justiça seja feita e vai lutar para que isso aconteça.

- 9º jurado
Um idoso doce e gentil, há muito derrotado pela vida, que se reconhece pelo que é e
lamenta os dias em que seria possível ser corajoso.

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- 10º jurado
Trata-se de um homem zangado e amargo, um dos antagonistas mais fervorosos da sala.
É um fanático que não dá valor a nenhuma vida humana, exceto a sua. Um homem que
não esteve em lugar nenhum e não vai a lugar nenhum, e que sabe disso profundamente
dentro de si.

- 11º jurado
Refugiado da Europa, fala com sotaque e tem uma certa vergonha de se expressar. É
humilde, quase subserviente às pessoas ao seu redor. Ele busca honestamente a justiça
porque sofreu com injustiça em seu país de origem.

- 12º jurado
Um publicitário astuto e brilhante que pensa em seres humanos em termos de
porcentagens, gráficos e pesquisas, o jurado nº 12 não tem uma compreensão real das
pessoas. Apesar de ser um esnobe superficial, tenta ser um bom sujeito, embora pareça
constantemente distraído do caso.

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Sala do júri em um tribunal criminal de uma grande cidade. São cerca de 16h. A sala é
mobiliada com uma longa mesa de conferência e uma dúzia de cadeiras. As paredes são
nuas, monótonas e precisam urgentemente de uma nova camada de tinta. Ao longo de uma
das paredes há uma fileira de janelas, que exibem no horizonte o distrito financeiro da
cidade. No alto de outra parede está um relógio elétrico. Do outro lado, uma saída para o
banheiro. Em um canto da sala há um bebedouro. Sobre a mesa estão blocos de notas,
lápis e cinzeiros. Uma das janelas está aberta. Papéis voam pela mesa e caem no chão
quando a porta se abre. Do lado de fora da porta estão escritas as palavras "Sala do Júri".
Um guarda uniformizado mantém a porta aberta. Lentamente, quase inconscientemente,
os doze jurados entram em fila. O guarda os conta enquanto eles entram pela porta, seus
lábios se movendo, mas nenhum som saindo. Quatro ou cinco dos jurados acendem
cigarros ao entrar na sala. O jurado Nº. 5 acende seu cachimbo, que fuma constantemente
durante a peça. Os jurados Nº. 2 e 12 vão para o bebedouro. O 9 vai para o banheiro, cuja
porta tem a inscrição "Homens". Vários dos jurados sentam-se à mesa. Outros ficam sem
jeito ao redor da sala. Vários olham pelas janelas. São homens que se sentem pouco à
vontade, que realmente não se conhecem o suficiente para conversar e que gostariam de
estar em qualquer lugar, menos aqui. O jurado nº 7, parado na janela, tira um pacote de
chiclete, pega um e oferece. Ninguém aceita. Ele enxuga a testa.

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Abre-se a porta e o Guarda entra. Ele segura uma prancheta com a lista dos jurados.

Guarda – Muito bem, senhores jurados, podem entrar.

Entram os jurados e se posicionam na boca de cena. O Guarda confere seus nomes na


lista.

7º Jurado – (virando-se para o 8º Jurado) Chiclete?

8º Jurado – Não, obrigado.

O 7º Jurado põe na boca um chiclete e vai até o 6º Jurado.

7º Jurado – Telefonei pra meteorologia. Hoje vai ser o dia mais quente do ano. (o 6º Jurado
assente com a cabeça e dá uma olhada pela janela) Pelo menos podia ter ar condicionado.
Quase morri sufocado no tribunal.

Guarda – (para o 1º Jurado) Estão todos aqui. Se precisarem de alguma coisa, estou ali
fora. É só bater.

O Guarda sai e ouve-se no silêncio o som da porta sendo trancada.

5º Jurado – Não sabia que trancavam a porta.

10º Jurado – Claro que trancam. Pensava o quê?

5º Jurado – Nada. Só não sabia...

O 10º Jurado cruza a sala, vai para frente do Presidente e observa as tiras de papel.

10º Jurado – Pra que isto?

Presidente – Cédulas! Paro o caso de uma votação secreta.

10º Jurado – Boa idéia! Quem sabe a gente elege o delinquente senador. (ri e tosse)

O Presidente consulta o relógio de pulso. O 3º Jurado apanha um copo de água no


bebedouro, segue em direção do 12º Jurado e olha em torno da sala, enquanto bebe.

3º Jurado – (para o 12º Jurado) O que achou?

2º Jurado – (calmamente) Sei lá, interessante.

3º Jurado – Foi? Eu quase dormi.

2º Jurado – É que nunca estive num júri antes.

3º Jurado – É mesmo? Já estive em alguns e sempre me espanta como esses advogados


falam, falam e falam mesmo num caso óbvio como este. Já viu tanta falação por nada?

2º Jurado – É um direito deles...

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3º Jurado – Claro e todos merecem um julgamento justo. É a lei. Eu seria o último a me
opor a isto, mas às vezes acho que seria melhor pegar de jeito esses moleques, antes que
criem problemas, entende? Pouparia tempo e dinheiro.

O 2º Jurado olha nervosamente para o 3º Jurado, balança a cabeça, levanta-se, vai em


direção do bebedouro, volta a encher o copo e fica de pé, sorvendo-o.

7º Jurado – (para o Presidente) Podemos começar?

Presidente – Precisamos esperar aquele senhor sair do banheiro...

5º Jurado – (para o Presidente, hesitante) Vamos sentar em ordem?

Presidente – Não sei, pode ser.

O 8º Jurado está olhando pela janela.

12º Jurado – (para o 8º Jurado) Que vista! (o 8º Jurado assente com a cabeça) O que
achou do caso? (o 8º Jurado não responde) Achei muito interessante. Sem contradição.
Sorte ser um caso de homicídio. Se fosse roubo ou assalto, podia ser bem chato.

O 8º Jurado continua olhando pela janela. O 12º Jurado olha para ele por um momento e
depois se afasta. O Presidente vai levar o seu paletó ao cabideiro.

7º Jurado – Puta perda de tempo. (ri)

10º Jurado – Três dias no tribunal para isso.

7º Jurado – E a história da faca? Da pra acreditar naquela babaquice.

10º Jurado – Esperava o quê? Vindo dessa gente.

7º Jurado – É. (o 10º Jurado assoa o nariz) Tá resfriado?

10º Jurado – Muito. E com esse calor piora. Nem consigo encostar no nariz. (assoa o nariz
estrepitosamente)

7º Jurado – A buzina está ótima.

10º Jurado – Você não viu o escapamento.

7º Jurado – (sobe no banco e tenta ligar o ventilador) Essa não, o ventilador não funciona.
(para o jurado número dois) Dá licença amigo. Deviam mandar uma carta ao prefeito:
“Excelentíssimo mão de vaca...”

Presidente – Espera aí! Deixa eu ver! (sobe no banco e examina o ventilador)

O 3º Jurado vai em direção do 4º Jurado, inclina-se e começa a bisbilhotar o jornal.

3º Jurado – (olhando o jornal do 4º Jurado) Alguma novidade? Não vi o jornal hoje.

4º Jurado – Só queria ver o fechamento da bolsa.

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3º Jurado – Trabalha na bolsa?

4º Jurado – Sou corretor.

3º Jurado – É mesmo? Eu tenho uma firma de entregas: “Leva & Traz”. O nome foi idéia
da minha mulher. Tenho trinta e sete empregados... Comecei do nada.

Presidente – É. Não funciona mesmo.

7º Jurado – (olha o seu relógio) Deixa para lá. Podemos colocar o time em campo?

Presidente – Muito bem, senhores. Vamos sentar, por favor. (desce do banco)

3º Jurado – É, vamos acabar logo com isto. Todo mundo tem mais o que a fazer.

7º Jurado – (para o 2º Jurado) Tenho ingressos para o jogo desta noite: Yankees vs.
Cleveland. Temos um novo arremessador, Modjelévski, ou sei lá o quê. (faz com a mão a
curva da bola) Ele tem um arremesso animal. (nenhuma reação por parte do 2º Jurado) O
amigo não é muito fã de beisebol, é? (volta-se para o Presidente) Eu posso jogar em qual
posição?

Presidente – Acho melhor sentar na mesma ordem da sala do júri. Já estamos


acostumados. (aponta para cada cadeira) Dois, três, quatro e assim por diante.

3º Jurado – Já estou no meu lugar.

10º Jurado – Que diferença faz?

4º Jurado – Acho razoável.

10º Jurado – (erguendo-se) Tudo bem. (vai sentar-se na décima cadeira)

Os jurados começam a procurar seus lugares. O 8º Jurado continua a olhar para fora parado
junto à janela. O 9º Jurado ainda está no banheiro.

12º Jurado – (para o 11º Jurado) O que achou do promotor?

11º Jurado – (com sotaque) Perdão?

12º Jurado – O promotor. Eu achei que ele foi muito preciso. Defendeu seus pontos de
vista um a um em uma seqüência lógica. É preciso ter cabeça para isso.

11º Jurado – É, acho que ele foi bem competente.

12º Jurado – Ele acertou em cheio. Em cheio!

7º Jurado – Podemos dar o apito inicial?

Presidente – (para o 8º Jurado que está na janela) Vamos sentar? (o 8º Jurado não ouve,
o Presidente vai até ele) Vamos sentar?

O 9º Jurado sai do banheiro e vai pendurar o paletó.

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10º Jurado – (na mesa, para o 4º Jurado) É duro de encarar! Matar o pai assim. Sem mais
nem menos.

12º Jurado – É só analisar as estatísticas sobre violência...

10º Jurado – Que estatísticas? É essa gente! Deixam essa molecada solta. Tem mais é
que se ferrar.

7º Jurado – (para o 5º Jurado) Você torce pros Yankees?

5º Jurado – Não, pelo Baltimore.

7º Jurado – Baltimore! Eu estou falando de beisebol... Além do cara que corta a grama que
mais vocês tem?

Presidente – (para o 9º Jurado) Gostaríamos de começar, se não se importam.

9º Jurado – Desculpe. (cruza a sala e vai sentar-se)

7º Jurado – O cara torce para o Baltimore!

Presidente – (de pé) Bem, os senhores é que decidem, não pretendo ditar as regras por
aqui, não. Nós podemos primeiro discutir e só depois votar, ou votar logo para ver como é
que estamos. (cala-se e olha em torno)

4º Jurado – É de praxe uma votação preliminar.

7º Jurado – Vamos votar. Quem sabe a gente pode ir embora rápido.

Presidente – Preciso lembrá-los que nós temos aqui um caso de homicídio em primeiro
grau. Se votarmos culpado, mandaremos o réu para a cadeira elétrica, sem apelação.

4º Jurado – Já sabemos de tudo isso.

3º Jurado – Vamos logo votar.

10º Jurado – Vamos ver que é quem.

Presidente – Um momento, por favor! Alguém não quer votar? (olha em torno) Mais uma
coisa, o resultado tem que ser unânime. É a lei. Todos prontos? Quem acha que o réu é
culpado levante mão, por favor. (seis ou oito mãos se erguem imediatamente. Várias outras
vão se erguendo mais devagar. Todos olham em torno da mesa enquanto o Presidente
começa a contagem. O 9º Jurado só agora ergue a mão. Todas elas estão levantadas
exceto a do 8º Jurado)... nove, dez, onze. Onze votam culpado.

10º Jurado – Ah não!

Presidente – Quem acha que o réu é inocente levanta a mão, por favor! (o 8º Jurado levanta
a mão vagarosamente) Um.

10º Jurado – Sempre tem um.

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Presidente – Então, está onze a um. Agora já sabemos em que pé estamos. (senta-se e
anota)

7º Jurado – (depois de uma pausa) E a gente faz o que?

8º Jurado – Bom, acho que podíamos conversar um pouco.

3º Jurado – (inclinando-se para o 8º Jurado) Acha mesmo que ele é inocente?

8º Jurado – Não sei.

3º Jurado – Vamos ter bom senso. O senhor se sentou lá no tribunal e ouviu as mesmas
coisas que nós. O homem é um assassino perigoso. Tá na cara.

8º Jurado – O homem!? Ele tem dezesseis anos.

3º Jurado – Já é bem grandinho. Esfaqueou o próprio pai. Dez centímetros no peito.

6º Jurado – (para o 8º Jurado) Não é óbvio? Fiquei convencido desde o primeiro dia.

3º Jurado – E quem não ficou? (para o 8º Jurado) Para mim esse é um caso decidido.
Ficou mais que provado. Eu tenho tudo anotado, se o senhor quiser, eu posso citar.

8º Jurado – Não é necessário.

10º Jurado – Então o senhor quer o quê?

8º Jurado – Nada. Só conversar a respeito.

7º Jurado – Mas conversar o quê? Onze jurados estão de acordo. Ninguém precisou
pensar duas vezes, só o senhor.

10º Jurado – Quer dizer então que acredita na história do garoto?

8º Jurado – Não sei se acredito ou não. Talvez não.

7º Jurado – Então por que votou inocente?

8º Jurado – Havia onze votos de culpado. Para mim não é fácil levantar a mão e condená-
lo.

7º Jurado – Quem disse que é fácil para mim?

8º Jurado – Ninguém.

7º Jurado – Só porque eu levantei a mão primeiro? Acho que ele é culpado. Ninguém vai
mudar a minha opinião mesmo que fale pelo resto da noite.

8º Jurado – Não quero mudar sua opinião. Só que estamos tratando aqui da vida de uma
pessoa. Não podemos decidir isto em cinco minutos. E se estivermos errados?

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7º Jurado – E se estivermos errados! E se este teto desabar sobre as nossas cabeças? A
gente pode supor qualquer coisa.

8º Jurado – É verdade.

7º Jurado – (depois de uma pausa) Que diferença faz o tempo que levar? Se acharmos
que o garoto é culpado, acabamos com isso em cinco minutos. Qual é o problema?

8º Jurado – Ótimo! Já que não faz diferença vamos ficar uma hora. O jogo só começa às
oito mesmo.

7º Jurado – (rindo) Ok, treinador, bola pra frente.

Presidente – Muito bem. Alguém é contra? (olha em torno. Para o 2º Jurado) O senhor?

2º Jurado – Eu, não.

Presidente – (para o 9º Jurado) O senhor?

9º Jurado – Estou de acordo podemos ficar mais uma hora.

Presidente – (para todos) Uma hora? (senta-se e anota)

10º Jurado – Já que nós vamos ficar mais uma hora... Eu ouvi uma ótima ontem à noite.
Uma enfermeira entra nua da cintura para cima em um consultório e diz: Doutor...

8º Jurado – Cavalheiro, meu senhor... Nós não estamos aqui para isso.

10º Jurado – Estamos aqui para quê?

8º Jurado – Talvez por nenhuma razão. Não sei. Esse menino foi maltratado a vida inteira,
morou num cortiço, a mãe morreu quando ele tinha nove anos. Passou um ano e meio num
orfanato enquanto o pai cumpria pena por falsificação. Não é um bom começo de vida.
Dezesseis anos de uma vida terrível. Acho que lhe devemos apenas algumas palavras. Só
isso.

10º Jurado – Não devemos nada a ele. Ele já teve um julgamento justo. Tinha que
agradecer por isso. Quanto acha que isso custa ao estado? (levanta-se e fala para todos)
Nós somos adultos. Ouvimos os fatos, não venha me dizer que devemos acreditar nele,
sabendo o que ele é. Vivi no meio deles a vida toda. Não se pode acreditar em nada do que
dizem. Já nasceram mentirosos.

9º Jurado – Sabe, estou começando a achar que o senhor é um ignorante.

10º Jurado – O que ele falou?

9º Jurado – Está pensando que é o dono da verdade?

10º Jurado – Porque criar um caso com isso? (para os outros) Qual é a desse cara?

9º Jurado – (para os outros) Acho que precisamos ensinar algumas coisas a esse senhor.
3º Jurado – Hoje não é domingo. Ninguém quer ouvir sermão aqui.

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10º Jurado – Dono da verdade! Pelo amor de Deus...

O 9º Jurado chega quase a levantar-se, mas sente a mão do 8º Jurado segurar firme seu
braço, empurrando-o gentilmente para baixo. O 12º Jurado rabisca em seu bloco.

4º Jurado – Se vamos discutir o caso, é melhor nos atermos aos fatos.

Presidente – (ficando de pé) Exato, senhores. Por favor! Vamos ao que viemos? (indo em
direção do 8º Jurado) Talvez o cavalheiro que votou inocente possa nos dizer por quê?
Possa nos dizer o que pensa a respeito do caso. E nós poderemos mostrar a ele onde ele
provavelmente se enganou.

12º Jurado – (interrompendo o Presidente) Pipocar!

11º Jurado – (olhando o 12º Jurado) O que é isso?

12º Jurado – (levanta o desenho) Esse aqui é um dos produtos que eu trabalho lá na minha
agência, é um novo cereal para o café da manhã: Pipoca de Arroz “Faça o seu café da
manhã pipocar”. Eu acabei de criar a frase.

11º Jurado – Muito criativa.

Presidente – Por favor, meu senhor, nós estamos tirando um procedimento aqui!

12º Jurado – (cortando o Presidente novamente) Desculpem. É que desenhar me ajuda a


pensar melhor.

Presidente – Que ótimo! Folgo em sabê-lo, mas...

12º Jurado – (cortando o Presidente pela 3ª vez) Eu tive uma idéia. É só uma idéia. Estou
pensando alto. Vou jogar a idéia para a foca para ver se ela bate palmas. Acho que
devemos convencer aquele cavalheiro (indica o 8º Jurado) que nós estamos certos e ele
errado. Talvez se cada um de nós falasse por um minuto ou dois minutos... é só uma idéia...

7º Jurado – Sensacional! Excelente sugestão! Podemos começar já?

Presidente – (indo se sentar) Podemos! Podemos fazer desse jeito ao invés do meu! (para
o 12º Jurado) E podemos seguir a ordem dos jurados?

12º Jurado – Claro!

Presidente – Que ótimo que o senhor concorda! (para o 2º Jurado) Nesse caso, o senhor
é o primeiro. (senta)

2º Jurado – (levanta e hesita) É difícil colocar em palavras... Apenas acho que ele é
culpado. Me pareceu óbvio desde o início. Ninguém provou o contrário.

8º Jurado – Ninguém tinha que provar o contrário. Quem tem que provar alguma coisa é o
promotor. O réu não tem sequer de abrir a boca. Está na lei. Todos ouviram isto.
2º Jurado – (perturbado) Claro que ouvimos. Eu sei disso. Mas é que eu acho que ele é
culpado. Uma mulher viu. (olha em torno desamparado. Senta)

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3º Jurado – (levanta e consulta suas notas) É o seguinte, o que eu acho não tem nada de
subjetivo. Não há nada de pessoal nisso. O que importa são os fatos. Os fatos são os fatos.
Primeiro. O velho que mora no andar de baixo, embaixo do apartamento onde ocorreu o
crime a meia noite e dez disse ter ouvido gritaria no apartamento de cima. Disse que parecia
uma briga, então ouviu o rapaz gritar alto “Vou te matar” e, um segundo depois, ouviu o
barulho do corpo caindo no chão. Em seguida ele correu até a porta do apartamento e viu
o garoto descendo a escada correndo e saindo prédio, então ligou para a polícia, que
encontrou o pai com a faca enfiada no peito.

Presidente – Isso! E o legista fixou à hora da morte em torno da meia-noite.

3º Jurado – Exato. Esses são os fatos. O senhor não vai querer refutar os fatos. O rapaz é
culpado. Eu sou tão sentimental como qualquer um aqui. Ele só tem dezesseis anos, mas
tem que pagar pelo que fez.

7º Jurado – Boa tacada! É isso aí, acertou em cheio!

4º Jurado – Para mim, estava óbvio desde o início que a história do rapaz era inconsistente.
Ele alegou que estava no cinema na hora do crime, mas uma hora depois já não se
lembrava do filme, nem dos atores.

3º Jurado – Exato. (para o 8º Jurado) Ouviu?

4º Jurado – Ninguém o viu entrar ou sair do cinema.

10º Jurado – E a mulher do outro lado da rua? Se o testemunho dela não prova o caso,
nada vai provar.

11º Jurado – Isto mesmo. Ela foi à única que presenciou de fato o crime.

Presidente – (levantando-se a meio) Dá licença, vamos continuar seguindo a ordem dos


jurados... (depois do corte, senta-se irritado)

10º Jurado – (cortando o presidente) Só um minuto, tinha essa mulher! Estava deitada sem
conseguir dormir por causa do calor. Ela olha pela janela e vê do outro lado da rua o
moleque enfiar a faca no peito do pai. Era meia noite e dez na bucha. Ela conhece o
moleque desde pequeno. Tudo se encaixa. O apartamento dela fica exatamente do lado
oposto da rua, separada pelo viaduto onde passa o trem e ela jurou que viu o crime.

8º Jurado – Através das janelas do trem que passava pelo viaduto naquela hora.

10º Jurado – Sim. O trem estava vazio, estava sendo recolhido e as luzes do trem estavam
apagadas. Lembram disso? E ficou provado no tribunal que é possível ver através das
janelas do trem o que acontece do outro lado da rua. Provaram isso.

8º Jurado – Engraçado. O senhor não acredita no menino, mas acredita na mulher. Ela
também não é “um deles”?

10º Jurado – (levantando-se irritado) O que você está querendo dizer com isso? Hein,
espertinho?

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Presidente – (levantando-se) Vamos com calma.

10º Jurado – (raivoso) O que o gênio está querendo insinuar? Eu estou falando...

3º Jurado – Que é isto? Por que está deixando ele te irritar assim?

O 10º Jurado senta-se lentamente.

Presidente – (esperando o 10º Jurado sentar) Quem é próximo? Número cinco.

5º Jurado – (olhando nervosamente em torno) Eu posso passar?

Presidente – Pode! Direito seu. Tem certeza?

5º Jurado – Tenho.

Presidente – Próximo jurado, por favor!

6º Jurado – Bom eu... (para e pede ao sétimo jurado que pare de bater o lápis) Eu fiquei
convencido desde o primeiro dia. Eu fiquei buscando motivos, eu acho o motivo muito
importante. Sem motivo não tem caso. O depoimento dos vizinhos de andar, por exemplo,
para mim foi muito decisivo. Eles disseram que teve uma briga do garoto com o pai por
volta de umas sete horas...

11º Jurado – Às oito horas. Não às sete.

8º Jurado – Exatamente. Às oito horas. Ouviram uma discussão, mas não souberam dizer
sobre o que. Então, ouviram o pai bater no menino duas vezes, e por fim viram o rapaz sair
correndo furioso para a rua. O que isto prova?

6º Jurado – Não prova nada, mas faz parte da história. Eu não disse que provava alguma
coisa.

8º Jurado – Mas disse que isto revelava um motivo para o crime. O promotor disse a mesma
coisa. Não acho que isto seja um motivo muito forte. Esse rapaz apanhou tantas vezes na
vida que a violência para ele era uma coisa normal. Não vejo como dois tapas na cara
pudessem levá-lo a cometer um crime.

4º Jurado – (calmamente) Esses tapas podem ter sido a gota d’água. Cada um tem seu
limite. (O 6º Jurado se senta)

6º Jurado – Era o que eu ia dizer.

Presidente – (para o 6º Jurado) Mais alguma coisa?

6º Jurado – Não.

Presidente – (para o 7º Jurado) Próximo jurado, por favor!

7º Jurado – Eu? A gente vai ficar falando a noite inteira é? Pra mim já falaram tudo. O
garoto é um caso perdido. Vocês ouviram os antecedentes. Aos dez anos ele esteve no
juizado de menores, porque atirou uma pedra na cabeça de um professor. Aos quatorze foi

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para o reformatório, por assalto. Ele roubou um carro! Já foi pego duas vezes tentando
esfaquear outro adolescente. E disseram que ele sabia manipular muito bem esses objetos.
Bonzinho o garoto?!

8º Jurado – Desde os cinco anos o pai batia nele regularmente.

7º Jurado – Eu faria o mesmo. Se eu tivesse um diabo desses em casa eu metia a mão...

4º Jurado – Esses espancamentos não seriam motivo suficiente para ele matar o pai?

8º Jurado – Talvez fosse um motivo para ele ser revoltado.

3º Jurado – Os meninos de hoje são assim. Revoltados! Hostis! Não têm mais jeito. Olha
como falam com a gente. Na idade dele, eu chamava meu pai de ‘Senhor’. É o certo.
Senhor! Já ouviram algum deles chamar o pai assim?

8º Jurado – Talvez os pais já não achem isto importante.

3º Jurado – Não? O senhor tem filhos?

8º Jurado – Dois.

3º Jurado – Eu tenho um. Está com vinte anos agora. Fiz tudo por ele e o que aconteceu?
Quando tinha nove anos fugiu de uma briga. Eu vi e fiquei tão envergonhado que quase
vomitei. Então disse pra dele: ‘Ou faço de você um homem ou te quebro no meio’. Fiz dele
um homem. Quando tinha dezesseis anos tivemos uma briga. Ele me bateu na cara. Ele é
grande. Faz dois anos que não o vejo. Garoto perdido. A gente faz tudo por eles e... (corta
de repente. Sente que disse mais do que queria. Fica embaraçado) Não interessa. Vamos
voltar ao caso.

4º Jurado – (levantando-se) Estamos nos desviando do assunto. Esse rapaz é fruto de


uma comunidade sórdida e de um lar desfeito. Isso é fato, concordo. Estamos aqui para
decidir se ele é ou não é culpado, e não para discutir as razões por que ele cresceu assim.
Não é segredo para ninguém que ele nasceu em um cortiço e nós sabemos que os cortiços
são viveiros de criminosos. As crianças nascidas nestes ambientes miseráveis são
ameaças potenciais à sociedade. Mas não é isso que está em questão aqui...

10º Jurado – (interrompendo) É isso aí, meu camarada. A molecada que cresce nesses
guetos são puro lixo. Não quero ficar aqui perdendo meu tempo com eles.

5º Jurado – (levantando-se) Eu morei em um cortiço a vida inteira e trabalho em um hospital


no Harlem, seis noites por semana, cuidando disso que o senhor chama de lixo.

10º Jurado – E qual é o problema?

5º Jurado – Lixo, meu amigo, é o que tinha em um terreno baldio onde eu costumava
brincar. Qual é o seu problema? Está sentindo o cheiro desse lixo no meu corpo?

10º Jurado – (em crescente fúria) Escuta aqui, meu chapa.

Presidente – (levantando-se) Calma, vamos ser sensatos.

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4º Jurado – (para o 5º Jurado) Não é pessoal...

5º Jurado – (em voz alta) É pessoal, sim!

O 3º Jurado vai em direção do 5º Jurado.

3º Jurado – Ele não quis se referir a você. Deixa de ser tão susceptível.

11º Jurado – Eu compreendo essa susceptibilidade.

O 10º Jurado encara o 11º. Ficam se enfrentando de pé.

Presidente – Por favor! (os dois continuam a se encarar) POR FAVOR!

11º Jurado – (sentando-se) Perdão.

Presidente – De quem é a vez agora? (consulta a prancheta) Número 8, sua vez! (senta-
se)

8º Jurado – Não esperava ter uma vez. Achei que a idéia fosse me convencer.

Presidente – É verdade, tinha me esquecido. Próximo jurado...

10º Jurado – (cortando o Presidente) Que diferença faz? Estamos aqui por causa dele.
Vamos ouvir o que tem a dizer.

Presidente – (levantando-se) Dá licença? É que nós combinamos fazer de outro jeito.


Vamos manter o combinado.

10º Jurado – (aborrecido) Deixe de ser infantil.

Presidente – Como assim, infantil?

10º Jurado – Foi isso que eu disse: In-fan-til.

Presidente – Só porque eu tentando manter o combinado eu sou infantil? Olha, aqui


cavalheiro, meu lugar está aqui, o senhor senta, a responsabilidade passa a ser sua e eu
calo a minha boca.

10º Jurado – Mas ele está muito nervoso, não? Calma.

Presidente – Estou calmo. Estou calmíssimo! A cadeira está aqui. O senhor senta e passa
a presidir o júri. Pensa que é fácil? Principalmente tendo uma pessoa como o senhor à
mesa?

10º Jurado – (rindo) Muito bem. Que belo show.

Presidente – Posso saber, exatamente, qual é a graça?

12º Jurado – Calma. Não é tão importante.

Presidente – Não é importante? Talvez o senhor queira tentar.

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12º Jurado – Não. O senhor está fazendo um belo trabalho. Ninguém quer mudar.

Presidente – Ótimo!

7º Jurado – Está jogando bem. Arremessa a bola e vamos mudar de base.

Presidente – Esplêndido!

10º Jurado – Então, senhor, com a palavra o próximo!

Presidente – Exato! O próximo! Número 9, por favor!

Há uma pausa.

8º Jurado – Olha se os senhores quiserem, eu posso dizer como é que eu vejo a coisa.

Presidente – (em voz baixa) Para mim tanto faz! (vai beber água)

8º Jurado – Não é nada especial. Sei tanto quanto os senhores. Pelos testemunhos o rapaz
parece culpado. Talvez seja. Durante os três dias as provas foram apresentadas no tribunal.
Todos pareciam tão convictos que comecei a duvidar. Não existe nada assim tão absoluto.
Se eu pudesse teria feito umas perguntas no tribunal. Talvez não levasse a nada. Não sei.
Mas comecei a sentir que a defesa não era eficiente. Deixava passar muita coisa. Detalhes.

10º Jurado – Que detalhes? Quando eles não perguntam é porque sabem que as respostas
vão prejudicar o caso.

8º Jurado – Talvez. Mas pode ser também que o advogado seja uma besta.

6º Jurado – Isso pode mesmo! Meu cunhado é advogado!

8º Jurado – Se eu fosse esse menino teria pedido para trocar de advogado. Se a minha
vida dependesse do julgamento gostaria que o meu advogado estraçalhasse as
testemunhas da promotoria, ou pelo menos que tentasse. Havia uma suposta testemunha
ocular do crime. Outra disse ter ouvido o homicídio e visto em seguida o rapaz sair correndo.
Havia muitas evidências circunstanciais, mas de fato aquelas duas testemunhas foram a
base do caso da promotoria. Muito bem. E se estivessem erradas?

12º Jurado – Como assim: “se estivessem erradas”. Então para que trazer as
testemunhas?

8º Jurado – Poderiam estar erradas!

12º Jurado – Mas elas testemunharam sob juramento. O que o senhor está querendo
dizer?

8º Jurado – Que são pessoas. Pessoas cometem erros. Não poderiam estar erradas?

12º Jurado – Eu não acho!

8º Jurado – O senhor não acha ou o senhor não sabe?

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12º Jurado – Ninguém pode saber uma coisa destas. Isso não é uma ciência exata.

8º Jurado – Concordo. Não é mesmo.

3º Jurado – (levantando-se irritado) Vamos voltar ao que interessa. A faca no peito do pai?

2º Jurado – Espera aí. Pensei que tínhamos combinado... Tem gente que ainda não falou.

3º Jurado – Eles podem falar depois, agora, por favor, cala a boca. (volta-se para o 8º
Jurado) E a faca? Aquela que o nosso nobre e gentil garoto admitiu ter comprado na noite
do crime. Vamos falar disso.

8º Jurado – Ótimo, vamos falar disso. Vamos falar sobre a faca. Senhor Presidente nós
gostaríamos de ver a faca. Senhor presidente?

O Presidente levanta-se e cruza a sala em direção da porta.

3º Jurado – Todo mundo já viu a faca. O que muda ver a faca de novo?

5º Jurado – Foi o senhor que levantou a questão.

4º Jurado – Ele tem o direito de ver as provas. (para o 8º Jurado) A faca é uma prova
evidente. Concorda?

8º Jurado – Concordo.

O Presidente bate na porta. O Guarda entra. O Presidente cochicha com ele. O Guarda
concorda e sai.

4º Jurado – Muito bem. Então vamos levantar os fatos um a um. O rapaz disse que saiu
de casa por volta das oito horas depois de ser esmurrado pelo pai.

8º Jurado – Ele não disse ‘esmurrado’. Disse “estapeado”.

7º Jurado – A tanto faz.

8º Jurado - Há uma diferença entre tapa e murro.

4º Jurado – Muito bem. Depois de levar uma surra do seu pai. Ele foi diretamente a uma
loja onde comprou esses canivetes automáticos, essas facas de mola. Não era uma faca
comum, o cabo tinha uns detalhes muito especiais. O dono da loja que a vendeu ao rapaz
disse que era a única que ele tinha em estoque. As 8h e 45 min ele se encontrou com uns
amigos em frente a um bar, até aqui eu estou certo?

8º Jurado – Certíssimo.

3º Jurado – (para o 8º Jurado) Claro que está. (para os outros) Ele sabe o que está falando.

4º Jurado – Ele conversou com os amigos até as 9h e 45 mim e eles viram a faca. Cada
um deles identificou a arma do crime no tribunal como sendo a mesma faca. As 22h o rapaz
retornou a sua casa e aqui o depoimento dele e o da promotoria começam a divergir

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ligeiramente. Ele disse que ficou em casa até as 23:30hs quando saiu para uma sessão da
meia noite no cinema, voltou as três e quinze da manhã, encontrou o pai morto e foi preso.
E o que aconteceu com a faca? Aqui entra a fabulazinha que ele inventou. Ele disse que a
faca caiu de um buraco no seu bolso enquanto ele ia e voltava do cinema e que nunca mais
a viu. Conversa! Ele não foi a cinema algum naquela noite. Ninguém no prédio o viu sair às
onze e meia, ninguém no cinema o identificou. O que aconteceu foi o seguinte: ele ficou em
casa, teve outra briga com o pai, apunhalou o pai e fugiu. Detalhe, ele se lembrou até de
limpar as impressões digitais.

Presidente – (Para 8º Jurado) A faca, cavalheiro.

4º Jurado – Com licença. (Pede a faca para 8º Jurado) Por favor! Obrigado!
Todos os envolvidos identificaram a faca. E o senhor quer nos convencer que a faca caiu
por um buraco no bolso do rapaz, alguém a encontrou na rua, foi a casa dele, apunhalou o
pai do rapaz só por brincadeira?

8º Jurado – Não. Estou dizendo que é possível que o rapaz tenha perdido a faca e que
alguém tenha apunhalado o pai dele com uma faca semelhante. É possível.

4º Jurado – Semelhante? (abre a faca de mola e crava-a na mesa) Olha esta faca. Nunca
vi nenhuma igual. Nem o dono da loja que a vendeu ao rapaz. O senhor não está tentando
nos convencer de uma coincidência absurda?

8º Jurado – Não. Estou apenas dizendo que é possível.

3º Jurado – (gritando) E eu digo que não é.

O 8º Jurado fica um momento em silêncio, depois procura no bolso e rapidamente tira dele
uma faca. Levanta-a na altura do rosto e aciona a mola, abrindo-a; depois se inclina para
frente e crava a faca na mesa, bem ao lado da outra. As duas são exatamente iguais. Há
um murmúrio na sala. O 8º Jurado afasta-se da mesa e fica observando.

6º Jurado – A faca é igual.

7º Jurado – Como pode?

12º Jurado – De onde ela veio?

2º Jurado – O que acham?

3º Jurado – (olhando para o 8º Jurado) O que está tentando fazer?

10º Jurado – Quem o senhor pensa que é?

4º Jurado – Um momento! Um momento! (para o 8º Jurado) Onde o senhor conseguiu esta


faca?

8º Jurado – Estava andando por aí ontem à noite, enquanto pensava. Comprei essa faca
em uma loja a três quadras da casa do rapaz. Seis dólares.

4º Jurado – A compra e venda desse tipo de faca é ilegal.

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8º Jurado – Eu sei. Infringi a lei.

3º Jurado – Foi um belo show. Mas prova o quê? Deve haver umas dez facas iguais a esta.

8º Jurado – É possível.

3º Jurado – E então, o que isto quer dizer? É o mesmo tipo de faca. E daí? Descobriu a
pólvora.

11º Jurado – Mesmo tendo encontrado uma faca igual, é uma absurda coincidência que
outra pessoa tivesse apunhalado pai do moço com uma semelhante.

3º Jurado – Isto mesmo.

7º Jurado – É uma possibilidade em um milhão.

8º Jurado – É possível.

4º Jurado – Mas pouco provável.

Presidente – Vamos voltar aos nossos lugares, senhores, por favor. (volta ao seu lugar
senta-se e anota)

Eles começam a voltar aos seus lugares. O 8º Jurado permanece de pé, observando.

2º Jurado – É interessante que ele tenha encontrado uma faca exatamente igual à que o
rapaz comprou.

3º Jurado – Por que interessante? Acha que isto prova alguma coisa?

2º Jurado – Não. Eu estava só...

3º Jurado – Interessante! (aponta para o 8º Jurado) Olha, porque o rapaz comprou a faca?

8º Jurado – Bem, ele alegou que...

3º Jurado – Eu sei. Ele alegou que comprou para dar a um amigo, cuja faca ele havia
quebrado.

8º Jurado – Isso mesmo. Foi o que ele disse.

7º Jurado – Balela!

9º Jurado – O amigo testemunhou que realmente o rapaz havia quebrado a faca dele.

3º Jurado – Foi. Mas quanto tempo antes do crime? Três semanas. Certo? Então como foi
que o nosso nobre rapaz comprou esta faca meia-hora depois de ter sido esbofeteado pelo
pai e três horas e meia depois ela foi encontrada enfiada até o cabo no peito desse pai?

7º Jurado – Ele ia dar ao amigo, só quis dar uma testadinha no peito do pai antes.

Há uma explosão de riso.

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8º Jurado – (para o 3º Jurado) Se ele comprou a faca para matar o pai, porque mostrou
aos amigos duas horas antes do assassinato?

3º Jurado – É conversa fiada. O rapaz mentiu e o senhor sabe disto.

8º Jurado – Ele pode ter mentido. (para o 10º Jurado) Em sua opinião, ele mentiu?

10º Jurado – Que pergunta idiota. Claro que mentiu.

8º Jurado – (para o 4º Jurado) E na sua?

4º Jurado – Já sabe minha opinião. Ele mentiu.

8º Jurado – (para o 5º Jurado) E em sua opinião? Ele mentiu?

5º Jurado – Não sei. Não tenho certeza... (interrompe de súbito e olha em redor)

3º Jurado – (intrometendo-se) Não tem certeza sobre o quê? Mas espera aí. (para o 8º
Jurado) Por acaso é advogado dele? Quem pensa que é para ficar nos questionando
assim?

8º Jurado – Não é essa a nossa função?

3º Jurado – Ainda tem onze jurados que acham que ele é culpado.

7º Jurado – É. Acha que vai mudar nossa opinião? Mas tudo bem, vai em frente com sua
teimosia, você vai nos levar a um impasse e o garoto vai ser julgado por outro júri e
condenado. É como dois e dois são quatro.

8º Jurado – É provável que o senhor esteja certo.

7º Jurado – Então, o que está querendo? Não podemos ficar aqui a noite inteira.

9º Jurado – Um menino pode morrer. É uma noite só.

7º Jurado – Ah, é uma noite só! OK, velhinho. Alguém tem um baralho?

2º Jurado – (para o 7º Jurado) Acho que o senhor não devia brincar com essas coisas.

O Presidente fica de pé para controlar a mesa.

10º Jurado – Eu acho que essa história da faca não tem nada a ver. A mulher viu o moleque
matar o pai, o que mais a gente precisa? Eu tenho três oficinas que estão abandonadas,
enquanto a gente fica aqui falando, falando, falando. Vamos acabar logo com isso e dar o
fora daqui.

11º Jurado – A faca foi muito importante para o promotor. Passou uma manhã inteira...

10º Jurado – Aquele era o vigésimo oitavo assistente. O que ele pode saber?

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Presidente – (cortando a discussão) Desculpe, mas esse tipo de discussão só nos atrasa.
(para o 8º Jurado) Talvez o cavalheiro que nos levou a um impasse tenha alguma sugestão
a dar?

3º Jurado – (para o 8º Jurado) O senhor está sozinho.

8º Jurado – Proponho uma votação secreta. Os onze votam por escrito e eu fico de fora.
Se ainda assim houver onze votos de culpado, eu aceito. Acato a decisão e levamos ao
juiz. Mas se alguém votar inocente continuamos a discussão. (pausa) É isso. Se quiserem
tentar, estou disposto.

3º Jurado – Finalmente uma proposta sensata.

12º Jurado – Eu compro a idéia.

7º Jurado – Pulamos de base. Já estão todos na posição, vamos começar.

Presidente – Um momento, por favor. Alguém é contra? Alguém não quer votar? Ótimo.
Podem passar. (vai passando as cédulas)

O 8º Jurado sai da mesa e senta-se no banco. Fica observando os demais. Os jurados


passam as cédulas uns para os outros. Por fim cada um deles começa a escrever. Depois
alguns começam a dobrar os papéis e passá-los ao Presidente. O Presidente empilha as
tiras em frente a ele na mesa. Vai abrindo e lendo as cédulas uma por uma.

Presidente – Culpado. Culpado. Culpado. Culpado. Culpado. Culpado. Culpado. Culpado.


Culpado. Inocente. (um murmúrio de vozes)

10º Jurado – A pelo amor de Deus! E agora?

Presidente – (lê a última tira) E o último: Culpado.

7º Jurado – Quem foi que virou a casaca?!

10º Jurado – Quem foi que votou inocente? Quero saber.

11º Jurado – Combinamos que a votação seria secreta. Concordamos com isto.

3º Jurado – Secreta? Como assim secreta? Não tem nada de secreto em uma sala de júri.
Eu sei quem foi. (cruza em direção do 5º Jurado) Rapaz você é um frouxo, hein? Chegou
aqui, como todo mundo e votou culpado, mas bastou esse pregador bom de bico amolecer
seu coração com a história do coitadinho que não podia ser assassino pra você mudar o
voto. Não tem opinião? Por que não põe uma moedinha na saca de esmolas dele?

5º Jurado – Hei, espera aí! (o 3º Jurado se volta) Você não pode falar comigo assim! (o 3º
Jurado vira-se de frente para ele. O 4º Jurado introduz-se entre eles e afasta o 5º Jurado
pelo braço) Não! (sacode o braço para tirar a mão do 4º Jurado) Quem deu a ele o direito
de gritar comigo?

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4º Jurado – É melhor sentar. Ele está um pouco exaltado. Esqueça isto.

3º Jurado – Claro que estou exaltado. Estávamos tentando pôr um criminoso na cadeira
elétrica que é o lugar dele e de repente alguém vem com histórias da carochinha e ficamos
ouvindo.

2º Jurado – (conciliatório) Calma.

3º Jurado – Que calma?! Acha bom ver um criminoso solto por aí? (pegando a faca) Porque
não devolve a faca pra ele? Facilitaria ainda mais.

Presidente – Por favor, vamos parar com essa gritaria! (o 3º Jurado entrega a faca ao 4º
Jurado) Será que alguém tem algo construtivo a dizer?

11º Jurado – Perdão. Eu gostaria dizer uma coisa. (o Presidente senta-se) Sempre pensei
que neste país uma pessoa tivesse o direito de ter opiniões divergentes...

7º Jurado – Não, espera ai. Esse ai é bola fora. (para o 5º Jurado) O, Baltimore, por que
mudou o voto? (arma-se um burburinho)

Presidente – (levantando-se. Para o 7º Jurado) Meu senhor! Meu senhor!

9º Jurado – (cortando a gritaria) Ele não mudou o voto coisa nenhuma. Quem mudou o
voto fui eu. Quer saber por quê?

7º Jurado – Não quero saber não vovô.

9º Jurado – Mas, eu faço questão de dizer, senão se importa.

10º Jurado – Pelo amor de Deus, ainda temos que ouvir isto?

6º Jurado – Ei, por favor! Deixa o senhor falar.

9º Jurado – Muito obrigado. (para o 7º Jurado) Este senhor (indica o 8º Jurado)


permaneceu sozinho contra todos nós. Ele não está dizendo que o rapaz é inocente.
Apenas não tem certeza. Não é fácil aguentar a pressão de todo mundo aqui. Ele precisava
de apoio e eu quis dar o meu apoio. Respeito os motivos dele. Provavelmente o rapaz é
culpado. Mas eu quero ouvir mais. (o 7º Jurado vai para o lavatório) A votação está dez a
dois. (o 7º Jurado entra no banheiro e bate a porta) Eu ainda estou falando. O senhor não
tem o direito...
8º Jurado – (para o 9º Jurado) Ele não ouve. E nunca vai ouvir.

3º Jurado – Se acabou o discurso, talvez se possa continuar.

Presidente – Não, agora pela regra a gente precisa dar uma parada, porque tem um lá
dentro. (senta-se e anota)

12º Jurado – (para o 11º Jurado) Voltamos a estaca zero! Essa história do velhinho pegou
todo mundo. Bem que eu queria ter uma idéia pra gente sair dessa. (sorri de repente) Lá
na agência... Eu já falei que trabalho numa agência de publicidade?

11º Jurado - Sim

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12º Jurado – Pois é lá tem gente bem engraçada, como em qualquer trabalho. Qual é a
sua profissão?

11º Jurado – Sou relojoeiro.

O Presidente vai em direção das duas facas espetadas. Apanha a que tem a etiqueta. Vai
até a porta e bate. Quando o Guarda aparece, o presidente lhe entrega a faca. O Guarda
sai. Senta-se no banco.

12º Jurado – É mesmo? Os melhores relojoeiros vêm da Europa. Como é que eu não tinha
pensado nisso. Como eu tava dizendo (para 2º jurado) Eu estou falando do meu trabalho
lá na agência – Lá quando acontece uma coisa dessas em uma reunião meu chefe sempre
tem uma na ponta da língua. É genial. E o que me tira do sério é como ele lança a idéia
com uma frase feita, ela já diria alguma coisa do tipo: “Senhores agora eu vou levantar uma
bandeira para ver se alguém bate continência.” “Senhores eu tenho uma ideia que vou
mandar para o espaço para ver se entra em órbita.” Isso ele falou para uns Russos, seus
amigos. É idiota, mas engraçado.

11º Jurado – Muito.

3º Jurado – (para o 5º Jurado) Olha eu não queria ser grosseiro de jeito nenhum. Eu sei
que me exaltei um pouco, mas é que eu sou assim mesmo, sou autêntico.

O 5º Jurado passa pelo 3º Jurado sem responder.

7º Jurado – O senhor é vendedor?

8º Jurado – Arquiteto.

7º Jurado – Conheço a sua técnica, sugestão indireta. A minha é diferente, piadinha,


wiskinho, tapinha nas costas. Faturei vinte e sete mil dólares ano passado vendendo
geleias. Nada mal, não? Geleias! (observa o 8º Jurado por um momento) O que está
sentindo? Adrenalina? O garoto é culpado. Vamos embora antes da gente ficar rouco.

8º Jurado – Que diferença faz ficar rouco aqui ou em um jogo de beisebol?

7º Jurado – Nenhuma treinador. Nenhuma.

O 7º Jurado afasta-se. O 6º Jurado retorna do banheiro.


6º Jurado – (para o 8º Jurado) Que turma, hein?

8º Jurado – Igual as outras.

6º Jurado – Aquele senhor ali. O brigão que falou do filho. Isso não é jeito de falar com as
pessoas.

8º Jurado – É o jeito dele.

6º Jurado – Que dia infernal! O senhor acha que a gente vai ficar aqui por muito tempo?

8º Jurado – Não sei...

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6º Jurado – O garoto é culpado. Não tem a menor dúvida. A gente já devia ter acabado
com isso. (o 8º Jurado sorri) Acha que ele é inocente?

8º Jurado – Não sei. É possível.

6º Jurado – Eu não te conheço, mas aposto que nunca esteve tão errado em toda a sua
vida. Acaba com isso, está perdendo tempo.

8º Jurado – Imagine se o senhor fosse o réu?

6º Jurado – Eu não imagino nada, só sou um simples operário. Mas já que o senhor me
perguntou vou tentar. Imagina que o senhor nos convença a votar inocente e o rapaz tenha
realmente enfiado a faca no peito do pai.

O 6º Jurado encara o 8º Jurado por um momento e depois afasta-se. O 8º Jurado


permanece ali sozinho por uns instantes e sabemos que este é o problema que o vem
atormentando. Ele não sabe, nem nunca saberá.

Presidente – (levantando-se) Mais alguém vai ao banheiro? Então, senhores, vamos voltar
aos nossos lugares, por favor. (cruza em direção ao seu lugar da mesa)

2º Jurado – Acho que vamos ficar aqui para jantar.

Presidente - Então, senhores, vamos voltar aos nossos lugares, por favor. (cruza em
direção ao seu lugar da mesa) Muito bem quem gostaria de recomeçar?

Há uma pausa, então o 4º e o 6º Jurados começam a falar ao mesmo tempo.

6º Jurado – Eu queria dizer... (para o 4º Jurado) Desculpe.

4º Jurado – Talvez fosse proveitoso se... (para o 6º Jurado) Perdão, continue.

6º Jurado – Não quis interromper.

4º Jurado – Claro. Vai em frente. Tudo bem.

6º Jurado – É só um detalhe, não é nada importante... (para o 8º Jurado) O rapaz tinha um


motivo para matar o pai, as surras por toda vida. E se ele não tinha um motivo, quem mais
tinha? Ninguém sai por aí matando as pessoas sem motivo, só se for louco.
8º Jurado – Pelo que sei temos que decidir se ele é culpado acima de qualquer dúvida
razoável. Se mais alguém tinha motivos, esse é um problema para a polícia.

4º Jurado – É verdade. E não podemos deixar de nos perguntar quem mais teria um motivo.
(acena com a cabeça em aprovação para o 6º Jurado) Este senhor levantou uma pergunta
bastante razoável. Alguém matou. Se não foi o rapaz, quem foi?

3º Jurado – Modjeléwski.

7º Jurado – Ah não, não, não! Ele tem que jogar hoje a noite. (arremessa a bola de papel
que é rebatido pelo 10º Jurado. O Presidente fica de pé)

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4º Jurado – Quem não tem nada para acrescentar é melhor ficar calado.

3º Jurado – Tudo bem. Foi só para descontrair. Desculpem. Podem continuar.

4º Jurado – (para o 8º Jurado) Talvez o senhor possa responder? Quem mais teria um
motivo?

8º Jurado – Não sei. O pai não era exatamente um modelo. O advogado listou seus
antecedentes na argumentação final. Já esteve preso, viciado em jogo, atolado em dividas,
vivia em bares, bebia, brigava, metido a valentão, mulherengo... Eis aí algumas
possibilidades. Ele pode ter sido assassinado por um ex-detento, um agiota, um desafeto,
uma mulher ressentida, qualquer pessoa com quem ele andava.

10º Jurado – Nunca ouvi tanta bobagem... Todo mundo aqui sabe que o pai era um
vagabundo. Mas o que tem isto a ver com todo o resto?

8º Jurado – Não fui eu que levantei isso. Perguntaram quem mais poderia tê-lo
assassinado. E eu respondi.

9º Jurado – (apontando para o 4º Jurado) Aquele senhor fez uma pergunta direta.

10º Jurado – É, todo mundo aqui agora é advogado!

3º Jurado – Me responde outra pergunta direta, por favor. O velho que mora no andar de
baixo ouviu o rapaz gritar bem alto “Vou te matar”, um segundo depois ele ouviu o barulho
de um corpo caindo no chão. Ele correu até a porta e viu o rapaz descendo as escadas e
saindo do prédio. O que acha disso?

8º Jurado – Fico imaginando como o velho pode ouvir a voz do rapaz através do teto.

3º Jurado – Não foi através do teto. As janelas estavam abertas. Fazia calor, lembram?

8º Jurado – A voz veio de outro apartamento. Não é fácil identificar uma voz, especialmente
um grito.

Presidente – Mas ele identificou a voz do rapaz no tribunal entre outras cinco vozes,
mesmo estando vendado.

8º Jurado – Aquilo foi um show do promotor. O velho conhecia muito bem a voz do rapaz.
Moravam no mesmo prédio há anos. Mas daí a identificá-la tão categoricamente do andar
de baixo... Não acha que ele poderia se enganar? Talvez tenha deduzido que o rapaz
estava lá e tenha concluído que a voz fosse à dele?

4º Jurado – Acho isto muito rebuscado.

10º Jurado – (para o 8º Jurado) O velho ouviu o corpo cair e viu o moleque sair correndo
quinze segundos depois. Ele viu o moleque.

12º Jurado – É isso aí. E ainda tem a mulher do outro lado da rua que viu através da janela
o menino apunhalar o pai. Só isso não basta?

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8º Jurado – Neste momento não. Não, não basta.

7º Jurado – O assunto vai e volta, vai e volta.

4º Jurado – A mulher viu o crime através das janelas de um trem em movimento. O trem
tem seis vagões e ela viu através das janelas dos últimos dois carros. Ela se lembrava de
detalhes insignificantes. Não vejo como possa se contrapor a isso.

3º Jurado – (para o 8º Jurado) Então, o que tem a dizer?

8º Jurado – É que eu ainda tenho dúvidas.

3º Jurado – Então vai pensando aí um pouquinho. (para o 12º Jurado) Me passa o lápis.

Há um murmúrio geral. Alguns desanimam. O Presidente vai em direção do seu paletó. O


12º Jurado empresta o lápis ao 3º Jurado que começa a desenhar no bloco os quadros de
um jogo da velha.

8º Jurado – (levantando-se) Pergunto se alguém aqui tem idéia de quanto tempo um trem
leva para...

11º Jurado – Sim!

Ele vê o 3º e o 12º Jurados jogando o jogo da velha, agarra com força o bloco, rasga a
folha, amassa-a e atira-a no cesto de papéis.

3º Jurado – Espera aí!

8º Jurado – Isto aqui não é uma brincadeira.

3º Jurado – (gritando) Quem você pensa que é?

12º Jurado – (para o 3º Jurado) Tudo bem. Calma.

3º Jurado – Eu vou dar uma porrada nele. Viu o que ele fez? O nervosinho!

10º Jurado – Tudo bem. Deixa pra lá. Não tem importância.

3º Jurado – Isto não é brincadeira’! Com quem ele pensa que está tratando?
Presidente – (para o 3º Jurado) Já passou. Vamos sentar. (senta-se na cadeira do 3º
Jurado)

3º Jurado – Passou o quê? Eu exijo desculpas.

6º Jurado – Tudo bem brigão. Ele pede desculpas. Agora vamos ver o que ele tem a dizer.

8º Jurado – Obrigado. Algum dos senhores tem idéia de quanto tempo leva um trem para
passar por um determinado ponto?

7ºJurado – Que tem isto a ver?

8º Jurado – Quanto tempo? Dá um palpite.

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4º Jurado – Não faço a mínima idéia.

8º Jurado – (para o 5º Jurado) Quanta acha que é?

5º Jurado – Sei lá. Uns dez ou doze segundos, talvez.

3º Jurado – Mas para que isto?

8º Jurado – Eu diria que é um bom palpite. Alguém mais?

11º Jurado – Concordo. Também acho que é mais ou menos isto.

10º Jurado – Pra que este jogo de adivinhação?

8º Jurado – (para o 2º Jurado) O senhor, quanto tempo?

2º Jurado – Dez segundos. Aproximadamente.

4º Jurado – Muito bem. Digamos dez segundos. Aonde quer chegar?

8º Jurado – Um trem leva cerca de dez segundos para passar por um determinado ponto.
Vamos imaginar que esse ponto fosse a janela do quarto onde ocorreu o crime. Quase se
pode tocar os trilhos com a mão pela janela certo?

5º Jurado – Certo.

8º Jurado – Algum dos senhores já morou perto da linha do trem?

6º Jurado – Acabei de pintar um apartamento com vista para a linha. Sou pintor. Fiquei lá
três dias.

8º Jurado – Como é que era?

6º Jurado – O barulho do trem é ensurdecedor. Quando passa é difícil até de trabalhar.

8º Jurado – Eu morei perto da linha do trem. Segundo andar de frente para linha. Quando
o trem passa e a janela está aberta o barulho é insuportável. Quase não se ouve os próprios
pensamentos.

3º Jurado – Tá. Não ouvia nem seus próprios pensamentos. Chega logo no ponto!

8º Jurado – Vou chegar. Vamos pegar duas partes dos testemunhos e tentar encaixá-las.
Primeira, a do velho do andar de baixo. Ele disse que ouviu o menino gritar, ‘Vou te matar’,
e menos de um segundo depois ouviu o corpo cair no chão. Um segundo depois. Certo?

2º Jurado – Isto mesmo.

8º Jurado – Depois o testemunho da mulher que mora do outro lado da linha. Ela disse que
viu o crime através dos dois últimos vagões. Dos dois últimos vagões!

3º Jurado – Sim, certo. O que pretende com isto?

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8º Jurado – Concordamos que um trem leva cerca de dez segundos para passar por um
determinado ponto. Como a mulher viu o crime através dos dois últimos vagões podemos
concluir que se houve um grito ele aconteceu enquanto o trem passava. Eu pergunto: Como
é possível que o velho tenha ouvido o menino gritar “Vou te matar” com o barulho do trem?

3º Jurado – Isto é uma idiotice! Claro que podia ter ouvido.

8º Jurado – (para o 3º Jurado) Acha mesmo?

3º Jurado – O velho disse que o rapaz urrou. É o que me basta.

8º Jurado – Mesmo se ouvisse alguma coisa, ainda assim não poderia identificar a voz do
rapaz com a barulheira do trem.

3º Jurado – Trata-se de uma questão de segundos. Ninguém pode ser tão preciso.

8º Jurado – Um testemunho que levar a cadeira elétrica deveria ser preciso.

5º Jurado – Faz sentido. É possível que ele não tenha ouvido.

6º Jurado – É mesmo. Talvez ele não tenha ouvido, com o barulho do trem...

3º Jurado – Do que esse povo está falando?

5º Jurado – Tem lógica o velho não ter ouvido.

3º Jurado – Está doido? Por que ele mentiria? Que ia ganhar com isto?

9º Jurado – Ia ganhar um pouco de atenção.

3º Jurado – Palpite brilhante. Por que você não joga na loteria? Podia ficar milionário.

6º Jurado – (para o 3º Jurado) Hei! Por que está falando com ele assim? (o 6º Jurado
avança para o 3º Jurado e o segura pelo braço) Isso não é jeito de falar com uma pessoa
mais velha. O senhor devia ter mais respeito. (O Presidente se coloca entre os dois)

3º Jurado – Tira as mãos de mim!

6º Jurado – Quem fala assim com uma pessoa mais velha merecia levar uma porrada.
(solta o braço do 3º Jurado e fala para o 9º Jurado) O senhor pode falar o quanto o senhor
quiser. Ninguém vai lhe interromper. Por que o senhor acha que o velho mentiu?

9º Jurado – Fiquei olhando para ele muito tempo. O paletó estava descosturado embaixo
do braço. Repararam? Francamente, vir ao tribunal desse jeito. Era um homem bem velho,
com um paletó puído, andando muito devagar. Arrastava um pouco a perna esquerda, mas
tentava disfarçar, talvez por vergonha. Acho que ninguém aqui o conhece melhor do que
eu. Trata-se de um velho calado, amedrontado e insignificante, que nunca foi nada na vida,
que nunca foi notado, seu nome nunca apareceu nos jornais. Ninguém o conhece, ninguém
fala dele, depois dos setenta e cinco anos ninguém mais lhe pediu uma opinião. É muito
triste não ser nada. Um homem como este precisa ser ouvido, ser lembrado pelo menos
uma vez. Teria sido muito difícil para ele perceber que a sua vida...

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7º Jurado – Então quer dizer que ele mentiu só para se sentir importante uma vez na vida?

9º Jurado – Não. Ele não mentiu. Provavelmente convenceu a si mesmo que ouviu aquelas
palavras “Vou te matar” e acabou reconhecendo a voz do rapaz.

10º Jurado – Esta é a história mais fantástica que já ouvi. Que criatividade. Inventou tudo
isso sozinho vovô?

O 9º Jurado abaixa a cabeça, embaraçado.

4º Jurado – Senhores, este caso está baseado numa sucessão razoável e lógica de fatos.
Vamos nos ater a isto, aos fatos.

11º Jurado – Os fatos podem adquirir as nuances das personalidades de quem conta.

10º Jurado – Nossa Senhora!

2º Jurado – Alguém quer pastilha para tosse?

10º Jurado – Eu quero. (O 10º Jurado, pega uma) Obrigado. (O Presidente também pega)

12º Jurado – Digam o que quiserem. Ninguém me vende a idéia de que esse moleque é
inocente.

8º Jurado – Bom acho que todos nós concordamos que o velho não podia ter ouvido o
rapaz gritar “Vou te matar”. Mas supondo que tivesse ouvido, quantas vezes qualquer um
de nós já não disse isso, para mulher, para os filhos? “Vou te matar”, “Vou te matar
moleque!”.

7º Jurado – É totalmente diferente.


8º Jurado – Ou até mesmo para um jogador quando erra uma jogada: Vou te matar cara!
Nós dizemos isso todos os dias, mas não quer dizer de verdade que vamos matar alguém.

3º Jurado – O que o senhor quer fazer a gente engolir agora? A frase foi, ‘Eu vou te matar’,
e o rapaz berrou com toda a força dos pulmões. Não me venha dizer que ele não tinha essa
intenção. Quem diz isto como ele disse, é porque quer fazer.

2º Jurado – Desculpe! Não sei. Semana passada discuti com um colega do banco, ele me
chamou de idiota e eu gritei: “eu vou te matar!”...

3º Jurado – Este cara quer fazer vocês acreditarem no que não existe. O rapaz disse que
ia matar e matou.

8º Jurado – Acha que ele iria gritar uma coisa destas para que toda a vizinhança ouvir? Ele
é esperto demais para isto.

10º Jurado – Esperto? Um bobalhão ignorante. Não sabe nem falar direito. Vai pedir pra
mim acreditar nisso.

11º Jurado – Para “eu” acreditar nisso.

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5º Jurado – Senhor presidente quero mudar meu voto para ‘inocente’.

Burburinho pela sala. Vários gritam. O Presidente pede silêncio.

7º Jurado – O Baltimore tinha que arregar, né?

5º Jurado – Foi o que eu disse.

Presidente – (para o 5º Jurado depois que o burburinho acaba) Tem certeza? (vai para o
seu lugar anotar)

5º Jurado – Tenho certeza. Inocente.

7º Jurado – É o fim! Baltimore, baseado em quê? Nas histórias desse aí? (para o 8º Jurado)
Você devia escrever romance policial, ia ficar rico.

Presidente – A votação agora está em nove a três para ‘culpado’.

7º Jurado – (para o 5º Jurado) Há fatos escancarados à nossa frente. Todos apontam para
o rapaz ter matado o pai. Por ter gritado “eu vou te matar”! O próprio advogado reconheceu
que ele não tinha nenhuma chance. O próprio advogado dele. Vocês viram. Ele merece a
cadeira elétrica.

8º Jurado – Merece? Já aconteceu antes alguém ter sido condenado e executado, e anos
mais tarde aparecer um outro que confessa o crime. Às vezes os fatos escancarados à
nossa frente estão errados!

7º Jurado – (para o 8º Jurado) Estou falando com ele – (indica o 5º Jurado) e não com o
senhor. (para os outros) Sujeito teimoso. (para o 8º Jurado) O garoto não tinha um
advogado? Ele defendeu o caso, não o senhor. Como é que o senhor tem tanta coisa assim
para dizer?

8º Jurado – O advogado foi indicado pelo tribunal.

7º Jurado – O que tem isso a ver?

8º Jurado – Uma porção de coisas. Que ele não queria o caso, que ele não ficou satisfeito
com a indicação. É o tipo de caso que não traz vantagem nenhuma. Nem dinheiro, nem
fama. Nem mesmo a chance de ganhar. É uma situação pouco promissora para um jovem
advogado. Ele teria que acreditar fielmente em seu cliente para fazer uma boa defesa. E
como o senhor mesmo disse, ele obviamente não acreditava.

7º Jurado – Claro que não acreditava. Quem acreditaria? Só se Jesus Cristo descesse a
terra. (olha para o relógio de pulso e depois o da parede) Olha a hora, senhor Presidente!

11º Jurado – Perdão, fiz algumas anotações.

10º Jurado – Mais essa agora!

11º Jurado – Gostaria de dizer uma coisa se não se importa.

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10º Jurado – Pois não, excelência.

11º Jurado – Obrigado! Estivesse prestando muita atenção e acho que esse senhor fez
algumas observações muito pertinentes. Pelo que foi apresentado no tribunal o rapaz
parece culpado, mas se analisarmos...

10º Jurado – Vai, vai, vai, vai...

11º Jurado – Muito bem! Vamos admitir que o rapaz tenha cometido o crime. Apunhalou o
pai no peito e fugiu. Isto foi meia-noite e dez. Como é que ele foi preso? Ele voltou para
casa às três da madrugada e foi detido por dois policiais na porta do prédio. Correto?
Pergunto então o seguinte: se ele realmente matou o pai, porque voltou para a casa três
horas depois? Não teria medo de ser preso?

3º Jurado – Voltou para pegar a faca. Não é educado deixar facas espetadas no peito das
pessoas.

7º Jurado – Principalmente no próprio pai. É pecado.

4º Jurado – (para o 11º Jurado) Senhores isso não tem a menor graça. Ele sabia que
alguém poderia identificar a faca. Portanto ele precisava apanhá-la antes da polícia.

11º Jurado – Mas se ele sabia que a faca poderia ser identificada, por que a deixou lá?

4º Jurado – Pressuponho que ele saiu correndo em pânico depois de ter matado o pai. Mas
tarde quando se acalmou, ele voltou...

11º Jurado – Isso depende da sua definição de pânico. Ele estava calmo o bastante para
certificar-se que não havia impressões digitais na faca. Assim sendo, quando terminou e
quando começou o pânico?

3º Jurado – Vamos esquecer essas bobagens. Ele só voltou a casa para arrancar a faca e
livrar-se dela.

11º Jurado – Três horas depois?

3º Jurado – Três horas depois.

11º Jurado – Se eu fosse o rapaz e tivesse matado meu pai, não voltaria para a casa três
horas depois com medo que a polícia estivesse lá. Ficaria longe, com ou sem a faca.

3º Jurado – Você não votou ‘culpado’? De que lado está agora?

11º Jurado – Não creio que tenha de ser leal a ninguém. Estou apenas questionando.

12º Jurado – Se eu fosse o moleque e tivesse cometido o crime, voltaria para pegar a faca.
Aposto que ele fugiu e nem percebeu que tinha alguém olhando. Foi no meio da noite! Com
certeza pensou que só fossem encontrar o corpo no outro dia.

11º Jurado – Perdão, mas a minha visão é a seguinte: A mulher do outro lado a rua
percebeu que logo após ter visto o crime, um momento após o trem passar, ela gritou e

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ligou para a polícia. O rapaz teria ouvido o grito e saberia que alguém o viu. Não creio quer
tivesse voltado para casa se fosse o criminoso.

8º Jurado – Talvez. Talvez tenha acontecido exatamente assim. O rapaz tenha de fato
apunhalado o pai e depois em pânico saiu correndo e mais tarde, mais calmo, tenha voltado
para pegar a faca. Talvez tenha acontecido exatamente assim. Ou talvez não. Acho que
existe dúvida suficiente para nos perguntar se ele estava lá na hora do crime.

10º Jurado – Que dúvida? De que está falando? O velho não viu o moleque sair correndo
do prédio? Ele está distorcendo os fatos. (para o 11º Jurado) O senhor aí. O velho viu ou
não viu o moleque sair do prédio à meia-noite e dez?

11º Jurado – Ele disse que viu.

10º Jurado – Disse que viu! (para os outros) Essa é ótima! (para o 11º Jurado) E a mulher
do outro lado da rua viu ou não viu o moleque matar o pai? Ela disse que viu! O problema
é esse, vocês não levam e conta o que as pessoas dizem. Quando querem acreditar
acreditam, quando não querem não acreditam. Distorcem os fatos, duvidam das
testemunhas e não tem motivo para isso.

5º Jurado – As testemunhas podem errar. Não podem?

10º Jurado – Certo, quando é do seu interesse elas erram!

Presidente – (indo em direção da briga) Muito bem. Vamos baixar o tom.

10º Jurado – (para o Presidente) Você também só sabe falar isso! Nós temos justamente
é que subir o tom nessa discussão. Esses caras mudam de lado a toda hora. Ouviu o grito,
não ouviu o grito. Que diferença faz? Ficam perdendo tempo com detalhes e se esquecem
do principal.

8º Jurado – Senhor Presidente, quero uma nova votação.

10º Jurado – Ei, eu estava falando...

Presidente – Foi pedida nova votação. Que tal voltarmos aos lugares?

Os Jurados que estavam de pé se encaminham para os seus lugares.

3º Jurado – Que vamos ganhar com uma nova votação?

Presidente – Não sei. Foi ele que pediu...

3º Jurado – Nunca vi tanto tempo perdido.

2º Jurado – (conciliador) Leva apenas um segundo.

Presidente – Muito bem. Acho que o mais rápido será saber quem vota ‘inocente’. Quem
acha que o réu é ‘inocente’ levante a mão, por favor. (o 5º, o 8º e o 9º Jurados levantam as
mãos) Um, dois, três. Continua a mesma coisa. Três ‘inocente’. E nove, ‘culpado’.

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7º Jurado – E agora? Não podemos ficar nesta lengalenga até a semana que vem.

11º Jurado – Perdão. (levanta vagarosamente a mão) Também voto inocente.

Burburinho na sala.

7º Jurado – Amarelou, né, gringo?

3º Jurado – Nós estamos falando de quê? Estão todos doidos aqui? O garoto é culpado.
Por que não se ater aos fatos? (para o 4º Jurado) Isto está virando piada!

Presidente – (senta-se e anota) A votação agora está oito a quatro, para ‘culpado’.

3º Jurado – Pelo que vejo o delinqüente juvenil tocou o coração das meninas. (para o 11º
Jurado) Por que mudou o voto?

11º Jurado – Tenho uma dúvida razoável, fora isso não lhe devo nenhuma explicação.

3º Jurado – Que dúvida razoável? Isto não passa de palavras. (Tira a faca da mesa e
levanta-a) Olha aqui. O rapaz que você decidiu que é inocente cravou essa faca no peito
do pai. Olha para ela, Senhor Dúvida Razoável.

9º Jurado – A faca não é essa não. Lembra?

3º Jurado – Brilhante! (volta a cravar a faca na mesa)

7º Jurado – O gringo fica dando ouvidos para as historinhas deste aí. No que devemos
acreditar? Se esse senhor fosse a uma luta de boxe ele ia nos convencer de que o
nocauteado é vencedor. No que devemos acreditar? Que o velho não ouviu o garoto gritar,
ele não correu até a porta, não viu descendo as escadas e nem saindo do prédio. Ah! E ele
disse tudo isso só para se sentir importante?

5º Jurado – Um minuto.

7º Jurado – Agora eu vou ter que ouvir o palpite do Baltimore.

10º Jurado – É importante.

7º Jurado – Vamos ouvir a opinião do Baltimore.

5º Jurado – O velho disse que correu para a porta?

7º Jurado – Correu. Andou. Se deslocou. Qual a diferença.

6º Jurado – Ele disse que correu até a porta. Pelo menos, acho que disse.

5º Jurado – Não lembro o que ele disse. Mas aquele velho não pode ter corrido.

4º Jurado – Ele disse que saiu do quarto e foi até a porta da frente. Não basta?

8º Jurado – Onde é que ficava exatamente o quarto dele?

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10º Jurado – Dá para o corredor. Pensei que se lembrasse de tudo. Não se lembra disto?

8º Jurado – Não, não me lembro disso. Senhor presidente, gostaria de examinar a planta
do apartamento.

7º Jurado – Por que não pede para refazerem o julgamento?

8º Jurado – Senhor Presidente...

Presidente – Já ouvi. (levanta-se cruza a sala e bate na porta)

3º Jurado – Por que o senhor é o único aqui a querer examinar as evidências o tempo
todo?

5º Jurado – Ele não é o único não. Eu também quero ver essa planta.

3º Jurado – E eu quero parar de perder tempo.

O Guarda entra. O Presidente confabula rapidamente com ele. O Guarda sai e tranca a
porta.

4º Jurado – Se vamos esmiuçar todos os aspectos do local onde o corpo foi encontrado...

8º Jurado – Não vamos. Só se alguém mais quiser. Só quero ver se um velho, que puxa
de uma perna, pode levantar da cama e ir até a porta da frente de seu apartamento em
quinze segundos.
3º Jurado – Ele disse vinte segundos.

8º Jurado – Disse quinze.

3º Jurado – Vinte. Por que está distorcendo os fatos...

11º Jurado – Ele disse quinze.

3º Jurado – Como ele sabe que foram quinze segundos? Não dá para calcular essas
coisas.

9º Jurado – Ele disse quinze segundos. E estava muito seguro disso.

3º Jurado – Trata-se de um velho. Vocês viram. Na maior parte do tempo estava confuso.
Como poderia estar seguro de alguma coisa?

O Guarda entra, trazendo um grande gráfico do apartamento. A planta mostra o esquema


de um prédio de apartamentos junto à via férrea. O quarto dá para os trilhos do elevado.
Atrás dele há uma série de quartos ao longo de um corredor. No quarto da frente há um X
marcando o local em que o corpo foi encontrado. Nos fundos do prédio, vê-se a passagem
para o corredor que leva à porta do prédio. Vê-se um lance de escada a partir da entrada
do prédio. Os quartos estão etiquetados, mostrando as dimensões de cada um. O
Presidente apanha a planta. O Guarda sai.

Presidente – (entregando a planta ao 8º Jurado) A planta, cavalheiro! A planta!

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12º Jurado – O que é que o senhor vai provar com a planta?

8º Jurado – Vamos ver se os detalhes confirmam o que ele disse. Ele disse que logo que
o corpo caiu no chão ele ouviu passos no andar de cima em direção à porta da frente do
apartamento. Agora se o assassino correu imediatamente...

12º Jurado – Talvez não tenha sido exatamente assim.

8º Jurado – O velho disse que foi.

7º Jurado – O senhor devia estar é numa convenção de caçadores de “pelo em ovo”, lá em


Baltimore...

6º Jurado – O Baseball, por que não para de bancar o engraçadinho o tempo todo?

7º Jurado – Pela fortuna que você esta ganhando aqui você devia se divertir um pouquinho
mais...

10º Jurado – (para o 8º Jurado) Agora que esta com a planta do apartamento o que o
senhor pretende fazer? Ele vai alugar o apartamento para a gente!

8º Jurado – (para o Presidente) Posso? (apanha a planta e a coloca numa cadeira) Esta
aqui é a planta do apartamento onde ocorreu o crime. O apartamento do velho fica no andar
de baixo e tem as mesmas dimensões. Aqui estão os trilhos do elevado. Aqui está o quarto,
a sala, cozinhas, banheiro, a porta do quarto, o corredor que da para porta da frente, a porta
do apartamento, as escadas, onde o velho disse que viu o menino sair correndo. Até aqui
estou certo?

3º Jurado – Pela milésima vez, a história é esta.

8º Jurado – Disse que fez tudo isso em quinze segundos.

11º Jurado – Correto.

8º Jurado – A cama fica perto da janela. Da cama até a porta do quarto são três metros.
Depois tem mais quinze metros de corredor até a porta da frente. O senhor estava deitado,
levantou-se andou três metros até a porta do quarto, abriu a porta do quarto, andou mais
quinze metros até a porta da frente do apartamento, chegou na porta da frente e viu o
menino descer correndo. Acha que ele poderia ter feito tudo isso em quinze segundos?

10º Jurado – Podia sim senhor.

11º Jurado – Ele só conseguia andar muito devagar. Precisou de ajuda para subir ao banco
das testemunhas.

3º Jurado – Você faz a coisa parecer uma longa caminhada. E não é.

9º Jurado – Para um velho que já teve um derrame, é.

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8º Jurado – Senhor presidente, eu posso usar aquele banco como cama?

Presidente – (levantando-se) Pode.

Enquanto o 8º Jurado posiciona o banco.

10º Jurado – Que está havendo aqui?

8º Jurado – Eu quero tentar uma coisa. Vamos ver quanto tempo leva.

3º Jurado – Tentar o quê? Por que o advogado não tentou isto, já que é tão importante?

5º Jurado – Talvez ele nem tivesse pensado nisto.

10º Jurado – Não pensou não? É uma coisa óbvia. Acha que ele é um idiota?

5º Jurado – O senhor pensou nisto?

10º Jurado – Não interessa o que eu pensei, o Baltimore.

8º Jurado – Aqui fica a cama do velho. Da cama até a porta são três metros. Um, dois três.

3º Jurado – Está doido. Não vai poder re-criar uma coisa destas.

11º Jurado – Quero ver isto.

O 12º Jurado apanha sua cadeira e leva-a até o 8º Jurado. O 8º Jurado põe a cadeira no
local em que estava de pé.

8º Jurado – Aqui é a porta do quarto. Aqui temos um corredor com quinze metros. Como
aqui não tem quinze metros eu vou contornar a mesa. Um, dois, três, quarto...
O senhor acha que ele podia fazer tudo isso em quinze segundos

10º Jurado – Podia, sim, senhor.

8º Jurado –... E quinze. Aqui fica a porta da frente. Segundo as testemunhas estava
trancada. Alguém tem um relógio com ponteiro que marca segundos?

2º Jurado – Eu tenho.

8º Jurado – O senhor se posicione aqui por gentileza. Bata com o pé, isso vai marcar a
queda do corpo. Começamos a contar a partir daí. Eu vou fazer o velho.

7º Jurado – Façam suas apostas. Quem da mais? Quinze segundos, dezoito! Ouvi vinte?

3º Jurado – Nunca vi nada igual em toda a minha vida!

8º Jurado – Muito bem, eu já estou pronto.

O 2º Jurado olha fixo para o relógio, esperando.

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10º Jurado – Vai, meu amigo!

2º Jurado – Estou esperando o ponteiro chegar aos sessenta.

Esperam. O 2º Jurado de repente bate com o pé no chão. O 8º Jurado passa à posição de


sentado, dobra as pernas para o chão e levanta-se. O 2º Jurado mantém os olhos fixos no
relógio. O 8º Jurado manquejando, arrastando uma das pernas, em direção da cadeira que
faz as vezes de porta do quarto. Ele chega até lá e finge abrir a porta. Depois sai
manquejando ao longo dos pretensos quinze metros do corredor.

7º Jurado – Foi dada a largada para o grande prêmio! Quem é o assassino? Em primeiro,
Pangaré Manco!

10º Jurado – Acelera! O velho andava mais rápido.

11º Jurado – Pois eu acho que ele está muito mais rápido do que o velho no tribunal.

8º Jurado – (ainda manquejando) Se quiser que eu acelere eu acelero.

Acelera levemente o passo. Todos observam o 8º Jurado, que chega à última cadeira. Finge
abrir o imaginário cadeado e abre em seguida a imaginária porta.

7º Jurado – Finalmente entra na reta final. Vai vencer. E cruza o disco final.

8º Jurado – Pronto! Quanto tempo deu?

2º Jurado – Quinze – vinte – trinta – trinta e cinco – quarenta – quarenta e dois segundos
exatos.

6º Jurado – Quarenta e dois segundos!

8º Jurado – Pois é. Acho que foi exatamente isso que aconteceu. O velho ouviu uma
discussão do pai com o filho uma hora antes, depois enquanto tentava dormir ouviu um
corpo cair no chão, depois ouviu a mulher gritando. Levantou-se e tentou chegar ao
corredor. Nesse momento percebeu alguém descendo as escadas correndo e deduziu que
fosse o rapaz.

6º Jurado – É bem provável.

3º Jurado – Deduziu? Gente, eu já vi tudo quanto é desonestidade em minha vida, mas


esta exibiçãozinha supera tudo. O senhor vem aqui com sua conversa mole sobre os
meninos de rua e a injustiça social, inventa umas histórias mirabolantes, e de repente
começa a ganhar a confiança de algumas dessas matronas. Pois saiba que a mim não vai
ganhar de jeito nenhum. Já ouvi demais. Que há com vocês? Todos sabem que ele é
culpado. E deve ser queimado. Estão deixando que ele escape entre os nossos dedos.

8º Jurado – Escape entre nossos dedos? Você é o carrasco?

3º Jurado – Sou um deles.

8º Jurado – Talvez o que vai ligar a tomada.

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3º Jurado – Para esse garoto? Eu ligo fácil.

8º Jurado – Lamento sua atitude.

3º Jurado – Não venha se engraçar comigo, não.

8º Jurado – Desde que entramos nesta sala, você se comporta como se fosse um vingador
público.

3º Jurado – Cala a boca!

8º Jurado – Você é um sádico.

3º Jurado – Cala a boca, seu filho da puta! (investe furiosamente contra o 8º Jurado. O 8º
Jurado mantém-se firme. O 5º e o 6º Jurados agarram o 3º Jurado por trás. Ele se esforça
para desvencilhar-se, a face congestionada pela ira) Me solta! Vou te matar! Vou te matar!

8º Jurado – (calmamente) O senhor não está dizendo de verdade que vai me matar...!

O 3º Jurado para de se agitar e encara furiosamente o 8º Jurado. Entra o Guarda.

Guarda – Algum problema? Ouvi um barulho.

Presidente – (se colocando na frente do Guarda para que este não entre) Não, tudo bem.
(apanha a planta do apartamento) Só uma discussão um pouco mais acalorada, mas está
tudo bem. (entrega a planta ao Guarda) Não precisamos mais disso, obrigado. (o Guarda
apanha a planta, olha cuidadosamente em torno da sala, depois sai. Há uma pausa. Os
outros olham para o 3º Jurado)

3º Jurado – Estão olhando o quê?

Os outros, embaraçados, viram-se. Alguns deles vão ocupar seus lugares.

12º Jurado – Acho que alguém podia recomeçar.

2º Jurado – Está ficando tarde. (para o Presidente) Será que vão nos levar para jantar?

Presidente – (faz um gesto de quem não sabe)

2º Jurado – Pelo menos que a gente vá para casa se não conseguirmos terminar. Meu filho
está com caxumba. Deste tamanho!

A sala começa a escurecer perceptivelmente agora.

12º Jurado – Se ninguém mais tem uma sugestão para recomeçar eu tenho uma aqui. Não
é nada genial, mas vamos jogar a idéia no pires para ver se o gatinho lambe.

Presidente – Para ver se o gatinho lambe?!?

12º Jurado – É uma expressão.

5º jurado – Olha como está escurecendo. Vai cair um temporal.

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11º Jurado – Perdão. Mas essa briga... Não viemos aqui para brigar. Temos uma
responsabilidade. Sempre achei admirável na democracia, isso de sermos convocados.
Convocados por correio para decidir pela inocência ou culpabilidade de uma pessoa da
qual nunca ouvimos falar. Nada temos a ganhar ou perder com o nosso veredicto. Esta é
uma das razões pela qual somos fortes. Não devíamos fazer disto um assunto pessoal.

5º jurado - Que calor! Desculpe-me, mas o senhor não transpira?

4º Jurado – Não, nunca.

6º Jurado – Presidente eu quero pedir uma nova votação.

Presidente – Foi pedida uma nova votação. Alguma objeção?

7º Jurado – Eu tenho! Dessa vez a gente deveria pedir uma cervejinha, uma musiquinha?

6º Jurado – Senhor Presidente uma nova votação?

3º Jurado – Eu proponho uma votação aberta. Declaramos nossos votos e vemos a posição
de cada um.

Presidente – Foi pedida uma votação aberta. (vira-se para o 7º Jurado) Alguma objeção?
Ótimo! Então vamos em ordem. Número 1: (levanta o próprio braço) Culpado. (anota e se
vira) Dois?

2º Jurado – Inocente.

Presidente – (anota e se vira) Três?

3º Jurado – Culpado.

Presidente – (anota e se vira) Quatro?

4º Jurado – Culpado.

Presidente – (anota e se vira) Cinco?

5º Jurado – Inocente.

Presidente – (anota e se vira) Seis?

6º Jurado – Eu mudo para inocente.

7º Jurado – Arregou, hein?!

Presidente – (anota e se vira) Shhh! Sete?

7º Jurado – Culpado.

Presidente – (anota e se vira) Oito?

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8º Jurado – Inocente.

Presidente – (anota e se vira) Nove?

9º Jurado – Inocente.

Presidente – (anota e começa a andar pela sala) Dez?

10º Jurado – Culpado.

Presidente – (anota e anda pela sala) Onze?

11º Jurado – Inocente.

Presidente – (anota e para ao lado do 12º Jurado) Doze?

12º Jurado – Culpado.

Presidente – (olhando as anotações e contando) Seis a seis.

7º Jurado – E o jogo vai para a prorrogação.

O 3º Jurado entra furioso no banheiro.

10º Jurado – Seis a seis! Esses caras enlouqueceram. Tudo por causa de um moleque
desses...

9º Jurado – Não se trata do tipo de pessoa que ele é. Mas dos fatos.

10º Jurado – Estou de saco cheio dos fatos. Os fatos, você sabem, podem ser distorcidos.

9º Jurado – É exatamente este ponto que o senhor aqui vem levantando. E o senhor fica
aí aos berros... Ah se eu fosse mais moço. Está muito quente aqui.

A sala começa a ficar bastante escura e opressivamente calma. O 6º Jurado acende a luz.
O Presidente, junto com o 7º Jurado, arruma o banco. O 6º Jurado sobe em cima da mesa
para ver uma lâmpada queimada.

11º Jurado – O senhor quer água?

9º Jurado – Obrigado.

2º Jurado – (para o 7º Jurado) Vai chover. Lá se foi o seu jogo.

7º Jurado – O meu amigo, foi amarelar justo no último arremesso?

2º Jurado – É que me pareceu... Na verdade há uma série de detalhes que não foram
esclarecidos aqui...

10º Jurado – Mas que detalhes! Está é se deixando levar por esse bando metido a
intelectual aí.

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2º Jurado – Não, nada disto.

10º Jurado – Você é igual aos outros. Pensa demais e se confunde, entendeu?

2º Jurado – Não acho que tenha o direito de falar assim comigo... (o 10º Jurado se afasta)
Falastrão!

7º Jurado – Olha lá! Acendeu! O campeão, aproveita e dá um geral no ventilador ali. Está
funcionando. Estava conectado com a luz. Ninguém teve essa idéia

O 3º Jurado sai do banheiro.

Presidente – Já que estamos todos aqui novamente: quem gostaria de recomeçar? (senta-
se e anota)

10º Jurado – Querem minha opinião? Não vamos chegar a lugar nenhum. Estou disposto
a ir ao Juiz e declarar o impasse.

7º Jurado – Concordo.

3º Jurado – Esta é a coisa mais ridícula que eu já... Nós fizemos um juramento no tribunal.
Não podem simplesmente desistir! Isso é desonesto!

8º Jurado – Não acho que o Juiz vá aceitar. Não ficamos tempo suficiente para decidir.

7º Jurado – Podemos tentar.

11º Jurado – Sou contra.

7º Jurado – (para o 11º Jurado) Escute, esse garoto não vai ter a menor chance com outro
júri e você sabe disso. (Se dirigindo aos outros) Aqui ninguém vai mudar de opinião, não é
isso? Então, nós estamos em um impasse. Vamos levar ao juiz.

5º Jurado – O senhor ainda acha que não há lugar para uma dúvida razoável?

7º Jurado – Não há!

11º Jurado – Perdão. Talvez o senhor não tenha entendido bem o termo ‘dúvida razoável’.

7º Jurado – Como é que é? Você está querendo me dar uma explicação? Vocês são
engraçados não é? Todos iguais. Você vem para o meu país ganhar a vida e no primeiro
dia já querem dar aula. Mas que arrogância.

5º Jurado – (para o 7º Jurado) Está dizendo que ele é arrogante só por que não nasceu
aqui? E eu digo que você é arrogante por ter nascido aqui. E aí?

11º Jurado – Por favor, não tem importância.

7º Jurado – Espera aí, Baltimore. Ninguém vai me dizer o que eu tenho que entender ou
deixar de entender, entendeu? Muito menos esse gringo aí. Eu vou quebrar a cara dele!

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Presidente – (que tentava apartar a briga) Vamos nos ater ao assunto, por favor? (para
com o pé na cadeira)

8º Jurado – Tem mais uma coisa que eu gostaria de rever se não se importam. Um ponto
importante para promotoria foi o rapaz ter alegado que estava no cinema na hora do crime,
mas não se lembrou nem do nome do filme nem do nome dos atores. Aquele senhor
mencionou isso várias vezes.

4º Jurado – É verdade. Foi o único álibi que o rapaz apresentou, mas não conseguiu
sustentá-lo.

8º Jurado – Acha que se lembraria de detalhes depois de ter apanhado do pai?

4º Jurado – Se houvesse algum detalhe especial sim. Ele não se lembrou de nada porque
não foi ao cinema naquela noite.

8º Jurado – Segundo os policiais ele foi ouvido pelos agentes na cozinha do apartamento
enquanto o corpo do pai estava estendido no chão do quarto. Acha que poderia se lembrar
de detalhes em tais circunstâncias?

4º Jurado – Sim.

8º Jurado – Mesmo sob forte tensão emocional?

4º Jurado – Mesmo sob forte tensão emocional.

5º Jurado – Ele lembrou o nome do filme no tribunal. E dos atores também.

4º Jurado – O advogado teve um trabalhão para descobrir. Entre a noite do crime e o


julgamento passaram três meses e o rapaz teve tempo de decorar. Eu fico com o
depoimento do policial que o interrogou logo após o crime, quando ele não se lembrou de
nada, sob forte impacto emocional ou não.

8º Jurado – Mas eu posso lhe fazer uma pergunta de caráter pessoal?

4º Jurado – Fique à vontade.

8º Jurado – Qual foi a última vez que foi ao cinema?

4º Jurado – Esta semana... Na terça! Não, na terça era noite do torneio de bridge. Eu jogo
bridge. (tentando lembrar-se) Fui com a minha mulher ao cinema na segunda feira.

8º Jurado – Qual era o filme?

4º Jurado – (esforçando-se) “A Notável Srª Bainbridge”.

2º Jurado – Desculpe. Também vi esse filme. É “A Adorável Srª Bainbridge”.

4º Jurado – Acho que senhor tem razão. “A Adorável Srª Bainbridge”.

8º Jurado – E quem fazia a Srª Bainbridge?

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4º Jurado – Barbara... Lang... eu acho. Uma morena, muito bonita. Lang ou Lane... uma
coisa assim.

8º Jurado – Uma coisa assim? E o nome dos outros atores?

4º Jurado – Eu não sei. Não me lembro. Era um desses filmes B, com gente
desconhecida...

8º Jurado – E o senhor não está sob forte tensão emocional, está?

4º Jurado – Não, não estou.

9º Jurado – O senhor está certo.

10º Jurado – Ah! Certíssimo!

9º Jurado – Certíssimo mesmo.

10º Jurado – Só porque ele não pôde lembrar o nome de uns atores de segunda? Isso
prova que o moleque estava no cinema?

9º Jurado – Não. Mas ninguém pode provar que não estava. É possível ele ter ido ao
cinema e se esquecido do filme que viu. Assim como foi normal para esse senhor (indica o
4º Jurado) esquecer alguns detalhes, será também perfeitamente normal para o rapaz. Ele
não pode ser acusado de assassinato por não ter uma memória infalível.

10º Jurado – (para o 9º Jurado) Pode falar até sua língua arrastar no chão. Para mim ele
é culpado. Ponto final. (para o 2º Jurado) Tem aquelas pastilhas contra tosse?

2º Jurado – Acabaram.

6º Jurado – Alguém pode me dizer que horas são?

Presidente – Seis e cinco.

2º Jurado – (para o 8º Jurado) Posso ver essa faca um segundo?

O 8º Jurado desliza a faca ao longo da mesa para o 2º Jurado que a abre e examina.

Presidente – A votação continua seis a seis. Alguém tem alguma sugestão? (senta-se e
anota)

12º Jurado – Eu. Vamos jantar.

5º Jurado – Por que não esperarmos até às sete? Só mais uma hora.

12º Jurado – Por mim, tudo bem. Ninguém vai brigar por isso

2º Jurado – Uma coisa vem me incomodando e já que estamos em um impasse... É aquela


história de que o golpe foi de cima para baixo.

3º Jurado – Não me diga que vamos começar com isto. Já foi mais que discutido.

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2º Jurado – Mas não me convenceu. O garoto tem um metro e setenta. O pai um e oitenta
e oito. Uma diferença de dezoito centímetros. É estranho apunhalar uma pessoa mais alta
no peito de cima para baixo.

3º Jurado – Me da aqui essa faca. Não vai sossegar enquanto não te mostrar. Alguém fica
em pé. (há uma pausa. Ninguém se mexe, então o 8º Jurado se levanta e vai até o 3º
Jurado. Ficam frente a frente, olhando um para o outro) Muito bem. (para o 2º Jurado) Olha
bem porque eu não vou repetir. Estou uns quinze ou dezoito centímetros mais baixo que
você. Certo?

2º Jurado – Certo. Talvez um pouco mais.

3º Jurado – Ok. Um pouco mais.

Ele aperta o botão e abre a faca, muda sua posição na mão e segura-a no alto, pronto para
apunhalar de cima para baixo. O 8º e o 3º Jurados olham fixamente um para o outro, e de
repente o 3º Jurado faz o gesto de apunhalar com força de cima para baixo.

A lâmina para a poucos centímetros do peito do 8º Jurado. O 8º Jurado não se move. O 3º


Jurado sorri. Há uma agitação na sala.

6º Jurado – Isso não é brincadeira.

3º Jurado – Calma! Ninguém se machucou. Certo?

8º Jurado – Ninguém se machucou.

3º Jurado – Este é o ângulo. De cima pra baixo. É como eu acertaria o peito um homem
mais alto e assim que foi feito. Diga se estou errado.

O 3º Jurado entrega a faca ao 8º Jurado e se afasta.

12º Jurado – De cima para baixo. Acabou a discussão.

5º Jurado – Um minuto, por favor. Posso ver essa faca um minutinho? Eu vi muita briga de
faca. Cresci no meio delas. Era muito comum no meu bairro

8º Jurado – Já viu alguma briga de faca?

5º Jurado – Eu acho que a gente tenta esquecer essas coisas. Mas olha, esse tipo de faca
a gente segura assim para soltar a lâmina e aí ataca. De baixo para cima. Para eu atacar
de cima para baixo eu preciso soltar a lâmina e mudar a pegada e atacar. Isso gasta muito
tempo. Essa faca foi feita para carregar assim, escondida na mão, atrás, no bolso. Saquei,
abri e ataquei. Entenderam?

8º Jurado – Tem certeza?

5º Jurado – Quem já usou uma faca dessas sabe que não tem outro jeito de usar.

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8º Jurado – Espere um pouco. Todos nós concordamos que esse menino sabia como usar
bem esse tipo de faca. Acha que ele teria atacado o pai assim, de cima para baixo?

5º Jurado – Ele cresceu naquele bairro. Ele sabia manejar essa faca. Se fosse atacar o pai
com certeza ele atacaria de baixo para cima.

3º Jurado – Como sabe? Estava no quarto quando o homem foi morto?

5º Jurado – Não, nem eu nem o senhor.

Crava a faca na mesa e afasta-se.

3º Jurado – (para o 8º Jurado) Conversa mole. Não acredito em nada.

4º Jurado – Não acho que se possa determinar que tipo de ferimento o menino fez só
porque ele sabe manejar uma faca.

3º Jurado – Isto, isto mesmo.

8º Jurado – (olhando para o 12º Jurado) O senhor, o que acha?

O 12º Jurado hesita um momento. Está confuso, mas tentando ser honesto.

12º Jurado – Não sei...

3º Jurado – Que quer dizer com “não sei”?

12º Jurado – Que não sei mesmo.

8º Jurado – (para o 7º Jurado) E o senhor?

O 7º Jurado olha em torno da mesa por um instante.

4º Jurado – Espera aí. Ainda temos o depoimento da mulher do outro lado dos trilhos.

7º Jurado – Não! Escutem aqui: eu já estou cheio desse lenga lenga. Está empatado, não
está? Então eu vou desempatar. Inocente. Sete a cinco!

3º Jurado – O quê?

7º Jurado – É o que vocês ouviram! Estou cheio!

3º Jurado – Como cheio? Isto não é resposta.

7º Jurado – Meta-se com sua vida!

11º Jurado – (indo para o 7º Jurado) Ele tem razão. Isso não é resposta. Que tipo de
homem é você? Senta aqui e vota culpado como os outros por causa de um jogo. Agora
muda o voto porque está cheio.

7º Jurado – Escuta aqui, meu chapa...

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11º Jurado – O senhor não tem o direito de brincar assim com a vida de um homem. É uma
atitude covarde e horrível. Não se importa com nada do que está sendo dito aqui...?

7º Jurado – Você não pode falar assim comigo!

11º Jurado – Posso, sim. Se acha que ele é inocente, vote inocente, mas se acha que ele
é culpado, vote culpado. Ou não tem coragem de assumir o que pensa? Inocente ou
culpado?

7º Jurado – Inocente.

11º Jurado – Por quê?

7º Jurado – Não tenho que...

11º Jurado – Tem sim. Diga, por quê?

7º Jurado – (em voz baixa) Não acho que ele seja culpado...

O 7º Jurado levanta-se, derrotado.

8º Jurado – Senhor Presidente, quero outra votação.

Presidente – Foi pedida uma nova votação, vamos voltar aos nossos lugares, por favor.
Quem acha que o réu é inocente, levanta a mão. (os 2º, 5º, 6º, 7º, 8º, 9º e 11º Jurados
erguem as mãos imediatamente) Um. Dois. Três. Quatro. Cinco. Seis. Sete. (o rosto do 12º
Jurado é uma máscara de indecisão, mas de repente ele levanta a mão) Oito. (para de
contar e olha em torno da mesa. Vagarosamente, quase embaraçado, ele também levanta
a mão) Nove. (abaixa a mão) Quem acha que o réu é culpado, levante a mão, por favor. (o
3º, 4º e 10º Jurados erguem as mãos) Três. A votação está agora: nove a três para inocente.
(senta-se e anota)

10º Jurado – Não entendo vocês. Ficam remexendo esses detalhes que não levam a nada.
Como podem acreditar no que esse sujeito diz? O negócio é o seguinte. Essa gente nasce
mentindo. E ninguém vai me dizer o contrário. Não sabem o que é a verdade. Eles são
diferentes. Pensam diferente. Agem diferente. Não precisam de nenhum motivo pra matar.
(o 5º Jurado vai em direção da porta do banheiro) É verdade. Todo mundo sabe. São uns
bêbados. (o 5º Jurado entra no banheiro e bate a porta) Olhem lá o gênio! Bateu a porta
assim por quê? São uns bêbados e por qualquer coisinha alguém aparece morto na sarjeta.
Ninguém está culpando eles por isso. É a natureza deles. Violentos! A vida não significa
para eles o mesmo que pra nós. (o 11º Jurado levanta-se e vai para a porta do lavabo. O11º
Jurado segue o 5º Jurado) Aonde vai? (o 11º Jurado não responde e entra no lavabo)
Aproveita e limpa os ouvidos, pra escutar melhor. (o 4º Jurado levanta-se e vai para a
janela) Você agora vai me ouvir. Essa gente enche a cara e briga o tempo todo, e se alguém
acaba morto, fica por isso mesmo. Não se importam. Família não significa nada para eles.
Fazem filho feito bicho. Pai, mãe, não significa nada. Alguns têm qualidades, reconheço,
mas são exceções.

9º Jurado – Sujeito doente.

10º Jurado – Doente?

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9º Jurado – Ah, senta aí!

10º Jurado – Quem pensa que é, seu velho filho da puta?! Quem é você para me chamar
de doente? Mal consegue ficar em pé! Vocês vão ter que me ouvir!

O 9º Jurado vai para a janela.

12º Jurado – Se o senhor se acalmasse.

10º Jurado – Acalmar porra nenhuma. Nenhum deles presta. Isto mesmo! Nem um. Agora
vou deixar bem claro, seus imbecis. (para o 9º Jurado) Você aí, bancando o espertinho.
Estamos diante de um perigo aqui. Essa gente está se multiplicando cinco vezes mais
rápido do que nós. É a estatística. Cinco vezes. São uns animais. (o Presidente se afasta
da mesa) Estão contra nós, nos odeiam, querem nos destruir. (para o 6º Jurado) Não me
olha assim! Pelo amor de Deus, é um perigo, e se não tomarmos cuidado, se não
acabarmos com eles, eles vão acabar com a gente.

6º Jurado – Por que o senhor não cala a boca?

10º Jurado – É melhor vocês me escutarem. Eles são viciados, violentos, ignorantes, e só
querem nos derrubar. Nós pegamos esse moleque. Pelo menos um. Vamos acabar com
ele antes que os outros acabem com a gente. Não dou a mínima pra lei. Porque daria? Eles
não dão.

2º Jurado – Já ouvi demais. Agora pare com isto.

10º Jurado - Eu vou quebrar a sua cara, seu filho da puta!

4º Jurado – Nós já ouvimos, agora cale essa boca.

O 10º Jurado vira-se, vai para uma cadeira e senta-se de costas para os outros. Os demais
regressam lentamente aos seus lugares.

8º Jurado – Eu não sei qual é a verdade. E acho que ninguém sabe. Nove de nós não
consideram o réu culpado, mas são apenas probabilidades. Podemos estar enganados e
devolver um homem culpado à sociedade. Não dá para saber. Mas temos uma dúvida
razoável, e isto é a base do nosso sistema. Nenhum júri pode declarar um homem culpado
a menos que tenha certeza. Nós não entendemos como vocês três ainda têm tanta certeza.
Talvez o senhor possa no explicar.

4º Jurado – Vou tentar. Foram ótimas as suas observações. Principalmente a última. O


argumento sobre a direção do golpe foi muito convincente. Mas ainda acho que ele é
culpado. Por uma razão forte: o testemunho da mulher que viu o crime.

3º Jurado – Perfeito. Pra mim esse testemunho é crucial.

4º Jurado – Ela viu o garoto levantar o braço e apunhalar a faca no peito do pai. Ela viu.
Não importa se foi do jeito errado.

3º Jurado – Isso! Isso mesmo!

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4º Jurado – Ela disse que foi para a cama por volta das onze. A cama fica ao lado da janela
e deitada dava pra ver o apartamento do outro lado dos trilhos. Ela não conseguia dormir.
Então casualmente a meia noite e dez, ela se virou e viu o crime através das janelas do
trem que passava. Ela disse que as luzes se apagaram logo após o crime, mas que antes,
viu o rapaz apunhalar o pai. Pra mim é um testemunho inabalável.

3º Jurado – Esse testemunho encerra o caso. Acabou gente.

4º Jurado – (para o 8º Jurado) Que acha? (o 8º Jurado permanece em silêncio. O 4º Jurado


olha para o 12º Jurado) E o senhor?

12º Jurado – Não sei. São tantos detalhes. É complicado.

4º Jurado – Honestamente, não dá para votar pela absolvição.

12º Jurado – É difícil organizar as provas.

3º Jurado – Pode jogar todas as outras provas fora. A mulher viu tudo. O que mais você
quer?

12º Jurado – É, talvez...

3º Jurado – Então, vamos votar.

Presidente – (voltando ao seu lugar) Pediram uma nova votação. Alguma objeção?

12º Jurado – Vou mudar meu voto. Acho que ele é culpado.

3º Jurado – Mais alguém? Está oito a quatro.

11º Jurado – (para o 3º Jurado) Por que comemora esse voto?

3º Jurado – Sou competitivo. (para os outros) Acho que estamos num impasse. Vamos
levar o caso ao Juiz.

4º Jurado – Antes o senhor não queria isso.

3º Jurado – Mas agora eu quero.

4º Jurado – Não entendo. O senhor achava errado...

3º Jurado – Não acho mais. Não dá pra discutir com essas mulas... Vamos ficar aqui uma
semana. Estamos num impasse. (volta-se para o 8º Jurado) Você que é o chefe, o que
acha?

8º Jurado – Vamos examinar de novo.

3º Jurado – Já examinamos de novo. (acena em direção do 12º Jurado) Aquele ali muda
de lado como bola de tênis...

12º Jurado – Espera aí. O senhor não tem o direito de...

47
O 4º Jurado tira os óculos e limpa.

3º Jurado – Peço desculpa de joelho. (para o 8º Jurado) Vamos sair daqui.

4º Jurado – Está bem. Talvez pudéssemos estabelecer um limite de tempo. (continua a


limpar os óculos, dá uma olhada para o relógio da parede) Agora são...

3º Jurado – Seis e quinze.

4º Jurado – (olha para o relógio) Seis e quinze. Alguém antes sugeriu sete horas. Vamos
discutir se estamos ou não num impasse.

O 9º Jurado olha para o 4º Jurado e deve ter pensado algo muito interessante.

9º Jurado – (para o 4º Jurado) O senhor está se sentindo bem?

4º Jurado – Estou. Por que?

9º Jurado – É que o senhor está esfregando o nariz...


4º Jurado – Estou tentando resolver uma coisa aqui. Posso?

9º Jurado – Acho que é muito importante.

4º Jurado – Muito bem...

9º Jurado – Porque o senhor fica esfregando o nariz?

3º Jurado – Oh, não, por favor!

9º Jurado – Eu estou falando com o senhor aqui! (para o 4º Jurado) Por que estava
esfregando o nariz?

4º Jurado – Se é da sua conta, estava me incomodando um pouco.

9º Jurado – Por causa dos óculos?

4º Jurado – É. Agora podemos ir em frente?

9º Jurado – Seus óculos deixaram marcas no nariz. Incomodam muito, não é?

4º Jurado – Incomodam bastante.

9º Jurado – Eu entendo. Uso óculos a vida inteira.

3º Jurado – Vamos parar com esse papo de oculista.

9º Jurado – É que a mulher que testemunhou tinha essas mesmas marcas.

8º Jurado – É verdade, agora me lembro. (há um silêncio na sala e logo um murmúrio de


conversa em voz baixa) Não sei se alguém aqui observou isto nela. No momento não pensei
nisto. Ela tinha as mesmas marcas. E esfregou-as no tribunal.

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5º Jurado – Ele tem razão. Ela fez isto várias vezes.

9º Jurado – Aquela mulher tinha uns quarenta e cinco anos e se esforçava para parecer
mais jovem. Muita maquiagem, cabelo pintado. Roupas de mocinha. Estava sem óculos.
Lembram dela?

3º Jurado – Como assim, sem óculos? Como sabe que ela usava óculos? Só porque
esfregava o nariz...

5º Jurado – Ela tinha essas marcas. Eu vi.

3º Jurado – E daí? Que significa isto?

Presidente – Eu também vi e era eu quem estava mais próximo dela.

3º Jurado – Tinha cabelo pintado e marcas no nariz. O que tem isto a ver?

9º Jurado – Essas marcas poderiam ser feitas por alguma outra coisa senão óculos?

4º Jurado – Não. Não poderiam.

3º Jurado – (para o 4º Jurado) Ouçam, eu não vi marca alguma.

4º Jurado – Eu vi. Estranho é que não pensei nisto antes.

3º Jurado – E o promotor? Acha que ele seria capaz de usar um recurso destes: fazê-la
testemunhar sem óculos?

8º Jurado – Já viu dessas mulheres que não usam óculos em público por vaidade?

6º Jurado – A minha esposa. Ela sempre tira os óculos...

8º Jurado – Talvez o promotor não soubesse disto.

6º Jurado – Era exatamente isto que eu ia dizer.

3º Jurado – Pois bem. Ela tinha marcas no nariz. Estou concordando com isto. Dos óculos.
Certo? Nunca os usava na rua por vaidade, mas quando viu o rapaz matar o pai ela estava
em casa. Sozinha. Só isto.

8º Jurado – (para o 4º Jurado) Usa óculos para dormir?

4º Jurado – Não, não uso. Ninguém usa óculos para dormir.

8º Jurado – Então é lógico que ela não estava usando enquanto tentava dormir.

3º Jurado – Como é que sabe?

8º Jurado – Não sei. Estou supondo. Ela própria disse que o crime ocorreu no momento
em que ela olhou e que as luzes do quarto se apagaram um segundo depois. Ela não teria
tempo de botar os óculos.

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3º Jurado – Um momento...

8º Jurado – E mais. Talvez ela tenha pensado que viu o rapaz matar o pai. Eu acho que
ela viu apenas um vulto.

3º Jurado – Como sabe o que ela viu? Como é que ele sabe tudo isso? (para o 8º Jurado)
Não sabe que tipo de óculos ela usava. Talvez fosse óculos para leitura. Talvez fossem
óculos de sol. Que sabe a respeito?

8º Jurado – Só sei que a visão da mulher está sendo questionada agora.

11º Jurado – Ela teria que identificar uma pessoa a dezoito metros, à noite, sem óculos.

2º Jurado – Não se condena ninguém à morte com testemunhos como este.

3º Jurado – Não me venha com isto!

8º Jurado – Não acha que a mulher poderia ter se enganado?

3º Jurado – Não.

8º Jurado – Não seria possível?

3º Jurado – Não! Não é possível.

8º Jurado – (para o 12º Jurado) É possível?

12º Jurado – É. Voto inocente.

8º Jurado – (para o 10º Jurado) Ainda acha que ele é culpado?

10º Jurado – Acho, mas estou pouco me lixando. Vocês espertalhões façam o que
quiserem.

8º Jurado – E como vota?

10º Jurado – Inocente. Façam o que quiserem.

3º Jurado – Você é o pior filho da... Eu acho que é culpado.

8º Jurado – Alguém mais acha que ele é culpado?

4º Jurado – Não, estou convencido.

3º Jurado – Que há com você?

4º Jurado – Tenho uma dúvida razoável agora.

9º Jurado – Está onze a um.

3º Jurado – E todas as outras provas? Tudo aquilo – a faca – aquela tralha toda?

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2º Jurado – O senhor mesmo disse que devíamos jogar fora as outras provas.

8º Jurado – (para o 3º Jurado) Está sozinho agora.

3º Jurado – Não me importo se estou sozinho ou não. É um direito meu.

8º Jurado – É um direito seu.

3º Jurado – E o que querem? Ele é culpado.

8º Jurado – Queremos seus argumentos.

3º Jurado – Já lhes dei meus argumentos.

8º Jurado – Não estamos convencidos. Queremos ouvir de novo. Temos todo tempo que
for preciso.

3º Jurado – Tudo – cada coisa que aconteceu naquele tribunal – mas, quero dizer, tudo,
tudo mesmo, indica que ele seja culpado. Acha que eu sou idiota ou algo assim? Seu bando
de frouxos. Não irão me intimidar. Tenho direito à minha opinião. Posso sentar-me neste
maldito tribunal um ano inteiro. Digam alguma coisa. (Todos olham em silêncio) Por que
não falam do velho, o velho que mora lá e ouviu tudo? Ou sobre a faca? Só porque ele
encontrou uma igual? O velho o viu. Ali mesmo nas escadas. Que diferença faz quantos
segundos levou? Que diferença? Cada detalhe. A faca que caiu pelo bolso furado – não
podem provar que ele não chegou à porta. Claro que podem se arrastar pelo quarto quanto
quiserem, mas não podem provar. Estou lhes dizendo que tudo o que ocorreu foi distorcido
e modificado aqui. Essa história dos óculos, como sabem se ela não estava com eles? A
mulher prestou juramento no tribunal. O que mais querem? É tudo. (os outros permanecem
em silêncio) O caso todo está aí. (os outros permanecem em silêncio) E sobre ter ouvido o
rapaz gritar? A frase foi ‘Vou te matar’. Foi o que ele disse. Para o próprio pai. Não me
importa que tipo de pai fosse. Era seu pai. Aquele garoto maldito. Eu sei bem. Sei como
são. O que fazem com a gente. Como nos matam a cada dia. Meu Deus, vocês não vêem?
Será que sou o único a ver? Deus, chego a sentir aquela faca no peito.

8º Jurado – Ele não é seu filho, mas de algum outro.

4º Jurado – Deixa o rapaz viver.

Há uma longa pausa.

3º Jurado – Está bem. Inocente.

A chuva cai enquanto as luzes baixam.

FIM

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