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MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO

UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ


CAMPUS MINISTRO PETRÔNIO PORTELA
FACULDADE DE DIREITO

ISABELLA DIAS DE OLIVEIRA

A POSSIBILIDADE DA FORMAÇÃO DE UM ESTADO NO


ESPAÇO

TERESINA
2022
A Possibilidade da Formação de um Estado no Espaço

Isabella Dias de Oliveira1

Resumo: Esse artigo tem por objetivo analisar a possibilidade inédita de um


Estado se formar em território extraterrestre. Nesse cenário, busca-se avaliar
as chances para essa formação a partir de uma perspectiva colonialista. Para
isso, a pesquisa foi desenvolvida a partir de métodos hipotético-dedutivos, com
técnicas de pesquisa documental e bibliográfica. Por fim, conclui-se que é uma
realidade possível diante de um viés jurídico, tanto quanto de um viés histórico.

Palavras-chave: Espaço. Estado. Colonização. Exploração.

Abstract: This article aims to analyze the unprecedented possibility of a State


to form in extraterrestrial territory. In this scenario, we seek to assess the
chances for this formation from a colonialist perspective. For this, the research
was developed from hypothetical-deductive methods, with documental and
bibliographic research techniques. Finally, it is concluded that it is a possible
reality in the face of a legal bias, as well as a historical bias.

Keywords: Space. State. Colonization. Exploration.

1. Introdução

Desde seu surgimento na Terra, há cerca de 2,5 milhões de anos atrás, a raça
humana coleciona vitórias no que refere-se à conquista de território. Uma vez
instalados com sucesso em terras congeladas, desertos áridos e altitudes
desafiadoras; só resta aos humanos provar que o céu não é o limite, buscando
ultrapassar a fronteira final: o espaço sideral. Com a ida do astronauta
norte-americano, Neil Armstrong, à lua em 1969, nações do mundo inteiro têm
investido recursos em projetos que visam atingir a realização de atividades fora da
órbita terrestre. Fato esse que traz possibilidades jurídicas nunca antes vistas,

1
Graduando em Direito pela UFPI. E-mail: isabellaolive997@gmail.com
incluindo a chance de surgir, entre as estrelas, um Estado independente e soberano
de direito.
A presente pesquisa tem por objetivo analisar como se daria o surgimento desse
Estado através de uma perspetiva colonial. Nesse cenário, busca-se avaliar o atual
contexto jurídico que rege o espaço cósmico. Assim como as experiências passadas
no que refere-se à formação de Estados que outrora foram colônias. Para, desse
modo, formular uma noção precisa das chances humanas de um dia estabelecer uma
sociedade autônoma fora da órbita terrestre.
Nesse contexto, será realizada uma análise das leis vigentes em relação às
condutas que devem ser adotadas quando se trata do cenário espacial. Bem como
outra análise da suposta via pela qual o Estado extraterrestre emergirá, por meio de
um modelo colonial. Ambas as análises foram pautadas em métodos
hipotético-dedutivos, com técnicas de pesquisas documentais e biográficas.

2. A Colonização Como Forma de Alcançar um Estado Extraterrestre

2.1 Aspectos Jurídicos e Históricos

Não existe Estado Moderno sem um povo, um poder soberano e um


território delimitado, como já declarou o filósofo alemão, Georg Jellinek (2000),
em sua definição de Estado:

É a corporação de um povo, assentada num determinado território e


dotada de um poder originário de mando.

Notoriamente, no caso do espaço sideral, não falta território a ser


aproveitado. Porém, a lei atual proíbe que alguém se aproprie licitamente de
território não terrestre. Fato que fica explícito no Artigo 2° do Tratado do
Espaço Exterior de 1967:

O espaço cósmico, incluindo a lua e demais corpos celestes, não


poderá ser objeto de apropriação nacional por proclamação de
soberania, por uso ou ocupação, nem por qualquer outro meio.

Esse mesmo tratado, ratificado por 107 países, determina que o Espaço
é um bem comum da humanidade e que sua regulação deve seguir os
princípios do direito internacional.
Com base apenas no tratado supracitado, não existe margem legal para
a formação de um Estado independente e soberano em território não terrestre.
No entanto, os Estados Unidos (maior potência espacial do século XXI),
não assinou o tratado e tem adotado uma postura completamente oposta às
condutas estabelecidas por ele. Postura essa que fica evidente na Ordem
Executiva2 promovida pelo ex-presidente Donald Trump no ano de 2020:

Os Americanos devem ter o direito de se envolver em exploração


comercial, recuperação e uso de recursos no espaço sideral.

A posição tomada pelos Estados Unidos em relação ao uso e ocupação


dos corpos celestes, têm um caráter econômico liberal. Assim, incentivando as
iniciativas privadas a obter o domínio do cosmo com o intuito de atingir lucro.
Em detrimento dessa posição, tem ocorrido um florescimento de projetos que
visam a criação de colônias de exploração em solo não terrestre. Caso do
projeto Mars One3, que busca levar humanos a Marte sem a intenção de
trazê-los de volta.
"Em vez de tentar devolvê-los, mais equipes seriam enviadas a cada
dois anos, estabelecendo um assentamento permanente e cada vez maior no
Planeta Vermelho" (MARS ONE, 2011).
Em virtude de tais projetos, a chance de um povo ocupar algum território
fora do planeta Terra, torna-se cada vez maior. Assim, criando uma expectativa
de assenhoreamento do cosmo por meio do modelo colonial de exploração.
Para efeito comparativo de exemplo, é cabível mencionar a apropriação
do Brasil, que surgiu como uma colônia portuguesa de exploração. De modo
que tinha, para Portugal, apenas um valor financeiro. Assim, sendo abstraído
de qualquer decisão que não passasse primeiro pela Coroa Portuguesa.

2
Uma ordem executiva é uma declaração oficial do presidente sobre como as agências
federais e Departamentos devem usar seus recursos. O mais importante é o fato de que ela
não precisa da aprovação do Congresso para entrar em vigor. Elas se enquadram no grupo de
"ações executivas" garantidas no Artigo 2º da Constituição americana e incluem também os
memorandos presidenciais (que são um passo a menos do que uma ordem executiva),
proclamações e diretrizes presidenciais (UOL NOTÍCIAS, 2017).
3
A Mars One é uma organização não-governamental criada em 2001 pelo engenheiro
holandês Bas Lansdorp, que pretende embarcar em 2026 o primeiro grupo de pessoas em
viagens apenas de ida, para estabelecer o inaugural assentamento humano em Marte (COM
CIÊNCIA, 2017).
Apesar disso, o Brasil tornou-se um Estado soberano em 1822, após sofrer
uma série de insatisfações com a Metrópole Portuguesa, tendo então a
necessidade de livrar-se das amarras estrangeiras e garantir que as decisões
nacionais coubessem aos nativos.
"Ao Brasil devia, como a quase todas as colônias, chegar o dia da sua
emancipação da metrópole" (VARNHAGEN, 2010).
O processo histórico citado acima, não ocorreu apenas na América
Portuguesa. Tanto os países colonizados pela Espanha, quanto aqueles
colonizados pela Inglaterra, percorreram um caminho semelhante, que lhes
concedeu suas respectivas emancipações. Criando assim um padrão de
autodeclaração de soberania, por parte das comunidades colonizadas, após
longos períodos de colonização.
É suposto que, se a ocupação do espaço sideral ocorrer por meio do
modelo colonial de exploração, o padrão acabará se repetindo e um novo
Estado nascerá. Será, ineditamente, o primeiro Estado a não precisar
estabelecer vínculos jurídicos com a comunidade do planeta Terra, pois não
estará situado em sua superfície.

2.2 Empecilhos Biológicos

É válido acrescentar que existem condições biológicas imprevisíveis


para o sucesso da vida como conhecemos hoje. É o caso do ciclo do carbono,
uma substância essencial para a manutenção da vida orgânica. Pois, está
presente no processo de fotossíntese, que permite com que as plantas (base
da alimentação de diversos animais) produzam seu próprio sustento.
É imperioso mencionar que o planeta Terra faz o dióxido de carbono
circular por sua atmosfera, solo e oceanos através da ação das placas
tectónicas. Outros planetas, como Vénus e Marte, retém o carbono em rochas
ou na atmosfera (NATIONAL GEOGRAPHIC PORTUGAL, 2019). Fato esse
que os torna impróprios para abrigar seres vegetais ou animais.
O exemplo citado acima é só um de muitos impedimentos biológicos
para o estabelecimento da vida em solo não terráqueo. No entanto, já existem
projetos que almejam criar colônias com condições de abrigar vida humana no
espaço, fazendo uso de meios artificiais para simular as características da
Terra em locais inóspitos. É o caso dos projetos da SpaceX, empresa
prestadora de serviços de transporte espacial para a Nasa, que atua no
desenvolvimento de tecnologias focadas essencialmente no domínio do cosmo.
O mais recente e promissor investimento da SpaceX é o projeto Starship:

A espaçonave Starship e o foguete Super Heavy da SpaceX


(coletivamente chamados de Starship), representam um sistema de
transporte totalmente reutilizável projetado para transportar tripulação
e carga para a órbita da Terra, a Lua, Marte e além. Starship será o
veículo de lançamento mais poderoso do mundo já desenvolvido, com
capacidade para transportar mais de 100 toneladas métricas para a
órbita da Terra (SPACEX, 2022).

A Starship está sendo construída para os mais diversos fins


relacionados ao cobrimento das necessidades humanas no espaço, caso do
transporte interplanetário:

Construir cidades em Marte exigirá a entrega acessível de


quantidades significativas de carga e pessoas. O sistema Starship
totalmente reutilizável usa a transferência de propelente no espaço
para conseguir isso e transportar pessoas em voos interplanetários de
longa duração (SPACEX, 2022).

3. Considerações Finais

Apesar dos empecilhos biológicos, a conquista do espaço ainda possui


um cenário promissor. Pois, é um campo de crescentes investimentos e
inovações. Assim, graças ao presente artigo, é possível concluir, com base no
passado e nos conflitos contidos na atual legislação, que a ida ao espaço com
o intuito de extrair recursos, pode culminar no estabelecimento de colônias que
irão apropriar-se do território estrageiro e, em dado momento, terminarão
exigindo soberania sobre o mesmo. De modo que alcançariam os três
elementos cernes do modelo contemporâneo de Estado: um território
reconhecido, uma soberania sobre esse território e um povo que a legitime.

Referências
VARNHAGEN, Francisco. História da Independência do Brasil. Vol. 137.
Brasília: Livraria do Senado, 2010.

NEIL Armstrong: conheça a história do primeiro homem a pisar na Lua. Revista


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<https://revistagalileu.globo.com/Ciencia/noticia/2018/11/neil-armstrong-conhec
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2022.

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O que são as ordens executivas de Trump? Elas podem ser derrubadas? UOL
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QKKAFQArABIIACAw%3D%3D#amp_tf=De%20%251%24s&aoh=1658689930
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de Trump, diz professor. Sputnik News, 2020. Disponível em:
<https://br.sputniknews.com/amp/20200424/eua-podem-exercer-dominio-emine
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MARS One's Journey. Mars One, 2011. Disponível em:


<https://www.mars-one.com/>. Acesso em: 10 de Jul. de 2022.

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