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colecão

apafavra
-..- VIVél
EDIÇÕES PAULINAS
JEROME MURPHY-O'CONNOR, 0.P.

São Paulo e a moral


dos nossos tempos
Coleção dirigida por
Fr. Gilberto da Silva Gorgulho
Ana Flora Anderson

Coleção " A PALAVRA VIVA "

1. - São Paulo e a moral dos nossos tempos, ].


Murphy-O'Connor, O.P.
2. - Milagres em Mateus, ]. Murphy-O'Connor, 0.P.
3. - Tesouro das Parábolas, L. C.Crfaux *
4. - O casal na Escritura, P. Grelot **
* No prelo
** Em preparação
EDIÇOES PAULINAS

BIBLIOTE C A
São Domingo•
UBERABA ~ MO
Nlhll obstat: Pe. P. Pazzagllni, ssp. • Sio Paulo, 30-10-72
lmprlmatur: t Benedito de U. V., vig. g. • São Paulo, 31-10-72

INTRODUÇAO

Este livro principia uma nova coleção:


A PALAVRA VIVA. Serão apresentados vá-
rios livros cuja finalidade é ajudar os leitores
a descobrir nas Escrituras Sagradas a mensa-
gem sempre atual da Palavra de Deus.
Iniciamos com um livro sobre Paulo, e
sobre a moral. Isso porque a teologia moral
é, atualmente, um dos campos mais difíceis da
reflexão cristã. Mais do que qualquer outro
setor teol6gico é este que deve ser impregna-
do pela Palavra de Deus e pelo ensinamento
dos Apóstolos.
A reflexão moral, sobre o sentido do agir
e da existência humanos, sobre o critério obje-
tivo da moralidade, tem desafiado filósofos e
teólogos. Todos esba"am no problema do
critério da moralidade, e como decidir o que
é o bem e o mal? - O homem autônomo e
livre não seria aquele que decide subjetiva-
mente, segundo as situações, o que é bom para

© BY EDIÇôES PAULINAS, SÃO PAULO, 1972 5


si? A liberdade humana seria a norma supre- ensinamento de Paulo deveria ser a norma e
ma da moralidade? - Tantas perguntas como a orientação deste ser-com-outros na dimensão
estas são ouvidas na vida concreta e nos livros da fé cristã.
dos mais variados tipos. Ana Flora Anderson que, na Escola Bí-
São Paulo tem algo a dizer para os ho- blica de Jerusalém, participou ativamente na
mens de hoje. Não somente por seu anúncio elaboração deste livro, já teve a experiência de
da salvação. Mas principalmente por anunciar que a riqueza destes capítulos só será com-
que esta salvação consiste no aparecimento do preendida, na medida em que se começar a
Homem Novo, já no seio da hist6ria dos tentar uma vida em comunidade a partir destas
homens. perspectivas apontadas por são Paulo.
Este livro mostrará o que é este Homem Este é nosso desejo. Tentem e verão o
Novo. Não pode ser compreendido numa linha que é o Homem Novo, proclamado por são
individualista. É o Cristo Total, no mistério Paulo!
de sua Igreja. Ser-em-Cristo é ser-com-outros. São Paulo, 8 de Setembro de 1972.
Esta formulação paulina é sua maneira de ex-
primir que Jesus morto e ressuscitado nos sal-
va fazendo-nos viver numa nova comunhão. FR. GILBERTO DA SILVA GoRGULHO, o. P.
Somente o amor é que salva. É na vida em ANA FLORA ANDERSON
comunhão que se pode discernir a verdadeira
vontade de Deus, a norma de toda ação moral
e sentido para a existência humana.
Este livro não pode ser apenas lido. De-
ve levar a uma profunda reflexão sobre o mis-
tério da Igreja nas cartas de Paulo. E mais,
seu ensinamento deve ser transposto para a
vida concreta. Neste momento em que a Igre-
ja incentiva a formação de pequenas comuni-
dades. ou comunidades eclesiais de baie, o

6 7
I
AS OPÇÕES HUMANAS

Para o cristão o Novo Testamento nun-


ca pode ser apenas objeto de um estudo histó-
rico desengajado. Tal investigação é necessá-
ria, mas, a menos que leve a um encontro pes-
soal com os grandes homens que escreveram
o Evangelho e as Epístolas, permanece huma-
na e religiosamente estéril. Para atingir tal
encontro pessoal, não é suficiente reconhecer
a beleza, o poder ou a verdade do que é dito.
Só o atingimos quando conseguimos uma em-
patia com o por que um autor do Novo Testa-
mento diz o que diz. As conclusões a que
chegou são importantes sob diversos pontos
de vista, mas, particularmente hoje, é de gran-
de valor uma apreciação do processo pelo qual
chegou a elas.
A fé é uma resposta humana, pessoal,
não tanto a um objeto (isto é, um conjunto

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de doutrina ), mas a uma pessoa. O Novo conciliar as exigências de uma tradiç.ão autên-
Testamento nos mostra exemplos escolhi- tica com os requisitos de um meio cultural
dos dos modos pelos quais essa resposta diferente. Precisaram procurar categorias que
pode ser dada. O plural é aqui usado delibe- expressassem com justeza o que compreendiam
radamente, porque, apesar do que todos tem da pessoa de Jesus, e tiveram que manifestar
em comum, há importantes diferenças na pers- as implicações práticas do seu compromisso
pectiva teológica entre os vários autores do com de.
Novo Testamento. A visão de Jesus em Ma- Este ensaio é uma tentativa para descre-
teus, por exemplo, é muito diferente da de ver como Paulo apresentou este último aspec-
João. O reconhecimento desse pluralismo do to e avaliar a importância contemporânea das
Novo Testamento deveria nos tornar conscien- soluções que deu. Desde o início entendeu Je-
tes de que a Igreja de hoje, com sua diversi- sus como um dom e um convite de Deus à
dade de teologias e seu clima de intensa dis- humanidade e, portanto, se preocupou com os
cussão, está muito mais perto da Igreja dos modos concretos das respostas humanas, tan-
disápulos imediatos de Jesus do que estava a to o seu, como o das comunidades pdas quais
"ortodoxia" monolítica da primeira parte do sentia-se responsável. Grande parte disso o
século. A vida nesta Igreja rejuvenescida, po- fez oralmente, em suas pregações, uma dimen-
rém, não é fácil, pelas dificuldades em com- são de suas atividades da qual nenhum apon-
binar fidelidade e flexibilidade, e em distin- tamento restou. Tudo que temos são suas car-
guir entre adaptações necessárias e acomoda- tas. Foram escritas respondendo a situações
ções sem fé. Precisamente a esse respeito po- particulares e, muitas vezes, apenas rdembram
demos aprender muito, observando como pen- brevemente o que deve ter sido explicado
savam os autores do Novo Testamento. Suas mais longamente. Daí nossa imagem de como
soluções e formulações podem ter que ser pensava Paulo deve ser construída a partir de
modificadas porque não vivemos no seu mun- indicações espalhadas em suas cartas. A apa-
do, mas o seu enfoque dos problemas continua rente artificialidade deste processo - as car-
a ter um valor perene. Basicamente enfrentaram tas cobrem um período de 10 a 12 anos - é
nossos mesmos problemas. Tiveram que re- mais que contrabalançada pela consistência do

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pensamento de Paulo. Apesar de raramente mente uma criatura, mas o homem em Cristo
se expressar sistematicamente, as várias alu- é uma nova criatura. Estas são as duas únicas
sões aos problemas morais encaixam-se tão maneiras de existir, possíveis ao homem. Digo
perfeitamente que devemos aceitar uma intui- ' possíveis' porque Paulo reconhecia que as
ção dominante e ordenada. coisas, na prática, não eram tão simples e cla-
Essa intuição encontra-se na compreen- ras. Ainda assim, devemos tentar definir estes
são, por parte de Paulo, da condição huma- dois modos de existência tão exatamente quan-
na. Uma vez que sua visão do homem é com- to possível, porque sua ignorância cria a ten-
preendida, todas as suas linhas de orientação são donde surgem os problemas morais. Paulo
determinadas tomam sentido; e as questões, estava ciente d.isso e suas soluções, expressas
referentes ao seu real significado, ao seu va- em forma de diretivas práticas, eram pela sua
lor perene e autoridade, são facilmente res- intuição dialética, ordenadas para o ideal.
pondidas.
Fundamental para a compreensã~ do ho-
mem, em Paulo, é a percepção de que aquele O HOMEM SEM CRISTO
não é uma entidade inteiramente independen-
te. É o termo de uma relação, sendo que o O retrato do homem sem Cristo foi pinta-
outro é Deus. Em outras palavras, o homem do por Paulo com cores muito sombrias. Essa
é uma criatura - "quem sois vós, um homem, visão pessimista é baseada, parcialmente, na
para responder a Deus? Vai a criatura dizer observação pessoal da vida nas cidades portuá-
ao seu Criador porque me fez assim? - " rias do Leste Mediterrâneo; e somada ao co-
( Rom 9 ,20 ) . A antropologia paulina, assim, nhecimento que o apóstolo tinha da possibili-
é essencialmente teocêntrica. Isso se torna evi- dade da existência em Cristo, permitiu in-
dente quando o apóstolo fala do homem como fluenciar sua apresentação. O bom senso exige
nova criatura, depois da sua incorporação à esta explicação da linguagem exagerada, usada
comunidade cristã (2Cor 5,17). Em concreto, na sua descrição do pagão (Rom 1,18-2,11 ).
porém, essa distinção foi feita com referên- Não pode ser entendido como dizendo que não
cia a Cristo; o homem sem Cristo era simples- havia gente boa e normal entre os milhões de

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não-cnstaos. Mal podia ter criticado a maio- ele. Enganamo-nos se considerarmos as afir-
ria por negligenciar a possibilidade do conheci- mações de Paulo simplesmente linguagem re-
mento natural de Deus, a menos que houvesse tórica e figurativa (como faz R. Bultmann, d.
alguns que tivessem de fato alcançado tal co- Th NT, I p. 249) 1, sem significado real. Por
nhecimento através da reflexão "sobre as coi- um lado, fazer isso, toma impossível compreen-
sas que foram feitas". Mas, mesmo descon- der o conceito que Paulo faz da " liberdade",
tando o elemento de hipérbole, devemos reco- que, veremos, é uma característica da existên-
nhecer sua força pedag6gica em sublinhar o cia em Cristo. O que, então, pensava Paulo?
caráter de antítese entre os dois modos de exis- A resposta mais provável é muito bem suge-
tência. rida pelo que H. H. Rowley escreveu sobre a
personificação do mal na literatura apocalíptica.
O poder do Pecado "Somos, em grande parte, criaturas de
nossa época, refletindo o espírito de nosso tem-
Em Cristo, como veremos, o homem fica po ( Zeitgeist) . E este espírito ( Zeitgeist) não
livre do Pecado; mas sem Cristo "todos os é algo que exista fora de todos os indivíduos
homens, tanto judeus como gregos, estão de- vivos, nem meramente num grande número
baixo do poder do Pecado" ( Rom 3,9). O de indivíduos distintos. Ele está presente na
emprego da maiúscula inicial, em Pecado, é totalidade do conjunto, e opera em maior ou
justificado não só pelo conteúdo deste texto, menor medida, em cada um em particular.
mas por uma série completa de outras pas- Caracteriza o nosso tempo, ainda que não nas-
sagens da Epístola aos romanos, que atribui ceu unicamente do nosso tempo. É gerado na
ações pessoais ao· Pecado. O Pecado "veio ao corrente vital que liga as gerações passadas à
mundo" (5,12) e "reina aí" (5,21), "escravi- nossa. . . Mas, se somos mais do que indiví-
zando" homens ( 6,6) a quem "ele paga sa- duos distintos, se somos membros de um con-
lários" ( 6,23) . Este tipo de linguagem evi- junto maior que abraça o passado tanto quanto
dencia a concepção do ap6stolo sobre o pecado, o presente, que nos une na corrente vital e
como um ser pessoal, distinto do homem, e tão 1 R. BuLTMANN, Thtology o/ tht Ntw Ttstamt11t, SCM
poderoso que o homem não pode resistir a Prcss, Londres, 19.59.

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que age através de nós, então uma força poten- 0 Pecado é a poluição corruptora do mau exem-
te do mal pode estar na corrente daquela vida, plo, o homem só pode ser subtraído de sua
derivada dos indivíduos, mas transcendendo-os esfera de influência sendo transportado para
apesar de ser encontrada em graus diferentes um outro ambiente e puro. A Lei, porém,
nos indivíduos" (The Relevance of Apoca- outra coisa não fazia senão informar o homem
lyptic, Londres, 1944, p. 151). da sua situação. Indicava uma orientação di-
O Pecado do qual Paulo fala nasceu da ferente, um esquema apropriado para a "situa-
ação humana (d. Rom 5,12); e eu sugiro ção" do homem como criatura, mas não fazia o
que seja compreendido como a influência cor- homem capaz de tornar esse esquema seu, per-
roedora de um meio corrupto, uma poluição manentemente. Retornaremos a este ponto
penetrante que todos devem respirar. Isto dá mais adiante em outro contexto; mas pelo que
inteira inteligibilidade aos textos acima. A foi dito, já está claro que os preceitos morais,
força cumulativa dos pecados pessoais gera sozinhos, não são suficientes para tornar o
uma pressão à qual estão sujeitos todos aque- homem moralmente bom.
les nascidos da sociedade humana. Ninguém
escapa à falsa orientação do todo. Além disto, Isolamento egocêntrico
esta abordagem permite-nos entender o que
Paulo pensava quando falava de "uma gera- A existência sem Cristo é um tema im-
ção corrupta e perversa" ( Flp 2,15) e "o mun- portante em Colossenses, mas com a diferença
do presente do mal" (Gál 1,4). significativa de que não faz menção nenhuma
No pensamento de Paulo, a Lei está as- ao Pecado ou à Lei. Este silêncio é difícil de
sociada estreitamente ao Pecado (d. Rom 7, se explicar, mas permite-nos perceber alguns
8-9; lCor 15,56); e o que diz dela confirma contatos surpreendentes entre os pontos en-
a interpretação acima. Se bem que dirigida fatizados por Paulo, e a análise das condições
diretamente contra o Pecado, a Lei foi incapaz humanas feitas por M. Heidegger. Ambos,
de libertar o homem de suas garras. Porque M. Heidegger e Paulo, observam os mesmos
isso se dá é facilmente entendido se é aceita a fatos· mas o pensamento de Paulo tem uma
teoria do Pecado como situação ambiental. Se orie;tação teísta que M. Heidegger exclui de-

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2 - São Paulo e a moral dos nossos dias
liberadamente. Ainda assim, as categorias de M. Concorda, porém, com M. Heidegger na im-
Heidegger fornecem-nos um instrumento dos portância da decisão pessoal. O poder do Pe-
mais úteis para a elucidação do que o apóstolo cado induz a uma predisposição à inautentici-
quer dizer. Às vezes as categorias de M. Hei- dade, mas pecar é sempre resultado de uma
degger serão inadequadas, mas nesses pontos ação pessoal. Os colossenses, antes de sua
o contraste servirá apenas para esclarecer o im- conversão eram " estrangeiros e inimigos atra-
pulso do pensamento de Paulo. vés de seus maus pensamentos e ações" ( Col
A perspectiva de M. Heidegger está di- 1,21 ).
rigida ao homem como é; e, para descrever a Uma distinção básica feita por M. Hei-
característica fundamental da sua existência, degger é entre o ser-de-um-homem e o ser-de-
usa a expressão " ser-no-mundo". Essa não é -uma-coisa. O primeiro tem três característi-
uma descrição espacial. Quer dizer que, exis- cas que faltam ao segundo: 1 ) o homem pode
tindo, o homem está envolvido pelo mundo; ter uma relação consigo próprio, isto é, pode
está ocupado com ele, e não somente nele. Em ser tanto sujeito como objeto, enquanto que
outras palavras, o homem está necessariamente a cadeira é simplesmente um objeto; 2 ) o ho-
em contato com outros seres, e é a sua reação mem é um indivíduo único, ao passo que duas
para com esses outros seres que faz sua exis- bolas de bilhar podem ser absolutamente idên-
tência autêntica ou fuautêntica. Ele, ou realiza ticas; 3 ) o homem é possibilidade e nunca está
as possibilidades do seu próprio modo de ser, completo, enquanto que uma coisa não pode
ou não o faz. Assim é revelada a importância fazer nada para modificar a sua existência. Na
da decisão do homem, e isto é o porque M. escala do ser, portanto, o homem é superior
Heidegger pode dizer que o homem é " possi- à coisa.
bilidade", e que é " constituído pela decisão". Um modo pelo qual o homem pode tornar
O homem se torna o que ele é. Paulo tam- a sua maneira de ser inautêntica, é definindo
bém manteria que o homem basicamente só suas possibilidades de ser em termos de coisas,
tem duas opções abertas para si; mas, como isto é, se todo seu ser está concentrado na pos-
veremos, ele difere radicalmente de M. Hei- sessão de dinheiro, condição social etc. Fa-
degger no que constitui a existência autêntica. zendo isso o homem se torna parte de um

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mundo alienado de existência. É precisamen- de existência que o homem encontra no mun-
te esta perspectiva que aclara duas das exor- do. É inevitavelmente empurrado à associa-
tações feitas por Paulo para impedir aos colos- ções com pessoas. Daqui decorre outra carac-
senses a volta ao mundo falso de existência: terística fundamental do seu modo de ser, de-
" Por que viveis como se ainda pertencêsseis ao finido por M. Heidegger como o " ser-com-os-
mundo ?" ( Col 2,20 ) . " Pensai nas coisas do -outros". Neste nível também, o homem é con-
~to e não nas coisas da terra" ( Col 3 ,2 ) . frontado com a escolha entre autencidade e
Fixando-se nas "coisas da terra" o homem inautenticidade. Para M. Heidegger o homem se
não está simplesmente no mundo, mas " per- faz inautêntico, submergindo sua identidade
tence ao mundo". Debaixo destas afirmativas na massa amorfa e despersonalizada que cha-
gerais existe uma referência a um problema ma " o homem" (das Man ). Dominado pelo
determinado. Paulo se preocupava com a ati- hábito de não pensar, perseguido pelos regu-
~de dos colossenses a respeito de certas prá- lamentos burocráticos que reduzem tudo ao
ticas externas, tais quais o calendário e cer tas nível das cifras, condenado às tarefas mecâni-
regulamentações dietéticas (d. Col 2, 16-17 ) . cas, seu próprio pensamento modelado pela
Estas não eram coisas para a preocupação fun- opinião pública, o homem se torna apenas um
damental, e achava que estavam assumindo da " multidão". Permitindo-se ser assim absor-
uma importância despropositada nas vidas da vido, o homem esconde a si próprio o desafio
comunidade. Tais observâncias tinham certa de sua existência, e evita ser coagido ao ponto
utilidade; mas seu valor não passava disso. de tomar uma decisão verdadeira, porque o
Assim, conformavam-se com a definição de que a multidão faz não é responsabilidade de
um "ser-para-ser-usado" de M. Heidegger. Fa- ninguém.
zê-las o critério de sua "situação" perante Há muitos pontos de contato entre este
Deus, porém, é definir a possibilidade de al- quadro e o conceito paulino de " mundo", como
guém em termos de coisas. É um passo para a esfera dominada pelo Pecado (Rom 3,6;5,
fora do verdadeiro modo humano de exis- 12; !Cor 1,20); mas por causa do colorido
tência. teístico do pensamento de Paulo, os dois não
As coisas, porém, não são a única forma se sobrepõem completamente. A divergência

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torna-se aparente se examinarmos a maneira nar. Neste estado de falsa segurança o ho-
pela qual o apóstolo visualiza a inautenticida- mem não sente necessidade de seus semelhan-
de ao nível das relações sociais do homem. A tes, e assim, relacionado com esse recolhimen-
visão de M. Heidegger estava bloqueada no to egoísta, há uma rejeição ativa dos outros.
nível puramente fenomenal; e neste nível, pou- Isto se manifesta na lista das características
cos negarão a exatidão de sua descrição da atribuídas, por Paulo, ao " homem velho".
maneira de vida da maioria. Por causa de "Desse modo, matai o que em vós é terreno,
Cristo, Paulo era otimista; e onde M. Hei- amoral, impuro, paixão, maus desejos, avareza,
degger só vê coletivismo, ele vê a possibili- idolatria. Nisto andáveis antes, quando nisto
dade de uma verdadeira comunidade. Daí a vivíeis. Agora, porém, tudo abandonastes -
sua suposição de que todos os homens são ira, ódio, malícia, blasfêmia, palavras vãs. Não
irmãos, filhos de um único Pai. Assim, ine- mintais uns aos outros, visto que vos desfizes-
vitavelmente, a existência inautêntica será ca- tes do homem velho e suas palavras" ( Col
racterizada pelo egocentrismo. 3 ,5; 7 ,9). Estas qualidades são predominante-
Isto aparece no tema de "vanglória", a mente anti-sociais, e um fenômeno similar é
qual, para Paulo é uma expressão extrema de observado em todas as listas paulinas de vícios;
auto-suficiência desavisada. Esta atitude, que Romanos 1,29-31 (cobiça, maldades, maledi-
provocou em Paulo a mais forte e sarcástica pas- cência, malícia, inveja, assassínios , contendas,
sagem de suas cartas (2Cor 11,16;12,13 ), é enganos, calúnias, insolência, arrogância, van-
bem definida por R. Bultmann como uma total glória etc.), Gálatas 5,19-21 (imoralidade,
"má interpretação da situaç.ão humana". É a feitiçaria, contenda, ciúmes, ira, egoísmo, dispu-
negação efetiva da "condição" do homem como tas, espírito partidário, inveja, bebidas e orgia),
criatura humana. " O que tendes vós que não 2Coríntios 12 ,20 (brigas, invejas, ira, egoís-
vos foi dado? E, se vos foi dado, do que vos mo, calúnia, maledicência, orgulho, desordens) .
vangloriais, como se não vos tivesse sido da- A importância desta ênfase no caráter anti-
do?" ( 1Cor 4, 7) . O indivíduo toma-se cen- -social do homem sem Cristo é acentuada pelo
tro do próprio mundo privado, formado pelo fato de que as listas de vícios do mundo he-
visível e tangível que pode controlar e domi- lênico em que Paulo vivia acentuavam geral-
22 23
mente os vícios " pessoais" ( cf. Wibling, Die temente contrárias de individualismo e comu-
Tugend und das Lasterkataloge p. 95 ). O nidade.
apóstolo estava empregando uma técnica co-
mum em educação moral, mas adaptou o con- Viver de acordo com a carne
teúdo em sua perspectiva própria. Veremos
que nisso foi influenciado por sua compreen- Se há uma única expressão que resume
são da existência autêntica em Cristo. a compreensão de Paulo da estrutura da exis-
O pessimismo inerente ao existencialismo tência sem Cristo, é "a carne". Ele, às vezes,
de M . Heidegger resulta da sua falha em de- usa este termo sem qualquer conotação ética,
senvolver um conceito satisfatório para uma para indicar a contingência da existência do
existência autêntica. Sente que o coletivismo homem no mundo, isto é, "a vida que eu vivo
contemporâneo baixou e atou o homem a um pela fé no Filho de Deus" (Gál 2,20 ). Mais
nível onde a autenticidade (no sentido real) freqüentemente, porém, usa " carne" para de-
era metafisicamente impossível. Se, porém, signar um modo de existência conseqüente de
existência autêntica é a antítese de existência uma decisão que orienta o homem todo em
inautêntica, dever-se-ia esperar que M. Hei- uma direção definida. "Aqueles que vivem de
degger desse uma certa aprovação qualificada acordo com a carne têm suas mentes fixas nas
ao tipo de individualismo condenado por Paulo. coisas da carne . . . Fixar a mente na carne
E isso fez, de fato porque a sua retirada da é morte . . . porque a mente que se fixa na car-
" multidão_" para a solidão da Floresta Negra, ne é hostil a Deus" (Rom 8,5-7 ). " Fixar a
mal admite qualquer outra interpretação. Nada mente nas coisas da carne" é o mesmo que
é mais significativo da diferença entre o filó- "fixar a mente nas coisas que estão na terra"
sofo e o apóstolo. Paulo acentua igualmente a ( Col 3 ,2 ) . " Viver de acordo com a carne",
aceitação da responsabilidade como critério da porta~to, não é condescender com a licenciosi-
autenticidade, mas esta responsabilidade ao in- dade sexual, mas adotar um mcxlo de vida
vés de ser uma afirmação egoística do próprio orientado para o visível e o tangível, com ex-
ser como um indivíduo à parte dos outros, ma- clusão de Deus e das exigências de uma autên-
nifesta-se na reconciliaç2o de exigênci::ic; aparen- tica comunidade humana. O verdadeiro eu, fica

24 25
perdido no mundo "coisificado" ou murado desperto e corajoso em face à futilidade da
no mundo fechado do egoísmo. De um ponto existência. Paulo, por outro lado, reconhece
de vista verdadeiramente humano isto não é um Deus que também é Pai, e quem através
existência, mas como Paulo graficamente co- de Cristo, restabeleceu para o homem a pos-
loca, uma forma de "morte". Para quem pen- sibilidade de atingir outro modo de existência.
sa em categorias essencialistas de Aristóteles, A descontinuidade radical entre esse novo
este último termo é um exagero, perdoável modo de existência e o antigo é expresso gra-
apenas, mas sem sentido real. Para o existen- ficamente por Paulo quando nos diz "vós que
cialista, ao contrário, é literalmente verdade. estáveis mortos, Deus vos tomou vivos" ( Col
Se o homem é constituído como homem pela 2,13). A teologia tradicional exprimiu essa
decisão que realiza suas autênticas possibilida- distinção em termos de "natural" e "sobrena-
des, a ausência de tal decisão é equivalente à tural"; e a justificativa para essa terminologia
morte do homem precisamente como tal. pode ser encontrada nos contrastes " homem
natural-homem espiritual" ( lCor 2,14-15), e
" homem velho-homem novo" (Col 3,9-10) de
HOMEM EM CRISTO Paulo. Não contesto a validade da distinção;
mas, penso que a esquecida antítese "morte-
Caracterizando a existência sem Cristo -vida" coloca o problema numa nova e lumi-
como "morte" Paulo pretende implicar que o nosa perspectiva. Do ponto de vista de Paulo,
homem não pode mudar sua condição sem au- o modo de existência que o homem frui em
xilio. M . Heidegger, praticamente, diz a mes- Cristo é a vida querida por Deus, desde o prin-
ma coisa. Seu termo genérico para uma exis- cípio, para o homem. Sob este aspecto merece
tência inautêntica é "estado de queda"; e sus- ser chamada, em sentido estrito, normal e hu-
tenta que o homem caído está impedido de mana. Seguindo adiante nessa linha de pensa-
poder escolher suas possibilidades originais. mento é-se levado inevitavelmente, a conside-
Porque M. Heidegger não admite poder algum rar a existência sem Deus, como humana ape-
fora do homem, o melhor que sugere é que nas num sentido muito remoto. Devido ao
troquemos nossas ilusões por um desespero uso consistente que Paulo faz do termo "mor-

26 27
te", pode-se argwr, que, se forçado, negaria
do pecado pudesse ser destruído, e nós não
que fosse humana num sentido real. A única
fôssemos mais escravos do Pecado" (Rom 6,
objeção possível a chamar os dois modos de
6). Este texto contém as características fun-
vida de "humano" e "sub-humano", é que esta
damentais do ser-em-Cristo.
terminologia podia ser compreendida, como
sendo o "humano", atingido sem auxílio ex-
Ser-com-ou'tros
terno. Nada, porém, poderia estar tão longe
da mente de Paulo; e é precisamente como
O novo modo de existência que o homem
uma iluminação a seu pensamento que é pro-
atinge em Cristo, não é inteiramente seu pró-
posta essa terminologia. Uma das vantagens
prio. É uma participação, um partilhar para
desta linha de pensamento é que nos permite
o qual os outros são essenciais. Pode-se dis-
ver porque a intervenção divina necessária to-
cutir se Paulo poderia ter concebido um cris-
mou forma de encarnação. Precisamente por-
tão anônimo; mas é certo que, para ele, a idéia
que foi "humano" no mais amplo sentido, Je-
de um cristão autônomo seria uma contradição
sus restituiu à humanidade a possibilidade de
nos termos.
se tornar ela mesma. A sua morte voluntária
A exortação "revestir-se do homem novo"
manifestou seu amor todo envolvente que ins-
tornou-se um clichê nos sermões, e assim, é
pira o homem a emergir do seu isolamento ego-
muitas vezes, tomada em sentido individualis-
cêntrico, ao qual se havia entregue sob o po-
der do Pecado. ta. Há alguma desculpa para isso, porque a
imagem de vestir-se evoca um contexto batis-
É um paradoxo tipicamente paulino que
mal, onde toda a atenção está focalizada no
só escapa da "morte", "morrendo". É tam-
indivíduo que se submete ao rito. Ele é con-
bém característico que esse "morrer" que efe-
cebido como vestindo um costume novo de
tua a transição de um modo de ser para o ou-
hábitos morais. Não é raro que a frase "ves-
tro, não seja feito no isolamento que caracte-
tir o Cristo" seja tomada num sentido seme-
riza uma existência inautêntica. É um morrer
lhante· o crente adota um modo de agir seme-
com Cristo: "nós sabemos que vosso velho ho-
lhante' ao de Cristo. Uma simples leitura dos
mem foi crucificado com ele, para que o corpo
textos paulinos, porém, revela que essa inter-
28
29
pretação é superficial e enganosa. A verdade dade problemática; mas, para o apóstolo, a
é mais rica e muito mais esclarecedora. unidade é um fato incontroverso; " o fato da
O primeiro texto aparece em Colossen- unidade, como um dado básico, sempre está,
ses : "Revesti-vos do homem novo. . . onde em Paulo, na sentença principal; a multiplici-
não há grego ou judeu, circunciso ou incircun- dade, por outro lado, é expressa numa frase
ciso, bárbaro, cita, escravo, livre, inas Cristo subordinada, ou numa cláusula com o sentido
está todo em todos" (3,10 ). A palavra onde · 'apesar de' (The Body, Londres, 1961, p . 60).
indica sem ambigüidade que o "homem novo" Por exemplo: "como muitos, quando fo-
tem valor coletivo. É uma esfera onde muitos ram batizados em Cristo, revestiram-se de Cris-
compartilham a existência. Vestindo o homem to. Não há nem judeu nem grego, nem escra-
novo, portanto, o indivíduo muda apenas até vo nem livre, nem homem nem mulher, por-
onde consegue um novo modo de vida com os que todos são um só homem em Cristo Jesus"
outros. Pode parecer exagero dizer que nin- (Gál 3 ,27-28). Revestir-se de Cristo é obvia-
guém é completo sem os outros; mas, este é, mente, equivalente a revestir-se do "homem
precisamente, o que Paulo diz na sua discus- novo" . "Cristo, portanto, comparte do valor
são sobre o corpo de Cristo, em Coríntios 12, coletivo que deve ser dado ao homem novo;
12-21. Começa com a afirmação: "porque o que está em questão é o Cristo total. ~
como o corpo é um, e tem muitos membros, mente nesta perspectiva, é que a expressão
e todos os membros do corpo, sendo muitos, " em Cristo" adquire sua inteligibilidade ple-
são um só corpo, assim também é Cristo" ( v. na. Para o apóstolo o homem existe verdadei-
12); e, então, prossegue para mostrar que o ramente como homem, apenas "em Cristo",
corpo não pode consistir de um só membro, isto é, enquanto comparte a esfera de existên-
mas deve ser "muitos" ( v. 14) . Sem muitos cia dominada pelo amor unificador de Deus
membros não pode haver um corpo, não pode em Cristo.
haver um homem novo. Como J. A. T. Robin- Outra expressão, para esse novo modo
son notou muito bem nossa visão do corpo de de existência, é " pertencendo ao Cristo" ( lCor
Cristo, é, muitas vezes, oposta à de Paulo. 3,23; 15,23; 2Cor 10,7; Gál 3,29; 5,24) .
Consideramos a multiplicidade óbvia, e a uni- Isto deve ser comparado com a afirmação de

30 31
que o homem sem Cristo " pertence ao mun- mem se faça presente aos seus semelhantes com
do" ( Col 2,20). "Cristo" e " mundo" são uma radical preocupaç.ão de amor.
postos em contraste como diferentes esferas de
existência; e os próprios termos são símbolos Liberdade
que ilustram a diferença entre os dois modos
de ser. "Mundo" é impessoal, neutro e intei- A segunda característica da vida-em-Cris-
ramente apropriado para uma esfera dividida to é a liberdade: "para que o corpo do pecado
em uma multidão de unidades isoladas e egoís- seja destruído, e nós possamos não mais ser
tas. "Cristo", por outro lado, é um nome pes- escravos do Pecado" ( Rom 6,6). A última
soal que concretiza a outra diretiva que é a frase é decisiva. Dizer que o homem "não é
suprema qualidade da existência verdadeira- mais escravo do Pecado implica que o Pecado
mente humana. Não apenas " amor" é a carac- ainda procura escravizar. Não é o Pecado que
terística dominante deste modo de vida ( v. g. mudou, mas o homem que foi libertado da
Col 1,8-10; 2,2), mas as virtudes atribuídas compulsão do Pecado. Em concreto, como se
por Paulo ao " homem novo" são todas dirigi- obtém isso? Pode-se pensar num poder divi-
das aos outros. " Revesti-vos de compaixão, no empolgando o homem e tomando impos-
bondade, humildade, mansidão e paciência, su- síveis atos pecaminosos, mas não há nada nos
portando-vos uns aos outros e se alguém tiver textos paulinos que leve a sustentar tal hipó-
uma queixa do outro perdoai-vos mutuamen- tese. O Espírito é um dom divino, e o cristão
te; como o Senhor nos perdoou, assim também vive " pelo Espírito" (Gál 5 ,25); mas este
deveis perdoar. E acima de tudo revesti-vos do mesmo texto diz claramente que a presença do
amor que tudo une em perfeita harmonia. E Espírito não assegura necessariamente uma con-
permiti que a paz do Cristo reine em vossos duta impecável. Assim, temos que pensar em
corações, à qual fostes chamados em um só uma forma de proteção que evite que a força
Corpo" (Col 3,12-15 ) . Uma orientação idên- do Pecado atinja o homem. O conceito de
tica pode ser encontrada na lista de virtudes Espírito é importante, e R. Bultmann apreen-
em Rom 12,9-12 e Gál 5,22-23. Todas essas deu corretamente a intuição de Paulo, quan-
qualidades exigem necessariamente que o ho- do diz: " Tudo indica que pelo termo Espí-

32 33
3 • São Paulo e a moral doa noaaoa dlaa
rito (Paulo) quer dizer a existência escatoló- Já vimos o conceito de Paulo do pecado
gica na qual o homem é col~do uma vez que como uma força que é gerada pelos pecados
apropriou o ato salvífico que aconteceu em pessoais dos indivíduos através do curso da
Cristo". história humana. O homem nasce numa so-
Infelizmente, R. Bultmann não continua ciedade desorientada, e é tão atraído por essa
essa intuição; um dos maiores defeitos da sua tendência, que eventualmente se torna parcial-
teologia é a falha em compreender o caráter mente responsável por ela através dos seus
comunitário da existência redimida. Penso que próprios pecados pessoais. Entretanto, como
está claro, que por detrás do pensamento de membro do Cristo total o homem pertence a
Paulo está a idéia tradicional de uma comu- uma comunidade que é corretamente orienta-
nidade escatológica que não pode pecar. Tex- da com respeito a Deus. Neste meio, o ho-
tos proféticos (Is 40,21; Ez 36,27-28) sapien- mem é libertado e passa a viver seu verdadeiro
ciais ( Prov 9 ,6; Sir 2 4 ,22 ), e aprócrifos ser. Em outras palavras, a pressão exercida
(Tes. Levi 18,9; Jubileus 5,15; Henoc 6,8), pelo Pecado não o toca, porque não vive em
atestam a crença consistente dentro do ju- companhia de pecadores. Apenas esta inter-
daísmo de que uma comunidade messiânica pretação faz justiça ao realismo mostrado na
seria livre de todo o pecado, causada pela pre- citação, pelo apóstolo, do provérbio grego:
sença do Espírito. Esta idéia contribuiu for- " As más companhias arruinam a boa moral"
temente para o entendimento próprio da comu- ( lCor 15,33, Thais de Menander, Fragmento
nidade de Qumrã. A mais extrema manifes- 218 ) . Isto também é exigido pelo aviso de
tação deste tema no Novo Testamento é a afir- que o pecado de um, de certo modo, fere a co-
mação joanina "ninguém nascido de Deus come- munidade toda: "mas se alguém causou mal
te pecado, pois a sua natureza mora nele, e (pecando) ele não o causou a mim, mas, em
ele não pode pecar porque nasceu de Deus" certa medida - para não colocar isso muito
( lJo 3,9); mas também pode ser percebida severamente - a todos vós" (2Cor 2,5; d.
no conceito de Paulo da comunidade cristã também lCor 5,6-7) . "Não sabeis que um
como Templo do Espírito Santo ( lCor 3,16; pouco de lêvedo fermenta a massa toda? Li-
2Cor 6,16). vrai-vos do velho fermento para que possais

34 35
ser uma massa nova, pois sois realmente sem de seus membros. A possibilidade de tal erro
lêvedo". Qualquer enfraquecimento da co- é enormemente aumentada pelo fato de que,
munidade ao compromisso para com Cristo como uma realidade humana, visível, a comu-
põe em perigo a liberdade de todos. Através nidade cristã não pode deixar de ser organiza-
a falha de um, os tentáculos do Pecado po- da institucionalmente. Na sua forma extrema
dem atingir uma esfera supostamente imune isso pode levar à crença de que a comunidade
à sua influência. é um valor em si mesma, a qual os membros
são ordenados para obedecer. A manifestação
Comunidade cristã extrema de tal crença é uma insistência de
uniformidade de pensamento e ação. Por isso,
O conhecimento da liberdade crista aci- em lugar de se organizar livremente, ou como
ma descrito ilumina de modo muito concreto Paulo diria "ser de glória para glória" ( 2Cor
a interdependência dos cristãos entre si. Exem- 3, 18) , o modelo de sua conduta é imposto de
plifica um aspecto do que se quer mostrar, di- fora. A palavra "responsabilidade" é despo-
zendo que a existência autêntica é uma realida- jada de todo significado, e a conseqüência ine-
de partilhada. Minha liberdade para realizar vitável é a inibição do crescimento autêntico.
minhas possibilidades como homem, está con- Este problema apareceu em uma das co-
dicionada à autenticidade dos outros membros munidades paulinas, como veremos depois, não
da comunidade, e vice-versa. Portanto a co- porém por causa da crescente institucionali-
munidade existe para o indivíduo. Não' serve zação, mas pela falta de maturidade da parte
a um ideal abstrato, mas a esse ideal como dos indivíduos. Essa imaturidade se evidencia
que encarnado em cada um dos seus membros. também de outras maneiras, particularmente
A comunidade, como o Cristo total, concre- na compreensão distorcida da liberdade que
tiza a possibilidade da totalidade humana ofe- o apóstolo tão veementemente pregava. Con-
recida à humanidade na pessoa de Cristo. O quanto que obviamente chocado com essas duas
grande perigo pairando sobre a comunidade manifestações extremas, há evidência de que
cristã é pensar que sua resposta a Deus é al- Paulo esperava um certo grau de imaturidade.
guma coisa distinta da resposta de cada um Apesar de seu pensamento estar dominado
/
36 37
pela visão da comunidade ideal (que tentei
esboçar acima), nunca permitiu que isso tol-
das~e a co~~reensão da natureza humana que
havia adqwndo através de longa experiência.
Esta combinação de idealismo e realismo ex-
plica certas inconsistências de seu pensamento
II
mas sua integridade faz com que a verdad~
prevaleça sobre a lógica. Instintivamente sa- O VAWR CONTEMPORÂNEO
b~a q_ue hav:~a tensão entre a tendência ego- DAS LINHAS DE ORIENTAÇÃO
centr1ca do homem velho" e a adesão total DA MORAL PAULINA
aos outros esperada do "homem novo". É
por causa dessa tensão que apareceram proble-
mas morais e é nessa perspectiva que Paulo Do ponto de vista contemporâneo a ques-
desenvolveu a solução que veio a ser conheci- tão fundamental concernente às linhas de orien-
da como a sua teologia moral. tação, encontradas no Novo Testamento é a
sua autoridade. São preceitos impostos ao ho-
mem com o peso todo da autoridade divina,
ou são diretivas oferecidas ao homem para seu
uso? Em qualquer dos casos surge mais uma
pergunta: essas linhas de orientação, dadas
em circunstâncias especiais, há dois mil anos,
tem a mesma importância hoje? Estas per-
guntas podem ser respondidas apenas se apreen-
dermos o espírito em que Paulo pregou impe-
rativos morais, porque é a sua compreensão
do que estava fazendo que é normativa.

38 39
Por que imperativos morais? cei antes, mas particularmente pela passagem
que se segue da primeira carta que escreveu.
A tensão entre o "homem velho" e o "Finalmente, meus irmãos, nós suplica-
"hornem novo " se torna manifesta no para- mos e exortamos no Senhor Jesus, já que ouvis-
doxo de um individualismo completamente al- tes de nós como deveis viver para agradar a
truístico, porque, isto é, de fato, o que Paulo Deus, tal como estais fazendo, deveis fazê-lo
exigia de seus convertidos. Sua adesão a Cris- mais e mais. Porque conheceis as instruções
to era atingida em completo isolamento, atra- que vos demos através do Senhor Jesus. Por-
vés a mais solitária decisão que um homem que isto é o desejo de Deus - vossa santifi-
pode fazer - o ato de fé. Seu crescimento cação : que vos abstenhais da imoralidade; que
nessa adesão devia ser um desenvolvimento cada um de vós saiba como controlar seu pró-
pessoal intenso das possibilidades que Deus prio corpo em santidade e honra, não em pai-
dá a cada indivíduo. Apesar disso, sua aten- xão e luxúria como os pagãos que não conhe-
ção não devia nunca, nem por um momento, cem a Deus; - que nenhum homem transgrida
estar fixa em si mesmo. Todo o seu ser de- e engane seu irmão nesta matéria, porque o
via estar alerta para notar e atender às neces- Senhor é um vingador em todas estas coisas,
sidades dos outros. Este equili'brio exigia tal como nós solenemente vos avisamos. Porque
delicadeza e habilidade, que, no princípio, as Deus não nos chamou para a impureza, mas
quedas eram inevitáveis. Paulo estava total- para a santidade. Portanto, quem quer des-
mente consciente dessa possibilidade, e usou prezar isto, despreza não o homem, mas a
sua responsabilidade como líder, dando um Deus, que vos deu o seu Espírito Santo. Mas,
número de orientações práticas para ajudar o tendo em vista o amor fraternal que possuís,
discernimento daqueles cuja compreensão das não há necessidade que alguém vos escreva,
implicações da vida-em-Cristo ainda era im- porque vós mesmos fostes ensinados por Deus
perfeita. a amar uns aos outros, e, de fato, vós amais
Este enfoque utilitário das linhas de orien- vossos irmãos que há em toda a Macedônia.
tação das cartas paulinas é justificado, não ape- Mas nós vos exortamos, irmãos, para que
nas pela antropologia do apóstolo como esho- ' mais e mais, para que aspireis a uma
ameis
40 41

BI B LIOTECA
São Domingos
UBERABA - MG
vida calma, para tomardes conta de vós pró- a essência do ser-em-Cristo. O adultério é con-
prios, trabalhardes com vossas mãos como vos denado precisamente pela mesma razão. O
ordenamos, para que possais suscitar o respeito relacionamento pode ter uma dimensão pessoal,
dos estranhos e não dependerdes de ninguém" mas no fim cria divisão na comunidade. Por-
(1 Tes 4,1-12). tanto, ambas as linhas de direção negativas
Os imperativos contidos nesta passagem devem ser vistas como um esforço para impe-
são típicos daqueles encontrados alhures nas dir ao homem regressar a seu isolamento ego-
cartas paulinas. O que nos é oferecido é so- cêntrico, que é a feição marcante da vida sem
mente uma série de pistas; obviamente ne- Cristo.
nhum esforço é feito para cobrir totalmente Os imperativos positivos, ao contrário,
todas as possibilidades. O que é significativo destinam-se a dar uma expressão concreta à co-
é a relação entre essas linhas de orientação e -existência que é a vida-em-Cristo. É essen-
os dois modos de ser, descritos previamente. cial o controle nas relações pessoais; a preocu-
Há dois preceitos negativos: "abster-se da imo- pação pelos outros deve prevalecer sobre o de-
ralidade" e "ninguém transgrida e engane seu sejo de auto-satisfação. É muito significativo,
irmão nesta matéria" (isto é, adultério) . "Imo- em vista do que foi dito acima, que Paulo
ralidade" pode ser usada para qualquer espé- veja o egoísmo da paixão, como uma caracte-
cie de relações sexuais ilícitas; mas Paulo esta- rística do homem sem Deus. É inteiramente
va pensando sobre a fornicação casual que natural encontrar uma forte ênfase no amor,
caracterizava certos cultos pagãos, e a vida porque é o fator unificante da existência com-
nos portos do Leste Mediterrâneo. Assim, era partida. As admoestações para viver uma vida
manifestação visível do "pertencer ao mundo", calma e trabalhar sublinham o realismo de
e, tão penetrante, que Paulo viu nisso um exem- Paulo, porque o barulho e a falta de ocupa-
plo do poder do pecado que ainda podia al- ção são notadamente destrutivos da vida em
cançar e reter os seus convertidos. Essa for- comunidade.
ma de fornicação não tem qualquer profundi- Assim, vimos que as linhas de orienta-
dade pessoal; usa o outro como coisa. É, por- ção de Paulo - e esta lista é típica - são
tanto, a antítese da existência partilhada que é diretamente relacionadas com a sua idéia da

42 43
conversão como transição de uma forma de de ser sustentado que "a lei não é para o justo,
vida egocêntrica de existência para um modo mas para o pecador e desobediente" (Tim 1,
de existir dirigido para o outro. Sua função 9), isto é, que apresentando estes imperativos
era habilitar o cristão a entender o que lhe Paulo estava tentando corrigir elementos que
acontecera, e auxiliá-lo a interpretar a sua estavam perturbando a comunidade. A limi-
conversão em termos de vida prática. Em tação dos imperativos a situações especiais e
outras palavras, esses imperativos tinham uma localizadas é insustentável, porque Paulo tor-
função educativa. nou claro que essas linhas foram feitas antes
Esta interpretação é confirmada por ou- que qualquer perturbação aparecesse, e porque
tros aspectos do texto, e, notadamente, pelo acentua que não há nada de anormal na comu-
fato de que Paulo acentua que está apenas nidade de Tessalônica - "já aprendestes de
chamando a atenção de seus leitores sobre algo nós como deveis viver para agradar a Deus -
que já tinha pregado oralmente. Isto é impor- como estais fazendo, e deveis fazer mais e
tante porque exclui duas possíveis explica- mais".
ções do por que Paulo usou imperativos mo- O valor educativo desses imperativos é
rais. Primeiramente, não se pode dizer que mais acentuado ainda pela forma literária des-
a necessidade de linhas de orientação se apre- sa passagem. Não é um texto de legislação,
sentou a Paulo somente quando começou a per- mas uma exortação pastoral: "nós suplicamos
der a esperança de uma parusia eminente. e vos exortamos". A tradução fala de ins-
Nesta perspectiva, Paulo deu diretivas somen- truções, mas o termo grego - parangelia -.-
te quando se compenetrou de que a comuni- tem uma amplitude de significado que varia
dade cristã teria que existir por muito mais de "ordem militar" a simples "conselho". Tu-
tempo do que tinha, a princípio, antecipado; do leva a supor que aqui um significado mais
e que por isso, teria de ser mais institucionali- para o fim da escala deva ser preferido. -~ara
zada. Esta explicação é indefensável, porque, artistas que aspiram o alto, conselhos prattcos
quando Paulo escreveu esta carta, sua expecta- serão dados em forma de comandos chãos, os
tiva escatológica estava no auge da intensidade quais, desde que a experiência seja. adquiri~~·
(d. 1Tes 4,15-17). Em segundo lugar, não po- podem ser ignorados. Já me referi ao equilí-

44 45
brio delicado que envolve a busca do ideal suas diretivas como expressão privilegiada da
cristão. A frase qualificativa em itálico "ins- vontade de Deus?
truções que demos através do Senhor Jesus" A única passagem na qual a vontade de
provocou certo número de discussões en- Deus é mencionada em íntima relação com a
tre os exegetas. Todos concordamos, porém, série de diretivas é a secção de "1 Tessaloni-
que isso não sugere que Paulo acreditasse que censes" acima citada. Imediatamente prece-
os imperativos que se seguiam fossem reve- dendo o l.º grupo de diretivas, lemos: "Este
lados diretamente. O mais provável parece é o desejo de Deus, vossa santificação".
ser que o apóstolo usasse tal frase para acen- "Santificação" aqui traduz a palavra grega
tuar a importância da idéia por trás das linhas hagiasmos que também aparece na frase que
de orientação; a vida-em-Cristo era uma ques- resume o grupo de imperativos. Deus não nos
tão de adesão continuada em ação. Que Paulo chamou à impureza, mas à santidade ( 4,7) .
tanto insisµsse quando escrevia aos novos Isto nos permite estabelecer uma relação mui-
convertidos, não dá aos imperativos um valor to próxima entre a vontade de Deus e o "cha-
absoluto. mado"; a vontade de Deus é expressa no "cha-
mado" . O próprio " chamado" tem um valor
Obediência à vontade de Deus consistente, quase técnico, nas epístolas pauli-
nas. Designa a ação divina responsável pela
Das vinte referências à "vontade" divina
transição do homem de um inautêntico para
nas cartas paulinas, apenas sete têm remota-
um autêntico modo de ser. O "chamado" é
mente uma conotação ética. As outras passa-
gens se referem à vontade de Deus como so- feito através o evento-Cristo, e o ministério
berana, à vontade de Deus sobre Cristo, e à de Paulo. Daí não é surpresa que a vontade
vontade de Deus expressa em referência à mis- divina seja considerada como tendo que ver
são de Paulo como apóstolo. Obviamente é diretamente com Cristo e Paulo. Nunca, nas
importante tentar definir o que Paulo pensa- cartas paulinas, este " chamado" está relacio-
va do relacionamento (se havia) das suas di- nado diretamente aos imperativos morais, e
retivas com a vontade de Deus. Considerava não há razão para, aqui, se supor diversamen-

46 47

l
te. A vontade de Deus como expressa no "cha- Neste caso, os macedônios procuraram a
mado" se refere ao homem ser-em-Cristo. A vontade concreta de Deus por eles próprios.
função das diretivas é ajudar o homem a achar E isso não é um caso isolado. Paulo escreveu
modalidades concretas desse modo de ser. No aos colossenses - "nós não cessamos de re-
processo de transformar sua adesão (isto é, zar para que fiqueis plenos do conhecimento
resposta ao "chamado") em ação, o homem da sua vontade em toda a sabedoria e entendi-
está, de fato, correspondendo à vontade de mento espiritual" ( 1,9), e, na mesma carta, -
Deus, mas isto está muito longe de se dizer transmite uma mensagem de Epafras, que reza
que as diretivas precisas, dadas por Paulo, "para que permaneçais maduros e totalmente
devam ser identificadas com a vontade de assegurados em toda a vontade de Deus" ( 4,
Deus. 12). Ambos os textos implicam que Paulo
Um exemplo tornará isso claro. Escre- considera os colossenses capazes de atingir por
vendo aos coríntios, Paulo acentua que a de- si mesmos as normas de vida prática apro-
cisão dos macedônios de contribuir para o alívio priadas ao seu novo modo de ser-em-Cristo. O
da pobreza em Jerusalém foi de "sua própria fato de que ele não é contrário a ajudá-los neste
e livre vontade " ( 2Cor 8,3) . E continuando processo com um número de diretivas práticas
dá a entender que isso era em conformidad~
1

(d. 3,18), apenas acentua o realismo que an-


com a vontade de Deus ( v. 5 ) ; não há a me- dava emparelhado com sua confiança.
nor sugestão de que tal doação de esmolas A afirmação de que a vontade de Deus
fosse explicitamente comandada pela vontade tem que ver com a total soberania que Deus
divina. A base da sua dedução era sua visão tem sobre o homem, e assim fundamenta dire-
deste ato como manifestação de doação própria: tamente um modo de vida considerado global-
"eles deram-se ao Senhor e a nós" ( v. 5) , e mente, nasceu do que Paulo diz sobre "obe-
tal altruísmo era a característica fundamental diência". Este tema aparece freqüentemente,
do modo de ser ao qual a vontade divina leva mas de uma maneira que é desconcertante para
diretamente. O papel pessoal de Paulo em um leitor do século vinte. Se compararmos
tudo isso era simplesmente indicar uma pos- as duas afirmativas seguintes : "sua fé é pro-
sibilidade ( v. 8 ) . clamada em todo o mundo" ( Rom 1,8); e

48 49
4 • SI.o Paulo e a moral dos nossos dias
"sua obediência é conhecida por todos" (Rom Vanglória na Lei?
16, 19 ) , somos forçados a concluir que Paulo
concebia a "fé" primariamente como "obediên- Entretanto, devemos ir um pouco mais
cia". Fala até da " obediência da fé" (Rom além, porque há indícios de que Paulo repu-
1,5), isto é, a obediência que é fé. Concre- diaria fortemente a idéia de obediência ao que
tamente esta obediência é dada a Cristo ( 2Cor tencionava fossem simples linhas de orien-
10,5-6), ou ao Evangelho (Rom 10,16; Gál tação.
2,14;5,7), isto é, às expressões tangíveis do Durante o tempo que ficou com os gála-
" chamado" divino. " Obediência", portanto, tas, Paulo seguia seu costume de dar um núme-
é a resposta do homem à oferta de salvação de ro de orientações práticas para os que viviam
Deus. É uma atitude que comanda a maneira fora da conversão ("como vos preveni antes"
de ser total do homem. Paulo nunca fala de Gál 5,21 ). O que vimos, em lTes argüiria
obediência à vontade de Deus, presumivelmen- que eram sumárias e esquemáticas. Muito em-
te porque a obediência é uma atitude prática bora os gálatas encontrassem segurança nelas,
que ele prefere relacionar com a expressão tan- como Paulo desejava que encontrassem. Essa
gível da vontade divina no "chamado". Mais segurança, entretanto, servia apenas para dei-
significativamente Paulo nunca fala do homem xar mais claras grandes áreas de incertezas.
obedecendo à " lei" ou a um "mandamento". Isto pode parecer um pouco forçado; mas, é
A adesão do homem a Cristo em resposta ao difícil conceber qualquer outra hipótese que
amor de Deus é concebida como uma forma pudesse explicar a velocidade com que a pre-
de submissão, mas a determinação das modali- gação judaizante era aceita ("estou atônito
dades práticas dessa adesão é responsabilidade que deserteis tão rapidamente" Gál 1,16). A
do homem. O silêncio de Paulo pode apenas insistência dos judaizantes na necessidade da
ser tomado como acentuando este ponto. lei deve-se ter harmonizado com uma necessi-
dade psicológica da parte dos gálatas. Paulo
não se incomodava com a observância à dire-
tiva das leis; veremos que muitas das suas
tinham a mesma origem. A violência da sua

50 51
reação originava-se no medo de que a lei se o homem pode confiar nela para falar por ele
tomasse algo mais do que uma mera moldu- diante de Deus.
ra, na qual o amor pudesse se exprimir sem Nesta perspectiva podemos ver por que
tensão ou ansiedade demais. Suspeitava que Paulo fala da lei como causa de "morte" (Rom
as linhas de orientação estavam sendo entendi- 7,12). A lei causa "morte" tanto quanto aju-
das como preceitos, cuja origem divina garan- da o homem na sua fuga à responsabilidade.
tia o favor de Deus. Obedecer-se sem dúvidas, Para Paulo a inspiração da ação humana pode
perguntas ou pensamentos - era estar assegu- ser apenas o amor de Deus em Cristo e o ho-
rados da salvação. mem cresce, humanamente, assumindo o fardo
Paulo manifesta explicitamente isto em de decidir o que este amor exige nas múlti-
"Romanos " , que contem ' os fru tos maduros plas circunstâncias da vida diária. O homem
das reflexões inspiradas pela crise dos gálatas. nega efetivamente sua adesão se permite que
"Vós vos dizeis judeus e confiais na lei e vos uma diretiva moral carregue o peso da deci-
vangloriais da vossa relação com Deus, co- são, porque, fazendo isso, se esquiva da sua
nheceis a sua vontade e aprovais o que é exce- responsabilidade. É um dos paradoxos do pen-
lente porque fostes instruídos na lei" (Rom samento de Paulo, que enquanto o ser-em-Cris-
2,17-18). Um pouco depois, no mesmo pa- to é concebido como "obediência", a manifes-
rágrafo Paulo resume essa atitude como "van- tação prática desse modo de ser se caracteriza
glória" na lei ( v. 23). Este resumo é tam- pela "liberdade". É pela submissão a Deus em
bém um julgamento, porque vi.mos previamen- Cristo que o homem adquire liberdade, mas
te que "vanglória" é característica de vida inau- ele perde essa liberdade, se, em verdade, obe-
têntica. É um falso sentido de segurança, que, decer a alguém ou a alguma outra coisa.
neste caso, é baseado numa concepção defor- É por isso que encontramos uma tremen-
mada do papel da lei. Os preceitos são enten- da ênfase na realidade da liberdade cristã em
didos como sendo uma expressão adequada Gálatas. Paulo precisava sacudir sua falsa con-
da vontade de Deus, e então o homem pode fiança baseada na lei e este foi o único caso
se limitar, em sua resposta a Deus, ao que está em que invoca o peso total de sua autoridade,
ordenado na lei. Tendo assim cumprido a lei advinda da sua missão apostólica (Gál 1 e 2 ) .

52 53
Ele nunca apela à sua autoridade para refor- O Antigo Testamento - Alusões múlti-
çar as suas diretivas morais. A sua força se plas ao Antigo Testamento são encontradas
baseia na sua relação com o novo ser-em-Cristo nas partes de exortação. Um pouco mais de
do homem e Paulo se contentava se seus con- 40 % dos textos são tirados do Pentateuco e
versos entendiam isso, porque, em última ins- os outros 60 % estão igualmente divididos en-
tância, o peso da decisão era deles. Quando tre os Profetas (virtualmente sempre Dêutero-
muito os ajudava oferecendo diretivas que os -Isaías ) , Salmos, Provérbios e Sabedoria. Re-
forçavam a olhar mais profundamente neles sulta daí que a influência material do Antigo
próprios e assim, gradualmente, se tornavam Testamento sobre Paulo não pode ser ques-
capazes de distinguir um impulso originário tionada. O problema crucial é a maneira pela
da " carne" (hábitos vindos do seu período de qual Paulo utiliza esse material. A compara-
vida inautêntico) de um originário do "espíri- ção com os documentos de Qumrã e os trata-
to" (uma ação comandada por amor genuíno ). dos morais rabínicos revela que a atitude do
apóstolo era completamente diferente da dos
As fontes das diretivas de Paulo judeus seus contemporâneos, que obviamente
achavam as prescrições do Antigo Testamento
Paulo não inventou todas as diretivas en- "normativas" no seu sentido mais estrito. A
contradas em suas cartas. Muitas não são es- sua atitude ante o Antigo Testamento era de
pecificamente cristãs em seu conteúdo. Mes- completa obediência, a sua função era codi-
mo um rápido exame das fontes que usou, ficar e interpretar. Paulo, por outro lado, nun-
ilustram muito vivamente aquela atitude para
ca elabora ou dá uma interpretação casuística
com os imperativos morais que tentei descre-
a um preceito tirado do Antigo Testamento.
ver antes.
Portanto, é um grande exagero querer, como
Uso "fontes" aqui num sentido muito
amplo. O termo não é restrito a documentos um exegeta alemão fez , que o Antigo Testa-
literários dos quais pode ser provada a de- mento fosse considerado, por Paulo, como
pendência, mas a todas as tradições éticas que "uma coleção de normas divinas para a vida,
influenciaram o apóstolo. as quais são também válidas para os cristãos".

55
54
O uso que o apóstolo faz do Antigo Tes- crição na formulação da resposta que o even-
tamento, para fins éticos, não pode ser se- to-Cristo exige.
parado do seu uso em outros contextos. A O ensinamento de ]esus - O dom apelo
pre-suposiç.ão que guiou o seu uso do Antigo de Deus é focalizado e realizado concretamen-
Testamento é claramente expresso em "Roma- te na pessoa de Cristo. Durante sua vida Je-
nos" 15,4 : "o que quer que foi escrito nos tem- sus fez declarações que clarearam ambos os as-
pos de antes, foi escrito para nossa instruç.ão, pectos da sua missão, e W. D. Davies acha
para que pela firmeza e pela exortação enco- que "foram as palavras de Jesus mesmo que
rajadora das escrituras nós possamos ter es- constituíram a fonte primária de Paulo em seu
perança" (d. Rom 4,23-24; lCor 9,10; 10,6). trabalho como mestre de ética (Paul and Rab-
O Antigo Testamento é o registro da ação de binic Judaism, Londres, 1962, p. 136). Um
Deus na história, e assim nos dá uma moldura exame da evidência revela que o adjetivo "pri-
dentro da qual devemos entender a ação de mária" é um exagero. Somente umas doze alu-
Deus em Cristo, que é, ao mesmo tempo, dá- sões prováveis às palavras de Jesus podem
diva e apelo. Do mesmo modo que o Antigo ser descobertas e mesmo assim, seu conteú-
Testamento foi de tremenda utilidade no es- do não é tão singular para colocar uma defini-
forço de compreender o mistério da pessoa de ção genética definida, fora de qualquer dúvida.
Jesus, assim também contribuiu na tarefa de Se, porém, tomamos este número míni-
explicar o apelo que nada mais é do que a ou- mo como base de trabalho, um número signi-
tra faceta daquele dom. Em ambos os casos ficativo de fatos aparece. As alusões às pala-
as categorias do Antigo Testamento estão a vras de Jesus são encontradas misturadas com
serviço do dom-apelo; em nenhum caso elas outras exortações éticas, sem qualquer atribui-
expressam isso adequadamente. Como as cate- ção explícita para ressaltá-las. Desde que não
gorias de "Messias", "Filho do homem", " Sa- pode ser presumido que as diferentes audiên-
bedoria" eram apenas indícios do mistério de cias do apóstolo tivessem suficiente familiari-
Jesus, assim também as prescrições morais do dade com as palavras de Jesus para reconhe-
Antigo Testamento eram apenas lembrança e cer as alusões, devemos concluir que Paulo
orientação para serem usadas com grande dis- não pretendia apresentá-las como exigências
56 57
gozando de autoridade especial, porque pro- todos à paz" (!Cor 7,15; d. "Deus não é
vinham de Jesus. Como no caso do Antigo Deus de confusão, mas de paz" lCor 14,33)
Testamento o interesse do apóstolo não estava Paulo faz uma exceção: "se a parte não crente
na origem, mas na utilidade. deseja separar-se, deixai-a separar-se; nestas
Esta interpretação é confirmada pelo exa- condições o irmão ou a irmã não permanecem
me de um dos dois casos em que Paulo re- ligados" (!Cor 7 ,15). Nada é dito sobre
corre formalmente às palavras de Jesus. Isto novo casamento nessas circunstâncias, mas na-
ocorre na sua resposta a uma questão concer- da no contexto sugere que isso esteja excluído.
nente ao casamento, que lhe fora proposta O sentido natural de "não está mais ligado"
pelos coríntios: "aos casados eu ordeno, não é que nenhum laço permanece ligando os dois,
eu, mas o Senhor, que a esposa não se separe mesmo que estivessem realmente casados.
do seu marido, mas se ela o faz, que permane- Este incidente é extremamente ilustrati-
ça solteira ou se reconcilie com o marido, e o vo. Em primeiro lugar há o óbvio respeito
marido não se divorcie de sua mulher" ( 1Cor de Paulo às palavras de Jesus. Mais adiante,
7,10-11 ). no mesmo espírito, anuncia com tristeza:
A referência diz respeito às palavras de "eu não tenho instruções de Deus" ( v. 25).
Jesus concernentes ao divórcio e conservada Dizer que as diretivas morais encontradas no
em todos os sinóticos (Mt 5 ,32; Me 10,11- Novo Testamento são linhas de orientação e
12; Lc 16, 18 ) . São invocadas por Paulo não preceitos não quer dizer que possam ser
para corrigir a orientação daqueles coríntios ignoradas. Seu valor educativo se completa
que sentiam que a liberdade total era o único apenas quando são encaradas com a maior se-
estado apropriado para a sua existência esca- riedade. Este respeito, porém, não exclui, ao
tológica. A proibição é incondicional ( a cláu- contrário, exige, um julgamento crítico e pes-
sula de exceção em Mateus é uma adição tar- soal. Pode-se argumentar sobre a justificativa
dia), e devia-se esperar que a sua autoridade de Paulo para fazer a exceção; por exemplo,
fosse absoluta. Mas· esse não é o caso. Em já foi dito que simplesmente aplicava o prin-
virtude de um principio que ele também apli- cipio que os convertidos ao judaísmo perdiam
ca em casos de carismas "Deus nos chamou todos os laços com o passado, tornando nulos

58 59
os casamentos e as dívidas. O ponto é que se numa extensão muito maior do que se pen-
sentia livre para julgar criticamente um dito de sava antes. Não deve surpreender, portanto,
Jesus. Sem qualquer detrimento para a sua vali- notarem-se contatos em temas e terminolo-
dade geral como um ideal, decidiu que era irre- gia entre as diretivas morais de Paulo e o he-
levante para a situação concreta de um cristão lenismo. Nós já tivemos a ocasião de notar a
particular. Com a sua particular intuição c. frase "má companhia arruína a boa moral"
H . Dodd comentou : "Podemos ver cada um des- ( !Cor 15,33 ). Aparece primeiro em itálicos
ses preceitos (de Jesus ) como indicando, num (frag. 218 ) de Menander, mas, mais prova-
quadro dramático de uma situação atual, a velmente, chegou ao apóstolo sob forma de
qualidade e a direção que estará de acordo com provérbio popular, cuja origem ninguém sabia.
a medida dada pelo ágape divino" ( Gospel and A mais significativa dívida de Paulo para com
Law, Cambridge 1951 , p. 73 ). De um pon- o helenismo é o conceito de " consciência" que
to de vista a proibição do divórcio é uma afir- foi o primeiro a introduzir na tradição cristã,
mação da doação mútua, sem limites ou con- e que examinaremos mais tarde com por-
dições, que deveria caracterizar o ser-em-Cris- menores.
to. Mas num casamento em que a união é A influência helenística também aparece
mantida somente por uma força fora das duas claramente numa passagem de "Filipenses",
personalidades envolvidas, Paulo julga que não cuja terminologia se apóia grandemente no
há real (como oposta à teórica ) possibilidade vocabulário da filosofia popular da época.
de apreciação da existência compartida, que, " Tudo o que é verdadeiro, tudo o que é res-
para ele, é a essência do ser-em-Cristo. Aqui, peitável, tudo o que é justo, tudo o que é
de novo, descobrimos o realismo de Paulo, puro, tudo o que é amável, tudo o que é de boa
porque obviamente não pensa que o divórcio fama , se alguma virtude há e se algum louvor
seja a melhor solução ( cf. v. 16 ); ele está fa- existe, seja isso que ocupe vosso pensamen-
zendo uma concessão educativa à fragilidade to" ( 4 ,8 ) . Este é o conselho final da segun-
humana. da carta escrita por Paulo à sua comunidade
Helenismo - Agora é reconhecido que favorita (Flp 1,3; 3,1; mais 4,2-9 ) e a sua
o judaísmo se misturou com o meio pagão generosidade e confiança confirmam a crença

60 61
de que as linhas de orientação endeuzadas em nidades: " examinai tudo; permanecei fir-
imperativos morais foram dirigidas primeira- mes no que for bom" (1 Tes 5 ,21 ) . Ele res-
mente a cristãos imaturos. A caridade prática pondia e reconhecia a validade das aspirações
manifestada pela cooperação dos filipenses os do homem à totalidade fossem elas expressas
tirou desta classe. Nesta perspectiva é muito nos livros sagrados do seu povo, ou nos escri-
significativo que não haja nada de especifica- tos populares do mundo em que vivia. Suas
mente cristão nesta admoestação. Isto aponta diretivas morais são, portanto, a essência da
para o ideal compreensivo da paideia - bom sabedoria humana. Isto continua verdadeiro
gosto, sensibilidade, julgamento, desenvolvidos mesmo que devamos reconhecer que, para Pau-
pelas maiores inteligências da Grécia. Paulo lo, esta sabedoria tinha um valor utilitário e
não via incompatibilidade entre este ideal e as não absoluto. Ele a punha a serviço de Cris-
exigências do ser-em-Cristo. Isto não apenas to que é a um tempo, dom e apelo.
revela o seu humanismo, mas mostra melhor
o colorido fortemente teológico do seu retrato
do homem-sem-Cristo. Infelizmente não há
evidência suficiente para determinar se Paulo
pensava que apenas os cristãos tinham alguma
esperança de alcançar este ideal como comu-
nidade, mas estou inclinado a pensar que esse
sena o caso.
Esta breve apresentação revela a ampli-
tude das fontes de Paulo. O Antigo Testa-
mento, os ensinamentos de Jesus, a melhor mo-
ral secular de seus dias, tudo isso contribuiu
para as suas diretivas. Apesar disso não era
um discípulo cegamente obediente, nem um
rabino, nem um filósofo moral. Agia segun-
do um conselho que deu a uma de suas comu-

62 63
III
A IMPORTÂNCIA ATUAL DAS LINHAS
DE ORIENTAÇÃO DE PAULO

As cartas de Paulo eram documentos


" ocasionais". Não foram escritas pensando na
posteridade; mas, para ajudar comunidades de-
terminadas e achar soluções para seus proble-
mas. Vivemos num mundo diferente. Enfren-
tamos problemas com os quais o apóstolo nun-
ca sonhou. Terão as suas linhas de orienta-
ção, portanto, qualquer importância para nós?
Serão educativas somente no sentido em que
a história nos ensina, ou num sentido mais
imediato?
O que tem certamente valor perene em
Paulo é a sua intuição da maneira de ser-em-
-Cristo, porque isso nos dá uma resposta de
incomparável profundidade, a duas perguntas
fundamentais que cada geração deve se fazer:

65
5 • São Paulo e a moral doa nossos dias
o que quer dizer ser "humano", e o que quer uma mulher falar na Igreja" ( lCor 14,34-
dizer "viver em comunidade"? Seus impera- 35 ). Há uma probabilidade muito grande de
tivos retêm um valor imediato hoje, para nós, que esta última admoestação não venha da
no sentido de que se rdacionam com a sua mão de Paulo; um número desusado de feições
maneira de compreender uma vida cristã au- estilísticas sugerem que esta seja uma interpo-
têntica. Diretivas destinadas a desencorajar o lação post-paulina. Uma sugestão similar foi
egoísmo, e a encorajar um serviço desinteres- feita em rdaç.ão a " Romanos " 13,1-7; mas a
sado aos outros, tem um valor perene. São evidência não é convincente. Nessa secção o
tão importantes para nós como o eram para apóstolo define as relações do cristão com o
as comunidades paulinas. Não devem ser obe- Estado, e insiste numa completa obediência à
decidas cegamente, mas a menos que sejam en- autoridade civil, como matéria não somente de
caradas com a maior seriedade, o cristão se conveniência, mas de consciência. Finalmente,
arrisca a permanecer cego para as forças que Paulo insiste que os escravos não reclamem
operam dentro dde e é levado ao perigo de liberdade: "Que todos vivam a vida que o Se-
confundir intensidade com autenticidade. nhor lhes deu e para a qual o Senhor os cha-
Algumas das diretivas de Paulo não têm mou" ( lCor 7,17; d . v. 20 : " Era você um
esta relação imediata com a sua visão do ser- escravo quando foi chamado?" ) .
-em-Cristo. Em particular me ocorrem três, Não apenas estas admoestações refletem
que são suas diretivas concernentes às mulhe- o valor cultural dos julgamentos do primeiro
res, aos escravos e ao Estado. As mulheres de- século, mas, o mais importante, eram inteira-
viam se sujeitar completamente aos seus ma- mente condicionadas por uma perspectiva es-
ridos ( Col 3, 18 ) . As mulheres deviam ir ao catológica, que Paulo mesmo abandonou mais
culto com as cabeças cobertas ( 1Cor 11,5 ) , tarde. Quando deu essas diretivas o seu pen-
e "deviam guardar silêncio nas Igrejas" . Por samento estava dominado pela expectativa imi-
que não se permitia que falassem, "mas fos- nente da parusia. O tempo era curto, e a sua
sem subalternas como até a lei diz. Se deseja- preocupação era que os fiéis o usassem da me-
rem saber alguma coisa, que perguntem em lhor maneira possívd. Tentar mudar institui-
casa a seus maridos, porque é impróprio para ções sociais tão fundamente enraizadas na cons-

66 67
ciência cultural da época era uma perda de problema de como Paulo concebeu a formu-
tempo, desde que os cristãos tinham múltiplas lação de um julgamento moral cristão.
oportunidades de manifestar o seu ser-em-Cris-
to mesmo dentro da moldura social, que dis- Consciência
tava muito de ser ideal. Esta é precisamente
a atitude que poderíamos esperar de um rea- Características nacionais aparecem mais
lista como Paulo; sonhos utópicos não deve- claramente na Igreja de Corinto do que em
riam silenciar o apelo imediato do presente. qualquer outra comunidade. Não é preciso
No fim de sua vida, porém, o apóstolo aban- grande sensibilidade para sentir a intensidade
donou esta perspectiva de tempo e nós não a turbulenta da sua vida, a qual certamente de-
compartimos. Como cristãos, portanto, não po- via muito à exuberância e ao interesse espe-
demos empurrar para a periferia do nosso pen- culativo grego. Não sem razão isso provocou
samento tais instituições sociais, e porque de- problemas muito diferentes aos apresentados
terminadas diretivas de Paulo não têm rela- pela pessimista e basicamente céltica igreja da
ção com a essência do ser-em Cristo não po- Galácia. Os coríntios não só recusavam re-
demos ignorá-las completamente. Ele mesmo conhecer o valor das linhas de orientação de
insiste na relação íntima da autenticidade so-
Paulo, mas, para preservar o seu sentimento
cial e pessoal. Em sua mente as duas são in-
de serem livres, rejeitavam as convenções so-
separáveis.
ciais que tinham formado a sua experiência
Dizer que Paulo concebeu seus impera-
antes da conversão.
tivos morais como linhas de orientação e não
como preceitos no sentido estrito, realmente Essa atitude se manifestava em muitos
não nos leva ao âmago de sua teologia mo- setores diferentes da vida da comunidade, mas
ral, porque só serve para remover um mal en- Paulo elabora seu ponto de vista mais comple-
tendido. Para ser um cristão deve-se fazer tamente na discussão sobre a legitimidade de
mais do que fixar os olhos em um grupo de comer a carne que pertencia originalmente às
preceitos e permitir que eles motivem nossas vítimas oferecidas nos templos pagãos. Alguns
ações. Verdadeiro como é, isto deixa intato o membros da comunidade achavam que sim,

68 69
baseando-se em verdades especulativas tais dominante nas decisões práticas feitas pelos
como "um ídolo não tem existência real", " não "fortes".
há senão um só Deus" ( lCor 8,4), e "a terra O apóstolo reconhecia que a atitude dos
é de Deus e tudo que há nela" (lCor 10,26). "fortes" estava baseada num conceito errôneo
Eles se consideravam "fortes", se orgulhavam da liberdade cristã. O seu "slogan" era: "to-
do seu "saber" ( lCor 8,1) e na firmeza de das as coisas são lícitas para mim" ( 1Cor 6,
caráter ( = consciência) que isto lhes dava. A 12; 10,23) e Paulo achava isto simplista. A
pregação da filosofia popular criou uma distin- liberdade que caracteriza o ser-em-Cristo tem
ção entre os que seguiam sua própria consciên- dois gumes: é simultaneamente liberdade "de"
cia, e os que sem força de caráter, seguiam a e liberdade "para". As duas estão ligadas in-
opinião dos outros. timamente, mas no seu entusiasmo os coríntios
Paulo não acha errado que os "fortes" transferiram o caráter absoluto da primeira
tomem a iniciativa de fazer um julgamento mo- para a segunda. Para entender o erro que isso
ral um tanto delicado; tinham aceitado a res- envolvia, devemos recordar o que foi dito acer-
ponsabilidade da sua liberdade em Cristo. Nem ca do que Paulo pensava sobre as duas possi-
discorda da sua solução (1 Cor 1O,35 ) . Mui- bilidades abertas ao homem: a existência inau-
to embora, os condena como imaturos ( "crian- têntica é caracterizada pelo isolamento, e a au-
ças em Cristo"; lCor 3,1; "crianças em pen- têntica pelo compartir. No seu isolamento
samento"; 2Cor 14,20), porque se esquece- auto-imposto o homem está completamente ex-
ram de levar em conta um elemento importan- posto ao poder do pecado, aparente nas ten-
te da sua situação concreta. Seu gosto por dências sociais do seu meio. Ele fica liberto
altos princípios e sua alegria em aplicá-los a "do" poder do pecado entrando para uma co-
casos particulares, os cegavam para a presença munidade cuja existência é modelada pelo
dos membros "fracos" na comunidade, isto é, amor. Mas, para comprender esta nova liber-
aqueles que seriam tentados à uma linha de dade como liberdade "para" fazer o que se
ação pela confiança dos outros, mesmo contra queira, inevitavelmente força o indivíduo de
as suas próprias convicções. Paulo insiste que volta ao isolamento, porque isso é a negação
a provável reação dos fracos devia ser o fator da completa dedicação aos outros, que é a

70 71
dra de tropeço ou obstáculo no caminho de
essência do ser-em-Cristo. Absolutizando essa um irmão . . . Se um irmão se ofende pelo
liberdade o homem inevitavelmente a pérde. que comeis, não estais mais palmilhando o ca-
Isto foi precisamente o que os coríntios fize- minho do amor. . . Procuremos então o que
ram quando se fixaram em princípios com ex- nos dá a paz e a edificação mútua" (Rom
clusão das pessoas. Esse perigo Paulo assina- 14,13; 15,19). A liberdade pode ser perdi-
la, _colocando uma restrição ao "slogan" corín- da pelo exagero, nunca pela renúncia.
tio, "todas as coisas são lícitas para mim, mas O amor, portanto, tem proeminência so-
eu não serei escravizado por nada" ( lCor bre os princípios especulativos, não obstante
6,12). serem eles verdadeiros. A aplicação desses
A insistência de Paulo de que as neces- princípios não confere automaticamente ver-
sidades dos outros devam ser o elemento deci- dade à ação; Paulo estava inteiramente cons-
sivo na formulação do julgamento da cons- ciente do verniz de respeitabilidade que a ver-
ciência é firmemente sublinhada em outro ca- dade especulativa pode conferir ao amor pró-
pítulo onde ele de novo lembra o "slogan" prio. É o amor genuíno que dita a aplicabili-
coríntio "todas as coisas são lícitas para mim, dade dos princípios, e não os princípios que
mas nem todas as coisas constroem" ( lCor canalizam a expressão do amor. Apesar de
1O,23 ) . A liberdade "para" deve ser en ten- Paulo ter introduzido a noção de "consciência"
dida num contexto de comunidade; é a liber- na tradição cristã, não a inventou. O fato de
dade cujo exercício serve para reforçar os laços que ela aparece apenas na discussão da carne
que mantêm juntos os homens em Cristo.
dos ídolos em "Coríntios" e não numa discus-
Em outras palavras, esta liberdade é circuns-
são similar em "Romanos", indica que ele a
crita pelo "amor que mantém as coisas jun-
tirou da igreja de Corinto. A contribuição
tas em perfeita harmonia" (Col 3,1-4 ). Em
maior do apóstolo foi tirar a "consciência" do
Cristo é-se livre para amar, e o amor é real
apenas no serviço. "Que não se procure o primado a ela conferido, e a fazê-la subordina-
próprio bem, mas o bem do seu vizinho" da à preocupação de amor pela necessidade
( lCor 10,24 ). "Que nós não julguemos o dos outros.
outro, mas sim decidamos nunca pôr uma pe-
73
6 • São Paulo e a moral dos nossos dias
72
Renovação da mente ral por um atalho e de modo impessoal; a maçã
tem certas analogias com os princípios espe-
Para determinar a moralidade de · uma culativos pelos quais os coríntios tentaram
ação, a pergunta que o cristão se deve fazer evitar um processo laborioso de decisão mcr
não é "isto está de acordo com a verdade ou ral. De qualquer maneira, a alusão ao Gênesis
com a lei", mas "isto traz uma contribuição indica que a "verdadeira sabedoria" em ques-
positiva para ser-em-Cristo dos outros"? Para tão, aqui, é uma intuição moral; esta conclusão
responder adequadamente a essa questão, isto é confirmada pelo uso do mesmo termo em Col
é, para fazer um julgamento moral verdadei- 1,9 "que possais ser cheios do pleno conhe-
ramente cristão, é preciso ter uma intuição es- cimento da sua vontade em toda a sabedoria
pecial das necessidades dos outros, necessi- e entendimento espiritual". Como era exigi-
dades que podem ser muito profundas para do no discurso, isto é, expresso no plural, mas
ter uma expressão verbal. Paulo se refere a a possibilidade de uma dimensão mais prcr
esse conhecimento em várias ocasiões. funda é sugerida por 3,10. O conhecimento
O texto mais claro aparece em "Colos- que está sendo renovado não é o do fiel in-
senses": "Revesti-vos do homem novo, o qual dividual, mas o da entidade incorporada, "o
está sendo sempre renovado na verdadeira sa- homem novo", o Cristo total. A verdadeira
bedoria, de acordo com a imagem do seu Cria- intuição moral, portanto, é levada ao indivíduo
dor" (3,10; d. Ef 4,23 ). A última frase através da sua participação na comunidade.
indica claramente que Paulo pensava na narra- Este tema também aparece em "Roma-
tiva do Gênesis; o homem foi criado à seme- nos". "Não vos moldeis pelo mundo, mas
lhança de Deus, mas caiu por ter procurado a transformai-vos renovando o espírito para que
sabedoria do bem e do mal de maneira oposta experimenteis o que seja bom, agradável, per-
ao desejo de Deus. De acordo com o autor feito, qual seja a vontade de Deus" ( 12,2). A
do Gênesis, o pecado de Adão e Eva foi de dimensão comunitária não é tão clara nesta
desobediência a uma ordem divina explícita, passagem como no texto já discutido, mas é
mas é possível ver o erro dos primeiros pais significativo que enquanto todos os verbos es-
como um desejo de adquirir conhecimento mcr tão no plural "o espírito" está no singular.

74 75
Temos novamente o problema da unidade e nada" de Rom 1,28 é típica de quem é "mcr
da multiplicidade; de novo a unidade é pri- delado pelo mundo" ( Rom 12 ,2 ) . A carac-
mordial do ponto de vista de Paulo. Deve terística básica da inteligência desordenada é
ser notado, porém, que Paulo se importava a recusa em reconhecer Deus como Criador
com a unidade, não a uniformidade; não é uma ( 1,25); mas em concreto manifesta-se na "apro-
questão de todos os membros de uma comu- vação" ( 1,32 - o mesmo verbo é usado a
nidade chegarem precisamente ao mesmo jul- propósito da vontade de Deus em 12,2) de
gamento moral. A unidade é "da mente" e é ações altamente destrutivas da comunidade:
anterior a julgamentos particulares. Deve-se "cheias de inveja, assassínios, discórdia, dolo,
também prestar atenção ao fato de que, quan- astúcia; são murmuradores, caluniadores, so-
do fala de "mente", Paulo usa as palavras berbos, fanfarrões; inventores de maldades,
"sendo renovado" ( Col) e "pela renovação" insubmissos aos pais; insensatos, infiéis, sem
( Rom). Estas fórmulas querem dizer que a caridade, sem piedade ( 1,29-31 ) . A "inteli-
capacidade para fazer julgamentos morais acu- gência desordenada", portanto, é a que deli-
rados não é dada de maneira estática, mas sim, beradamente se isola de seus companheiros,
é alguma coisa que amadurece e se desenvol-
praticando ações que os aliena. Isto acontece
ve. Isto se encaixa perfeitamente com o que
se permite "ser moldada pelo mundo", adcr
foi dito anteriormente sobre o caráter educa-
tando os moldes de comportamento falseados
tivo dos imperativos morais de Paulo.
sob o domínio do pecado. Por contraste, a
Os comentadores já fizeram grande jogo
"inteligência que se renova" deve ser a que
com o contraste entre "não vos moldeis" e
"transformai-vos" em Rom 12,2, mas só Vic- progressivamente assimila os modos de com-
tor Furnish (Theology and Ethics in Paul, portamento próprios do ser-em-Cristo. Desde
Nashville - Nova Iorque, 1968, p. 130) pa- que ser-em-Cristo é uma existência partilhada,
rece ter advertido que esse versículo tem con- esta "inteligência" deve ser a consciência da
tatos significativos de vocabulário e conteúdo comunidade; e dela o indivíduo participa ser
com Rom 1,23-32. Este contraste é extrema- mente na medida em que se entrega ao Cristo
mente esclarecedor. A "inteligência desorde- total. Acentuar o individualismo e indepen-

76 77
dência do julgamento é evocar a "inteligência evidência de que tais manifestações devam
desordenada''. relacionar-se com problemas morais; e é difícil
aceitar esta atividade excepcional do Espírito
Amor e Conhecimento como ilustrativa do pensamento de Paulo.
Moule certamente modificaria sua conclu-
Num artigo intitulado " The New Testa- são se tivesse dado maior atenção a um
ment and Moral Decisions" (Expository Ti- texto onde Paulo se exprime, sem ambigüida-
mes 74, 1962-63, p. 370-373 ), C. F. D. - des : " É minha prece que seu amor possa
Moule acentua, corretamente, o aspecto co- abundar mais e mais com o verdadeiro conhe-
munitário da decisão da moral cristã- "olhan- cimento e todo o discernimento ( aisthêsis ),
do para o Espírito Santo através de Jesus para que possais aprovar o que é excelente"
Cristo significa algo mais comunitário e mais (Flp 1,9-10 ). O contraste com Rom 2,18
objetivo do que é geralmente sugerido pela ("aprovais o que é excelente porque fostes
luz interior" (p. 372 ). Mas, não está in- ensinados pela lei" ) põe em relevo a impor-
teiramente com a verdade quando tenta ex- tância desta passagem. Em ambos os textos
plicar como isso funciona na prática: "O é uma questão de "aprovação do que é exce-
órgão de percepção, através do qual se espera lente"; a palavra excelente traduz um implí-
que o Espírito Santo fale com linhas de orien- cito comparativo grego que quer dizer "as coi-
tação cristã característica, é a comunidade sas que de fato importam". Em Romanos, o
cristã em oração, ouvindo com espírito crítico" apóstolo critica o ponto de vista de que tal
(cada uma dessas palavras é vital para a de- intuição seja adquirida pela " instrução na lei";
finição). É difícil decidir se o autor preten- ela é desenvolvida apenas pelo crescimento em
dia ou não este tom categoricamente institu- "amor". Em outras palavras, o que a lei fez
cional; mas em todo caso, a opinião é bastan- pelo homem sem Cristo, o amor faz para o
te intelectualista para ser autenticamente pau- cristão.
lina. De "sendo dirigida pelo Espírito", Moule "Amor" neste contexto é inteiramente
pulou para a ação do Espírito em manifesta- indeterminado mas, no contexto geral do pen-
ção carismática (1 Cor 14 ) . Não há nenhuma samento de Paulo, engloba o amor a Deus e

78 79
o amor ao proxuno. A prece do apóstolo para ( aisthêsis ), a única coisa que pode compensar
que o amor cresça, corresponde à diretiva a falta de tal 'padrão racional' " ( Resumo de
"transformai-vos pela renovação do espírito" um tratado de medicina do IV.º A.C. )
(Rom 12,2 ), porque este amor se manifestará
" Discernimento", portanto, é mais intui-
no " verdadeiro conhecimento" e no " discer- tivo do que racional. É a qualidade instintiva
nimento". O conhecimento moral tem raízes das necessidades que não podem ser raciona-
no amor; e não ao contrário. " O verdadeiro lizadas. É a sensibilidade que dá a orientação
conhecimento" tem uma grande variedade de adequada em situações que resistem à análise
significados; já vimos uma clara conotação mo- puramente intelectual. Prolonga o " conheci-
ral em Col 3,10. " Discernimento" é mais mento verdadeiro" à área crepuscular onde não
limitado em significado; e, por isso extrema- há contornos nítidos, nem cores brilhantes.
mente significativo para nosso problema pre-
sente. Para Filão está intimamente ligado à Este é proeminentemente o domínio das
" mente", e freqüentemente, identificado com relações interpessoais. Sem tal " discernimen-
"consciência"; mas, para compreender seu sig- to" não pode o homem entender as implica-
nificado verdadeiro, é preciso recorrer a textos ções práticas do ideal ser-em-Cristo que Paulo
médicos, fonte original do conceito. tenta expressar na exortação " completai a mi-
nha alegria tendo a mesma mente, tendo o
"O doente pode ser prejudicado comendo mesmo amor, estando de pleno acordo e pen-
menos. Também pode ser prejudicado comen- sando o mesmo. Não façais nada por egoísmo
do demais. O verdadeiro médico é reconhecido ou vaidade, mas humildemente contai os ou-
por sua capacidade em estimar o que é apro- tros por melhores. Cada um tome conta não
priado para cada caso individual. Ele é o ho- só dos próprios interesses, mas também dos
mem que tem o julgamento seguro para esco- interesses dos outros" ( Flp 2,2-4 ) . Assim
lher a quantidade exata para cada um. Não há como o modo de ser dos cristãos é partilhar,
padrões nem peso nem medida, pelos quais se do mesmo modo o conhecimento moral neces-
podem fixar quantidades numa base geral. sário à sua continuação e desenvolvimento é
Isto deve ser feito, unicamente, por intuição resultado de uma experiência comum de amor;

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ele é alcançado "vivendo a verdade no amor" o amor como o fator chave no discernimento
(Ef 4,15) . Para ser verdadeiro cristão é imen- moral, continuou a dar diretivas morais que
samente mais importante aprender como amar eram uma educação de como amar. O amor
do que aprender o que a lei manda. A intui- verdadeiro contém um impacto inconfundível;
ção é adquirida através da reflexão sobre a mas, na medida em que é muito fácil de ser
experiência vivida; não através de estudo reconhecido nos outros, apresenta sempre a
de uma série de preceitos. A " mente" possibilidade de autodecepção quando usado
do Cristo total não é formada primeiramente como critério de nossa própria atividade. Pau-
por conhecimento. Paulo mesmo insiste "ten- lo bem sabia que a intensidade de um impulso
de entre vós a mente que estava em Cristo não é garantia de sua autenticidade. A intui-
Jesus" (Flp 2,5); e quer significar com isso a ção tem suas raízes no amor, e deve ser afinada
mente animada pelo amor que levou Jesus a para que o fiel possa distinguir o impulso ge-
se esvaziar, e "tomar-se obediente até a morte nuíno do "espírito" e o que provém da " car-
e morte de cruz" ( v. 8). Aqui temos o pa- ne". É para este fim que Paulo dirige suas
radoxo de que dar é receber, e do amor que diretivas que são destinadas a servir a uma
é obediência. dupla função. Por um lado, intensificam a
Paulo não atenua a complexidade do dis- consciência dos fiéis sobre o caráter partilhan-
cernimento moral. Da maneira pela qual vol- do de sua existência; e, por outro, alertam-
ta ao problema uma e outra vez, pode-se per- -nos contra o perigo de cair novamente no iso-
ceber que está preocupado com uma realidade lamento egocêntrico. Paulo achava necessário
sutil que lhe escapa sempre. A declaração ma- ao fiel amadurecer dentro da estrutura das di-
dura, "Filipenses" 1,9-10, é a que mais perto retivas. Tomá-las a sério, mas sem subser-
chega de uma definição clara; mas, mesmo viência era o fator principal para levar à ma-
assim, conserva uma imprecisão que ainda nos turidade o amor que, sozinho, dá o discerni-
deixa na insatisfação. É , porém, nesta situa- mento adequado em uma situação moral.
ção, que nos tomamos vivamente conscientes Somente o amor de um adulto em Cristo
do gênio inventivo de Paulo. Enquanto luta- dá a intuição adequada numa situação moral,
va até o ponto em que foi capaz de apontar porque aquele amor desenvolveu-se num par-

82 83
tilhar contínuo que o fez inteiramente apto
para responder ("obediente" ) ao apelo de
Deus expresso nas necessidades do Cristo
total.

!NDICE
Pág.

5 Introdução

9 1 . AS OPÇOES HUMANAS
13 O homem sem Cristo
14 O poder do pecado
17 Isolamento egocêntrico
25 Viver de acordo com a carne
26 Homem em Cristo
29 Ser-com.outros
33 Liberdade
36 Comunidade cristã

39 2 . O VALOR CONTEMPORÂNEO DAS LI-


NHAS DE ORIENTAÇÃO DA MORAL
PAULINA
40 Por que imperativos morais?
46 Obec:üência à vontade de Deus
51 Vanglória na Lei?
54 As fontes das diretivas de Paulo

65 3. A IMPORTÂNCIA ATUAL DAS LINHAS


DE ORIENTAÇÃO DE PAULO
69 Consciência
74 Renovação da mente
84 78 Amor e conhedmemo
,

Impresso na gráfica das Edições Paulinas, 1972


Via Rapóso Tavares, km. 18,5 - 01000 São Paulo

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