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William Canton
A Chuva de Rosas
A Profecia de Klingsohr
Era o inı́cio do sé culo XIII, o meio-dia da Era da Fé . O povo cristã o vivia
tã o perto do invisı́vel quanto do mundo visı́vel. Os misté rios da religiã o
e a ocorrê ncia de milagres nã o deviam ser questionados mais do que a
realidade da montanha - rocha e loresta - á rvore. Os homens
acreditavam intensamente. O sangue ı́gneo de raças semibá rbaras pode
levá -los a ataques de loucura, mas o pecado in lamado ou o crime cruel
era seguido por jejum, oraçã o e torrentes de lá grimas, e talvez expiado
por um açoite pú blico na porta da igreja.
Nesse momento, a cristandade ocidental estava passando por uma
imensa transformaçã o. A velha ordem social estava se rompendo pela
vontade de um potentado que empunhava a espada deste mundo e
possuı́a as chaves do pró ximo. A Cruz Vermelha emancipou o burguê s e
o servo dos campos, libertou o devedor, libertou o criminoso, absolveu
o vassalo dos serviços prestados ao seu senhor feudal. Do sonho
cavalheiresco de entregar o Santo Sepulcro, os grandes nobres da
Europa despertaram para a percepçã o de que as propriedades
principescas haviam sido empobrecidas; vastas extensõ es de terra
mudaram de propriedade; comerciantes, mercadores e agiotas
acumularam enormes lucros, e a Igreja enriqueceu
enormemente. Ofuscando esse declı́nio do poder baronial e a
conseqü ente expansã o do governo real estava o crescimento da
supremacia papal.
Riqueza e luxo eram talvez inevitá veis em um sistema que reivindicava
suserania polı́tica sobre os reinos da terra, mas multidõ es de crentes
devotos se voltaram em desespero do esplendor do mundanismo que
desacreditou a Igreja. Sã o Bernardo, em seu tempo, gemeu em espı́rito
pelos "dias antigos, quando os apó stolos lançavam suas redes em busca
de almas humanas, nã o de ouro ou prata". Agora o protesto assumiu a
forma de numerosas heresias; mas a força que estava por trá s do
descontentamento, a obstinaçã o, a revolta dos hereges era uma crença
ardente, embora nã o escolarizada, e um anseio pela regra simples que
Nosso Senhor ensinou nas encostas das colinas da Palestina. Os Pobres
de Lyon expressaram da maneira mais iel o clamor geral dos alienados
por reforma, e em pouco tempo o retorno à s pegadas de Cristo que eles
contemplavam foi realizado com resultados mais felizes pelo Pobre
Homem de Assis e seus Frades Cinzentos.
Até agora podem-se indicar essas fases das grandes
transformaçõ es. Outros foram afetados por agitaçõ es e impulsos que
escapam ao nosso questionamento. O surgimento de uma nova alegria
na religiã o é um dos misté rios da experiê ncia. Foi como se as janelas do
cé u tivessem se aberto e um espı́rito de mú sica edi icante tivesse
soprado sobre a Europa e encontrado expressã o em muitas formas de
expressã o. Os mestres construtores sentiram e, sob suas mã os, a pedra
acelerada pegou a poderosa curva das asas sera ins e se elevou até o
arco pontiagudo, incendiou-se em torres trê mulas, expandiu-se em
galerias aé reas repletas de imagens lı́ricas. O amor, algué m poderia
dizer, expulsou o medo; os homens até entã o nesta era tinham
propiciado a Deus, agora eles O louvavam.
O espı́rito da mú sica despertou os trovadores e os trovadores. A
Provença se tornou a lor de uma literatura alegre e sensual. Entã o a
Alemanha tocou com o é pico heró ico, e riu e brilhou com a mú sica dos
Minnesingers. Nunca houve uma tubulaçã o tã o universal. A primavera,
com folhas verdes, lores e pá ssaros, veio como um visitante angelical, e
o camponê s do sulco teve um deleite consciente com a Natureza. Mas
no coraçã o sonhador do menestrel alemã o, Love nã o se contentava com
as cores doces da beleza humana; assumiu a aparê ncia de um anseio
mı́stico indescritı́vel e revelou-se por im como o "forte Filho de Deus".
E assim como Sã o Francisco percebeu na prá tica o ensino da sagrada
pobreza que havia sido antecipado por Waldo, o comerciante de Lyon,
també m, muito antes da morte de Isabel, ele inconscientemente
mesclou e espiritualizou tudo o que havia de mais puro e belo na
alegria lı́rica de Troubadour e Minnesinger. Ele també m, e seus
seguidores, eram menestré is errantes - "bardoiros de Deus" - cantando
cançõ es de tranquilidade e amor nas cidades e vilas, nos campos, nos
olivais e nos vinhedos da Umbria e das Marcas.
Como o Trovador, ele amava a mais bela das mulheres - pois o que mais
era minha Senhora da Pobreza? A serenata provençal deu uma emoçã o
româ ntica ao crepú sculo de verã o; Sã o Francisco sorria da feliz ideia
que isso sugeria e, a partir do pô r-do-sol, em todas as estaçõ es do ano,
a Ave Maria lutuava docemente sobre a colina e o vale com todos os
sinos da capela.
Será que o Minnesinger teve um prazer recé m-nascido em bosques,
á guas e prados loridos, e observou com olhos bondosos o jogo alegre
de pequenas criaturas selvagens? Sã o Francisco elevou seu sentimento
pela Natureza a um nı́vel sem precedentes de simpatia espiritual, e com
ele a simpatia esteve sempre ligada ao serviço prá tico. Ele implorou a
seus companheiros que guardassem um terreno para as lores de suas
irmã zinhas; fornecer mel e vinho para as abelhas quando chegasse o
inverno; para espalhar comida para os pá ssaros, especialmente para
"meu irmã o Lark". A tenda que um pescador deu a ele, ele colocou de
volta no lago, ordenando que ele amasse a Deus. "Por que você
atormenta meus irmã os mais novos, os cordeiros", perguntou ele,
"carregando-os amarrados e pendurados em um cajado para que
chorem lamentavelmente?" e deu sua capa para resgatá -los. O pró prio
lobo era seu bom parente, e em sua Cançã o do Sol ele reuniu no seio
feliz de um amor mundial todas as coisas criadas e a Irmã Morte.
Até mesmo a inspiraçã o dos construtores de catedrais foi elevada em
sua vida a um nı́vel mais alto. Louvor e bê nçã o deixavam pouco espaço
para a oraçã o se ajoelhar. O opressivo senso de pecado, a consternaçã o
do julgamento, o terror da condenaçã o foram consumidos no fogo de
um amor será ico, e toda a alma do homem subiu para o cé u
trans igurado, um templo vivo de Deus.
Tais eram, em um vislumbre, o aspecto e a tendê ncia da é poca.
Na recepçã o universal que saudou os Minnesingers, Hermann,
Landgrave da Turı́ngia, destacou-se entre os prı́ncipes por seu
entusiasmo e muni icê ncia. O mais brilhante dos novos poetas
frequentou sua corte. Lá você deve ter conhecido Wolfram von
Eschenbach, construtor das sagas heró icas de Parzival e Titurel , e
Walther von der Vogelweide, doce e prolı́ ico laureado da Escola do
Amor. O Wartburg, ultrapassando os altos bosques acima de Eisenach,
foi revestido com a gló ria do verso; e das competiçõ es lı́ricas realizadas
em seu nobre sangersaal cresceu a lenda poé tica de "A contenda dos
menestré is".
A mais famosa dessas competiçõ es ocorreu em 1206. Havia seis
competidores, e tã o aguçada, dizem, tornou-se a luta e tanto acirrou a
rivalidade, que o condenado foi convocado a aguardar com sua corda e
imediatamente balançar o malsucedido concorrente para a á rvore mais
pró xima. Aquele inal trá gico para uma festa de madrigais, cançõ es de
lores e elogios era possı́vel em uma é poca em que as pessoas pouco
davam conta de tortura e mutilaçã o. Henrique VI nã o havia acabado de
condenar os conspiradores sicilianos contra seu trono a assentos de
fogo e coroas em brasa? Frei Dietrich, no entanto, nada sabe sobre um
condenado mascarado e um galho de forca verde, e simplesmente
registra que a competiçã o foi suspensa antes do encerramento, e que
Klingsohr, o mestre de todas as artes musicais, foi enviado pelo
Landgrave para julgar entre os menestré is.
Assim aconteceu que, em uma tarde de verã o do ano de 1207, uma
imponente companhia de viajantes entrou na pequena cidade murada e
cinzenta de Eisenach e desceu na bela estalagem, com sua madeira
entalhada e frontõ es coloridos, perto do Portã o de Sã o Jorge.
O Mestre Klingsohr veio da Transilvâ nia, a terra dos Sete Castelos como
aquela parte da Hungria era chamada; foi o mais erudito e engenhoso
dos homens; versado em letras e ciê ncias desde a juventude, nã o menos
há bil em necromancia e na sabedoria obscura dos cé us estrelados. Para
isso ele era amigo do rei Andreas da Hungria e uma pessoa de renda
principesca. A lenda dos tempos posteriores o converteu em um
poderoso mago; estudiosos modernos o consideram um mito. Dietrich
viveu perto o su iciente da é poca para saber algo sobre a verdade do
assunto.
No frescor da noite, quando o brilho do oeste desapareceu da loresta e
as cegonhas izeram ninho, prı́ncipes, cortesã os e os cavaleiros
menestré is desceram de Wartburg para dar-lhe as boas-vindas; e
enquanto ele conversava com eles no jardim do meu an itriã o Heinrich
na amena noite de verã o, ele olhou para os labirintos brilhantes lá em
cima. Algo no aspecto dos cé us pareceu prender sua atençã o. Ele olhou
atentamente e o silê ncio caiu sobre o grupo de visitantes. Por im, um
deles aventurou-se a interromper sua abstraçã o: "Rezamos a você por
sua cortesia para nos dizer que segredo das coisas por vir você leu
nessas estrelas misteriosas."
O hú ngaro olhou para eles com um sorriso sé rio. "Já que você
perguntou", disse ele, "saiba que esta noite nasceu uma ilha do rei da
Hungria. Seu nome será Isabel. Santa ela será . Ela será dada em
casamento ao ilho deste prı́ncipe - levantando seus olhos para as
alturas escuras de Wartburg - e toda a terra se regozijará e será
exaltada na fama de sua santidade. "
E, de fato, naquela noite de verã o, como se pode facilmente acreditar
em Presburg ou na velha cidade de Saros-Patak, pois nenhum registro
autê ntico de data ou local foi preservado uma pequena donzela nasceu
de Andreas, rei da Hungria. Pode-se imaginar com que espetá culo de
clero e esplendor magiar e alegria a criança foi carregada para a fonte e
recebeu o nome de Elizabeth; mas ela era a terceira ilha do rei, e o
rumor desses incidentes di icilmente poderia ter viajado com o vento
ocioso atravé s da Austria e da Boê mia até Wartburg. Lá , sem dú vida,
eles eram conhecidos quase imediatamente apó s terem acontecido e,
estranhamente, o curso dos eventos começou a correr normalmente em
direçã o ao cumprimento da previsã o.
A contenda dos menestré is chegara a uma conclusã o feliz, e Mestre
Klingsohr cavalgou pela loresta para a terra dos Sete Castelos,
possivelmente com a certeza de ter cumprido uma missã o mais
delicada do que o julgamento de concursos poé ticos. O mestre cantor e
astro leitor també m era um diplomata astuto? Que motivos polı́ticos
poderiam ter levado Andreas a oferecer ou Hermann a buscar uma
aliança estreita com a Hungria? Dietrich ignora esses
assuntos; Klingsohr desaparece no desconhecido; mas é certo que
dentro de alguns meses a princesa Elizabeth, ainda um bebê no peito,
foi prometida ao ilho mais velho do Landgrave.
No antigo castelo alto de Presburg, com vista para as extensõ es
ensolaradas do paı́s e as amplas á guas do Danú bio, a pequena criatura
teve uma infâ ncia encantadora. Ela era alegre e alegre, de coraçã o terno
e compassiva, dada a todos os tipos de gentilezas divertidas e belas
devoçõ es; mas, alé m do mais, suponho, um pequeno mortal bastante
simples e saudá vel, nã o sem falhas de obstinaçã o e outras falhas
infantis. Santidade é uma conquista da vontade, nã o uma e lorescê ncia
de temperamento.
Olhando para trá s muito tempo depois, as pessoas devotas viram
aqueles primeiros anos atravé s do glamour de sua santidade. Eles se
lembraram de que no nascimento dela uma é poca mais feliz começou
para a Hungria, e parecia-lhes que, mesmo em seu berço, o bebê
inocente, caı́do como uma lor do Paraı́so, trouxera paz e boa vontade à
terra. Se eles se lembrassem da memó ria de seus grandes ancestrais,
era natural, pois no sangue de Arpad havia uma mistura de heroı́smo e
santidade, e as iguras mais gloriosas nos primeiros cem anos da
histó ria da Hungria como naçã o cristã eram reis canonizados. Até hoje a
mã o embalsamada de Santo Estê vã o é carregada em procissã o, e os reis
dos magiares sã o coroados com seu diadema "apostó lico"; e a lenda
ainda conta como, dois sé culos e meio apó s sua morte, Santo Ladislas se
levantou de sua tumba em Grosswardein, montou no cavalo de sua
está tua de bronze e derrotou os tá rtaros.
Sobre Andreas, Dietrich tem pouco a dizer. Ele o menciona como ilustre
por sua riqueza e poder, um homem bom e pacı́ ico. Virtuoso, piedoso,
irrepreensı́vel em seu governo, acrescenta o velho rima alemã o da Vida
mé trica; e passa a representar com as cores do romance a descoberta
de inesgotá veis minas de ouro nas montanhas e a generosidade com
que Andreas usou suas maravilhosas riquezas na construçã o de igrejas
e na fundaçã o de mosteiros. Nos escritores modernos, entretanto, nó s o
encontramos diante de nó s com toda a graça e integridade de um
soberano ideal, uma lor dos reis, cavalheiresco, generoso, santo, a
gló ria da religiã o e o deleite de seu povo. A luz fria da histó ria, a pessoa
sai dessa delineaçã o desencantada e arrependida.
O pai de Andreas, Bela III, morreu antes que pudesse realizar seu sonho
de desferir um golpe para resgatar o Santo Sepulcro. Ele acumulou um
tesouro considerá vel para esse propó sito, mas na abertura da Terceira
Cruzada, quando Barbarossa marchou pela Hungria para o Oriente, ele
nã o pô de fazer mais do que dar as boas-vindas ao imperador e ajudar
suas tropas no caminho. Em seu leito de morte, Bela entregou o cetro
ao ilho mais velho, Emeric; seu tesouro ele con iou a Andreas e rogou-
lhe que o empregasse em seu favor na entrega da Terra Santa. Assim
que o rei foi colocado em sua sepultura, Andreas reuniu um grande
exé rcito; mas o poder e os recursos que deveriam ter sido dedicados ao
serviço da Cruz Vermelha foram usados para lançar seu irmã o do
trono. Emeric foi derrotado, as provı́ncias foram invadidas e Andreas se
proclamou supremo sobre grande parte da Hungria. Em vã o o rei
apelou ao papa Inocê ncio III para que insistisse em que Andreas
cumprisse o voto de seu pai. O rebelde bem-sucedido continuou sem
controle em sua maldade e contumá cia. Por im, em 1198, os irmã os se
encontraram em armas nas margens do Drave, e ocorreu um dos
episó dios mais estranhos registrados nas crô nicas magiares.
O acampamento de Andreas ressoou com a carni icina de um grande
exé rcito con iante na vitó ria. Emeric sentou-se desanimado entre seus
partidá rios galantes, mas desesperadoramente em menor nú mero. De
repente, ele se levantou em silê ncio e saiu sozinho, coroado, com o
cetro e vestido ré gio. Ele entrou no acampamento hostil, dirigiu-se à
tenda de seu irmã o e partiu abruptamente ao ver os chefes
festeiros. "Deixe-me ver o homem", disse ele, no silê ncio de espanto que
se seguiu ao seu aparecimento, "que ousa levantar a mã o pecaminosa
contra seu rei e senhor." Avançando para o trono, ele agarrou as mã os
do irmã o, conduziu-o atravé s do bando de rebeldes, que parecia
transformado em pedra, e o levou prisioneiro para seu pró prio
acampamento. "Tal divindade protege um rei!"
Por quase seis anos, Andreas permaneceu em cativeiro. Entã o, quando
Emeric sentiu que seu pró prio im se aproximava, ele mandou coroar
seu ilho Ladislau como seu sucessor, libertou seu irmã o, perdoou-lhe
sua deslealdade e entregou a criança à sua tutela. Andreas falhou em
sua con iança. A criança foi despojada da pró pria aparê ncia de
soberania e banida com sua mã e da corte de seu protetor. Com sua
morte, alguns meses depois, Andreas assumiu a coroa de Santo
Estê vã o. O ano era 1205, e a Idade de Ouro que em tempos posteriores
o bebê Elizabeth teria trazido com ela para a terra foi o im das lutas
civis, o renascimento da prosperidade com o retorno da paz e os gastos
deslumbrantes de um rei que se deleitava com a pompa do estado e
pró digos benefı́cios pela causa da religiã o. Os homens dessa idade nã o
devem ser julgados por nossos padrõ es, mas olhe para Andreas sob
qualquer luz que possamos, nã o podemos considerá -lo um sucessor
digno dos santos coroados de sua linhagem.
Sua esposa Gertrude era da ilustre casa ducal de Merã e Dalmá cia, que
traçava uma descendê ncia direta de Carlos Magno. De seus irmã os,
Egbert era bispo de Bamberg e patriarca Berthold de Aquileia. Sua irmã
Hedwige casou-se com Henrique, duque da Silé sia, viveu e morreu em
santidade e foi inscrita entre os santos. O casamento de sua
irrepreensı́vel irmã Agnes com Filipe Augusto da França foi a causa de
uma luta amarga com o Papa, durante a qual o reino francê s foi
interditado. Sua irmã Mathilda tornou-se abadessa do grande convento
da Francô nia de Kitzingen, e nos encontraremos por um momento no
decorrer desta histó ria.
A pró pria Gertrude parece ter herdado muitas das qualidades distintas
que izeram de sua casa uma das mais poderosas e ilustres da Europa. A
uma notá vel amplitude de intelecto, ela acrescentou extraordiná ria
coragem, decisã o e rapidez de açã o. Sua beleza e força de cará ter
dominaram completamente o rei; e se ela tivesse vivido, o belo,
arrojado e irresoluto Andreas poderia ter encontrado nela os dons e
virtudes de que precisava para um reinado tranquilo e
pró spero. Infelizmente, um erro fatal neutralizou sua capacidade de ter
um governo bem-sucedido; ela parece ter feito pouco esforço para
conquistar o amor dos hú ngaros. Ela se cercou de seu pró prio povo, e
seu favoritismo e patrocı́nio extravagante levaram a uma separaçã o
desastrosa da nobreza magiar.
Trê s anos se passaram rá pida e felizmente para Elizabeth. Naqueles
dias longı́nquos, e em todos os sé culos do mundo, a infâ ncia foi a
mesma idade estranha e encantadora de descobertas e aventuras de
agora. O despertar para a percepçã o, as alegres surpresas da visã o, do
som e do tato sã o coisas que escapam aos registros, mas estã o na base
do inı́cio do cará ter. Nos jardins do palá cio, nas altas muralhas
ensolaradas, nas longas galerias, brilhando com armas lendá rias e
armaduras de malha, ou parecendo quase vivas com as imagens e
está tuas de heró is que partiram, nas janelas com vista para o grande
pá tio onde tropas de cavalos e O pé encheu o mundo com o choque e
tilintar de ferro e o esplendor de bandeiras e equipamentos de guerra,
cada dia deve ter sido repleto de magia e milagre sempre
renovados. Em seguida, havia a rica capela bizantina do castelo, com
seu profundo silê ncio e luz multicolorida, na qual, sem dú vida, quando
ela já tinha idade su iciente, veio a ela aquelas estranhas visitas do
invisı́vel que tantas vezes acontecem à s crianças alegres em seus
momentos de melancolia; e lá , em meio aos afrescos escuros e belas
imagens, ela localizou e deu forma e um signi icado pró prio, como
fazem as crianças, ao que ouvira no colo de sua mã e do cé u e dos anjos,
e de Deus e da santidade.
Foi a essa é poca que a lenda anexou o belo incidente do divino Menino
de Nazaré participando da peça simples de Isabel.
Como companheiros terrenos, ela tinha os ilhos da corte, alé m de sua
irmã Marie e a cavalheiresca Bela, que um dia seria um verdadeiro rei
de Arpad. Os severos chefes guerreiros davam muito valor à criança
amigá vel e, quanto a Andreas, ela era "a luz de seus olhos e a alegria da
vida". Com a rainha e as grandes damas, a relaçã o afetuosa era
combinada, mesmo naqueles anos, com um cuidadoso treinamento nas
majestosas graças e graves cortesias da realeza.
Aproximando-se o tempo em que, de acordo com o costume da é poca, a
princesa deveria ser con iada aos cuidados da famı́lia de seu futuro
marido, pai e mã e devem ter tido muitos pensamentos de ansiedade e
momentos de tristeza. A aliança era uma das mais brilhantes, a
perspectiva era clara, mas separar-se do pequeno ser vencedor, para
con iá -la tã o jovem e indefesa ao encargo mesmo daqueles que nã o
podiam deixar de amá -la e tratá -la com carinho, apertou seus coraçõ es,
e Elizabeth deve ter olhado muitas vezes perplexa e meio assustada
quando se viu agarrada e pressionada em seus braços em meio a uma
explosã o de lá grimas. Talvez, també m, a lembrança de outra criança por
quem nem mesmo as oraçõ es de um irmã o pudessem garantir proteçã o
ou piedade pode ter afetado Andreas com remorso e apreensã o.
No verã o de 1211, uma imponente embaixada de grandes senhores e
nobres damas, entre os quais devemos lembrar apenas o chefe, o conde
Walther von Varila, o copeiro do Landgrave, saiu de Wartburg para
escoltar a princesa até sua nova casa. Em Presburg eles foram recebidos
com a realeza, entretidos por trê s dias em majestosos serviços
religiosos, jogos marciais, danças, menestré is e festas alegres, e em sua
preparaçã o para retornar foram carregados com presentes
magnı́ icos. Vestida de seda bordada com prata e ouro e reclinada em
um berço de prata, Elizabeth foi entregue por sua mã e à s damas da
Turı́ngia. "Diga ao seu bom prı́ncipe", disse ela, "que rogo-lhe que esteja
bem e tenha alegria, porque se o Senhor me der a vida, amontoarei
riquezas sobre ele."
Alé m do dote real que seria levado ao Landgrave, o rei deu seis cavalos
magnı́ icos para o uso da criança, e a rainha Gertrudes enviou com seus
vasos de ouro e prata muitos e maravilhosos; os mais preciosos
diademas, ané is, colares e cintas de joias; um banho de prata, inú meros
vestidos e almofadas, travesseiros e colchas de seda roxa. Coisas de tal
custo e beleza como essas que a Rainha esbanjou em sua ilha nunca
tinham sido vistas na terra da Turı́ngia. Os visitantes da Turı́ngia que
tinham vindo com duas carruagens deixaram a Hungria com uma
comitiva de treze.
Antes de começarem, Andreas chamou Walther von Varila de lado. "Oh,
conde", disse ele, com os lá bios trê mulos, "em você eu con io. Prometa-
me, pela fé de um cavaleiro cristã o, que você sempre protegerá e será
um verdadeiro amigo para meu ilhinho." E Walther olhou gravemente e
com ternura para o rosto perturbado do rei: "Pela fé de um cavaleiro
cristã o, dou-lhe a minha promessa."
Nos territó rios pelos quais passaram os prı́ncipes, prelados e nobres,
que os haviam suplicado com grande honra em sua jornada para o leste,
agora os recebiam com gentileza e cortesia redobrada. Chegaram à
Turı́ngia sem contratempos, atravessaram a loresta antiga pela grande
estrada que corria abaixo das saias arborizadas e da crista nua do
Horsel e, por im, avistaram ao longe, à luz do entardecer, as torres do
Wartburg.
Assim que as notı́cias de sua aproximaçã o foram trazidas ao castelo, o
Landgrave e a Duquesa Sophia desceram com grande alegria a Eisenach
para recebê -los, e quando a cavalgada entrou pelos portõ es da velha
cidade cinzenta, ambos caı́ram de joelhos e agradeceram. a Deus pela
chegada feliz da criança-noiva.
Eles se voltaram para a bela estalagem, em cujo jardim o astro-estrela
Klingsohr previra sua chegada na noite de verã o, quatro anos
antes. Hermann pegou carinhosamente a criança nos braços, beijou-a e
chamou-a de ilha pequena. Sob o telhado da pousada Helgreven e sob a
luz das mesmas estrelas, Elizabeth entrou em sua nova vida pelas
portas abençoadas do sono.
O castelo na loresta
O pequeno exílio
A criança-noiva
A Cruz Vermelha
Exilado
A vontade quebrada
Canção de um passarinho
O ano de 1231 estava chegando ao inverno. Elizabeth já estava há quase
dois anos em Marburg. Foi nos ú ltimos dias de outubro. O tempo estava
extremamente frio, com chuvas geladas e ventos cortantes. Seu corpo
frá gil quase se transformou em sombra, mas sustentado por seu
constante ê xtase de amor e alegria, ela continuou seu trabalho
devotado entre os enfermos e a litos.
Uma noite ela voltou para sua pobre morada, provavelmente
encharcada de chuva e gelada até os ossos, certamente desmaiada de
fome e vencida pelo cansaço. Naquela noite, ela acordou, ou parecia
despertar, em meio a um brilho maravilhoso; ouvi algué m chamá -
la; contemplou a pró pria face e forma do Senhor Jesus. Acordada ou
dormindo, era a visã o da Sulamita nos jardins de nogueiras de Hermon:
"A voz do meu amado! ...
Meu amado falou e disse-me:
Levanta-te, minha querida, formosa minha, e vem embora."
Para Elizabeth, nã o era nenhum sonho noturno, nenhuma ilusã o dos
sentidos, nenhuma ilusã o do coraçã o. Há muito tempo, aquela voz havia
prometido que Ele estaria sempre com ela, e ela sabia agora que se
aproximava o tempo em que ela deveria ser transformada.
Ela saiu entre os pobres para ajudá -los e consolá -los pela ú ltima
vez. Nesse clima rigoroso, Mestre Conrad també m adoeceu e pensou
que nã o se recuperaria. "Senhora e ilha", disse ele quando ela o visitou
e os dois conversaram, "você já pensou em como vai ordenar sua vida
quando eu morrer?"
"Por isso", respondeu ela, "nã o preciso pensar mais", e disse a ele que
seu im estava muito pró ximo. Depois disso, no quarto dia, ela caiu na
sua ú ltima doença; e por doze dias a vida dentro dela trabalhou como
as andorinhas trabalham em ventos fortes, fazendo a terra de sua
migraçã o.
Aconteceu em um dia em que ela estava deitada com o rosto para a
parede, sua serva Elizabeth, sentada ao pé da cama, ouviu o som da
mais doce cantoria. Pouco depois, o Landgravine se virou, dizendo:
"Onde está minha querida?" pois ela chamava seus companheiros de
"amigos" e "queridos". (Estou aqui ", disse a criada, e acrescentou:" Oh,
senhora, você cantou docemente. "
"Você ouviu alguma coisa?"
"Verdade", respondeu a empregada.
"Eu vou te dizer," disse Elizabeth; "entre mim e a parede, algum
passarinho cantou alegremente para mim; e iquei tã o comovido com
sua doçura que també m tive de cantar."
Trê s dias antes de sua morte, ela implorou que nã o permitissem a
entrada de visitantes na sala, nem mesmo as grandes damas que
freqü entemente vinham vê -la; "pois", disse ela, quando a questionaram,
"devo pensar no dia do meu julgamento e no meu onipotente Juiz." No
domingo, vé spera da oitava do dia de Sã o Martinho - ou melhor, era
quando a meia-noite de domingo já havia passado e as matinas haviam
sido ditas, mestre Conrad veio e ouviu sua con issã o; e quando ele
perguntou a ela depois o que ela desejava ter feito com as coisas que
pertenciam a ela, "Todas essas coisas eu apenas parecia possuir", ela
disse; "eles pertenciam aos pobres", e ela implorou que ele os
distribuı́sse para ela, exceto pelo há bito de lã cinza grosseiro com o qual
ela implorava que eles a enterrassem. Ela nã o faria nenhum testamento,
pois o ú nico herdeiro que desejava ter era Cristo em Seus pobres.
No inı́cio, na escuridã o da manhã , ela recebeu o Santı́ssimo Sacramento,
que ela implorou para receber; e durante todo aquele dia, até a hora da
vesper, ela permaneceu absorta em devoçã o. As vezes ela falava, e uma
vez - depois de icar em pé em espı́rito, creio eu, ao lado daquela jovem
igura corajosa esculpida na tumba de Reinhartsbrunn - ela contou
como o Senhor Jesus consolou Marta e Maria ao ressuscitar seu irmã o
Lá zaro, e Demorou-se em Sua terna compaixã o quando, chorando com
eles chorando, Ele derramou lá grimas de tristeza pelos mortos. Entã o,
aqueles ao seu redor ouviram as vozes mais doces cantando, embora
seus lá bios nunca se movessem.
Do crepú sculo em diante, seu tempo era gasto em oraçã o. A medida que
o galo começou a cantar, ela perguntou de repente: "O que devemos
fazer se o Inimigo da Humanidade aparecer diante de nó s?" Entã o, em
pouco tempo, ela gritou em voz alta e clara, como se repelisse o Espı́rito
do Mal: "Fora! Fora!" Ao primeiro canto do galo, ela pareceu reviver. A
hora está pró xima ", disse ela," quando o Senhor nasceu. Falemos de
Deus e do Menino Jesus, pois é quase meia-noite, quando Ele veio ao
mundo, e icou quieto na manjedoura, e criou por Sua onipotê ncia uma
nova estrela que ningué m nunca tinha visto antes. ”Enquanto ela disse
nessas coisas, ela era muito viva e inteligente, como se nã o enfermasse
nada. Na verdade, ela mesma disse: "Estou muito fraca, mas nã o sinto
nenhuma doença ou dor."
Dessa forma, ela passou todo aquele dia, expressando seus
pensamentos devotos, e regozijando-se em Deus, e recomendando aos
seus cuidados aqueles ao seu redor. Entã o, inalmente, caindo quieto à
noite, e sua cabeça caindo como se estivesse em sono, o espı́rito mais
inocente e doce do mundo naquela é poca voltou para Deus que o deu.
Durante trê s dias, por causa do forte desejo do povo de que ela nã o
fosse enterrada até que tivessem visto seu rosto mais uma vez, ela foi
deitada na pequena capela anexa à Casa de Hó spedes dos Pobres. Nã o
havia horror ao tú mulo, mas em seu lugar a ternura do sono juvenil e,
exceto pela palidez, uma beleza mais doce na morte do que em vida. Na
noite do terceiro dia, enquanto os Irmã os Menores cantavam o Ofı́cio
dos Mortos, a abadessa de Wechere, que estava presente, ouviu um
maravilhoso liribleamento de pá ssaros e se perguntou como isso era
possı́vel no frio do inverno, ela saiu da capela, e avistei um grande
bando de passarinhos pousados no telhado e cantando, por assim dizer,
sua endecha. Foi da mesma maneira, quando Sã o Francisco morreu e os
irmã os ainda estavam olhando para seu rosto, que inú meras cotovias
caı́ram e cantaram alegremente na palha de sua cela.
No quarto dia, em meio a uma vasta multidã o de abades, padres,
religiosos e religiosas, e pessoas de todos os tipos, ela foi colocada na
terra. Ela morreu em 19 de novembro de 1231, com quase 24 anos.
Milagres aconteceram em seu tú mulo; bem poderia ser, mas nenhum
tã o memorá vel quanto o de sua pró pria vida. Mestre Conrad de
Marburg começou a coletar as provas de santidade exigidas para a
inscriçã o de seu nome no Calendá rio dos Santos. A tarefa caiu de sua
mã o inacabada; foi retomado e completado por outros.
A coroa do Kaiser
PostScript
Nã o posso fechar estas pá ginas sem reconhecer minha dı́vida para com
dois livros deliciosos sobre o assunto, a Histoire de Sainte
Elisabeth (1836), do conde de Montalembert, que tinha uma ligaçã o tã o
interessante com o Santo, e Sainte Elisabeth de Hongrie (1901), de M.
Emile Horn, que aproveitou os resultados de pesquisas recentes na
Alemanha. Em muitos pontos, entretanto, fui incapaz de aceitar as
opiniõ es ou os sentimentos desses ilustres escritores, e me aventurei a
seguir os registros medievais lidos à luz dos historiadores
modernos. Em particular, nã o consigo descobrir nenhuma razã o para
adotar a conclusã o do Sr. Horn de que, em primeira instâ ncia, Santa
Isabel estava noiva do menino Hermann, a quem ele considera o ilho
mais velho do Landgrave Hermann, e que, apó s sua morte, o A questã o
de devolver o dote de Elizabeth foi a causa de seu noivado com
Lewis. Tal sucessã o de eventos di icilmente poderia ter passado sem
conhecimento para os primeiros escritores, e nã o havia razã o para
suprimir o relato deles se aconteceram.
A tentativa de explicar o cará ter e a vida de Santa Isabel com o cará ter e
a vida de Sã o Francisco de Assis é , creio eu, su icientemente justi icada
pelas a irmaçõ es do texto. O triunfo do que pode ser chamado de
ascetismo regularizado, baseado na é poca quase inteiramente no medo
pessoal da perdiçã o, destruiu um dos mais nobres, e talvez o mais
nobre, dos grandes movimentos espirituais da histó ria da Igreja.
A igreja memorial de Santa Isabel ainda sobrevive em sua beleza gó tica
pura à s margens do Lahn em Marburg. Apó s os danos causados pelas
inundaçõ es de 1847, foi restaurado e durante as obras foi necessá rio
remover o monumento de Conrado, o Grã o-Mestre da Ordem Teutô nica
e cunhado de Santa Isabel. Abaixo deste monumento foi descoberta
uma laje esculpida e, abaixo dela, outra, que cobria um caixã o de
pedra. Neste ú ltimo estava um baú de chumbo que continha o que se
acreditava serem as relı́quias de Santa Isabel. A permissã o para
examiná -los foi recusada pelas autoridades, e eles foram
imediatamente entregues à terra.
Pela sua deposiçã o na capela memorial, o santuá rio do Santo parece ter
sido, durante quase trê s sé culos, o centro de uma veneraçã o e
peregrinaçã o generalizada. No domingo, 18 de maio de 1539, Filipe, o
Magnâ nimo, entrou à força na cerca e removeu as relı́quias. Nove anos
depois, em 12 de julho, o santuá rio e as relı́quias foram restaurados,
mas a enorme coroa de ouro do Kaiser Frederico havia
desaparecido. Os restos mortais parecem ter sido secretamente
enterrados pelos Cavaleiros Teutô nicos, mas o registro do local,
preservado apenas pela tradiçã o oral, tornou-se vago e incerto. Por
volta do ano de 1718, um pequeno baú , supostamente de ferro, foi
encontrado perto da tumba de Conrado, o Grã o-Mestre. Era para conter
as relı́quias do Santo e foi imediatamente substituı́do. Do intervalo
entre essa data e a restauraçã o da igreja nada se sabe.