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XXVIII Encontro Anual da Compós, Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Porto Alegre - RS, 11 a 14 de junho de 2019
Resumo: Na campanha eleitoral brasileira, de 2018, e na posse do presidente, surge novo estágio
da midiatização da política, chamando atenção para estratégias comunicacionais
que tiram de cena os mass medias, enquanto “elo intermediário” entre instituições
e sociedade. Apoia-se em matriz de circulação através de operações que disseminam
“discurso de combate” às estruturas de mediação através de argumentação de que
“podemos fazer sozinhos”, “tendo Deus acima de tudo”. Contempla como coletivo,
o “nós-inclusivo”, cujas marcas de existência se enunciam na campanha e no
ambiente da posse do novo presidente. Sua posse se desenrolou em meio a lógicas
de contenção e de vigilância sobre os jornalistas que, privados de circularem,
enunciam a narrativa dos sitiados em disrupção com “gramáticas da vigilância” e
a “retórica do combate” sustentada na fala presidência no parlatório da Praça dos
3 Poderes.
Abstract: In the Brazilian electoral campaign of 2018, and in the inauguration of the President,
emerged a new stage of the political media. The attention lies on communicative
strategies that take the mass medias off the scene as an "intermediary link" between
institutions and society. This work relies on a circulation matrix through operations
that disseminate "combat discourse" to mediation structures through argumentation
such as "we can do it by ourselves" or "having God above all else". It contemplates
as a collective, the "we-inclusive", whose marks of existence are enunciate in the
campaign and in the environment of the inauguration of the new president. His
possession was unfolded amid the logics of containment and vigilance on journalists
who, deprived of circulating, enunciated the narrative of the siege in disruptions with
"grammars of vigilance" and the "rhetoric of combat" sustained in the presidency
speech in parlatory of the Three Powers Square.
1. Nota Introdutória
Ao longo de várias décadas manifestações políticas, como as eleições presidenciais nos
cenários nacional e internacional, ocorreram através de mediações de tecnologias de caráter
“mass-midiático”, em um contexto nomeado como “sociedade dos meios”. Destacam-se dentre
outras, o primeiro debate televisivo entre Nixon e Kennedy, que marca, nos anos 60 do século
1
Antônio Fausto Neto, doutor em comunicação pela Escola de Altos Estudos em Ciências Sociais – França;
Mestre em comunicação pela Universidade de Brasília; Graduado em comunicação pela Universidade Federal de
Juiz de Fora. Co-fundador da Associação Nacional de Pós-Graduação em Comunicação; Presidente do Centro
Internacional de Semiótica e Comunicação – CISECO; e, professor titular do PPG-Comunicação da Unisinos.
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O presente trabalho foi feito com a colaboração de Victor Thiesen, bolsista de Iniciação Científica – CNPQ.
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presidente estava ainda alimentado pelo imaginário da campanha eleitoral, algo, portanto,
distante e, não em sintonia, com os efeitos desta liturgia, suscitados pela natureza de um
discurso de celebração cívica. A quem falaria o presidente, enquanto interlocutores, se
jornalistas estavam proibidos de lhe contatar, inclusive com a emissão de perguntas? Tão pouco
que dele não poderiam se aproximar para os cumprimentos mais calorosos - em convergência
com o espirito do evento- em consequência dos efeitos do loteamento do território que os
reunia, em setores distintos? Nesta topografia não havia espaço para dissensos, conforme
temiam as expectativas das forças de vigilância. Mas, a despeito de suas restrições, surgiram
vozes anunciando que “o mito, - o capitão - voltara!” Estas não foram suficientes para inibir
emissão de uma outra voz a qual, mesmo que tivesse sido prevista no cerimonial, trazia consigo
um outro corpo, além o do presidente, envolto pela faixa presidencial. O corpo da primeira
dama irrompe no parlatório, entre o corpo do presidente e das massas distantes, proferindo um
discurso em língua brasileira de sinais (LIBRAS) dirigido aos presentes, assim contemplando,
certamente um outro “mercado discursivo”. A sua voz vai além da comunidade receptora e
ofusca o corpo do presidente, cuja exposição não pode ser ali repetida, a exemplo dos rituais
com que comparece as redes sociais. A performance da primeira dama causa surpresa porque
comparece como índice alusivo de um evento que não pode ser transformado em festa.
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ao comparecer apenas a uma determinada mídia televisiva, para conceder entrevista, por ele
escolhida e reconhecida como o porta-voz audiovisual, durante sua campanha. Concede
entrevistas apenas a jornalistas selecionados pelos assessores, impondo restrições a
participação de outros, cujos critérios não são anunciados explicitamente. Aceita participar de
programas radiofônicos desde que seja entrevistado apenas pelo principal responsável,
evitando assim ser inquirido por um jornalista co-participante. Este ao perceber a performance
da “emissão” demite-se “ao vivo” do programa, alegando censura.
Por ocasião de um dos seus s discursos de posse, mantem aberto o “discurso de
combate” às mídias tradicionais, avisando aos seus eleitores e seguidores que “o poder popular
não precisa mais de intermediação, pois as novas tecnologias permitiram uma relação direta
entre eleitores e seus representantes”, (FSP, 10/12/2018). O presidente vai sendo pautado pela
lógica segundo a qual candidatos ficavam acessíveis a 140 caracteres de distância, enquanto
possiblidade de contato com a população. Em parte, isto é verdade, se admitirmos que as
condições de acesso entre os atores destes circuitos de comunicação são dinamizadas pelas
redes. Porém, não se pode garantir que resulte da eficácia de tal acessibilidade afirmações
segundo as quais as redes elegeram o novo presidente da república. Outros fatores são
corresponsáveis, como o papel estratégico de novas estruturas de mediação. Devemos lembrar
que a internet não é uma rede lisa, pois está envolva em complexidades de outras instancias
intermediarias, enquanto campos sociais. Especialmente, o papel de empresas de várias
naturezas, inclusive de origem digital, que teriam emprestado emprestam a ação comunicativa
da campanha de Bolsonaro, colaboração decisiva na compra e circulação de mensagens de
apoio, cujos conteúdos não eram diretamente produzidos pelas instituições responsáveis pela
campanha oficial do candidato. Outras estruturas intermediárias – como mentores e
admiradores do presidente - se agregam ao “disparo de mensagens” ampliando a sua ofensiva
de combate contra as mediações jornalísticas. Logo após sua vitória e, antes mesmos de sua
posse, mensagens sustentam agenda belicosa das redes sociais, contra as instâncias mediação,
afirmando que “os jornalistas são os maiores inimigos do povo, seja nos Estados Unidos ou no
Brasil” (@O_de carvalho, 17.12.2018). O tom do discurso de caráter discriminatório contra
jornalistas, cresce e dissemina-se na ambiência dos festejos de posse, via apelos que, de alguma
forma, argumentam contra a permanência dos jornalistas (estrangeiros) na própria topografia
dos acontecimentos que se avizinham: “os representantes de órgãos de mídia estrangeiros que
só vão ao Brasil para dar palpites em vez de noticiar fatos deveriam ser banidos do território
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