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CIMERE

Para Prebisch (1949), sobre a teoria do desenvolvimento clássico, as análises de

desempenho econômico são realizadas a partir das condições histórico-estruturais internas de

cada país. O autor esclarece que, para superar a marca do subdesenvolvimento faz-se necessária

a combinação de três variáveis complementares entre si: a descentralização de decisões que são

amparadas por políticas de coordenação (p. 35), o Estado orientador e mais propositivo (p. 32)

e, além disso, a exposição à concorrência internacional (p. 27).

Adiante, observa que, para que um país em desenvolvimento possa realizar um


progresso técnico é necessário enfrentar um conjunto de problemas relativamente
importantes, para poder modificar o seu aparato estrutural na indústria e estimular a
produção interna substitutiva dos bens de capital e das matérias-primas, uma vez que
essa dinâmica provoca desequilíbrio estrutural no balanço de pagamentos, a exemplo da
inflação e do desemprego. Sobre esse aspecto o autor Prebisch (1949, p. 29),
[...] A dinâmica substitutiva consiste na forma como a economia reage a
sucessivos estrangulamentos do balanço de pagamentos. Por progressiva
compressão na pauta de importação, a industrialização vai passando de
setores de instalação “fácil”, pouco exigentes em matéria de tecnologia,
capital e escala, a segmentos cada vez mais sofisticados e exigentes
(PREBISCH, 1949, p. 29).

Tavares (1993), ao relembrar as principais características do modelo de


desenvolvimento econômico relacionadas às economias tradicionais, a exemplo dos
“países centrais”, descreve sobre a dinâmica de movimentação da estrutura produtiva
voltada “para fora”, com base também na combinação de duas principais variáveis:
exógenas (investimento autônomo) e endógenas (inovações tecnológicas). Assim, os
bens de capital e as matérias-primas captadas por esses países contribuem para o
processo de substituição de importação e de melhora da Renda Nacional, no contexto
em que a divisão social do trabalho local já se encontra bem estabelecida.
A autora (1963) argumenta que, o desenvolvimento econômico em países como
o Brasil, as variáveis endógenas e exógenas devem ser bem coordenadas e planejadas
em etapas, para que o modelo de substituição de importação seja “real ou efetivo”, pois
além de proporcionar melhora na divisão do trabalho local, promove também o
fortalecimento da Renda Nacional. Cabe salientar que para que haja crescimento
econômico é imprescindível que o setor externo e mercado interno estejam bem
alinhados, tal como se observa nas economias mais desenvolvidas.
Adiante, ao tratar do desenvolvimento econômico brasileiro, a autora observa
que a estrutura produtiva econômica era inicialmente voltada “para fora” e muito
associada à posição na Divisão Internacional do Trabalho Social, dada a sua
dependência em relação aos países centrais. Tal dependência, portanto, foi reflexo da
sua própria formação econômica, decorrente da forçosa limitação da sua capacidade
produtiva, pouco diversificada e mais voltada para o mercado exportador, setor esse que
recebia a maior parte dos benefícios da Renda Nacional (TAVARES, 1993).
Contudo, entre os anos de 1914 e 1945, as crises sucessivas, principalmente
decorrentes de um somatório de 20 anos de guerras no âmbito internacional, a partir dos
anos de 1930, por causa da queda brusca na receita de exportação das economias
globais atingiu, igualmente, a economia brasileira. Os mais significativos reflexos
percebidos na economia brasileira foram, principalmente, com relação à capacidade de
importar, em razão da forte queda de receita dos grandes capitalistas (TAVARES,
1993).
Em linhas anteriores, trouxemos que os modelos de desenvolvimento
tradicionais voltados “para fora” precisam estar alinhados a variáveis endógenas e
exógenas, as quais favorecem o equilíbrio da balança em níveis significativos e em
termos de distribuição de Renda Nacional.
Outros autores que estudam o desenvolvimento econômico brasileiro descrevem
sobre a postura dual do Estado como sendo nacional e capitalista. O Estado nacional
atua como articulador, intervindo no novo mercado interno e incorporando aparelhos
regulatórios específicos que possam sustentar o setor agroexportador; o Estado
capitalista possibilita manter as bases materiais das relações de contradições da
sociedade (DRAIBE, 1985).
A autora (1985, p. 82), ao recordar o período de 1930-1945 do Brasil, demonstra
o Estado centralizado e nacionalmente articulado, por ter sofrido muitas metamorfoses e
múltiplas fases até a sua consolidação na fase chamada de “acumulação industrial”. Ela
explica ainda que, as condições políticas e econômicas decorrentes da crise de 1930
geraram ações específicas para esse Estado, sob um regime autoritário, que abarcassem
as articulações de coordenação (IBID).
Nesse contexto, com a forte presença do Estado na economia, as transformações
da sociedade produziram uma enorme estruturação para a promoção da modernização
administrativa nas funções normativas e executivas. Entre 1930 e 1945, surgiram órgãos
de natureza de coordenação de políticas gerais e econômicas para viabilizar as políticas
econômicas (cambiais e de comércio exterior) e administrativas, a fim de fomentar a
nova industrial (IDEM).
Assim, no ano de 1938 foi criado o Departamento de Serviço Público (DASP),
que tinha como objetivo definir normas e regras para a carreira decorrente de concursos
públicos e para a estrutura administrativa. A partir desse momento, outros órgãos
emergiram, mas com atuações limitadas, em decorrência do aspecto de clientelismo e
arbitragem política. Uma importante passagem de Draibe (1985, p. 90),
[...] De qualquer forma, o que nos interessa ressaltar é que estes organismos,
ao estabelecer as políticas setoriais levando em conta o conjunto do
respectivo setor em termos nacionais, objetivaram e abstraíram os interesses
concretos envolvidos, de tal forma que as relações intercapitalistas
respectivas tinham expressão apenas dentro e através daquele aparato estatal.
E no interior destes aparelhos é que se defrontarão os móveis particularistas –
sejam os de caráter regional, sejam os típicos interesses proprietários, no seu
afã de privatizar ou orientar, segundo seus desígnios, as políticas estatais
(DRAIBE, 1985, p. 90).

Ademais, a autora (1985, p. 94) explica que com a presença específica do Estado
na economia, sob a coordenação de política, a reorganização do aparelho estatal inseriu
muitos instrumentos que pudessem fomentar tanto as atividades econômicas estatais
quanto as do setor privado, para aprimorar a produção nacional. Por essa razão, a forma
de atuação do Estado se constituiu numa estrutura de organização como sendo
articulador de recurso estratégico frente a outros Estados Nacionais para a economia
interna e a guerra (IDEM).
Por essa razão, ela esclarece que o padrão dual de formação econômica brasileira
fez surgir um poder unificado e, que por essa análise, não é possível entender de forma
separada esse momento histórico, mas como parte da estrutura social. Sobre autoridade
estatal descreve a autora (1985, p. 94-95),
Pode-se dizer que a efetivação da autoridade pública central, sobre recursos
considerados essenciais ou estratégicos, constituiu um dos mecanismos
típicos de formação dos Estados nacionais. Nesse particular, o processo de
formação do Estado brasileiro pare ter constituído exceção: as embrionárias
formulações legais anteriores a 1930 atingiram, após a Revolução, um grau
consistente de codificação, explicitando a demarcação das competências,
direitos, etc (DRAIBE, 1985, p. 94-95).

Diante disso, as políticas do Estado brasileiro, a atuação de supervisão e


desempenho atuou nas competências e responsabilidades em gerir os setores mais
básicos, sobretudo, formulação de legislação econômica específica, como o salário
mínimo, o câmbio, os juros e os créditos elementos que condicionassem a acumulação
industrial (IDEM).
Draibe (1985, p. 98-99) clareia o entendimento sobre a área de regulação e
intervenção estatal ao trazer elementos essenciais e mais profundos da própria forma de
atuação do Estado, as correlações de forças. Sobre essas correções descreve Draibe
(1985, p. 99),
As correções de forças que se estruturaram ao longo do período 30-45
constituíram, sem dúvida, a base social e política sobre a qual se
estabeleceram, simultaneamente, as possibilidades da ação intervencionista e
seus limites, que se expressavam na própria materialidade do aparelho
econômica e de seu âmbito de atuação. Entretanto, sobre essa base estrutural,
se definiu e tomou forma uma direção econômica estatal que sintetizou os
diferentes interesses sociais sobre os quais se erigia como autonomia, mas
não se reduziu a eles, como se fosse um somatório de elementos, pressões e
conflitos que o Estado haveria de contemplar.

Já nas contribuições de Furtado (2003), as reflexões sobre o processo de


formação econômica, a partir da atividade da agricultura plantation, ao longo de três
séculos posteriores ao século 16, evidenciam um lento processo de transformações
históricas que se desenvolveu como sendo vegetativo ou estagnado.
O autor identifica nessa economia agroexportadora, no período da colônia
(açucareira, mineira e cafeeira), uma balança de pagamento incapaz de oferecer à classe
dos grandes agricultores um retorno financeiro que pudesse garantir-lhes lucratividade,
dando início a um grande período de dificuldade econômica (FURTADO, 2003).
Observados esses acontecimentos por uma perspectiva ampla, já com o processo
de independência brasileira instalado, o modelo de “desenvolvimento” que ora se
apresentava não mais suportava uma estrutura econômica baseada em pouco
dinamismo. Por essa razão, esse movimento também exigiu maior transformação
econômica e social que se integrasse com a expansão do comércio internacional (IBID).
Para tanto, com as dificuldades econômicas herdadas da colônia e a estrutura
social baseada no modelo de tráfico de escravos, o Brasil apresentava problemas que
provocavam empecilhos para a incipiente estrutura produtiva: a tendência ao
desequilíbrio externo, pouca autonomia administrativa e falta de mercado consumidor
(IDEM).
As soluções foram na direção da conquista da autonomia administrativa,
econômica e social. Em 1889, a autonomia administrativa, com a proclamação da
república, trouxe a descentralização política, para trazer mais autonomia regional aos
Estados, e social, com a abolição dos escravos. A libertação dos escravos não foi uma
causa humanitária, mas, sobretudo, de cunho econômico, porque permitiu o aumento de
assalariados na economia cafeeira (IDEM).
Por outro lado, o movimento da proclamação da república em 1889 e a crise de
1893 no mercado externo mundial provocaram grandes impactos na economia
brasileira, que sofreu uma crise de superprodução (1927-29), o que estabeleceu uma
pressão inflacionária nos anos que se sucederam, obrigando o governo central ao
financiamento desse estoque. Veja o que nos diz Furtado (2003, p. 192),
É fácil compreender a enorme forca perturbadora potencial que representava
para a economia esse tipo de operação. O financiamento desses estoques
havia sido obtido em grande parte de bancos estrangeiros. Pretendia-se, dessa
forma, evitar o desequilíbrio externo. Vejamos o que em realidade se passara.
Os empréstimos externos serviam de base para a expansão de meios de
pagamentos destinados à compra de café que era retirado do mercado. O
aumento brusco e amplo da renda da monetária dos grupos que derivavam
suas receitas da exportação não podia, evidentemente, deixar de provocar
pressão inflacionária. Essa pressão é particularmente grande numa economia
subdesenvolvida, e se manifesta de imediato em rápido crescimento das
importações, em razão da baixa elasticidade da oferta interna (FURTADO,
2003, p. 192).

Nessa direção, a pressão inflacionária favoreceu a inversão de estoques no


período entre 1927 e 1929, época que a economia brasileira foi favorecida pela forte
entrada de capital privado estrangeiro e com o amplo investimento para financiar o café
em defesa da renda da política de fomentação da renda.
Com a conjuntura da crise cafeeira e da crise de 1929, em âmbito internacional,
as decisões políticas foram tomadas com o objetivo de manter o novo mercado interno
que ora se apresentava, bem como garantir uma massa de salários oriundos do mercado
externo, continuando a expandir mesmo depois da crise. Veja uma significativa
passagem para descrever o processo da incipiente industrialização brasileira,
Possibilitando um melhor aproveitamento dos recursos de terra e mão-de-
obra preexistentes, o impulso dos recursos de terra e mão-de-obra
preexistentes, o impulso externo cria o aumento de produtividade que é o
ponto de partida no processo de acumulação de capital. A massa de salários e
outras remunerações criadas no setor de exportação representam o embrião
do mercado interno. Ao crescer o impulso externo, a expansão indireta da
procura interna tende a integra na economia monetária os recursos de mão-
de-obra e terra subutilizados no setor de subsistência. Ao reduzir-se o
impulso externo, por outro lado, a contração consequente da renda monetária
tende a criar desemprego ou subutilização da capacidade no setor ligado ao
mercado interno (FURTADO, 2003, p. 209).

Então, segundo o autor (IDEM, 2003), nos anos de 1930 a 1939, os mecanismos
de política externa do governo central brasileiro favoreceram significativamente o
mercado interno, que se apresentava em meio à crise internacional, porque conseguiu
articular um duplo mecanismo que funcionava em sincronia, o interno e o externo, e
nessa direção, se instalou o incipiente processo de industrialização brasileira.
Diante do exposto, entre os anos de 1930-1945, na teoria do desenvolvimento
econômico, de acordo com Prebisch (1949), o Estado nacional brasileiro atuou de forma
coordenada e planejada para fomentar a indústria, e por essa razão, conferiram nisso
uma relativa intenção, já que partiram as decisões estratégicas do próprio Estado.
Já em Tavares (1963), ainda que o desenvolvimento econômico não acontecesse
de forma “real ou efetiva”, à luz das estratégias políticas econômicas, para fomentar a
indústria nos moldes de Prebisch (1949), também não eliminou o caráter intencional,
pois promoveu de alguma forma a melhora do setor externo e do mercado interno, tal
como ocorre nas economias mais desenvolvidas.
Depois, em Furtado (2003), ao analisar o lapso temporal, do período da colônia
aos anos iniciais do século 20, o desenvolvimento econômico foi visivelmente mais
acelerado entre os anos 1893 a 1930, em meio ao processo de urbanização e promoção
da indústria brasileira, e dessa forma, não pôde ser excluído o projeto intencional.
E, por fim, Draibe (1985), sobre a acumulação industrial, trouxe elementos
significativamente importantes da história da formação econômica brasileira, por trazer
também análises sobre as estratégias de coordenação e planejamento das políticas
administrativa e econômica no período entre 1930-1945, pondo em destaque as
motivações em meio às crises, também de caráter intencional.

Referências

DRAIBE, S. Rumos e metamorfoses: um estudo sobre a constituição do Estado e as


alternativas da industrialização no Brasil, 1930-1960. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1985.

FURTADO, C. Formação Econômica do Brasil, São Paulo: Companhia Editora


Nacional, 2003.

PREBISCH, R. “O desenvolvimento econômico latino-americano e alguns de seus


principais problemas”  em Bielschowsky, Ricardo (org.), Cinquenta anos de
pensamento da CEPAL, Rio de Janeiro: Record, vol.  1, ([1949] 2000).  

TAVARES, M. C. “Auge e declínio do processo de substituição de importações no


Brasil” em Tavares,  Maria da Conceição, Da substituição de importações ao
capitalismo financeiro. Rio de Janeiro: Zahar,  ([1963] 1972).

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