Você está na página 1de 52

Detectores Semicondutores de Radiação

Fundamentos Teóricos, Tecnologia e Aplicações

TNA – 5795-1

Dr. Fabio Eduardo da Costa

Dra. Margarida Mizue Hamada

Dr. Carlos Henrique de Mesquita

INTRODUÇÃO

Para entendermos como a radiação interage com meios semicondutores


e permite sua detecção, vamos inicialmente conhecer como as várias
frequências do espectro eletromagnético, Figura 1, interagem com
determinados meios e progressivamente estudar esta interação com os
semicondutores.

Figura 1 – Espectro eletromagnético.

Extraído de:
http://www2.pucpr.br/educacao/lst/atividade_simulacao_transferencia.html (não
disponível mais em 03/02/2012).
Como pode ser visto na Figura 1, as unidades de comprimento (metro e
seus múltiplos e submúltiplos) para o comprimento de onda ou a frequência
(Hertz, múltiplos e submúltiplos), são usadas de forma a determinar um ponto
no espectro eletromagnético. A relação entre a frequência e seu comprimento
de onda é dada por:

velocidade daluz no ar ou vácuo(m /s)


frequência(Hz ou s-1)¿
comprimento de onda(m)

A unidade usada depende mais de onde o ponto do espectro está sendo


caracterizado, não tendo uma regra determinada. Assim em baixas frequências
é comum usar o Hz e seus múltiplos ( 60 Hz para a rede elétrica, 1 kHz para
uma frequência de áudio, 700 kHz para uma estação de radio na faixa de
ondas médias, 7 MHz para uma frequência de uma estação de radioamador ou
40 metros quando este operador está interessado em saber o comprimento
adequado para uma antena nesta frequência). Na medida em que vamos
subindo a frequência, as unidades Hz e metros são usadas indiferentemente
como em micro-ondas. Quando chegamos ao infravermelho, continuam a
serem usados os submúltiplos de metro (µm e nm) e começam a serem usadas
as unidades de energia, mais especificamente o elétron-volt.

Esta proporcionalidade foi introduzida por Planck, constante de Planck


(h), que associa a cada frequência uma energia.

E (energia em joules)= h(6,625 . 10-34 J.s) . ν(frequência Hz ou s-1)

ou

E(eV)= h(4,135 . 10-15 eV.s) . ν(frequência Hz ou s-1)

Do ponto de vista energético, o elétron-volt é a energia equivalente à


variação de energia de um elétron, quando este é submetido a uma diferença
de potencial igual a 1 volt. Em Joules, é o equivalente a 1,602x10E-19 J.
Temos portanto:

1 eV=1,602. 10-19J
Apesar de que, em um primeiro momento, a unidade eV parecer
estranha, é um formato adequado para as faixas de energia envolvidas nos
fenômenos que serão abordados.

Continuando subindo as frequências no espectro eletromagnético,


chegamos nas frequências correspondentes aos raios-X e passamos a usar
apenas eV e seus múltiplos.

Deve ficar claro que indiferentemente a unidade utilizada, sempre estará


associada a cada frequência do espectro eletromagnético uma determinada
energia, e que de alguma forma esta energia pode ou não interagir com o meio
em que incidiu. Quando esta energia interage e se transfere em parte ou
totalmente para o meio, pode em algumas circunstâncias provocar efeitos
mensuráveis que serão os objetivos buscados, especificamente neste curso,
com o uso de detectores semicondutores de radiação.

INTERAÇÃO DA RADIAÇÃO ELETROMAGNÉTICA COM A MATÉRIA

Em baixas frequências podemos tomar como exemplo a interação que


acontece em transformadores, onde uma corrente elétrica alternada no
enrolamento primário induz um campo magnético que provoca um movimento
de elétrons no enrolamento secundário. De forma semelhante, uma corrente
elétrica em uma antena, produz um campo eletromagnético que induzirá uma
corrente elétrica em uma antena secundária. Deve ser observado que os
elétrons que se movem são os elétrons livres presentes no metal condutor que
forma o transformador ou a antena e no processo não se forneceu nenhuma
energia para quebrar uma ligação e ionizar o metal que constitui o fio condutor.

Este tipo de interação gera dúvidas com respeito à interação com o


corpo humano. Do trabalho Campos magnéticos de frequência extremamente
baixa e efeitos na saúde: revisão da literatura - Rev. Bras Epidemiol 2009; 12(2):
105-23 é citado: “O primeiro trabalho nesse sentido foi publicado na década de
1960 e focava a exposição ocupacional. Em 1979, o estudo de Wertheimer e
Leeper colocou o assunto definitivamente em evidência ao apontar uma
relação entre o risco para leucemia em crianças e a exposição a campos
eletromagnéticos. A interação conhecida entre os campos magnéticos de
frequência extremamente baixa e o corpo humano é a indução de correntes
elétricas fracas. Esses campos não são capazes de quebrar ligações químicas
e são conhecidos como “radiações não ionizantes” ”.

O espectro eletromagnético compreendido entre centenas de kilohertz


até microondas apresenta um comportamento idêntico do ponto de vista de
interação com os meios condutores, mas difere sobremaneira do ponto de
vista de atenuação e propagação no meio, sempre sem produzir ionização,
mas não é tratado de maneira igual quando se observa sua interação com o
corpo humano. A RESOLUÇÃO N.º 303, DE 2 DE JULHO DE 2002 da AGÊNCIA
NACIONAL DE TELECOMUNICAÇÕES cita as expressões para cálculo de
distâncias mínimas à antenas de estações transmissoras para atendimento aos
limites de exposição para a população em geral, embora não cite seus efeitos
biológicos.

Extraído de: http://www.satfm.org/res303/ disponível em 22/10/201

Faixa de Exposição da em Geral


Radiofreqüências População

1 MHz a 10 MHz r = 0,10 Ö(eirp x f) r = 0,129 Ö(erp x f)

10 MHz a 400 MHz r = 0,319 Ö(eirp) r = 0,409 Ö(erp)

400 MHz a 2000 MHz r = 0,638 Ö(eirp / f) r = 8,16 Ö(erp / f)

2000 MHz a 300000 r = 0,143 Ö(eirp) r = 0,183 Ö(erp)


MHz

r é distância mínima da antena, em metros;

f é a freqüência, em
MHz;

e.r.p. é a potência efetiva radiada na direção de maior ganho da


antena, em watt;

e.i.r.p. é a potência equivalente isotropicamente radiada na direção


de maior ganho da antena, em watt.
Não é preciso nos ater aos detalhes dos cálculos, mas fica óbvio que as
interações do ponto de vista biológico não são idênticas para toda a faixa do
espectro eletromagnético citado.

Segundo B.H.Brown at all em Medical Physics and Biomedical


Engineering, IOP Publishing Ltd., 1999, as três mais importantes interações
entre campos eletromagnéticos e o tecido humano são eletrólise, estimulação
neural e aquecimento. Há outras interações como as ressonâncias de prótons
e moléculas que podem ocorrer em campos magnéticos contínuos, mas sem
causar efeitos biológicos significativos.

Continuando a subir a frequência, dentro do espectro eletromagnético,


alcança-se as micro-ondas. Apesar de seus valores elevados de frequência, as
micro-ondas também não interagem produzindo ionização. Estes comprimentos
de onda são utilizados em telecomunicações devido a sua baixa atenuação, o
que facilita a comunicação em meios urbanos e são amplamente utilizados, por
exemplo, em telefonia móvel. Quanto a interação observada nos equipamentos
aquecedores com micro-ondas segundo o site Wikipédia, temos: “Quando
sujeitas às micro-ondas, as moléculas de água do alimento orientam-se em
direção do campo elétrico que compõe estas ondas. Este campo, ao ser
alternado, faz com que os pólos orientem-se sucessivamente num sentido e
seguidamente no outro, o que resulta em várias mudanças de orientação ao
mesmo ritmo da frequência da onda incidente. As fricções entre as moléculas
de água produzem calor.“

Elevando novamente as frequências no espectro, vamos


propositadamente pular o infravermelho e o visível e alcançarmos o ultravioleta
para estudarmos o efeito fotoelétrico.
A DESCOBERTA DO EFEITO FOTOELÉTRICO

Extraído de: http://www.if.ufrgs.br/einstein/efeitofotoeletricodescoberta.html,


acessado em 22/10/2012.

“Hertz estudando a produção de descargas elétricas entre duas


superfícies de metal, em potenciais diferentes, observou que uma faísca
proveniente de uma superfície gerava uma faísca secundária na outra. Após
uma série de experiências, Hertz confirmou o seu palpite de que a luz poderia
gerar faíscas. Também chegou à conclusão que o fenômeno deveria ser devido
apenas à luz ultravioleta. Em 1888, estimulado pelo trabalho de Hertz, Wilhelm
Hallwachs mostrou que corpos metálicos irradiados com luz ultravioleta
adquiriam carga positiva. Isto, antes da descoberta do elétron, que se deu em
1897.

Dois anos após a descoberta de Hertz, Thomson postulou que o efeito


fotoelétrico consistia na emissão de elétrons. Em 1903, Lenard estudou o efeito
fotoelétrico utilizando como fonte luminosa um arco de carbono. Variando a
intensidade da luz por um fator 1000, provou que a energia dos elétrons
emitidos não apresentava a menor dependência com a intensidade da luz. Em
1904, Schweidler mostrou que a energia do elétron era proporcional a
frequência da luz.

O fato de existirem mais ou menos fótons de um determinado


comprimento de onda (frequência), não muda a energia do elétron ejetado,
mas o número dos elétrons ejetados.

O aumento da energia do fóton incidente (ou seja, a diminuição de seu


comprimento de onda ou aumento da sua frequência) é que faz o elétron ser
ejetado com mais energia.

Einstein desenvolveu, em 1905, uma teoria muito simples e


revolucionária para explicar o efeito fotoelétrico. De acordo com sua teoria, um
quantum de luz transfere toda a sua energia a um único elétron,
independentemente da existência de outros quanta de luz. Tendo em conta que
um elétron ejetado do interior do corpo perde energia até atingir a superfície,
Einstein propôs a seguinte equação, que relaciona a energia do elétron ejetado
(E) na superfície, à frequência da luz incidente (ν) e à função trabalho do metal
(Ф), que é a energia necessária para escapar do material. Isto é:

E=hν–Ф “

Podemos trabalhar com esta equação tanto em joules como elétrons-


volt, mas como será visto, será muito prático em elétrons-volt.

Segundo o Handbook of Chemistry and Physics., 93° Edição, 2012-


2013, disponível em http://www.hbcpnetbase.com/, acessado em 26/10/2012 a
função trabalho é a medida da mínima energia requerida para extrair um
elétron da superfície de um sólido. Esta distância é tipicamente da ordem de
10-4 cm.

Para exemplificar o efeito fotoelétrico vamos iluminar um catodo metálico


com luz ultravioleta com uma frequência (energia) suficiente para remover
elétrons, Figura 2.

Figura 2 – Elétrons ejetados de um catodo metálico pela incidência de

luz ultravioleta.

luz ultravioleta

vácuo

elétrons
ejetados
do metal
catodo metálico

A situação mostrada na figura acima só é válida porque a energia dos


fótons, emitidos pela lâmpada no espectro do ultravioleta, são suficientes para
transferir aos elétrons da camada mais externa dos átomos, energia para
vencer a função trabalho (Ф) do metal e ejetar estes elétrons do metal com
alguma energia cinética.
Adicionando agora uma segunda placa metálica, uma fonte de tensão
continua ajustável, um medidor de corrente, como mostrado na Figura 3,
poderemos obter a função trabalho do metal que está sendo iluminado.

Figura 3 – Arranjo esquemático para obtenção da função trabalho de um


metal.

medidor de corrente luz ultravioleta


300 nm

fonte tensão ajustável vácuo

elétrons
ejetados
do metal

- +
catodo metálico

No arranjo da Figura 3 e com a fonte de tensão ajustável em 0 V, existe


uma corrente elétrica devido aos elétrons que alcançam a placa superior e
dirigem-se via fonte de tensão para o catodo, que está positivo devido a perda
de elétrons em sua superfície. Progressivamente eleva-se a tensão da fonte de
modo a cessar a corrente observada. Neste momento podemos assegurar que
o potencial negativo aplicado sobre a placa que está coletando elétrons vezes
a carga do elétron é igual a energia cinética dos elétrons que alcançavam a
placa superior.

Para exemplificar numericamente, vamos admitir que com 2,31 V


aplicados entre as placas e com uma lâmpada emitindo ultravioleta no
comprimento de onda de 300 nm ou 1.10 15 Hz ≡ 1.1015 s-1, a corrente cessou,
Figura 4.

Figura 4 – Arranjo esquemático para obtenção da função trabalho. Neste


exemplo a corrente cessa com 2,31 V aplicados entre catodo e a placa
coletora.

medidor de corrente luz ultravioleta


300 nm

fonte tensão ajustável vácuo

elétrons
ejetados
do metal

- +
catodo metálico

Substituindo então E (energia cinética dos elétrons ejetados) pelo valor


do potencial aplicado em eV (2,31 eV), e utilizamos para ν (1.10-15 s -1), obtemos
Ф (função trabalho) do metal hipotético do exemplo.
E= hν – Ф

2,31eV= 4,135.10-15 eV.s .1.10-15 s -1 - Ф

Ф=1,825 eV

Neste momento, apenas para frisar, a radiação eletromagnética com


comprimentos de onda no ultravioleta interage com a matéria, neste caso
metais, removendo elétrons das camadas mais externas destes metais,
provocando ionização do material.

Segundo Kaplan, I. em Física Nuclear, 2° Edição, 1978, Ed. Guanabara


temos:

Se a luz de uma dada frequência pode liberar elétrons de uma


superfície, a corrente de elétrons é proporcional à intensidade da luz
(proporcional ao número de fótons).

Para uma dada superfície metálica, existe um valor mínimo da


frequência para o qual a luz incidente pode liberar elétrons (elétrons ligados
com menor energia).

A energia cinética máxima dos elétrons emitidos é uma função linear da


frequência da luz que causa sua emissão. No efeito fotoelétrico o fóton
incidente é totalmente absorvido e sua energia é distribuída de forma a
remover o elétron de sua ligação e o restante convertida em energia cinética do
elétron ejetado.

Do ponto de vista biológico, segundo B.H.Brown at all em Medical


Physics and Biomedical Engineering, IOP Publishing Ltd., 1999, o espectro do
ultravioleta está entre as radiações não ionizantes e ionizantes. Podem
produzir efeitos desde uma queimadura até um carcinoma, bem como serem
usadas em tratamentos de psoríase, na inibição da síntese do DNA.

Ultrapassando o espectro de frequências do ultravioleta, ultrapassamos


também a região de transição entre radiações não ionizantes e ionizantes.
Entrando na região dos raios-X, todas as frequências a partir desta faixa serão
sempre ionizantes e sua interação ocorre basicamente por três fenômenos:
absorção fotoelétrica, efeito Compton e produção de pares.

ABSORÇÃO FOTOELÉTRICA, extraído de Radiation Detection and


Measurement, Glenn F. Knoll, 2° Edition, 1988, John Wiley & Sons).

Acontece quando um fóton incide em um átomo, transferindo toda sua


energia a um único elétron orbital, fazendo com que ele seja ejetado. A
absorção fotoelétrica é predominante para baixas energias e para elementos
de elevado número atômico (Z), sendo proporcional a Z 5. A equação que rege o
comportamento tem formato idêntico ao do efeito fotoelétrico.

Eelétron= hν - Eligação

Eelétron ≡energia cinética do elétron liberado no meio material 

hν=energia do fóton gama incidente

Eligação= energia de ligação do elétron no átomo (camada K ou L )

Como no efeito fotoelétrico, o fóton incidente transfere toda sua energia


para o elétron e a energia restante fica como energia cinética do elétron. A
diferença é que para as energias do raio-X e acima, a absorção fotoelétrica
acontece com elétrons das camadas eletrônicas mais profundas do átomo e
portanto mais energéticas. Este elétron ejetado e com velocidade, vai ionizando
átomos do material até ser absorvido por um algum átomo.

EFEITO COMPTON OU ESPALHAMENTO COMPTON

O efeito Compton é predominante para radiações gama de energias


intermediárias e com elétrons das camadas mais externas do átomo ( menores
valências ). Este tipo de interação é inversamente proporcional à energia do
fóton gama incidente e proporcional ao número atômico do meio material. A
Figura 5 mostra um modelo para a interação do tipo Compton.
Figura 5 – Modelo para interação do tipo efeito Compton.


hν '=hν /(1+ ( 1−cosθ ) )
mo c 2

hν é a energia do fóton incidente

hν’ é a energia do fóton emergente

moc2 é a energia do elétron em repouso

Ө é o ângulo entre o caminho original do fóton incidente e o caminho do fóton


de menor energia emergente.
PRODUÇÃO DE PARES

Se a energia do fóton excede duas vezes a energia da massa de


repouso de um elétron (1,02 MeV ) o processo de produção de pares é
energeticamente possível. A interação acontece no campo coulombiano do
núcleo, onde o fóton gama desaparece, aparecendo no seu lugar um par
elétron-pósitron. Para que seja conservado o momento é necessário que haja
um corpo ou partícula que absorva o momento de recuo, geralmente o núcleo
de algum átomo. Desta forma a produção de pares não ocorre no vácuo.

Como o pósitron rapidamente se aniquila com um elétron do meio, esta


aniquilação da origem a dois fótons gama de 511 keV que são emitidos
exatamente opostos um do outro. A figura 6 ilustra este fenômeno.

Figura 6 – Produção de pares, extraída de:


http://www.abfm.org.br/c2005/palestras/palestra112.pdf

Do ponto de vista de probabilidades, a Figura 7 apresenta as tendências


de ocorrer cada um dos efeitos citados em função da energia do fóton incidente
e do número atômico do absorvedor ( pode ser uma blindagem, detector ou
qualquer material sobre a incidência de um dado fóton eletromagnético da
energia considerada.

Figura 7- Predominância da ocorrência dos fenômenos de interação em função


da energia do fóton incidente e do número atômico do material. Figura
modificada de Radiation Detection and Measurement, Glenn F. Knoll, 2°
Edition, 1988, John Wiley & Sons
ISOLANTES, SEMICONDUTORES E CONDUTORES

A Figura 8 apresenta o modelo de bandas de energia para (a) isolantes,


(b) semicondutores e (c) condutores. A banda de valência representa os níveis
energéticos dos elétrons constituintes das ligações covalentes do material. E G é
a energia de banda proibida, ou band gap do material. É uma faixa de energia
onde não são encontrados elétrons. Banda de condução são as energias
possíveis para que um elétron livre possa “circular” pelo material.

Figura 8 – Modelo de bandas de energia para isolantes, semicondutores e


condutores.

Nos modelos utilizados na Figura 8, os isolantes (a), apresentam todos


os elétrons ligados constituindo as ligações covalentes na banda de valência e
não há elétrons na banda de condução, não permitindo portanto que este
material apresente qualquer condutividade. A energia da banda proibida é
elevada e seria necessário algo como uma descarga elétrica ou temperaturas
que fundissem o material de forma a fornecer energia suficiente para que as
ligações covalentes fossem rompidas.

Os condutores (c) não apresentam a banda proibida e os elétrons estão


livres para circular pelo metal. Existem vários modelos para explicar este
comportamento, mas não serão abordados neste curso.

Os semicondutores (b) possuem uma banda proibida intermediária. Os


valores de banda proibida encontrados nos semicondutores faz com que
termicamente algumas ligações covalentes possam ser quebradas e os
elétrons participantes destas ligações passem para a banda de condução. Esta
é a razão pela qual em temperatura ambiente estes materiais tenham um
comportamento intermediário. Um semicondutor puro, também chamado de
intrínseco, à 0 k, é um isolante.

Uma analogia pode ser feita com a condutividade destes materiais.


Enquanto os metais possuem uma condutividade da ordem de 10 6 ohm-1. cm-1,
os semicondutores apresentam condutividades da ordem de 10 -9 a 102 ohm-1.
cm-1. Esta grande diferença é devida a diferença no número de portadores de
cargas livres. Diferentemente dos metais que tem elevada concentração de
portadores de carga, os semicondutores têm reduzido número de portadores
quando comparado aos metais. Além deste número reduzido de portadores,
eles também apresentam problemas com sua locomoção. Esta dificuldade
será a responsável pelo aparecimento da carga espacial dentro de um
elemento semicondutor que será um problema discutido futuramente.

Um leitor mais atento deve ter notado que em dado momento


substituímos os elétrons por portadores de carga. O termo aparece em especial
com os materiais semicondutores, pois ao quebrarmos uma ligação covalente,
por exemplo com aquecimento, um elétron vai para a banda de condução e
uma lacuna, vacância ou buraco (todos são o mesmo ente) fica em seu lugar.
Na verdade fica um estado energético que permite que um elétron venha a
ocupá-lo. Em uma banda preenchida (banda de valência), a corrente não pode
fluir pois elétrons são normalmente partículas de Fermi e respeitam a lei de
exclusão de Pauli. Um estado vazio na banda de valência é chamada lacuna e
elétrons podem se mover se há um estado vazio disponível.

Quando aplicamos uma diferença de potencial sobre um material


semicondutor, os elétrons, na banda de condução, tenderão a caminhar para o
polo positivo e o estado energético devido a lacuna fará trocas sucessivas
(elétron-lacuna) com os átomos da rede cristalina em direção ao polo negativo.
Observa-se aqui que efetivamente há o movimento de uma carga positiva, que
na verdade é apenas um estado energético. Em metais isto não acontece, pois
de forma praticamente instantânea esta lacuna é preenchida por um elétron.
Do ponto de vista do sinal elétrico os dois carregam a mesma informação,
apenas com sinais opostos. Do ponto de vista do material semicondutor é
desejável que ele seja cristalino, livre de imperfeições e impurezas, de forma
que tanto elétrons como lacunas possam caminhar dentro da rede sem
encontrar pontos onde sejam armadilhados e desta forma deixarem de
contribuir para a formação do sinal elétrico correspondente a interação
ocorrida.

Há diversas formas de se provocar o aparecimento de pares elétron-


lacuna livres em um um cristal semicondutor. Um deles é fornecer energia
térmica (ou calor). Outra maneira, consiste em fazer com que um feixe de luz,
infravermelho ou uma radiação de maior energia incida sobre o material
semicondutor. Mesmo sem campo elétrico aplicado, os portadores estão
continuamente em movimento, devido à energia térmica que recebem.
Este movimento térmico é no entanto em direção randômica, de forma
que, não há um movimento líquido de portadores. O movimento térmico
randômico dos portadores não é do tipo linear contínuo, mas sim um
movimento interrompido por colisões de vários tipos.

Após cada colisão o portador muda de direção, mantendo no


entanto a randomicidade. Com aplicação de campo elétrico, tem-se
sobreposto ao movimento Brauniano, uma aceleração das cargas pelo
campo elétrico entre uma colisão e outra, resultando num deslocamento
líquido.
Um experimento interessante para obter a energia da banda proibida
em semicondutores é utilizar um espectrômetro e observar a transmissão ou
absorção do espectro pelo cristal. Do ponto de vista da transmissão, vamos
subindo a energia (ou reduzindo o comprimento de onda) até um determinado
momento em que a transmissão vai diminuindo. O fenômeno que começa a
acontecer nesta região é devido a energia já ser suficiente para remover
elétrons da banda de valência e levá-los para a banda de condução. Como o
fóton de luz é consumido neste processo, a transmissão começa a ser
reduzida. A Figura 9 apresenta o comportamento da transmissão de um feixe
de luz sobre o cristal semicondutor de TlBr. Desta curva podemos obter a
energia de banda proibida do cristal em teste.

50

40
Optical Transmission

30

20

10

0
300 400 500 600

Wavelength (nm)

Figura 9 – Curva de transmissão ótica do cristal de TlBr.

A reta intercepta o eixo dos comprimentos de onda em 439 nm, assim


temos:
hc
E g=
λε 0

6,64 E−34∗3E8
E g=
439 E−9∗1,6 E−19

E g =2, 82 eV

MODELO DE BANDAS DE ENERGIA (SITUAÇÃO MAIS REAL)

O modelo apresentado na Figura 8 é suficiente para um primeiro


entendimento da teoria de bandas de energia em um semicondutor, mas deve
ser complementado. Como os modelos mais detalhados carregam outras
informações, vamos rever alguns conceitos:

-Célula primitiva é a menor célula de uma estrutura de uma rede cristalina com
2, 3 ou n dimensões;

-Uma rede cristalina pode ser caracterizada pela geometria de sua célula
primitiva;

-Espaço recíproco é a Transformada de Fourier desta representação e

-Zona de Brillouin é a representação da célula primitiva no espaço recíproco.

A Figura 10, extraída da Wikipedia, apresenta um esquema da Zona de


de Brillouin de uma rede cristalina cúbica de faces centradas e as legendas
para outras estruturas cristalinas quando representadas no espaço recíproco.
Figura 10- Primeira zona de Brilloin para um cristal cúbico de faces centradas e
legendas.

Este esquema permite representar melhor os estados energéticos que


os elétrons apresentam tanto na banda de valência como na banda de
condução de um cristal e propiciam assim uma visualização mais verdadeira do
modelo de bandas de energia.
Figura 11 - Alguns dos estados energéticos possíveis nos
semicondutores arseneto de índio, fosfato de índio e arseneto de gálio.
(Figuras extraídas de Instructions Manual to Accompany, Semiconductor
Devices, Basic Principles, Prof. Jaspirt Singh).

A Figura 11 apresenta, no espaço recíproco e no plano k, os estados


energéticos das bandas de valência e condução para os semicondutores
citados. Como pode ser observado, a banda de valência possui níveis
energéticos que alcançam valores máximos em determinadas posições que por
sua vez encontram valores mínimos que elétrons podem estar ocupando na
banda de condução. Esta diferença mínima de energia entre estes dois
possíveis estados energéticos é que caracteriza o valor da banda proibida ou
band gap. O modelo apresentado na Figura 8 tem finalidade didática como um
primeiro contato com a teoria de bandas, mas é muito simplificado quando
comparado com os exemplos da Figura 11. Outra situação real, é a presença
de contaminantes que criam níveis permitidos na banda proibida. Assim, um
contaminante que tenha elétrons em excesso, quando comparados aos átomos
da rede, irá produzir níveis permitidos logo abaixo da banda de condução. Por
sua vez, um elemento presente na rede cristalina que apresente menos
elétrons na ligação covalente que os átomos da rede irá apresentar níveis
permitidos logo acima da banda de valência.

Os três exemplos de bandas proibidas dos semicondutores mostrados


na Figura 11 são chamados band gaps diretos, pois para a posição de um
mínimo de energia que o elétron pode ter na banda de condução é possível
encontrar um estado energético com um máximo de energia na banda de
valência. Este tipo de band gap é o ideal por oferecer estados energéticos para
os elétrons na excitação mais “fáceis” de serem alcançados. Isto nem sempre é
verdade como pode ser visto na Figura 12.

Figura 12- Exemplo de semicondutores com band gap indireto.


Na transição com band gap indireto, parte da energia do elétron excitado
vai ser consumida na rede até que ele encontre a região de menor energia na
banda de condução ou tenha recebido energia suficiente para assumir o novo
estado energético na banda de condução.

Tabela 13 - Parâmetros resumidos encontrados nas Figuras 11 e 12.

Semicondutor Banda proibida (Eg) Tipo de transição


Arseneto de índio 0,35 eV direto
Fosfato de índio 1,34 eV direto
Arseneto de gálio 1,43 eV direto
Germânio 0,66 eV indireto
Silício 1,1 eV indireto

A observação dos parâmetros mostrados na tabela acima não permite


uma imediata avaliação dos semicondutores citados, mas o uso massivo na
industria eletrônica e suas razões ajudará neste entendimento. O arseneto de
gálio é usado em transistores de baixo ruído, como os utilizados na entrada de
antenas parabólicas. Desta aplicação podemos concluir que o valor de 1,43 eV
para a banda proibida já se constitui em um valor interessante para termos
pouca excitação térmica e portanto pouco ruído eletrônico produzido pelo
componente. Apresentam também a banda proibida direta, que facilita a
transição entre os estados relaxados e excitados dos portadores de carga e
boa mobilidade destes portadores de carga na rede cristalina. Componentes
feitos com arseneto de gálio são caros e a tecnologia de produzir óxidos sobre
sua superfície, tecnologia necessária na fabricação destes componentes é
complicada.
Da avaliação acima, podemos inferir que a banda proibida do arseneto
de índio de 0,35 eV já se constitui em um problema quando queremos
minimizar o ruído eletrônico do componente, gerado termicamente,
principalmente se for utilizado à temperatura ambiente. Os cristais de arseneto
de índio têm uma mobilidade de elétrons melhor que a do silício, mas são
difíceis de crescer. Fosfato de índio tem tido aplicação em partes de
componentes, como visores LCD.

Silício é amplamente utilizado na industria eletrônica, o que de certa


forma assegura suas qualidades, apesar da banda proibida indireta. A razão
disso é que silício, bem como o germânio já são obtidos com altíssima pureza.
Isto reflete em um número reduzido de centros armadilhadores que permitem
maior mobilidade dos portadores de carga dentro destes semicondutores.

O valor da banda proibida, apesar de não tão elevada, propicia um ruído


eletrônico aceitável à temperatura ambiente para a maioria das aplicações.
Esta situação já fica mais comprometida com o germânio, que foi substituído
pelo silício na indústria eletrônica por apresentar forte dependência das
características dos componentes fabricados com este material com a variação
de temperatura. O germânio, devido a sua estreita banda proibida, apresenta
uma elevação grande do número de portadores de cargas livres com a subida
da temperatura.

Apesar de abandonado pela industria de componentes eletrônicos, o


germânio hiperpuro, operado à temperatura criogênicas, apresenta excelentes
características, produzindo pouco ruído eletrônico devido a portadores de carga
livres e por suas excelente mobilidade de seus portadores de carga na rede
cristalina.

Mobilidade é a capacidade dos elétrons ou lacunas se deslocarem na


rede cristalina, sem serem armadilhados em níveis energéticos mais profundos
ou imperfeições da rede e podendo finalmente ser coletados. Esta propriedade
depende de fatores já citados, como a pureza do cristal ou estrutura
cristalográfica sem deformações que acabam por propiciar uma eficiente troca
dos estados energéticos dos átomos no cristal. No silício e germânio, apesar
da banda proibida indireta, as lacunas apresentam uma massa efetiva elevada
quando comparada a outros semicondutores. Esta propriedade faz com que as
lacunas tenham alta mobilidade e com isso possam ser coletadas com
facilidade. Isto é fundamental para uma boa formação do sinal elétrico devido a
produção de cargas livres em um cristal. De um modo geral, os elétrons por
serem massivos apresentam melhor mobilidade que lacunas e acabam sendo
coletados em uma extremidade do cristal; as lacunas por sua vez, coletadas
em outro extremo, algumas vezes são armadilhadas e não acabam
constituindo o sinal elétrico desejado. A coleção de cargas incompleta (elétrons
e lacunas) produz um sinal que não representa verdadeiramente a interação
ocorrida e como será visto oportunamente compromete a qualidade do sinal
desejado.

Em física do estado sólido, a massa efetiva de uma partícula é avaliada


admitindo-se o modelo semi clássico para o transporte dentro do cristal.
Elétrons e lacunas respondem aos campos elétricos e magnéticos dentro do
cristal e têm uma massa dependente da orientação dentro do cristal.
Simplificando, podemos ignorar a configuração anisotrópica de um cristal e
considerar as partículas com uma massa que é diferente em função da direção
de deslocamento. A massa é usualmente referenciada pela unidade de massa
do elétron, me=9,11×10−31 kg. Nesta unidade, a massa efetiva geralmente
estará entre 0,01 e 10, mas pode alcançar valores entre 0 e 1000.

A massa efetiva tem um papel importante nas propriedades de um


sólido, como a eficiência de uma célula solar e a velocidade em um circuito
integrado (resposta em frequência). O silício é um semicondutor que a princípio
apresenta band gap indireto, o que dificultaria as transferências de energia
entre a banda de valência e a de condução, mas como apresenta elevada
massa efetiva das lacunas torna-se um excelente semicondutor.

Tabela 14- Massa efetivas de alguns materiais semicondutores

Semicondutor massa efetiva elétrons massa efetiva lacunas


Si 1,08 0,56
Ge 0,55 0,37
GaAs 0,067 0,45
InSb 0,013 0,6
ZnO 0,29 1,21
ZnSe 0,17 1,44

LIVRE CAMINHO MÉDIO, VELOCIDADE DE DERIVA, MOBILIDADE,


CONDUTIVIDADE, CORRENTE DE FUGA, RESISTIVIDADE E TEMPO DE
VIDA MÉDIO

Para efeito de entendimento vamos tomar a semelhança existente entre


um cristal e um metal para entendermos as definições acima. As considerações
seguintes foram extraídas de Eletrônica vol. 1, traduzido do original Integrated
Electronics, Millman, J., Halkias, C. C., McGraw-Hill, 1981.

Um metal é visualizado como sendo uma região que contém um


conjunto periódico tridimensional de íons fortemente interligados, permeado de
grande quantidade de elétrons, que podem mover-se quase completamente
livres. Este quadro é conhecido como a descrição do gás eletrônico de um
metal.

De acordo com a teoria do gás eletrônico de um metal, os elétrons estão


em movimento continuo, sendo sua direção mudada após cada colisão com
íons pesados (quase estacionários). A distância média entre colisões é
chamada livre caminho médio. Como o movimento é randômico, então, em
média, existirão tantos elétrons passando através de uma área unitária no
metal, em qualquer direção, como na direção oposta, em um dado tempo. Em
outras palavras, a corrente média resultante é zero.

Veremos, agora, como a situação é modificada se um campo elétrico


constante ε (volts por metro) é aplicado ao metal. Como resultado da força
eletrostática aplicada, os elétrons de valência são acelerados e sua velocidade
aumentaria indefinidamente com o tempo, caso não houvesse colisão com os
íons da rede. No entanto, a cada colisão inelástica com um íon, o elétron perde
energia e uma nova condição inicial é atingida com um novo valor finito de
velocidade de deriva ν. Esta velocidade de deriva está na direção oposta à
direção do campo elétrico aplicado. A velocidade entre colisões em um tempo t
é dada por at, onde a=qε/m é a aceleração. Então a velocidade média v é
proporcional a ε. Assim,

v=µε

onde µ (metro quadrado por volt x segundo) é chamado mobilidade dos


elétrons. Em física de semicondutores existe a mobilidade para elétrons (µ e) e
para lacunas (µl ou µh) e as unidades usadas são cm2/V.s.

De acordo com a teoria apresentada anteriormente, uma velocidade de


deriva em regime estacionário se sobrepõe no interior do semicondutor devido
ao campo elétrico que orienta o movimento térmico (randômico) dos elétrons.
Esse fluxo dirigido de elétrons constitui uma corrente.

Este modelo citado por Millman e Halkias em seu livro, embora


considerado para um metal, é perfeitamente adequado para um cristal
semicondutor. Assim dentro de um semicondutor, sobre ação de um campo
elétrico, temos um movimento de elétrons em um sentido, lacunas no sentido
oposto, resultando em uma corrente que é uma função da coleta de todas
estas cargas. Em um primeiro momento pode parecer que estas correntes se
cancelam, mas na verdade as lacunas ao chegarem a um extremo do cristal
semicondutor por ação do campo elétrico vão permitindo que elétrons entrem
no cristal ocupando estes estados energéticos. Estes elétrons que estão
entrando no cristal têm o mesmo sentido daqueles que estão saindo na outra
extremidade do cristal.

Nos semicondutores, a temperatura passa a ser um fator de extrema


importância. A mobilidade tem um comportamento dependente da temperatura
com características diferentes em função da faixa de temperaturas. De um
modo geral, nas temperaturas usadas em detectores de radiação com
semicondutores, a mobilidade aumenta com a redução da temperatura. Este
parâmetro não deve ser confundido com a condutividade que com o aumento
de temperatura, produz mais pares elétron-lacuna que aumentam a
condutividade. É neste ponto que é desejado que o semicondutor possua uma
banda proibida elevada, justamente para não produzir termicamente pares
elétron-lacuna. Esta maior condutividade aumenta o que chamamos corrente
de fuga, que aumenta o ruído eletrônico em um detector que irá modular ou
mesmo mascarar completamente uma determinada quantidade de cargas que
iriam produzir o sinal desejado. Outros fenômenos também darão origem a
correntes de fuga, mas não serão discutidos no momento.

O silício substituiu o germânio na indústria eletrônica devido ao menor


aumento de sua condutividade com aumento da temperatura propiciando uma
menor alteração dos parâmetros do componente eletrônico. Para os
detectores de radiação, o germânio por ser crescido com elevada pureza,
apresenta uma melhor mobilidade de seus portadores de carga fazendo com
que detectores de radiação feitos com este semicondutor e operados à baixa
temperatura apresentem excelentes características como detectores.

Como pode ser visto, o cristal semicondutor ideal depende de um


conjunto de fatores e da aplicação que será dada, não nos permitindo dizer que
este ou aquele cristal semicondutor é melhor. O ênfase atual é em cristais
semicondutores que possam ser usados como detectores de radiação à
temperatura ambiente. Para isto são desejadas alta mobilidade dos portadores
de carga e baixa corrente de fuga, características dificilmente encontradas
simultaneamente.

Ainda pensando no comportamento dos elétrons e lacunas no interior de


um cristal semicondutor, vamos supor que uma radiação incida em um
semiconduto, seja absorvida pelo meio e produza por exemplo 40.000 elétrons
livres. Esta radiação só será corretamente mensurada se 40.000 elétrons forem
coletados em uma extremidade do cristal e 40.000 lacunas caminhem para o
extremo oposto do cristal e sejam ocupadas por 40.000 elétrons vindos por
exemplo da fonte de polarização (a que fornece o campo elétrico sobre o
cristal). Se isto não acontece, temos um sinal que não corresponde a realidade
da interação e pode acabar aparecendo como pouca resolução do cristal como
detector de radiação ou mesmo como uma incapacidade de definir estados
energéticos da radiação que incidiu.

A resistividade é o inverso da condutividade e é medida em ohm x


metro. Em função das dimensões dos detectores semicondutores, as unidades
usuais são ohm x centímetro (Ω.cm). Se termicamente são produzidos poucos
pares elétron-lacunas, poucos portadores de carga estarão disponíveis para
produzir uma corrente de fuga (dark currente). Isto equivale a dizer que a
resistividade é elevada e o fator sempre buscado em um detector
semicondutor. O nome corrente de fuga, geralmente usado, realmente é melhor
definido por corrente no escuro, ou seja, aquela corrente que existe sem estar
incidindo nenhuma radiação sobre o cristal, mas na prática não conseguimos
separar a corrente no escuro das demais correntes de fuga que aparecem
quando o cristal está sobre a ação de um campo elétrico. Assim, generaliza-se
e a corrente sem incidência de radiação pode ser chamada de corrente de
fuga, embora quando se considera que as demais correntes são desprezíveis o
efeito nominado corrente no escuro estará mais correto.

Para o tempo de vida médio (ζ) vamos nos referenciar a Radiation


Detection and Measurement, Knoll, G. F., John Wiley & Sons, 1989.

Assim que elétrons e lacunas são formados em um semicondutor, eles


irão tender a migrar espontaneamente ou sobre a ação de um campo elétrico
até serem coletados por um eletrodo ou a recombinação aconteça. Há
previsões teóricas que o tempo de vida médio de portadores de carga em um
perfeitamente puro semicondutor pode ser tão grande quanto um segundo. Na
prática tempos de vida três ou quatro ordens de grandeza menores são a
realidade, devido a impurezas presentes no cristal. Algumas destas impurezas
ocupam posições substitucionais na rede cristalina e introduzem níveis de
energia no meio da banda proibida. Estas impurezas podem armadilhar
elétrons ou lacunas e irão imobilizar estas cargas por períodos longos de
tempo, períodos estes que podem fazer com que a carga armadilhada não
contribua para o pulso medido.
Existem também impurezas que propiciam a recombinação dos pares.
Segundo Knoll, a recombinação por este tipo de impureza é mais comum que a
recombinação direta entre elétrons e lacunas. Na prática procura-se aumentar
o valor do campo elétrico, aumentando a velocidade dos portadores de carga e
diminuindo o tempo para coleta das cargas. Assim torna-se comum tempo de
coleta de cargas da ordem de 10 -7 ou 10-8 s para tempo de vida média de
portadores da ordem de 10-5 s. Vale lembrar que o tempo de vida médio de
elétrons e lacunas são diferentes e característicos de cada cristal, da pureza e
da qualidade cristalográfica.

ENERGIA DE BANDA PROIBIDA (Eg) E ENERGIA PARA PRODUZIR UM


PAR ELÉTRON-LACUNA (ε)

Até o momento foi visto que para a temperatura ambiente, o meio já


fornece energia suficiente para produzir pares elétron-lacuna em alguns
semicondutores. Esta energia fornecida aos elétrons ( térmica, infravermelho,
ultravioleta) dos orbitais mais externos, proporciona a quebra das ligações
covalentes e fornece energia suficiente ao elétron para passar para a banda de
condução. Com energias na faixa do raio-X e acima disto acontecem os efeitos
de absorção fotoelétrica, Compton e produção de pares. Nestas interações as
trocas de energia acontecem de forma indireta e a energia necessária para
produzir um par elétron-lacuna já não é mais a energia de banda proibida.
Estes valores são mensuráveis e para um mesmo cristal, sempre a energia de
banda proibida (Eg) é menor que a energia (ε) para produção de pares elétron-
lacuna quando a interação da radiação é por um dos processos acima. A
Figura 15 apresenta Eg e ε para vários cristais semicondutores. Esta figura é
modificada de Improved spectrometric characteristics of thallium bromide
nuclear radiation detectors, K. Hitomi at all., Nuclear Inst. and Meth, Vol A 428,
pp 372-278, 1999. No eixo x temos as energias de banda proibida (Eg) para
vários materiais e no eixo y as energias ε. O paralelogramo formado pela linha
pontilhada mostra que o comportamento dos parâmetros destes
semicondutores formam aproximadamente duas linhas paralelas. Esta situação
vai permitir, mais a frente neste trabalho, a partir de um detector semicondutor
e seu ε conhecido, inferir o ε de outro semicondutor. Ainda na figura podemos
ver o que seria a relação esperado Eg= ε.

Figura 15 – Largura da banda proibida (band gap) versus energia necessária


para produzir um par elétron-lacuna (ε) para vários materiais detectores
semicondutores. Figura modificada de Improved spectrometric characteristics
of thallium bromide nuclear radiation detectors, K. Hitomi at all., Nuclear Inst.
and Meth, Vol A 428, pp 372-378, 1999.
Eg=ε
1

0
0 0,5 1,0 1,5 2,0 2,5 3,0

Eg [eV]

A reta formada a esquerda é conhecida como relação de Klein e no


trabalho citado obteve-se os valores da reta à direita. Existe um trabalho
anterior, Comparison of HgI2, CdTe and Si (p-i-n) X-ray detectors, J. S.
Iwanczyk at all, Nuclear Inst. and Meth, Vol A 380, pp 186-192, 1996, que não
apresenta este paralelismo. Para cálculos futuros vamos tomar o trabalho mais
recente como correto.
PRINCIPAIS CARACTERÍSTICAS DE ALGUNS SEMICONDUTORES

Tabela 16 – Características físicas de alguns semicondutores a 25°C. Tabela


modificada de Progress in the Development of CdTe and CdZnTe
Semiconductor Radiation Detectors for Astrophysical and Medical Applications,
Stefano Del Sordo at all, Sensors 2009, 9, 3491-3526.

Avaliando separadamente cada característica dos semicondutores


acima, iniciaremos com o número atômico.

NÚMERO ATÔMICO

Quando maior o número atômico, maior a probabilidade da radiação


interagir com o material. Deve ser enfatizado que a interação desejada é com
raios-X ou radiação gama, que por apresentarem alta energia tem maior
probabilidade de serem absorvidos com materiais de alto número atômico (Z).
Assim cristais de brometo de tálio (TlBr) apresentariam melhor eficiência de
detecção de radiação gama quando comparados, por exemplo, com o
germânio (Ge). Esta consideração é válida para dois cristais com a mesma
espessura. Se os cristais fossem perfeitos e que todos os portadores de carga
fossem sempre coletados, um cristal maior, mesmo com um número atômico
mais baixo poderia apresentar a mesma eficiência. Isto é quase uma verdade
para o estado atual da tecnologia de crescimento do Ge. O Ge apesar de não
ter o número atômico tão elevado quanto os demais desta tabela, é crescido
com pureza elevadíssima, excelentes características cristalográficas e elevado
volume. Estas qualidades fazem do detector feito com Ge como um dos
melhores detectores atuais.
As radiações de baixa energia, como infravermelho, luz e parte do
ultravioleta apresentam pouca penetrabilidade. Como a interação é na
superfície ou pouco abaixo, o número atômico não se constitui em um
problema, razão pela qual células solares em sua maioria são construídas a
partir de substratos finos de silício (< mm).

DENSIDADE

A densidade é uma característica física, usada inclusive para cálculo de


barreiras em proteção radiológica e como o número atômico, quanto maior,
maior será a probabilidade da radiação interagir com o meio.

BANDA PROIBIDA

Banda proibida (band gap) é uma das características decisivas no


comportamento de um detector de radiação com semicondutor. Quanto maior,
menor a probabilidade de termicamente pares elétron-lacunas serem
produzidos. Isto é uma condição desejada, pois a radiação incidente (gama por
exemplo) também produzirá pares elétron-lacunas e se o número destes não
superar aquele produzidos termicamente, o sinal produzido pela incidência de
radiação não será diferenciado. Esta é a razão pelo detector de germânio ser
operado a baixas temperaturas. Com a redução da temperatura, a banda
proibida praticamente não se altera, mas o numero de portadores de carga
produzidos termicamente torna-se muito reduzido, fazendo com que os
detectores de germânio operados em temperaturas criogênicas apresentem
excelentes qualidades como detectores. Por sua vez, o brometo de tálio
apresenta elevada banda proibida e seria o melhor semicondutor como
detector levando-se em conta apenas esta característica.

A energia para criação de um par elétron-lacuna (ε) seria um fator que


quanto menor, maior o número de pares produzidos e portanto uma melhor
estatística; mas é um fator característico do semicondutor e não pode ser
manipulado. Do ponto de vista estatístico, o número de cargas produzidas são
em número elevado para energias do raio-X e acima, fazendo com que as
diferenças sejam desprezíveis em função deste parâmetro.
RESISTIVIDADE

A resistividade foi uma característica física de certa forma já discutida.


Os portadores de carga produzidos termicamente dão origem a condutividade
de um semicondutor. Como resistividade é o inverso da condutividade, um
semicondutor que apresente baixo número de portadores de carga gerados
termicamente apresentará alta resistividade, condição que pode ser obtida por
exemplo resfriando o semicondutor, como no caso do germânio. Os materiais
semicondutores que apresentam alta resistividade à temperatura ambiente são
materiais que vem sendo desenvolvidos nas últimas décadas e ainda
apresentam limitações. Para a tabela 16, levando-se em contato apenas a
resistividade, o melhor semicondutor como detector de radiação seria o iodeto
de mercúrio (HgI2).

MOBILIDADE E TEMPO DE VIDA

Na tabela 16 são mostrados os produtos mobilidade x tempo de vida (µ x


ζ). Isto é feito porque medir o produto destes valores é mais fácil que medi-los
separadamente. Do ponto de vista de avaliação das propriedades, é desejado
que tenhamos a maior mobilidade possível, bem como o maior tempo de vida
possível. Assim um produto µ x ζ elevado é a condição desejada. Como
podemos observar o silício e o germânio são semicondutores imbatíveis neste
quesito. Comparando os valores e observando que as diferenças deste produto
são muito grandes, poderíamos inferir em um primeiro momento que os demais
detectores nem funcionariam. Na realidade, quando os detectores são feitos
com materiais de alto número atômico, a espessura mínima necessária para
uma determinada energia também diminui; isto faz com que possamos utilizar
detectores muito finos e essa menor espessura permite que o tempo de coleta
das cargas seja em um período curto e menor que o tempo de vida. Knoll em
seu livro cita que detectores típicos apresentam tempos de coleção de cargas
da ordem de 10-7-10-8 s, que seriam portanto mais rápidos que os tempos de
vida da ordem de 10 -5 s de alguns detectores semicondutores. O tempo de
coleta de cargas curto é obtido com um valor elevado de campo elétrico; a
velocidade das cargas, ou velocidade de deslocamento alcança a velocidade
de saturação. Nesta condição quase todas as cargas dentro do cristal podem
ser coletadas. Como esta velocidade e da ordem de 10 7 cm/s, para uma
dimensão típica de 0,1 cm de espessura do detector, os tempos de coleta de
carga situam-se na ordem de 10 ns.

SEMICONDUTORES INTRÍNSECOS, EXTRÍNSECOS, TIPO P E TIPO N

Extraído de Knoll.

SEMICONDUTORES INTRÍNSECOS

Em um semicondutor puro, na ausência de uma radiação ionizante,


todos os elétrons na banda de condução e todas as lacunas na banda de
valência são produzidas por excitação térmica,. Nestas condições, cada
elétron deve deixar uma lacuna ao ser excitado. O número de elétrons na
banda de condução deve ser o mesmo que o número de lacunas na banda de
valência. Este material e chamado semicondutor intrínseco.
Na pratica é uma condição impossível de se obter, e as propriedades
elétricas reais dos materiais tende a ser dominadas por níveis muito baixo de
impurezas.

SEMICONDUTORES TIPO N

A partir deste ponto, n representa a concentração, número por unidade


de volume, de elétrons na banda de condução; e p representa a concentração
de lacunas na banda de valência. Em um material intrínseco, com excitação
térmica, o equilíbrio e estabelecido e tem-se a condição n i = pi

Vamos considerar agora o efeito de uma pequena concentração de


impurezas que podem estar presentes em um semicondutor como residuais,
após o melhor processo de purificação, ou ainda uma pequena quantidade
adicionada ao material para criar as condições desejadas. Se uma impureza
pentavalente (5 elétrons na última camada eletrônica) esta presente em
pequena concentração, estes átomos irão substituir sítios dentro da rede
cristalina, tomando, por exemplo, o lugar de um átomo de silício. Nesta
situação existe um elétron extra que permanece apenas fracamente ligado ao
sitio original. Portanto apenas uma pequena energia é capaz de removê-lo e
coloca-lo na banda de condução. A Figura 17 mostra um modelo de uma rede
cristalina de silício tipo n.

Figura 17 – Modelo de uma rede cristalina de silício tipo n. Extraída de


http://www.rumoaoita.com/materiais/marlos/semicondutores.pdf, acessado em
27/03/2013.

A Figura 18 mostra o estado energético permitido que aparece logo


abaixo da banda de condução para silício dopado com fósforo ( 5 elétrons na
última camada eletrônica) tornando-se tipo n.

Figura 18 – Modelo de banda de energia para um silício dopado com fósforo.


Figura modificada extraída de
http://www.ccs.unicamp.br/cursos/fee107/download/cap03.pdf, acessada em
26/03/2013.
Impurezas deste tipo são chamadas doadoras, porque contribuem
prontamente com elétrons para a banda de condução. Estes elétrons
fracamente ligados terão energia muito próxima ao topo da banda da região
proibida. O efeito líquido desta impureza no cristal é fazer com que o número
de elétrons para condução seja maior que o número de lacunas, diferente do
material intrínseco que o número de elétrons é igual ao de lacunas.

Com o silício, à temperatura ambiente, se um doador está presente na


concentração de 1017 átomos/cm3, cerca de 2 partes por milhão, a densidade
de elétrons na banda de condução será 10 17/cm3 e a concentração de lacunas
irá ser 103/cm3. Este material portanto, com portadores de carga
predominantemente sendo elétrons será chamado tipo n. Como o número total
de portadores de carga é muito grande, a condutividade elétrica de um material
dopado e sempre muito maior que a correspondente do material puro.

SEMICONDUTORES TIPO P

Vamos agora considerar uma impureza trivalente ( 3 elétrons na última


camada eletrônica) que está presente em pequena concentração dentro do
cristal. Ela irá ocupar um sitio substitucional e terá um elétron a menos que os
átomos de silício ao redor e, portanto, uma ligação covalente não estará
saturada. Esta vacância representa uma lacuna similar a deixada atrás por um
elétron quando excitado para a banda de condução, mas esta lacuna apresenta
uma característica energética ligeiramente diferente. A Figura 19 apresenta um
modelo para o silício dopado com índio, 3 elétrons na ultima camada eletrônica,
tornando-se silício tipo p.
Figura 19 - Modelo de uma rede cristalina de silício tipo p. Extraída de
http://www.rumoaoita.com/materiais/marlos/semicondutores.pdf, acessado em
27/03/2013.

As impurezas aceitadoras também criam sítios para elétrons na banda


proibida. Neste caso, o nível aceitador está próximo a parte inferior da banda
proibida, porque suas propriedades estão bem próximas aos sítios ocupados
pelos elétrons de valência.

Agora o silício é chamado tipo p e as lacunas são chamadas portadores


de carga majoritários e os elétrons minoritários. Uma medida do nível de
impureza de um material semicondutor é a condutividade elétrica, ou o inverso
a resistividade. O valor teórico para o silício intrínseco e cerca de 200.000
Ω.cm; com a mais avançada técnica de purificação disponível no momento os
valores situam-se em torno de 50.000 Ω.cm e para um típico silício tipo p de
11.000 a 16.000 Ω.cm, valores estes para temperatura ambiente.

Esta resistividade é muito baixa para permitir seu uso diretamente como
detector de radiação, pois as correntes de fuga são dezenas de vezes maiores
quando comparadas a corrente produzida por uma radiação que incide no
cristal. A técnica de produzir uma junção é a tecnologia utilizada para resolver
este problema e será discutida mais adiante.
Telureto de cádmio e telureto de cádmio com zinco (CdTe e CdZnTe)

Como discutido anteriormente, devido a impurezas presentes na rede


cristalina, o semicondutor pode comportar-se como tipo n ou p. Em qualquer
uma das situações haverá muitos portadores de cargas livres que tornam baixa
a resistividade do semicondutor ( ou aumentam a condutividade) inviabilizando-
o como detector de radiação. Vamos descrever agora o trabalho CdTe and
CdZnTe Crystal Growth and Production of Gamma Radiation Detectors de Uri
Lachish, resumindo-o do ponto de vista de como obter a partir do crescimento
destes cristais que eles funcionem como detectores de radiação.

Neste trabalho os cristais foram crescidos pelo método de controle de


pressão de vapor. Não nos importa discutir no momento o método, mas sim
citar que para este tipo de crescimento como os cristais se comportaram.

Assim que crescidos, os cristais se apresentam altamente dopados com


doadores, portanto logo após o crescimento, o cristal é tipo n apresentando alta
condutividade. Posteriormente, tratados com vapor de telúrio ocorre uma
compensação de cargas. Experimentando diferentes concentrações do
dopante ( aqui o próprio Te ) altera-se a resistividade e o tempo de vida desses
elétrons ( lembre-se que originalmente é tipo n) de forma a otimizar o ponto de
trabalho do semicondutor como detector de radiação. Adicionando
progressivamente o Te pode-se alcançar resistividades da ordem de 10 5
- 106
Ω.cm. Caso o Te ( na forma de vapor) seja introduzido em excesso no cristal,
o cristal torna-se tipo p com resistividade da ordem de 10 3 - 105 Ω.cm e não
funciona como detector de radiação.

A adição de Zn aumenta a banda proibida e a resistividade, melhorando


a qualidade deste semicondutor como detector de radiação devido a diminuição
da corrente de fuga.
Brometo de tálio (TlBr)

Vamos utilizar como referência o trabalho Influence of zone purification


process on TlBr crystals for radiation detector fabrication, Hitomi at all, Nuclear
Instruments and Methods in Physics Research A 579 (2007) 153–156.

O método utilizado neste trabalho para se obter cristais de qualidade é


além de utilizar um pó de TlBr com 99,99% de pureza, purificá-lo ainda mais
pelo método de refino zonal. Os autores apresentam os resultados para 1
passo de refino zonal, 100 passos e 300 passos. Após o crescimento os
cristais foram avaliados pela sua resistividade e mobilidade de seus portadores
de carga.

A resistividades foram 1,2 1010 Ω.cm; 8,6 109 Ω.cm e 8,3 109 Ω.cm para
1, 100 e 300 paços respectivamente. Observe que o desejado aumento de
resistividade não ocorreu, que pode ser explicado por uma melhor qualidade
cristalina obtida a partir de um material mais puro. Esta melhor qualidade ficou
clara nos resultados de mobilidade dos portadores de carga como podem ser
vistos abaixo:

Produto mobilidade x tempo de vida (cm2/V)


paços electrons lacunas
1 3.2 10-4 9.4 10-6
100 1.2 10-3 1.9 10-4
300 9.1 10-4 3.6 10-4

Os resultados como detectores de radiação mostraram, como esperado,


valores melhores para cristais com portadores de carga com maior mobilidade.
Os resultados deste trabalho mostram que não devemos nos ater a apenas
uma das características do semicondutor, mas ao conjunto, de modo a termos
detectores de qualidade.
Silício e Germânio

Como visto na Tabela 16, os semicondutores silício e germânio


apresentam o maior produto da mobilidade x tempo de vida dos
semicondutores apresentados; também são conhecidas as excelentes
características dos detectores de germânio como detectores de radiação.
Sendo isto uma verdade, como explicar esse desempenho apesar da
baixíssima resistividade que esses semicondutores apresentam em relação aos
demais?

Já foi discutido anteriormente que reduzindo a temperatura, diminuímos


os portadores de carga produzidos termicamente, mas mesmo assim as
correntes sobre o detector, quando fosse aplicada a tensão de polarização,
ainda seriam muito elevadas, mascarando qualquer sinal devido à incidência
de radiação.

Para se conseguir elevar a resistividade destes semicondutores para


serem utilizados como detectores de radiação utiliza-se da técnica de produzir
uma junção nestes semicondutores. Esta junção será feita a partir de um
mesmo material, por exemplo o silício, mas entre um silício tipo p e n como
discutido anteriormente. A partir do texto de Knoll vamos discutir o processo de
produzir uma junção.

Simplesmente pressionando duas peças destes materiais, não seria o


suficiente, pois inevitáveis separações iriam existir comparadas as dimensões
atômicas da rede. Na prática, a junção e feita em um único cristal, mudando
suas características de um lado, através da introdução de impurezas.

Vamos começar, por exemplo, com um cristal tipo p que foi dopado com
uma concentração uniforme de impurezas aceitadoras para ter esta
característica, Figura 20.
P-type silicon Acceptor
site

Si Si Si Si
Si B
Si Si Si Si
Si Si
Si Si Si Si

Figura 20 – Silício tipo p a partir da dopagem de silício intrínseco com


átomos de boro ( 3 elétrons na última camada ), figura modificada de Knoll.

Então expomos um lado deste cristal a um vapor de impurezas tipo n,


neste caso fósforo ( 5 elétrons na última camada ) que se difundem a alguma
distância dentro do cristal, Figura 21.

P-type silicon

Si Si Si
P
B
Si Si Si
P Si

Si Si Si

N-type impurity

Figura 21 – Silício tipo p que em uma das faces recebe impurezas tipo n ,
figura modificada de Knoll.

Como existe um gradiente elevado na diferença de concentração dos


portadores de carga e qualquer carga esta livre para migrar dentro do cristal,
acontece uma difusão das regiões de alta concentração para as de baixa
concentração. Desta forma, irá ocorrer uma difusão de elétrons em excesso
depositados pelo vapor do material doador para dentro do material tipo p,
Figura 22.
P-type silicon

Si Si Si
P
B
Si Si Si
P Si

Si Si Si

N-type impurity

Figura 22 – Difusão de impurezas tipo n dentro do cristal de silício tipo p,


figura modificada de Knoll.

A difusão destes elétrons de condução para fora do material tipo n, deixa


neste material cargas positivas imóveis na forma de impurezas ionizadas,
Figura 23.

P-type silicon

Si Si Si
P
B
Si Si Si
P Si

Si Si Si

Immobile positive ion

Figura 23 – Íons positivos criados por efeito da difusão dos elétrons da


região n para p, figura modificada de Knoll.
Ao mesmo tempo, este elétron de condução e capturado por uma
vacância do lado p, provocando um efeito de aniquilação desta, Figura 24.

Vacancy annihilation

Si Si Si
P
B
Si Si Si
P Si

Si Si Si

P-type silicon

Figura 24 – Elétron que deixou o orbital de um átomo de fósforo da região n


e aniquila uma vacância na região p, figura modificada de Knoll.

Com a mesma argumentação, lacunas do lado p, tendem a difundir-se


para o lado n, devido a baixa concentração destas neste material. Cada
lacuna que é removida, deixa na região p, um elétron armadilhado que
representa uma carga negativa imóvel. O efeito total é o crescimento de uma
carga espacial positiva no lado do material tipo n, e uma carga espacial
negativa do lado p. Este acúmulo de cargas, cria um campo elétrico que
diminui a tendência de novas difusões. No equilíbrio, o campo elétrico é
suficiente para impedir novas difusões através da junção e um estado
estacionário de cargas e obtido, Figura 25.
Depletion region

_
n + p

_
+
+ _
_
+
_
+

Positive ions Negative ions

Figura 25 – Acúmulo de cargas positivas na região n e negativa na região p,


por efeito de difusão de cargas, que acaba por produzir um campo elétrico
em torno de uma região que se define por região de depleção.

Esta região, chamada região de depleção, exibe boas propriedades


como meio detector de radiação. O campo elétrico produzido, causa a
qualquer elétron criado próximo ou na junção, que o mesmo seja varrido em
direção ao lado n do material e de forma similar uma lacuna para o lado p.
Desta forma, nesta região depletada, a concentração de elétrons e lacunas é
grandemente reduzida.

Em um detector de silício, a densidade de portadores de carga na região


de depleção é da ordem de 100 elétrons ou lacunas por cm 3, agora muito
baixo quando comparada a densidade de 10 10 em um material de alta
resistividade. Devido então a baixa concentração de portadores de carga, a
corrente residual é muito baixa e cargas eventualmente produzidas por uma
radiação ionizante podem agora ser discriminadas.

A junção descrita, sem aplicação de uma tensão externa, irá funcionar


como detector, mas com pouco desempenho. O campo elétrico formado
espontaneamente através da junção, é insuficiente para fazer com que as
cargas produzidas por uma radiação nesta região movam-se rapidamente e
possam ser coletadas. Nesta condição, a região de depleção será muito
pequena e a capacitância desta junção muito alta. Se aplicarmos voltagem
negativa no lado p da junção e positiva do lado n, a junção estará
reversamente polarizada. Nesta condição, os portadores minoritários de
carga, lacunas do lado n, e elétrons do lado p, serão atraídos através da
junção. Isto dará origem a corrente reversa do semicondutor, mas como
suas concentrações são muito baixas, a corrente através da junção será
muito baixa.

Fabricação de detectores de silício de barreira de superfície

Corte:

Deve ser usada uma máquina de corte por ultra som. Para evitar de
quebrar o “wafer” de silício ele deve ser fixado em um vidro com auxílio de
cera de abelha aquecida.

Tenha certeza que o wafer está completamente aderido ao vidro antes


de iniciar o corte. O corte é auxiliado com o uso do abrasivo carborundum
#400-500 e água.
Limpeza:

Lavar com CH3CCl3 (99.5%), tri-cloroethyleno, wafer +vidro,em um becker


de polietileno com ajuda de ultra som. Quando o wafer descolar coloque-o
em um banho de (CH3)2CO, cetona para remover o CH3CCl3. Em seguida
o wafer é lavado em DIWTM ,(CH3)2CO, e armazenado em HNO3 (1.38).

Algumas vezes o procedimento anterior não é o suficiente para remover


resíduos completamente. Se isso acontecer mergulhe o wafer em H2SO4
(98%) e agite em um banho de ultra som por alguns minutos até remover
qualquer resíduo. Em seguida lave na seguinte ordem: DIW,, DIW
novamente e finalmente armazene em HNO3 (1.38).
Etching Process (processo de corrosão ou tratamento químico)

Primeiro a solução para o etching deve ser preparada e usada em


poucas horas. A solução é feita em um becker de polietileno misturando
HNO3 (60%):HF (40%)=3=1.

Preparada a solução, remova o wafer do banho de HNO3, lave com DIW


e coloque em uma peneira de polietileno. Coloque cerca de 100 ml da
solução para etching em um recipiente da mesma ordem de volume e vá
enxaguando o wafer dentro da peneira nesta solução. Não deixe o wafer
flutuar na solução. A velocidade do etching é da ordem de 20-30 µm/min.
Algo em torno de 100 µm é um bom valor.

O processo de etching precisa ser finalizado rapidamente. Para isso


tenha em mão cerca de 2 litros de água para despejar sobre o wafer que
está dentro da solução do etching sem deixá-lo exposto ao ar.
Em seguida o wafer é enxaguado na solução de DEW e pode ser seco
em papel de filtro.

Se o wafer de silício é tipo n já está finalizado; caso seja tipo p deverá


ser produzida uma camada de óxido na superfície. Isto é necessário porque
no tipo p aparecem correntes de fuga na superfície elevadas que não
permitiriam a discriminação do sinal detectado.

Iniciando o processo de produção da camada oxidada, após a lavagem


com DIW deixe o wafer dentro da solução de DIW por uma hora.

Coloque novamente o wafer em uma peneira e mergulhe em 50-100 ml


de HF (40%) por aproximadamente um minuto. Lave novamente com água
em abundância sem deixar ficar exposto ao ar inicialmente. Neste momento
o wafer de silício está fortemente invertido ( a superfície está tipo n).

Agora, usando outra peneira, mergulhe o wafer em 100 ml de K2Cr2O7


(1%) + H2SO4 (98%)=10=1 por 3 segundos. Este tempo poderá ser alterado
até cerca de 30 s, buscando melhores resultados. Deve–se ir agitando a
peneira durante o procedimento para obter-se melhor homogeneidade do
óxido sobre a superfície.
.

Você também pode gostar