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Rio Juqueriquerê
Rio Juqueriquerê

Vera Lúcia Rodrigues Teixeira


Caraguatatuba - Litoral Norte - SP

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Ficha Técnica
Ficha Técnica
C a p a :
Marcos Oliveira

C o r r e ç ã o :
Eliane de Lucas Daniel

F o t o g r a fi a :
Adriana Coutinho
Gianni D’Angelo
Gustavo Grunewald

P r o j e t o g r á fi c o e d i a g r a m a ç ã o
Malu Baracat
Rafael Romero

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Agradecimento Agradecimento

Após anos de luta, consegui realizar o meu grande sonho,


freqüentar uma faculdade e concluir um curso. Durante todos esses
Agenor, Maria Dalva, Milton, Maria das Graças, Joana, Azemar,
João, Aparecida, Luciana e Juliano obrigada por estarem sempre
anos contei com a força do pai que está no céu e que sempre olhou ao meu lado, mesmo nos momentos mais difíceis da minha vida.
por mim e toda a minha família, por isso agradeço, em primeiro A todos os meus cunhados, cunhadas e sobrinhos muito obrigado
lugar, tudo que conquistei a Deus nosso pai. Em segundo lugar por estarem sempre comigo. A minha amiga Sandrinha, seu marido
agradeço ao meu pai, Antônio Teixeira dos Santos, (em memória) e meu afilhado Marcos Henrique, obrigada por vocês existirem. Às
que durante a sua passagem aqui na terra cuidou de mim e me pessoas que trabalharam comigo, André, Beth, Mona, Gustavo,
deu suporte para realizar o meu sonho. Durante anos, sonhou junto Gianni, Rafael, Malu, Rosana, Adriana Coutinho, Cléa, Eliane, e a
comigo com o dia em que meu desejo se tornasse realidade, mas Gisele que Deus abençoe a todos. Aos meus professores obrigada
Deus resolveu levá-lo para junto de ti, pois já tinha concluído sua de coração e principalmente a minha orientadora Vânia Brás, que
obra aqui na terra. Tenho certeza que de lá de cima olha sempre acreditou no meu trabalho.
por mim e guia meu caminho. Em terceiro lugar agradeço a grande A Todos que tiveram uma participação mais que especial na
mulher que sempre esteve ao meu lado, sofrendo, lutando junto minha vida, enfim todos aqueles que sempre estiveram ao meu lado
comigo, a minha mãe, dona Geralda Cardoso dos Santos, mulher nos momentos de alegria e tristeza e que nunca me desanimou
forte, grande guerreira que passou por grandes privações e, hoje, nos momentos de angústias, dificuldades, que Deus abençoe e
junto comigo saboreia o gostinho da vitória. Ao meus irmãos sucesso a todos nós.

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Dedicatória Dedicatória

Dedico este trabalho ao meu pai, Antônio Teixeira dos Santos (em Te amo muito mãe.
memória) e a minha mãe, Geralda Cardoso dos Santos, que me deram a Pai onde quer que você esteja vou continuar te amando muito, nem
oportunidade de realizar o meu sonho e contribuíram, de todas as formas, o tempo vai apagar o amor que sinto por você. O que me conforta é saber
para que ele se tornasse realidade. A eles, todo o meu respeito e dedicação. que você está ao lado de Deus, olhando por toda a sua família.

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Epígrafe Epígrafe

Estamos diante de um momento crítico na história da terra,


numa época em que a humanidade deve escolher seu futuro...
ou formar uma aliança global para cuidar da terra e uns dos
outros, ou arriscar a nossa destruição e a diversidade da vida.

Texto tirado da carta Terra e escrito no livro Meio Ambiente no Sécu-


lo 21 por Leonardo Boff

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Prefácio
A água do Rio Juqueriquerê é muito mais do que H20. É composta tam-
Prefácio

bém de muitas histórias de caiçara que viveu e ainda vive em suas margens, de
que desobedeciam aos pais e iam para o fundo. O Pora era um menino negro
que aparecia assustando a todos. Ele era temido pelos moradores do local. O
muitas histórias de pescador e de muitas brincadeiras infantis. Quantas canoas importante a acentuar é que esta história servia como regra para os que usu-
singraram suas superfícies para a pesca, para o transporte. Muita mulher cai- fruíam das águas do referido rio. E funcionava, pois todo mundo temia ser pego
çara vivia abastecendo suas casas com a preciosa água para beber, cozinhar pelo Pora. Atualmente, as regras proibitivas parecem não funcionar. Um velho
seus alimentos, para o banho e lavagem de louças e roupas. Quantos segredos pescador do rio Juqueriquerê reflete: “nós pescava muito naquele tempo e de
guardados e confessados à beira rio? No mês de junho alguns caiçaras, à meia tanto que a gente pescava, nunca faltava peixe. Hoje em dia com tanta lei que
noite de lua cheia, iam ver sua imagem refletida. Caso não a vissem, significava proíbe não tem mais nada de peixe”. O que mudou?
maus presságios. A negação do conhecimento dito tradicional que faz parte da “ciência
Há muitas histórias sobre o rio. Muitas dessas histórias estão relatadas do concreto”, como bem analisou Claude Lévi-Strauss, levou à arrogância do
neste livro e muitas outras se perderam ao longo do tempo. Seja com a morte Ocidente.
de velhos e velhas caiçaras, seja pela destruição que se alastra ao longo do Este livro é uma homenagem ao Rio Juqueriquerê. Para tanto, Vera percorreu
percurso do Juqueriquerê. Porém, há luta e resistência contra a ganância de os caminhos da memória de moradores para reconstruir a História do rio. A História
quem vê o rio apenas como um recurso financeiro. Esta lógica perversa assola revela muito dos acontecimentos que se perderam diante da História Oficial e não se
todo o litoral. Não há um sentimento de carinho pelo lugar. A lógica dominante de encontram escritos em livros. História tecida pelas pessoas do lugar, pela sua própria
apropriação indevida, de poder sobre o outro e a natureza, infelizmente, ainda cultura.
prevalece na sociedade capitalista. Silvia Regina Paes
No tempo de antigamente, para os caiçaras, o rio Juqueriquerê tinha um Socióloga e Assessora de Projetos da ACAJU

dono chamado Pora. Este sinalizava os perigos e cuidados que os usuários do


rio deveriam ter, ou seja, o pescador que pescava onde não devia, as crianças

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Sumário Sumário

Prefácio............................................................................................ 13

Capítulo I – A Cultura Caiçara.......................................................... 17


1.1 O que é ser Caiçara.................................................17
1.2 Os produtos da cultura caiçara................................22
1.3 Como a Cultura Caiçara sobrevive..........................25
Capítulo II - O Rio Juqueriquerê......................................................35
2.1 – A história do Juqueriquerê...................................35
2.2 – Projetos e Apoios.................................................53
Capítulo III – O Rio como meio de sobrevivência.............................59
3.1 – A opinião de quem depende do rio......................60
3.2 – A visão dos ambientalistas...................................61
Capítulo IV – A nova geração...........................................................65
Vocabulário.......................................................................................66
Bibliografia.........................................................................................68

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Cultura Caiçara

1.1 – O que é ser Caiçara construídas ao redor da praça. Os casebres dos pescadores eram
feitos de pau a pique se localizavam próximos às praias, bem perto
Muitas pessoas que vieram dos quatro cantos do país para viver dos rancho de suas canoas.
em Caraguatatuba, podem nem saber o que quer dizer a palavra A pesca artesanal, aquela que é praticada diretamente pelo
CAIÇARA. Procurando o significado no dicionário virtual houaiss, pescador profissional, de forma autônoma, em regime de economia
encontrei vários significados como:1 pessoa natural ou habitante familiar ou com regime de parceria com outros pescadores, com
de localidade litorânea; praiano; habitante do litoral, que vive de finalidade comercial, era muito comum na época. Na pesca de ar-
modo rústico, da pesca ou de atividade próxima. Características rastão, onde era utilizada uma rede de arrasto, todos os pescadores
típicas de muitos moradores do município e principalmente aquelas que ajudavam no trabalho tinham participação do que era pescado.
que vivem da pesca. O mar era muito rico de peixes como: o cação, o robalo e a tainha.
Para seu Pedro Paes Sobrinho, 2  o caiçara nativo é toda pes- Todas as manhãs viam se pescadores, esposas e filhos
soa que nasceu e criou no Litoral Norte. Gostam de tudo que a carregando suas fieiras de peixe para serem vendidos para os mo-
região oferece, lugar onde guarda muitas riquezas naturais, como radores da localidade. Assim a cidade era conhecida pelos turistas.
é o caso do peixe, camarão e uma variedade de produtos também O desenvolvimento não havia chegado à cidade. A sobrevivência
valorizadas por eles. das família dos pescadores do centro da cidade, como as regiões
Os caiçaras do Litoral Norte têm seus próprios costumes e tradições. isoladas, também dependiam da lavoura.
Sua principal característica é a maneira de vestir. Os caiçaras legí- As luzes que iluminavam as casas eram de lampião, as
timos gostam de andar de pés descalços, são tímidos, não gostam esteiras de taboa, planta típica de terrenos alagadiços, que utiliza-
de aparecer. Sua característica marcante é ficar a vontade. São vam para dormir eram feitas pelas próprias mulheres e a farinha
pessoas simples, mas muito cordiais, sempre dispostas a ajudar de mandioca também eram fabricadas pelas próprias famílias.
quem precisa. Algumas lembranças ainda fazem parte do cotidiano desses pes-
A cidade de Caraguá, como ficou conhecida, pela sua sim- cadores. Histórias que ficaram registradas na memória dessa gente
plicidade, era um local sossegado, de gente simples e poucas simples que valoriza a cultura de seu povo e procura preservar as
pessoas, pouco comércio, uma igreja, um cemitério e poucas casas suas tradições.

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Muitos pescadores ainda são encontrados em todo o Litoral gem, que fazem da sua cultura o seu meio de sobrevivência. Cultura
Norte para relembrar o passado e contar como a civilização mudou essa, que passa de pai para filho. Cada um a procura de uma vida
a sua vida. melhor e que tem como objetivo não deixar morrer sua tradição.
Até hoje os costumes e as tradições são seguidas pelos A FUNDACC (Fundação Educacional de Cultural de Cara-
pescadores e seus familiares e os moradores que vivem por aqui guatatuba) colheu depoimento de muitos desses pescadores, que
respeitam a cultura encontrada quando chegaram. relembraram com muita saudade dos tempos vividos e que jamais
sairão da memória. Eles contaram como era a pesca da época,
Os caiçaras de ontem e de hoje como carregavam os pescados e como eram conservados seus
peixes, já que na ocasião não existia frigorífico, geladeiras ou pei-
Em Caraguá vivem vários caiçaras, muitos deles moram às xaria. Os produtos eram preparados, salgados e secados ao sol,
margens do Rio Juqueriquerê. Eles também podem ser conhecidos para depois serem comercializados pelos armazéns de secos e
como “Piraquara”. Esta palavra vem do tupi “pira” kwar “pescaria”, molhados.
que quer dizer caipira, pescador, nome que se dá aos habitantes Muitas vinham de outras cidades para vender seus produtos
que vivem às margens de um rio e sobrevivem dele. na região, o mais procurado era o branquinho, também conhecida
Tanto os caiçaras quanto os piraquaras são homens de cora- como gonguito. Ao chegar na praia, o vendedor batia na borda da
canoa e o povo do município, atento ao chamado, vinha com seus
vasilhames para comprar a bebida. O preço do produto era barato,
atraia os compradores.
Uma das lutas dos pescadores de Caraguatatuba é em
defesa do lugar da pesca. Pessoas com grandes embarcações
motorizadas, conhecidos por eles como “tubarões”, vinham aos
poucos ocupando cada vez mais o espaço da pesca artesanal,
que durante décadas sobreviveu nas águas de Caraguatatuba,
uma arte que atravessou gerações.
Atualmente são poucos os pescadores que sobrevivem da
pesca artesanal. Alguns possuem pequenos barcos motorizados e
outros se viram obrigados a procurar uma nova atividade profissio-

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nal, deixando, por necessidade, a profissão de pescador, mesmo pregava principalmente as mulheres
que seja por um curto período. que exerciam diferentes atividades,
Geralmente essa busca por uma complementação de renda desde os serviços domésticos até os
acontece nos períodos críticos da pesca, como na época do defeso, pequenos trabalhos voltados para
quando acontece a desova, isto é, reprodução do peixe . Porém a produção de bananas, principal
cedo ou tarde, eles acabam voltando para o mar, pois foi lá que produto cultivado e exportado pela
aprenderam tudo que sabem sobre a arte da pesca. Aprenderam empresa. No local havia também a
valorizar o pescador e adquiriram os ensinamentos dos seus ante- fabrica de aguardente, onde as mu-
passados, que ainda hoje passam de pai para filho, na esperança lheres dos pescadores trabalhavam
de não deixar essa cultura morrer, mesmo sabendo das dificuldade na produção e embalagem. Estas
encontradas no dia a dia da profissão. atividades auxiliavam na economia
Mesmo com poucos pescadores sobrevivendo da pesca, doméstica dessas famílias.
para eles é de fundamental importância construir um imaginário As diferentes atividades exer-
capaz de mantê-los unidos, organizados e confiantes no seu poder cidas pelas mulheres dos pescadores
de resistência e de conquista das águas nas quais durante séculos eram os fatores que diferenciavam o
buscaram sua sobrevivência. cotidiano dessas famílias, sejam elas
As esposas de pescadores também tinham funções impor- da região central, do bairro Porto Novo ou do bairro Massaguaçu,
tantes dentro da família, além de dona de casa. Enquanto os pes- região norte da cidade. No demais, sua vidas tiveram sempre a
cadores trabalhavam no mar suas esposas se dedicavam a lavoura mesma rotina e as mesmas preocupações com suas famílias .
e aos filhos, que fora do horário de aula ajudavam suas mães no Mesmo com todas as dificuldades encontradas e tendo que
plantio e na colheita dos alimentos. trabalhar para auxiliar na economia domésticas, as mães tinham a
As mulheres usavam a troca de mantimentos e cuidava das preocupação com o futuro educativo de seus filhos. Muitas escolas
crianças enquanto seus maridos praticavam a arte da pesca. As ficavam distantes de suas casas, mesmo assim a crianças eram
que residiam no bairro do Porto Novo, região sul da cidade, também levadas para freqüentar as aulas.
trabalhavam na Fazenda dos Ingleses, empresa que tinha como Os pescadores que saíam com o raiar do sol para ir para o
atividade o cultivo e exportação de frutas, e gerava emprego para a mar, deixando para trás esposa e filhos sempre apegavam com as
cidade de Caraguatatuba e até mesmo para as cidades vizinhas. Em- crenças populares para pedir proteção com esperança de voltarem
para casa. As mulheres rezavam e pediam para Santa Barbara e
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até hoje são consumidos pela população e pelos turistas que vistam
a cidade durante o ano.
O artesanato era outra atividade exercida pelas mulheres
da região. A esteira de taboa, planta típica de terrenos alagadiços,
era confeccionada por elas. Grande parte das mulheres possuía
essa habilidade e trazia para o cotidiano familiar. A matéria prima
era muito comum na região de Caraguatatuba. A peça artesanal
era muito utilizada para forrar as camas para dormir.
As famílias pesqueiras também apreciavam as festas tradi-
cionais que aconteciam nos bairros, pois não viviam só de trabalho.
Os bailes, que faziam a alegria das mulheres, aconteciam nas casas
dos próprios moradores. As festividades não tinham data certa para
serem realizadas, geralmente o evento acontecia nos fins de sema-
Nossa Senhora dos Navegantes proteção para seus maridos, pois na. Os instrumentos utilizados para dar som ao ambiente escolhido
eram nelas que depositavam sua fé e eram elas que sempre davam para as festas eram a sanfona, o pandeiro e o cavaquinho. Nesses
coragem a cada vez que seus maridos pegavam suas canoas para dias as mulheres colocavam seus melhores vestidos, as moças
enfrentar a vastidão do mar. solteiras iam acompanhadas de seus pais, outras iam escondidas
As mulheres dos pescadores quando não estavam trabalhan- porque seus pais eram muitos severos, o que fazia com que elas
do fora de casa preparavam os alimentos que cultivavam. Muitos pulassem as janelas ou saíssem na ponta dos pés, só voltando no
deles eram estocados para durar meses ou até mesmo anos. raiar do dia.
As tradicionais receitas ensinadas pelas suas mães e avôs Os bailes de carnaval e a Folia de Reis também faziam a
sempre eram preparadas em seus fogões a lenha, feito de pau a alegria das comunidades. A folia iniciava após o natal e terminava
pique e cobertos com sapê. Elas se preocupavam em ensinar as apenas no mês de janeiro. Durante esse período o cantores de
receitas. Muitas dessas delas continuam sendo preparadas até hoje reisado entoavam de porta em porta e eram recebidos com café,
e são adotadas até mesmo por restaurantes da cidade. almoço ou jantar.
Os alimentos mais comuns de todas as comunidades de Em datas comemorativas como as festas religiosas tinham
pescadores que viviam na costa marítima eram: o peixe cozido, a toda a atenção da população. Até os moradores dos bairros distan-
banana, o palmito, a mandioca e os frutos do mar. Alimentos que
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tes da cidade andavam um longo e difícil caminho para chegar ao longa caminhada. São sonhos que muitos acalentam a anos e vê
centro da cidade, e apreciar as comemorações. Festas essas como neste dia a oportunidade de poder realizá-lo sem nenhum custo.
celebração da Congada de São Benedito e a festa de Santo Antônio. Os pescadores relataram a saudade da época em que,
Hoje em dia a Congada de São Benedito, que foi uma das mesmo com muitas dificuldades enfrentadas pelo precário acesso
principais manifestações culturais da cidade da década de 20 até a outras regiões e a vida difícil vivida pela comunidade pesqueira
meados da década de 70, deixou de existir. O principal motivo da a situação era bem melhor que os dias atuais. Eles saiam de casa
extinção desse ato cultural foi a falta de apoio aos integrantes do cedo, conheciam o tempo como a si mesmo podendo identificar se
grupo e o desinteresse do filhos e netos dos congadeiros. Seus o dia era propício ou não para pescar, mas tinham a certeza que
sucessores não se manifestaram interesse em continuar levando voltariam do mar com fartura de peixe, diferente de hoje, que sai
essa cultura as gerações futuras . A festa de Santo Antônio, que é de casa sem nenhuma perspectiva de sucesso no trabalho, talvez
o padroeiro da cidade, ainda acontece até hoje. Uma das maiores possa voltar sem o seu pescado.
atrações do evento é o tradicional casamento comunitário, que a O bairro do Porto Novo sempre ofereceu à população local
cada ano está atraindo mais e mais devotos e pessoas de todas as uma opção a mais para conseguir o sustento, o rio Juqueriquerê,
idades que vêem no acontecimento a oportunidade de selar uma um lugar rico de peixes de espécies diferentes. Os moradores utili-
união conjugal e jurar amor eterno a seu companheiro, muitos de zavam o rio para pescar e suas águas serviam para beber, banhar
e utilizar para as necessidades do lar, até a década de 50, quando
a água encanada chegou ao bairro. Águas essas consideradas pelo
moradores do bairros como “Água Santa”. Segundo a lenda, a água
do Juqueriquerê serviu para a cura de enfermos, pois eram delas
que as benzedeiras do local realizavam suas curas. Outra história
contada por eles é a existência no rio do “Pora”. Um menino negro
que cuidava do rio para que não fosse desrespeitado pelos mora-
dores e por quem alí passasse. O respeito com a vegetação do rio
e com ele próprio era de fundamental importância para o caiçara,
pois dependiam daquelas águas para sua sobrevivência.

1.2 - Produtos da Cultura Caiçara

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os grandes barcos que clandestinamente invadem o mar com a chamada
pesca de arrasto. Muitos dos pescadores se viram obrigados a exercer
outras profissões, muitas totalmente distintas da pesca para garantir
a sobrevivência de sua família.
Fabricada pelo carpinteiro artesanal, as canoas de madeiras
serviam como embarcações para o pescador, ele próprio é quem
fabricava. Atualmente a embarcação está sendo substituída pelo
barco motori-zado, pois além de ser mais desenvolvido que a ca-
noa, serve também para desviar o pescador artesanal das grandes
embarcações.
Barcos
Em Caraguatatuba são encontrados produtos da cultura
caiçara/piraquara usados pelos pescadores da cidade. O alto pre- Os pescadores como
ço da matéria prima fez com que o valor desses materiais fossem as pessoas que apreciam a
elevados e a procura ficasse cada vez menor no decorrer dos anos. natureza utilizam muito o bar-
Alguns desses produtos não são mais fabricados na cida- co para trabalhar ou passear.
de, outros ainda são encontrados em pequena quantidade, pelas As embarcações motorizadas
enumeras dificuldades encontradas ao longo dos anos tanto os grandes como os
Com muita luta e esforço do trabalho incansável da FUN- de pequeno porte têm sido
DACC, outros meios de preservação cultural foram criados para fonte de renda para algumas
incentivar a preservação da memória cultural e colaborar com os famílias em Caraguatatuba.
pescadores em ocasiões especiais. Apesar do alto preço, o barco
tem tido uma boa procura tanto
A pesca e a canoa: na cidade quanto em outros
municípios, que vem até o
Não só em Caraguatatuba, mas em todo o Litoral Norte, a nosso município para contratar
pesca artesanal, enfrenta problemas, como a escassez do peixe e a mão de obra especializada e

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de qualidade.
Aqui em Caraguatatuba, mas precisamente às margens do
Rio Juqueriquerê, existem duas carpintarias navais. Mesmo sendo
de proprietários diferentes os dois têm o mesmo objetivo, o trabalho
de qualidade e o reconhecimento financeiro.
O trabalho dos carpinteiros não resume apenas na fabricação
de barcos, eles também reformam barcos de pesca e constróem
canoas, navegação que segundo os profissionais, ainda é um pro-
duto muito procurado.
Seu Raul Ramos da Silva, está com a maior parte do seu
tempo dedicando a construção de uma escura, 3  , encomenda vinda
da cidade de Santos.
Hoje em dia a procura está menor, a madeira que não viu em seu filho o interesse pela profissão e que seguiu
tem que vir de outro estado, então isso encarece muito um outro ramo de atividade profissional.
a embarcação. Mas é um trabalho que tem que gostar Na oficina de seu Dario Ordallio Ferreira, o amor pela profis-
para fazer. Fazemos qualquer tipo de encomenda, tanto são está no sangue. A arte de fabricar barcos foi herdada de toda
a embarcação pesqueira como turística, reformamos a sua família. Desde os 9 anos de idade já freqüentava o estaleiro
também. São 41 anos de profissão. A Capitania dos com seu pai e avô, aos 14 anos seu Silva começou a exercer a
Portos já confia no meu trabalho. No final do serviço o profissão e agora aos 57 anos de idade e 30 anos que mora no
engenheiro vem e faz a vistoria e a embarcação, que bairro, se orgulha de ter formado quatro profissionais na cidade de
demora aproximadamente um ano para ficar pronta, está Ubatuba e oito no município. Seu filho é a esperança de que um dia
apta a navegabilidade. seus netos possam continuar praticando a atividade, que segundo
Seu Silva, que é parceiro da Associação dos Pescadores do ele, apesar das dificuldades encontradas e o alto preço da matéria
bairro Porto Novo, colabora com uma porcentagem do seu lucro prima ainda é uma fonte de renda para eles, seu filho e seus fun-
para a associação, é quem cria os projetos. O cliente apenas faz cionários, que, juntos, fabricam em médias três embarcações por
as especificações de que tipo de embarcação gostaria de possuir ano e reformam três.
e o projeto, automaticamente, já é desenvolvido pelo marceneiro, Há 10 anos atrás uma embarcação com oito me-

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tros comprimento custava em torno de R$ 3 mil reais, é confeccionada por algumas pessoas no litoral, embora é mais
hoje em dia o preço ultrapassa R$ 25 mil. Na mesma utilizada por pescadores que fazem da pesca um hobby.
época eu trabalhava com 17 funcionários, atualmente
estou com dois. Mesmo assim o negócio é bom. Eu que Linha e anzol
também já fui pescador, sinto que os profissionais da
área estão cada vez mais desaparecendo, as pessoas já A pesca de linhada (linha com anzol e vara) é o produto de
não tem mais interesse pela carpintaria naval. A melhor pesca mais comum entre os pescadores e pessoas que fazem da
idade para se formar um profissional é com a idade que atividade lazer e distração. O produto é comprado em qualquer
comecei a aprender com meu pais e quando ensinei para casa de caça e pesca em todo o Litoral Norte.
o meu filho, que foi aos 14 anos. Quando a pesca era em ambudância os pescadores ar-
mavam suas redes no mar a espera dos peixes, enquanto isso,
Rede e Tarrafa eles faziam o trabalho com a linhada. Outros pescadores usavam
somente pesca de anzol, devido o rio e mar serem ricos de peixe
Produto da cultura pesqueira, a rede é a principal ferramenta e ele a opção de escolher qual o peixe queria pescar. Ele percor-
usada pelos pescadores em seus trabalhos diários. Além se ser ria cerca de 2 a 3 km da praia quando chegava no final da tarde
construída por eles, elas podem ser reformadas. Também no bair- voltava para casa com cerca de 40 a 50 kg de peixe, só usando a
ro Porto Novo mora o seu Genésico Joaquim da Costa, que após
26 anos de pesca, sofreu um acidente no mar e perdeu a visão
direita, então deixou a atividade para se dedicar exclusivamente à
confecção e reformas das redes.
Seu Costa contou que demora aproximadamente 4 meses
para fazer a rede e para consertar entre 3 e 4 dias e que todos os
dias tem trabalho. Após três anos dedicados exclusivamente ao
trabalho recebe encomenda até de pescadores dos bairros enseada
e Praia da Cigarra, em São Sebastião.
A tarrafa atualmente não é muito usada pelos pescadores.
O produto pode ser comprado em lojas especialidades e também

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arte da linhada. Todo ano, no dia 29 de junho, eles fazem questão de comemorar o
Antigo pescador do Porto Novo e presidente da ONG ACAJU, dia de São Pedro, o protetor do pescador. A “Procissão Marítima”,
sr. Pedro Paes Sobrinho, relembra com carinho da vida do pescador com a benção dos barcos acontece todo ano e reúne pescadores
na época em que exerceu a função. de toda a região. É esse festejo que após a época do defeso abre
“A vida do pescador era melhor entre as décadas a pesca do camarão na cidade.
de 40 e 50. Na época existia peixe em todos os locais
de pescaria, tanto no rio como no mar. Naquela época 1.3 - Como a Cultura Caiçara sobrevive
existia muito conforto para os pescadores, até a água A cultura caiçara atualmente está sobrevivendo graças ao
era consumida do próprio Rio Juqueriquerê, o local não esforço de muitos que se dedicam em manter a memória cultural
era poluído como é atualmente, o peixe também era de sempre viva. Cada caiçara tenta manter no seu dia a dia seus
fartura, o dinheiro era pouco usado” hábitos, costumes e tradições. Órgãos e instituições trabalham in-
Sobrinho lamenta todos os contratempos que o pescador vem cansavelmente para que a cidade não perca sua cultura e tradição
enfrentando ao longo dos anos. Para ele e seus companheiros, as para que no futuro, outras pessoas possam dar continuidade ao
dificuldades são enumeras e o piraquara vem sofrendo cada vez trabalho de resgate e cidadania.
mais com a degradação do meio ambiente. Ex-pescadores, como Todos os trabalhos desenvolvidos visam o bem estar social
é o seu caso, e os que ainda exercem a profissão, teme que o de todas as pessoas que vivem na cidade ou escolheram Caragua-
exercício de pescador e a cultura local se acabe com o passar dos tatuba para passar seus dias de férias.
anos. Cada dia as dificuldades aumentam e a nova geração está FUNDACC: Fundação Educacional e Cultural de Caragua-
se afastando cada vez mais da vida da pesca. tatuba
Para seu Pedro Paes a maior causa da escassez do peixe Órgão municipal, a FUNDACC trabalha em prol da cultura de
são os barcos comerciais, embarcações de grande porte que estão Caraguá. Vários trabalhos são feitos pela instituição para o resgate
cada vez mais freqüentes na região. Atualmente elas estão tomando da identidade cultural do município e principalmente para colaborar
conta dos rios e do mar As embarcações vêm para o rio ou mar com às pessoas que tem a cultura como um meio de sobrevivência.
durante o dia e noite com rede de arrasto e levam tudo, do peixe Eventos de dança, teatro e o folclore acontecem anualmente
grande até o peixe pequeno. em nossa Caraguá. Desde a sua fundação em 1992 o município
Os caiçaras gostam de comemorar as tradicionais festas ganhou locais onde são encontradas as histórias da cidade, da
que envolvem a sua cultura, esta é outra característica do caiçara. cultura local e inovações para que a cultura tenha um espaço ga-

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rantido na cidade. consagrados do eixo Rio - São
No Polo Cultural Adaly Coelho Passos está abrigado o MACC Paulo.
(Museu de Arte e Cultura de Caraguatatuba), local onde pode ser Exposições de obras
encontrados painéis com textos e fotografias sobre os temas: edu- montadas com peças vindas
cação, política, cultura, economia entre outros. Lá existe também de museus do estado de São
uma maquete com a malha viária da cidade e os pontos turísticos Paulo também fazem parte da
existentes ao longo do município. Também em exposição perma- agenda do local.
nente, os amantes da cultura e curiosos podem visitar objetos que No MACC as pessoas
fazem parte da história da cidade e um cenário típico do caiçara que gostam de artesanato tam-
pescador, como moradia em pau a pique, apetrechos de pesca, bém podem adquirir obras de arte dos artistas locais. O artesanato
fogão a lenha entre outros objetos do cotidiano. O aquário marinho com peças de cerâmica artesanal e traçado em taboa são alguns
com espécie de peixes do Litoral Norte é outro atrativo que pode dos objetos que podem ser adquiridos.
ser encontrado no local. As peças são fabricadas pelos artesãos participantes do
O museu ainda conta com duas salas de exposições tempo- projeto Terramar, com o ceramista Bem Hur Vernizzio, e Gente de
rárias. Lá podem ser visitadas mensalmente exposições de artistas Fibra desenvolvidos pela FUNDACC . Ambos os trabalhos são de
geração de renda para as famílias.
Também podem ser encontrados no MACC livros de história
e estórias, contados pelos pescadores, lendas, depoimentos entres
outros. Os relatos são de pescadores que atravessaram gerações
e vivenciaram todos os altos e baixos da região.
Outro local que está abrigado no Polo cultural é o Arquivo
Público, é lá que está toda a história de Caraguatatuba que pôde
ser resgatado por profissionais que desenvolveram um trabalho
minucioso. Muitos outros projetos ainda estão sendo desenvolvidos,
para que a cidade tenha uma identidade cultural.
A Biblioteca de Artes Leopoldo Ferreira Louzada, que leva
o nome de uma das pessoas mais antigas da cidade e que após

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contribuir para o resgate cultural município faleceu em 2005 aos
100 anos de idade, um anos após receber a homenagem, possui
um cadastro especificamente na arte da cultura em geral. Lá está
cadastro centenas de sites e também disponibilizados quatro com-
putadores e um grande acervo de vídeos, DVD, discos para que
estudantes, munícipes e turistas possam realizar suas pesquisas
e principalmente sobre a cultura do município.
No calendário anual da FUNDACC apreciadores da boa
cultura regional pode desfrutar de eventos como:
Carnaval de Antigamente: O carnaval como era antigamente
foi um dos eventos que recebeu uma atenção especial. Seu resgate
trouxe novamente muitas famílias às ruas da cidade, principalmente
a população mais antiga do município. É
na avenida que os apreciadores da festa
relembram a época que estava esquecida. fizeram da festa sua principal diversão nos dias de carnaval.
No repertório a famosa marchinha A população que encontram dificuldades para chegar até a
relembra os tradicionais carnavais que, cidade recebem em seus bairros os bailes com um repertório bem
aconteciam nos salões com animados bai- variado como: as marchinhas, o samba, o forró, o xote e o xaxado.
les. O concurso de fantasia faz com que a Litoral em Dança (festival de dança): Bailarinos de todo o
festa ficasse mais animada. Os participan- Brasil visitam Caraguatatuba em um evento de caráter competitivo,
tes se organizam em grupos ou fantasiam considerado pelos organizadores, o maior do Cone Leste Paulista,
seus próprios filhos para participarem da quando cada qual tem a oportunidade de mostrar a diversidade de
divertida brincadeira. estilo em seu trabalho.
Os bailes têm atraído famílias in- O festival não limita somente na competitividade. Durante os
teira do munícipes e turistas de todas as dias de programação, os participantes oferecem ao público uma
idades que vendo a animação da popula- diversidade de atividades em mostra paralelas nos vários bairros da
ção local aderem a brincadeira, outros já cidade com atrações como: aulas abertas, workshop e exposições.

27
O objetivo desses atividades é acres- noites frias. É assim que muitas
centar mais conhecimento, criar intercâmbio pessoas que prestigiam as atra-
entre os participantes; e nas mostras para- ções musicais do projeto Inverno
lelas, levar a dança para as áreas descen- Quente se sentem ao comparecer
tralizadas da cidade, dando oportunidade à Praça do Coreto, em Caraguá.
para que a comunidade local possa assistir Violeiros e Seresteiros fa-
a algumas apresentações. zem com que muitos moradores
A nossa comunidade caraguatatu- relembrem o tempo das serestas e modas de violas tocadas em
bense tem a oportunidade de conhecer de noites de inverno. Músicas raiz fazem a alegria não só dessas
perto, além dos trabalhos desenvolvidos pessoas da melhor idade, mas de todos os munícipes e turistas de
pela FUNDACC, a arte corporal de outras várias faixas etárias que fazem da aconchegante praça o seu ponto
cidades brasileiras. de encontro nas noites de frias de inverno.
FET (Festival Estudantil de Teatro): Em 2004 os moradores foram presenteados com Espaço
Incentivar com prêmios a produção cuidadosa dos espetáculos e Educacional e Cultural Mario Covas. O local abriga o Teatro Muni-
valorizar a apresentação de mensagens bem elaboradas é um dos cipal que possui mais de 600 lugares e conta com camarins, sala
objetivos do FET. de aquecimento, chapelaria, sala vip, bilheterias entre outros.
O projeto que conta com a parceria da Secretaria do Estado O espaço está transformando o cotidiano dos munícipes, pois
da Cultura de São Paulo visa oferecer oportunidade a artistas no- traz para a cidade espetáculos com artistas de renome no mundo
vos e grupos amadores, desenvolver o teatro na região e torná-lo artístico, como Regina Duarte, Ana Lúcia Torres, Paulo Coronato,
acessível à comunidade principalmente a estudantes. Taumaturgo Ferreira, Chico Anysio entre outros, além de valorizar
Caraguá recebe o evento desde 2002. O sucesso do projeto o trabalho de artistas locais, como é o caso das peças Contos de
alcançou outros horizontes alcançando a popularidade em outros Areia e Zona Contaminada, produzidas pela própria fundação. O
estados, como é o caso de Minas Gerais Espírito Santos e Rio de espaço também foi construído com o objetivo de sediar eventos e
Janeiro que tem enviado seus artistas para abrilhantar ainda mais convenções.
a festa e fazer com que o evento cresça a cada ano, incentivando Natal pela Paz: No início do mês de dezembro o Natal pela
cada vez mais crianças e jovens a se interessarem pela arte. Paz, também idealizado pela FUNDACC, leva aos moradores e
Inverno Quente: Reviver o clima de convivência de antigas turistas um diversidade de atrativos natalinos com concertos de

28
natal pelas ruas da cidade. A chegada do Menino Jesus,
A Banda Musical Carlos Gomes, que conta com a participa- a apresentação do Auto de Natal
ção de 40 integrantes com idade entre 16 e 60 anos e já é tradição Pastoril e a Folia de Reis atraem
no município a mais de 50 anos, é quem faz a população recordar devotos de todas as idades.
o natal como existia antigamente. A Praça Cândido Mota é ponto Todos os eventos contam
de encontro para os amantes da boa música natalina. sempre com a participação de artis-
Recepcionar os turistas que chegam nesse período na cidade tas locais e de alunos das oficinas
é outra atividade que a banda exerce nos dias do evento. As boas culturais de teatro.
vindas acontecem em frente o Terminal Rodoviário do Município, A Folia de Reis é apresentada pelo grupo do bairro do Tin-
entrada da cidade. ga, região central do município. O grupo é composto por músicos
O presépio também é outro atrativo que contagia a todos que tocando violas, violão, cavaquinho, pandeiros e tambor.
passam pelo Polo Cultural Adaly Coelho Passos. Todos os anos os A valorização do pescador:
organizadores do evento inova em suas criações. Exemplo disso Devido as dificuldades enfrentadas pelos pescadores do Lito-
é que em 2004, a FUNDACC fez uma releitura da família sagrada ral Norte, alguns projetos foram implantados para que os problemas
em material reciclado, com a técnica do empapelamento e do papel profissionais da categoria fossem amenizados em Caraguatatuba.
machê. Para auxiliar os pescadores da região, foi criada a Colônia
dos Pescadores Z-8 Bejamin Constant. A entidade é a responsável
pela representação legal dos pescadores para o reconhecimento
do setor pesqueiro, é também encarregada pelo registro dos pro-
fissionais. Ela também funciona como mediadora nos processos
de registros junto ao IBAMA (Instituto Brasileiro de Meio Ambiente)
e a Capitania dos Portos, órgão que exerce atribuições de assun-
tos marítimos como: informações de navegação, licenciamento e
registro para que uma navegação possa adentrar ao mar, entre
outros serviços .
Em meados de 1989, no bairro da Cocanha, os pescadores
deram início ao projeto de criação de mexilhões. Com as constantes

29
pesquisas e aprimoramento, os matilicultores envolvidos no trabalho produto. A associação conta com a participação de 17 famílias.
passaram a se dedicar diariamente ao cultivo do marisco. Vários projetos que envolvem os pescadores foram criados
Para dar apoio técnico às atividades e solucionar os proble- na cidade por pessoas que ainda trabalham em prol da preservação
mas encontrados pelos maricultores e fixar os pescadores em seu da cultura regional.
local de origem, organizar o setor complementar da pesca, que O “Festival do Mexilhão” criada em prol do pescador local
inclui mulheres e conservar os recursos naturais eles criaram a acontece desde 2002 entre os meses de outubro e novembro, na
APMC (Associação dos pescadores e Maricultores da Cocanha). praia da Cocanha. Com uma grande repercussão regional a festa
A Instituição é orientada pelo Instituto de Pesca e pela AMESP traz atrativos culturais, como as tendas de arte e brincadeiras, cor-
(Associação dos Maricultores do Estado de São Paulo). rida de canoa caiçara e competições esportivas.
A criação do mexilhão foi uma alternativa encontrada pelo O “Festival do Camarão” que acontece desde 1998 no mês de
pescadores dos bairros Massaguaçu e Cocanha para o aumento junho, na praia do camaroeiro, tem a participação de todos os pes-
de suas rendas familiares. cadores daquela região. O evento conta com o apoio da FUNDACC
A criação do marisco de Caraguá é a maior produtora do e da Secretaria Municipal de Turismo e é visitado pela população
Estado de São Paulo e uma das maiores do país. A produção do e turistas que comparecem ao local especialmente para prestigiar
pescado na fazenda marinha chega a 80 o que o litoral guarda de mais belo que a “Cultura”.
tonelas por ano. 80% do produto cultiva- Lá na praia do Camaroeiro foi construído um entreposto de
do são distribuídos para restaurantes e pesca, é lá que os pescadores daquela região vendem seus pes-
quiosques do Litoral Norte os 20% res- cados com qualidade e conforto, eles também ganharam um pier,
tantes são vendidos para moradores e para facilitar a atracagem dos seus barcos.
turistas que freqüentam o local. O “Festival da Tainha” com organização da Associação de
Em recente visita a fazenda de pescadores do bairro Porto Novo, foi criado 2003 no mês de julho.
mexilhões, o Centro de Toxinologia do O evento recebe o apoio da FUNDACC e Secretaria Municipal de
Instituto Butantan da USP (Universidade Turismo.
de São Paulo) divulgou um relatório que A população do município tem prestigiado a festa. A cada
aprova a qualidade do marisco. Os técni- edição cerca de 1500 pessoas vão ao local, que também conta com
cos descartaram a ausência de qualquer atrativos culturais, comidas e bebidas típicas. O entreposto ganhou
toxinas paralisantes nos teste feitos no um marco, que conta, através de fotos e relatos com a história do

30
Rio Juqueriquerê e da cidade. Caraguatatuba.
No Porto Novo, o que vem auxiliando na economia domés- Esse trabalho ele começou a fazer visando as dificuldades
tica é a chamada “Pesca Turística”. Os pescadores organizados que a pesca estava enfrentando, após 4 anos em que a o trabalho
iniciaram esse trabalho em 2003 quando o pescador artesanal era sua única fonte de renda. Muitas pessoas da região também
sentiu necessidade de complementar sua renda. procuram no artesanato uma complementação de renda familiar.
Esse é mais um trabalho em que a Ong ACAJU está à fren-
te. É ela quem coordena os trabalhos dos pescadores. O turista ONG ACAJU (Associação Caiçara Juqueriquerê)
interessado em realizar o passeio e ouvir a “História de Pescador”,
entra em contato com a instituição e os pescadores se organizam Com o surgimento da ONG ACAJU em 11 de maio de 2000,
para participar do projeto. os pescadores do bairro Porto Novo tiveram mais um órgão que luta
Os pescadores levam o turista a vários pontos do Litoral pela preservação da cultura e o bem estar do pescador artesanal.
Norte, ensinando-os a pescar e mostrando um pouco da cultura Com a finalidade de preservar do Rio Juqueriquerê, a ACAJU
caiçara. Este projeto é aberto a todos os pescadores da região. (Associação Caiçara Juqueriquerê) composta por 10 integrantes por
O presidente da Ong ACAJU, Pedro Paes Sobrinho, disse sua vez a maioria caiçara nativo que moram à beira do Rio Juqueri-
que os pescadores não são guias turísticos, mas usa toda a ex- querê era dotada de personalidade jurídica de direito privado e sem
periência que adquiriu durante os longos anos de trabalho para fins lucrativos, mas em 2005 foi decretada pela Câmara Municipal
proporcionar ao cliente um passeio seguro, divertido, e cultural. como instituição de utilidade pública.
O artesanato é um antigo costume dos caiçaras. Fazer A criação da associação foi resultado de vários anos de
produtos de folhas de coqueiro despertou a criatividade de muitos observação, por parte desses caiçaras que observou a destruição
artesãos local. Seu Pedro Paes, como vários caiçaras, começou a de seu habitat natural, como poluição do rio, aterro do manguezal
fazer artesanato com o material por ser de fácil acesso, mas com entre outros, e consequentemente a perda de sua memória e cul-
o passar do tempo ele descobriu outro talento que guardava den- tura tradicional.
tro de si. Seu Sobrinho descobriu que seus artesanatos poderiam A ACAJU tem como objetivo propugnar pela proteção do
ir além da folha de coqueiro, então ele começou a confeccionar meio ambiente, em especial do ecossistema habitado pela comu-
vasos com cimento revestidos com conchas do mar. Atualmente, nidade caiçara; promover o estudo do ecossistema, tendo em vista
como vive de uma aposentadoria, ele faz esse trabalho por hobby seu desenvolvimento sustentável; desenvolver atividades com a
e conseguiu expor algumas de suas peças na Casa da Cultura de população que vive em torno da área de manguezal, para que haja

31
o envolvimento da mesma com o meio ambiente do qual faz parte todo o meio ambiente principalmente às margens do Juqueriquerê.
e, assim, zelar pela preservação e recuperação do meio ambiente Com a ajuda da população, escolas e de pessoas que vieram
que vive. morar no bairro e gostaram dos trabalhos realizados pela instituição,
Desde a sua criação até os dias atuais, a ACAJU já de- a entidade já promoveu diversas atividades em benefício do rio. O
senvolveu vários projetos para a preservação dos manguesais e seu objetivo é o de preservar além de suas águas, os manguezais
principalmente as Rio Juqueriquerê. e a mata ciliar, patrimônios naturais que devem ser respeitados
No primeiro ano de sua fundação, a entidade realizou um pelas pessoas e de grande importância para a vida da natureza.
total de quatro mutirões de limpeza. Foram retirados ao todo cerca O Dia Mundial de Limpeza das praias, comemorado anual-
de 12 mil toneladas de lixo e tiveram a participação de mais de 70 mente no dia 17 de setembro, também faz parte do calendário de
pessoas entre a comunidade e turistas que também se mobilizaram atividades da entidade.
com a campanha. Com o sucesso do primeiro anos, o mutirão foi A entidade reúne escolas, voluntários em parceria com ongs
o primeiro projeto que ganhou data fixa no calendário de eventos de proteção ambiental da cidade e a Fundamar (Fundação de Mu-
da instituição. seu Pesquisa e Arqueologia do Mar) de São Sebastião para limpar
Daí pra cá o órgão estendeu o trabalho para as escolas do além das margens do rio todas as praias do município.
bairro. Os integrantes da ong visitaram as entidades municipais e Todo ano mais de 200 pessoas aderem a campanha, que
estaduais com exposições e propostas para um trabalho em conjun- tem repercussão internacional, para que o dia não seja esquecido.
to. Cerca de 1.400 pessoas entre alunos e professores conheceram Além de realizar diversos trabalhos em defesa do Rio Juque-
os projetos e o trabalho da associação. riquerê a ONG ACAJU apoia trabalhos desenvolvidos por escolas,
A partir desse primeiro contato com escolas e comunidade, profissionais da área e universidades que contata a entidade para
os trabalhos da ong não pararam e vários projetos foram criados, o desenvolvimento dos sua teses.
os mutirões continuaram a todo vapor e cada vez mais as pessoas De acordo com o presidente da associação, Sr. Pedro Paes
da comunidade aderiram ao trabalho. O comércio local, Sabesp, Sobrinho, a Ong já prestou atendimento a biólogos, que pesqui-
Petrobrás e a Prefeitura Municipal também se uniram dando apoio saram sobre os caranguejos e o manguezal da região, alunos de
aos eventos. turismo e até mesmo a USP (Universidade de São Paulo) já enviou
Desde a fundação da ACAJU até os dias atuais os integrantes seus alunos para serem instruídos pela ACAJU.
da instituição têm dedicado ao máximo para que os trabalhos não
parem. Eles continuam lutando pela preservação do rio, mar e de

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 1
Pesquisado em 10 de julho de 2005
 2
um dos moradores mais antigo do bairro Porto Novo, região sul da cidade de Caraguatatuba, Litoral Norte
de São Paulo
3
Embarcação ligeira de dois mastros e velas latinas com uma ou duas gáveas..

33
34
Rio Juqueriquerê
2.1 – A História de um Rio de peixes que procuram em suas águas alimentação e abrigo para
desova, uma grande variedade de aves e espécies de animais
Localizado na região sul da cidade, o Rio Juqueriquerê1  é abrigadas em seu mangue.
marco histórico na região. Com 13 km e 600 metros de exten- O Juqueriquerê começou a ter importância para a cidade,
são, ele nasce na serra do mar e atualmente tem como afluentes quando por volta do ano de 1534, Martin Afonso recebeu do capitão
o Rio Claro, Rio Camburú e o Rio Bela Cachoeira. Dele sai alguns donatário a Capitania chamada de São Vicente, a qual começava
córregos como o Rio Cambiche, que pega algumas cachoeira de no rio Macaé e tinha como margem o rio Carupacê, nome que
baixa proporção, diferente dos seus principais afluentes. Seu nome primeiramente era conhecido o Juqueriquerê. Ele serviu como
é originado? divisor das capitanias de São Vicente e Santo Amaro, como limite
Desde os primórdios da cidade de Caraguatatuba o Rio setentrional (do lado norte). Eram duas capitanias irmãs, as terras
Juqueriquerê já faz parte de sua história. Ele foi a principal ligação ao norte pertenciam a São Vicente e ao sul Santo Amaro.
entre as cidades de Caraguá, como é Fato que tornou o Juqueriquerê como tema de discussão
carinhosamente conhecida, e São Se- política foi em 1916 quando o engenheiro J. Charvolin pediu à
bastião, por servir como divisores das Câmara Municipal a concessão para a exploração de madeira na
capitanias hereditárias. Por ser o único região. Em troca o engenheiro faria a construção de linhas ferro-
rio navegável do Litoral Norte, era de viárias industrial que ligassem o porto da Prainha, na região norte
lá que saiam várias embarcações que à foz do Juqueriquerê, que fica na região sul. Discussão política
tinham o porto de São Sebastião como que acabou sendo aceita pelos vereadores em 1º de maio de 1916
destino. Os produtos embarcados em e o engenheiro que tinha negócios na cidade teve fácil acesso ao
suas águas seguiam para o porto de Porto de São Sebastião, seu principal interesse.
Santos. O Juqueriquerê serviu como escoamento de produção
Lá está abrigado parte da Mata pela via fluvial até o mar. A baldeação dos produtos para os navios
Atlântica e um dos maiores mangues transatlânticos era realizada no canal de São Sebastião.
da região, fonte permanente de vida. Ele começou a ser conhecido em todo o estado por volta de
Também existe no local uma variedade 1906, quando uma Comissão Geográfica e Geológica do Estado

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A Exploração do Rio Juqueriquerê A lavoura também era de pequena proporção sendo predominante
no local a cultura da cana de açúcar.
A primeira preocupação da comissão de expedição foi locali- Ao longo dos trabalhos realizados, os expedidores consegui-
zar a região de Caraguatatuba, que fica no extremo norte, junto com ram fazer um estudo da origem do Juqueriquerê, que por sua vez
morro e é abrigada por ventos. Nessa época, eles concluíram que foi formado da junção de vários rios e torna-se o que é atualmente.
a população era pequena e a cidade precisava ser mais cuidada. Contataram que ao sul da grande praia está localizado a
barra do Rio Juqueriquerê. Na ocasião
o local tinha um pouco mais de 50 me-
tros de largura, regular profundidade e
oferecia boas condições de navegabi-
lidade até a junção com o Rio Claro,
o seu afluente de margem direita,
que por sua vez recebe pela margem
esquerda o Ribeirão Pirassununga e
o Rafael.
Após receber o rio Claro como
afluente, o Juqueriquerê toma nome
de Camburú, o qual conserva até a
barra do Rio Verde. Deste para cima
é conhecido pela denominação de
Rio Pardo. Assim, pode se dizer que
o Rio Juqueriquerê é formado pelo Rio
Camburú, pelo Rio Claro e Camburú,
que origina da união do Rio Verde com
o Pardo.
O Juqueriquerê, com o nome
de Camburú nasce no alto da serra,

36
tendo em seu curso superior o Rio Pardo até a confluência com A parte Navegável do Juqueriquerê
o Rio Verde.
Em 5 de setembro de 1906 os expedidores deram início
Para seguir do rio Pirassununga em diante até o lugar onde
aos trabalhos pela parte navegável do rio até o mar. Três canoas
o rio Juqueriquerê se torna navegável, os expedidores tiveram que
transportava as pessoas e equipamentos necessários para realizar
fazer esforço para atravessar a várzea e a serra no Nimbú.
o trabalho.
A estrada pelo rio só foi possível graças ao pequeno número
Uma embarcação carregava os mantimentos, uma com uten-
de pedras existentes ao longo do se curso por ser menos inclinada
sílios de cozinha, cozinheiro, três remadores e um piloto e a terceira
transversalmente. Eles constataram que em outras estradas como
com ajudante e tripulação necessária para realizar a expedição.
a do Rio Claro e o Pirassununga existiam muitos declives e verda-
Para o levantamento, os incumbidos de fazer o trabalho
deiros despenhadeiros, e muitas vezes nas passagens encontradas
utilizaram equipamentos como lunetas lugeol e bússola pris-
nesses locais existiam grandes pedras que teriam que ser removidas
mática, materiais que os ajudariam a se orientar ao longo do
com muito trabalho e pontes teriam que ser construídas para ligar
percurso do rio.
a cidade de São Paulo ao Litoral Norte.
O tempo gasto nos serviços era minuciosamente anotado,
Nas margens do Juqueriquerê o mato é limpo e toda parte
em um papel quadriculado, onde existia um esboço do local. Tra-
das suas margens também existe árvores fornecendo madeiras,
balho este que levou cinco dias para ser concluído até a altura da
sendo as mais importantes como: covi, jatahy, urucurama, louro,
barra do rio.
arariba, sapucaia, mocotauba, cajarama, cedro, ipê, pequia e jacuã.
A distância percorrida do Rio Juqueriquerê ao trajeto final foi
De todas as árvores encontradas na região pelos expedido-
de 20.600 metros e mais 1.646 metros Rio Claro acima.
res a Peroba era em pequeno número e pouco desenvolvida e já
Veja a distribuição do trajeto feito pelos expedidores de acordo com
estava se tornando rara. Já os Jequitibás estavam com tamanho
a Comissão Geográfica:
suficiente para batelões. Já o Pau D’Alho era encontrado em grande
proporção.
Outra curiosidade do local era a árvore Bacoanha, que di-
ferente de todas as outras espécies ela podia ser queimada ainda
em estado verde.

Dias Distância

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Tempo gasto 48m
Primeiro dia 4.200 m Porto Bananal ao Porto do Nimbu 3.1300 m
5h10m 1h27m
Segundo dia 2.390 m Porto do Nimbu a Barra da Várgea Grande 3.168 m
5h52m 2h56m
Terceiro dia 2.890 m Barra da Várgea Grande ao Abarracamento 2.060m
4h23m 52 m
Quarto dia 4.443 m Total metros/tempo percorrido 2.600m
4h35m 8h05
Quinto dia 6.687 m Na época foi feito, pelos expedidores, um levantamento do
3h31m percurso médio por hora da distância percorrida. Eles concluíram
Sexto dia 1.646 m que o trajeto foi de 872 m. O caminho andado máximo foi de 1.910
2h m e o mínimo de 492m. Na subida feita em canoas, os navegadores
Total metros/tempo percorrido 22.246 m fizeram um percurso médio de 2.548 m, sendo o máximo de 5.015m
24h51m e o mínimo de 1.070 m por hora.
A tripulação dividiu a região em quatro zonas distintas, sen-
A distância entre os principais pontos percorridos e o tempo do do Porto do Abarracamento até a barra da Gamboa da Vargem
gasto de subida com canoas carregadas foram os seguintes: Grande; deste lugar ao Bananal, do Porto do Bananal à barra do
Local: Distância Rio Claro e deste ao mar. A primeira zona teria uma extensão de
Tempo Gasto 2.062 metros; a segunda com 6. 438 metros; a terceira com 4.045
Barra do Juqueriquerê a Taquara 6.687 m metros e a quarta com 8.055 metros.
1h20m
Taquará a Barra do Rio Claro 1.368 m Primeira Zona:
18m
Barra do Rio Claro ao Morro da Pedra 1.762 m Neste local o leito do rio tinha de 25 a 30 metros de largura.
24m A parte tomada por praias de areia, que com pequenas enchentes
Morro da Pedra ao Porto Bananal 2.283 m ficavam cobertas de água, sendo sua direção leste em grandes

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estriões e entre barrancos altos e secos, mas distante dos morros, alagadiços entre o Rio das Mortes na margem esquerda. O Ju-
exceto no começo, quando encosta a ele na margem direita. Nesse queriquerê nasce na serra no sentido da cidade de Caraguatatuba
trecho a água era pouca e havia lugares onde as canoas carrega- e conduz em um pequeno volume de água atravessando a grande
das flutuavam com dificuldades, às vezes sendo necessárias as várzea, sem correnteza apreciável. Pouco acima os expedidores
mesmas serem arrastadas. encontraram o Rio Pau D’Alho, na mesma margem, mas já quase
sem água tendo-se empraiado para sangradouros sobre a várzea.
Segunda Zona: Do morro do Nimbú encontraram-se em sua margem esquer-
da o Rio das Mortes e junto da barra o grupo seguiu encontrando
Na Gamboa da Vargem Grande começava a margem esquer- um caminho para Caraguatatuba, passando por vários moradores.
da e paralelamente a segunda zona, local onde o rio começava a A principal fazenda da cidade encontrava-se abandonada servida
se estreitar e adquirir profundidade. Neste trecho suas águas ad- pelo porto de Nimbú, este abandonado havia anos.
quiriram maior velocidade, porém obstruído por paus secos e raízes Ao chegar ao morro do Nimbú, expedição observou que
deitadas no fundo. Tornado-o trancado por árvores dos barrancos o rio seguia logo abaixo em direção sul, onde tornou-se mais
baixos que deitaram seus galhos ou troncos sobre suas águas. largo tendo em média 15 metros de margem e com estriões
Abaixo da gôndola o rio corre para um canal cavado, tendo regulares e desimpedidos por dois quilômetros, mas, estreitado
abandonado o seu leito tortuoso antigo. Um canal estreito com uma por galhos das árvores ribeirinha. Do porto do bananal para
média entre 4 a 6 metros de largura e sendo todo trancado pela fo- baixo é que os obstáculos existentes no rio foram diminuindo
lhagem das árvores. Nesse local a correnteza era fortíssima e o leito definitivamente.
estreito, porém na resistência oposta pela remagem submergida No porto das bananas foi possível observar um caminho que
havia tronco grosso de árvore tornando uma verdadeira corredeira levava até o ponto extremo da serra do Nimbú, quatro quilômetros
logo na entrada do canal. da margem direita, onde havia várias roças, culturas. Local onde
Após estes obstáculos encontrados ao longo do caminho, morava os donos da barra do Juqueriquerê, de onde vinham as
os expedidores chegaram a um trecho onde o rio se alargou até o canoas para tratar das plantações.
morro do Nimbu, conservando-o com correnteza forte e seu leito ,
trancado. Em vários lugares entrava parte da água para sangra- Terceira Zona:
douros, que logo tornaram reunir-se ao rio.
Próximo ao morro do Nimbú os barrancos eram baixos e É na barra do Juqueriquerê que começava a terceira zona.

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Do morro da pedra em diante o rio tornava-se quase fraco e de casas plantações de pomares de frutas como laranjeiras, bananais
tamanho considerável, com onze metros de água por segundos e e pequenas lavouras de mandioca e de cana.
aumentando constantemente com gamboas pelo caminho. No porto De Taquara haviam caminhos de ambos os lados do rio que
do abarracamento o volume era de 6 metros cúbicos por segundos. levava à praia, mas quase todo o trajeto e o comércio eram feitos
com canoas. No curso inferior era grande a tiragem de lenha com
Quarta Zona: destino à São Sebastião.
Os artesãos locais faziam-se esteiras de tábuas em grande
Desde a foz do Rio Claro era que começava a última zona. quantidade para serem vendidas nas cidades vizinhas. A pesca
O rio grande como costumavam chamar o Juqueriquerê. Neste também rendia benefício para os piraquaras que lá viviam. Os
trecho o volume de água neste trecho era de 20 metros cúbicos por peixes eram de fartura no local, as tainhas subiam até a foz do Rio
segundo com uma profundidade de 4 metros e a largura de 25 a 40 Claro, local que também chagava a maré da praia, por suas águas
metros. As áreas eram grandes e cobertas com tábua. Em alguns estarem um gosto ligeiramente salgado.
lados o rio aumentava a largura do seu leito, neste trecho a corren- Neste trecho também era boa a navegabilidade do rio. Uma
teza era fraquíssima quase inapreciável. No período da manhã não variedade de produtos com destino a cidade de Santos eram trans-
havia vento e com a superfície lisa a água se tornava muito clara portados do local. Até um pequeno rebocador a vapor transpôs a
e podia ser observada a vegetação na marginal tornando bonita barra, e uma vez dentro tais embarcações podiam subir até a foz
a navegabilidade. do Rio Claro ou até mesmo um pouco acima. Isso permitiu a pro-
Da junção do Rio Claro para baixo, o Juqueriquerê ava fundidade e a ausência de qualquer obstáculo como materiais que
tanto da praia que ficava apenas ha 700 metros de distância, mas pudessem impedir o trânsito das embarcações.
retomava a direção sul correndo paralelamente ao mar em mais 3 Desobstruindo o rio deste ponto para cima, seria navegável
km para então, uma outra volta ao leste, desaguar no mar. para canoas até gamboa da Vargem Grande porque havia um canal
A largura no lugar da balsa era de aproximadamente 50 me- de 80 centímetro de profundidade. Acima da Vargem Grande o canal
tros acima da barra, local raso e tampada por um banco de areia. ia se estreitando até chegar a 40 centímetros e era tão irregular que
As primeiras casas encontradas pelos expedidores ficavam às vezes os navegadores teriam que puxar as canoas, quando as
logo abaixo do Rio Claro. Os moradores dessa região era cada vez águas estavam baixas. No trecho que ia até as cachoeiras tinha
mais freqüentes. Já na outra margem do rio, onde os barrancos apenas uns 10 quilômetros que precisaria de desobstrução para
altos favoreciam os estabelecimentos e podia encontrar junto às torná-lo navegável para canoas de grande porte, o que acarretaria

40
em um grande desperdício, visto que havia muitos obstáculos a Os trabalhos de exploração do Juqueriquerê tiveram início
serem removidos com foice e machado. no dia 19 de outubro pelo Rio Pirassununga, alargando e seguindo
O rio corre por várzeas extensas e em geral os barrancos a picada de reconhecimento a tempos abertos pelo engenheiro
são baixos e sujeito a inundações. Nenhum morro chagava em suas Washmundt. Este caminho seguiu pelo rio Pirassununga acima
margens a não ser o morro do Nimbú e o dos Paes, local isolado e pela margem direita até a cachoeira grande, onde os expedidores
afastado do barranco da margem esquerda, ficava por cima do Rio armaram seus acampamentos, e atravessaram o Ribeirão da Ca-
Pau D’Alho. O denominado morro da pedra é apenas um barranco choeira Grande afluente do rio , no ponto em que se encontrava
coberto com cerrado. uma belíssima cachoeira em um mato frondoso e pitoresco
No local existia vegetação e mato nas suas duas margens Deste ponto a cachoeira continuava seguindo pela margem
até o taquara mas já desde o morro da pedra que a vegetação era direita do rio até as suas cabeceiras e desce ainda pela margem
misturada com cerrado. De taquara para baixo era a vegetação que direita de um galho que vai até o rio verde, e por este até abaixo
predominava. É o arbusto que mais trancava o rio em toda a parte quase a sua confluência com o rio Pardo. Deste lugar ele segue o
do morro da pedra para cima e o Paraitica, madeira muito rica, mas rio acima margeando até o rancho do Caramburu e deste até subir
que produz grande quantidade de frutas pretas do tamanho de uma a estrada Dória.
jabuticaba de bom gosto. A estrada Dória que vem de São Sebastião segue margean-
Pouco acima da barra, onde a estrada de São Sebastião a do o rio Pardo e passa pelo Porto da cultura, que fica situado no
Caraguatatuba atravessa o rio havia uma balsa que dava passagem rio Novo localizado na barra do rio com o mesmo nome que é o
e junto a esta também haviam vários negócios, onde aos domingos rio Pardo; passa no porto da cultura e vai até o alto da serra em
reuniam-se muitos pessoas. Muitas canoas em movimento se en- demanda a Salesópolis.
contravam na parte povoada do rio, em frente às casas situadas O levantamento seguiu até o cume da serra do mar, na en-
nos barrancos. Nesses dias grupos de homens, mulheres e crianças trada Dória, nas cabeceiras do Rio Pardo, neste ponto a linha de
davam vida ao colorido da paisagem. chagada dos expedidores atingiu a altitude de 1.200 metros sobre
A praia da Enseada, com 12 quilômetros de extensão e curva o nível do mar. Para alcançar este ponto eles tiveram que afrontar
fraca, é interrompida pela foz do Rio Juqueriquerê, que tem suas uma estação inclemente e imprópria para trabalhos desta nature-
cabeceiras no alto da serra e constitui divisa entre os municípios de za, pois os serviços começaram em meados de outubro de1906 a
São Sebastião e Caraguatatuba tornando a praia essa dominação fevereiro de 1907, quando partiram de Salesópolis com destino a
até o rio. Guararema, onde no mesmo dia embarcaram para a capital paulista.

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Neste espaço de três meses incompletos, foram levantados capando das suas atribuições emitiu um parecer sobre a qualidade
uma região de cerca de 70 quilômetros de extensão, incluindo o do terreno, lembrando apenas que as suas visitas não deixaram
tempo que foi perdido para voltar e concluir estudos que outras de encontrar-se com a vestimenta luxuriante e soberba que eram
turmas haviam abandonado, isto é, depois de ter atingido ao porto revertidas as matas, especialmente ao Rio Pirassununga . Estes
da cultura do Rio Pardo, já próximo ao alto da serra eles tiveram postos, porém devido a grande distância que media entre eles e
que voltar no rio Novo, onde foram abertas picadas e proceder com os centros povoados mais próximos como Salesópolis em cima da
os levantamentos. serra e São Sebastião no litoral, não prosperavam, pois, na época,
No dia 6 de janeiro, os exploradores chegaram a barra do ninguém se sujeitava a permanecer isolado e nos mais completo
Rio Verde, no mesmo ponto onde tiveram o sexto acampamento. abandono.
No dia seguinte foi ligada uma linha com a do engenheiro Olavo Ao insucesso desta prova, deve acrescentar ainda a inde-
Hummel cuja estaca 307, estava em uma distância de 1.700 metros mência do clima, os acidentes de terrenos e a pouca constância
do terreno cuja diferença era superior a 200 metros. de nosso caboclo que não deixaram no abandono que se acham.
Anteriormente outros expedidores tinham iniciado um levan- Contemporaneamente os trabalhos eram feitos nessa zona,
tamento de exploração de uma ponte do Rio Novo, uma extensão estudos PIEF de São Sebastião por três turmas chefiadas pelos
de oito quilômetros. Nessa ocasião, quando a segunda turma voltou engenheiros Florence, Peters e Abreu Guimarães. Na barra do Rio
ao Porto da Cultura, mais precisamente no dia 21 de janeiro, eles Verde, o acampamento estava instalado mais próximo ao deste
foram surpreendidos com a visita do coronel Benedito Passos e engenheiro a uma distância de uns 400 metros e no Rancho do
Roberto Simon, que foram ao local para instalar um observatório Camburu foram vizinhos do dr. Peters. O contato com os enge-
meteorológico. Eles passaram o resto do dia tirando fotografia nheiros e seus auxiliares veio a suavizar um pouco o estado de
das culturas mais importantes do lugar, assim como do novo porto abatimento que encontravam os expedidores pela separação da
meteorológico. família, fadiga, falta de conforto, pelos insetos em excesso nesta
No vale do alto do Juqueriquerê existiam instalados três região e especialmente pelas intemperaturas do tempo que não
pontos de cultura que tinham o nome de Caramburu, Boracea e davam trégua.
Rio Pardo fundados a títulos de ensaio, para conhecimento da O transporte foi outro problema encontrado pelos expedi-
qualidade, da fertilidade do solo e dos cereais que mais vigassem dores. No primeiro momento eles tentaram seguir o método adap-
nessa zona. tado por outras turmas, preparando a estrada para os cargueiros.
Alexandre M. Cococi, um dos integrantes da tripulação, es- Fizeram seis quilômetros de estrada regular para a tropa. Com

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o tempo limitado e a grande distância a vencer, e as dificuldades topógrafo que ia concluir um serviço de levantamento geográfico na
encontradas no terreno que ora apresentava pedras gigantescas, área e também nas estradas da bacia do Juqueriquerê. A tarefa do
ora despenhadeiros, ora enormes tosseiras de taquaras, sendo botânico Gustavo Edwal, integrante da equipe dos expedidores que
destino desses propósitos, eles seguiram a abrir uma picada que estavam fazendo o estudo do rio, era estudar a vegetação do local.
permitisse o trânsito a pé, com as cargas nas costas. Desta maneira, A excursão era prometedora. O descobrimento de diversas
a agilidade técnica dos serviços aumentou imensamente, permitindo espécies de plantas que seriam encontradas na região. Naquela
fazer uma média diária de 100 metros, inclusive a abertura de pica- época nada havia sido publicado sobre as espécies da serra do mar.
das, serviço de enxada e levantamento tecnométrico, enquanto que O botânico teve uma curta passagem pela região. Ele che-
antes gastavam-se entre seis e sete dias para fazer igual extensão. gou ao acampamento do Pirassununga no dia 18 de outubro, onde
Um dos companheiros do sr. Gustavo Edwall, por motivos permaneceu até o dia 7 de novembro, quando foi obrigado, por
particulares, no dia 7 de novembro, desligava-se da turma e partia motivo de doença, voltar para a capital.
para a Enseada a trabalho de sua profissão e o sr. Pedro Saturnino, Os outros serviços foram interrompidos pelas freqüentes
também se desligou da turma no dia 3 de janeiro. Assim os expe- chuvas da época, na encosta da serra e na vizinhança do oceano.
didores ficaram completamente sós naquele sertão despovoado e Mesmo com os pouco dias de permanência no local Edwal
triste. fez um levantamento de sua observação. Ele concluiu que a ve-
No dia 3 de fevereiro foi feito um levantamento de aproxima- getação na serra não tinha sido incluídas nas da região por Vom
damente quatro quilômetros no rio Campestre , desde o posto dos Martins em sua topografia brasileira.
Pilões, no rio Pardo, até além do acampamento do Mato Limpo. E No norte do estado os seus picos mais altos já teriam sido
assim deram por concluída a tarefa que teve como ponto de partida visitados por cientistas, porém Vom Martins só passou pela velha
o rancho do Pirassununga, na altitude de 10 metros sobre o nível estrada do Rio de Janeiro à São Paulo descrevendo sua vegetação.
do mar, com irradicações da mesma linha e ficaram as dos rios Funcionários da seção botânica percorreram todo o Litoral Norte, ao
Caramburu e Campestre com 14 quilômetros de extensão. longo das praias, subindo a serra em três diversos pontos, indo de
Ubatuba a Taubaté, da raiz da serra até o alto, e de Iguape Ribeira
A excursão do Rio Juqueriquerê acima até Yporanga. Os botânicos fizeram numerosas excursões
ao alto da serra e tomou como base todas as direções. Mas nessa
Pouco depois do regresso da equipe ao rio do Peixe, no mês enorme massa silvestre ainda escondia muitos segredos e eles
de outubro, eles tiveram de voltar e acompanhar um engenheiro ousaram esperar que a nova estrada que acabava de ser aberta ao

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longo do Juqueriquerê e seus afluentes ficasse pronta, pois seria de, a qual dá um cunho especial na paisagem. O calor era forte e
um poderoso meio para se conseguir valiosas contribuições para o sol fértil, por isso tinha todas as condições para uma vegetação
seu conhecimento. exuberante e as maiores probabilidades para um bom êxito de
O caminho de Caramburu, o Juqueriquerê em seu curso certas culturas puramente tropicais, que uma vez que a zona seja
médio, e o Pirassununga, rio afluente, as montanhas prepostas do aberta para o povoado.
rio Claro, outro afluente, o próprio mar da Enseada e a margem A fertilidade do solo se dava por ser formado pela decompo-
direita do Juqueriquerê constituíam os limites dessa área que é sição dos gnaisse e granito e as suas majestosas florestas. Toda
uma enorme baixada, coberta porém por uma manta bastante a região era coberta de matas altas, não havia clarões, senão em
alta e densa. O acampamento do Pirassununga, era considerado alguns pontos onde geralmente se desenvolve com força extraordi-
o ponto de partida. Os expedidores costumavam fazer as excur- nária. O taquarussú, considerado nessas paisagens como padrão
sões em três direções. Uns quatro quilômetros para cima acima, de terra boas, era também encontrado na região. Essa gigantesca
acompanhando a picada em construção; para a direita, seguia o gramínea achava-se quase sempre nos declives dos morros, subs-
caminho que atravessava a baixada, com o Ribeirão do Gentio; e tituída na baixada por uma ou outra mais fina e por cresciumas,
para trás, até o acampamento Cauvi, situado na estrada que ligava que às vezes cobrem inteiramente em forma de colunas piramidais
o acampamento com o arraial da Enseada na beira mar. as árvores em grandes extensões. o palmito (euterpe-edulis) era
A zona em questão era caracterizada pela grande humilda- muito comum nas baixadas.
Eles descobriram também que pouco além do acampamento
havia uma mancha clara na vegetação escura e comum, constituída
por grande quantidade de vários salanum e sobre tudo por cecropia
(embaúba) em conseqüência que sempre presume ter sido roçado
uma vez essa parte. Realmente achou-se logo após nessa parte
vestígios de uma cultura abandonada. As embaúbas são rápidas
sucessoras das culturas abandonadas, sendo elas muito comuns
na serra do mar. O motivo do abandono desse lugar era sem dúvida
a falta de boas vias de comunicação com o litoral, a mais perto que
existia e a única razoável saída para os produtores.
Do rio Pirassununga acima foi observado como as matas to-

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mavam mais e mais o caráter da vegetação das montanhas, ficando “A serra do mar estendendo-se ao norte e sul é
mais abertas, até teve ocasião de admirar o jequitibá, que na altura formada pela costa do Brasil e compõe uma maior
do peito, media não menos que seis metros e vinte centímetros de parte de rochas graníticas eruptivas e de gnaisse,
circunferência e havendo, quase junto a este gigante, um outro de sendo que suficientemente decompostas formam
dimensão um pouco menor. um solo muito fértil, pelo que a serra do mar acha-
Os grandes jequitibás que existiam na vizinhança do litoral se coberta de matas virgens.
já tinham sido procuradas e cortadas para servir de canoas, que As mesmas rochas são também as princi-
são feitas de um só tronco, em que os arrojados pescadores da pais na formação da serra de São Sebastião, em
costa navegam mar afora, bem longe das praias. Tanto quanto se cujas vizinhanças os Rios Juqueriquerê, o Tietê e
pode observar as matas acentuadas mais acima ainda das que também o Paraíba têm as suas nascentes.
foram percorridas achavam-se livre de mato rateiro. Existiam ali Do caminho entre São Sebastião e Enseada
riquezas nas florestas, que só esperavam um tratamento racional, e do acampamento de Pirassununga, afluente do
uma extração criteriosa e culturas adequadas. Juqueriquerê , obteve amostras das rochas cole-
A seção botânica do Estado de São Paulo possuía, da época, cionadas pelo botânico Gustavo Edwall. Todas são
uma grande coleção de madeiras, que foram adquiridas na cidade Biotitgranito, muitas vezes bastante decompostas
de Cubatão, litoral sul do estado. Uma lista parcial da mesma es- kaolinisadas e P.P. podres em biotita com pequenas
pécie já tinha sido publicada no relatório da seção em 1901, e as veias puras de quartzo.
matas percorridas em geral eram identificadas como as daquela Estas rochas graníticas, de origem eruptivas,
localidade. acham-se como se vê pelas amostras coleciona-
Em seguida o botânico listou várias plantas que em sua das, cortadas por numerosos filões e pequeno
curta demora no acampamento de Pirassununga ele pôde colher maciços de rochas mais básicas e ricas em pla-
para o herbário. Ele considerava que era de interesse e valor saber gioklásio, todos pertencentes a série magmáticas
quais as gerações geológicas existiam em certas zonas vegetais. de gabbrodioritos.
Ele colheu também amostras de algumas pedras existentes no Além destas, existem filões típicos inteira-
local. As espécies foram entregues para a seção geológica e uma mente pretos e compactos, também com pagiokla-
boa parte delas foram estudadas pelo Dr. Eugênio Hussak, chefe sio, que correspondem a verdadeiros basaltos
daquela seção, que fez a seguinte avaliação: fedespathicos. Tais rochas eruptivas filonianas

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de natureza basaltica já teriam sido encontradas As rochas basálticas, de fedspath, que pro-
próximo a cidade de Santos. As rochas são de vavelmente existme em filões foram todas encon-
gabbro-dioritico são de um interesse especial, e tradas próximo a São Sebastião e Enseada
consegui, no correr dos meus longos anos no Bra- Uma análise clínica e rigorosa destas rochas erupti-
sil, verificá-las no litoral inteiro desde a Bahia até vas seria de grande valor científico, sobretudo para
Santa Catarina. poder-se provar que estas transições de norito para
Macroscopicamente estas rochas parecem muitos dioritos e amphibolitos existem também em relação
diferentes, mas na estrutura microscópica elas a constituição clinica da magma gabrro-dioritica.”
mostram que só existem pequenas diferenças na Hussak pretendia mais tarde examiná-las juntamente com as rochas
composição mineralógica. do mesmo grupo proveniente da Bahia e de Santa Catarina, incluin-
Todas essas rochas eruptivas são livre de do nesta publicação descrições detalhadas de todas as amostras
quartzo e essencialmente composta de pagiokla- que a este respeito se achavam a sua disposição.
gio e pyroxênio junto com um pouco de magnésio, A zona que por tanto tempo ficou esquecida, bem se pôde
algumas vezes aparecem também amphiobolio compreender a sua suma importância. O botânico sentiu muito
pardo e biotito na mesma cor. quando se viu obrigado a desistir da viagem caminho acima. Sua
O pyroxênio desapareceu quase que com- esperança é que em uma outra oportunidade pudesse voltar ao
pleto e assim formam-se rochas puramente dio- local e continuar os estudos, porém em direção oposta, isto é des-
ríticas; às vezes de textura chistosa parecendo cendo a serra. Sendo assim, provavelmente, encontraria condições
amphibolitos. favoráveis para as investigações havendo nestes trechos pontos
As rochas encontradas no local foram as seguintes: fixos de apoio.
1 – Olivim – norito , acampamento do Pirassununga Não se tem na região nenhum registro que conste a volta do
2 – Olivim – gabbo, Ilha de São Sebastião botânico para a cidade para continuar a exploração do local, que
3 – Gabbo, Ilha de São Sebastião um problema de saúde o fez afastar naquela época.
4 – Diorito porphyrite, São Sebastião, Pirassunun- No relatório das coordenadas astronômicas de São Sebas-
ga, Pedreira tião, apresentado pelo engenheiro Cornélio Schimdt ele relata que
5 – Plagioklasio – amphibolito, São Sebastião, o litoral do estado pode ser dividido em duas partes, a do norte até
Enseada e Pedreira Paraty, no estado do Rio de Janeiro, até Conceição, na qual a serra

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do mar vem junto ao oceano, e ao sul que recua a um semicírculo serra do mar, cujos picos chegavam a dois mil metros de altitude.
terminando no maciço da serra negra em Ararapira. Ele concluiu Assim tornava-se imprópria para constituir ponto de reforço
que no Litoral Norte a serra acompanhada do oceano geralmente para os povoadores e aventureiros, que tendo que avançar muito
deixa pequenas tiras de terrenos baixos e mangues, entre o maci- para o interior na procura de minas precisavam deixar seus trajetos
ço que levanta a pique e o mar, e quando por exceção encurva-se assinalados com culturas e guardas, que facilitando-lhes a volta as-
formando área desses terrenos, e em pequena extensão estão os segurasse orientação de entrada e por mais facilmente se fizesse
formados pela barra do Rio Juqueriquerê. as comunicações com a metrópole.
Schimit relata ainda que a única importante bacia existente Na região sul já havia moradores, a barra era mais larga e
na região do litoral é a do Juqueriquerê, que a partir da ponta do profunda, as serras tinham uma altura menor facilitando o acesso,
arpoador segue em curva até Caraguatatuba, e daí para o norte , assim se deu o povoamento e o acesso com maior facilidade, fir-
sempre cortada por pequenas praias até o extremo norte do Litoral mando assim aquela região como o principal núcleo de povoadores
Paulista. do litoral.
Em seus estudos ele concluiu que o estado tem três principais Em razão da bacia do Rio Juqueriquerê o governo do esta-
barras entre seus limites norte e sul: Santos Ribeira e o Juqueri- do, por meio da Secretaria da Cultura, determinou a criação de um
querê. Consequentemente três pontos que deveriam se originar, núcleo colonial no alto da serra para iniciar um núcleo de popula-
quando os portugueses descobriram as terras ou povoados em ção. Sobre boas condições de sucesso determinou a reabertura
demanda em terrenos de culturas e minas, procuraram penetrar e concertos de uma estrada entre as proximidades de Mogi das
no interior do estado. Cruzes e São Sebastião com transporte econômico, para facilitar
Ele relata que vindo do sul em vários navios de vela, a partir a comunicação entre o litoral e a capital. O governador visitou pes-
do Rio de Janeiro, acompanhavam sempre a direita a grande serra, soalmente a região para animar com sua presença o espírito de
muralha de vasta fortaleza , que lhes vedava a entrada até a foz iniciativa e o caminho vitorioso do progresso.
do Juqueriquerê. Na louvável persistência de valorizar a zona e torná-la co-
A entrada pelo Rio Juqueriquerê com o percurso apenas nhecida determinou o governo a exploração da bacia do Juqueri-
de poucos quilômetros por terrenos baixos sinuosa e estreita , es- querê. O chefe da comissão Geográfica designou para o trabalho
barrava com a serra de difícil escalação. Mesmo subindo no alto o engenheiro Dr. Olavo Hummel, que já havia efeito um serviço
continuavam os terrenos montanhosos, e depois de atravessar o de igual natureza. Acompanhado de dois auxiliares ele partiu da
estreito do Vale do Paraíba, encontravam a cadeia principal da capital em 1906 e regressou em dezembro do mesmo ano, tendo

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desempenhado brilhantemente sua comissão, na qual apresentou cultura local que ainda guarda os habitantes.
bem com auxiliares que trabalharam isoladamente sob sua espe-
cialidade técnica. Juqueriquerê: Um patrimônio de todos
De acordo com o engenheiro, o seu trabalho foi adiado pelo O povoado de Caraguatatuba surgiu com o desenvolvimen-
chefe da comissão por causa de outra tarefa que teria que realizar. to das cidades de São Sebastião e Ubatuba, com seus portos de
Somente no final de 1909, o engenheiro voltou ao local e concluí grande importância no século XVII. Um século antes a cidade foi
a pesquisa. conhecida como Enseada dos Guromomins, pois seus primeiros
Outros expedidores tiveram na cidade para realizar tarefas habitantes foram os índios Guaromimins, remanescentes do grupo
de exploração na região, só que desta vez em todo o Litoral Pau- indígena Guaianá.
lista. Em 1912 uma expedição foi feita desde a cidade de Santos Entre os anos de 1664 e 1665, Manuel de Faria Dória, Ca-
até a fronteira do Rio de Janeiro, e no relatório apresentado pelo pitão Mor da Capitania de Itanhanhém fundou a Vila Nova, que
engenheiro Guilherme Wendell ele disse que a verdadeira serra do recebeu o nome de Vila de Santo Antônio de Caraguatatuba.
mar encontra-se na serra do Juqueriquerê, que divide as águas que No início do século XVIII, a vila desapareceu e ficou conhe-
vão para o litoral e as que nascem para os Rios Tietê e Paraíba. cida com a vila que desertou. A população local foi vitimada com o
Ele relata ainda, que o Juqueriquerê é o rio mais importante surto da varíola, conhecida como doença da bexiga. O restante dos
do Litoral Norte do Estado de São Paulo , cuja barra fica cerca de moradores que sobreviveu a epidemia dirigiu-se para as cidades
dois quilômetros da enseada e cujas cabeceiras vêm desde o Morro de Ubatuba e São Sebastião.
do Corcovado. Em 16 de março de 1847, o presidente da província de São
Muitos obstáculos foram encontrados pelas pessoas Paulo, Manuel da Fonseca Lima, elevou a cidade em condição de
que descobriram as belezas e riquezas do Rio Juqueriquerê. Freguesia. Dez anos mais tarde, em 20 de abril de 1857, Cara-
Para realizar os trabalhos de exploração muitos outros locais guatatuba foi elevada a condição de Vila, nesta data obteve-se a
tiveram que ser estudados. Na verdade o estudo do Juque- emancipação político e administrativa e em 1947 foi reconhecida
riquerê abriu espaço para que outros rios e serras do Litoral como Estância Balneária.
Norte de São Paulo fosses descobertos, como é o caso de Em 1967, vinte anos após ser elevada a Estância Balneária,
locais que até hoje é povoado em Caraguatatuba, como Rio uma tragédia abalou a cidade, o município foi atingido por uma ca-
Claro, Pirassununga e Rio Pardo. Locais que é conhecido tástrofe, a tromba d’água, centenas de casas ficaram destruídas e
pela população pelas suas cachoeiras ainda existentes e pela milhares de pessoas perderam suas vidas.

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Através do rio, que eram feitas as exportações de frutas, rio, que foi considerado pelo engenheiro e expedidor Guilherme
como laranja, pêra e banana, produzidas na Fazenda dos Fran- Wendell, o único navegável e o mais importante do Litoral Norte,
ceses que mais tarde foi adquirida pelos ingleses, e se passou a pode ser admirado pelos amantes da natureza. Ao longo do ser
chamar Fazenda dos Ingleses. Por causa da guerra suas atividades curso pode-se desfrutar de passeios de barcos ou jet-ski, e paisa-
foram paralisadas, pois suas mercadorias eram exportadas para a gens deslumbrantes que abrigam grande diversidade da fauna e
Inglaterra e outras cidades da Europa. A fazenda foi vendida para flora brasileira e ainda abriga um riquíssimo ecossistema e podem
e Serveng, empresa de Construção de Estradas e Rodagem, e os ser observados o mangue, o serrado e a Mata Atlântica.
novos proprietários dedicaram a criação de gado e a produção do De suas águas viveram inúmeras famílias que se dedicavam
leite e seus derivados. Nomeou a propriedade como Serramar, e à pesca abundante em suas águas. Fatos que integraram este povo,
seu porto foi desativado. permitiu o surgimento dos bairros Morro do Algodão e Barranco Alto.
O rio Juqueriquerê já não é mais utilizado para fazer expor- Atualmente, boa parte da população mais antiga ainda guarda na
tações. Com a chegada da tecnologia, outros meios de transporte memória o tempo em que o rio era o polo de lazer, daqueles que
foram utilizados para levar mercadorias até o porto de São Sebas- pescavam e banhavam em suas águas. A mesma água que abaste-
tião. Novas estradas foram construídas e pavimentadas, mas no cia todas as famílias da Fazenda dos Ingleses, em atividades como:
lavar roupas, tomar banho, consumo, enfim, atendia às necessida-
des daqueles que lá viviam para todas as atividades domésticas.
Mesmo com o desastre ecológico sofrido quando foi atingi-
do pelo derramamento de petróleo em um acidente com o Navio
Vergina 2, no Terminal Marítimo da Petrobrás, na cidade de São
Sebastião, sua beleza ainda pode ser observada por visitantes e
amantes da natureza. Cerca de 86 mil litros de óleo, atingiu além
do rio, 17 praias da região. Um trecho de 500 metros da margem
direita sofreu com o acidente. Vinte e cinco homens da empresa
trabalharam na desembocadura do rio com barreiras de contenção,
para evitar o desastre em outros trechos.
As escolas e a comunidade que vivem nos arredores do
rio e a Ong ACAJU, organização que luta pela preservação de

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suas águas e mangues, procuram conscientizar a população do da coleta do lixo nas margens do rio. A associação realiza a coleta
município, turistas e veranistas quanto à preservação desse bem para estimular as pessoas a preservarem o local.
existente em Caraguatatuba. Ações como o Caiaquerê , corrida A esperança de conseguir uma melhor navegabilidade no rio foi
com caiaque, que o vencedor é quem coleta mais lixo e não o que a obra de desassoreamento, que graças ao BNDS (Banco Nacional
chega primeiro no ponto de partida, foi promovido. A primeira ação de Desenvolvimento Econômico Social) e a FEHIDRO (Fundo Es-
aconteceu com os alunos da escola do bairro Barranco Alto, no dia tadual de Recursos Hídricos) que liberaram verba para a realização
6 de novembro de 2004. Os alunos do 5º ao 8º ano em conjunto do serviço que devido a necessidade dos trabalhos outorgado pelo
com a ONG se mobilizaram para a limpeza do rio. A gincana reuniu DAEE (Departamento de Águas e Energia Elétrica), visa preser-
mais de 25 caiaques. A comunidade também se envolveu em um vação, melhorando a vida dos pescadores e de suas famílias. O
ato de conscientização e preservação do patrimônio histórico que desassoreamento e o dreno das águas foram as principais obras,
a cidade tem. pois evitam enchentes na área facilitando a pesca artesanal e nova
Sempre preocupada com a preservação do rio, a ACAJU opção de complementação de renda que é a “pesca turística”.
promoveu vários mutirões de limpeza recolhendo mais de 150 kg Com o desassoreamento a navegabilidade do pescador artesanal
de lixo a cada evento. A canoagem ecológica é outro projeto que se torna mais fácil mesmo com a maré baixa. A previsão é que até
a ONG promove em defesa da preservação do Juqueriquerê. O o mês de fevereiro de 2006 a obra fica pronta.
evento reúne pessoas que têm barcos e canoas para participarem O rio, com toda a poluição que existe, ainda tem força para
continuar sobrevivendo, é um rio que quando a maré está alta ele
solta toda a sujeira existente, então o peixe entra em suas águas
e o pescador, que ainda sobrevive do pescado, tem a chance de
conseguir peixes em grande quantidade. Na divisa do município
de Caraguá com São Sebastião há dois pescadores que todos os
dias navegam pelas águas do rio em busca de sua sobrevivência.
O que mais prejudica o rio é o esgoto e o lixo que são jogados às
suas margens, por uma grande parte da população residente, turis-
tas e veranistas sem consciência, eles se livram da sujeira de suas
casas e depositam no meio ambiente, mesmo com os serviços de
coleta seletiva que a prefeitura da cidade oferece. Para seu Pedro

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nadando em suas águas, a rotatividade dos amantes da natação
praticando este esporte e tendo o rio como sua piscina natural é
muito grande nesta época do ano, infelizmente para consumir não
é mais possível. Coisa que alguns anos atrás era perfeitamente
possível, por não possuir tanta poluição que existe atualmente.
Seu Pedro relembra com saudade da época em que não
existia os problemas atuais. “Eu pegava a minha canoa e navegava
rio acima para pegar água e trazer para os vizinhos em época de
maré alta, eu ia na altura da Ilha Morena, local distante do mar, trazia
Paes Sobrinho as pessoas não têm consciência que existe a coleta a água e oferecia a todos, na maré baixa eles podiam consumir a
seletiva de lixo. água daqui mesmo, a maré não vinha até aqui, a água não tinha o
“O rio não é lugar de jogar lixo, e sim um lugar de diversão e lazer, gosto de sal. Outra época boa era quando tinha muitos peixes como
como nadar e passear de barco”, desabafou seu Pedro ao falar da a tainha, o robalo, parati, lambari e o bagri, nós pescávamos o dia
falta de consciência das pessoas. Para ele, existe muita irresponsa- inteiro, no final da tarde trazíamos muito pescado para casa, uma
bilidade por parte dos cidadãos que por ignorância ou impudência época que jamais vou esquecer”. A emoção toma conta do antigo
tomam esse tipo de atitude. pescador que luta pela preservação do local, pela volta ao tempo
A luta para as pessoas que buscam a conscientização da quando a pesca era o único meio de sobrevivência.
população a não cometerem crime ambiental é muito grande. Os No tempo dos ingleses, havia uma grande plantação de ba-
moradores não só procuram preservar o meio ambiente como nanais próximo ao pantanal existente à beira do rio, como ele corta
também a memória de uma vida. Muitos deles a lembrança de sua parte da fazenda, acumulava muitas águas nos pântanos em época
infância. As histórias dos pais que trabalharam durante anos como de chuva a Serveng, atual proprietária da fazenda Serramar, dragou
marinheiro e tinha o rio como o único meio de navegabilidade para e aterrou as margens do rio formando valetas e destruindo o local,
chegar até o porto de São Sebastião e Santos, outros porque cria- onde acabou com o acúmulo de água existente, isso prejudicou o
ram seus filhos brincando em suas águas e comendo o alimento rio e a fazenda foi beneficiada com o pasto para os animais, pois
dado por ele. causou o enfraquecimento de suas águas e o acúmulo de areia na
Apesar da poluição, o Juqueriquerê ainda pode servir como boca da barra, local onde o rio deságua no mar, por não ter força
local para banho. Algumas pessoas ainda refrescam o calor de verão para desassorear. Os pescadores também foram prejudicados, pois
seus barcos ficam atracados na areia acumulada.
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Para seu Pedro Paes, que trabalhou durante 12 anos e 5 Existem leis, decretos e resoluções federal e estadual que
meses na fazenda dos Ingleses, as lembranças não saem de sua prevê a preservação do rio como:
cabeça da época em que diariamente entre 4 e 5 embarcações Legislação Federal: lei 4771/65 (novo código florestal) e lei
carregavam cargas de bananas, sem problema de ficarem paradas 6938/81
na areia, atualmente as embarcações de pequeno porte encontram Decreto Federal: 99274/90
dificuldades para navegarem do rio até o mar, com o desassorea- Resolução Conama 004/85
mento a esperança é que essa situação se reverta e os pecadores Legislação Estadual: lei 997-96
possam navegar em suas águas. A prefeitura da cidade é quem Resolução S.M.A. nº 042/94
está executando os serviços. Os principais órgãos responsáveis pela preservação do rio e que
Muitos órgão de proteção ambiental dependem de projetos apoiam projetos são: DAEE (Departamento de Água e Energia Elé-
de entidades e órgãos de proteção ambiental e até mesmo da ad- trica), DAIA (Departamento de Avaliação e impacto Ambiental), CBH
ministração municipal para que o apoio seja dado,e trabalhos em (Comitê de Bacias Hidrográfica), DEPRN (Departamento Estadual
benefício ao meio ambiente seja executado. No Rio Juqueriquerê o de Proteção dos Recursos Naturais e a CETESB (Companhia de
procedimento para o apoio de desenvolvimento de projetos para a Tecnologia de Saneamento Ambiental).
sua preservação também precisa que a sociedade civil organizada, Em benefício aos pescadores artesanais do Litoral Norte, os
ongs ambientais e o município se manifestem para que verba seja governos federal e estadual em parceria com os municípios estão
liberada e apoio seja concedido. desenvolvendo no Litoral Norte o projeto de Zoneamento Ecológico
A SABESP (Saneamento Básico do Estado de São Paulo) e Econômico, devido aos problemas ambientais que a região vem
concluiu em torno de 60 km de rede coletora de esgoto próximo ao afrentando ao longo dos anos e a extinção do peixe, deixando o
rio. Ainda existe projeto de saneamento básico para ser executado, pescador artesanal com dificuldades de sobreviver do pescado.
porém o que está pronto ainda não foi liberado, pois depende da Este projeto em âmbito estadual, que após vários anos de
construção da ETE (Estação de Tratamento de Esgoto) do bairro. discussão, foi aprovado sob o decreto nº 49.215 para ser executado
A instituição pretende concluir os serviços até 2008, quando será no Litoral Norte, em 7 de dezembro de 2004, tem como principal
liberado para os moradores o uso da rede coletora de esgoto. objetivo o resgate da pesca artesanal. O mar foi dividido zonas
A Secretaria Municipal de Meio Ambiente trabalha com a distintas com especificações de onde pode ou não praticar a pesca.
inibição à invasão das margens do rio, fiscaliza o local e faz plantio Embora o rio Juqueriquerê não faça parte deste gerencia-
de árvores, preservando assim a mata ciliar do local. mento, por ele ser somente para a costa marítima, os pescadores

52
que moram em suas margens também são beneficiados com o que a preservação se faz
projeto. necessária, para que o
O trabalho tem surgindo um efeito positivo na região. A se- futuro seja próspero e que
cretaria de Meio Ambiente do Município disse que muitos peixes nos próximos anos todos
que estavam praticamente desaparecidos voltaram a circular pelas possam usufruir do desen-
águas caiçaras. Fato que prevê um futuro promissor para a espécie volvimento sustentável sem
e para os pescadores. prejudicar o meio ambiente,
e que, no futuro, outras crianças possam estar escrevendo uma
2.2 - Projetos e apoios nova história da vida desse patrimônio vivo.
Todo anos são desenvolvidos projetos que fazem parte do
Durante todos os anos de trabalhos da comunidade que vive calendário oficial da instituição e os novos que foram criados por
às margem do Rio Juqueriquerê e do surgimento da ONG ACAJU, meio de parcerias com escolas e outras instituições, de acordo com
vários projetos já foram realizados, apoios já foram oferecidas para as necessidades percebidas pela ong.
se desenvolver um trabalho de qualidade entre escolas e comu- Vários mutirões de limpeza foram promovidos retirando
nidade. O objetivo é conscientizar as pessoas da preservação de toneladas de lixo das águas do rio. Cada evento tem a participação
um patrimônio permanente e orientar as crianças e adolescentes de cerca de 70 pessoas entre munícipes e turistas.
As escolas municipal e estadual do bairro Porto novo:
CIEFI (Centro Integrado de Ensino Fundamental e Infantil) do Porto
Novo e E.E.P.S.G Avelino Ferreira foram os principais locais em
que a instituição fez os primeiros contatos, após a sua fundação,
ao todos foram mais de 1.400 alunos que já visitaram as mini ex-
posições que a ong leva às escolas. No mesmo ano de sua criação
a Acaju realizou a primeira oficina de fotografia com lata .
A ong ainda participa de reuniões do Comitê de Bacias
Hidrográficas, de audiência pública do Macrozoneamento do Litoral
entre outros. E ainda colabora com a organização da tradicional
Festa Caiçara da Escola CIEFI do Porto Novo.
Em seus projetos e realizações a instituição tem o
53
cuidado de fazer observações importantes ao longo do rio. Nos Os alunos foram incentivados a participar do dia em uma
mutirões de limpeza a ACAJU verificou que um dos ecossistemas grande corrente democrática. Ostras escolas foram convidadas a
mais ricos e importantes do rio está cada vez mais degradado: o colaborar com o trabalho abraçando a causa.
mangue. Parceiros como as ongs projeto Resgate ao Mar e Caraguatá
A ong está cadastrada nno Comitê de Bacia Hidrográfi- e instituições como: Colégio e Faculdades Módulos, Colégio Objetivo,
ca do litoral Norte e na Secretaria do Meio Ambiente em São Paulo. Associação Baleia Azul, Associação dos Maricultores e voluntários
A instituição afirma que ao longo dos últimos 25 anos, foram conquistados para realizar o trabalho que acontece todos os
o Litoral Norte, como um todo, vem sofrendo uma devastação sem anos, e está ganhando cada vez mais adeptos. O evento ainda conta
precedentes. Ainda passa pôr ma urbanização desordenada, es- com o apoio da Petrobrás, Sabesp e iniciativa privada.
peculação imobiliária desastrosa e desumana, principalmente para No dia que antecede o evento a ACAJU faz uma reunião
a população caiçara. preliminar com os participantes e sempre leva um convidado para
Desde o ano de 2000, quando a ACAJU começou a desenvol- proferir uma palestra para os colaboradores. Em 2005 os partici-
ver seus trabalhos, muitas pessoas se interessaram pela iniciativa. pantes puderam aprender mais um pouco sobre a “A Importância
A ong realizou várias atividades e conquistou muitas parcerias. da Organização Popular nas conquistas sociais” com Robson
Desde a criação da ONG Acaju a escola municipal localizada Rodrigues (Doutorando em Arqueologia na USP/SP).
no mesmo bairro em que se encontra o rio aderiu o projeto O “Dia Em 2001 mais um projeto foi promovido. O “Rio acima, à
Mundial de Limpeza de Praias” que acontece no mês de setembro beira rio”: canoagem ecológica no Rio Juqueriquerê”, tendo como
é um programa feito pelo Centro para a Conservação da Vida (The objetivo chamar à atenção de moradores locais e turistas para a
Ocean Conservancy) e o Clean up the Word da Austrália e, tem conservação do rio e mangue.
por objetivo sensibilizar as pessoas para os problemas ambientais, O evento tem duração de um dia inteiro com atividades como:
principalmente o tocante ao lixo nos oceanos, rios e lagoas. corrida de canoa em dupla ou individual, onde o vencedor é quem
Constitui-se como um programa sem fins lucrativos que se retira a maior quantidade de lixo do rio; atividades de sensibiliza-
iniciou no Brasil em 1993. Caraguatatuba entrou na campanha ção e apresentação de capoeira e show Musical (com um músico
em 2001 sob a coordenação da ACAJU e é realizado nas praias caiçara que canta temas da própria cultura ).
do município e no Rio Juquerieuerê. No primeiro ano do evento o O projeto “Sábios Encontros”, também foi desenvolvido
trabalhos foi desenvolvido em três praias e no rio, após o segundo em 2001. O evento teve como principal objetivo o encontro de velhos
ano, todas as praias da cidade foram limpas. e velhas caiçaras para que os mesmos contassem suas memórias

54
sobre o lugar; causos, mitos, é abordado um tema.
1. Sobre o rio Juqueriquerê;
2. Causos de pescador;
3. Histórias sobre caçador;
4. Ervas e benzimentos;
5. Histórias de assombração, lobisomem, bruxas
e outras, etc.
A CAJUFEST, realizada sempre no mês de janeiro,
também é outro projeto que a ACAJU realiza. No evento os visitantes
podem apreciar a boa comida caiçara. Várias barracas são mon-
tadas no entreposto de pesca, local da festa. Show musical faz a preservação dos espaços litorâneos e do rio.
alegria dos apreciadores da festa enquanto eles têm a oportunidade Fiscaliza a degradação do rio, faz mutirão de conscien-
de conhecer e adiquir uma grande variedade de artesanatos caiçara. tização com a comunidade local e é a responsável pelo projeto
Uma parceria entre a Casa da Agricultura de Caraguata- Pora de Cultura Ecológica: oficina de maquinalata que consiste na
tuba e a Associação dos Pescadores da Zona Sul foi firmada para reconstrução da cultura caiçara e preservação ambiental.
a realização do projeto “Estaleiro Escola” que tem como objetivo Uma outra parceria com a Casada Agricultura proporciona o
a educação qualificada e criação de oportunidade para os jovens levantamento de Plantas e Ervas do Litoral Paulista com o objetivo
desempregados;. A ong ainda é parceira no projeto de educação da reconstrução do conhecimento caiçara desses vegetais.
ambiental “O conhecimento indígena sobre a natureza como subsí- O projeto Alma Caiçara: Cultura e Meio Ambiente do Litoral
dio à educação ambiental” aprovado pelo MEC em 2005. E participa Paulista com o apoio da Secretaria Estadual da Cultura (2005) tam-
também de projetos importantes como as reuniões da Agenda 21 bém tem como objetivo a reconstrução do conhecimento caiçara
local e do Conselho de Meio Ambiente além da Educação Ambiental sobre o meio ambiente.
nas Escolas com Palestras e mini exposição sobre a biodiversidade A entidade ainda faz parte do grupo setorial do Litoral Norte
do litoral e em especial do rio Juqueriquerê. Desenvolve atividades representando a Sociedade Civil no Zoneanento Ecológico Econô-
de sensibilização para o Ensino Fundamental das redes públicas mico junto com outras entidades.
com Objetivo de conscientizar as crianças para a importância da A CIEFI (Centro Integrado de Ensino Fundamental e Infantil)
Maria Aparecida Ugio, que fica localizada no bairro, realiza há seis

55
anos um trabalho considerado, pela direção da escola, primordial
para a educação cultural das crianças e para que elas sejam mul-
tiplicadores dessa cultural.
A cada semestre os professores da escola são levados a
conhecer a cultura local, principalmente em fatos que envolvem o
Juqueriquerê. Temas de diversos segmentos são sorteados e cada Juqueriquerê significa a planta que dorme. planta que tem o nome
 1

de dormideira. Porém os Índios Guarani definem como rio salgado.


um deles é trabalhado ao longo de seis meses com os alunos. A lógica da definição indígena é por fica salobro pela proximidade
O trabalho não resume só no aprendizado teórico, durante com o mar.

o seu desenvolvimento, os educadores levam as crianças para


vivenciar a realidade cultural de perto.
Nesses seis anos de existência, os alunos já conheceram
algumas espécies de peixes, como por exemplo o berbigão e tam-
bém o mangue, nomes que até então eram desconhecidos pelas
crianças.
Ao todo são 450 alunos que a cada ano estuda um novo
tema, assim passando por todas as etapas e sendo multiplicadores
dessa rica cultura que Caraguatatuba guarda em sua trajetória de
vida e procura conservar com as crianças que, no futuro, serão mul-
tiplicadoras e quem sabe, defensoras, desse patrimônio existente,
“Nosso Meio Ambiente e Nossa Cultura Regional.”

56
57
58
O rio como meio de sobrevivência

Durante muitos anos, o rio Juqueriquerê foi o único meio de o desassoreamento, não se estão alcançando resultados efetiva-
sobrevivência para muitos pescadores daquela região, não só com mente positivos. A esperança é que até a conclusão da atividade,
o pescado, mas como fonte de água para consumo e atividades haja melhores condições, no local.
domésticas. Ele disse que toda vez que vem do mar, traz pequenos pei-
Hoje, os pescadores reclamam da escassez de peixe, no xes para serem jogados no rio. Seu objetivo é contribuir para que
rio. Eles lamentam que todos os pescadores da região têm de um dia a fartura do peixe volte a reinar no local, inclusive o siri, que
enfrentar o alto mar em busca do seu sustento. pode ser observado à beira d’água. Para ele, o período de maio
Em suas águas, observa-se muita sujeira. A cor escura e a junho, quando a tainha sobe até o rio para a desova e alguns
a turbidez escondem entulhos e profissionais realizam seu trabalho, não é suficiente para que os
eletrodomésticos como geladei- pescadores tenham o rio como meio de sobrevivência, isso é ape-
ra, fogão que dificultam a nave- nas um período como o do camarão, época em que o produto está
gabilidade e tornam cada vez reprodutivo, isso acontece com todos os peixes e com a tainha é a
mais difíceis as iniciativas para mesma coisa. Época do defeso, aí sim alguns pescadores pescam
conservar o rio limpo e saudável. e vendem para complementar a renda com outros peixes do mar.
Para Paulo Giovanni D’Avila, Os pescadores que se encontravam às margens do rio cui-
pescador e proprietário de bar- dando dos seus barcos para partir para a lida, tiveram a mesma
cos, até a pesca no mar está opinião sobre o rio. Seu João Milentino de Souza, pescador de São
se tornando difícil. Seus barcos Sebastião e que freqüenta o local para a realização de reparos
ficam atracados e, para saírem, em seu barco, no estaleiro que fica às margens do rio, também
é necessário muito cuidado, por afirmou que após muitos anos de pesca, a escassez do produto
causa do banco de areia que no Juqueriquerê é por falta de cuidado dos ambientalistas e, até
se forma no leito do canal e dos mesmo de órgãos públicos, que cuidam diretamente da pesca,
entulhos que são encontrados por não perceberem a necessidade de se realizar um trabalho que
ao longo do trajeto. Mesmo com valorize mais aos pescadores e ao meio ambiente, patrimônio de

59
todos. idas e vindas ao mar, é comum ao longo do percurso. Cenas que
As opiniões são unânimes, a sobrevivência através do rio podem ser evitadas se cada pessoa fizer sua parte. Esse é o desejo
Juqueriquerê não é mais possível. Muitas pessoas ainda usam a de todos os que vivem ou utilizam o rio para alguma atividade.
pesca de anzol como forma de passar o tempo, se distrair e usar
a natureza como terapia para relaxar. O olhar de quem depende do Rio
Outro fator que está dificultando a reprodução dos peixes é
a criação de bagre africano, espécie de peixe predador, criado em Em uma conversa informal com os pescadores, outros pro-
uma fazenda próxima ao rio e que agora está invadindo o local, blemas foram pontuados. Para eles, o rio está morrendo a cada dia.
causando desequilíbrio ecológico, matando o restante dos peixe O descaso com o local por parte dos órgãos competentes é total,
que ainda sobrevivem lá. e essas instituições deveriam se mobilizar em defesa deles.
O Sr. Genésio Costa contou que já existiram, no rio, muitos Segundo os entrevistados, seguindo o Juqueriquerê, sentido
peixes como robalo, tainha entre outros e que agora, infelizmente Rio Claro, por um dos seus afluentes, onde não existe povoação,
não é mais possível encontrar essas espécies em abundância. suas águas podem ser consumidas, não existe poluição, entulhos
“A tristeza é muito grande quando vejo que o rio está mor- jogados, e o mangue está preservado.
rendo pouco a pouco”, lamenta seu Nélson Henrique dos Santos Atualmente, a população ribeirinha sofre com a poluição e
Fabrício, um dos pescadores que se preparava para seguir para o com a falta de consciência dos que vivem às suas margens. O des-
mar em busca de sua sobrevivência. Também morador do bairro, caso não é só dos órgãos competentes, mas de toda a população
acredita que, com a união de todos e o interesse dos órgãos com- que não evita jogar lixo, entulho e até animais mortos. Desfazem-se
petentes, o rio possa um dia voltar ao curso normal, isto é, quando de tudo que não querem mais e usam o rio como lata de lixo.
a pesca voltar a ser farta e suas águas forem fonte de alimento para Os moradores e pescadores reclamam da falta de sanea-
todos. mento, de fiscalização e principalmente de conscientização popular.
Para os pescadores, o saneamento básico é uma das coisas A ACAJU é o único órgão que se mantém em atividade constante
que precisam ser regularizadas no bairro com a maior urgência. Os para que o rio não morra de vez, realizando trabalhos e tentando
bueiros transbordam em época de chuva e o chorume escorre para conscientizar as pessoas da importância do local para o município
o rio. A poluição doméstica por despejo de esgoto in natura precisa e para o ser humano.
ser evitada. A falta de saneamento básico, na região, contribuiu para que
Encontrar peixe morto e animais nas águas, durante suas muitos moradores despejassem esgoto no rio. A invasão de suas

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margens também é outro fator que leva o rio à degradação, e por ser apresentados para que possam ser debatidos, reformulados e
conseqüência, neste ritmo, o colapso será inevitável. aprovados para receber o benefício.
Cada um dos pescadores tem o cuidado de verificar diaria- O CBH (Comitê de Bacias Hidrográficas) que funciona como
mente se há vazamento de óleo em sua embarcação. Com essa um fórum, ou seja, espaço para reuniões, discussões de ações
iniciativa, acreditam estar colaborando para que o rio não chegue ao consideradas prioritárias para a preservação de recursos hídricos
desaparecimento total, em decorrência da poluição através do óleo e outros recursos naturais, atua de diversas maneiras, seja fomen-
diesel, e procuram conscientizar a todos os outros que procuram o tando discussões, seja incentivando o desenvolvimento de recursos
rio como local de atracagem, seja barco de pesca ou de passeio. hídricos e outros recursos naturais, através de grupos de trabalhos.
Os pescadores insistem que os órgãos públicos têm a obriga- É através dela que é a FEHIDRO financia projetos de preservação
ção de salvar a vida do rio, que atende não só ao pescador artesanal, ambiental, mas eles têm de ser apresentados por alguma instituição,
mas como uma segunda opção de renda para os pescadores que até mesmo pela própria prefeitura do município, Estado ou ONGs,
aderiram à “Pesca Turística” como função complementar para sua que atuam na área.
sobrevivência. O órgão também considera o rio Juqueriquerê como o mais
importante do município. A instituição afirma que o que falta para
A visão de ambientalistas que ele seja despoluído e protegido são projetos que visem es-
ses objetivos. A falta de um plano de trabalho e desenvolvimento
Órgãos de proteção ambiental têm consciência da atual si- sustentado é um dos fatores que inviabiliza a liberação de verbas
tuação do rio Juqueriquerê, mas ao mesmo tempo afirmam apoiar estaduais e federais.
projetos que devem ser desenvolvidos pelo município e ONGs A instituição afirma que tem estimulado diferentes ONGs a
(Organizações Não Governamentais) de proteção ambiental. desenvolverem tais projetos e executarem trabalhos em prol do
Vários projetos podem ser desenvolvidos em defesa do rio. meio ambiente.
Órgãos do governo federal apóiam esses projetos. Eles só precisam Integrante da Ong Onda Verde, o arquiteto Paulo André

61
acredita que a solução existe, e que o rio Juqueriquerê, com todos peja esgoto in natura, no rio. Embora as redes coletoras estejam
os problemas que enfrenta, ainda está em estado de boa qualida- prontas, elas não estão disponíveis para uso, porque o sistema
de. Muitos trechos de suas margens não estão ocupados e têm a ainda não conta com uma ETE (Estação de Tratamento de Esgoto).
mata ciliar preservada. Pela qualidade da água ainda é possível Neste caso, os moradores teriam de possuir fossa séptica.
uma recuperação natural. A poluição causada por esgotos domés- A empresa relatou que muitos moradores fizeram ligações
ticos pode ser resolvida com o saneamento básico do município e irregulares na rede que ainda não está em operação. Os detritos
a conscientização da população de utilizar-se dos equipamentos lançados na tubulação não escoam e transbordam em via pública,
sanitários. Para ele, outro fator que contribui com a poluição é o causando transtornos e seguindo para o rio. A problemática se
óleo dos barcos de pesca e das marinas que também depende de amplia, quando as ligações clandestinas são feitas diretamente nas
um processo de conscientização e educação não só ambiental, galerias de águas pluviais. A chuva sobrecarrega a rede provocando
mas formal e de mudança de conceitos e atitudes. Além disso, é extravasamentos.
fundamental a fiscalização para coibir as ocupações irregulares O IBAMA (Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos Recur-
em áreas de preservação permanente e supressão de mata ciliar. sos Naturais Renováveis), núcleo de Caraguatatuba, instituição que
O arquiteto e ambientalista afirma que o Juqueriquerê, formado funciona com atribuições abrangentes como em licenciamento de
pelos rios Claro, Pirassununga e Camburu, compõem a maior mi- dragagem e ocupação, acredita que a mobilização social ajudaria
cro bacia do Litoral Norte paulista, e devem ser olhados com muito muito o rio. A ocupação das margens e a degradação ambiental que
carinho e seriedade pelos administradores e população ribeirinha. ocorrem no Juqueriquerê são degradatórias para a pesca, e que se
Ele acrescenta que esse é o maior berço da pesca da região, em a sociedade civil organizada, o ministério público, ONGs e entidades
que a maioria das espécies se reproduz e mantém a subsistência públicas se unirem muitas coisas boas podem ser desenvolvidas e
da fauna marinha da região. Para Paulo André, as autoridades um trabalho positivo pode salvar o rio de todas as dificuldades que
precisam cumprir sua função fiscalizadora e a população precisa vem enfrentando, ao longo dos anos.
mudar de atitude e se conscientizar sobre a preservação de um dos
principais patrimônios naturais que o Litoral Norte possui, e isso O olhar da população (depoimento da população da cidade)
abrange a dimensão de recurso hídrigo, aporte para reprodução No município, poucas pessoas têm noção da importância
de fauna e flora marinha, navegação para turismo náutico, biodi- do Rio Juqueriquerê para a cidade. Muitas delas já ouviram falar,
versidade costeira e beleza cênica. mas sem se lembram quem e nem quando ouviram falar. Muitos
Para a SABESP falta conscientização da população local que des- atravessam a ponte sobre o rio diariamente, sem se dar conta de

62
sua existência. As que moram em bairros mais distantes nunca de forma regular, porque embora sejam geradoras de empregos
ouviram falar do rio. diretos, não devem degradar o meio ambiente. Ele disse ter se
Em Caraguatatuba, as opiniões sobre o rio são as mais informado sobre o local e tem consciência de que a existência dos
diferentes possíveis. Há os que nem se preocupem com o as- manguezais auxilia a sobrevivência dos peixes e aves migratórias,
sunto, os que não têm opinião formada a respeito, seja por falta fato que já ele pôde observar quando esteve visitado o seu leito.
de informação, ou por nunca terem pensado no assunto. Outras A professora Débora Valle da Silva Pillon se orgulha muito
sabem de que se trata, mas a rotina acelerada não deixa espaço do trabalho que desenvolve com as crianças da escola que dirige
para preocuparem-se com a mobilização de ações em prol do rio há cinco anos. Ela que veio de São Paulo, e mora na região central
ou para conscientizar outras pessoas. do município, disse que quando chegou não tinha ouvido falar no
Isso demonstra que a conscientização ambiental deve Juqueriquerê, mas quando veio para a escola e começou a desen-
receber especial atenção, e ser levada às pessoas por meio de volver o projeto viu a importância que o rio tem, e hoje incentiva até
instituições educacionais com projetos educativos. as crianças do maternal a acompanharem todos os processos do
Boa parte dessa população compõe-se de imigrantes que trabalho, que já segue pelo sexto ano consecutivo.
não têm ligação afetiva com a localidade e, talvez por isso, não de- No bairro Rio do Ouro, que faz parte da região central, tam-
monstrem curiosidade sobre a importância do Juqueriquerê. Célia bém existem pessoas que não sabem da importância do rio.
Maria da Silva, por exemplo, veio da Paraíba em busca de emprego Cristiane Ribeiro, veio de São Paulo e reside na cidade há 4
e melhores condições de vida. Residente no bairro há menos de anos, freqüenta o bairro, mas nunca tinha ouvido falar do rio. Ficou
um ano, nunca tinha ouvido falar do rio. Para ela, as pessoas fica- surpresa quando foi abordada sobre o assunto.
vam ali pescando de linhada como uma forma de terapia. Apesar Ana Paula Figueiredo, apesar de residir em um bairro dis-
de gostar da natureza nunca se interessou em se informar sobre o tante do rio, já se banhou em suas águas. Sempre freqüentou a
que existe no bairro em que mora. casa do avô, no Porto Novo, e através dele é que conheceu o rio.
Outras pessoas se dizem observadoras e curiosas, é o caso Ela também lamenta o estado em que ele se encontra, e acredita
do Léo Costa, que mora na cidade de São Sebastião, no bairro da que algo tem que ser feito para que a sua vida natural volte a ser
Enseada, há 14 anos, e desde que chegou na região percebeu que o que era antes.
o rio tem grande importância para a comunidade ribeirinha, prin- População, ambientalistas e órgãos competentes têm a mes-
cipalmente como atividade econômica para as marinas, em suas ma opinião, o que está faltando é uma liderança que inicie ações
margens. Sua preocupação, no entanto, é se elas estão construídas concretas, em prol do rio, mas pela população que sofre com o

63
descaso e a ausência de uma efetiva educação ambiental.
Projetos com a envergadura necessária para atender ques-
tões como essa beneficiarão, pelo menos, 90 mil habitantes, já que
os ecossistemas se interconectam.

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A Nova geração

O olhar das crianças, como será o Juqueriquerê


sob o olhar daqueles que são o futuro

Cada criança faz uma leitura do rio de acordo com o seu


imaginário e o com o que observa no dia a dia, em casa, na es-
cola, na rua.
Sensíveis e perspicazes, crianças são agentes multiplica-
dores do que aprendem. Sua inocência e senso de cuidado são
elementos essenciais para um futuro diferente.
Em cada trabalho, elas retrataram o sentimento positivo ou
negativo que têm pelo rio. O mais importante é saber que, daqui
a alguns anos, todas elas estarão, quem sabe, no lugar de pes-
soas que hoje lutam pela preservação do entorno. Quem sabe,
serão elas os agentes de conscientização em órgãos públicos,
organizações não-governamentais e sociedade civil organizada.
O futuro pode ser diferente. Os “anjos” de hoje podem ser
as “feras” do amanhã, e o que acreditamos ser impossível na
atual situação, pode ser possível daqui a alguns anos. Nós, que
acreditamos ser “heróis” ao tentar salvar uma “vida”, seremos
apenas espectadores dos potenciais vitoriosos que estão surgindo
através de um simples trabalho de criança. No entanto, cidadãos
que acreditam no futuro.
Em breve, essa problemática será apenas lembrança e um
novo ciclo da vida irá recomeçar.

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Vocabulário
Afrontar – encarar de frente, suportar
Vocabulário

Filão - massa de minério, de tamanho e peso variáveis.


Arrojado - audaz, destemido, valente, com características inova- Fronde – a copa das árvores, folhagem ou rama de palmeira e
doras; ousado fetos, ramagem ou ramo de árvore.
Arbusto – vegetal lenhoso ramificado desde a base de modo Frondoso – que tem fronde, tudo que tem muitas ramificações
que não pode distinguir seu tronco principal Gramínea - família de plantas que compreende, em geral, ervas
Basalto – rocha ígnea, densa ou finamente granulada monocotiledôneas de pequeno porte, flores nuas, em espigas.
Batel – barcos pequenos Herbário - coleção científica de plantas secas
Bússola – instrumento de orientação usado em navegação no Inclemente – áspero, desagradável, rigoroso, severo
mar, na terra ou aérea Incumbir – dar incumbência, encarregar, estar a cargo, ser da
Caboclo – indígena brasileiro, de cor acobreada, mestiço bran- obrigação, ou do dever, caber, competir
co com o índio. caipira, sertanejo, roceiro. Tratamento carinhoso Junção – ato ou efeito de juntar, união, ligação
para homem Leito – depressão de terreno em que correm águas de rio ou re-
Confluência – ponto de junção dos rios gata
Cessar – acabar, parar, interromper, suspender, deixar de, desis- Luxuriante – exuberante, viçoso
tir Magmática – que refere ao magma
Cume – ponto mais elevado de um monte, auge Magma - mistura de matéria mineral ou orgânica em estado de
Declive – inclinado formando ladeiras, inclinação de terrenos, pasta fina, matéria pastosa, espessa, ígnea, de origem profunda,
considerando este de cima para baixo. cuja consolidação dá origem às rochas ígneas ou magmáticas.
Esboço – delineamento de desenho ou pintura, obra literária de- Pitoresco – picante, imaginoso, original
lineada em largos traços. Resumo sinopse. Primórdio – o que organiza primeiro, origem, princípio
Expedição – ato ou efeito de expedir, Envio de remessa, seção Prismático – de vidro ou de cristal, que serve para decompor os
encarregada de despachar mercadorias. raios luminosos

66
Vocabulário Vocabulário

Quartzo - sílica natural em que consistem, quase inteiramente, Submerso – coberto de água
as areias e arenitos, e que entra com 10 a 15% na formação de Transversal – não reto, que passa de travessa ou oblíqua
muitas rochas, como, por exemplo, o granito e vários gnaisses. Várzea – campina cultivado, terrenos baixos e planos, que mar-
Rebocador – aquele que reboca geiam rios e ribeirões.
Reinantes – que reina, que domina ou predomina Vastidão - qualidade do que é vasto, extensão muito grande
Sangradouro – rego ou lugar por onde se desvia parte da água Vogas – movimento de remos.
de um rio lago ou fonte.
Soberba – altura de coisa que está superior a outra, orgulho ex-
cessivo, altivez

67
Bibliografia Bibliografia

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