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Teste sobre Os Maias de Eça de Queirós

I
A
Lê atentamente o texto que se segue.

"Diante deles o hipódromo elevava-se suavemente em colina, parecendo, depois da


poeirada quente da calçada e das cruas reverberações da cal, mais fresco, mais
vasto, com a sua relva já um pouco crestada pelo sol de Junho, e uma ou outra
papoula vermelhejando aqui e além. Uma aragem larga e repousante, chegava
vagarosamente do rio.
No centro, como perdido no largo espaço verde, negrejava, no brilho do sol, um
magote apertado de gente, com algumas carruagens pelo meio, donde sobressaíam
tons claros de sombrinhas, o faiscar de um vidro de lanterna, ou um casaco branco de
cocheiro. Para além, dos dois lados da tribuna real forrada de um baetão vermelho de
mesa de repartição, erguiam-se as duas tribunas públicas, com o feitio de traves mal
pregadas, como palanques de arraial. A da esquerda, vazia, por pintar, mostrava à luz
as fendas do tabuado. Na da direita, besuntada por fora de azul-claro, havia uma fila
de senhoras quase todas de escuro encostadas ao rebordo, outras espalhadas pelos
primeiros degraus; e o resto das bancadas permanecia deserto e desconsolado, de
um tom alvadio de madeira, que abafava as cores alegres dos raros vestidos de
Verão. Por vezes a brisa lenta agitava no alto dos dois mastros o azul das bandeirolas.
Um grande silêncio caía do céu faiscante.
Em volta do recinto da tribuna, fechado por um tapume de madeira, havia mais
soldados de Infantaria, com as baionetas lampejando ao sol. E no homem triste que
estava à entrada, recebendo os bilhetes, metido dentro de um enorme colete branco,
reteso de goma, e que lhe chegava até aos joelhos – Carlos reconheceu o servente do
seu laboratório. (…)
No recinto em declive, entre a tribuna e a pista, havia só homens, a gente do Grémio,
das secretarias e da casa Havanesa; a maior parte à vontade, com jaquetões claros, e
de chapéu-coco; outros mais em estilo, de sobrecasaca e binóculo a tiracolo, pareciam
embaraçados e quase arrependidos do seu chique. Falava-se baixo, com passos
lentos pela relva, entre leves fumaraças de cigarro. Aqui e além um cavalheiro,
parado, de mãos atrás das costas, pasmava languidamente para as senhoras. Ao lado
de Carlos dois brasileiros queixavam-se do preço dos bilhetes, achando aquilo uma
“Sensaboria de rachar”.
Defronte a pista estava deserta, com a relva pisada, guardada por soldados: e junto à
corda, do outro lado, apinhava-se o magote de gente, com as carruagens pelo meio,
sem um rumor, numa pasmaceira tristonha, sob o peso do sol de Junho. Um rapazote
com uma voz dolente, apregoava água fresca. Lá ao fundo o largo Tejo faiscava, todo
azul, tão azul como o céu, numa pulverização fina de luz. (…)
Os outros voltaram-se. Era o Sequeira, com a face como um pimentão, entalado numa
sobrecasaca curta que o fazia mais atarracado, de chapéu branco sobre o olho e
grande chicote debaixo do braço.
Aceitou um copo de champanhe e teve muito prazer em conhecer o Sr. Clifford…
– E o que me diz você a esta sensaboria? Exclamou ele logo, voltando-se para
Carlos.
Enquanto a si, estava contente, pulava… Aquela corrida insípida, sem cavalos, sem
jóqueis, com meia dúzia de pessoas a bocejar em roda, dava-lhe a certeza que eram
talvez e que o Jockey Club rebentava… E ainda bem! Via-se a gente livre de um
divertimento que não estava nos hábitos do País. Corridas era para se apostar. Tinha-
se apostado? Não? Então histórias!... Em Inglaterra e em França, sim! Aí eram um
jogo como a roleta, ou como o monte… Até havia banqueiros, que eram
bookmakers… Então já viram!”

Eça de Queirós, Os Maias (Cap. X)

1. O espaço tinha sido preparado para a ocasião. Transcreve do segundo e do terceiro


parágrafos expressões que evidenciem a improvisação.
2. Descreve o vestuário das pessoas presentes, registando os contrates que se
evidenciam.
3. Transcreve do texto expressões que provem o provincianismo na organização deste
evento.
4. No texto o discurso indireto livre é utilizado. Justifica, retirando um excerto.
5. Classifica a focalização do narrador neste excerto da obra.

B
“Apesar de ser uma obra realista, n’ Os Maias são evidentes características da
tragédia grega.”
Num texto entre 60 a 100 palavras, comenta a afirmação transcrita, num texto bem
estruturado.

II

Lê o texto que se segue e seleciona a alínea correta para cada questão:

“Este livro reúne alguns dos textos que mensalmente e ao longo dos últimos anos fui
publicando (…). A estranheza do título justifica uma explicação, para que ele não
passe como um mero exercício de estilo.
Quando era pequeno — muito pequeno, talvez oito ou dez anos — lembro-me de estar
deitado na banheira, em casa dos meus pais, a ler um livro de quadradinhos. Era uma
aventura do David Crockett, o desbravador do Kentucky e do Tenessee, que haveria
de morrer na mítica batalha do Forte Álamo. Nessa história, o David Crockett era
emboscado por um grupo de índios, levava com um machado na cabeça, ficava
inconsciente e era levado prisioneiro para o acampamento índio. Aí, dentro de uma
tenda, dia e noite, molhando-lhe a testa com água, havia uma índia muito bonita —
uma “squaw”, na literatura do Far-West — que cuidava dele, dia e noite, molhando-lhe
a testa com água, tratando das suas feridas e vigiando o seu coma. E, a certa altura,
ela murmurava para o seu prostrado e inconsciente guerreiro: “não te deixarei morrer,
David Crockett!”
Não sei porquê, esta frase e esta cena viajaram comigo para sempre, quase
obsessivamente. Durante muito tempo, preservei-as à luz do seu significado mais
óbvio: eu era o David Crockett, que queria correr mundo e riscos, viver aventuras e
desvendar Tenessees. Iria, fatalmente, sofrer, levar pancada e ficar, por vezes
inconsciente. Mas ao meu lado haveria sempre uma índia, que vigiaria o meu sono e
cuidaria das minhas feridas, que me passaria a mão pela testa quando eu estivesse
adormecido e me diria: “não te deixarei morrer, David Crockett!” E, não só por isso, eu
sobreviria a todos os combates. Banal, elementar.
Porém, mais tarde, comecei a compreender mais coisas sobre as emboscadas, os
combates e o comportamento das índias perante os guerreiros inconscientes. Foi aí
que percebi que toda a minha interpretação daquela cena estava errada: o David
Crockett representava sim a minha infância, a minha crença de criança numa vida de
aventuras, de descobertas, de riscos e de encontros. Mas mais, muito mais do que
isso: uma espécie de pureza inicial, um excesso de sentimentos e de sensibilidade, a
ingenuidade e a fé, a hipótese fantástica da felicidade para sempre. (…)”
Miguel Sousa Tavares, Não Te Deixarei Morrer, David Crockett

Seleciona a opção correta para cada questão.

1. Com a afirmação “esta frase e esta cena viajaram comigo para sempre” , o autor
quer dizer que
a. se sentia marcado para toda a vida por aquela frase e aquela cena.
b. transportava consigo, sempre que viajava, um livro de David Crockett.
c. se lembrava daquela frase e daquela cena sempre que viajava.
d. tinha aquela frase gravada na pasta que usava em viagem.

2. Na frase iniciada por “Foi aí que” , o autor assinala o momento em que


a. leu a história aventurosa e acidentada do desbravador David Crockett.
b. tomou consciência de que David Crockett era o símbolo da sua infância.
c. sentiu a necessidade de preservar na memória o herói David Crockett.
d. julgou que era David Crockett, o mítico combatente de Forte Álamo.

3. A perífrase verbal em “e ao longo dos últimos anos fui publicando” traduz uma ação
a. momentânea, no passado.
b. repetida, do passado ao presente.
c. apenas começada, no passado.
d. posta em prática, no momento.

4. A locução “para que” permite estabelecer na frase uma relação de


a. causalidade.
b. completamento.
c. finalidade.
d. retoma.

5. O uso do travessão duplo justifica-se pela necessidade de


a. destacar uma explicitação.
b. registar falas em discurso direto.
c. marcar alteração de interlocutor.
d. sinalizar uma conclusão.

6. O uso repetido do nome “David Crockett”


a. constitui um mecanismo de coesão lexical.
b. assegura a progressão temática.
c. constitui um processo retórico.
d. assegura a coesão interfrásica do texto.

7. Assinala se as afirmações são verdadeiras (V) ou falsas (F):


a. No segmento textual “lembro-me de estar deitado” o verbo constitui uma referência
deíctica textual.
b. O constituinte “inconsciente” em “Nessa história, o David Crockett (…) ficava
inconsciente” desempenha, na frase, a função de predicativo do sujeito.
c. Os vocábulos “batalha” e “combates” mantêm entre si uma relação de antonímia.
d. O antecedente do pronome relativo “que” é “uma índia muito bonita” .
e. Em “molhando-lhe a testa com água, tratando das suas feridas e vigiando o seu
coma” , as formas verbais “molhando”, “tratando” e “vigiando” traduzem o modo
continuado como a índia cuidava de David Crockett.
f. Na frase “ela murmurava para o seu prostrado e inconsciente guerreiro” , os
adjetivos têm um valor restritivo.
g. Em “não te deixarei morrer, David Crockett” , “te” e “David Crockett” são referências
deícticas pessoais.
h. Na frase “preservei-as à luz do seu significado mais óbvio” , o referente de “as” é
“esta frase e esta cena” .
i. A frase “que vigiaria o meu sono” é subordinada relativa restritiva.
j. O conector “Porém” introduz uma relação de oposição entre o que anteriormente foi
dito e a ideia exposta posteriormente.

III

Seleciona apenas uma hipótese e constrói um texto coerente entre cento e cinquenta
e duzentas palavras:

a. Comenta o cartoon tendo em conta o excessivo uso do telemóvel e a sua influência


na vida dos jovens da tua idade.

b. Observa a vinheta apresentada e, num texto argumentativo-expositivo, reflete sobre


as relações entre pais e filhos.
(as imagens não puderam ser carregadas. Porém, considero que as questões são
simples).

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