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Revisão – Prova de linguagens – 1º bimestre – 3º ano

1. Mas seu olhar verde, inconfundível, impressionante, iluminava com sua luz misteriosa as sombrias
arcadas superciliares, que pareciam queimadas por ela, dizia logo a sua origem cruzada e decantada
através das misérias e dos orgulhos de homens de aventura, contadores de histórias fantásticas, e de
mulheres caladas e sofredoras, que acompanhavam os maridos e amantes através das matas
intermináveis, expostas às febres, às feras, às cobras do sertão indecifrável, ameaçador e sem fim, que
elas percorriam com a ambição única de um “pouso” onde pudessem viver, por alguns dias, a vida
ilusória de família e de lar, sempre no encalço dos homens, enfebrados pela procura do ouro e do
diamante.

PENNA, C. Fronteira. Rio de Janeiro: Tecnoprint, s/d.

Ao descrever os olhos de Maria Santa, o narrador estabelece correlações que refletem a


a) caracterização da personagem com mestiça.
b) construção do enredo de conquistas da família.
c) relação conflituosa das mulheres e seus maridos.
d) nostalgia do desejo de viver como os antepassados.
e) marca de antigos sofrimentos no fluxo de consciência.

2. O problema central do método narrativo diz respeito à relação do autor com a sua obra. Em uma
peça teatral, o autor é ausente; ele desapareceu por trás dela. Mas o poeta épico conta a história como
contador profissional, incluindo os seus comentários no poema e dando à narrativa propriamente dita
(distinta do diálogo) o seu próprio estilo.
O romancista pode, similarmente, contar uma história sem afirmar que testemunhou ou participou do
que narra. Pode escrever na terceira pessoa, como “autor onisciente”. Esse é, sem dúvida, o modo
tradicional e “natural” de narração. O autor está presente, ao lado da sua obra, como o palestrante cuja
exposição acompanha o projetor de slides ou o filme documentário.

WELLEK, René; WARREN, Austin. Teoria da Literatura e Metodologia dos Estudos Literários. São Paulo:
Martins Fontes, 2001. p. 301.

Sobre o trecho acima e os gêneros literários, assinale a alternativa correta.


a) No gênero autobiográfico, o autor prescinde do recurso do narrador, expondo sua voz real e
testemunhal.
b) O narrador onisciente em terceira pessoa se caracteriza por ser imparcial e confiável em seu discurso.
c) O poema épico, a despeito de sua terminologia, pertence ao gênero lírico, já que é escrito em versos.
d) No gênero dramático há um afastamento do autor pela habitual inexistência da figura de um narrador
ou de um eu-lírico.

TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO:


Leia a crônica “Caso de justiceiro”, de Carlos Drummond de Andrade.

Mercadinho é imagem de confusão organizada. Todos comprando tudo ao mesmo tempo em


corredores estreitos, carrinhos e pirâmides de coisas se comprimindo, apalpamento, cheiração e análise
visual de gêneros pelas madamas, e, a dominar o vozerio, o metralhar contínuo das registradoras. Um
olho invisível, múltiplo e implacável, controla os menores movimentos da freguesia, devassa o mistério
de bolsas e bolsos, quem sabe se até o pensamento. Parece o caos; contudo nada escapa à fiscalização.
Aquela velhinha estrangeira, por exemplo, foi desmascarada.
– A senhora não pagou a dúzia de ovos quebrados.
– Paguei.
Antes que o leitor suponha ter a velhinha quebrado uma dúzia de ovos, explico que eles estão à
venda assim mesmo, trincados. Por isso são mais baratos, e muita gente os prefere; casca é embalagem.
A senhora ia pagar a dúzia de ovos perfeitos, comprada depois; mas e os quebrados, que ela comprara
antes?
A velhinha se zanga e xinga em ótimo português-carioca o rapaz da caixa. O qual lhe responde
boas, no mesmo idioma, frisando que gringo nenhum viria lá de sua terra da peste para dar prejuízo no
Brasil, que ele estava ali para defender nosso torrão contra piratas da estranja. A mulher, fula de
indignação, foi perdendo a voz. Caixeiros acorreram, tomando posição em defesa da pátria ultrajada na
pessoa do colega; entre eles, alguns portugueses. A freguesia fez bolo. O mercadinho parou.
Eis que irrompe o tarzã de calção de banho ainda rorejante e berra para o caixa:
– Para com isso, que eu não conheço essa dona mas vê-se pela cara que é distinta.
– Distinta? Roubou cem cruzeiros à casa e insultou a gente feito uma danada.
– Roubou coisa nenhuma, e o que ela disse de você eu não ouvi mas subscrevo. O que você é, é
um calhorda e quer fazer média com o patrão à custa de uma pobre mulher.
O outro ia revidar à altura, mas o tarzã não era de cinema, era de verdade, o que aliás não
escapou à percepção de nenhum dos presentes. De modo que enquanto uns socorriam a velhinha, que
desmaiava, outros passavam a apoiá-la moralmente, querendo arrebentar aquela joça. O partido
nacionalista acoelhou-se. Foram tratando de cerrar as portas, para evitar a repetição de Caxias. Quem
estava lá dentro que morresse de calor; enquanto não viessem a radiopatrulha e a ambulância, a
questão dos ovos ficava em suspenso.
– Ah, é? – disse o vingador. – Pois eu pago os cem cruzeiros pelos ovos mas você tem de engolir
a nota.
Tirou-a do bolso do calção, fez uma bolinha, puxou para baixo, com dedos de ferro, o queixo do
caixa, e meteu-lhe o dinheiro na boca.
Assistência deslumbrada, em silêncio admiracional. Não é todos os dias que se vê engolir
dinheiro. O caixa começou a mastigar, branco, nauseado, engasgado.
Uma voz veio do setor de ovos:
– Ela não roubou mesmo não! Olha o dinheiro embaixo do pacote!
Outras vozes se altearam: “Engole mais os outros cem!” “Os ovos também!” “Salafra” “Isso!”
“Aquilo!”.
A onda era tamanha que o tarzã, instrumento da justiça divina, teve de restabelecer o
equilíbrio.
– Espera aí. Este aqui já pagou. Agora vocês é que vão engolir tudo, se maltratarem este rapaz.

(Carlos Drummond de Andrade. Cadeira de balanço, 2020.)

3. No discurso indireto livre, a fala de determinada personagem ou fragmentos dela inserem-se


discretamente no discurso indireto através do qual o narrador relata os fatos. Ocorre discurso indireto
livre no seguinte trecho:
a) “– Ah, é? – disse o vingador. – Pois eu pago os cem cruzeiros pelos ovos mas você tem de engolir a
nota.” (11º parágrafo)
b) “Antes que o leitor suponha ter a velhinha quebrado uma dúzia de ovos, explico que eles estão à
venda assim mesmo, trincados.” (4º parágrafo)
c) “A senhora ia pagar a dúzia de ovos perfeitos, comprada depois; mas e os quebrados, que ela
comprara antes?” (4º parágrafo)
d) “– Distinta? Roubou cem cruzeiros à casa e insultou a gente feito uma danada.” (8º parágrafo)
e) “Outras vozes se altearam: ‘Engole mais os outros cem!’ ‘Os ovos também!’ ‘Salafra’ ‘Isso!’ ‘Aquilo!’.”
(16º parágrafo)

4. Caso pluvioso

A chuva me irritava. Até que um dia


descobri que maria é que chovia.

A chuva era maria. E cada pingo


de maria ensopava o meu domingo.

E meus ossos molhando, me deixava


como terra que a chuva lavra e lava.
E eu era todo barro, sem verdura...
maria, chuvosíssima criatura!

Ela chovia em mim, em cada gesto,


pensamento, desejo, sono, e o resto.

Era chuva fininha e chuva grossa,


Matinal e noturna, ativa... Nossa!

ANDRADE, C. D. Viola de bolso. Rio de Janeiro: José Olympio, 1952 (fragmento).

Considerando-se a exploração das palavras “maria” e “chuvosíssima” no poema, conclui-se que tal
recurso expressivo é um(a)
a) registro social típico de variedades regionais.
b) variante particular presente na oralidade.
c) inovação lexical singularizante da linguagem literária.
d) marca de informalidade característica do texto literário.
e) traço linguístico exclusivo da linguagem poética.

5. Canção

No desequilíbrio dos mares,


as proas giram sozinhas…
Numa das naves que afundaram
é que certamente tu vinhas.

Eu te esperei todos os séculos


sem desespero e sem desgosto,
e morri de infinitas mortes
guardando sempre o mesmo rosto.

Quando as ondas te carregaram


meus olhos, entre águas e areias,
cegaram como os das estátuas,
a tudo quanto existe alheias.

Minhas mãos pararam sobre o ar


e endureceram junto ao vento,
e perderam a cor que tinham
e a lembrança do movimento.

E o sorriso que eu te levava


desprendeu-se e caiu de mim:
e só talvez ele ainda viva
dentro destas águas sem fim.

MEIRELES, C. In: SECCHIN, A. C. (Org.). Obra completa. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2001.

Na composição do poema, o tom elegíaco e solene manifesta uma concepção de lirismo fundada na
a) contradição entre a vontade da espera pelo ser amado e o desejo de fuga.
b) expressão do desencanto diante da impossibilidade da realização amorosa.
c) associação de imagens díspares indicativas de esperança no amor futuro.
d) recusa à aceitação da impermanência do sentimento pela pessoa amada.
e) consciência da inutilidade do amor em relação à inevitabilidade da morte.
6. Leia o texto:

A denúncia de uma crise de sentido na educação não é algo novo e exclusivo do momento
histórico em que vivemos. Podemos dizer que a crítica ao modelo educacional e à função social da
escola se constitui à medida que a própria educação se institucionaliza, incorporando a responsabilidade
de ser um processo sistemático e intencional de formação humana.
[...]
A reflexão sobre o sentido da educação adentra o século XX. A crítica se aprofunda e há
insatisfação tanto das correntes mais liberais quanto das mais marxistas. [...] As mudanças sociais
acentuaram os problemas estruturais da instituição escola. No Brasil, por exemplo, em meados dos anos
50, apenas 30% da população brasileira vivia nas cidades. A pressão das camadas médias pelo aumento
do acesso e da permanência na escola ampliou-se consideravelmente neste período, dada a relação
estabelecida entre a escolarização e o direito à cidadania.

(ROCHA, J. Design thinking na formação de professores: novos olhares para os desafios da educação. In:
Metodologias ativas para uma educação inovadora. Porto Alegre: Penso, 2018, p.154.)

O excerto apresenta, brevemente, uma crítica ao modelo vigente da educação na sociedade brasileira
nos anos 1950.

Assinale a alternativa em que o trecho literário retrata uma situação semelhante à abordada no texto.
a) “E ele, Clarimundo, o homem do relógio, o escravo fiel das horas, que fez nos seus quarenta e oito
anos de vida? Preparou espíritos, estudou e compreendeu Einstein, escreveu artigos para jornais,
notas sobre filosofia, matemática, física e astronomia recreativa...”, Érico Veríssimo, Caminhos
Cruzados.
b) “As primas já estão se acostumando no Colégio, mas Luisinha está se queixando de dor no estômago
e nós a achamos mais magra. Diante disso eu insisti com mamãe para trazê-la para casa para
consultar com Dr. Teles. A Superiora quis fazer dúvida e disse que não era preciso trazer Luisinha
porque o médico podia ir ao Colégio como vai sempre ver outras meninas.”, Helena Morley, Minha
Vida de Menina.
c) “Fabiano estava contente e acreditava nessa terra, porque não sabia como ela era nem onde era.
Repetia docilmente as palavras de sinha Vitória, as palavras que sinha Vitória murmurava porque
tinha confiança nele. E andavam para o sul, metidos naquele sonho. Uma cidade grande, cheia de
pessoas fortes. Os meninos em escolas, aprendendo coisas difíceis e necessárias.”, Graciliano Ramos,
Vidas Secas.
d) “Dirigi-me a alguns amigos, e quase todos consentiram de boa vontade em contribuir para o
desenvolvimento das letras nacionais. Padre Silvestre ficaria com a parte moral e as citações latinas;
João Nogueira aceitou a pontuação, a ortografia e a sintaxe; prometi ao Arquimedes a composição
tipográfica; para a composição literária convidei Lúcio Gomes de Azevedo Gondim, redator e diretor
do Cruzeiro.”, Graciliano Ramos, São Bernardo.
e) “Na segunda-feira, voltou o menino armado com a sua competente pasta a tiracolo, a sua lousa de
escrever e o seu tinteiro de chifre; o padrinho o acompanhou até a porta. Logo nesse dia portou-se
de tal maneira que o mestre não se pôde dispensar de lhe dar quatro bolos, o que lhe fez perder toda
a folia com que entrara: declarou desde esse instante guerra viva à escola.”, Manuel Antônio de
Almeida, Memórias de um Sargento de Milícias.

7. Certa vez minha mãe surrou-me com uma corda nodosa que me pintou as costas de manchas
sangrentas. Moído, virando a cabeça com dificuldade, eu distinguia nas costelas grandes lanhos
vermelhos. Deitaram-me, enrolaram-me em panos molhados com água de sal – e houve uma discussão
na família. Minha avó, que nos visitava, condenou o procedimento da filha e esta afligiu-se. Irritada,
ferira-me à toa, sem querer. Não guardei ódio a minha mãe: o culpado era o nó.

RAMOS, G. Infância. Rio de Janeiro: Record, 1998.


Num texto narrativo, a sequência dos fatos contribui para a progressão temática. No fragmento, esse
processo é indicado
a) pela a alternância das pessoas do discurso que determinam o foco narrativo.
b) utilização de formas verbais que marcam tempos narrativos variados.
c) indeterminação dos sujeitos de ações que caracterizam os eventos narrados.
d) justaposição de frases que relacionam semanticamente os acontecimentos narrados.
e) recorrência de expressões adverbiais que organizam temporalmente a narrativa.
Gabarito:

Resposta da questão 1:
[E]

O narrador descreve os olhos de Maria Rita perscrutando o seu fluxo de consciência, em que apareciam
memórias de um tempo em que “mulheres caladas e sofredoras... acompanhavam os maridos e
amantes através das matas intermináveis”, “no encalço dos homens, enfebrados pela procura do ouro e
do diamante”. Assim, o narrador estabelece correlações que refletem a marca de antigos sofrimentos
no fluxo de consciência, como transcrito em [E].

Resposta da questão 2:
[D]

As opções [A], [B] e [C] são incorretas, pois

[A] No gênero autobiográfico, existe coincidência entre autor e narrador, propriedade discursiva
importante na autobiografia.
[B] Nem sempre o narrador onisciente é imparcial, quando se trata de narrador onisciente intruso, pois,
ao mesmo tempo em que narra a história, critica os personagens e insere juízos de valor sobre
algumas ações. Ou ainda como narrador onisciente múltiplo, quando influencia o leitor para que este
tome alguma posição.
[C] Embora os gêneros literários sejam classificados como narrativo, lírico e dramático, o texto épico-
lírico implica características da epopeia (narrativa de um feito heroico) e da lírica. Ou seja, resulta da
fusão de elementos épicos com uma componente lírica, capaz de exprimir os sentimentos ou os
pensamentos íntimos do "eu". "Mensagem" de Fernando Pessoa, é um dos melhores exemplos de
texto épico-lírico, em que o relato histórico dá lugar à visão subjetiva e introspetiva dos
acontecimentos que contêm valores míticos e simbólicos.

Assim, é correta a opção [D], pois o gênero dramático caracteriza-se pela ausência do narrador ou do eu
lírico, com consequente afastamento do autor que entrega o decorrer da ação diretamente aos
personagens.

Resposta da questão 3:
[C]

Na frase transcrita em [C], o segmento “mas e os quebrados, que ela comprara antes?” (4º parágrafo)
pode reproduzir a fala de qualquer personagem envolvida na cena ou o discurso indireto com que o
narrador relata os fatos, estratégia típica do discurso indireto livre como mencionado no enunciado.

Resposta da questão 4:
[C]

Em “Caso pluvioso”, Carlos Drummond de Andrade cria diversas palavras com as quais desenvolve a
trama da chuva para expressar as sensações perturbadoras que o assaltavam. O termo metafórico
“maria”, identificação da mulher com a chuva, e o uso do superlativo em “chuvosíssima”, com
importante valor expressivo para a atmosfera hiperbólica do poema, constituem, assim, recursos
poéticos com o qual o poeta pode expressar, de forma singular, os seus sentimentos. Ou seja, trata-se
de inovação lexical singularizante da linguagem literária, como se afirma em [C].

Resposta da questão 5:
[B]

No poema “Canção”, de Cecília Meireles, o eu lírico manifesta profunda melancolia pelo


desaparecimento de seu interlocutor poético. Os versos “Eu te esperei todos os séculos” e “morri de
infinitas mortes”, através dos recursos linguísticos da hipérbole e do paradoxo, expressam a dor que
ultrapassa o tempo da sua própria existência, para na última estrofe, revelar a perda da alegria ou
encantamento de viver: “E o sorriso que eu te levava/ desprendeu-se e caiu de mim”. Assim, é correta a
opção [B].

Resposta da questão 6:
[C]

[A] Incorreto. O trecho destacado salienta o comportamento do professor, sem criticar problemas
estruturais da educação.
[B] Incorreto. O trecho ilustra o desconforto da aluna, sem mencionar problemas estruturais da
educação.
[C] Correto. O trecho em questão ilustra a passagem “relação estabelecida entre a escolarização e o
direito à cidadania.”.
[D] Incorreto. O trecho destacado mostra a organização das matérias a serem lecionadas em uma escola
rural, sem tocar nos aspectos relevantes do texto apresentado.
[E] Incorreto. O trecho citado indica o comportamento do aluno, sem que sejam abordados problemas
estruturais da educação.

Resposta da questão 7:
[B]

No excerto de “Infância”, observa-se que o autor executa um processo memorialístico que oscila entre o
passado e o presente, num jogo entre um narrador que lembra e analisa o recordado e a personagem-
menino que se localiza no enunciado. O relato com termos verbais no pretérito perfeito do indicativo
(“surrou-me”, “me pintou”, “Deitaram-me”, “enrolaram-me”) é interrompido por digressões com verbos
no gerúndio e pretérito imperfeito do indicativo (“virando”, “distinguia”) que transmitem ideia de
continuidade e duração no momento em que estão sendo enunciados. Assim, é correta a opção [B].

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