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Sumário:
1. Introdução
O presente artigo, para o qual se valeu do método dedutivo, tem o propósito de analisar
como se dá a distribuição dos ônus da sucumbência e a aplicabilidade da isenção das
custas na ação popular constitucional, com recurso subsidiário e supletivo do Código de
Processo Civil. O estudo se justifica pela constatação de que a temática, embora de
grande relevo pragmático para os operadores do direito, tem pouco aprofundamento na
literatura.
O estudo dos institutos jurídicos se remete ao básico, ao princípio. O que significa? Qual
a sua origem e histórico? O que o diferencia dos demais? Qual a sua natureza jurídica?
Não há como pensar em custas sem pensar em custo, em valor. Quem deverá ser
responsabilizado por seu pagamento?
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Ação popular: critérios para distribuição da sucumbência
Não havia, porém, um parâmetro para a condenação nas despesas do processo, ficando
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ao arbítrio do juiz. Foi com Adolfo Weber, segundo Orlando Venâncio dos Santos Filho ,
que se estabeleceu a regra segundo a qual a condenação do vencido deveria ficar
circunscrita ao ressarcimento do prejuízo do vencedor, fundamentado na culpa aquiliana
do Direito Romano.
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Ressalta Antônio de Souza Prudente que a teoria dominante era de que deveria ser
condenado aquele que litigava com dolo, o vicius victori, critério que seria abandonado
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com a Constituição de Zenão , do ano de 487 d.C., marcando a passagem do sistema
sancionatório para o sistema de condenação objetiva nas despesas do processo.
Aqui é possível estabelecer um paralelo com o art. 13 da Lei de Ação Popular, que
imputa ao autor popular o pagamento do décuplo das custas se a lide for reconhecida
como temerária, afirmando-se suas raízes históricas no Direito Romano, tanto no que se
refere ao caráter penalizador do litigante temerário, como no quantum da penalização.
No Brasil, pode-se delinear uma forte influência do Direito Português no tratamento das
custas, já que as regras sobre pagamento foram primariamente previstas pelas
Ordenações, nas quais era possível visualizar uma noção embrionária da figura do dano
processual, qual seja, as custas por malícia, bem como a possibilidade de seu
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ressarcimento pela causalidade .
Nas Ordenações (Livro 3º, Título 67), a parte vencida sempre seria condenada nas
custas, ainda que tivesse razão para litigar. O quantum ficava a depender da malícia do
litigante vencido. Se demandasse sem malícia, previa-se o pagamento de “custas
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singelas” e, de outro modo, as custas seriam pagas em dobro ou “em tredobro” . Era
possível, ainda, a prisão por custas, a qual só foi abolida pelo Decreto Imperial 5.737, de
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2 de setembro de 1874.
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Segundo observou Paulo Rodolfo Moreira Neto , mesmo com a dissociação das regras
lusitanas, com o advento do Regulamento 737, de 1850, permanecia o disposto nas
Ordenações, ressalvadas algumas normas, como a questão da prisão por falta de
pagamento da despesa. As alterações substanciais viriam com os Códigos de Processo
Civil Estaduais, como o da Bahia, do Distrito Federal, de São Paulo e de Pernambuco,
regras que foram unificadas no Código de Processo Civil Nacional de 1939.
Mas afinal, o que é sucumbência e como está teorizada no campo das despesas
processuais?
A regra da sucumbência foi mantida no Código Processual Civil vigente (2015), artigos
82, § 2º, e 85, respectivamente: “A sentença condenará o vencido a pagar ao vencedor
as despesas que antecipou”; e “A sentença condenará o vencido a pagar honorários ao
advogado do vencedor”.
Supondo que o réu reconheça o pedido, ele estaria isento de pagar as despesas do
processo? A resposta é dada sob a lógica da evitabilidade da lide. Assim, o
reconhecimento do pedido não irá isentar o réu da sucumbência, se não for efetivo e
oportuno, de tal modo que tivesse tornado evitável a lide. Nesse caso, prevalece uma
relação de causalidade entre o réu e a lide, que é o que determina a condenação nas
despesas e não a sucumbência. Afinal, o réu deu causa à movimentação do aparato da
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justiça .
Mas deve ser anotado que o legislador pode incentivar que o réu não prolongue o
processo, como na regra do art. 90, § 3º, do CPC/2015 (LGL\2015\1656): “§ 3º Se a
transação ocorrer antes da sentença, as partes ficam dispensadas do pagamento das
custas processuais remanescentes, se houver”.
causalidade atenderia a uma questão de justiça distributiva, onerando quem de fato deu
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causa à demanda .
No caso da Lei da Ação Popular, devem ser aplicadas as regras do Código de Processo
Civil naquilo que não contrariarem os seus dispositivos ou a natureza específica da ação,
segundo dispõe o art. 22 dessa Lei, sendo certo que o art. 12 possui disposição expressa
quanto à condenação nas despesas processuais e nos honorários de advogado.
Feito esse traçado evolutivo, quanto aos elementos conceituais, tem-se que as custas
têm origem no verbete latino constãre (constõ, ãs, ãre), que quer dizer preço, valor. É,
em poucas palavras, o custo, o preço, o valor do litígio.
A Lei da Ação Popular, em seu art. 12, usa a terminologia “das custas e demais
despesas, judiciais e extrajudiciais”, “diretamente relacionadas com a ação”, dando a
entender, da mesma forma, que custas são espécie do gênero despesas que decorrem
da ação.
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verba alimentar , com os mesmos privilégios dos créditos oriundos da legislação do
trabalho. Além disso, não podem ser compensados quando ocorre a sucumbência parcial
e não se confundem com o objeto da condenação. Este pertence à parte vencedora. O
CPC/2015 (LGL\2015\1656) dispõe que a sentença condenará o vencido a pagar
honorários ao advogado do vencedor, tratando a questão de forma diferente do
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CPC/1973 (LGL\1973\5) , que mandava pagar os honorários ao vencedor e não a seu
advogado, o que pressupunha, na regra anterior, previsão extra autos em contrato,
tema sempre controverso e objeto de debates, o que restou pacificado com o Estatuto
dos Advogados (Lei 8.906/1994 (LGL\1994\58)).
A Lei da Ação Popular, por seu turno, divide as “custas e demais despesas” em judiciais
e extrajudiciais.
A despesa extrajudicial também pode ser chamada de emolumento e diz respeito àquela
paga pela realização de um serviço público delegado, como é o caso dos notários e
registradores das serventias extrajudiciais.
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Ação popular: critérios para distribuição da sucumbência
Não se pode ignorar que as custas judiciais, a taxa judiciária e as despesas processuais
não são sinônimas e foram tratadas como elementos diversos no Provimento de Custas
do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, o qual se buscou como parâmetro. As custas,
segundo a Lei Estadual Mineira 14.939/2003, que tratou da espécie no âmbito da Justiça
Estadual, detém natureza tributária, pagas por contraprestação aos serviços judiciários.
“São despesas com atos judiciais praticados em razão de ofício” (art. 4º da citada
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norma) . Trata-se dos valores devidos em decorrência dos serviços prestados pelos
serventuários da justiça para impulsionamento do processo e especificadas em tabelas
de cada ente do Poder Judiciário. Tendo por base esse Provimento, referem-se “ao
registro, à expedição, ao preparo e ao arquivamento de feitos”.
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Antônio de Souza Prudente conceitua custas processuais como “despesas ou gastos
necessários a se iniciar, desenvolver e terminar um processo, nos termos legais, até a
resolução definitiva da causa”.
Uma classificação a ser adotada, portanto, seria inserir as custas judiciais no amplo
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gênero despesa, proposição que tem lastro em julgado do Superior Tribunal de Justiça ,
diferenciando-a, porém, das despesas processuais em sentido estrito, estas de natureza
não tributária, para as quais se exige, para o seu cálculo, a comprovação de sua
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realização por meio de notas ou recibos . Detém, dessarte, um caráter indenizatório,
como ocorre com o reembolso de verbas indenizatórias de transporte de servidores para
cumprimento de atos do processo, extração de cópias reprográficas, ato de
desarquivamento, etc.
Quanto à natureza jurídica das custas, há decisão do Supremo Tribunal Federal, na Ação
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Direta de Inconstitucionalidade 1.444, julgada em 2003 , de que se trata de tributo,
mais precisamente uma taxa, sujeitando-se, portanto, à obrigatoriedade de lei formal
para fixação de seus valores. Essa mesma Ação Direta fixou a natureza tributária dos
emolumentos – despesas extrajudiciais – o que reclama, da mesma sorte, o princípio da
legalidade para a sua fixação.
No tocante à destinação das custas, de acordo com o art. 98, § 2º, da Constituição de
1988, “as custas e emolumentos serão destinados exclusivamente ao custeio dos
serviços afetos às atividades específicas da Justiça.” Além disso, podem ser direcionadas
aos diversos Fundos instituídos para modernização do Poder Judiciário, sendo que o
artigo 97 do CPC/2015 (LGL\2015\1656) menciona outras verbas previstas em lei, tal
como ocorre com as sanções pecuniárias processuais que sejam destinadas à União e
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Ação popular: critérios para distribuição da sucumbência
A taxa judiciária, como o próprio nome diz, tem como fato gerador o serviço público
específico e divisível consistente no ato praticado no processo judicial. Tem natureza
puramente tributária, prevista, portanto, em lei. As leis estaduais trazem tabelas com os
valores das taxas, de acordo com o tipo de atividade realizada no processo, bem como
com o momento de recolhimento.
Não há uma delimitação precisa na definição do que sejam custas em relação às taxas,
especialmente se considerado o entendimento do Supremo Tribunal Federal de que
aquelas (as custas) detêm natureza tributária, compatível com a taxa. Talvez o único
ponto que as diferencie seja aquilo que cada Regimento dos órgãos do Judiciário, bem
como o que as leis estaduais em suas respectivas tabelas digam que é.
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Oportuno mencionar o precedente de lavra do Superior Tribunal de Justiça no sentido
de delimitar, com apoio na doutrina, o conceito de custas e de despesas processuais,
bem como a responsabilidade pelo seu pagamento:
A multa processual, por sua vez, tem natureza sancionatória e não se confunde com as
perdas e danos, de natureza ressarcitória. O litigante de má-fé pode ser condenado a
pagar perdas e danos, cumulativamente com a multa. As multas, como se mencionou,
podem ser destinadas, ainda, aos chamados Fundos de Modernização do Poder Judiciário
da União ou do Estado (art. 97, CPC (LGL\2015\1656)).
Por fim o preparo, como requisito extrínseco de admissibilidade do recurso, nada mais é
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que o adiantamento das despesas para o seu processamento . O seu valor, a partir da
interpretação do art. 1.007 do CPC/2015 (LGL\2015\1656), é a soma da taxa judiciária,
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Ação popular: critérios para distribuição da sucumbência
mais o porte (valor/custo) de remessa e retorno dos autos, ainda que pagos em
separado. Sob a égide dos autos eletrônicos, por questão óbvia e por previsão expressa
no CPC (LGL\2015\1656) (art. 1.007, § 3º), o pagamento do porte de remessa e de
retorno está dispensado.
Definidas que estão todas as categorias das despesas que decorrem do processo, as
quais incumbirão, em regra, ao sucumbente, além da sua destinação e regras de
pagamento, propõe-se, baseada na legislação processual, a seguinte classificação, para
então adentrar no segundo capítulo, que tratará do critério para distribuição dos ônus
dessa sucumbência na Ação Popular:
A norma é especial em relação à regra do Código de Processo Civil prevista no art. 82,
caput, de antecipação do pagamento das despesas dos atos realizados ou requeridos no
processo e, por isso, prevalece em face do regramento comum. Firma-se a análise, pois,
somente no texto constitucional.
Nessa concepção, apesar de o texto legislativo dizer “as partes”, não só o autor popular,
tem-se como melhor técnica em vez de considerar que o dispositivo não foi recepcionado
pelo atual texto constitucional, até porque não se deve fazer uma cisão da expressão
para considerar recepcionado ou não o artigo, proceder a uma interpretação conforme à
Constituição do verbete previsto no art. 10 da Lei da Ação Popular, de modo a excluir
apenas o autor, mantendo-o incólume em relação ao réu.
Portanto, a isenção do pagamento das despesas não se aplica ao réu da ação popular, o
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que, a partir da redação do art. 12 da Lei 4.717/1965 (LGL\1965\10) , ficará indene de
dúvidas. Quanto ao adiantamento das despesas, o art. 10 da Lei dispensa “as partes”. O
termo “partes”, de lege lata, não retira do réu o benefício, ainda que realizada a
interpretação conforme, tal como mencionado.
Dito de outro modo, da mesma forma que o réu não poderia ser premiado por sua
conduta lesiva, tampouco lhe deveria ser concedido o retardamento das despesas pelos
atos que requeresse no processo. Porém, a se entender pela recepção do art. 10 da
citada Lei, oxigenado pela Constituição de 1988, deve-se concluir que o réu somente
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pagará as custas e preparo ao final .
Não foi esse, contudo, o entendimento que prevaleceu no Superior Tribunal de Justiça,
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colacionado por Tatianny Kariny Veloso Gomes . A interpretação que é dada pelo
Superior Tribunal de Justiça é de restringir o benefício processual, limitando-o ao autor
da Ação Popular.
Pública, quando parte no processo, fica sujeita à exigência do depósito prévio dos
honorários do perito”), de forma diversa da regra legislativa, pressupõe o adiantamento
de despesas com perito pela União, Estados, Municípios e DF e, nessa inteligência, a
Fazenda Pública a qual se acha vinculado o órgão do Ministério Público.
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Esse é um ponto polêmico apontado por um dos subscritores há muito tempo :
despesas prévias para realização de perícia requerida pelo autor popular.
Em verdade, após a Constituição de 1988, a interpretação que deve ser dada ao termo
“custas” do art. 10 da Lei da Ação Popular é que seja esse o mais abrangente possível, a
fim de estimular o dever de fiscalização da Administração Pública pelo cidadão, que
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subjaz ao sistema processual coletivo de defesa de direitos .
“Se o autor na ação popular, não adianta os honorários do perito nem as despesas com
perícia, quem deve fazê-lo? Não há regra jurídica que force o demandado a padecer o
ônus processual do demandante, mesmo em ação popular. Inexiste normas jurídicas,
que constranjam o perito, não oficial, a servir e a gastar, com a perícia, no processo,
sujeitando-se à mora, em receber do sucumbente. Afinal, ninguém pode ser tangido a
fazer, ou deixar de fazer algo, senão em virtude de lei, ou de coisa julgada (art. 5º,
incisos II e XXXVI, da Constituição da República) (...)”.
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Rodolfo de Camargo Mancuso busca a solução para esses casos na Lei de Ação Civil
Pública. Propõe, assim, utilizar parte dos recursos recolhidos nas ações públicas ao
Fundo previsto no art. 13 da Lei da Ação Civil Pública para prover eventuais despesas
com perícia, quando envolvesse interesses sociais relevantes – na Ação Popular sempre
será – mas isso, diz, dependeria de “uma interpretação mais flexível da finalidade deste
Fundo”, visto que referido gasto não se inclui na sua destinação.
Outro argumento para afastar a obrigação de adiantamento das custas seria o fato de
que a Ação Popular compõe o sistema processual coletivo integrado pela Lei de Ação
Civil Pública e pelo Código de Defesa do Consumidor, os quais trazem previsão,
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Ação popular: critérios para distribuição da sucumbência
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respectivamente nos artigos 18 e 87 , de que não haverá adiantamento de custas,
emolumentos, honorários periciais e quaisquer outras despesas, nem condenação da
associação autora, salvo comprovada má-fé, em honorários de advogado, custas e
despesas processuais.
Se a perícia for requerida pela Fazenda Pública, pelo Ministério Público ou pela
Defensoria Pública, o CPC de 2015, aplicável supletivamente à ação popular, prevê que
(art. 91, § 1º): “(...) poderão ser realizadas por entidade pública ou, havendo previsão
orçamentária, ter os valores adiantados por aquele que requerer a prova”. O problema
ocorre quando não há previsão orçamentária. Nesse caso, segundo o citado dispositivo
legal (§ 2º), os honorários periciais serão pagos no exercício seguinte ou ao final, pelo
vencido, caso o processo se encerre antes do adiantamento a ser feito pelo ente público,
isto é, volta-se à regra prevista na ação popular e, por conseguinte, à mesma aporia.
Importante ressaltar que também para os atos determinados pelo juiz de ofício, o autor
popular fica dispensado de adiantar as custas. Na prática, os órgãos jurisdicionais
mantêm um cadastro de peritos, os quais são pagos com verba orçamentária do Poder
Judiciário.
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Nery Jr. e Rosa Maria de Andrade Nery , no entanto, salientam que, mesmo se a perícia
for requerida pela Fazenda Pública, Ministério Público ou Defensoria, “o experto não é
obrigado a praticar o ato sem a contraprestação pecuniária respectiva, de sorte que, se
ele assim o exigir, a Fazenda Pública deve fazer o depósito prévio”.
Outro ponto interessante sobre a isenção das despesas processuais é se, após a
Constituição de 1988, a taxa judiciária ainda poderia ser cobrada do réu sucumbente na
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Ação Popular, ao final. Lembra Antônio de Souza Prudente que a taxa judiciária
recebeu do art. 5º, XXXIV, imunidade constitucional para garantia de acesso à Justiça.
Pelo disposto, são a todos assegurados, independentemente do pagamento de taxas o
direito de petição aos Poderes Públicos em defesa de direitos ou contra ilegalidade ou
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abuso de poder .
Dito de outro modo, o réu vencido em Ação Popular deve arcar com todas as despesas e
custas processuais. E se processado o recurso, caso não tenha pagado o respectivo
preparo, o mesmo deve ser cobrado ao final. Aqui a legitimidade para a cobrança é do
autor popular, do Ministério Público e do Poder Público titular da verba.
Considerando-se que há regra própria para isenção não só da taxa judiciária, mas das
despesas e honorários advocatícios em sentindo amplo, é desnecessário se socorrer da
imunidade aqui versada em se tratando do autor popular, seja vencido, seja vencedor,
ao menos como regra geral.
na Ação Popular: o réu, vencido, deverá arcar com os ônus da sucumbência, por
aplicação pura da teoria da sucumbência, pelo fato objetivo da derrota, prevista no
CPC/2015 (LGL\2015\1656) e no art. 12 da Lei da Ação Popular, arcando com o
pagamento das custas, todas as despesas processuais e honorários de advogado.
Em tal sentido, ainda que a sucumbência seja recíproca, a regra é a mesma se o autor
popular tivesse sido inteiramente vencido, ausente base normativa que autorize a
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responsabilização pelo ônus da sucumbência .
Assim, se a sucumbência foi de 50% para cada parte, os réus respondem pela sua cota
proporcional, ficando isento o autor popular, salvo sua má-fé processual. Sendo em
parte vencedores, não tem sentido lógico ou legal exigir que os réus paguem as custas e
despesas processuais na sua integralidade. Contudo, os réus respondem na integralidade
se a sucumbência do autor popular for mínima, como é a regra geral do sistema
processual (art. 86, parágrafo único, do CPC/2015 (LGL\2015\1656)).
3. Decisão declaratória que julga “meramente improcedente” a ação popular: esse termo
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é usado por Rodolfo de Camargo Mancuso para os casos em que o autor está “imbuído
de boa-fé, atento e diligente com a ação proposta”, mas não obtém êxito na ação, a
exemplo da insuficiência de prova. Nesse caso, o autor popular não responde pelas
custas e demais despesas processuais, bem como pelos honorários. A justificativa
estaria no fato de que o impetrante, por si, não sucumbe e sim “a sociedade cujo
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interesse o autor, ao menos in statu assertionis, tencionava tutelar ao propor a ação”.
4. Decisão que extingue o processo, como a situação em que o ato é sanado pela
Administração Pública ou o dano ao Erário é ressarcido (fato superveniente): sobre essa
decisão, relevante é a observação realizada por Mancuso de que, na jurisprudência,
visualiza-se tanto um tratamento no plano das condições da ação, com extinção do
processo sem julgamento do mérito, como, em outros casos, de análise do mérito, de
modo a levar à improcedência do pedido. Para o referido autor, dada a finalidade pública
e a repercussão social da ação popular, a inexistência da ilegalidade/lesividade deve ser
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conduzida no plano cognitivo do mérito da demanda, de forma ampla e exauriente ,
posição a qual aderimos.
Pois bem, nesse caso, seja numa ou noutra acepção, o que há de ser observado para
distribuição dos ônus da sucumbência é a existência ou não da má-fé. E, de forma mais
aprofundada, o critério da evitabilidade ou não da lide, aqui versado. O critério do tipo
de decisão não será suficiente. Visto que a má-fé não pode ser presumida, não haverá
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Ação popular: critérios para distribuição da sucumbência
O que se investiga é: a) O autor popular tinha razão? A correção do ato pelo Poder
Público é claro indício que sim; b) Os réus deram causa à instauração da demanda? c)
Qual seria o resultado se a demanda tivesse prosseguido? d) Agiu o autor popular com
boa-fé?
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Esses os critérios que devem orientar a decisão jurisdicional .
A diferença aqui é que a revogação do ato decorreu de decisão judicial (terceiro) e não
por iniciativa do Poder Público.
No caso de perda de objeto que leve à extinção da Ação Popular, ainda que a lei seja
omissa a esse respeito, o que resolverá o problema aqui será a teoria da causalidade.
Mesmo que tenha diligenciado para o retorno ao status quo ante, não se afasta a
responsabilidade dos réus pelos honorários do advogado do autor e se diga, pelas
despesas processuais, tal qual prevê o art. 12 da Lei de Ação Popular. O autor popular
ficará isento, salvo se tiver atuado com má-fé comprovada.
8. Decisão que julga procedente o pedido e reconhece a má-fé do autor popular: nessa
hipótese não há outro critério para responsabilizar o autor popular pelo dano processual
senão o da causalidade. O autor venceu a demanda (não é sucumbente), mas ainda
assim deverá suportar os ônus respectivos, ainda que de forma proporcional, pela
conduta maliciosa causadora do dano à parte contrária, em favor de quem será revertida
a sanção processual.
9. Decisão que julga improcedente o pedido veiculado na ação popular e reconhece ter
sido a lide manifestamente temerária: na específica hipótese de lide temerária, a qual é
prevista em um dos incisos do art. 80 (inciso V), a Lei da Ação Popular não se limitou às
sanções por litigância de má-fé, tratando a temeridade da lide de modo mais rigoroso,
por certo para evitar o casuísmo, a perseguição política que pode ensejar a ação,
notadamente nos anos eleitorais.
A melhor interpretação, no entanto, é que ao autor deverá ser imputado o valor das
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custas simples, mais o seu décuplo . Trata-se de uma sanção processual criada pelo
legislador a uma das hipóteses da litigância de má-fé genericamente previstas pelo art.
80 do CPC/2015 (LGL\2015\1656).
10. Decisão que julga improcedente o pedido na Ação Popular e reconhece a prática pelo
autor popular de ato atentatório à dignidade da justiça ou contempt of court (art. 77, §
1º, CPC/2015 (LGL\2015\1656)), isto é, a parte não cumpre com exatidão as decisões
jurisdicionais, de natureza provisória ou final, cria embaraços à sua efetivação ou pratica
inovação ilegal no estado de fato de bem ou direito litigioso: sob a lógica da causalidade
jurídica, além das despesas processuais, honorários advocatícios, sanção pelo dano
processual se reconhecida a má-fé, o autor será penalizado com uma multa de vinte por
cento sobre o valor da causa, sem prejuízos de outras sanções (penais, civis e
processuais).
Referida multa processual, no entanto, não é revertida à parte contrária, mas à União ou
ao Estado ao qual está vinculado o órgão judiciário, sendo importante ressaltar, ainda,
que se o ato partir do réu (Administração Pública), a aplicação da sanção há de ser
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pessoal, isto é, ao administrador que o tenha realizado .
12. Por fim, a decisão originária de Ação Rescisória que rescinde a sentença de
procedência do pedido em sede de Ação Popular (Ação Rescisória): aqui o autor popular
é alcançado pela isenção dos ônus da sucumbência prevista no art. 5º, LXXIII, da
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Constituição, conforme entendimento pacífico do Supremo Tribunal Federal , salvo se
reconhecida a sua atuação como litigante de má-fé na demanda originária ou na própria
ação rescisória.
5. Conclusões
Conclui-se que não há um consenso na doutrina ou nos próprios dispositivos legais sobre
o conceito e a classificação das despesas que integram os ônus da sucumbência, matéria
que somente vem à discussão quando do seu enfrentamento prático, com potencialidade
de levar a equívocos nas decisões judiciais, se não devidamente categorizadas.
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Ação popular: critérios para distribuição da sucumbência
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povo ajuizar ação popular contra ato de “suborno, peita, peculato e concussão” dirigida a
ato de prevaricação dos juízes, julgada pelo Imperador, com alto teor moralizador, de
caráter criminal, em que pese a utilização do termo “ação popular”. E apesar de o
verbete ter sido utilizado expressamente no ordenamento jurídico brasileiro pela
primeira vez naquela Constituição, antes mesmo, na vigência das Ordenações Filipinas,
vislumbravam-se ações de iniciativa de qualquer do povo contra usurpação de coisas de
uso público ou para embargar obra nociva a bem de uso comum como a rua, o mar, o
rio público, como uma reminiscência do Direito Romano. (cf. SILVA, José Afonso da.
Ação popular constitucional. Doutrina e processo. 2. ed. rev., ampl. E aum. 2. tir. São
Paulo: Malheiros Editores, 2013. p. 32-33).
3 .Art. 5º, LXXIII. “Qualquer cidadão é parte legítima para propor ação popular que vise
a anular ato lesivo ao patrimônio público ou de entidade de que o Estado participe, à
moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural,
ficando o autor, salvo comprovada má-fé, isento de custas judiciais e do ônus da
sucumbência” (BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.
Presidência da República, Casa Civil. Subchefia para Assuntos Jurídicos. Disponível em:
[www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm]. Acesso em: 28.03.2021).
Art. 13. A sentença que, apreciando o fundamento de direito do pedido, julgar a lide
manifestamente temerária, condenará o autor ao pagamento do décuplo das custas.”
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Ação popular: critérios para distribuição da sucumbência
18 .SANTOS FILHO, Orlando Venâncio dos. Op. cit., p. 34. Ver também: CAHALI, Yussef
Said Cahali. Honorários advocatícios. São Paulo: Ed. RT. 1997.
22 .Ver art. 85, caput, do CPC/2015, em comparação com o art. 20, primeira parte, do
CPC/1973.
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Ação popular: critérios para distribuição da sucumbência
26 .Há um projeto de lei complementar para unificação do valor das custas dos serviços
forenses no âmbito da União, dos Estados, DF e territórios, após ter o Conselho Nacional
de Justiça detectado grande discrepância de valores entre os diversos Estados (BRASIL.
Conselho Nacional de Justiça. Custas judiciais: regras para equilibrar acesso e gastos da
Justiça, 22 nov. 2019. Disponível em:
[www.cnj.jus.br/custas-judiciais-regras-para-equilibrar-acesso-e-gastos-da-justica/].
Acesso em: 26.05.2020).
28 .STJ, REsp 1.558.185/SP, rel. Min. Nancy Andrighi, j. 02.02.2017, DJU 16.02.2017.
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Ação popular: critérios para distribuição da sucumbência
32 .“Art. 11. A sentença que, julgando procedente a ação popular, decretar a invalidade
do ato impugnado, condenará ao pagamento de perdas e danos os responsáveis pela
sua prática e os beneficiários dele, ressalvada a ação regressiva contra os funcionários
causadores de dano, quando incorrerem em culpa” (BRASIL. Lei 4.717, 29 de junho de
1965. Regula a ação popular. Presidência da República, Casa Civil. Subchefia para
Assuntos Jurídicos. Disponível em: [www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l4717.htm].
Acesso em: 28.03.2021).
33 .O art. 3º, parágrafo único, do Projeto de Lei Complementar para unificação das
custas, prevê a vedação de destiná-las a pessoas físicas ou jurídicas de direito privado, o
que acolhe o entendimento jurisprudencial do Supremo Tribunal Federal.
35 .STJ, REsp 1.558.185/SP, rel. Min. Nancy Andrighi, j. 02.02.2017, DJU 16.02.2017.
36 .NERY JUNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Op. cit., p. 2190.
41 .GOMES JÚNIOR, Luiz Manoel. Ação popular: aspectos polêmicos. 2. ed. rev., ampl. e
atual. Rio de Janeiro: Forense, 2004. p. 120-121.
42 .GOMES JÚNIOR, Luiz Manoel. Op. cit., p. 120-121. Pertinente mencionar uma rara e
bem fundamentada sentença na qual há uma adequada condenação em má-fé da autora
popular e que merece ser lida: TJSP – Processo nº 1000482-53.2022.8.26.0100 – Juiz
Renato Augusto Pereira Maia, j. 20.01.2022 – pendente de análise pelo Tribunal de
Justiça de São Paulo.
43 .Assemelha-se esse imbróglio ao que ocorre com a Justiça Eleitoral, não só no que
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Ação popular: critérios para distribuição da sucumbência
respeita à perícia, mas também em relação aos advogados voluntários e dativos, dado
que as ações eleitorais classificadas como ações de cidadania e eximem o autor do
adiantamento de custas e do ônus da sucumbência.
46 .TJSP, AgIn 46.582-5, rel. Des. Ricardo Lewandowski, j. 15.10.1997. GOMES JÚNIOR,
Luiz Manoel. Op. cit., p. 121.
47 .TJSP, AgIn 99.537-5/SP, rel. Des. Sérgio Pitombo, j. 04.10.1999 GOMES JÚNIOR,
Luiz Manoel. Op. cit., p. 121.
48 .MANCUSO, Rodolfo de Camargo. Ação popular. 8. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo:
Ed. RT, 2015. p. 324.
51 .NERY JUNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Op. cit., p. 470.
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