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ISSN: 2525-8761
Murilo Rotta
Graduando em Engenharia de Pesca - UFAM Instituição: Universidade Federal
do Amazonas - UFAM
Endereço: Av. General Rodrigo Octavio Jordão Ramos, 1200 - Coroado I,
Manaus - AM, CEP: 69067-005, Manaus – AM
E-mail: murilo.rotta@gmail.com
RESUMO
O presente estudo investigou a relação peso-comprimento de cinco espécies de peixes de
interesse ornamental da Reserva de Desenvolvimento Sustentável do Tupé, em Manaus,
Amazonas, avaliando também a influência dos períodos hidrológicos sobre a mesma. Os
peixes foram coletados em 2 períodos hidrológicos no ano de 2017, utilizando-se rapichés
e redes de cerco, nas margens do lago Tupé. Os parâmetros da relação peso comprimento
foram estimados utilizando o coeficiente angular ou alométrico (b), que variou de 2,0477
à 3,5743 no período da enchente e 2,3141 à 3,7053 no período da vazante. As espécies
estudadas Acarichtys heckelii, Hyphessobrycon copelandi, Mesonauta festivus,
Nannostomus eques e Nannostomus unifasciatus apresentaram variação sazonal na
alometria. Os resultados deste trabalho fornecem dados de peso-comprimento que
poderão servir de referência para futuros estudos com as espécies.
ABSTRACT
The present study investigated the length- weight relationship of five species of
ornamental fish of the Tupé Sustainable Development Reserve, in Manaus, Amazonas,
also evaluating the influence of hydrological periods on it. The fish were collected in 2
hydrological periods in the year 2017, using rapichés and seines, on the banks of Lake
Tupé. The parameters of the length- weight relationship were estimated using the angular
or allometric coefficient (b), which ranged from 2.0477 to 3.5743 in the flooding period
and 2.3141 to 3.7053 in the ebb period. The studied species Acarichtys heckelii,
Hyphessobrycon copelandi, Mesonauta festivus, Nannostomus eques and Nannostomus
unifasciatus presented seasonal variation in allometry. The results of this study provide
length- weight data that can serve as a reference for future studies with the species.
1 INTRODUÇÃO
A relação peso-comprimento (LWR, length-weight relationship) tem como
origem a lei do quadrado-cubo, proposta por Galileu Galilei (FROESE, 2006). Esta lei
propõe que um objeto ao ser submetido à um aumento proporcional de tamanho, seu
volume é proporcional ao cubo do multiplicador em questão, enquanto sua área é
correspondente à apenas o quadrado deste mesmo multiplicador. Spencer (1864) em seu
livro, “Princípios da Biologia”, reafirmou a proposição de Galileu. Dessa forma, um peixe
que dobra de tamanho tem sua massa aumentada em 8 vezes. Fulton (1904), por sua vez,
notou que os peixes aumentam mais em peso do que em comprimento, sujeitos a variação
do ciclo hidrológico e do pulso de inundação, que modulam sua reprodução, e, por fim,
como a relação pode variar grandemente entre peixes de diferentes espécies. Essa
afirmação foi feita após a aplicação da LWR em 19 espécies de peixes e 5675 indivíduos
provenientes do mar do norte escocês (FULTON, 1904).
Para obter-se a LWR, usa-se a fórmula P=aCb. Onde: P é o peso em gramas, C é
o comprimento total, em centímetros, a é a intercessão da regressão e b o coeficiente
alométrico. Este coeficiente varia de 2,5 à 3,5 e é considerado isométrico quando é igual
à 3. Ou seja, com um resultado de b=3 tem-se a lei do quadrado-cubo. Um resultado
alométrico, onde b ≠ 3, considera que o desenvolvimento do indivíduo não é igual para
todas as partes do corpo, o que torna os cálculos mais realistas, tendo em vista que o corpo
precisa compensar de alguma forma o aumento de peso gerado pelo crescimento
(GAYON, 2000; SOUSA ET AL., 2020).
É importante destacar que a LWR é de grande utilidade e suma importância, pois
permite a estimativa de biomassa através da observação do comprimento dos peixes, é
útil para comparações de mesmas espécies entre diferentes regiões e estoques, fornece
meios de se estimar a condição de saúde do animal, fornecendo o coeficiente alométrico
para o fator de condição, e permite a conversão de equações de crescimento-comprimento
para crescimento-peso, utilizadas em modelos de avaliação de estoques pesqueiros
(WOOTTON, 1990; PAULY 1993; PETRAKIS & STERGIOU, 1995; GONÇALVES et
al. 1996; BINOHLAN & PAULY, 1998). Segundo Camara et al., (2011), a relação peso-
2 MATERIAL E MÉTODOS
2.1 ÁREA DE ESTUDO
O lago Tupé, está localizado na Reserva de Desenvolvimento Sustentável do Tupé
(RDS Tupé) (60º19’08’’W – 03º04’22’’S e 60º13’46’’W – 02º57’50’’S), distante
aproximadamente à 25 km em linha reta da Cidade de Manaus, na margem esquerda do
rio Negro (SCUDELLER et al., 2005). É um lago de águas pretas e margens íngremes,
com área inundável, ou seja, sua área total varia durante a cheia e a seca, com cerca de 60
hectares de área e até 3 km de comprimento, alimentado por, ao menos, cinco igarapés.
Sofre influência direta do rio Negro, apresentando características semelhantes à
dos lagos de área inundável da bacia do rio Negro, como pH ácido e baixa visibilidade,
principalmente na época da cheia, pode alcançar um volume de cerca de 2,6 milhões de
metros cúbicos e profundidade que varia de 10 à 15 metros. Durante a seca, as
características são determinadas, principalmente, pelos igarapés e pelo regime de chuvas.
Com volume de cerca de 1,4 milhões de metros cúbicos e profundidade que pode variar
até 4,5m quando comparada à profundidade na época de cheia. (APRILE & DARWICH,
2005).
em um habitat típico de águas negras com águas claras, ácidas e cor de chá em águas
rasas, entre a vegetação terrestre submersa (ORTEGA; VARI, 1986).
N. unifasciatus habita geralmente afluentes lentos, áreas pantanosas e pequenos
rios, com galhos submersos, vegetações aquáticas densas, sendo encontrados também sob
ilhas flutuantes. É geralmente encontrado associado à outra espécie do gênero
Nannostomus, o N. eques. É uma das maiores espécies do gênero, alcançando 7
centímetros de comprimento. Com hábitos onívoros, alimenta-se de insetos e crustáceos
pequenos, principalmente. É comum, também, o consumo de algas e perifiton
(WEINTZMAN; COBB, 1975).
2.3 AMOSTRAGENS
As coletas foram realizadas nas margens do lago Tupé em dois períodos do ciclo
hidrológico (enchente e vazante) em 2017, com auxílio de rapichés e rede de cerco. As
coletas foram realizadas no período da manhã 08h-10h e pela tarde 16h-18h, com esforço
padronizado de três coletores. Após as coletas os peixes foram pesados (g) e medidos
(cm) e fixados em formalina à 10 %, sendo transportados ao laboratório de ictiologia da
Universidade Federal do Amazonas (UFAM) onde foram identificados com o uso de
chaves taxonômicas e a ajuda de especialistas.
3 RESULTADOS
Os valores de comprimento variaram 2,4 centímetros na enchente e 1 centímetro
na vazante para a espécie Acarichthys heckelii, com 84 indivíduos. A variação de peso
foi de 3,48 gramas na enchente e 0,25 gramas na vazante. O resultado de b, para
Acarichthys heckelii, foi pouco acima do limite ideal sugerido por Froese (2006), que
varia de 2,5 à 3,5. Considera-se, então, que a espécie possui alometria positiva, indicando
que os indivíduos estavam mais arredondados do que o esperado durante a enchente. Na
vazante, com o valor de 2,3, seguindo o mesmo padrão de 2,5 à 3,5, observa-se que os
indivíduos possuíam alometria negativa, estando um pouco mais alongados do que o
esperado.
Já a espécie Hyphessobrycon copelandi, com 50 indivíduos, os valores de
comprimento variando 1,3 centímetros na enchente e 1,4 centímetros na vazante. Os
indivíduos mostraram-se mais pesados na enchente, com valores que variaram de 0,28
gramas à 0,83 gramas, enquanto que na vazante, os valores foram de 0,18 à 0,58 gramas.
Segundo os valores de referência de Froese (2006), os indivíduos demonstraram alometria
negativa em ambos os períodos, com 1,94 e 1,64, na cheia e vazante, respectivamente.
Logo, também estavam consideravelmente mais “alongados” do que o esperado.
Diferentemente de Acarichthys heckelii, a espécie não teve relação significativa entre
peso e comprimento, ou seja, o comprimento não explicava o peso.
A espécie Mesonauta festivus contou com 23 indivíduos, tendo uma variação de
1,5 centímetros no comprimento destes durante a enchente e vazante. Já o peso dos
indivíduos variou, na enchente, 4,69 gramas, a maior variação dentre todas as espécies e
períodos e, na vazante, obteve variação de 0,77 gramas. Os valores de b para Mesonauta
festivus foi 2,0 para a enchente e 3,7 na vazante. Novamente os valores excedem os limites
estabelecidos por Froese (2006), demonstrando que a espécie estava alongada durante a
enchente e arredondada durante a vazante, porém bem mais próximas dos valores
aceitáveis do que a espécie Hyphessobrycon copelandi. Os valores de p-value foram
abaixo de 0,05, confirmando que a relação peso-comprimento é verificada, ou seja,
estatisticamente o peso é relacionado ao comprimento, entretanto, apesar de próxima, a
influência dos dois períodos hidrológicos na relação peso-comprimento, ainda que muito
próxima do mínimo, não foi verificada.
Tabela 1: N = número de indivíduos, Comp (min-max) = comprimento mínimo e máximo dos indivíduos, Peso (min-max) = peso mínimo e máximo dos
indivíduos, a = intercepto, b = coeficiente de regressão, Valor-P(PxC) = significância da relação peso-comprimento (<0,05), Valor-P entre períodos =
Significância do período hidrológico sobre a relação peso-comprimento (<0,05).
Comp Peso (min- a b Valor-P Valor-P
Espécie Período N (min-max) max) r² (PxC) entre
periodos
Enchente 3,0 - 5,4 0,42 - 3,90 2,019345 3,573432 0,767 2,22E-16
Acarichthys heckelii 84 0,0011
Vazante 1,5 - 2,5 0,11 - 0,36 1,358573 2,314127 0,901 0,0072
Enchente 2,2 - 3,5 0,28 - 0,83 11,579183 1,937335 0,074 0,0846
Hyphessobrycon copelandi 50 0,6570
Vazante 1,3 - 2,7 0,18 - 0,58 10,145970 1,637595 0,219 0,2034
Enchente 3,8 - 5,3 1,22 - 5,91 0,779403 2,047749 0,549 0,0010
Mesonauta festivus 23 0,0619
Vazante 2,5 - 4,0 0,26 - 1,03 2,195648 3,705318 0,752 0,0114
Enchente 2,1 - 3,2 0,14 - 0,83 1,584481 4,257278 0,006 0,4024
Nannostomus eques 199 8,70E-12
Vazante 1,0 - 4,2 0,07 - 0,81 11,056680 1,585435 0,197 0,9010
Enchente 2,9 - 3,2 0,14 - 0,83 9,125857 1,812270 0,004 0,6924
Nannostomus unifasciatus 59 6,50E-8
Vazante 1,0 - 2,5 0,04 - 0,80 0,223386 2,877978 0,122 0,1851
4 DISCUSSÃO
A espécie A. heckelii apresentou diferentes valores de b nas diferentes épocas,
possivelmente, pelas variações na alimentação e distribuição da espécie pelas áreas
alagadas. O fato de não se encontrarem no intervalo definidos por Froese (2006), estando
muito mais alongados na vazante e muito mais arredondados na enchente, implica em
menor quantidade de alimento na área quando o período de enchente iniciou, pois com a
seca é comum a concentração de grande quantidade de animais num menor volume de
água e a competição torna-se maior. Logo, o fato de estarem mais alongados na vazante
implica, também, que há uma grande variação de peso e uso da energia acumulada durante
a enchente para a sobrevivência. Pode estar relacionado, também à qualidade nutricional
dos alimentos disponíveis. Segundo Ricker (1975), valores de b acima de 3,5 ou abaixo
de 2,5 para a espécie geralmente são considerados incorretos. No entanto, é importante
denotar o quanto os valores variam em relação ao período hidrológico. Logo as mudanças
hidrológicas na região podem vir a justificar os valores fora do padrão.
Os valores de b obtidos neste trabalho diferem dos obtidos por Matos et al (2019)
para a espécie A. heckelii, com b = 2.67 (2.48–2.86), porém o trabalho em questão engloba
todos os períodos hidrológicos de 10 lagos de várzea do Rio Solimões, Amazonas. Os
valores de b deste trabalho também divergiram dos obtidos por Lubich et al (2020), que
obtiveram 2,9671 para b, em dois tributários do Rio Negro. Vale ressaltar que nossos
resultados ocorrem advindos de ambientes de igarapés, cuja dinâmica ecológica é
completamente diferente dos biótopos supracitados.
5 CONCLUSÃO
As espécies Acarichthys heckelii e Mesonauta festivus apresentaram variações
consideráveis nas suas relações peso-comprimento, quando relacionados os períodos de
enchente e vazante, onde A. heckelii estava mais arredondado na enchente e mais
alongados na vazante. A espécie M. festivus teve o comportamento inverso, estando mais
alongados na enchente e mais arredondados na vazante. As espécies Hyphessobrycon
copelandi, Nannostomus eques e Nannostomus unifasciatus não demonstraram,
estatisticamente, seus respectivos pesos justificados por seus comprimentos.
Os resultados deste trabalho fornecem dados de peso-comprimento que poderão
servir de referência para futuros estudos com as espécies, é necessário, ainda, estudo mais
amplo, com coletas mais frequentes, para avaliar a relação peso-comprimento nos 4
períodos hidrológicos, para então poder avaliar se a média dos 4 períodos se encaixa nos
limites tidos como ideais, tendo em vista o interesse ornamental das espécies estudadas.
AGRADECIMENTOS
Universidade Federal do Amazonas – UFAM
REFERÊNCIAS