Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Natal
2022
FRANCISCO ANTONIO DA SILVA
Böschemeier.
Natal
2022
Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN
Sistema de Bibliotecas - SISBI
Catalogação de Publicação na Fonte. UFRN - Biblioteca Setorial do Centro Ciências da Saúde - CCS
COMISSÃO JULGADORA
___________________________________________________
Profa. Dra. Ana Tânia Lopes Sampaio
Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN
____________________________________________________
Prof. Dr. Luiz Carvalho de Assunção
Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN
____________________________________________________
Profa. Dra. Ana Gretel Echazú Böschemeier.
Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN
Professora Orientadora - Presidente da Banca Examinadora
Tendo em vista a constante desvalorização do Sistema Único de Saúde (SUS) por parte da
população brasileira, houve a necessidade de investigação neste trabalho de pesquisa sobre a
efetividade do uso de tecnologias do saber popular em processos pedagógicos para a
promoção da Educação Popular em Saúde, visando discutir o direito à saúde pública, a partir
do cordel “Os 30 anos do SUS”. Para tanto, houve a necessidade de envolvimento de
estudantes do curso saúde coletiva da Universidade Federal de Rio Grande do Norte
objetivando discutir sobre as questões levantadas dentro do tema proposto. Realizou-se, então,
uma pesquisa semiestruturada quanti-qualitativa, com a aplicação de um questionário
contendo perguntas semiabertas e complementação das informações com a realização de um
grupo focal, com um número reduzido de estudantes para debater os conteúdos sobre o tema.
É possível identificar no presente trabalho um passeio realizado pelas informações
relacionadas à Educação Popular em Saúde, pelas artes enquanto indutoras do debate das
políticas públicas, onde se apoia a literatura popular do cordel, suas origens, história, a
estruturação e suas vertentes artísticas. Diante disso, pode-se afirmar que essas metodologias
que envolvem a arte-educação têm grande valor no meio popular, pois facilitam o acesso à
informação, potencializando o aprendizado, gerando conhecimento por meio das suas ações
problematizadoras do debate sobre temas relevantes na sociedade, especialmente sobre saúde,
com uma linguagem própria da cultura de um povo, possibilitando o fortalecimento da
democracia, do SUS e da cidadania.
Palabras clave: Educación popular en salud. Literatura de cordel. Arte educación. Sistema
Único de Salud. Derecho a la salud.
Abstract
Taking into consideration the constant devaluation of the Unified Health System (SUS) by the
Brazilian population, the need arose to investigate in this research work the effectiveness of
the use of popular knowledge technologies as methodological tools for the promotion of
Popular Health Education, to discuss the right to public health, from the cordel [traditional
poem] “The 30 years of the SUS”. For this, it was necessary to involve the students of the
collective health course of the Federal University of Rio Grande do Norte to discuss the issues
raised on the proposed theme. Semi-structured research of a quantitative-qualitative type was
then conducted, with the application of a questionnaire with semi-open-ended questions and
the complementation of the information with the realization of a focus group, with a reduced
number of students to discuss the contents on the subject. In this work it is possible to identify
a journey through the information related to Popular Education in Health, throughout art
education as inducer of the debate of public policies, where the popular literature of the
cordel, its origins, history, structuring, and its artistic aspects. Given this, it can be said that
these methodologies involving the arts and art education have great value in the popular
sphere, because they facilitate access to information, enhance learning, generating knowledge
through their actions that problematize the debate on relevant issues of society, especially on
health, with the language typical of the local culture and its people, allowing the strengthening
of democracy, the national Unified Health System, and citizenship.
Keywords: Popular education in health. Cordel literature. Art education. Universal Health
System. Right to health.
Sumário
1 Introdução ……………………………………………………………………………..…... 8
2 As artes e a Educação Popular em Saúde ……………………………..…………..….... 11
3 O que é o cordel? ……………………………..………..……………………...…………. 14
4 O cordel “30 anos do SUS” ……………………………………………………………… 16
5 Aspectos Teórico-Metodológicos ...……………………………...…….………………… 24
6 Análise das narrativas produzidas: Questionário …...……………....………………… 28
7 Análise das narrativas produzidas: Grupo Focal .…………………………….………. 32
8 Conclusões …………………………………………………………….……….…………. 48
Referências bibliográficas ……………………………………………….………………... 51
Anexos …………………………………………………...…………………………………. 53
1 Introdução
Esse trabalho parte de um problema que merece ser investigado em relação ao Sistema
Único de Saúde (SUS), que é a sua desvalorização por parte das pessoas, que teimam em
enxergar apenas os gargalos enfrentados no dia a dia dentro dos serviços, muitas vezes, por
falta de informação sobre o sistema como um todo. Assim, torna-se pertinente encontrar uma
alternativa que possa responder ao seguinte questionamento: por que será que o nosso sistema
de saúde é tão desvalorizado no meio da sociedade brasileira? Levantaram-se, a partir desta
questão, outros sub questionamentos e hipóteses para a realização desta pesquisa: será que
isso se deve a falta de conhecimento das pessoas sobre o SUS e o seu funcionamento? E,
ainda, será que levar informação à população por meio de processos metodológicos da
educação popular tornará mais fácil a assimilação dos conceitos relacionados ao sistema de
saúde? É possível aprender com o apoio de tecnologias populares como o cordel? É possível
entender sobre o direito à saúde pública utilizando o cordel “Os 30 anos do SUS”?
Apesar da Constituição Federal Brasileira de 1988 prever a participação da sociedade
civil nas decisões relacionadas às políticas públicas, e a legislação do SUS conter o controle
social como um dos seus princípios, ainda existe a falta de informações e o pouco
envolvimento da população nessas questões. Segundo Kawashima et al (2007), em seu artigo
“O desconhecido SUS”, conclui que:
Além do cordel ser aqui apresentado enquanto proposta indutora do debate para a
construção do conhecimento popular em saúde, este trabalho tenta mostrar a possibilidade
desta literatura servir como base para outras expressões artísticas como o teatro (e as suas
várias vertentes como o teatro popular de rua, fantoches ou de bonecos), a cenopoesia, a
música, a dança, para o aprender brincando. São várias as possibilidades que o cordel tem
para ser trabalhado como uma ferramenta, não somente com potencial para a educação
popular, mas para o divertimento ou lazer, com o poder de reunir pessoas, como podemos
observar em Santos (2010), apoiado em registros antigos que apontam a sua capacidade de
envolver pessoas em seus enredos ou estórias, onde reuniam-se entre vizinhos para
“escutação” de recitações e leituras coletivas das histórias cordelizadas, tidas como momentos
de lazer:
O significado que tem a riqueza cultural do cordel vai além das narrativas dos seus
conteúdos. É uma literatura que tem uma estrutura própria mostrada neste trabalho, com
informações necessárias para que se entenda o que é um cordel, a sua origem e história de
arraigamento cultural no Nordeste do Brasil e como é formada a sua estrutura literária. Traz,
ainda, o cordel “Os 30 anos do SUS”, como podemos observar abaixo, na íntegra, com a sua
organização, contendo 40 estrofes de 6 versos cada, sendo que os 3 versos pares (2º, 4º e 6º)
são rimados entre si e os 3 ímpares (1º, 3º e 5º) livres ou seja, sem rimas, e cada um dos
versos é construído ritmicamente com 7 sílabas poéticas, onde o 6º verso de cada estrofe rima
com o 1º da estrofe seguinte.
E, ainda, é oportuno dizer que este estudo representa apenas uma pequena
contribuição ao importante e necessário debate sobre o fortalecimento do SUS, a partir da
construção do conhecimento entre profissionais e usuários desse nosso sistema de saúde, por
meio de ações da EPS em uma perspectiva dialógica, participativa, criativa e emancipadora,
imprescindível para tornar possível a universalização do acesso e a integralização das redes de
atendimento, através da valorização e do apoio à comunicação e a informação em saúde para
que todos e todas possam entender o SUS, o seu direito à saúde pública, gratuita e de
qualidade, e ser atendidos no sistema de forma equitativa, contribuindo assim com a cidadania
e o bem viver.
No parágrafo 2º do Artigo 4º desta mesma portaria, que trata dos quatro Eixos
Estratégicos da PNEPS-SUS, especificamente sobre o Eixo Estratégico II: “da formação,
comunicação e produção de conhecimento”
Incentivar a realização de trabalhos educativos por meio das artes como forma de dar
expressão a conteúdos científicos que possam ser assimilados pela população em geral, pode
ser uma estratégia viável, já que ela possibilita mexer com as emoções e sentimentos das
pessoas e subsidiar na análise crítica sobre diversos temas, mesmo os que estão presentes no
dia a dia da população, mas distantes do seu conhecimento, como é o caso da saúde. Para
isso, é necessário valorizar e fomentar as práticas populares no sistema de saúde, por meio
de ações que proporcionem a interprofissionalidade e a integração das pessoas, a partir de
processos informativos, de divulgação e incentivo dessas metodologias, em especial, junto à
Atenção Primária à Saúde (APS).
As tecnologias digitais dominam atualmente o cenário nos ambientes cotidianos das
pessoas, mas existe a possibilidade de intervenção pedagógica por meio de performances da
cultura popular, como no caso em estudo, do cordel no cumprimento de um papel
informativo ou educativo de temas como o direito à saúde. Sendo assim, é possível também
haver uma integração entre os meios populares e os aplicativos disponíveis em aparelhos
tecnológicos como os celulares. Para esta integração, além do cordel, pode-se utilizar o
“teatro de fantoches”, a dança, a música / paródia, entre outras expressões artísticas.
A valorização do SUS e o respeito pelo conhecimento popular podem ser
potencializados por meio de uma pedagogia libertadora, que possa escambiar informações,
sentir os “sentires”, ouvir os “ouvires” e saber os “saberes” uns dos outros e isso é
primordial numa ação de educação popular. Este debate do respeito ao conhecimento
popular e da valorização das oralidades vai muito além da promoção de ações de educação
popular junto aos profissionais e à população em si. É um assunto que ainda está
imperceptível, mas, já se estende às instituições de ensino superior no Brasil e em outras
partes do mundo, especialmente na América Latina, onde supera a discussão das cotas para
os povos nativos e para os povos afrodescendentes nas universidades, chegando agora ao
debate da inclusão do “Notório Saber” docente, que são os saberes tradicionais dos mestres e
seus povos, no destas instituições de ensino, num “processo de reinstitucionalização
descolonizadora, que levará a uma refundação completa das nossas universidades”
(CARVALHO, 2018).
Esses saberes tradicionais são expressões artístico-culturais de uma coletividade que,
em alguns momentos, representam um sincretismo de religiosidades. Em outros, trazem à
tona as vivências e convivências desses coletivos, o seu cotidiano na vida social ou mesmo o
criticismo às condições político-econômicas em que vivem. Nesta linha, podemos observar
em “Ciranda da Vida: Dialogismo e Arte na Gestão em Saúde”, da médica seridoense,
doutora em educação, Vera Lúcia de Azevedo Dantas, poetisa e teatróloga (Teatro Popular
de Rua), militante da Educação Popular em Saúde, onde afirma que:
Desta forma, o teatro, a dança, o cordel, a música, seja qual for a abordagem artística
a ser explorada, a arte mexe com os sentimentos e as emoções das pessoas, podendo
envolver uma coletividade e proporcionar o bem viver, e realizar processos
potencializadores da aprendizagem em qualquer atividade de construção de conhecimentos
dentro de uma ação de EPS, pois, segundo Goldschmidt (2010, pág. 104):
Pode-se perceber, no trabalho realizado por Batista et al (2015), que a arte também
pode ser uma propulsora do empoderamento e instigadora do cuidado com a própria saúde de
quem a pratica, “que através da dança como instrumento de Educação Popular em Saúde as
pessoas sentem a necessidade de mudança de hábitos, da importância da atividade física, de
alimentação saudável, controle do peso, glicemia e da pressão arterial”.
O uso da arte e da cultura local como meio de diálogo, permite uma maior
abertura entre as pessoas, que passam a se identificar com o conteúdo
debatido, aproximando-as de sua realidade.
3 O que é o cordel?
É consenso entre os autores dessa literatura, que o cordel tem suas raízes na Europa,
principalmente na península ibérica e, especialmente, em Portugal. Foi difundida no Brasil
por meio de oralidades trazidas paulatinamente junto a colonização e ressignificada como
Literatura de Folheto Nordestina. Hoje, se apresenta como um produto cultural literário da
manifestação oral popular típica desta região do país.
Nas “oralituras” cordelizadas podemos encontrar produções com fatos históricos e de
ficção, estórias de heroísmo, contos e romances, causos, mitos, fatos ou acontecimentos de
diversas narrativas e até servia antigamente como veículo de transmissão de notícias. Um
universo de possibilidades, é uma arte geradora de outras artes, que dialoga com várias formas
de expressão dos conteúdos artístico-culturais como os cordéis e poemas recitados, cantados,
as canções, as emboladas de côco, as pelejas, os aboios, as poesias improvisadas…
O embelezamento poético dessa literatura se traduz também em suas variadas formas
estruturais de composição, inclusive, na sonoridade, ritmo e musicalidade produzidas pelas
rimas, a partir do construto linear dos versos pausados e tonificados metricamente em sílabas
poéticas (pentassílabo, hexassílabo, heptassílabo), formando suas estrofes (quadra, quintilha,
sextilha, septilha), a depender do número de versos ou linhas que o compõe. Vale lembrar
aqui que para compreender melhor a construção poética dessa literatura é necessário um
maior aprofundamento em seu estudo.
Recentemente, no ano de 2018, “o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico
Nacional (IPHAN) reconheceu a literatura de cordel como patrimônio cultural imaterial do
Brasil”, de acordo com Melo (2019):
Segundo Salgado et al (2019) “Essa literatura tem como pano de fundo a cultura
popular nordestina e carrega consigo toda a identidade sertaneja”, que geralmente aborda
conteúdos sobre diversos temas da atualidade e de interesse da sociedade como um todo,
através de uma linguagem simples e popular. Castro e Costa (2015) apontam que o cordel
“caracteriza-se como uma literatura popular e de baixo custo e a sua utilização como
ferramenta didática torna-se importante estratégia nos meios escolares”.
Também, ensejando a citação de Martins (2011) que favorece ao objeto deste estudo
sobre o emprego da literatura de cordel na Educação Popular em Saúde, que tem uma
linguagem acessível, uma mensagem facilmente compreendida pela população e pode
promover a participação dos sujeitos no processo educativo; é uma “importante expressão
cultural do Nordeste brasileiro e pode ser utilizada como uma tecnologia educacional que
propicia, de forma lúdica, um reestudo de questões inerentes à promoção e à educação em
saúde”. Na área da saúde existem diversas publicações em cordel, contendo vários temas
específicos no que diz respeito aos processos saúde-doença, inclusive com publicações
realizadas também pelo Ministério da Saúde.
No contexto da visão ampliada em saúde, a arte e a cultura, seja através de estilos,
gêneros musicais e / ou poéticos, de uma forma em geral, entre outros, podem provocar o
debate de questões ligadas ao processo saúde-doença e ao bem-estar da população. O uso da
literatura de cordel como uma metodologia educativa, já conhecida e consolidada na
expressão da cultura popular nordestina, se apresenta como uma alternativa para o
desenvolvimento de processos educativos lúdicos, com uma intervenção dinâmica e
enriquecedora dos conteúdos ministrados, e facilitam o entendimento dos assuntos
estudados.
Dessa forma, esta literatura é vista como uma estratégia poética facilitadora do
acesso à informação, que possibilita a transformação de um assunto denso e de cunho
científico, em um conteúdo leve, permitindo a compreensão de forma simples, direta, e de
fácil absorção de qualquer abordagem temática. Sendo assim, trabalhar com o cordel é
essencial para as pessoas que utilizam os serviços públicos terem acesso à informação de
uma forma simples, para se apropriarem das questões relacionadas à cidadania, saúde e bem
viver e buscarem uma melhoria nos serviços prestados à população e a conquista de uma
melhor qualidade de vida.
Os cordelistas são pessoas que, normalmente, narram suas vivências e convivência na
sua comunidade, de uma forma simples, traduzindo para quem lê, geralmente, uma crítica
sobre a interpretação da vida cotidiana ou sobre sua própria existência. É por isso que, ao
abordar temas como saúde, cidadania e bem viver, o cordel se transforma em peça educativa
para um processo de ensino-aprendizagem sobre direitos, participação nas tomadas de
decisão do Estado, sobretudo, no que se refere à elaboração e implantação de políticas
públicas.
Nesse contexto, o cordel “Os 30 anos do SUS” traz uma abordagem da trajetória de
luta do movimento para a Reforma Sanitária no Brasil, relatando poeticamente como a saúde
era tratada antes e como está sendo conduzida após a criação do Sistema Único de Saúde,
também versa sobre os princípios e diretrizes do SUS, seus avanços e gargalos enfrentados no
período, as conquistas das políticas e dos programas de saúde criados, além de outros desafios
a serem ultrapassados para cumprir com o que está preconizado em sua legislação.
O período de elaboração do cordel “Os 30 anos do SUS” se deu no mês de julho do
ano 2019, no momento em que aconteciam as conferências municipais e estaduais,
preparatórias para a 16ª Conferência Nacional de Saúde (8ª + 8), que teve como tema Saúde e
Democracia, onde o seu autor / pesquisador deste trabalho, participou como delegado
representante da sociedade civil / usuários do SUS, em Brasília/DF, apresentando o referido
cordel na Tenda Paulo Freire e no palco principal deste evento. O processo para a sua
construção naquele momento gerou um clima inspirador de tentar visualizar não somente os
30 anos passados de história de um SUS já autorizado legalmente, mas tentar enxergar a luta
que foi o movimento da Reforma Sanitária no Brasil, principalmente no período da década de
70, e a criação do Sistema Único de Saúde com a constituição de 1988, bem como os
momentos posteriores, como o da lei que regulamentaria o nosso sistema de saúde e suas
legislações posteriores, as políticas de saúde e os programas criados para atender os princípios
e diretrizes do SUS. E ir além, acreditando em um sistema de saúde inclusivo em todos os
níveis de atenção, bem conceituado pela população brasileira.
Com tudo isto em mente, o autor buscou a inspiração possível para registrar
poeticamente algumas conquistas e desafios do SUS nessas três décadas em um folheto
conhecido como literatura de cordel, composto por 40 estrofes e adequado às técnicas
tradicionais deste gênero literário, sendo cada estrofe formada por seis versos (sextilhas) e
cada verso metrificado, contendo sete sílabas poéticas – heptassílabos –, uma das modalidades
mais comuns, onde os versos pares (2, 4 e 6) são rimados de forma alternada entre si, e os
ímpares (1, 3 e 5) são livres, com o último verso de cada estrofe rimando com o primeiro
verso da estrofe seguinte, reproduzidos a seguir:
II
III
Ùma comemoração
Daquilo que já deu certo
E o que ainda não deu
Para conseguir o resto
Nós devemos é lutar
E não deixar em aberto
IV
Um movimento se ascendia
No Brasil, antes do SUS
Da “Reforma Sanitária”
Que deu p’rá saúde a luz
Sérgio Arouca, um líder
Na Fundação Oswaldo Cruz
VI
VII
VIII
XI
XII
A saúde verdadeira
É ter acesso à educação,
Lazer e saneamento
Qualidade em habitação,
Em transporte e bom emprego
Que nos dê sustentação
XIII
Em nossa Constituição
Tudo isso está contido
Saúde como direito
Nosso, já é garantido
E um dever do Estado
Tudo está constituído
XIV
XVI
A descentralização
Dar responsabilidade
Aos entes federativos
Em qualquer complexidade
Para integrar seus serviços
Seja no campo ou cidade
XVII
E o viés da qualidade
Do serviço a ser prestado
Desde o seu acolhimento
Com um dever humanizado
Por qualquer um servidor
Efetivo ou contratado
XVIII
É de um grande legado
O “Programa do Agente
Comunitário de Saúde”
Que está sempre à frente
Tendo como sigla PACS
Para atender nossa gente
XIX
XX
Falamos da implantação
Do SUS, em suas esferas
Município, estado, união
Nessas trinta primaveras
E, p’rá consolidação
Só com medidas severas
XXI
XXII
Devemos agradecer
Conquistas que obtivemos
SAMU, “Brasil Sorridente”
Entre outras que tivemos
Programa como o “Mais Médicos”
Esse nunca esqueceremos
XXIII
XXIV
XXV
XXVI
Sabemos da relevância
Da “(Atenção) Psicossocial”
Também da “Rede Cegonha”
E de forma especial
Da “Saúde das Pessoas
No Sistema Prisional”
XXVII
O “Cartão Nacional”
É a identidade no Sistema
Para quem for acolhido,
Consultado no esquema,
Ou melhor, utiliza o SUS
Seja qual for o problema
XXVIII
XXIX
A “Atenção Domiciliar”
É uma estratégia do serviço
“Melhor em Casa”, o programa
Que passa até passadiço
Para atender a família
Em um lugar fronteiriço
XXX
XXXI
XXXII
A “Estratégia Digital
Da Saúde p’rá o Brasil”
DIGISUS no e-Saúde
Para adulto e infantil
Beber desse patrimônio
Do “país céu cor de anil”
XXXIV
XXXV
XXXVI
As “Ações Afirmativas”
Ampliam a inclusão
De quem esteve distante
Em outra ocasião
Das “Políticas de Saúde”
Que nunca chegavam não!
XXXVII
XXXVIII
XL
5 Aspectos Teórico-Metodológicos
No quesito raça / etnia, 56,3% responderam que são brancos, 28,1% que são negros /
afrodescendentes e 15,6% que são outros, também não teve nenhum indígena respondente.
Nos comentários realizados pelo grupo, houve uma reclamação da ausência da classificação
“parda”, sendo possível constatar esta ausência também entre as pessoas que responderam a
alternativa "outra'' onde estão inclusos os/as considerados/as pardos/as. Existe aqui uma
curiosidade que merece ser melhor investigada que é em relação a essa maioria de pessoas
brancas no curso Saúde Coletiva da UFRN, mesmo com a política de cotas para negros e
pardos, considerando que esta é apenas uma amostra do universo de estudantes matriculados
neste curso, no semestre em tela. O que se sabe é que muitos dos estudantes que entram neste
curso já chegam com uma graduação, principalmente, em outros cursos da área da saúde
como enfermagem, odontologia, biomedicina, entre outros.
Horário Atividade
Pergunta final para o grupo: o que te chamou mais a atenção nesta dinâmica?
15:50h (1 a 2 intervenções).
Tão simples e de uma grandeza sem tamanho e tem a ver também com a
questão da região, porque o SUS se propõe como universal para todo o
Brasil, mas cada região vai se apropriar dele de uma forma diferente.
(Participante C).
As estrofes 18ª a 40ª do cordel, que tratam dos programas e outras conquistas
contidas no SUS tiveram a participação dos envolvidos / implicados na discussão do grupo
focal, de alguma forma, com leituras e declamações que realizaram dos versos. Observou-se
também o reconhecimento na utilização de expressões (como cuscuz, passadiço) locais e/ou
regionais que remete, especialmente, à cultura do meio rural, contidas no cordel, que por
sinal, é uma das características desta literatura e da proposta da educação popular, contida na
pedagogia freireana, que utiliza palavras do contexto relacionado a própria realidade onde
estão as pessoas com e para as quais se constrói o conhecimento.
Percebe-se, ainda nesta discussão, a importância das pessoas em geral conhecerem o
SUS, pois a compreensão de como ele está estruturado e do que este sistema tem a oferecer
para a população é fundamental para poder defendê-lo das visões negativas e opiniões
pejorativas. Uma linguagem mais acessível às pessoas a partir de metodologias populares é
fundamental para este entendimento do sistema de saúde. A mídia brasileira, em geral,
também tem responsabilidade e pode apoiar neste sentido, para levar informações sérias, de
qualidade e verídicas para a população sobre o SUS. Outro ponto notado é que o cordel já
carrega em si a resistência de âmbito cultural, mas também em suas narrativas que
geralmente tratam da vida cotidiana de um povo. É uma literatura que as pessoas pouco
valorizam e nos meios escolares ou acadêmicos também quase não é vista ou estudada.
Na fala do/a participante “A” (transcrita abaixo) podemos observar que existe um
certo descrédito da sociedade em relação ao SUS. Na sua opinião, essa situação provém da
má gestão dos recursos públicos, dos desmandos dos governantes em relação aos cuidados
com a coisa pública que, além de não valorizar o sistema de saúde, ainda “desviam para
outras finalidades, os recursos disponíveis para investir nos serviços de atendimento à
população”. Isto vem se perpetuando ao longo dos anos e a desinformação potencializa esta
visão de que o SUS não presta.
Porém, podemos observar que, neste período pandêmico, existe uma certa
valorização do sistema, perceptível na assistência prestada pelo SUS, não somente no seu
momento mais cruel, que foi o período inicial, da urgência e emergência, da superlotação de
leitos, das internações em UTIs, mas principalmente neste período de imunização, mesmo
enfrentando a supervalorização do negacionismo em relação a ciência por parte de uma
necropolítica apoiada pelo atual governo central brasileiro. Nesse contexto, as ferramentas
de EPS têm um papel fundamental para informar a população, apoiar a capacitação dos e das
profissionais de saúde para a desconstrução desse entendimento e ajudar a fortalecer o SUS:
Com esse entendimento, o cordel “Os 30 anos do SUS”, com sua forma simples,
conteúdo sintetizado e compreensível, sobre como acontece a luta do movimento pela
Reforma Sanitária no Brasil, a construção e aprovação da lei de criação de um sistema
unificado de saúde, algumas políticas e programas existentes, os princípios e diretrizes e como
o SUS está estruturado em suas redes de atenção, entre outros assuntos, se propõe a aceitar o
desafio de “dar o seu recado” como provocador do debate do direito à saúde, possibilitando a
utilização mais ativa desta literatura pelos profissionais da área da saúde ou não, como uma
ferramenta metodológica para a EPS. Conteúdos apresentados na forma leve de um poema ou
folheto de cordel, será melhor absorvido e o aprendizado poderá acontecer com maior
facilidade, oferecendo subsídios para as pessoas simples contra-argumentar, afirmar e
defender com propriedade e de uma forma mais consciente e consistente, quando escutarem
que “o SUS não presta”, ou outros argumentos negativos em relação ao nosso sistema público
de saúde.
A partir da análise dos resultados extraídos com as metodologias aplicadas nesta
pesquisa, pode-se constatar que existe um certo preconceito em relação a utilização de
elementos do domínio da cultura popular nordestina nas ações ou em processos do ensino-
aprendizagem em saúde, principalmente em regiões fora do nordeste, onde não se conhece a
literatura do cordel. Talvez, por não conhecerem os elementos dessa cultura, às vezes, as
pessoas não querem ouvir ou acham que é simplesmente uma “besteira” e, por isso, não os
veem enquanto possibilidade metodológica.
Entende-se que, são muitos os anos de “desinformação” da população brasileira, uma
mídia sem interesse de informar sobre os direitos e as políticas públicas existentes no país,
deveria ajudar a divulgar e propagar mais os pontos positivos do SUS, em vez de mostrar
apenas os problemas, deixando no imaginário popular o sentido de que o sistema não presta.
É uma situação que se torna difícil reverter ou desconstruir essa imagem negativa do SUS.
Acredita-se que isto será possível a partir de um comando do governo federal, com mais
investimentos em informação e educação em saúde direcionada à população, com muitos
anos de propaganda positiva, divulgando o que o sistema tem a oferecer de concreto ao
cidadão e à cidadã brasileira, já seria possível abrir mais a mente das pessoas para um
melhor entendimento em relação ao seu direito à saúde pública. O cordel e as outras
metodologias populares poderiam entrar nesse contexto, de forma complementar à educação
popular em saúde, pois, com sua linguagem mais acessível poderia despertar o interesse da
população pelos serviços e para apoiar o fortalecimento do SUS, que é considerado um
patrimônio do povo brasileiro, assim como as artes e a cultura também são patrimônio de um
povo. Nesse sentido, o/a participante “C” afirma:
A luta poderia ser mais ativa […] as pessoas estão muito caladas, não
porque não conheçam, pois temos muitas possibilidades de conhecer o
sistema, conhecer como ele está fundamentado, como o SUS age, só que da
forma como a gente conhece é diferente! se é apresentado na forma de um
cordel, na forma de um poema, vai chegar melhor para as pessoas; eu
acredito que o aprendizado fique mais leve […] e dará argumento para as
pessoas simples, quando escutarem que o SUS não presta, a pessoa vai
afirmar e defender com conhecimento de fato, leve e não aquele
conhecimento pesado que você ler vários artigos para tentar entender o que
significa aquilo, porque já está mastigado ali para você, entendeu?
(Participante C).
8 Conclusões
BATISTA, Nancy Nay Leite de Araújo Loiola et al. Trabalhando a educação popular em
saúde com a dança. Revista Eletrônica Gestão e Saúde, Vol. 6 (Supl. 1). Março, 2015 p.817-
823. Disponível em: <http://ojs.bce.unb.br/index.php/rgs/article/view/22646>. Acesso em:
15/01/2022.
CARVALHO, José Jorge de. Encontro de saberes e descolonização: para uma refundação
étnica, racial e epistêmica das universidades brasileiras. Decolonialidade e pensamento
afrodiaspórico. Col. Cultura Negra e Identidades. Org. Joaze B. Costa, Nelson M. Torres e
Ramón Grosfoguel. Edit. Autêntica, 2018.
CASTRO, Manoel Cavalcante de Souza; COSTA, Íris do Céu Clara. A Literatura de Cordel
como instrumento didático-pedagógico na educação, motivação e promoção da saúde
bucal. Revista Ciência Plural, 2015; 1(1): 40-9.
DANTAS, Vera Lúcia de Azevedo et al. Ciranda da Vida: dialogismo e arte na gestão em
saúde. Saúde Soc. São Paulo, v21, supl. I, p. 46-58, 2012. Disponível em:
<https://www.scielo.br/j/sausoc/a/czZLxrcQBvv4btR8VT5nSGQ/?lang=pt>. Acesso em:
15/01/2022.
_______; PARO, César Augusto; CRUZ, Pedro José Santos Carneiro. Educação popular em
saúde, arte e múltiplas linguagens. Ed. Popular, Uberlândia, Edição Especial, p. 298-311,
jul. 2020. Disponível em: <https://seer.ufu.br/index.php/reveducpop/article/view/56011>.
Acesso em: 13/01/2022.
FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. 17ª ed. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1987. 23ª
Reimpressão, p.45. Disponibilizado na internet em pdf pela publicadora Le Livros em:
https://cpers.com.br/wp-content/uploads/2019/10/Pedagogia-do-Oprimido-Paulo-Freire.pdf.
Acesso em: 25/01/2022.
MARTINS, Álisan Karine Lima et al. Literatura de Cordel: tecnologia de educação para
saúde e enfermagem. Rev. Enferm. UERJ, Rio de Janeiro, 2011 abr/jun; 19(2):324-9.
MILLER, Daniel. Como conduzir uma etnografia durante o isolamento social. Youtube,
2020. 1 vídeo (20:13min.). Disponível em:
<https://www.youtube.com/watch?v=NSiTrYB-0so&t=3s&ab_channel=DanielMiller>.
Acesso em: 19/01/2022.
OLIVEIRA, Dafylla Kelly Silva et al. A arte de educar na área da saúde: experiências
com metodologias ativas. Rev. Humanidades & Inovação, Palmas, ano 2, n.1, jan./jul. 2015.
Disponível em: <https://revista.unitins.br/index.php/humanidadeseinovacao/article/view/60>.
Acesso: em 13/01/2022.
SALGADO, Francine Vitória dos Santos et al. A literatura de cordel e suas manifestações
na cultura erudita e na popular. Travessias Interativas. São Cristovão (SE), N.19 (Vol.9),
p.408-428, jul-dez/2019. Disponível em:
<https://seer.ufs.br/index.php/Travessias/article/view/12705/9540> Acesso em 04/07/2021.
Obrigado por aceitar o nosso convite para participar desta pesquisa com estudantes do
curso Saúde Coletiva, respondendo a este questionário com indagações que servem para
aquecer as ideias e percepções para o segundo momento, que será a discussão do tema no
grupo focal! Nesta oportunidade, esperamos ainda contar com a sua participação no Grupo
Focal a ser realizado no dia 13/12, às 14h, pelo google meet, com o link que será
disponibilizado por e-mail, com antecedência.
Agora, pedimos por gentileza, ler e assinar o TCLE (Termo de Consentimento Livre e
Esclarecido), conforme seu "Aceito" ou "Não Aceito" em participar desta pesquisa.
Anexo B - Termo de Consentimento Livre e Esclarecido - TCLE
1. Esclarecimentos
Após ter sido esclarecido sobre os objetivos, importância e o modo como os dados
serão coletados nessa pesquisa, além de conhecer os riscos, desconfortos e benefícios que ela
trará para mim e ter ficado ciente de todos os meus direitos, concordo em participar da
pesquisa Tecnologias do Saber Popular e o Direito à Saúde Pública: relato de experiência
junto ao Cordel “Os 30 anos do SUS”, e autorizo a divulgação das informações por mim
fornecidas em congressos e/ou publicações científicas desde que nenhum dado possa me
identificar.