Você está na página 1de 2

Instituto Federal do Espírito Santo – Campus Venda Nova do Imigrante

Professora: Nathália – Língua Portuguesa e Literatura III – Parnasianismo


Discente: ________________________________________________________

Francisca Júlia: poetisa esquecida pelo tempo


Daniela Jacinto - Jornal Cruzeiro do Sul
Contemporânea de Olavo Bilac, Francisca Júlia entrou, sem pedir licença, em um universo que na época era
de domínio masculino e mesmo assim conquistou respeito. Considerada o maior vulto feminino do
parnasianismo brasileiro, seus versos, parnasianos na forma mas com passagem pelo simbolismo, eram
considerados perfeitos e em nada ficaram a dever à chamada "tríade parnasiana" - Olavo Bilac, Raimundo
Correa e Alberto de Oliveira -, que foram admiradores e principais incentivadores da poetisa. É ainda
precursora da literatura infantil no Brasil. Diante de tantas conquistas, fica a pergunta: por que caiu no
esquecimento? (...)
Na Pinacoteca, uma escultura em granito Carrara, de quase três metros de altura e com um peso de três
toneladas, intitulada Musa impassível, obra de Victor Brecheret, é uma das poucas referências à artista, que
também ganhou nome de rua: uma importante via no alto do bairro de Santana, em São Paulo, onde
curiosamente outros autores simbolistas foram homenageados. Quem passa por ali pode observar pelos
cruzamentos: rua Francisca Júlia x rua Alphonsus de Guimaraens, e rua Francisca Júlia x rua Paulo Gonçalves.
Mas só. Dela não se falam nas escolas, não reeditam livros, não lembram em datas especiais.
A história da poetisa está sendo resgatada pelo escritor Roberto Fortes, de Iguape, que vem estudando a vida
e a obra de Francisca Júlia desde 1981. "Consegui juntar um bom material, incluindo documentos, livros,
jornais, fotos e depoimentos", conta o autor, que pretende lançar um livro sobre a vida e a obra da poetisa.
Roberto afirma que após finalizar o livro, ainda sem previsão de data, irá buscar patrocínio, particular ou
público.
O escritor lembra que Francisca Júlia causou alvoroço ao enviar sonetos na década de 1890 para a revista A
semana, do Rio de Janeiro, que era muito conceituada. "Os membros da redação (Raimundo Correia, Bilac e
outros), a princípio, não acreditaram que aqueles versos másculos, marmóreos, fossem de uma mulher", diz.
Ainda conforme Roberto, um deles - João Ribeiro - teria dito que deveria ser uma brincadeira do Raimundo
Correia. "Foi aí que surgiu o interesse por Francisca Júlia", afirma.
Quando descobriram que era mesmo uma mulher, passaram a apoiá-la. Vale lembrar que na época ela tinha
apenas 24 anos. Olavo Bilac, por exemplo, louvou-lhe o culto da forma, a língua remoçada, sua arte calma e
consoladora. A consagração da poetisa se refletiu nas inúmeras revistas que começaram a estampar-lhe o
retrato.
Seu primeiro livro, Mármores, lançado em 1895, foi prefaciado pelo próprio João Ribeiro, que era um famoso
e conceituado crítico literário, muito influente na época. "A partir daí, Francisca Júlia começou a virar um
mito, até sua morte, em 1920, quando passou a ser gradativamente esquecida", lamenta Roberto.
No site Blocos, o escritor comenta que "a despeito da importância incontestável de sua obra, Francisca Júlia
ainda não ocupa o lugar que lhe é devido no cenário da poesia brasileira, talvez por "esquecimento" dos
estudiosos da literatura brasileira e dos críticos literários em geral. Nos livros didáticos adotados nas escolas
secundárias e nas universidades, pouco ou nada se encontra sobre a poetisa e sua obra". Para ele, é uma falta
de respeito à sua memória e uma dívida a ser resgatada com a literatura de língua portuguesa.
(...)
De acordo com Roberto, o marido da poetisa era telegrafista da Central do Brasil e não muito afeito a poesias.
"Quando um figurão literário paulista, Manuel Carlos, visitou a casinha simples do casal, comentou com o
esposo sobre o talento da poetisa. O esposo respondeu: "Dizem que Chiquinha é uma grande poetisa. Eu não
sei, não sou poeta"".
Roberto afirma que a transferência da escultura Musa impassível, de Brecheret, que inicialmente foi instalada
no túmulo da poetisa, em 1923, para a Pinacoteca, ajudou a dar visibilidade à obra de Francisca Júlia e a tornar
seu nome novamente conhecido. "Quando visitei a Pinacoteca, próximo à escultura, existiam painéis contando
sobre a vida da poetisa. Então, o público fica sabendo que aquela escultura fora feita especialmente para o
túmulo dela. Tal transferência fez com que a poetisa ficasse em evidência", acredita.
Em 1909, ela se casou com o telegrafista da Estrada de Ferro Central do Brasil, Filadelfo Edmundo Munster,
que foi diagnosticado com tuberculose em 1916 e veio a falecer em 1920. Poucas horas após o seu falecimento,
Francisca Júlia foi encontrada morta no quarto do marido, depois de ter ingerido grande quantidade de
narcóticos. Antes, ela havia declarado a amigos que a vida não teria sentido sem a companhia do marido e
deixou claro que "jamais poria o véu de viúva". Ela tinha 49 anos. A morte ocorreu em São Paulo, no dia 1º
de novembro de 1920.
No enterro da poetisa, no Cemitério do Araçá, os futuros revolucionários da Semana de Arte Moderna que ali
compareceram - Oswald de Andrade, Menotti Del Picchia, Guilherme de Almeida, Martins Fontes, Paulo
Setúbal, Ciro Costa (que falou à beira-túmulo) e Di Cavalcanti, entre outros - decidem homenageá-la com um
mausoléu.
Solicitaram ao então governador do Estado de São Paulo, Washington Luís, que fosse feita uma homenagem
à artista. Foi então contatado um jovem escultor brasileiro que estudava em Paris, Victor Brecheret, que
realizou o trabalho de 1921 a 1923 em Paris. "O resultado foi uma escultura envolvida por sensualidade. Olhos
fechados que remetem a querer esquecer a dor da morte. Seios grandes e fartos para afirmar a importância da
mulher na sociedade. Dedos e braços longos e delicados simbolizando a força e a superioridade de uma mulher
que abriu segmento na literatura feminina. Nascia a Musa impassível", descreve Janara Lopes, no site
IdeaFixa.
A escultura foi instalada em seu túmulo em 1923 e por ali residiu até começarem ser percebidos os danos
causados pela urbanização da cidade, principalmente pela chuva ácida. Em 13 de dezembro de 2006, 83 anos
depois de sua instalação, a escultura foi retirada com a ajuda de 15 pessoas e um guindaste. "Saindo do mundo
dos mortos para o mundo dos vivos, a escultura chega finalmente à Pinacoteca, e no lugar da escultura original,
foi colocada uma réplica em bronze", ainda conforme Janara Lopes.
(...)
Foi padrinho de seu casamento o poeta e amigo Vicente de Carvalho. Nessa época já estava compenetrada em
pensamentos místicos. Isola-se e vive para o lar, recebendo visitas esporádicas de jornalistas que ainda
publicam poesias suas. Em 1912 sai seu último livro, Alma infantil, em parceria com o irmão Júlio César da
Silva, que alcança notável repercussão nas escolas do Estado, quando grande parte da edição é adquirida pelo
Secretário do Interior, na época, Altino Arantes.
Passa a explorar temas como a caridade, a fé, vida após a morte, reencarnação e ideologias orientais diversas
(budismo). Descobre, em 1916, a doença do marido (tuberculose) e mergulha numa depressão profunda. Diz
ter visões, que está para morrer, e tem alucinações provenientes da intoxicação do ácido úrico. Com o passar
dos anos a situação se agrava, suas poesias - as poucas que ainda escreve - retratam a vontade de uma mulher
que almeja a paz espiritual fora do plano terrestre. Diz, em entrevista, que sua "vida encurta-se hora a hora".
Mesmo assim volta a escrever para A cigarra e promete um livro de poesias chamado Versos áureos.
Em 1920, o marido, já desenganado pelos médicos, morre. Francisca Júlia se suicida.
(Fonte: Jornal O Cruzeiro, disponível em: https://www2.jornalcruzeiro.com.br/materia/597963/francisca-julia-poetisa-
esquecida-pelo-tempo )

Você também pode gostar