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RECENSÃO CRÍTICA DE UM ESTUDO EMPÍRICO

Instituto Universitário das Ciências Psicológicas, Sociais e da Vida

2º ano do Mestrado Integrado em Psicologia

Psicobiologia da Motivação e das Emoções (2º semestre)

10 de Março de 2015

Estudo das emoções nos animais

Recensão critíca do artigo: Berman, O., Parker, R., Paul, E., Mendl, M. (2008).

Sensitivity to reward loss as an indicator of animal emotion and welfare. Biology

letters, 4, pp. 330-333

Docente: Prof. Doutora Sofia Menéres

Discentes: turma 8, grupo 1

22877 – Filipa Albuquerque

22777 – Catarina Figueiredo Lopes

22757 – João David Martins


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Enquadramento teórico
As emoções têm sido objeto de investigação de diferentes áreas do conhecimento,
havendo uma multiplicidade de propostas para a sua definição. Procurámos ilustrar algu-
mas correntes teóricas que estudam as emoções (primárias e secundárias) nos animais,
reconhecendo o papel impulsionador dos trabalhos de Darwin. Independentemente da cor-
rente teórica, existirão sempre analogias entre o homem e os animais. Dada a impossibili-
dade de auto-relato, os métodos de estudo baseiam-se, sobretudo, em medições fisiológi-
cas e comportamentais (Kuczaj et. al, 2013). No entanto, a questão que se coloca é perceber
até que ponto têm valor evolutivo, se decorrem efetivamente da expressão de uma emoção
animal ou se são apenas uma consequência de um estímulo sensorial, não implicando um
estado emocional associado (Darwin, 1890). Isto remete-nos para dois grandes dilemas: os
animais podem estar a sentir emoções e não o demonstrar versus os animais podem de-
monstrar emoções e não estar a senti-las (Panksepp, 1998).

Introdução
Uma nova abordagem assenta nas alterações no processamento de informação e
decisões como reflexo de estados emocionais, como a sensibilidade à perda de recompen-
sa - reflexo de estados emocionais de valência negativa, nos humanos, podendo ser uma
medida útil em animais. O estudo recorre ao método SNC (successive negative contrast)
no qual a recompensa por uma tarefa (percorrer um percurso) é subitamente reduzida. Em
ratos verificou-se um aumento do tempo necessário para percorrer o percurso. É referida
evidência de que este estado, quando prolongado no tempo, indica um estado afectivo ne-
gativo. Para manipular o estado emocional nos ratos, estes foram alojados em jaulas con-
tendo objetos com efeitos comportamentais e psicológicos positivos demonstrados. Estes
objetos foram removidos das jaulas de metade da amostra, para causar estados emocionais
negativos. A previsão foi de que estes ratos experienciariam afeto negativo e demonstrari-
am maior sensibilidade à perda de recompensa na tarefa.
Método
Amostra
24 Indivíduos, 3 meses de idade, em ciclos de luz invertidos de 12 horas.
Material
Jaulas (33x50x21 cm); percurso de 2m em acrílico; pastilhas de comida de 45 mg
numa taça metálica, água e comida livremente disponíveis.
Procedimento
Os ratos foram alojados durante 12 semanas em jaulas enriquecidas. Doze animais
experienciaram remoção dos objetos da jaula (U), os restantes continuaram no ambiente
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enriquecido (E). Todos os ratos foram treinados a percorrer a pista de acrílico para receber
comida. Em ambos os grupos, E e U, metade dos ratos recebeu 12 pastilhas no fim do per-
curso; a outra metade recebeu uma. Ao 12º dia quando os primeiros correram significati-
vamente mais rápido, todos os ratos passaram a receber uma pastilha. Nos dias seguintes,
registaram-se os tempos dos 4 grupos: E12-1, E1-1, U12-1 e U1-1.

Resultados
Ao 12º dia o grupo U exibiu uma resposta significativamente mais prolongada à
perda de recompensa, comparativamente ao grupo E. Análise post-hoc das medições entre
o 14º e 16º dias mostraram que o grupo U12-1 foi significativamente mais lento que os
grupos E1-1 e U1-1. O grupo U12-1 foi significativamente mais lento que E12-1 no 16º
dia. Finalmente, o grupo U1-1 diferiu do grupo E1-1 apenas no 14º dia.

Discussão
Os resultados suportam a previsão de que os ratos do grupo U mostrariam maior
sensibilidade e resposta mais prolongada à perda da recompensa, à semelhança da resposta
mais forte à perda nos humanos em estados emocionais negativos. Nos humanos e ani-
mais, a resposta imediata não é tão elevada como o esperado. No estudo atual, a demora
na tarefa pode ser explicada por processos cognitivos não emocionais, como a procura
pela recompensa perdida. Em suma, os resultados sugerem a sensibilidade à redução de
recompensa como um bom indicador de estados emocionais em animais. Sugere-se uma
exploração do fenómeno de expetativa da recompensa, assim como estudos em seres hu-
manos que sublinham o que há de comum entre espécies.
Análise crítica
A relevância do estudo prende-se principalmente com uma melhor aferição do
bem-estar psicológico dos animais – importante, e.g., nas avaliações éticas de estudos com
testes em animais ou quando estes são mantidos em cativeiro. O delineamento é semelhan-
te a outros estudos com ratos em condições de habitação imprevisíveis, introduzindo a
medição da sensibilidade à perda de recompensa. Os resultados convergem tanto com os
estudos referenciados, como com outros que abordaram diferentes animais (Mendl et al.,
2010) ou induziram estados emocionais com metodologias diferentes (Papciaka et al.,
2013; Rygula et al., 2010). Estudos com animais enfrentam a dificuldade na aferição de
estados emocionais, mensuráveis em humanos com auto-relato. O estudo em causa mani-
pula “estados afetivos negativos” com um método verificado em muitos outros trabalhos,
mas que requer ainda inferências cuidadas – os processos cognitivos que podemos medir
em humanos são apenas assumidos nos animais, dificultando a transposição.
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Referências

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comparative perspective on dolphin emotions and emotional expressions). In S. Watanabe
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Mendl, M., Brooks, J., Basse, C., Burman, O., Paul, E., Blackwell, E. and Casey, R. (2010). Dogs
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Panksepp, J. (1998). Affective neuroscience: The foundations of human and animal emotions. New
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Papciaka, J., Popika, P., Fuchsc, E. and Rygula, R. (2013). Chronic psychosocial stress makes rats
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Rygula, R; Pluta, H; P, Popik (2012). "Laughing rats are optimistic". PLoS ONE 7 (12):
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Waal, F. B. (2011). What is an animal emotion? Annals Of The New York Academy Of Sciences,
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