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Temos cada vez mais tipos de ordem e cada vez menos ordem. (…) Depois de todos os
esforços do passado, entrámos num período de retrocesso. Vê bem como as coisas se
passam hoje: quando um homem importante lança uma nova ideia no mundo, ela é
imediatamente apanhada por um mecanismo de divisão, constituído por simpatia e repulsa.
Primeiro vêm os admiradores e arrancam grandes bocados, os que lhes convêm, a essa
ideia, e despedaçam o mestre como as raposas a presa; a seguir, os adversários destroem as
partes fracas, e em pouco tempo o que resta de um grande feito mais não é do que uma
reserva de aforismos de que amigos e inimigos se servem a seu bel-prazer. O resultado é
uma ambiguidade generalizada. Não há Sim a que se não junte um Não. Podes fazer o que
quiseres, que encontras sempre vinte das mais belas ideias a favor e, se quiseres, vinte que
são contra. Quase somos levados a acreditar que é como no amor e no ódio, ou na fome, em
que os gostos têm de ser diferentes, para que cada um fique com o seu bocado.
ROBERT MUSIL
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O Centro do Universo
Se todo o indivíduo pudesse escolher entre o seu próprio aniquilamento e o do resto do
mundo, não preciso dizer para que lado, na maioria dos casos, penderia a balança.
Conforme essa escolha, cada um faz de si o centro do universo, refere tudo a si mesmo e
considera primeiramente tudo o que acontece – por exemplo, as maiores mudanças no
destino dos povos – do ponto de vista do seu interesse. Ainda que este seja muito pequeno e
remoto, é nele que pensa acima de tudo. Não existe contraste maior do que aquele entre a
alta e exclusiva divisão, que cada um faz dentro do seu próprio eu, e a indiferença com a
qual, em geral, todos os outros consideram aquele eu, bem como o primeiro faz com o
deles.
Chega a ter o seu lado cómico ver os inúmeros indivíduos que, pelo menos no aspecto
prático, consideram-se exclusivamente reais e aos outros, de certo modo, como meros
fantasmas.
[…] O único universo que todos realmente conhecem e do qual têm consciência é aquele
que carregam consigo como sua representação e que, portanto, constitui o seu centro. É
justamente por isso que cada um é em si mesmo tudo em tudo.
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ARTHUR SCHOPENHAUER
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Seguro Emocional
Com frequência, comento com os meus alunos da licenciatura em psicanálise e psicologia
multifocal que uma das tarefas mais nobres e relevantes do Eu é mapear, esquadrinhar os
nossos fantasmas e reeditar as nossas janelas traumáticas. De outro modo, podemos fazer
parte do rol dos que falam sobre maturidade mas são verdadeiras crianças no território da
emoção, pois não sabem ser minimamente criticados, contrariados e, além disso, têm a
necessidade neurótica de poder e de que o mundo gravite na sua órbita.
Certa vez, perguntei a executivos das cinquenta empresas psicologicamente mais saudáveis
do país: «Quem tem algum tipo de seguro?» Todos responderam que tinham. Em seguida,
indaguei: «Quem tem um seguro emocional?» Ninguém arriscou levantar a mão. Foram
sinceros. Como podemos falar de empresas saudáveis sem mencionar os mecanismos
básicos para proteger a emoção? Só fazemos um seguro daquilo que nos é caro. Mas,
infelizmente, a mais importante propriedade tem tido um valor irrelevante.
Em geral, estes profissionais são ótimos para a empresa, mas carrascos de si mesmos.
Acertam no trivial, mas erram muito no essencial. E eu? E o leitor? Ainda que possamos
dizer que a mente humana é a mais complexa de todas as «empresas»,
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AUGUSTO CURY
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MATIAS AIRES
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OSWALD SPENGLER
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SÉNECA
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EÇA DE QUEIRÓS
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STIG DAGERMAN
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Amizade Correcta
O sábio, ainda que se baste a si mesmo, deseja ter um amigo, quanto mais não fosse para
exercer a amizade, para não deixar definhar tão grande virtude. Ele não busca, como dizia
Epicuro, «alguém que lhe vele à cabeceira em caso de doença, que o socorra quando esteja
em grilhões ou na indigência». Busca alguém a cuja cabeceira de doente possa velar;
alguém que, quando implicado numa contenda, ele possa salvar dos cárceres inimigos.
Pensar em si próprio, e empenhar-se numa amizade com esse pensamento preconcebido, é
cometer um erro de cálculo. A empresa terminará como começou. Fulano arranjou um
amigo para dispor, um dia, de um libertador que o preserve dos grilhões. Ao primeiro tinido
de cadeias, lá se vai o amigo.
Tais são as amizades que o mundo chama de «ligações temporárias». O homem a quem se
escolhe para prestar serviços deixará de agradar no dia em que não sirva para mais nada.
Daí a constelação de amigos ao redor das grandes fortunas. Vinda a ruína, faz-se, à volta, a
solidão: os amigos esquivam-se dos lugares onde são postos à prova. Daí, todos esses
escândalos: amigos abandonados, amigos traídos, sempre por medo! É inevitável que o fim
concorde com o começo: o interesse fez de sicrano teu amigo;
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SÉNECA
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FRANÇOIS DE LA ROCHEFOUCAULD
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SÉNECA
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TEIXEIRA DE PASCOAES
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Memória Personalizada
Não acontece apenas que certas pessoas têm memória e outras não (…), mas, mesmo com
memórias iguais, duas pessoas não se lembram das mesmas coisas. Uma terá prestado
pouca atenção a um facto do qual a outra guardará um grande remorso, e em contrapartida
terá apanhado no ar como sinal simpático e característico uma palavra que a outra terá
deixado escapar quase sem pensar. O interesse de não nos termos enganado quando
emitimos um prognóstico falso abrevia a duração da lembrança desse prognóstico e
permite-nos afirmar em breve que não o emitimos. Enfim, um interesse mais profundo,
mais desinteressado, diversifica as memórias das pessoas, de tal modo que o poeta que
esqueceu quase tudo dos factos que outros lhe recordam retém deles uma impressão fugidia.
De tudo isso, resulta que, passados vinte anos de ausência, encontramos, em lugar de
esperados rancores, perdões involuntários, inconscientes, e, em contrapartida, tantos ódios
cuja razão não conseguimos explicar (porque esquecemos também a má impressão que
causámos). Até da história das pessoas que conhecemos melhor esquecemos as datas.
MARCEL PROUST
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AGOSTINHO DA SILVA
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A Vantagem do Esquecimento
O esquecimento não é só uma vis inertioe, como crêem os espíritos superfinos; antes é um
poder activo, uma faculdade moderadora, à qual devemos o facto de que tudo quanto nos
acontece na vida, tudo quanto absorvemos, se apresenta à nossa consciência durante o
estado da «digestão» (que poderia chamar-se absorção física), do mesmo modo que o
multíplice processo da assimiliação corporal tão pouco fatiga a consciencia. Fechar de
quando em quando as portas e janelas da consciência, permanecer insensível às ruidosas
lutas do mundo subterrâneo dos nossos orgãos; fazer silêncio e tábua rasa da nossa
consciência, a fim de que aí haja lugar para as funções mais nobres para governar, para
rever, para pressentir (porque o nosso organismo é uma verdadeira oligarquia): eis aqui,
repito, o ofício desta faculdade activa, desta vigilante guarda encarregada de manter a
ordem física, a tranquilidade, a etiqueta. Donde se coligue que nenhuma felicidade,
nenhuma serenidade, nenhuma esperança, nenhum gozo presente poderiam existir sem a
faculdade do esquecimento.
FRIEDRICH NIETZSCHE
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Saber Zangar-se
O que me parece é que as pessoas, em geral, como que deixaram de saber zangar-se.
Deixaram de saber zangar-se com aquilo que consideram errado – e, pior ainda, deixaram
de saber dizê-lo na cara umas das outras. A não ser, naturalmente, que haja uma agenda.
Ainda nos zangamos muito, é verdade. Mas zangamo-nos mal. Com a maior das facilidades
nos zangamos contra inimigos abstractos, como «o Governo», «o capitalismo selvagem» ou
mesmo apenas «a crise». Com a maior das facilidades nos zangamos com aqueles que
entendemos como nossos subordinados, no trabalho e na vida em geral (afinal, os nossos
«superiores» acabam de pôr-nos a pata em cima. alguém vai ter de pagar a conta). Com
aqueles que estão, de alguma forma, em ascendente sobre nós, já não nos zangamos:
amuamos, que é a forma mais cobarde de nos zangarmos. Aos nossos iguais simplesmente
não dizemos nada: engolimos e tornamos a engolir, convencendo-nos de que do outro lado
está, afinal, um pobre diabo, tão pobre que nem sequer merece uma zanga – e, quando
enfim nos zangamos, é para dar-lhe um tiro na cabeça, como todos os dias nos mostram os
jornais.
A impressão com que eu fico é que tudo isto vem dessa mania das social skills e do team
building e dos demais chavões moderninhos que os gurus dos livros de Economia nos
enfiaram pela garganta abaixo,
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JOEL NETO
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Depois de Chorar
Não é a tristeza que nos faz chorar, mas o amor que enfrenta os vazios. As angústias e
desesperos são expressões de falta.
As lágrimas que de nós brotam e caem longe do olhar dos outros são as que mais força
trazem em si, as que fazem concreto e objetivo o sentir mais íntimo.
Por vezes, o coração cai nas armadilhas das tristezas antigas… outras, sentimos os espinhos
das novas adversidades cravarem-se-nos na carne. Há sempre tristezas, há sempre
sofrimento, haverá sempre dor enquanto houver amor.
As lágrimas não choradas não deixam de ser amargas, mas essas, ao contrário das que
nascem, corroem o interior de quem com elas não chega a regar a terra que lhe segura os
pés.
A vida faz-se também com as nossas lágrimas e vence-se, muitas vezes, de olhos carregados
de mar. O esforço que nos é exigido chega quase a ser impossível sem lágrimas. Chorar não
é sinal de derrota, antes sim de um amor que busca a paz merecida.
O sentido da vida cabe dentro de uma gota de água salgada… a verdadeira paixão é a dor
máxima do amor mais profundo. Aquele que faz germinar em nós o melhor…
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O Preço da Independência
Por outro foste preterido num banquete, num elogio, na audição de um conselho. Caso se
trate de provas de consideração, que o teu coração se alegre por esse outro com tais provas
ter sido distinguido. Se coisas más são, não te lamentes por não teres sido convidado para o
banquete, não teres merecido o elogio, não terem recorrido ao teu conselho. Que não te
esqueças nunca do seguinte: se nada fazes para obteres o que não depende de nós (ao
contrário dos outros que assim procedem) de maneira nenhuma podes aspirar às mesmas
vantagens.
Na verdade, como se pode reconhecer os mesmos direitos àquele que se atreve às coisas do
mundo e àquele que as menospreza? Àquele que integra um séquito e àquele que o não
integra? Àquele que elogia e louva e àquele que não louva nem elogia? Insaciável e injusto
tu serás, se, não sendo pródigo no preço pelo qual tais coisas se vendem, essas mesmas
coisas, que regalias são, pretendas receber graciosamente.
Sabes tu por quanto se vendem as alfaces? Supõe que por um óbolo, a mais pequena das
moedas gregas. Qualquer um, então, é pródigo com o seu óbolo e sem mais adquire as
alfaces.
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EPITETO
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Felicidade e Prazer
Devemos estudar os meios de alcançar a felicidade, pois, quando a temos, possuímos tudo
e, quando não a temos, fazemos tudo por alcançá-la. Respeita, portanto, e aplica os
princípios que continuadamente te inculquei, convencendo-te de que eles são os elementos
necessários para bem viver. Pensa primeiro que o deus é um ser imortal e feliz, como o
indica a noção comum de divindade, e não lhe atribuas jamais carácter algum oposto à sua
imortalidade e à sua beatitude. Habitua-te, em segundo lugar, a pensar que a morte nada é,
pois o bem e o mal só existem na sensação. De onde se segue que um conhecimento exacto
do facto de a morte nada ser nos permite fruir esta vida mortal, poupando-nos o acréscimo
de uma ideia de duração eterna e a pena da imortalidade. Porque não teme a vida quem
compreende que não há nada de temível no facto de se não viver mais. É, portanto, tolo
quem declara ter medo da morte, não porque seja temível quando chega, mas porque é
temível esperar por ela.
É tolice afligirmo-nos com a espera da morte, visto ser ela uma coisa que não faz mal, uma
vez chegada. Por conseguinte, o mais pavoroso de todos os males,