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MANDATA COLETIVA

4 Apresentação

Índice
7 Sofri racismo.
O que devo fazer?

7 1. Apoio à vítima

8 2. O passo inicial para a denúncia


é o registro do Boletim de Ocorrência

8 3. Ação Civil Paralela

9 Instituições em Fortaleza/CE,
que podem auxiliar vítimas de racismo

O crime de racismo
11
Índice

Diferenças entre Crime de


Racismo e Crime de Injúria 15
O que geralmente
ocorre 16
Texto de Finalização
19
Glossário
22
MINI GUIA PARA VÍTIMAS DE RACISMO 3
Apresentação
A Mandata Coletiva Nossa Cara é a pri-
meira experiência compartilhada do Estado
do Ceará. A vereança, composta pelas co-ve-
readoras Adriana Gerônimo, Lila M. Salu e
Louise Santana, foi eleita para a 19ª legisla-
tura (2021 a 2024), no Município de Fortaleza.
São três mulheres pretas, periféricas, traba-
lhadoras e experientes na construção da luta
por justiça social.
Mandata Coletiva é uma forma comparti-
lhada, inovadora, democrática e socialista,
que busca partilhar as atribuições referen-
tes ao assento na Câmara Municipal de For-
taleza (CMFor). O objetivo da nossa constru-
ção coletiva é promover a ampla participação
popular, onde o povo, através dos movimen-
tos sociais da esquerda democrática, possa
cooperar com as proposições feitas pela Man-
data Nossa Cara, assegurando que a partici-
pação na tribuna e as demais ações reflitam
as necessidades da população.
Nossa atuação se baseia em três eixos:
Direito à Cidade, Educação e Cultura. Com-
preendemos que, a partir destes pontos, con-

4 MINI GUIA PARA VÍTIMAS DE RACISMO


seguimos atuar em diversas frentes de luta
e defesa de direitos fundamentais. Conside-
ramos que as mudanças sociais, para serem
efetivas, precisam ser pensadas a partir de
debates e ações protagonizadas pelos sujei-
tos historicamente oprimidos. Por isso, a nos-
sa atuação é formulada a partir das questões
étnico-raciais, de mulheres e LGBTQIA+.
Queremos uma Fortaleza onde pessoas
com a Nossa Cara tenham acesso à educa-
ção, moradia, lazer, justiça, arte, alimentação
de qualidade e tudo o que é preciso para uma
vida plena.

Grande Abraço das co-vereadoras


Adriana Gerônimo, Lila M. Salu e Louise Santana!

MINI GUIA PARA VÍTIMAS DE RACISMO 5


Sofri racismo.
O que devo fazer?

1. Apoio à vítima
Por todas as falhas ocasionadas pela mini-
mização do racismo dentro sistema de justiça
brasileiro, recomenda-se a busca por orien-
tação e, se possível, o acompanhamento
qualificado nesse caminho.
Considerando o Racismo Institucional nas
delegacias, é importante buscar o apoio de
Escritórios de Direitos Humanos e/ou Ad-
vogades Populares para receber orientações
sobre como proceder. Se possível, vá à dele-
gacia acompanhada/o/e.
A revitimização é outra característica co-
mum nos casos de racismo e se dá de diver-
sas formas. A repetição exaustiva do racis-
mo sofrido e a necessidade de convencer
quem recebe a denúncia da gravidade da si-
tuação são dores conhecidas pela população
preta. Muitas pessoas acabam silenciando
diante de tamanha violência e constrangi-
mento. O acompanhamento será uma for-
ma de apoio contra esse silenciamento.

MINI GUIA PARA VÍTIMAS DE RACISMO 7


2. O passo inicial para a denúncia é
o registro do Boletim de Ocorrência
O registro do Boletim de Ocorrência é
uma ação fundamental. É a partir dele que a
investigação é iniciada e o processo penal
é criado.
É importante avaliar se a ação está mais
próxima do que se considera crime de ra-
cismo (direcionado à coletividade) ou de injú-
ria racial (quando direcionado à uma pessoa
individualmente), para evitar arquivamentos.
O registro da ocorrência deve ser realizado
considerando este direcionamento.
Em casos de Injúria Racial, tipo penal que
depende do desejo da vítima de que ocorra o
processamento, a denúncia poderá ser envia-
da diretamente ao Ministério Público.

3. Ação Civil Paralela


Pela Defensoria Pública, as vítimas podem
buscar entrar com uma Ação de Responsabi-
lização Civil para garantir indenização em
dinheiro, pois a esfera penal apresenta difi-
culdades para garantir a responsabilização do
Agente Agressor em casos de racismo.

8 MINI GUIA PARA VÍTIMAS DE RACISMO


Instituições em Fortaleza/CE,
que podem auxiliar vítimas
de racismo

· Escritório Frei Tito de


Direitos Humanos,
da Assembléia Legislativa
do Estado do
Ceará (ALCE)
Av. Desembargador Moreira
, 2807 - Bairro: Dionísio Tor-
res - CEP: 60.170-900 - (85
)999403630

· Escritório Dom Aloísio


de Direitos Hu-
manos, da Câmara Munic
ipal de Fortaleza
(CMFor)
Rua Thompson Bulcão, 830
- Luciano Cavalcante CEP
:
60810-460 Fortaleza-CE
| Fone: (85) 3444 8300

· Núcleo de Direitos Huma


nos e Cidadania
da Defensoria do Ceará
Avenida Senador Virgílio
(ND HC - DPE/CE)
Távora, 2184, bairro Dionísi
o
Torres

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· Núcleo Criminal do Ministério Público
do Ceará (CAOCRIM - MP/CE)
Avenida Antônio Sales 1740, bairro Dionísio Torres, CEP
60.135-101. E-mail caocrim@mpce.mp.br Tel.: 3452-
3716

· Núcleo de Atendimento às Vítimas de


Violência do MPCE - NUAVV.
Av. Cel. Philomeno Gomes, 222, bairro Luciano Ca-
valcante, Fortaleza, Ceará (prédio das Promotorias
de Justiça Criminais). Telefone fixo: (85) 3218-7630 e
celular institucional: (85) 98563-4067.
E-mail: nuavv@mpce.mp.br

· CEDECA - Ceará (em caso de vítimas


Crianças e Adolescentes).
Rua Deputado João Lopes, 83, Centro, Fortaleza - CE
60.060-130. Tel.: 3252.4202 Whatsapp: 85 9768-0032
e-mail cedeca@cedecaceara.org.br

10 MINI GUIA PARA VÍTIMAS DE RACISMO


O crime de racismo
Atualmente, existem três principais tipifica-
ções de racismo:

A) A Lei Caó (Lei 7.716/1989) regulamenta o


Crime do Racismo previsto na Constituição
(Art. 5, XLII ) como crime inafiançável e im-
prescritível, trazendo duas categorias:

1. Discriminações segregatórias: são aquelas


baseadas em regimes de separação de am-
bientes públicos e estabelecimentos comer-
ciais, determinando o acesso das pessoas
com base na raça e cor da pele. Nos países
onde havia leis que permitiam essa divisão
segregatória, as pessoas negras eram impedi-
das de entrar em espaços ocupados por pes-
soas brancas.

Essa categoria não dá conta da


realidade brasileira
Definir racismo como segregação é um grande
problema quando falamos de discriminação racial
no Brasil. Aqui, essas práticas geralmente não são
verbalizadas, ocorre uma discriminação indireta.
MINI GUIA PARA VÍTIMAS DE RACISMO 11
As pessoas não são impedidas oficialmente de
entrar, mas não são bem-vindas e isso fica explícito
pelo tratamento, muitas vezes vexatório.
São exemplos dessas situações: questionar se a
pessoa tem dinheiro para consumir no espaço, acusar
de roubo sem nenhum indício anterior ou seguranças
do ambiente ficarem seguindo pessoas apenas pela
cor de sua pele.

2. Formulação genérica ao racismo (Art.


20): após reivindicações do movimento ne-
gro sobre as categorias segregatórias, foi adi-
cionado à Lei um artigo prevendo a prática
ou incentivo à discriminação. Isto pode re-
presentar uma definição mais ampla, abran-
gendo casos que não apresentem somente a
perspectiva de separação e divisão raciais.

B) No Código Penal existe ainda a tercei-


ra categoria, chamada Instituto da Injúria

12 MINI GUIA PARA VÍTIMAS DE RACISMO


Racial (§ 3º do artigo 140 do Código Pe-
nal), que trata de uma qualificadora ao cri-
me já existente de Injúria. Ou seja, se a injú-
ria - ofensa à dignidade - for cometida por
questões relacionadas à cor, raça, etnia ou
religião, essa não será considerada apenas
uma Injúria, será considerada uma Injúria Ra-
cial. A qualificadora acrescenta o elemento de
preconceito/discriminação por raça e etnia à
categoria prevista do crime, assim surge uma
nova categoria de crime.

Isso significa que a Injúria Racial é tam-


bém uma manifestação do Racismo, ou
seja, cometer Injúria Racial também consiste
na prática do racismo. Infelizmente, a lei trata
este crime como se fosse menos grave e não
configurasse racismo de fato.

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14 MINI GUIA PARA VÍTIMAS DE RACISMO
Diferenças entre Crime de
Racismo e Crime de Injúria
As principais diferenças entre a Lei do Ra-
cismo e o tipo da Injúria Racial são de ini-
ciativa, pois a injúria precisa ser denuncia-
da pela vítima. Além disso, este crime pode
prescrever em oito anos, impedindo a vítima
de buscar responsabilização do agressor na
Justiça após este tempo. O crime de racismo
é imprescritível.
Apesar das Leis de criminalização das prá-
ticas de racismo, ainda temos um Sistema de
Justiça que minimiza os efeitos dos atos
que configuram este crime. A legislação tra-
ta de forma confusa os conceitos de racismo,
discriminação e preconceito, não existem de-
finições mais nítidas, que previnam interpre-
tações equivocadas.
Assim, a definição do que é racismo é
feita a partir da análise de quem julga o
caso. Ao serem julgados por juízes pouco
dispostos a interpretar esses conceitos a
partir de uma análise comprometida com
a realidade social, os crimes não recebem as
punições cabíveis. Desta forma, o acesso à
justiça é negado, o que fortalece o racismo
estrutural e institucional.
MINI GUIA PARA VÍTIMAS DE RACISMO 15
O que geralmente ocorre

Fato 1
A maioria dos processos sobre racismo e
das condenações são de insultos raciais. Ape-
sar de serem racismo e se enquadrarem na
Lei Caó, costumam ser julgados como Injúria
Racial.

Fato 2
Há um número considerável de conde-
nações por injúria racial. Infelizmente, mui-
tos casos que tentam condenação pela Lei
Caó, como racismo, terminam em prescri-
ção e decadência porque a Justiça avaliou
como Injúria Racial.

Fato 3
Não há padrão de argumentação para
orientar juízes e unificar a definição do que é
ou não é considerado racismo. Outro fator é
a desqualificação do insulto racial, a partir

16 MINI GUIA PARA VÍTIMAS DE RACISMO


de uma lógica penal de análise da agressão
como fato isolado e descontextualizado da
realidade de funcionamento estrutural do ra-
cismo.

Fato 4
As condenações nos casos de racismo são
comumente substituídas por penas restri-
tivas de direitos. As pessoas condenadas não
são privadas de liberdade, a penalização se dá
em forma de prestação de serviços para a
comunidade, o que contribui para uma per-
cepção popular de impunidade.

As limitações técnicas do Direito, aliadas


às limitações interpretativas do judiciá-
rio, reduzem consideravelmente as chances
de criminalização do racismo. É necessário
estudar as dinâmicas de funcionamento do
racismo,
de para realizar a identificação e a res-
ponsabilização, criando um panorama real das
práticas racistas e evidenciando a necessida-
de de criação de políticas públicas.

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18 MINI GUIA PARA VÍTIMAS DE RACISMO
E
sta cartilha foi construída com o objetivo
de oferecer apoio e direcionamento prá-
tico para vítimas de racismo.
Eu, Fernanda Estanislau, sou mulher negra,
advogada, professora e construo a Mandata
Nossa Cara. Contribuí para a construção deste
mini guia a partir da minha pesquisa, enten-
dendo a importância de colocar esse conheci-
mento à serviço da nossa população.
Poder ocupar espaços de repasse e produ-
ção de conhecimento escancara as injustiças
e desigualdades da nossa realidade social. Es-
tudar e construir conhecimentos a partir de
uma perspectiva antirracista nos mostra tam-
bém como essas desigualdades foram plane-
jadas em momentos históricos anteriores.
Entender que as desigualdades impostas
à nossa população negra é resultado de uma
política de subalternização e de manutenção
da lógica escravista e colonial, nos revela tam-
bém os motivos dos dispositivos legais não
serem espaços de amparo para as pessoas
negras vítimas de violência racial. O funciona-
mento das nossas instituições ainda ocorre a
partir da manutenção da lógica racista, atra-
vés do seu funcionamento estrutural.

MINI GUIA PARA VÍTIMAS DE RACISMO 19


As orientações deste mini guia têm o obje-
tivo de nos fortalecer, mesmo que ainda den-
tro de uma estrutura que reproduz racismo
automaticamente. O conteúdo foi desenvolvi-
do a partir da minha experiência de pesquisa
no mestrado em Direito Constitucional, com
enfoque em Relações Raciais, pela Universi-
dade Federal do Ceará (UFC), do meu livro “Di-
reito Antirracista” (Emais, 2021) e acrescida da
minha experiência enquanto advogada negra
e membra da equipe da Mandata Nossa Cara.
Compreender pessoas pretas como sujei-
tos de direitos é o primeiro passo para deses-
tabilizar as estruturas do racismo. A constru-
ção das estratégias de desmonte do racismo
estrutural também é atravessada pelo empo-
deramento e consciência de nossos direitos,
para cobrança dos poderes públicos.

Fernanda Estanislau
Advogada, professora e
Assessora da Mandata Nossa Cara

20 MINI GUIA PARA VÍTIMAS DE RACISMO


MINI GUIA PARA VÍTIMAS DE RACISMO 21
Glossário
Racismo Institucional
Fracasso das instituições e organizações
em prover um serviço profissional e adequa-
do às pessoas em virtude de sua cor, cultura,
origem racial ou étnica. Ele se manifesta em
normas, práticas e comportamentos discri-
minatórios adotados no cotidiano do traba-
lho, os quais são resultantes do preconceito
racial, uma atitude que combina estereótipos
racistas, falta de atenção e ignorância. Em
qualquer caso, o racismo institucional sempre
coloca pessoas de grupos raciais ou étnicos
discriminados em situação de desvantagem
no acesso a benefícios gerados pelo Estado e
por demais instituições e organizações. (CRI,
2006, p.22).
Revitimização
Acontece quando, para realizar a denúncia,
a vítima é exposta a situações que lhe fazem
reviver o sofrimento de forma continuada e
repetitiva, mesmo após o fim da violência ori-
ginalmente sofrida.

22 MINI GUIA PARA VÍTIMAS DE RACISMO


Discriminação Indireta
Imposição de normas e regras, que po-
dem não serem ditas explicitamente ou serem
consideradas inofensivas, mas que na realida-
de causam discriminação. Um exemplo disso é
impedir que uma pessoa acesse determinado
espaço por estar usando chinelos.
Sendo assim, também existe a discrimina-
ção direta, que consiste em normas ou ações
que estigmatizam e excluem pessoas com
base em alguma diferença, impedindo-a in-
clusive de acessar direitos.

Insulto Racial
Ofensas verbais com a utilização de xinga-
mentos racistas, como chamar uma pessoa
negra de “macaca”.

Racismo Estrutural
O processo de escravização foi baseado na
falsa ideia de inferioridade de pessoas negras,
que até hoje não foi superada. Os motivos da
perpetuação dos ideais racistas são diversos,
dentre eles está o processo de abolição da

MINI GUIA PARA VÍTIMAS DE RACISMO 23


escravidão que não considerou a criação de
políticas públicas que integrassem verdadei-
ramente negros e indígenas na sociedade.
A falta de políticas de assistência social
para promoção da equidade de direitos entre
pessoas racializadas e pessoas brancas oca-
sionou o racismo estrutural, fruto de um pro-
cesso histórico que baseado na manutenção
dos privilégios da branquitude nas esferas po-
lítica, econômica, cultural e social.

Penas Restritivas de Direitos

As penas restritivas de direitos, também


chamadas de penas alternativas, são uma
substituição à prisão. Pessoas condenadas
têm alguns direitos limitados, como forma
de cumprir a pena, substituindo o encarce-
ramento. Representam uma dos três tipos de
pena, sendo as outras duas as penas privati-
vas de liberdade e penas de multa.

24 MINI GUIA PARA VÍTIMAS DE RACISMO


Anotações
Vereança
Adriana Gerônimo
Lila M. Salu
Louise Santana

Texto
Fernanda Estanislau MANDATA COLETIVA

Nerice Carioca

Revisão
Nerice Carioca
Adriana Gerônimo
Louise Santana

Projeto Gráfico e Colagens

Expediente
Rodrigo Paulino

Assessoria
Alêssandra Félix
Duda Jaguar
Eri Lima
Guilherme Bezerra
Jaqueline Silva
Joel Gomes
Jon Oliveira
Julianne Melo
Letícia Abreu
Mabel Rocha de Castro
Manuela Teixeira
Micinete de Lima
Nerice Carioca
Rodrigo Paulino
Rogério da Costa

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