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UNIVERSIDADE VEIGA DE ALMEIDA

NATHALIA CRISTINA ARAÚJO DA SILVA

FUTEBOL, CULTURA E JORNALISMO: UM ESTUDO DE CASO DA


REVISTA ALEMÃ 11FREUNDE

RIO DE JANEIRO

2016
NATHALIA CRISTINA ARAÚJO DA SILVA

FUTEBOL, CULTURA E JORNALISMO: UM ESTUDO DE CASO DA


REVISTA ALEMÃ 11FREUNDE

Trabalho de conclusão de curso apresentado como


pré-requisito para conclusão do curso de
Comunicação Social, da Universidade Veiga de
Almeida, orientado pela professora Daniela Oliveira.

RIO DE JANEIRO

2016
NATHALIA CRISTINA ARAÚJO DA SILVA

FUTEBOL, CULTURA E JORNALISMO: UM ESTUDO DE CASO DA


REVISTA ALEMÃ 11FREUNDE

Trabalho de conclusão de curso apresentado como


pré-requisito para conclusão do curso de
Comunicação Social, da Universidade Veiga de
Almeida, orientado pela professora Daniela Oliveira.

Rio de Janeiro, ______ de novembro de 2016.

BANCA EXAMINADORA

_____________________________________________________
Profa. Ms. Daniela Oliveira (Universidade Veiga de Almeida)

_____________________________________________________
Prof. Dr. Guilherme Carvalhido (Universidade Veiga de Almeida)

_____________________________________________________
Prof. Ms. Luiz Gustavo de Lacerda (Universidade Veiga de Almeida)
AGRADECIMENTOS

A Deus, que sempre iluminou meu caminho e me cercou de pessoas boas, a começar pelas três
mais importantes da minha vida.
Ao meu pai, a minha mãe e ao meu irmão, que sempre me apoiaram, me incentiveram, me deram
amor e carinho. Sem eles, nada disso seria possível.
Ao meu avô e a minha avó, que são pilares fundamentais da minha vida.
A minha orientadora, Daniela Oliveira, por aceitar me acompanhar neste enorme desafio e por
sempre ser tão atenciosa.
Aos professores Guilherme Carvalhido e Luiz Gustavo Lacerda, não apenas por participarem da
banca avaliadora, mas também por terem contribuído com meu crescimento acadêmico.
A todos os professores de alemão do Instituto Cultural Germânico. Sem eles, eu nem mesmo teria
a capacidade de ler a capa da 11FREUNDE.
Aos jornalistas da revista 11FREUNDE, Andreas Bock e Uli Hesse, que foram extremamente
atenciosos com um aluna de jornalismo do outro lado do Atlântico.
Aos amigos Bruno da Silva, Bruno Vilela, Gabriel, João Rafael, Mattheus, Thaísa e Thiago, que,
de alguma maneira, seja revisando meu texto ou simplesmente me oferecendo palavras de
incentivo, contribuíram para a produção deste trabalho.
“Football is a simple game; 22 men chase a ball for
90 minutes and at the end, the Germans always win.”

(Gary Lineker)
RESUMO

Este estudo tem por objetivo compreender e analisar como a adoção de características do
jornalismo literário e a visão do futebol como cultura podem contribuir para a qualificação do
jornalismo esportivo, em especial, a prática no impresso, por meio de um estudo de caso da revista
alemã 11FREUNDE. A autora entende que o cenário atual do jornalismo esportivo, no Brasil e no
mundo, encontra-se em momento de estagnação, na dependência de releases de assessorias,
manchetes sensacionalistas e notícias que apresentam mais do mesmo para gerar conteúdo.
Contrária a esse movimento, a revista alemã 11FREUNDE utiliza o futebol como pano de fundo
para falar de cultura, sociedade, política, arte e, claro, sobre o jogo praticado dentro das quatro
linhas. Publicada pela primeira vez em 2000, a 11FREUNDE é, atualmente, a revista que mais
cresce na Alemanha, superando números de crescimento das duas maiores revistas esportivas do
país, kicker e Sport Bild. Além de reportagens que fogem do hard news futebolístico diário, a
publicação dá atenção especial ao futebol amador, que, aos poucos, vem se tornando novamente
popular entre os amantes de futebol europeus, como forma de escapar da comercialização e do
anonimato proporcionados pelo futebol profissional.
O presente estudo está dividido em três partes. Na primeira, será apontado como o futebol
se relaciona com cultura e como o esporte foi essencial na formação cultural e da identidade
nacional de brasileiros e alemães, tomando por exemplo as Copas do Mundo de 1954, 1950 e 1970.
Serão contextualizados também aspectos da cultura futebolística alemã, que permitirão uma melhor
compreensão do cenário atual no país. A segunda parte vai tratar do jornalismo esportivo, com um
pouco de história e contextualização do mercado de revistas na Alemanha. Também serão
contextualizadas as características do jornalismo de revista, do jornalismo cultural e do jornalismo
literário, base da análise do objeto de estudo. Por fim, a terceira e última parte apresenta a análise
de três reportagens da 11FREUNDE, como forma de apontar o híbrido de jornalismo esportivo,
cultural e literário feito pela revista. Para tal análise, além de apoio bibliográfico, foram feitas
entrevistas com jornalistas da publicação, pesquisa de opinião com leitores e uma análise do projeto
gráfico, que possui extrema importância na apresentação do impresso.
Esse material reforça a necessidade do resgate da grande reportagem, associada ao
jornalismo literário, à apuração minuciosa e à imersão total no assunto para possibilitar renovação
do jornalismo esportivo praticado atualmente.

PALAVRAS-CHAVES: Jornalismo esportivo, Futebol, Cultura, Jornalismo literário, Jornalismo


esportivo alemão, Revista 11FREUNDE.
ABSTRACT

This study aims to understand and to analyze how the use of New Journalism and the vision
of football as culture can contribute to the improvement of sports journalism, especially in print
media, taking the German magazine 11FREUNDE as example. The author understands that today’s
sports journalism is not moving forward, but relying on public relations offices, biased headlines
and news that report always the same to generate content. Against all of this, the 11FREUNDE-
magazine uses football as background to talk about culture, society, politics, arts and, of course,
the game itself. Published for the first time in 2000 the 11FREUNDE-magazine is the fastest
growing football magazine in Germany, leaving behind the two biggest sports magazines in the
country, kicker and Sport Bild. Besides the articles that do not hold onto the daily football hard
news, the magazine gives special treatment to amateur football, which has been becoming popular
once again among the football lovers in Europe, as an escape from the market and from the
anonymity professional football has become.
This study has three parts. The first one points how football can be related to culture and
how this sport was essential to build the cultural scenario and the national identity in Brazil and
Germany, taking as an example the 1954, 1950 and 1970 World Cups. Cultural aspects of the
German football will also be presented as a way to understand the actual scenario in the country.
The second part will bring aspects of journalism in magazines, of the arts journalism and of New
Journalism, main source to analyze the object of this study. Finally, the third and last part brings
the analysis of three articles from the 11FREUNDE-magazine, pointing the mix between sports
journalism, arts journalism and New Journalism. For this analysis, besides the bibliographic
support, interviews, public opinion research and analysis of the graphic project were made. This
one being very important for the presentation of the magazine.
This study reinforces the need to redeem the in-depth report alongside New Journalism, the
careful investigation and the entire immersion in the subject to enable the regeneration of today´s
sports journalism.

KEY WORDS: Sports journalism, New Journalism, Football, Culture, Sports journalism in
Germany, 11FREUNDE-magazine.
LISTA DE FIGURAS

Figura 1 – Páginas especiais nos moldes dos anos 1950/1960...................................................... 12

Figura 2 – Tabela com levantamento da utilização de imagens.................................................... 44


SUMÁRIO

INTRODUÇÃO........................................................................................................................... 10

1. FUTEBOL, CULTURA E IDENTIDADE NACIONAL....................................................... 15

1.1. Miscigenação, democracia e as Copas de 1950 e 1970................................................ 18

1.2. O futebol na cultura alemã e o Milagre de Berna........................................................ 21

2. JORNALISMO ESPORTIVO................................................................................................ 25

2.1. O jornalismo esportivo na Alemanha........................................................................... 29

2.2. O jornalismo esportivo em revista............................................................................... 31

2.3. Jornalismo literário...................................................................................................... 34

3. A REVISTA 11FREUNDE...................................................................................................... 36

3.1. De fanzine à revista...................................................................................................... 36

3.2. Estrutura atual.............................................................................................................. 38

3.3. O projeto gráfico.......................................................................................................... 43

3.4. Análise de reportagens................................................................................................. 46

Das Adu Experiment............................................................................................... 47

Von Liebe und Tod.................................................................................................. 50

Wir müssen alle Montag arbeiten……..........…………………………..………... 53

3.5. Pesquisa de opinião…………………………………………………………………. 55

CONCLUSÃO.............................................................................................................................. 57

BIBLIOGRAFIA......................................................................................................................... 60

ANEXOS....................................................................................................................................... 66
10

INTRODUÇÃO

"Ao longo da semana, não se passa um dia, no qual os acontecimentos futebolísticos não
sejam veiculados nos jornais: o último adversário, a próxima partida, as lesões, suspensões,
atmosfera, intrigas, expectativas". Com essa frase, Schümer (1995) destaca a importância do
futebol como gerador de conteúdo para a mídia. Para ele, o futebol, de maneira imperceptível, se
tornou "essência duradoura para a comunicação da sociedade". A mídia "difundiu o calendário de
futebol na vida pública como um parasita" (SCHÜMER, 1995).

Entretanto, o jornalismo esportivo voltado para o futebol vive um momento de estagnação.


Especialmente quando observamos as grandes mídias tradicionais, é difícil encontrar algo novo e
todos os veículos parecem apenas apresentar mais do mesmo. Cada dia mais manchetes
tendenciosas, trocadilhos, intrigas e merchandising e menos informação de qualidade - "é de
interesse das pessoas, se Mario Basler1, nesta temporada, marcou mais gols que Heiko Herrlich2?"
(SCHÜMER, 1995)

Em artigo para o Observatório da Imprensa (2015), a pesquisadora Elaine Manini relata


um caso concreto que demonstra a falta de criatividade na busca por pautas e abordagens. De
acordo com ela, nas 21 notícias publicadas pelo Globo Esporte e pelo SporTV após a eliminação
do Brasil na Copa América em 2015, são corriqueiros apenas assuntos como opiniões de jogadores
sobre a partida, as lamentações, as datas dos próximos jogos e também o desfalque de Neymar.

Dois motivos podem ser apontados para tal fenômeno de estagnação. O primeiro é o fato
de muitos veículos de informação se limitarem a repassar o que é divulgado pelas agências de
notícias (observado em meios de comunicação como ESPN ou Esporte Interativo, que lidam
diariamente com futebol internacional). O segundo motivo é a demanda. O leitor e simpatizante do
esporte deseja informações rápidas, como o placar final dos jogos, quem marcou os gols, a
classificação dos times após a rodada. O torcedor deseja saber sobre o mercado de transferências
e, para isso, aceita qualquer rumor que lhe é oferecido pelos tabloides ingleses e espanhóis e
replicados por inúmeros outros veículos espalhados pelo mundo. Schümer (1995) ironiza, dizendo

1
Ex-jogador e, atualmente, técnico de futebol no Eintracht Trier. Campeão da Eurocopa em 1996 pela seleção alemã.
2
Ex-jogador e, atualmente, técnico de futebol no time sub-17 do Bayern de Munique.
11

que existem pessoas que não querem nem mais saber da própria avó, mas desejam detalhes
aprofundados sobre a lesão sofrida por algum jogador. Então, como ser criativo diante dessa
demanda e de modelos e técnicas já formulados para o desenvolvimento do jornalismo esportivo?

De encontro a esse movimento dos grandes veículos, surge em 2000, na Alemanha, a revista
11FREUNDE (em português, "11 Amigos"). Autodenominada "Magazin für Fußballkultur"
("revista para cultura de futebol"), a publicação procura dar um olhar diferente ao esporte. O jogo
disputado nas quatro linhas está presente nas reportagens e nas entrevistas, mas com abordagens
diferenciadas que tentam utilizar o futebol como uma lente para aspectos culturais, políticos,
econômicos, artísticos, entre outros, que envolvem uma sociedade. Em matéria comemorativa para
o site alemão Zeit Online3, o jornalista Klaus Walter sintetizou a transformação que a revista trouxe
para o jornalismo:

Futebol agora é cultura. A escrita sobre futebol se modificou. Menos números, dados,
fatos, mais atmosfera, psicologia, perspectiva dos torcedores e mais contadores de
histórias. Em cerca de dez anos e com 100 edições, a 11FREUNDE contribuiu para a
transformação do jornalismo esportivo e para mudança da cultura do futebol. Entusiastas
diriam: tem sido uma desmilitarização (WALTER, 2010).

Diversas reportagens da revista demonstram a busca por uma abordagem diferente do


mundo futebolístico. Como, por exemplo, matérias sobre torcedores de clubes da Kreisliga4 ou
sobre política e futebol a exemplo do Irã. A criatividade também se destaca na apresentação das
reportagens. A edição 165, por exemplo, apresentou páginas especiais nos moldes dos anos
1950/1960 para retratar o domínio dos times da ex-Alemanha Oriental na 2. Bundesliga5. Uma das
inovações da revista foi produzir uma edição especial feita apenas por jogadores. As pautas, os
textos, as fotos e até mesmo as entrevistas e a diagramação final – tudo foi produzido por jogadores
do Campeonato Alemão. Por esses motivos, Uli Hesse (2016), jornalista da 11FREUNDE,
considera a revista a "maior publicação futebolística mensal da Alemanha".

3
Site do semanário alemão de circulação nacional Die Zeit.
4
7ª à 14ª divisões do sistema de futebol alemão.
5
Segunda divisão do futebol alemão.
12

Figura 1: Páginas especiais nos moldes dos anos 1950/1960 para retratar o domínio dos clubes da ex-Alemanha
Oriental na 2.Bundesliga (Fonte: 11FREUNDE, edição 165).

O sucesso do formato adotado pela 11FREUNDE foi refletido no aumento de investimentos


por anunciantes e também de seu alcance na população. De acordo com dados do
Informationsgemeinschaft zur Feststellung der Verbreitung von Werbeträgern (IVW)6, a
11FREUNDE possui tiragem de 98.665 exemplares e 39.528 assinantes. Além disso, de 2011 para
2015, as revistas Sport Bild e kicker (respectivamente, primeira e segunda revistas de esporte mais
lidas na Alemanha) tiveram um aumento de 9,2% e 7,3%, respectivamente, no dinheiro investido
por anunciantes. A renda de €3,32 milhões da 11FREUNDE, em 2012, fica bem abaixo quando
comparada aos €38,5 milhões da Sport Bild e os €16,4 milhões da kicker. Porém, se mostra superior
ao possuir um aumento percentual de 11,6.

Ainda de acordo com o IVW, no que se refere ao alcance por edição, de 2011 para 2015, a
11FREUNDE teve um aumento de 48,8%, passando a atingir 1,01 milhões de leitores. Por outro
lado, kicker e Sport Bild tiveram o mesmo período marcado por queda no número de pessoas
alcançadas, com perda de 20,3% e 23,3% de leitores respectivamente.

No Brasil, apesar de a revista não ser popular – principalmente por ser disponibilizada
apenas em alemão - já foi utilizada como referência ou teve matérias reproduzidas por veículos

6
Organização que certifica a circulação de jornais e revistas na Alemanha.
13

nacionais. O site do jornal O Globo divulgou a capa da edição 141 que representava o técnico Pep
Guardiola (na época, no Bayern de Munique) como um personagem da série Breaking Bad7,
enquanto o site Vírgula publicou uma lista criada pela 11FREUNDE com os marcadores mais
violentos da história do futebol8. Além disso, o site brasileiro da revista Billboard divulgou um
calendário de jogos produzido pela publicação alemã, no qual os clubes eram associados a bandas
de rock9.

A 11FREUNDE aborda temas e produz reportagens que se distanciam de matérias


produzidas por outras publicações esportivas por tratar o futebol como cultura. Além de uma
linguagem com técnicas narrativas para prender o leitor, que serão discutidas mais detalhadamente
no capítulo 3, a revista procura pautas que se destacam não apenas por tratar de grandes clubes,
mas também que tratam do futebol amador. Sempre utilizando o futebol como lente para abordar
cultura, política e sociedade

Para facilitar a compreensão do caso da revista 11FREUNDE, é possível fazer uma


comparação com a brasileira Placar. Rocco Júnior e Belmonte (2013) relatam que, ao longo de sua
existência, mudanças foram feitas na revista de forma que a audiência e os interesses comerciais
passaram a determinar os valores-notícia a serem considerados no estabelecimento de pautas.

Dessa forma, ainda de acordo com os dois autores, a Placar perdeu informação de qualidade
e cedeu espaço ao entretenimento, à fofoca e à notícia superficial. Paulo Vinícius Coelho (2011)
também destaca que a Placar deixou de ser uma publicação esportiva para se tornar uma revista de
comportamento. Já a 11FREUNDE resiste a ceder espaço ao espetáculo, ao show e ao
entretenimento. Se a Placar não toca "nas feridas, nas mazelas e no submundo do futebol"
(ROCCO JÚNIOR E BELMONTE, 2013), a 11FREUNDE busca fazer exatamente o contrário: a
ênfase está nos aspectos sociais e humanos (MAGALLÓN, 2009).

A análise da revista 11FREUNDE é importante, pois se trata de uma publicação que busca
sair do óbvio e trazer uma abordagem diferente do futebol. Dessa forma, ela pode servir para

7
Disponível em: http://blogs.oglobo.globo.com/planeta-que-rola/post/breaking-pep-guardiola-posa-para-revista-
alema-imitando-serie-de-tv-507180.html. Acesso em: 16/05/2016.
8
Disponível em: http://virgula.uol.com.br/esporte/revista-alema-publica-lista-dos-marcadores-mais-violentos-da-
historia-pepe-e-o-sexto/#img=1&galleryId=157392. Acesso em: 16/05/2016.
9
Disponível em: http://www.billboard.com.br/noticias/revista-cria-logos-de-times-alemaes-com-influencia-de-
bandas. Acesso em: 16/05/2016.
14

inspirar jornalistas a buscar histórias novas e interessantes sobre atletas e torcedores, ao invés de
apenas focar nos grandes astros do esporte. A ideia de tratar futebol como cultura é uma
possibilidade para abrir novos horizontes para o jornalismo esportivo. O presente estudo, portanto,
busca analisar como a revista, em suas reportagens, transforma o futebol em um objeto cultural e
o utiliza para enxergar diversos aspectos da sociedade alemã.

Para desenvolvimento, execução e conclusão deste trabalho, foram realizadas pesquisas


bibliográficas que forneceram base teórica para a construção do texto e contextualização de temas
como o jornalismo esportivo, cultura e formação da identidade nacional. Entre as leituras, estão
renomados autores da área de esporte, comunicação e sociedade, como Ronaldo Helal, Hugo
Lovisolo e Roberto da Matta, e também nomes consagrados no campo do jornalismo de revista,
como Marília Scalzo e Sérgio Vilas Boas.

O maior desafio durante a produção do estudo foram as pesquisas em alemão e a busca de


informações para contextualizar, explicar e compreender o cenário jornalístico e cultural
germânico. Apesar de leituras de artigos variados, dois autores foram fundamentais para o estudo:
Stefanie Hauer (acadêmica de esporte, mídia e comunicação pela Universidade Técnica de
Munique) e Dirk Schümer10 (jornalista do diário Die Welt, especializado em política, sociedade e
cultura europeias).

No primeiro capítulo, trataremos sobre a relação do futebol com a cultura e a formação da


identidade nacional no Brasil e na Alemanha, tendo como exemplos as Copas do Mundo de 1950,
1954 e 1970. O segundo capítulo busca trazer a história do jornalismo esportivo - em especial
contextualizar a modalidade na Alemanha – e abordar o surgimento e desenvolvimento do esporte
em revistas, além de dar um panorama geral sobre o jornalismo literário, que será base para a
análise de reportagens no capítulo 3. Por fim, o terceiro e último capítulo, traz análises de
reportagens da revista 11FREUNDE, ilustrando o "novo" jornalismo esportivo realizado pela
publicação.

10
O título do livro de Schümer utilizado neste trabalho, Gott ist rund (“Deus é redondo”) é inspirado em uma frase
de Armando Nogueira: “O jornalista esportivo e ensaísta Armando Nogueira viu voando pelo ar um brinquedo
mágico, que concedeu ao povo sofredor uma vista do céu: ‘Deus é redondo’”. (SCHÜMER, 1995, p. 174).
15

1. FUTEBOL, CULTURA E IDENTIDADE NACIONAL

Definir cultura e tão difícil, que a proliferação desta palavra na Europa, durante o século
XVIII, levou o filósofo alemão J. G. Herder (apud SANTAELLA, 2003) a afirmar que "nada
poderia ser mais indeterminado do que a palavra cultura". Os estudos do significado de cultura se
estenderam até levar o escritor A. Lawrence Lowell (apud SANTAELLA, 2003) a dizer que "nada
no mundo e mais evasivo que a cultura. Uma tentativa de abranger seu significado em palavras e
como tentar agarrar o ar com as mãos".

De acordo com Santaella (2003), as interpretações do conceito de cultura são numerosas.


Em seu estudo, a autora explica que existe um consenso sobre "o fato de que cultura e aprendida"
e que "permite a adaptação humana ao seu ambiente natural". Santaella ainda oferece uma definição
"breve e útil" de cultura: "parte do ambiente que e feita pelo homem" e que "inclui todos os
elementos do legado humano maduro adquirido através do grupo pela aprendizagem consciente".
Ou seja, a partir dessa definição, podemos concluir que música e literatura são cultura, mas a roda
e o celular também são.

Malinowski (apud SANTAELLA, 2003) propõe uma teoria que considera cultura como
"um aparato instrumental dirigido para um fim" por meio do qual "as pessoas satisfazem
necessidades orgânicas e transmitidas, das quais dependem sua existência e bem-estar psicológico".
Já Tylor (apud PAUSER, 2009) caracteriza cultura como "a síntese dos conhecimentos, das
crenças, da arte, da moral, das regras, dos costumes e de outras capacidades e hábitos que o homem
adquire como membro da sociedade". Tal conceito, se encaixa muito bem nos objetivos do presente
estudo. Piza (2003) complementa, afirmando que cultura "esta em tudo" e que e de sua essência
"misturar assuntos e atravessar linguagens".

Contudo, como o próprio Piza destaca, a maioria das pessoas ainda enxerga cultura como
algo inatingível, "exclusivo dos que leem muitos livros e acumulam muitas informações" e "sem a
leveza de um filme-passatempo". Santaella (2003) corrobora a fala de Piza, ao afirmar que um
conceito comum de cultura e o de "refinamento, implicando na habilidade que alguém possui de
manipular certos aspectos da nossa civilização que trazem prestígio". Tal visão de cultura por
grande parte da população pode ser atribuída a mídia, que, de acordo com Piza, limita as suas pautas
16

aos temas "associados imediatamente a ideia de erudição" e oferece uma escrita "burocrática e
lenta, com excesso de jargões e falta de clareza". (PIZA, 2003)

Nos cadernos culturais de jornais ou em editoriais do tema em programas de televisão ou


de rádio, e comum encontrar uma quantidade limitada de atividades que podem ser consideradas
como cultura. O que, para Porombka (apud PAUSER, 2009), e um erro. Afinal, o jornalismo
cultural "deve se interessar por muito mais: por tudo que envolve cultura como um todo, e não
apenas por arte, literatura, teatro, arquitetura ou música" (POROMBKA apud PAUSER). Reus
(apud PAUSER, 2009) segue a mesma linha e defende que quem relata cultura não deve estabelecer
barreiras ou limites, mas sim "conhecer e espelhar as diversas faces da cultura". Herskovits (apud
SANTAELLA) ilustra como deve ser a relação com a cultura:

Para o cientista, entretanto, qualquer pessoa culta só e capaz de manipular alguns


fragmentos especializados de nossa cultura, compartilhando muito mais do que se pode
suspeitar com um fazendeiro, um pedreiro ou qualquer tipo de profissional. A mais rude
economia, o rito religioso mais arrebatado, um simples conto popular são todos
igualmente partes da cultura" (HERSKOVITS apud SANTAELLA, 2003, p. 31).

Além disso, para Da Matta (1981), o conceito de cultura também e, por diversas vezes,
confundido como "estado educacional" e utilizado como "arma discriminatória contra algum sexo,
idade, etnia ou mesmo sociedades inteiras" (DA MATTA, 1981).

Falamos então em "alta cultura" e "baixa cultura" ou "cultura popular", preferindo


naturalmente as formas sofisticadas que se confundem com a própria ideia de cultura.
Assim, teríamos a cultura e culturas particulares e adjetivadas, como formas secundárias,
incompletas e inferiores de vida social (DA MATTA, 1981, p.2).

Essa problematização destacada por Da Matta vem de uma visão humanista que, de acordo
com Barnard e Spencer (apud SANTAELLA, 2003), considera que algumas pessoas "têm mais
cultura do que outras e alguns produtos humanos, tais como artes visuais, música e literatura, são
mais culturais do que outros".

Talvez, por isso, o futebol ainda não seja visto por muitos como uma manifestação cultural
de uma sociedade. O futebol não aparece no Segundo Caderno, por exemplo. Ele possui um
caderno próprio, mas que se limita a relatar a notícia, o factual, ou a um box com uma coluna de
opinião, mas, ainda assim, baseada nos acontecimentos do dia anterior ou da semana. Hesse (2016)
conta que, na Alemanha, apesar de o futebol ser muito importante, ele tem a impressão de que
muitos não vivem e amam o jogo com tanta intensidade e, por isso, não enxergam o esporte como
uma manifestação cultural.
17

Mas, se o futebol não e cultura, por que a transmissão de uma partida e o único programa
na televisão que "altera o horário bancário, muda o sentido das ruas, fecha o comércio e pára o
país"? (GASTALDO in HELAL, LOVISOLO E SOARES, 2011). Por que então a camisa da
Seleção e o futebol brasileiro parece "cativar muito mais a atenção" por parte da população do que
símbolos oficiais como a bandeira e o hino nacionais? (GASTALDO in HELAL, LOVISOLO E
SOARES, 2011.)

A cultura futebolística, definida por Glöckl (apud PAUSE, 2009) como "tudo aquilo que
vai além do jogo em si"11, se tornou expressão de identidade, ao lado de "outras artes populares,
criando-se afinidades entre tango e futebol, carnaval e futebol" (LOVISOLO in HELAL,
LOVISOLO E SOARES, 2011). O esporte pode ser visto como "um desses locais que sintetizam
a cultura nacional" (SOARES E LOVISOLO in HELAL, LOVISOLO E SOARES, 2011),
concentrando as adesões "mais intensas e duradouras por parte da população"12 (LOVISOLO in
HELAL, LOVISOLO E SOARES, 2011). Afinal, e aceitável trocar de religião ou de partido
político, mas nunca trocar o time do coração.

Schümer (1995) define o futebol como a "estrela guia" da cultura, a partir do momento que
cultura significa "sobre o que a maioria conversa, pelo o que a maioria vibra, o que a maioria acha
importante". Entretanto, o futebol não apenas pode ser considerado um produto cultural, mas
também uma forma de "conhecer melhor a sociedade em que vivemos" (LOVISOLO in HELAL,
LOVISOLO E SOARES, 2011). Por ser o esporte mais popular na maioria dos países, o futebol se
torna um reflexo do meio social. Tomemos por exemplo os casos de intensa violência entre as
torcidas do Galatasaray e do Besiktas da Turquia13. Não e novidade o confronto entre os dois times
ser realizado apenas para a torcida do time mandante, já para evitar brigas14. Analisando a situação,
podemos enxergar nesse embate futebolístico um reflexo da violenta sociedade turca: alvo de

11
Em especial a cultura de torcida, como as iniciativas, projetos, cantos e coreografias.
12
Hesse (2016) afirma que a situação na Alemanha não é diferente. "Eu, por exemplo, sou torcedor do Borussia
Dortmund, mas não porque o clube obteve sucesso nos últimos anos. Eu nasci e cresci em Dortmund,
automaticamente me tornei torcedor do time". Curiosamente, de acordo com Hesse, na redação da 11FREUNDE, não
há um torcedor do Bayern de Munique – maior clube alemão.
13
Disponível em: http://esporte.uol.com.br/futebol/ultimas-noticias/2016/08/13/galatasaray-e-campeao-da-
supercopa-em-jogo-marcado-pela-violencia.htm. Acesso em: 09/11/2016.
14
Disponível em: http://esporte.uol.com.br/futebol/ultimas-noticias/2015/02/06/torcida-unica-em-estadio-nao-e-
garantia-de-seguranca-europa-prova-isso.htm. Acesso em: 09/11/2016.
18

constantes ataques terroristas, local de confrontos étnicos seculares, além de violações constantes
dos direitos humanos.

Schümer (1995) ilustra também o fato de o futebol servir como reflexo social apontando o
machismo presente no meio esportivo. O autor observa que o futebol e, de fato, um espaço para
todos - inclusive para mulheres. Desde que "elas tomem as perspectivas masculinas como suas
próprias". Para ele, o futebol "revela mais sobre o sexo e a partilha do poder do que qualquer
teatralização feminista". O futebol não só "sobrevive como ideologia velada do patriarcado", mas
também "se estende para as outras áreas da vida" (SCHÜMER, 1995).

1.1. Miscigenação, democracia e as Copas de 1950 e 1970

No que se refere ao Brasil, o futebol chega ao país no final do século XIX e início do século
XX por meio de jovens da elite brasileira que iam para a Europa e traziam de lá as últimas
novidades15. E, durante algum tempo, o futebol foi um esporte de elite, largamente criticado, de
acordo com Hollanda (2011), pelos modernistas da época, que consideravam o esporte apenas mais
um produto importado e "fenômeno típico da dependência cultural brasileira"16. Curiosamente, o
futebol foi uma das maneiras encontradas para formar a identidade brasileira. Nos dias atuais, Da
Matta (1982) enxerga o esporte como um "veículo para dramatizações de problemas importantes"
por ser um modo especifico pelo o qual "a nossa sociedade fala, apresenta-se, revela-se, exibe-se,
deixando-se descobrir". Helal, Soares e Santoro (2004) debatem como o futebol se reflete na
sociedade brasileira:

Nosso futebol dava forma a uma autoimagem que permitia aos brasileiros se verem como
os grandes mestres da bola. Tratava-se, assim, de afirmar, para além desses valores
intrínsecos ao jogo, o valor da cultura local frente ao mundo. A produção de narrativas
sobre o futebol assumia o discurso de pertencimento, isto e, da 'essência' do ser brasileiro
(HELAL, SOARES E SANTORO, 2004, p. 66).

15
HOLLANDA, 2011, p. 4.
16
Lembrando que, na época, tais escritores e artistas buscavam criar uma identidade nacional própria. A
representação máxima desse momento foi a Semana de Arte Moderna de 1922.
19

Afirmar o valor da cultura brasileira era um dos maiores objetivos durante a realização da
Copa do Mundo no Brasil de 195017. Da Matta (1982) explica que tal evento ocorreu no início de
uma década "na qual o Brasil buscava marcar o seu lugar como nação que tinha um grande destino
a cumprir". E, por isso, o Maracanazo, a final entre Brasil e Uruguai, foi tão traumatizante. Ate o
7:1 em 2014, contra a Alemanha, a derrota de 1950 era considerada a maior tragédia do futebol
brasileiro. No contexto da época, o fatídico jogo foi tomado como "metáfora para as 'derrotas' da
própria sociedade brasileira, sempre submetida às forças impessoais do destino" (DA MATTA,
1982). Talvez, por isso, a derrota para a Alemanha no Mineirão teve seu peso apenas no campo
futebolístico pois, em 2014, o Brasil já estava consolidado como grande nação, parte de importantes
organizações mundiais como o BRICS e G-20 e com sua cultura exportada para o mundo inteiro.

O estilo brasileiro de jogar, com o futebol-arte, malandro, de improviso, cheio de dribles e


tão importante na formação da identidade cultural brasileira que foi exaltado pela mídia após a
conquista da Copa do Mundo de 1970, deixando de lado todo o trabalho científico e psicológico
feito com aquele grupo – o mesmo trabalho destacado pela mesma mídia ao longo do campeonato18.
Tal estilo alargou-se pelo mundo e passou a ser "louvado por jornalistas e torcedores de outros
países em que o futebol era o esporte dominante" (BARTHOLO E SOARES in HELAL, SOARES
E LOVISOLO, 2011). A definição do estilo brasileiro enfatiza "as habilidades individuais, o que
torna a disciplina e o jogo de equipe secundários (SOARES E LOVISOLO in HELAL, LOVISOLO
E SOARES, 2011).

Helal (2003) explica que, apesar de esforço e determinação serem necessários para alcançar
objetivos, são aspectos muitas vezes rebaixados a um plano secundário nos discursos dos cronistas
e jornalistas brasileiros. Para ele, no caso do futebol, em especial, "chega a ser até uma crítica
contundente chamar um jogador de 'esforçado'", pois essa seria uma forma de "se dizer que o sujeito
não tem talento".

Um argumento que se desdobra da hipótese principal e a de que tal esquecimento, na


memória jornalística, se dá em função de que as imagens de disciplina, do esforço, do
planejamento, da rotina do treinamento e da ciência não se ajustam às imagens identitárias
da 'arte, da genialidade, da criatividade, da malícia ou malandragem' do jogador brasileiro
(HELAL, SOARES E SANTORO, 2004, p. 64).

17
DA MATTA, 1982, p. 57.
18
HELAL, SOARES E SANTORO, 2004, p. 64.
20

O futebol também se tornou um espaço para afirmação da miscigenação do país que, uma
vez já vista como "empecilho ao progresso e motivo de vergonha", transformou-se em afirmação
da singularidade brasileira (SOARES E LOVISOLO in HELAL, LOVISOLO E SOARES, 2011).
Foi com o bom desempenho de jogadores de origens negras, com a "originalidade étnica divisada
no futebol" (HOLLANDA, 2011) que o Brasil conquistou o terceiro lugar na Copa do Mundo da
França em 1938. As atuações de Leônidas da Silva e Domingos da Guia "estreitaram o sentimento
esportivo de pertencimento e de identificação a pátria" (HOLLANDA, 2011). Para Freyre (apud
HELAL, 2010), a miscigenação racial brasileira fundou "um estilo de jogo que seria típico do Brasil
- uma 'dança dionisíaca', o que tempos depois se convencionou chamar de futebol-arte". E, como
registrou Oswald de Andrade (apud HOLLANDA, 2011) em seu poema E a Europa curvou-se ao
Brasil, pela primeira vez e por meio do futebol, "o Brasil teria o sortilégio de inverter a tradicional
relação de dependência face às potências do Velho Mundo".

No futebol brasileiro, a positividade dessas características (balanço, ginga e alegria)


transformou-se em narrativa normativa de identidade que engloba a comunidade
imaginada no Brasil, a qual, por sua vez, tem na 'raça negra' o referencial dessas
representações (ABRAHÃO E SOARES in HELAL, LOVISOLO E SOARES, 2011, p.
82).

Foi o futebol o primeiro exemplo de democracia para os brasileiros, pois "não foi através
do nosso Parlamento que o povo aprendeu a respeitar as regras, mas assistindo a jogos de futebol",
nos quais o "vitorioso não tem o direito de ser um ditador e o perdedor não deve ser humilhado"
(DA MATTA, 1994). Ainda hoje, e através do jogo de futebol que "as massas brasileiras podem
experimentar vencer com os times favoritos", sentindo que o desempenho nas arquibancadas de
fato produz resultados. Tal vitória é "desconhecida no campo da educação, da saúde e, acima de
tudo, da política" (DA MATTA, 1994).

Finalmente, o futebol proporciona a sociedade brasileira a experiência da igualdade e da


justiça social. Pois, produzindo um espetáculo complexo, mas governado por regras
simples que todos conhecem, o futebol reafirma, simbolicamente, que o melhor, o mais
capaz e o que tem mais mérito pode, efetivamente, vencer. Que a aliança entre talento e
desempenho pode conduzir a vitória inconteste. E, melhor que tudo, que as regras valem
para todos. (...). Além disso, fica assegurado que, diferentemente da experiência política
corriqueira, as regras não podem ser mudadas nem por quem está perdendo, nem por quem
está ganhando (DA MATTA, 1994, p. 17).
21

1.2. O futebol na cultura alemã e o Milagre de Berna

Na Alemanha, o futebol também foi, por algum tempo, um esporte de elite. Quando os
primeiros clubes foram fundados, ainda durante o império, a classe trabalhadora praticava a "força
e a resistência do corpo" preferencialmente em aparelhos de ginástica artística (EISENBERG apud
SCHÜMER, 1995). Por ter sido um esporte desenvolvido nos gramados dos internatos da
Inglaterra, o futebol era visto como "esnobe e estrangeiro" (SCHÜMER, 1995). Juristas, arquitetos
e, especialmente, engenheiros foram os pioneiros a entregar-se ao futebol.

Mas, o esporte logo chamou a atenção dos militares e não permaneceu elitista por muito
tempo. Em 1908, a marinha envia seus marinheiros e integrantes de outros cargos mais baixos para
a copa da esquadra e, a partir de 1910, o futebol entra para o planejamento de formação do
exército19. Com a mistura das classes nas trincheiras durante a 1ª Guerra Mundial, o futebol passa
a ser popular também entre o proletariado (SCHÜMER, 1995). De locais como o Vale do Ruhr,
região altamente industrializada na época, surgem clubes formados pela classe trabalhadora, como
o Schalke 04.

Após as duas grandes guerras, o povo alemão passa a ter dificuldade de relação com a
cultura e os símbolos nacionais. A ideia de uma nação própria e de uma identidade nacional e
automaticamente comparada a um nacionalismo de direita exagerado e a definição de "nação"
recupera, no entendimento alemão, "a agressiva delimitação do que era de fora e a violenta
consolidação militar" dentro do país20. A memória cultural do povo alemão remetia a história
nacional, mas sempre permanecendo sob a perspectiva do Nacional-Socialismo (SCHEUBLE E
WEHNER, 2006).

O sentimento de união e conexão emocional da sociedade começou a ser recuperado com


um evento, até então, inusitado: a Copa do Mundo de 1954. O que, no começo, não recebia atenção
nem por parte da população, nem por parte da mídia, culminou na vitória sobre a Hungria e em
uma "incondicional rendição a euforia das massas" (SCHÜMMER, 1995). Para Scheuble e Wehner
(2006), não só os onze futebolistas venceram aquela final de Copa do Mundo, mas todo o povo

19
SCHÜMER, 1995, p. 191.
20
SCHEUBLE E WEHNER, 2006, p. 28.
22

alemão. A sombra "triste e escura" da época do Nazismo e a "desorientação social" do período de


reconstrução do país proporcionaram a conquista do título uma "mistura de êxtase e vitória
coletivos" (SEITZ apud SCHEUBLE E WEHNER, 2006).

O impacto político que o futebol pode ter foi demonstrado pela sensacional vitória na Copa
do Mundo de 1954. Seu significado estadual de longo alcance e certamente graças a
experiência emocional e a reabilitação simbólica, soldadas entre si por meio do futebol e
do azarão Fritz Walter. O que se viu na Alemanha, durante aquela semana, ilustrou a força
da organização emocional que esse jogo pode exercer (SCHÜMER, 1995, p. 192).

Schümer (1995) ainda afirma que a vitória de 1954 resultou em um "inesperado ato de
fundação de uma identidade nacional" e que o futebol garantiu a Alemanha o "mínimo necessário
para uma supremacia continental". Não só por tal importância política e social, mas também pelo
fato de que a seleção alemã era tecnicamente inferior a seleção húngara (considerada a melhor do
mundo na época), renderam a Copa do Mundo de 1954 o carinhoso apelido de O Milagre de
Berna21. Os mitos criados na época são ainda relembrados nos dias de hoje. As clássicas frases do
técnico/filósofo Sepp Herberger22 ainda ecoam nas conversas sobre futebol, assim como a
definição Fritz-Walter-Wetter para definir dias nublados e chuvosos – clima favorito do capitão do
título, Fritz Walter23.

O desenrolar do futebol alemão durante a década de 1970 também foi de grande importância
para a cultura e a formação da identidade nacional no país. Jogadores como Paul Breitner, Uli
Hoeneß, Gunter Netzer e Franz Beckenbauer, parte dos times do Bayern de Munique e do Borussia
Mönchengladbach que dominaram o cenário europeu nesta época24, foram mais influentes na
mentalidade do país do que "qualquer pintor, artista de filme ou político" (SCHÜMER, 1995).

A conquista da Copa do Mundo de 1974 também teve um grande peso na sociedade


germânica (SCHEUBLE E WEHNER, 2006). Neste período, o mundo vivia a Guerra Fria e a
Alemanha encontrava-se dividida em dois países diferentes: a República Democrática Alemã
(RDA, socialista) e a República Federal da Alemanha (RFA, capitalista). Durante a Copa de 74, os

21
Berna, capital da Suíça e local onde foi realizada a final da Copa do Mundo de 1954.
22
Como, por exemplo, “A bola é redonda e o jogo dura 90 minutos", ou “O próximo jogo é sempre o mais difícil".
23
Fritz Walter sentia dificuldade em jogar em climas quentes por ter contraído malária durante a 2ª Guerra Mundial.
24
O Bayern de Munique foi campeão da Copa dos Campeões da Europa (atual Liga dos Campeões da UEFA) nas
temporadas 1973/74, 1974/75 e 1975/76. Já o Borussia Mönchengladbach foi campeão da Copa da UEFA (atual Liga
Europa da UEFA) nas temporadas 1974/75 e 1978/79.
23

dois países se cruzaram e a RDA ganhou a partida por 1:0. Mas, ao final do torneio, o lado
capitalista se sagrou campeão, ao vencer a Holanda por 2:1 na final.

Scheuble e Wehner (2006) ainda citam o tricampeonato alemão na Copa do Mundo de 1990
como outro evento futebolístico que teve sua importância ampliada perante a sociedade devido ao
fato de que, naquele momento, o país passava pelo processo de reunificação. Para os autores, o
futebol e mais que apenas um jogo: "o futebol proporciona ao torcedor ordinário uma consciência
política". Afinal, Michael Ballack25 e "mais significativo do que Bismarck26 para a nação alemã"
(SCHEUBLE E WEHNER, 2006).

Nos dias atuais, o futebol e, de segunda a segunda, parte do cotidiano alemão. Seja nos
noticiários, nos jogos dos campeonatos europeus ou nas partidas de divisões inferiores, o esporte
está presente entre os assuntos do dia. Além disso, a pesquisa de opinião realizada ao longo desta
monografia mostrou que, para 92% dos alemães, o futebol é parte da cultura do país.

A média de público nos estádios da Alemanha e uma das provas da importância do futebol
para a população: de acordo com a revista kicker27, a temporada 2015/16 teve média de 42.420
pessoas por partida na primeira divisão, enquanto a segunda divisão terminou com média de
público de 19.016 espectadores28. Para efeito de comparação, de acordo com o site FutDados29, o
Campeonato Brasileiro de 2015 teve média de público de apenas 18.198 por partida.

Também e parte da cultura futebolística alemã as viagens para os jogos "fora de casa". As
chamadas Auswärtsfahrt são tradição entre os torcedores mais fanáticos, especialmente aqueles
que fazem parte de alguma torcida organizada. Essas viagens são uma forma de apoiar o time,
quando este joga em outra cidade, fora de seu estádio, e também de criar laços de amizade entre
aqueles que participam com frequência. Para trajetos dentro do país, as torcidas organizadas
oferecem ônibus a preços acessíveis, bem abaixo do que e oferecido pelo sistema de trem, por

25
Ex-jogador e ex-capitão da seleção alemã. Eleito o jogador do ano na Alemanha em 2002, 2003 e 2005.
26
Otto von Bismarck, responsável pela unificação da Alemanha (1817) e primeiro chanceler do Império Alemão
(também conhecido como II Reich).
27
Disponível em: http://www.kicker.de/news/fussball/bundesliga/spieltag/1-bundesliga/2015-16/zuschauer-der-
saison.html. Acesso em: 24/09/2016.
28
Disponível em: http://www.kicker.de/news/fussball/2bundesliga/spieltag/2-bundesliga/2015-16/zuschauer-der-
saison.html. Acesso em: 24/09/2016.
29
Disponível em: http://futdados.com/campeonatos-brasileiros-medias-de-publico/#tabela. Acesso em: 24/09/2016.
24

exemplo. Em caso de partidas em países mais distantes, como a Grécia, por exemplo, são
organizados os chamados Sonderflug, no qual os torcedores viajam de avião.

Além disso, a socialização dos torcedores vai além das arquibancadas. A torcida organizada
do Bayern de Munique, Club Nr. 12, por exemplo, organiza torneios de boliche e, junto com outras
agremiações, e organizado o Kurt Landauer Turnier, um torneio de futebol amador que visa exaltar
a mensagem de combate ao racismo e leva o nome do ex-presidente do Bayern de Munique30. Outro
exemplo muito comum entre as torcidas de diversos times alemães e a doação de dinheiro para
causas sociais, como o Kältebus München, organização que ajuda os moradores de rua com roupas
e alimentos.

Eles não investem apenas dinheiro, mas também muito tempo em Auswärtsfahrten31 e
incontáveis encontros entre torcedores, e são os visitantes mais frequentes no estádio. (...)
Torcedores dentro de um grupo se sentem intimamente conectados e consideram-se parte
de algo especial. Eles possuem um maior sentimento de autoestima coletiva do que outras
pessoas (STRAUSS, 2006, p. 41).

Scheuble e Wehner (2006) afirmam que o futebol torna claro os mecanismos das estruturas
de identificação. Para eles, a cultura dentro dos estádios recupera a operação da construção da
nação "independente de diferenças individuais, sociais ou políticas por, pelo menos, 90 minutos".
O espectador, então, e levado a uma "sociedade imaginada", orientada pelos mesmos valores (o
desfrute do futebol) e os mesmos objetivos (a vitória do seu time)32. Os autores ainda destacam
como os cantos das torcidas funcionam como códigos, os quais todos - independente do seu meio
pessoal – podem compreender e participar.

Esse tipo de movimento por parte dos torcedores mostra que, dentro da Alemanha, existe
um público que enxerga o futebol como algo que vai além do jogo si. São torcedores que querem
usar o esporte para entender a sociedade na qual vivem, para criar debates políticos e movimentos
sociais. Tal público cria uma demanda e um mercado adequado para um jornalismo mais
aprofundado, diferente do noticiário factual e das futilidades oferecidas diariamente pela maioria
dos veículos. E e nesse aspecto que a 11FREUNDE se encaixa no cotidiano do futebol alemão.

30
Kurt Landauer era judeu e foi preso no campo de concentração nazista em Dachau durante a 2ª Guerra Mundial.
Foi libertado graças a seus serviços prestados ao exército alemão durante a 1ª Guerra Mundial.
31
Viagens para assistir jogos fora de casa.
32
SCHEUBLE E WEHNER, 2006, p. 28.
25

2. JORNALISMO ESPORTIVO

O esporte nem sempre teve o espaço que possui hoje na mídia. Pelo contrário, a editoria
esportiva era desprezada por jornalistas de editorias maiores e, ainda hoje, essa ideia ainda está
presente em algumas redações. Esse desprezo era – ou ainda e - causado, de acordo com Silveira
(2009), devido a concepção de que todo mundo entende de esportes. Logo, qualquer um poderia
escrever sobre o assunto, como ironiza Vilas Boas (2005).

Qualquer bípede pode comentar futebol no Brasil. Basta dizer que futebol e uma caixinha
de surpresas. Cada jogo tem sua história. Dois a zero e um placar perigoso. Esta faltando
pegada, atitude e determinação. O grupo está unido. Não se joga mais como antigamente.
Não temos mais pontas. E preciso acertar o passe ofensivo. O melhor caminho para o gol
e as pontas. Não tem mais bobo no futebol. (VILAS BOAS, 2005, p. 16)

Contudo, como apontado por Hauer (2012), a relevância do esporte cresceu dentro da
sociedade e o jornalismo esportivo se desenvolveu de maneira surpreendente, a ponto que os
jornalistas esportivos deixaram a "condição de excluídos para se tornarem 'estrelas da mídia'"33.
Dois motivos podem ser apontados para esse desenvolvimento: o primeiro e o fato de o esporte ser
uma das áreas mais comuns da vida. Hauer (2012) destaca que a independência de sexo, idade ou
classe torna o esporte uma grande influência na cultura de uma sociedade e Vilas Boas (2005)
complementa, afirmando que "o esporte e, talvez, o mais democrático dos temas". O segundo
motivo e o fato de o esporte não apenas envolver a partida em si, mas também aspectos políticos,
sociais, culturais e econômicos.

Para afastar a ideia de que qualquer um pode escrever sobre esportes, o jornalista dessa área
deve demonstrar conhecimento maior do que aqueles que se julgam apenas torcedores de
determinada modalidade34. Como uma especialização, o jornalismo esportivo deve orientar os
indivíduos e agrega-los conforme as suas necessidades. Por exemplo, um torcedor de um time de
futebol não deseja apenas saber o resultado das partidas. Ele quer informações sobre os treinos do
clube, sobre a preparação para os jogos, sobre bastidores (diretoria, patrocinadores, marketing),
entre outras. De acordo com Silveira (2009), o jornalismo esportivo precisou migrar para uma

33
HAUER, 2012, p. 14.
34
DA SILVEIRA, 2009, p. 54.
26

veiculação de matérias que abrangem não apenas o conhecimento, e o profissional da área precisa
estar preparado para lidar com diferentes assuntos que se conectam com o acontecimento principal.

A história do jornalismo esportivo começa na Inglaterra - definida por Hauer (2012) como
a "nação mãe do esporte" - em 1681, com a publicação da primeira nota sobre uma luta de boxe no
jornal True Protestant Mercury35. Já a primeira revista esportiva, a Sporting Magazine, surge
apenas cerca de 100 anos depois, em 179236. Somente a partir de 1817, os jornais passam a dedicar
uma seção exclusiva para esportes, sendo os pioneiros o Morning Herald e o The Globe37. Quatro
anos depois, chega ao mercado o primeiro jornal exclusivamente sobre esportes, o Sporting Life38.

No rádio, o jornalismo esportivo se inicia com a transmissão de eventos. Existem dúvidas


sobre qual foi, oficialmente, o primeiro evento a ser transmitido pelo rádio. Alguns consideram que
a transmissão de uma luta de boxe entre Johnny Dundee e Johnny Ray, em 1921, foi a primeira na
rede radiofônica a ser feita pela KDKA, em Pittsburgh39. Entretanto, as transmissões esportivas
dos jogos de futebol americano da Universidade de Minnesota, por meio de uma rádio experimental
criada pelo professor F. W. Springer40, também briga pelo posto de primeira transmissão esportiva
no rádio.

Por outro lado, também existem relatos que, no Canada, partidas de hockey já eram
transmitidas com a descrição das jogadas enviadas pelo telégrafo durante os anos 189041. Já quando
pensamos em televisão, não existem dúvidas: o primeiro evento esportivo a ser transmitido foram
as Olimpíadas de 1936 na Alemanha. As imagens eram enviadas para cabines especiais, chamadas
Public Television Offices, espalhadas por Berlim e Potsdam.42 Tal fato foi marcante por transmitir
a vitória do africano/americano Jesse Owens na final dos 100 metros – um negro se consagrando
campeão em plena Alemanha nazista.

35
HAUER, 2012, p. 32.
36
HAUER, 2012, p. 32.
37
HAUER, 2012, p. 33.
38
HAUER, 2012, p. 33.
39
HAUER, 2012, p. 34.
40
NACHMAN, 2011.
41
Disponível em: https://en.wikipedia.org/wiki/Broadcasting_of_sports_events. Acesso em: 13/09/2016.
42
Disponível em: http://people.howstuffworks.com/culture-traditions/tv-and-culture/first-televised-sporting-
event.htm. Acesso em: 13/09/2016.
27

E no Brasil...

No Brasil, com a popularização do futebol, os cadernos esportivos ganham espaço nos


jornais de circulação nacional a partir da década de 1920. Assim como as outras notícias da época,
as da área esportiva possuíam caráter literário. O espaço destinado a editoria esportiva se
consolidou nos jornais apenas na década de 1960.

O primeiro jornal diário dedicado exclusivamente ao esporte, o Jornal dos Sports, foi
lançado na década de 1930 (COELHO, 2003), no Rio de Janeiro, tendo como um de seus
proprietários o jornalista Mário Filho. De acordo com Coelho (2003), os cronistas da época se
preocupavam mais com personagem e suas histórias do que com informação precisa. Coelho
continua, relatando que essa maneira de fazer jornalismo no Rio de Janeiro acabava por criar um
processo de romantização e motivava o torcedor a ir ao estádio ver seu ídolo em campo.

Ao longo dos anos, diversos outros periódicos dedicados exclusivamente ao esporte


surgiram no Brasil, como o diário Lance! e a Revista Placar. Contudo, tanto nos periódicos
especializados, como nos grandes jornais de circulação nacional, que possuíam uma editoria de
esportes, o futebol era – e ainda e - o carro-chefe das reportagens. Nos anos nos quais a televisão e
o rádio ainda não existiam, era de responsabilidade da mídia impressa a descrição das grandes
jogadas, a divulgação de gols e o endeusamento de jogadores e partidas históricas.

No rádio, a primeira transmissão de uma partida de futebol, entre Paraná e São Paulo, foi
realizada no dia 19 de julho de 1931 pela Rádio Educadora de São Paulo43. Sete anos depois, ocorre
a primeira transmissão de uma Copa do Mundo (França, 1938) e também de um evento esportivo
fora do país. Na década de 1950, de acordo com Silveira (2009), inicia-se um processo de
padronização da transmissão esportiva, bem parecida com o que existe hoje. Além disso, e na
mesma época que surgem as equipes esportivas e começa a valorização de comentaristas e
repórteres44. Tudo isso impulsionado pelo grande sucesso do rádio durante as transmissões da Copa
do Mundo de 1958.

43
DA SILVEIRA, 2009, p. 23.
44
DA SILVEIRA, 2009, p. 23.
28

Na televisão brasileira, uma partida entre São Paulo e Palmeiras foi a primeira transmissão
esportiva, realizada em outubro de 1950 pela TV Tupi45. Seis anos depois, a TV Record e a TV Rio
realizaram, pela primeira vez, a transmissão de uma partida interestadual46. O sucesso dessa
transmissão e o aumento de vendas de aparelhos de TV, de acordo com Savenhago (2011),
estimularam as emissoras a investirem em tecnologia. Entretanto, a estrutura necessária para uma
transmissão internacional veio somente em 1970 e, finalmente, a primeira Copa do Mundo foi
transmitida nas televisões brasileiras.

Nos dias atuais, o jornalismo esportivo vive um processo de transformação e pode ser visto
mais como entretenimento do que como jornalismo propriamente dito. Vilas Boas (2005) critica
duramente essa mudança, citando, por exemplo, a maior preocupação com a escolha do
apresentador de determinado programa, do que com o conteúdo a ser transmitido. Na televisão,
essa problemática e ainda mais evidente do que em outras mídias de comunicação.

Ainda de acordo com Vilas Boas (2005), um dos motivos para essa mistura de jornalismo
com entretenimento e o fato de que, hoje, os índices de audiência ditam as pautas das coberturas
esportivas. Manchetes tendenciosas são constantes para agradar o torcedor47. Outro fato que ilustra
a transição do jornalismo para o entretenimento e o crescente interesse na vida privada dos atletas.
A foto postada no Instagram já e o suficiente para uma postagem nos portais esportivos. Na
Inglaterra, as esposas e namoradas de jogadores – apelidadas de WAG's (wives and girlfriends) -
são presença constante nos cadernos de esportes de tabloides como o The Sun.

Independente da abordagem, não ficam dúvidas de que o futebol e a modalidade que


domina o jornalismo esportivo. No que se refere ao surgimento de revistas, o foco voltado para o
futebol contribuiu para a especialização em outras modalidades que não recebem tanta atenção em
jornais diários, canais de televisão e programas de rádio. Hoje, e comum encontrar nas bancas de
jornais publicações dedicadas ao surfe e ao automobilismo, por exemplo. Mais adiante,
aprofundaremos um pouco mais a relação do esporte – em especial, o futebol - com as revistas.

45
DA SILVEIRA, 2009, p. 24.
46
DA SILVEIRA, 2009, p. 25.
47
Um exemplo de manchete tendenciosa é a notícia publicada no portal Goal.com, na qual o título escancara:
"Gündogan: Manchester City é maior que o Bayern". Entretanto, a leitura completa da matéria revela que o jogador,
Ilkay Gündogan, apenas disse que a estrutura do Manchester City era algo que nem o Bayern de Munique possuía.
Disponível em: http://www.goal.com/en-gh/news/4363/premier-league/2016/11/07/29277642/gundogan-manchester-
city-are-bigger-than-bayern-munich. Acesso em: 07/11/2016.
29

2.1. O jornalismo esportivo na Alemanha

Loosen (apud HAUER, 2012) afirma que o esporte "sempre teve conjuntura na mídia -
apenas os protagonistas e as modalidades mudam". A história do jornalismo esportivo na Alemanha
começa a ser construída em 172448, com os relatos do Breslauer Zeitung49 sobre hipismo. De
acordo com Eggers (apud THIEME, 2011), a situação da época não pode ser comparada com os
dias atuais, especialmente porque os relatos eram destinados a um público-alvo muito pequeno.

No início do século XIX, a prática e a informação sobre o esporte eram algo exclusivo da
nobreza. Outras camadas sociais não tinham tempo para se ocupar com algo que, para a época, era
considerado supérfluo. Entretanto, com a difusão do Iluminismo e a industrialização, melhoram os
salários, as condições de vida da população e o esporte se torna relevante para um público maior50.
A partir de meados do século XIX, os primeiros produtos jornalísticos de esporte começam a ser
difundidos por meio da imprensa especializada em ginástica artística, com os jornais Allgemeine
Turn-Zeitung (1842), Der Turner (1846) e Deutsche Turnzeitung (1856).

Aos jornais esportivos, seguiram-se os folhetins especializados e, finalmente, durante os


anos 1860, surgem as revistas especializadas em esportes. Por volta de 1880, quase todos os
esportes possuíam uma publicação específica (WEISCHENBERG apud HAUER, 2012). Apenas
o futebol teve um atraso, pois a primeira publicação especializada neste esporte surgiu apenas em
1894, com o folhetim Der Fußball51. Já a primeira revista dedicada ao futebol surgiu em 1911 e
chamava-se Fußball52. No que se refere a jornais diários, o Münchner Neuesten Nachrichten foi o
primeiro a possuir um caderno exclusivamente dedicado a esportes a partir de 1886. Já o Berliner
Zeitung am Mittag foi o primeiro a possuir redatores que se ocupavam apenas com o jornalismo
esportivo.

No rádio, a população pôde acompanhar uma transmissão de um evento esportivo ao vivo


pela primeira vez em 1921. Na ocasião, foi transmitida uma luta de boxe nos Estados Unidos entre

48
THIEME, 2011, p. 14.
49
Jornal local da cidade de Breslau.
50
PAUSE, 2009.
51
O folhetim Der Fußball se tornou especializado em esportes em geral um ano após sua criação. (HAUER, 2012)
52
HAUER, 2012, p. 33.
30

Johnny Dundee e Johnny Ray (Osterhaus, 2011). Já a primeira transmissão esportiva na televisão
foi, como já citado, as Olimpíadas de 1936, fortemente utilizada por Adolf Hitler como forma de
propagar a superioridade alemã e sua desejada raça ariana.

Para Hauer (2012), com o desenvolvimento da mídia e também do esporte, esses dois
sistemas descobriram que as ofertas esportivas poderiam ajudar a amenizar os problemas sociais.
Ela ainda destaca que situações de ganho para os dois lados levaram ao "fortalecimento de uma
interdependência entre esporte e mídias de massa". Para a mídia, o esporte garante altas de
telespectadores, leitores ou ouvintes. Por outro lado, para o esporte, a mídia é a plataforma ideal
para atingir um público cada vez maior (HAUER, 2012).

Com o desenvolvimento e propagação da internet, sites e blogs esportivos também ganham


espaço entre a população alemã. Entre os blogs, o futebol e o terceiro maior tema, atrás apenas das
temáticas de experiências pessoais e hobbys53. Já os grandes portais, hoje, são de extrema
importância para o jornalismo esportivo. Entre 2006 e 2011, o site sport1.de teve um aumento de
90 para cerca de 283 milhões de visitas. Números expressivos também podem ser observados nas
versões online da revista kicker (aumento de 270%) e do jornal Bild (aumento de 820% entre 2007
e 2012)54.

Nos últimos anos, a economia passa a fazer parte desta integração, agora com três sistemas.
Para Lamprecht e Stamm (apud HAUER, 2012), a comercialização do esporte e "um dos
desenvolvimentos mais importantes dos últimos anos". O estudo Wirtschaftliche Bedeutung des
Sportkonsums in Deutschland55 (“Significado Econômico do Consumo Esportivo na Alemanha”)
constatou que, em 2012, 4,4% do PIB alemão era creditado às relações econômicas esportivas. Em
2014, as três primeiras divisões da Bundesliga (liga nacional de futebol) foram responsáveis pelo
crescimento de 0,3% do PIB do país. Inclusive, no mesmo ano, o futebol foi classificado como um
dos maiores geradores de empregos da Alemanha, com 110 mil pessoas trabalhando em tempo
integral56.

53
HAUER, 2012, p. 37.
54
HAUER, 2012, p. 38.
55
Disponível em: http://www.agitano.com/der-sport-traegt-in-deutschland-100-mrd-euro-zur-wirtschaftsleistung-
bip-bei/24534. Acesso em: 11/09/2016.
56
Disponível em: http://www.dw.com/pt-br/bundesliga-um-dos-motores-da-economia-alem%C3%A3/a-18648160.
Acesso em: 11/09/2016.
31

Assim como no Brasil, o jornalismo esportivo na Alemanha recebe críticas pela sua
superficialidade e, em alguns casos, pela rendição aos desejos de patrocinadores ou de
influenciadores da mídia. Steffny (apud HAUER, 2012) aponta que o jornalismo esportivo se
tornou uma forma de "companheirismo e cumplicidade", algo que "em outras áreas seria
caracterizado como corrupção". Para Hauer (2012), e graças a esses dois fatores que, cada vez
mais, elementos de relações públicas são integrados ao dia a dia das redações.

2.2. O jornalismo esportivo em revista

Scalzo (2003) define revista como "objeto querido, fácil de carregar e de colecionar" e que
"ajuda a compor a personalidade", estabelecendo identificações e dando "a sensação de pertencer
a um determinado grupo". Para ela, isso justifica o fato de o leitor de revista gostar de andar
abraçado as suas publicações, como forma de mostrar a todos que ele pertence a este ou àquele
grupo.

Scalzo continua sua definição, afirmando que "revista e comunicação de massa, mas não
muito". Para ela, uma publicação começa a correr perigo a partir do momento que atinge um
público muito grande e difícil de distinguir. A autora cita o caso da revista norte-americana Life
que, mesmo vendendo 5,5 milhões de exemplares, teve que fechar as portas, vítima de seu próprio
"gigantismo".

No Brasil, a Placar foi a tentativa mais bem-sucedida de uma revista especializada em


futebol. Mas viveu de altos e baixos e, hoje, não é relevante no cenário da publicação esportiva.
Em 2015, a Placar possuía tiragem de 66 mil exemplares, sendo 47 mil de assinaturas (FRADE,
2016)57. A ausência de uma grande revista dedicada ao futebol, esporte tão popular no país, pode
ser explicada pelo fato de que, no Brasil, leem-se 3,5 revistas per capita por ano, enquanto, nos
Estados Unidos, são lidas 30 e, na Escandinávia, 60 (Scalzo, 2003).

Um sucesso relativo, entretanto, e observado em revistas dedicadas a outros esportes, como


o automobilismo, o surfe, o ciclismo, os esportes náuticos, entre outros. O possível motivo para tal

57
Números bem abaixo dos 237 mil exemplares em 1994. (FRADE, 2016).
32

acontecimento pode estar no fato de que o torcedor/leitor de futebol e bombardeado 24 horas por
dia por jornais, canais de televisão, rádios e sites na internet com conteúdo relacionado ao seu
esporte favorito. Tal fato não se observa com as já citadas modalidades "bem-sucedidas" em
revistas. Dessa forma, para que uma revista de futebol possa atrair e fidelizar seu público, são
necessários novos conteúdos e novas abordagens.

Desde 2015, existe no mercado a revista Corner, que e a publicação brasileira que mais se
aproxima da 11FREUNDE. O objetivo da Corner e contar "as histórias que são deixadas de lado"
e escrever "para quem tem vontade de refletir sobre a sociedade através do esporte"58.

Nesta primeira e em todas as próximas edições, o futebol vai ser uma enorme desculpa
para falar de sociedade, cultura, história, política, artes, arquitetura, design, entre outras
vertentes sociais. A Corner não vai, nem deve, noticiar nada. Todo mundo já sabe onde
encontrar notícias. A intenção aqui e promover reflexões (CORNER, 2015, p. 3).

A publicação, que pode ser adquirida apenas pela internet, e uma tentativa independente
com inspiração direta na espanhola Paneka, que, por sua vez, e inspirada na alemã 11FREUNDE.
Apesar de oferecer exatamente o que falta no cenário do jornalismo esportivo brasileiro,
especialmente no que se refere ao futebol, o futuro da Corner e incerto. Por ter como princípio a
produção de "100 páginas, sem anúncios", o lançamento da segunda edição da revista só foi
possível graças a um crowndfunding realizado pelos idealizadores do projeto, no qual 350 leitores
colaboraram com R$ 26.010,0059.

Na Alemanha, a primeira revista de esportes surge em 1842, a Allgemeinen Turnschrift. A


partir desta publicação, abrem-se as portas para o surgimento de revistas especializadas em
automobilismo, ciclismo e esportes aquáticos. Em 1885, e lançada a Sport im Bild, a primeira
revista alemã ilustrada e dedicada totalmente a esportes. Já primeira revista dedicada apenas ao
futebol – Fußball - surge mais de vinte anos depois, em 1911.

Ao final da Primeira Guerra Mundial, cresce o consumo de conteúdo esportivo na


Alemanha e, até 1933, mais de 400 revistas esportivas são publicadas no país60. A chegada do
Partido Nacional Socialista ao poder e, junto com ele, a censura da imprensa, fez com que esse
número caísse graças a proibição de publicações esportivas consideradas de esquerda. Em 1935,

58
Manifesto Corner, 1ª edição, p. 1.
59
Durante a produção deste trabalho, foi lançada a campanha de crowfunding para a Corner #3. A arrecadação foi
um sucesso e a produção da terceira edição confirmada. 345 leitores colaboraram com R$22.863.
60
WEISCHENBERG apud MÖBUS, 2014, p. 4.
33

apenas 239 revistas sobreviviam ao regime nazista61. Durante a Segunda Guerra Mundial, apenas
50 revistas esportivas eram veiculadas e, em outubro de 1944, esse número chegou a zero 62. O
renascimento da mídia esportiva alemã se deu apenas com o retorno do país às Olimpíadas de 1952
e com conquista da Copa do Mundo de 1954.

Atualmente, o Informationsgemeinschaft zur Feststellung der Verbreitung von


Werbeträgern (IVW), organização que certifica a circulação de grandes publicações de jornais e
revistas na Alemanha, registra 68 publicações dedicadas ao esporte, além de dedicar um espaço
especial para o registro de revistas de automobilismo, com 41 publicações. Entre as editoras, a
Motor Presse Stuttgart domina o mercado no que se refere a quantidade de publicações, com oito
revistas diferentes e total de vendas de 790.843. Em segundo lugar, esta a Axel Springer, com cinco
publicações diferentes e com vendas de 950.548, impulsionadas, principalmente, pela maior revista
esportiva do país, a Sport Bild. O terceiro lugar fica com Jahr Top Verlag e suas cinco publicações
diferentes, mas com apenas 133.762 de vendas. A Olympia Verlag, por exemplo, responsável pela
kicker Magazin – a segunda maior revista de esportes da Alemanha – possui apenas dois títulos no
mercado, mas 319.308 publicações vendidas.

Apesar do número de vendas menor, a revista kicker se mostra mais popular entre a
população. Em pesquisa realizada ao longo deste trabalho com leitores de revistas na Alemanha,
67% responderam que, ao pensar em futebol, a kicker é a primeira publicação a vir em mente. A
11FREUNDE aparece em segundo lugar, com 15% das respostas, enquanto a Sport Bild é lembrada
por apenas 4% dos entrevistados.

Ate a metade dos anos 1990, não existiam revistas esportivas de futebol com abordagem
cultural. A primeira tentativa veio em 1995, com o lançamento da Der tödlicher Pass (“O passe
mortal”), que se autodescrevia como "crítica e satírica" e caracterizada pelo Zeit Online (2015)
como "onde Gündogan63 vira literatura". A publicação existe até hoje na cidade de Munique.
Primeiramente, passou a ter uma tiragem trimestral com 2.500 exemplares. Entretanto, desde 2007,
e disponibilizada apenas por assinatura e com uma tiragem de 500 exemplares.

61
WEISCHENBERG apud MÖBUS, 2014, p. 4.
62
WEISCHENBERG apud MÖBUS, 2014, p. 5.
63
Meio-campista alemão, atualmente do Manchester City (Inglaterra).
34

No ano 2000, e publicado o primeiro exemplar da que podemos chamar de mais bem-
sucedida revista de futebol e cultura da Alemanha: a 11FREUNDE. A revista surge com o objetivo
de "focar o futebol com reportagens sutis, porém frescas, ao invés de fornecer estatísticas em
branco e relatos de jogos"64.

Uma revista de alcance nacional, diferente da Sport Bild e da kicker. Uma publicação
inspirada na torcida, com histórias fascinantes que a vida e o futebol escrevem. Uma
revista sobre o bom e o belo do futebol. Assim deve ser a 11FREUNDE: apaixonada, auto
irônica, engraçada e muito mais (KÖSTER apud PAUSE, 2009).

Hoje, a 11FREUNDE vende 96.133 exemplares, possui 39.528 assinantes e e a revista que
mais cresce na Alemanha, com um aumento de 48,5% no alcance por edição entre 2011 e 2015
(comparado a redução de 20,3% e 23,1% de kicker e Sport Bild, respectivamente). Os motivos para
tal desenvolvimento, serão estudados no capítulo 3.

2.3. Jornalismo literário

O jornalismo literário merece atenção e contextualização neste trabalho, pois servirá de


base para a análise das reportagens no capítulo 3. Weise (2013) define que esta forma de se fazer
jornalismo possui a missão, não apenas de informar com uma notícia, mas também de apresentar
uma história com personagens, enredos e contextualizações que não possuem espaço no cotidiano
jornalístico. Tudo isso apresentado em um texto bem escrito, completo e com estrutura narrativa
(WEISE, 2013).

Apesar de a literatura se afastar do jornalismo por "não possuir compromisso com a


veracidade factual" (BULHÕES, 2007), são recursos literários, citados por Wolfe (apud
BULHÕES, 2007), como a presença de diálogos, registro de gestos de personagens, descrição de
costumes e hábitos ou detalhamento espacial que se tornaram importantes no New Journalism. O
próprio Wolfe define o movimento como "a prática textual desenvolvida em alguns jornais e
revistas americanas, incialmente com os textos das chamadas reportagens especiais (…) até atingir
configurações de grandes narrativas com feição de romance". (WOLFE apud BULHÕES, 2007).

64
Wer sind 11FREUNDE? Disponível em: http://www.11freunde.de/ueber-uns. Acesso em: 11/09/2016.
35

O New Journalism se difere do jornalismo literário por ter sido um "movimento específico"
desse gênero durante os anos 1960 (NECCHI, 2009). Contudo, de acordo com Vilas Boas (1996),
o movimento deixou suas raízes para a reelaboração da modalidade jornalística, ou seja, da "grande
reportagem por excelência, a que combina a fidelidade ao mundo real e a melhor técnica literária"
(VILAS BOAS, 1996).

Entretanto, Necchi (2009) explica que, no Brasil, pouco se praticou o jornalismo literário
desde o fenômeno da revista Realidade, cujas reportagens combinavam o "rigor jornalístico na
apuração dos fatos com uma escrita que se aproximava da literatura" (NECCHI, 2009) entre 1966
e 197665. O autor ainda aponta os supostos fatores alegados por dirigentes de jornais para o
abandono da modalidade, como equipes reduzidas, falta de espaço nas publicações, orçamentos
reduzidos e, até mesmo, falta do interesse do leitor por grandes reportagens. Entretanto, para
Necchi (2009), isso é uma tendência que dirigentes de grandes veículos possuem de menosprezar
o público.

Apesar disso, Necchi continua, apontado que a temática do jornalismo literário está em
voga, pois, de acordo com ele, existe espaço para reportagens que "surpreendam pelo texto que
dimensiona e valoriza a essência da matéria-prima do jornalismo: pessoas e suas experiências no
mundo" (NECCHI, 2009). Vilas Boas (1996) complementa, afirmando que, dessa forma, a matéria
só tem a ganhar em fundamentação e sustentação por trazer uma coleta de dados mais criteriosa.

As técnicas inseridas no jornalismo literário e também no New Journalism para a produção


de grandes reportagens serão detalhadas ao longo do estudo de caso da revista 11FREUNDE no
próximo capítulo.

65
Em 1967, a Realidade chegou a possuir tiragem de mais de 500 mil exemplares. (FARO, 1999).
36

3. A REVISTA 11FREUNDE

Depois de uma contextualização sobre o jornalismo esportivo e também sobre futebol e


cultura, a partir daqui, inicia-se, de fato, a análise do objeto de estudo, a revista 11FREUNDE, com
o objetivo de confirmar a hipótese central levantada neste trabalho: a de que e possível renovar o
jornalismo esportivo sem apelar para resumos de partidas, notícias rasas de agências, fofocas ou
sensacionalismo.

Serão analisadas reportagens retiradas de edições distintas da revista. Tais matérias foram
escolhidas por unir a grande reportagem, a apuração minuciosa, um teor literário e a busca de pautas
inusitadas na criação de um produto jornalístico diferente. Apesar dessas características serem a
base do trabalho da redação da 11FREUNDE, as reportagens aqui analisadas foram escolhidas
também a gosto da autora.

A análise do objeto de estudo está dividida da seguinte forma: primeiro, será apresentada a
história da revista e, em seguida, a dissecação de sua estrutura atual. Logo depois, será feita uma
análise do projeto gráfico da publicação, com foco na utilização da fotografia. Finalmente,
estudaremos as reportagens escolhidas, tendo como base teóricos da grande reportagem e do
jornalismo literário e entrevistas realizadas com jornalistas da 11FREUNDE. Por fim, será
apresentada uma pesquisa de opinião realizada por meio de um formulário online com leitores da
revista.

3.1. De fanzine à revista

Para Pause (2009) o futebol serve como "projeção para diversos aspectos políticos, sociais,
culturais e econômicos" e, de acordo com ele, desde o final dos anos 1990, começam a surgir
revistas que focam e abordam o futebol com uma perspectiva intelectual e emocional. Rund (na
Alemanha), FourFourTwo (na Inglaterra) e Zwölf (na Suíça) são alguns exemplos. Mas o objeto
de estudo deste trabalho, a 11FREUNDE, fundada pelo jornalista Philipp Köster e o fotógrafo
Reinaldo Coddou, e publicada pela primeira vez em abril de 2000.
37

O projeto da revista foi inspirado na fanzine "Um halb vier war die Welt noch in Ordnung"
("Às três e meia, o mundo ainda estava em ordem"), produzida por Köster para torcedores do
Arminia Bielefeld66. Fanzine e um determinado tipo de revista muito popular na Alemanha e em
outros países da Europa. Nelas, os fãs mais engajados escrevem o que, para eles, são assuntos
importantes. Geralmente, os temas são relacionados a insatisfação com a comercialização do
futebol: ingressos caros, falta de espaços reservados para a torcida ficar de pá nos estádios, horário
dos jogos ou estádios com naming rights67.

E, de fato, o primeiro contato da 11FREUNDE com os seus possíveis leitores foi no melhor
estilo fanzine: a princípio, a revista não era vendida em bancas de jornal, mas sim do lado de fora
dos estádios. A primeira edição, em abril de 2000, foi vendida em frente ao Estádio Olímpico de
Berlim durante a final da Copa da Alemanha entre Bayern de Munique e Werder Bremen. Uli
Hesse68 (2016), jornalista da revista, relata que, apesar de a publicação ter se tornado grande e
profissional, a redação ainda se sente conectada aos aspectos de fanzine: de torcedores para
torcedores.

No início, a revista era produzida no apartamento de Coddou e a avo dele foi a primeira
financiadora da publicação, ao investir cinco mil Marcos (hoje, cerca de R$9.360) na primeira
edição. Em 2002, a revista passou por um período complicado ao acumular €50.000 (cerca de
R$182.500) em dívidas. "50.000 e muito dinheiro, mas falhar com a 11FREUNDE não teria sido o
pior cartão de visitas", confessou Köster em uma entrevista ao vocer.org.

Aos poucos, a revista conquistou espaço e cresceu no mercado alemão com seus temas que
"vão além das perguntas óbvias após o apito" (SCHNEIDER, 2015). Desde 2009, a 11FREUNDE
possui um escritório em Berlim e e lida por grandes nomes do futebol alemão, como Oliver Kahn,

66
Clube de futebol da cidade de Bielefeld, no norte da Alemanha.
67
Estádios que levam o nome de uma empresa patrocinadora do clube, como por exemplo a Allianz Arena do Bayern
de Munique ou o Signal Iduna Park do Borussia Dortmund (ambos estádios levam o nome de seguradoras). No
Brasil, o exemplo mais recente é o Allianz Parque do Palmeiras.
68
Ulrich "Uli" Hesse é um dos grandes nomes do jornalismo esportivo alemão atual. Já fez coberturas musicais para
a edição alemã da revista Rolling Stone e foi editor da revista oficial da UEFA Champions League também em
alemão. Atualmente, é colunista do site ESPN FC e escreve regularmente para a 11FREUNDE. Hesse é autor do
livro Tor! The story of German football, considerado leitura obrigatória para os fãs de futebol alemão.
38

ex-goleiro da seleção alemã e do Bayern de Munique69. Desde junho de 2010, a 11FREUNDE e


parte do catálogo da editora Gruner+Jahr, segunda maior da Europa e detentora de 51% da revista.

O jornalista alemão Jürn Kruse (2010), em reportagem para o site do jornal Die
Tageszeitung, escreveu que o caminho do sucesso da 11FREUNDE “foi e e a antítese da kicker"70.
Para ele, enquanto a kicker oferece um "layout chato e um jogo de palavras banal", a 11FREUNDE
busca "transmitir o sentimento que muitos carregam durante os 90 minutos" de uma partida de
futebol. Martin Schneider (2015), no site do diário Süddeutsche Zeitung, compara como a
11FREUNDE e a mídia tradicional tratam dos mesmos assuntos, a exemplo do clube 1860
Munique: se nos grandes jornais, o time recebe destaque "pela sua incompetência e as ameaças de
rebaixamento", na 11FREUNDE, ganhou a capa da edição 161 pelas "lembranças dos tempos
gloriosos".

Apesar de ser uma publicação futebolística e com funcionários apaixonados pelo esporte,
Hesse (2016) explica que o amor pelo futebol não é o que mais motiva a produção da revista, mas
sim o interesse nas pessoas: "algumas delas são os atletas, outras os torcedores, cuja história nós
queremos contar".

3.2. Estrutura atual

A revista 11FREUNDE e publicada mensalmente entre as penúltima e última semanas do


mês. Desde 2007, a edição de agosto e um especial sobre o início de temporada da Bundesliga
(primeira divisão do campeonato alemão) chamada Sonderheft71. A Eurocopa e a Copa do Mundo
também possuem um Sonderheft próprio. Além disso, nos meses de março e setembro, e publicada
uma edição especial e tematizada, como, por exemplo, a de setembro de 2016 que trata do futebol
na antiga Alemanha Oriental. No final do ano, a publicação também organiza a 11FREUNDE

69
Ao encontrar Kahn para uma entrevista, Tim Jürgens, editor-chefe da 11FREUNDE, levou algumas edições para
que o jogador pudesse entender sobre o que a publicação trata. Kahn simplesmente respondeu: "eu sei, eu leio vocês"
(SÜDDEUTSCHE ZEITUNG, 2015).
70
Segunda revista de esporte mais lida na Alemanha, perdendo apenas para a Sport Bild.
71
O Sonderheft é uma edição com um grande resumo da temporada ou do campeonato que ainda vai começar. Nele,
é possível encontrar a relação completa de times, tabelas de edições passadas ou fatos históricos, por exemplo.
39

Chronik, uma retrospectiva do ano no futebol. A edição mensal da revista costuma ter cerca de 120
páginas, enquanto as especiais possuem em torno de 130. Além da versão física, também e
disponibilizada uma versão digital da revista que pode ser comprada dentro do aplicativo para
celulares e tablets.

De acordo com Hesse (2016), a redação da revista possui cerca de dez jornalistas
contratados, além de mais quatro funcionários responsáveis pelo projeto gráfico e pelas fotos. Mas,
para a produção das edições, a 11FREUNDE ainda conta com redatores freelance. Em cada edição,
cerca de quatro ou cinco textos são produzidos por freelances ou por estagiários. O tempo de
produção de artigos varia muito de acordo com os temas, segundo Hesse (2016). Ele exemplifica,
citando sua última apuração, sobre o retorno das arquibancadas com espaço para a torcida ficar de
pé no estádio do Celtic, em Glasgow. Para tal, Hesse ficou três dias na cidade e precisou de mais
dois dias para a redação do texto e o ajuste dele no layout da revista.

A versão física da edição mensal custa €4,80 (cerca de R$18,00), enquanto um Sonderheft
custa €5,80 (cerca de R$21,00). As edições especiais de março e setembro custam €6,90 (em torno
de R$25,00) e a Chronik, €9,80 (cerca de R$36,00). Na loja online da 11FREUNDE, e possível
encontrar as edições mais antigas por valores mais baratos, começando a partir de €3,00 (em torno
de R$11,00).

Cada edição apresenta diferentes matérias, geralmente, em formato de grande reportagem


e textos mais aprofundados, entrevistas e colunas. Contudo, algumas seções da revista são
basicamente fixas, como será detalhado a seguir.

Zeitlupe (“Câmera lenta”)

Uma coletânea com as fotos do mês. Essas fotos são impressas de forma que ocupam duas
páginas inteiras e são acompanhadas por uma pequena legenda. Em algumas edições, a seção
Zeitlupe ganha uma versão especial, como na edição 177 que, ao invés das fotos do mês, se tornou
uma galeria com cartazes de filmes adaptados para versões futebolísticas.
40

Gehen Sie davon aus – Hans Meyer Wahrheiten (“Vamos assumir que... - Verdades de Hans
Meyer”)

Desde 2011, toda edição da 11FREUNDE traz uma entrevista no formato pingue-pongue
com o ex-jogador e ex-técnico de futebol Hans Meyer, na qual ele, com base em sua carreira,
responde perguntas sobre temas atuais do futebol. A coluna e uma paródia da antiga rubrica do
jornal Die Zeit, na qual o ex-chanceler Helmut Schmidt era questionado sobre política.

Kurzpass (“Passe curto”)

Nos dias de jogo, o site da 11FREUNDE narra as partidas através de um tempo real
(Liveticker). A ideia inicial, implantada pelo editor Dirk Gieselmann, durante a Eurocopa em 2008,
era apenas narrar os principais lances dos jogos, notificando o leitor sobre gols, cartões amarelos e
vermelhos ou faltas, por exemplo. Entretanto, apenas seis pessoas acompanharam a "transmissão".
Gieselmann, então, assumindo que praticamente ninguém estava lendo o que ele escrevia, decidiu
contar piadas e coisas engraçadas. E foi assim que o Liverticker da 11FREUNDE recebeu o Henri-
Nannen-Preis72, o Grimme Online Award73 e uma página na revista, na qual as melhores
publicações durante os jogos são reproduzidas.

Interview des Monats (“Entrevista do mês”)

Toda edição possui uma grande entrevista em formato pingue-pongue com alguma
personalidade do futebol alemão, como jogadores ou técnicos. Em alguns casos, como na edição
164, a entrevista do mês também e a matéria de capa.

Ein Fußballjahr in Bildern (“Um ano de futebol em imagens”)

Como o próprio nome explica, essa seção e dedicada a relembrar os acontecimentos do


futebol, em um determinado ano, com imagens. Uma das fotos recebe destaque pelo seu tamanho
maior e e acompanhada por um pequeno texto explicativo, enquanto as outras possuem uma
pequena legenda, em torno de duas linhas. Na edição 174, por exemplo, o ano escolhido foi o de
1997. A imagem de destaque e a de jogadores do Schalke 04 celebrando o gol de empate nos

72
Premiação dada aos melhores trabalhos jornalísticos.
73
Premiação dos mesmos responsáveis pela renomada versão televisiva, Grimme Awards.
41

últimos minutos do clássico contra o Borussia Dortmund74. Mas o fato curioso: o gol foi marcado
pelo goleiro Jens Lehmann.

Kreisliga B - verrückte Amateure (“Kreisliga B – Amadores loucos”)

A Kreisliga e o conjunto das ligas distritais da que engloba a 7ª até a 15ª divisões do futebol
alemão. A redação da 11FREUNDE busca pelo país as histórias mais curiosas e os fãs mais loucos
de clubes que são parte das ligas distritais. Na edição 169, por exemplo, o leitor e apresentado ao
TSV Selent, time da Kreisliga Plön, e a história de Thies Weisner, jogador do clube que sofreu
uma parada cardíaca em campo e foi salvo graças aos primeiros socorros de seus colegas de time.
O TSV Selent apoiou Weisner, enviando a ele camisas enquanto estava no hospital e organizando
uma ação beneficente para a compra de um desfibrilador. Um ano depois, Weisner retornou aos
campos pelo Selent.

Rot wegen Meckerns (“Vermelho por reclamação”)

Rot wegen Meckerns e a coluna do fundador e editor-chefe da revista, Philipp Köster, na


qual ele debate diversos assuntos como política, sociedade, comercialização e tudo que possa
envolver o futebol. O nome da coluna e uma alusão ao ato do árbitro de futebol de dar cartão por
reclamação (no caso, vermelho) para um jogador.

Rattelschneck

Rattelschneck, derivação humorística da palavra inglesa Rattlesnake (cobra cascavel), e o


pseudônimo dos cartunistas alemães Marcus Weimer e Olav Westphalen. Para a 11FREUNDE, os
dois produzem cartuns humorísticos que retratam cenas em bares, as famosas Kneipes na
Alemanha.

Kunstschuss

Kunstschuss e a união da palavra Kunst (arte) com Schuss (chute) e, no contexto


futebolístico, o termo e utilizado para descrever um chute ou um passe bonito, artístico. Na
11FREUNDE, Kunstschuss e um editorial fotográfico com temas diversos em cada edição. A

74
Revierderby, o maior clássico da região do Ruhr.
42

revista de número 174, por exemplo, trouxe um perfil fotográfico de Maurice Jarnoux, fotógrafo
francês que retratou a seleção francesa em 1955.

Länderpunkt

Um torcedor recebe um Länderpunkt ao assistir uma partida pela primeira vez um estádio
em um Estado ou campo membro de uma federação filiada a FIFA. Essa espécie de "pontuação"
baseada no esquema de Groundhopping, que consiste em visitar o maior número diferente de
estádios possíveis ao redor do mundo. Nesta seção da revista, o repórter visita um país e realiza
atividades típicas de um torcedor que pratica o Groundhopping. Na edição 146, por exemplo, a
Austrália foi o país escolhido. O repórter responsável pela matéria assistiu jogos em estádios locais
e acompanhou partidas em bares. Um dos objetivos dessa seção e relatar a relação da população
local com o futebol.

Probetraining (“Treino teste”)

Espaço dedicado a indicação de livros, filmes, blogs e fanzines dedicadas ao futebol.

Quiz

Toda edição da 11FREUNDE vem com um quiz que oferece premiação aos leitores. O
estilo do jogo varia, podendo ser questões de múltipla escolha sobre as regras do futebol, como na
edição 146, ou até mesmo uma brincadeira para adivinhar a qual estádio pertence determinado
mostrador de placar, como na edição 169.

Gästeblock (“Setor visitante”)

Simplesmente um espaço para as cartas ou e-mails dos leitores.

Der Fußball, mein Leben und ich (“O futebol, minha vida e eu”)

Espaço geralmente dedicado a entrevistas com ex-jogadores que não tiveram uma carreira
tão gloriosa como, por exemplo, Lajos Detari: jogador húngaro mais caro da história da Bundesliga
em 1988, mas que, hoje, não e lembrado pela mídia.
43

Auswärtsspiele (“Partidas fora de casa”)

O termo Auswärtsspiele e utilizado para denominar as partidas que um time joga "fora de
casa", ou seja, fora de sua cidade. Nesta seção, a redação abre espaço aos torcedores que visitam
estádios ao redor do mundo, para que eles compartilhem fotos e histórias com os leitores da revista.
Na edição 169, por exemplo, foram escolhidos estádios como o Jeju World Cup Stadium (Coreia
do Sul), o Albert Park (Escócia) e o Stadion Rajko Mitic (Sérvia).

Schweigeminute (“Minuto de silêncio”)

Espaço dedicado a relembrar jogadores que já faleceram.

Günter Hetzer

A última página da 11FREUNDE e dedicada a coluna humorística de Günter Hetzer -


pseudônimo do editor-chefe Philipp Köster.

3.3. O projeto gráfico

De acordo com a Associação de Designers Gráficos do Brasil (apud GRUSZYNSKI E


CHASSOT), o projeto gráfico de uma revista ou de qualquer outro periódico engloba o
planejamento relativo à identidade visual e a atividade que articula texto e imagem nas páginas da
publicação, "a fim de facilitar a leitura e a diferenciação dos textos pelo leitor". (GRUSZYNSKI E
CHASSOT, 2006).

Gruszynski e Chassot (2006) explicam que o projeto gráfico de uma publicação é uma
forma de dialogar com públicos específicos, gerando rápida identificação e reconhecimento em
meio a outros materiais. As autoras ainda destacam a importância do design gráfico em uma página,
especialmente no que se refere à "identidade do produto e conquista de um público cada vez mais
disputado por concorrentes" (GRUSZYNSKI E CHASSOT, 2006).

Uli Hesse, jornalista da 11FREUNDE e autor do livro Tor! - A história do futebol alemão,
segue o pensamento das autoras, especialmente quando se trata da revista na qual trabalha. De
44

acordo com ele, a 11FREUNDE se encaixa em um grupo restrito de revistas que, raramente,
utilizam fotos de agências.

Isso significa que, para quase todos os nossos textos, nós contratamos um fotógrafo
especialmente para fazer as fotos. Em uma matéria que fiz em Glasgow, fui acompanhado
por um fotógrafo escocês, a quem contei previamente sobre a história que eu iria apurar e
quais tipos de fotos eu gostaria de fazer (HESSE, 2016).

De fato, ao folhear uma edição da 11FREUNDE, fica explícito, até mesmo para os que não
falam alemão, a importância da fotografia para a revista. Com o objetivo de comprovar tal tese,
serão analisadas a seguir as edições 146, 164 e 174. Na tabela abaixo, estão contabilizados o
número de páginas e de fotos, a quantidade de fotos próprias (ou seja, fotos produzidas por um
fotógrafo contratado especialmente para a matéria), o número de páginas ocupadas inteiramente
com uma ou mais fotos e a quantidade de ilustrações ou infográficos:

Figura 2: Tabela com levantamento da utilização de imagens nas edições 146, 164 e 174 da revista 11FREUNDE
(Fonte: Elaborada pela autora).

Por meio da tabela, é possível comprovar a fala de Hesse (2016) ao destacar a utilização de
fotos pela revista. Cerca de 30% das páginas da publicação são ocupadas inteiramente por uma ou
mais fotos. No que se refere à produção original, a utilização de fotos feitas por fotógrafos
especialmente contratados varia de 29% da quantidade total de fotos (edição 146) a 61% (edição
174). Ou seja, em determinada edição, mais da metade das fotos utilizadas foram produzidas
exclusivamente para as reportagens.

Na tabela, observa-se também que a revista não faz questão de utilizar grande quantidade
de ilustrações ou infográficos. O foco maior é, de fato, na fotografia. Vale a pena mencionar que,
45

das páginas ocupadas inteiramente com uma ou mais fotos, uma média de 20 são dedicadas à
fotorreportagens, ou seja, matérias no qual a informação principal está contida nas imagens. Estas,
são acompanhadas por pequenas notas ou apenas por uma legenda explicativa.

É importante observar outros dois aspectos do projeto gráfico de uma publicação destacados
por Gruszynski e Chassot (2006) e também por Castedo (2005): o diagrama e a tipografia.

O diagrama de uma revista deve sugerir a ideia de ordem e tornar a leitura de textos e
imagens mais clara (GRUSZYNSKI E CHASSOT, 2006). É durante o processo de diagramação
que são definidos os números de colunas e o espaço entre as mesmas e também as margens da
página. É a partir do diagrama que o designer irá organizar o conteúdo da página e também criar
diferentes layouts sem fugir da estrutura pré-definida (CASTEDO E GRUSZYNSKI, 2005).
Seguindo esses critérios, a 11FREUNDE apresenta três colunas por página com uma distância de
0,7cm entre elas. O texto na página não é justificado, mas sim alinhado à esquerda.

Já a tipografia é, segundo Gruszynski e Chassot (2006), elemento fundamental para manter


as características da publicação. As autoras explicam que, as fontes lineares (ou seja, sem serifa)
são geralmente utilizadas em matérias que tenham necessidade de grandes corpos de texto. Nas
revistas, seriam títulos, subtítulos e olhos, por exemplo. Já as fontes com serifa, são utilizadas para
grandes quantidades de texto e com corpo de fonte menor. No que se refere à 11FREUNDE, esse
padrão é seguido inclusive no website da revista. Dessa forma, a identidade visual é mantida em
todas as plataformas.

Por fim, outro aspecto que merece destaque na revista estudada é a utilização de páginas
especiais para determinadas matérias. Em outras palavras, páginas que diferem do padrão clássico
com fundo branco e texto em cor preta, seja apenas por um detalhe na borda, mudança na cor do
título e subtítulo ou por uma mudança total na coloração. Como foi o caso da reportagem Von Liebe
und Tod ("Por amor e morte"), publicada na edição 16475. A reportagem trata sobre o Boca Juniors,
clube de futebol argentino, e as páginas foram adaptadas às cores do clube: fundo amarelo e
elementos textuais em azul.

75
Material disponível nos Anexo B deste trabalho.
46

Ainda na mesma edição, a reportagem Auferstanden in Ruinen ("Ressurgido das ruínas") é


mais um exemplo. A matéria trata da promoção do SV Darmstadt à primeira divisão. Mais uma
vez, as cores do clube são utilizadas para caracterizar a página: bordas e elementos textuais –
inclusive o texto da reportagem – em azul. Por fim, um terceiro exemplo pode ser observado na
reportagem Was bleibt (“O que fica”), da edição 174, sobre a cultura de torcida na França e na
Bélgica: bordas e elementos textuais em vermelho, a cor comum nas bandeiras dos dois países.

Além disso, seções fixas, como a coluna do editor-chefe Philipp Köster (Rot wegen
Meckerns) ou o obituário também possuem detalhes com cores diferentes das páginas padrões. Tal
tática é importante, pois, como explica Barbosa (apud GRUSZYNSKI E CHASSOT, 2006), o
primeiro acesso à informação por parte do leitor se dá no manuseio da revista, pois, em geral, ele
folheia o material antes de ler. O autor finaliza, explicando que o aspecto gráfico é de grande
importância para a seleção da leitura. Afinal, uma página toda em amarelo, sem dúvidas, sobressai
sobre as outras.

3.4. Análise de reportagens

Para melhor compreender o trabalho da revista 11FREUNDE, serão analisadas três


diferentes reportagens. A primeira e uma matéria perfil sobre o jogador Freddy Adu (edição 164);
a segunda, uma reportagem sobre o clube argentino Boca Juniors (edição 164). Já a terceira e a
reportagem de capa da edição 174, que trata sobre futebol amador.

Será possível notar a presença de características do New Journalism, que, de acordo com
Bulhões (2006), trouxe uma "nova textualidade jornalística, desatrelada da pasteurização e do
pragmatismo noticiosos". Características desse movimento destacadas Wolfe (apud BULHÕ ES
2006), como o registro de gestos de personagens, detalhamento espacial ou presença de diálogo,
também poderão ser notadas nas reportagens analisadas.
47

Das Adu Experiment (“O experimento Adu”)

Todo jornalista sabe o quanto e difícil produzir uma reportagem sem apuração ou com uma
pesquisa malfeita. Magno (2006) afirma que o "corte no tempo da apuração" e uma das dimensões
do "calvário da grande reportagem". Em alguns casos, nos quais a entrevista com um personagem
e necessária para a produção da matéria, a situação pode ficar complicada quando o entrevistado
se recusa a falar. E foi basicamente isso que aconteceu com o repórter Andreas Bock e o fotógrafo
Tuomas Uusheimo durante a produção da reportagem Das Adu Experiment.

"Foi em 2003, que seu nome (de Freddy Adu) surgiu pela primeira vez na mídia
internacional" (BOCK, 2015). Na época, com apenas 12 anos, Adu já era considerado a maior
promessa do futebol norte-americano. Entretanto, a criança prodígio não seguiu o caminho do
sucesso e, hoje, o nome de Adu não figura mais nos noticiários internacionais. Na época em que a
reportagem foi publicada, o jogador estava no Kuopion Palloseura, clube da Finlândia. Desde
então, Adu foi emprestado ao Soccer Club Kuopio Futis-98 (também da Finlândia) e, atualmente,
e parte do elenco do norte-americano Tampa Bay Rowdies. As expectativas sobre o futuro de Adu
são relatadas por Bock já na abertura da reportagem:

Originalmente, essa história deveria começar em um outro lugar. No Maracanã, com as


mãos na taça da Copa do Mundo; na Casa Branca, ao lado de Barack Obama ou, pelo
menos, em uma Lamborghini de alta velocidade. Se os especialistas estivessem corretos,
essa história não começaria, de forma alguma, em uma praça de mercado de uma província
finlandesa, mais exatamente: em Kuopio, 400 quilômetros ao norte de Helsinki, quatro
graus em uma tarde de quarta-feira, final de abril (BOCK, 2015, p. 76).

Bock e Uusheimo haviam recebido uma promessa do porta-voz do Kuopion, Mikko


Seppälä, de que teriam um encontro com Adu para realizar a entrevista, mas isso nunca aconteceu
e as tentativas de conseguir fazer uma ou outra pergunta ao jogador foram narradas ao longo da
reportagem. A primeira tentativa ocorreu na manhã de uma quarta-feira, após um evento realizado
por um dos patrocinadores do clube. Adu, que havia se demonstrado totalmente indiferente durante
a cerimônia, dispensou os jornalistas dizendo que "não tinha tempo".

A segunda tentativa ocorreu no mesmo dia, na parte da tarde, após o treino do Kuopion.
Mais uma vez, Adu se recusou a falar com os jornalistas que, dessa vez, disseram ter sido
anunciados. "Ninguém falou comigo, esclareçam isso com Mikko", disse Adu. O problema,
relatado por Bock no texto, era o fato de que o porta-voz não podia ser encontrado: "ele desligou o
telefone". Seppälä só entrou em contato novamente na tarde do dia seguinte, quinta-feira,
48

explicando que a entrevista aconteceria após o jogo do Kuopion. Contudo, mais uma vez, os
jornalistas receberam uma resposta negativa.

A forma encontrada por Bock para suprir a ausência da entrevista com o jogador e conseguir
produzir a matéria foi criar uma narrativa, mesclando a história de vida do jogador com fatos atuais
e observados pelo jornalista durante a estadia na Finlândia. Em entrevista, Bock contou que,
passada a frustração inicial, escrever o perfil de Adu se tornou mais fácil graças a observação.
"Entrevistas com jogadores profissionais quase nunca são produtivas", afirmou. Inspirado em um
perfil sobre Frank Sinatra escrito por Gay Talese76, o jornalista percebeu que estava em um
ambiente favorável para sua apuração.

O Kuopion não e um time grande, o centro de treinamento e uma estrutura amadora e nós
tínhamos liberdade de caminhar por lá. Eu observei Adu muito bem nos treinos, nos jogos,
no vestiário, durante a massagem. E, em algumas oportunidades, eu conversei com ele,
não em uma entrevista clássica, mas sim em um bate papo espontâneo. Eu acho que, com
isso, o perfil ganhou mais emoção. Ficou mais cheio de vida (BOCK, 2016).

As palavras de Bock seguem o pensamento de Magno (2006) que afirma que "a fonte
principal da reportagem são os olhos e os ouvidos do repórter". Para ela, uma boa reportagem e
"necessariamente fruto de uma observação cuidadosa". Ainda sobre a construção do texto, Bulhões
(2006) observa os aspectos literários do jornalismo ao apontar que, na literatura, e construída uma
"realidade centrada no modo com (as palavras) se arranjam, se articulam, se movimentam".

E interessante observar que, ao longo da matéria, Bock cria uma tensão no leitor e a
curiosidade de saber se, afinal, Adu concedeu ou não a prometida entrevista. Vilas Boas (1996)
aponta que essa técnica de "retardar o clímax", funciona como uma "bomba injetora de tensão". O
acontecimento e os fatos podem ser retardados, de acordo com o autor, por meio de "referências
ao interior dos personagens, às lembranças, temores, percepções, desejos". No caso da matéria
sobre Freddy Adu, Bock utiliza-se de diálogos com funcionários do clube ou do resgate de fatos
sobre a carreira do atleta, por exemplo.

Junto de sua observação pessoal, Bock também utilizou-se das seguintes técnicas para a
construção do texto:

76
Gay Talese foi um dos grandes contribuidores do New Journalism. A reportagem a qual Bock se refere, é um perfil
sobre Frank Sinatra, no qual Talese realizou uma entrevista com o cantor norte-americano. Ao invés disso, ele
observou Sinatra durante um mês e, frequentemente, acompanhava o cantor onde quer que ele ia. De acordo com
Bock, Talese considerava a observação muito mais importante que a entrevista.
49

 Buscou depoimento de amigos, como forma de conhecer melhor o passado do jogador;

Um amigo contou, mais tarde, sobre o seu primeiro encontro com Adu. O menino-prodigio
estava na quarta série e, em um determinado domingo, ele deveria se juntar para um jogo
entre dois times da escola. Adu apareceu com uma camisa laranja e uma touca do Mickey
Mouse. Os adversários riram, mas, assim que a bola rolou, ele [Adu] driblou todos até
coloca-la dentro do gol. A partir daí, ninguém mais riu (BOCK, 2015, p. 76).

 Utilizou o histórico profissional do jogador e as expectativas na época que ele era uma das
maiores promessas do futebol;

Em 2011, Adu retornou aos Estados Unidos. No Philadelphia Union, ele jogou bem, mas
era para ser assim? O jovem, que estava a caminho de revolucionar o futebol mundial,
estava de volta em casa, encalhado, fracassado. Em 2012, ele foi embora de novo. Foi
mais um erro, disse Adu mais tarde. Nem no Brasil, no EC Bahia, nem no FK Jagodina,
na Sérvia, ele encontrou felicidade. No início de 2015, ele teve que constatar que, nos
últimos dois anos e meio, ele jogara apenas 59 minutos (BOCK, 2015, p. 79).

 Utilizou o relato de um jogo do Kuopion e também do histórico do clube;

A partida contra o VPS Vaasa se arrastou com muitos passes errados e quase nenhuma
chance de gol. Kuopion venceu por 1:0, mas o verdadeiro ponto alto foi uma gaivota que,
aos 80 minutos de jogo, debaixo dos gritos da torcida, cagou em campo (BOCK, 2015, p.
79).
Antes, nos anos 1960 e 1970, o Kuopion jogava frequentemente os torneios europeus. Ate
mesmo Michel Platini já passou por aqui com o Saint-Etienne durante a Copa da UEFA
em 1980 (BOCK, 2015, p. 76).

 Trouxe para o artigo falas do jogador em entrevistas antigas;

Ele [Adu] tinha 18 anos e, enquanto para a maioria dos jogadores dessa idade a carreira
mal começara, parecia, para Adu, que seu tempo já havia passado. Suas próprias
entrevistas não lembravam mais o entusiástico jovem de antigamente, mas soavam como
lemas de resistência: "Eu quero permanecer, na lembrança das pessoas, como alguém que
deu tudo de si" (BOCK, 2015, p. 79).

 Descreveu ambientes e reproduziu conversas;

Na manhã̃ de sexta-feira, as nuvens ainda pairam de forma mais pesada sobre Kuopio do
que no dia anterior. Freddy Adu sai da reunião com o time e vai direto para o carro. O
porta-voz Mikko Seppälä está, novamente, submerso. Celular desligado, nenhum SMS.
Adu ri: "ele está se escondendo de vocês". O que o seu agente disse? "Sem entrevistas,
primeiro eu tenho que entrar em forma!". Por que a Finlândia? "Porque eu quero
permanecer em paz!". E qual livro você̂ esta lendo agora? "Ei, isso vai se tornar uma
entrevista?" (BOCK, 2015, p. 79).

 Apurou em redes sociais.

À noite, o repórter e o fotógrafo leem a timeline do Twitter de Adu, do início ao fim. No


final de marco de 2015, ele citou Winston Churchill. (...) Alguns segundos depois, um
novo tweet apareceu em sua timeline: "Acabei de ver 'Avengers' no cinema". Foi muito
50

bom. Mas estou muito animado para ver 'Batman vs. Super-Homem'" (BOCK, 2015, p.
79).

Como pode ser observado, o que era para ser uma simples entrevista, se tornou um
processo de observação e pesquisa muito mais denso e elaborado. Bock e Uusheimo
conseguiram, através da apuração, da observação do ambiente ao seu redor e de uma narrativa
literária, fazer com que a reportagem ganhasse espaço na edição 164. A leitura do Twitter de
Adu, inclusive, rendeu a matéria uma conclusão poética, propiciando ao leitor "pelo menos
uma leve satisfação e acirramento dos ânimos" (VILAS BOAS, 1996):

Adu ligou o motor. O repórter bateu mais uma vez no vidro para uma última pergunta.
Quem venceria: Batman ou Super-Homem? Freddy Adu ergueu os ombros. "Os dois não
são invencíveis? (BOCK, 2015, p. 79).

Von Liebe und Tod (“Por amor e morte”)

"Este som. Que som! E possível ouvi-lo de longe, bem antes da partida. (...) E então no
estádio. As pessoas não apenas o escutam. As pessoas o aproveitam". Foi assim que Jan Christoph
Wiechmann iniciou a reportagem, da edição 164, que traz a história e a relação dos torcedores com
o Boca Juniors, time de futebol argentino da capital Buenos Aires. Já pela abertura, e possível notar
características do jornalismo literário, em especial a libertação da "primazia do lead" (NECCHI,
2009). Para Vilas Boas (1996), a clássica pirâmide invertida não e necessária para as revistas, mas
sim uma "abertura envolvente" para conquistar o leitor.

O Boca Juniors, que ainda e considerado um dos maiores clubes da América do Sul, já
viveu momentos mais gloriosos, especialmente entre os anos 1995 e 2007. Neste período, o Boca
Juniors era gerenciado por Mauricio Macri – atual presidente da Argentina - e conquistou 17 títulos,
entre eles quatro Libertadores. Entretanto, apesar de não viver mais uma época dourada, o Boca
chama a atenção da 11FREUNDE por ser um clube, no qual a relação da torcida com o time e
rodeada de paixão, violência, mitos, política, conflitos sociais e rivalidade com os vizinhos River
Plate.

Para a produção da reportagem, Wiechmann e o fotógrafo Joao Pina foram até o bairro de
La Boca, em Buenos Aires, onde está localizado um dos maiores símbolos do clube: o estádio La
51

Bombonera que, para os torcedores, "e um lugar sagrado, um status de histórias e mitos" do Boca
Juniors no bairro argentino.

Durante este período, os jornalistas assistiram a uma partida entre Boca e River Plate, o
Superclásico - o maior da Argentina e, talvez, das Américas. Na redação do texto, Wiechmann usa
e abusa das descrições de suas observações. Dessa forma, a reportagem se encaixa no estilo
narrativo, caracterizado por Vilas Boas (1996) "pela referência a ação de pessoas, descrições de
circunstâncias e objetos". Recriar a realidade vivida aos olhos do leitor (VILAS BOAS, 1996) e
uma forma de aproximar o repórter de seu público-alvo:

O som então se espalha pelo corpo. As pessoas o aproveitam nas calçadas, nas catacumbas
e nas escadas. (...) O som vem dos Populares, das arquibancadas de pé, de mais de dez
mil torcedores. Eles pulam e aterrissam sobre o concreto. Pulam e aterrissam. Batem com
os pés. Repetidamente, sem pausa. (...) O vestiário dos adversários fica debaixo das
arquibancadas. (...). Quando um informante relata aos torcedores que o técnico começou
o seu discurso, então eles pulam e batem ainda mais forte com os pés. Tão alto, que
nenhum jogador abaixo deles consegue entender uma palavra (WIECHMANN, 2015, p.
82).

A enorme rivalidade entre os clubes e explicada pelo autor por meio da informação de que
a torcida do River Plate não está presente: ha três anos, em jogos válidos pela Primera Division, os
visitantes não têm entrada permitida nas partidas fora de casa. "Já aconteceram muitos distúrbios,
muitas mortes" (WIECHMANN, 2015). Ou então, por meio da fala do atual presidente Daniel
Angelici, ao explicar que, apesar de o River possuir mais títulos nacionais (36 contra 30 do Boca),
pelo menos o "clube do povo nunca foi rebaixado".

A rivalidade contra o River se espalha por todo o bairro de La Boca, onde, de acordo com
o repórter, e possível encontrar pichações em azul e amarelo – cores do clube - nas paredes, como:
"com os Milionários, não existe democracia". Milionários e o apelido dos torcedores do River
Plate. Enquanto o River representa a elite, o "Boca e o povo". A relação dos moradores de La Boca
com o time também e relatada por Wiechmann:

Aqui, em La Boca, eles até mesmo proclamaram uma república independente após uma
greve trabalhista. Eles têm orgulho de suas origens modestas, imigrantes italianos do
século XIX, eles têm orgulho das suas pequenas casas coloridas, dos guindastes, dos
armazéns, do aroma de suor, ferro e trabalho pesado. O clube sempre esteve fundido com
o seu bairro. Todo o distrito e pintado em azul e amarelo: caixotes de eletricidade, escadas,
até mesmo algumas mercearias e os terços de motoristas (WIECHMANN, 2015, p. 84).

A violência que envolve bairro e clube também e retratada na reportagem. "Ha brigas entre
os mesmos torcedores. Boca contra Boca. River contra River", escreve Wiechmann, após ouvir de
52

seu entrevistado e ex-jogador do Boca, Antonio Rattin, que, no futebol argentino, "tudo gira em
torno de poder e dinheiro". A brutalidade e ilustrada na reportagem pelo relato do caso de um
assassinato de dois torcedores do River após um Superclásico. O Boca perdeu para o rival por 2:0
e, em seguida, os corpos foram encontrados com o recado: "nós empatamos".

Tomando a análise de Necchi (2009) como base, e possível observar no texto de


Wiechmann recursos "típicos da literatura", como a profunda observação e a imersão total na
história a ser contada, a partir do momento que o repórter vai além do clube em si e destaca aspectos
sociais e políticos que cercam o local no qual ele se encontra.

O fanatismo violento pelo lado do Boca fica por conta dos Barra Brava, a torcida
organizada do clube, cuja liderança "constitui uma agremiação criminosa, uma máfia do futebol".

Eles lucram com a atribuição de ingressos. Eles comandam o pagamento dos


estacionamentos e, quem não quiser pagar 100 Pesos, pode busca-lo no ferro velho. (...)
Em um Boca x River, eles contrabandearam, para dentro do estádio, centenas de
torcedores sem ingresso pelo valor de 300 dólares cada. A Argentina e o único país, no
qual os Hooligans tornaram a fidelidade ao clube em um trabalho em tempo integral
(WIECHMANN, 2015, p. 86).

O problema nos estádios e também com os Barra Brava e um reflexo da situação externa
no bairro de La Boca. Durante a produção da reportagem, os jornalistas da 11FREUNDE não
ficaram imunes a violência do local. Após saírem de uma coletiva de imprensa na sede do Boca
Juniors, a 500 metros de La Bombonera, os dois foram abordados por um homem que perguntava
se eles precisavam de ingressos. Ao receber atenção, o homem ergueu uma pistola e apontou para
os jornalistas, exigindo que lhe entregassem as bolsas.

Um carro com vidros escuros aproximou-se e esperou o bandido entrar. Talvez o Boca
seja o único "World King of Clubs" que consegue levar dez mil torcedores ao Japão. Mas
também e único, no qual alguém pode ser assaltado após uma coletiva de imprensa
(WIECHMANN, 2015, p. 85-86).

A adição desse relato enriquece a matéria, pois da ao texto "pequenos toques humanos, que
até podem não ser fundamentais para impulsionar a narrativa" (VILAS BOAS, 1995), mas que
aproximam a realidade do repórter a do leitor. Para Necchi (2009), essa e mais uma das
possibilidades do jornalismo literário, no qual o jornalista pode ser "observador ou até participante
da ação", além de deixar de lado alguns "mitos do jornalismo, como a impessoalidade".

E claro, como não poderia faltar em uma grande reportagem, Wiechmann nos apresenta um
personagem que, de fato, vive todo esse contexto relatado no texto. Toti, torcedor do Boca Juniors,
53

que conta possuir 150 brigas em sua vida. Ele e trazido a matéria para comprovar a loucura e o
fanatismo pelo clube já citado ao longo do texto. A paixão de Toti pelo Boca Juniors e apresentada
por meio de diálogos entre o torcedor e sua esposa. Para Vilas Boas (1996), "um diálogo curto,
bem construído, vale por parágrafos e mais parágrafos descritivos ou argumentativos".

Toti empacota suas coisas para uma viagem ao norte. Ele vende artigos de merchandising
do clube. Ele também possui uma empresa de construção graças aos seus contatos com os
Barra. “Diz para eles que tipo de torcedor eu sou”, pede ele a sua mãe, que está ao seu
lado. “Você sempre tem apenas o Boca na cabeça”, diz a mãe. “Não, eu sou doente. Eu
tenho a doença do Boca”. “Sim, você é doente”, responde ela. “Eu já roubei por causa do
Boca”, confessa Toti. “O que?”, diz a mãe. “Disso eu não sabia” (WIECHMANN, 2015,
p. 87).

Wir müssen alle Montag arbeiten (“Nós temos que trabalhar toda segunda-feira”)

Um dos fatos que mais chamam atenção na 11FREUNDE e o tratamento que a publicação
da ao futebol amador na Alemanha. Além de possuir uma seção fixa para falar sobre histórias da
Kreisliga, por exemplo, por vezes, as divisões inferiores são assuntos de grandes reportagens e até
mesmo de capa - como foi o caso da edição 174, intitulada Vergesst die Bundesliga. Hier kommen
die Amateure ("Esqueça a Bundesliga. Ai vem os amadores”).

Em cerca de três semanas, os repórteres Andreas Bock e Ron Ulrich fizeram um tour pela
Alemanha junto com o fotógrafo Norman Konrad, o que possibilitou uma profunda imersão na
história e bases para que a matéria final não fosse obtida apenas por meio de entrevistas (VILAS
BOAS, 1996). De acordo com Bock, a maioria das histórias foram previamente pesquisadas.
Outras, entretanto, foram descobertas ao longo da produção, como, por exemplo, o caso do Indian
Football – time de futebol formado apenas por indianos – ou da AuS TV, canal na web dedicado
ao futebol amador.

Bock explica que o futebol amador vem se tornando novamente interessante na Europa
devido a "turbo comercialização" do futebol profissional. Ele explica que muitos torcedores
acabam ficando para trás neste processo, pois não podem mais bancar os ingressos ou simplesmente
não se sentem mais atraídos por toda modernização. Esses torcedores, de acordo com Bock, buscam
"a beleza nas coisas pequenas" e "histórias ainda não vividas, que jogos como o centésimo
confronto entre Bayern de Munique e Real Madrid não podem contar".
54

Eles (os torcedores) encontram essas histórias nas ligas mais baixas. Ali, eles não são
apenas clientes, mas sim participantes ativos da vida do clube. Deixam de ser espectadores
e se tornam atores. Fazem fanzines, transmissões de rádio, programas de TV. Eles realizam
o futebol com o que amam. Um futebol que não deve ser perfeito, mas de coração (BOCK,
2016).

Na reportagem analisada em questão, os dois jornalistas usam a pauta para "fugir de olhares
pré-formatados" e produzem um texto que surpreende ao "romper com visões obvias e
hegemônicas sobre a realidade" (NECCHI, 2009). Além disso, a partir do momento que uma revista
de grande circulação decide dedicar dez páginas em uma edição ao futebol amador, os responsáveis
pela reportagem fazem o que Pena (2006) chama de "evitar definidores". Ou seja, tiram o foco das
grandes ligas, dos jogadores profissionais e criam alternativas aos "personagens já legitimados,
ouvindo o cidadão comum, a fonte anônima, as lacunas, os pontos de vista que nunca foram
abordados" (PENA, 2006).

Algumas técnicas já citadas ao longo deste texto também podem ser observadas nesta
reportagem, como a recriação da realidade de forma a "encurtar a distância entre o leitor e o
acontecimento" (VILAS BOAS, 1995):

Nesta tarde de sábado, começo de abril, começa tudo de novo. Ate mesmo Egon Eiche77
ajuda, questão de honra. Ele carrega engradados de cerveja do armazém para o balcão,
posa para fotos com as crianças, cumprimenta o time e anima os torcedores com tambores,
artifícios e canções. Supostamente, ele poderia até marcar um gol, mas, até mesmo na
Kreisliga, existem regras: uma mascote em uma gigante roupa de esquilo como jogador –
isso não e permitido (BOCK E ULRICH, 2016, p. 42).

Bock e Ulrich também utilizam sequências narrativas (LAGE, 2005) com o presente verbal
ao contar fatos ocorridos no passado (SODRE E FERRARI, 1986). Tal artifício e especialmente
utilizado para descrever ações de personagens e, de acordo com Sodré e Ferrari (1986), e mais uma
forma de aproximar o leitor da cena, "transformando a narração numa imagem quase
cinematográfica", como pode ser observado no trecho a seguir:

A cerca 300 quilômetros noroeste de Ragösen, próximo a Hamburgo, Monty e mais três
amigos aguardam na estação de ônibus Geesthacht. Eles são torcedores do TSV Gülzow
e hoje viajam para a partida fora de casa contra o terceiro time do Escheburger SV,
Kreisklasse 8, mais baixo isso não fica (BOCK E ULRICH, 2016, p. 44).

O profundo humanismo e a quebra da impessoalidade por parte dos jornalistas são


perceptíveis nas intervenções ao longo do texto com opiniões, reflexões ou comentários próprios

77
Mascote do SV Eiche Ragösen, time participante da matéria.
55

que, segundo Coimbra (apud VILAS BOAS, 1996), criam um diálogo com o leitor. Isso pode ser
observado no trecho abaixo:

Quando alguém está na lateral do campo, seja aqui em Escheburg ou em Ragösen, e como
se as pessoas tivessem alcançado uma forma em miniatura da Bundesliga. Com a diferença
de que o futebol delas ainda possui muito daquilo que se perdeu no inchado aparato
profissional: humor, participação, união. Com cantos, bandeiras e histórias próprias. Com
o bom sentimento de que ninguém prescreve quando e como eles devem bater palmas
(BOCK E ULRICH, 2016, p. 44).

Detalhes da aparência, modos ou da forma como o entrevistado fala também são estratégias
utilizadas por Bock e Ulrich. Vilas Boas (1996) aponta que, além de ser uma maneira de "manter
viva a atenção do leitor da página", também e uma forma de fazer o personagem parecer real. Foi
o caso de "Kauli". Seu jeito engraçado de falar foi retratado da mesma forma no texto. O trecho a
seguir e como, de acordo com Bock e Ulrich, o personagem Kauli teria falado: "Pssst! Wir ham
zwee Pyrostäbe aus Polen jekooft. Musste 'n Foto mache gleich!". Entretanto, no alemão
tradicional e escrito, a fala seria: "Wir haben zwei Pyrostäbe aus Polen gekauft. Musste ein Foto
machen gleich!" ("Nós compramos dois sinalizadores poloneses. Temos que tirar uma foto!). O
interessante e que, ao longo do parágrafo, os repórteres escrevem algumas palavras da forma que
Kauli pronunciaria, trocando g por j.

Por fim, observamos ao longo desta reportagem a forma como os dois jornalistas alemães
se utilizam das técnicas do jornalismo literário a partir do momento em que "cumprem a missão de
informar, porém com ganho em vocabulário, estrutura narrativa e aprofundamento de conteúdo"
(WEIGE, 2013). Bock e Ulrich se encaixam em uma categoria de repórteres cada vez mais sumida
e definida por Kotscho (1989) como aqueles "dispostos a encarar o desafio de entrar de cabeça num
assunto, esquecer de tudo o mais para, no fim, ter o prazer de contar uma boa história".

3.5. Pesquisa de opinião

Para a produção desta monografia, foi realizada uma pesquisa de opinião com leitores da
11FREUNDE. A pesquisa foi realizada entre os dias 18 e 28 de setembro e teve como objetivo
verificar a satisfação dos leitores com os artigos publicados na revista. 123 pessoas responderam
ao formulário criado no Google Forms.
56

Atingir o público-alvo da pesquisa não foi fácil. Os resultados mostraram que 83% dos
entrevistados moram na Alemanha. Para alcançar essas pessoas, a pesquisa foi, primeiramente
compartilhada entre amigos por meio de redes sociais, como Twitter e Faccebook. Buscando atingir
um público maior, possíveis entrevistados foram procurados em fóruns sobre futebol amador. Por
fim, a pesquisa foi compartilhada no Reddit, que também funciona como uma espécie de fórum.

Os resultados finais mostraram que a maioria dos leitores da 11FREUNDE (62%) não
possuem frequência de compra definida. Apenas 10% dos entrevistados compram a revista todo o
mês. O número de assinantes é ainda menor, com 8%. Apesar disso, 17% dois leitores se disseram
“muito satisfeitos” com os artigos publicados na revista, enquanto 59% se consideram “satisfeitos”.

Questionados com perguntas abertas sobre o motivo de lerem a revista, boa parte dos
leitores respondeu que era devido aos artigos interessantes, bem escritos, com boas histórias e que
oferecem um jornalismo alternativo, fugindo do mainstream. As reportagens sobre os clubes de
ligas inferiores foram citadas como razão para comprar a revista, assim como o tom de humor
utilizado nas reportagens.

Perguntados também com perguntas abertas sobre como a revista poderia ser melhor, foram
pedidos mais artigos sobre táticas, mais artigos históricos e mais artigos sobre o futebol africano e
asiático. Enquanto uns alegaram que a revista já é perfeita, outros reclamaram do preço e de alguns
artigos, que são exageradamente engraçados. Curiosamente, alguns leitores criticaram o layout e a
grande quantidade de fotos utilizadas na revista. Pedidos de publicações mais frequentes e textos
mais longos e aprofundados também foram relatados.

A maioria dos leitores da 11FREUNDE possuem mais de 30 anos (32%), enquanto os


menores de idade somam apenas 11%. Além dos já citados 83% moradores da Alemanha, 2,4%
dos leitores são da Áustria, 2,4% da Suíça e curiosos 4% dos Estados Unidos. Entre os que vivem
na Alemanha, a maior parte vem do estado da Renânia do Norte-Vestefália (20,6%), seguidos pelo
estado da Baviera (15,9%).

Entre os clubes, o Bayern de Munique lidera com 34,1% dos leitores. Em segundo lugar,
ficam os torcedores do Borussia Dortmund (10,5%) e, em terceiro, do Hamburgo (8,9%). Os
leitores que torcem para times fora da Alemanha somam 9,3%.
57

CONCLUSÃO

O presente trabalho de pesquisa durou cerca de oito meses, entre elaboração do pré-projeto,
leitura de material bibliográfico, entrevistas, pesquisa de opinião, escolha e análise de reportagens
e a redação final da monografia. A produção deste trabalho acadêmico foi a oportunidade não
apenas para ler textos interessantes e esclarecedores sobre futebol e cultura, mas também de
aprofundamento no conhecimento de uma revista, pela qual a pesquisadora possui grande afeição
– por isso também a dificuldade de se distanciar do objeto de estudo. Em especial, as entrevistas
com jornalistas da 11FREUNDE foram extremamente enriquecedoras acadêmica e pessoalmente.

O texto aqui apresentado buscou expor características jornalísticas e culturais de um país,


até certo ponto, não muito conhecido para os brasileiros. E são justamente essas exposições, junto
com a apresentação do objeto de estudo, que oferecem algo novo no campo da comunicação social.
Além disso, é possível dizer que esta pesquisa deixará um legado de informações para aqueles que
desejam compreender o jornalismo e a cultura alemã, mas não possuem domínio do idioma. A
barreira da linguagem é, de fato, enorme e impossibilita o acesso à determinados dados. Afinal, ao
longo do processo de pesquisa, não foi encontrado nenhum livro ou artigo em português tratando
sobre o jornalismo esportivo na Alemanha.

Por meio das leituras e da contextualização de aspectos do jornalismo e da cultura alemã -


sempre comparando com a situação no Brasil -, fica claro que a relação dos germânicos com o
futebol vai além das quatro linhas. E, por isso, é importante a existência de uma publicação como
a 11FREUNDE, que aborda cultura, política e sociedade usando o esporte como pano de fundo.

A principal hipótese defendida neste trabalho é de que a 11FREUNDE pode servir como
modelo de inspiração para fugir dos modismos e comodismos do jornalismo esportivo atual. Pela
análise do material, é possível observar que a fórmula não é nova. Afinal, não é novidade a técnica
de utilizar a grande reportagem associada ao jornalismo literário para a produção de matérias de
qualidade e conteúdo aprofundado. Tais artifícios foram adotados durante os anos 1960 com o New
Journalism norte-americano e, inclusive, em publicações brasileiras, como a revista Realidade.

A novidade, talvez, esteja no fato de a 11FREUNDE utilizar essas técnicas um pouco mais
sofisticadas para falar não apenas de futebol, mas também combinar o método com pautas criativas
58

e humanas. Ao final da análise das reportagens, foi possível observar a relação da revista com o
jornalismo literário, devido ao fato de, segundo Bulhões (2006), a literatura ser parte de "uma das
atividades mais poderosas e antigas de manifestação da própria civilização humana, a de contar e
transmitir histórias". A mistura deu certo e isso fica evidente pelos números apresentados ao longo
do capítulo 2.

O caso da 11FREUNDE está diretamente relacionado com o jornalismo impresso. Este,


vive um momento difícil e necessita de renovação para conquistar novamente o leitor. A
11FREUNDE é um modelo de inspiração que pode ser seguido, especialmente aqui no Brasil.
Nosso país é extremamente rico em cultura futebolística. Se o futebol amador brasileiro não possui
a mesma organização e popularidade como na Alemanha, o país ainda possui seu futebol de várzea,
jogado nas periferias das cidades em campinhos de terra batida. Possui também os torneios internos
nas favelas, utilizados como forma de afastar crianças e adolescentes da violência. O Brasil possui
seus ídolos como Heleno de Freitas, Gérson ou Mazzola, que não são tão lembrados como Pelé ou
Ronaldo.

E são desses exemplos citados que é possível extrair novas histórias que vão encantar e
emocionar o leitor. A revista Corner, inspirada na 11FREUNDE e citada ao longo deste trabalho,
já percebeu isso. Seus produtores vão além das fronteiras brasileiras para buscar lugares e
personagens para suas matérias. O problema é a questão financeira. A Corner depende de seus
leitores para arrecadação de dinheiro. Uma forma de impedir a influência de anunciantes, mas uma
maneira perigosa de sobreviver no impresso.

De fato, o caminho para construir um material consistente e de qualidade não é fácil. A


própria história da 11FREUNDE comprova isso. Se hoje, a revista é facilmente encontrada nas
bancas da Alemanha, um dia, já foi vendida como fanzine na entrada de estádios. Outros aspectos
como equipe e orçamentos reduzidos nas redações, apontados por Necchi (2009), também
dificultam o desenvolvimento de um projeto tão ambicioso. No caso da 11FREUNDE, o fato de a
revista ter sido parcialmente vendida para a Gruner+Jahr, segunda maior editora da Europa,
contribui para a sua sobrevivência financeira. Especialmente quando levamos em consideração a
necessidade de longas viagens e gastos com fotografias para a produção das reportagens.
59

Tal investimento é o que possibilita a ousadia e inovação de buscar pautas novas e produzir
textos mais profundos e analíticos. É o que possibilita a imersão total do repórter em sua apuração
e observação. É o que possibilita a criação de um material feito para pensar, refletir, informar e
contar histórias – práticas que fazem falta ao jornalismo, em tempos que a notícia é apenas
reportada e repassada.

Contudo, a crise vivida pelo jornalismo esportivo, já citada ao longo deste trabalho, pede
por novas ideias. O caminho é longo e não é fácil, mas talvez seja hora de dirigentes de empresas
jornalísticas e os próprios repórteres abrirem novamente as portas para a grande reportagem e a
narrativa literária; para o envolvimento por completo na apuração e a observação cautelosa de
personagens e ambientes – seja no impresso ou no digital. Se realmente existe a tendência dos
dirigentes de desprezarem o seu público (NECCHI, 2009), a 11FREUNDE é a prova de que já está
na hora de mudar essa mentalidade.
60

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setembro de 2016.

Entrevistas:
BOCK, Andreas. Entrevista concedida à Nathalia Araújo. Niterói, 19 de outubro de 2016. [A
entrevista encontra-se transcrita no Anexo E desta monografia].
HESSE, Uli. Entrevista concedida à Nathalia Araújo. Niterói, 7 de outubro de 2016. [A entrevista
encontra-se transcrita no Anexo D desta monografia].
66

ANEXOS
Anexo A: 11FREUNDE #164 - Reportagem Das Adu Experiment
67
68
69
70
71
72

Anexo B: 11FREUNDE #164 - Reportagem Von Liebe und Tod


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77
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79
80

Anexo C: 11FREUNDE #174 – Reportagem Wir müssen alle Montag arbeiten


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83
84
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Anexo D: Entrevista com Uli Hesse


1) Por que fazer uma revista de cultura futebolística?
2) O quão importante é o projeto gráfico da revista? É um dos diferenciais?
3) Como é um dia típico na redação da 11FREUNDE? Quais são suas tarefas?
4) Como é a estrutura da redação? Quantas pessoas fazem a revista?
5) Como funciona a produção de um artigo? Quanto tempo dura esse processo?
6) Qual o valor do jornalismo praticado pela 11FREUNDE no cenário da mídia?
7) O que te motiva a ir para a redação da 11FREUNDE?
8) Na sua opinião, qual público lê a revista?
9) Vocês recebem feedback dos leitores? O que eles pensam sobre a revista?
10) Especialistas consideram que, no Brasil, o futebol concentra as adesões mais intensas e
duradouras por parte da população. Um homem pode mudar de religião, mas nunca de time.
Como você vê isso na Alemanha?
11) O futebol, na Alemanha, é um espaço para manifestações típicas da identidade nacional?
12) Por que o futebol ainda não é visto como cultura, mas sim apenas como entretenimento?
13) Quais são os passos para a 11FREUNDE? Talvez fornecimento da revista para outros
países, além de Alemanha, Áustria e Suíça?

Anexo E: Entrevista com Andreas Bock


1) Você não conseguiu realizar uma entrevista com Freddy Adu. Como jornalista, consigo
entender o quão problemático isso pode ser. Foi difícil escrever a reportagem sem ter
realizado a entrevista com o jogador?
2) Em algum momento você chegou a achar que o artigo não seria feito?
3) Como essas dificuldades influenciaram a sua rotina de trabalho?
4) Aqui no Brasil, o futebol amador não é um tema presente nas conversas do cotidiano, nem
nas notícias. É difícil obter informações sobre o futebol amador brasileiro. Contudo, na
Alemanha, esse cenário parece ser bem diferente. Vocês possuem sites como o FuPa, o
Fussball.de e, naturalmente, a 11FREUNDE como forma de conseguir informação. A
pergunta é: por que a Kreisliga e seus torcedores merecem a capa de uma das maiores
revistas de futebol da Alemanha?
5) Você poderia me contar um pouco sobre o processo de produção da reportagem?
92

Anexo F: Tradução da reportagem Das Adu Experiment


O experimento Adu (por Andreas Bock)
Originalmente, essa história deveria começar em um outro lugar. No Maracanã, com as
mãos na taça da Copa do Mundo, na Casa Branca, ao lado de Barack Obama ou, pelo menos, dentro
de uma Lamborghini de alta velocidade. Se os especialistas estivessem certos, essa história não
começaria de forma alguma em uma praça de mercado, numa província finlandesa, mais
exatamente: em Kuopio, 400km ao norte de Helsinki, quatro graus em uma manhã de quarta-feira,
final de abril. Hyvää Päivä. Boa tarde.

Aqui se encontra também o homem que já foi tudo: o novo Pelé, a criança prodígio, o quinto
Beatle e o Super-Homem. Aqui está, agachado nos calcanhares, Freddy Adu, 1,73m de altura,
touca, Nike Air Max, casaco grosso e fazendo o que jogadores de futebol fazem em eventos como
este: ele está com os olhos em seu smartphone. O patrocinador de seu novo clube Kuopion
Palloseura - ou KuPS Kuopio - apresenta hoje uma chuteira supermoderna e os jogadores
preocupam-se com glamour. O sucesso é claro. À parte, dois jovens com o novo corte de cabelo de
Paul Pogba experimentam uma máquina de bolas e, por trás, uma jovem, típica candidata do
Alemanha procura uma Superstar, caminha de um lado para o outro. Além disso: maçante. Além
disso: baixos retumbantes vindos das caixas de som: Kanye West, Miley Cyrus e então a banda
MKTO: “Baby let’s live and die, what happened to the American Dream? ”.

Freddy Adu está indiferente a tudo isso. O lance com o patrocinador e o American Dream
- e também que aqui estão dois jornalistas de uma revista alemã, cujo porta-voz do Kuopion
prometeu uma entrevista. Ele se agacha novamente e, da maneira que ali ele senta e observa, é
possível acreditar que ele dirige-se aos 40 anos de idade. Mas ele tem apenas 25, praticamente uma
criança. Por fim, ele se levanta e diz: “Eu não tenho tempo”, e sai dali arrastando os pés. Ah,
Freddy.

Foi em 2003, quando seu nome apareceu pela primeira vez na mídia internacional. Adu era,
naquela época, a maior promessa do futebol norte-americano. Aos 12 anos, ele recusou uma
proposta de seis dígitos da Inter de Milão, porque sua mãe queria que ele terminasse a escola
primeiro. Em troca, ele assinou, um ano mais tarde, um contrato de um milhão de dólares com a
Nike. Adu sentou-se com apresentadores como Jay Leno ou David Letterman e ao lado de
celebridades como Alec Baldwin ou Britney Spears. Ele explicou aos norte-americanos o que era
93

futebol e, como exibição, ele equilibrava a bola em sua nuca, enquanto tirava e vestia a camisa. Os
dirigentes da Major League Soccer (MLS)78 festejavam. Eles diziam que Adu seria maior que o
futebol: popstar, pioneiro, revolucionário, embaixador, tudo em um.

Adu tinha seis anos, quando ele imigrou de Tema, uma cidade portuária em Gana nas
proximidades de Accra, para Potomac/Maryland nos Estados Unidos. Sua mãe ganhou um
Greencard na loteria. O sonho americano, entretanto, não foi encontrado pela família, já que o pai
de Adu foi embora meses depois e sua mãe sustentou ela mesma e mais duas crianças com dois
minis empregos.

Um amigo contou depois sobre seu primeiro encontro com Adu. A criança prodígio
frequentava na época a quarta série e, em um domingo, ele teve que participar de uma partida entre
dois times da escola. Adu apareceu com uma camisa laranja e uma touca do Mickey. Os adversários
riram, mas, assim que ele tocou na bola, driblou todos e marcou um gol. Então ninguém mais riu e
o treinador do time adversário perguntou se ele podia jogar pelo time sub-16. Adu disse sim, claro.
Ele tinha nove anos de idade.

E assim foi. Como por exemplo, quando Adu, aos 14 anos, se tornou o debutante mais novo
no esporte profissional norte-americano. A Federação de Futebol Americana considerou fazer um
teste de medula óssea, pois ninguém acreditava que Adu era tão novo. Mais tarde, a revista Sports
Illustrated enviou dois detetives ao hospital Bengali em Tema, para comprovar a certidão de
nascimento do jogador. Alguns dias depois, eles retornaram: sim, Adu tinha apenas 14 anos. Sim,
ele era um milagre.

Agora, os especialistas de futebol tinham certeza: Freddy Adu ia tornar os Estados Unidos
campeões mundiais de futebol, seja em 2010 em Johannesburgo ou em 2014 no Rio de Janeiro.
Enquanto isso, Adu continuava aparecendo em talkshows, enquanto o Times ou o New Yorker
escreviam reportagens sobre o rapaz prodígio. Em uma delas, Adu disse: “Muitos jovens já foram
extremamente elogiados e depois sumiram de cena. Eu jurei a mim mesmo não me tornar um
deles”.

78
Campeonato nacional de futebol norte-americano.
94

Na quarta-feira à tarde, uma nova tentativa de contato. A um dia da primeira partida em


casa da temporada e o time está agitado. Antes, nos anos 1960 e 1970, o Kuopion jogava
frequentemente nos campeonatos europeus. Em 1980, até mesmo Michel Platini passou por aqui
com o Saint-Étienne pela Copa da UEFA. Mas, um jogador que já foi perseguido por todos os
grandes times da Europa, que apresenta seu novo relógio de diamantes no Instagram e foi
mencionado por Jay-Z79 em uma música, isso ninguém nunca viu por aqui.

“Freddy tem 40 mil seguidores no Twitter, nós temos 3000”, alegra-se o diretor Jarmo
Heiskanen. E o porta-voz Mikko Seppälä complementa: “Em sua apresentação tinham 40
jornalistas. Uma loucura! ”.

Em momentos assim, vislumbra-se como a saga do herói se tornou uma tragédia. Há 11


anos, Adu vem passando de clube em clube. Primeiro, ele era a criança prodígio; depois, a
promessa; a última esperança. Por fim, em todo caso, uma piada publicitária. Um entre muitos ele
nunca foi.

Por último, Adu estava sob contrato com o clube sérvio FK Jagodina, no qual ele não jogou
uma partida sequer e não recebeu salário. Anteriormente, ele jogou pelo Çaykur Rizesport, na
segunda divisão do futebol turco, e no Aris Saloniki na Grécia. E antes disso: Belenenses, Mônaco,
Aris Saloniki. Em nenhum lugar, ele jogou mais de dez partidas. Nesse meio tempo, ou ele estava
sem clube, ou fracassando em testes no FC Ingolstadt, no Blackpool, no AZ Alkmaar ou no
norueguês Stabaek. Por todo lugar onde ele surgia, lá estavam os repórteres, antes mesmo dele
encostar na bola. “Onde foi que tudo deu errado, Freddy?”, eles perguntavam. E, mesmo que ele
não quisesse mais responder, sempre havia alguma coisa para explicar. Um pouco antes da
mudança para Kuopion, alguns jornais ingleses publicaram que ele estava trabalhando em um clube
noturno de prostituição.

“Tudo besteira”, disse Adu, arrastando os pés dos vestiários para o campo. Para trás, ficou
uma bolsa em um cabide, no qual alguém colou um adesivo com seu nome. A entrevista vai
acontecer depois do treino? O porta-voz Seppälä acena com a cabeça. Claro! Freddy recusou todos
os pedidos, mas com vocês ele vai falar. Sério? Com certeza!

79
Cantor de rap norte-americano.
95

Então, escuta-se o treinador gritar: “Freddy, vai, vai!”, e Freddy corre, corre, a touca caindo
no rosto. Ali, ele parece sempre o mesmo de antes, o jovem de Maryland. Como alguém que, há
anos, espera pelo salto da sua vida. “Freddy Adu não é mais o garoto prodígio de 14 anos, mas um
futebolista profissional de 25”, diz o treinador Marko Rajamärki. Para Adu, o Kuopion deve ser o
seu trampolim. “Ele gosta daqui, as pessoas são muito amigáveis”, conta o técnico. “Vocês vão
conversar com ele, né?”. Sim, claro.

Finalmente, Adu retorna, desleixado, para o vestiário. “Eu botei para trás os dois piores
anos da minha vida”, ladra ele. “Eu recusei o Times. Não tenho mais vontade”. Mas nós fomos
avisados. “Ninguém falou comigo, esclareçam isso com Mikko!”. O problema é: Mikko Seppälä,
o porta-voz, não pode ser encontrado. Ele desligou o celular.

Então, o repórter e o fotógrafo ficam parados em frente ao escritório, zero grau,


chuviscando, cigarros, fim de tarde. Adu passa com seu carro por ali, uma Pegeout-Kombi,
empréstimo do clube. Seu nome está gravado com letras douradas na porta. Ele pisca. Ele riu
mesmo?

Por fim, o repórter e o fotógrafo assistem no YouTube a mencionada coletiva de imprensa.


Nela, Freddy está sentado ao lado do treinador. Na sala, não havia 40 jornalistas, mas apenas cinco.
Um jornalista pergunta a Adu que tipo de relação ele tem com a Finlândia. O jogador responde que
a Finlândia sempre foi especial, afinal, foi aqui que tudo começou. Foi em agosto de 2003, que a
estrela de Adu começou a brilhar na Copa do Mundo sub-17 na Finlândia. O melhor jogador do
torneio foi Cesc Fàbregas. O jogador secreto, entretanto, foi Adu. Ele marcou quatro gols e chegou
com os Estados Unidos nas quartas de final. O treinador das categorias de base do Bayer
Leverkusen, Michael Reschke, estava, na época, nos jogos da fase de grupo e opinou:
“Simplesmente uma loucura”. A concorrência de Reschke era, sem dúvida, gigantesca porque, ao
seu lado, estavam olheiros do Arsenal, do Barcelona, do Milan, do Manchester United e do Real
Madrid. Todos nervosos com os celulares nas mãos. Quem esse jovem iria escolher?

Adu também já gravou um comercial com Pelé, no qual ele faz malabarismo com a bola
usando o calcanhar e, no final, deixa para trás para o esgotado velho campeão. Pelé disse: “Deus
te presenteou com o dom do futebol”. Adu gravou outros comerciais, de sopas ou jogos de vídeo
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game, e poderia ter gravado outros, mas os colegas invejosos fizeram o assessor Richard Motzkin
recusar qualquer outra oferta.

“Nós precisamos de estrelas como ele”, disse o seu padrinho, John Hackworth, na época,
para o Spiegel80. “E, naturalmente, preparamos estudantes como Freddy para o mercado. Esporte é
um produto que deve ser vendido”. Ele percebeu que Adu, por si mesmo, já havia se tornado um
produto. Ele parece um experimento de pesquisadores, que querem descobrir um super futebolista
invencível e programar suas habilidades e características com um botão.

Quando Adu tinha 11 anos, seus padrinhos o enviaram para a Brandeton Academy, na
Flórida, onde Nick Bollettieri81 tinha seu acampamento e jogadores de tênis como Andre Agassi e
Anna Kurnikowa foram criados. O colocaram ao lado de ex-estrelas do tênis que explicavam como
ele deveria lidar com a agitação. Um de seus professores foi Jaleel White, que ficou conhecido, nos
anos 1990, como Steve Urkel na série norte-americana Family Matters. Jaleel o aconselhou a
sempre ter um livro por perto.

Além disso, Adu trabalhou com o psicólogo esportivo Trevor Moawad que o mostrou
vídeos, nos quais Lance Armstrong82 vencia seu adversário numa importante etapa de ciclismo nas
montanhas ou Mike Tyson aplicava um golpe de nocaute. No momento dos triunfos, Moawad
pausava o vídeo e dizia: “Olhe esse rosto, jovem!”. Até aquele momento, Adu ainda não tinha feito
nenhuma partida profissional.

No começo de 2004, quando Adu se mudou para Washington após o Superdraft83, o


treinador do DC-United, Ray Hudson, disse: “Até mesmo um cego em um cavalo galopante
consegue enxergar o seu talento”. Em uma coletiva de imprensa no Madison Square Garden,
transmitida para todo o país, o vice-presidente da MLS, Ivan Gazidis, afirmou: “Ele é o melhor
jovem jogador do mundo, não apenas dos Estados Unidos”.

80
Revistas de notícias semanal alemã.
81
Treinador de tênis norte-americano.
82
Ex-ciclista norte-americano, mais conhecido por vencer o Tour de France sete vezes consecutivas.
83
Evento anual, no qual os clubes da MLS escolhem jogadores recém graduados ou recém contratados pela liga.
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Nas semanas seguintes, o número de espectadores nas partidas fora de casa do DC-United
aumentaram em 4,4%. As pessoas queriam ver o milagre. Elas queriam dizer que elas estavam lá,
quando os Estados Unidos descobriram novamente o futebol.

Em 3 de abril de 2004, Adu estreou profissionalmente contra o San Jose Earthquakes. 240
jornalistas do mundo inteiro estavam lá apenas porque o jovem de 14 anos estava na capital. Ele
jogou os últimos 30 minutos e, quando entrou em campo, um grupo de jovens meninas gritou como
se ele fosse o Justin Timberlake. Freddymania na MLS. Um milagre futebolístico, no entanto, não
veio. Adu jogou discretamente, deu nove toques na bola e, quando tentou driblar, foi bloqueado
pelo jogador de 35 anos, Jeff Agros.

Adu esteve entre os titulares do DC em 14 oportunidades, até novembro de 2004. Marcou


cinco gols e deu três assistências. Números aceitáveis para um adolescente. Mas era desse milagre
que foi falado aos jornalistas e torcedores? A pergunta agora era mais crítica e, logo, percebeu-se
que a coisa não era maior que o futebol. Ela se tornara tão bombástica, que ameaçava explodir. Ao
final da temporada, o jovem desabafou: “Eu não me importo com o que os outros dizem, eu apenas
quero jogar futebol”. E o técnico da seleção, Bruce Arenas, declarou: “Freddy ainda não é um
produto pronto”.

Meio ano depois, a situação não mudou. E ainda mais constantemente perguntavam-se os
jornalistas e torcedores o que não dera certo na programação do super-herói. Adu, agora com seus
quase 16 anos, recebia poucas oportunidades de jogar. Ele também se irritava. John Ellinger, ex-
técnico sub-17, agora dizia: “Eu acho que ele não entendeu como funciona a MLS”. Um ano depois,
2007, Adu se transferiu para o Salt Lake City e, mais tarde, por 1,5 milhões de euros para o Benfica
em Lisboa. Foi o começo do fim.

Ele agora tinha 18 anos e, enquanto para muitos a carreira no futebol mal tinha começado
nessa idade, para Adu, parecia que seu tempo já havia passado. Até mesmo suas entrevistas não
lembravam mais o jovem entusiástico de outrora, mas soavam como um lema de resistência: “Eu
quero permanecer na lembrança das pessoas como alguém que sempre deu o melhor de si”. Em
Lisboa, ele jogou em 11 oportunidades. Depois, perdeu-se pela Europa como jogador de
empréstimo, sem conceito, mal aconselhado, enquanto, nos Estados Unidos, há muito um outro
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jogador fora escolhido como garoto prodígio do futebol: Brek Shea, 18 anos que, da mesma forma,
treinava no time da escola na Flórida.

Em 2011, Adu retornou aos Estados Unidos. Pelo Philadelphia Union, ele jogou bem, mas
era para ser assim? O jovem, que estava a caminho de revolucionar o futebol mundial, estava
novamente em casa, encalhado, fracassado. Então, em 2012, tudo novamente. Foi o próximo erro,
disse Adu mais tarde. Nem no Brasil, no Bahia, nem pelo FK Jagodina, na Sérvia, ele encontrou a
felicidade. No início de 2015, ele teve que constatar que, nos últimos dois anos e meio, ele jogara
apenas 59 minutos.

Tarde de quinta-feira. Mikko Seppälä, o porta-voz, envia uma mensagem de texto. A


entrevista vai acontecer, com certeza, após o jogo. O diretor Jarmo Heiskanen diz: “Freddy vai
jogar. É o primeiro jogo em casa da temporada”.

2200 espectadores espalham-se pelo estádio. Debaixo do telhado, estão jovens que,
fortemente e com tambores, incentivam o time. Quando Freddy está com a bola, eles gritam:
“Freddy, vamos lá!”. A partida contra o VPS Vaasa se arrastou com muitos passes errados e quase
nenhuma chance de gol. Kuopion venceu por 1:0, mas o verdadeiro ponto alto foi uma gaivota que,
aos 80 minutos de jogo, debaixo dos gritos da torcida, cagou em campo. Adu fez uma partida
razoável, bateu alguns escanteios, tentou alguns dribles.

Agora, ele está novamente nos vestiários, chinelo, toalha de mão sobre os ombros. Freddy,
os alemães enervantes estão de volta. Freddy ergue os cantos da boca. Sim, dessa vez ele realmente
sorriu. Então, como vai ser? Apenas 30 minutos, um café ou uma água? “Talvez amanhã”, diz ele.
“Eu vou falar com o meu agente”. Então, ele se deita na maca de massagem. “Vocês viram como
eu importunei o goleiro no primeiro gol?”. Claro, Freddy. Demais, Freddy.

Em seu livro The Gold Mine Effect, o coach corporativo, Rasmus Andersen, pesquisou os
mistérios da performance esportiva de alto nível. Ele analisou a ascensão e queda de Freddy Adu
e tomou como referência um estudo da psicóloga Carol Dweck. Em um experimento na
Universidade de Hong-Kong, ela percebeu um desenvolvimento interessante: os estudantes, que,
no começo, eram elogiados pela sua inteligência, mais tarde, tiveram resultados piores do que os
estudantes que chamavam atenção pela aplicação e esforço. Esses tentavam melhorar
permanentemente. Ankersen fez então um paralelo com a evolução de Adu. Ele pergunta por que
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um jovem de 14 anos deve esforçar-se, se Pelé, o rei do futebol, disse a ele que Deus o havia
presenteado com pés de ouro? “Adu é, até hoje, refém de um talento que o foi imputado desde que
ele tinha apenas dez anos de idade”, resume Ankersen.

Adu não quer falar sobre isso. “Vocês viram? Como eu o importunei?”, diz novamente.
Então de volta à massagem e, depois, ao celular. “Até amanhã!”.

À noite, o repórter e o fotógrafo leem o perfil do Twitter de Adu, do começo ao fim. No


final de março de 2015, ele citou Winston Churchill: “Sucesso é a habilidade de ir de um fracasso
ao outro sem perder o entusiasmo”. Alguns segundos depois, um novo tweet aparece em seu perfil:
“Acabei de assistir Os Vingadores no cinema. Foi muito bom. Mas estou animado para assistir
Batman vs. Super-Homem”.

Na manhã de sexta-feira, as nuvens sobre Kuopion estão ainda mais pesadas que no dia
anterior. Freddy Adu sai da reunião do time e atravessa o estacionamento rumo ao seu carro. O
porta-voz Mikko Seppälä está novamente submerso. Celular desligado, nenhuma mensagem de
texto. Adu ri: “Ele está se escondendo de vocês!”. O que seu agente disse? “Sem entrevista. Eu
devo entrar em forma primeiro”. Por que a Finlândia? “Porque eu quero permanecer em paz!”. E
qual livro você está lendo no momento? “Ei, isso vai se tornar uma entrevista?”.

Adu inicia o motor. O repórter bate mais uma vez no vidro do carro para um última
pergunta. Quem venceria: Batman ou Super-Homem? Freddy Adu ergue os ombros. “Os dois não
são invencíveis?”
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Anexo G: Tradução da reportagem Von Liebe und Tod

Por amor e morte (por Jan Christoph Wiechmann)

Esse som. Que som! É possível ouvi-lo a distância, antes mesmo da partida. Não são cantos.
Também não são tambores. É, de preferência, uma vibração. Um ronco. Como um comboio ao
longe.

Então, de fato, no estádio. O som não é apenas escutado, mas também aproveitado. O
concreto se move, estremece. O som atravessa o corpo. É possível aproveitá-lo nas catacumbas,
nas calçadas e nas escadas. Como um frágil terremoto que não quer acabar.

Dentro do estádio, na Bombonera, na caixa de bombom, tudo fica mais claro. O som vem
dos Populares, das arquibancadas de pé, de mais de dez mil torcedores. Eles pulam e aterrissam
no concreto. Pulam e aterrissam. Batem com os pés. Repetidamente, sem pausa. Dez mil saltadores
no concreto. 100 toneladas. É o som do domingo, eles dizem. O som da Bombonera. O som de La
Boca. O som de La 12, como são conhecidas as torcidas organizadas. Um som diferente de qualquer
outro neste mundo.

O vestiário do adversário fica diretamente debaixo das arquibancadas. Os torcedores


intensificam os movimentos. Ao sinal, quando um informante compartilha que o discurso do
técnico começou, eles pulam ainda mais forte. Tão alto, que nenhum jogador consegue entender
uma palavra sequer. Então começam os tambores e os cantos. Eles dizem: “Nós somos a metade
mais um. Boca, eu te carrego na alma. E a cada dia eu te amo mais”.

É dia de Superclásico, Boca Juniors contra River Plate. No estádio mais conhecido da
América do Sul, depois do Maracanã. De qualquer forma, o mais barulhento. E - ao contrário do
Maracanã - com os ingressos esgotados. Eles podem encher o estádio quatro vezes, até mesmo
quando o Boca joga contra o último colocado. Contra o River Plate, dez vezes.

Um Superclásico não é como qualquer outro jogo. Não se trata apenas dos tremores nas
tribunas ou das músicas, que duram os 90 minutos de jogo. Músicas sobre amor e fervor, como se
tratasse de um grande romance. Mas se trata também do ódio aos jogadores do River Plate. Nas
canções de insulto, eles são chamados de “galinhas” e seu estádio, o Monumental, de “arca
101

frigorífica”. Se trata também das frases nas bandeiras que, no melodrama argentino, falam sobre
amor e morte. “Nem mesmo a morte irá nos separar. Até no céu, eu torcerei por ti, Boca”.

Os torcedores do River Plate não estão presentes nesse jogo. Há três anos, na Primera
Division, os torcedores adversários estão proibidos de atender à partidas fora de casa. Já
aconteceram muitos distúrbios, muitas mortes. O Superclásico da Copa Libertadores, que vai
acontecer em algumas semanas, teve seu jogo de ida cancelado no intervalo, pois torcedores do
Boca agrediram alguns jogadores do River com spray de pimenta.

A Terra pára em dias como esse. Cerca de 40% dos argentinos são torcedores do Boca e
30% do River. Isso nenhum outro grande clássico do mundo consegue acompanhar - Milan e Inter,
Schalke e Dortmund, Manchester United e Manchester City. Nem mesmo Celtic e Rangers.

A Bombonera se tornou velha, uma bacia de concreto construída no final dos anos 1930,
um estádio para os nostálgicos do futebol - e é aí que começam os problemas do Boca. A tinta está
descascando, assim como as logos dos patrocinadores. O concreto possui rachaduras, o placar não
pode mais ser reconhecido e, acima de tudo, o estádio é muito pequeno. Buenos Aires pode ser a
capital mundial do futebol com seus 12 clubes na primeira divisão. Mas os estádios parecem ser da
idade de pedra do futebol. Para os torcedores, La Bombonera é um lugar sagrado. Um local de
histórias e mitos. Para o clube, é o objeto de um grande debate sem solução: é possível o Boca
crescer com o antigo estádio construído em 1938? Ou apenas sem ele? Como o Boca pode avançar
entre os clubes no top 10 da América Latina?

Eles estão em uma encruzilhada. É necessário perguntar: o clube quer conquistar o mundo
ou permanecer apenas na Argentina? De acordo com o presidente Daniel Angelici, o Boca já está
entre os top 5 do mundo. Ele dispõe de seu próprio cálculo. O Boca pode estar a dez mil quilômetros
de distância das grandes ligas, mas “o clube já ganhou 18 troféus internacionais, assim como Milan
e Real Madrid. Nós estamos juntos, no mesmo lugar”.

O presidente está em seu camarote, a cerca de 30 metros do campo. Atrás dele, um bar,
garçom, TV, poltronas de couro fino. Ele tem o seu próprio camarote, para o qual ele convida
políticos, embaixadores, cardeais. Ele fica ali como um rei, em um terno escuro, o cabelo cerrado
preto, comemorando seu aniversário de 51 anos. Em frente a ele, na tribuna oposta, encontram-se
102

32 camarotes, entre eles o de Diego Maradona, vitalício, para o jogador e sua família. “E todas as
suas namoradas e ex-namoradas”, brincam as pessoas no clube.

Logo ao lado, estão os camarotes de outras lendas do clube: Juan Pablo Riquelme (El
Torero) ou o ex-treinador Carlos Bianchi. O Boca, constantemente, parece uma grande novela.

O clube quer também um camarote para outros grandes nomes. Para Martin Palermo, El
Titan, que jogou 404 vezes pelo Boca e marcou 236 gols. E para Carlos Tevez, El Apache, que, no
verão, finalmente deve retornar para casa.

Assim são conhecidos os mais importantes heróis do Boca. Ícones, dizem por aqui. Outros
dizem: divas, neuróticos, malucos. Eles nunca tiveram um elegante Alfredo Di Stéfano ou um
Mario Kempes, como o River, conta Angelici. Mas esses nunca teriam se ajustado aqui. Eles
também nunca teriam uma filosofia como César Luis Menotti. Atualmente, o Boca não possui
nenhuma estrela no time além de Fernando Gago, que retornou do Valência e jogou a Copa do
Mundo no Brasil. O clube também não é o maior campeão do país, com 30 títulos, mas sim o River
Plate (36). “Mas nós nunca fomos rebaixados”, declara Angelici.

Ser presidente do Boca é algo especial na Argentina. Muitos dizem que é o cargo mais
importante, ao lado do presidente da República. Em frente ao estádio, ruge fortemente a briga
eleitoral. Colunas fazem publicidade para seus candidatos, a votação será em oito meses. Eles
distribuem panfletos e pequenos presentes. Todos possuem o mesmo lema: “Horacio Lime é o
povo”. “Jorge Amor Ameal é o povo”. Todos querem ser o povo.

A eleição no Boca tem o fôlego de uma eleição municipal, com tudo incluído - intrigas,
campanhas com insultos e suborno. O antecedente de Angelici, Mauricio Macri, vai concorrer à
presidência da República em outubro. Ele tem boas chances. Marcou seu nome no Boca como
reconstrutor. Sob o comando de Macri, o clube conquistou 17 títulos entre 1995 e 2007. Sem ele,
o Boca não estaria onde se encontra atualmente. Por outro lado, sem o Boca, Macri nunca teria se
tornado prefeito de Buenos Aires e não seria candidato à presidência.

Isso diz bastante sobre o futebol. E sobre a Argentina. Quando Daniel Angelici, hoje,
caminha pelo seu estádio, ele enxerga apenas grandeza. Começa com uma foto no vestiário, que
mostra ele com o Papa Francisco. Ele passa direto por uma estátua de bronze de Maradona para
uma foto de 20 metros de altura do jogador com a seguinte legenda: “Gênio, gênio, gênio. De que
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planeta você vem?”. A seguir, um quadro, no qual estão os 18 títulos internacionais: Copa
Libertadores, Copa Internacional, Copa Intercontinental. Além disso, o slogan: “Rei mundial de
clubes”, em espanhol e inglês. Essa é a mensagem para os outros países.

Outro slogan do clube diz: “A metade mais um”. Isso significa: nós temos mais da metade
dos argentinos conosco. Essa é a mensagem para o país. E ainda tem um terceiro: “Um clube cada
dia maior”. Esse é o lema do Boca para o futuro. Para os patrocinadores.

O maior problema no caminho? Angelici não pensa muito. A Bombonera. O estádio é muito
velho e muito pequeno. Outro problema: a violência. Os Hooligans, os Ultras - chamados, na
Argentina, de Barra Brava84. “Nós queremos nos livrar deles, não dá mais. A violência é um
espelho da sociedade argentina”.

A mente brilhante por trás da nova estratégia de expansão é o braço direito de Angelici,
Maximiliano Nobili. Ele é recebido no escritório, em frente a um quadro com a frase: “Faça seu
trabalho com paixão ou procure um outro emprego”. Nobili veste uma camisa polo e sapatilhas,
ele fala baixo e de maneira ponderada. Ele parece um pouco despropositado ao lado da pintura do
porto de La Boca e as estátuas de trabalhadores musculosos.

Esses são os pilares do Boca no mercado: Paixão. Luta. História. Suor. Imigrantes. Porto.
Trabalhadores. Eles se veem mais próximos ao FC Liverpool do que dos clubes de Londres85. Mais
próximo do Borussia Dortmund do que do Bayern. Mas o Boca é o Boca. “Nós estamos apenas no
começo”, afirma Nobili. “Nós temos possibilidades inacreditáveis e que não foram utilizadas. Qual
clube consegue levar 10 mil torcedores para a final do Mundial de Clubes no Japão? Como marca,
o Boca está no top 5 mundial, junto com o Barça, Real e Bayern. Mas, infelizmente, não no
rendimento”.

Antigamente, o Boca possuía escolinhas de futebol em mais de 15 países: Nova York,


Miami, Equador, Japão e Índia. O Boca é o clube argentino com mais fãs no Faccebook (7 milhões),
com mais seguidores no Twitter (1,3 milhões). É a marca mais conhecida do país, longe do River
Plate, da empresa de petróleo YFP ou das Aerolineas Argentinas.

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Grupo de torcedores mais radicais e violentos.
85
Como Chelsea ou Arsenal, por exemplo.
104

Pela primeira vez em anos, o clube está sem dívidas. A renda principal vem do patrocínio
de empresas internacionais, da venda de produtos licenciados do time e da venda de jogadores,
sobretudo das categorias de base. Em 2006, eles venderam Fernando Gago ao Real Madrid por €20
milhões. Em 1984, Maradona foi vendido pelo valor recorde da época de $12 milhões. Em
contrapartida, o dinheiro dos direitos de transmissões televisiva e de público pagante no estádio é
pouco.

Houve um tempo, no início dos anos 1980, que o Boca não podia pagar os salários e ficou
à beira da falência. Até mesmo a Bombonera foi temporariamente fechada. Mais tarde, ao final dos
anos 1990, o clube podia manter estrelas como Riquelme e Palermo, mas hoje, com os salários na
Espanha, Inglaterra ou Itália, isso não é mais possível para os clubes argentinos. Mais de 1500
profissionais jogam no exterior. “Não podemos nem pagar um quarto do que os europeus pagam”,
admite Nobili. “Tevez teve que voltar para cá de graça”.

Entretanto, o clube consegue manter seus sócios. No final de abril, o Boca recebeu seu sócio
de número 100.000 - em uma recém-criada categoria de segunda classe. Os sócios da primeira
classe (67.204) têm direito ao carnê de ingressos da temporada. Eles pagam 10.000 Pesos por ano,
cerca de €1.000. O valor de mercado dos ingressos é cinco vezes mais alto. Em caso de falecimento,
os carnês são passados a frente por hereditariedade. “Nós poderíamos disponibilizar 250.000
carnês, mas temos apenas 50.000 lugares”, diz Nobili.

Com isso, ele descreve a maior magia do clube. Mas também o maior dilema. Ele chama
de “choque de culturas”. Os mais velhos não querem abrir mão da amada Bombonera. Os mais
jovens querem um estádio novo e, finalmente, uma chance.

Há dez anos, já existem planos para a ampliação da Bombonera. Mas, para isso, cerca de
60 casas do bairro de La Boca teriam que ser destruídas. “Enquanto um único morador resistir, não
podemos construir”, diz o presidente Angelici. “Que a gente abandone o bairro não é concebível”.

Então, ele apresentou uma nova construção, a 300 metros do centro de treinamento. Mas
isso levaria a uma rebelião, recearam os funcionários do clube. Eles estão nas mãos do “Povo do
Boca”. Eles participam intensamente das decisões do técnico, das eleições e, até mesmo, da
atribuição de ingressos. Aqui, no bairro de La Boca, eles até mesmo fundaram uma república
independente após uma greve trabalhista. Eles têm orgulho de suas origens modestas, imigrantes
105

italianos do século XIX, eles têm orgulho das suas pequenas casas coloridas, dos guindastes, dos
armazéns, do aroma de suor, ferro e trabalho pesado. O clube sempre esteve fundido com o seu
bairro. Todo o distrito pintado em azul e amarelo: caixotes de eletricidade, escadas, até mesmo
algumas mercearias e os terços de motoristas. Nos cartazes nas paredes, o clube anuncia a votação
para a Miss Boca Juniors 2015. Em outros, os torcedores escrevem seus lemas, sempre em azul e
amarelo: “Com os Milionários não existe democracia. A Bombonera permanece. Boca é o povo”.

Originalmente, as cores do clube eram preto e branco, depois azul claro, mas, como já era
cor utilizada pelos rivais, precisaram encontrar novas cores. O ex-presidente Juan Briccheto foi ao
porto e decidiu adotar as cores nacionais do primeiro navio que ali aportar-se. Foi um sueco, a
Rainha Sophia.

Briccheto já era o terceiro presidente do clube. Seu antecessor tinha acabado de completar
17 anos e substituira um amigo com experiência ainda menor. Por isso o nome Boca Juniors.
Briccheto faleceu no dia da inauguração da Bombonera, em 25 de maio de 1940. Tudo no clube é
assim: grandes dramas, muitas superstições, história forte e egos violentos.

E isso é vivido todos os dias. Uma coletiva de imprensa normal com o treinador Rudolfo
Arruabarrena, chamado de El Vasco, o basco é um momento especial. Dentro de dez dias, o Boca
e o River vão disputar três Superclásicos, um pelo campeonato nacional e dois pelas oitavas de
final da Libertadores. Durante o mês inteiro, batizado de Supermaio, não se fala em outra coisa em
Buenos Aires. As emissoras de rádio se ocupam 24 horas por dia com futebol. Eles começam
falando sobre a lesão de um jogador e acabam as conversas com Maradona e Messi e os males da
sociedade argentina.

Dezenas de repórteres se colocam em frente às câmeras e microfones. Eles dizem que é


possível “sentir a fome”, “respirar o calor”, “tocar a tensão com as mãos”. Então El Vasco diz: “Eu
estou bem tranquilo”. Os jornalistas pressionam, perguntam sobre nervosismo e medo - ele apenas
ri: “Não, não. Eu estou tranquilo. São vocês que falam demais”.

A princípio, é a semana inteira assim. A mídia gasta horas na TV e no rádio com


comentários e especulações. Os jornais já dedicaram 670 páginas ao Superclásico. Uma notícia de
verdade não existe. Elas são criadas. Fernando Gago, jogador do Boca e da seleção argentina, diz,
em um momento imprudente, que perder para o River não é um fracasso. “Como???”, espanta-se
106

a mídia perante a falta de paixão. Não é fracasso? Eles fazem análises, perguntam a atores e
políticos sobre o significado da palavra fracasso - perguntam também ao técnico. El Vasco ri. Ele
veste um casaco azul-marinho, bem descontraído, com um sorriso no rosto. Ele conhece a
extravagância. O Boca foi seu primeiro clube, o Boca é seu amor. Ele diz: “Eu também vejo assim.
Não é fracasso. Um grande golpe, talvez, mas fracasso é uma palavra muito forte”.

Ele parece a única pessoa normal dentro de uma gaiola cheia de tolos. E, contudo, ele pode
ficar contente por não ter perdido o jogo. No Boca, uma única palavra errada - muita cortesia, pouca
paixão - pode custar o cargo do técnico.

Após a coletiva de imprensa no centro de treinamento do Boca, a 500 metros do estádio,


um homem se aproxima e pergunta se nós precisamos de ingresso. Então ele aponta uma pistola
em nossa direção. “As bolsas”, ele exige. Nós entregamos a ele. Um carro com vidros escuros
aproximou-se e esperou o bandido entrar. Foram embora. Talvez o Boca seja o único World King
of Clubs que consegue levar dez mil torcedores ao Japão. Mas é também o único, no qual alguém
pode ser assaltado após uma coletiva de imprensa.

O policial que está de vigilância nos conta: “Isso acontece constantemente aqui. Esse é o
outro lado do bairro. Casinhas bonitinhas, pode ser, mas também ataques, chantagem, violência.
Eles já tentaram me assaltar em meu carro. Só porque me reconhecerem, me deixaram escapar.
Eles roubam e passam fome para conseguir ir aos jogos. A Argentina está metida numa grande
merda”.

Nós ouvimos constantemente nas conversas, de funcionários a torcedores: vocês europeus


não entendem isso. A paixão no futebol argentino é diferente da Europa. Ainda mais no Boca. Pelo
Boca, larga-se a família, passa-se fome. “Boca é a maior coisa que existe”, diz Antonio Rattin. “É
um amor, que cresce a cada dia”.

Rattin é uma lenda, talvez a maior do clube. El Rata jogou por 14 anos em 381 partidas
pelo Boca e nunca jogou em outro lugar. Na Copa do Mundo de 1966, ele encontrou Beckenbauer
e Uwe Seeler, foi expulso de campo nas quartas de final contra Inglaterra. Como protesto, ele
sentou no tapete vermelho da rainha. “Tudo combinado na época”, ele diz. “Todos ladrões”. Até
hoje, ele se aborrece pela expulsão. Ele exalta-se durante uns 30 minutos falando sobre 1966 e, ao
final, parece perto de um ataque do coração.
107

Na Argentina, explica Rattin, ainda se aplicam as regras antigas, às quais, na Alemanha,


apenas Kevin Großkreutz86 ainda respeita. Como uma lenda do Boca, você nunca deverá jogar pelo
River. Você deve permanecer fiel ao seu clube pelo resto de sua vida. Você deve ir para a Europa
ganhar dinheiro, mas deve voltar ao Boca para encerrar sua carreira. Apenas alguns se encaixam
nessa categoria: Roberto Mouzo. Antonio Rattin. Martin Palermo. O próximo: Carlos Tevez.
Carlitos, como eles carinhosamente falam.

Rattin, 78, passa o dia de jogo no camarote do presidente. Ele tem acesso, assim como
outros jogadores do Boca que passaram pela seleção argentina. Ele pode comer e beber de graça e,
se precisar de ajuda financeira, o Boca abre os braços para ele. O Boca é seu asilo, ele está aqui em
todos os jogos. Caso contrário, ele venderia apólices de seguro para sobreviver. “Olhe este país
degradado”, ele diz. “Nós sofremos. As pessoas passam fome. O quão fundo a Argentina chegou”.

O grande problema é a violência dos Barra Brava, isso todos estão de acordo. Famílias não
vão mais ao estádio. Torcida visitante não é mais permitida. E isso não é apenas devido à guerra
entre Boca e River. Há brigas entre os mesmos torcedores. Boca contra Boca. River contra River.
Tudo gira torno de poder e dinheiro. “Nós temos uma outra cultura”, diz Rattin, resignado. “Muitos
fanáticos. Em nosso futebol, existe um número muito alto de machucados e mortos”.

Por alguns dias, parecia que o Superclásico não iria acontecer. O ministro do interior
ameaçou cancelar a partida, porque um líder dos Barra Brava queria retornar ao estádio após uma
longa estadia na cadeia. Mais de 270 torcedores já foram mortos. Uma vez, quando o Boca perdeu
por 2:0 para o rival, foram encontrados dois corpos de torcedores do River com o recado: “nós
empatamos”.

Todas as conversas terminam nos Barra Brava e, depois de muitas tentativas, um deles
concordou em conversar conosco. Nós o encontramos sob uma condição: chamá-lo apenas pelo
apelido, Toti. Toti tem 38 anos, é casado e possui dois filhos. Ele possui diversas cicatrizes e uma
grande tatuagem no braço direito - CABj, Club Atletico Boca Juniors. Ao lado, o número 12 - marca

86
Jogador alemão atualmente no VfB Stuttgart. Kevin Großkreutz defende que um jogador deve ter amor pela
camisa do time e, normalmente, se posiciona ao lado da torcida em questões como, por exemplo, o alto preço dos
ingressos para jogos de futebol.
108

de reconhecimento dos torcedores fanáticos. Toti foi parte dos Barra Brava por 15 anos. Há dois
anos, não está mais no núcleo mais rígido, afirma ele.

Toti divide o principal problema do Boca em duas partes: uma delas é a violência, as
famílias desencorajadas a ir ao estádio. Ao mesmo tempo, o entrave para investimento de
patrocinadores. Os Barra Brava se preocupam com a festa no estádio, mas sua liderança constrói,
ao mesmo tempo, uma associação criminosa, uma máfia do futebol. Eles lucram com a atribuição
de ingressos. Eles comandam o pagamento dos estacionamentos e, quem não quiser pagar 100
Pesos, pode buscar o carro no ferro velho. Eles pressionam os jogadores a participar de encontros
com os torcedores, nos quais eles conseguem alta renda. Em um Boca x River, eles
contrabandearam, para dentro do estádio, centenas de torcedores sem ingresso pelo valor de 300
dólares cada. A Argentina é o único país, no qual os Hooligans tornaram a fidelidade ao clube em
um trabalho em tempo integral. Apesar de diversas tentativa, o Boca não consegue se livrar dos
Barra. Eles possuem muito poder e, há muito tempo, trabalham também para políticos. Eles são
contratados para aparecer em protestos. E assim, diversos clubes, inclusive o Boca, concordam
com eles. Típico da sociedade argentina. Quando o presidente do Independente, Javier Cantero, foi
contra eles, teve sua casa atacada.

O caminho para o topo dos Barra Brava foi difícil, conta Toti. Ele ia aos jogos, fazia
contatos na arquibancada, envolvia-se em brigas com outros grupos de torcedores: “tenho 150
brigas na bagagem”. Ele se lembra de todas tão bem como se fossem gols importantes do Boca.
“Eu fui introduzido, como num ritual, e cheguei ao círculo central da liderança interna”. Além
disso, ele não diz mais nada.

Toti empacota suas coisas para uma viagem ao norte. Ele vende artigos de merchandising
do clube. Ele também possui uma empresa de construção graças aos seus contatos com os Barra.
“Diz para eles que tipo de torcedor eu sou”, pede ele a sua mãe, que está ao seu lado. “Você sempre
tem apenas o Boca na cabeça”, diz a mãe. “Não, eu sou doente. Eu tenho a doença do Boca”. “Sim,
você é doente”, diz ela. “Eu já roubei por causa do Boca”. “O que?”, diz a mãe. “Disso eu não
sabia”.

Toti liga para sua esposa. Na tela do celular, aparece Rose Amor. Ele bota no alto-falante.
“Querida, diga a eles, o quão louco eu sou pelo Boca”. “Você é tão maluco, que casou comigo de
109

azul e amarelo. Mostre o vídeo a eles”. Toti nos mostra o vídeo. Ela diz: “Você é tão louco, que
largaria sua família”. “Aí está”, ele diz, triunfante.

Nós o perguntamos o que ele faria se o seu filho mais novo decidisse torcer pelo River.
“Diga a eles. O que eu faria com o nosso filho?” “Você o expulsaria de casa”, diz a esposa. Isso é
doença, dizemos a ele. “Eu já disse: eu sou doente”. Ele vê isso como um prêmio.

Antes do jogo contra o River Plate, Toti apostou com todos os torcedores do River que ele
conhece. Uma cerveja, um churrasco, dinheiro. “Eu aceito tudo”, diz ele. Boca venceu a partida
por 2:0 com dois gols nos últimos seis minutos.

Após o jogo, Toti saiu caminhando por Buenos Aires. Ele atirou galinhas nas janelas dos
torcedores do River, “porque eles são umas galinhas”. Ele comprou também dezenas de edições
dos grandes jornais e os deixou debaixo da porta das casas dos torcedores do River. Ali, eles irão
ler sobre pelo o que Toti, Rattin, Angelici, Nobili e 20 milhões de argentinos vivem: Boca
desmantelou o River.
110

Anexo H: Tradução da reportagem Wir müssen alle Montag arbeiten

Nós temos que trabalhar toda segunda-feira (por Andreas Bock e Ron Ulrich)

Nesta tarde de sábado, início de abril, começa tudo de novo. Até mesmo Egon Eiche87
ajuda, questão de honra. Ele carrega engradados de cerveja do armazém para o balcão, posa para
fotos com as crianças, cumprimenta o time e anima os torcedores com tambores, artifícios e
canções. Supostamente, ele poderia até marcar um gol, mas, até mesmo na Kreisliga, existem
regras: uma mascote em uma gigante roupa de esquilo como jogador – isso não é permitido. Por
isso, o presidente Robert Wernick teve que se juntar ao time. O quadril mostra que, em forma, ele
não está: “Não vou ficar mais jovem, mas não tem problema. Isso é Kreisliga”. Hoje é um dia
simplesmente importante, hoje é briga contra o rebaixamento, SV Eiche Ragösen contra SV 71
Busendorf, e metade do vilarejo está aqui. Bem-vindos à Kreisliga Havilland B, província de
Brandemburgo, bem longe.

Uma busca pela a alma do futebol amador poderia ter começado em meio às cinzas do sul
de Hamburgo, em uma espelunca em Berlim ou nos vestiários de um clube multicultural da
Kreisliga. Esse universo amplamente ramificado das ligas e classes amadoras poderia ser evitado,
mas, provavelmente, nenhum outro lugar condensa o pan-óptico de loucura da Kreisliga como esse
ninho de 575 moradores: se alguém te perguntar onde encontrar o futebol amador, mande-o para
Ragösen! A princípio, aqui, uma coisa pode ser explicada: o que os torcedores de futebol veem em
um atacante que faz Reiner Calmund88 parecer um personal trainer? Por que eles lamentam quando
seu time é eliminado na segunda rodada da Kreispokal? Por que alguém vai a um jogo de futebol
amador quando a Sky transmite, sete dias por semana, futebol de outro planeta?

Em Ragösen, não há muita coisa, nem mesmo um pub. Contudo, o futebol vibra e ilumina
os olhos de mais de 200 espectadores ao lado do campo. Rock ’n’ Roll em Ragösen e, ao final, a
ideia de que o pequeno futebol pode ser maior que a comemoração da Copa do Mundo no Portão
de Brandemburgo ou uma partida da Bundesliga num sábado à noite.

Tudo começou no ano de 2005. Ragösen era um desses lugares mortos, que existem em
abundância em Brandemburgo. Quem quisesse assistir ou jogar futebol deveria ir para as cidades

87
Mascote do SV Eiche Ragösen.
88
Ex-técnico de futebol e, atualmente, comentarista.
111

vizinhas, como Ortschaften, Fredersdorf ou Belzig. Às vezes, até mesmo viajar 100 quilômetros
até a distante Berlim. Muitos jovens permanecem por lá. A metrópole oferece aventuras maiores
que o coral masculino.

Um dia, Robert Wernicke e seus amigos decidiram fundar novamente o antigo clube da
cidade, que existira por seis anos como SV Eiche. Os mais velhos reviraram os olhos. “Olhem só
esse campo”, diziam eles, mostrando o círculo central, onde nem mesmo cresciam ervas daninhas,
e os gols, cuja rede era feita de fios para amarrar frango. “E quem vai jogar por vocês?”,
perguntavam. “Não tem mais ninguém aqui!”.

Mas os jovens não perderam a coragem e mobilizaram amigos, conhecidos, parentes. Um


fazia instalação de água e gás, então ele construiu os banheiros. O ladrilheiro cuidou do chão dos
vestiários. Outros eram especialistas em jardinagem, então ficaram responsáveis pelo gramado.
Ainda assim, alguns diziam que o novo clube precisava de torcedores, então eles fundaram uma
pequena torcida organizada.

Onze anos depois, na rua Kastanienwinkel nº 9 em Ragösen, estende-se um gramado


moderno e bem cuidado. Há arquibancadas, quadro para marcar o placar, redes de gol decentes. O
SV Eiche Ragösen é, provavelmente, de longe o clube mais profissional da Kreisliga. Só que aqui
é tudo feito de forma voluntária, no antigo “faça você mesmo”, até mesmo os artigos de
merchandising. Eles oferecem cachecóis, toucas, guarda-chuvas e até mesmo chinelos. E, quando
o clube chegou à Kreisliga, os mais velhos ficaram boquiabertos. Ninguém achava isso possível.

Hoje temos um bom futebol para ver, Ragösen venceu por 3:1. Quando Robert Wernicke
tocava na bola, os torcedores gritavam suas canções: “Um chute como um canhão, mas o goleiro
vai agarrá-lo como uma mosca irritante!”. E, quando o Ragösen marcou seu gol da vitória, eles
cantaram: “Algum dia o Eiche vai jogar internacionalmente!”.

Enquanto a torcida anda ao som da música You’ll Never Walk Alone89, ali encontra-se Ingo
Haß, prefeito da cidade. Ele está bem orgulhoso. E toda a situação é bem importante. “Caso
contrário, não haveria nada aqui”, diz ele. Agora, a cada final de semana, os moradores do vilarejo

89
Canção composta por Richard Rodgers e Oscar Hammerstein II para o musical Carousel. Entretanto, entre os
torcedores de futebol, é mais conhecida por ser um hino da torcida do britânico Liverpool.
112

se reúnem e até mesmo moradores dos arredores aparecem. Em breve, o pub também será
construído.

É um conto de fadas e, quando se deixa este lugar, vem novamente o sentimento de que a
banda Tocotronic90 escreveu uma música adequada para quase todas as situações, até mesmo para
o Eiche Ragösen. Neste caso: “Isso a juventude construiu sozinha”91.

A cerca 300 quilômetros noroeste de Ragösen, próximo a Hamburgo, Monty e mais três
amigos aguardam na estação de ônibus Geesthacht. Eles são torcedores do TSV Gülzow e hoje
viajam para a partida fora de casa contra o terceiro time do Escheburger SV, Kreisklasse 8, mais
baixo isso não fica. Monty, um agradável homem ao final de seus 20 anos com barriga, barba e
boné de aba reta, costumava ir aos jogos do Hamburgo SV. Mas, nos últimos anos, tudo se tornou
muito gigante e anônimo. A visita a um estádio de futebol não apresentava mais nenhuma surpresa
ou espontaneidade. Uma vez, ele e os amigos foram retirados por seguranças de um setor, porque
eles estavam dançando de forma muito selvagem. Agora, Gülzow é a casa deles. Viagens para
jogos fora de casa em linhas de ônibus. Aqui, ele se sente um pouco mais como antigamente, na
época que o futebol não era controlado por patrocinadores. Quando o futebol era uma forma de
linguagem secreta. “Quem são vocês?”, pergunta o fiscal. “Somos torcedores de futebol”, diz
Monty. “Gülzow joga hoje em Escheburg!”. O fiscal olha os cachecóis, nos quais está escrito
“torcedores de elite”, uma referência não tão séria à gangue fictícia Green Street Elite do filme
Hooligans. “Oh, aha”, diz o fiscal e sai arrastando os pés, ainda mais confuso.

A partida será realizada num campo, que é cercado por colinas e florestas. No começo, não
mais que cinco pessoas compareciam a esses jogos. Hoje, cerca de 300 pessoas ficam nas linhas
laterais do campo. No estacionamento, Monty e seus amigos são recebidos por outros torcedores.
Alguns são de um grupo amigo vindo de Bergedorf. Eles possuem tambores e um aparelho de som
móvel com microfone, do qual estouram música eletrônica e hip-hop. No início, eles tinham um
megafone, mas, de acordo com Monty, isso se tornou um pouco exagerado. Depois, ele abre uma
caixa de isopor com cerveja e algumas garrafas de licor de menta. Vamos lá, cantar, beber, bater
papo. Eles começam com uma música, na qual parte do grupo que está atrás do gol canta um tom

90
Banda de indie rock alemã fundada em 1993.
91
Trecho da música Let there be rock.
113

mais alto. Um pouco antes do intervalo, Monty pega o microfone: “O setor visitante está, com 38
espectadores, esgotado como sempre”.

Há algum tempo, um clube de Hamburgo da Oberliga92 - que era apoiado por um rico
patrocinador, mas quase não tinha torcida - entrou em contato com Monty. O clube perguntou se
ele e seus amigos não ambicionavam torcer por um clube da quinta divisão. Monty ficou perplexo
e recusou. “O que essas pessoas pensam? Que se troca de time como se troca de cueca”.

Após a partida, o Gülzow assegurou a liderança da tabela depois de um 4:1 e a torcida fez
um pequeno show com fogos de artifício. Tudo em acordo com o time adversário (“Nos arrume
um engradado de cerveja”) e com o árbitro (“Somente quando eu estiver no vestiário e não puder
mais ver”). Uma vez, eles dispararam um sinalizador por descuido na presença de uma pessoa
imparcial. Tiveram que pagar €150 dos próprios bolsos à federação.

Quando alguém está na lateral do campo, seja aqui em Escheburg ou em Ragösen, é como
se as pessoas tivessem alcançado uma forma em miniatura da Bundesliga. Com a diferença de que
o futebol delas ainda possui muito daquilo que se perdeu no inchado aparato profissional: humor,
participação, união. Com cantos, bandeiras e histórias próprias. Com o bom sentimento de que
ninguém prescreve quando e como eles devem bater palmas. Com o sentimento de serem não
apenas clientes, mas também participantes.

O fato de o futebol amador se tornar novamente popular entre os espectadores tem muito a
ver com a frustração, explica Monty. Com o anonimato nas arenas da Bundesliga, com a
permutabilidade do público, com a distância cada vez maior entre torcedores e jogadores. Que algo
está acontecendo, também é demonstrado pelo fato de que os meios de comunicação na Kreisliga
estão mais difundidos do que nunca. Existem revistas físicas e online, como a Fussifreunde ou a
fupa.net. Daí vem as diversas páginas no Facebook, que se ocupam exclusivamente com futebol
amador. Há tempos, eles não são apenas mídia de nicho. Uma página como a Kreisligafußball -
Das Bier gewinnt (“Futebol da Kreisliga - a cerveja vence”), por exemplo, possui mais de 350 mil
curtidas. Até mesmo as clássicas fanzines, vendidas de mão em mão nos estádios, não estão mortas.
Em Berlin, dois jovens fazem a Auf Jahre unschlagbar (“Há anos invencíveis”), na qual eles falam
sobre punk-rock e futebol de ligas mais baixas. Em Hamburgo, isso se aplica à fanzine do Altona

92
5ª divisão do futebol alemão.
114

93, All To Nah (“Tudo para perto”), há tempos um clássico. Também existem web shows como a
Elbkick TV ou a Mainkick TV. A revolução da Kreisliga será televisionada.

Também por meio de Wolle e Bine, dois repórteres de Hamburgo com quase 70 anos, o
futebol amador é levado a sério. Ele trabalhava como compositor, ela como comerciante. Há alguns
anos, eles se aposentaram e, como procuravam um novo hobby, se tornaram diretores de filme
amadores. Eles compraram duas câmeras e criaram, em 2011, o site AuS - Amateure unter sich
(“Amadores por eles mesmos”). Desde então, todo fim de semana, eles visitam campos em
Schleswig-Holstein, Hamburgo e Niedersachsen e contam sobre partidas da Kreisliga à
Landesliga93. Até agora, eles já visitaram cerca de 350 times amadores.

Em uma manhã de quinta-feira, Wolle está sentado em frente ao seu computador. Ele
acabou de transferir os vídeos do jogo entre SC Serber e Victoria 2 para seu HD. Então ele liga o
microfone e narra uma cena após a vitória por 4:1 do Victoria: “Assim como o tempo, a animação
agora está momentaneamente muito ruim!”. Entre sexta-feira e domingo, eles vão a três jogos.
Segunda à quinta são dias dedicados à edição. E, em seguida, inicia-se a pesquisa para o próximo
fim de semana.

Seus entrevistados preferidos são os jogadores das ligas mais baixas, que às vezes se juntam
a uma piada e não recorrem aos discursos prontos. Como, recentemente, ele disse a um técnico:
“Você conhece o ditado ‘nenhuma ideia, nenhuma opinião, nenhum conceito’?”. E o técnico
respondeu: “Ah, você de novo. Wolle, eu também não gosto de você!”. Naturalmente, uma piada.
Wolle e Bine são, sem dúvidas, os repórteres mais amados do futebol amador no norte da
Alemanha. Eles gastam muito tempo, seus vídeos geralmente duram 25 minutos e muitos clubes
pedem para serem visitados, pois utilizam o material para análise de partidas.

A ideia é não criar fronteiras nas ligas mais baixas. Aqui, na Kreisliga, todos recebem seus
15 minutos de fama ou 35 metros quadrados de adesivos, como no SV 06 Lehrte, nas proximidades
de Hannover. Em pouco tempo, foi criado um álbum de figurinhas. Das categorias de base até o
time principal, todos os jogadores, treinadores e funcionários foram representados. “Já vendemos
quase 10 mil figurinhas”, diz Jannis Meggers orgulhosamente.

93
6ª divisão do futebol alemão presente apenas nos seguintes Estados: Baviera, Hamburgo, Bremen, Baixa Saxônia,
Saxônia e Turíngia.
115

Meggers é voluntário no SV Lehrte e acompanhou a formação do álbum. Em um sábado


no final de abril, foi organizada a última reunião de troca de figurinhas em um supermercado.
Meggers e o gerente do mercado estavam orgulhosos ao lado das três mesinhas de cerveja. Até
mesmo a imprensa estava lá, como um repórter do Hannoverschen Allgemeinen Zeitung94. “Algo
desse tipo desenvolve a economia local”, diz Meggers. “Antes das fotos, os jogadores até foram ao
cabeleireiro!”.

Em Essen, um grupo de jovens também teve uma ideia curiosa. Christoph Steinmetz e Lars
Höcker desenvolveram um jogo de simulação especialmente para Kreisliga. O jogo se chama
FAMOS - Fußball Amateur Manager online spielen (Futebol Amador Manager online), parece
altamente profissional e é ainda mais minucioso que qualquer outro jogo conhecido. São
disponibilizadas tabelas, o “time do dia”, um quiz e um jogo de apostas. Os usuários podem até
mesmo comprar ações de clubes da Kreisliga como forma de melhorar o orçamento ou construir
um quiosque de batata frita ou uma loja de bebidas.

Christian Wenning programou tudo sozinho e foi carinhosamente apelidado de “vampiro”,


pois passava as noites construindo o site: 20 mil linhas, dois milhões de números, 800 jogadores.
Em menos de um mês, cerca de 300 jogadores foram atraídos. Ao contrário da Bundesliga, o fator
“acaso” tem um grande papel. “Às vezes o goleiro tem que abandonar seu posto para jogar na linha
e acaba marcando dois gols - isso é Kreisliga!”, diz Hacker.

Não muito longe daqui, em Dortmund, o presidente do Borussia Dortmund, Hans-Joachim


Watzke, disse uma vez: “A Kreisliga não é sexy”. Muitos torcedores, que toda semana visitam os
gramados em Mülheim, Dinslaken ou Scharnhorst, ficaram indignados com a declaração. Nisso,
Watzke tem razão: a Kreisliga não é sexy. Mas é exatamente isso. É a imperfeição, o prazer e
também a feiura que atrai as pessoas para o futebol amador.

É um mundo, onde nascem heróis próprios, como Hans-Jürgen Thedens. Aos 75 anos,
vindo de Rendsburg em Schleswig-Holstein, ele foi eleito “árbitro do ano” e isso o deixa
imensamente orgulhoso. Ele exibe seu troféu no apartamento. Por que ele recebeu o prêmio? Uma
vez, ele advertiu o açougueiro por um lance em campo com duas salsichas. Uma outra vez, ele
mostrou apenas um amarelo para um jogador que tocou a bola com as mãos propositalmente. “Isso

94
Jornal diário da cidade de Hannover.
116

irritou a federação”, diz ele. Quando a mesma situação ocorreu, algumas semanas depois, ele
novamente não quis mostrar o cartão vermelho. Então, o próprio jogador retirou o cartão do bolso
de Thedens.

Isso não é futebol, mas uma besteira romântica, diriam os puristas. E, naturalmente, eles
também estariam certos. Futebol é simplesmente uma competição, trata-se de performance, título,
vitórias. Mas o futebol também não precisa dessas pessoas, que, antigamente, eram chamadas de
autênticas e, hoje, se multiplicam nos campos de futebol amador? Seja apenas para enfrentar as
estratégias de otimização com um pouco de simplicidade e normalidade.

Bubu, de Bad Homburg, também é um desses heróis locais. Hoje, manhã de quarta-feira,
ele está estressado. Mas para Bubu, isso é normal. Ele ginga até sua kombi, o porta-malas está
cheio de flores, roupas sujas, bolsas e aparelhos.

Bubu na verdade se chama Reinhard Buschatzki, mas, aqui em Bad Homburg, as pessoas
o conhecem apenas pelo seu apelido. Ele está há cerca de 50 anos no SpVgg 05/99 Bad Homburg.
Não está claro, se ele já viveu sem o clube ou se o clube já viveu sem ele. Bubu, suor e treino. Tudo
começou em 10 de maio de 1966, a data ele sempre recita de cor. Ele veio das redondezas de
Oldenburg para Bad Homburg. Bubu jogou pelo time principal, antes dele ser promovido à diretor.
Árbitro, treinador, chefe de departamento - em 50 anos, ele simplesmente realizou basicamente
todas as funções no clube.

Nos anos 90, ele precisou ser internado e estabeleceu aqueles que ficavam perto do campo.
Da janela e com um walkie-talkie, ele instruía seus filhos, que ficaram em seu lugar durante a
ausência. Quando ele ficou saudável novamente, voou para Mallorca com cinco Marcos na carteira.
A viagem do time estava marcada e Bubu, necessariamente, deveria ir junto. Então ele sentou-se
no avião, após informar à esposa que iria comprar cigarros. Se isso é verdade ou não, ninguém
sabe. Mas, se um trecho de uma música de Udo Jürgens95 fosse vivo, este seria Bubu.

Oito dias depois, ele retornou com 250 Marcos na carteira e, como forma de apaziguamento
com a esposa, ele comprou um colar de pérolas. Supostamente, ele teria enganado os jogadores em

95
Cantor e compositor austríaco famoso por suas canções românticas e melancólicas. Faleceu em 2014.
117

um jogo de cartas. Mas, agora, ele parou com as loucuras, o celular toca novamente: 05 Bad
Homburg o espera. Treino na Kreisoberliga. Precisam dele.

O futebol amador também cria seus próprios times. Times, que são fundados em balcões de
bares e marcham até a Landesliga. Times, que realmente são formados por 11 amigos. Clubes,
como o Indian Football, que, em 2013, foi fundado na periferia de um templo Hindu em Hamburgo.
Ano passado, o time ganhou o “troféu jogo limpo”, porque os jogadores cometeram poucas faltas.
Por isso, eles quase sempre perdem. Isso os irrita, mas o importante é que eles se mantêm unidos,
diz o fundador Sawan Kumar. Uma vez, cerca de 100 espectadores vieram para vê-los jogar contra
o Altengamme e os jogadores ficaram comovidos com os tambores. O jogo terminou em uma
merecida derrota por 11:0.

A quase 500km sudoeste de Hamburgo, um pouco antes da fronteira com a Holanda, existe
um clube, cujo objetivo inicial era apenas construir algo com amigos. Na estrada principal,
ocasionalmente retumbam os motores dos carros que por ali passam. Por outro lado, o remoto
centro de treinamento do DJK Kleve é silencioso. Apenas atrás do campo, iluminado por holofotes,
sopram algumas vozes inquietas. Pequenos gritos, vamos lá, ataque, Hintermann, atrás de você, o
mergulho da molhada bola de couro. Dois times, 15 contra 15 fazem agora um jogo-treino, até que
o treinador Ingo Pauls pára tudo. Ele caminha de um lado para o outro, acena com os braços e grita:
“Não é possível, que nós jogamos a bola de maneira tão impensada. Vocês devem olhar antes do
passe quem está perto de vocês, rapazes”. Os jogadores compartilham a mensagem no campo. Um
traduz para o inglês, outro para o espanhol, um terceiro tenta uma linguagem com gestos. O DJK
Kleve joga na Kreisliga B, grupo 1. O time reúne no treino não apenas 30 jogadores, mas também
25 nacionalidades diferentes.

É uma seleção mundial da Kreisliga: os jogadores são derivados, entre outros países, de
Camarões, do Chile, da China, de Hong Kong, do Nepal, de El Salvador, do Quênia, da Indonésia,
da Coreia do Sul, da Turquia, do Egito, da Áustria, do Kosovo, da Islândia, da Bulgária, da Espanha
ou da Grécia. Também se encontram ali dois refugiados, um da Síria e outro do Afeganistão. Falta
apenas a Holanda, apesar do país estar a poucos minutos de bicicleta. “Os jogadores vêm de todas
as partes do mundo e, acredite, nenhuma única vez eles trocaram palavras maldosas entre eles”,
diz Pauls. Pelo contrário: os jogadores festejam juntos, e da maneira mais alemã possível com
chucrute e linguiça grelhada. Há dois anos, o DJK teve problemas com sócios e categorias de base,
118

assim como outros clubes da Kreisliga. Como poucos jogadores iam aos treinos, o motor do meio-
campo, Hauke Benjes, começou a falar com seus colegas de faculdade.

Na faculdade internacional Rhein-Waal, metade dos estudantes são estrangeiros. Na


primeira semana, Benjes foi acompanhado ao treino por seis novos jogadores, na segunda, foram
dez. O técnico Ingo Pauls e o co-técnico Nils Nellissen reconheceram o potencial e, rapidamente,
imprimiram panfletos para serem distribuídos no refeitório. De repente, jogadores de todo o mundo
se juntaram a esse time internacional. O trabalho do treinador não deve ser subestimado, já que as
despesas esportivas e burocráticas foram enormes. Para cada jogador, eles tinham que conseguir
uma licença de jogo internacional e, para isso, não falavam apenas com a federação alemã, mas
também com as federações de cada país natal. “No começo, eram cerca de 40 arremessos laterais
errados, o nível era muito diferente”, diz Nellissen.

Quando o DJK vence uma partida, as festividades são do mundo todo. O time compôs uma
música para o meio-campista Edgar Ho, de Hong Kong, que até mesmo virou hit de carnaval.
“Príncipes do Carnaval” cantaram fervorosamente sobre Edgar Ho nas turnês de carnaval. O vídeo
foi postado na página no Facebook do clube com a legenda: “Mais uma história inacreditável do
DJK”. Os espectadores, de Hong Kong a Camarões, vibraram.

De volta a Berlim. Para quem está de fora, uma diáspora do futebol, especialmente para
aqueles que adotam a densidade dos clubes de futebol na região do Ruhr como norma. Na realidade,
sobretudo a Berlin-Liga96, é como um reservatório de água para torcedores de futebol exilados,
disponível na capital como areia no mar.

Há um ano, o Tasmania e o Tennis Borussia Belin eram times grandes. Para o jogo de
promoção à Oberliga (quinta divisão), em maio de 2015, vieram cerca de 2000 mil torcedores. A
partida foi transmitida ao vivo pela torcida via internet. Três câmeras na arquibancada principal
capturavam as imagens. Algo assim, nunca existiu.

Um desses torcedores exilados é Thomas. Originalmente, ele é torcedor do Bayern, mas,


em Berlim, visita regularmente os jogos do Tasmania. Ele gosta da mistura de pessoas: estudantes,
hipsters, moradores do distrito de Neukölln, torcedores antigos e mães árabes com lenços na cabeça

96
Liga da 6ª divisão do futebol alemão.
119

ficam um ao lado do outro e cantam juntos. Thomas fundou, junto com amigos, a torcida
TASmanische Teufel (“Demônio da Tasmânia”). Às vezes, eles fazem propaganda para o clube,
pendurando cartazes em bares com os dizeres: “Apoie seu clube de futebol local!”.

Em uma noite de sexta-feira, numa partida em Köpernick, ele reporta sobre o jogo contra o
Tennis Borussia Berlin, contando que os torcedores trouxeram aguardente e bolo. Ou então, relata
sobre a conversa do diretor com os jogadores sobre transferências e salários. No meio do
acontecimento. “Isso você não encontra na Bundesliga!”. E lá estava também o lendário co-técnico
Sascha Schwann. Ele ficou conhecido por ter participado do Big Brother e ter feito sexo com uma
atriz de filme pornô. “Quando eu soube, pesquisei o nome no Google”, diz Thomas. “Em seguida,
eu sabia: que clube louco. É aqui que eu quero ficar!”.

Em Staaken, por outro lado, um pequeno lugar na periferia de Berlim com 43 mil habitantes,
existe um clube para antigos berlinenses orientais e, à primeira vista, não tem nada de louco. Aqui
cheira a futebol profissional. Segunda-feira de Páscoa: semifinal da Berliner Pokal97 contra o BFC
Preussen. O vencedor do torneio vai jogar a Copa da Alemanha na próxima temporada.
Normalmente, não mais de 30 espectadores vêm aos jogos do SC Staaken. Entretanto, hoje eles
fretaram um ônibus de turismo. 100 torcedores trouxeram licor de ovo feito em casa e se preparam
para o grande golpe. Berlim, Berlim, eles marcham por Berlim.

Thorsten, um torcedor do Staaken no segundo andar do ônibus, costuma frequentar os jogos


do Hertha Berlin. Ele é um daqueles caras do tipo “já fiz de tudo”. A quarta de final foi sensacional,
diz ele. O Staaken, da sexta divisão, surpreendentemente eliminou o BFC Dynamo, da quarta
divisão. Quando eu cheguei em casa, minha esposa disse para mim: “Você nunca esteve tão feliz,
nem mesmo após uma vitória do Hertha”.

De volta ao primeiro piso. Um dos jovens selvagens sussurra: “Psst! Nós compramos dois
sinalizadores poloneses. Temos que tirar uma foto já!”. Então, eles posam após a chegada, com
cerca de 100 homens em frente ao estádio no bairro de Lankwitz. Apenas os sinalizadores não
foram disparados. Ah, tanto faz, diz “Kauli”. Ele veste uma camisa dos anos 1960, quando o

97
Torneio no estilo “mata-mata” organizado pela federação de futebol de Berlim.
120

Staaken ainda jogava na segunda divisão. “Desde então, estou ao lado do clube”, diz ele. Ele viu
de tudo, ouviu de tudo.

E, se Albert Camus98 ainda não formulou, essa frase pode também ter vindo de Kauli. Ou
de Wolle, Monty, Bubu ou de qualquer um dos seis milhões de jogadores de futebol amador: “O
campo possui mais arranhões do que a canela do meio-campista do time adversário. Eu
compreendo imediatamente que a bola nunca chega como se espera. Isso foi uma lição para a vida”.
Até mesmo aqui, na semifinal da Berliner Pokal, em frente a cerca de 900 espectadores, se trata da
beleza das marcas de sujeira, dos arranhões e, naturalmente, da vida.

A princípio, dava tudo certo para o Staaken. O time logo saiu na frente do placar com 1:0
e conseguiu voltar à frente após um empate. Quase no final do jogo, o placar marcava 2:1. Aos 50
minutos do segundo tempo, o Preussen partiu para cima, conseguiu um cruzamento e, uma tentativa
de tirar a bola da área, se tornou um gol contra. Na prorrogação, o Preussen venceu por 3:2.

Os torcedores do Staaken marcharam desapontados de volta ao ônibus. “Amador”, clamou


Kauli. “Isso foi realmente amador”. De fato, ele tem razão. Em todo caso, ainda tem licor de ovo.

98
Escritor e dramaturgo francês vencedor do Prêmio Nobel de Literatura em 1957.
121

Anexo I: Perguntas realizadas na pesquisa de opinião

1) O futebol é parte da cultura alemã?


2) O futebol pode ser considerado cultura ou apenas entretenimento?
3) Quando você pensa em futebol, qual a primeira revista vem em mente?
4) Com qual frequência você compra a 11FREUNDE?
5) Você é assinante da 11FREUNDE?
6) Por que você lê a 11FREUNDE?
7) Onde você lê a 11FREUNDE?
8) Você está satisfeito com os artigos publicados na revista?
9) Como a revista pode ser melhor?
10) Idade?
11) País?
12) Estado onde mora? (Apenas para moradores da Alemanha)
13) Seu time?
122

Anexo J: Gráficos com resultados da pesquisa de opinião

O futebol é parte da cultura alemã?

2%
6%

Sim
Não
Não sei

92%

O futebol pode ser considerado cultura ou apenas


entretenimento?

3% 13%
Cultura
10%
Entretenimento
Ambos
Nem um, nem outro
74%
123

Quando você pensa em futebol, qual a primeira revista


vem em mente?

14%
4% Kicker
11FREUNDE
15%
Sport Bild
67% Outra

Com qual frequência você compra a 11FREUNDE?

10%
Todo mês
23% De 1 a 6 vezes/ano
De 7 a 11 vezes/ano
62%
Não possuo frequência definida
5%
124

Você é assinante da 11FREUNDE?

8%

Sim
Não

92%

Onde você lê a 11FREUNDE?

80.00%
70.00%
60.00%
50.00%
40.00%
68.30%
30.00%
20.00%
30.90% 26.80%
10.00% 15.40% 13% 1.60%
0.00%

(Possibilidade de escolher mais de um alternativa)


125

Você está satisfeito com os artigos publicados na revista?

16% 17%
2% Muito satisfeito
Satisfeito
6%
Um pouco satisfeito
Insatisfeito
Não sei
59%

Idade:

11%

32% 15 - 18 anos
19 - 23 anos
28%
24 - 29 anos
Mais de 30 anos

29%
126

País:
90%

80%

70%

60%

50%

40% 83%

30%

20%

10%
2.40% 2.40% 4% 4% 4.20%
0%
ALEMANHA ÁUSTRIA SUÍÇA ESTADOS INGLATERRA OUTRO
UNIDOS

Estado (apenas para moradores da Alemanha)


BAYERN 15.90%
BADEN-WÜRTTEMBERG 8.40%
RHEINLAND-PFALZ 2.80%
SACHSEN 1.90%
THÜRINGEN 2.80%
HESSEN 9.30%
NORDRHEIN-WESTFALEN 20.60%
SACHSEN-ANHALT 0.90%
NIEDERSACHSEN 10.30%
BERLIN 10.30%
BRANDENBURG 0.90%
BREMEN 1.90%
HAMBURG 10.30%
MECKLENBURG-VORPOMMERN 0.90%
SCHLESWIG-HOLSTEIN 2.80%
0.00% 5.00% 10.00% 15.00% 20.00% 25.00%
127

Qual o seu time?


FORA DA ALEMANHA 9.30%
VFB STUTTGART 4%
EINTRACHT FRANKFURT 2.40%
ARMINIA BIELEFELD 1.60%
NÜURNBERG 1.60%
HERTHA BERLIN 1.60%
BORUSSIA MÖNCHENGLADBACH 1.60%
EINTRACHT BRAUNSCHWEIG 1.60%
SCHALKE 04 1.60%
HAMBURG SV 8.90%
KAISERSLAUTERN 3.30%
FC KÖLN 3.30%
ST. PAULI 3.30%
WERDER BREMEN 3.30%
BAYER LEVERKUSEN 0.80%
FORTUNA DÜSSSELDORF 0.80%
BOCHUM 0.80%
FREIBURG 0.80%
HANNOVER 0.80%
TSV HOLZHEIM 0.80%
MAGDEBURG 0.80%
MAINZ 05 0.80%
KARLSRUHE 0.80%
WOLFSBURG 0.80%
BORUSSIA DORTMUND 10.50%
FC BAYERN 34.10%
0.00% 5.00% 10.00% 15.00% 20.00% 25.00% 30.00% 35.00% 40.00%
128

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