Você está na página 1de 262

Literatura Hispânica II

Prof.ª Mara Gonzalez Bezerra


Prof.ª Luiziane da Silva Rosa

2019
Copyright © UNIASSELVI 2019

Elaboração:
Prof.a Mara Gonzalez Bezerra
Prof.a Luiziane da Silva Rosa

Revisão, Diagramação e Produção:


Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI

Ficha catalográfica elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri


UNIASSELVI – Indaial.

R788l
Rosa, Luiziane da Silva

Literatura hispânica II. / Luiziane da Silva Rosa; Mara Gonzalez


Bezerra. – Indaial: UNIASSELVI, 2019.

252 p.; il.

ISBN 978-85-515-0305-8

1. Literatura espanhola. – Brasil. 2. Literatura hispano-americana. –


Brasil. I. Bezerra, Mara Gonzalez. II. Centro Universitário Leonardo Da Vinci.

CDD 860

Impresso por:
Apresentação
Caro acadêmico, neste livro didático você encontrará algumas
informações e exemplos de textos representativos da literatura hispano-
americana. Os países de fala espanhola nas Américas são: Argentina,
Paraguai, Uruguai, Colômbia, Peru, Chile, Equador, Bolívia, Venezuela, El
Salvador, Nicarágua, Guatemala, Costa Rica, Cuba, Honduras, Panamá,
República Dominicana e México. E cada um visto geograficamente, com suas
próprias variações linguísticas, sociais e culturais.

A Unidade 1 aborda o reconhecimento cultural e literário dos povos


originários, os primeiros encontros de culturas a partir dos relatos espanhóis,
o Barroco hispano-americano e seus escritores. A Unidade 2 apresenta o
reflexo social europeu como influência em movimentos independentistas e
a incipiente formação de textos hispano-americanos com elementos locais,
o gênero gauchesco é um exemplo. A Unidade 3 aponta para escritores em
busca de uma literatura própria hispano-americana e que se torna reconhecida
mundialmente, mas em busca de uma independência cultural.

Estudar a literatura das Américas requer uma pesquisa contínua, um


fato para o aluno de Letras-Espanhol. Ao desenvolver uma reflexão sobre
qual é o papel da literatura na educação, percebemos que nos torna críticos
e reflexivos na vida cotidiana. Certamente o assunto não se esgota aqui, a
variedade e o conteúdo dos gêneros textuais publicados ao longo de séculos
e os que ainda surgirão devem nos tornar um estudante “insatisfeito” com o
desejo constante de saber mais.

Bons estudos!

Prof.a Dr.a Mara Gonzalez Bezerra


Prof.a M.a Luiziane da Silva Rosa

III
NOTA

Você já me conhece das outras disciplinas? Não? É calouro? Enfim, tanto


para você que está chegando agora à UNIASSELVI quanto para você que já é veterano, há
novidades em nosso material.

Na Educação a Distância, o livro impresso, entregue a todos os acadêmicos desde 2005, é


o material base da disciplina. A partir de 2017, nossos livros estão de visual novo, com um
formato mais prático, que cabe na bolsa e facilita a leitura.

O conteúdo continua na íntegra, mas a estrutura interna foi aperfeiçoada com nova
diagramação no texto, aproveitando ao máximo o espaço da página, o que também
contribui para diminuir a extração de árvores para produção de folhas de papel, por exemplo.

Assim, a UNIASSELVI, preocupando-se com o impacto de nossas ações sobre o ambiente,


apresenta também este livro no formato digital. Assim, você, acadêmico, tem a possibilidade
de estudá-lo com versatilidade nas telas do celular, tablet ou computador.
 
Eu mesmo, UNI, ganhei um novo layout, você me verá frequentemente e surgirei para
apresentar dicas de vídeos e outras fontes de conhecimento que complementam o assunto
em questão.

Todos esses ajustes foram pensados a partir de relatos que recebemos nas pesquisas
institucionais sobre os materiais impressos, para que você, nossa maior prioridade, possa
continuar seus estudos com um material de qualidade.

Aproveito o momento para convidá-lo para um bate-papo sobre o Exame Nacional de


Desempenho de Estudantes – ENADE.
 
Bons estudos!

IV
V
VI
Sumário
UNIDADE 1 – O PERÍODO COLONIAL HISPANO-AMERICANO............................................ 1

TÓPICO 1 – O LEGADO DOS POVOS ORIGINÁRIOS ATÉ A CHEGADA DOS


PRIMEIROS EUROPEUS AO NOVO MUNDO......................................................... 3
1 INTRODUÇÃO...................................................................................................................................... 3
2 A LITERATURA PRÉ-HISPÂNICA: O LEGADO DOS POVOS ORIGINÁRIOS................... 3
2.1 OS MAIAS.......................................................................................................................................... 6
2.1.1 Popol Vuh................................................................................................................................. 9
2.2 OS ASTECAS..................................................................................................................................... 13
2.2.1 Netzahualcóyotl – Um Imperador Poeta Náuatle............................................................... 15
2.3 OS INCAS.......................................................................................................................................... 16
2.3.1 Os Quipus e os Quellcas (Quicas)......................................................................................... 18
2.4 OS GUARANIS................................................................................................................................. 23
2.4.1 Outros povos originários........................................................................................................ 24
3 A EXPANSÃO DA COROA ESPANHOLA...................................................................................... 25
3.1 ISABEL E FERNANDO – OS REIS CATÓLICOS......................................................................... 25
3.2 AS NAVEGAÇÕES, OS PLANOS E AS DESCOBERTAS MARÍTIMAS................................... 28
3.3 O TRATADO DE TORDESILHAS – ESPANHA E PORTUGAL COMO POTÊNCIAS
MARÍTIMAS...................................................................................................................................... 28
LEITURA COMPLEMENTAR................................................................................................................ 31
RESUMO DO TÓPICO 1........................................................................................................................ 33
AUTOATIVIDADE.................................................................................................................................. 34

TÓPICO 2 – AS MISSIVAS DO NOVO MUNDO............................................................................. 37


1 INTRODUÇÃO...................................................................................................................................... 37
2 AS NOTÍCIAS DO COLONIZADOR............................................................................................... 37
2.1 CRISTÓVÃO COLOMBO................................................................................................................ 39
2.2 HERNÁN CORTÉS NO MÉXICO.................................................................................................. 41
2.3 A TRADUÇÃO COMO UMA ESTRATÉGIA DA COLONIZAÇÃO........................................ 42
2.4 FRANCISCO PIZARRO NO PERU................................................................................................ 44
3 AS NARRATIVAS SOBRE AMÉRICA.............................................................................................. 46
3.1 BERNAL DÍAZ DEL CASTILLO . ................................................................................................. 49
3.2 FRANCISCO LÓPEZ DE GÓMARA ............................................................................................ 50
3.3 FELIPE GUAMÁN POMA DE AYALA......................................................................................... 51
3.4 INCA GARCILASO DE LA VEGA................................................................................................ 52
3.5 ÁLVAR NÚÑEZ CABEZA DE VACA .......................................................................................... 54
3.6 ALONSO DE ERCILLA Y ZÚÑIGA – A ÉPICA ......................................................................... 54
4 O BARROCO HISPANO-AMERICANO.......................................................................................... 56
4.1 O TEATRO COLONIAL – JUAN RUIZ DE ALARCÓN Y MENDOZA................................... 61
4.2 AS LETRAS DE CARLOS DE SIGUËNZA Y GÓNGORA......................................................... 64
4.3 AS LETRAS DO CONVENTO........................................................................................................ 65
4.4 SOR JUANA INÉS DE LA CRUZ – UMA ESCRITORA BARROCA........................................ 66
4.5 SOR JUANA ESCREVE SOBRE A PRESENÇA AFRICANA NAS COLÔNIAS
ESPANHOLAS ................................................................................................................................. 70

VII
LEITURA COMPLEMENTAR................................................................................................................ 73
RESUMO DO TÓPICO 2........................................................................................................................ 76
AUTOATIVIDADE.................................................................................................................................. 77

UNIDADE 2 – PANORAMA DA LITERATURA HISPANO-AMERICANA DOS


SÉCULOS XVIII E XIX.................................................................................................. 81

TÓPICO 1 – POR UMA IDENTIDADE LITERÁRIA LATINO-AMERICANA........................... 83


1 INTRODUÇÃO...................................................................................................................................... 83
2 A CORTE ESPANHOLA NOS TERRITÓRIOS HISPANO-AMERICANOS ANTES
DAS INDEPENDÊNCIAS.................................................................................................................... 83
3 O MOVIMENTO DAS INDEPENDÊNCIAS NAS COLÔNIAS HISPANO-
AMERICANAS....................................................................................................................................... 88
LEITURA COMPLEMENTAR................................................................................................................ 92
RESUMO DO TÓPICO 1........................................................................................................................ 94
AUTOATIVIDADE.................................................................................................................................. 95

TÓPICO 2 – A FORMAÇÃO DE UMA LITERATURA HISPANO-AMERICANA..................... 97


1 INTRODUÇÃO...................................................................................................................................... 97
2 A LITERATURA DO SÉCULO XVIII................................................................................................ 97
3 A LITERATURA HISPANO-AMERICANA ENTRE O SÉCULO XVIII E O XIX..................... 100
4 O NEOCLASSICISMO......................................................................................................................... 101
4.1 JOSÉ DE LIZARDI............................................................................................................................ 101
4.2 ANDRÉS BELLO . ............................................................................................................................ 104
4.3 JOSÉ JOAQUÍN OLMEDO.............................................................................................................. 106
4.4 SIMÓN BOLÍVAR ............................................................................................................................ 107
5 A TRANSIÇÃO LITERÁRIA DO SÉCULO XVIII PARA O XIX ................................................ 110
LEITURA COMPLEMENTAR................................................................................................................ 111
RESUMO DO TÓPICO 2........................................................................................................................ 113
AUTOATIVIDADE.................................................................................................................................. 114

TÓPICO 3 – A LITERATURA HISPANO-AMERICANA DO SÉCULO XIX................................ 117


1 INTRODUÇÃO...................................................................................................................................... 117
2 GÊNEROS E AUTORES HISPANO-AMERICANOS DO SÉCULO XIX................................... 118
3 O ROMANTISMO................................................................................................................................. 120
3.1 ESTEBAN ECHEVERRÍA................................................................................................................ 122
3.2 MARIANO MELGAR ..................................................................................................................... 127
3.3 JOSÉ MÁRMOL ............................................................................................................................... 129
3.4 DOMINGO F. SARMIENTO . ........................................................................................................ 130
4 OS RELATOS DAS EXPEDIÇÕES MILITARES AO INTERIOR DO PAÍS.............................. 132
5 O REALISMO......................................................................................................................................... 135
5.1 ESTEBAN ECHEVERRÍA . ............................................................................................................. 136
6 A POESIA GAUCHESCA..................................................................................................................... 138
6.1 JOSÉ HERNÁNDEZ......................................................................................................................... 141
6.2 RAFAEL OBLIGADO....................................................................................................................... 142
6.3 ESTANISLAO DEL CAMPO . ........................................................................................................ 144
6.4 EDUARDO GUTIÉRREZ . .............................................................................................................. 146
7 O MODERNISMO ................................................................................................................................ 152
7.1 JOSÉ MARTÍ...................................................................................................................................... 154
7.2 RUBÉN DARÍO ................................................................................................................................ 156

VIII
8 A TRADIÇÃO ........................................................................................................................................ 159
9 AS CORRENTES IMIGRATÓRIAS................................................................................................... 160
LEITURA COMPLEMENTAR................................................................................................................ 163
RESUMO DO TÓPICO 3........................................................................................................................ 166
AUTOATIVIDADE.................................................................................................................................. 167

UNIDADE 3 – O PANORAMA DA LITERATURA HISPANO-AMERICANA ENTRE


OS SÉCULOS XX e XXI................................................................................................ 169

TÓPICO 1 – A LITERATURA HISPANO-AMERICANA NA VIRADA DO SÉCULO XX........ 171


1 INTRODUÇÃO...................................................................................................................................... 171
2 A INFLUÊNCIA ESTRANGEIRA NA LITERATURA HISPANO-AMERICANA.................... 171
3 O MODERNISMO E SEUS MOVIMENTOS APÓS 1900 ............................................................ 172
3.1 CÉSAR VALLEJO.............................................................................................................................. 174
4 A VANGUARDA HISPANO-AMERICANA.................................................................................... 176
4.1 POR DENTRO DA VANGUARDA................................................................................................ 179
4.2 VICENTE HUIDOBRO.................................................................................................................... 180
4.3 JORGE LUÍS BORGES . ................................................................................................................... 182
LEITURA COMPLEMENTAR................................................................................................................ 187
RESUMO DO TÓPICO 1........................................................................................................................ 190
AUTOATIVIDADE.................................................................................................................................. 191

TÓPICO 2 – O SÉCULO XX – A TEXTUALIDADE HISPANO-AMERICANA........................... 193


1 INTRODUÇÃO...................................................................................................................................... 193
2 AFIRMAÇÃO DE UMA LITERATURA HISPANO-AMERICANA ........................................... 193
3 A LITERATURA HISPANO-AMERICANA E O BOOM HISPANO-AMERICANO............... 195
4 DEPOIS DA VANGUARDA HISPANO-AMERICANA OU UMA LITERATURA
CONTEMPORÂNEA ........................................................................................................................... 197
4.1 JUAN CARLOS ONETTI................................................................................................................. 197
4.2 AUGUSTO ROA BASTOS............................................................................................................... 199
4.3 JUAN RULFO.................................................................................................................................... 200
4.4 JULIO CORTÁZAR.......................................................................................................................... 203
4.5 MARIO VARGAS LLOSA................................................................................................................ 205
4.6 PABLO NERUDA............................................................................................................................. 206
5 O REALISMO MARAVILHOSO E O REALISMO MÁGICO ..................................................... 207
LEITURA COMPLEMENTAR................................................................................................................ 214
RESUMO DO TÓPICO 2........................................................................................................................ 219
AUTOATIVIDADE.................................................................................................................................. 220

TÓPICO 3 – A LITERATURA CONTEMPORÂNEA HISPANO-AMERICANA......................... 223


1 INTRODUÇÃO...................................................................................................................................... 223
2 A LITERATURA DA AMÉRICA CENTRAL E MÉXICO............................................................... 223
3 A LITERATURA RIO-PLATENSE...................................................................................................... 226
3.1 JOSEFINA PLÁ................................................................................................................................. 227
3.2 SUSY DELGADO.............................................................................................................................. 227
4 A LITERATURA ANDINA.................................................................................................................. 230
LEITURA COMPLEMENTAR................................................................................................................ 234
RESUMO DO TÓPICO 3........................................................................................................................ 237
AUTOATIVIDADE.................................................................................................................................. 238

REFERÊNCIAS.......................................................................................................................................... 241

IX
X
UNIDADE 1

O PERÍODO COLONIAL
HISPANO-AMERICANO

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
A partir desta unidade, você deverá ser capaz de:

• conhecer a história e a contribuição literária dos povos originários;

• refletir sobre a importância dos gêneros textuais e literários utilizados


pelos europeus para descrever o novo mundo;

• compreender a participação de pessoas autóctones e estrangeiras na


formação de uma literatura crioula.

PLANO DE ESTUDOS
Esta unidade está dividida em dois tópicos. No decorrer da unidade
você encontrará autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo
apresentado.

TÓPICO 1 – O LEGADO DOS POVOS ORIGINÁRIOS ATÉ A CHEGADA


DOS PRIMEIROS EUROPEUS AO NOVO MUNDO

TÓPICO 2 – AS MISSIVAS DO NOVO MUNDO

1
2
UNIDADE 1
TÓPICO 1

O LEGADO DOS POVOS ORIGINÁRIOS ATÉ A CHEGADA


DOS PRIMEIROS EUROPEUS AO NOVO MUNDO

1 INTRODUÇÃO
Bem-vindo ao Tópico 1! Começamos a jornada com os povos originários,
os habitantes do continente antes da chegada do europeu. As pesquisas
de historiadores e arqueólogos comprovam que estes povos tinham um
desenvolvimento cultural, social, literário, artístico e humano e alguns com maior
expressão.

Para este tópico foi realizado um recorte a partir da literatura e dos


gêneros textuais desenvolvidos durante o período denominado pré-colombiano,
da conquista e o colonial.

Iremos destacar alguns autores e textos importantes, mas sem esgotar


cada tema, porque o importante é adquirir uma base para o entendimento de
como a literatura hispano-americana se desenvolveu a partir do encontro entre
europeus e povos originários.

Por isso, não deixe de ler os textos indicados, assim como as leituras
complementares para saber mais. Cada gênero textual e literário apresentado irá
somar para que você, leitor, obtenha no fim do estudo um panorama cronológico
do desenvolvimento da literatura hispano-americana. Para tanto, discutiremos,
neste primeiro tópico:

• Os primeiros gêneros textuais das civilizações da Mesoamérica.


• Aproximação aos maias e astecas, incas e guaranis.
• A importância dos códices, ou códex, para o registro da oralidade e escritura.
• A influência da cultura e da língua espanhola nos textos nativos.
• Autores e textos representativos do período colonial hispânico.

2 A LITERATURA PRÉ-HISPÂNICA: O LEGADO DOS


POVOS ORIGINÁRIOS
Neste tópico abordaremos a forma como antigos impérios mantiveram
viva a memória, a preservação de tradições e culturas a partir de meios
pictográficos, objetos como cordas e, principalmente, a tradição oral passada de
geração a geração.

3
UNIDADE 1 | O PERÍODO COLONIAL HISPANO-AMERICANO

O período pré-colombiano se refere àqueles que já habitavam as Américas


antes de 1492, e se tem notícias de pesquisas históricas que comprovam que
outros povos, como os navegadores vikings, estiveram na América muito antes
dos espanhóis, mas sem repercussão.

DICAS

Assista ao filme Eréndira, la indomable (2007). Sob direção de Juan Carlos


Mora Cattlet, narra a vida de Eréndira Ikikunari, uma jovem tarasca que desafiou e lutou contra
os conquistadores espanhóis. Mostra a história do ponto de vista dos indígenas. Disponível na
íntegra em https://www.youtube.com/watch?v=hpthoMJyQwk.

As diversas civilizações que povoaram o continente americano em


nada ficavam para trás das europeias. A chegada dos espanhóis ao continente
americano foi um marco histórico e social, e o mundo não seria o mesmo após
Colombo e suas caravelas.

O estudo relacionado à literatura hispano-americana é extenso. As fontes


e referências são muitas e compõem um vasto leque de publicações literárias,
além de artigos científicos, pesquisas sobre sítios arqueológicos e resultados.

A própria internet possibilita o acesso a material que dificilmente seria


encontrado impresso, por isso sugerimos sempre, ao longo dos estudos, que você
desenvolva um estudo interdisciplinar para apreciação sob diversos prismas do
mesmo tema, porém sempre procurando em fontes responsáveis pela divulgação
de notícias e arquivos.

Antes de comentar sobre cada povo é importante começar a esclarecer


sobre a literatura oral e a importância dos códices.

Por outro lado, nas últimas décadas do século XX, a História Oral
começou a estreitar laços com a Literatura. Daí em diante a abordagem
interdisciplinar tem se constituído em um dos principais caminhos
para a História Oral, não apenas História Oral no diálogo História/
Literatura, mas também no diálogo entre História e iconografia
(SILVA; SILVA, 2009, p. 187).

É indiscutível que a organização social e as artes dos povos originários,


como maias, astecas e incas, principalmente, além de outros povos minoritários,
mas não menos importantes na sua cultura, causaram um certo estupor para o
recém-chegado.

4
TÓPICO 1 | O LEGADO DOS POVOS ORIGINÁRIOS ATÉ A CHEGADA DOS PRIMEIROS EUROPEUS AO NOVO MUNDO

A escrita de cartas, relatos e crônicas sobre o cotidiano recém-descoberto,


enviados para seus superiores, continha uma variedade muito grande de temas,
como a descrição de aparências, as tradições, os costumes, comidas, animais, as
riquezas etc.

Os cronistas recolheram as histórias contadas oralmente e tiveram um


trabalho de escrever apresentações do novo mundo, assim descreveram as
formas de gravar textos em suportes diferentes de papel, como os quipus incaicos.
Os glifos astecas foram também alvo de curiosidade e muitos dos códices foram
destruídos ou espoliados e enviados para a Europa pelo colonizador sem nenhum
pudor.

NOTA

Glifos são signos da cultura maia, asteca e olmeca (entre outros povos pré-
hispânicos da Mesoamérica) que carregam algumas características. Basicamente existiam
cinco categorias de glifos: os de representação numérica (numéricos), os de representação
temporal com o uso de datas (calendário), os de representação de objetos (pictográfico), os
de representação de ideias (ideográfico) e os de representação de sons e escrita (fonético).

É importante ressaltar que o gênero epistolar foi frequentemente utilizado


para descrever o novo mundo, e como se sabe, sobre ele há também um peso
histórico e social, já que o registro escrito trazia a visão do europeu na nova terra.

Certamente você já deve ter ouvido ou lido algo sobre a carta que Pero Vaz
de Caminha escreveu ao rei Dom Manuel, em Portugal, escrita em Porto Seguro,
no final do mês de abril de 1500. A carta, considerada o primeiro marco literário
do país, também é conhecida como “Carta de Achamento do Brasil”. Ela narra
como foi o encontro com os índios, como aconteceu a primeira missa, como foi a
recepção e tentativa de domesticação dos índios, enfim, as primeiras impressões.

Um pouco antes da chegada de Cristóvão Colombo até 1500, tantas outras


cartas e relatos de viagens foram escritos e são também considerados textos
literários. A respeito do relato de viagem é interessante dizer que o registro de
um diário, pela sua composição, é uma variante da autobiografia (GUZMÁN-
RUBIO, 2011) e, como variação, terá a percepção ou experiência do autor como
composição essencial da obra.

La escritura diarística, por su intención de contar vivencias reales, es


una variante de la autobiográfica. Lo que la diferencia de esta es su
pretensión de simultaneidad y un mayor apego a la verdad, puesto
que las entradas de un diario no se consignan como una evocación
lejana, sino poco tiempo después de ocurridos los hechos, aunque más
tarde se corrija su relato (GUZMÁN-RUBIO, 2011, p. 117).

5
UNIDADE 1 | O PERÍODO COLONIAL HISPANO-AMERICANO

Nesse sentido, a experiência vivenciada em terras hispano-americanas foi


contada pelo olhar de quem esteve naquele contexto. Isso, pressupõe um olhar
individual, um ponto de vista ideológico de alguém que não foi um habitante
autóctone e escreveu com um estilo literário europeu.

Tanto a carta quanto o diário de viagem carregam consigo dados precisos


que remetem à temporalidade, isto é, há uma precisão cronológica e delimitação
temporal exatas, de acordo com Guzman-Rubio (2011). Podemos nos localizar
na época em que está narrada aquela história, e por isso esses gêneros são mais
fiéis ao caráter temporal. Assim, quando falamos em uma literatura deixada por
um povo originário, é importante esclarecer sob qual ponto de vista está sendo
analisado, uma vez que pode não coincidir com os demais escritos ou registros.

Dessa forma, concordamos com León-Portilla (2012) quando sugere que,


ao estudar a literatura dos povos americanos, é imprescindível fazer-se algumas
perguntas, tais como: O que representava o livro para o habitante mesoamericano?
(incluímos também outros povos originários), Como era a leitura dos conteúdos?
Quais eram seus significados? Qual foi o impacto da conquista nesses livros?
Como esses dois mundos, o velho mundo e o novo mundo, relacionavam-se e se
inter-relacionavam com os textos?

O encontro de dois mundos irá se traduzir em um choque cultural. Ainda


longe de uma transculturação, a cultura europeia e a dos povos originários irão
assimilar aspectos do outro, como os linguísticos, sociais e culturais, porém a
cultura espanhola é a que irá se impor, principalmente pela língua castelhana.

DICAS

Para você conhecer um pouco mais sobre esses gêneros, indicamos buscar
na internet as cartas que os escrivães e navegadores escreviam para os reis. Observe como
são retratados os índios, a paisagem, as situações e os próprios europeus naquela época. Um
exemplo são as primeiras cartas escritas por Cristóvão Colombo, que iremos abordar mais
adiante o tema. Acesse o site: http://www.biblioteca.org.ar/libros/131757.pdf

2.1 OS MAIAS
Os maias, que criaram seu império na América Central, legaram um
conjunto arquitetônico e literário cuja preservação permite ainda que se aprecie e
se entenda um pouco sobre este povo.

O povo maia viveu na região denominada Mesoamérica, que hoje


compreende alguns territórios do México, Guatemala, Belize, Honduras e El
Salvador.
6
TÓPICO 1 | O LEGADO DOS POVOS ORIGINÁRIOS ATÉ A CHEGADA DOS PRIMEIROS EUROPEUS AO NOVO MUNDO

A civilização maia resguarda ainda a presença na atualidade,


principalmente na arquitetura (com suas monumentais pirâmides e plataformas
cerimoniais), na história e nos traços fenotípicos de seu povo.

A escrita deixada pelos maias é o único sistema quase totalmente decifrado


dentre as demais civilizações mesoamericanas. Isto porque as primeiras inscrições
desse sistema de escrita datam do século III a.C. e foi usada até pouco tempo
depois da chegada dos espanhóis. Das características dessa escrita destaca-se
o uso de logogramas complementados por um jogo de glifos silábicos, muito
similares à escrita japonesa e bem distantes do alfabeto fonético espanhol. Alguns
pesquisadores afirmam que a forma é muito similar à escrita egípcia, por utilizar
desenhos similares ao hieróglifo. No entanto, o alfabeto maia não é similar ao
alfabeto espanhol.

A língua escrita maia estudada hoje em dia, mas que foi pioneira na
América, consistia em uma mistura de aspectos da língua maia com o espanhol
pós-conquista. Os livros que se conservam não são fáceis de interpretar, sobretudo
pelo caráter mitológico e religioso, mas também contextual. Até mesmo os
primeiros maias que tiveram acesso a esses registros ou ajudaram a escrevê-los
tiveram dificuldades de interpretar. No entanto, muitos pesquisadores concordam
que uma marca estilística do texto é a inspiração poética e patriótica retratando
ciência, religião e história da época.

Com relação às produções literárias, muito pouco se tem notícia, mas


o marco da literatura está nos Códices Maias. Códices, do latim, significa "livro",
"bloco de madeira", “manuscrito”, são os objetos com os registros escritos de
antigas civilizações. Os maias usavam para escrever um papel fabricado à base
de fibras vegetais com capa de madeira. Muitos foram destruídos com o tempo e
também pelos conquistadores espanhóis. Estuda-se comumente quatro relíquias:
o Códice de Dresde, o Códice Tro-Cortesiano, o Códice Peresiano e o Códice Grolier, que
se encontram respectivamente em Dresden (Alemanha), Madri (Espanha), Paris
(França) e Cidade de México (México).

DICAS

Você pode saber mais sobre os CÓDICES a partir dos textos de Miguel León-
Portilla, importante escritor e historiador mexicano. Ele aborda em seu livro enciclopédico
Códices: los antiguos libros del nuevo mundo (2003) a escrita pré-hispânica e colonial de
povos da Mesoamérica. O autor esclarece o que são códices, quem os fez, como se liam e
como se classificam. Leia uma resenha sobre o tema:

• BRISENO, María Elena. Códices: los antiguos libros del nuevo mundo. Anales del Instituto
de Investigaciones Estéticas, México, v. 24, n. 81, p. 175-178, nov. 2002. https://bit.ly/2p1tPEr.
Acesso em: 7 dez. 2018.

7
UNIDADE 1 | O PERÍODO COLONIAL HISPANO-AMERICANO

Os livros de Chilam Balam, Popol Vuh e Los Anales de los Cakchiqueles foram
escritos respectivamente em “maya yucateco”, “quiché” e “cakchiquel” utilizando
o alfabeto latino trazido pelos espanhóis.

Tras la conquista española, la tradición y la ciencia de los pueblos


mayas fue transcrita de los textos originales pictográficos y del
recuerdo memorizado a caracteres latinos en las diferentes lenguas de
la zona. Así ocurrió con los varios libros del Chilam Balam, escritos
en maya, y con el Popol Vuh, escrito en quiche (BELLINI, 1997, p. 39).

Existe um códice da época da conquista, o Códice de Calkíni, e outros vêm


sendo estudados, como a obra dramática El Rabinal Achí, escrito em quiché, que
representa a rivalidade entre dois lugares, suas guerras, a captura e morte de um
de seus guerreiros e o cotidiano.

No próximo item veremos um pouco desse legado maia a partir do livro


sagrado de conselhos, o Popol Vuh, que trata da essência e escrita maia da época.
Sem dúvida, é um imenso registro dos primeiros povos mesoamericanos.

DICAS

Herbert M. Herget (Saint Louis, Missouri, Estados Unidos, 1885-1955) foi um


notável artista que trabalhou para a revista National Geographic. Ele fez ilustrações sobre o
povo maia intituladas "Portraits of Ancient Mayas" (1935) e "Life and Death in Ancient Maya
Land" (1936) retratando a sociedade, os hábitos e a hierarquia política. Você pode encontrar
cada ilustração detalhadamente em: https://goo.gl/4hg3Z1.

DICAS

Além de documentários, sugerimos que você assista ao filme Apocalypto, de


2006. Foi escrito, produzido e dirigido por Mel Gibson em parceria com Farhad Sarfinia. O
filme retrata um povo nativo americano antes da chegada dos espanhóis, especificamente
sob o ponto de vista de um guerreiro. O filme teve muitas críticas por expor a violência, mas
ao mesmo tempo justificada por conta dos ritos religiosos desses povos e o deslocamento de
tribos por conta de guerras internas. Boa parte do filme é falado em maia iucateco.
Acesse: https://archive.org/details/videoplayback_20160530 e confira!

8
TÓPICO 1 | O LEGADO DOS POVOS ORIGINÁRIOS ATÉ A CHEGADA DOS PRIMEIROS EUROPEUS AO NOVO MUNDO

DICAS

Assista ao filme 1492, a conquista do Paraíso, de 1992, dirigido por Ridley


Scott. É um longa-metragem épico e de aventura com Gérard Depardieu, Sigourney Weaver,
entre outros atores. O filme trata da chegada de Cristóvão Colombo à América e como se
deu essa ocupação. Disponível em: https://bit.ly/2SJiJ2P.

2.1.1 Popol Vuh


O Popol Vuh é o livro de conselhos dos índios quichés (Popol significa
“comunidade” ou “conselho” e Vuh significa “livro”). Foi transmitido pela língua
oral até provavelmente o século XVI, e os primeiros registros escritos encontrados
carregam certos traços de mestiçagem espanhola, embora tenha sido escrito por
índios na língua quiché, com caracteres latinos. Isso quer dizer que embora tenha
sido registrado na sua escrita, o livro ainda carrega fortes traços da língua oral
daquele povo. A obra é um clássico da história universal. Digamos que é uma
Bíblia Indígena semelhante à parte do que conhecemos hoje como o Gênesis.
As narrativas apresentam diversas características de cunho histórico, religioso e
mitológico do povo maia.

O livro foi traduzido para o espanhol pelo padre Francisco Ximénez,


pertencente à Paróquia de Santo Tomás Chuilá, atualmente Chichicastenango,
Guatemala. A parte traduzida foi incorporada em outro livro que ele estava
escrevendo, o Primer Tomo de la Crónica de la Província de Chiapa y Guatemala. A
obra foi traduzida ao espanhol e a diversas línguas. A Ediciones Libertador tem
impresso um livro intitulado Popol Vuh. Libro Sagrado de los Mayas. O livro resgata
o verdadeiro compêndio da mitologia maia e de seu livro sagrado de conselhos.
Facilmente se encontra uma versão na internet para leitura.

Popol Vuh pode ser caracterizado por três partes. A primeira trata da
história da criação do mundo e do homem. A segunda se refere às aventuras de
personagens míticos como Hunahpú, Ixbalanqué e Ixquix e suas lutas com os gênios
do mal, os senhores de Xibalbá. É importante considerar que deuses (maiores e
menores), profetas e sábios se misturam com fábulas que envolviam animais,
forças da natureza e outros símbolos da natureza, como árvores, fogo e céu. Essa
parte, representativa e simbólica, foi tranquilamente interpretada nos estudos da
língua quiché.

9
UNIDADE 1 | O PERÍODO COLONIAL HISPANO-AMERICANO

FIGURA 1 – PORTADA DO LIVRO POPOL VUH

FONTE: <https://goo.gl/oRVaWP>. Acesso em: 24 jun. 2018.

DICAS

Para conhecer um pouco mais da cultura maia, povo guatemalteco e do


legado do Popol Vuh, acesse o link pertencente à Universidade Francisco Marroquín: https://
bit.ly/2D3q6PC.

Especificamente sobre a criação dos homens, o livro Popol Vuh narra a


história da seguinte maneira:

Primeira criação: os deuses criaram a Terra e a população de animais


dando-lhes a cada um uma linguagem, mas como não foram capazes de pronunciar
os nomes divinos, foram castigados por isso, destruindo sua “linguagem”.

Segunda criação: esses deuses, chamados de construtores ou formadores,


criam as figuras humanas de barro que falam, mas lhes falta a habilidade de pensar.
Não satisfeitos com essa figura, a igual que a primeira, resolveram destruí-las.

Terceira criação: corresponde à fabricação de bonecos que lembravam


a forma humana. Esses bonecos falavam e tiveram uma linhagem, mas como
careciam de sangue, acabaram secos. Atribui-se esse estágio a uma espécie de
ensaio da existência da humanidade sobre a Terra. Os utensílios de cozinha e os
animais domésticos se revoltaram contra esses manequins e uma espessa chuva os
destruiu. Os que sobreviveram fugiram para os montes convertidos em macacos.

Quarta criação: depois de celebrar novo conselho, por fim, os deuses


fizeram definitivamente o homem como o conhecemos: os primeiros pais
da humanidade. Para isso, fortaleceram-no com alguns ingredientes-chave,
como uma substância branca extraída do milho, para dar-lhe forma. Depois,

10
TÓPICO 1 | O LEGADO DOS POVOS ORIGINÁRIOS ATÉ A CHEGADA DOS PRIMEIROS EUROPEUS AO NOVO MUNDO

recorreram de desbravarem os espaços da Terra, agradeceram sua criação aos


deuses, comprovando que tinham inteligência para compreender os segredos do
universo.

DICAS

Veja a bela narrativa do Popol Vuh sobre o mito da criação neste vídeo: El Mito
de la Creación Maya Quiché, Popol Vuh, disponível em https://bit.ly/1JQ5eXq, ou leia a obra
Popol Vuh na íntegra: https://bit.ly/2mAYgxU.

FIGURA 2 – CENA DO MITO DA CRIAÇÃO MAIA

FONTE: <https://bit.ly/1JQ5eXq>. Acesso em: 30 mar. 2019.

Como podemos inferir, o Popol Vuh é uma obra de caráter simbólico,


composta pela história do povo quiché, desde a Pré-História até a pós-vinda dos
europeus. Aporta um material valiosíssimo porque não temos somente a história
dos povos autóctones da América, mas temos também o legado que deixaram de
conhecimento no campo das artes, ciências e cultura em geral.

A linguagem do livro-conselho é metafórica, por isso as imagens são


fundamentais para interpretar ou fazer analogias ao nosso tempo. A metáfora é
parte do estilo de escrita usado para enriquecer a fábula, que tem como objetivo
apresentar uma moral ou conselho.

A linguagem do Popol Vuh é intrigante por explicar racionalmente o


universo com imagens metafóricas, oferecendo assim uma das maiores riquezas
semânticas dentre os escritos antigos.

Talvez por essa razão é que a obra seja lembrada e estudada por sociólogos,
historiadores, antropólogos e linguistas, porque aporta uma visão misteriosa de
um povo originário a partir de uma linguagem poética.

11
UNIDADE 1 | O PERÍODO COLONIAL HISPANO-AMERICANO

Em comparação, Popol Vuh foi colocado como obra emblemática igual


às obras teogônicas da humanidade, por tal profundidade de ideias ao abordar
gêneses e as deidades. Também foi comparada com grandes obras que registravam
antigas epopeias da Índia e da Grécia, dado ao seu valor literário, a luta entre
homens e a presença de divindades. A seguir está um fragmento da primeira
criação:

He aquí el relato de cómo todo estaba en suspenso, todo tranquilo,


todo inmóvil, todo apacible, todo silencioso, todo vacío, en el cielo, en
la tierra. He aquí la primera historia, la primera descripción.
No había un solo hombre, un solo animal, pájaro, pez, cangrejo,
madera, piedra, caverna, barranca, hierba, selva. Sólo el cielo existía.
La faz de la tierra no aparecía; sólo existían la mar limitada, todo el
espacio del cielo. No había nada reunido, junto. Todo era invisible,
todo estaba inmóvil en el cielo.
No existía nada edificado. Solamente el agua limitada, solamente la
mar tranquila, sola, limitada. Nada existía. Solamente la inmovilidad,
el silencio, en las tinieblas, en la noche. [...]
Entonces vino la Palabra; vino aquí de los Dominadores, de los
Poderosos del Cielo, en las tinieblas, en la noche: fue dicha por los
Dominadores, los Poderosos del Cielo; hablaron: entonces celebraron
consejo, entonces pensaron, se comprendieron, unieron sus palabras,
sus sabidurías. Entonces se mostraron, meditaron, en el momento del
alba; decidieron construir al hombre, mientras celebraban consejo
sobre la producción, la existencia, de los árboles, de los bejucos, la
producción de la vida, de la existencia, en las tinieblas, en la noche,
por los Espíritus del Cielo llamados Maestros Gigantes (ASTURIAS;
MENDOZA, s.d., s.p.).

Não podemos deixar de mencionar outro livro marcante da Mesoamérica:


o livro de Chilam Balam. Este livro se tornou conhecido por narrar o desespero
dos indígenas frente à ocupação espanhola que foi, segundo o próprio livro,
profetizada por um sacerdote. No entanto, cabe esclarecer que é uma obra
contestada, já que houve diferentes escritores (e povos) com diferentes escritas
nas primeiras décadas da conquista espanhola, criando assim outras versões.
Não há um estilo ou gênero definido, já que comporta uma miscelânea de temas
da história, medicina, religião, rituais, calendários, astronomia e artes. Digamos
que é um tratado que registra o conhecimento e sabedorias maias da época.

Ao que tudo indica, Chilam Balam foi escrito por sacerdotes maias que
transcreveram os textos para hieróglifos em lugares sagrados e acrescentaram
notícias dos conhecimentos de cada um desses locais. Geralmente eram
consultados ou lidos em rituais específicos ou em ocasiões especiais.

12
TÓPICO 1 | O LEGADO DOS POVOS ORIGINÁRIOS ATÉ A CHEGADA DOS PRIMEIROS EUROPEUS AO NOVO MUNDO

NOTA

Os livros da pós-conquista não existem mais e os fragmentos literários


encontrados são cópias do século XVI. Ainda assim são grandes registros que comportam
um legado muito significativo para compreender não só a história, mas a literatura daquele
povo.

2.2 OS ASTECAS
Outro povo originário da região do México é o povo asteca, que se
autodenominava mexica, em língua Náuatle. Esse povo se estabeleceu no centro
do vale mexicano e guatemalteco que hoje compreende as regiões de Veracruz,
Puebla, Oaxaca, Guerrero, Chiapas e parte da Guatemala. Pertence aos povos
pré-colombianos da Mesoamérica e dominou grande parte deste território.

A sociedade asteca considerava a hierarquia como base das regras do


cotidiano. Ela compreendia desde os guerreiros a imperadores e sacerdotes. A
vestimenta e o acesso a alimentos e bebidas se diferenciavam conforme o status
social. Em certas ocasiões, a vestimenta mudava para representar os deuses em
rituais religiosos.

O povo asteca surpreendeu os colonizadores por seu desenvolvimento


tecnológico em física, principalmente na observação dos astros (Sol, Lua, Vênus
e, talvez, Marte). Nomeavam estrelas e constelações, conheciam a existência
de cometas, a frequência dos eclipses de Sol e Lua e criaram um calendário
bem complexo, incluindo prognósticos meteorológicos. Não é à toa que esse
conhecimento também tenha permeado em seus registros escritos.

O conhecimento sobre a natureza também propiciou a esse povo um


amplo conhecimento em medicina, distinguindo propriedades curativas em
diversos minerais e plantas. O povo asteca é conhecido por realizar o sacrifício
humano (como retirada de membros e músculos) como oferenda aos seus deuses,
o que denota o bom conhecimento em anatomia.

As técnicas de cultivo de plantas e as técnicas de ourives permitiram a


esse povo obter as mais significativas joias, materiais de adornos e de trabalho.
Arte e técnica podem ser observadas nos resquícios arqueológicos em sua
arquitetura rodeada de templos e espaços para os rituais. É bem certo que na
atualidade pouco resta desse imenso legado arquitetônico, mesmo na Plaza de
las Tres Culturas, atual capital do México e antiga Tenochtitlán, embora muitas
escavações tenham nos presenteado com o pouco que sabemos do império asteca.
Contudo, é possível observar o plano arquitetônico desde as rochas, pilastras e
pirâmides, bem como o tipo de material utilizado.

13
UNIDADE 1 | O PERÍODO COLONIAL HISPANO-AMERICANO

Os astecas já falavam uma língua semelhante ao náuatle mil anos antes


da chegada dos espanhóis. A língua náuatle ainda é falada pelos indígenas
atualmente e os resquícios da fonética podem ser encontrados no espanhol atual
dessa região. A escrita misturava pictogramas, ideogramas e símbolos fonéticos,
o que pode ser observado nos raros códices ainda presentes.

Um deles é o Códice Borbónico, um dos poucos códices conservados


antes da invasão espanhola de Cortés, em 1519, onde houve grande saqueio. De
acordo com Léon-Portilla (2012, p. 66), “o código foi enviado à Espanha durante
o período colonial, [...] as tropas francesas, durante a invasão napoleônica na
Espanha, o levaram consigo como despojo”, para o Palácio Bourbon, em Paris. É
um livro-calendário de duas partes: a primeira é o Tonalamalt, livro dos destinos,
e a segunda é o Xiuhpohualli, o livro de calendário de festas.

DICAS

Você pode saber mais sobre o Códice Borbónico no link https://goo.gl/D2rGow.

FIGURA – CÓDICE BORBÓNICO

FONTE: <https://goo.gl/djC3qr>. Acesso em: 24 jun. 2018.

14
TÓPICO 1 | O LEGADO DOS POVOS ORIGINÁRIOS ATÉ A CHEGADA DOS PRIMEIROS EUROPEUS AO NOVO MUNDO

Os poucos registros escritos existentes se baseiam na poesia. Dizemos de


poucos registros não destruídos pelos espanhóis, porque, como bem sabemos, os
astecas, embora resistentes à força bélica, sofreram com as invasões e a insistência
da imposição cultural dos europeus.

NOTA

Você sabia?

Os poemas eram recitados ou cantados (teocuícatl) ao ritmo de instrumentos musicais de


percussão. Algumas vezes incluíam palavras com significado que serviam para marcar ritmo.
Esses cânticos frequentemente eram dedicados aos deuses, mas também tratavam de outros
temas, como amizades, amores, guerra, morte e vida. Especificamente, os cantos dedicados
aos guerreiros eram chamados de Yaocuícatl.

O que se sabe da produção literária dos mexicas é o que permaneceu


na tradição oral, até porque somente alguns registros foram traduzidos para o
alfabeto ocidental ou conservados tal como eram. Mesmo assim, esses registros
ainda são uma incógnita por causa do estado de conservação ou porque parecem
estar incompletos. Até mesmo o sacerdote Ángel María Garibay Kintana
(1892-1957), um dos principais estudiosos da cultura mexica, e historiadores e
antropólogos mexicanos, como Miguel León-Portilla, considerados grandes
especialistas que procuraram entender a literatura náuatle não só na era Pré-
colombiana, não tiveram tanta sorte com os resquícios deixados, embora tenha
sido possível reacender todo o legado literário desse povo.

2.2.1 Netzahualcóyotl – Um Imperador Poeta Náuatle


Netzahualcóyotl (1402-1472) de Texcoco, México, foi um poderoso
imperador asteca, guerreiro, filósofo e um proeminente poeta.

Famoso pela forma como defendeu seu reino e desenvolveu as artes,


realizou grandiosas construções arquitetônicas.

Na obra Cantares Mexicanos, Tomo I e Tomo II, edição de Miguel León-


Portilla (2011), publicada pela UNAM e totalmente digital, são apresentados seus
poemas em uma edição bilíngue, na língua náuatle e traduzidos para o espanhol.

Leia os versos a seguir do imperador poeta traduzidos do náuatle para a


língua espanhola pelo padre Ángel María Garibay (1892-1962), um importante
pesquisador e referência para os estudos de poesia náuatle, assim como Miguel

15
UNIDADE 1 | O PERÍODO COLONIAL HISPANO-AMERICANO

León-Portilla (1926), ambos têm publicado e organizado livros e publicado os


poemas com tradução para a língua espanhola, em que resgatam o valor da
poesia pré-hispânica como integrante da literatura hispano-americana:

QUADRO 1 – POESIA EM LÍNGUA NÁUATLE E A TRADUÇÃO EM LÍNGUA ESPANHOLA

¿CAN NELPA TONYAZQUE? ¿A DÓNDE IREMOS?


Língua Náuatle Tradução para o espanhol
[...] ¿Can nelpa tonyazque [...] ¿A dónde iremos
canon aya micohua? donde la muerte no exista?
¿Ica nichoca? Más, ¿por ésto viviré llorando?
Moyoliol xi melacuahuacan: Que tu corazón se enderece:
ayac nican nemiz. aquí nadie vivirá para siempre.

Tel ca tepilhuan omicoaco, Aún los príncipes a morir vinieron,


netlatiloc. los bultos funerarios se queman.
Moyoliol xi melacuahuacan: Que tu corazón se enderece:
ayac nican nemiz. aquí nadie vivirá para siempre.
(Cantares Mexicanos, f. 70r) (Poemas, p. 9)
FONTE: <https://bit.ly/2COtRpr>. Acesso em: 1 abr. 2019.

O poeta compartilha as suas inquietações no poema, reconhece que ele


mesmo, um príncipe, está sujeito aos acontecimentos naturais. O poeta apresenta
um desenvolvimento rítmico, os versos desenvolvem um tema universal em que a
única certeza do poeta é a dor e a finitude da vida. Um tema universal e que pode
ser visto tanto em poesia indígena ou na poesia do Barroco da Contrarreforma.

2.3 OS INCAS
Os incas se adaptaram muito bem à geografia da cordilheira San Juan
de Los Andes, na América do Sul. Essa adaptação está impregnada em sua
história, modos de vida, política e tradições. Eles habitavam os territórios que
hoje conhecemos como Peru, Equador, ocidente da Bolívia, norte da Argentina,
norte do Chile e o sul da Colômbia. Há estudos que indicam a presença inca na
dominação marítima da região, chegando possivelmente até a atual Polinésia,
teoria que faz sentido com a presença de povos na Ilha de Páscoa, que fica entre
o Chile e a Oceania. A teoria coincide também com histórias incas que dão nomes
às ilhas polinésias.

O povo inca é conhecido por sua rica história, influência artística, religião,
arquitetura e cultura, mas também pelos mistérios deixados principalmente no
Peru e na cidade sagrada de Cusco. Para se ter uma ideia, a arte inca data de
3.000 a.C. a 1.500 d.C., o que de fato se percebe por ditos resquícios. Mesmo após

16
TÓPICO 1 | O LEGADO DOS POVOS ORIGINÁRIOS ATÉ A CHEGADA DOS PRIMEIROS EUROPEUS AO NOVO MUNDO

a chegada do espanhol Francisco Pizarro, no ano de 1532, é perceptível a forte


influência desse povo no artesanato, na arquitetura, na culinária e na oralidade.

A tradição oral da cultura inca traz relatos interessantes, principalmente


da evangelização indígena, marcada por muitos conflitos e imposições. Os casos
mais famosos de que se tem notícias resultam do espanhol Francisco Pizarro e do
índio Atahualpa, quando o desconhecimento dos europeus impôs o catolicismo
de forma violenta ou criando “imagens cristianizantes” (LÉON-PORTILLA, 2012),
que demonizavam as referências de mitos e lendas indígenas, como podemos
observar neste relato:

O capelão de Francisco Pizarro, frei Vicente Valverde, auxiliado


pelo intérprete indígena, Felipe de Huancavilca, falou com o inca
Atahualpa. Entre outras coisas, o frade lhe disse que vinha convertê-
lo à verdadeira religião, pois nem ele, nem seus súditos, conheciam
Deus. Atahualpa o interrompeu, respondendo que sabia a quem devia
adorar, ao Sol e aos seus deuses:
[...] Perguntou o dito inca ao frei Vicente quem lhe havia dito [o que
tinha afirmado sobre um Deus muito grande]. Responde frei Vicente
que o havia dito o Evangelho, o livro. E disse Atahualpa: Dá-me-o, a
mim, o livro, para que me diga. E assim, foi-lhe dado e o tomou nas
mãos, começou a folhear as folhas do dito livro. E disse o inca: O quê?
Como não me diz? Nem fala comigo o dito livro! Falando com grande
majestade, assentado em seu trono, o dito inca Atahualpa jogou o dito
livro das suas mãos.
A reação de Atahualpa diante do livro que nada lhe dizia trouxe
consigo dramáticas consequências. O padre Velarde, que não só sabia
o que era um livro, como também quis interpretar o ato de Atahualpa
como um desprezo à Bíblia, exclamou: 'Aqui, cavalheiros, com estes
índios gentios que são contra nossa fé"! Ignorar o que era um livro foi
um bom pretexto para o ataque de surpresa que tinha previsto Pizarro,
Atahualpa ficou preso como refém e, como bem sabemos pela história,
nem todo o ouro que depois ele entregou a Pizarro serviu para salvar
a sua vida (LÉON-PORTILLA, 2012, p. 20).

Quando dizemos que o resultado do encontro destes mundos foi


violento, diferente em diversos aspectos, não devemos nos esquecer de que o
maior propósito era a captação das riquezas, principalmente o ouro por parte
dos invasores. A saga do ouro levou ao descobrimento de outras áreas indígenas
até aquele momento não exploradas pelos próprios conquistadores. O saqueio,
como visto por historiadores e antropólogos, levou a uma modificação extrema
não só no aspecto religioso da população indígena, mas também na economia, na
cultura, na mestiçagem do homem branco com o indígena. Em outras palavras, a
corrida ao ouro provocou devastadoras modificações e até genocídio de boa parte
da população indígena. Observemos esse fragmento:

Esplendores de Potosí el ciclo de la plata


Dicen que hasta las herraduras de los caballos eran de plata, en la
época del auge de la ciudad de Potosí. De plata eran los altares de
las iglesias y las alas de los querubines en las procesiones, en 1658
para la celebración de Hábeas Christi, las calles de la ciudad fueron
desempedradas, desde la matriz hasta la iglesia de Recoletos,
totalmente cubiertas con barras de plata. En Potosí la plata levantó

17
UNIDADE 1 | O PERÍODO COLONIAL HISPANO-AMERICANO

templos y palacios, monasterios y garritos, ofreció motivo a la tragedia


y a la fiesta derramó sangre y vino, encendió la codicia y desató el
despilfarro. Convertido en piñas y lingotes, las vísceras de cerro rico
alimentaron sustancialmente el desarrollo de Europa. “Vale un Perú”
fue el elogio máximo de las personas o a las cosas desde que Pizarro
se hizo dueño del Cuzco. Vena yugular del Virreinato manantial de la
plata de América, Potosí contaba con 120.000 habitantes según el censo
de 1573. Era una de las ciudades más grandes y más ricas del mundo,
diez veces más habitada que Boston, en tiempos en que Nueva York
ni siquiera había empezado a llamarse así (GALEANO, 2003, p. 37).

Embora o fragmento pareça um relato desde a perspectiva indígena, não


se difere muito dos outros tantos relatos extraídos dos textos que ficaram para a
posteridade.

2.3.1 Os Quipus e os Quellcas (Quicas)


Falar de como escreviam os incas é se aproximar também da sua língua
originária: o Quéchua ou quíchua. De acordo com o Dicionário de Conceitos (2015,
s.p.), Quéchua é um conceito “com vários usos, que partem de uma mesma
referência” e que se remetem aos “povos aborígines que habitavam na Zona de
Cuzco durante o processo de colonização do território que hoje pertence ao Peru”,
mas também se pode afirmar que são os descendentes que vivem no Equador,
Colômbia, Bolívia, Chile e na Argentina, principalmente nas zonas próximas às
Cordilheiras dos Andes. A língua também confere identidade aos povos de etnias
fincadas na Cordilheira dos Andes.

NOTA

A língua dos quéchua falada hoje contém resquícios daquela língua falada no
período incaico, obviamente com suas variantes e influência do espanhol. De acordo com
o Atlas Sociolinguístico de Pueblos Indígenas de América Latina (UNICEF, 2011), estima-
se que 14 milhões de pessoas falem quéchua em suas diferentes variedades, embora seja
difícil ainda de precisar um número exato, devido às várias condicionantes sociais, como
localização geográfica, variantes linguísticas, comunidades linguísticas existentes, influência
do espanhol sobre esses povos etc.

Assim como muitas línguas originárias da América do Sul, o quéchua


também trouxe sua história pautada na oralidade, tendo poucos registros escritos.
Os registros orais que temos atualmente dão conta de dizer que a literatura inca
continha poesia religiosa, narrações sobre o cotidiano, a natureza e lendas.

18
TÓPICO 1 | O LEGADO DOS POVOS ORIGINÁRIOS ATÉ A CHEGADA DOS PRIMEIROS EUROPEUS AO NOVO MUNDO

DICAS

Leia sobre o Atlas Linguístico da América Latina:

O Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) apresenta periodicamente Atlas que
buscam entender alguns povos originários, principalmente dos países emergentes. O Atlas
Linguístico de América Latina de 2011 e de 2009 é um deles e contém um vasto material
não só linguístico, mas também histórico e que visa atender aos direitos dos povos indígenas
(documento firmado em diferentes países no ano de 2007). Acesse o link da UNICEF e confira
esse importante estudo feito em dois tomos: https://uni.cf/2zXUZTv.

Outros nomes que aparecem em muitos estudos da área são: Cristóbal


de Molina, cronista cusquenho que transcreveu Fábulas y ritos incas (1573), o inca
Garcilaso de La Vega (1539-1616) e o também cronista indígena Felipe Guamán
Poma de Ayala, com a emblemática Nueva Crónica y Buen Gobierno (escrito entre
1600 e 1615), que traz a história e a sociedade pós-conquista. Um pouco mais
adiante, falaremos um pouco mais sobre Guamán Poma de Ayala.

O que se tem de registro oral foi traduzido por espanhóis pós-conquista


e também por índios evangelizados, como Juan Santa Cruz Pachacuti Yamqui
Salcamaygua ou Santa Cruz Pachacuti, defensor da Coroa espanhola e que
escreveu Relaciones de Antiguedades de este reino del Pirú (1613).

A obra se encontra digitalizada na Biblioteca de Espanha e no livro são


escritos alguns trechos sobre a religião e a filosofia quéchua, além de alguns
poemas da tradição oral. Veja uma amostra do fac-símile na figura a seguir:

FIGURA 4 – FAC-SÍMILE DO LIVRO DE SANTA CRUZ PACHACUTI

FONTE: <https://bit.ly/2NDJhDq>. Acesso em: 11 set. 2018.

19
UNIDADE 1 | O PERÍODO COLONIAL HISPANO-AMERICANO

Como podemos perceber, a oralidade influenciou sobremaneira no


registro e na memória desse povo, mas havia também registros escritos
em sistemas próprios dos incas que, para muitos investigadores (como
historiadores, antropólogos e linguísticas), tais registros estão nos quipus e
para poucos estudiosos estão também nos quellcas (ou quilcas). O primeiro
registro compreende um sistema de escrita semelhante aos ábacos matemáticos,
e o segundo é o sistema de escrita adotado pelos incas de acordo com os últimos
estudos.

O desacordo entre os estudiosos está justamente na inexistência, em


termos de textos literários originários, de uma literatura inca ou quéchua,
seja uma literatura originária do povo ou em língua quéchua. Tal desacordo
se sustenta porque os registros que ficaram são transcrições realizadas pelos
espanhóis, a partir da tradição oral quéchua, que como também dissemos
anteriormente, são registros escritos a partir de outra perspectiva, de quem
observa e não de quem vivencia ou é nativo. Contudo, é graças a esses registros
que hoje entendemos um pouco mais do que costumavam escrever e oralizar.

Dentre os textos literários incas, deixados como referências, estão as


poesias e poemas sobre a natureza (plantas, flores animais e o cotidiano de base
agrícola) e também uma obra de teatro chamada Ollantay, de estrutura dramática
adaptada ao estilo ocidental europeu, como explica Silva-Santisteban (2012, p. 1):

Así como podemos considerar la Tragedia del fin de Atau Wallpa


una pieza quechua indígena contaminada (por motivos históricos
y culturales) con elementos occidentales; las piezas del teatro
sacramental y religioso quechuas como Rapto de Proserpina y sueño de
Endimión y El pobre más rico como dramas de completa enajenación
cultural; el Ollantay podemos estimarlo una comedia de fusión cultural
mestiza. Desde su publicación en 1853 por Johann Jacob von Tschudi
como apéndice en su Die Quechua Sprache, Ollanta ha sido la pieza
más difundida, editada y traducida de toda la literatura quechua. [...]
Ollanta se inscribe, probablemente, como una de las creaciones más
recientes de ese privilegiado conjunto de dramas quechuas escritos
probablemente a partir de mediados del siglo XVII hasta el primer
tercio del siglo siguiente, alimentados, sobre todo, por el teatro de
Pedro Calderón de la Barca.

Sua origem é bastante controversa, por sinal, tendo inclusive três


diferentes teses de constituição. Contudo, todas concordam com os personagens
e argumentos, sendo muito pouco modificada. Da história de amor presente na
peça surge o inca Túpac Yupanqui.

20
TÓPICO 1 | O LEGADO DOS POVOS ORIGINÁRIOS ATÉ A CHEGADA DOS PRIMEIROS EUROPEUS AO NOVO MUNDO

DICAS

Você pode encontrar facilmente na Biblioteca Universitária Virtual do governo


argentino uma versão ao castelhano de Ollantay, disponível em: https://bit.ly/2KPxj5L.

Você pode ainda aprofundar sua leitura com o artigo:

• SILVA-SANTISTEBAN, Ricardo. Ollanta: Drama Quichua en Tres Actos y en Verso / traducción


del quechua de Constantino Carrasco (1876). Ed. Ricardo Silva-Santisteban. Alicante: Biblioteca
Virtual Miguel de Cervantes, 2012. https://bit.ly/2SxwSjp. Acesso em: 1º dez. 2018.

Ainda que estejamos falando de um texto que traz a voz do inca, é


importante dizer que não se trata de uma literatura originária, mas sim de
mestiçagem que apareceu por volta do século XVI, no período republicano
peruano. É, portanto, uma literatura que não se pode caracterizar devidamente, já
que mistura cantos, danças, ritos religiosos, lírica e até mesmo doutrinação, entre
outros estilos e gêneros identificados na cultura europeia, mas que até então não
haviam sido decifrados.

FIGURA 5 – EXEMPLO DE QUIPUS

FONTE: <https://bit.ly/2U7qwJ5>. Acesso em: 1º dez. 2018.

Quando falamos de algo bem original, tratando-se do povo inca, estamos


falando também dos quipus. Os quipus eram fios coloridos amarrados de
diversas formas e tamanhos, que serviam para contar mais que para significar
ideias abstratas. As cordas com os nós variavam de tamanho, que podia ser de 20
até mil cordas. De acordo com alguns estudiosos, entre eles William Burns Glynn,
os nós, nas cordas, indicavam quantidade, mas também poderiam indicar objetos
e dali defendeu a sua tese de que havia uma linguagem secreta que indicava
também fatos, situações e acontecimentos passados.
21
UNIDADE 1 | O PERÍODO COLONIAL HISPANO-AMERICANO

De acordo com a tese de Burns, a escritura inca (pictográfica, epigráfica,


nilalográfica) é também "acrofônica", ou seja, quando uma palavra guarda relação
com outros critérios e estão relacionadas com os números e as dez consoantes
encontradas por ele, muito similares à escrita do antigo Egito. Essa escrita, a qual
também se encontra na grafia dos primeiros judeus (cuneiforme), verifica-se que
não havia a predominância de vogais. Burns dá o exemplo de "Mando Capac"
que se transcreveu como "mnk kpk" e nos nós quipus estaria representado pela
contagem "397 787".

FIGURA 6 – ADAPTADA DA OBRA DE ARTURO MALLMA CORTEZ, A ESCRITURA


SECRETA DE LOS INCAS

FONTE: <https://bit.ly/2Qkiivg>. Acesso em: 20 jun. 2018.

De acordo com Bravo (2012, s.p.), Burns acredita que a cultura inca tinha
um sistema de escrita de moldes geométricos e sustenta esta tese a partir dos
tecidos incas, nas anotações de Garcilaso de La Vega e demais cronistas espanhóis
que testemunharam essa forma de escrita:

El profesor Burns ha descubierto un alfabeto incaico de diez


consonantes, cada una de las cuales, en el orden correlativo, se
corresponde con cada uno de los números del sistema decimal. Este
investigador a través de la adecuada discriminación de las opiniones
de los cronistas ha establecido, dentro de muchas conclusiones,
dos importantes: la primera, que cuando los españoles decían que
los naturales del Perú no tenían escritura, lo que querían decir era
No tenían escritura como la de nosotros; y la segunda que en los
lexicones confeccionados por los españoles, se encuentra una serie
de palabras que sí indican el oficio y la actividad de escribir. Quillca:
letra o carta mensajera, libro o papel. Quillcanigui: pintar o escribir.
Quillcacamayoc: escribano y dibujador. Quillcamaytosca: envoltorio
como las letras. Quillcayachak, el que sabe escribir. Quillcacacuna, las
letras.

Ainda de acordo com Bravo (2012, s.p.), o inca Garcilaso dizia que os
Quipucamayoc, escrivães ou escritores, escreviam em “nós” todas as coisas que
se referiam a número "hasta las batalles, cuántas embajadas había traído el inca
y cuántas pláticas y razonamientos había hecho del rey", e acrescentou que “a
su turno, el mismo Guamán Poma de Ayala agrega que los escribanos asentaban
todo en el quipu con tanta habilidad que las anotaciones hechas en cordeles
resultaban como si se hubiera escrito con letras”.

22
TÓPICO 1 | O LEGADO DOS POVOS ORIGINÁRIOS ATÉ A CHEGADA DOS PRIMEIROS EUROPEUS AO NOVO MUNDO

O que podemos concluir com o trabalho de Burns é a tentativa de entender


a importância daqueles nós e o significado adicional que eles comportavam. De
fato, se há registros para além da oralidade e há menções nos registros escritos
dos espanhóis e dos índios evangelizados, algo a mais deve ter sido de suma
importância. O que não fica claro na tese de Burns é como essa escrita não se
desenvolveu ou se misturou com os demais registros escritos, principalmente os
textos espanhóis. Talvez já saibamos a resposta: perdeu-se no tempo, sem a devida
conservação, mas por alguma causa. Comprovamos tal assertiva corroborando
com Bravo (2012, s.p.) ao finalizar sua análise dizendo que:

Estos signos convencionales de escritura de base geométrica se


configuraron porque también eran más fáciles de representar en los
tejidos. Con razón cuando los españoles de la conquista entraban a
un pueblo vacío, por la inminente invasión, encontraban: comida,
oro, plata, objetos, vajilla, pero los tejidos los encontraban quemados.
Primero porque allí se contenía y guardaba la historia del pueblo; y
segundo, porque ello serán objetos mágicos y sagrados.
Dos conclusiones: sí hubo escritura quechua; y, segundo, los quipus y
la escritura geométrica se correspondían y eran lo mismo a efectos de
la lectura realizada por los Quipucamayocs.

Por certo, se havia uma escrita inca anterior ao período colonial, decerto
os quellcas ou quicas eram os que mais se encaixavam.

2.4 OS GUARANIS
Outro povo indígena que habitava a região sul da América eram os
guaranis. De acordo com Melià (1990, p. 1), um pesquisador do povo guarani, “as
evidências arqueológicas mostram que os guaranis chegaram a ocupar as melhores
terras da bacia dos rios Paraguai, Paraná e Uruguai, e do sapé da Cordilheira”.
Atualmente a língua guarani é falada no Paraguai e reconhecida como língua
oficial junto ao espanhol. O fato de conservar uma língua nativa indígena
reflete ao mesmo tempo a posse de uma identidade cultural, caracterizada pela
preservação de uma tradição, herança de um povo originário. Ainda de acordo
com Melià, os guaranis são agricultores, têm fartura e sabem trabalhar a terra. “O
guarani é um aldeão. Há um povoado e uma casa nos quais se concentra sua vida
social e política” (MELIÀ, 1990, p. 5). A vida do povo guarani era movida por
ciclos fundamentados em uma cosmogonia religiosa.

DICAS

O filme A missão (1986), do diretor Roland Joffe, é um drama que recebeu


diversos prêmios. O filme mostra o cotidiano de uma missão jesuítica na América do Sul, na
terra dos guaranis e a luta pela sobrevivência de uma língua e cultura. No Youtube tem uma
versão integral do filme, acesse: https://www.youtube.com/watch?v=lsOpHh21oIc.

23
UNIDADE 1 | O PERÍODO COLONIAL HISPANO-AMERICANO

Eles desenvolveram a tradição oral como suporte para transmitir suas


histórias para cada geração e dessa forma se manteve uma memória viva de
sua cosmogonia e fatos relevantes, porém a chegada dos sacerdotes jesuítas e
suas missões junto à imposição da língua espanhola modificam a forma como os
guaranis registram seus mitos, lendas e fatos:

La Contrarreforma, emulando a la Reforma protestante, impulsó no


solo la introducción en América de La Biblia y otros textos religiosos
en castellano, sino también su traducción a las principales lenguas
indígenas. Pero hubo un gran control para impedir o restringir al
máximo la utilización de esta lengua para difundir las literaturas
indias. Así, por ejemplo, a pesar de que el guaraní fue el único idioma
usado en las misiones y el principal medio de comunicación del
Paraguay, ni una sola producción literaria de esa lengua se transcribió
de la oralidad durante la Colonia. Existió, sí, una profusa literatura
en guaraní impresa en las misiones de textos católicos que servían
a los fines de la evangelización. Las misiones ayudaron a fijar la
lengua para valerse de ella, pero vaciándola de sus valores originales
(COLOMBRES, 2006, p. 158).

Novamente o papel da tradução é sumamente importante, ao ser utilizada


pelos exploradores espanhóis para registrar em língua espanhola as histórias orais
do povo guarani. Por não ter um sistema de escrita desenvolvido ou semelhante,
acabam registrando na língua do estrangeiro suas próprias histórias.

DICAS

Saiba um pouco mais sobre a língua Guarani disponível neste blog: https://
www.veintemundos.com/magazines/25-fr/.

2.4.1 Outros povos originários


A formação da literatura hispano-americana começará a se formar a partir
das primeiras letras escritas em solo americano, mas ainda:

Una revisión de nuestras fuentes muestra que las diferentes regiones


de los antiguos pueblos americanos de alta cultura han sido tratadas
de modo muy desigual. Mientras que se han conservado muchos mitos
y leyendas de los aztecas, de los mayas de Guatemala, de los muiscas
y de algunas tribus del Perú, faItan representantes de otros grandes
pueblos si no del todo, casi por completo (KRICKEBERG, 1971, p. 12).

24
TÓPICO 1 | O LEGADO DOS POVOS ORIGINÁRIOS ATÉ A CHEGADA DOS PRIMEIROS EUROPEUS AO NOVO MUNDO

Esta afirmativa se constata ao se realizar pesquisas mais extensas sobre


os povos indígenas, como os aymara, mapuche, os cauca da Colômbia, e como
realizaram o registro de suas histórias. A maioria dos povos originários utilizava
a tradição oral como forma de manter sua história, o que os deixava extremamente
vulneráveis no caso de extinção da tribo ou do sincretismo.

NOTA

Sites como YouTube e Vimeo trazem muitos documentários de vários povos


indígenas originários da América, nos quais relatam seus modos de vida antes da chegada
dos conquistadores. Procure vê-los com muita reflexão e crítica para trabalhar seus próprios
argumentos. Ao longo deste livro, nós também daremos dicas e sugestões de material
audiovisual que possam complementar certas ideias acerca desses povos originários.

3 A EXPANSÃO DA COROA ESPANHOLA


Depois da consolidação dos reinos, os reis começam a projetar novos
empreendimentos e um deles era abrir caminho para uma expansão do comércio
marítimo. A estratégia era buscar novas rotas para criar meios para ganhar mais
e investir menos. Assim, neste cenário, Colombo terá a oportunidade ideal para
mostrar seus planos e convencer os reis sobre a busca de uma nova rota marítima
para o comércio das Índias. Tais decisões refletem diretamente nos registros
escritos e, consequentemente, também nos registros escritos literários. Vejamos
alguns fatos que marcaram a história.

E
IMPORTANT

Revisite o Livro Didático de Literatura Hispânica I para retomar os períodos


históricos.

3.1 ISABEL E FERNANDO – OS REIS CATÓLICOS


Antes da unificação do reino da Espanha por parte dos reis católicos, Isabel
e Fernando, “España vive una época en la que conviven árabes, judíos e hispanos,
y en que lengua culta y poder clerical se ven unificados en el latín. Las lenguas
vernáculas coexisten con las cultas, y cada una cumple sus correspondientes
funciones” (PULIDO, 2014, p. 13). Para consolidar seu reinado, Isabel e Fernando
expulsaram judeus e mouros de seus reinos.
25
UNIDADE 1 | O PERÍODO COLONIAL HISPANO-AMERICANO

FIGURA 7 – OS REIS CATÓLICOS, FERNANDO E ISABEL

FONTE: <https://goo.gl/ziGcGm>. Acesso em: 10 jun. 2018.

Ainda obrigaram os que ficaram à conversão forçada, o que criou uma


nomenclatura nova para a composição da sociedade espanhola: cristãos velhos
e cristãos novos. Os velhos eram os que já eram cristãos de toda uma vida, e os
novos eram estes conversos à força e que muitos em segredo praticavam suas
crenças.

A conquista de Granada era estratégica como forma de solidificar o reino de


Castela, com a vitória dos exércitos de Isabel e Fernando, um reino consolidado, se
procede à unificação dos diversos reinos e se forma um Estado único, respeitando
as línguas, porém estes reinos perdem sua autonomia administrativa, passando a
responder perante os reis de Castela.

Após a primeira viagem de Colombo, no seu retorno foi recebido pelos


reis católicos que viajaram de Castela para o reino de Aragão; em Barcelona
receberam o navegador que falou e mostrou objetos e artefatos que tinha levado
do novo mundo. Seu relato sobre as descobertas causou uma grande impressão
em seus ouvintes e foi decidido que Colombo viajaria mais uma vez e tomaria a
posse das terras descobertas por ele em nome dos reis de Espanha.

Os reis católicos, após os primeiros relatos, especialmente Isabel,


demonstraram a preocupação com a evangelização dos “povos pagãos”, eles
estavam convictos de que era uma missão a conversão dos povos originários e
para isso enviaram sacerdotes que empreenderam uma conversão a qualquer
custo e própria do pensamento da Contrarreforma, o pensamento religioso
vigente da época.

Um fator importante para a consolidação da Coroa espanhola foi o envio de


padres junto às expedições para consolidar pela educação a soberania espanhola
a partir da língua e da religião, e a Companhia de Jesus foi incansável nesta tarefa,
estabelecendo suas bases em diversas regiões do continente americano:

26
TÓPICO 1 | O LEGADO DOS POVOS ORIGINÁRIOS ATÉ A CHEGADA DOS PRIMEIROS EUROPEUS AO NOVO MUNDO

A Companhia de Jesus foi fundada em pleno desenrolar do movimento


de reação da Igreja Católica contra a Reforma protestante, podendo ser
considerada um dos principais instrumentos da Contrarreforma nessa
luta. Seu objetivo era tentar sustar o grande avanço protestante da
época, e para isso utilizou-se de duas estratégias: por meio da educação
dos homens e dos índios; e por intermédio da ação missionária,
procurando converter à fé católica os povos das regiões que estavam
sendo colonizadas (SHIGUNOV NETO; MACIEL, 2008, p. 172).

Era uma preocupação por parte do próprio conquistador a conversão


realizar uma tarefa de conversão religiosa junto aos povos originários. A
importância de enviar padres para evangelizar os nativos e salvar suas almas a
qualquer preço era a empresa mais importante, assim, os sacerdotes nem sempre
entenderam a cultura local e cometeram diversas atrocidades. A rainha Isabel, ao
escrever seu testamento no leito de morte, deixou explícito que os indígenas das
Américas não deveriam ser escravizados, pois eram considerados cidadãos do
reino espanhol.

NOTA

Você sabia? No dia 4 de maio de 1493, o Papa Alexandre VI emitiu as bulas


Inter Caetera II e III, as quais concediam ao reino de Castela o direito de continuar as viagens
marítimas em mares desconhecidos e a possessão de tudo o que tinha sido encontrado por
Colombo.

Ao priorizar o Cristianismo na conquista, houve um prejuízo sem conta


de vidas humanas, nesse sentido, Todorov (1982, s.p.) comenta: “si alguna vez
se ha aplicado con precisión a un caso la palabra genocidio es a éste”, e sem
contar a destruição de códices, textos e objetos dos povos originários, pois no afã
de destruir obras consideradas como pagãs, destruíram tudo que era julgado do
“demônio”. Muitos destes objetos relatavam suas histórias e crenças, e o autor
apresenta algumas hipóteses sobre a diminuição da população indígena:

1. Por homicidio directo, durante las guerras o fuera de ellas: número


elevado, aunque relativamente bajo; responsabilidad directa.
2. Como consecuencia de malos tratos: número más elevado;
responsabilidad (apenas) menos directa.
3. Por enfermedades, debido al «choque microbiano»: la mayor parte
de la población; responsabilidad difusa e indirecta (TODOROV, 1982,
s.p.).

Efetivamente o papa concedeu aos reis católicos “el derecho para invadir,
conquistar, subyugar y reducir a la esclavitud perpetua a las gentes descubiertas;
la razón invocada para fundamentar tal derecho era la evangelización”
(ALCARAZ, 1993, p. 10). Nesse sentido, a evangelização e o saqueio sistemático

27
UNIDADE 1 | O PERÍODO COLONIAL HISPANO-AMERICANO

tinham iniciado assim que o conquistador colocou seus pés em terras americanas.
Em outras palavras, aponta o genocídio como uma forma indireta de colonização,
a partir da imposição de língua, cultura e religião estrangeira sobre os povos
originários.

3.2 AS NAVEGAÇÕES, OS PLANOS E AS DESCOBERTAS


MARÍTIMAS
Fruto da vontade de expansão marítima, o ano de 1492 acabou por se tornar
um marco histórico que mudaria a compreensão de mundo da humanidade. O
total desconhecimento dos espanhóis sobre a existência do continente americano
e o encontro com os povos originários acabariam por levar a um choque cultural
que criaria inúmeras tensões.

Assim, a história tem tratado a literatura como o período Pré-Colombiano,


que se refere às produções artísticas dos que já habitavam o chamado novo mundo
antes de 1492, e Literatura hispano-americana a partir da conquista espanhola,
em que as primeiras letras produzidas no continente americano serão textos não
ficcionais. A ficção viria posteriormente.

A chegada do conquistador espanhol pressupõe a posse das terras


ameríndias em nome dos reis católicos, Fernando e Isabel, com isso a cultura
local passa a ser suplantada pela cultura espanhola, porém com a ressalva de
que alguns religiosos se deram conta da importância de preservar as histórias
autóctones:

[…] en el momento de la conquista empezó a surgir en los territorios


donde habían florecido las civilizaciones aborígenes más importantes,
desde México al Perú, una nueva cultura en la que tuvo un puesto
relevante lo indígena. Los religiosos, presentes ya en los primeros viajes
de descubrimiento de Colón y en las sucesivas empresas de conquista
y colonización, fueron los grandes difusores y conservadores de dicha
cultura (BELLINI, 1997, p. 58-59).

3.3 O TRATADO DE TORDESILHAS – ESPANHA E


PORTUGAL COMO POTÊNCIAS MARÍTIMAS
O Tratado de Tordesilhas, assinado em 1494 pelos reis de Portugal e de
Castela, Fernando e Isabel, foi um acordo assinado entre os dois reinos para
delimitar as terras de cada coroa. O documento foi uma proposta de evitar
disputas sobre a posse de terras entre os reinos de Portugal e Espanha após as
primeiras navegações e descobertas.

28
TÓPICO 1 | O LEGADO DOS POVOS ORIGINÁRIOS ATÉ A CHEGADA DOS PRIMEIROS EUROPEUS AO NOVO MUNDO

A 7 de junho de 1494, as delegações de Portugal e Espanha reuniram-se


em Tordesilhas, perto de Valladolid, e acordaram no estabelecimento
de uma linha 370 léguas a oeste de Cabo Verde, de polo a polo,
que dividia o Oceano Atlântico em duas metades: todas as terras,
descobertas e por descobrir, a oeste dessa linha pertenceriam aos reis
de Espanha, e todas a leste caberiam a Portugal
(SOUSA PINTO, 2017, s.p.).

Uma demonstração de como um continente foi repartido entre os dois


reinos, com isso se observa como o processo de colonização da América foi
arbitrário:

FIGURA 8 – MAPA DO TRATADO DE TORDESILHAS DE 1494

FONTE: <https://bit.ly/2BVuayy>. Acesso em: 7 dez. 2018.

A divisão de terras entre os dois reinos, fechada entre Espanha e Portugal,


também se tornou um fato histórico porque foi realizada sem a intervenção papal
durante a negociação.

O tratado acordado de forma bilateral "probablemente sea el primer


ejemplo genuino de cómo una frontera política se origina en un mapa – o más
bien en una representación carto-científica del espacio – que, en consecuencia,
juega un papel performativo en la configuración del mundo" (DUVE, 2017, p. 1).

A demarcação de terras e as fronteiras estabelecidas tinham sido resolvidas


em conversas e negociações em salões dos reis europeus; e os habitantes das
Américas em nenhum momento foram levados em consideração. Naturalmente
isso teria implicações sociais e culturais devastadoras para todos. Uma observação
é que o espanhol não se via como um invasor de terras alheias.

29
UNIDADE 1 | O PERÍODO COLONIAL HISPANO-AMERICANO

DICAS

Você pode saber mais sobre o Tratado de Tordesilhas lendo o artigo:

CINTRA, Jorge Pimentel. O mapa das cortes e as fronteiras do Brasil. Bol. Ciênc. Geod.,
Curitiba, v. 18, n. 3, p. 421-445, set. 2012. https://bit.ly/2BXKdfh.

Também assista ao vídeo e ao material disponibilizado no site da RTP – Rádio e Televisão de


Portugal (2018). https://bit.ly/2BVuayy.

A partir das guerras independentistas, onde a luta pela soberania nacional


de cada país das Américas se torna um objetivo, é que se iniciou uma busca pela
descolonização e o desejo de não ser mais submetido a um reino distante e que
cobrava tributos.

Apesar de tudo, ainda assim a América será culturalmente dependente e


conservaria um pensamento colonizado, sempre valorizando principalmente o
europeu, o estrangeiro, em detrimento do nacional e autóctone.

A literatura seria uma forma de reverter a mentalidade colonizada, a


partir dos movimentos modernistas, indigenistas, gauchescos, entre outros.

30
TÓPICO 1 | O LEGADO DOS POVOS ORIGINÁRIOS ATÉ A CHEGADA DOS PRIMEIROS EUROPEUS AO NOVO MUNDO

LEITURA COMPLEMENTAR

A MESTIÇAGEM COMO DIVISOR DE ÁGUAS

José Maria Arguedas é uma referência em novelas e ensaios que denunciam


e fazem o leitor pensar sobre os povos nativos após 1500. No livro Os Rios
Profundos, o autor peruano de origem quéchua centraliza a discussão nos dois
tipos de sociedade que temos hoje: aquela de descendentes de povos originários
e aquela formada pela elite de colonizadores, criando assim subcategorias. Neste
romance, o autor apresenta Ernesto, um índio que percorre as mais envolventes
paisagens do Peru e ao mesmo tempo retrata a vida dos indígenas e dos espanhóis,
bem diferentes até hoje. Arguedas fala com propriedade sobre o povo quéchua, já
que é também antropólogo.

Leia um fragmento extraído de Los Ríos Profundos

Comenzó en ese instante, el primer golpe de la María Angola. Nuestra


habitación, cubierta de hollín hasta el techo, empezó a vibrar con las ondas lentas
del canto. La vibración era triste, la mancha del hollín se mecía como un trapo
negro. Nos arrodillamos para rezar. Las ondas finales se percibían todavía en el
aire, apagándose, cuando llegó el segundo golpe aún más triste. Yo tenía catorce
años; había pasado mi niñez en una casa ajena, vigilado siempre por crueles
personas. El señor de la casa, el padre, tenía ojos de párpados enrojecidos y cejas
espesas; le placía hacer sufrir a los que dependían de él. Sirvientes y animales.
Después, cuando mi padre me rescató y vagué con él por los pueblos, encontré
que en todas partes la gente sufría. La “María Angola” lloraba, quizás, por todos
ellos, desde el Cuzco. A nadie había visto más humillado que a ese pongo del
Viejo. A cada golpe, la campana entristecía más y se hundía en todas las cosas
(ARGUEDAS, 2018, p. 21).

FONTE: ARGUEDAS, José Maria. Los Rios Profundos. 2018. https://bit.ly/2G5Ume6. Acesso em:
1º dez. 2018.

No mercado brasileiro há uma tradução ao português:

ARGUEDAS, José Maria. Os Rios Profundos. Tradução de Josely Vianna Baptista.


São Paulo: Companhia das Letras, 2005.

O vídeo de uma montagem teatral sobre a mesma obra de Arguedas disponível


em: https://www.youtube.com/watch?v=qlngmX4qq2s.

31
UNIDADE 1 | O PERÍODO COLONIAL HISPANO-AMERICANO

FRAGMENTO SOBRE EL TEATRO INDÍGENA Y POPULAR

El género dramático se remonta en América a la época precolombina. Su más


alto grado de desarrollo se habría alcanzado en el Incario, según se desprende de
las crónicas de Sarmiento de Gamboa, Martín de Morúa, Blas Valera y Martínez de
Arzans y Vela. Piezas capitales como el Ollantay y la Tragedia del fin de Atawallpa
dan fe de este nivel. El teatro quechua admitía al menos dos subgéneros. Uno era
el wanka, de carácter eminentemente histórico, que guarda alguna relación con la
tragedia, por ser expresión de un duelo. Escenificaba los momentos más gloriosos de
la vida de los monarcas y grandes personajes fallecidos, con versos elaborados por
los amautas. Señala Cáceres Romero que aún se lo practica en Bolivia de un modo
espontáneo, ante los restos mortales de un ser querido. Generalmente el doliente,
acompañado por las plañideras, gime y canta, evocando la vida del deudo. El otro
subgénero era el aránway, de temática más vasta y vinculada a la comedia por su
carácter alegre y festivo, aunque sin llegar a confundirse con ésta. Lo cultivaban
generalmente jóvenes de ambos sexos, en fiestas y celebraciones que realizaban
junto a las sementeras, danzando y cantando los versos en rueda, a veces a la luz
de la luna, al son de la quena, el tambor y la zampoña. A éstos podría sumarse el
wawaki, manifestación lírica de carácter colectivo, que al ser cantada por jóvenes de
ambos sexos en forma dialogada adquiere cierta forma dramática. El teatro aymara
no tendría un origen precolombino, sino colonial. Quizás esto explica su temor a
representar seres humanos. Al igual que en las fábulas, sus personajes eran todos
animales, con lo que se quería probablemente burlar a la censura hispana. Los
antiguos quichés de Guatemala desarrollaron el ballet dramático, subgénero del
que nos quedó el Rabinal Achí. El México antiguo poseía también ciertas formas
primarias de representación, que se daban sobre todo en la recitación de tres clases
de poemas épicos: los yaocuícatl (lo más cercano a la epopeya), los cuauhcuícatl
(cantos de águila) y los ocelocuícatl (cantos de ocelote). Su recitación estaba a cargo
de varios actores, los que actuaban dialogando entre sí durante las fiestas, con
música, canto e indumentarias especiales. Además de esto, estaba lo que Miguel
León-Portilla llama “el drama cósmico del teatro perpetuo”, realizado por “actores”
largamente preparados para representar a un dios en una fiesta y unirse a él en el
sacrificio, que era real, no figurado, por lo que venían a ser grandes actores de
una sola actuación. Los misioneros católicos adoptarían y adaptarían luego esta
tradición dramática, conservando las escenografías al aire libre, las habilidades
histriónicas de los indígenas, sus mímicas, onomatopeyas y también la lengua,
aunque sustituyendo sus sistemas simbólicos por el dogma cristiano. Estos dramas
religiosos se representaron en mixteco, mixe, zapoteco, paine, matlazinca, tarasco,
cora, mayo, yaqui, tepehuano y otras lenguas (COLOMBRES, 2006, p. 45-46).

FONTE: COLOMBRES, Adolfo. La Literatura oral y popular de nuestra América. Quito, Instituto
Iberoamericano del Patrimonio Natural y Cultural-IPANC, 2006. http://www.flacsoandes.edu.ec/
libros/112668-opac. Acesso em: 10 jun. 2018.

32
RESUMO DO TÓPICO 1

Neste tópico, você aprendeu que:

• Os povos originários tinham uma literatura própria, porém desvalorizada


pelos espanhóis.

• A literatura era caracterizada principalmente pela transmissão oral e há pouco


registro escrito ou que se possa comprovar a procedência.

• Existem, contudo, registros e estudos posteriores que dão conta de explicar


parte do legado deixado pelos mesoamericanos e sul-americanos.

• Os textos das civilizações mesoamericanas eram variados. Tinham poesias, os


conselhos, as narrativas de constituição do mundo e do cotidiano.

• Os Códices – ou Códex – são os primeiros registros da oralidade e escritura na


Mesoamérica.

• Um registro importante do povo inca eram os quipus e quelcas.

• A ocupação espanhola e portuguesa extraviou ou adaptou artefatos autóctones.


A prova está em cartas e crônicas escritas pelos conquistadores ao retratar a
cultura indígena para suas colônias.

• Os escritos estrangeiros também destacaram as lutas pela posse da terra que


redundaram em morte massiva dos indígenas.

• A imposição da língua, principalmente a língua espanhola, foi um fator de


unificação do continente.

• A conversão obrigatória ao Cristianismo apagou ou adaptou religiões dos


povos originários.

33
AUTOATIVIDADE

1 Considerando o contexto histórico dos seguintes excertos retirados de Las


Venas Abiertas de América Latina, de Eduardo Galeano (2003), analise as
sentenças que seguem e responda V para verdadeiro e F para falso:

(1) Durante largos años excavaron los españoles el fondo del lago de México
en busca de oro y los objetos preciosos presuntamente escondidos por los
indios. Antes de que Francisco Pizarro degollara al inca Atahualpa le arrancó
un rescate en “andas de oro y plata” que pesaba más de veinte mil marcos de
plata fina, un millón y trescientos veintiséis mil escudos de oro finísimo (p. 36).

(2) [...] Golpeaban los utensilios de oro o le daban a martillazos para reducirlos
a una forma más fácil y manuable, arrojaban al crisol, para convertir al metal
en barras todo el tesoro del templo [...]. La catedral católica se alza sobre las
ruinas del templo más importante de Tenochtitlán y el palacio de gobierno
está emplazado sobre la residencia de Cuauhtémoc, el jefe azteca ahorcado por
Cortés (p. 37).

a) ( ) O texto 1 trata os motivos pelos quais o capelão Francisco Pizarro


mandou matar o índio Atahualpa.
b) ( ) O texto 2 sugere as técnicas de redução do ouro que facilitam a
manipulação e por isso que era feito geralmente em barras.
c) ( ) O texto 1 sugere que antes de degolar o inca Atahualpa, foi retirada
uma grande quantia de ouro e prata.
d) ( ) Grandes construções, como as igrejas, foram edificadas com ouro ou
sobre ruínas de indígenas mesoamericanos.

2 Leia o fragmento a seguir:

“Atualmente poucas pessoas ignoram que as historiografias das


civilizações extraeuropeias possuem uma dívida de gratidão profunda
para com os cronistas nativos da primeira metade do século XVI,
dentre os quais se destacam o inca Cuxi Yupanque (1492-1541) e,
sobretudo, a princesa asteca Dona Xochiquetzal da Gama (1504-1589).
Nascida em Tenochctitlán, capital da Tríplice Aliança que então governava
Anáhuac (México Central), na última década que antecedeu o avassalamento
lusitano, Xochiquetzal foi uma das primeiras cihuapipiltin (filhas de nobreza
asteca) a se transformar numa fidalga lusitana. Contudo, ao contrário do
ocorrido com centenas de nomes astecas de sua geração – convertidos à força
em lusíadas após terem sido levados para Portugal [...] –, ao desposar Dom
Vasco da Gama aos treze anos de idade, Xochiquetzal tornou-se não apenas
lusíada de direito pro forma, mas lusitana de fato.
Dotada de um poder de síntese invulgar e de um espírito observador
aguçado, Xochiquetzal desfrutou do privilégio relativamente raro à época

34
de acompanhar seu marido e a Esquadra do Mundo Oceano ao longo das
expedições às Índias e à África. Regressando ao Atlântico, ela presenciou a
destruição da cognominada Armada Invencível do Rei Carlos I de Espanha e,
meses mais tarde, galgou os Andes junto com as forças aliadas inca-lusíadas
durante a intervenção portuguesa na guerra civil que lavrou no Império Inca
da terceira década do século XVI” (LODI-RIBEIRO, 2009, p. 4).

O fragmento faz parte de uma ucronia (história alternativa de ficção


científica com base em episódios da história real da humanidade) de autoria
do brasileiro Gerson Lodi-Ribeiro que, sob o pseudônimo de Carla Cristina
Pereira, aproveitou também a lenda asteca de Xochiquetzal. Considerando essa
alegoria do subgênero, a história dos povos originários da América pouco
antes da vinda dos europeus e o destaque que se deu no texto, responda V
para sentenças verdadeiras e F para sentenças falsas:

a) ( ) Os povos originários da América já tinham desenvolvido uma escrita


que se aproximava da escrita espanhola e portuguesa.
b) ( ) Maias e astecas foram os primeiros a registrar em códigos escritos as
histórias orais.
c) ( ) Lendas e mitos como a de Xochiquetzal foram traduzidos por indígenas
aos espanhóis, mas foram “perdidos” em conteúdos ao longo dos séculos.
d) ( ) Os nobres astecas tinham acesso mais fácil aos escritos e histórias orais,
muitos deles resumidos a inscrições rupestres ou passados para as suas
famílias.

3 De acordo com o estudado, a figura a seguir se refere a:

FONTE: <https://bit.ly/2JWxwrd>. Acesso em: 1 abr. 2019.

35
a) ( ) Um sistema de escrita mexica que utiliza formas geométricas em tecidos
para anotar acontecimentos como se fossem escritos com letras.
b) ( ) É um escrito dos mexicas, descoberto e traduzido pelos espanhóis.
c) ( ) Escrito inca datado do período colonial, chamado de quellcas ou quicas.
d) ( ) Obra de artistas do período Pós-Colonial.

36
UNIDADE 1
TÓPICO 2

AS MISSIVAS DO NOVO MUNDO

1 INTRODUÇÃO
Neste tópico vamos falar sobre as notícias enviadas por soldados e clérigos
após a descoberta do continente americano.

A interação entre os dois mundos ocasionou um choque cultural e uma


pluralidade cultural, e desse encontro surgiram as primeiras impressões enviadas
para a Espanha em forma de cartas, crônicas e diários.

A princípio não se fala em ficção, e sim em textos informativos, com o


objetivo de descrever seus habitantes e a nova terra. A preocupação era enviar os
relatos mais fiéis possíveis para contar sobre as novidades, a partir da chegada
das caravelas de Colombo ao novo mundo.

2 AS NOTÍCIAS DO COLONIZADOR
A formação de uma literatura hispano-americana “começará com a
conquista, uma literatura de transplantação, segundo Ricardo Rojas” (JOZEF,
2005, p. 14). As primeiras letras escritas sobre o continente eram enviadas para a
Espanha para informar à medida que a conquista espanhola se consolidava.

Neste tópico, trataremos de textos não literários, considerados assim por


conta de suas características, mas que, como vimos no Tópico 1, têm importância
literária por seu conteúdo. O conquistador europeu não escreve ficções e, mesmo
de forma rudimentar, porque não é um escritor literário, procura informar os
representantes de instituições, como reis ou bispos, da melhor forma possível
acerca das novidades de um mundo novo.

As novidades eram descritas “em cartas-relatórios e crônicas dos soldados,


dos catequistas e dos viajantes” (BANDEIRA, 1960, p. 15). Em pouco tempo, os
exploradores espanhóis tinham levado a cabo a conquista do continente americano
e as informações eram remetidas para a Espanha e às respectivas autoridades.

Junto ao navegador também estavam os sacerdotes. A chegada do


espanhol pressupõe a instalação de dois reinos em terras ameríndias: o poder
real, representado pelo soldado e conquistador, e o religioso, já que sacerdotes
católicos faziam parte da empresa de evangelismo. São eles que, com os soldados,
irão escrever sobre as primeiras impressões do novo mundo. As descrições provêm

37
UNIDADE 1 | O PERÍODO COLONIAL HISPANO-AMERICANO

de um homem ocidental, europeu, e de forma específica, o espanhol repleto de


um espírito da Contrarreforma, são compartilhadas e são essas impressões que
irão povoar o imaginário do leitor.

A descoberta foi uma conquista e ampliação da Coroa espanhola, porém,


para os indígenas, significou a perda de seu mundo, cultura e liberdade. Os
astecas, a exemplo de outros reinos, como os maias e os incas, eram um estado
religioso e em tudo o que era feito buscavam a direção dos sacerdotes e deuses de
sua própria cosmogonia, mas considerados pagãos para os católicos.

O menosprezo da cultura local, entre outras violências cometidas,


espoliou a maioria dos registros dos povos originários, como os códices, textos
ou objetos de valor; e qualquer artefato que evocava qualquer crença considerada
como paganismo foi destruído.

As entrelinhas refletem claramente o pensamento ocidental cristão em


detrimento do autóctone. Cada texto preservado dos que foram enviados para
o rei ou para uma instituição, indiscutivelmente são considerados documentos
importantes porque são os primeiros registros obtidos sobre a América.

Os textos dos exploradores e sacerdotes com o intuito de informar o


máximo possível sobre as novidades encontradas refletem observações sobre
diversas áreas de estudo, como a Sociologia, a História, Geografia, a Literatura,
Gastronomia, entre outras, e colaboram para mostrar o que foi que impressionou
a estes europeus pela primeira vez nas Américas. Provavelmente notaram a falta
de palavras específicas para determinados seres da flora e fauna, pessoas, objetos
e por ilustrarem ou incorporarem palavras locais, como o caso da palavra náuatle
chocolate, já que o cacau era desconhecido na Europa.

Os diversos gêneros textuais utilizados para dar suporte às primeiras


impressões enviadas para o velho mundo foram a carta e a crônica, mas até relatos
de viagem se constituem nos primeiros textos hispano-americanos.

Veja neste excerto da primeira carta de Colombo algumas das muitas


descrições sobre a descoberta de uma nova terra e povo:

Así que monstruos no he hallado ni noticia, salvo de una isla que es


aquí en la segunda a la entrada de las Indias, que es poblada de una
gente que tienen en todas las islas por muy feroces, los cuales comen
carne humana. Estos tienen muchas canoas, con las cuales corren
todas las islas de India, roban y toman cuanto pueden; ellos no son
más disformes que los otros, salvo que tienen en costumbre de traer
los cabellos largos como mujeres, y usan arcos y flechas de las mismas
armas de cañas, con un palillo al cabo por defecto de fierro que no
tienen. Son feroces entre estos otros pueblos que son en demasiado
grado cobardes, más yo no los tengo en nada más que a los otros
(COLÓN, s.d., p. 4).

38
TÓPICO 2 | AS MISSIVAS DO NOVO MUNDO

Os pesquisadores de literatura hispano-americana começam a falar


de uma literatura transplantada à medida que os colonizadores
chegavam, especialmente os religiosos, se instalaram em terras
americanas e fundaram escolas e mosteiros. “En 1505 el franciscano
Fernando Suárez inaugura la enseñanza primaria en Santo Domingo,
donde existía ya un convento de la Orden; en 1515 fue fundado un
convento de dominicos y en 1538 el colegio que le anexionaron fue
elevado a Universidad Pontificia, la de Santo Tomás, primera de las
fundadas en tierras americanas” (BELLINI, 1997, p. 59).

O trabalho de educação, principalmente o ensino da língua espanhola


e do ensino primário, foi realizado pelos sacerdotes católicos que se instalaram
nas colônias, e após “el descubrimiento y colonización de las grandes islas
antillanas, la cultura europea, hispánica, inicia su penetración en América por
obra de los franciscanos, de los agustinos, de los dominicos y, más tarde, de los
jesuitas” (BELLINI, 1997, p. 57). A preocupação com a educação tinha sua base no
ensino da leitura e da escrita em língua espanhola, e isso era uma estratégia de
evangelização e de apagamento da cultura do outro, com o objetivo de implantar
uma cultura estrangeira, dessa forma se construiu, quando se fala de literatura,
uma imaginação colonizada.

2.1 CRISTÓVÃO COLOMBO


Cristóvão Colombo (145?-1506) foi um navegador de origem
desconhecida, embora fontes históricas digam que era genovês, mas a serviço
da Espanha.

A proposta de encontrar um novo caminho para as Índias foi apoiada


pelos reis católicos, Fernando e Isabel. Colombo equipou três caravelas com
dinheiro arrecadado pela rainha e saiu em busca de um novo caminho para as
Índias. A descoberta do continente americano foi por mero acaso, avistou terra,
uma ilha chamada Guanahaní, em 1492.

A primeira viagem foi em busca de um novo caminho para as Índias


orientais, mas acabou descobrindo umas ilhas na região do Caribe, que mais
tarde se saberia que era um novo continente.

Colombo fez quatro viagens e acabou percebendo que tinha encontrado


uma extensa área de terras firmes, algo que nenhum navegador tinha registrado,
um achado de terras tão extensas e reivindicado as mesmas em nome de alguma
coroa europeia.

39
UNIDADE 1 | O PERÍODO COLONIAL HISPANO-AMERICANO

FIGURA 9 – AS VIAGENS DE COLOMBO

FONTE: <https://goo.gl/5wcb3s>. Acesso em: 10 jun. 2018.

Colombo escreveu uma carta por viagem, onde registra suas primeiras
impressões a respeito do novo mundo para informar os reis sobre as novidades
das descobertas. “Las primeras cartas de Colón, por ejemplo, se van modificando
una a una ante las constantes exigencias de los reyes católicos” (ESPITIA ORTIZ,
2017, p. 5). A cada expansão e viagem da conquista espanhola, a exigência de
notícias crescia, por isso Colombo se vê diante de obrigações de informação
cada vez maiores. “A medida que avanzan los descubrimientos y que se volvía
más compleja la administración de los lugares conquistados, cada vez son más
precisos los intereses de la Corona y, por ello, las exigencias en el control de la
información” (ESPITIA ORTIZ, 2017, p. 5). A primeira carta dirigida a Luis de
Santángel, um dos principais financiadores de Colombo, foi publicada em abril
de 1493, contando as primeiras impressões de um continente inexplorado para
um europeu.

A primeira carta de Colombo se constitui no primeiro documento escrito


sobre a América, também considerada a mais importante de todas junto à quarta
carta, em que ele faz uma descrição de objetos, fauna, flora, paisagens, pessoas,
dentre outros assuntos, e o encontro com os habitantes:

Y luego que llegué a Indias, en la primera isla que hallé tomé por
fuerza algunos de ellos, para que deprendiesen y me diesen noticia de
lo que había en aquellas partes, así fue que luego entendieron, y nos
a ellos, cuando por lengua o señas; y estos han aprovechado mucho
(COLÓN, s.d., s.p.).

40
TÓPICO 2 | AS MISSIVAS DO NOVO MUNDO

A constatação de Colombo, ao escrever sua primeira carta, ao dizer que


eles não tinham “hierro, ni acero, ni armas”, mostra que futuramente isso daria
alguma vantagem nas guerras para os espanhóis. O fato é que os indígenas não
conheciam o ferro, a pólvora e o cavalo. Os espanhóis utilizaram estes elementos
a seu favor, o cavalo, a pólvora e o ferro e em mais de uma oportunidade foi o que
deu vantagem aos espanhóis em guerras.

FIGURA 9 – AS VIAGENS DE COLOMBO

FONTE: <https://goo.gl/5wcb3s>. Acesso em: 10 jun. 2018.

Os indígenas utilizavam em suas ferramentas a obsidiana, uma pedra, que


podia ser polida e afiada, mas que no choque com o ferro se quebrava facilmente.

DICAS

Para saber mais sobre as viagens de Colombo, acesse este site: Historia del
Nuevo Mundo: Historia entrelazada entre España y América – La conquista de América, la
colonización de América, que está disponível no seguinte link: https://bit.ly/2QgQhIJ.

2.2 HERNÁN CORTÉS NO MÉXICO


A entrada de Cortés (1485-1547) no México foi registrada pelos cronistas
da época, além do próprio Cortés ter escrito sobre suas primeiras impressões. Ele
escreveu cinco cartas para o rei, sendo muito detalhista, descreveu o processo da
conquista espanhola no continente americano. Para se ter uma ideia da conquista
do México, e da própria vida de Cortés, são necessárias as leituras das crônicas dos
primeiros escritores da Conquista, como por exemplo, Bernal Díaz del Castillo.
41
UNIDADE 1 | O PERÍODO COLONIAL HISPANO-AMERICANO

Cortés, ao entrar nas terras do México, acabou por desconsiderar a riqueza


social, cultural e histórica dos povos desconhecidos pelo europeu. Cortés era um
homem próprio do tempo da Contrarreforma vivida pela Espanha, tinha um zelo
religioso próprio dos conquistadores, e o desejo de expandir o Cristianismo no
meio dos povos considerados por ele como pagãos era uma questão de honra:

La introducción de los libros cristianos vino acompañada por la


destrucción de los libros americanos por “herejes”. Ya Cortés se ocupó
de quemar cientos de códices del archivo de Texcoco, y fray Juan de
Zumárraga, primer arzobispo de México dio cuenta del resto. Más
célebre es el Auto de Fe de Maní, realizado en l562 por fray Diego de
Landa, tras valerse de la tortura y el crimen para encontrar los códices
mayas. Poco se salvó del fanatismo de los misioneros, aunque la
escritura de caracteres latinos serviría luego para recuperar a algunos
de ellos (COLOMBRES, 2006, p. 158).

Houve a destruição em massa de materiais e objetos dos povos originários,


assim como a imposição da religião, seja pela força ou pela manipulação e
imposição das crenças dos povos ameríndios.

DICAS

Você pode ler as cartas de Hernán Cortés no site da Biblioteca Digital Mundial:
“A primeira carta, datada de julho de 1519, nunca foi encontrada. A segunda e a terceira cartas
foram publicadas em Sevilha (em 1522 e 1523), e a quarta em Toledo, em 1525. A quinta carta
permaneceu inédita até 1842”. Leia as informações disponíveis acessando o seguinte link:
https://www.wdl.org/pt/item/7335/.

2.3 A TRADUÇÃO COMO UMA ESTRATÉGIA DA


COLONIZAÇÃO
O uso de intérpretes para a consolidação da colonização espanhola
será fundamental, neste quesito se destaca a figura de La Malinche ou Malintzin
ou Doña Marina (1496-1529 ou 1551), indígena, escrava de astecas na época da
conquista espanhola, designada tradutora de Hernán Cortés, por isso teve um
papel importante no avanço da invasão espanhola no México.

Sabemos que ela foi real e fundamental para os exploradores espanhóis,


a partir das crônicas de Bernal Díaz del Castillo, que a menciona diversas vezes
em suas crônicas e ainda dedica para ela o capítulo XXXVII: “Cómo Doña Marina
era cacica, e hija de grandes señores, y señora de pueblos y vasallos, y de la manera que
fue traída a Tabasco”, sabemos um pouco de sua história de vida. Nas crônicas,

42
TÓPICO 2 | AS MISSIVAS DO NOVO MUNDO

relata sobre a origem nobre de Dona Marina, o seu nome cristão após batismo,
como foi encontrada e fez parte da equipe de Cortés, desempenhando um papel
fundamental na intermediação entre o espanhol e os líderes dos povos originários.

DICAS

Leia o capítulo na íntegra em que Bernal Díaz del Castillo escreve sobre Dona
Marina e reconhece seu valor. https://pueblosoriginarios.com/textos/bernal/16.html.

Seus contemporâneos locais se convenceram de que ela favoreceu os


conquistadores espanhóis, especialmente Cortés, por isso os estudos, como o de
Jean Franco (2004), são importantes à medida que recupera a dignidade de Dona
Marina, cujo nome Malinche é um sinônimo de traição no país mexicano, foi acusada
secularmente de ter facilitado a invasão espanhola a partir da intermediação pela
tradução. Franco destaca que ela é vista pelo olhar e história do explorador, do
lado vencedor, ou seja, “en los relatos de la conquista, la Malinche es la que ayuda
al héroe” (FRANCO, 2004, p. 19). Em nenhum momento se leva em conta o que os
outros, os vencidos, pensaram ou sentiram sobre ela.

Nesse sentido, as descrições sobre ela, feitas por Del Castillo, demonstram
uma mulher com uma postura de firmeza e que sabia mandar, algo raro,
considerando que o padrão para as mulheres era de total submissão. Por isso, ela
ficava em evidência onde estivesse. Ela passou para a história do México como
uma colaboradora do estrangeiro e traidora de seu povo e seu nome até hoje é
considerado sinônimo de traição. O testemunho de Castillo, narrado nas crônicas
(você pode consultar a UNI nota), ratifica o fato do papel estratégico que ela
representou nos encontros entre a comitiva de Cortés e os caciques astecas: ela
falava três línguas, náuatle, maia e castelhano.

Os comentários de Bernal Díaz del Castillo indicam que ela foi amante
de Cortés com o qual teve um filho, mesmo sendo dada em casamento para um
outro capitão espanhol.

O trabalho de intérprete gerou para Dona Marina, ou Malinche, uma


série de prejuízos e acusações, tanto que seu nome náuatle se tornou sinônimo,
para os mexicanos, de traição e/ou admiração e valorização do estrangeiro em
detrimento do nacional. Conforme explica Todorov (1990, p. 6), “el malinchismo,
retomando la palabra utilizada por los mexicanos para designar la adulación
ciega de los valores occidentales, hace poco españoles, hoy angloamericanos,
palabra que proviene del nombre de la célebre Malinche, la intérprete indígena de
Cortés”. Assim, séculos depois ainda é acusada de ter se prestado para fortalecer
o estrangeiro contra o seu próprio povo.

43
UNIDADE 1 | O PERÍODO COLONIAL HISPANO-AMERICANO

NOTA

O romance com fundo histórico da escritora Norma Esquivel, mexicana, em


sua obra La Malinche (2007), humaniza e aproxima Dona Marina desmistificando sua fama de
pessoa traidora. A obra conta com tradução para o português e humaniza a pessoa humana
que viu nos espanhóis uma oportunidade para reverter seu destino.

A comunicação entre duas culturas e línguas diversas já seria o suficiente


para criar uma tensão entre os povos originários e o espanhol recém-chegado;
porém, o que minimizou o diálogo ou propiciou um mínimo de comunicação
nos anos seguintes à chegada dos espanhóis foi a tradução realizada por pessoas
locais e espanhóis que aprenderam a língua local.

2.4 FRANCISCO PIZARRO NO PERU


O explorador espanhol Francisco Pizarro González (1475-1541), natural
de Trujillo, de origem bastarda, se tornou um grande explorador do continente
americano. Morreu em Lima, Peru, assassinado por desavenças com Diego de
Almagro, outro explorador espanhol.

Antes de explorar o Peru, participou de duas campanhas de exploração: a


primeira, “parte na sua primeira viagem em 1524, explorando a costa sul de onde
agora se encontra a Colômbia” (KLOCK; FLECK, 2010, p. 9), foi um fracasso,
então em 1526 consegue “apoio financeiro do padre Hernando de Luque para
a segunda viagem de exploração [...]”. “No entanto, é obrigado pela corte
espanhola a retornar para a Espanha, apesar de seus esforços em convencê-los
de ter encontrado ouro”, depois de ouvir sobre as lendas de riquezas de ouro e
prata do Império Inca, porém será somente em 1530 que ele irá se dirigir à região
do Peru em busca de riquezas e terras, e depor Atahualpa, o imperador, e anexar
o Império Inca à Coroa espanhola (KLOCK; FLECK, 2010, p. 9).

NOTA

Você sabia que o primeiro encontro de Atahualpa e Pizarro, em Cajamarca, foi


o encontro de duas culturas muito diferentes? Atahualpa apresentou-se como o imperador
de um grande reino, enquanto Pizarro e seus soldados, em pouco número, estavam mais
preocupados se viveriam para contar a história no dia seguinte.

44
TÓPICO 2 | AS MISSIVAS DO NOVO MUNDO

A narrativa do encontro foi realizada do ponto de vista espanhol, do


vencedor. Este é um lembrete importante quando se analisa a narrativa de
quaisquer fatos históricos, saber quem e qual lado está contando os fatos.

Pizarro obteve uma vitória decisiva sobre os incas porque planejou um


ataque surpresa, assim, com um exército menor, atacou a comitiva real que nem
sequer suspeitava da armadilha preparada:

Este último chegou ao encontro dos espanhóis precedido por


servidores que varriam o caminho real. Ele vinha numa Iiteira
sustentada por oitenta senhores e sentado numa pequena cadeira com
um coxim de ouro. Chegou com uma coroa na cabeça, um grande
colar de esmeraldas no pescoço e protegido por um contingente de
uns cinco mil combatentes semidesarmados (GIUCCI, 1991, p. 5).

A ordem de Pizarro para atacar primeiro deu-lhe a vantagem e foi uma


carnificina: morreram em torno de dois mil indígenas. Os espanhóis atacaram de
surpresa e com cavalos, pólvora e armas. “Paralelamente, em 15 de novembro
de 1532, o analfabeto Pizarro capturou, com apenas 160 soldados, na emboscada
de Cajamarca, o orgulhoso imperador Atahualpa” (GIUCCI, 1991, p. 5). Pizarro
desenvolveu junto de seus capitães uma estratégia, e consta em mais de um
testemunho que o medo imperava nas fileiras castelhanas, pois reconhecidamente
eram em menor número, se Atahualpa tivesse atacado primeiro, Pizarro e seu
pequeno exército não teriam sobrevivido.

Nota-se que Cortés, no México, teve o auxílio de uma pessoa local, La


Malinche, porém Pizarro não contou com a ajuda de uma pessoa que fizesse
uma intermediação cultural e linguística. Desta forma, é possível entender um
significativo exemplo das diferenças culturais que existiam entre os povos europeu
e inca. O fato que está narrado neste trecho das crônicas sobre a compreensão do
que era um objeto sagrado para cada cultura se evidencia quando Fray Vicente de
Valverde oferece um livro religioso para Atahualpa. Ele:

Trató de abrirlo por el lomo, y al no poder hacerlo, Valverde quiso


ayudarlo. Atahualpa apartó de un golpe el brazo del religioso. Por fin
abrió el libro y pareció no sorprenderse al ver la palabra escrita sobre
el papel, arrojándolo con desprecio a cinco o seis pasos (BARLETTA
VILLARÁN, 2008, s.p.).

A atitude de Atahualpa, como consta nas narrativas do cronista Guamán


de Poma Ayala, se constitui em uma instigante reflexão sobre a importância
dos estudos culturais e interdisciplinares para os estudos da literatura hispano-
americana.

Para finalizar, sabemos que Pizarro irá efetivar a posse da terra do Peru
em nome da Coroa espanhola, Atahualpa será morto e “o conquistador espanhol
entregou a coroa do Império ao filho de Atahualpa, Toparca. Rei fantoche nas mãos
dos vencedores, Toparca foi envenenado tão logo passou a reclamar os poderes
que lhe pertenciam por direito” (ROY, 1974, p. 5). Logo seria estabelecido o uso

45
UNIDADE 1 | O PERÍODO COLONIAL HISPANO-AMERICANO

da língua espanhola, a Igreja abriria atividades de educação e dessa forma estaria


impondo os meios militares, religiosos e culturais espanhóis que consolidaram a
conquista espanhola no continente hispano-americano.

3 AS NARRATIVAS SOBRE AMÉRICA


As narrativas em formato de crônicas ou cartas são as primeiras impressões
que o europeu irá receber sobre um continente desconhecido. A partir de um olhar
direto, o de homens militares ou religiosos, que estavam a serviço das instituições e
tinham que enviar relatórios de seus feitos.

As principais crônicas são dos impérios Maia, Asteca e Inca. Sobre a região
do Sul, o primeiro cronista da região platina, conforme Bandeira (1960, p. 25), foi
o soldado “alemão Ulrich Schmid. "[...] sua obrinha escrita em alemão e editada
pela primeira vez em 1567, é conhecida pelo título de Viaje al Rio de la Plata”.
Bandeira irá dizer que a narrativa de Schmid é própria do registro de um soldado
sem estudos, por isso a falta de rigor científico, mas por narrar sobre as lendas, a
fauna do novo mundo, se torna importante porque ele era “uma testemunha de
vista e participante de ação” (BANDEIRA, 1960, p. 25). Soldados e marinheiros
narravam os fatos de forma prática e objetiva.

Esses escritores procuravam transmitir com palavras a surpresa, muitas


vezes, diante das diferenças culturais, sociais e históricas vivenciadas em solo
americano, apesar de que:

La literatura "oficial", en un principio, se concebirá de acuerdo con


unas pautas cuyo origen se halla a miles de leguas del lugar a que
se refiere, o donde se produce. El espacio y el tiempo en que ella se
inscribe no serán, pues, los del continente que la suscita, sino los de las
metrópolis, del "Occidente" (LIENHARD, 1993, p. 51).

A crônica é um exemplo de como um gênero amplamente utilizado pelo


escritor europeu ocidental migrou para a América e se constituiu no principal
suporte textual para as narrativas sobre o novo mundo. O gênero era conhecido
pelo leitor europeu: “Ao transplantar-se para a América, a crônica tinha uma
longa tradição na Europa. Havia surgido particularmente na Espanha, como
derivação épica, e apresentava tendência moralizadora” (JOZEF, 2005, p. 15). Para
o escritor e leitor, os textos enviados pelos cronistas se constituem nos primeiros
documentos oficiais para descrever o novo mundo para a Europa.

Posteriormente à conquista inicial e à destruição de muitas fontes


narrativas, sejam orais ou textuais, evidentemente houve uma preocupação por
parte de alguns sacerdotes e soldados de preservar as histórias locais. Assim, as
cartas, as crônicas, os relatos de viagem serão os gêneros mais utilizados inicial e
posteriormente. Com o crescimento dos habitantes das terras hispano-americanas
surgirão escritores literários que irão praticar a escrita da poesia, do drama e da
comédia.

46
TÓPICO 2 | AS MISSIVAS DO NOVO MUNDO

Assim, Frei Bernardino de Sahagún, entre outros escritores que serão


estudados, escreveu a obra História general de las cosas de Nueva España
e se valeu dos relatos dos próprios indígenas para compor a obra:
“En ella, de acuerdo con los principios de la etnología moderna, no
es el autor quien relata, sino el informante indígena el que nos habla
ampliamente y en su propio idioma, acerca de los diversos aspectos
de la cultura azteca, de los cuales casi ninguno se ha dejado fuera”
(KRICKEBERG, 1971, p. 9).

Estes cronistas perceberam que o mundo em que estavam era diferente


de tudo o que tinham ouvido falar anteriormente, e que era maior do que o
imaginado, muitos destes cronistas “enalteceram os povos vencidos”, dando
valor às descobertas apresentadas (JOZEF, 2005, p. 15).

Em 1577, um édito real foi emitido pelo rei da Espanha em que mandava
parar a total produção escrita dos textos que recolhiam as histórias dos povos
originários. Um reflexo da Contrarreforma tinha cruzado o Atlântico e se instalado
nas colônias. Por isso, qualquer texto ou suporte que preservasse as memórias dos
povos originários passou a ser considerado pagão e não deveria ser propagado:

A causa de esta cédula, los textos permanecieron cientos de años en


el silencio. Recién en el siglo XIX es exhumado el Popol Vuh de los
kichés, mientras que El primer nueva corónica y buen gobierno de
Guamán Poma de Ayala, concluido en l6l5, deberá esperar hasta l936
para ver la luz. Los textos clásicos de la cultura náhuatl recopilados
por Sahagún, Durán, Olmos y otros, debieron esperar también a que el
padre Ángel María Garibay los rescatara (COLOMBRES, 2006, p. 158).

Muitos anos se passaram antes de que muitas das crônicas tivessem uma
circulação livre e popular. As histórias narradas, como as de Guamán Poma de Ayala,
levaram praticamente três séculos para circular livremente com acesso ao público.

DICAS

Leia o artigo sobre a polêmica em torno dos escritos de Guamán:


BORRERO, María José. Felipe Guamán Poma de Ayala y su obra Nueva Corónica y Buen
Gobierno: ¿verdadera o falsa autoría? 1997. Disponível em: https://bit.ly/2UfHbOx.

A importância dessas obras escritas por mestiços ou por sacerdotes


católicos é porque elas contêm elementos pré-hispânicos, na sua grande maioria
coletados da tradição oral, que até algumas décadas passadas não era reconhecida
por não considerar a memória individual ou coletiva como fonte confiável.
Porém, cada vez mais se constata a importância de fontes orais, reconhecidas
como transmitidas de geração em geração, como forma de conhecer e entender a
gênese de um povo; não só para o mundo hispano, mas também brasileiro.
47
UNIDADE 1 | O PERÍODO COLONIAL HISPANO-AMERICANO

As perspectivas da História Oral permitem ainda melhor compreensão


das sociedades sem escrita, como os indígenas brasileiros. Ela
incentiva que pensemos a oralidade em toda a sua funcionalidade
como ferramenta de transmissão de valores, sentimentos, visões de
mundo. Enfim, como instrumento de transmissão de cultura (SILVA;
SILVA, 2009, p. 188).

Em alguns textos é possível ver diferenças de opinião entre os cronistas


sobre o mesmo tema, como entre Díaz del Castillo e Gómara sobre La Malinche,
mas consideramos isso um ganho para o leitor hodierno, já que nos possibilita
ter diversos pontos de vista e opinião. Principalmente sobre o que se considerava
adequado ao tratamento dos indígenas, que foi a grande preocupação de
Bartolomé de las Casas ou o próprio Sahagun.

A escrita sobre as narrativas pré-hispânicas acaba por impor a escrita em


língua espanhola: “Al establecer su dominación política-militar en América, los
europeos imponen también el predominio de la escritura (y de los valores en que
ella se basa) sobre todos los sistemas autóctonos” (LIENHARD, 1993, p. 51). Isso
acarretou um grande prejuízo cultural e social porque criou uma dependência
cultural de modelos europeus, desenvolvida ao longo da formação da identidade
dos habitantes das Américas.

Atualmente as pesquisas sobre a recuperação e a incorporação das


literaturas indígenas, de acordo com Colombres (2006, p. 161), leva a pensar em
quatro propostas:

QUADRO 2 – PANORAMA DE PROPOSTAS PARA A RECUPERAÇÃO DE LITERATURA


INDÍGENA DE COLOMBRES

Primeira Segunda Terceira Quarta


Proposta Proposta Proposta Proposta
La literatura [...] está dada por el [...] sería la creación [...] serían las creaciones
de tradición tránsito de los relatos literaria escrita en literarias escritas en
oral de estos y cantos de tradición lengua indígena, los idiomas coloniales
pueblos, oral a la escritura, lo actualmente en (español, portugués,
narrada o que obliga a distinguir emergencia, y que inglés) por miembros
cantada en su los casos en que dicho reclama un sitio de dichas minorías,
lengua y con tránsito fue realizado en la literatura de quienes se apoderan
la totalidad de por personas ajenas América Latina que así de lenguas de gran
los elementos al grupo de los que vaya más allá de difusión para poder
que definen fue obra de miembros contar sus mitos publicar sus obras y
el estilo social de él, y a preguntarse y cuentos a los encontrar un público
y aportan si se utilizó la lengua niños mediante lector que de otro
unidades materna o una adaptaciones modo no tendrían, por
semánticas no segunda lengua. estereotipadas. pertenecer a pueblos
verbales. ágrafos o que carecen de
la práctica de la lectura.
FONTE: Adaptado de Colombres (2006)

48
TÓPICO 2 | AS MISSIVAS DO NOVO MUNDO

Assim, a partir do quadro apresentado, mostram-se as possibilidades


sobre a preservação e a escrita das narrativas indígenas e como, desde o encontro
dos exploradores espanhóis e dos povos originários, as formas de escrever a
literatura, a história indígena se desenvolvem. Nas próximas seções, vamos
detalhar os principais autores, muitos deles cronistas, que detalham o período
pós-colonial.

3.1 BERNAL DÍAZ DEL CASTILLO


Bernal Díaz del Castillo (1492-1581) foi um soldado espanhol que veio
para a América na expedição de Pedro Arias Davila (conhecido por Pedrarias), em
1514. Bernal participou de expedições anteriores à de Cortés, mas lutou em todas
as batalhas referentes à conquista do México integrando o exército de Cortés, e
“depois da conquista viveu tranquilamente na Guatemala, e só na velhice pensou
em escrever as suas memórias” (BANDEIRA, 1960, p. 22). Ele se tornou um dos
maiores cronistas das colônias hispano-americanas.

FIGURA 11 – BERNAL DÍAZ DEL CASTILLO

FONTE: <https://www.laphamsquarterly.org/contributors/diaz-del-castillo>. Acesso em: 10 jun. 2018.

A sua obra História verdadera de la conquista de la nueva España, publicada em


1632, tornou-se um importante documento sobre as invasões espanholas. Bernal
foi uma testemunha ocular e estava interessado em mostrar a expedição de Cortés
na conquista do México como uma empresa feita por uma grande equipe. Por isso
ele não destaca apenas Cortés, mas concede esta importância aos soldados como
participantes comprometidos com a conquista espanhola. Outro fato notório de
suas crônicas são os registros pessoais, como a descrição do impacto que sentiu

49
UNIDADE 1 | O PERÍODO COLONIAL HISPANO-AMERICANO

ao entrar pela primeira vez nas cidades astecas. Provavelmente, como soldado
europeu, não estava preparado para absorver a surpresa diante da organização e
riqueza do Império Asteca.

A obra foi escrita para evidenciar que ele realmente tinha viajado para a
América e tinha vivenciado o que escreveu, pois criticava os escritores que nunca
tinham viajado e escreviam sobre a conquista hispano-americana, a exemplo de
López de Gómara, seu desafeto.

Bernal Díaz va consolidando una identidad de escritor que opone,


muy intencionalmente, a la identidad de un escritor como Francisco
López de Gómara, ese cronista que, paradójicamente, le serviría como
modelo formal para la elaboración de su propia Historia verdadera de la
conquista de la Nueva España (ESPITIA ORTIZ, 2017, p. 133).

Escreveu quando tinha 84 anos, com o objetivo de deixar sua visão para
seus descendentes, também para fazer oposição a Francisco López de Gómara, a
quem criticava por escrever sobre a conquista espanhola sem nunca ter viajado
com nenhuma expedição para o continente americano.

DICAS

Que tal aprofundar mais a leitura? Veja esta edição de Guillermo Serés sobre
Historia Verdadera de la Conquista de la Nueva España: Aparato de Variantes, de Bernal Díaz
del Castillo. Acesse: https://bit.ly/2HJlbVP.

3.2 FRANCISCO LÓPEZ DE GÓMARA


Francisco López de Gómara (1611-[16??]) foi um historiador espanhol,
escreveu a obra Historia general de las Indias: conquista de Méjico. “Na volta de Hernán
Cortés, teve acesso aos dados de viagem e narrativas do próprio conquistador e
escreveu a história sobre a exploração do México e os passos de Cortés na região,
isso sem nunca ter viajado para as Américas” (VEGA, 2011, p. 1). Por isso foi
acusado por Bernal Díaz del Castillo de ser impreciso e de escrever do ponto de
vista do vencedor e ainda de engrandecer a Cortés.

Es el caso de la Istoria general de las Indias y conquista de México de


Francisco López de Gómara, impresa en Zaragoza en 1552. Se trata
de una historia elaborada en base a testimonios indirectos, incluidos
los manuscritos de la Historia de Fernández de Oviedo (O'Gorman
50), pues Gómara no vino nunca al Perú ni a América. Sin embargo,
debido a las numerosas ediciones tempranas, fue uno de los autores
determinantes en "la fijación de una imagen histórica de los tiempos
españoles iniciales" (Pease, Crónicas 29) (VEGA, 2011, p. 228).

50
TÓPICO 2 | AS MISSIVAS DO NOVO MUNDO

Mesmo que a obra seja constantemente questionada, ainda se constitui


em um registro dos primeiros testemunhos sobre aqueles que retornaram das
viagens das conquistas hispano-americanas. De acordo com Espitia Ortiz (2017),
os dois escritores eram de estirpes diferentes, um era humanista, o outro soldado,
e cada um tinha que escrever para satisfazer à necessidade de informação dos
soberanos.

3.3 FELIPE GUAMÁN POMA DE AYALA


O cronista peruano Felipe Guamán Poma de Ayala (1534-1615) nasceu
em Lima, Peru, era indígena peruano e publicou em 1615 o livro Nueva Corónica
y Buen Gobierno: “[...] uma crônica de 1200 páginas que narra a história do Peru
desde os tempos de Adão até os inícios do século XVII para um interlocutor de
exceção, o rei da Espanha, Felipe III. Dessas 1200 páginas, um terço, quer dizer,
398 folhas, é composto por desenhos” (AYBAR-RAMÍREZ, 2008, p. 1).

As ilustrações também eram necessárias para complementar a informação


diante da falta de palavras castelhanas para nomear alguma coisa ou ser, pois a
maioria das histórias era proveniente das tradições orais.

FIGURA 12 – PORTADA DA OBRA DE GUAMÁN POMA – DESENHO 1

FONTE: <https://bit.ly/2x7rB98>. Acesso em: 10 jun. 2018.

51
UNIDADE 1 | O PERÍODO COLONIAL HISPANO-AMERICANO

A importância de sua obra reside no relato sobre a entrada de Pizarro


na região do Cusco, no Peru, na sua estratégia para vencer o imperador inca
Atahualpa, a descrição da sociedade colonial e indígena de sua época e o entorno
social.

De acordo com Borrero (1997, s.p.), o conteúdo do livro é bem crítico e


retoma um pouco de sua vida como indígena falante de quéchua. A obra é:

[...] un relato que presenta un idioma mezcla de español y quechua


y que se halla dividido en dos partes: la primera, la Nueva Corónica,
versa sobre los tiempos anteriores a la civilización inca. En ella,
presenta, a grandes rasgos, un mundo atractivo de ocupaciones,
fiestas, canciones, prácticas de superstición y de religión, quehaceres
medicinales y costumbres funerarias, que tiene su expresión más
intrínseca en la incorporación de textos escritos en quechua, aymara
o en otras modalidades regionales; la segunda, el Buen Gobierno,
denuncia las injusticias que acechan a los indios. A todo esto, se añade
la abundancia de ilustraciones pictóricas a pluma y sin color que
revelan la participación de una mano primitiva, las cuales han sido
estudiadas por Mercedes López-Baralt en Icono y conquista: Guamán
Poma de Ayala.

A descrição da sociedade religiosa colonial também foi uma contribuição


importante e, sem dúvida, Poma de Ayala será um cronista lembrado pelo fato
de narrar as histórias de uma região conquistada posteriormente ao México e
Caribe, desde o ponto de vista de um autóctone e não propriamente de alguém
que ouviu as histórias, mas de quem conviveu com as próprias fontes orais.

DICAS

A obra Nueva Crónica y Buen Gobierno, de Felipe Guamán Poma de Ayala, tem
uma versão antiga em fac-símile que foi publicada on-line em 2011 pela Biblioteca Real Danês
(Dinamarca). O livro é considerado uma longa crítica sobre o domínio espanhol no Peru e foi
dedicada ao então rei da Espanha, Felipe II. No livro, o autor descreve o domínio sangrento das
terras indígenas, a injustiça social e as mudanças sociais durante o Período Colonial.

3.4 INCA GARCILASO DE LA VEGA


A obra mais conhecida do escritor peruano, Gómez Suárez de Figueroa
(1539-1616), ou El Inca Garcilaso de La Vega é Os Comentários Reais.

Garcilaso de La Vega era de origem materna inca e por parte paterna


espanhola, tornou-se conhecido por escrever uma obra que relatava a história dos
incas. De acordo com Coulthard (1979, p. 40), Garcilaso foi “o primeiro grande
intérprete mestiço da realidade pré-colombiana”.

52
TÓPICO 2 | AS MISSIVAS DO NOVO MUNDO

Garcilaso “inicia o critério de criação estética com o tema do novo mundo;


é a primeira tentativa de valorização da cultura indígena” (SAGUIER, 1979, p.
16). A obra Comentarios Reales foi composta de duas partes: a primeira parte
dos Comentários foi impressa em 1609 com a aprovação do Tribunal da Santa
Inquisição e publicada em Lisboa, em 1609. Formada por nove livros apresentados
em capítulos, com 525 páginas, a obra conta a origem do povo inca, lendas e
particularidades. A segunda parte, conhecida como História geral do Peru (1616),
é formada por oito livros e conta sobre a chegada dos espanhóis e as vitórias no
continente americano, além das disputas entre Pizarro e Almagro, a partilha da
terra e os efeitos de uma colonização à base da espada.

FIGURA 13 – FRONTISPÍCIO DA PUBLICAÇÃO EM LISBOA,1605

FONTE: <https://goo.gl/nUqHZp>. Acesso em: 10 jun. 2018.

A publicação de Los Comentários Reales ficou proibida nas colônias


hispanoamericanas em 1782 porque: “debido a que de ella aprendían ‘los naturales
muchas cosas inconvenientes’; circulaba, sin embargo, libremente en Madrid, y
a partir de 1918 se publica en América” (PULIDO, 2017, p. 47). O que comprova
o apagamento da cultura indígena e a perda do registro de outros povos pré-
hispânicos.

53
UNIDADE 1 | O PERÍODO COLONIAL HISPANO-AMERICANO

3.5 ÁLVAR NÚÑEZ CABEZA DE VACA


O soldado espanhol, Álvar Núñez Cabeza de Vaca (1490-1558) nasceu em
Jerez de la Frontera e morreu em Sevilha, na Espanha. Autor do livro Naufrágios,
que conta com tradução para o português, é uma obra que descreve suas aventuras
como navegador, o tempo que permaneceu em cativeiro com povos indígenas e o
seu retorno à sociedade espanhola.

Cabeza de Vaca foi um explorador incansável, mesmo depois de ter


sido prisioneiro dos indígenas por quase dez anos, voltou a explorar terras
desconhecidas, por isso passou pela Ilha de Santa Catarina, em 1541, e foi seu
primeiro governador como representante da Coroa espanhola; neste período
batizou duas ilhas, conhecidas até hoje como Ilhas Ratones, localizadas na Baía
Norte, uma chamada de Ratón Grande e outra de Ratón Pequeno, devido ao
formato delas em se assemelhar a dois camundongos. Em menos de um ano
continuou sua jornada e se tornou o primeiro europeu a descrever as Cataratas
do Iguaçu e a explorar o curso do rio Paraguai.

O escritor Paulo Markun escreveu a obra Cabeza de Vaca (2009).


Publicada pela Companhia das Letras apresenta o navegador, em que comenta
como Cabeza de Vaca é um representante de seu tempo e não apenas como
explorador, mas por ter escrito Naufrágios e registrado uma parte muito
importante do período relacionado à expansão espanhola nas Américas.

DICAS

Indicamos o audiolivro Naufrágios, escrito por Cabeza de Vaca e gravado em


língua espanhola. Acesse https://bit.ly/2L4ipJl.

3.6 ALONSO DE ERCILLA Y ZÚÑIGA – A ÉPICA


Alonso de Ercilla y Zúñiga (1533-1594), poeta e soldado espanhol, nasceu
e morreu em Madri. Viajou para o Peru em 1555 e chegou ao Chile em 1557.
Retorna para a Espanha em 1562.

54
TÓPICO 2 | AS MISSIVAS DO NOVO MUNDO

FIGURA 14 – ALONSO DE ERCILLA

FONTE: <https://goo.gl/N1VFTT>. Acesso em: 24 jun. 2018.

Escreveu La Araucana, uma obra considerada um poema épico.


Desenvolveu o tema da colonização do Chile e narra a guerra entre os indígenas
araucanos, os espanhóis e mapuches. A obra foi publicada em 1569. Em 1578,
publicou a segunda parte, e a terceira parte do poema em 1589.

FIGURA 15 – FRONTISPÍCIO DA PUBLICAÇÃO EM MADRID, 1574

FONTE: <https://goo.gl/yVP3w5>. Acesso em: 10 jun. 2018.

55
UNIDADE 1 | O PERÍODO COLONIAL HISPANO-AMERICANO

La Araucana foi reconhecida como um poema épico e representativo de


seu tempo. Félix Lope de Vega escreveu alguns versos para elogiar a Ercilla e La
Araucana, em sua obra Laurel de Apolo (1630), declarou sobre Ercilla:

uno de los ingenios más claros de ambos continentes:


Don Alonso de Ercilla
tan ricas Indias en su ingenio tiene
que desde Chile viene
a enriquecer la Musa de Castilla.

La cita confirma que Ercilla o, por mejor decir, su obra, representaba


un producto de cultura refinada, propio del Renacimiento (BELLINI,
1997, p. 115-116).

O poema tem sido alvo de muitas discussões por parte da crítica literária
sobre a representatividade social de um povo submetido pelos espanhóis,
de acordo com Bellini: “la actitud del poeta es la de un español que se siente
emotivamente atraído por el mundo americano, pero que no olvida en ningún
momento su propio origen, es decir, que es precisamente un español” (BELLINI,
1997, p. 116-117).

4 O BARROCO HISPANO-AMERICANO
A partir dos primeiros textos enviados pelos cronistas e as cartas dos
relatos dos conquistadores, uma literatura começa a se desenvolver nas colônias.
No encontro dos povos originários e europeus começou uma troca de saberes
e aculturação, em detrimento dos povos indígenas, que sofreram um genocídio
ou acabaram submetidos linguística, política e culturalmente. Dessa forma, o
modelo literário que se instalou nas colônias foi o europeu.

A Contrarreforma também se faz presente nos vice-reinados das


Américas, a Inquisição é uma ameaça constante e a Igreja vigia seus cidadãos
para que ninguém se perca em crenças pagãs. Isso inclui a produção de literatura,
nada é publicado sem primeiro passar por uma série de licenças, principalmente
o censor da Igreja, porém a Inquisição não terá a força que tinha na Espanha.

Nas colônias, o barroco encontrou um clima ideal para se desenvolver


mais ainda, incorporando elementos mesoamericanos, surgindo uma tensão que
irá caracterizar a arte. O Barroco, diferente do Clássico, apresenta uma estética
subjetiva, de cores sombrias, e vindo para as colônias assimilou da arte local
elementos tropicais e coloridos. Assim, o barroco se adaptou às terras hispano-
americanas. Dos temas barrocos, o mais importante foi a conservação de um tema
comum às duas culturas, a morte. Um tema sinalizado pela caveira como símbolo
da finitude da vida e encontrado na produção artística do período barroco
espanhol e hispano-americano. A estética barroca se estendeu à arquitetura,
pintura e literatura. A Contrarreforma espanhola, de forma desenhada e/ou
escrita foi transplantada e assimilada pela nova cultura híbrida.

56
TÓPICO 2 | AS MISSIVAS DO NOVO MUNDO

NOTA

O Barroco se caracteriza como um estilo visto em diversas manifestações


artísticas. O mais evidente será na arquitetura, principalmente na construção de igrejas, mas
na escrita, em prosa e verso, terá uma expressiva produção literária.

Ao transplantar-se nas Américas e no encontro do local e do estrangeiro,


enriqueceu ainda mais seu estilo exuberante. As colônias cresceram e importaram
o modelo europeu de vida cultural.

Na arte barroca hispano-americana acontece uma assimilação entre o local


e o estrangeiro. De acordo com Sarduy (1974, p. 99-100), “el barroco subvierte el
orden supuestamente normal de las cosas, como la elipse ese suplemento de valor
subvierte y deforma el trazo, que la tradición idealista supone perfecto entre
todos, del círculo”. Mais uma vez a vocação de uma estética retorcida e subjetiva
em que se inscreve.

FIGURA 16 – CATEDRAL METROPOLITANA EM CIDADE DE MÉXICO – ALTAR DOS REIS

FONTE: <https://bit.ly/2O5yuip>. Acesso em: 10 set. 2018.

57
UNIDADE 1 | O PERÍODO COLONIAL HISPANO-AMERICANO

Assim, a sociedade do Período Colonial Hispano-americano se


caracterizou por uma continuidade da Espanha e isso se refletia na esfera de
todas as relações sociais. O indígena e o negro eram marginalizados no Período
Colonial e praticamente no mesmo nível acontecia com as mulheres e crianças,
indiferentemente de classe social.

A etnia/raça indicava também a distribuição de trabalhos, rendas e


até a genealogia era um fator importante na sociedade hispano-americana.
Um exemplo é a bastardia, que significava, se não uma total exclusão social,
pelo menos uma indiferença, principalmente para as mulheres era um fator
determinante quando se tratava de escolhas para casamento.

Os estratos sociais durante o Período Colonial também são estabelecidos


por uma sociedade caracterizada pela origem do indivíduo. Observe a figura a
seguir e veja uma projeção dos estratos sociais da sociedade colonial do vice-
reinado do México:

FIGURA 17 – PIRÂMIDE DA SOCIEDADE COLONIAL DO VICE-REINADO DO MÉXICO

FONTE: <http://migre.me/sE4EL>. Acesso em: 10 jun. 2018.

O gênero dramático (o teatro espanhol) será amplamente difundido


nas colônias. Depois dos textos não ficcionais dos relatos das conquistas,
os missionários espanhóis desenvolveram uma estratégia evangelizadora,
incorporando os elementos autóctones da América. Observaram que os indígenas
realizavam representações que envolviam elementos teatrais e incluíam a
dança e gestos, ainda assim era uma enorme diferença do que era praticado

58
TÓPICO 2 | AS MISSIVAS DO NOVO MUNDO

na Europa: “nem na estrutura, nem na temática aparecem semelhanças com o


teatro medieval trazido à América pelos evangelizadores, e menos ainda com as
formas evoluídas que foram chegando depois” (JOZEF, 2005, p. 22), porque para
os povos originários eram rituais sagrados, expressão de sua religião, e sempre
como oferenda e culto aos deuses.

A prática acabou sendo aproveitada de forma didática pelos sacerdotes


católicos para difundir o Cristianismo e induzir à conversão ao Cristianismo em
massa.

Aconteceu um fenômeno de sincretismo nas colônias hispânicas. De


acordo com Jozef (2005, p. 23), “o teatro missionário é o símbolo mais concreto da
fusão do espírito espanhol e indígena”. Após o estabelecimento dos colonizadores
e o crescimento das cidades, o teatro evoluiu, deixou de ser um mero instrumento
de catequese e passou a ser também uma grande fonte de diversão e um
entretenimento cada vez mais requerido, sem diferenças de classes sociais e para
todas as ocasiões.

A escrita barroca, especialmente os gêneros dramáticos escritos na


colônia, mesmo seguindo uma preceptiva europeia, e mais tarde lopesca, acabará
por incorporar o cotidiano social local. Não faltarão nas colônias escritores de
teatro, como Juan Ruiz de Alarcón ou Sor Juana Inés de la Cruz, dentre outros, e
se desenvolverá a exemplo do ocorrido na Espanha, terá diversos representantes,
mas o nome de destaque dos escritores coloniais será a freira mexicana Sor Juana
Inés de La Cruz, que será publicada na Espanha ainda em vida.

Começam a circular textos literários, já existe uma demanda e uma


produção para o consumo e o divertimento da corte instalada nos vice-reinados,
ou para satisfazer festividades religiosas.

O teatro foi sempre uma diversão para os habitantes e já existia no vice-


reinado uma "casa de comédias", datada de 1597, no México (CASTRO LEAL,
1943, p. 32). Os gêneros literários do barroco são diversos, porém a comédia
teatral será seu grande expoente. Os textos nascidos nas colônias já inserem
alguns elementos, como os gêneros poéticos e dramáticos que envolvem os
elementos próprios de um texto barroco, ainda incluem a música e a dança. Com
a consolidação da conquista hispânica, começa o processo de formação de uma
literatura hispano-americana.

Nas colônias hispano-americanas os gêneros se desenvolveram em igual


ou mesmo grau que no continente europeu. Observe o quadro a seguir sobre os
diversos tipos de gêneros textuais que envolviam o drama:

59
UNIDADE 1 | O PERÍODO COLONIAL HISPANO-AMERICANO

QUADRO 3 – ESQUEMA DOS DIFERENTES TIPOS DE GÊNEROS TEATRAIS

Tragédia Obra dramática de tema elevado.

Obras Texto dramático de conflitos menores que os


Drama
Maiores desenvolvidos na tragédia
Texto teatral que representa festas e alegrias e
Comédia
desenlaces felizes.
Auto
Texto teatral de tema religioso.
sacramental
Peça teatral curta de caráter cômico. Os personagens
Obras
Entremez são populares e tudo é feito para divertir o público
Menores
entre os atos de uma comédia.
Obra cômica com elementos populares, de um ou
Sainete
mais atos. São apresentados como uma peça única.
FONTE: <https://goo.gl/S6TdYG>. Acesso em: 19 fev. 2018.

O barroco espanhol se confundia com a própria doutrina da Igreja


Católica, seguia as decisões emitidas no Concílio de Trento, assim, “o artista e
escritor Barroco atrelam-se mais claramente à cosmovisão contrarreformista”
(GONZÁLEZ, 2010, p. 392), por isso foi o estilo colonial predominante.

NOTA

O estilo sombrio do barroco espanhol, os jogos do claro e escuro, encontra no


colorido mexicano outras formas de expressão e se expande. O tema da morte, próprio do
barroco, curiosamente também se encontra no meio autóctone, a morte não é vista como o
fim, e nisso as duas culturas se assemelham nas crenças de uma vida pós-morte.

O barroco se sobrepõe às artes locais, porém, entre o barroco espanhol e


as artes dos povos originários, a fronteira é tênue, e se consideradas do ponto de
vista estético, surgem espaços, culturas e o encontro comum entre as artes. Há
um transplante, a cultura hispânica atravessa o oceano e se acomoda em meio à
cultura local, o que gera um fenômeno de assimilação, ou mesmo, antropofagia
entre ambas.

60
TÓPICO 2 | AS MISSIVAS DO NOVO MUNDO

4.1 O TEATRO COLONIAL – JUAN RUIZ DE ALARCÓN Y


MENDOZA
O dramaturgo mexicano Juan Ruiz de Alarcón y Mendoza (1581-
1639) nasceu no vice-reinado espanhol do México, quando a Espanha já tinha
consolidado sua conquista e a Corte espanhola tinha se estabelecido em vice-
reinados ao longo das Américas.

FIGURA 18 – JUAN RUIZ DE ALARCÓN

FONTE: <https://taxco.webcindario.com/costumbres_016.jpg>. Acesso em: 26 mar. 2019.

Ele viaja para Madri, em 1600, onde começou a estudar na Universidade


de Salamanca e retornou para o México em 1608, onde “de su vida en México en
esta época nada sabemos, fuera de su paso por la Universidad y sus funciones
de letrado en el Cabildo y en la Audiencia” (CASTRO LEAL, 1943, p. 32). Em
1613, retorna pela segunda vez à Espanha e se dedica à escrita de obras teatrais.
“Al llegar a Madrid, en 1613, llevaba en sus baúles algunas comedias, cinco o
seis: las que había escrito en Salamanca, Sevilla y México. Las revisa, las corrige,
les agrega algunas referencias a ciertos acontecimientos de actualidad y las
ofrece a los empresarios” (CASTRO LEAL, 1943, p. 37).

Octávio Paz (1989) dedicou um significativo ensaio para falar do escritor


e sua obra e a sua importância para as letras do barroco mexicano. O autor, ao
descrever Alarcón, afirma que ele é “un gran dramaturgo – y mediano poeta lírico
– opone al teatro lopesco y a su deslumbrante facilidad una obra en la que no es
gratuito ver un eco de Plauto y Terencio” (PAZ, 1989, p. 18). Em seus estudos, Paz
(1989) discute o fato de que a obra de Alarcón não se rege propriamente pelo Arte
Nuevo de Hacer Comédias ou os preceitos do teatro de Lope de Vega, mas sim os
dos antigos dramaturgos latinos.

61
UNIDADE 1 | O PERÍODO COLONIAL HISPANO-AMERICANO

A obra de Alarcón não é considerada extensa para a época, apenas 20


comédias e em duas partes: “la primera, con ocho en Madrid, 1628, y la segunda
con doce en Barcelona, 1634. Algunas otras piezas se publican en diversas
colecciones” (ARELLANO, 2012, p. 282). Isso se explica pelos trabalhos paralelos
que ele tinha e o fato de que em alguns períodos de sua vida não foi escritor em
tempo integral, como outros contemporâneos.

FIGURA 19 – FRONTISPÍCIO DA PUBLICAÇÃO EM MADRID

FONTE: <https://bit.ly/2MlBXI6>. Acesso em: 10 jun. 2018.

Suas obras criaram a base de uma identidade cultural mexicana, “Alarcón


es una respuesta al siglo XVII español. En Alarcón, por vez primera, se presiente
que lo mexicano no es, tan sólo, una dimensión de lo español, sino, mejor que
nada, una réplica” (PAZ, 1989, p. 64). Ao se estudar o teatro de Alarcón se percebe
a base para um teatro hispano-americano, que abriria caminho para outros
escritores, como a Sor Juana Inés de la Cruz, a maior representante do drama
barroco colonial. Paz ainda diz que “Alarcón es mexicano, en cuanto que no es
español” (PAZ, 1989, p. 64). As letras de Alarcón demonstram a preocupação com
a identidade autóctone, a busca de uma independência intelectual da Espanha e a
construção de uma literatura hispano-americana.

A identidade cultural mexicana na obra de Alarcón, defendida por Paz


(1989), não encontra eco em Arellano, crítico teatral espanhol que difere ao
questionar se ele desenvolvia de fato uma obra teatral que incorporava elementos
próprios da cultura mexicana:

62
TÓPICO 2 | AS MISSIVAS DO NOVO MUNDO

Dejo aparte ahora el falso problema del mejicanismo de Ruiz de Alarcón,


que ha dado demasiado trabajo a las prensas para su trascendencia: se
ha llegado a hablar de la «sinuosidad india» del poeta, que de indio no
tenía nada — habría que ver además si el indio, el mejicano, se supone,
es o no «sinuoso» (¡?), o lo era en el xvii — (ARELLANO, 2012, p. 281).

Outro ponto de vista sobre a obra do dramaturgo é do ensaísta Antonio


Castro Leal, quem dedicou uma extensa obra ao escritor, com prefácio de Alfonso
Reyes, publicando alguns artigos e as comédias coletadas em um volume. Ressalta
que “de todo el teatro clásico español ningún autor halagaría más que Alarcón el
gusto francés” (CASTRO LEAL, 1943, p. 199). Assim, Alarcón foi representado em
espanhol e francês, e fez sucesso como dramaturgo na França, o que demonstra
que seus textos tinham elementos multiculturais.

Como foi contemporâneo de Lope de Vega e este recebeu boa parte da


atenção do público, acabou que suas obras não foram tão difundidas na época,
mesmo assim, Alarcón “inaugura en la Europa continental la comedia de
caracteres. El carácter nace de una determinada relación de causalidad entre los
motivos de la acción y las acciones mismas” (CASTRO LEAL, 1943, p. 196). Foi
notória sua inimizade com Lope de Vega e outros escritores madrilenhos, como
Quevedo, porém se firmou como escritor de comédias e de boa qualidade, ou seja,
não tinha uma produção enorme como Lope de Vega, mas escrevia o suficiente
para viver das letras. Algumas de suas comédias, como La cueva de Salamanca, são
encenadas até os dias de hoje.

Alarcón escreveu em prosa e verso, mas foi no teatro que se destacou,


ao escrever comédias ele escreveu ao estilo barroco espanhol, acrescido de
elementos indígenas ou próprios das colônias hispânicas. A comédia Las paredes
oyen apresenta um enredo simples, mas que gerou toda sorte de mal-entendidos
e graças, em que o personagem Don Mendo, o namorado de Lucrécia, deseja se
casar com Dona Ana.

Por sua vez, anos depois, Sor Juana irá escrever um enredo semelhante
para a comédia Amor es más Laberinto, na qual o herói Teseu, por gratidão a
Ariadne, estabelece um compromisso com ela quando realmente está enamorado
da irmã dela, Fedra. Sor Juana também tem uma comédia chamada Los Empeños
de una Casa, com personagens chamados Don Juan e Doña Leonor, assim como
Alarcón escreveu uma comédia chamada Los empeños de un engano, em que
também há personagens com os mesmos nomes. Esta prática intertextual, ou de
plágio, diriam outros, era uma prática comum durante o barroco e se constituía
em repetir os mesmos argumentos ou nomes de personagens e que não se
considerava como plágio.

63
UNIDADE 1 | O PERÍODO COLONIAL HISPANO-AMERICANO

4.2 AS LETRAS DE CARLOS DE SIGUËNZA Y GÓNGORA


Carlos de Sigüenza y Góngora (1645-1700) foi um cientista, escritor, poeta
e político, nasceu na Cidade do México, onde também veio a falecer. Desenvolveu
toda sua carreira acadêmica na capital mexicana e foi reconhecido como um grande
intelectual de seu tempo. Era por parte de mãe parente do poeta culteranista Luis
de Góngora y Argote, espanhol.

FIGURA 20 – CARLOS DE SIGÜENZA Y GÓNGORA

FONTE: <https://goo.gl/oNMbeV>. Acesso em: 10 jun. 2018.

Autor de livros históricos, também escreveu obras em prosa: Infortunios de


Alonso Ramírez (1690), e em versos como os livros de poemas: Primavera indiana
(1668), Triunfo parténico (1683) e Hasta el oriental planeta evangélico (1700).

Ele foi contemporâneo e amigo de Sor Juana Inés de la Cruz. De acordo


com Benítez Grobet (1995, p. 427):

Así, sor Juana se refiere a Sigüenza en el soneto:

Dulce, canoro cisne mexicano


Pues por no profanar tanto decoro
mi entendimiento admira lo que entiendo
y mi fe reverencia lo que ignoro.

Sigüenza tampoco escatima los elogios a sor Juana:

Bastante juzgo que se ha comprobado lo que propuse en el título, por


los motivos de la cortesania, a que me obligó la no vulgaridad de mi
Assumpto y por la reverencia con que debemos aplaudir las excelentes
obras del peregrino ingenio de la Madre Juana Inés de la Cruz, cuya
fama y cuyo nombre se acabará con el mundo.

Escreveu o poema intitulado Primavera Indiana, Poema sacrohistórico, idea de


María Santísima de Guadalupe de México, copiada de flores, de 1668. Também escreveu
o poema em oitavas reais, em seguida colocamos um excerto do poema:

64
TÓPICO 2 | AS MISSIVAS DO NOVO MUNDO

Si merecí Calíope tu acento


de divino furor mi mente inspira,
y en acorde compás da a mi instrumento,
que de marfil canoro, a trompa aspira.
Tu dictamen: atienda a mi concento
cuanto con luces de sus rayos gira
ardiente Febo sin temer fracaso
del chino oriente, al mexicano ocaso.
(SIGÜENZA Y GÓNGORA)

DICAS

Você pode ler este poema em:


SIGÜENZA Y GÓNGORA, Carlos. 1668. Primavera Indiana, Poema sacrohistórico, idea de
María Santísima de Guadalupe de México, copiada de flores. https://goo.gl/8HHYzq. Acesso
em 10 jun. 2018.

4.3 AS LETRAS DO CONVENTO


Uma busca do nacionalismo se reflete nas letras de Sigüenza y Góngora,
pois mesmo como escritor e com um estilo barroco, ele procurou nas origens de
sua herança cultural a inclusão de elementos autóctones.

Ao desenvolver um regionalismo incipiente, “se dio al rescate del pasado


indígena y buscó conscientemente la forma de integrarlo al pasado hispano y a
la cultura ecuménica ensanchando con ello sus horizontes” (BENÍTEZ GROBET,
1995, p. 425), a exemplo do que Sor Juana iria fazer mais adiante na escrita dos
villancicos.

Neste tópico iremos resgatar um pouco da escrita de freiras católicas,


escritoras e que no silêncio dos mosteiros usufruíram de uma liberdade literária
praticamente impossível para mulheres. São poucas as conhecidas de um grande
público, elas escreveram os mais diversos gêneros textuais, sempre para suprir as
demandas dos próprios conventos. Pouco divulgadas e mal reconhecidas, estas
escritoras deixaram um legado escrito que vai além de temas espirituais, mostram
também o cotidiano e a vida social no claustro.

Algumas são mais conhecidas, como Teresa de Ávila e Sor Juana Inés de
la Cruz, porém muitas escreveram e seus escritos raramente saíram do limite do
mosteiro ou sequer foram impressos.

65
UNIDADE 1 | O PERÍODO COLONIAL HISPANO-AMERICANO

Continuando a falar de uma proposta interdisciplinar, a produção textual


das freiras é das mais ricas e variadas, desde os cadernos com receitas à poesia
mística, são refletidos hábitos, costumes, demonstrando que elas tinham influência
em seu meio, principalmente por se dedicarem à educação de mulheres.

O contexto social em que a escrita de freiras se desenvolvia era o convento,


em que, dependendo da ordem a que se pertencia, era um espaço social para
confraternização e lazer de visitantes ilustres e das próprias freiras. A literatura
produzida pelas freiras permite uma leitura de gênero, em que se pode vislumbrar
o pensamento feminino da época, como na Carta Atenagórica de Sor Juana.

No Período Colonial, em algumas ordens religiosas a escrita feminina era


permitida, a exemplo do Mosteiro de São Jerônimo, porém sempre sob a supervisão
de um padre. Se recomendava às freiras que, ao escrever, desenvolvessem temas
divinos, porém em alguns escritos, como os de Sor Juana, se permitem as letras
profanas. Os gêneros textuais desenvolvidos serão a poesia e o drama, como os
autos sacramentais e as peças para festejos específicos.

4.4 SOR JUANA INÉS DE LA CRUZ – UMA ESCRITORA


BARROCA
Apresentamos a seguir a escritora Sor Juana Inés de la Cruz (1651-1695),
reconhecida como a mais importante escritora do barroco hispano-americano e
uma das vozes femininas do Período Colonial.

FIGURA 21 – SOR JUANA INÉS DE LA CRUZ, RETRATO DE MIGUEL CABRERA EM 1750

FONTE: <https://bit.ly/2x2mec3>. Acesso em: 10 jun. 2018.

66
TÓPICO 2 | AS MISSIVAS DO NOVO MUNDO

Freira e mexicana, ela é, de acordo com Paz (1989, p. 21): “no solamente
es la figura más alta de la poesía colonial hispano-americana sino que es también
uno de los espíritus más ricos y profundos de nuestras letras”. Mesmo levando
uma vida conventual, havia um espaço que permitia a escrita, mas sempre vigiada
pela Igreja, na pessoa de seus confessores.

No Período Colonial Barroco Hispano-americano, a escritora de maior


proeminência foi Sor Juana Inés de la Cruz. Nascida em Neplanta, no México, em
1648, morou em sua infância na fazenda do avô materno, onde teve o contato com
os livros e aprendeu a ler aos três anos, conforme a palavra dela.

Durante a adolescência foi levada para a Corte e, mais tarde, entre a


opção de se casar ou permanecer solteira, prefere se tornar freira, primeiro no
Mosteiro das Carmelitas Descalças, onde diante do rigor da ordem, adoece e sai
do convento, mais tarde entrou na ordem de São Jerônimo, onde permaneceu até
sua morte.

Apelidada como a Décima Musa e Fénix das Américas, foi uma criança
que aprendeu a ler cedo, ela mesma relata que aos três anos já era alfabetizada.
Também estudou latim em apenas 20 lições e quando adolescente ingressou na
corte do vice-reinado mexicano, onde foi dama de companhia da vice-rainha, a
Marquesa de Mancera. Na Corte foi muito admirada porque demonstrou grande
inteligência e vivacidade. Sempre teve um bom relacionamento com a Corte,
mesmo depois do ingresso no convento era visitada e mantinha tertúlias em sua
cela. Para a amiga e vice-rainha do México, a Marquesa de Paredes, Sor Juana
escreveu e dedicou vários poemas de sua obra lírica. Escreveu muitos textos,
entre prosa e verso, e alguns continuam perdidos, como El Caracol, que se sabe
que existe apenas por menções.

O estilo literário de Sor Juana Inés de La Cruz foi o barroco, mas hispano-
americano, na época da poetisa o barroco já tinha a inclusão de elementos
autóctones, provenientes da riqueza pré-hispânica. Ela manteve o estilo, as
características próprias do estilo, como as figuras de pensamento, principalmente
as antíteses, paradoxos, próprios de uma estética barroca.

Os versos seguintes mostram como um poema barroco se constrói a partir


dos pressupostos do contraditório, do estranhamento e das figuras de pensamento
(DE LA CRUZ, 2000, p. 114):

Óyeme con los ojos,


Ya que están tan distantes los oídos,
Y de ausentes enojos
En ecos, de mi pluma los gemidos;
Y ya que a ti no llega mi voz ruda,
Óyeme sordo, pues me quejo muda

67
UNIDADE 1 | O PERÍODO COLONIAL HISPANO-AMERICANO

A partir de figuras da retórica literária, de oposição: antítese e paradoxos,


os versos de Sor Juana demonstram o alinhamento com as características do
barroco. Leia mais uma vez os versos do poema anterior e perceba, no último
verso da estrofe, a contradição: óyeme sordo, pues me quejo muda, em que se observa
a criação poética própria do barroco.

A utilização de figuras retóricas é um recurso estilístico amplamente


utilizado na escrita barroca independentemente do gênero literário: “As figuras
são um fenômeno da dispositio, que dá forma à matéria-prima da inventio e da
elocutio” (LAUSBERG, 2004, p. 165). Tanto na poesia como no teatro, as figuras
são colocadas a partir de uma disposição retórica para não só ornamentar o texto,
mas também encobrir e escurecer o que não se diz diretamente para o leitor.

DICAS

Para conhecer a obra e saber mais sobre Sor Juana Inés de la Cruz, consulte o
portal dedicado totalmente à escritora na Biblioteca Virtual Cervantes. Disponível em https://
bit.ly/1qF42NY

Desenvolveu letras para festas populares, como os villancicos, peças


dramáticas, como em Amor es más Laberinto, uma comédia teatral fundamentada
na fábula de Teseu e Ariadne, e o auto sacramental O Divino Narciso, traduzido
para a língua portuguesa por Manuel Bandeira. O poeta foi o primeiro tradutor
da escritora para língua portuguesa na variante brasileira e traduziu o poema
Primero Sueño, em que o tema fundamental é uma indagação sobre a viagem da
alma enquanto o corpo dorme.

A marquesa de Paredes, amiga pessoal de Sor Juana, reuniu os manuscritos


dela, os levou no seu regresso para a Espanha e organizou para que fossem
publicados em um volume, Inundación Castálida, em 1689, dessa forma sua fama
se estendeu, ao ser reconhecida e publicada em vida na Espanha e em Portugal.

Sor Juana viveu durante o Período Colonial Hispano-americano e transitou


pelos mais distintos gêneros literários. Incursionou além do drama e o lírico,
entre o sacro ou profano. Se aventurou nos campos considerados estritamente
masculinos, como o sermão, um exemplo foram as críticas ao Padre Antonio
Vieira ao refutar partes de um sermão pronunciado pelo padre em Lisboa, muitos
anos antes dele se mudar para o Brasil. As opiniões emitidas por Sor Juana,
cujo eixo central foi sobre a arrogância de Vieira, acaba por ser um exemplo do
conhecimento teológico e filosófico de Sor Juana.

68
TÓPICO 2 | AS MISSIVAS DO NOVO MUNDO

En agosto de 1690 sor Juana Inés de la Cruz recibió en el locutorio


del convento de San Jerónimo a un visitante de importancia. Aunque
desconocemos su identidad, sabemos que escuchó una crítica de la
religiosa sobre el Sermón del mandato del célebre jesuita portugués
Antonio Vieira. Éste lo había pronunciado entre 1642 y 1650. El tema
era la mayor fineza de Cristo, es decir, su mayúscula demostración de
amor (VALLÉS, 2014, p. 15).

A opinião de Sor Juana causou uma impressão tão grande em seus


interlocutores que, a pedido do Bispo de Puebla, Manuel Fernández de Santa
Cruz, ela escreveu um texto sobre o tema: a Carta Atenagórica, realizada apenas
para fins de leitura particular por parte do clérigo.

DICAS

Para conhecer o teor da Carta Atenagórica, leia na íntegra em: https://goo.


gl/5qpKC9.

O que ela nunca imaginou é que a carta seria publicada e que o mesmo
bispo ainda escreveria uma resposta à carta de Sor Juana, denominada Carta de
Sor Filotea de la Cruz, em que o bispo utiliza o pseudônimo Sor Filotea e fala com
a freira como se fosse uma mulher. A essa carta do bispo, Sor Juana irá escrever
uma Respuesta de la poetisa a la muy ilustre sor Filotea de la Cruz.

Estas trocas de correspondência geraram uma tensão. Paz (1989, p. 72)


assinala que, “no fim, a disputa de respostas filosóficas e teológicas irá culminar
na recomendação por parte de Sor Filotea de que Sor Juana se dedique mais aos
exercícios espirituais”. Assim, Sor Juana aos poucos abandona a escrita e passa
a se dedicar mais ao serviço no convento, vende seus materiais e instrumentos
científicos e oferece o dinheiro aos pobres, uma especulação é que houve alguma
ameaça por parte da Igreja, já que na época a Inquisição tinha representantes nas
colônias espanholas.

DICAS

Para aprofundar a sua leitura acerca de Sor Juana e entender melhor o conflito,
sugerimos a leitura do texto: Sor Filotea y sor Juana: Cartas del obispo de Puebla a sor Juana
Inés de la Cruz. Disponível em: https://bit.ly/2FVqktg.

69
UNIDADE 1 | O PERÍODO COLONIAL HISPANO-AMERICANO

Atualmente, novos estudos, como os de Vallés (2014), questionam se de


fato Sor Juana foi ameaçada, se por isso vendeu seus pertences e abandonou a
escrita profana.

Em seguida a esses fatos, na cidade deu-se uma epidemia de tifo, e Sor


Juana, ao cuidar de suas colegas doentes, acabou por contrair a doença e morreu
aos 44 anos, em 1695.

4.5 SOR JUANA ESCREVE SOBRE A PRESENÇA AFRICANA


NAS COLÔNIAS ESPANHOLAS
A literatura hispano-americana, durante o Período Colonial, carece de
temas ou personagens africanos. Nas colônias espanholas existia uma população
africana, mas era uma população invisibilizada. De acordo com Colombres
(2006, p. 166), “Los afroamericanos tienen su más lejano antecedente literario en
Hamel the obeah man, novela de autor desconocido escrita en inglés y publicada
en l827”. As fontes literárias para pesquisa são escassas, mesmo que “os contatos
euro-indígenas e as contribuições africanas estabelecem-se durante grande parte
do século XVI. Os elementos que irão evoluir em conjunto durante o período
colonial e o nacional já existem após 1500” (JOZEF, 2005, p. 14), porém a projeção
e a inclusão ainda terão um longo percurso pela frente.

Na literatura, a presença de pessoas negras teve um destaque no Período


Colonial nos escritos de Sor Juana Inés de la Cruz. A pesquisadora Valdés-Cruz
(1978, p. 216) afirma que a “actual poesía afroamericana tiene su raíz en Sor Juana
y en el siempre sorprendente Barroco”, este comentário reside no fato de que
a freira incluiu em sua obra a presença de africanos e indígenas em diversos
gêneros textuais, mas principalmente nos villancicos, os gêneros mais populares
de sua obra em versos.

Para entender a presença de afrodescendentes nas colônias se tem


recorrido a fontes que propriamente não eram valorizadas até pouco tempo atrás.
De acordo com Silva e Silva (2009, p. 188):

A África Negra, por exemplo, atualmente constrói sua história baseada


em fontes arqueológicas e na elaboração de registros de História Oral
das tribos. A história da América Latina, por sua vez, embora também
tenha se voltado para a História Oral, caminha pela valorização de
seu passado colonial e, portanto, preocupa-se mais detidamente com
o tratamento e o questionamento de fontes coloniais, como processos
inquisitoriais, registros religiosos e documentos administrativos.

Durante a época colonial espanhola foi proibida, em parte, a manifestação


de representar a língua, tradições ou costumes por parte de africanos publicamente,
e sancionado por lei: “el virrey Luis de Velasco decretó en 1609 la restricción de
esta práctica en las plazas públicas entre las horas de mediodía y las seis de la
tarde” (LONG, 2008, p. 567).

70
TÓPICO 2 | AS MISSIVAS DO NOVO MUNDO

Sor Juana “estava ciente das restrições do decreto e da cartilha, mas mesmo
assim inseriu os elementos da cultura africana em sua obra, e um exemplo disso
são os villancicos”. Gonzalez Bezerra (2016, p. 16) demonstra que ela tinha uma
visão de mundo superior à estética literária vigente, em seu pensamento todos
eram habitantes do orbe e, portanto, era natural que tivessem voz e ação.

DICAS

Para saber mais sobre o pensamento de Sor Juana e a presença africana no


México Colonial, leia o artigo de:
VALDÉS-CRUZ, Rosa. La visión del negro en Sor Juana. XVII Congreso del Instituto
Internacional de Literatura Iberoamericana: II El barroco en América, Madrid: Centro
Iberoamericano de Cooperación, 1978, p. 207-215.

A obra de Sor Juana permite diversas leituras à luz dos estudos pós-
coloniais e culturais, porém, Paz (1989, p. 78) afirma que “sería un error confundir
la estética barroca – que abría las puertas al exotismo del Nuevo Mundo – con
una preocupación nacionalista”, ou seja, Sor Juana tinha uma consciência sobre a
“universalidad del Imperio: indios, criollos, mulatos y españoles forman un todo
[...] conciliar los antagonismos, abrazar las diferencias en una verdad superior”
(PAZ, 1989, p. 78). A inclusão de excluídos socialmente na obra dela aponta para o
barroquismo de Sor Juana e um estilo literário próprio. Ela mesma deu o exemplo
em sua obra literária como fez na loa que antecede o poema El Divino Narciso.

Os villancicos, pequenas canções cantadas em datas como Natal, foi outro


gênero que Sor Juana praticou com frequência. Paz (1989, p. 78) destaca que
“en sus villancicos surgen las cláusulas tiernas del mexicano lenguaje, al lado
del negro congolés y el bronco hablar del vizcaíno. Sor Juana usa con entera
conciencia y hasta con cierta coquetería todas esas raras especias”. Sor Juana,
mesmo com as restrições impostas, transgrediu e incluiu a marca da oralidade
própria da linguagem de pessoas negras em versos de villancicos.

Os cantos eram para ser cantados durante as festividades sacras na


catedral do México colonial, algo que, de acordo com a letra, era ou não do agrado
de autoridades religiosas, como neste exemplo onde Sor Juana coloca cada pessoa
com a linguagem própria do seu estrato social, sem incorrer em julgamentos
parciais (GARFIELD, 1991, p. 59):

de su grandeza admirado,
por regocijar la fiesta
cantó al son de un calabazo:
Puerto rico ―Estribillo
¡Tumba, la-lá-la; tumba, la-lé-le;

71
UNIDADE 1 | O PERÍODO COLONIAL HISPANO-AMERICANO

que donde ya Pilico, escrava no quede!


¡Tumba, tumba, la-lé-le; tumba, la-lá-la
que donde ya Pilico, no quede escrava!
(Villancico VIII – Ensaladilla)

Observe neste excerto a demonstração de como Sor Juana valorizou a


linguagem de cada grupo social. Ela praticou o respeito muito antes de se falar
sobre questões de sociolinguística ou de preconceito linguístico.

DICAS

A letra do Villancico está disponibilizada em:


GARFIELD, Evelyn Picon. Las literaturas hispánicas: Hispanoamérica. Introducción a su
estudio. Evelyn Picon Garfield, Iván A. Schulman. Detroit. Wayne State University Press. 1991.
p. 59. https://bit.ly/2SBou2j. Acesso em 10 jun. 2018.

DICAS

Leia também este artigo e aprofunde seu conhecimento sobre a escritora com
estas leituras:
MARTÍNEZ-SAN MIGUEL, Yolanda. Saberes americanos: la constitución de una subjetividad
colonial en los villancicos de Sor Juana. Alicante: Biblioteca Virtual do Instituto Cervantes,
2005. https://bit.ly/2pfn6FT. Acesso em: 10 jun. 2018.

Séculos depois, a literatura afro-americana teve sua maior expressão em


línguas inglesa e francesa, porém autores afrodescendentes escreveram em língua
espanhola, como “Nicolás Guillén con la música de sus sones, los puertorriqueños
Luis Palés Matos y José de Diego Padrós, los ecuatorianos Adalberto Ortiz [...] y
Antonio Preciado, el peruano Nicomedes Santa Cruz y otros” (COLOMBRES,
2006, p. 168). Desta maneira se constata a escrita comprometida com suas raízes e
que busca fixar uma visão cultural e social de seu entorno, assim como reflexões
sociais e culturais abordadas literariamente.

Uma literatura em constante movimento como a hispano-americana


criou oportunidades, seja no passado ou no presente, para difundir e contar suas
próprias histórias, sua cultura e suas tradições.

72
TÓPICO 2 | AS MISSIVAS DO NOVO MUNDO

LEITURA COMPLEMENTAR

Fragmento:

LA CULTURA BARROCA EN INDIAS: LA VISIÓN DE MARIANO PICÓN


SALAS

Patricia Escandón Bolaños

[...] Estoy convencida de que el barroco, lo barroco o los barroquismos


siguen siendo ingredientes básicos de los estilos de vida “nacionales” a lo largo
y ancho del subcontinente que llamamos América Latina, como en su momento
lo fueron para España. Y el único argumento plausible que se me ocurre es que
tal fenómeno – el de la pervivencia, desde luego – obedece a nuestro encierro y
a nuestra desconfianza; a nuestro aferramiento a las tradiciones; a nuestro gusto
por las vistosas formas externas que no cambian de contenido y, finalmente, a
nuestro tironeo interno entre el canto de sirenas de lo “moderno” y la seguridad
del apego a la cultura heredada de nuestros ancestros. Y en cuanto a esto último,
creo que nadie me podrá objetar que la contradicción y el desgarramiento son
características distintivas del barroco hispánico.
[...]
Pero en la América española, el barroco adopta sus modalidades propias
y derivadas, según Picón, de las condiciones del medio: un medio primitivo, de
influencia híbrida por el choque de razas y por la acción violenta del trasplante.
Posiblemente hayan sido los habitantes de este Nuevo Mundo quienes hayan
ofrecido “la expresión más vital de la complejidad barroca” en su tiempo. Como
se sabe, desde el principio mismo de la hegemonía española en Indias se fue
gestando una sociedad heterogénea, cuya materia prima fue aportación de tres
continentes: América, Europa y África (en mucho menor medida Asia). De la
convivencia e interacción de blancos, indígenas y negros, necesariamente vino
la fusión de elementos dispares, que produjo un conglomerado étnico y cultural
de lo más variopinto. Esta comunidad, en la que desde luego se conservaron
y aplicaron los principios de la jerarquía y el detalle, esto es, la imposición de
criterios clasificatorios por clase y calidad, fue escenario de un juego de tensiones
(p. 42).
[...]

Leia o texto completo no link indicado na fonte.

FONTE: BOLAÑOS, Patricia Escandón. La cultura barroca en Indias: la visión de Mariano Picón
Salas. Latinoamérica [online]. 2006, n. 42, p.35-49. https://bit.ly/2QRa4y1. Acesso em: 1º dez.
2018.

73
UNIDADE 1 | O PERÍODO COLONIAL HISPANO-AMERICANO

Fragmento:

EL JEROGLÍFICO DEL SENTIMIENTO: LA POESÍA AMOROSA DE SOR


JUANA

Margo Glantz

Ved que es querer que, las causas ¿Y cómo podrá la boca,


con efectos desconformes, cuando el corazón se enoje,
nieves el fuego congele, fingir cariños, faltando
que la nieve llamas brote... quien le ministre razones?
¿Cómo el corazón podrá, ¿Podrá mi noble altivez
cómo sabrá el labio torpe consentir que mis acciones
fingir halago, olvidando; de nieve y de fuego, sirvan
mentir, amando, rigores? de ser fábula del orbe?...
¿Cómo sufrir abatido ¡Oh vil arte, cuyas reglas
entre tan bajas ficciones, tanto a la razón se oponen,
que lo desmienta la boca que para que se ejecuten
podrá un corazón tan noble? es menester que se ignoren!

1. Las bajas ficciones de la retórica

Si tomamos al pie de la letra los versos de sor Juana que he citado


a manera de epígrafe, correspondientes al conocido Romance que empieza
«Supuesto, discurso mío, que gozáis en todo el orbe...», intitulado así por sus
editores españoles: «Que resuelve con ingenuidad sobre el problema entre las
instancias de la obligación y el afecto», y catalogado por Méndez Plancarte con el
número 4, en el primer tomo de las Obras completas (Juana Inés de la Cruz 1951:
Romance 4, 18-19), se advierte una asociación, una correspondencia reiterada
—116→ entre dos órganos del cuerpo, uno interior e invisible, el corazón, centro
de la vida, el afecto y lo verdadero, en consecuencia noble; y otro órgano exterior
y risible, la boca, desde donde fluye la voz, se emiten las palabras, se exhalan
los suspiros y pueden deleitarse los sentidos. Correlación tópica: aparece en la
poesía contemporánea y en los textos religiosos, por ejemplo en una licencia
aprobatoria para la publicación de un sermón, se lee: «desde que de lo íntimo de
mi corazón en el púlpito [...] salió a los labios predicado». Pero en el poema esa
correlación se produce de manera paradójica: la palabra, en apariencia fiel reflejo
del sentimiento, lo traiciona y al hacerlo desvirtúa a la razón. En ese transcurso
impalpable que hace visibles, o mejor, audibles, los movimientos del corazón,
los sentimientos se falsean y se convierten en engaño, un engaño retórico. ¿Es
imposible expresar la pasión? ¿Cómo destruir la barrera que el mismo cuerpo
impone? y, sobre todo, ¿cómo romper la cárcel de la retórica y de la cortesanía
que en última instancia estarían irremisiblemente ligadas? (GLANTZ, 2005, s.p.).
[...]

74
TÓPICO 2 | AS MISSIVAS DO NOVO MUNDO

A autora do artigo, Margo Glantz, é uma das maiores especialistas sobre a


literatura de Sor Juana Inés de la Cruz. Leia o texto completo no link indicado na
fonte.

FONTE: GLANTZ, Margo. El jeroglífico del sentimiento: la poesía amorosa de Sor Juana.
Alicante: Biblioteca Virtual Miguel de Cervantes, 2005. https://bit.ly/2QNlpPe. Acesso em: 10
dez. 2018.

75
RESUMO DO TÓPICO 2

Neste tópico, você aprendeu que:

• Os primeiros relatos sobre América, em grande parte foram realizados por


espanhóis residentes ou a mando da Coroa espanhola.

• Os textos são por vezes informativos e as crônicas visavam esclarecer, desde o


ponto de vista do não índio, aos demais europeus.

• A história é contada da perspectiva do colonizador ou do índio já catequizado.


Com isso, tem-se uma grande chance de perda e essência de registros reais.

• Houve cronistas e autores, entre eles estão alguns indígenas que passaram a
trabalhar para a colônia espanhola.

• A tradução funcionou como um diálogo, mas também como uma estratégia da


colonização.

• A literatura colonial teve alguns gêneros e estilos literários, como o teatro


colonial e o Barroco hispano-americano.

• Sor Juana Inés de la Cruz foi uma importante poetisa reconhecida do Século
do Ouro. Demos ênfase também aos afrodescendentes nas colônias espanholas
retratados na literatura de Sor Juana.

76
AUTOATIVIDADE

1 Leia o fragmento e responda às questões a seguir:

La madurez del Siglo de Oro en América

El siglo XVII es una época de notable esplendor en las letras americanas, en


todos los géneros: épica, lírica, teatro, prosa. Hay una floración de grandes
personalidades creadoras, cuyos proyectos y visiones estéticas tienen un
grado de complejidad, grandeza y originalidad tal vez sorprendente en un
ambiente que sólo había sido introducido a la lengua española y empezado
a organizar su vida cultural un siglo atrás. Los proyectos que los ingenios
americanos encaran ahora producen una sensación general de madurez,
afirmación y certidumbre interna. Bastaría citar dos nombres – el del Inca
Garcilaso en la primera parte del siglo y el de Sor Juana Inés de la Cruz en la
segunda – para confirmar que la creación literaria ha alcanzado en América
las cumbres de la verdadera genialidad; sin olvidar que esos autores están
rodeados por numerosos talentos de considerable trascendencia que dan a las
letras coloniales un perfil muy definido. (Tampoco hay que olvidar lo que está
pasando en otros campos ajenos a la literatura: aparecen escuelas de pintura
criolla y estilos mestizos, compositores de música sacra, altas expresiones de
la arquitectura y la decoración, etc.). La expansión de la actividad intelectual
continúa y supera largamente a la registrada en el siglo anterior hasta
convertirse en una realidad con características de una verdadera institución;
es decir, deja de ser algo casual y discontinuo (OVIEDO, 1995, p. 173-174).

OVIEDO, José Miguel. Historia de la literatura hispanoamericana. De los


orígenes a la Emancipación. Madri: Alianza Editorial, 1995.

a) Qual é a informação mais importante que o fragmento apresenta? Assinale


a alternativa correta:

( ) O século XVII é um período considerado inferior ao Renascimento Europeu.


( ) Sor Juana Inés é a única expressão literária do Século de Ouro.
( ) A produção artística colonial supera de longe a produção peninsular.
( ) O escritor Inca Garcilaso alcançou uma fama merecida que beira à
genialidade.

b) O texto fala de diversos gêneros textuais, qual deles é utilizado para escrever
uma obra teatral?

( ) Épico.
( ) Lírico.
( ) Dramático.

77
c) Quando o autor menciona estilos mestizos, isso significa:

( ) Um tipo de estilo artístico e único desenvolvido na Europa.


( ) Uma arte que mistura diversas influências e as transmite.
( ) Um artista que capta o seu meio e o plasma onde se encontra.
( ) Uma arte autóctone e que se caracteriza por ser barroca.

2 A partir da leitura do soneto de Sor Juana Inés de la Cruz, complete o que


se pede:

Soneto ¿En perseguirme, mundo, qué interesas?


de Sor Juana Inés de la Cruz

¿En perseguirme, mundo, qué interesas?


¿En qué te ofendo, cuando sólo intento
poner bellezas en mi entendimiento
y no mi entendimiento en las bellezas?

Yo no estimo tesoros ni riquezas,


y así, siempre me causa más contento
poner riquezas en mi entendimiento
que no mi entendimiento en las riquezas.

Yo no estimo hermosura que vencida


es despojo civil de las edades
ni riqueza me agrada fementida,

teniendo por mejor en mis verdades


consumir vanidades de la vida
que consumir la vida en vanidades.

FONTE: Soneto. https://bit.ly/2C1VPOl. Acesso em: 10 dez. 2018.

a) Leia os versos e responda: Qual é a figura de linguagem que se encontra?

poner riquezas en mi entendimiento,


que no mi entendimiento en las riquezas.

( ) Metáfora.
( ) Oxímoro.
( ) Quiasmo.

b) O verso Yo no estimo tesoros ni riqueza... se refere a:

( ) Votos de pobreza.
( ) Desprezo por bens materiais.
( ) Desinteresse por bens materiais.
( ) Substituição dos bens materiais.
78
c) No segundo quarteto, a que se refere a poeta quando fala de y no mi
entendimiento en las bellezas?

d) No primeiro verso do primeiro terceto, Sor Juana menciona mais uma vez
sua postura sobre os atributos físicos como um fator passageiro. Se refere
indiretamente à:

( ) Velhice.
( ) Inteligência.
( ) Religiosidade.
( ) Juventude.

79
80
UNIDADE 2

PANORAMA DA LITERATURA
HISPANO-AMERICANA DOS
SÉCULOS XVIII E XIX

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de:

• conhecer a forma de governo instituído nas colônias hispano-americanas


após o período da conquista;

• entender a importância dos movimentos independentistas na formação


de uma literatura hispano-americana;

• compreender os diversos movimentos literários nos séculos XVIII e XIX,


do Barroco ao Modernismo;

• conhecer a literatura que circulava após a independência das colônias es-


panholas;

• perceber a influência literária que os imigrantes no século XIX tiveram


nas Américas.

PLANO DE ESTUDOS
Esta unidade está dividida em três tópicos. No decorrer da unidade você
encontrará autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo apresentado.

TÓPICO 1 – POR UMA IDENTIDADE LITERÁRIA LATINO-


AMERICANA

TÓPICO 2 – A FORMAÇÃO DE UMA LITERATURA HISPANO-


AMERICANA

TÓPICO 3 – A LITERATURA HISPANO-AMERICANA DO SÉCULO XIX

81
82
UNIDADE 2
TÓPICO 1

POR UMA IDENTIDADE LITERÁRIA LATINO-AMERICANA

1 INTRODUÇÃO
Após a consolidação da conquista espanhola no continente americano
e estabelecida a Corte espanhola, representada através dos vice-reinados,
distribuídos na América, vive-se o período da época colonial, quando a produção
de riquezas minerais, vegetais e animais, assim como um comércio marítimo
desenvolvido, era comercializada e enviada para a Espanha.

A passagem da época colonial da América espanhola para o período das


independências será um movimento idealizado por intelectuais e burgueses das
colônias espanholas, inspirados nas ideias iluministas, ou “La ilustración”, como
o movimento ficou conhecido na Espanha. Dos círculos intelectuais encontrados
nas colônias surgiu o sentimento de nacionalismo, resultando nas guerras de
independência.

Grupos de escritores e filósofos discutiram a liberdade de soberania,


o que se caracterizou mais como um movimento político e intelectual do que
propriamente um levante popular contra governos ou contra a Coroa espanhola.

A contextualização do período histórico se torna importante para entender


a formação de uma literatura hispano-americana com inúmeras influências da
literatura europeia.

2 A CORTE ESPANHOLA NOS TERRITÓRIOS HISPANO-


AMERICANOS ANTES DAS INDEPENDÊNCIAS
Ao terminar o período da conquista, em torno de 1570, e consolidada
a implantação da Coroa espanhola, o sistema de governo praticado e que
caracterizou as colônias foi o de vice-reinado, e seus dirigentes chamados de vice-
reis. Eles controlavam com rigor os territórios hispano-americanos, se reportavam
ao Conselho de Índias e ao próprio rei na Espanha.

83
UNIDADE 2 | PANORAMA DA LITERATURA HISPANO-AMERICANA DOS SÉCULOS XVIII E XIX

NOTA

Vice-reis

São representantes do rei espanhol, investidos de autoridade real, mas ainda submissos ao
próprio rei, sem uma autonomia total, dependentes principalmente das idas e vindas de
éditos reais, leis, autorizações e as correspondências além-mar para qualquer resolução que
atingisse a soberania espanhola nas colônias hispano-americanas.

Definição: vi·ce·-rei (vice- + rei) substantivo masculino. 1. Governador de um Estado


dependente de um reino ou de outro Estado. 2. Governador de um reino ou de uma grande
província que dependem de outro Estado. Feminino: vice-rainha. Plural: vice-reis. "vice-rei".

FONTE: Dicionário Priberam da Língua Portuguesa [em linha], 2008-2013. https://www.


priberam.pt/dlpo/vice-rei. Acesso em: 24 jul. 2018.

O sistema de governo implantado, mesmo à distância, funcionava o


melhor possível dentro das condições da época. Espanha governava além-mar as
terras recém-descobertas. Cada vice-rei em seu vice-reinado, além de desfrutar
de um grande poder local, tinha obrigações governamentais, como a de zelar pela
posse da terra, pelo povo, pelo poder legislativo e militar das colônias.

De acordo com Rodríguez (2016, p. 20), administrativamente, “a América


espanhola era composta inicialmente por dois vice-reinados, Nueva España e
Perú, e só mais tarde foram acrescentados e divididos por Madri mais dois vice-
reinados: Nueva Granada (1739) e Río de la Plata (1776)”.

Além dos vice-reinados estabelecidos, havia Capitanias ou Gobernaciones,


em que governadores tinham um poder inferior ao vice-rei e às comarcas,
conhecidas como Audiências, que funcionavam como tribunais de justiça. A partir
dessa divisão administrativa e política, quando surgiram as independências,
praticamente cada país já tinha seus próprios limites geográficos preestabelecidos.

NOTA

Audiencias, nome em espanhol dado para as comarcas que não tinham


o status de vice-reinados durante o período de colonização espanhola, mas tinham seus
próprios responsáveis.

84
TÓPICO 1 | POR UMA IDENTIDADE LITERÁRIA LATINO-AMERICANA

A Igreja Católica também se instalou nas novas terras, porém com uma
autonomia administrativa igual ou até superior ao Poder Legislativo. Assim,
diversas ordens religiosas migram, constroem mosteiros e implantam suas
organizações em solo hispano-americano e, com isso, a sua forma de trabalho,
dando grande ênfase à educação.

A língua oficial das colônias se tornou o castelhano, aproximando dessa


forma a cultura à religião, em detrimento de qualquer outra língua autóctone ou
mesmo das faladas em Espanha.

NOTA

Veja a definição oferecida pelo dicionário on-line Aulete para o significado da


palavra autóctone e que interessa para os estudos da literatura hispano-americana:

1. Que é natural da região onde habita ou se encontra (povo autóctone, flora autóctone);
ABORÍGINE; INDÍGENA [P. opos. a alóctone.] [...]
4. Ling. Diz-se da língua que primeiramente se forma e é falada numa região, num país etc.
5. Habitante nativo de uma região; ABORÍGINE; INDÍGENA. [F.: Do gr. authócton, on, pelo
lat. autochthon, onis.]

FONTE: <http://www.aulete.com.br/aut%C3%B3ctone>. Acesso em: 27 mar. 2019.

O uso de uma única língua extinguiu muitas outras línguas originárias,


culturas e tradições de povos existentes no continente. As que se mantiveram,
como o náuatle, quéchua e guarani, foram marginalizadas e proibidas. O mesmo
aconteceu quando Castela, a dos reis católicos, consolidou-se sobre os outros
reinos, a língua castelhana se tornou a língua oficial da Espanha, ignorando o
galego, o catalão, o euskera, hoje consideradas co-oficiais. O Paraguai atualmente
reconhece a língua guarani como oficial no país.

Conforme explicitamos na Unidade 1, os povos originários foram proibidos


de falar suas próprias línguas, expressar culturalmente seus conhecimentos ou
participar de suas crenças ancestrais.

A língua foi utilizada como um fator unificador na expansão da


colonização espanhola. Assim, tornou-se comum aos países hispano-americanos
e uma ferramenta útil de colonização: “Se comprende entonces por qué toda clase
dominante cuida particularmente la praxis del lenguaje y controla sus formas y
los medios de su difusión: la información, la prensa, la literatura” (KRISTEVA,
1988, p. 159). A língua, como adverte Kristeva, carrega no discurso uma ideologia,
assim também a prática literária incipiente será exercida por uma elite letrada
dentro de uma prática literária ocidental e utilizando apenas a língua espanhola.

85
UNIDADE 2 | PANORAMA DA LITERATURA HISPANO-AMERICANA DOS SÉCULOS XVIII E XIX

DICAS

Atribuem ao chileno Francisco Bilbao ter utilizado o termo América Latina


pela primeira vez em Paris para uma conferência em 1856, e o colombiano José María Torres
Caicedo utilizou o termo em seu poema “Las dos Américas”, também em 1856. Leia mais
sobre as controvérsias no artigo de Monica Quijada: Sobre El Origen Y Difusión Del Nombre
"América Latina" (O Una Variación Heterodoxa En Torno Al Tema De La Construcción Social
De La Verdad. Revista de Índias, 1998, v. LVIII, n. 214, p. 595-615). Disponível em: https://bit.
ly/2xNehYJ.

Veja no quadro a seguir um mapa das línguas originárias em torno de 1492:

FIGURA 1 – MAPA DAS LÍNGUAS ORIGINÁRIAS ANTES DA CHEGADA DOS ESPANHÓIS

FONTE: <https://bit.ly/2NSycuP>. Acesso em: 10 set. 2018.

86
TÓPICO 1 | POR UMA IDENTIDADE LITERÁRIA LATINO-AMERICANA

Todos os habitantes das Américas foram considerados súditos da Coroa


espanhola e houve uma forçada conversão à religião católica, constituindo
também dessa forma uma ampliação de fiéis e o crescimento da Igreja. Espanha
importou, com a conquista, uma sociedade ocidental, religiosa e monolíngue.

A Contrarreforma espanhola estava impregnada nas políticas coloniais e,


sem um diálogo intercultural, estas acabaram por descaracterizar a maior parte
da cultura e tradições dos povos originários. Espanha ignorou por muito tempo
a cultura local, porém, com o passar dos anos, houve uma integração cultural da
arquitetura às artes.

DICAS

Saiba mais sobre a discussão atual sobre palavras como conquista,


descobrimento, colonialismo europeu etc. utilizados pelos livros didáticos ou de história
sobre a chegada dos espanhóis ao continente americano. Indicamos a leitura do texto: A
América Latina e a modernidade contemporânea: uma interpretação sociológica.

“A América – incluindo suas regiões mais ao sul – tem um claro começo, diferentemente
da maioria das áreas na história: 1492, o ano de sua “descoberta” – ou “conquista”, de outro
ângulo, e obviamente ‘invenção’, como qualquer fenômeno social – pela Coroa espanhola, a
ser formalmente completada pelos portugueses em 1500” (DOMINGUES, 2009, p. 198).

• DOMINGUES, José Maurício. A América Latina e a modernidade contemporânea: uma


interpretação sociológica. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2009.

O governo espanhol, prevendo uma possível revolta, desconfiado de


conspirações independentistas nas colônias, tentou por vias diplomáticas
evitar o máximo possível um conflito iminente: “Los ministros de Fernando
VII propusieron una política de reconciliación como el método más apropiado
de restablecer la paz en el Nuevo Mundo”, porém não obtiveram os resultados
esperados (RODRÍGUEZ, 2016, p. 20).

A Europa passa por significativas mudanças a partir do Iluminismo,


um movimento que se desenvolveu principalmente na França e na Inglaterra, e
teria seu ápice na Revolução Francesa. O movimento na Espanha e nas colônias
também seria conhecido como “Ilustración”. A Espanha saía do período Barroco,
do antibarroquismo, e se abria às ideias iluministas, apontando para uma maior
liberdade de pensamento. Também o despotismo dos reis, de Felipe V a Carlos
III, e a crescente modernização econômica, criarão crises em que as ideias de
liberdade e igualdade do Iluminismo se desenvolverão.

87
UNIDADE 2 | PANORAMA DA LITERATURA HISPANO-AMERICANA DOS SÉCULOS XVIII E XIX

Existiu nos escritores hispano-americanos a busca de uma literatura


que refletisse o pensamento de inconformismo sobre a dependência colonial.
Concretizar a independência teve um custo alto de vidas, sacrifícios pessoais, e
esses temas foram escritos em prosa e verso. Os próprios intelectuais nascidos aqui,
mas em sua maioria educados na Europa, começaram a escrever sobre o tema:

Se trataba, pues, de reconocer la necesidad de forjar una literatura que


fuese la expresión de las ideas, la idiosincrasia y el espíritu creativo
de las nuevas repúblicas, todavía ensangrentadas por las guerras
de independencia y las subsiguientes luchas internas. El argumento
es bien conocido y se fraguó entre fuerzas discordantes, pero que
apuntaban a la necesidad de crear una literatura nacional original
(OPERÉ, 1996, s.p.).

O conceito de originalidade é complexo e discutido, mas a literatura


buscou, principalmente no século XVIII, temas entre os mais diversos gêneros
e estilos literários que refletissem o valor das Américas. Desenvolveu temas
nacionais, próprios da cultura e tradições hispano-americanas, mas ainda com
a tendência de seguir estilos literários e formas europeias. Mas foi um começo.

DICAS

Uma dica de audiovisual é a famosa série de televisão El Zorro, produzida nos


EUA pela Walt Disney Company (1957-1959). Trata-se de um espadachim rico recém-chegado
da Espanha e que vai viver na antiga Califórnia, Los Angeles. De certa forma, como pano de
fundo há um retrato de como a Coroa espanhola tinha seus reinados na América Latina.

3 O MOVIMENTO DAS INDEPENDÊNCIAS NAS


COLÔNIAS HISPANO-AMERICANAS
O século XVIII marcou a ruptura entre o período colonial e um novo tempo
que aponta para novas ideias, o século das luzes, e isso se refletiria também nos
territórios hispano-americanos.

Grosso modo, as ideias do Iluminismo, movimento intelectual assim


chamado porque priorizava a busca da lógica, da razão humana como essencial e
necessária para o desenvolvimento humano e social, admitia que se tinha mais de
uma luz que irradiava o conhecimento e a sabedoria, uma referência neste caso à
Igreja Católica. Por isso, na Espanha, o movimento se difundiu mais lentamente.
Durante séculos, as impressões de obras literárias tinham sido controladas e
somente após uma autorização fiscal era possível imprimir e publicar livros, assim
como os jornais, textos impressos rápidos, e principalmente ensaios, gêneros
textuais que difundiram amplamente as ideias do século das luzes.

88
TÓPICO 1 | POR UMA IDENTIDADE LITERÁRIA LATINO-AMERICANA

Na virada do século XVIII, uma elite hispano-americana, principalmente os


habitantes letrados dos territórios hispano-americanos, de forma geral estava ciente
das novidades literárias na Europa e das ideias surgidas nos meios intelectuais.

Os grupos literários e filosóficos hispano-americanos discutiam as ideias


iluministas e isso propiciou o ambiente para a busca da independência. De acordo
com Bandeira (1960, p. 74):

A gigantesca empresa da emancipação das colônias espanholas da


América foi obra de “criollos” favorecida pela relativa impotência a
que se achava reduzida a Espanha por força das guerras internas e
externas em que se debatia. Muitos dos guias do movimento eram
escritores e oradores, homens de educação filosófica e literária, que se
serviam do jornal e do panfleto como instrumentos de propaganda de
seus ideais políticos.

O descontentamento se tornou cada vez maior e o sentimento de não


receber nenhuma retribuição de benefícios diante dos impostos e tributos pagos
criou um sentimento de urgência de libertação da Coroa espanhola.

Las independencias estuvieron precedidas, tanto en la América


española como en el Brasil, por la crisis provocada por las guerras
europeas napoleónicas y la invasión de la Península Ibérica a partir de
1807. Y la ruptura estuvo también marcada en todos estos territorios
por debates filosóficos que en buena parte provenían de ese ideario
ilustrado, adaptado a las circunstancias locales (GODOY; GARCÍA,
2017, p. 16).

A distribuição dos bens, riquezas e principalmente na evasão de bens


a favor de um reino distante como era a Espanha, favoreceu o sentimento
emergente de nacionalismo americano, o que também motivou as guerras das
independências dos países da América espanhola.

O esvaziamento sistemático do continente de sua cultura, tradições, línguas e


a exploração das riquezas, a escravidão, os grandes latifúndios, se tornaram motivos
que prepararam o terreno para os pensamentos incipientes de independência.

Durante o século XVIII, entre a Espanha e as Américas existia uma situação


paradoxal, as terras hispano-americanas geravam a riqueza mineral, e Espanha,
que não tinha esse recurso, o recebia sem dar nada em troca, pois não devolvia
nenhum benefício para as colônias. Assim:

España era una metrópoli antigua, pero sin desarrollar. A fines del siglo
XVIII, después de tres siglos de dominio imperial, Hispanoamérica
aún encontraba en su madre patria un reflejo de sí misma, ya que
si las colonias exportaban materias primas, lo mismo hacía España;
si las colonias dependían de una marina mercante extranjera, lo
mismo sucedía en España; si las colonias eran dominadas por una
élite señorial, sin tendencia al ahorro y a la inversión, lo mismo
ocurría en España. Pero, por otro lado, las dos economías diferían en
una actividad, ya que las colonias producían metales preciosos y la
metrópoli no (BETHELL, 2001, p. 1).

89
UNIDADE 2 | PANORAMA DA LITERATURA HISPANO-AMERICANA DOS SÉCULOS XVIII E XIX

O habitante autóctone, ou os crioulos (criollos) nascidos em terras


americanas, também os estrangeiros que moravam nelas, começaram a desenvolver
um crescente sentimento nacionalista. O incentivo provinha principalmente de
textos que circulavam entre Europa e o continente americano.

Os habitantes das Américas perceberam na independência de sua região


geográfica uma oportunidade para seus interesses particulares, a fim de livrar-se
dos impostos, tributos e imposições da Coroa espanhola, entre outras questões
sociais e econômicas.

NOTA

Criollo/lla ou Crioulo/la: o Dicionário da Real Academia Espanhola – DRAE –


aponta a procedência do português:

criollo, lla Del port. crioulo, y este der. de criar 'criar'.


1. adj. Dicho de una persona: Hija o descendiente de europeos, nacida en los antiguos
territorios españoles de América o en algunas colonias europeas de dicho continente. U. t.
c. s.
2. adj. Dicho de una persona: De raza negra, nacida en los antiguos territorios españoles de
América, por oposición a la que había sido llevada allí de África como esclava. U. t. c. s.
3. adj. Dicho de una persona: Nacida en un país hispanoamericano. U. para resaltar que esa
persona posee las cualidades estimadas como características de su origen. U. t. c. s.
4. adj. Autóctono o propio de un país hispanoamericano, o del conjunto de ellos.
5. adj. Perteneciente o relativo al criollo (ll lengua). Léxico criollo.

FONTE: <http://dle.rae.es/?id=BHW6idE>. Acesso em: 15 set. 2018.

As independências, no século XIX, das principais colônias ou capitanias


sob domínio espanhol aconteceram nos diversos territórios basicamente no mesmo
período. Por exemplo, a do México, da Argentina e a da Colômbia em 1810; do
Paraguai em 1811, Peru em 1822; Chile em 1817; e o movimento independentista
influencia toda uma geração de escritores.

DICAS

Para saber sobre os eventos mais relevantes por data no processo de


independência dos países hispano-americanos, acesse a linha de tempo em que são
mostrados os três períodos principais: de 1740 a 1983. Acesse o Instituto Cervantes: https://
bit.ly/2NR3ohH.

90
TÓPICO 1 | POR UMA IDENTIDADE LITERÁRIA LATINO-AMERICANA

Veja na imagem a data das independências dos países das Américas, em


especial os colonizados por Espanha, e perceba que as datas de independência,
salvo poucos países, praticamente são iguais ou muito próximas.

FIGURA 2 – MAPA DOS PAÍSES DAS AMÉRICAS E A DATA DE INDEPENDÊNCIA

FONTE: <https://bit.ly/2oy9CnX>. Acesso em: 27 ago. 2018.

As sucessivas independências, desde o ponto de vista das letras, foram um


fator determinante na busca e na formação de uma identidade literária de países
hispano-americanos, porque refletiram em textos dos mais diversos gêneros literários.

Começa uma busca de elementos locais para temas literários, o que leva a
olhar para o indígena, a terra, as tradições, entre outros, como forma de valorizar
o local para uma produção literária. No século XVIII, a identidade criolla irá se
afirmar, assim como os ideais de independência, e no século XIX se consolida a
afirmação de uma soberania nacional, o que permitiu à literatura a busca de sua
própria autonomia em terras hispano-americanas.

Para saber mais sobre a organização legislativa nas colônias hispano-


americanas, leia sobre os vice-reinados neste fragmento a seguir.

91
UNIDADE 2 | PANORAMA DA LITERATURA HISPANO-AMERICANA DOS SÉCULOS XVIII E XIX

LEITURA COMPLEMENTAR

“El virrey es el representante directo y superior del monarca español


en América y su hombre de confianza. El cargo de virrey en Indias aparece en
las Capitulaciones de Santa Fe, firmadas por Colón y los Reyes Católicos en
1492, pero no se consolida hasta que se tiene conocimiento de la extensión de
los nuevos territorios y de la importancia de las culturas en ellos asentadas.
Este cargo reúne en su persona todos los poderes de gobierno (capitán general,
gobernador, presidente de la Audiencia, inspector de todo el sistema económico
de su territorio, y en materia religiosa, ejerce de vicepatrono). Su duración
dependerá de la potestad regia.

Los dos más antiguos en América son el Virreinato de Nueva España


(1535), con capital en México y jurisdicción en todo el territorio actual de América
Central y del Norte; y el Virreinato de Perú (1542), con capital en Lima, y extensión
por toda Sudamérica, excepto Venezuela y Panamá. También coexisten territorios
casi independientes como los de las islas Filipinas, Marianas y Carolinas en el
Océano Pacífico, y Cuba, Puerto Rico, República Dominicana y Venezuela en el
Caribe”.

Leia mais sobre os vice-reinados e a organização hispano-americana


no site Bicentenário das Independências americanas, publicado pelo Ministério de
Cultura e Esporte do Governo de Espanha. Disponível em: http://pares.mcu.es/
Bicentenarios/portal/virreinatos.html.

FONTE: <http://pares.mcu.es/Bicentenarios/portal/virreinatos.html>. Acesso em: 1º dez. 2018.

Leia sobre como a literatura do Iluminismo circulava nas colônias


hispano-americanas.

“Sin embargo, la América española pudo conocer la nueva filosofía


directamente de sus fuentes originales en Inglaterra, Francia y Alemania, ya que
la literatura de la Ilustración circulaba con relativa libertad. En México existía
un público para las obras de Newton, Locke y Adam Smith, para Descartes,
Montesquieu, Voltaire, Diderot, Rousseau, Condillac y D'Alembert. Los lectores
se encontraban entre los oficiales de alta graduación, entre los comerciantes y los
individuos de los sectores profesionales, entre el personal de las universidades
y los eclesiásticos. En Perú había un grupo de intelectuales, algunos de ellos
salidos del real colegio de San Carlos, miembros de la Sociedad Económica y
colaboradores del Mercurio Peruano, que admiraban los escritos de Locke,
Descartes y Voltaire, y estaban familiarizados con las ideas del contrato social,
la primacía de la razón y el culto a la libertad. ¿Pero qué significaba todo ello?
La Ilustración de ningún modo era universal en América, ni tampoco sobrevivió
intacta una vez que se implantó allí, puesto que su expansión, mermada por el
conservadurismo y limitada por la tradición, fue escasa. Cronológicamente su
impacto fue tardío. Las revoluciones de 1780-1781 tenían muy poco, si es que

92
TÓPICO 1 | POR UMA IDENTIDADE LITERÁRIA LATINO-AMERICANA

algo tenían, del pensamiento de la Ilustración; fue entre entonces y 1810 cuando
empezó a enraizar. Su difusión se incrementó en la década de 1790: en México la
Inquisición empezó a reaccionar, alarmada menos por la heterodoxia religiosa que
por el contenido político de la nueva filosofía a la que se miraba como sediciosa,
«contraria a la quietud de los estados y reynos», llena de «principios generales
sobre la igualdad y libertad de todos los hombres», y en algunos casos un medio
de obtener noticias de «la espantosa revolución de Francia que tantos daños
ha causado». En general, sin embargo, la Ilustración inspiró en sus discípulos
criollos, más que una filosofía de la liberación, una actitud independiente ante
las ideas e instituciones recibidas, significó una preferencia por la razón frente
a la autoridad, por el experimento frente a la tradición, por la ciencia frente a
la especulación. Sin duda estas fueron influencias constantes en la América
española, pero por el momento fueron agentes de reforma y no de destrucción”
(BETHELL, 2001, p. 34-35).

FONTE: BETHELL, Leslie (Ed.). Historia de América Latina. 5. La Independencia. Traducción


Castellana de Ángels Sola. Barcelona: Editorial Crítica, 2001. p. 1.

93
RESUMO DO TÓPICO 1

Neste tópico, você aprendeu que:

• O sistema de governo praticado na América espanhola reproduzia o sistema


da coroa espanhola, assim o Vice-Rei era o representante do próprio rei em
terras estrangeiras.

• Uma forma de concretizar a conquista de povos e terras foi a instituição da


língua castelhana como um mecanismo de unificação das colônias espanholas.

• A colonização em massa excluiu a cultura dos povos originários e as línguas


existentes até a chegada do europeu.

• A situação política e social dos territórios hispano-americanos tornou-se


insustentável em alguns séculos e o movimento independentista cresceu,
principalmente nos meios intelectuais da colônia.

• Os habitantes ilustres das terras hispano-americanas foram influenciados pelo


Iluminismo e seus ideais.

• O Iluminismo foi um fator preponderante na impulsão e influência do


pensamento independentista nas colônias.

• A vontade de separação entre reino e colônia se propagou primeiro entre a


elite das colônias, e logo as classes menos favorecidas, como os escravos e os
indígenas, também participaram do movimento independentista.

• Os escritores e intelectuais das colônias hispano-americanas utilizaram o gênero


epistolar, as cartas, porque era um meio de comunicação rápido e discreto.

• A carta se tornou um gênero textual importante para a historiografia e como


registro literário desenvolvido nas Américas.

• As crônicas, diários, relatos de viagem, são os textos dos primeiros séculos da


ocupação espanhola no continente americano.

94
AUTOATIVIDADE

1 Leia o seguinte fragmento da Carta dirigida a los Españoles Americanos, de


Juan Pablo Vizcardo y Guzmán (2012):

[...] Sería una blasfemia el imaginar, que el supremo Bienhechor de los hombres
haya permitido el descubrimiento del Nuevo Mundo, para que un corto número
de pícaros imbéciles fuesen siempre dueños de desolarle, y de tener el placer
atroz de despojar a millones de hombres, que no les han dado el menor motivo
de queja, de los derechos esenciales recibidos de su mano divina; el imaginar que
su sabiduría eterna quisiera privar, al resto del género humano, de las inmensas
ventajas que en el orden natural debía procurarles un evento tan grande, y
condenarle a desear que el Nuevo Mundo hubiese quedado desconocido para
siempre. Esta blasfemia está sin embargo puesta en práctica por el derecho que
la España se arroga sobre la América; y la malicia humana ha pervertido el orden
natural de las misericordias del Señor, sin hablar de la justicia debida a nuestros
intereses particulares para la defensa de la patria. Nosotros estamos obligados
a llenar, con todas nuestras fuerzas, las esperanzas de que hasta aquí el género
humano ha estado privado. Descubramos otra vez de nuevo la América para
todos nuestros hermanos, los habitantes de este globo, de donde la ingratitud, la
injusticia y la avaricia más insensata nos han desterrado. La recompensa no será
menor para nosotros que para ellos.
[...] ¡Plugiese a Dios que este día, el más dichoso que habrá amanecido jamás,
no digo para la América, sino para el mundo entero; plugiese a Dios que llegue
sin dilación! ¡Cuando a los horrores de la opresión, y de la crueldad, suceda el
reino de la razón, de la justicia, de la humanidad; cuando el temor, las angustias,
y los gemidos de diez y ocho millones de hombres hagan lugar a la confianza
mutua, a la más franca satisfacción, y al goce más puro de los beneficios del
Creador, cuyo nombre no se emplee más en disfrazar el robo, el fraude, y la
ferocidad; cuando sean echados por tierra los odiosos obstáculos que el egoísmo
más insensato opone al bienestar de todo el género humano, sacrificando sus
verdaderos intereses al placer bárbaro de impedir el bien ajeno, ¡qué agradable
y sensible espectáculo presentarán las costas de la América, cubiertas de
hombres de todas las naciones, cambiando las producciones de sus países
por las nuestras! ¡Cuántos, huyendo de la opresión, o de la miseria, vendrán
a enriquecernos con su industria, con sus conocimientos y a reparar nuestra
población debilitada! De esta manera la América reunirá las extremidades de la
tierra, y sus habitantes serán atados por el interés común de una sola GRANDE
FAMILIA DE HERMANOS (VISCARDO Y GUZMÁN, 2012, p. 340-341).

FONTE: VISCARDO Y GUZMÁN, Juan Pablo. Carta dirigida a los Españoles Americanos.
Alicante: Biblioteca Virtual Miguel de Cervantes, 2012. http://www.cervantesvirtual.com/nd/
ark:/59851/bmcp55w5. Acesso em: 24 set. 2018.

Após a leitura do fragmento, realize primeiro uma pesquisa sobre o autor e o


contexto de sua obra, se possível leia a carta completa, está disponibilizada na
íntegra no link das referências, depois responda às questões propostas:
95
a) A carta foi um gênero textual utilizado pela elite intelectual para discutir e
afirmar questões relacionadas à busca da independência da coroa espanhola.
Um dos motivos de ser utilizado foi porque as cartas eram um meio de
comunicação rápido, discreto e sem volume, era fácil de ser escondida e
levada de forma clandestina para a Europa ou vice-versa. Neste contexto,
assinale a alternativa CORRETA:

( ) As cartas, um gênero epistolar muito utilizado na América, serviram como


canal para fomentar as guerras independentistas.
( ) O rei da Espanha estava disposto a fazer acordos com os líderes
independentistas oferecendo casamentos com a casa real.
( ) Os indígenas da costa leste americana estavam organizados em pelotões
para tomar o governo e restaurar o governo dos imperadores astecas,
maias e incas.
( ) Vizcardo nega que futuras levas de imigração iriam colaborar na expansão
das Américas.

b) O jesuíta Juan Pablo Vizcardo escreveu a carta no exílio com o objetivo de


incentivar a valorização dos territórios hispano-americanos, neste caso o
que o escritor evidencia na carta? Diante do autor e contexto, disserte sobre
o conteúdo da carta.

c) Para saber mais sobre a importância das missivas independentistas,


preparamos um roteiro para que você realize uma pesquisa sobre as
circunstâncias em que a Carta dirigida a los Españoles Americanos foi escrita e
responda a estas questões:

• Quem é o escritor e para quem ele escreve?


• Desde que lugar ele escreve?
• Como são vistos os espanhóis nesta carta?
• Qual o teor da convocação da carta para os hispano-americanos?
• Como termina o texto?

2 A partir das leituras sobre os acontecimentos desde a chegada dos


espanhóis, releia e complete o esquema com os acontecimentos e autores,
obras e gêneros mais expressivos das datas mencionadas:

Datas Acontecimentos Autores e obras


Século XVIII

Século XIX
Final do
Século XIX
FONTE: As autoras

96
UNIDADE 2 TÓPICO 2

A FORMAÇÃO DE UMA LITERATURA HISPANO-


AMERICANA

1 INTRODUÇÃO
Neste tópico estudaremos a busca de independência da Espanha por parte
dos territórios hispano-americanos e também os movimentos literários que foram
um fator de influência na propaganda independentista.

O surgimento de um habitante criollo e os movimentos filosóficos europeus,


assim como as terras férteis e abundantes, trouxeram mudanças significativas que
prepararam o espaço para as guerras independentistas, assim como a mudança
do mapa geográfico e humano das colônias hispano-americanas.

Assim, no campo da literatura temos pouca representação literária, tendo


em vista o século anterior. Vejamos um pouco dessa passagem literária a partir
do século XVIII.

2 A LITERATURA DO SÉCULO XVIII


Reforçamos que muito antes do período histórico que corresponde à
chegada dos espanhóis e portugueses ao continente americano, já existia uma
literatura, a dos povos originários, e nem todas em um suporte como o papel.
Foi uma literatura menosprezada por muitos séculos, e a predominância de uma
literatura ocidental de origem cristã e europeia impediu que muitas das influências
autóctones fossem admitidas na formação das letras hispano-americanas.

O trabalho dos jesuítas realizado no continente americano foi importante


em diversas áreas, como a educação, a cultura, e na escrita de textos descritivos
dos mais diversos temas dos territórios ocupados pela Coroa espanhola. A
expulsão deles, em 1767, dos territórios hispano-americanos, acabou por dar uma
visibilidade maior, e no exílio escreveram sobre temas da América.

Um expoente destacado foi Juan Pablo Vizcardo y Guzmán (1748-1798),


sacerdote jesuíta e de nacionalidade peruana. Após a expulsão, descontente,
publicou em 1799: Lettre aux Espagnots-Américains ou Carta aos espanhóis americanos
(tradução das autoras), em que incita os habitantes a pensar na América como
sua pátria e a insurgir-se contra a Coroa espanhola: “El Nuevo Mundo – escribió
Vizcardo – es nuestra patria, su historia es la nuestra, y es en ella que debemos
examinar nuestra situación presente, para determinarnos, por ella, a tomar el

97
UNIDADE 2 | PANORAMA DA LITERATURA HISPANO-AMERICANA DOS SÉCULOS XVIII E XIX

partido necesario a la conservación de nuestros derechos propios, y de nuestros


sucesores” (BETHELL, 2001, p. 33). Os escritos dele foram uma contribuição
inestimável para o crescimento das ideias independentistas.

Vale destacar que a maioria dos jesuítas exilados escreveu para mostrar o
valor do continente americano e não com o objetivo de incentivar uma revolução,
porém, no continente, esse período após a expulsão dos jesuítas, o período
conhecido como pré-independência, “vio el nacimiento de una literatura de
identidad en la que los americanos glorificaban sus países, exaltaban sus recursos
y valoraban a sus gentes” (BETHELL, 2001, p. 34).

Enquanto a Europa irradiava novidades nas mais diversas esferas


sociais, políticas, artísticas, as colônias espanholas e sua elite também recebiam e
discutiam as notícias do velho mundo.

As ideias europeias, principalmente da França, Inglaterra e Alemanha,


foram um fator de influência na formação do pensamento independentista hispano-
americano que buscava sua autonomia legislativa e financeira. Esse caminho só
foi possível a partir da literatura que divulgou as ideias de Montesquieu, Voltaire
e Rousseau, inspiradoras no processo de independência dos países da América
espanhola.

Um exemplo foi a Revolução Francesa, ocorrida quase no final do século


em 1789, quando foram enfrentadas as novas ideias revolucionárias diante de
um regime absolutista, antigo, que já não se sustentava mais diante de uma
burguesia empoderada e consciente de sua liberdade e poder. Assim, também
a independência das colônias inglesas na América do Norte impulsionou o
processo de independência hispano-americano.

A Europa entrou na contemporaneidade e a literatura teve um papel


predominante na condução de ideologias, também começou a se desenvolver em
outros gêneros literários, como os discursos, ensaios, relatos de viagens.

Especialmente durante la segunda mitad del siglo XVIII, todos ellos


– al igual que otros imperios atlánticos – experimentaron el impacto
de las reformas metropolitanas, destinadas en gran medida a extraer
mayores recursos de los territorios ultramarinos para financiar
las guerras entre los diferentes poderes europeos o rentabilizar el
comercio. Ello supuso transformaciones importantes en la relación que
mantenían estos dominios extraeuropeos con las metrópolis ibéricas.
La centuria introdujo en América Latina novedades y alteraciones
sustanciales, entre las más evidentes de las cuales se encontraban las
transformaciones en las relaciones comerciales a nivel internacional,
el estallido de revueltas y levantamientos – que en ocasiones
llegaron a cuestionar las bases del dominio colonial – y el impacto
de la Ilustración sobre el pensamiento, la ciencia o la política. Este
movimiento intelectual y cultural será adaptado y reformulado en su
recorrido por las Américas (GODOY; GARCÍA, 2017, p. 16).

98
TÓPICO 2 | A FORMAÇÃO DE UMA LITERATURA HISPANO-AMERICANA

O século foi de agitação cultural e social na Europa e chegou ao continente


americano. As notícias europeias, trazidas de navio, sobre as publicações e a
literatura, sempre em movimento, também foram bem recebidas nas Américas,
que acompanharam as inovações de pensamento que surgiram, porém nas
colônias hispano-americanas não se tinha ainda uma cultura literária mais próxima
do autóctone. Afinal, boa parte dos informantes e consumidores deste tipo de
publicação era a elite, herdeiros de espanhóis, muitos nascidos na América, que
tinham acesso à literatura ou estudavam na Europa. Chegar à sociedade menos
abastada era, portanto, bem difícil.

A literatura hispano-americana durante o século XVIII se encontrou parca


e sem muita produção literária notável, as obras que circulavam nas colônias
espanholas tiveram em sua maior parte uma origem europeia.

Críticos de literatura, como Bellini, colocam a obra de Lizardi como uma


representante do período:

La única obra de relieve de la narrativa hispanoamericana, en el período


que va desde la época barroca a los comienzos del Romanticismo, es
la de Fernández de Lizardi. El vacío sólo se interrumpe con algunos
intentos narrativos, de los que ya hemos hablado, pura imitación de
Quevedo. El siglo XVIII huye de la invención novelesca, repudia la
fantasía para dar un marcado acento didáctico a la literatura. Los
escasos ejemplos narrativos mencionados están sometidos a estas
exigencias, a los inevitables fines moralizantes, a los que no escapa
ni siquiera Lizardi, si bien éste deja bien sentadas sus cualidades
creativas de auténtico narrador. Al reactualizar el género picaresco,
José Joaquín Fernández de Lizardi se sitúa cronológicamente en un
espacio anacrónico; reaviva un tipo de narrativa que estaba muerta y
bien muerta en España (BELLINI, 1997, p. 195).

Autores hispano-americanos afamados de séculos anteriores, como Sor


Juana, Sigüenza y Góngora, andavam esquecidos e a obra deles sem muita
divulgação. Devido às circunstâncias de dependência do colonizador, da
vigilância religiosa, a América espanhola teve pouca expressão literária, a não ser
por Lizardi, ou alguns autores que continuavam imitando clássicos do século de
ouro, os leitores se voltaram mais para as novidades europeias da Ilustração, das
luzes.

Os textos de leitura eram oriundos principalmente da França, vinham


também da Alemanha, Espanha e Inglaterra. Coulthard (1979, p. 57) aponta: “A
princípio predomina de maneira quase absoluta a francesa; as influências inglesas
ou alemãs chegam geralmente através do francês”. O Barroco tinha passado e a
elite intelectual das colônias tinha na literatura ocidental a fonte de suas leituras
e da escrita.

99
UNIDADE 2 | PANORAMA DA LITERATURA HISPANO-AMERICANA DOS SÉCULOS XVIII E XIX

DICAS

Uma referência de literatura sobre o período é a obra De la Conquista a la


Independencia, do escritor Mariano Picón-Sala, que, de acordo com Bandeira (1960, p. 73),
“discute o salto brusco que dá passagem da época barroca ao enciclopedismo revolucionário”.
De fato, do estilo barroco aos textos literários que antecederam as independências houve
uma mudança notável e a letra foi utilizada como forma de introdução do pensamento
independentista. Leia:
PICÓN-SALAS, Mariano. De la conquista a la independencia: tres siglos de historia cultural
hispanoamericana. México: FCE, 1944. (Colec. TIERRA FIRME).

3 A LITERATURA HISPANO-AMERICANA ENTRE O


SÉCULO XVIII E O XIX
O século XVIII, descrito como medíocre em produção literária, por
diversos críticos, entre eles também Jozef (2005), encontra na prosa epistolar a
epistolografia, como cartas e relatos a serviço de causas cíveis. Quase no final do
século, foi quando a literatura hispano-americana tomou um novo impulso sob
os ventos do Iluminismo e dos eventos políticos europeus.

Convém ressaltar que o retorno aos clássicos no final do século XVIII e início
do XIX indicou uma ruptura com o Barroco, estilo considerado pelos escritores da
época sobrecarregado e, muitas vezes, frívolo. No entanto, os estudos teóricos de
literatura atualmente mostram que o Barroco foi um período polissêmico, realizou
uma crítica velada, dentro do que a Contrarreforma permitia, e de uma produção
literária sem par. Assim, as críticas classicistas ao Barroco são concebidas a partir
do ponto em que o leitor e escritor estavam posicionados, o que vale como reflexão
para cada estilo estudado em literatura hispano-americana.

A busca da razão, do sentido, da lógica, consoante com as ideias do


Iluminismo e a divulgação desde a Península Ibérica e por outras vias até a
América espanhola irá influenciar o movimento nos círculos intelectuais e, por
conseguinte, em suas letras:

O século 18 prefere as meditações severas da ciência, a história e a


filosofia, o que foi pouco favorável à poesia, mas transmitiu semente
fértil. O século que acabara deixa uma herança que se transforma
para expressar novas necessidades espirituais. Durante alguns
anos os temas serão pueris, em estilo poético insincero, mas logo se
converterão em expressão patriótica e arma de combate. Naquela
sociedade heterogênea, cheia de divisões e ressentimentos, vai se
processando o movimento da Independência. Esta acompanhou-se de
uma época de mediocridade cultural. Em toda parte, a pena estava a
serviço da causa da independência, seja no jornalismo incipiente, seja
na poesia de circunstância, na literatura jurídica e na oratória (JOZEF,
2005, p. 34).

100
TÓPICO 2 | A FORMAÇÃO DE UMA LITERATURA HISPANO-AMERICANA

Praticamente não dá para dissociar o final do XVIII e XIX. Os movimentos


literários surgem nos territórios hispano-americanos, mas nem sempre estarão
no mesmo compasso europeu e cronológico ou mesmo de características. Um
exemplo é o Barroco espanhol nas Américas, em que a incorporação de novos
elementos enriqueceu e/ou alterou algumas das características. Vale destacar que
a tradição literária na Europa sucedeu de forma muito diferente da América, e
realmente, comparar cronologicamente não faz sentido.

A seguir vamos apresentar os movimentos mais expressivos praticados da


literatura e as obras publicadas por escritores em terras americanas, começando
pelo final do XVIII e entrando um pouco no XIX, porém os movimentos literários
do século XIX serão tratados no Tópico 3.

4 O NEOCLASSICISMO
O Neoclassicismo ou Novo Classicismo representa um movimento
artístico e cultural literário que envolveu também a pintura, a escultura e a
arquitetura. No Brasil, o movimento será conhecido por Arcadismo.

O movimento literário surgiu na Europa ainda no século XVIII e fez escola


nas colônias hispano-americanas, permanecendo até meados do século XIX.

Caracterizou-se por retomar o clássico, a imitação dos autores gregos e


romanos, uma volta à serenidade, ou ao que tinha sido realizado no Renascimento,
o que se contrapôs ao Barroco, considerado um período de pessimismo,
contradições e sombras.

O retorno ao clássico indicou uma decadência da religião e seus dogmas


em prol da razão como o fio condutor do pensamento humano. Fortemente
influenciado pelas ideias iluministas, dará o impulso para novos gêneros
literários e os escritores que surgiram nas colônias hispano-americanas. De acordo
com Aguiar e Silva (1979, p. 446), “a verossimilhança representa um princípio
fundamental da estética clássica”, neste período os escritores irão buscar o crível
e a credibilidade poética e assim negavam a estética barroca, ‘complicada e
inverossímil’, sobretudo na literatura teatral” (AGUIAR E SILVA, 1979, p. 446,
grifo do original).

4.1 JOSÉ DE LIZARDI


Nas Américas, especialmente no México, irá se tornar uma escola a partir
de escritores como José Joaquín Fernández de Lizardi, escritor nascido em 1776
na capital do México, e se tornou conhecido como o maior representante do
Neoclassicismo.

101
UNIDADE 2 | PANORAMA DA LITERATURA HISPANO-AMERICANA DOS SÉCULOS XVIII E XIX

El neoclasicismo se manifiesta en América en todo su esplendor, con


figuras de relieve, en la primera mitad del siglo XIX, sobre todo en el
ámbito poético. Basta pensar en nombres como Bello y Olmedo para
que la afirmación quede confirmada. En la narrativa ocupa un lugar
importante el mexicano José Joaquín Fernández de Lizardi (1776-1827);
a él se debe una serie de novelas picarescas: El Periquillo Sarniento
(1816), Don Catrín de la Fachenda (1819; editado en 1823), La Quijotita
y su prima (1818-1819). Sin embargo, se puede considerar a Lizardi
como anunciador de la sensibilidad romántica, por las Noches tristes,
publicadas en 1818 y a las que añade, al año siguiente, El día alegre.
Las noches lúgubres de Cadalso son el modelo en que se inspiran
las Noches tristes, con todo lo que esto significa en el ámbito de la
apertura al clima prerromántico (BELLINI, 1997, p. 195).

O Neoclassicismo observa a natureza humana e acentua as características,


quer sejam virtudes quer não, por isso a obra de Lizardi El Periquillo Sarniento,
publicada em 1816, sinaliza e se inscreve no movimento.

Lizardi segue a tradição do gênero picaresco espanhol. A inspiração foi a


obra anônima El Lazarillo de Tormes, cuja clássico espanhol é do Siglo de Oro.

Na obra El Periquillo se conta a história de um idoso que, sentindo a morte


próxima, escreve para seus filhos, a fim de relatar sua história pessoal, além
de aconselhamentos para sua família. “En lo que respecta a la estructura de El
Periquillo Sarniento, estamos ante una novela de entregas formada con las tres
fases de la ortodoxia cristiana: pecado, castigo y redención” (MAYORAL, 2012,
p. 23).

DICAS

Você pode ler o clássico espanhol da novela picaresca El Lazarillo de Tormes


(Anônimo) em https://bit.ly/1PSMhlG.
A obra remonta ao Siglo de Oro espanhol, escrita provavelmente em 1553, e é anônima,
talvez dada por seu forte teor anticlerical.

102
TÓPICO 2 | A FORMAÇÃO DE UMA LITERATURA HISPANO-AMERICANA

FIGURA 3 – JOSÉ JOAQUÍN FERNÁNDEZ DE LIZARDI

FONTE: <https://bit.ly/2NkH8xd>. Acesso em: 1º dez. 2018.

A seguir, indicamos a leitura do fragmento de El Periquillo Sarniento (1816), de


Lizardi, em que a narrativa apresenta as características de uma literatura picaresca:

… entonces me vanaglorié de la mudanza de mi suerte y me contenté


demasiado con el rumboso título de aprendiz de botica, sin saber el común
refrancillo que dice: estudiante perdulario, sacristán o boticario […] en nada
menos pensé que en aplicarme al estudio de la chímica y botánica. Mi estudio
se redujo a hacer algunos menjurjes, a aprender algunos términos técnicos, y
a agilitarme en el despacho; pero como era tan buen hipócrita, me granjeé la
confianza y cariño del oficial (pues mi amo no estaba mucho en la botica), y
tanto que al año ya yo le ayudaba tan bien a don José que tenía lugar de pasear
y aun de irse a dormir a la calle.

Desde entonces, o tres meses antes, se me asignaron ocho pesos cada


mes, y yo hubiera salido oficial como muchos si un accidente no me hubiera
sacado de la casa. Pero antes de referir esta aventura es menester imponeros en
algunas circunstancias.

Había en aquella época en esta capital un médico viejo, a quien llamaban


por mal nombre el doctor Purgante, porque a todos los enfermos decía que
facilitaba la curación con un purgante […]. Era este pobre viejo buen cristiano […]
no adherido a Hipócrates, Avicena, Galeno y Averroes, sino a su capricho. Creía
que toda enfermedad no podía provenir sino de abundancia de humor pecante;
y así pensaba que con evacuar este humor se quitaba la causa de la enfermedad.
Pudiera haberse desengañado a costa de algunas víctimas que sacrificó en
las aras de su ignorancia […] yo para mí tengo que el médico que yerra por
no preguntar o consultar con los médicos sabios por vanidad o capricho peca
mortalmente […] este médico estaba igualado con mi maestro […] don Nicolás
enviaba cuantos enfermos podía al doctor Purgante y éste dirigía a todos sus
enfermos a nuestra botica. El primero decía que no había mejor médico que el
dicho viejo, y el segundo decía que no había mejor botica que la nuestra; y así
unos y otros hacíamos muy bien nuestro negocio (MAYORAL, 2012, p. 188-189).

103
UNIDADE 2 | PANORAMA DA LITERATURA HISPANO-AMERICANA DOS SÉCULOS XVIII E XIX

Como você pôde observar neste fragmento, a novela picaresca (romance


picaresco) é escrita em prosa e é característica da literatura espanhola. Escrita em
primeira pessoa, personagem e autor se confundem numa tentativa de descrever
uma história autobiográfica, talvez distante da realidade do autor.

O gênero se originou por volta do reinado de Felipe II, no século XVI,


e faz uma crítica à sociedade da época, principalmente com temas envolvendo
relações e religião. O “pícaro” é um personagem controverso porque é um ladrão,
inclinado à vagabundagem, mas tornado um personagem que não considera seus
atos um roubo. É cético, frio e ausente de romantismo, mas alegre e travesso.

Outro diferencial do romance picaresco às demais narrativas, além da


questão da autoria, é o estilo popular, com linguagem simples e uma narrativa
rápida no conjunto dos relatos, sem ligação, porém tendo o personagem-
autor como fio condutor. Com isso, a presença do herói não é tão necessária e
há possibilidade de se criar várias histórias. A presença da mulher também se
destaca, já que esta colabora na narrativa e não apenas serve ou é alvo das tramas.

4.2 ANDRÉS BELLO


Escritor, poeta e linguista, nasceu em 1781 na Venezuela, mudou-se para o
Chile em 1829. No Chile, foi reconhecido e aclamado como grande escritor, mas o
país já tinha seus poetas de envergadura, como Alonso de Ercilla e Pedro de Oña,
por isso ele não recebeu o título de primeiro poeta de renome do país.

Exerceu diversas funções no mundo das letras, foi poeta, filólogo, jurista,
tradutor de clássicos e ainda escreveu a Gramática de la lengua Castellana, uma
das obras mais importantes no mundo hispano-americano, que foi publicada em
1847. Bandeira (1960, p. 87) destaca que Bello foi considerado o homem mais culto
de seu tempo. Entre as diversas funções desempenhadas, ainda foi professor de
Simón Bolívar, em 1810. Morreu em 1865.

FIGURA 4 – RETRATO DE ANDRÉS BELLO

FONTE: <https://bit.ly/2NTQTli>. Acesso em: 18 set. 2018.


104
TÓPICO 2 | A FORMAÇÃO DE UMA LITERATURA HISPANO-AMERICANA

FIGURA 5 – PORTADA DE GRAMÁTICA DE LA LENGUA CASTELLANA

FONTE: <http://www.memoriachilena.cl/602/w3-article-72543.html>. Acesso em: 20 set. 2018.

Os poemas que Bello escreveu estão dentro do Neoclássico como Oda al


Anauco (1800), Alocución a la Poesía (1823) escrito em Londres, Tirsis habitador del
Tajo umbrío (1805) e A la nave (1808), neste imita ao poeta romano Quinto Horácio
Flaco, autor de obras líricas e satíricas, além de filósofo e célebre pela sua ode 11,
em que desenvolveu o tema do Carpe Diem. Bello publicou em Londres os poemas
Silvas Americanas, entre 1826-1827.

Os textos do poeta refletem o período em que se procurava sair do Barroco


hispano-americano e sob influência da Ilustração europeia se buscava a razão e a
lógica na poesia.

Leia um fragmento do poema A La Nave, de Andrés Bello:

QUADRO 1 – A LA NAVE

A La Nave ¿Qué tu nombre, famoso


¿Qué nuevas esperanzas en reinos de la aurora,
al mar te llevan? Torna, y donde al sol recibe
torna, atrevida nave, su cristalina alcoba?
a la nativa costa.
Ayer por estas aguas,
Aún ves de la pasada segura de sí propia,
tormenta mil memorias, desafiaba al viento
¿y ya a correr fortuna otra arrogante proa.
segunda vez te arrojas?

105
UNIDADE 2 | PANORAMA DA LITERATURA HISPANO-AMERICANA DOS SÉCULOS XVIII E XIX

Sembrada está de sirtes Y ya, padrón infausto


aleves tu derrota, que al navegante asombra,
do tarde los peligros en un desnudo escollo
avisará la sonda. está cubierta de ovas.

¡Ah! Vuelve, que aún es tiempo, ¡Qué! ¿No me oyes? ¿El rumbo
mientras el mar las conchas no tuerces? ¿Orgullosa
de la ribera halaga descoges nuevas velas,
con apacibles olas. y sin pavor te engolfas?

Presto erizando cerros ¿No ves, ¡oh malhadada!


vendrá a batir las rocas, que ya el cielo se entolda,
y náufragas reliquias y las nubes bramando
hará a Neptuno alfombra. relámpagos abortan?

De flámulas de seda ¿No ves la espuma cana,


la presumida pompa que hinchada se alborota,
no arredra los insultos ni el vendaval te asusta,
de tempestad sonora. que silba en las maromas?

¿Qué valen contra el Euro, ¡Vuelve, objeto querido


tirano de las ondas, de mi inquietud ansiosa;
las barras y leones vuelve a la amiga playa,
de tu dorada popa? antes que el sol se esconda!
FONTE: <https://bit.ly/2FW3Ntj>. Acesso em: 4 abr. 2019.

4.3 JOSÉ JOAQUÍN OLMEDO


Nascido em Guayaquil, no Equador, em 1780, além de escritor foi
advogado, político e militar. Dedicou-se também ao jornalismo. Caracterizado
como poeta neoclássico da independência, foi um entusiasta defensor da
América, destacando literariamente ao libertador Bolívar com o seu La Victória
de Junín: Canto a Bolívar, e posicionando-se contra os exércitos de Napoleão se
caracterizou por escrever poesias que exaltaram a grandiosidade da natureza, em
que destacou a Cordilheira dos Andes, assim como de forma tímida introduziu
elementos indígenas. Escreveu sobre temas relacionados ao exército. Considerado
grande referência da epopeia hispano-americana, sendo lembrado por Menéndez
antes de Bello e de Heredia.

La Victoria de Junín: Canto a Bolívar foi escrita em homenagem à vitória


obtida sobre os espanhóis na batalha de Junín e Ayacucho. O poema foi publicado
em 1825 e se distinguiu por ter sido escrito “com valores poéticos essencialmente
líricos, e não apenas sentimentais ou patrióticos” (JOZEF, 2005, p. 35). Veja os
próximos versos do poema escrito por Olmedo (1999, s.p.):

106
TÓPICO 2 | A FORMAÇÃO DE UMA LITERATURA HISPANO-AMERICANA

[...] Y el rayo que en Junín rompe y ahuyenta


la hispana muchedumbre
que, más feroz que nunca, amenazaba,
a sangre y fuego, eterna servidumbre,
y el canto de victoria
que en ecos mil discurre, ensordeciendo
el hondo valle y enriscada cumbre,
proclaman a Bolívar en la tierra
árbitro de la paz y de la guerra.

Faleceu em 1847. Dentre suas obras estão produções líricas inspiradas em


Juan António Meléndez Valdéz, como em A la muerte de mi hermana, ode Al Árbol
e ao General Flores, elegia em La muerte de la Princesa de Asturias, Alfabeto para un
niño e Canción indiana.

NOTA

Confira na autoatividade um fragmento de La Victoria de Junín, que acabou


sendo mais conhecido como Canto a Bolívar, e perceba as características neoclássicas e as
alusões à independência.

4.4 SIMÓN BOLÍVAR


A carta foi o gênero textual mais praticado no período que antecedeu as
independências, e entre as que ficaram como testemunho da importância de uma
época destacamos a escrita por Simón Bolívar (1783-1830), cujo nome completo é:
José Antonio de la Santísima Trinidad Bolívar y Palacios Ponte-Andrade y Blanco.
Venezuelano, militar e ativo no processo de independência cultural com o objetivo
da descolonização das Américas. Em muitos países é considerado o verdadeiro
libertador por se envolver na causa da independência, sendo referência em vários
livros e autores.

107
UNIDADE 2 | PANORAMA DA LITERATURA HISPANO-AMERICANA DOS SÉCULOS XVIII E XIX

FIGURA 6 – SIMÓN BOLÍVAR

FONTE: <https://bit.ly/2pjlbjO>. Acesso em: 18 set. 2018.

Autor de inúmeras cartas, utilizou o gênero epistolar como forma de


difusão rápida para trocar ideias com seus correligionários.

A sua carta mais conhecida é a Carta de Jamaica, que escreveu em Kingston,


na Jamaica, e se tornou um documento essencial para o processo de independência
nas Américas. Na carta, Bolívar expressou o seu pensamento sobre a importância
da independência dos territórios sob domínio da Coroa espanhola. Foi uma
atitude que poderia ter custado a sua própria vida:

Bolívar, autor de miles de cartas que constituyen en sí un voluminoso


archivo, y de la más famosa carta en la historia latinoamericana
(la "Carta de Jamaica", de 1815), y redactor principal de varias
constituciones, es como el chispazo mortecino ya de lo que fue un
segundo big bang histórico: la Independencia y la creación de las
naciones latinoamericanas (GONZÁLEZ ECHEVARRÍA, 2011, p. 19).

Simón Bolívar, ao escrever em Kingston, demonstra a circulação que havia


das pessoas nas colônias, assim como na carta demonstra que conhecia muito
bem a situação colonial hispano-americana. Isso ratifica que na época colonial
circulava uma vasta produção epistolar e se tinha uma comunicação constante
sobre os anseios de independência da Coroa espanhola entre as regiões.

Leia a seguir o fragmento final da Carta da Jamaica (1815), de autoria de


Simón Bolívar:

Seguramente, la unión es lo que nos falta para completar la obra de


nuestra regeneración. Sin embargo, nuestra división no es estraña, porque tal
es el distintivo de las guerras civiles, formadas jeneralmente entre dos partidos:
concervadores y reformadores. Los primeros son, por lo comun, más numerosos,
porque el Ymperio de la costumbre, produce el efecto de la obediencia a las

108
TÓPICO 2 | A FORMAÇÃO DE UMA LITERATURA HISPANO-AMERICANA

potestades establecidas; los ultimos son siempre menos numerosos, aunque


más vehementes e ilustrados. De este modo la masa física se equilibra con la
fuerza moral, y la contienda se prolonga, siendo sus resultados muy inciertos.
Por fortuna, entre nosotros la masa ha seguido a la inteligencia.

Yo diré a Usted lo que puede ponernos en aptitud de espulsar a los


Españoles y de fundar un Gobierno libre. Es la union, ciertamente; mas ésta union
no nos vendrá por prodigios divinos, sino por efectos sensibles y esfuerzos bien
dirijidos. La America está encontrada entre sí, porque se halla abandonada de
todas las Naciones; aislada en medio del Universo, sin relaciones diplomáticas
ni aucilios militares, y combatida por la España, que posee más elementos para
la Guerra, que cuantos nosotros furtivamente podemos adquirir. Cuando los
sucesos no estan asegurados; cuando el Estado es debil, y cuando las empresas
son remotas, todos los hombres vacilan, las opiniones se dividen, las paciones
las agitan, y los enemigos las animan para triunfar por éste facil medio. Luego
que seamos fuertes, bajo los auspicios de una nación liberal que nos preste
su proteccion; se nos verá de acuerdo cultivar las virtudes y los talentos que
conducen á la gloria; entonces seguiremos la marcha magestuosa hacia las
grandes prosperidades a que está destinada la America Meridional, entonces
las ciencias y las artes, que nacieron en el Oriente, y han ilustrado a la Europa,
volarán a Colombia libre que las convidará con un asilo. Tales son, Señor, las
observaciones y pensamientos que tengo el honor de someter a usted, para que
las rectifique o deseche según su mérito; suplicándole se persuada de que me he
atrevido a exponerlos, más por no ser descortés, que porque me crea capaz de
ilustrar a Vd. en la materia. Soy de Vd. &. &. &. Kingston, septiembre 6 de 1815.

FONTE: BOLÍVAR, Simón. Carta de Jamaica. Caracas: Comisión Presidencial para la


Conmemoración del Bicentenario de la Carta de Jamaica, 2015. Colección Unidad Nuestra
Americana. https://bit.ly/2gnUzYc. Acesso em: 18 set. 2018.

DICAS

Você pode ler a Carta de Jamaica na íntegra acessando:

BOLÍVAR, Simón. Carta de Jamaica. Caracas: Comisión Presidencial para la Conmemoración


del Bicentenario de la Carta de Jamaica, 2015. Colección Unidad Nuestra Americana. https://
bit.ly/2gnUzYc. Acesso em: 18 set. 2018.

109
UNIDADE 2 | PANORAMA DA LITERATURA HISPANO-AMERICANA DOS SÉCULOS XVIII E XIX

5 A TRANSIÇÃO LITERÁRIA DO SÉCULO XVIII PARA O


XIX
O longo caminho para uma consolidação de uma literatura americana foi
de séculos, porém irá se manifestar de forma profícua a partir do século XIX,
quando os escritores começam a questionar a imitação de valores estrangeiros e
a preocupação de escrever sobre o nacional a partir do que eles estão vendo ao
seu redor.

Depois do Neoclassicismo, próprio do século XVIII, discutido neste tópico,


mesmo diante de outras estéticas literárias, como o Rococó, o Pré-Romantismo,
iremos estudar o Romantismo, porque as obras do Romantismo, assim como da
gauchesca, refletirão o local e a preocupação de uma descolonização da literatura
e uma independência literária em relação à Europa. Surgiu uma escrita que busca
os elementos hispano-americanos para que as narrativas sejam em verso ou prosa
e nos mais distintos gêneros literários.

A literatura está em constante movimento e uma estética literária não se


torna absoluta. De tempos em tempos surgem outras estéticas que apresentam
uma nova forma de contar uma história. Repare, por exemplo, o que aconteceu
com o Barroco, o Neoclassicismo, o Romantismo, o Realismo e que irão refletir
nas vanguardas do século XX.

Muitos dos movimentos estéticos tiveram sua origem na Europa,


porém nas Américas os movimentos chegavam tardiamente. Um exemplo é o
Romantismo, que na Europa estava presente desde o século XVIII, mas nos países
latino-americanos surge na literatura na primeira metade do século XIX.

O século XVIII terminará com o prenúncio de grandes mudanças no


territórios hispano-americanos. O século XIX irá consolidar a autonomia de
regiões em países e a formação de uma literatura nacional, e os escritores nascidos
no século XVIII publicarão a maior parte de suas obras já no século XIX, quando
se juntam às guerras das independências. As ideias iluministas floresceram
e inspiraram o movimento literário Neoclassicismo, que terá representantes
hispano-americanos.

Sugerimos que você complemente os estudos investigando os movimentos


estéticos que fizeram parte dos períodos citados, para que tenha uma ideia de
suas características principais e o quão foram se adaptando e até inovando em
solo americano. Compare também com os movimentos filosóficos, artísticos e
literários que chegaram no Brasil e os de Portugal.

110
TÓPICO 2 | A FORMAÇÃO DE UMA LITERATURA HISPANO-AMERICANA

LEITURA COMPLEMENTAR

Para saber mais sobre o que aconteceu depois das principais guerras das
independências:

“Los casos nacionales. La norma y las excepciones


Hemos señalado ya que, luego de la independencia, prevalecieron en
América Latina la inestabilidad política y la violenta lucha por el poder entre los
caudillos nacionales o locales; queda sin embargo por ver si es posible emerger
de ese laberinto de conflictos y si, en ese panorama caótico, despunta alguna
excepción. Todos los nuevos estados y las viejas unidades administrativas de la era
colonial se deshicieron en mil pedazos. Una vez derrocado el rey, cada territorio o
ciudad con peso propio se adueñó de su soberanía o retomó la posesión de lo que
consideraba una libertad antigua que le correspondía apenas estuviera disuelto
el pacto con el soberano, de la cual ningún otro territorio, y menos que nadie una
ciudad vecina o una capital amenazadora, podía declarar vocación hereditaria.
Fue así que en 1840 se disolvió la Confederación Centroamericana nacida en
1823, y de sus ruinas surgieron los estados de Guatemala, Honduras, Salvador,
Nicaragua y Costa Rica. La Gran Colombia soñada por Bolívar y nacida en 1819
se disolvió en 1830 y dejó la vía libre al nacimiento de Colombia, Venezuela y
Ecuador. En tanto, el Virreinato del Perú perdió Chile y Bolivia, cada una de las
cuales formó un estado independiente. Por último, las Provincias Unidas del Río
de la Plata se disgregaron y la Argentina fue incapaz de mantener junto a sí al
Paraguay ni impedir el nacimiento del Uruguay.
Además de estar enfrentados y de no contar con fronteras precisas (fuente
de años de conflictos y tensiones), desde un primer momento los nuevos estados
se vieron surcados por profundos desgarramientos, cada uno por motivos
singulares, aunque en el fondo todos guardaran similitudes. En verdad, de un
modo u otro todos fueron presa de conflictos entre el centro y la periferia, la
costa y el altiplano, el puerto y el interior, entre una ciudad y otra; en suma, entre
territorios celosos de la soberanía apenas conquistada y en absoluto dispuestos
a sustituir la tenue sumisión a un rey lejano por la mucho más rígida a un poder
más próximo e invasivo. Los ejemplos son múltiples: el de México tironeado entre
centralistas y federalistas; el de Colombia y sus ciudades en perpetua guerra; el
del Perú y sus guerras civiles; el de la Argentina y la insanable rivalidad entre
Buenos Aires y las provincias del interior son sólo algunos”.

FONTE: ZANATTA, Loris. Historia de América Latina: de la Colonia al siglo XXI. 1. ed. Tradução de
Alfredo Grieco y Bavio e Guillermo David. Buenos Aires: Siglo Veintiuno Editores, 2012. p. 66-67.

Para saber mais sobre o gênero literário da picaresca, colocamos aqui


um fragmento de El Lazarillo de Tormes. Leia e compare com o fragmento de El
Periquillo Sarniento, de Lizardi, um texto considerado neoclássico e apresentado
anteriormente na seção 4.1; compare os textos e perceba as características textuais
comuns, por exemplo, a figura de um oficial e um aprendiz, a subsistência diária,
a estratégia para lograr o outro.

111
UNIDADE 2 | PANORAMA DA LITERATURA HISPANO-AMERICANA DOS SÉCULOS XVIII E XIX

[...]
Yo por bien tengo que cosas tan señaladas y por ventura nunca oídas ni
vistas vengan a noticia de muchos y no se entierren en la sepultura del olvido,
pues podría ser que alguno que las lea halle algo que le agrade, y a los que no
ahondaren tanto los deleite. Y a este propósito dice Plinio que «no hay libro, por
malo que sea, que no tenga alguna cosa buena». Mayormente que los gustos no
son todos unos, más lo que uno no come, otro se pierde por ello, y así vemos
cosas tenidas en poco de algunos que de otros no lo son. Y esto para que ninguna
cosa se debría romper ni echar a mal, si muy detestable no fuese, sino que a todos
se comunicase, mayormente siendo sin perjuicio y pudiendo sacar de ella algún
fruto. Porque, si así no fuese, muy pocos escribirían para uno solo, pues no se
hace teníades bien qué hacer y no haríades poco si me remediásedes», dije paso,
que no me oyó. Mas como no era tiempo de gastarlo en decir gracias, alumbrado
por el Espíritu Santo, le dije:

—Tío, una llave de esta arca he perdido y temo mi señor me azote. Por
vuestra vida, veáis si en esas que traéis hay alguna que le haga, que yo os lo
pagaré.

Comenzó a probar el angélico calderero una y otra de un gran sartal que


de ellas traía, y yo a ayudalle con mis flacas oraciones. Cuando no me cato, veo
en figura de panes, como dicen, la cara de Dios dentro del arcaz. Y, abierto, díjele:

—Yo no tengo dineros que os dar por la llave, más tomad de ahí el pago. Él
tomó un bodigo de aquéllos, el que mejor le pareció, y, dándome mi llave, se fue
muy contento, dejándome más a mí. Mas no toqué en nada por el presente, porque
no fuese la falta sentida; y aun, porque me vi de tanto bien señor, parecióme que
la hambre no se me osaba allegar. Vino el mísero de mi amo, y quiso Dios no miró
en la oblada que el ángel había llevado. Y otro día, en saliendo de casa, abro mi
paraíso panal y tomo entre las manos y dientes un bodigo, y en dos credos le hice
invisible, no se me olvidando el arca abierta.

FONTE: ANÔNIMO. Lazarillo de Tormes. Edición, estudio y notas de Francisco Rico. Madrid:
Real Academia Española, MMXI. P. 2-3.

112
RESUMO DO TÓPICO 2

Neste tópico, você aprendeu que:

● A literatura do século XVIII e os gêneros usuais hispano-americanos, como


as cartas, discursos, ensaios, relatos de viagens, foram o meio intelectual de
incentivo às independências hispano-americanas.

● Um fato importante do Período Colonial foi a expulsão dos jesuítas.

● O jesuíta Juan Pablo Vizcardo y Guzmán escreveu desde o exílio cartas para
animar o povo hispano-americano a buscar a independência.

● Os movimentos literários europeus influenciaram a colônia, e após o Barroco


foi a vez do Neoclassicismo ou Novo Classicismo, um movimento influenciado
por ideias iluministas.

● O Iluminismo influenciou a literatura pré-independentista.

● O destaque do período pré-independentista foi o escritor José Joaquín


Fernández de Lizardi, um expoente da literatura de 1700.

● Os escritores Andrés Bello, José Joaquín Olmedo, dentre outros, participaram


dos movimentos pré-independentistas.

● Um exemplo de gênero textual pré-independentista foi o gênero epistolar.

● Uma carta fundamental na história hispano-americana foi a Carta da Jamaica,


escrita por Simón Bolívar, intelectual e militar que lutou contra a Coroa
espanhola.

113
AUTOATIVIDADE

1 Realize em voz alta e dramatizada a leitura do fragmento La victoria de


Junín – Canto a Bolívar, de Joaquín José Olmedo, em que o escritor exalta a
busca da soberania hispano-americana e um de seus líderes, Bolívar, em
que o chama de “el rayo que en Junín rompe”:
La victoria de Junín. Canto a Bolívar jamás se moverán. Ellos, burlando
de de ajena envidia y del protervo tiempo
José Joaquín Olmedo la furia y el poder serán eternos
de libertad y de victoria heraldos,
que con eco profundo,
El trueno horrendo que en fragor revienta a la postrema edad dirán del mundo:
y sordo retumbando se dilata
por la inflamada esfera, «Nosotros vimos de Junín el campo,
al Dios anuncia que en el cielo impera. vimos que al desplegarse
del Perú y de Colombia las banderas,
Y el rayo que en Junín rompe y ahuyenta la se turban las legiones altaneras,
hispana muchedumbre huye el fiero español despavorido,
que, más feroz que nunca, amenazaba, o pide paz rendido.
a sangre y fuego, eterna servidumbre Venció Bolívar, el Perú fue libre,
y el canto de victoria y en triunfal pompa Libertad sagrada
que en ecos mil discurre, ensordeciendo en el templo del Sol fue colocada.»
el hondo valle y enriscada cumbre,
proclaman a Bolívar en la tierra ¿Quién me dará templar el voraz fuego
árbitro de la paz y de la guerra. en que ardo todo yo? Trémula, incierta,
Las soberbias pirámides que al cielo torpe la mano va sobre la lira dando
el arte humano osado levantaba discorde son. ¿Quién me liberta
para hablar a los siglos y naciones del dios que me fatiga...?
-templos do esclavas manos
deificaban en pompa a sus tiranos-, Siento unas veces la rebelde Musa
ludibrio son del tiempo, que con su ala cual bacante en furor, vagar incierta
débil, las toca y las derriba al suelo, por medio de las plazas bulliciosas,
después que en fácil juego el fugaz viento o sola por las selvas silenciosas,
borró sus mentirosas inscripciones; o las risueñas playas
y bajo los escombros, confundido que manso lame el caudaloso Guayas
entre la sombra del eterno olvido otras el vuelo arrebatada tiende
-¡oh de ambición y de miseria ejemplo!- sobre los montes, y de allí desciende
el sacerdote yace, el dios y el templo. al campo de Junín, y ardiendo en ira,
Mas los sublimes montes, cuya frente los numerosos escuadrones mira,
a la región etérea se levanta, que el odiado pendón de España arbolan,
que ven las tempestades a su planta y en cristado morrión y peto armada,
brillar, rugir, romperse, disiparse, cual amazona fiera,
los Andes, las enormes, estupendas se mezcla entre las filas la primera
moles sentadas sobre bases de oro, de todos los guerreros,
la tierra con su peso equilibrando, y a combatir con ellos se adelanta,
triunfa con ellos y sus triunfos canta.
[...]
FONTE: OLMEDO, José Joaquín. La victoria de Junín. Canto a Bolívar. Alicante: Biblioteca
Virtual Miguel de Cervantes, 1999. Poema completo. https://bit.ly/2NqG9Md. Acesso em: 20
set. 2018.
114
2 Realize um estudo interdisciplinar sobre o tema do poema e amplie seu
conhecimento literário e da língua espanhola respondendo às questões
propostas. Lembre-se de que estas autoatividades sempre podem ser
adaptadas para seu estágio, e fazendo pequenas modificações é possível
escrever um projeto didático para suas aulas de Espanhol.

a) Depois de sua leitura, escute o poema declamado e repasse as palavras em


que encontrou dificuldade de pronúncia. La Victoria de Junín – Canto a Bolívar.
Vídeo disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=C40CCjSoMpc.

b) O título se torna importante porque instiga o leitor e indica o tema central


do poema, por isso antecipa o que trata a obra. Troque o título (La victoria de
Junín. Canto a Bolívar) e apresente a sua proposta. Justifique.

c) O poema apresenta as características neoclássicas. Identifique duas e


justifique. Por exemplo: no verso “Las soberbias pirámides” aludem ao
Egito, mas neste poema são um paralelo com a Cordilheira dos Andes.

d) Escolha um excerto do poema e reescreva para um texto modificando


o gênero textual, como uma carta, um relato, ou mesmo uma crônica,
mantendo o fio condutor da narrativa do poema.

e) Escolha uma estrofe do poema e faça a tradução para a língua portuguesa,


cuidando com a rima e métrica do poema.

Poema em espanhol Tradução para o português

f) No fragmento apresentado encontramos palavras conhecidas do leitor de


Olmedo, por exemplo, Junín. Identifique algumas que são desconhecidas
para você, faça uma lista e coloque a tradução em português ou uma
explicação para a palavra. Verifique se a tradução faz sentido no contexto em
que a palavra foi utilizada. Busque em dicionários bilíngues ou monolíngues
e pesquise em corpus linguísticos, como o Corpus Lingue, em que você
pode verificar o uso no contexto (https://www.linguee.com.br/portugues-
espanhol). Damos o primeiro exemplo utilizando a palavra templar para que
você possa ver como sugerimos que seja feita a autoatividade:

115
Versos em que se localiza a
Palavra Tradução/Significado
palavra

g) Identifique e transcreva ocorrências de figuras de linguagem nos versos do


poema.

116
UNIDADE 2 TÓPICO 3

A LITERATURA HISPANO-AMERICANA DO SÉCULO XIX

1 INTRODUÇÃO
A partir do século XIX cabem algumas reflexões: Quem era o leitor nas
Américas? Quem escrevia para quem e sobre o que se escrevia? As respostas são
encontradas a partir do momento em que os escritores dos países independentes
começam a buscar em seus territórios elementos nacionais para escrever suas
obras. Assim, o Romantismo, o Realismo, a Gauchesca, refletirão esse momento
nacionalista, mas ainda sob uma influência muito europeia, já que os escritores
traziam ou tinham leituras da Europa; até que surge o Modernismo no final do
século XIX, prenunciando uma escola marcadamente hispano-americana e que
na mão contrária da maioria dos movimentos literários irá influenciar escritores
europeus, principalmente espanhóis, no século XX.

Cabe lembrar que a adesão dos intelectuais da época aos movimentos


literários e questões da independência foi influenciada pela leitura de jornais,
gênero muito utilizado no século XVIII para difusão de ideias literárias.
As matérias publicadas pela imprensa repercutiram também na política,
principalmente. De acordo com Perez Stocco (2015, p. 168-169), “La función de
la prensa fue, en aquel momento, principalmente informativa y de difusión de
aspectos culturales, científicos e históricos”. Por isso, a imprensa foi um meio
importante para informar, expor novas ideias de forma ágil.

Muitos escritores que mencionamos escreveram para periódicos, sob


nomes reais ou pseudônimos. No México, por exemplo:

En relación con las imprentas podemos afirmar que todavía a


comienzos del siglo XIX, necesitaban licencias reales para funcionar.
Hasta 1806 en todo el territorio mexicano sólo hubo dos y en los tres
años siguientes se fueron sumando tres más, por lo que para 1809
ya había cinco. A partir de allí su número fluctuó en relación con la
vigencia de la libertad de prensa y a los avatares políticos.
Estas eran grandes imprentas, pero había imprentillas o talleres
que trabajaban a pequeña escala y fueron requeridos por los grupos
insurgentes a partir de 1809 para publicar pasquines y cedulillas.
Estas funcionaban al margen de las licencias oficiales, pero se sabía de
su existencia; como prueba de ello se conoce una disposición de ese
mismo año por la cual el Virrey las prohibió.
Muchas de aquellas breves publicaciones circulaban en español y
en náhuatl lo que permite deducir que los indígenas también fueron
destinatarios de esos escritos.
Si bien a partir de 1808 la cantidad de impresos aumentó, estos
tuvieron que sortear ciertas dificultades: los altos costos, la falta de
herramientas para imprimir, la escasez de papel y la censura (PEREZ
STOCCO, 2015, p. 169).

117
UNIDADE 2 | PANORAMA DA LITERATURA HISPANO-AMERICANA DOS SÉCULOS XVIII E XIX

Neste tópico, especificamente, falaremos de uma diáspora europeia


do século XVIII e XIX; essa migração se deu nos movimentos artísticos, como
a literatura, mas também com as imigrações em massa para os países hispano-
americanos. Motivadas principalmente pela atração que a América exercia como
promessa de prosperidade, paz e riquezas, o que propiciou sucessivas levas de
imigrantes. Eles impulsionaram a economia, supriram mão de obra especializada.
Também houve muitos conflitos em torno da expansão urbana e no interior dos
países.

2 GÊNEROS E AUTORES HISPANO-AMERICANOS DO


SÉCULO XIX
A primeira metade do século XIX foi mais pródiga em literatura produzida
nos países hispano-americanos do que em todo o século XVIII. A novidade serão
as obras de cunho nacionalista que incluem o indígena, o gaúcho e as referências
à terra local.

Da Cidade do México à cidade de Buenos Aires, o continente sentiu a nova


fase literária e algumas regiões, como a do Rio de la Plata, terão uma produção
literária que se tornará canônica nas letras hispano-americanas.

Durante o século XIX, as guerras de independência e a organização dos


países estabelecidos com suas juntas de governo permitiram as discordâncias de
ideias por suas lutas de poder nos países recém-independentes.

La historia política de América Latina en el siglo XIX está surcada


por el constante conflicto entre liberales y conservadores. No fue el
origen social lo que separó a unos de otros: en tiempos en los cuales
la actividad política era coto de pocos notables, ambas corrientes
nacieron en el seno de las elites criollas, esto es, en el vértice de la
pirámide social (ZANATTA, 2012, p. 56).

Um exemplo dessas guerras civis acontece na Argentina, onde o governo


de Juan Manuel de Rosas, em Buenos Aires, registra uma marca de perseguição e
terror aos que se opunham ao seu regime. Os políticos e a sociedade se dividiam
em unitários e federais, o que acarretou guerras, mortes, um conflito interno que
marcou a nação por um longo tempo. “Para entonces, en el Río de la Plata, a las
guerras de independencia les han sucedido las guerras civiles entre unitarios y
federales, y Juan Manuel de Rosas se ha erigido en el hombre fuerte de la política
nacional” (TERÁN, 2007, p. 13).

118
TÓPICO 3 | A LITERATURA HISPANO-AMERICANA DO SÉCULO XIX

Enquanto os governos assentam suas constituições, regulamentam leis e


afirmam a soberania nacional, a literatura continua a se desenvolver, agora cada
vez mais olhando para seu próprio entorno social e linguístico, descobrindo na
sua própria terra temas para desenvolver, ao mesmo tempo em que os escritores
são influenciados pelas escolas, estilos literários que vêm da Europa.

A partir dos primeiros gêneros desenvolvidos na América espanhola, e


ainda sob uma forte influência de valorização de uma estética literária europeia,
começa a se desenvolver uma literatura nativa. Em princípio, a produção escrita
daquele momento se apresenta como a redação de constituições dos novos países,
uma escrita técnica. Os textos literários que valorizam costumes e tradições locais
e a constante busca da inovação literária ao introduzir temas locais começam a
delinear uma literatura que aos poucos começa a refletir seu entorno social.

Dos gêneros cultivados na hispano-américa, o diálogo latino vinha


ao encontro do ensino retórico e escolástico universitário. Outros
gêneros: a poesia lírica, a historiografia e a epopeia. [...] A literatura
passa de ativa e contemplativa, mascarando uma sociedade que se
tornou urbana e sedentária. Quando se passa da Araucana ao Arauco
Domado, de Oña, se observa a transformação do mundo idílico em
guerreiro (JOZEF, 2005, p. 27).

O cenário que se desenha após o período das independências da América


Latina é o surgimento de novos textos devido à demanda da redação de
documentos para as nações recém-criadas e que se tornarão importantes devido
ao fato de que constituirão um gênero autobiográfico, documental, fundamental
para guardar a memória dos acontecimentos do século XVIII.

La literatura del siglo XIX se mueve en un continuo forcejeo entre


tradición e innovación. La cuestión sobre su paternidad o filiaciones
genéricas es un tema antiguo y de difícil aproximación. Sin embargo,
en los últimos años, nuevos y originales trabajos de crítica histórica
colonial nos han proporcionado nuevas lecturas para estos textos
(OPERÉ, 1996, s.p.).

As crônicas, cartas e documentos dos conquistadores darão lugar a novos


escritores repletos de sentimentos nacionalistas e uma diversificação de estilos e
gêneros literários. Solidificam na memória dos leitores também aqueles escritores
que se utilizaram desses gêneros para sua atuação política, como é o caso de
Simon Bolívar no período anterior.

Os gêneros literários europeus cruzaram lentamente o Atlântico e se


instalaram em terras hispano-americanas, trazendo novidades literárias que
renovaram as letras.

119
UNIDADE 2 | PANORAMA DA LITERATURA HISPANO-AMERICANA DOS SÉCULOS XVIII E XIX

NOTA

A Geração do 37 foi o primeiro movimento considerado intelectual do século


XIX e tinha como objetivo a busca da afirmação de uma identidade nacional. Aconteceu na
Argentina e envolveu diversos escritores.

En el plano cultural, como relevo de la generación rivadaviana o


unitaria, se ha conformado la llamada Generación del '37, considerada
el primer movimiento intelectual en busca de una identidad nacional.
Sus integrantes más reconocidos son Esteban Echeverría, Juan Bautista
Alberdi, Juan María Gutiérrez, Vicente Fidel López, José Mármol y Félix
Frías (TERÁN, 2007, p. 13).

3 O ROMANTISMO
O Romantismo surgiu na Europa no final do século XVIII e na América se
desenvolveu a partir do século XIX. De acordo com Aguiar e Silva (1979, p. 213):

A doutrina romântica acerca dos gêneros literários é multiforme e, por


vezes, contraditória. Não encontramos uma solução unitária, embora
se possa apontar como princípio comum a todos os românticos a
condenação da teoria clássica dos gêneros literários, em nome da
liberdade e da espontaneidade criadoras, da unicidade da obra literária
etc. [...] Verifica-se, na verdade, que alguns românticos buscaram
estabelecer novas teorias dos gêneros literários, fundamentando-
se não em elementos externos e formalistas, mas em elementos
intrínsecos e filosóficos.

Ao contrário do Neoclassicismo, o Romantismo escreve sobre os


sentimentos, a liberdade de expressão, sem ser conduzido por uma lógica
extremamente racional, mas por permitir uma reflexão filosófica a respeito de
temas variados. Obras como Os Miseráveis, de Victor Hugo, e Os sofrimentos do
Jovem Werther (1774), de Goethe, são exemplos europeus de obras escritas sob a
inspiração do Romantismo.

DICAS

Uma leitura fundamental para entender a teoria romântica é o texto Prefácio


de Cromwell (1827), de autoria de Victor Hugo. Neste texto o autor faz uma defesa do drama
romântico e apresenta uma exposição desde o drama grego, Homero, até o século XIX.

FONTE: HUGO, Victor. Do Grotesco e do Sublime. Tradução do “Prefácio de Cromwell".


Tradução e notas de Celia Berretini. São Paulo: Editora Perspectiva, s.d. https://bit.ly/2xiE0bd.
Acesso em: 19 set. 2018.

120
TÓPICO 3 | A LITERATURA HISPANO-AMERICANA DO SÉCULO XIX

No Romantismo, o escritor busca, em temas como tradições, temas


nacionais populares, a composição de suas obras. Por isso, o leque de obras que
se inscrevem no romantismo é variado.

Nas Américas terá representantes que irão escrever utilizando elementos


hispano-americanos para o fundo de suas histórias. “La literatura romántica, en
particular la poesía, creó figuras idealizadas de los nativos que tenían poco en
común con sus contrapartidas del pasado o de esa misma época” (GONZÁLEZ
ECHEVARRÍA, 2011, p. 212). Os autores começam a olhar seu entorno e publicam
obras com personagens idealizados, essas primeiras obras, redigidas a partir do
local, do latino-americano ao longo do tempo, se tornaram canônicas nas letras
hispano-americanas, como reflexo de uma sociedade entre o colonial e a nova
fase de independência vivida pelos habitantes.

Nas Américas, o Romantismo terá em Esteban Echeverría um referencial.


Em La Cautiva, sua obra mais representativa, são observados os elementos do
Romantismo, porque incluem o sentimento nacionalista e emancipador, muito
próprio desta época. Mais adiante você lerá especificamente sobre esta obra.

O Romantismo atravessa o Atlântico anos depois de ter iniciado na


Europa, principalmente na região rio-platense, onde irá se desenvolver mais, terá
uma gama de escritores que praticam o estilo.

Cabe reforçar que o romanticismo rio-platense se faz mais forte entre os


fazendeiros e o espírito de revolução toma conta dos países, principalmente no
interior. A má situação econômica e a pouca valorização dos produtos vindos
do interior acentuam a busca de um modelo de gestão que permitisse a ideia
de federalismo, próprio dos Estados Unidos da época. O militar Dorrego, por
exemplo, que chegou a ser governador de Buenos Aires, mesmo defendendo
as ideias norte-americanas e do voto qualificado (dos letrados, pais de família e
homens), tem apoio das massas e acaba por ser assassinado pelos militares.

Em 1832, há diferentes movimentos de oposição na Argentina, a maioria


integrada por jovens com pauta de revolução e lutas já em um ambiente romântico
e mais nacionalista. Há frequentes discussões e união entre a arte e a vida para
refletir sobre o rumo do país, e uma forma de utilizar a linguagem a favor das
lutas é o estilo literário. Nesta mesma época, volta do exílio Echeverría, que em
seus escritos utiliza os textos jornalísticos para se aproximar dos ideais e das
correntes filosóficas.

Outro ponto a ser considerado sobre a literatura argentina, que teve


grande relevância nos textos rio-platenses, é a característica dos românticos
argentinos. Lembrando aqui que estamos tratando de um movimento literário
que refletia a literatura nacional argentina de forma crítica, por isso vai além da
visão do mundo da época. Defendia-se, inclusive, que se deveria usar a cultura e
as tradições para escrever algo, mas algo diferente aos modelos predeterminados,

121
UNIDADE 2 | PANORAMA DA LITERATURA HISPANO-AMERICANA DOS SÉCULOS XVIII E XIX

embora a América da época ainda praticasse os modelos de pensamento europeus.


E justamente a ideia de nacionalidade e o espírito (tensão entre espiritualidade e
positivismo, corpo e alma) são as características mais marcantes.

Além de Esteban Echeverría, se destacaram Juan Bautista Alberdi, Juan


María Gutiérrez, Vicente Fidel López, José Mármol e Félix Frías, porém, de
acordo com Terán (2007, p. 14), tiveram a influência de Echeverría: “[...] resultaron
deudores de Echeverría, quien retornó de Francia en 1830 con las novedades del
romanticismo, movimiento que llevaba cincuenta años de existencia en Europa,
donde su predominio abarcará aproximadamente el período que va de 1770 a
1850”.

Outros destaques são Domingo F. Sarmiento, Estanislao del Campo, Lúcio


V. Mansilla, Concolorcorvo, José María Ramos Mejía, Juan Moreira y Eugenio
Cambaceres.

Na região do México, o Romantismo também se manifestou, mas nesse


período os mexicanos sofreram com guerras externas e uma civil. Um primeiro
representante foi José María Heredia e em Cuba foi Gabriel de la Concepción
Valdés (1809-1844), o mais conhecido e precursor de um gênero nativista.

Por isso, para o estudo deste tópico serão apresentados apenas alguns
escritores de maior relevância no movimento.

DICAS

O portal del Centro Internacional de Estudios sobre Romanticismo Hispánico


difunde pesquisas realizadas por intelectuais que estudam esta corrente estética. O Centro
foi fundado no ano de 1979 à raiz de um congresso organizado pelo professor Caldera,
da Universidade de Génova, configurado por professores e pesquisadores pertencentes a
diversas universidades americanas e europeias. O portal inclui todas as atas dos congressos
realizados até o momento. Você pode conferir em: https://bit.ly/2E7SLlc.

3.1 ESTEBAN ECHEVERRÍA


Nascido em Buenos Aires, Esteban Echeverría (1805-1851) pronunciou
a célebre frase No se puede ser independiente en política y colono en literatura, o
que demonstra a preocupação do autor em fomentar uma literatura presente
na América com elementos que refletissem o momento pós-independência
vivenciado por ele. Os círculos intelectuais de letras e filosofia foram os grupos
que mais difundiram a consolidação das independências e a descolonização
dentro do momento histórico e social referente à época em que viviam.

122
TÓPICO 3 | A LITERATURA HISPANO-AMERICANA DO SÉCULO XIX

A obra de Echeverría, que se tornou um ícone nos movimentos do


Romantismo, será La Cautiva, poema publicado em 1837 apenas depois de sete
anos do retorno dele da Europa.

O poema épico narra a história de um casal de brancos em que o soldado


Brian e sua esposa Maria são raptados por um malón.

NOTA

Malón ou malones: se chamava o ataque surpresa feito por parte de grupos


indígenas como tática para atacar e saquear um lugar. Roubavam animais, alimentos e
sequestravam mulheres, chamadas de cautivas.

FIGURA 7 – EL MALÓN (1845) POR MAURÍCIO RUGENDAS

FONTE: <https://bit.ly/2N2CUFr>. Acesso em: 20 set. 2018.

O poema permite toda uma análise e comentários textuais, desde os


nomes próprios até as ideias implícitas de homem branco como o bem e o índio
como o malvado. As virtudes são exaltadas, como a de Maria, por ela guardar a
honra mesmo nos momentos sombrios, e mostra um marido envergonhado por
não ter conseguido defendê-la dos seus sequestradores. Eles sofrem penúrias por
parte da tribo, ali retratada como desumana, e fazem de tudo para escapar de
seus raptores e da própria morte.

O estereótipo de homem civilizado e o homem selvagem está presente na


obra, mas também os estereótipos românticos. Contudo, o modelo da mulher
romântica não é tão estereotipado. Sim, Echeverría a evoca, de certa forma, para
um papel mais completo e há uma certa crítica a partir dos papéis masculinos
(Bello e Belgrano como duplo agente, questões e ambivalência nos personagens,
como o pai da vítima etc.).

123
UNIDADE 2 | PANORAMA DA LITERATURA HISPANO-AMERICANA DOS SÉCULOS XVIII E XIX

La Cautiva apresenta costumes e paisagens naturais (tentativa de


originalidade ao descrever abundantemente a natureza e aproveitar uma
linguagem mais visual), como também descreve muito da tradição popular da
Argentina na época sobre o homem branco e o gaucho (aquele que é marginalizado
pelo homem branco e visto com maus olhos pelo índio) e predominância da morte
como solução de problemas.

E
IMPORTANT

Optamos por deixar o termo em espanhol gaucho para fazer referência ao


principal personagem dessa época e da literatura gauchesca argentina.

Um fato interessante a ser observado na obra é o prólogo que adjetiva


de ficção calculada, por que justifica que não se trata apenas de uma obra de
entretenimento, mas ressalta que deve ser lida como se fosse uma novela histórica.

“La Cautiva”, es un soplo admirable del romanticismo implantado en


la vieja España por don José de Espronceda, producto a su vez del
romanticismo inglés, con lord Byron a la cabeza, y de Francia, con
las evocaciones de ultratumba de Alfonso de Lamartine; animando
el corazón soñador de Echeverría, ansioso de su patria joven, no
fuera a la zaga del sentimiento peninsular, pero que aportara en su
estructuración la vitalidad del alma argentina, y el panorama amplio
y armonioso de la Pampa. ‘La Cautiva’, es una de las obras más
puras y más firmes de la lírica argentina del pasado, presentándonos
un verdadero valor, firme a pesar del tiempo transcurrido desde su
publicación, porque fue animado de un soplo vital, de un sentimiento
en el alma de todos, porque era un reflejo de nuestro cancionero, la
voz de la tierra, nuestra madre sublime, que recogerá nuestras últimas
ofrendas y esperanzas (ECHEVERRÍA, 1957, p. 7).

Veja a seguir uma pintura de Rugendas: El Rapto de la Cautiva, de 1845, feita


logo após o lançamento de La Cautiva, e perceba como diversas artes dialogam
entre si e reproduzem os rasgos do Romantismo nesta ilustração do ataque de
um malón e o sequestro de uma mulher. Observe as cores da pintura, a simetria
das linhas da cena, as expressões faciais, assim como o indígena perseguido pelos
homens que galopam em seu encalço:

124
TÓPICO 3 | A LITERATURA HISPANO-AMERICANA DO SÉCULO XIX

FIGURA 8 – EL RAPTO DE LA CAUTIVA (1845). AUTOR: MAURÍCIO RUGENDAS


(ÓLEO SOBRE TELA, 44,5 X 53,5 CM)

FONTE: <http://www.cervantesvirtual.com/portales/jose_marmol/imagenes_contexto/imagen/
imagenes_contexto_06_rugendas_rapto_cautiva/>. Acesso em: 20 set. 2018.

Observe como no fragmento do poema La Cautiva são apresentadas as


características do movimento romântico que se desenvolveu na região rio-
platense e que Echeverría soube utilizar em sua obra. Perceba durante a leitura
os elementos que compõem um poema épico, e ambientado em um espaço hostil
como o deserto, os acampamentos indígenas e a insegurança e sacrifícios pessoais
diante da morte do ser amado.

125
UNIDADE 2 | PANORAMA DA LITERATURA HISPANO-AMERICANA DOS SÉCULOS XVIII E XIX

QUADRO 2 – FRAGMENTO DO POEMA LA CAUTIVA, DE ESTEBAN ECHEVERRÍA

La Cautiva velando a tu lado estoy.


[...] Nada tema tu congoja.
Allí está; —silenciosa ella, —Y enajenada se arroja
como tímida doncella, de su querido en los brazos,
besa su entreabierta boca, le da mil besos y abrazos,
cual si dudara le toca repitiendo: Brian, mi Brian,
por ver si respira aún. La alma heroica del guerrero
Entonces las ataduras, siente el gozo lisonjero
que sus carnes roen duras, por sus miembros doloridos
corta, corta velozmente, correr, y que sus sentidos
con su puñal obediente, libres de ilusión están,
teñido en sangre común. Y en labios de su querida
Brian despierta, —su alma fuerte, apura aliento de vida,
conforme ya con su suerte, y la estrecha cariñoso
no se conturba ni azora; y en éxtasis amoroso
poco a poco se incorpora, ambos respiran así.
mira sereno, y cree ver Mas, súbito él la separa,
un asesino; —echan fuego como si en su alma brotara
sus ojos de ira; más luego horrible idea, y la dice:
se siente libre, y se calma; —María, soy infelice,
y dice:—¿Eres alguna alma ya no eres digna de mí,
que pueda y deba querer? Del salvaje la torpeza
¿Eres espíritu errante, habrá ajado la pureza
ángel bueno o vacilante de tu honor, y mancillado
parto de mi fantasía? tu cuerpo santificado
—Mi vulgar nombre es María, por mi cariño y tu amor,
ángel de tu guarda soy; ya no me es dado quererte.
y mientras cobra pujanza, — Ella le responde: —Advierte,
ebria la feroz venganza que en este acero está escrito
de los bárbaros, segura, mi pureza y mi delito,
en aquesta noche obscura, mi ternura y mi valor. [...]
FONTE: <https://bit.ly/2D88zFL>. Acesso em: 4 dez. 2018.

DICAS

Você quer saber como termina a história de La Cautiva? Então leia a obra
completa em:

ECHEVERRÍA, José Esteban. La cautiva. Alicante: Biblioteca Virtual Miguel de Cervantes;


Santiago de Compostela: Universidad de Santiago de Compostela, 2010. https://bit.ly/2D88zFL.
Acesso em: 4 dez. 2018.

126
TÓPICO 3 | A LITERATURA HISPANO-AMERICANA DO SÉCULO XIX

Outro importante texto de Esteban Echeverría é El Matadero, que você


verá mais adiante na reflexão sobre relatos militares no interior.

3.2 MARIANO MELGAR


Mariano Lorenzo Melgar Valdivieso (1790-1815) nasceu em Arequipa,
Peru, e contribuiu na busca de uma literatura hispano-americana, principalmente
andina.

FIGURA 9 – MARIANO MELGAR

FONTE: <https://bit.ly/2QKIhwf>. Acesso em: 20 set. 2018.

Melgar foi escritor e tornou-se conhecido como um dos românticos mais


proeminentes nascido no Peru. Escreveu fábulas, odes, mas principalmente
escreveu e, ao mesmo tempo, tornou mais conhecida a poesia yaraví, tipo de
poesia andina. “Melgar descubre el yaraví, (canción que mitiga los duelos del
amor) al relacionarse con hombres humildes de esa zona, que entonaban estas
canciones populares y de origen prehispánico” (GAMERO CANO, 2013, p. 13).

127
UNIDADE 2 | PANORAMA DA LITERATURA HISPANO-AMERICANA DOS SÉCULOS XVIII E XIX

QUADRO 3 – YARAVÍ
¡Ay, amor!, dulce veneno,
ay, tema de mi delirio, ¡Ay, amor! glorioso infierno
solicitado martirio y de infernales injurias,
y de todos males lleno. león de celosas furias,
disfrazado de cordero.
¡Ay, amor! lleno de insultos,
centro de angustias mortales, ¡Ay, amor!, pero ¿qué digo,
donde los bienes son males que conociendo quién eres,
y los placeres tumultos. abandonando placeres.
soy yo quien a ti te sigo?
¡Ay, amor! ladrón casero
de la quietud más estable.
¡Ay, amor, falso y mudable!
¡Ay, que por causa muero!
FONTE: Lama (2007, p. 197)

DICAS

Saiba mais sobre o Yaraví, um gênero da poesia andina, procurando vídeos no


YouTube ou lendo a letra de alguns poemas, disponíveis em:

ZARDOYA, Concha. Yaraví de las desdichas. In: Cuadernos Hispanoamericanos. Homenaje


a César Vallejo, v. 2, n. 456-457, junio-julio 1988, p. 634-638. Madrid: Instituto de Cooperación
Iberoamericana. http://www.cervantesvirtual.com/nd/ark:/59851/bmcj10k4. Alicante:
Biblioteca Virtual Miguel de Cervantes, 2009. Acesso em: 20 set. 2018.

Também foi poeta e militar, se envolveu nas campanhas de guerra


independentistas. Preso, morre fuzilado em 1815, aos 24 anos, pelo exército
espanhol, porque se recusou a jurar devoção à Coroa espanhola. Passou para o
panteão dos heróis da independência peruana, mas o destaque e a valorização
dado ao yaraví foi a sua maior contribuição literária.

DICAS

Saiba mais sobre o poeta Mariano Melgar Valdivieso. Acesse https://www.


youtube.com/watch?v=rNLDYMzpaj0.

128
TÓPICO 3 | A LITERATURA HISPANO-AMERICANA DO SÉCULO XIX

Os gêneros autóctones também fazem parte da literatura hispano-


americana e pouco se estuda sobre eles. Por isso, se torna importante saber a
origem para entender como se relaciona na prática o encontro de culturas tão
diferentes como a andina e a espanhola. A forma poética dos yaravíes expressos
em língua espanhola permite uma leitura a partir de um espaço comum, a arte, se
relacionam e demonstram a possibilidade do diálogo.

3.3 JOSÉ MÁRMOL


José Mármol (1817-1871), argentino, escreveu o romance Amalia (1855). A
obra foi considerada o primeiro romance publicado na região do Rio de la Plata.
Publicado pela primeira vez em Montevidéu, Uruguai, em 1851, semanalmente
no jornal La Semana de Montevideo, e em livro em Buenos Aires, na Argentina, em
1855, com oito capítulos a mais.

José Mármol é tido como o escritor que fez oposição ferrenha ao governador
de Buenos Aires, Juan Manuel de Rosas (1793-1877), político e militar, que, como
você deve ter observado, perseguiu ferozmente a seus inimigos políticos, entre
eles, escritores de renome.

No poema Canto do Peregrino se observam os ideais românticos em um


texto que fala dos tempos de ditadura de Rosas e que ele vivenciou e sempre
denunciou em suas obras literárias:

Venid; el arpa que tomé en mis manos,


cuando del Plata abandoné la arena,
tiene una maldición a los tiranos
que en sus bordonas áspera resuena,
y una voz Libertad que a mis hermanos
de sacro fuego el corazón les llena,
porque ellos como yo secan el llanto
con el calor del patriotismo santo.
(Cantos del Peregrino)

DICAS

Veja o filme Amalia (1936), da obra de José Mármol, realizado na Argentina, de


M. Barth, com Hermínia Franco e Floren Delbene.
Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=YpgoaHFgAls.

129
UNIDADE 2 | PANORAMA DA LITERATURA HISPANO-AMERICANA DOS SÉCULOS XVIII E XIX

A escrita de Mármol irá fixar o sul das Américas como um local em que o
Romantismo se desenvolveu com mais força e o uso de elementos locais como a
paisagem, tema e protagonista dos romances escritos.

3.4 DOMINGO F. SARMIENTO


Domingo Faustino Sarmiento Albarracín nasceu em 1811 em San Juan,
Argentina, e faleceu em Assunção, no Paraguai, em 1888. Foi escritor, político,
jornalista e professor. Ficou marcado pela escrita da obra Civilización y barbarie.
Vida de Juan Facundo Quiroga y aspecto físico, costumbres y hábitos de la República
Argentina, publicado em 1845. Uma observação importante é que o subtítulo,
Facundo, acaba sendo muitas vezes usado como o título da obra, inclusive na
Argentina.

Sarmiento é considerado parte do movimento de intelectuais, conhecido


como a Geração do 37, que procurava afirmar uma identidade nacional, mas consta
que “Domingo Faustino Sarmiento será un componente alejado espacialmente del
grupo, dado que sólo conocerá la ciudad de Buenos Aires en 1852, en el momento
del derrocamiento de Rosas” (TERÁN, 2007, p. 13). Como nasceu no interior e
posteriormente se exilou no Chile, onde escreveu Facundo, irá para Buenos Aires
muito depois de Rosas ter sido deposto.

A escrita de Sarmiento alterna biografia e romance com críticas políticas.


Utiliza-se da improvisação (há um erro, mas segue escrevendo para justificar
o erro) e marcas de oralidade (sabe falar, usar a palavra, o bom uso dela para
convencer).

De acordo com a estética Romântica, Sarmiento escreve com sentimento


e exagero nos fatos, mas o respalda com uma escrita histórica, quase biográfica.
Com seu livro Facundo, tenta mostrar a realidade argentina, onde a figura de
Facundo se converte em um mito (representativo de um momento histórico, mas
que se perde no decorrer da situação).

Piglia (2000, s.p.) se refere ao Facundo como “[...] un libro de ficción escrito
como si fuera un libro verdadero. En ese desplazamiento se define la forma del
libro, quiero decir que el libro le da forma a ese desplazamiento”. O autor ainda
ressalta que Facundo “es un punto de referencia esencial. La combinación de
modos de narrar y de registros que tiene el libro. Esa forma inclasificable. Se
inaugura ahí una gran tradición de la literatura argentina” (PIGLIA, 2000, s.p.).

Ao escrever, Sarmiento remete ao estilo jornalístico, coerente por ser


ele um jornalista, mas em outros momentos é uma narrativa épica, devido à
complexidade de temas que abrange, mas ele era contra toda tradição clássica. De
acordo com Jozef (2005, p. 59), “suas maiores preocupações literárias consistiram
no desejo de originalidade e atendimento à realidade americana, com um sentido

130
TÓPICO 3 | A LITERATURA HISPANO-AMERICANA DO SÉCULO XIX

orgânico da evolução histórica continental”. Por não fazer parte de uma elite
intelectual, ser autodidata em sua própria educação e ter sido obrigado a ir para o
exílio, Sarmiento foi um dos maiores pensadores e escritores pós-independência
e que se dedicaram a explicar a influência do meio social nos fatos históricos
da América espanhola. Talvez, por isso, utiliza-se de recursos literários como a
ironia. E sem deixar de mencionar, é também informativo, muitas vezes, devido
ao ensino que demonstra sobre temas genuinamente argentinos.

Para entender mais sobre as ideias de civilização e barbárie apresentadas


por Sarmiento (1999, p. 60), leia este fragmento da obra Facundo (1845) e observe
a linguagem da narrativa, tanto no cotidiano como nos espaços em que escritor,
personagem e leitor se encontram e como são descritos os personagens históricos
no excerto:

La vida de los campos argentinos, tal como la he mostrado, no es un


accidente vulgar: es un orden de cosas, un sistema de asociación característico,
normal, único, a mi juicio, en el mundo, y él solo basta para explicar toda nuestra
revolución. Había, antes de 1810, en la República Argentina, dos sociedades
distintas, rivales e incompatibles, dos civilizaciones diversas: la una, española,
europea, culta, y la otra, bárbara, americana, casi indígena; y la revolución de
las ciudades sólo iba a servir de causa, de móvil, para que estas dos maneras
distintas de ser de un pueblo se pusiesen en presencia una de otra, se acometiesen
y, después de largos años de lucha, la una absorbiese a la otra. He indicado la
asociación normal de la campaña, la desasociación, peor mil veces que la tribu
nómade; he mostrado la asociación ficticia, en la desocupación; la formación
de las reputaciones gauchas: valor, arrojo, destreza, violencias y oposición a la
justicia regular, a la justicia civil de la ciudad. Este fenómeno de organización
social existía en 1810, existe aún, modificado en muchos puntos, modificándose
lentamente en otros e intacto en muchos aún. Estos focos de reunión del gauchaje
valiente, ignorante, libre y desocupado estaban diseminados a millares en la
campaña. La revolución de 1810 llevó a todas partes el movimiento y el rumor
de las armas. La vida pública, que hasta entonces había faltado a esta asociación
áraberromana, entró en todas las ventas, y el movimiento revolucionario trajo,
al fin, la asociación bélica en la montonera provincial, hija legítima de la venta
y de la estancia, enemiga de la ciudad y del ejército patriota revolucionario.
Desenvolviéndose los acontecimientos, veremos las montoneras provinciales
con sus caudillos a la cabeza; en Facundo Quiroga, últimamente triunfante en
todas partes, la campaña sobre las ciudades, y dominadas éstas en su espíritu,
gobierno, civilización, formarse al fin el Gobierno central, unitario, despótico,
del estanciero don Juan Manuel Rosas, que clava en la culta Buenos Aires el
cuchillo del gaucho y destruye la obra de los siglos, la civilización, las leyes y
la libertad.

131
UNIDADE 2 | PANORAMA DA LITERATURA HISPANO-AMERICANA DOS SÉCULOS XVIII E XIX

DICAS

Você pode ler a obra Facundo, de Sarmiento, acessando o seguinte link: http://
www.hacer.org/pdf/Facundo.pdf.

Facundo também foi entendido pela crítica com um ensaio que trata a
oposição civilização e barbárie. É uma oposição temporal, que faz muito mais
referência à Idade Média que ao século XIX.

Civilização é entendida como a luz da razão, próprios do pensamento


europeu. Embora a Espanha seja considerada a parte bárbara da Europa, se
comparada a outros países, os nascidos na América são considerados então
duplamente bárbaros, por serem descendentes do bárbaro europeu (espanhóis)
e por serem americanos. A contradição de tudo está em caracterizar Buenos
Aires como a mais civilizada porque obteve mais influência europeia, inclusive
da Itália. Esse pensamento está presente no imaginário popular ainda. E quem
seria, então, a barbárie da América? O ser irracional, o indígena que é associado à
morte, ao ódio e à falta de educação culta europeia. Por conta disso, o gaucho vai
ser considerado também um bárbaro porque ele é descendente deste índio.

4 OS RELATOS DAS EXPEDIÇÕES MILITARES AO INTERIOR


DO PAÍS
As imigrações começam a se tornar objeto de estudo por parte de governos,
principalmente para deslocar os estrangeiros nos países e também para saber
sobre os povos originários e sua forma de vida.

Algumas expedições são realizadas para os interiores do continente em busca


de informações. São amplamente documentadas as incursões organizadas pelo
governo argentino; discutindo o tema de civilização e barbárie, dois termos antitéticos
propostos por Sarmiento, em artigo publicado pelo jornal El Mercúrio, em 7 outubro
de 1842, termos que podem ser encontrados em textos anteriores dele.

Viajeros latinoamericanos como Lucio Mansilla en Argentina y Cirilo


Villaverde en Cuba, por dar sólo dos ejemplos, también escribieron
sobre los no europeos en el Nuevo Mundo; el primero sobre los indios
y el segundo sobre los negros en los ingenios azucareros de Cuba. No
obstante, estos informes no se escribieron en aras de incorporar estas
poblaciones a una cultura o un sistema de gobierno más abiertos. Por
el contrario, y como vimos en Sarmiento y Euclides da Cunha, estos
informes a veces estaban impregnados de un "racismo científico" que
condenaba la influencia nociva que las razas no europeas tenían en
el progreso moral, intelectual, cultural y material de América Latina
(GONZÁLEZ ECHEVARRÍA, 2011, p. 211-212).

132
TÓPICO 3 | A LITERATURA HISPANO-AMERICANA DO SÉCULO XIX

A partir dessas viagens, surgem as obras caracterizadas pelo gênero relato


de viagem; e que irá não somente colaborar com dados, estatísticas, descrições,
mas também em seu bojo apresentam uma nota discriminatória, até propriamente
racista: “El deseo de modernizar alejó a las repúblicas del pasado indio y las puso
en contra del presente indio” (GONZÁLEZ ECHEVARRÍA, 2011, p. 212) e que
fixou estereótipos sociais e culturais principalmente sobre a população indígena.

A estes relatos se forma uma oposição que será a “nossa e a deles” e não se
fala em “nós”, mas se instala a ideia do bárbaro (a pessoa indígena, negra) frente
ao civilizado (pessoa branca), ou “a civilização e a barbárie”. Sobre estas ideias
Sarmiento desenvolveu a narrativa em Facundo.

A falta de alteridade por parte destes escritores era influência do momento


histórico em que viviam, e por muitas décadas e por não dizer séculos, também
iriam influenciar seus leitores. Um exemplo objetivo na obra de Lúcio V. Mansilla
(1831-1913), Una Excursión a los Indios Ranqueles (1870), é a forma descritiva de
suas percepções, e as decisões que toma sobre o uso da língua castelhana em
detrimento da língua autóctone, dentre elas, por exemplo, conta como renomear
as coisas, pessoas, situações etc. Para o castelhano é aproximar o bárbaro da
civilização e, mais uma vez, a língua se torna um fator de dominação:

Mansilla renombra las cosas que ya tenían un nombre en lengua


indígena; se ve en la necesidad de traducir a su amigo Santiago los
nombres de los lugares. Este acto de renombrar tiene implicaciones en
el plano de lo simbólico ya que la conquista no sólo se ejerce sobre el
espacio sino también sobre el bien cultural más preciado por cualquier
comunidad, que es la lengua. Cuando Mansilla traduce los nombres
originales al castellano los vuelve a bautizar, ejerce una violencia en el
plano de lo lingüístico despojando a esos lugares de reminiscencias de
sus antiguos dueños (POLOTTO SABATÉ, 2011, p. 574).

Dentro do contexto histórico e social da época se torna nítida a formação de


um pensamento de valorização unilateral de uma cultura e língua em detrimento
do outro. Este outro, neste caso, era o antigo dono da terra, que após 200 anos
continua despojado de sua língua e dignidade.

Veja este fragmento de Una Excursión a los Indios Ranqueles, publicada em


1870, observe a forma descritiva de suas percepções relatadas em sua viagem e
compiladas a partir de seus diários. Perceba que questões e reflexões da cultura
ranquelina são contadas através das anedotas de Mansilla (2011, s.p.):

Una Excursión a los Indios Ranqueles


XXXII

El espíritu maligno se cernía sobre ella. Yo era emperador de los


ranqueles. Hacía mi entrada triunfal en Salinas Grandes.

133
UNIDADE 2 | PANORAMA DA LITERATURA HISPANO-AMERICANA DOS SÉCULOS XVIII E XIX

Las tribus de Calfucurá me aclamaban. Mi nombre llenaba el desierto


preconizado por las cien leguas de la fama. Me habían erigido un gran arco
triunfal. Representaba un coloso como el de Rodes. Tenía un pie en la soberbia
cordillera de los Andes, otro en las márgenes del Plata. Con una mano empuñada
una pluma deforme de ganso, cuyas aristas brillaban como mostacilla de oro,
chispeando de su punta letras de fuego, que era necesario leer con la rapidez
del relámpago para alcanzar a descifrar que decían: mené, thekel, phare. Con
la otra blandía una espada de inconmensurable largor, cuya hoja de bruñido
acero resplandecía como meteoro, centelleando en ella diamantinas letras que
era menester leer con la rapidez del pensamiento para adivinar que decían:
In hoc signo vinces. Por debajo de aquel monumento de egipcia estructura y
proporciones, capaz de provocar la envidia sangrienta, la venganza corsa y
el odio eterno de un Faraón, desfilaba como el rayo, tirada por veinte yuntas
de yeguas chúcaras, una carreta tucumana, cubierta de penachos, de crines
caballares de varios colores y en cuyo lecho se alza un dosel de pieles de carnero.

En él iba sentado un mancebo de rostro pintado con carmín. ¡Era yo!


Manejaba la ecuestre recua con un látigo de cháguara que no tenía fin, al grito
infernal de: ¡pape satán! ¡pape satán alepe! Mi traje consistía en un cuero de
jaguar; los brazos del animal formaban las mangas, las piernas, los calzones, lo
demás cubría el cuerpo, y, por fin, la cabeza con sus colmillos agudos adornaba
y cubría mi frente a manera de antiguo capacete.

La cola no sé qué se había hecho. Un ser extraño, invisible para todos,


menos para mí, quería ponerme una paja. Yo le miraba como diciéndole: basta
de atavíos, y él vacilaba y me seguía sin saber qué hacer.

Una escolta formada en zigzags, me precedía, cubriéndome la retaguardia.


Indígenas de todas las castas australes se veían allí: ranqueles, puelches,
pehuenches, piscunches, patagones y araucanos. Los unos iban en potros bravos,
los otros en mansos caballos, éstos en guanacos, aquéllos en avestruces, muchos
a pie, varios montados en cañas, infinitos en alados cóndores.

Sus armas eran lanzas y bolas; sus trajes mixtos, a lo gaucho, a la francesa,
a la inglesa, a lo Adán los más. Cantaban un himno marcial al son de unas flautas
de cañuto de grueso carrizo, y las palabras Lucius Victorius Imperator, resonaban
con fragor en medio de repetidas ¡¡¡ba-ba-ba-ba-ba-ba-ba!!!

Nuevo Baltasar, yo marchaba a la conquista de una ciudad poderosa,


contra el dictamen de mis consejeros, que me decían: Allí no penetrarás
victorioso jamás; porque sus calles están empedradas con enormes monolitos y
cubiertas de pantanos, por donde es imposible que pase tu carreta.

Tenaz, como soy en sueños, no quería escuchar la voz autorizada de


mis expertos monitores. Me había hecho aclamar y coronar por aquellas gentes
sencillas, había superado ya algunos obstáculos de mi vida; ¿por qué no había
de tentar la empresa de luchar y vencer una civilización decrépita?

134
TÓPICO 3 | A LITERATURA HISPANO-AMERICANA DO SÉCULO XIX

Por otra parte, yo había nacido en esa egregia ciudad y ella iba a
enorgullecerse de verme llegar a sus puertas, no como Aníbal a las de Roma,
sino cual otro valiente Camilo.

FONTE: <http://www.cervantesvirtual.com/nd/ark:/59851/bmcn8760>. Acesso em: 19 set. 2018.

Perceba também como Mansilla centraliza no homem branco o relato,


embora tenha o índio (rechaçado, mas o tem) compondo o relato. Ainda assim,
para sua época, dá voz e defende este tipo de texto, embora o coloque como
selvagem, assim como aos negros e os paisanos-gauchos.

DICAS

O tema pode ser ampliado com as leituras de Todorov (1993) e sua obra A
conquista da América. A Questão do Outro, quando o autor discute sobre não se levar em
conta o outro.

Dos precursores do Romantismo surgiram múltiplas narrativas que a seu


modo influenciaram cada estilo. Europa ainda influenciará muito a literatura
hispano-americana. Um fator de influência foi quando o Positivismo europeu
se desenvolveu e começou a tomar o lugar da metafísica, seja na literatura ou
filosofia. Os escritores hispano-americanos fusionam em seus textos uma estética
que iguala a realidade, em que as narrativas deixam o leitor na dúvida se a
leitura era de fato real ou ficção. Nasce, assim, um estilo em prosa e verso, que se
diferencia por inserir elementos da cultura e tradições locais e ainda oferecer uma
verossimilitude, o que às vezes deixa o leitor incrédulo sobre a natureza estética
da história.

5 O REALISMO
O Realismo foi um gênero textual caracterizado por romper com o
Romantismo, tudo era escrito buscando uma verossimilhança, o interesse pela
sociedade e uma sobriedade na narrativa.

Pouco tempo depois do Realismo, ainda no século XIX, surgiram outros


movimentos, conhecidos como Costumbrismo (1875), em que são retratados
personagens simplórios, os diálogos são populares e os personagens são descritos
a partir dos costumes, o que denota uma marcada diferença entre classes sociais.
Também o Naturalismo retratou na literatura, a partir de 1888, a primazia da ciência
e das explicações lógicas, assim como se interessou pelos problemas sociais.

135
UNIDADE 2 | PANORAMA DA LITERATURA HISPANO-AMERICANA DOS SÉCULOS XVIII E XIX

Um autor fundamental foi Esteban Echeverría, que você já conheceu na


seção do Romantismo, ele também escreveu desde uma perspectiva realista.
Outros textos e autores também são canônicos do Realismo e são apresentados
aqui a partir de uma seleção, que deixou de fora outros que também merecem ser
estudados.

5.1 ESTEBAN ECHEVERRÍA


Outro importante texto de Esteban Echeverría é El Matadero, publicado
em 1871. É um relato breve com estética realista. Todos os escritos fazem alusão a
Rosas, um militar e ditador da época que causava protestos e descontentamentos.
Na obra é refletida a cultura da época.

O relato talvez não poderia se encaixar no gênero conto, porque a narrativa


não permite, e há vários estudos que analisam tal linguagem diferenciada que ele
traz, um misto de romantismo francês com realismo castelhano, mesclando ficção
e realidade até se transformar em documento político que retrata boa parte da
história argentina da época rosista.

El Matadero empieza a ser cuento a partir de un determinado momento


y previamente no lo es; es cuento en su totalidad pero no lo es en sus
partes, si cabe la escisión. ¿Qué es previamente? Echeverría lo dice de
algún modo: «A pesar de que la mía es historia no la empezaré por el
Arca de Noé y la genealogía de sus ascendientes...». Dejemos de lado la
doble ironía (por un lado respecto de los antiguos cronistas españoles
que se remontaban hasta el diluvio, por la otra al hecho de que se va a
tratar de una inundación) y permanezcamos en el ataque conceptual
de la frase, en la afirmación que bien puede no ser imputable al humor:
«la mía es historia». Parece entonces claro: lo que no es cuento en este
escrito es realidad; quizás sea ficción de realidad pero no es seguro que
la afirmación tenga ese sentido para Echeverría (JITRIK, 1971, s.p.).

Digamos que é um relato-denúncia dos tiranos e formadores da lei, no
qual Echeverría se contrapõe, trazendo suas ideias de um mundo sem exclusão
ou classes. Um mundo idealizado que tarda muito em se concretizar. Por tais
ideias, Echeverría teve que se mudar para Montevidéu, Uruguai, por um longo
tempo, e lá escreveu La insurrección del Sur e outras obras, como Dogma Socialista.

136
TÓPICO 3 | A LITERATURA HISPANO-AMERICANA DO SÉCULO XIX

DICAS

Para saber mais sobre o governo de Juan Manuel de Rosas, procure assistir
Camila (1984), filme baseado em uma história real que mostra o entorno social e cultural à
época do Romantismo.

Filme: Camila. Direção de Maria Luísa Bermberg. 1984. Disponível em: https://youtu.be/
cnAumCV-hMI

FIGURA 10 – RETRATO DE MARIA CAMILA O'GORMAN XIMÉNEZ (1827/1828-1848)

FONTE: <https://bit.ly/2QkgUYD>. Acesso em: 20 set. 2018.

Leia um fragmento de El Matadero, do texto de Echeverría, perceba as


características do Realismo e como foi ambientado na periferia de Buenos Aires e
com personagens locais:

[...]
El matadero de la Convalecencia o del Alto, sito en las quintas al Sud de
la ciudad, es una gran playa en forma rectangular colocada al extremo de dos
calles, una de las cuales allí se termina y la otra se prolonga hacia el Este. [...]
Estos corrales son en tiempo de invierno un verdadero lodazal en el cual los
animales apeñuscados se hunden hasta el encuentro y quedan como pegados
y casi sin movimiento. En la casilla se hace la recaudación del impuesto de
corrales, se cobran las multas por violación de reglamentos y se sienta el juez
del matadero, personaje importante, caudillo de los carniceros y que ejerce la
suma del poder en aquella pequeña república por delegación del Restaurador.
- Fáciles calcular qué clase de hombre se requiere para el desempeño de
semejante cargo. [..]

La sala de la casilla tenía en su centro una grande y fornida mesa de


la cual no salían los vasos de bebida y los naipes sino para dar lugar a las
ejecuciones y torturas de los sayones federales del Matadero. Notábase además
en un rincón otra mesa chica con recado de escribir y un cuaderno de apuntes
y porción de sillas entre las que resaltaba un sillón de brazos destinado para

137
UNIDADE 2 | PANORAMA DA LITERATURA HISPANO-AMERICANA DOS SÉCULOS XVIII E XIX

el Juez. Un hombre, soldado en apariencia, sentado en una de ellas cantaba


al son de la guitarra la resbalosa, tonada de inmensa popularidad entre los
federales, cuando la chusma llegando en tropel al corredor de la casilla lanzó a
empellones al joven unitario hacia el centro de la sala.

[...] - Silencio y sentarse -exclamó el Juez dejándose caer sobre su sillón.


Todos obedecieron, mientras el joven de pie encarando al Juez exclamó con voz
preñada de indignación:

- Infames sayones, ¿qué intentan hacer de mí?


- ¡Calma! - dijo sonriendo el juez-; no hay que encolerizarse. Ya lo verás.

El joven, en efecto, estaba fuera de sí de cólera. Todo su cuerpo parecía


estar en convulsión: su pálido y amoratado rostro, su voz, su labio trémulo,
mostraban el movimiento convulsivo de su corazón, la agitación de sus nervios.
Sus ojos de fuego parecían salirse de la órbita, su negro y lacio cabello se levantaba
erizado. Su cuello desnudo y la pechera de su camisa dejaban entrever el latido
violento de sus arterias y la respiración anhelante de sus pulmones. [...]

DICAS

Você pode ler o texto El Matadero por completo e saber o que aconteceu no
matadouro. Disponível em https://bit.ly/2OnJfQs.

Percebeu como o escritor descreveu o ambiente do matadouro? E a forma


como descreveu a raiva que o jovem unitário sentiu ao ser preso injustamente?
O texto se caracteriza por descrever da forma mais real possível uma cena, o
que permite ao leitor a confusão entre se o que está lendo é realidade ou ficção.
Obviamente é uma narrativa ficcional, porém com elementos apresentados que
correspondem a cenas reais da época em que o texto foi escrito.

6 A POESIA GAUCHESCA
A Gauchesca foi um movimento literário desenvolvido particularmente
na região do Rio de la Plata e fundamental na formação da nação argentina. Após
as guerras pela independência em 1810, quando o homem do campo e o homem
urbano lutaram lado a lado pelas terras, surgiram escritores que incluiriam as
façanhas do gaucho em poemas que imitavam a fala e o modo de vida dos gauchos.

138
TÓPICO 3 | A LITERATURA HISPANO-AMERICANA DO SÉCULO XIX

O primeiro a escrever temas gauchescos, de acordo com Jozef (2005), foi


Juan Gualberto Godoy (1793-1864). A obra escrita por ele de referência é Corro
(1820), um diálogo em que um gaucho fala da derrota da guerra em Salta.

Assim, a literatura divulgou uma cultura gauchesca desconhecida por boa


parte do público em geral. As narrativas gauchescas imortalizaram personagens
como Martín Fierro e Santos Vega, entre outros, e preservaram a memória do
canto e verso popular. Vale ressaltar que a literatura gauchesca não termina em
Martín Fierro, considerado por muitos como um poema nacional, existem outras
linhas ao longo do século XX.

NOTA

Destacam-se duas: Artur Jacaueche “Paso de los Libros” e Jufanqui, “Copas


del Payador Perseguido”, com uma linguagem particular, com intenção política. Tem pontos
de semelhanças com o que se lê em Martín Fierro e em Facundo (liberalismo, identidade
nacional).

As narrativas mostram um homem do interior das planícies pampianas,


representante de um modo de vida desconhecido da elite. Além de ser
desfavorecido econômica, social e geograficamente, da oralidade passou para
a escrita, e “Aunque la gauchesca transitó, desde sus orígenes, por la escritura,
la usó como puente para recuperar la oralidad en cuyo cauce se había forjado”
(RAMA, 1982, p. 200). A gauchesca passa a ser cantada e revisitada em versos e
violão. A inspiração, a rima e a musicalidade também buscam em fontes como a
dança e a poesia.

A literatura gauchesca oriunda dos gêneros orais de uma cultura popular


se deve muito às canções da época e dos versos amplamente difundidos na região
rio-platense.

As canções e os bailes populares foram uma fonte de inspiração para


os escritores, que reproduziram em suas obras o cotidiano de uma população
marginalizada:

Cuando los poetas de la Independencia y del período rosista buscaron


moldes para sus obras, encontraron a mano un repertorio abundante:
el "cielito", el romance corrido, la décima, la media caña, etc. les
proporcionaron las matrices adecuadas. Eran de sobra conocidas,
cantadas o bailadas con acompañamiento de guitarras y disponían de
amplio radio de divulgación dentro de Ia cultura analfabeta tradicional
(RAMA, 1982, p. 200).

139
UNIDADE 2 | PANORAMA DA LITERATURA HISPANO-AMERICANA DOS SÉCULOS XVIII E XIX

O estudo compreenderia um livro inteiro pela riqueza histórica, geográfica


e literária que comporta. Em Literatura Hispânica I você já estudou sobre a poesia
de Martín Fierro, em contraposição à poesia espanhola, aqui iremos apresentar
outros escritores que são parte do estilo gauchesco.

FIGURA 11 – EL CIELITO, DE AUTORIA DE CARLOS MOREL

FONTE: <https://bit.ly/2x6SFGh>. Acesso em: 11 set. 2018.

DICAS

“La aparición del gaucho en Argentina, sin embargo, siguió diferentes caminos.
No se daban en la campaña argentina las condiciones anteriormente expuestas, por lo que el
tipo del gaucho se demoró hasta el siglo XIX y fue apareciendo paulatinamente con distintas
atribuciones a las del gaucho del Uruguay. En opinión de Bonifacio del Carril, lo peculiar del
gaucho argentino fue, por un lado, su naturaleza errante, y, por otro lado, su condición de
alzado o fugado de la justicia. Fueron estas las condiciones que originaron, en cierta forma,
‘la leyenda del gaucho’ y de toda la literatura que le tuvo por protagonista”. Esta informação
e mais ainda está disponível no Portal de literatura gauchesca do Instituto Cervantes, em
https://goo.gl/dUkpUo.

Agora que você já leu um pouco sobre a estética gauchesca e soube da


influência da música no estilo, será apresentada nas próximas seções uma seleção
de autores e obras significativas sobre a Gauchesca. Acompanhe as leituras
indicadas!

140
TÓPICO 3 | A LITERATURA HISPANO-AMERICANA DO SÉCULO XIX

6.1 JOSÉ HERNÁNDEZ


Nasceu em 1834 e morreu em 1886. Autor do poema gauchesco Martín
Fierro (1872) e a sequência La vuelta de Martín Fierro (1879), que foi considerada sua
obra mais importantes e a obra representativa da literatura argentina. Dedicou-
se ao jornalismo e teve uma vida de autoria e política muito semelhante a de
outros escritores que aqui mencionamos. Mas os dados que se tomaram sobre
sua vida, principalmente a pessoal, foram escritos em um folhetim por seu irmão
Rafael. Seu pai trabalhou em uma estância de Rosas e dizem que por conta desse
detalhe é que José Hernández conheceu muito da vida no campo. Alguns críticos
chegaram a questionar quem é o narrador de Martín Fierro: narrador-gaucho (fala
de sua obra, fala como gaucho), Hernández como narrador ou uma autobiografia
de Hernández.

Uma curiosidade bastante pertinente é o uso de pseudônimos. Os possíveis


pseudônimos são Juan Barbialí e Bincha, que aparecem em periódicos da época
em formato de cielitos, cantos e diálogos patrióticos característicos da literatura
gauchesca.

A publicação da primeira parte de Martín Fierro foi inicialmente de má


qualidade e publicada em forma de folhetim em um periódico. A obra trata
de civilização e barbárie vista de outra forma e tem uma forte crítica política,
principalmente contra Sarmiento e Mitre.

DICAS

Assista ao filme, uma adaptação de Martín Fierro (2007), realizado por Roberto
Fontanarrosa. Disponível em: https://bit.ly/2OAFFQ3.

A publicação da segunda parte de Martín Fierro também é em tom crítico e


de denúncia. Há denúncia à própria literatura gauchesca, mas também há defesa
aos aspectos sociais e educacionais que a política deveria considerar. Por isso
podemos dizer que La Vuelta de Martín Fierro oferece outras vozes, as vozes da
comunidade, e a opinião de Hernández sobre o gaucho: ele não estava de acordo
com o isolamento diante da barbárie.

A adoção do “cantar-opinião”, entre diversão de cantar (oralidade)


e retratar um fato (história) também confirma o tom crítico, porque não era
simplesmente um cantar “bonito”, do gaucho-poeta, a partir de uma métrica, mas
sim um cantar-opinando.

141
UNIDADE 2 | PANORAMA DA LITERATURA HISPANO-AMERICANA DOS SÉCULOS XVIII E XIX

Você deve estar se perguntando: O que Martín Fierro tem de encantador


e diferente? Em primeiro lugar, é importante ressaltar que a obra traz a oposição
entre o saber do gaucho e o saber do homem da cidade. A utilização do cantar
como uma estratégia para apresentar essa defesa já diz muito do tipo de literatura
que se estava construindo, com uma linguagem de missão representativa de um
grupo social específico. Algo forte na obra é o uso de refrães, que reforçam a ideia
de valorização.

Mas não esperemos encontrar na valorização literária somente um sentido


positivo. Recordamos que há menções de gauchos considerados bons e ruins, e se
fazia forte crítica sobre quem os corrompeu ou sobre as leis que imperavam no
campo, as quais não são iguais às leis escritas pela sociedade.

Hernández também se ocupa de construir um personagem diferenciado


do Facundo, de Sarmiento, o gaucho não é mais um caudilho e utiliza para mostrar
isso um recurso: o bufão, como paródia do imaginário de gaucho até então criado.

DICAS

As críticas e textos sobre Martín Fierro são abundantes. Vale conferir não só
os mais recentes, mas os que foram decisivos para o conhecimento da obra que temos hoje
em dia. Citamos alguns autores que você pode consultar na internet: Jorge Luís Borges,
Leopoldo Lugones, Pablo Surieta, Vicente Rossi.
Leia o poema El Gaucho escrito por Jorge Luís Borges. Disponível em https://bit.ly/2A9YtAe.

A seguir você irá conhecer outro expressivo autor e sua obra, que são
referências na literatura sobre o gênero.

6.2 RAFAEL OBLIGADO


Rafael Obligado nasceu em Buenos Aires, em 1851, e faleceu em
Mendoza, em 1920. Foi um poeta argentino, autor de um poema que consagrou
definitivamente Santos Vega como um gaucho payador (repentista). Antes de
Obligado, Santos Vega como gaucho e payador já tinha sido poetizado por
Bartolomé Mitre em sua Armonías de Pampa (1838). O poema publicado em 1885
foi um marco na literatura gauchesca.

De característica essencial, este gaucho pertencia a um estrato social fora


da elite rio-platense, e Obligado o retrata como uma pessoa comum, do povo e
que não devia ser marginalizado.

142
TÓPICO 3 | A LITERATURA HISPANO-AMERICANA DO SÉCULO XIX

A figura do payador ou repentista, acompanhado de um violão, está


presente no poema:

QUADRO 4 – POEMA: EL ALMA DEL PAYADOR, DA OBRA SANTOS VEGA, ESCRITA


POR RAFAEL OBLIGADO
El alma del payador

Santos Vega el payador,


aquél de la larga fama,
murió cantando su amor
como el pájaro en la rama
Cantar popular.

Abajo Cuando la tarde se inclina Cuentan los criollos del suelo
sollozando al occidente,
corre una sombra doliente que, en tibia noche de luna,
sobre la pampa argentina. en solitaria laguna
Y cuando el sol ilumina para la sombra su vuelo;
con luz brillante y serena que allí se ensancha, y un velo 15
del ancho campo la escena, va sobre el agua formando,
la melancólica sombra mientras se goza escuchando
huye besando su alfombra por singular beneficio,
con el afán de la pena. el incesante bullicio
que hacen las olas rodando.

FONTE: <https://bit.ly/2OY5byP>. Acesso em: 28 mar. 2019.

DICAS

Leia o poema completo de Santos Vega neste endereço: http://www.biblioteca.


org.ar/libros/71156.pdf.

143
UNIDADE 2 | PANORAMA DA LITERATURA HISPANO-AMERICANA DOS SÉCULOS XVIII E XIX

FIGURA 12 – FRONTISPÍCIO DE SANTOS VEGA

FONTE: <https://bit.ly/2Qm2sQ7>. Acesso em: 20 set. 2018.

De Martín Fierro a Santos Vega, são personagens que em seu tempo


marcaram como modelos de literatura regionalista, representativa de países
que buscavam uma independência também por um viés literário dos modelos
europeus.

6.3 ESTANISLAO DEL CAMPO


Estanislao del Campo Maciel y Luna Brizuela nasceu em Buenos Aires, em
1834 e faleceu em 1880. Del Campo escreveu três diálogos que falam da situação
na época do poeta e político Hilario Ascasubi, do qual Del Campo também é
herdeiro.

A escrita de Del Campo traz política, denúncia e lamentos de ordem


social. Na obra mais representativa, Fausto: Impresiones del gaucho Anastasio el Pollo
en la representación de esta ópera, Estanislao conta a aventura de um gaucho que
vai à cidade, entra no famoso Teatro Colón de Buenos Aires e vê a apresentação
de uma ópera, Fausto, baseada em Goethe, depois de ser apresentada na França.
O gaucho conta o episódio ao seu compadre Hidalgo, através de uma troca de
cartas. Descreve o cenário, as situações e as falas de forma ingênua. De fato, por
se inspirar na primeira obra de Goethe, leva a obra a uma sociedade culta (que vai
à ópera e ao teatro) a partir de uma versão popular.

O gaucho confunde a representação teatral com a realidade. Dali saem


reflexões sobre a natureza, a mulher, os festejos em momentos líricos e do próprio
ser gaucho. É um relato da ópera tal como viu a questão complexa da representação
teatral, mas um questionamento sobre um importante personagem nacional.

144
TÓPICO 3 | A LITERATURA HISPANO-AMERICANA DO SÉCULO XIX

FIGURA 13 – ESTANISLAO DEL CAMPO

FONTE: <https://bit.ly/2OkATcn>. Acesso em: 1º jun. 2018.

FIGURA 14 – FRONTISPÍCIO DA EDIÇÃO DE FAUSTO (1866)

FONTE: <https://bit.ly/2P0uD6M>. Acesso em: 1º jun. 2018.

Confira um fragmento da análise do texto que reflete justamente a


linguagem artificial da representação teatral e que não retrata o gaucho que se
conhece:

“Cierto es que era esta una empresa difícil. Fuera de Hidalgo, no


tenemos en esta rama de nuestra literatura, sino manifestaciones más o menos
felices de los giros de lenguaje y comparaciones del gaucho, accesorios que
nunca reflejan la índole de las razas, porque no emanan del modo de sentir de
ellas, que es también el único modo de animar la interpretación en el difícil rol
de poeta característico.
145
UNIDADE 2 | PANORAMA DA LITERATURA HISPANO-AMERICANA DOS SÉCULOS XVIII E XIX

El tecnicismo es una simpleza, y el pensamiento que no retrata más que


la construcción del idioma, no tiene un día de vida. Para pintar e interpretar al
gaucho es preciso trasladarse no a su lenguaje sino a su corazón, y arreglarlo
todo, no al paisaje, sino a su preocupación, a su filosofía, a su sentimiento.

Así se comprende que dos solos versos puedan reflejar el carácter del
paisano, con sus preocupaciones y su religión enteras, cuando Hidalgo pone
en boca del gaucho que va a afrontar un peligro, este compendio de su alma:

«puse el corazón en Dios


y en la viuda, y embestí.»

Usted verá todos los días pretendidas descripciones de la índole y


costumbres del gaucho, donde todo se reduce a hacinar significados campesinos
que no tienen más particularidad que estar subrayados hasta el fastidio.

Es que no todos tienen bastante luz interna para penetrar el corazón


ajeno en la vorágine de sus instintos, y creen que, dibujando la vestimenta,
puede reflejarse el tipo moral deduciéndolo por la vulgaridad de lo común.

Esos que así son retratados, no son gauchos de este mundo ni del otro;
son simples camiluchos que no constituyen género de raza.

FONTE: CAMPO, Estanislao del. Fausto: impresiones del gaucho Anastasio El Pollo en la
representación de esta obra. Alicante: Biblioteca Virtual Miguel de Cervantes, 1999. https://bit.
ly/2NVJ0N3. Acesso em: 20 set. 2018.

No fragmento que você acabou de ler se encontra uma amostra da obra


de Estanislao Del Campo em que o autor parodia o gaucho, como no último
parágrafo do fragmento: “Esos que así son retratados, no son gauchos de este mundo ni
del otro; son simples camiluchos que no constituyen género de raz”. Alguns são apenas
caricaturas sem adquirir destrezas e uma identidade que outorga credibilidade
não passa de um rascunho gauchesco. A partir disso, faz uma comparação com o
modelo gauchesco vigente da época. Vale lembrar que a obra foi escrita durante
a Guerra do Paraguai e faz duras críticas sociais.

6.4 EDUARDO GUTIÉRREZ


Eduardo Gutierrez (1851-1889) foi um escritor argentino nascido em
Buenos Aires e que escreveu textos de tradições nacionais da literatura gauchesca.
Sua mais exitosa obra foi Juan Moreira, escrita na década de 1880, que conta a
história de um gaucho perseguido pela lei.

146
TÓPICO 3 | A LITERATURA HISPANO-AMERICANA DO SÉCULO XIX

Antes de adentrar especificamente na sua mais célebre obra, é importante


contextualizar novamente em qual recorte histórico ela foi escrita e, para isso,
falaremos um pouco sobre as gerações de 80 e 90 (relacionada ao final da década
de 1880 e adentrando até 1890).

Como vimos, foi um período que consagrou autores importantes da


literatura argentina, como José Hernández, em meio a muitas mudanças no cenário
político e social: presidência de Mitre, de Avellaneda e de Julio Argentino Roca,
adoção de vários modelos político-econômicos, adoção de modelos arquitetônicos
com materiais importados para dar um ar de civilidade à capital, ingresso no
circuito capitalista com a produção de matérias-primas, desenvolvimento da
agricultura e agropecuária, estabelecimento de importantes leis na educação,
conflitos limítrofes com Chile atenuados sem guerras, entre outras situações
positivas. Contudo, alguns aspectos negativos da vida na Argentina começam a
tomar corpo, principalmente de ordem financeira.

A dependência econômica com a Inglaterra e o ainda modelo cultural


inspirado na França expuseram uma ideia de progresso, de liberalismo (onde
não há intervenção do Estado), de especulação das terras públicas que tornou
um grande debate nos governos da década de 1890. Os movimentos sociais
eram contra a imposição do Estado não só nas questões governamentais, como
também na sociedade (intervenção da Igreja no nascimento, morte e casamento).
Atrelado a isso, a sociedade argentina estava em mudança com a vinda de outros
numerosos imigrantes, não só europeus (embora esses tenham sido em maior
número, principalmente os italianos), vistos ora como modelo de progresso ora
como propagadores de enfermidades e ideias.

NOTA

Diferente da visão de imigração ocorrida décadas antes, a partir de 1850 até final
de 1890 chega outra leva de imigrantes à Argentina. Eles se dedicam ao trabalho na cidade
porque é o período dos destaques de inovação tecnológica e científica. Essa geração de
imigrantes não veio com tantas ilusões como as anteriores e trazia consigo ideais socialistas
do anarquismo. Como exemplo temos as destacadas greves nacionais, como em 1878, e as
leis sancionadas que fazem referência direta à imigração (Lei nº 4.144 de Residencia). É dessa
época que surgem os “Conventillos” (cortiços) nas grandes cidades, que serão mencionados
em muitos textos literários e letras de tango.

No mundo, o discurso científico do Positivismo, lema de Augusto Comte,


também chega na sociedade argentina, e com ele grande influência nas artes (mais
no questionamento social do que das técnicas artísticas) e na literatura (já que o
contato com os textos jornalísticos é mais forte, dando mais voz a outras pessoas
e não só aos políticos).

147
UNIDADE 2 | PANORAMA DA LITERATURA HISPANO-AMERICANA DOS SÉCULOS XVIII E XIX

NOTA

No Positivismo, princípio de Spencer, não se estuda somente as leis naturais,


mas também as sociais. Nessa época, o governo de Sarmiento perde sua voz no sentido de
dar voz à ciência (naturais e sociais), porque não deu tanta ênfase como estava acontecendo
em outras cidades do mundo. A voz do discurso científico era mais valorizada porque
correspondia ao progresso.

No campo da literatura destaca-se a formação de grupos literários mais


cosmopolitas, que compartilhavam costumes, discutiam aspectos políticos e
sociais, mas estavam localizados em um ambiente de entretenimento (figuras
dantescas). Os integrantes desses grupos literários escreviam, a princípio, para
serem lidos pelo seu próprio círculo intelectual e por isso se expressavam com
maior liberdade de palavras e argumentos. Discutiam de forma otimista o futuro
da Argentina. O Club del Progreso, renomado clube da elite portenha que embora
tenha sua primeira sede desde meados de 1850, é um exemplo de clube influente,
que teve como sócios Estanislao de Campos, Eugenio Cambaceres, Lucio Mansilla
e outros políticos, sendo destes, 17 presidentes.

Das características da geração de 80 podemos destacar:

• Uso da conversação e da oralidade que influenciou na forma mais livre da língua


escrita e foi usada também para persuadir a partir de um viés político. Utiliza-
se a oralidade com fins literários (depois também utilizada no Modernismo).
• Há muitos textos autobiográficos, relatos, memórias, diários etc.
• A memória é a tentativa de valorizar o passado, que foi perdido, e trazê-lo para
a nova sociedade que deve repensar as mudanças que estão acontecendo.
• Contudo, esses textos memoriais não são tão inocentes. Trazem um tom
melancólico e os escritores introduzem o “nós” para se identificar no grupo.
• Lembram sempre que os valores novos se contrapõem com os outros que são
diferentes. Os outros são provindos dos criollos, bárbaros, marginais etc.
• Valorizavam as viagens à Europa.
• Há forte marca do cientificismo e do espiritismo (doutrina nova que explica
cientificamente os fenômenos). Importante ressaltar que há o entendimento de
espírito como alma, mas os escritores também escreviam como algo fantástico.
• Argentina intensificava a imigração e seus defeitos (usava o naturalismo
francês para explicar os males da imigração).

Dentre as características da década de 90 podemos destacar:

• Mudanças políticas e econômicas gerando uma profunda crise em 1890, com a


quebra da Bolsa do Comércio de Buenos Aires.

148
TÓPICO 3 | A LITERATURA HISPANO-AMERICANA DO SÉCULO XIX

• Produz-se uma série de novelas escritas por gente que esteve presente na
quebra da bolsa. Segue na linha do Naturalismo, melancolia e suicídio. La
Bolsa (1890) inclusive é o nome de uma novela escrita nesse mesmo ano pelo
jornalista e poeta argentino José María Miró (Buenos Aires, 1867-1896), mais
conhecido por seu pseudônimo literário Julián Martel.​
• Constitui-se uma série de “heróis” porque com a chegada de culturas diferentes
é preciso identificar um salvador, herói.
• Os imigrantes conservavam seu patriotismo e queriam ter suas próprias leis,
gerando polêmicas. No outro lado, ressurge a ideia de argentinizar o país a
partir de uma campanha democratizadora da educação (já no governo de
Sarmiento se pensava assim).
• É nesta época que surgem os Folletines (Folhetín) e o teatro nacional que tem a
ver com a literatura gauchesca. O folclore também é presente.
• A linguagem jornalística é cada vez mais presente, com uma autonomia cada vez
maior do escritor, mas, por outro lado, uma profissionalização de muitos deles (a
imprensa os contratava e os pagava para publicar exclusivamente no gênero da
moda, até porque os jornais passam a ser diários em vez de bissemanais).
• A emergência das revistas gráficas e ilustradas. Começa aqui a publicidade
nessas revistas combinando duas linguagens (escrita e imagética). A classe
média foi a maior produtora e consumidora deste tipo de publicação.

O Folletín são novelas populares ou novelas por entregas (por episódios),


que vão se articulando através de séries concatenadas. Interrompe-se a narrativa
no suspense da trama para que o leitor siga interessado pela história reiterando-se
dela, possibilitando também o aumento das vendas. Tinha a intenção de satisfazer
a imaginação destes eleitores e fazer com que dessem visibilidade aos episódios.

DICAS

Sobre a publicação dos Folhetins, leia este artigo para saber mais sobre o
gênero e sua circulação:

El folletín como producto de la cultura popular en la prensa de fines del siglo XIX: entre el
estereotipo y el reconocimiento de un género en el diario. El Orden. RISCO, Ana María. Actas – IV
Congreso Internacional Latina de Comunicación Social – IV CILCS – Universidad de La Laguna,
dic. 2012. Disponível em: http://www.revistalatinacs.org/12SLCS/2012_actas/054_Risco.pdf.

Outro elemento característico do Folletín é o exagero, a mitificação do


herói, o suspense, a truculência. Sobre o herói cabe mencionar que é uma figura-
chave neste tipo de gênero: sofre uma adversidade (algo que corta a sua rotina),
toma uma decisão geralmente atrelada a uma vingança, pode ser vencido por
seus perseguidores, trazendo-o uma imagem de vítima. O leitor é convidado
a ajudar o herói. Esse leitor o aceita, mesmo tendo o herói como um bandido,
inicialmente, porque se contrapõe com a lei.
149
UNIDADE 2 | PANORAMA DA LITERATURA HISPANO-AMERICANA DOS SÉCULOS XVIII E XIX

Tem-se que entender o Folletín como uma narrativa em si mesma, com


características próprias. Ela foi, sem dúvida, um marco no recorte histórico das
gerações que citamos e serviu para outras tantas surgidas depois dela.

Creo, también, que analizar el folletín es absolutamente necesario si


lo que se busca es una comprensión total de la novela decimonónica
argentina. Frecuentemente se olvida que Amalia, por ej., nuestra tan
publicitada "novela política", apareció, por entregas, en el periódico La
Semana y, aunque no sea novela en puridad, que lo mismo ocurrió con
Facundo en El Progreso. Y nadie disiente en ubicar ambos libros entre la
literatura literariamente válida, si se me permite el pleonasmo. El folletín,
por lo demás, hace posible una mayor precisión de los límites de esa
novela que Ilamé antes "artística." [...] En el folletín se aíslan situaciones
y caracteres del mundo real para su uso literario, lo que determina
dos consecuencias: el empobrecimiento de los mismos y, por ende,
su esquematismo. De allí la repetición de temas y personajes, ergo, la
pobreza del folletín en estos puntos. Esto se debe a que el folletín fue, en
verdad, concebido como una mercancía, que su autor era un reproductor
u obrero y su editor un empresario que elegía e imponía el producto de
acuerdo a leyes de mercado. El autor-obrero debía de producir diaria o
semanalmente (Gutiérrez lo hacía diariamente), en forma muy similar a
la del periodista, con deadline y sin tiempo para retoques o correcciones
(DELLEPIANE, 1978, p. 487, grifos do original).

E assim, a partir da contextualização anterior e das explicações sobre
um gênero literário marcante da época é que adentramos na obra de Gutiérrez,
intitulada Juan Moreira.

Gutiérrez escolhe um público, de alguma maneira, mas ele não está tão
distante dele. A massa urbana, composta por setores rurais e estrangeira, invade a
cidade. Mas daí se constrói um estilo: aparece a imagem de dois mundos em conflito
entre a busca da estabilidade encontrando a instabilidade. O herói é esse conflito.

Gutiérrez constrói um fenômeno do “moreirilismo”: apresentar ao


público, expressão de rebeldia, a possibilidade de tomar uma vingança, a própria
conduta do herói. Autores como Josefina Ludmer o veem como a continuação de
Facundo, em que Gutiérrez tira a voz e narra a biografia de Facundo.

Assim, podemos destacar ao menos três características de Juan Moreira:

1) Atos de rebeldia com a presença do cuchillero, sangue e estereótipo do herói


idealizado pelos pobres marginais. Essa característica foi contestada mais tarde
pelos críticos literários, já que essa era uma exigência da imprensa da época.
Pelo contrário, o caracterizam como alguém sensível.
2) Criollismo como elemento de distinção, como aquele que foi levado do campo
para a cidade e com seu diálogo retrata sua vida.
3) Argentinidade: o criollismo como apoio a uma identidade argentina. Exemplo
disso eram as pessoas que se disfarçavam de Juan Moreira no carnaval, mas
eram italianas.

150
TÓPICO 3 | A LITERATURA HISPANO-AMERICANA DO SÉCULO XIX

O teatro nacional é outro ponto que corresponde a essa busca pela


argentinidade. A obra é levada ao circo nos anos seguintes, o circo criollo, saindo
da visão estética francesa de elite e atingindo outro público, reiterando a presença
do oral frente ao escrito. Como exemplo temos a representação de José Juan
“Pepe” Podestá, ator uruguaio provindo de família de artistas, que levou ao teatro
Juan Moreira do palhaço El Pepino 88, marcando o nascimento do circo criollo e a
popularização do Baile Pericón, uma dança típica no Rio da Prata e Chile.

DICAS

Apresentamos um fragmento de Juan Moreira e você pode ler a obra


completa em: http://www.biblioteca.org.ar/libros/8829.pdf.

(Entra Moreira) SARDETTI


GAUCHO 1º He verdá amigo Moreira, yo he negao
(Dando la mano a Moreira). la deuda porque nun tenía plata y si lo
Dios lo guarde Amigo Moreira. confesaba me iban a vender el negocio,
OTRO GAUCHO má, yo sé que le debo he algun dia le he de
Que vientos lo traen por aqui Amigo pagar.
MOREIRA MOREIRA
Tal vez la desgracia, paisano. Me han puesto en el cepo de cabeza como á
OTRO GAUCHO un ladrón, me han golpéau cuando me han
Como va amigo Moreira. Aquí estábamos visto indefenso, y por último me han largao
comentando lo que le había pasao con el con el calor de la marca diciéndome que me
Alcalde y, juepucha, será cierto lo que se dice habían de mandar a la frontera.
que a un hombre como Vd. lo aigan puesto GAUCHO 1º
en el cepo de Cabeza y que le haigan dau una Es verdad Moreira, tenés razón, pero por un
felpiada de mi flor. perro de esta clase no merece la pena que
MOREIRA un hombre de bien se pierda haciendo una
Si, han creido que soy vaca que se ordeña sin hombrada: Amas vos tenes un hijo y este
manear, y así va a ser la cornada! me han va á sufrir las consecuencias de lo que vos
aga[r]rao por gueno pero se me hace que hagas. Y si no lo haces por mi hacelo por esa
esta vez no la han de sacar por tarja. prenda de tu cariño, y vamonos, tomando la
Haber pulpero heche otra copa! Amigos yo copa del estribo.
pago la otra vuelta. MOREIRA
La paciencia se gasta, porque no es oro, y Yo no me voy paisano, sin haber cumplido
siento que la mía á ido a parar a la loma del mi palabra y sin termina[r] lo que voy a
diablo - Anoche me ha hecho ser blanco el hacer, y no tomo la copa del estribo, porque
teniente Alcalde y me ha metido en el cepo, no quiero que mañana digan que lo que yo
pero hoy la vaca se ha vuelto toro y no hay he hecho lo hice divertido, porque no tuve
que hacerle al dolor. entrañas pa hacerlo fresco.
Todos Vds. paisanos saben que yo presté a GAUCHO 1º
este hombre diez mil pesos, pues he tenido No paisano vos no tenes que hacer eso,
que demandarlo porque no había podido acordate que tenes família.
conseguir que me pagara, y saben lo que me MOREIRA
ha contestado? Dejame hermano. Yo tengo que salir con las
Pues ha dicho que yo mentía y que no me mías.
debia un medio. Haber, concluyamos que es tarde, Amigo
Sardetti, vengo á que me pague los diez mil
pesos o a cumplir mi palabra empeñada

151
UNIDADE 2 | PANORAMA DA LITERATURA HISPANO-AMERICANA DOS SÉCULOS XVIII E XIX

DICAS

Juan Moreira é uma obra que se sobrepõe ao texto impresso. Ela foi
apresentada, na mesma época, sob a forma de teatro gauchesco, marcando outras
características do gênero literário. Décadas mais tarde, fez parte de filmes, telenovelas,
radionovela e HQ. Um filme famoso é Juan Moreira, 1973, dirigido por Leonardo Favio. Você
pode consultar mais neste site: http://www.elortiba.org/old/moreira1.html.

Agora você já sabe mais sobre a Gauchesca e o gaucho, próprios de


uma literatura que popularizou um personagem do mundo real. Em alguns
textos ele é enaltecido, em outros diminuído, parodiado, cantado em versos e
poetizado, continua sendo um desafio estudar e entender como o personagem
está representado literariamente e realizar uma crítica sobre o tema.

Depois dos textos gauchescos e a busca de retratar uma literatura regional,


de costumes e nacional, surgiu nos alvores do século XX, a partir da América
Central, um novo movimento literário e que teve um grande impulso, porque
realizou um movimento de ida para Europa e não o contrário, como de forma
geral ocorria, o Modernismo.

7 O MODERNISMO
Nos países hispano-americanos surgiu um movimento literário denominado
Modernismo. Surgiu no final do século XIX, em torno de 1880, como uma resposta da
América hispânica à modernidade que se iniciava (JOZEF, 2005, p. 91).

No tópico anterior, vimos que o século XIX tinha sido sacudido por
sucessivos movimentos literários, os movimentos filosóficos, os questionamentos
e as angústias existenciais trouxeram uma nova percepção com a chegada do
Modernismo.

A criação modernista surgiu como um movimento sem manifestos,


diferente do que foi no Brasil, e como narra Diniz (2010, p. 82): “O modernismo
hispano-americano não teve manifestos e houve uma diversidade de autores e
lugares, mas principalmente se caracterizou porque trouxe uma crise, uma perda
social da fé da esfera estética”. Não deve ser confundido com o movimento
modernista brasileiro que irá acontecer paralelo com a vanguarda hispano-
americana entre 1917 e 1930.

O movimento a partir da junção de características do Romantismo,


Realismo e Simbolismo recriou uma nova estética: Modernismo. De acordo com
Jozef (2005, p. 92), “a estética do Romantismo perdura em muitos aspectos no

152
TÓPICO 3 | A LITERATURA HISPANO-AMERICANA DO SÉCULO XIX

Modernismo. A isso se contrapõe o pessimismo transcendental e a sensibilidade


mórbida que invadem o modernismo afastados do cotidiano a partir de uma
idealização”. Essa contradição será o que os modernistas irão frisar como
liberdade de inspiração, o que permite a muitos críticos entender que o
Modernismo mantém características do Barroco. Estes movimentos literários
tinham influenciado quase a metade de um século. Também se opunha ao
Parnasianismo, movimento contemporâneo do Realismo e Naturalismo, e por
isso acabou por inovar na poesia. O Parnasianismo elaborava uma poesia com
imagens estáticas, e os modernistas inovaram ao criar movimento em imagens.

A inclusão de correntes espirituais também é contemplada no


Modernismo, e harmonizadas, permitem a confluência de diversas culturas e
tradições convivendo no mesmo movimento.

O Modernismo inovou na estética entre os diversos gêneros textuais de


verso e prosa e permitiu:

• modificar ritmos;
• introduzir um vocabulário elegante;
• usar escolhas lexicais incomuns;
• realizar uma releitura de elementos autóctones;
• elaborar imagens poéticas.

Os escritores hispano-americanos desse período demonstravam em suas


obras a busca de uma independência de movimentos literários europeus. Entre
outros modernistas precursores figuram, além de José Martí, Julián del Casal
(1863-1893), Manuel Gutiérrez Nájera (1859-1895), Salvador Díaz Mirón (1853-
1928), José Asunción Silva (1865-1896) e Leopoldo Lugones (1874-1938). Do
México a Buenos Aires, o movimento foi pródigo e atuante, com abundante obra
literária como legado. Os modernistas foram, de acordo com Retamar (1995, p.
327), “os primeiros a influir sobre a própria Europa – ao menos sobre a Espanha”,
e foram os hispano-americanos que influenciaram os europeus, e especialmente
a Espanha. O grande representante do movimento foi Rubén Darío, que
exerceu uma influência literária tanto nas Américas como na Europa. Leopoldo
Lugones, argentino, escreveu em 1905 El imperio jesuítico, um ensaio modernista
e importante porque demonstra a liberdade exercida pelos modernistas, já que é
possível vislumbrar os aspectos barrocos em meio à estética modernista.

DICAS

Assista a este vídeo sobre o Modernismo latino-americano e a estética do


movimento: https://www.youtube.com/watch?v=QkBIa_FUndM.

153
UNIDADE 2 | PANORAMA DA LITERATURA HISPANO-AMERICANA DOS SÉCULOS XVIII E XIX

O Modernismo se estende ainda no século XX, porém, já no final do século


XIX, surgiu a vanguarda hispano-americana, que representou a ruptura com o
Modernismo e se tornou um grande movimento no século XX. Na Unidade 3
iremos falar das vanguardas e outros movimentos literários mais detalhadamente.
Nesta unidade destacaremos dois modernistas importantes pela sua participação
no movimento e inspiração para outros escritores, e apresentar dois gêneros
textuais diferentes, como o ensaio e o poema, dentro de uma estética modernista.

7.1 JOSÉ MARTÍ


José Julián Martí Pérez (1853-1895) nasceu em Cuba e teve diversas
profissões. Foi escritor, jornalista, filósofo, político, e em todas se destacou. Na
literatura é considerado um precursor do Modernismo, iniciou o movimento em
prosa ao publicar o romance Amistad Funesta, em 1885.

Martí é conhecido principalmente pelos seus ensaios e poesias. Ele foi


considerado por Bandeira (1960, p. 150) como um renovador do gênero poético,
um mestre do verso e da prosa, um grande orador, e no jornalismo elevou o
gênero a “um nível artístico”. O século efervescente nas questões relacionadas
à independência encontrou em Martí o defensor para a independência cubana,
por isso desde cedo se envolveu na política e acabou exilado pelas autoridades
espanholas. Cuba obteve sua independência muito depois da maioria dos outros
países nas Américas.

Martí foi exilado de Cuba com apenas 18 anos, indo residir na Espanha.
Viveu em vários países latino-americanos até fixar-se nos EUA, onde
viveu por 15 anos. Retornou a Cuba como o soldado-poeta e morreu
pela pátria, acreditando na futura nação livre e numa América Latina
emancipada de toda forma de dominação (VELOSO, 2011, p. 135).

Martí foi um político participante da criação do Partido Revolucionário


Cubano e organizador da Terceira Guerra de independência cubana em 1895
contra os espanhóis. Como escritor, seu ensaio Nuestra América (1891) se tornou
um de seus textos mais conhecidos.

Leia um fragmento do texto citado e procure as metáforas criadas pelo


autor para falar de colonizadores e colonizados:

Cree el aldeano vanidoso que el mundo entero es su aldea, y con tal que
él quede de alcalde, o le mortifique al rival que le quitó la novia, o le crezcan
en la alcancía los ahorros, ya da por bueno el orden universal, sin saber de
los gigantes que llevan siete leguas en las botas y le pueden poner la bota
encima, ni de la pelea de los cometas en el Cielo, que van por el aire dormidos
engullendo mundos. Lo que quede de aldea en América ha de despertar.
Estos tiempos no son para acostarse con el pañuelo en la cabeza, sino con las
armas en la almohada, como los varones de Juan de Castellanos: las armas del

154
TÓPICO 3 | A LITERATURA HISPANO-AMERICANA DO SÉCULO XIX

juicio, que vencen a las otras. Trincheras de ideas valen más que trincheras de
piedra. No hay proa que taje una nube de ideas. Una idea enérgica, flameada
a tiempo ante el mundo, para, como la bandera mística del juicio final, a un
escuadrón de acorazados. Los pueblos que no se conocen han de darse prisa
para conocerse, como quienes van a pelear juntos. Los que enseñan los puños,
como hermanos celosos, que quieren los dos la misma tierra, o el de casa chica,
que le tiene envidia al de casa mejor, han de encajar, de modo que sean una, las
dos manos. Los que, al amparo de una tradición criminal, cercenaron, con el
sable tinto en la sangre de sus mismas venas, la tierra del hermano vencido, del
hermano castigado más allá de sus culpas, si no quieren que les llame el pueblo
ladrón, devuélvanle sus tierras al hermano. Las deudas del honor no las cobra
el honrado en dinero, a tanto por la bofetada. Ya no podemos ser el pueblo de
hojas, que vive en el aire, con la copa cargada de flor, restallando o zumbando,
según la acaricie el capricho de la luz, o la tundan y talen las tempestades; ¡los
árboles se han de poner en fila para que no pase el gigante de las siete leguas!
Es la hora del recuento, y de la marcha unida, y hemos de andar en cuadro
apretado, como la plata en las raíces de los Andes (MARTÍ, 2010, p. 133).

Gabarito para metáforas:


Trincheras de ideas – ideias, pensamento;
el pueblo de hojas – temerosos;
árboles se han de poner en fila – países iberoamericanos;
el gigante de las siete leguas – Estados Unidos.

155
UNIDADE 2 | PANORAMA DA LITERATURA HISPANO-AMERICANA DOS SÉCULOS XVIII E XIX

NOTA

Observe o mapa da América Central, berço de dois grandes modernistas, José


Martí e Rubén Darío:

FIGURA 15 – MAPA DOS PAÍSES DA AMÉRICA CENTRAL

FONTE: <https://bit.ly/2IzQD5X>. Acesso em: 20 set. 2018.

7.2 RUBÉN DARÍO


Félix Rubén García Sarmiento ou Rubén Darío (1867-1916) foi um poeta,
jornalista, natural da Nicarágua. Seu nome, Darío, foi “herdado de um tataravô”
(BANDEIRA, 1960, p. 159) e é considerado como o iniciador e o mais importante
escritor do movimento Modernista. A sua influência na poesia se estendeu por
boa parte do século XX.

Darío se tornou um mestre para muitos escritores e aconselhou seus


seguidores: “cada um procure sua expressão particular, dentro da orientação da
estética geral, tornando mais flexível o idioma, capacitando a expressar a nova
complexidade do presente” (JOZEF, 2005, p. 93).

Autor de Azul (1888), publicado em Valparaíso, Chile, a obra é um livro


de contos e poesias, considerada pelos críticos como a obra mais importante do
modernismo hispano-americano.

A partir da publicação de Azul, consegue o posto de jornalista


correspondente no jornal La Nación, em Buenos Aires, e por conta do cargo viaja
bastante pela América e a Europa.
156
TÓPICO 3 | A LITERATURA HISPANO-AMERICANA DO SÉCULO XIX

Em Buenos Aires publica Los Raros (1896) e Prosas Profanas y otros Poemas
(1896), ambas consideradas como as obras que validaram definitivamente o
movimento Modernista.

Na Espanha conhece os autores pertencentes à conhecida geração de 98,


os espanhóis Ramón María del Valle-Inclán, Jacinto Benavente y Juan Ramón
Jiménez, também conheceu em 1902 o poeta Antonio Machado, em Paris.

Em 1914, em Barcelona, publicou sua última obra: Canto a la Argentina y


otros poemas. No mesmo ano retornou após o início da Primeira Guerra Mundial
e morreu em Nicarágua, em 1916.

FIGURA 16 – RUBÉN DARÍO

FONTE: <https://bit.ly/2PcnTCP>. Acesso em: 20 set. 2018.

Com o advento das vanguardas históricas na América, o Modernismo


irá perder sua força como movimento literário. Os seguidores do Ultraísmo,
principalmente, um ramo do movimento vanguardista, irão se contrapor à
estética de Rubén Darío e seus seguidores.

Leia um fragmento de Azul (2003, p. 3), de Rubén Darío, observando a


frase do escritor francês Victor Hugo como epígrafe. Que tal, depois desta leitura,
realizar uma pesquisa sobre a cor azul nas Artes?

Prólogo
L'art c'est l'azur
Victor Hugo
I

¡Qué cofre tan artístico! ¡Qué libro tan hermoso!

¿Quién me lo trajo?

¡Ah! La Musa joven de alas sonantes y corazón de fuego, la Musa de Nicaragua,


la de las selvas seculares que besa el sol de los trópicos y arrullan los océanos.

157
UNIDADE 2 | PANORAMA DA LITERATURA HISPANO-AMERICANA DOS SÉCULOS XVIII E XIX

¡Qué hermosas páginas de deliciosa lectura, con prosa como versos, con versos
como música! ¡Qué brillo! todo luz, todo perfume, todo juventud y amor.

Es un regalo de hadas: es la obra de un poeta.

Pero, de un poeta verdadero, siempre inspirado, siempre artista, sea que suelte
al aire las alas azules de sus rimas, sea que talle en rubíes y diamantes las
facetas de su prosa.

Rubén Darío es, en efecto, un poeta de exquisito temperamento artístico que


aduna el vigor a la gracia; de gusto fino y delicado, casi diría aristocrático;
neurótico y por lo mismo original; lleno de fosforescencias súbitas, de
novedades y sorpresas; con la cabeza poblada de aladas fantasías, quimeras y
ensueños, y el corazón ávido de amor, siempre abierto a la esperanza.

Si el ala negra de la muerte antes no lo toca, si las fogosidades del numen no lo


consumen o despeñan, ¡Rubén Darío llegará a ser una gloria americana, que tal
es la fuerza y ley de su estro juvenil!

En la portada de su libro, sobre la tapa de su cofre cincelado brilla la palabra


AZUL... misteriosa como es el océano, profunda como el cielo azul, soñadora
como los ojos azul cielo.

¡L'art c'est l'azur! Dijo el gran poeta.

Sí: pero aquel azul de las alturas que desprende un rayo de sol para dorar
las espigas y las naranjas, que redondea y sazona las pomas, que madura los
racimos y colora las mejillas satinadas de la niñez.

Sí, el arte es el azul, pero aquel azul de arriba que desprende un rayo de amor
para encender los corazones y ennoblecer el pensamiento y engendrar las
acciones grandes y generosas.

Eso es el ideal, eso el Azul con irradiaciones inmortales, eso lo que contiene el
cofre artístico del poeta.

¿Y aquellas alas de mariposa azul de qué nos sirven? preguntarán los que
nacieron sin alas. ¿De qué nos sirve eso que flota en el vago azul de los sueños?

Contesta el poeta: - Pour des certains êtres sublimes, planer c'est servir.

158
TÓPICO 3 | A LITERATURA HISPANO-AMERICANA DO SÉCULO XIX

DICAS

Você pode ler diversas obras de Rubén Darío em: Biblioteca Virtual Universal.
Disponível em: https://bit.ly/2C0ydKE.

Concomitante ao movimento Modernista, no Peru, um escritor coletava


as histórias e tradições de sua região, compilava e as publicava. Assim nascia um
gênero: a Tradição, mais uma expressão literária e única das Américas.

8 A TRADIÇÃO
Ricardo Palma (1833-1919), escritor peruano, é considerado o inventor da
tradição, gênero literário que reúne narrativas locais e da região. Uma forma de
valorizar a escrita de histórias locais e que eram conhecidas oralmente em sua
maioria.

A obra de Palma recolheu um número de narrativas peruanas, graças


a isso foram preservadas. A importância do escritor reside por ser o primeiro
representante desse gênero textual no movimento literário hispano-americano.
Bandeira (1960, p. 124) o descreve como “o ficcionista mais original da fase
romântica, o seu prosador mais elegante, mais vivo, mais ágil”. De fato, ele
escreveu textos de outros gêneros literários, poesia, drama e de linguística.
Conhecia a língua espanhola em suas variações linguísticas, peninsular,
hispano-americanas e regionais, por isso sugeriu à Academia espanhola alguns
verbetes para serem incluídos no Dicionário da Real Academia – ERA –, mas
sem sucesso.

O gênero tradição foi uma produção escrita de fôlego. Ele levou em torno
de 40 anos para selecionar e compor os volumes das narrativas das tradições
que seriam publicadas, e o seu maior mérito literário reside no fato de cuidar e
preservar a memória coletiva.

159
UNIDADE 2 | PANORAMA DA LITERATURA HISPANO-AMERICANA DOS SÉCULOS XVIII E XIX

FIGURA 17 – RICARDO PALMA, AUTOR DE TRADICIONES PERUANAS

FONTE: <https://bit.ly/2I4CygG>. Acesso em: 21 set. 2018.

DICAS

Você gostaria de saber mais sobre Ricardo Palma e sua obra? Leia este conto
em edição bilíngue, espanhol e português. Conto Meteorologia em tradução espanhol-
português. In: Rónai: Revista de Estudos Clássicos e Tradutórios, 2015, v. 3, n. 1, p. 46-48.
UFJF – Juiz De Fora. Tradução de Andréa Cesco e Mara Gonzalez Bezerra. Disponível em:
https://bit.ly/2pmn2o3.

A literatura começou a se expandir em diversos gêneros textuais nas


Américas e na virada do século XIX surge uma nova sociedade após as guerras
das independências. No século XIX, até certo ponto são os mesmos sistemas
culturais, os mesmos donos da terra, com a diferença de que há uma soberania
nacional local demarcada por fronteiras geográficas. Na nova fase vivida pelos
latino-americanos, os países se organizam, elegem seus dirigentes, postulam
suas constituições, poderes executivo e legislativo, organizam seus militares
nacionais etc., e a língua espanhola continua sendo um fator em comum aos
países colonizados por Espanha. Não há por parte dos dirigentes a inclusão de
negros e indígenas nos programas e cargos de governo.

9 AS CORRENTES IMIGRATÓRIAS
Nessa nova fase do continente, a riqueza já não se esvai totalmente para
a Europa, mas ainda a Europa se constitui no ideal da civilização, as famílias
abastadas ainda enviavam seus filhos para estudar na Europa, o que demonstra
como eram fortes a valorização e uma dependência do modelo idealizado, a
Europa, como símbolo de uma sociedade culta e moderna, o que para as Américas
acaba por desenvolver lentamente uma consciência nacional hispano-americana.

160
TÓPICO 3 | A LITERATURA HISPANO-AMERICANA DO SÉCULO XIX

Assim, o fluxo de viajantes se intensifica, a Europa também está passando


por mudanças econômicas significativas e guerras, e isso acaba gerando um
movimento migratório em direção às terras hispano-americanas. A título de
introdução, cabe mencionar que nessa imigração em massa, as pessoas eram
provenientes principalmente da Europa e se dirigiam em sua maioria para
Argentina, Brasil, Uruguai, Cuba, México e Venezuela. Muitos se dirigiram para
o Caribe também.

Saíam de seus países de origem devido às péssimas condições de falta


de infraestrutura social e a pobreza encontradas na Europa. A entrada dos
imigrantes europeus contribuiu para povoar cidades e o desenvolvimento do
país. Nem todos eram pessoas desprovidas de recursos, mas mesmo os que
detinham meios financeiros de recomeçar em um novo continente o faziam por
encontrar melhores condições de vida nas Américas.

A propaganda dos governos hispano-americanos se tornava atraente


diante da promessa de oferecer terras para cultivo e condições facilitadas para
tramitações legais e mobilidade. Eram recebidos pelas autoridades locais. A
chegada de imigrantes ao continente americano se deu em sucessivas levas,
principalmente ao longo dos séculos XIX e XX. Havia uma diversidade de
europeus, asiáticos e africanos, mas foi acentuada a partir do século XIX com
uma grande leva de europeus, em especial, italianos, espanhóis, portugueses,
entre muitas outras nacionalidades. Junto aos imigrantes também vieram seus
costumes, tradições, línguas, cultura e as influências de literatura.

Veja o mapa com estatísticas das correntes migratórias durante a primeira


metade do século XIX, aproximadamente:

161
UNIDADE 2 | PANORAMA DA LITERATURA HISPANO-AMERICANA DOS SÉCULOS XVIII E XIX

FIGURA 18 – AS IMIGRAÇÕES

FONTE: <https://bit.ly/2PIALS5>. Acesso em: 28 ago. 2018.

As imigrações enriqueceram o continente e colaboraram com a formação


de uma literatura hispano-americana.

Observe as estatísticas a partir da metade do século XIX, início do século


XX, entre os anos 1846 a 1910, a distribuição e a preferência de local por parte dos
imigrantes. Europeus, africanos, asiáticos estão na formação do povo hispano-
americano. E esta imigração para os países de fala hispana irá influenciar em sua
literatura, principalmente a partir do século XX.

162
TÓPICO 3 | A LITERATURA HISPANO-AMERICANA DO SÉCULO XIX

LEITURA COMPLEMENTAR

Narrativa sobre a viagem de Lúcio V


Mansilla e o encontro com os indígenas Ranqueles

A fines de 1868 Mansilla fue destinado a Río Cuarto para comandar


el sector de fronteras Córdoba-San Luis-Mendoza y para participar, de hecho,
en esa política. En febrero de 1870, Mansilla concertó un tratado de paz con los
ranqueles sin consultar a su superior, el Gral. José Miguel Arredondo. El presidente
procedió a hacer algunas enmiendas al documento preparado por Mansilla. Los
ajustes provocaron su descontento al percibirlas como obstáculo a su gestión y
como posible causa de la anulación del tratado, además de sentir que impugnaban
sus negociaciones. Al hacer públicas sus desavenencias en la prensa de Buenos
Aires, Sarmiento le hizo llegar ciertas reconvenciones a su conducta, moderadas
para la gravedad del caso. Los ranqueles aceptaron las enmiendas al tratado
pero desconfiaban, y con razón, de algunas cláusulas y del trámite parlamentario
necesario para su ratificación. Ante esta nueva situación, Mansilla solicitó la
venia del Gral. Arredondo para dirigirse en persona y con una escolta reducida
a las tolderías del cacique Mariano Rosas para demostrarle la buena fe que debía
inspirarle lo acordado. El 30 de marzo de 1870, Mansilla salió con su partida. La
expedición duró dieciocho días. A partir del 20 de mayo, los lectores de La Tribuna
de Buenos Aires pudieron leer las cartas redactadas por Mansilla sobre un acto
audaz que representaba una vez más las características de quien, violando todo
canon protocolar, y aun de sensatez, procedió a crear una saga que posee un
impacto literario mayor que el resultado concreto de la excursión. Fue tal el éxito de
las cartas que, a instancia de Héctor Varela, se publicaron en dos tomos bajo el título
actual. La obra fue premiada en 1875 por el Congreso Internacional Geográfico de
París. Dos años más tarde se publicó una «edición autorizada» en Leipzig.

FONTE: MANSILLA, Lucio V. Una Excursión a los indios Ranqueles. Edición de Saúl Sosnowski.
Edición revisada basada en la de Fundación Biblioteca Ayacucho. Caracas: Stockcero, 1984.
https://bit.ly/2xwEY2N. Acesso em: 29 mar. 2019.

Mariano Melgar, a valorização da poesia andina

Mariano Melgar es un antecedente en cuanto a este tema, por sus yaravíes,


los cuales fueron de su interés y literaturizó. Por lo mismo, que los yaravíes son
parte de la tradición retórica y literaria, también es de interés ver como reflejan
las preocupaciones del autor sobre diferentes temas que traspasan las fronteras
temporales, geográficas y culturales, tal y como lo explica y resume, Jorge Cornejo
Polar en la contraportada de Poesías completas (Melgar, 2010): Melgar no sólo
inaugura la literatura arequipeña, abre también la auténtica literatura nacional.
Liberándose de moldes formales y temáticos impuestos, descubriendo por primera
vez el Perú (geografía, realidad, social, legado indígena), como materia literaria,
atinando incluso a crear ciertas modalidades como el yaraví. La importancia de
su aporte se magnifica con su contribución al proceso emancipador y la entrega
de su vida. Las desventuras amorosas exacerban su sensibilidad ya proclive al

163
UNIDADE 2 | PANORAMA DA LITERATURA HISPANO-AMERICANA DOS SÉCULOS XVIII E XIX

temple romántico, dando como resultado que sea él una especie de solitario y casi
inexplicable adelantando del romanticismo en América hispana (Melgar, 2010).
Podemos evidenciar a Melgar como antecedente de la poesía peruana quien no
sólo abre paso a un Romanticismo propio, sino también a una poesía intercultural
inspirada en el mundo andino. Melgar no ha tenido la atención adecuada de la
crítica. Probablemente, muchos han sido los factores que han contribuido a ello,
así como las inmensas figuras poéticas peruanas posteriores a Melgar que han
ocupado la mayoría de las críticas literarias. En este caso, nos preguntamos,
¿Cuántos han sido inspirados por Melgar? (HÖGSKOLA, 2013, p. 8-9).

FONTE: GAMERO CANO, Flor de Lourdes. La poesía peruana arequipeña, romántica, e


intercultural. Suecia: Mälardalen University, School of Education, Culture and Communication. 2013.
http://www.diva-portal.org/smash/get/diva2:683002/FULLTEXT01.pdf. Acesso em: 4 abr. 2019.

Fragmento do romance Amalia, de José Mármol

[...] Al cabo de pocos minutos de marcha, detiene su caballo, gira sus ojos,
y convencido de que no veía ni oía nada, hace tomar el paso a su caballo, y dice
a Eduardo:

- Ya estás en salvo, pronto estarás en seguridad y curado.


- ¿Dónde? - le pregunta Eduardo con voz sumamente desfallecida.
- Aquí - le responde Daniel, subiendo el caballo a la vereda de una casa por
cuyas ventanas, cubiertas con celosías y los vidrios por espesas cortinas de
muselina blanca en la parte interior, se trasparentaban las luces que iluminaban
las habitaciones; y al decir aquella palabra, arrima el caballo a las rejas, e
introduciendo su brazo por ellas y las celosías, tocó suavemente en los cristales.
Nadie respondió, sin embargo. Volvió a llamar segunda vez, y entonces una voz
de mujer preguntó con un acento de recelo:
- ¿Quién es?
- Yo soy, Amalia, yo, tu primo.
- ¡Daniel! dijo la misma voz, aproximándose más a la ventana la persona del
interior.
- Sí, Daniel.

Y en el momento, la ventana se abrió, la celosía fue alzada, y una mujer


joven y vestida de negro inclinó su cuerpo hasta tocar las rejas con su mano.
Pero al ver dos hombres en un mismo caballo retiróse de esa posición, como
sorprendida.

- ¿No me conoces, Amalia? Oye: abre al momento la puerta de la calle; pero no


despiertes a los criados; ábrela tú misma.
- ¿Pero, qué hay, Daniel?
- No pierdas un segundo, Amalia, abre en este momento en que está solo el
camino; me va la vida, más que la vida, ¿lo entiendes ahora?

164
TÓPICO 3 | A LITERATURA HISPANO-AMERICANA DO SÉCULO XIX

¡Dios mío! - exclama la joven, que cierra la ventana, que se precipita a la


puerta de la sala, de ésta a la de la calle, que abre sin cuidarse de hacer poco o
mucho ruido, y que saliendo hasta la vereda dice a Daniel:

- ¡Entra! - pronunciando esta palabra con ese acento de espontaneidad sublime


que sólo las mujeres tienen en su alma sensible y armoniosa, cuando ejecutan
alguna acción de valor, que siempre es en ellas la obra, no del raciocinio, sino de
la inspiración.
- Todavía no - dice Daniel, que ya estaba en tierra con Eduardo sostenido por la
cintura; y de ese modo, y sin soltar la brida del caballo, llega a la puerta.
- Ocupa mi lugar, Amalia; sostén a este hombre que no puede andar solo.

Amalia, sin vacilar, toma con sus manos un brazo de Eduardo, que,
recostado contra el marco de la puerta, hacía esfuerzos indecibles por mover su
pierna izquierda que le pesaba enormemente.

¡Gracias, señorita, gracias! - dice con voz llena de sentimiento y de dulzura.


[...]
- ¡Ahora - dice Daniel -, adentro! - acercándose a la puerta, levantando a Eduardo
por la cintura hasta ponerlo en el zaguán, y cerrando aquélla. De ese mismo modo
lo introdujo a la sala, y puso, por fin, sobre un sofá a aquel hombre a quien había
salvado y protegido tanto en aquella noche de sangre; aquel hombre lleno de valor
moral y de espíritu todavía, y cuyo cuerpo no podía, sin embargo, sostenerse por
sí solo un momento.

FONTE: MÁRMOL, José. Amalia. Alicante: Biblioteca Virtual Miguel de Cervantes, 1999. https://
bit.ly/2xvjyUo. Acesso em: 21 set. 2018.

165
RESUMO DO TÓPICO 3

Neste tópico, você aprendeu que:

• As mudanças significativas de gêneros textuais na literatura hispano-


americana se deram a partir da chegada dos colonizadores espanhóis e junto
com eles houve um “transplante” da cultura europeia, em especial o Barroco,
que em terras hispano-americanas entrou em contato com a cultura artística
autóctone, e entre ambas culturas uma assimilou elementos artísticos da outra,
enriquecendo o que veio a se chamar Barroco hispano-americano.

• Os textos coloniais eram modelos de uma literatura europeia, com a expansão


das colônias espanholas também cresceu o número de intelectuais criollos, que
se destacaram em atividades literárias. Destacamos os escritores Andrés Bello
e Simon Bolívar neste período.

• Após as guerras, a busca de uma literatura nacional leva os escritores à


participação em diversas escolas, em sua maioria oriundas da Europa, como
o Romantismo, em que Esteban Echeverría, autor de La Cautiva, busca em
elementos autóctones o roteiro de suas histórias, e reflete de forma realista em
El Matadero, um dos períodos mais difíceis da história argentina.

• A literatura gauchesca teve em José Hernández um escritor de máxima


representação e com a publicação de Martín Fierro o nacionalismo é retratado a
partir do homem do campo, após a independência argentina, assim se dá início
ao Modernismo na literatura hispano-americana. Seu maior representante será
Rubén Darío, quem irá influenciar a Europa, com o pioneirismo do movimento
Modernista.

• No Peru, Ricardo Palma e o gênero tradição são um exemplo único da


diversidade literária hispano-americana.

• As imigrações para as Américas enriqueceram a cultura, a tradição e os


costumes do continente, assim se inicia no alvorecer do século XX uma nova
fase na literatura hispano-americana, com o advento das vanguardas históricas.

166
AUTOATIVIDADE

Apresentamos o poema, e propomos a você, acadêmico, uma série de tarefas


complementares.

1 Faça uma leitura dramatizada do poema Margarita Debayle (2003), escrito


por Rubén Darío, o poeta modernista, em voz alta, de pé e imagine estar de
frente a uma plateia:

QUADRO 5 – MARGARITA DEBAYLE

Margarita está linda la mar, La princesa no mentía.


y el viento Y así, dijo la verdad:
lleva esencia sutil de azahar; «Fui a cortar la estrella mía
yo siento a la azul inmensidad».
en el alma una alondra cantar;
tu acento: Y el rey clama: «¿No te he dicho
Margarita, te voy a contar que el azul no hay que cortar?
un cuento: ¡Qué locura!, ¡Qué capricho!...
El Señor se va a enojar».
Esto era un rey que tenía
un palacio de diamantes, Y ella dice: «No hubo intento;
una tienda hecha de día yo me fui no sé por qué.
y un rebaño de elefantes, Por las olas por el viento
un kiosko de malaquita, fui a la estrella y la corté».
un gran manto de tisú,
y una gentil princesita, Y el papá dice enojado:
tan bonita, «Un castigo has de tener:
Margarita, vuelve al cielo y lo robado
tan bonita, como tú. vas ahora a devolver».

Una tarde, la princesa La princesa se entristece


vio una estrella aparecer; por su dulce flor de luz,
la princesa era traviesa cuando entonces aparece
y la quiso ir a coger. sonriendo el Buen Jesús.

La quería para hacerla Y así dice: «En mis campiñas


decorar un prendedor, esa rosa le ofrecí;
con un verso y una perla son mis flores de las niñas
y una pluma y una flor. que al soñar piensan en mí».

Las princesas primorosas Viste el rey pompas brillantes,


se parecen mucho a ti: y luego hace desfilar
cortan lirios, cortan rosas, cuatrocientos elefantes
cortan astros. Son así. a la orilla de la mar.

167
Pues se fue la niña bella, La princesita está bella,
bajo el cielo y sobre el mar, pues ya tiene el prendedor
a cortar la blanca estrella en que lucen, con la estrella,
que la hacía suspirar. verso, perla, pluma y flor.

Y siguió camino arriba, ***


por la luna y más allá; Margarita, está linda la mar,
más lo malo es que ella iba y el viento
sin permiso de papá. lleva esencia sutil de azahar:
tu aliento.
Cuando estuvo ya de vuelta
de los parques del Señor, Ya que lejos de mí vas a estar,
se miraba toda envuelta guarda, niña, un gentil pensamiento
en un dulce resplandor. al que un día te quiso contar
un cuento.
Y el rey dijo: «¿Qué te has hecho?
te he buscado y no te hallé;
y ¿qué tienes en el pecho
que encendido se te ve?».

FONTE: <http://www.biblioteca.org.ar/libros/80.pdf>. Acesso em: 10 set. 2018.

2 Assista à animação realizada a partir do poema Margarita Debayle, disponível


on-line em: https://youtu.be/DOIa1jMzPgg.

3 Acesse o vídeo-quis (https://es.educaplay.com/es/recursoseducativos/1867653/


ruben_dario.htm). À medida que o vídeo avança, ele irá parar e você deve
responder às perguntas a partir da sua leitura do poema e da animação.

4 Complete os dados autobiográficos de Rubén Darío a partir deste jogo


sobre os dados do escritor. Você pode realizar on-line ou em papel. De
qualquer forma, a diversão e aprendizagem estão garantidas. Você já sabe
o significado de Azul na obra do escritor? Então, se precisar, faça uma
pesquisa antes para reconhecer ao que se referem as palavras. Disponível
em: https://www.educaplay.com/es/actividades/1753338/actividad.swf.

5 Escreva um breve comentário por escrito do poema Margarita Debayle e


lembre de apontar uma experiência própria sobre a leitura do texto poético.
Lembre-se de que na poesia a forma como o tema central é desenvolvido é
importante.

6 Por meio de um exercício de mudança de gênero textual, escreva uma


versão em prosa de alguns versos do poema Margarita Debayle. Sugerimos
um gênero breve, como um conto, uma crônica, uma carta, e observe que
o tema principal continua, apenas a forma de contar se torna diferente.
Registre as suas impressões pessoais após realizar o exercício.

168
UNIDADE 3

O PANORAMA DA LITERATURA
HISPANO-AMERICANA ENTRE OS
SÉCULOS XX E XXI

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de:

• avaliar o processo de formação da literatura hispano-americana;

• identificar os principais movimentos literários na virada do século XIX e


XX;

• analisar as vertentes da literatura contemporânea hispano-americana;

• apreciar a contribuição de elementos autóctones na busca de uma litera-


tura hispano-americana.

PLANO DE ESTUDOS
Esta unidade está dividida em três tópicos. No decorrer da unidade você
encontrará autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo apresentado.

TÓPICO 1 – A LITERATURA HISPANO-AMERICANA NA VIRADA DO


SÉCULO XX

TÓPICO 2 – O SÉCULO XX – A TEXTUALIDADE HISPANO-


AMERICANA

TÓPICO 3 – A LITERATURA CONTEMPORÂNEA HISPANO-


AMERICANA

169
170
UNIDADE 3
TÓPICO 1

A LITERATURA HISPANO-AMERICANA NA
VIRADA DO SÉCULO XX

1 INTRODUÇÃO
Neste tópico, você estudará os movimentos da literatura hispano-
americana a partir do eclipse do Modernismo e o início dos movimentos
vanguardistas no continente americano.

Cada época teve uma produção intelectual e de forma mais pontual


estudaremos o Modernismo, a Vanguarda e, dentro dela, uma geração de
escritores que irão fazer escola e influenciar toda uma literatura contemporânea
como inovadores de gêneros literários e movimentos.

Este tópico abordará a transição do Modernismo para a Vanguarda


hispano-americana. A virada do século XX, influenciada por um entorno
social conturbado por guerras, independências, invenções etc., atingiu uma
experimentação no campo artístico onde normas e valores estéticos tidos como
canônicos, até então, foram questionados e inovados.

2 A INFLUÊNCIA ESTRANGEIRA NA LITERATURA HISPANO-


AMERICANA
A influência da Europa em terras hispano-americanas era visível em
diversos setores, principalmente na Literatura, nas Artes, nos modelos de
educação. Muitos fatores além da Primeira Guerra influenciaram no descenso
econômico hispano-americano e, de acordo com Santos (2018, p. 122), os países
que sentiram a crise entre 1900 e 1930 foi devido a dois fatores importantes:
“ascensão de novas classes sociais e o início de uma fase fabril da economia
latino-americana”. O modelo de superação oligárquico aconteceu no México
com a revolução mexicana. Países como Argentina, Chile e Uruguai tiveram um
desenvolvimento capitalista, assim, no início da primeira década do século XX
surgem novas classes sociais (SANTOS, 2018).

Ao mesmo tempo que se tinha uma intensa troca intelectual entre as


Américas e a Europa, durante a virada do século XX, mais precisamente na
década de 1920, explodiu uma crise econômica e social, em grande parte como
consequência da Primeira Guerra Mundial no continente europeu, e isso afetou
os países hispano-americanos.

171
UNIDADE 3 | O PANORAMA DA LITERATURA HISPANO-AMERICANA ENTRE OS SÉCULOS XX E XXI

A expansão econômica nas Américas, que lutaram contra monopólios


oligárquicos, contra o escravismo, dentre outras situações, e se desenvolveram
dentro de um regime capitalista, teve fatores de crescimento econômico, como
a industrialização e a ascensão de classes sociais, que fortaleceram a burguesia
que passa a consumir artes e adquirir literatura, antes um privilégio para poucos.
Nem todos os países tiveram o mesmo crescimento, alguns permaneceram sob
ditaduras, o que impediu um maior desenvolvimento social e econômico.

DICAS

Para saber mais sobre o processo de independência latino-americana e o que


aconteceu depois, consulte a obra História da América: das independências à globalização,
disponível na Biblioteca Pearson na Plataforma Gioconda:

• SANTOS, Lara Taline dos. História da América: das independências à globalização [livro
eletrônico]/Lara Taline dos Santos. Curitiba: InterSaberes, 2018. Livro disponível na Biblioteca
Pearson na Plataforma Gioconda.

3 O MODERNISMO E SEUS MOVIMENTOS APÓS 1900


Trataremos do Modernismo e seus movimentos estéticos e literários após
o ano 1900, no entanto é importante retomar suas leituras da Unidade 2 a respeito
do que tal movimento significou.

O movimento poético hispano-americano, introduzido na Espanha por


Rubén Darío, como você já viu na Unidade 2, teve seu apogeu entre 1888 e 1910,
com uma miscelânea de verso em prosa, entre eles o comentado texto Azul,
publicado em 1888. Darío usou a palavra “modernismo” para designar a nova
tendência literária, assim como os simbolistas o fizeram. Darío é considerado o
centro do movimento Modernista.

Vale reiterar que, conforme Fernández-López (s.d, s.p.), “el modernismo


hoy en día ya no es moderno”, ou seja, não é sobre o teor da palavra moderno que
estamos falando, mas sim de uma construção teórica que contraria e inova com
o tradicionalismo, o classicismo, o purismo e a linguagem acadêmica rebuscada
e que em torno de 1920 já estará eclipsado. É um movimento que buscou
interpretar a ânsia por uma estética mais livre, mais criadora e menos refinada.
Buscava contrapor regras e quebrar paradigmas. Daí sua aproximação com a dita
vanguarda.

172
TÓPICO 1 | A LITERATURA HISPANO-AMERICANA NA VIRADA DO SÉCULO XX

El modernismo se desarrolla entre los años 1880-1914. Esta escuela


busca separarse de la burguesía y su materialismo, por medio de un
arte refinado y estetizante. Con respecto al lenguaje, el Modernismo
reacciona contra la retórica, el descuido formal del Romanticismo y la
vulgaridad del Realismo y del Naturalismo. Se nutre básicamente de
dos movimientos líricos surgidos en Francia, en la segunda mitad del
siglo XIX: el Parnasianismo y el Simbolismo (FERNÁNDEZ-LÓPEZ,
s.d., s.p.).

Muitos artistas e escritores americanos tiveram destaque nesta época (final


do século XIX e começo do século XX). Como este tema não se esgota com estas
unidades, e a partir da lista proposta por Fernández-López (s.d, s.p), encorajamos
você a pesquisar sobre os seguintes autores e sua obras:

• Leopoldo Lugones (1874-1938), poeta, narrador e ensaísta argentino.


• Julio Herrera y Reissig (1875-1910), poeta uruguaio.
• Ricardo Jaimes Freyre (1868-1933), poeta, ensaísta e historiador boliviano.
• Salvador Díaz Mirón (1853-1928), escritor e jornalista mexicano.

Conforme também mencionamos na Unidade 2, não poderíamos tratar


de todos se não fosse fazer uma pausa para explicar cada marco temporal,
principalmente no legado deixado na América Latina, como esta também deixou
na Espanha.

O destaque do Modernismo foi Rubén Darío, o poeta de dois continentes.


Ele teve a contribuição de um renomado ilustrador, poeta e humanista: Enrique
Ochoa (1891-1978), que ilustrou mais de 2000 desenhos para revistas e alguns
poucos livros, entre eles uma edição especial de Dom Quixote. Ochoa ilustrou as
obras completas de Darío, que iam de capas a desenhos livres ou que tivessem a
ver com as poesias.

FIGURA 1 – FRONTISPÍCIO COM ILUSTRAÇÃO DE OCHOA PARA AZUL, DE RUBÉN DARÍO

FONTE: <https://bit.ly/2FnJlDx>. Acesso em: 7 jan. 2018.

173
UNIDADE 3 | O PANORAMA DA LITERATURA HISPANO-AMERICANA ENTRE OS SÉCULOS XX E XXI

Após o sucesso de Rubén Darío como representante do Modernismo,


e outros escritores, surgiu um movimento que se contrapôs ao Modernismo e
renovou as letras nas Américas, chamado de Vanguarda.

Houve escritores, como César Vallejo, inscritos entre os dois movimentos


literários, por exemplo, ele publica no Modernismo e seus desdobramentos com
o pós-modernismo e com a literatura estão sempre em movimento, não são
estáticos, e ele ainda interage com obras vanguardistas.

O mesmo acontece com Borges, que escreve obras vanguardistas e, depois


passado o movimento, continua a publicar obras com outra estética literária.

3.1 CÉSAR VALLEJO


César Abraham Vallejo Mendoza (1892-1938) é considerado pela crítica
literária o maior escritor peruano e um dos mais reconhecidos do século XX.
César Vallejo, como é conhecido nos meios literários, foi autor de diversas obras
poéticas consideradas canônicas na literatura hispano-americana.

O livro de poemas Los Heraldos Negros (1918), considerado como primeira


obra de Vallejo e que tem uma notada influência modernista, vincula Vallejo ao
Modernismo iniciado por Rubén Darío: “Trata de temas como a dor, a orfandade,
a morte, o lar, a infância, o absurdo. Combina imagens da vida cotidiana com
temas mais profundos e que não foram bem reconhecidos pela sociedade
da época” (LANNOY, 2013, p. 78-79). A seguir, leia um fragmento do poema
de Vallejo (1979, p. 3) que dá nome ao livro de poemas Los Heraldos Negros,
relacionado ao período modernista do escritor:

Los Heraldos Negros

Hay golpes en la vida, tan fuertes... ¡Yo no sé!


Golpes como del odio de Dios; como si ante ellos,
la resaca de todo lo sufrido
se empozara en el alma... Yo no sé!

Son pocos; pero son... Abren zanjas oscuras


en el rostro más fiero y en el lomo más fuerte.
Serán tal vez los potros de bárbaros atilas;
o los heraldos negros que nos manda la Muerte.

Son las caídas hondas de los Cristos del alma


de alguna fe adorable que el Destino blasfema.
Esos golpes sangrientos son las crepitaciones
de algún pan que en la puerta del horno se nos quema.

174
TÓPICO 1 | A LITERATURA HISPANO-AMERICANA NA VIRADA DO SÉCULO XX

Y el hombre... Pobre... pobre! Vuelve los ojos, como


cuando por sobre el hombro nos llama una palmada;
vuelve los ojos locos, y todo lo vivido
se empoza, como charco de culpa, en la mirada.
Hay golpes en la vida, tan fuertes... ¡Yo no sé!

Após a fase modernista, integrou a vanguarda hispano-americana e


se consagra com a publicação de Trilce (1922), obra-prima do vanguardismo
hispano-americano. O livro reúne um conjunto de poemas do autor escritos na
sua maioria em 1919 (VALLEJO, 1979).

Vallejo (1979) inovou ao realizar aglutinações de palavras, como o título


do livro em que a palavra Trilce têm inúmeras explicações por parte da crítica,
por exemplo: a junção de triste+dulce; ou a referência a uma flor da cidade de
origem do escritor, ou o balbucio incoerente de palavras. A discussão centrada na
inovação lexical era uma das marcas da Vanguarda.

Leia um fragmento de Trilce, Parte I e II:

QUADRO 1 – POEMA TRILCE DE CÉSAR VALLEJO

I II
Quién hace tanta bulla y ni deja Tiempo Tiempo.
Testar las islas que van quedando. Mediodía estancado entre relentes.
Un poco más de consideración Bomba aburrida del cuartel achica
en cuanto será tarde, temprano, tiempo tiempo tiempo tiempo.
y se aquilatará mejor Era Era.
el guano, la simple calabrina tesórea Gallos cancionan escarbando en vano.
que brinda sin querer, Boca del claro día que conjuga
en el insular corazón, era era era era.
salobre alcatraz, a cada hialóidea Mañana Mañana.
grupada. El reposo caliente aún de ser.
Un poco más de consideración, Piensa el presente guárdame para
y el mantillo líquido, seis de la tarde mañana mañana mañana mañana
de los más soberbios bemoles. Nombre Nombre.
Y la península párase ¿Qué se llama cuanto heriza nos?
por la espalda, abozaleada, impertérrita Se llama Lomismo que padece
en la línea mortal del equilibrio. nombre nombre nombre nombre.
FONTE: <https://bit.ly/2RnlIBC>. Acesso em: 2 dez. 2018.

Aguirre, no prólogo das obras completas de Vallejo, relembra uma fase


política e vanguardista do escritor enquanto vivia na Europa:

175
UNIDADE 3 | O PANORAMA DA LITERATURA HISPANO-AMERICANA ENTRE OS SÉCULOS XX E XXI

Hacia 1929-1930 Vallejo escribe la nota siguiente: Hay la revolución


en literatura (que no es necesariamente revolución en política: Proust,
Giraudoux, Morand, Stravinski, Picasso) y hay la revolución en
literatura (que es necesariamente revolución en política: Prokofiev,
Barbusse, Diego Rivera). Esta última revolución es de temas y, a veces,
va acompañada de temas. En Rusia sólo se tiene en cuenta o, al menos,
se prefiere, la revolución temática. En París, la revolución técnica.
He aquí toda la diferencia entre revolucionario y reaccionario, entre
vanguardistas y retaguardistas etc. (VALLEJO, 1979, p. xvii).

Sobre o posicionamento político das vanguardas, muitos de seus escritores


irão se engajar literariamente, como Vallejo, em que a guerra civil espanhola faz
parte da sua escrita poética:

César Vallejo quien también sucumbe al llamado insoslayable de


la madre España en agonía, pero, fiel a su estirpe singular y a su
concepción poética y política, en lugar de integrarse sin más en esta
línea iniciada por Tuñón y continuada por Neruda y Guillén, escribe
en un rapto visceral de tres meses los poemas reunidos en España,
aparta de mí este cáliz, que, probablemente, es el mejor texto literario
escrito sobre la guerra civil española (LÓPEZ, 2016, p. 108).

DICAS

Você pode ler o livro com a obra completa de Cesar Vallejo em pdf: https://
repositorio.ufsc.br/handle/123456789/178892.
VALLEJO, César. Obra poética completa. Caracas: Biblioteca Ayacucho, 1979.

4 A VANGUARDA HISPANO-AMERICANA
O movimento vanguardista com uma proposta existencialista surgiu
na virada do século XX em meio ao fervor de movimentos sociais, como o
Anarquismo, fortemente representado em terras hispano-americanas.

Muitos escritores participaram do movimento vanguardista, mas foi o


chileno Vicente Huidobro quem impulsionou o estilo nas Américas, após uma
temporada passada em Paris e na Espanha e, por isso, é considerado o pai da
vanguarda hispano-americana.

176
TÓPICO 1 | A LITERATURA HISPANO-AMERICANA NA VIRADA DO SÉCULO XX

DICAS

Vale lembrar que na Europa foi intensa a produção intelectual vanguardista


em todas as artes, tendo outros representantes destacados, como foi a Geração do 27 e que
ficou conhecida como “Edad de Plata” da poesia espanhola. A denominação 27 tem origem
em uma homenagem ao terceiro centenário do aniversário da morte de Góngora em 1927
(MORALES, 2011).

Para saber mais, leia esta obra sobre a literatura espanhola:

MORALES, Gabriel Iglesias. Aplicaciones Didácticas de la Poesía y el Arte en el Aula De Ele.


Madri: Consejeria de España, 2011. Disponível em: https://bit.ly/2FWx9L8.

De acordo com Altamirano e Sarlo (1997), o vanguardismo hispano-


americano tem seu marco a partir da edição do Manifiesto no Periódico Martín
Fierro, escrito por Olivério Girondo. O texto também foi distribuído como panfleto.
A proposta do Manifiesto era uma “ruptura con las instituciones y costumbres de
un campo intelectual preexistente, cuyo desarrollo fue el que hizo socialmente
posible el surgimiento de la vanguardia” (p. 217). Era comunicada uma vontade
de inovar as regras da escrita literária e mostrar que a literatura mudava e estava
em constante movimento.

Colocamos um fragmento deste marco literário da vanguarda publicado


no periódico quinzenal de arte e crítica livre Martín Fierro, em 1924, mas em
seguida indicamos a referência onde o texto se encontra completo:

"MARTÍN FIERRO" siente la necesidad imprescindible de definirse


y de 'lamer a cuantos sean capaces de percibir que nos hallamos en
presencia de una NUEVA sensibilidad y de una NUEVA comprensión,
que, al ponernos de acuerdo con nosotros mismos, nos descubre
panoramas insospechados y nuevos medios y formal de expresión.
"MARTIN FIERRO" acepta las consecuencias y las responsabilidades
de localizarse, porque sabe que de ello depende su salud. Instruido
de sus antecedentes, de su anatomía, del meridiano en que camina:
consulta el barómetro, el calendario, antes de salir a la calle a vivirla
con sus nervios y con su mentalidad de hoy (GIRONDO, 1924, s.p.).

A poesia foi o veículo principal dos textos vanguardistas. Rompeu com


a estrutura linear, a rima, a métrica e priorizou o verso livre. Os temas eram
fatalistas, porém, após o primeiro momento da Vanguarda, e principalmente
com a Guerra civil espanhola, tinha-se uma discussão política em letras que
transpareciam em poemas e com os problemas sociais latino-americanos.

177
UNIDADE 3 | O PANORAMA DA LITERATURA HISPANO-AMERICANA ENTRE OS SÉCULOS XX E XXI

DICAS

A revista Martín Fierro foi um importante veículo literário e deve o seu nome
ao personagem gauchesco criado por José Hernández. Você pode ler o texto completo do
Manifesto vanguardista em: Manifiesto de Martín Fierro: periódico quincenal de arte y crítica
libre.

GIRONDO, Oliverio. Martín Fierro: Periódico quincenal de arte y crítica libre. Buenos Aires, v.
1, n. 4, May. 1924. Disponível em: https://bit.ly/2BL2Djb.

FIGURA 2 – PANFLETO DISTRIBUÍDO COM O “MANIFIESTO”

FONTE: <https://bit.ly/2BL2Djb>. Acesso em: 1º dez. 2018.

FIGURA 3 – PORTADA DO “PERIÓDICO MARTÍN FIERRO”

FONTE: <https://bit.ly/2E7sTH7>. Acesso em: 1º dez. 2018.

178
TÓPICO 1 | A LITERATURA HISPANO-AMERICANA NA VIRADA DO SÉCULO XX

A exemplo do que aconteceu no barroco espanhol, em que dois estilos


tão diferentes como o Conceptismo e o Culteranismo eram parte da arte barroca,
surgiram dentro da Vanguarda Hispano-americana movimentos conhecidos
como o Creacionismo, no Chile, o Ultraísmo, na Argentina, e o Estridentismo, no
México.

4.1 POR DENTRO DA VANGUARDA


Cada um desses estilos literários tinha suas próprias características e seus
representantes. Acabaram por incorporar novidades na forma e conteúdo literário
e de fato representaram uma ruptura com os modelos literários conhecidos.
Comparemos brevemente, no quadro a seguir, as principais características:

QUADRO 2 – VANGUARDA HISPANO-AMERICANA E SEUS PRINCIPAIS MOVIMENTOS


HISPANO-AMERICANOS

Creacionismo • Os textos são escritos sem as descrições


características do Romantismo.
Representante do estilo: • Valorização dos efeitos visuais produzidos por
Vicente Huidobro figuras literárias, como as metáforas, ecfrasis.
• Uso de uma nova estética, como as fontes das
letras.
• O poeta acredita que é o próprio autor da sua
criação, um sentimento de todo poderoso.
• O uso da vírgula é restringido e se abusa do ponto
e vírgula.
Ultraísmo • Uso da metáfora.
• Textos enxutos e sem nenhum ornamento retórico.
Representante do estilo: • As imagens criadas no texto se confundem entre
Jorge Luis Borges elas.
• Textos ilógicos para o leitor.
• Uso massivo de neologismos, tecnicismos e
proparoxítonas.
• Uso da rima livre.

179
UNIDADE 3 | O PANORAMA DA LITERATURA HISPANO-AMERICANA ENTRE OS SÉCULOS XX E XXI

Estridentismo No México, a vanguarda teve seu impulso com a


no México obra de José Tablada, conforme Oviedo (2001, p.
385), em que um grupo de escritores denominado
Representante fundador “Estridentistas” ou Estridentismo, como ficou
do estilo: conhecido o movimento, realiza produções artísticas
Manuel Maples Arce não somente na literatura, mas também nas artes
pictóricas. O Estridentismo no México, de acordo
com Oviedo: “El año de 1921 es clave: muere López
Velarde y Vasconcelos inicia su vasto programa
cultural dentro del marco revolucionario. [...] sus
lazos con el dadaísmo, el futurismo (en sus versiones
italiana y rusa) y sobre todo con el ultraísmo han sido
reconocidos por todos. [...] En todos esos aspectos, se
nota la preocupación del grupo por crear una estética
definida por los valores del maquinismo y la técnica;
por eso eligieron el aeroplano como emblema. Su
radicalismo era también político, como puede verse or
su tercer manifiesto, que clamaba: “Muera la reacción
intelectual y momificada!” (OVIEDO, 2001, p. 386).
FONTE: As autoras

4.2 VICENTE HUIDOBRO


Vicente Huidobro ou Vicente García-Huidobro Fernández (1893-1948),
chileno, poeta, é considerado o representante do movimento denominado
Creacionismo na estética vanguardista.

O Creacionismo se refere ao ato criativo para a escrita de um poema e sobre


o pensamento de Huidobro se escreveu bastante para explicar no que consistia o
movimento e sua obra:

[...] la inteligencia poética, en Huidobro, se identifica con la


imaginación. En el sistema poético que él propone, "la imaginación
arrasa con la sensibilidad". Habría que aclarar que, por supuesto, no
se trata de una ruptura total entre los dos términos; la imaginación,
para Huidobro, absorbe la sensibilidad y la sitúa en un plano estético.
Aun habla directamente de la emoción. En uno de sus manifiestos,
dice: "El poeta es un pequeño dios. Se trata, pues, de condensar el
caos en diminutos planetas de emoción". Lo que sí parece excluir es
la emotividad que se vuelve patética o, como se dice, "humana". "No
escribas con sangre de tu corazón. ¡Qué nos importa tu corazón!", era
uno de sus consejos, ligeramente burlón. Sin embargo, no desconocía
la fuerza de la pasión; por ello podía escribir también: "Todo aquello
que disciplina el corazón, prepara una derrota de nosotros mismos,
de nuestro yo absoluto". Lo que él quería era no sólo deslindar el
campo de lo psicológico y de lo estético, sino, igualmente, identificar
la pasión con la obra misma. Casi al comienzo de su labor, en 1917,
decía: "L'émotion doit naitre de la seule vertu créatrice". De este modo,
el poema se constituía en centro de la actividad creadora: el mundo

180
TÓPICO 1 | A LITERATURA HISPANO-AMERICANA NA VIRADA DO SÉCULO XX

confluye en él y fluye de él; el poeta lo crea y a un tiempo es creado


por él. Esto, por tanto, era proponer la impersonalidad (SUCRE, 1985,
p. 96-97).

Autor de diversos textos, Huidobro escreveu entre eles o Poemario, em que


se destacam os princípios em que o Creacionismo vanguardista se fundamentava.
Leia os versos do seguinte poema e observe as características:

QUADRO 3 – POEMA: QUE EL VERSO SEA COMO UNA LLAVE

Que el verso sea como una llave

Que abra mil puertas.


Una hoja cae; algo pasa volando;
Cuanto miren los ojos creado sea,
Y el alma del oyente quede temblando.

Inventa mundos nuevos y cuida tu palabra;


El adjetivo, cuando no da vida, mata,

Estamos en el ciclo de los nervios,


El músculo cuelga,
Como recuerdo, en los museos;
Mas no por eso tenemos menos fuerza:
El vigor verdadero
Reside en la cabeza.

Por qué cantáis la rosa ¡oh, Poetas!


Hacedla florecer en el poema;

Sólo para vosotros


Viven todas las cosas bajo el Sol.

El poeta es un pequeño Dios.

FONTE: <https://bit.ly/2FYhQBM>. Acesso em: 1º dez. 2018.

Nesse poema se encontram algumas questões comentadas anteriormente


e próprias da Vanguarda. Perceba, no poema de Huidobro, uma exaltação à
prática da poesia como um ato criador, um pensamento transgressor para a época
em que foi lançado, já que a sociedade era regida por instituições e seus códigos
cívicos, morais etc. Observe a métrica e a rima, elas já não seguem normas rígidas
como as encontradas em uma poética anterior e o tema do poema fica sem uma
clara evidência do que se trata. Um dos pressupostos da escrita vanguardista era
o automatismo, deixar fluir o pensamento de forma que a lógica não interferisse
na fluidez poética da escrita.

181
UNIDADE 3 | O PANORAMA DA LITERATURA HISPANO-AMERICANA ENTRE OS SÉCULOS XX E XXI

Huidobro entrou em contato com o estilo em Paris, onde conheceu a


vanguarda europeia. Ele foi influenciado pelo Cubismo literário e pelo Futurismo,
ao retornar para a América divulga o movimento a partir de seus escritos.
Huidobro escreveu Altazor, sua obra mais estudada pela crítica literária, também
incursionou na prosa escrevendo romances e textos dramáticos.

DICAS

: Saiba mais sobre esses movimentos dentro da Vanguarda:

FUTURISMO: movimento artístico que surgiu na virada do século XX e que definhou após
a Primeira Guerra Mundial. Encontra-se na base de outros movimentos, como o Cubismo,
Dadaísmo, Surrealismo.
CUBISMO: movimento pictórico surgido dentro da vanguarda europeia e que se utiliza de
formas geométricas como expressão gráfica em obras de artes. Tem uma estreita relação com
a literatura por conta do relacionamento entre pintores e escritores, e o francês Guillaume
Apollinaire (1880-1918) será um de seus representantes, autor de um manifesto publicado
em 1912 marca o inicio do movimento. O Cubismo abre o caminho, posteriormente, para o
movimento estético literário Concretismo.

Para saber mais sobre o Cubismo, leia o Manifesto de Apollinaire na íntegra. Disponível em:
https://conteudos.files.wordpress.com/2016/02/manifestocubista.pdf.

4.3 JORGE LUÍS BORGES


Jorge Francisco Isidoro Luis Borges nasceu em Buenos Aires, em 1899,
e faleceu em 1986. Ele, antes de tudo, foi um “excelente lector” e um escritor
reconhecido pelo seu trabalho literário (PIGLIA, 2000, p. 1550). Também foi
tradutor de obras da língua inglesa para a espanhola.

Trabalhou durante toda a sua vida com as letras, por isso organizou
revistas, movimentos literários, antologias, escreveu artigos de crítica literária,
realizou palestras para universidades, ensinou literatura no exercício do
magistério e exerceu o cargo de diretor da Biblioteca Nacional Argentina, entre
outras atividade durante o século XX. O universo literário de Borges é estudado
sob diversos aspectos da crítica literária continuamente, e não se esgota.

Borges escreveu as primeiras obras: Fervor de Buenos Aires (1923), Luna


de enfrente (1925) e Cuaderno San Martín (1929), em que retrata a cidade e seus
movimentos no período de transição entre o final do Modernismo e a Vanguarda.
Elas são escritas em um período em que o escritor ficou conhecido como “o
jovem Borges”. Durante a vanguarda, o Ultraísmo teve em Borges seu maior
representante e publicou diversas obras.

182
TÓPICO 1 | A LITERATURA HISPANO-AMERICANA NA VIRADA DO SÉCULO XX

Leia a seguir um fragmento do poema de Borges com características


ultraístas, que foi publicado na Revista Ultra, de Madrid, ano I, n. I, em 27 de
janeiro de 1921, p. 3:

Mañana

A Antonio M. Cubero

Las banderas cantaron sus colores


y el viento es una vara de bambú entre las manos
El mundo crece como un árbol claro
[...]
Arriba el cielo vuela
y lo surcan los pájaros como noches errantes
La mañana viene a posarse fresca en mi espalda

DICAS

Para ler o poema Manãna na íntegra, acesse https://bit.ly/2CpeJ0B.

DICAS

Você pode saber mais sobre Jorge Luis Borges visitando o site on-line da
fundação organizada por Maria Kodama, em Buenos Aires:
Fundação Internacional Jorge Luis Borges – dedicada a difundir e manter a obra do escritor,
assim como realizar uma visita se estiver na cidade portenha. Disponível em: https://bit.
ly/2VI5Qbj.

Você já leu antes algo sobre Borges e sua fase vanguardista, agora vamos
falar de Borges e sua escrita após o movimento da vanguarda ser eclipsado e
o escritor continuar com sua escrita literária. Aqui, iremos falar um pouco do
conceito de ficção que Borges tinha, conforme dois de seus críticos: Ricardo Piglia
e Juan José Saer.

Pensar em ficção é lembrar de um paradoxo, já que incorpora um termo falso


com uma aparência de verdade, com o objetivo de “enganar” o leitor. Este pode
esquecer, por alguns momentos, que a leitura é apenas um produto da imaginação,
uma invenção, e que toma elementos reais para dar veracidade à história.
183
UNIDADE 3 | O PANORAMA DA LITERATURA HISPANO-AMERICANA ENTRE OS SÉCULOS XX E XXI

Um exemplo são romances ou novelas, em que a trama é verossímil,


mesmo quando só tem semelhança com a vida real ou há elementos fantásticos,
irreais incorporados na trama. Um exemplo a ser dado é o extenso ensaio de Juan
José Saer, do qual extraímos esta breve explicação sobre o conceito de ficção de
forma geral:

La ficción no es, por lo tanto, una reivindicación de lo falso. Aun


aquellas ficciones que incorporan lo falso de un modo deliberado –
fuentes falsas, atribuciones falsas, confusión de datos históricos con
datos imaginarios, etcétera –, lo hacen no para confundir al lector, sino
para señalar el carácter doble de la ficción, que mezcla, de un modo
inevitable, lo empírico y lo imaginario (SAER, 2014, p.12).

Na escrita de Borges, Saer faz uma colocação específica sobre a escrita


ficcional de Borges: “Si llama Ficciones a uno de sus libros fundamentales, no lo
hace con el fin de exaltar lo falso a expensas de lo verdadero, sino con el de sugerir
que la ficción es el medio más apropiado para tratar sus relaciones complejas”
(SAER, 2014, p. 14). A partir do uso da ficção, Borges e outros escritores hispano-
americanos lançam as bases para uma escrita em que o real e o imaginário
permitem uma leitura reflexiva que vai além do entretenimento.

O universo borgiano compreendia em sua escrita uma série de imagens


e ideias frequentemente utilizadas, uma síntese dos temas borgianos são as
bibliotecas, o eterno retorno, o labirinto e as mitologias. Temas repetidamente
encontrados em sua narrativa ficcional.

DICAS

Faça uma pausa antes de prosseguir e leia esse conto de Borges. Sugerimos
que durante a leitura você observe como Borges trabalha os elementos básicos de um conto:
o enredo, o tema, os personagens, a ação, o espaço e o tempo. El jardín de los senderos que
se bifurcan, de Jorge Luis Borges está disponível em: https://ciudadseva.com/texto/el-jardin-
de-los-senderos-que-se-bifurcan/.

A chamada literatura fantástica hispano-americana é atribuída a Borges


e considera-se a obra Ficciones (1944) o marco do conceito sobre o fantástico
hispano-americano. Escreveu a partir de contos, relatos, uma narrativa curta, em
que os elementos conceituais do fantástico são presentes.

184
TÓPICO 1 | A LITERATURA HISPANO-AMERICANA NA VIRADA DO SÉCULO XX

DICAS

Na virada do século XX um escritor uruguaio, Horacio Silvestre Quiroga Forteza,


conhecido como Horácio Quiroga (1878-1937), também se inscreve no gênero fantástico
a partir de seus contos. Veja mais sobre sua escrita nesta obra: CUENTOS DE AMOR, DE
LOCURA Y DE MUERTE, um livro em pdf que está disponível neste link: http://www.biblioteca.
org.ar/libros/211732.pdf.

Ainda quando se tenta classificar uma literatura quanto ao tipo de estética


literária à qual ela pertence surgem dificuldades, podendo incorrer em erros.
Vale lembrar que se há conto fantástico também há o realista e, muitas vezes, as
características de um e outro são muito tênues, pois o fantástico apresenta um
grau de realismo em sua narrativa que um leitor desavisado acaba por imaginar
que tudo é verossímil na obra.

DICAS

Ricardo Piglia, um importante escritor e crítico literário argentino, ao falar


sobre Borges em sua aula sobre a literatura borgeana, a chama de ficção especulativa ou
literatura conceitual. O crítico compartilha com seus ouvintes que Borges encontrou uma
fórmula de levar o leitor a um lugar fora do senso comum, dos finais previsíveis, o leva a
um estranhamento e a uma reflexão posterior. A literatura fantástica de Borges, com raízes
no gótico saxão, difere do que mais adiante serão os gêneros realismo mágico e ou real
maravilhoso difundidos no boom hispano-americano.

Assista a esta aula ministrada por Ricardo Piglia, eminente crítico e escritor argentino sobre
a vida de obra de Jorge Luis Borges e entenda melhor o que Piglia ensina sobre o escritor.
Vídeo: Ricardo Piglia analiza vida y obra de Jorge Luis Borges.
Disponível em: https://bit.ly/2ROjKJN.

Sardiñas (2007, p. 9) menciona que o prólogo de Bioy Casares para


“Antología da literatura fantástica que Borges, Silvina Ocampo y el propio Bioy
publicaron en 1940 parece ser el primer texto hispanoamericano más o menos
teórico que intenta explicar qué es un cuento o relato fantástico” e Cortázar, em
suas aulas de literatura, faz o registro de que a estética fantástica na literatura
hispano-americana se desenvolve a partir de 1920, e ratifica que são as obras de
Borges que dão maior visibilidade ao tema: “é nas duas margens do Rio da Prata
que se encontra a máxima concentração deste gênero. [...] Ali, e sem muitos sinais
premonitórios, a dimensão do fantástico entra em erupção com as principais
obras de Jorge Luis Borges” (CORTÁZAR, 1999, p. 92). Ele ainda cita os escritores
Juana Manuela Gorriti e Eduardo Ladislao Holmberg, “fiéis herdeiros da tradição
185
UNIDADE 3 | O PANORAMA DA LITERATURA HISPANO-AMERICANA ENTRE OS SÉCULOS XX E XXI

gótica anglo-saxã com todas as suas características boas e más”, e inclui ao poeta
argentino, Leopoldo Lugones como escritores precursores de textos fantásticos
(CORTÁZAR, 1999, p. 92).

O legado de Borges compreende centenas de textos literários, ensaios e


artigos. Duas obras entre outras são importantes: Ficciones (1944) inclui o conto
El jardín de senderos que se bifurcan. Com a publicação ganha o Prêmio de Honra
da Sociedade Argentina de Escritores; e El Aleph (1949), um livro de contos
fantásticos.

DICAS

Conheça a escritora Alfonsina Storni no portal dedicado a ela e sua obra na


Biblioteca Virtual Cervantes em http://www.cervantesvirtual.com/portales/alfonsina_storni/.

186
TÓPICO 1 | A LITERATURA HISPANO-AMERICANA NA VIRADA DO SÉCULO XX

LEITURA COMPLEMENTAR

TEXTO 1:

Poema Altazor escrito por Vicente Huidobro (observe a falta de pontuação


no poema):

Canto I

Altazor ¿por qué perdiste tu primera serenidad?


¿Qué ángel malo se paró en la puerta de tu sonrisa
Con la espada en la mano?
¿Quién sembró la angustia en las llanuras de tus ojos como el adorno de
un dios?
¿Por qué un día de repente sentiste el terror de ser?
Y esa voz que te gritó vives y no te ves vivir
¿Quién hizo converger tus pensamientos al cruce de todos los vientos del
dolor?
Se rompió el diamante de tus sueños en un mar de estupor
Estás perdido Altazor
Solo en medio del universo
Solo como una nota que florece en las alturas del vacío
No hay bien no hay mal ni verdad ni orden ni belleza
¿En dónde estás Altazor?

La nebulosa de la angustia pasa como un río


Y me arrastra según la ley de las atracciones
La nebulosa en olores solidificada huye su propia soledad
Siento un telescopio que me apunta como un revólver
La cola de un cometa me azota el rostro y pasa relleno de eternidad
Buscando infatigable un lago quieto en donde refrescar su tarea ineludible

Altazor morirás Se secará tú voz y serás invisible

La Tierra seguirá girando sobre su órbita precisa


Temerosa de un traspiés como el equilibrista sobre el alambre
que ata las miradas del pavor
En vano buscas ojo enloquecido
No hay puerta de salida y el viento desplaza los planetas
Piensas que no importa caer eternamente si se logra escapar
¿No ves que vas cayendo ya?
Limpia tu cabeza de prejuicio y moral
Y si queriendo alzarte nada has alcanzado
Déjate caer sin parar tu caída sin miedo al fondo de la sombra
Sin miedo al enigma de ti mismo
Acaso encuentres una luz sin noche
Perdida en las grietas de los precipicios
187
UNIDADE 3 | O PANORAMA DA LITERATURA HISPANO-AMERICANA ENTRE OS SÉCULOS XX E XXI

Cae

Cae eternamente
Cae al fondo del infinito
Cae al fondo del tiempo
Cae al fondo de ti mismo
Cae lo más bajo que se pueda caer
Cae sin vértigo
A través de todos los espacios y todas las edades

FONTE: HUIDOBRO, 2000, p. 18-19. Alicante. Biblioteca Virtual Miguel de Cervantes, 2000.
https://bit.ly/2QdMzzB. Acesso em: 1º dez. 2018.

TEXTO 2:

Leia o poema Sur de Jorge Luis Borges, publicado na obra Fervor de Buenos
Aires em 1923, ainda sob a influência do movimento ultraísta e perceba a quebra
de métrica, rima e as repetições, a falta de pontuação entre os versos, entre outros
aspectos.

El Sur

Desde uno de tus patios haber mirado


las antiguas estrellas,
desde el banco de
la sombra haber mirado
esas luces dispersas
que mi ignorancia no ha aprendido a nombrar
ni a ordenar en constelaciones,
haber sentido el círculo del agua
en el secreto aljibe,
el olor del jazmín y la madreselva,
el silencio del pájaro dormido,
el arco del zaguán, la humedad
-esas cosas, acaso, son el poema.

FONTE: <http://rodolfogiunta.com.ar/recursos/Fuente%20005.pdf>. Acesso em: 1º dez. 2018.

TEXTO 3:

A introdução do Prof. Jorge Schwartz sobre o vanguardismo hispano-


americano nos oferece uma perspectiva sobre as possíveis datas do início da
Vanguarda. Recomendamos a leitura da obra na íntegra que conta edição em
português, publicada pela Edusp:

[...]

188
TÓPICO 1 | A LITERATURA HISPANO-AMERICANA NA VIRADA DO SÉCULO XX

A pesar de que es común encuadrar a las vanguardias latinoamericanas


en el periodo de los años veinte, decenio en el cual los movimientos alcanzan
su mayor auge, no me atuve a ese límite cronológico. Una posible fecha inicial,
demasiado generosa a mi ver, sería 1909, año en que Marinetti lanza en París
el Manifiesto Futurista (20 de febrero de 1909), cuyas repercusiones en América
Latina fueron casi inmediatas. Pocas semanas más tarde, en la edición del 5 de abril
del prestigioso diario La Nación de Buenos Aires, Rubén Darío, figura principal
del modernismo hispanoamericano, es el primero en publicar una reseña sobre el
innovador trabajo de Marinetti como poeta, dramaturgo y director de la revista
Poesía. Darío traduce los once puntos del manifiesto (a pesar de que lo considera
“inútil”) y hace un extenso comentario crítico, una especie de irónico canto del
cisne de quien, a fines del siglo xix, había revolucionado la estética simbolista-
decadentista en lengua castellana. No menos sorprendente es que, a fines de esc
mismo año de 1909, un diario de Salvador, en Bahía, publique el artículo “Urna
nova escola literária” de Almacchío Diniz, primera mención al futurismo en el
Brasil. Estas dos referencias deben considerarse como las primeras noticias de las
vanguardias en tierras latinoamericanas.

Una fecha más apropiada para la inauguración de las vanguardias


latinoamericanas, aunque distante de los años veinte, es la lectura del manifiesto
Non serviam por Vicente Huidobro, en 1914. [...] Otra posibilidad cronológica es
la fijación de 1922 como annus mira- bilis de las vanguardias internacionales y
latinoamericanas.

En la introducción al índice de la nueva poesía americana, de 1926,


Borges adopta 1922 como fecha generacional iniciadora de una nueva era en las
letras: “Desde mil novecientos veintidós —la fecha es tanteadora: se trata de una
situación de conciencia que ha ido definiéndose poco a poco— todo eso [las obras
de Darío, Lugones, Rodó, etc.] ha caducado”. Un año más tarde, en 1927, en la
“Justificación“ de Pedro Juan Vignale y César Tiempo a la Exposición de la actual
poesía argentina, encontramos esta frase: “Presentamos aquí, a más de cuarenta
poetas aparecidos después de 1922 y que constituyen los diversos núcleos y
aledaños de la nueva generación literaria” (SCHWARTZ, 2002, p. 36-37).

FONTE: SCHWARTZ, Jorge. Las vanguardias latinoamericanas. Textos programáticos y críticos.


Trad. de Estela Dos Santos. México: FCE, 2002.

189
RESUMO DO TÓPICO 1
Neste tópico, você aprendeu que:

• Sobre a passagem do século XIX para o XX, como o movimento do Modernismo


marcado pela escrita de Rubén Darío cede ante um movimento novo que surge
na Europa denominado Vanguarda.

• O escritor César Vallejo fez parte do Modernismo e da Vanguarda escrevendo


obras com características de cada movimento.

• Escritores hispano-americanos entram em contato com os grupos vanguardistas


e começam a escrever textos com uma estética variada dentro do movimento,
embora cada uma concentre algumas características.

• A Vanguarda faz escola nas Américas, com pelo menos dois movimentos
expressivos: o Creacionismo e o Ultraísmo, com representantes de peso e uma
vasta produção textual.

• Escritores como Vicente Huidobro e Jorge Luis Borges foram representantes do


movimento vanguardista.

• Aos poucos, a Vanguarda perde força e expressão e um novo panorama literário


começa a ser desenhado no horizonte.

190
AUTOATIVIDADE

1 A respeito do movimento literário do Modernismo hispânico, escolha a


alternativa com sequência correta de V (Verdadeira) ou F (Falsa):

I- O Modernismo hispânico tem como grande referencial e iniciador o poeta


nicaraguense Rubén Darío, que publicou “Azul” em 1888 durante sua
estância no Chile.
II- No seguinte fragmento: “Era mui aficionado a las artes el soberano, y
favorecía con gran largueza a sus músicos, a sus hacedores de ditirambos,
pintores, escultores, boticarios, barberos y maestros de esgrima” (DARÍO,
s.d., s.p.), uma das características do Modernismo hispano-americano faz
referência frequente à Idade Média, dando ênfase a ela ou a colocando
como fonte de inspiração.
III- A frase extraída do excerto abaixo: “bellos libros sobre cuestiones
gramaticales” e que valoriza a gramática refere-se a Dario?
“El rei tenía un palacio soberbio donde había acumulado riquezas y objetos
de arte maravillosos. Llegaba a él por entre grupos de lilas y estensos
estanques, siendo saludado por los cisnes de cuellos blancos, antes que por
los lacayos estirados. Buen gusto. Subía por una escalera llena de columnas
de alabastro y de esmaragdina, que tenía a los lados leones de mármol
como los de los tronos salomónicos. Refinamiento. A más de los cisnes,
tenía una vasta pajarera, como amante de la armonía, del arrullo, del trino;
y cerca de ella iba a ensanchar su espíritu, leyendo novelas de M. Ohnet,
o bellos libros sobre cuestiones gramaticales, o críticas hermosillescas. Eso
sí: defensor acérrimo de la corrección académica en letras, y del modo
lamido en artes; ¡alma sublime amante de la lija y de la ortografía!”

a) ( ) V, F, F.
b) ( ) V, V, F.
c) ( ) V, F, V.
d) ( ) V, V, V.

2 De acordo com os conhecimentos gerais sobre literatura hispano-americana,


responda às questões propostas e assinale a alternativa correta:

Questão A
I- A narrativa hispano-americana se tornou empobrecida no século XIX.
II- Os escritores hispano-americanos escreveram em prosa e verso.
III- Alguns escritores atravessaram décadas e movimentos literários.

É correto o que se afirma em:


a) ( ) I, apenas.
b) ( ) III, apenas.
c) ( ) I e II, apenas
d) ( ) II e III, apenas
191
Questão B
I- A literatura se tornou um tipo de escrita refinada e sofisticada somente a
partir de 1970.
II- Os escritores realizaram escolhas lexicais “complexas” da língua
portuguesa.
III- Rima e métrica são elementos característicos do verso.

É correto o que se afirma em:


a) ( ) I, apenas.
b) ( ) III, apenas.
c) ( ) I e II, apenas
d) ( ) II e III, apenas

Questão C
I- Cubismo e Futurismo são movimentos inseridos na Vanguarda.
II- Huidobro, autor de Altazor, foi precursor do Creacionismo.
III- Borges teve uma fase inicial de escritor conhecida como o jovem Borges.

É correto o que se afirma em:


a) ( ) I, apenas.
b) ( ) III, apenas.
c) ( ) I e II, apenas
d) ( ) I, II e III.

192
UNIDADE 3
TÓPICO 2

O SÉCULO XX – A TEXTUALIDADE HISPANO-AMERICANA

1 INTRODUÇÃO
Neste tópico são apresentados alguns escritores latino-americanos de
maior proeminência durante o século XX e que, devido aos críticos literários, se
tornaram canônicos nas letras hispano-americanas.

O século XX foi rico especialmente para a literatura hispano-americana.


De autores premiados a uma produção inovadora, que em nada deixava a desejar
a autores consagrados da época. A literatura era também comprometida social e
culturalmente.

As narrativas se desenvolveram a ponto de desencadear, na década de


1960, o chamado boom hispano-americano, momento ímpar para as letras, que
abriu caminhos para a universalização e o reconhecimento mundial da literatura
hispano-americana e de muitos autores. Vale ressaltar que o termo boom foi alvo
de protestos por parte de intelectuais pelo fato do nome que deu ao fenômeno de
reconhecimento literário estar em língua inglesa.

2 AFIRMAÇÃO DE UMA LITERATURA HISPANO-


AMERICANA
A literatura hispano-americana cresceu, daquelas cartas e diários iniciais,
dos panfletos revolucionários, os gêneros literários proliferam. A escrita e a leitura
já não são exclusivas de meios sociais mais elevados. Costa (2001, p. 2) oferece um
bom exemplo de como a literatura teve um salto extraordinário no início de 1960:
“[...] antes dos anos 60, as obras de Cortázar, Asturias, Onetti ou Borges apenas
alcançavam edições de 2.000 exemplares, que permaneciam por longos anos
em livrarias sem que se esgotassem. No momento do boom, as mesmas obras
alcançaram tiragens de 20.000 exemplares anuais”.

A escrita se tornou uma arte que empregou os recursos estéticos que


tinha a mão ou que inventou para desenvolver os gêneros narrativos. Os textos
apresentaram uma escrita que demonstrou ousadia e amadurecimento literário
hispano-americano. O mercado se expandiu para uma aquisição de obras
literárias acessíveis ao povo em geral e como entretenimento. Muitas obras foram
traduzidas para o francês e o inglês.

193
UNIDADE 3 | O PANORAMA DA LITERATURA HISPANO-AMERICANA ENTRE OS SÉCULOS XX E XXI

O número de publicações dos escritores do continente americano


demonstrou a curiosidade, principalmente de europeus, de ler e saber sobre o
movimento hispano-americano. O movimento literário iniciado antes do século
XIX cresceu com sucesso.

Autores do porte de Julio Cortázar, Gabriel García Márquez, Mario


Vargas Llosa são exemplos de autores reconhecidos mundialmente pelos seus
textos literários. Outros somente foram reconhecidos posteriormente ao boom,
como o caso de Juan Rulfo, Ernesto Sábato, Alejo Carpentier. Naturalmente por
conta do espaço será impossível referenciar todos. São muitos os escritores que
se destacam, homens e mulheres, alguns são mais conhecidos, outros ainda estão
para ser descobertos. Um gênero comum a esses escritores é a escrita de contos. O
conto, gênero por excelência e comum à maioria dos escritores de prosa hispano-
americana, terá no escritor e ensaísta Ricardo Piglia – Tesis sobre el cuento. Los dos
hilos: Análisis de las dos historias – a construção de um conjunto de normas como
forma de realizar uma crítica quando se estuda o gênero textual.

DICAS

Piglia (s.d.) expõe 12 considerações sobre o conto. Leia a primeira delas e


depois busque no link o decálogo completo.
PIGLIA, Ricardo. Tesis sobre el cuento. Disponível em: https://ciudadseva.com/texto/tesis-
sobre-el-cuento/.

Tesis I
En uno de sus cuadernos de notas, Chejov registró esta anécdota: “Un hombre, en
Montecarlo, va al casino, gana un millón, vuelve a casa, se suicida”. La forma clásica del
cuento está condensada en el núcleo de ese relato futuro y no escrito. Contra lo previsible y
convencional (jugar-perder-suicidarse), la intriga se plantea como una paradoja. La anécdota
tiende a desvincular la historia del juego y la historia del suicidio. Esa escisión es clave para
definir el carácter doble de la forma del cuento.
Primera tesis: un cuento siempre cuenta dos historias.

Depois do eclipse do vanguardismo, a literatura hispano-americana busca


renovar a sua escrita, por isso, na primeira metade do século XX, autores buscam
retratar o seu entorno. As narrativas soam críticas, ácidas, são denúncias sobre
a realidade social e sobre os privilégios para poucos. Denunciam um sistema
que substituiu o escravocrata, mas ainda subjugaria o trabalhador por conta de
interesses econômicos, principalmente de latifundiários. A narrativa está em
expansão e mais escritores começam publicando obras que causam impacto
social e político nos leitores. Principalmente os gêneros ficcionais, enriquecendo
gêneros e criando movimentos:

194
TÓPICO 2 | O SÉCULO XX – A TEXTUALIDADE HISPANO-AMERICANA

Las décadas iniciadas en 1960, 1970 y 1980 modificaron en gran medida


la percepción de la literatura latinoamericana. La extraordinaria
producción novelística de esas décadas —con el arrastre de obras
poco y mal leídas del pasado reciente, y con el entusiasmo proyectado
sobre el futuro — fue a la vez producto y estímulo de dicho cambio
(RUFFINELLI, 2013, p. 515).

Assim, nas Américas, após a vanguarda surgem no cenário latino-


americano autores comprometidos com o entorno social em que vivem. Durante
o século XX são muitos os estilos literários que surgem, e para isso será mostrado
o percurso após a vanguarda. Por isso, neste tópico, não esgotamos o tema,
mas convidamos o leitor a pesquisar e ampliar o universo das letras hispano-
americanas.

E
IMPORTANT

Sobre a poesia hispano-americana, a galeria de escritores é muito grande, por


isso indicamos a leitura do livro de Octavio Paz: El Arco y la Lira, obra em que se reflexiona
sobre o que é a poesia. Escreve sobre o fenômeno poético, a história. Leia um excerto da
obra:

El poema es una posibilidad abierta a todos los hombres, cualquiera


que sea su temperamento, su ánimo o su disposición. Ahora bien, el
poema no es sino eso: posibilidad, algo que sólo se anima al contacto
de un lector o de un oyente. Hay una nota común a todos los poemas,
sin la cual no serían nunca poesía: la participación. Cada vez que el
lector revive de veras el poema, accede a un estado que podemos
llamar poético. La experiencia puede adoptar esta o aquella forma, pero
es siempre un ir más allá de sí, un romper los muros temporales, para
ser otro (PAZ, 1972, p. 25).

A seguir apresentamos um importante capítulo da literatura, quando as


obras começam a circular em grandes tiragens e autores hispano-americanos são
reconhecidos mundialmente.

3 A LITERATURA HISPANO-AMERICANA E O BOOM


HISPANO-AMERICANO
No caminhar do século XX, a produção intelectual se refina e o corpus
literário começa a ser reconhecido além das Américas. Com a publicação de obras
literárias ficcionais aclamadas pela crítica internacional como uma nova narrativa
latino-americana, o caminho para uma explosão literária nos mercados europeus
se abre.

195
UNIDADE 3 | O PANORAMA DA LITERATURA HISPANO-AMERICANA ENTRE OS SÉCULOS XX E XXI

Essa “inundação” de literatura será chamada de boom. Surgiu primeiro


no México e Buenos Aires, porém, ao migrar para Europa, surgem algumas
controvérsias devidas ao desconhecimento europeu em relação às obras e autores
hispano-americanos, como explica Rama (1984, p. 52):

[...] foi ampliado, ao instalar-se em Barcelona, onde a tardia e confusa


informação sobre o romance latino-americano proporcionou uma
primeira imagem da arbitrariedade que caracterizaria o boom: o
conhecimento de Mario Vargas Llosa foi anterior ao de Julio Cortázar
e o deste anterior ao de Jorge Luis Borges, o que contribuiu para um
aplanamento sincrônico da história da narrativa americana que só
posteriormente e com dificuldade a crítica tentou corrigir.

Teve seu auge na década de 1960 e início dos anos 1970 e “hacía 1972
varios reportajes a escritores y artículos periodísticos fueron índice de que se
había comenzado a decretar su extinción” (RAMA, 1984, p. 51), mas a essas
alturas a literatura hispano-americana se consolidava como produção própria de
um continente emergente.

Uma crítica importante sobre todo o movimento da literatura hispano-


americana vem do crítico, ensaísta e escritor argentino Juan José Saer (1937-
2005), ao ressaltar o que ele chama de dois perigos à espreita da literatura latino-
americana:

El primero es justamente el de presentarse a priori como latinoamericana.


La función de la literatura no es la de investigar los diversos aspectos
de una nacionalidad, porque no podría hacerlo sino imperfectamente,
sin el rigor y el conjunto de posibilidades ofrecidas por otras
disciplinas. El error más grande que puede cometer un escritor es el
de creer que el hecho de ser latinoamericano es una razón suficiente
para ponerse a escribir. Lo que pueda haber de latinoamericano en su
obra debe ser secundario y venir “por añadidura”. Su especificidad
proviene, no del accidente geográfico de su nacimiento, sino de su
trabajo de escritor. [...] El segundo riesgo, consecuencia de nuestra
miseria política y social, es el voluntarismo,que considera la literatura
como un instrumento inmediato del cambio social y la emplea como
ilustración de principios teóricos definidos de antemano (SAER, 2014,
p. 262).

O chamado boom teve suas críticas internas e externas, quer de escritores,


críticos, editores, leitores, porque adquiriu um viés político e entre os próprios
escritores as controvérsias eram agudas, isso porque “o boom não foi apenas
um fenômeno comercial, mas também a oportunidade de apoiar decididamente
as revoluções e os projetos socialistas na América Latina” (COSTA, 2001, p. 1).
Este pensamento de pesquisadores contemporâneos é oposto a outros escritores,
como Saer (2014, p. 261):

La tendencia de la crítica europea a considerar la literatura


latinoamericana por lo que tiene de específicamente latinoamericano
me parece una confusión y un peligro,porque parte de ideas
preconcebidas sobre América Latina y contribuye a confinar a los
escritores en el gueto de la latinoamericanidad.

196
TÓPICO 2 | O SÉCULO XX – A TEXTUALIDADE HISPANO-AMERICANA

Assim, o boom analisado por outras vertentes da crítica literária era


pensado como um produto comercial e de interesse para editores estrangeiros,
uma das bases desse pensamento residia no fato da nomenclatura estrangeira, o
que se identificava como um pensamento colonizador, se boom fosse traduzido
para uma proposta, seria algo como “explosão literária hispano-americana”. O
importante é que independentemente de motivação ou fatores internos, a década
de 1960 a 70 projetou de forma globalizada e definitiva a literatura de escritores
nascidos em continente americano.

Escrever sobre a literatura hispano-americana se torna uma tarefa


desafiadora e praticamente sem fim, pois são muitos os temas para serem
abordados, as especificidades de cada autor, obra e período em que foram
publicados.

DICAS

Que tal saber mais sobre o momento da literatura hispano-americana? Assista


à entrevista sobre o boom a partir do pensamento de Julio Cortázar:
Acesse https://youtu.be/4nY9eX-BDvs?t=219.

4 DEPOIS DA VANGUARDA HISPANO-AMERICANA OU


UMA LITERATURA CONTEMPORÂNEA
A observação de uma terra que independente geograficamente, mas que
ainda depende de modelos exportados e a certeza da exploração comercial de
mão de obra operária, de terras indígenas, a intolerância racial, e a certeza de
que as Américas necessitavam impor sua condição de independência cultural
incentiva os novos escritores a expor suas obras, e isso ocorre de sul a norte do
continente americano.

4.1 JUAN CARLOS ONETTI


Juan Carlos Onetti (1909-1994), escritor, romancista e contista uruguaio
desenvolveu uma narrativa realista em que demonstrava uma crise da polis como
aglomerado urbano que desarticula o realismo. Uma literatura em que a natureza
humana se mostra cruel e criadora da cidade mítica de Santa Maria, lugar onde
coloca seus personagens. Em 1984, recebeu o Prêmio Miguel de Cervantes. A
ficção da obra Onetiana é considerada uma das mais importantes da literatura
hispano-americana.

197
UNIDADE 3 | O PANORAMA DA LITERATURA HISPANO-AMERICANA ENTRE OS SÉCULOS XX E XXI

Autor de diversos romances e contos, entre eles El pozo (1939), Para una tumba
sin nombre (1959) e Juntacadáveres (1964), esta última considerada sua obra-prima,
pertencente ao ciclo mítico da cidade de Santa Maria, a narrativa desenvolve a
chegada de Larsen à cidade com a intenção de abrir um bordel, porém as pessoas,
de forma geral, se opõem ao projeto e esta tensão é o fio condutor da história. Em
suas obras, a cidade mítica de Santa Maria será uma cidade criada por ele para
acomodar seus personagens fictícios, porém tão humana que se torna universal.
Com a Comala, de Juan Rulfo, e a Macondo, de García Márquez, formará um trio
de cidades míticas atemporais.

FIGURA 4 – PLACA EM FRENTE À CASA DO ESCRITOR EM MADRI

FONTE: <https://bit.ly/2sxGNKN>. Acesso em: 20 dez. 2018.

Merece destaque a importância do escritor William Faulkner como


inspiração na escrita de Onetti e Rulfo, assim como Rulfo inspirou, anos depois,
García Márquez a escrever Cem anos de Solidão e criar Macondo, mas todas estas
cidades ficcionais, importantes pelo que representam na narrativa, são nascidas
da imaginação destes escritores hispano-americanos. Onetti, em 1980, recebeu o
prêmio Cervantes pelo conjunto de sua obra. No Brasil, há diversas traduções
para o português vendidas em e-book ou em papel. A seguir, leia um fragmento
de Juntacadáveres:

Junta avanzaba medio paso delante de las mujeres y su mano derecha


colgaba con un ramo de flores rojas, raquíticas. Me miró y no quiso conocerme;
empujaba, dominado, el gesto perdonador de quien regresa al país natal
autorizado por el triunfo, lo cubría a medias con una mueca alegre y transigente.
Encabezaba el taconeo de las mujeres en el andén, las guiaba con la victoriosa
seguridad de su marcha, con el confiado balanceo de los hombres. Pero – a mí
e invisible a las mujeres – los ojos salientes y la boca, las mejillas azulosas y
colgantes, construían sin insistencia una máscara afectuosa y considerada, la

198
TÓPICO 2 | O SÉCULO XX – A TEXTUALIDADE HISPANO-AMERICANA

insinuación habilidosa de que él, Larsen, Junta o Juntacadáveres, no participaba


totalmente del destino y la condición del trío de mujeres que arrastraba sobre
las baldosas grises. En el aire velado de la tarde, moviéndose a compás frente
a las formas y los colores de las sedas, de los sombreros, de los adornos, de
las joyas, de los rostros y los brazos desnudos, la cara de Junta, pronta para la
lucha, para la traición y el negocio, podía traducir, indiferentemente, el vigor
o la debilidad de su empresa, de él mismo en relación a su empresa (ONETTI,
2016, s.p.).

DICAS

Leia esta reportagem da revista Cult e saiba mais sobre o autor e sua obra
publicada no Brasil. O uruguaio Juan Carlos Onetti, cuja novela O poço chega ao Brasil,
recusou os arroubos épicos de seus contemporâneos e tornou-se um marco da narrativa
moderna, escrito por Julián Fuks.
Disponível em: https://revistacult.uol.com.br/home/a-historia-de-uma-alma/.

4.2 AUGUSTO ROA BASTOS


Roa Bastos (1917-2005) foi um escritor, roteirista e ensaísta paraguaio. Roa
Bastos passou boa parte de sua vida exilado por conta da ditadura no seu país e
pela sua escrita de cunho social e político. Em 1947, obrigado a se exilar, vai para
Buenos Aires e lá escreve e publica sua obra pela primeira vez.

Durante a ditadura na Argentina, instala-se na França onde leciona


literatura hispano-americana. Recebeu diversos prêmios, dentre eles o Prêmio
Cervantes, em 1989.

A escrita dele é o retrato de um compromisso com o povo do Paraguai,


um povo bilíngue, de fala oficial guarani (entre outras línguas originárias) e a
espanhola. Em suas obras é nítida a preocupação de mostrar um povo digno, mas
abusado economicamente por conta de interesses políticos e estrangeiros. Como
na obra El trueno entre las hojas (1953), que por meio de contos retrata o cotidiano
dos ervateiros e dos indígenas.

199
UNIDADE 3 | O PANORAMA DA LITERATURA HISPANO-AMERICANA ENTRE OS SÉCULOS XX E XXI

NOTA

Nas leituras complementares inserimos um fragmento da obra como forma


de ilustrar a escrita com os elementos nacionais paraguaios e o uso do bilinguismo,
características próprias de toda sua obra.

A obra Yo el Supremo (1974) é considerada uma de suas mais importantes,


assim como Hijo de hombre (1960). Ele concentra muitas outras e os temas de sua
escrita são localizados como tradução intercultural, cultura guarani e literatura
latino-americana, oralidade e arquivos de fronteira.

DICAS

Você pode ter acesso ao NELOOL – Núcleo de Estudos de Literatura,


Oralidade e Outras Linguagens – sediado na UFSC. Um grupo de pesquisa que se dedica a
estudar a obra de Roa Bastos e a realizar o congresso internacional em edição bianual. No
site você encontra publicações, anais e diversos textos sobre o autor. Acesse http://www.
nelool.ufsc.br/index.htm.

4.3 JUAN RULFO


Juan Rulfo, ou Juan Nepomuceno Carlos Pérez Rulfo Vizcaíno, nasceu
em 16 de maio de 1918, em Jalisco, México. Seu pai foi assassinado quando ele
era criança e logo a mãe também faleceu, assim ele e seus irmãos ficaram órfãos
e foram morar com parentes. Rulfo faleceu em Ciudad do México, em 1986.
Recebeu diversos prêmios, dentre eles o Cervantes e obteve um reconhecimento
mundial como escritor ainda em vida.

200
TÓPICO 2 | O SÉCULO XX – A TEXTUALIDADE HISPANO-AMERICANA

FIGURA 5 – JUAN RULFO

FONTE: <https://bit.ly/2FouhVt>. Acesso em: 10 jul. 2011.

Quando jovem, Rulfo se mudou de Guadalajara para a capital do México:


Ciudad de México, e mais tarde casou-se com Clara Aparício. Assim começou sua
carreira de escritor. Com apenas duas obras, El Llano en Llamas (1953) e o romance
Pedro Páramo (1955), bastou para que figurasse na galeria dos escritores imortais.
Foi fotógrafo amador e documentou muitas imagens do interior mexicano quando
trabalhava para o Governo Federal. Também escreveu roteiros de cinema: El Gallo
de Oro, entre 1956 e 1958, La Fórmula Secreta, entre outros textos. Também existem
outros relatos e textos considerados autobiográficos, como Un Pedazo de Noche
e La vida no es muy Seria en sus Cosas. Sua produção intelectual inclui inúmeros
ensaios, discursos, conferências e prólogos.

A inspiração da sua escrita é atribuída às memórias de criança e da


vivência da guerra Cristera no México, além de seu trabalho como funcionário
público para assuntos do interior do país:

Da infância ele guardou algumas lembranças, que se refletem em


seus escritos, como quando viu os cristeiros passarem pela ladeira
da montanha, e sua mãe fechava seus olhos para que não visse
os enforcados da Revolução Cristeira ou, ainda, os paredões de
fuzilamentos organizados pelos soldados, quando apanhavam
insurgentes (BEZERRA, 2011, p. 18).

Os textos do escritor refletem temas universais inerentes aos seres humanos,


como a reforma agrária, a distribuição de terras, o conceito de caciquismo.

201
UNIDADE 3 | O PANORAMA DA LITERATURA HISPANO-AMERICANA ENTRE OS SÉCULOS XX E XXI

DICAS

Nesse link você encontra os contos do escritor, o romance Pedro Páramo em


audiolivro e ainda uma leitura de conto ¡Diles que no me maten!, realizada pelo próprio Rulfo,
e uma entrevista realizada com ele. Acesse: https://bit.ly/2snQziu e confira!

Como pano de fundo de suas obras ainda se encontram referências


históricas à Revolução Mexicana e à Guerra Cristeira, líderes como Emiliano
Zapata e Pancho Villa situam o leitor na história do texto. De acordo com Bezerra
(2011, p. 111), “O Império Asteca e sua herança pré-colonial, assim como os
conquistadores, também estão presentes na obra”. Sua obra não é considerada
indigenista, mas os elementos autóctones presentes permitem que a leitura reflita
uma realidade vivida por uma sociedade formada a partir de uma miscigenação
do homem do campo e as relações cotidianas entre senhores da terra e os
arrendatários, o que tornou Rulfo um transculturador, no conceito de Rama
(2008).

A escrita literária de Rulfo também reside em uma estratégia utilizada


largamente em Pedro Páramo, seu único romance, a de causar estranhamento ao
leitor, além de não deixar muito claro o que se está lendo, e para isso é necessário
entender a disposição do texto. Rulfo coloca mortos para conversar como
personagens reais, o leitor está “escutando” as conversas estabelecidas entre os
personagens a partir de memórias individuais ou coletivas, o que causa certo
espanto. A estrutura da obra apresenta uma fragmentação física, sem capítulos ou
títulos, com muitas interpolações obriga o leitor a uma leitura atenta e reflexiva.

DICAS

Na obra indicada a seguir, você pode ler o texto de Pedro Páramo e El Llano en
Llamas, assim como os outros textos de Rulfo e uma fortuna crítica podem ser encontrados
na obra:
FELL, Claude. Juan Rulfo. Toda la obra. Edición crítica. 2. ed. Madrid; París; México; Buenos
Aires; São Paulo; Rio de Janeiro; Lima: ALLCA XX, Colección Archivos, 1996. Disponível em:
https://bit.ly/2FoAOja.

202
TÓPICO 2 | O SÉCULO XX – A TEXTUALIDADE HISPANO-AMERICANA

4.4 JULIO CORTÁZAR


Julio Florencio Cortázar, argentino, nasceu na embaixada de Bruxelas
em 1914 e faleceu em Paris em 1984, onde morava desde 1951. Sempre manteve
seu vínculo afetivo com Buenos Aires, cidade da qual escreveu em suas obras.
Foi escritor, professor e tradutor principalmente dos textos de Poe. Escritor de
diversos gêneros textuais, como o romance e o conto, foi também professor de
literatura e as suas aulas documentadas e publicadas são uma reflexão sobre
textos, escritores e teoria literária hispano-americana. Entre suas obras publicadas
em língua portuguesa se encontram: Bestiário, Octaedro e 62 Modelo para armar.

DICAS

Para conhecer mais sobre Cortázar, sugerimos explorar o site da Biblioteca


UNED Cortázar.
Disponível em: https://sites.google.com/site/bibliotecaunedcortazar/inicio.

O romance Rayuela (1963) ou O jogo da amarelinha, como foi traduzido


por Fernando Castro Ferro e publicado pela Editora Civilização Brasileira, que
em 2014 estava na sua 22ª edição, é considerado um clássico hispânico. Leia o
fragmento inicial da obra considerado um dos melhores começos literários:

¿Encontraría a la Maga? Tantas veces me había bastado asomarme,


viniendo por la rue de Seine, al arco que da al Quai de Conti, y apenas
la luz de ceniza y olivo que flota sobre el río me dejaba distinguir
las formas, ya su silueta delgada se inscribía en el Pont des Arts, a
veces andando de un lado a otro, a veces detenida en el pretil de
hierro, inclinada sobre el agua. Y era tan natural cruzar la calle, subir
los peldaños del puente, entrar en su delgada cintura y acercarme
a la Maga que sonreía sin sorpresa, convencida como yo de que un
encuentro casual era lo menos casual en nuestras vidas, y que la gente
que se da citas precisas es la misma que necesita papel rayado para
escribirse o que aprieta desde abajo el tubo de dentífrico (CORTÁZAR,
1981, p. 3).

O texto é composto de uma série de técnicas inovadoras e consideradas


de vanguarda literária, porque quebra a leitura tradicional, a sequencial e propõe
uma leitura de capítulos saltados, aleatórios, o convite é para ler o texto na ordem
que desejar.

203
UNIDADE 3 | O PANORAMA DA LITERATURA HISPANO-AMERICANA ENTRE OS SÉCULOS XX E XXI

DICAS

Assista ao vídeo 100 años con Cortázar, disponível em: https://youtu.be/9NG_


OfLJd1Q.

A importância de Rayuela, além do entretenimento, reside em vários


aspectos, além do projeto próprio de um romance, inclui toda uma didática
literária aplicada ao texto, mas o perfil psicológico dos personagens coloca a obra
na galeria dos clássicos.

Desde suas primeiras obras a crítica literária considera Cortázar um escritor


amadurecido, intelectual e que tem consciência do que realiza. Destacamos o
pensamento de Cortázar e a sua relação com o gênero dos contos.

O autor desenvolveu reflexões próprias sobre a teoria e a prática escrita


do conto hispano-americano, de acordo com ele “Todo bom conto garante sua
duração nas memórias mediante uma qualidade que o mau contista desconhece”
(CORTÁZAR, 1999, p. 74). Integrante do boom, desenvolveu uma crítica sobre o
gênero dos contos, e como escritor uniu a estética literária ao momento político
vivenciado na América Latina. Um exemplo é o conto Casa Tomada, publicado por
Borges em 1946 na revista Anales de Buenos Aires. O conto Casa Tomada ao longo de
décadas teve ampla repercussão e releituras publicadas como os textos “Cabecita
negra”, de Germán Rozenmacher, de 1962; e de Washington Cucurto, de 2008.

Cortázar (1999, p. 74), em suas aulas de literatura, discorreu sobre o


gênero conto e o impacto da texto sobre o leitor: “Creio que a maioria dos relatos
cai no esquecimento (de quantos contos você se lembra?)”. Questiona o fato que
um conto é uma leitura passageira e poucos os que causam um estranhamento ao
leitor, uma reflexão ou releituras.

DICAS

Leia o conto La casa tomada completo neste link: https://ciudadseva.com/


texto/casa-tomada/.

204
TÓPICO 2 | O SÉCULO XX – A TEXTUALIDADE HISPANO-AMERICANA

4.5 MARIO VARGAS LLOSA


Vargas Llosa nasceu em Arequipa, Peru, em 1936. Escritor, jornalista,
ensaísta e político fez parte do boom latino-americano ao lado de García Márquez
e Cortázar. Recebeu diversos prêmios, como o internacional de romance "Rómulo
Gallegos", em Caracas, em 1967 e o prêmio Nobel de Literatura de 2010. O conjunto
de sua obra é inúmero, porque inclui textos literários como contos e romances,
ensaios, jornalísticos são muitos, por isso aqui ressaltamos a consulta à linha do
tempo disponibilizada no site a seguir e que demonstra a trajetória do escritor.

DICAS

Saiba mais sobre o escritor e sua obra no site de Mario Vargas Llosa, disponível
em: http://www.mvargasllosa.com/crono.htm.

Como curiosidade, colocamos um fragmento da obra Los Jefes (2008):

Javier se adelantó por un segundo: – ¡Pito! – gritó, ya de pie. La tensión


se quebró, violentamente, como una explosión. Todos estábamos parados: el
doctor Abásalo tenía la boca abierta. Enrojecía, apretando los puños. Cuando,
recobrándose, levantaba una mano y parecía a punto de lanzar un sermón, el
pito sonó de verdad. Salimos corriendo con estrépito, enloquecidos, azuzados
por el graznido de cuervo de Amaya, que avanzaba volteando carpetas. El
patio estaba sacudido por los gritos. Los de cuarto y tercero habían salido
antes, formaban un gran círculo que se mecía bajo el polvo. Casi con nosotros,
entraron los de primero y segundo; traían nuevas frases agresivas, más odio. El
círculo creció. La indignación era unánime en la media. (La primaria tenía un
patio pequeño, de mosaicos azules, en el ala opuesta del colegio.)

FONTE: VARGAS LLOSA, MARIO. Los jefes. Los cachorros. Madrid: Santillana Ediciones
Generales, 2008, p. 9.

205
UNIDADE 3 | O PANORAMA DA LITERATURA HISPANO-AMERICANA ENTRE OS SÉCULOS XX E XXI

DICAS

Faça a leitura de uma obra ou assista a um filme baseado na obra La ciudad


y los perros, publicada em 1963, escrita por Mário Vargas Llosa. Em 1985, Francisco José
Lombardi, peruano, apresenta ao público o filme La ciudad y los perros. Ele escreveu o roteiro
e dirigiu o filme baseado na obra homônima de Vargas Llosa. O filme concorreu na categoria
de melhor filme estrangeiro no Oscar de 1986. Acesse o filme no link disponivel em: https://
bit.ly/2MmptS3.

FONTE: VARGAS LLOSA, Mario. La ciudad y los perros. Barcelona, Seix Barral, Biblioteca de
bolsillo, 1986. https://bit.ly/2NwePv7. Acesso em: 16 nov. 2018.

FIGURA – FIGURA DO CARTAZ DO FILME LA CIUDAD Y LOS PERROS

FONTE: <https://bit.ly/2W7I3C7>. Acesso em: 20 dez. 2018.

4.6 PABLO NERUDA


Ricardo Eliezer Neftalí Reyes Basoalto, ou simplesmente Pablo Neruda,
nasceu no Chile em 1904 e faleceu em 1973. Além de escritor, foi cônsul chileno.

Por ser membro do Partido Comunista de seu país saiu para o exílio.
Neruda foi um autor de poemas destacado do século XX e pelo conjunto de sua
obra recebeu, em 1971, o Prêmio Nobel de Literatura.

206
TÓPICO 2 | O SÉCULO XX – A TEXTUALIDADE HISPANO-AMERICANA

FIGURA 6 – PABLO NERUDA

FONTE: <https://bit.ly/2N05dUR>. Acesso em: 29 out. 2018.

DICAS

Escute o poema escrito por Pablo Neruda: Walking around. Disponível em:
https://www.youtube.com/watch?v=R0AY3Ue75ZM. Para saber mais sobre o poeta, leia a
reportagem disponível em: https://bit.ly/2N05dUR.

Visite virtualmente a fundação Pablo Neruda. Acesse https://fundacionneruda.org/.

5 O REALISMO MARAVILHOSO E O REALISMO MÁGICO


Neste subtópico serão abordados brevemente os conceitos literários de
“realismo mágico” e “real maravilhoso”, em que são oferecidas algumas pistas
sobre o tema com o objetivo de incentivar uma pesquisa sobre as diferenças entre
os tipos de realismo hispano-americano.

Na literatura de ficção não se espera uma explicação lógica para


mitos, lendas e/ou fenômenos metafísicos, e constatam-se os elementos de
verossimilhança. Sempre houve obras que desenvolveram temas reais, mas sem
nenhuma base lógica, como na obra de Rulfo, quando o leitor percebe exatamente
o local e o estado onde se encontram os personagens que falam na obra, por
exemplo.

207
UNIDADE 3 | O PANORAMA DA LITERATURA HISPANO-AMERICANA ENTRE OS SÉCULOS XX E XXI

E
IMPORTANT

Veja um fragmento do verbete Realismo Mágico no Dicionário de Termos


Literários que você pode explorar, pois contém ainda mais informações.

O primeiro de todos os autores a empregar a expressão realismo mágico foi o venezuelano


Uslar Pietri, em Letras y hombres de Venezuela (1948). Para ele essa nova narrativa viria a
incorporar o “mistério” e uma “adivinhação (ou negação) poética da realidade”. Dessa maneira
procurava corrigir os limites do realismo puro. Daí ele sugerir “o que na falta de outra palavra
poderia denominar-se um realismo mágico”. No mundo académico foi, porém, Angel Flores
o primeiro a usar o sintagma “realismo mágico”, na conferência “Magical Realism in Spanish
American” (Nova York, MLA, 1954) publicada depois em Hispania, 38 (2), 1955. Este trabalho
divulgou a designação que passou a ser usada para a nova narrativa hispano-americana.

FONTE: CALASANS, Selma. Verbete. In: E-Dicionário de Termos Literários (EDTL). Coord. de
Carlos Ceia. Realismo Mágico. Dez. 27, 2009. http://edtl.fcsh.unl.pt/encyclopedia/realismo-
magico/. Acesso em: 20 dez. 2018.

Na literatura hispano-americana o reflexo do fantástico se deve a


precursores como Enrique Anderson Imbert (1910-2000), que incursionou
pelo gênero fantástico, porém foi Borges, com suas publicações ficcionais, que
consagraria o conceito estético de um fato anormal, sem explicação e nem sequer
é possível alocar em um mundo paralelo. A dúvida é a tônica, já que a leitura
causa profunda estranheza para o leitor.

Assim, é importante que se tenha em mente que o realismo mágico


e o real maravilhoso diferem em suas características, o realismo mágico tinha
uma tendência internacional, enquanto o real maravilhoso se restringiu mais a
algumas regiões da América e suas raízes são africanas e indígenas, uma escrita
que remete ao Barroco porque era carregada de enfeites literários, próprios de
elementos literários da retórica, enquanto o realismo mágico apresenta uma
escrita mais objetiva, direta, sem ornamentos retóricos.

Falar de literatura fantástica hispano-americana se deve a Jorge Luis


Borges e sua escrita ficcional, mas também a outros dois escritores que são
importantes devido ao uso de duas designações: real maravilloso e realismo mágico,
conceitos amplamente difundidos a partir dos textos de Alejo Carpentier (1904-
1980) e Gabriel García Márquez (1927-2014).

O primeiro autor, Alejo Carpentier, foi um escritor cubano, autor de


diversos textos ficcionais como El reino de este mundo (1949) e Viaje a la semilla
(1944) e El Siglo de las luces (1962), entre outros textos. Ele inovou na literatura
a partir da inserção de elementos fantásticos afro-hispano-americanos em suas
obras, diferente de Borges, que criou uma estética literária chamada de Realismo
Maravilhoso, como explana Coelho (2019, p. 24) em sua bela análise sobre a
contribuição africana à literatura hispano-americana:
208
TÓPICO 2 | O SÉCULO XX – A TEXTUALIDADE HISPANO-AMERICANA

Outro exemplo que poderia ser mencionado em relação à recepção


do imaginário africano na Literatura Afro-Hispano-Americana está
no livro “No Reino deste Mundo” (2005), de outro cubano, o escritor
e ensaísta Alejo Carpentier. Mackandal, um dos protagonistas da
novela, um Cimarrón que também habitou as Montanhas (Monte),
tinha o poder de transformar-se em insetos, peixes e aves e este dado
“surpreendente” enquadrou-se tão somente do ponto de vista estético
ao que se configurou como “Realismo Maravilhoso”.

Carpentier escreve sob uma estética chamada de maravilhosa na obra


El Reino de este Mundo, porque ressalta os elementos metafísicos buscados em
uma cosmogonia africana, e que são tratados como elementos ficcionais na obra.
Esse autor também introduz e valoriza a cultura, as tradições e religião africanas
trazidas para a América pelos escravos e mantidas ao longo dos séculos.

Carpentier dá voz a toda uma sociedade presente nas guerras de


independência e internas e que não era reconhecida como cidadãos plenos,
vítimas de racismo e indiferença, a literatura cumpre um papel social de visibilizar
e dignificar os cidadãos afro-hispano-americanos.

DICAS

Veja a capa do livro publicada em 1978 e faça uma leitura semiótica da imagem
sobre os elementos do real maravilhoso na capa, é o reflexo de uma pessoa no espelho ou
uma moldura? As velas simbolizam o quê?

FONTE: <https://amzn.to/2MhIPrm>. Acesso em: 15 dez. 2018.

Leia o fragmento inicial da obra de Carpentier, El Siglo de las Luces. Nesta


obra o autor incorpora o estilo barroco:

209
UNIDADE 3 | O PANORAMA DA LITERATURA HISPANO-AMERICANA ENTRE OS SÉCULOS XX E XXI

Detrás de él, en acongojado diapasón, volvía el Albacea a su recuento de


responsos, crucero, ofrendas, vestuario, blandones, bayetas y flores, obituario
y réquiem – y había venido éste de gran uniforme, y había llorado aquél, y
había dicho el otro que no éramos nada... – sin que la idea de la muerte acabara
de hacerse lúgubre a bordo de aquella barca que cruzaba la bahía bajo un
tórrido sol de media tarde, cuya luz rebrillaba en todas las olas, encandilando
por la espuma y la burbuja, quemante en descubierto, quemante bajo el toldo,
metido en los ojos, en los poros, intolerable para las manos que buscaban un
descanso en las bordas. Envuelto en sus improvisados lutos que olían a tintas
de ayer, el adolescente miraba la ciudad, extrañamente parecida, a esta hora
de reverberaciones y sombras largas, a un gigantesco lampadario barroco,
cuyas cristalerías verdes, rojas, anaranjadas, colorearan una confusa rocalla
de balcones, arcadas, cimborrios, belvederes y galerías de persianas – siempre
erizada de andamios, maderas aspadas, horcas y cucañas de albañilería,
desde que la fiebre de la construcción se había apoderado de sus habitantes
enriquecidos por la última guerra de Europa.

FONTE: CARPENTIER, Alejo. El siglo de las luces. Edición de Ambrosio Fornet. Madrid:
Cátedra, 1982. https://bit.ly/2TVN26U. Acesso em: 16 nov. 2018.

O segundo autor, Gabriel García Márquez, escritor colombiano, surge


com outro gênero conhecido como realismo mágico, que se tornou seu expoente
com a publicação de Cien años de soledad, em 1967. Também passou a fazer parte
do boom latino-americano e foi agraciado com um prêmio Nobel de Literatura em
1982. Foi considerado criador de um gênero chamado realismo mágico, atribuído
à forma como sua obra foi escrita. Na cidade de Macondo (lembre que é uma
cidade fictícia) acontecem fatos insólitos, mas seus habitantes nem se espantam,
por exemplo: durante um período, a população sofre uma peste que tinha como
consequência uma insônia, ou seja, praticamente uma cidade inteira sem dormir,
logo surge outra peste, a do esquecimento, entre tantas idas e vindas um cigano
ressuscita e uma mulher sobe aos céus, ou seja, acontecimentos fantásticos, mas
ao mesmo tempo sem causar nenhum estranhamento para a cidade e para os
habitantes.

O realismo mágico de García Márquez apresenta narrativas com elementos


fantásticos, mas que não incluíam mutações ou incorporações, ou aparecimentos
de animais fabulosos etc., por isso se diferencia do real maravilhoso como foi visto
na obra de Carpentier. Muitos escritores, como Cortázar e Vargas Llosa, aderiram
ao gênero.

Leia a seguir o começo da obra Cem Anos de Solidão, apontado como um


dos começos mais marcantes da literatura hispano-americana:

210
TÓPICO 2 | O SÉCULO XX – A TEXTUALIDADE HISPANO-AMERICANA

Muchos años después, frente al pelotón de fusilamiento, el coronel


Aureliano Buendía había de recordar aquella tarde remota en que su
padre lo llevó a conocer el hielo. Macondo era entonces una aldea de
veinte casas de barro y cañabrava construidas a la orilla de un río de
aguas diáfanas que se precipitaban por un lecho de piedras pulidas,
blancas y enormes como huevos prehistóricos. El mundo era tan
reciente, que muchas cosas carecían de nombre, y para mencionarlas
había que señalarlas con el dedo. Todos los años, por el mes de marzo,
una familia de gitanos desarrapados plantaba su carpa cerca de la
aldea, y con un grande alboroto de pitos y timbales daban a conocer
los nuevos inventos. Primero llevaron el imán. Un gitano corpulento,
de barba montaraz y manos de gorrión, que se presentó con el nombre
de Melquíades, hizo una truculenta demostración pública de lo que
él mismo llamaba la octava maravilla de los sabios alquimistas de
Macedonia (GARCÍA MÁRQUEZ, 1996, p. 3).

Como já discutimos antes, os personagens de Cem anos de Solidão seriam


acomodados em uma cidade fictícia, Macondo, criada pelo escritor. Nela se
desenrola toda a saga da família Buendía.

A obra de Márquez, Cem Anos de Solidão, narra uma saga familiar. Uma
característica curiosa da obra é que os nomes se repetem praticamente em todas
as gerações, por isso o leitor encontra uma sucessão de Aurelianos, José Arcadio e
Buendía, e isso causa muitas confusões na leitura. É um fato comum o retorno de
alguns parágrafos ou páginas para recuperar informações sobre os personagens.

A princípio, para uma primeira leitura de Cem Anos de Solidão indicamos o


acompanhamento dos primeiros capítulos com um guia dos personagens, como
este mapa a seguir:

211
UNIDADE 3 | O PANORAMA DA LITERATURA HISPANO-AMERICANA ENTRE OS SÉCULOS XX E XXI

FIGURA 8 – MAPA GENEALÓGICO DOS PERSONAGENS DE CIEN AÑOS DE SOLEDAD

FONTE: <https://bit.ly/2sBRtZ0>. Acesso em: 12 dez. 2018.

212
TÓPICO 2 | O SÉCULO XX – A TEXTUALIDADE HISPANO-AMERICANA

DICAS

Leia esta bela reportagem de Demian Orosz, Medio siglo de Cien años de
soledad: una fiesta de la imaginación, publicada pelo Jornal La Voz, em 28 de maio de 2017.
Disponível em https://bit.ly/2DkNhDa.

Assim, finalizamos o Tópico 2 e esperamos que você, acadêmico, prossiga


com seus estudos, pois ainda faltam muitos autores e obras para comentarmos,
por isso incentivamos a pesquisa e a leitura para complementar o conhecimento
literário deste que foi um dos séculos mais representativos dos escritores hispano-
americanos.

213
UNIDADE 3 | O PANORAMA DA LITERATURA HISPANO-AMERICANA ENTRE OS SÉCULOS XX E XXI

LEITURA COMPLEMENTAR

FRAGMENTO TEXTO 1:

Vanguardia y Modernidad en el Discurso Cultural

Ana Pizarro

En el discurso literario de estos primeros decenios surge un grupo


interesante de voces femeninas. Se trata de un grupo de poetas – entonces se hablaba
de poetisas y hoy el término se usa más bien con ironía – formado por Gabriela
Mistral, Alfonsina Storni, Juana de Ibarbourou y Delmira Agustini. A este grupo
habría que agregar otros nombres, como el de Dulce María Loynaz en Cuba, Teresa
de la Parra en Venezuela y, un poco más tarde, Cecilia Meireles en Brasil, que tiene
fuerte presencia. Se trata de un grupo de mujeres de sensibilidad bastante afín, lo
que les entrega una voz nítida. Entre algunas de ellas hay contactos e intercambios.
Dulce María, por ejemplo, está bastante ligada a Gabriela en un momento, quien
la visita en La Habana de las primeras décadas.

Une a estas mujeres escritoras la función de haber delimitado un ámbito,


a partir del cual tienen la osadía de ofrecer todos los flancos de una sensibilidad
nueva, calificada a veces de cursi, en la medida en que no escatiman la dimensión
emocional. Para hacer frente a esta ampliación del espectro literario necesitan
adoptar posturas, gestos, propiciar complicadas imágenes legitimadoras de su
tribuna, afianzadoras de su paso de la marginación a la evidencia: imagen de niña,
de maestra y madre, del desenfado abierto. No es tarea fácil diseñar este espacio y
las estrategias de legitimación constituyen “las tretas del débil” , de acuerdo con
la expresión de Josefina Ludmer, que perfilan también su lenguaje.

Escritoras y críticas al mismo tiempo – los papeles no están definidos en un


momento en que se están abriendo paso – tienen percepciones certeras y conciencia
de la función que están desempeñando: de Juana y Alfonsina dice Dulce María
que “esta incidencia en la femineidad más pura será lo único que compartan”,
estableciendo ya el diseño de un espacio común y diferente, para luego especificar
sobre el tono de Gabriela: En la tierra araucana no se podía escribir de otra manera;
allí todo tiene la dureza del granito, la plenitud del mar, el perfil del acantilado. Y
así escribe Gabriela, con los pies en las dunas y el aliento en el altiplano. Este grupo
de mujeres escritoras demarcó un espacio en el desarrollo literario de los primeros
decenios. Fue la función que les correspondió para su momento y las sociedades
a las que pertenecían. Frente a ellas aparece en la plástica un grupo más audaz,
francamente rupturista en lo estético y en la definición de su función. Se trata, por
una parte, de las surrealistas mexicanas o adscritas a este espacio, Frida Kahlo,
Remedios Varo, Leonora Carrington, cuya propuesta estética está directamente
ligada al espíritu transgresor de las vanguardias europeas, pero, en el caso de
Kahlo, a partir de una fuerte inserción en las culturas populares mexicanas, cuyo
trazo, temas y mirada, ella trasluce incluso con la incorporación de los versos de

214
TÓPICO 2 | O SÉCULO XX – A TEXTUALIDADE HISPANO-AMERICANA

cordel en sus telas. Por otra parte, está el grupo de la Semana de 22 en Brasil, el de
las modernistas brasileñas: Tarsila do Amaral, Anita Malfatti, activas en el combate
contra el arte oficial, académico, y en la propuesta recuperadora de la ‘brasilidad’.
Pareciera que en la plástica el gesto de modernización antecede, tanto en Brasil
como en México, a la literatura. En este, las artistas plásticas tienen su palabra
(PIZARRO, 2013, 26-27).

FRAGMENTO TEXTO 2: Excerto do artigo El llano en llamas: hacia una “poética


del espacio” en los cuentos de Juan Rulfo.

Obra: El LLano en LLamas

Espacios de la poesía y la violencia

Juan Rulfo
[...]
Cuando Gastón Bachelard propone en su clásico estudio La poética del
espacio examinar las imágenes literarias de los “espacios de posesión”, de lo que
llama “espacios ensalzados”, “defendidos contra fuerzas adversas”, deja entrever
asimismo las posibilidades de una perspectiva opuesta, la de los espacios de la
hostilidad, “espacios del odio y del combate”, que solo podrían analizarse, para
decirlo con palabras de Bachelard, “refiriéndose a materias ardientes, a las imágenes
del apocalipsis” (1992, p. 21). Precisamente en la tensión entre lo poético y lo
apocalíptico, entre la posesión y lo desposeído, la figuración de los espacios en
El llano en llamas cobra un espesor significativo. Así lo advierte Jorge Rufinelli,
cuando subraya que la atmósfera desolada del paisaje rulfiano se transforma
en protagonista de sus relatos, imagen que no solo es simbolización de soledad
extrema sino que alude concretamente al despoblamiento del campo jalisciense en
los últimos años de la Revolución Mexicana, incluida la rebelión cristera de 1926-
1928: “En el ambiente físico de los cuentos de Rulfo se palpa la infertilidad de las
tierras, la pobreza absoluta de los personajes, un vagar constante hacia nadie sabe
dónde” (1982, p. 38). Notamos entonces que distintos desplazamientos espaciales
y temporales, concretos y simbólicos saturan los cuentos. Son con frecuencia
derroteros que no conforman una trayectoria buscada o en algo lograda por los
personajes. Si se puede definir como destino, difícilmente puede vérsela como
culminación, o no al menos como una culminación claramente diseñada en algún
momento del relato, ya que los personajes no la perciben en toda su dimensión –en
buena medida porque se difumina en la narración que ha clausurado de antemano
el sentido de esos desplazamientos. Los movimientos temporales contribuyen
a desarticular la concatenación de la historia contada, le otorgan espesor o la
desrealizan, crean distorsiones y ambigüedades, tal como se los describe en
“Luvina”: “Y es que allá el tiempo es muy largo. Nadie lleva la cuenta de las horas,
ni a nadie le preocupa cómo van amontonándose los años. Los días comienzan y se
acaban. Luego viene la noche. Solamente el día y la noche hasta el día de la muerte,
que para ellos es una esperanza” (RULFO, 2005, p. 106). Estos movimientos son tan
errantes como los del recuerdo, con meandros y atajos que casi siempre ingresan

215
UNIDADE 3 | O PANORAMA DA LITERATURA HISPANO-AMERICANA ENTRE OS SÉCULOS XX E XXI

para desbaratar su razón de ser, para mostrar su inconsecuencia, que suele lograr
asidero en la oposición antes-ahora, acentuando la indeterminación temporal de los
episodios narrados. Así ocurre en otros relatos como “En la madrugada”, “¡Diles
que no me maten!”, “Acuérdate” o “El día del derrumbe”. [...] (SANCHOLUZ,
2018, p. 157-158).

FONTE: SANCHOLUZ, Carolina. El llano en llamas: hacia una “poética del espacio” en los
cuentos de Juan Rulfo. In: AÑÓN, V.; SANCHOLUZ, C.; HENAO-JARAMILLO, S. (Comps.).
(2017). Tropos, tópicos y cartografías: Figuras del espacio en la literatura latinoamericana. La
Plata: Universidad Nacional de La Plata. Facultad de Humanidades y Ciencias de la Educación.
(Colectivo crítico; 3). http://libros.fahce.unlp.edu.ar/index.php/libros/catalog/book/89. Acesso
em: 20 ago. 2018.

FRAGMENTO TEXTO 3:

Conto de Augusto Roa Bastos. Observe que o autor preserva a linguagem


popular própria dos ervateiros e o uso da língua guarani, retratando cenas do
Paraguai de forma realista.

EL TRUENO ENTRE LAS HOJAS

El ingenio se hallaba cerrado por limpieza y reparaciones después de la


zafra. Un tufo de horno henchía la pesada y eléctrica noche de diciembre. Todo
estaba quieto y parado junto al río. No se oían las aguas ni el follaje. La amenaza de
mal tiempo había puesto tensa la atmósfera como el hueco negro de una campana en
la que el silencio parecía freírse con susurros ahogados y secretas resquebrajaduras.

En eso surgió de las barrancas la música del acordeón. Era una melodía
ubicua, deshilachada. Se interrumpía y volvía a empezar en un sitio distinto, a lo
largo de la caja acústica del río. Sonaba nostálgica y fantasmal.

– ¿Y eso qué es? – preguntó un forastero.


– El cordión de Solano – informó un viejo.
– ¿Quién?
– Solano Rojas, el pasero ciego.
– Pero, ¿no dicen que murió?
– Él sí. Pero el que toca agora e' su la'sánima.
– ¡Aicheyarangá, Solano! – murmuró una vieja persignándose.

La mole de la fábrica flotaba inmóvil en la oscuridad. Un perro ladró a lo


lejos, como si ladrara bajo tierra. Dos o tres críos desnudos se revolvieron en los
regazos de sus madres, junto al fuego. Uno de ellos empezó a gimotear asustado,
quedamente.

– Callate, m'hijo. Escuchá a Solano. E'tá solito en el Paso.

216
TÓPICO 2 | O SÉCULO XX – A TEXTUALIDADE HISPANO-AMERICANA

El contrapunto de un guaimingüé que rompió con su tañido la quietud del


monte, volvió aún más fantasmal la melodía. El acordeón sonaba ahora con un
lamento distante y enlutado.

– Así suena cuando no hay luna – dijo el viejo encendiendo su cigarro en


un tizón en el que se quemaba un poco de noche.
– La debe andar buscando todavía.
– ¡Pobre Solano!
[...]

Leia a continuação do conto na íntegra neste site: El Trueno entre las hojas.
Portal Guarani. Disponível em: https://bit.ly/2VJ1Pna.

FRAGMENTO TEXTO 4:

Segunda aula de Julio Cortázar sobre:

El cuento fantástico I: el tiempo

Se ha sostenido muchas veces que la literatura latinoamericana en su


conjunto entra en la modernidad sin tener toda esa carga – que es al mismo
tiempo una seguridad – de un lento pasado y una lenta evolución como tienen las
literaturas europeas. Nosotros pasamos de la Conquista española a la colonización
y a nuestras independencias en un período cronológico que, comparado con el
desarrollo de las grandes culturas literarias de Occidente, es pequeñísimo, apenas
un instante. Eso hace que al comenzar a escribir, y con autonomía en cada uno de
nuestros países, los escritores pueden haber sentido de una manera inconsciente
esa falta de una lenta evolución que los hubiera traído a ellos mismos como último
eslabón de una larga cadena; de golpe se encontraron manejando una cultura
moderna y un idioma que se prestaba a todas las posibilidades de expresión,
sintiéndose a la vez un poco desvinculados de una más desarrollada y coherente
y teniendo que valerse fundamentalmente de las influencias de las corrientes que
venían del exterior, que nunca son lo mismo que la propia cultura de una raza o
de una civilización. Para explicar esto del cuento se ha dicho que, aunque sea de
una manera inconsciente, el escritor todavía está muy cerca de las grandes culturas
precolombinas latinoamericanas como la inca o incaica en el Perú y en el Ecuador
y las grandes culturas mexicanas mayas y aztecas que desde el punto de vista
de la literatura estaban en un territorio fundamentalmente oral y que incluso en
sus formas escritas buscaban expresarse a través de relatos, de pequeños cuentos
como los que forman en general las mitologías y las cosmogonías. Si por ejemplo
uno echa un vistazo al Popol Vuh, el libro sagrado de los mayas, ve cómo toda la
historia de la creación, todas las historias de las primeras actividades de los dioses
y sus contactos con los mortales, constituyen una serie de relatos muy frecuentes
en otros tipos de cosmogonías y de mitologías: la griega y la judaica a través
del Antiguo Testamento contienen momentos que se pueden separar y que son
verdaderos relatos como el Zend Avesta. La teoría propone entonces que el escritor
latinoamericano está todavía muy cerca de esa etapa oral o de comienzo de la

217
UNIDADE 3 | O PANORAMA DA LITERATURA HISPANO-AMERICANA ENTRE OS SÉCULOS XX E XXI

escritura como trasfondo personal y cultural al que le falta una lenta evolución de
muchos siglos; por eso el cuento viene de una manera espontánea a un mexicano,
un peruano o un boliviano.

[...] Tengo la impresión de que hasta este momento al menos yo no conozco


ningún trabajo crítico que responda de manera satisfactoria por qué en América
Latina el cuento es tan popular y alcanza una calidad que lo coloca al nivel de los
mejores que se puedan imaginar o escribir en el planeta.

FONTE: CORTÁZAR, Julio. Julio Cortázar. Clases de literatura. Berkeley, 1980. 1. ed. Buenos
Aires: Aguilar, Altea, Taurus, Alfaguara, 2013. p. 45-46.

218
RESUMO DO TÓPICO 2

Neste tópico, você aprendeu que:

● O andamento da literatura hispano-americana se deu em movimentos literários


sucessivos.

● Após a Vanguarda, começou uma afirmação literária que teve seu auge no
período do chamado boom hispano-americano.

● Alguns estilos literários, conceituais, se fixam ao longo do século XX como a


literatura fantástica, o real maravilhoso e o realismo mágico.

● O continente hispano-americano foi pródigo em autores consagrados pela


crítica literária internacional como Juan Carlos Onetti, Augusto Roa Bastos,
Juan Rulfo, Julio Cortázar, Mario Vargas Llosa e Pablo Neruda, entre outros.

● As teses sobre o conto de Ricardo Piglia são universais e são a chave para
explicar o gênero textual .

219
AUTOATIVIDADE

1 Apresentamos aqui um excerto do conto Talpa, de Juan Rulfo, encontrado na


obra El LLano en Llamas. Faça a atividade proposta depois da leitura.

Talpa

Natalia se metió entre los brazos de su madre y lloró largamente allí


con un llanto quedito. Era un llanto aguantado por muchos días, guardado
hasta ahora que regresamos a Zenzontla y vio a su madre y comenzó a sentirse
con ganas de consuelo.

Sin embargo, antes, entre los trabajos de tantos días difíciles, cuando
tuvimos que enterrar a Tanilo en un pozo de la tierra de Talpa, sin que nadie
nos ayudara, cuando ella y yo, los dos solos, juntamos nuestras fuerzas y
nos pusimos a escarbar la sepultura desenterrando los terrones con nuestras
manos – dándonos prisa para esconder pronto a Tanilo dentro del pozo y que
no siguiera espantando ya a nadie con el olor de su aire lleno de muerte –,
entonces no lloró.

Ni después, al regreso, cuando nos vinimos caminando de noche sin


conocer el sosiego, andando a tientas como dormidos y pisando con pasos que
parecían golpes sobre la sepultura de Tanilo. En ese entonces, Natalia parecía
estar endurecida y traer el corazón apretado para no sentirlo bullir dentro de
ella. Pero de sus ojos no salió ninguna lágrima.
[...]

Porque la cosa es que a Tanilo Santos entre Natalia y yo lo matamos.


Lo llevamos a Talpa para que se muriera. Y se murió. Sabíamos que no
aguantaría tanto camino; pero, así y todo, lo llevamos empujándolo entre los
dos, pensando acabar con él para siempre. Eso hicimos.

La idea de ir a Talpa salió de mi hermano Tanilo. A él se le ocurrió


primero que a nadie. Desde hacía años que estaba pidiendo que lo llevaran.
Desde hacía años. Desde aquel día en que amaneció con unas ampollas
moradas repartidas en los brazos y las piernas. Cuando después las ampollas
se le convirtieron en llagas por donde no salía nada de sangre y sí una cosa
amarilla como goma de copal que destilaba agua espesa. Desde entonces me
acuerdo muy bien que nos dijo cuánto miedo sentía de no tener ya remedio.
Para eso quería ir a ver a la Virgen de Talpa; para que Ella con su mirada le
curara sus llagas. Aunque sabía que Talpa estaba lejos y que tendríamos que
caminar mucho debajo del sol de los días y del frío de las noches de marzo,
así y todo quería ir.
[...]

220
Y de eso nos agarramos Natalia y yo para llevarlo. Yo tenía que
acompañar a Tanilo porque era mi hermano. Natalia tendría que ir también,
de todos modos, porque era su mujer. Tenía que ayudarlo llevándolo del
brazo, sopesándolo a la ida y tal vez a la vuelta sobre sus hombros, mientras
él arrastrara su esperanza.
[...]

FONTE: RULFO, Juan. El Llano en Llamas. 11. ed. Madri: Cátedra, 1999. http://ciudadseva.
com/texto/talpa/. Acesso em: 19 dez. 2018.

Após a leitura do fragmento e do texto na íntegra indicado na fonte,


leia as perguntas e responda às perguntas a seguir:

a) Analise o texto e destaque algumas características da narrativa.

b) Explique brevemente o conflito sofrido pelos personagens.

c) Quem narra a história?

d) Escreva um final diferente para o conto no qual os personagens tenham


seus destinos mudados. Sugerimos, se possível, que você escreva em língua
espanhola.

2 A partir da leitura do fragmento extraído do poema Tú me quieres blanca... de


Alfonsina Storni (1892-1938), responda à seguinte questão sobre o poema:

QUADRO – POEMA TÚ ME QUIERES BLANCA... DE ALFONSINA STORNI


Tú me quieres alba, Tú, que en el banquete
me quieres de espuma, cubierto de pámpanos,
me quieres de nácar. dejaste las carnes
Que sea azucena festejando a Baco.
sobre todas casta, ¡Tú, que en los jardines
de perfume tenue, negros del Engaño
corola cerrada, vestido de rojo
ni un rayo de luna corriste al Estrago!
filtrado me haya, ¡Tú, que el esqueleto
ni una margarita conservas intacto,
se diga mi hermana. no sé todavía
Tú me quieres nívea, por cuáles milagros,
tú me quieres blanca, me pretendes blanca...
tú me quieres casta. (Dios te lo perdone)
¡Tú, que hubiste todas me pretendes casta...
las copas a mano; (Dios te lo perdone)
de frutas y mieles me pretendes alba!
los labios morados! [...]
FONTE: STORNI, Alfonsina. Tú me quieres alba. Biblioteca Virtual Miguel de Cervantes.
Alicante: Biblioteca Virtual Miguel de Cervantes, 2014. https://bit.ly/2sC0Qrn. Acesso em: 15
dez. 2018.

221
a) Reflita sobre o tema do poema tendo em conta o pensamento da autora
sobre lugar feminino na sociedade e a busca de um lugar reconhecido para
a mulher nos espaços literários.

222
UNIDADE 3
TÓPICO 3

A LITERATURA CONTEMPORÂNEA
HISPANO-AMERICANA

1 INTRODUÇÃO
Falar de uma literatura hispano-americana contemporânea é reconhecer
no bojo de sua formação a composição de inúmeras vozes. Procurar entender o
processo criativo é pensar desde um ponto de vista polimórfico. É uma estética
composta por múltiplos gêneros e estilos formados a partir da contribuição de
diversas fontes, escritas, pictóricas ou oral que está em constante movimento e a
qualquer momento surgirão novas tendências e estilos.

Um exemplo importante da plasticidade literária é o verso, que ao longo


dos séculos rompeu com a rigidez das regras de escrita: “En nuestra época el
verso libre ha obtenido grandes victorias. Es hora de admitirlo como el verso
característico de nuestro tiempo. Ya sea desde el punto de vista histórico, ya sea
del teórico, es erróneo considerarlo anómalo o simple y llana prosa” (TINIANOV,
1972, p.32).

A citação corrobora a certeza de que em literatura há espaço para


novidades e que por isso o século XXI será um reflexo do passado ao mesmo
tempo que antecipa novas tendências literárias.

2 A LITERATURA DA AMÉRICA CENTRAL E MÉXICO


Considerar a literatura da América Central e do México é considerar
também outros traçados históricos deixados pelos povos originários e por outros
povos que constituíram a região central da América Latina. Neste tópico, vamos
tratar não somente do hispanismo constituído ao longo dos séculos, mas da
revelação de uma identidade que ainda está sendo construída.

Nos séculos XIX e XX, a região central da América passou por mudanças
significativas: emancipação de regiões, consolidação geopolítica de outras regiões
(pertencimento das Ilhas das Antilhas, por exemplo), novas migrações, guerras
civis, entre outras situações. Tudo isso contribuiu para os movimentos artísticos
adquirirem certas características de identidade, afastando-se cada vez mais das
referências europeias presentes até então.

223
UNIDADE 3 | O PANORAMA DA LITERATURA HISPANO-AMERICANA ENTRE OS SÉCULOS XX E XXI

Uma das características é o tema social das narrativas que não passa a se
concentrar somente no México, mas em muitos países da América Central e região
caribenha. O tema social pode ser identificado como denúncia e testemunho de
violências, já que muitos escritores presenciaram ou foram alvos de situações,
como confrontos internos e ditadura.

Desde los inicios del siglo XX, la literatura centroamericana ha contado


con figuras de trascendencia universal como lo fueron el nicaragüense
Rubén Darío el guatemalteco Miguel Angel Asturias [...] Como en el
resto de Latinoamérica, la influencia europea fue determinante en la
primera mitad del siglo pasado. Luego, la novela social con temas
que se referían a las luchas sociales internas, quizás por influencia de
México, dominó la narrativa. La poesía también abrazó esta causa y la
imbricación de literatura con la lucha social y política se hizo patente.
[...] Centroamérica difícilmente puede hacer una diferencia con el resto
de literaturas de Latinoamérica y del Caribe en que está circunscrita.
Las tensas condiciones políticas en países tan pequeños, acallaron la
resonancia de la producción literaria (BERMÚDEZ, 2002, s.p.).

De acordo com Bermúdez (2002), a América Central ficou de fora do


boom literário que foi tão marcante para outros países porque as guerras civis
internas e sistemas opressivos silenciaram de alguma forma as novas expressões
e manifestações artísticas. Desde Miguel Ángel Asturias há poucas novidades
literárias, embora tenhamos em outras manifestações artísticas, como na música e
pintura, algumas referências de peso que influenciaram os movimentos artísticos
da época.

Coincidentemente ou não, uma vez acabados ou amenizados esses marcos


históricos sociais (ainda estamos falando principalmente das guerras internas
e ditadura), a literatura centro-americana e mexicana ressurge inclusive com
novidades na região:

Hoy los autores muestran una gran producción cuya variedad llama
la atención. La nueva novela histórica, la novela negra, lo fantástico
cotidiano, la tendencia urbana sobre la agraria, muestran rasgos
comunes en los siete países, pero a la vez mantienen una gran gama
de enfoques y tratamientos.
No cabe duda de que la literatura centroamericana actual pretende
menos y logra más. Los escritores quieren contar su historia sin afanes
de gran trascendencia y sin aspiraciones a un nuevo boom. Algunas
casa editoriales ya han notado la veta y estimulan esta producción
(BERMÚDEZ, 2002, s.p.).

De fato, as narrativas têm forte presença de retratos mais realistas


envolvidos também em uma representação fantástica e às vezes até lúdica, dando
outra característica para as narrativas em prosa, principalmente tornando o
discurso de testemunho e a ficção alegórica como marcas da literatura centro-
americana e caribenha.

224
TÓPICO 3 | A LITERATURA CONTEMPORÂNEA HISPANO-AMERICANA

No entanto, até 1980, que é, digamos, uma década de referência a muitas


teorias e estudos artísticos literários, a comunicação entre os escritores que
estreavam na região ainda é considerada escassa. De acordo com Bermúdez (2002,
s.p.), “los autores son perfectos desconocidos unos para otros” talvez por ainda
haver os resquícios dos confrontos internos dos quais havíamos falado.

DICAS

Há alguns estudos que identificam positivamente a literatura dessa região


como forma de preservar a memória individual e coletiva como compromisso histórico e
registro dos problemas sociais. Você pode consultar em Trauma Studies, teoria que investiga
o trauma, a memória e a narrativa literária, ou em artigos específicos sobre esses temas. Se
você se interessou por este tipo de pesquisa, indicamos revistas e periódicos que tematizam
Literatura e Sociedade:
Acesse http://www.jlts.stir.ac.uk/ e http://www.revistas.usp.br/ls/article/view/134583 e confira!

A literatura do Caribe tem seus maiores representantes e influência em


autores cubanos. Uma literatura influenciada por uma herança africana que foi
sendo demarcada por histórias de denúncia, sofrimento e sentimentos.

En el Caribe y la costa atlántica, la presencia negro-africana adquiere


protagonismo en un juego insólito de reconocimientos: la vanguardia
europea rescata la validez de las culturas africanas y aborígenes en
general —las colecciones de estatuas y fetiches constituyen el bagaje de
los hombres del arte de la época desde Apollinaire a Neruda, pasando
por Picasso y Huidobro—, el Renacimiento de Harlem les entrega
bríos desde un horizonte más cercano —Marcus Garvey, el gran
propulsor de la causa negra, vive un tiempo importante en los Estados
Unidos— y el Caribe comienza a reconocerse entonces a través de una
mirada que lo advierte y con la que se observa a sí mismo. Comienza,
en la hermandad afroamericana en París, entre caribeños y africanos,
rehaciendo el trágico diseño triangular de los inicios, la propuesta de
la negritud (PIZARRO, 2013, p. 23).

Ao longo das deste livro foram apresentados diversos escritores da região


do Caribe, e da Literatura Cubana selecionamos dois escritores que são um marco
em seus gêneros textuais:

• Nicolás Guillén ou Nicolás Cristóbal Guillén Batista (1902-1989) foi um poeta


cubano.
• Severo Sarduy (1937-1993) foi um poeta, romancista, jornalista e crítico de arte
e literatura cubano, criador do termo neobarroco.

225
UNIDADE 3 | O PANORAMA DA LITERATURA HISPANO-AMERICANA ENTRE OS SÉCULOS XX E XXI

DICAS

Apresentamos como sugestão de leitura o excelente artigo Literaturas hispano-


africanas, literaturas afro-hispânicas, de Amarino Oliveira de Queiroz. In: CORDIVIOLA,
Alfredo; ANDRADE, Brenda Carlos de (Orgs.). Hispanismos: outras margens. São Paulo:
Associação Brasileira de Hispanistas, 2019. p. 31-40. E-book. https://bit.ly/2QSdo7R. Acesso
em: 15 jan. 2019.

3 A LITERATURA RIO-PLATENSE
Na Unidade 2, você viu um pouco da literatura rio-platense a partir da
produção gaúcha na Argentina do século XVIII a XX. Nos próximos subtópicos,
trataremos um pouco da contribuição contemporânea da literatura produzida na
região do Rio da Prata.

De acordo com Oliveira Bermúdez (2012), a literatura uruguaia tampouco


se prendeu a modelos e padrões literários de colonizadores europeus, mas
preservou muito as manifestações populares e regionais, adquirindo uma certa
identidade. “Por outro lado, pode-se afirmar que existe uma verdadeira fusão
entre as literaturas do Rio da Prata (as atuais Buenos Aires e Montevidéu),
denominadas pela crítica como literatura rio-platense” (OLIVEIRA BERMÚDEZ,
2012, p. 73).

A literatura uruguaia tem seus primeiros registros com o poeta Bartolomé


Hidalgo (1788-1822) em Montevidéu, com a poesia gauchesca. O teor de sua
obra foi influenciado também pela política, já que como militar participou de
revoluções emancipadoras de terras do Rio da Prata, ou seja, aos processos de
independência. “Nesse período de descobrimento de uma nova identidade
cultural e homogênea da nação, surgiu a poesia militante, de cuja expressão a
primeira figura ilustre foi Bartolomé Hidalgo” (OLIVEIRA BERMÚDEZ, 2012, p.
74). Desse período para cá surgiram outros escritores que fizeram nome, ainda
assim temos um estilo que preserva o caráter de denúncia e testemunho.

A literatura paraguaia tem em Augusto Roa Bastos um de seus mais


expressivos representantes, o qual já foi citado no Tópico 2, mas também há
outros escritores.

Uma peculiaridade é que o Paraguai é um país com duas línguas oficiais, o


Guarani (da família do Tupi-Guarani) e o Espanhol. A produção literária, assim, é
bilíngue, já que a língua guarani, por ser oficial no país, é falada quase tanto como
o espanhol. Apresentamos, nestae subtópico, um grupo de poetisas reconhecidas,
o que diferencia neste caso a escrita delas de outros autores é que as letras dos
poemas são bilíngues, em guarani e castelhano.

226
TÓPICO 3 | A LITERATURA CONTEMPORÂNEA HISPANO-AMERICANA

DICAS

La Constitución Nacional de 1992 declara en su artículo 140 que “el Paraguay es


un país pluricultural y bilingüe. Son idiomas oficiales el castellano y guaraní”. Leia mais sobre
o Paraguai e os dados linguínsticos em El español y las lenguas indígenas en el Paraguay.
Disponível em: https://bit.ly/2RWRq8l.

3.1 JOSEFINA PLÁ


María Josefina Teodora nasceu na Espanha, em 1903, e faleceu em
Assunção, Paraguai, em 1999. Chegou ao Paraguai em 1926. Começou a escrever e
apresentar seus textos em jornais, quando o Pós-Modernismo estava já eclipsado
nas Américas.

Como escritora, desenvolveu os mais diversos gêneros textuais, se


caracterizou pela lírica, mas além de poesia também escreveu textos teatrais,
narrativas e ensaios. Escritora profícua, do muito que escreveu destacamos,
dentre outros, estes livros de poesias como referências: El precio de los sueños
(1934), Tiempo y Tiniebla (1982) e La llama y la arena (1987).

3.2 SUSY DELGADO


Poeta bilingue, nascida em 1949 em San Lorenzo, no Paraguai, é uma
poetisa que escreve em espanhol e guarani. Publicou obras nas duas línguas,
Yvytu yma, Ayvu membyre, Junto al fuego, Palabra en dúo.

Leia o poema Peichaite nga’u / Ojalá así fuera, de Susy Delgado, escrito
em três línguas: Guarani, Espanhol e Português, e disponibilizado no Blog de
Antonio Miranda, onde há outros poemas trilingues.

227
UNIDADE 3 | O PANORAMA DA LITERATURA HISPANO-AMERICANA ENTRE OS SÉCULOS XX E XXI

QUADRO 4 – PEICHAITE NGA’U / OJALÁ ASÍ FUERA, DE SUSY DELGADO

Peichaite nga’u Ojalá así fuera Oxalá fosse assim


Tradução de Antonio Miranda
Peichaite nga’u Ojalá así fuera Oxalá fosse assim

che rekovemi: mi pequeña vida: minha vida pequena:

tahenda porä que estuviera asentada que estivesse assentada

ko yvy ape ári, en un buen lugar em um bom lugar

tojajái rei sobre esta tierra, sobre esta terra,

kuarahy rendýicha, que brillara que brilhasse

tojahu yvytúpe.. como el fuego del sol como o fogo do sol

y se bañara en el viento... e banhasse no vento….


FONTE: <http://www.antoniomiranda.com.br/Iberoamerica/paraguai/susy_delgado.html>.
Acesso em: 22 abr. 2019.

DICAS

Para saber mais sobre Susy Delgado, acesse: http://www.antoniomiranda.com.


br/Iberoamerica/paraguai/susy_delgado.html.

Sobre a literatura guarani, observa-se que “Não há como estudar a cultura


guarani apenas do ponto de vista xamânico, mas é preciso escutar e estimular
sincretismos das novas gerações” (DINIZ, 2015, p. 37), por isso apoiar estas
pesquisas a partir dos estudos culturais e pós-coloniais é um caminho para a
descolonização de uma literatura que reflete uma estética autóctone.

228
TÓPICO 3 | A LITERATURA CONTEMPORÂNEA HISPANO-AMERICANA

DICAS

Será impossível esgotar a lista de escritores que merecem ser destacados, assim,
neste link pode ser encontrada uma enorme lista de escritores paraguaios que contribuíram
significativamente para as letras hispano-americanas, além de praticar uma inclusão literária
ao escrever em guarani e castelhano.
Disponível em: http://www.educando.edu.do/portal/conoces-algunos-escritores-
paraguayos-y-sus-obras/.

Ainda sobre a literatura rio-platense, devemos mencionar a contribuição da


Argentina. Conforme dissemos, a literatura argentina é identificada diretamente
com a literatura gauchesca, assunto do qual já tratamos. Isso também tem a
razão lógica, já que praticamente toda a construção literária desse país aconteceu
com a constituição de nação e de sua independência. Daí também encontrarmos
conteúdos com forte relação patriótica, em que a relação herói e inimigos são
ressaltadas, sendo o primeiro de mais destaque.

A Argentina é fonte de inspiração até para os novos escritores. Também


seria limitador de nossa parte falar apenas dos mais conhecidos, contudo o espaço
é pequeno para falarmos das revelações da literatura contemporânea.

DICAS

Busque saber mais sobre os autores e obras comentadas e do cânone da


literatura argentina, reconhecidos e apontados como leituras essenciais do século XX e
XXI. Sobre a literatura argentina expomos no Tópico 2 as suas maiores influências. Ainda
faltariam outros autores e temas para desenvolver, por isso selecionamos estes autores
contemporâneos argentinos como indicação para investigação literária:

• Alejandra Pizarnik (1936-1972) foi uma escritora e poetisa argentina.


• Manuel Puig ou Juan Manuel Puig Delledonne (1932-1990) foi um escritor argentino.
• Ernesto Sabato (1911-2011) foi um romancista, ensaísta e artista plástico argentino.
• Liliana Bodoc (1958-2018) ou Liliana Chiavetta escritora e poetisa argentina.

229
UNIDADE 3 | O PANORAMA DA LITERATURA HISPANO-AMERICANA ENTRE OS SÉCULOS XX E XXI

4 A LITERATURA ANDINA
A literatura hispano-americana contemporânea se nutre das mais diversas
culturas e conhecimentos autóctones, mesmo que não o reconheça inicialmente.
Da mesma forma que o barroco, principalmente nas artes e na arquitetura, ao
migrar para as Américas misturou-se com os elementos existentes e tornou-se um
barroco hispano-americano.

Ao passar dos séculos, com a busca da valorização do regional, cada vez


mais os elementos indígenas, principalmente as fontes orais, estão presentes em
suportes textuais de língua espanhola:

El mundo indígena adquiere protagonismo con la Revolución


Mexicana, las propuestas peruanas de Haya de la Torre y Mariátegui.
El reconocimiento de la memoria étnica es presencia también en
el modernismo brasileño: “Tupi or not tupi, that is the question” ,
reza con humor la propuesta del Manifesto Antropófago. A negra es
la tela clásica de Tarsila do Amaral. Se trata de culturas populares,
fundamentalmente rurales, que al ingresar al espacio urbano lo hacen
desde los cinturones periféricos. De allí saltan ahora a la imaginería
del arte (PIZARRO, 2013, p. 23).

A essa inclusão se deve o amadurecimento da escrita hispano-americana,


um processo secular, impulsionado por escritores que souberam olhar o seu
entorno e incluir os elementos autóctones ampliando um leque de temas para
serem explorados em textos de ficção e não ficção.

Vamos incluir neste subtópico alguns países que têm em comum a


Cordilheira dos Andes, assim falamos de Colômbia, Peru, Bolívia e Chile.

Esses países apresentam uma riqueza de escritores contemporâneos e


não temos a pretensão de esgotar o tema, por isso colocamos autores dos países
mencionados no parágrafo anterior como importantes para uma posterior
pesquisa e leitura de suas obras.

230
TÓPICO 3 | A LITERATURA CONTEMPORÂNEA HISPANO-AMERICANA

QUADRO 5 – AUTORES E SUAS RESPECTIVAS OBRAS

AUTOR OBRA
Jorge Franco (1964), autor Romance Rosario Tijeras ( 2002)
colombiano Filme Rosario Tijeras ( 2005) direção de Emilio
Maillé

Figura do cartaz do filme Rosário Tijeras.


FONTE: <https://bit.ly/2FP4cPF>. Acesso em: 20 dez.
2018.
Efraim Medina Reyes (1967-), Romances:
autor colombiano Seis Informes (1988)
Érase una vez el amor, pero tuve que matarlo (2001)
Laura Restrepo (1950), Delirio (2004) e traduzido para o português
escritora colombiana como Delírio (2008)
Demasiados heroes (2009) e traduzido para o
português como Demasiados heróis (2011).
Hot sur (2012)
Pecado (2016)
Fernando Vallejo (1942), El desbarrancadero (2001), traduzido para
escritor colombiano o português como O despenhadeiro. Obra
premiada com o prêmio Romulo Gallegos em
2003.
La Virgen de los Sicários (1994), com tradução
para o português A virgem dos Sicários.
Alfredo Bryce Echenique Entre romances e contos destacamos estas
(1939-), peruano obras:
Magdalena peruana y otros cuentos(1986)
Leia mais sobre o autor em: Entre la soledad y el amor (2005)
Tiro de Letra. Disponível em: Las obras infames de Pancho Marambio (2007)
https://bit.ly/2R21vfy.

231
UNIDADE 3 | O PANORAMA DA LITERATURA HISPANO-AMERICANA ENTRE OS SÉCULOS XX E XXI

Roberto Bolaño (1953-2003), Llamadas telefónicas (1997) (contos)


escritor chileno Los detectives salvajes (Os Detetives Selvagens)
(1998)
Amberes (2002)
El gaucho insufrible (2003) (contos)
2666 (2004)
Los perros románticos (2000) (Poesía)
Tres (2000)(Poesía)
Aldo Astete Cuadra (1978), Mente Suicida y Otras Muertes (Cinosargo,
escritor chileno. 2012).
O autor desenvolveu uma Chile del Terror 1, Una Antología Ilustrada
variação do gênero terror que (2014).
chamou de Terror Lárico. Ensayo Fantástico (2015).

Entenda melhor o conceito lendo o conto


El Suicidante del Moraleda disponível em:
CUADRA, A., BEZERRA, M., SOBOTTKA, M.
(2018). O Suicidante do Moraleda. Belas Infiéis,
7(1), 233-247. Disponível em: <https://bit.
ly/2m70B7D>. Acesso em: 20 dez. 2018.
Franz Tamayo Solares, Scopas (1939) Poesia
escritor boliviano (1879-1956) Epigramas griegos (1945) Poesia
Creación de la pedagogía nacional (1910)
Ensaio
Crítica del duelo (1911) Ensaio
Gonzalo Lema (1959), escritor Romance:
boliviano Dime contra quién disparo (2004)
Contra nadie en la batalla (2007)
Teatro: Gracias por el muerto (1983)
Relato:
Nos conocimos armando (1981)
Anota que soy un hombre (1987)
Edmundo Paz Soldán (1967) Romances:
ou Los vivos y los muertos (2009)
José Edmundo Paz-Soldán Norte, Mondadori (2011)
Ávila. Iris, ciencia ficción (2014)
Desenvolveu uma releitura Los días de la peste ( 2017)
do realismo mágico
conceituada por ele como
McOndo uma vertente do
realismo do século XX por
um realismo moderno e
tecnológico.
FONTE: As autoras

232
TÓPICO 3 | A LITERATURA CONTEMPORÂNEA HISPANO-AMERICANA

Finalizamos este tópico com a certeza de que estudar a literatura hispano-


americana é um campo de pesquisa inesgotável.

O reconhecimento das diversas influências e as contribuições para a escrita


dos diversos gêneros textuais são variadas. Os escritores do século XX escreveram
e deixaram sua marca literária. No século XXI, outros escritores surgem e fazem
escola.

A literatura está sempre em movimento, não é estática, por isso a cada


momento pode surgir uma inovação, uma nova forma ou experimento no campo
das Letras.

Estamos estudando literatura e, a esta altura, nos perguntamos: Como


o suporte do texto tem se modificado com o passar dos séculos? Dos primeiros
espanhóis em solo americano à globalização do planeta, percebe-se que o texto
e o leitor também mudaram. Por isso, leia a seguir o ensaio de Chartier (2000) e
pense nas mudanças que ele aponta.

233
UNIDADE 3 | O PANORAMA DA LITERATURA HISPANO-AMERICANA ENTRE OS SÉCULOS XX E XXI

LEITURA COMPLEMENTAR

¿MUERTE O TRANSFIGURACIÓN DEL LECTOR?

Se habla de la desaparición del libro;


yo creo que es imposible.
(Jorge Luis Borges, El libro, 1978).

En 1968, en un ensayo que llegó a ser célebre, Roland Barthes asociaba


la omnipotencia del lector y la muerte del autor. Destronado de su antigua
soberanía por el lenguaje o, antes bien, por "las escrituras múltiples, surgidas de
diversas culturas y que establecen entre sí una relación de diálogo, de parodia y
de oposición", el autor cedía su preeminencia al lector, entendido como "aquel que
reúne en un mismo campo todas las huellas que constituyen lo escrito".

[...] la muerte del lector y la desaparición de la lectura se conciben como la


consecuencia ineludible de la civilización de la pantalla, del triunfo de las imágenes
y de la comunicación electrónica. Este último diagnóstico es el que quisiera analizar
aquí. Las pantallas de nuestro siglo son, en efecto, de una nueva clase. A diferencia
de las pantallas del cine o de la televisión, estas tienen textos, no solamente textos,
ciertamente, pero también tienen textos. La antigua oposición entre, por un lado,
el libro,lo escrito, la lectura y, por el otro, la pantalla y la imagen ha sido sustituida
por una situación nueva que propone un nuevo soporte para la cultura escrita y
una nueva forma para el libro. De allí surge el lazo muy paradójico establecido
entre la tercera revolución del libro, que transforma las modalidades de inscripción
y de transmisión de los textos, corno lo hicieron antes la invención del codex y
luego la de la imprenta, y el terna obsesivo de la "muerte del lector". Comprender
esta contradicción supone echar una mirada al pasado y medir los efectos de
revoluciones anteriores que afectaron los soportes de la cultura escrita. En el siglo IV
de la era cristiana, una forma nueva del libro se impuso definitivamente a expensas
de aquella con la que estaban familiarizados los lectores griegos y romanos. El
codex, es decir, un libro compuesto de hojas dobladas, reunidas y encuadernadas,
suplantó de manera progresiva pero ineludible los rollos que hasta entonces habían
sido los vehículos de la cultura escrita. Con la nueva materialidad del libro, gestos
imposibles se hicieron comunes: tales corno escribir y leer al mismo tiempo, hojear
una obra, identificar rápidamente un pasaje particular. [...] ¿Debemos suponer que
estarnos en vísperas de una mutación semejante y que el libro electrónico ha de
reemplazar, o está ya reemplazando el codex impreso tal corno lo conocemos en sus
diversas formas: libro, revista, periódico? Tal vez. [...] Esta hipótesis es seguramente
más razonable que los lamentos por la pérdida irreparable de la cultura escrita
o que los entusiasmos imprudentes que anunciaban el ingreso inmediato en una
nueva era de la comunicación (CHARTIER, 2000, p. 104-105).

FONTE: CHARTIER, Roger. Las Revoluciones de la Cultura Escrita. Diálogo e intervenciones.


Barcelona: GEDISA, 2000.

234
TÓPICO 3 | A LITERATURA CONTEMPORÂNEA HISPANO-AMERICANA

Leia também este fragmento do texto de Canclini (2014), disponível na


íntegra na referência e reflexione sobre literatura e tecnologia.

Imágenes y escrituras: modos de dudar

Nestor García Canclini

[...]
Una perspectiva más atenta a la reestructuración mundial de las prácticas
culturales puede registrar cómo se han desmaterializado las artes y la literatura
en la época de su reproductibilidad tecnológica. Las relaciones de la escritura y la
lectura con lo audiovisual y lo digital nos conducen a un nuevo régimen simbólico.
¿Se disuelve la consistencia del arte y la literatura, como algo distinto de la nada,
que la resiste, en este tiempo de flujo digital generalizado de imágenes y escrituras?

La desmaterialización, como sabemos, no comenzó con el predominio de


la comunicación digital sobre el arte de objetos y la literatura en papel. Ya desde
Mallarmé y Duchamp las prácticas artísticas basadas en objetos fueron cediendo
lugar a prácticas ancladas en contextos y procesos temporales, en experiencias
abismales de desdefinición de lo estético. Podrían rastrearse las relaciones de la
literatura y el arte con la nada analizando si los modos en que los escritores y
artistas tratan con la ausencia, el vacío u otras formas de negatividad corresponden
a su diversa ubicación en distintas estructuras sociales, etapas históricas, rituales
y la transgresión de todo eso. Hablo de correspondencia, no de que los contextos
explicarían el carácter de las obras, porque la sociología y la antropología del arte
no pretenden ya suministrar claves de determinaciones sociales sobre la creación;
se interrogan, más bien, si las formas abiertas y polisémicas de la producción,
la comunicación y la recepción del arte y la literatura son correlacionables con
el orden social y sus cambios. Si partimos de la hipótesis de que los actos que
forman parte del proceso literario – escribir, publicar, leer, interpretar, e incluso
vender y comprar textos – son modos de estar en la sociedad, es posible también
indagar qué sentido social tienen las apariciones de lo negativo en ese proceso:
no escribir, escribir y no publicar, no querer reeditar, no leer, etcétera. Sabemos
que muchos escritores han incorporado estos rechazos, prescindencias, fracasos
y desconstrucciones a sus narraciones y poemas. ¿Cuál es su sentido social? [...]
(CANCLINI, 2014, p. 15-16).

FONTE: CANCLINI, Nestor. ¿Por qué hay literatura y no más bien nada? In: BASILE, Teresa;
FOFFANI, Enrique. (Orgs.). Literaturas compartidas. La Plata, Universidad Nacional de La Plata.
Facultad de Humanidades y Ciencias de la Educación, 2014. (Colectivo crítico; 1). https://bit.
ly/2RnwFmP. Acesso em: 14 maio 2018.

O texto de María Cristina Martínez Solís (1976, p. 23) contempla uma


discussão sobre a compreensão leitora, neste momento, depois do percurso pela
literatura hispano-americana e ter conhecido um pouco de seus autores e textos,
torna-se importante desenvolver uma reflexão sobre texto, leitor e leitura.

235
UNIDADE 3 | O PANORAMA DA LITERATURA HISPANO-AMERICANA ENTRE OS SÉCULOS XX E XXI

¿Cómo se Realizan los Procesos de Comprensión?

Las investigaciones realizadas en las últimas décadas sobre la comprensión


del discurso dan cuenta de dos orientaciones principales: los que se sitúan desde la
perspectiva del lector y sus esquemas de conocimiento previo y los que se sitúan
desde la perspectiva del texto y su organización estructural. Uno de los aportes
más representativos realizados no solamente por los lingüistas sino también
por investigadores de diferentes disciplinas como la psicología cognitiva y la
inteligencia artificial, tiene que ver con la teoría de los esquemas, la cual destaca
la incidencia de los conocimientos previos del lector en los procesos de inferencia
y de interpretación del texto. Según Lakoff (1987) estas investigaciones se inspiran
en gran parte del concepto de “frame” de Fillmore (1968) desarrollado a través
de la teoría de los casos. Los casos, en palabras de este lingüista semanticista,
equivalen a representaciones mentales generales sobre la manera como se perciben,
se comunican y se interpretan las experiencias (1976). Un “marco” o esquema es
entonces lo que se tiene en mente, son paquetes de conocimiento estructurado,
más o menos estable, que orientan la comprensión y la búsqueda de la nueva
información, el movimiento hacia lo desconocido. Los esquemas, son abstracciones
regularizadas en la mente y representarían la gramática interna del hablante.
Fillmore argumenta además sobre la importancia de la noción de esquema, y dice
que en la caracterización del sistema lingüístico se debe añadir a la descripción de la
gramática y del léxico, una descripción de los esquemas cognitivos e interaccionales
en términos de cómo el usuario del lenguaje interpreta su contexto, formula sus
propios mensajes, comprende los mensajes de otros y acumula y crea un modelo
interno del mundo. La evolución hacia el lenguaje, añade, debe consistir en gran
parte en una adquisición gradual de un repertorio de esquemas y de procesos
mentales para operar con estos esquemas, y, eventualmente en la capacidad de
crear y de transmitir otros nuevos (SOLIS, 1997, p. 15-16).

FONTE: MARTÍNEZ SOLÍS, María Cristina. El Desarrollo de Estrategias Discursivas a Nivel


Universitario. In: MARTÍNEZ SOLÍS, María Cristina (Orgs.). Los procesos de la lectura y la
escritura. Santiago de Cali: Universidad del Valle, 1997.

236
RESUMO DO TÓPICO 3

Neste tópico, você aprendeu que:

• A literatura hispano-americana, entre os séculos XX e XXI, apresenta uma


escrita com características próprias de temas regionais.

• A literatura hispano-americana se desenvolveu em todas as regiões dos três


continentes, sem exceção, e legaram um vasto acervo literário com muitas
obras premiadas internacionalmente.

• Muitas das obras e autores hispano-americanos atualmente são considerados


canônicos. A lista de obras e autores são extensas e por isso não são todas
abordadas nesta unidade.

• Ao falar do Rio de La Plata, compreendeu-se um panorama dos escritores


argentinos, uruguaios e paraguaios.

• As escritoras Josefina Plá e Susy Delgado, contemporâneas e representantes


do Paraguai, realizaram uma escrita de textos publicados ao mesmo tempo em
língua espanhola e guarani.

• A região Andina nos faz pensar em países que têm em comum a Cordilheira
dos Andes, por isso apresentamos em conjunto: Peru, Bolívia, Chile e Colômbia
e destacamos alguns de seus mais conhecidos autores atuais.

• A inovação literária de conceitos como McOndo e Terror Lárico são tendências


do século XXI, por isso merecem ser conhecidas.

237
AUTOATIVIDADE

A partir da leitura do fragmento El Arco y la Lira, de Octavio Paz, ordene


sintaticamente as orações do texto desordenado a seguir e organize artigos,
conjunções, pontuações e preposições, quando necessário:

único poema es Cada. En late, mayor cada obra con o menor


intensidad, la poesía toda. la lectura de un Por tanto, solo poema nos revelará
con mayor certeza que cualquier histórica o poesía filológica qué es la
investigación. Pero del experiencia la poema – su a lectura recitación través
o la de la recreación – ostenta heterogeneidad también una desconcertante
pluralidad y . la lectura se presenta como Casi siempre la revelación de
ajeno poesía algo a la dicha propiamente.

FONTE: PAZ, Octavio. El Arco y la Lira. El poema, la revelación poética, poesía e história. 3.
ed. México: Fondo de cultura económico, 1972. p. 23-24.

2 A partir do Poema II da coletânea Veinte poemas de amor y una canción


desesperada (1923), de Pablo Neruda (1990, s.p.), responda às questões
propostas a seguir:

Poema II

En su llama mortal la luz te envuelve.


Absorta, pálida doliente, así situada
contra las viejas hélices del crepúsculo
que en torno a ti da vueltas.

Muda, mi amiga,
sola en lo solitario de esta hora de muertes
y llena de las vidas del fuego,
pura heredera del día destruído.

Del sol cae un racimo en tu vestido oscuro.


De la noche las grandes raíces
crecen de súbito desde tu alma,
y a lo exterior regresan las cosas en ti ocultas.
de modo que un pueblo pálido y azul
de ti recién nacido se alimenta.

Oh grandiosa y fecunda y magnética esclava


círculo que en negro y dorado sucede:
erguida, trata y logra una creación tan viva
que sucumben sus flores, y llena es de tristeza.

FONTE: <https://bit.ly/2TVN26U>. Acesso em: 16 nov. 2018.

238
a) Leia o poema em voz alta, devagar e respeitando a pontuação. Observe
onde recaem as sílabas tônicas.

b) Faça um breve resumo e identifique sobre o que o poeta está falando.

c) Identifique e escreva a estrutura do poema.

d) Identifique e transcreva uma metáfora do poema.

3 Leia a seguir a letra da canção de Juanes, chamada Rosario Tijeras, que conta
a vida de uma sicaria (pessoa contratada para matar outras pessoas em
troca de dinheiro). A canção pertence ao disco Mi Sangre (2004) e traz a
famosa obra colombiana de Jorge Franco, de mesmo nome. Perceba como a
personagem está colocada na canção e faça uma breve descrição dela e de
sua situação social

Rosario Tijeras (JUANES)

Y se llamaba Rosario, del barrio era la manda más


Con su pistola en la mano siempre lista pa'matar
En odios y desengaños Rosario era la number one
Nunca amó ni la amaron

Y en sus ojos siempre el dolor existió


Todo fue porque en su niñez
Un malpa la violó y ella se vengó

Era Rosario Tijeras, la de pistola, espejito y labial


en su cartera siempre llena de vicio
sexo, balas, placer y dolor
las de las mil y una vidas, pam pam pam.. Rosario!
Nunca amó ni la amaron

Y en sus ojos siempre el dolor existió


y todo fue porque en su niñez
Un malpa la violó y ella se vengó

Y confundió el amor fue una bala lo que entró en su corazón


Nunca jamás lloró y en su alma siempre un llanto se escuchó
De tantos que mató uno vino mal herido y se vengó
Rosario así murió y en el cementerio nadie la lloró

FONTE: <https://www.vagalume.com.br/juanes/rosario-tijeras.html>. Acesso em: 22 abr. 2019.

239
240
REFERÊNCIAS
AGUIAR E SILVA, V. M. de. Teoria da literatura. 3. ed. Coimbra: Livraria
Almedina, 1979.

AGUIRRE, Henrique Ballón. Prólogo. VALLEJO, César. Obra poética completa.


Edición, Prólogo y Cronología de Enrique Ballon Aguirre. Caracas: Biblioteca
Ayacucho, 1979. https://repositorio.ufsc.br/handle/123456789/178892. Acesso em:
15 dez. 2018.

ALCARAZ, Jose Maria Camorlinga. Dos Religiones Azteca-Cristiana. 3. ed.


México: Plaza y Valdés editores, 1993.

ALTAMIRANO, Carlos; SARLO, Beatriz. Ensayos Argentinos. De Sarmiento a


la Vanguardia. Argentina: Espasa Calpe Argentina S.A.; Ariel, 1997.

ARELLANO, Ignacio. Historia del teatro español del siglo XVII. 5. ed. Madri:
Ediciones Cátedra, 2012.

ASTURIAS, M. A.; MENDOZA, J. M. González de. Popol Vuh. Wikisourse.


[s.d.]. https://goo.gl/aeJj9g. Acesso em: 10 jun. 2018.

AYBAR-RAMÍREZ, M. D. O Éden americano de Guamán Poma In: Anais


abralic. São Paulo: USP, 2008. https://goo.gl/DqvJik. Acesso em: 23 jun. 2018.

BANDEIRA, Manuel. Literatura Hispanoamericana. Rio de Janeiro: editora


Fundo de Cultura, 1960.

BARLETTA VILLARAN, R. Breve historia de Francisco Pizarro. Madri:


Nowtilus, 2008.

BELLINI, G. Nueva historia de la literatura hispanoamericana. 3. ed. Corrigida


e aumentada. Madrid: Editorial Castalia, S.A., 1997.

BENÍTEZ GROBET, L. Carlos de Sigüenza y Góngora. Criollo, nacionalista


y moderno hombre de ciencia. Anuario Saber Novohispano 1995. México,
Universidad Autónoma de Zacatecas, n. 2, p. 425-435, 1995. https://goo.
gl/28qt2Q. Acesso em: 10 maio 2018.

BERMÚDEZ, Manuel. Literatura Centroamericana Hoy. In: Semanario


Universidad. Universidad de Costa Rica. 2002. https://semanariouniversidad.
com/suplementos/forja/literatura-centroamericana-hoy/. Acesso em: 11 dez.
2018.

241
BETHELL, L. (Ed.). Historia De América Latina. 5. ed. La Independencia.
Tradução de Àngels Sola. Barcelona: Editorial Crítica, 2001.

BEZERRA, Mara Gonzalez. Mulheres que habitavam Comala. Personagens


femininas em Pedro Páramo [dissertação]. Florianópolis-SC, 2011.

BOLÍVAR, S. Carta de Jamaica: Simón Bolívar. Caracas: Comisión Presidencial


para la Conmemoración del Bicentenario de la Carta de Jamaica, 2015. Colección
Unidad Nuestra Americana. https://bit.ly/2gnUzYc. Acesso em: 18 set. 2018.

BORRERO, M. J. Felipe Guamán Poma de Ayala y su obra Nueva Corónica


y Buen Gobierno: ¿verdadera o falsa autoría? 1997. https://webs.ucm.es/info/
especulo/numero7/guaman.htm. Acesso em: 30 jun. 2018.

BRAVO, J. A. La tesis de William Burns: el quechua sí tuvo escritura. Variedades


n. 275, Lima, maio 2012. https://bit.ly/2C7Rl9a. Acesso em: 30 jun. 2018.

BRISEÑO, M. E. Reseña de Códices. Los antiguos libros del nuevo mundo, de


Miguel León-Portilla. Anales del Instituto de Investigaciones Estéticas [en
linea] 2002. https://bit.ly/2zSoNi7. Acesso em: 16 jun. 2018.

CABRERA LEMA, E. C. Representaciones del demonio: miedos sociales


vislumbrados en tres escritos conventuales neogranadinos. CS, Cali, n. 9, p. 87-
114, jun. 2012.

CALASANS, Selma. Verbete. In: E-Dicionário de Termos Literários (EDTL).


Coord. de Carlos Ceia. Realismo Mágico. Dez. 27, 2009. http://edtl.fcsh.unl.pt/
encyclopedia/realismo-magico/. Acesso em: 20 dez. 2018.

CANCLINI, Nestor. ¿Por qué hay literatura y no más bien nada? In: BASILE,
Teresa; FOFFANI, Enrique. (Orgs.). Literaturas compartidas. La Plata:
Universidad Nacional de La Plata. Facultad de Humanidades y Ciencias de la
Educación, 2014. (Colectivo crítico; 1). https://bit.ly/2RnwFmP. Acesso em: 14
maio 2018.

CARPENTIER, Alejo. El siglo de las luces. Edición de Ambrosio Fornet.


Madrid: Cátedra, 1982. https://bit.ly/2TVN26U. Acesso em: 16 nov. 2018.

CASTRO LEAL, A. Juan Ruiz de Alarcón: Su vida y su obra. México:


Cuadernos Americanos, 1943.

COLOMBRES, A. La Literatura oral y popular de nuestra América. Quito:


Instituto Iberoamericano del Patrimonio Natural y Cultural-IPANC, 2006.

COLÓN, C. Carta I de 1493. [s.d.]. https://goo.gl/xbu3kg. Acesso em: 10 jun.


2018.

242
CONCEITO.DE. Dicionário de Conceitos. Online. 2015. https://conceito.de/
quechua. Acesso em: 1º dez. 2018.

CORREA, M. L. P. Filosofía e Historia en la práctica de la traducción.


Colombia: UDEA - Editorial Universidad de Antioquia, 2014.

CORTÁZAR, Julio. Obra Crítica. V. 2. Organização de Jaime Alazraki; tradução


de Paulina Wacht e Ari Roitman. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1999.

CORTÁZAR, Julio. Rayuela. Barcelona: Edhasa, 1981. https://bit.ly/2TVN26U.


Acesso em: 16 nov. 2018.

CORTÁZAR, Julio. Clases de Literatura. Berkeley, 1980. Barcelona. [Edición de


Carles Álvarez Garriga]. Ed. Punto de lectura, 2014.

COSTA, Adriane Vidal. Os intelectuais, o boom da literatura latino-americana


e a Revolução Cubana. In: Anais do... XXVI Simpósio Nacional de História –
ANPUH. São Paulo, julho 2001. https://bit.ly/2VUnOrf. Acesso em: 21 dez. 2018.

COULTHARD, G. R. A Pluralidade Cultural. In: FERNÁNDEZ MORENO, C.


(Coord.). UNESCO. América Latina em sua literatura. Paris: UNESCO, São
Paulo: Perspectiva, 1979.

DARÍO, Rubén. Azul. Domínio Público. [s.d.]. http://www.dominiopublico.gov.


br/pesquisa/DetalheObraForm.do?select_action=&co_obra=6449>.Acesso em: 16
nov. 2018.

DARÍO, R. A Margarita Debayle. Argentina: Biblioteca Virtual Universia. 2003.


http://www.biblioteca.org.ar/libros/80.pdf. Acesso em: 4 abr. 2019.

DARÍO, R. Azul. Argentina: Biblioteca Virtual Universia. 2003. https://bit.


ly/2UociYb. Acesso em: 4 abr. 2019.

DE LA CRUZ, J. I. Los empeños de una casa. Amor es más Laberinto. Edición


de Celsa Carmen García Valdés. Madrid: Cátedra, 2010.

DE LA CRUZ, J. I. Poesía Lírica. Edición de José Carlos González Boixo. 4. ed.


Madrid: Cátedra, 2000.

DELLEPIANE, A. B. Los folletines gauchescos de Eduardo Gutiérrez. Revista


Iberoamericana, [S.l.], p. 487-506, dic. 1978. https://revista-iberoamericana.pitt.
edu/ojs/index.php/Iberoamericana/article/view/3331/3510. Acesso em: 6 abr.
2019.

DÍAZ DEL CASTILLO, B. Historia verdadera de la conquista de la nueva


España. 13. ed. México: Editorial Porrúa, 1983.

243
DINIZ, A. G. Somos analfabetos? Interculturalidade, deslocamentos e
descolonização na américa latina. In: García de la Pena, J. S. I.; Izquierdo
Blanco, M.; Palacios Diaz, A. M. (Org.). Anais do... V Congresso Nordestino de
Professores de Espanhol (nov. 2014). I Congresso Internacional do Ensino de
Espanhol, 2015. Madrid. Secretaría General Técnica. Centro de Publicaciones.
Ministerio de Educación, Cultura y Deporte, 2015, p. 35-43. https://goo.gl/
iPFU9H. Acesso em: 14 maio 2018.

DINIZ, A. G. Literatura Hispanoamericana. Florianópolis, SC: LLE/CCE/UFSC,


2010.

DOMINGUES, J. M. A América Latina e a modernidade contemporânea: uma


interpretação sociológica. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2009.

DUVE, T. El Tratado de Tordesillas: ¿Una 'revolución espacial'? Cosmografía,


prácticas jurídicas y la historia del derecho internacional público *. Rev. hist.
Derecho, Ciudad Autónoma de Buenos Aires, n. 54, p. 1-10, dez. 2017. https://
bit.ly/2QqKxfF. Acesso em: 29 jun. 2018.

ECHEVERRÍA, J. E. La cautiva. Alicante: Biblioteca Virtual Miguel de


Cervantes; Santiago de Compostela: Universidad de Santiago de Compostela,
2010. https://bit.ly/2D88zFL. Acesso em: 4 dez. 2018.

ECHEVERRÍA, E. La cautiva. Buenos Aires: Editorial Tor, 1957.

ERCILLA Y ZUÑIGA, A. de. La araucana. Madrid: Castalia, 1979. http://bdh-rd.


bne.es/viewer.vm?id=0000172070&page=1. Acesso em: 8 jun. 2018.

ESPITIA ORTIZ, D. L. Consolidación, construcción y modelación de un «yo»,


o la manera como el lenguaje modela una realidad (el caso de las cartas de
relación de Hernán Cortés). La Palabra, Tunja, n. 30, p. 131-149, jun. 2017.
https://bit.ly/2C8uqKK. Acesso em: 23 jun. 2018.

FERNÁNDEZ-LÓPEZ, Justo. El modernismo. Hispanoteca. [s.d.]. http://


hispanoteca.eu/Literatura%20española/Modernismo/El%20Modernismo.htm.
Acesso em: 21 dez. 2018.

FRANCO, J. Las conspiradoras. La representación de la mujer en México.


México: F.C.E., 2004.

GALENO, Cícero. (Org.). Literaturas americanas. Porto Alegre: EDIPUCRS,


2012. http://ebooks.pucrs.br/edipucrs/LiteraturasAmericanas.pdf. Acesso em: 16
nov. 2018.

GALEANO, E. Las venas abiertas de América Latina. Madrid, Espanha: Editora


Siglo XXI, 2003.

244
GAMERO CANO, F. de L. La poesía peruana arequipeña, romántica e
intercultural. Suecia: Mälardalen University, School of Education, Culture and
Communication. 2013. Disponível em http://www.diva-portal.org/smash/get/
diva2:683002/FULLTEXT01.pdf. Acesso em: 4 abr. 2019.

GARCÍA MÁRQUEZ, Gabriel. Cien años de soledad. Edición de Jacques Joset,


Madrid: Cátedra, 1996. https://bit.ly/2TVN26U. Acesso em: 16 nov. 2018.

GARCILASO DE LA VEGA, I. Inca Garcilaso de la Vega: Primera parte de los


Comentarios Reales de los Incas. Lisboa, 1609. In: GARCILASO DE LA VEGA,
I. Historia general del Perú (segunda parte de los Comentarios Reales de los
Incas). Córdova, 1617.

GARFIELD, E. P. Las literaturas hispánicas: Hispanoamérica. Introducción


a su estudio. Evelyn Picon Garfield; Iván A. Schulman. Detroit: Wayne State
University Press, 1991. https://bit.ly/2SBou2j. Acesso em: 16 jun. 2018.

GIRONDO, Oliverio. Manifesto de Martín Fierro: Periódico quincenal de arte


y crítica libre. In: Martín Fierro: Periódico quincenal de arte y crítica libre,
Buenos Aires, v. 1, n. 4, May. 1924. https://bit.ly/2BL2Djb. Acesso em: 1º jan.
2019.

GIUCCI, G. Velhos e novos mundos: da conquista da América ao domínio do


espaço cósmico. Revista Estudos Históricos, Rio de Janeiro, v. 4, n. 7, p. 3-18,
jul. 1991. https://goo.gl/oGyRxa. Acesso em: 16 jun. 2018.

GODOY, S. O.; GARCÍA, M. E. R. (Coords.). El ocaso del antiguo régimen en


los imperios ibéricos. Lima, Pontificia Universidad Católica del Perú: Fondo
Editorial, 2017.

GONZÁLEZ ECHEVARRÍA, R. Mito y Archivo. Una teoría de la narrativa


latinoamericana. Trad. de Virginia Aguirre Muñoz. 2. ed. México: FCE, 2011.

GONZALEZ BEZERRA, Mara. Tradução comentada da peça teatral Amor es


más laberinto de Sor Juana Inés de La Cruz: o emaranhado jogo das antíteses.
2016. 281 p. Tese (Doutorado) – Universidade Federal de Santa Catarina, Centro
de Comunicação e Expressão, Programa de Pós-Graduação em Estudos de
Tradução, Florianópolis, 2016. http://www.bu.ufsc.br/teses/PGET0316-T.pdf.
Acesso em: 22 abr. 2019.

GONZÁLEZ, M. M. Leituras de literatura espanhola. São Paulo: FAPESP, 2010.

GUZMÁN-RUBIO, Federico. Tipología del relato de viajes en la literatura


hispanoamericana: definiciones y desarrollo. Revista de Literatura, enero-junio,
v. LXXIII, n. 145, p. 111-130, 2011.
https://bit.ly/2FPlcoD. Acesso em: 16 jun. 2018.

245
JITRIK, N. Forma y significación en "El Matadero", de Esteban Echeverría. El
fuego de la especie: ensayos sobre seis escritores argentinos, Buenos Aires:
Siglo Veintiuno Argentina, 1971, p. 63-98. https://bit.ly/2C1a9XN. Acesso em: 28
set. 2018.

JOZEF, B. História da literatura hispano-americana. 4. ed. Rio de Janeiro:


Editora da UFRJ/ Editora Francisco Alves, 2005.

KLOCK, A. M.; FLECK, G. F. Descobrimento e conquista da América: gênese


do multiculturalismo americano. II Seminário Nacional em Estudos da
Linguagem: Diversidade, Ensino e Linguagem. UNIOESTE, 2010. https://goo.gl/
HXgkeq. Acesso em: 10 jun. 2018.

KRICKEBERG, W. Mitos y leyendas de los aztecas, incas, mayas y muiscas.


México: IFF, 1971.

KRISTEVA, J. El lenguaje, ese desconocido. Introducción a la lingüística.


Tradução: María Antoranz. Madrid: Editorial Fundamentos, 1988.

LAMA, V. de. (Org.). Antologia de ka Poesía Amorosa Española e


Hispanoamericana. 14. ed. España: EDAF, 2007.

LANNOY, Lucie Josephe de. Céu, inferno e purgatório: da escrita e do outro na


obra de César Vallejo. Brasília, 2013.

LAUSBERG, H. Elementos de Retórica Literária. 5. ed. Tradução, préfacio e


aditamentos de R. M. Rosado Fernando. Lisboa: Fundação Calouste Gulbekian,
2004.

LEÓN-PORTILLA, M. Códices: os antigos livros do novo mundo. Florianópolis:


Ed. da UFSC, 2012.

LEÓN-PORTILLA, León. Cantares mexicanos. Miguel León-Portilla (edición,


paleografía, traducción y notas). Volumen II. Tomo 2. Del folio, 42 v al
85r. México: Universidad Nacional Autónoma de México, 2011. https://bit.
ly/2COtRpr. Acesso em: 1 abr. 2019.

LIENHARD, M. Los comienzos de la literatura latinoamericana: monólogos y


diálogos de conquistadores y conquistados. In: PIZARRO, Ana (Org.). América
Latina: Palavra, literatura e cultura. Campinas: UNICAMP, v. 1, p. 51. 1993.

LIZARDI, J. J. F. de. In: MAYORAL, M. R. P. (Org.). El Periquillo Sarniento.


México: Instituto Nacional de Estudios Históricos de las Revoluciones de
México, 2012. https://bit.ly/2POlMoX. Acesso em: 17 set. 2018.

246
LODI-RIBEIRO, G. Xochiquetzal: uma princesa asteca entre os incas. São Paulo:
Editora Draco, SP, 2014. https://bit.ly/2PzTLAH. Acesso em: 1º dez. 2018.

LONG, Pamela. In: Ruidos con la inquisición: los villancicos de Sor Juana.
Destiempos. Dossier Virreinatos. México, Distrito Federal, mar,/abr. 2008, año
3, n. 14. Publicación Bimestral Dossier: Virreinatos. p. 56 -578. http://migre.me/
sEDJI. Acesso em: 20 dez. 2015.

LÓPEZ, Alejo. La política encarnada: España, aparta de mí este cáliz de César


Vallejo. In: Revista Zama, Buenos Aires, Universidad de Buenos Aires, n. 8,
2016, p. 103-107. http://revistascientificas.filo.uba.ar/index.php/zama/article/
download/3078/2719. Acesso em: 16 nov. 2018.

LÓPEZ DE GÓMARA, F. Historia general de las Indias: Conquista de México.


Barcelona [Espanha]: ORBIS, 1985.

MANSILLA, L. V. Tomo Primero. In: Una excursión a los indios ranqueles.


Alicante Biblioteca Virtual Miguel de Cervantes, 2001. http://www.
cervantesvirtual.com/nd/ark:/59851/bmcn8760. Acesso em: 19 set. 2018.

MARKUN, P. Cabeza de Vaca. São Paulo: Companhia das Letras, 2009.

MARTÍ, J. La Revista Ilustrada de Nueva York, Estados Unidos. 1891. In:


Nuestra América, Buenos Aires: OSAL, Observatório social de América Latina,
año XI, n. 27, abr. 2010. https://bit.ly/2NmSlIO. Acesso em: 20 set. 2018.

MARTÍNEZ SOLÍS, María Cristina. El Desarrollo de Estrategias Discursivas a


Nivel Universitario. In: Los procesos de la lectura y la escritura. MARTÍNEZ
SOLÍS, María Cristina (Orgs.). Santiago de Cali: Universidad del Valle, 1997.

MELIÀ, B. A terra sem mal dos Guarani. Revista de Antropologia, São Paulo, v.
33, p. 33-46, dez. 1990. http://www.revistas.usp.br/ra/article/view/111213/109495.
Acesso em: 22 jun. 2018.

MIRANDA, Antonio. Poesía Paraguaya, Susy Delgado. http://www.


antoniomiranda.com.br/Iberoamerica/paraguai/susy_delgado.html. Acesso em:
10 abr. 2019

MORALES, Gabriel Iglesias. Aplicaciones Didácticas de la Poesía y el Arte en


el Aula de Ele. Madri: Consejeria de España, 2011. https://bit.ly/2UIPcL1. Acesso
em: 16 nov. 2018.

NOGUEROL, F. Mujer Y Escritura en la época de Sor Juana Inés de la Cruz.


Salamanca, Ediciones Universidad de Salamanca América Latina Hoy, n. 30,
2002, p. 179-202. https://goo.gl/sFdt4V. Acesso em: 14 maio 2018.

247
NÚÑEZ CABEZA DE VACA, A. Naufrágios e comentários. Porto Alegre:
L&PM, 1999. 319 p.

OBLIGADO, R. Santos Vega: tradiciones argentinas. Alicante: Biblioteca Virtual


Miguel de Cervantes, 2000. http://www.cervantesvirtual.com/nd/ark:/59851/
bmc1v5d2. Acesso em: 28 mar. 2019.

OLIVEIRA BERMÚDEZ, María Alejandra. Literatura uruguaia: breve


apresentação. In: LOPES, Cícero Galeno. Literaturas Americanas. Porto Alegre:
EdiPUCRS, 2012.

OLMEDO, J. J. In: La victoria de Junín. Canto a Bolívar. Alicante: Biblioteca


Virtual Miguel de Cervantes. 1999. https://bit.ly/2NqG9Md. Acesso em: 18 set.
2018.

ONETTI, Juan Carlos. Juntacadáveres. E-book Epub, 2016. https://www.


amazon.com.br/Livros-Juan-Carlos-Onetti/s?rh=n%3A6740748011%2Cp_27%3A
Juan+Carlos+Onetti. Acesso em: 10 abr. 2019.

OPERÉ, F. El discurso natural y moral en Hispanoamérica: de la colonia a la


independencia. In: Letras de Deusto, v. 70, n. 26, 1996, p. 145-167. https://bit.
ly/2MENabS. Acesso em: 28 ago. 2018.

OVIEDO, José Miguel. Historia de la Literatura Hispanoamericana 3:


Postmodernismo, vanguardia, regionalismo. Madrid: Alianza Editorial, 2001.

PAZ, Octavio. México en la obra de Octavio Paz. II. Generaciones y semblanzas:


escritores y letras de México. 1. Una literatura transplantada. Edicion de Octávio
Paz y Luis Mario Schneider. México: Fondo de Cultura Mexicana, 1989.

PAZ, Octavio. El Arco y la Lira. El poema, la revelación poética, poesía e


história. 3. ed. México, Fondo de cultura económico, 1972. p. 23-24.

PEREZ STOCCO, S. La influencia de la prensa en el proceso de independencia


de México. Rev. hist. am. argent., Mendoza, v. 50, n. 1, p. 161-187, jul. 2015.
https://goo.gl/17hQbx. Acesso em: 27 set. 2018.

PIGLIA, Ricardo. Crítica y ficción. Buenos Aires: Seix Barral, 2000.

PIZARRO, Ana. Vanguardia y modernidad em el discurso cultural. In:


PIZARRO, Ana. (Org.). América Latina: Palabra, Literatura y Cultura. Santiago
de Chile: Ediciones Universidad Alberto Hurtado, 2013.

248
POLOTTO SABATÉ, M. L. La visión del otro en una excursión a los indios
ranqueles, de Lucio V. Mansilla. Miscelánea Comillas. Revista de Ciencias
Humanas y Sociales, [S.l.], v. 69, n. 135, p. 571-583, feb. 2011. http://revistas.
upcomillas.es/index.php/miscelaneacomillas/article/view/756/632. Acesso em: 10
set. 2018.

POMA DE AYALA, F. G. El Primer Nueva Corónica y Buen Gobierno (1615-


1616). Universidade Copenhague. https://goo.gl/YzD9zz. Acesso em: 14 maio
2018.

PULIDO, M. In: Simpósio Crônica: Jornalismo, Edição, Tradução (1.: 2016:


Florianópolis, SC). Caderno de Resumos / I Simpósio Crônica: Jornalismo,
Edição, Tradução; Organizadores, Walter Carlos Costa, Rosario Lázaro Igoa,
Letícia Goellner. – Florianópolis: PGET/CCE/UFSC, 2017. https://goo.gl/ErkiVj.
Acesso em: 20 jun. 2018.

RAMA, Ángel. Transculturación narrativa en América Latina. 2. ed. Buenos


Aires: Ediciones El Andariego, 2008.

RAMA, Ángel. (Ed.). Mas allá del boom: literatura y mercado. Buenos Aires:
Folios, 1984.

RAMA, A. Los gauchipolíticos rioplatenses. Buenos Aires: Centro Editor de


América Latina, 1982.

RETAMAR, R. F. Para una teoría de la literatura hispanoamericana. Santafé de


Bogotá: Imprenta Patriótica del Instituto Caro y Cuervo, 1995.

RIBEIRO, Maria Paula Gurgel. Tradução de Águas-Fortes Portenhas, de


Roberto Arlt. 2001. Dissertação (Mestrado em Língua Espanhola e Literaturas
Espanhola e Hispano-Americana). Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências
Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2001. http://www.teses.usp.
br/teses/disponiveis/8/8145/tde-12042002-115005/pt-br.php. Acesso em: 14 maio
2018.

ROBLEDO, A. I. La Madre Castillo: Autobiografía Mística y Discurso Marginal.


Letras Femeninas, v. 18, n. 1/2, 1992, p. 55-63. www.jstor.org/stable/23022573.
Acesso em: 16 jun. 2018.

RODRÍGUEZ, J. E. La Independencia de la América Española. México, Colegio


de México: Fondo de Cultura Económica, 2016.

RODRÍGUEZ, M. R. La edad de oro de los Virreyes. Madrid: Akal, 2011.

ROY, G. A busca do El Dourado. Revista de História, São Paulo, v. 49, n. 99, p.


45-60, set. 1974. https://goo.gl/HwfRvJ. Acesso em: 17 jun. 2018.

249
RUFFINELLI, Jorge. Después de la ruptura: La Ficción. In: PIZARRO, Ana.
(Org.). América Latina: Palabra, Literatura y Cultura. Santiago de Chile:
Ediciones Universidad Alberto Hurtado, 2013.

RUGENDAS, M. El rapto de la cautiva. 1845. In: CARRIL, B. del. Imágenes:


contexto histórico-cultural. Buenos Aires: Academia Nacional de Bellas Artes,
1966. https://bit.ly/2xtQs8b. Acesso em: 20 set. 2018.

SAER, Juan José. El concepto de ficción. 4. ed. Buenos Aires: Seix Barral, 2014.
(Los Tres Mundos).

SAGUIER, R. B. Encontro de Culturas. In: FERNÁNDEZ MORENO, C. (Coord.).


UNESCO.

SANTOS, Lara Taline dos. História da América: das independências à


globalização. [livro eletrônico]. Curitiba: InterSaberes, 2018. Disponível na
Plataforma Gioconda.

SARDIÑAS, José Miguel. El pensamiento teórico hispanoamericano sobre


literatura fantástica. Un recuento (1940-2005). La Habana: Editorial Arte y
Literatura, 2007.

SARDUY, S. Barroco. Buenos Aires: Sudamericana, 1974.

SARMIENTO, D. F. Facundo. Argentina: El Aleph. 1999. http://www.hacer.org/


pdf/Facundo.pdf. Acesso em: 4 abr. 2019.

SHIGUNOV NETO, A.; MACIEL, L. S. B. O ensino jesuítico no período colonial


brasileiro: algumas discussões. Educ. rev., Curitiba, n. 31, p. 169-189, 2008.
http://www.scielo.br/pdf/er/n31/n31a11. Acesso em: 17 jun. 2018.

SIGÜENZA Y GÓNGORA, C. de. Teatro de virtudes políticas que constituyen


a un príncipe: advertidas en los monarcas antiguos del Mexicano Imperio, con
cuyas efigies se hermoseó el Arco triunfal que la ... Ciudad de México erigió
para ... recibimiento del ... Virrey Conde de Paredes, Marqués de La Laguna ... /
ideolo entonces y ahora lo describe D. Carlos de Sigüenza y Góngora. Alicante:
Biblioteca Virtual Miguel de Cervantes, 2005. https://bit.ly/2Bg16QM. Acesso
em: 10 jun. 2018.

SILVA-SANTISTEBAN, Ricardo. Ollanta: Drama Quichua en Tres Actos y


en Verso, en traducción de Constantino Carrasco (1876). Alicante: Cervantes
virtual, 2012. https://bit.ly/2JWIyg8. Acesso em: 1 abr. 2019.

SILVA, K. V.; SILVA, M. H. Dicionário de conceitos históricos. 2. ed. São Paulo:


Contexto, 2009.

250
SOUSA PINTO, Paulo. Os dias de História: assinatura do tratado de
Tordesilhas. Em: Blog RTP – Rádio e Televisão de Portugal. Portugal, Antena
2, 2017. https://bit.ly/2BVuayy. Acesso em: 1 abr. 2019.

SUCRE, Guillermo. La Máscara, La Transparencia: Ensayos sobre la poesía


Hispanoamericana. México, D.F.: Fondo de Cultura Económica (Tierra Firme),
1985. https://bit.ly/2rgYIol. Acesso em: 1º dez. 2018.

TERÁN, O. Para leer el Facundo: civilización y barbarie: cultura de fricción.


Buenos Aires: Capital intelectual, 2007.

TINIANOV, Iuri. El problema de la lengua poética. Traducción de Ana Luisa


Poljak. Buenos Aires: Siglo Veintiuno Argentina editores S.A., 1972.

TODOROV, T. A Conquista da América. A Questão do Outro. 2. ed. Tradução


de Beatriz Perrone Moi. São Paulo: Martins Fontes, 1993.

TODOROV, T. La conquista de América. El problema del otro. S/L: Editora


Digital Sergio, 1992.

TODOROV, T. El cruce entre culturas. In: Criterios, La Habana, n. 25-28, jan./


dez. 1990. p. 3-19.

UNICEF – Atlas Sociolinguístico de Pueblos Indígenas de América Latina.


Cochabamba: UNICEF, 2011. https://uni.cf/2zXUZTv. Acesso em: 1 abr. 2019.

VALDÉS-CRUZ, R. La visión del negro en Sor Juana. XVII Congreso del


Instituto Internacional de Literatura Iberoamericana: II El barroco en América.
Madrid: Centro Iberoamericano de Cooperación, 1978, p. 207-215.

VALLEJO, César. Obra poética completa. Edición, Prólogo y Cronología de


Enrique Ballon Aguirre. Caracas: Biblioteca Ayacucho, 1979. https://repositorio.
ufsc.br/handle/123456789/178892. Acesso em: 15 dez. 2018.

VALLÉS, A. S. (Org., edición, introducción, estudio liminar y notas). Sor Filotea


y sor Juana. Primera edición. Secretaría de Educación del Gobierno del Estado
de México. 2014.

VARGAS LLOSA, Mario. Los jefes. Los cachorros. Madrid: Santillana Ediciones
Generales, 2008.

VEGA, A. Experiencias De Cordillera. Ecos De Frío: Relatos Cruzados Entre


Chile Y Quito En El Siglo Xvi. Rev. chil. lit., Santiago, n. 80, p. 223-242, nov.
2011. https://bit.ly/2PqbESH. Acesso em: 23 jun. 2018.

251
VEGA, G. de la. Comentarios reales. Primera parte de los Commentarios reales
que tratan del origen de los Yncas, Reyes que fueron del Peru ..., y de todo lo
que fue aquel Imperio y su Republica, antes que los españoles pasaran a el.
Madrid: Biblioteca Nacional de España, 1605. https://bit.ly/2RSsBab. Acesso em:
23 jun. 2018.

VELOSO, M. J. Martí: modernidade e utopia. Sociedade e Estado, Brasília, v.


26, n. 2, p. 133-153, maio/ago. 2011. http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_
arttext&pid=S0102-69922011000200008. Acesso em: 3 out. 2018.

ZANATTA, L. Historia de América Latina: de la Colonia al siglo XXI. 1. ed.


Trad. Alfredo Grieco y Bavio y Guillermo David. Buenos Aires: Siglo Veintiuno
Editores, 2012.

252

Você também pode gostar