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TERAPEUTA DE SI E ENTÃO DE MAIS ALGUÉM

AGRADECIMENTOS

Agradeço as porções de mim, que vêm retornando


uma a uma para o espaço amplo e gentil que tenho me
tornado, que me apoiaram e continuam a me apoiar
em minha jornada, em especial nos momentos quando
não pude ser maior que os eventos que me sucediam.
Agradeço em especial à pequenina que mora aqui
dentro e que não me deixou esquecer meu grande
sonho...
Agradeço cada passo da jornada que me trouxe até
aqui, a cada mestre, cada aprendizado, cada
conhecimento e experiências vividas tão intensamente
ao longo da vida.
Agradeço à minha família e ao meu companheiro de
vida, Ricardo, por todo amor experimentado, sendo o
amor minha grande escola.

Muito obrigada!
CLIQUE E ASSISTA A ABERTURA
TERAPEUTA DE SI E ENTÃO DE MAIS ALGUÉM

PREFÁCIO

O CURADOR FERIDO
Foi já em minha Pós-Graduação em Psicotraumatologia que um mito
calou mais fundo em mim... O mito do curador ferido, o centauro
Quíron...
Coincidentemente, o centauro é a imagem simbólica do meu signo
zodiacal, o símbolo metade bicho, metade homem.
Este lindo centauro, Quíron, falava mais a mim nessa perspectiva dual
de ter os pés bem fincados na terra em sua forma animal e sua flecha
sempre apontada para as estrelas, na constante busca de
compreender os mistérios dos céus...
Quíron sempre falou a mim em minha jornada. De fato, a jornada é
um ponto que sempre me chama e para o qual eu não canso de olhar.
Seja a jornada que fizemos há um certo tempo para chegar a este
mundo, atravessando o portal da vida, seja a jornada de encontrar o
próprio propósito e de se tornar FAIXA PRETA naquilo que você ama
fazer.
São muitas jornadas heroicas ao longo da vida; elas nunca cessam.
Algumas ocorrem de forma simultânea, outras duram toda a vida.
Muitas vezes somos faixa preta em uma área da vida, faixa branca em
outra e faixa azul em outra; enfim, independentemente da faixa, o que
é realmente importante é continuar no processo de seguir para o
próximo nível em você, em sua própria jornada de si mesmo.
Nessa minha Pós-Graduação, encontrei uma professora
completamente sábia em sua visão de desenvolvimento humano, em
especial em sua fala tão eloquente sobre a necessidade de
reencontrarmos o casamento mente e corpo há tanto tempo
separado por “divórcio litigioso” ... Uma terapeuta e professora
verdadeiramente faixa preta a caminho da maestria. Sua fala que mais
me chamou atenção foi:
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“A Psicologia ocidental historicamente se divorciou da Fisiologia;


este é um matrimônio que precisa ser reparado, para que
o fazer psicoterápico se apoie num saber integrado, que nos
permita acessar os múltiplos níveis de inteligência e mistério que
vivem dentro de nós.”
(Liana Netto)

Já fazia alguns anos que eu me dedicava às especializações que me


permitissem encontrar esses níveis de sabedoria em nós, os quais
estão além de nossa perspectiva cognitiva e que, de alguma forma,
me ajudassem a compreender nossas dores e nossos
comportamentos, emoções e sensações – que não se explicam de
maneira lógica e que não mudam apenas pela manifestação de nossa
vontade deliberada.

Corpo, coração e mente... Diversas faces de uma mesma integridade


que é ser UM SER HUMANO.
Desde o começo da vida, aprendemos pela experiência que não é nada
fácil integrar essas faces e, por isso, muitas vezes vivenciamos
verdadeiras guerras internas. Nosso “tatame mora dentro nós
mesmos”.
Quantas vezes quisemos fazer uma coisa que “SABEMOS
RACIONALMENTE” que é “certa”, seja comer mais saudável ou
abandonar um relacionamento tóxico, mas não conseguimos FAZER,
por mais que queiramos? Quantas vezes não nos cobramos e nos
“chicoteamos” por não termos a habilidade de conseguir fazer o que
é “melhor”? Quantas vezes quisemos mudar algo em nós, fosse um
comportamento ou emoção, e simplesmente não conseguimos? E,
para aumentar o desafio, escolhemos como carreira manejar esses
processos em outras pessoas.
Nós, que somos profissionais da área do desenvolvimento humano,
talvez tenhamos perseguido soluções para estes dilemas durante toda
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a vida, tanto por nossa própria história quanto pela busca de


compreender e apoiar nossos clientes.
Foi por meio da jornada de encontrar o caminho para essa conversa
sobre estas instâncias em mim que encontrei o caminho, e foi pela
perspectiva do relacionamento interior e do aprender a escutar esses
lugares em mim até então ignorados que encontrei o como aprender
a escutar meu próprio corpo!
Eu dediquei alguns anos estudando as abordagens de renegociação de
trauma por meio do contato com o corpo e não apenas na instância
cognitiva. Foi assim que encontrei muito do que vou compartilhar com
você neste e-book.
Em minhas aulas com Liana Netto, a professora à que me referi
anteriormente e coordenadora da pós-graduação que realizei, vi-me
mais uma vez apaixonada pelo tema trauma de desenvolvimento e
conversa com o corpo. Tantas aulas incríveis, tantas experiências
tocantes... Pedi autorização para gravar um bate-papo nosso, para
poder trazer um pouco dessa beleza que eu testemunhava em nossas
aulas... Em um dado momento de nossa conversa, eu perguntei:

– Como é que então você encontrou o tema trauma?


– Ou como é que o trauma me encontrou? – provocou
ela.
– Como é que o trauma te encontrou?
– Eu diria que não é a gente que escolhe ser terapeuta
de trauma... Muitos de nós só vamos saber que existe
terapia de trauma porque tivemos trauma. Então, eu
podia dizer até assim: como é que o trauma me
encontrou? Que é o que nos move com o impulso e
desejo para conhecer um pouco mais dessa ferramenta.
Eu vou contar um mito, posso?
– Claro!
TERAPEUTA DE SI E ENTÃO DE MAIS ALGUÉM

SUMÁRIO

O MITO DE QUÍRON .............................................................................7


UMA FORMAÇÃO QUE COMEÇOU BEM CEDO ..................................11
FOCALIZAÇÃO: UM NOVO RELACIONAMENTO COM O QUE É
SENTIDO .............................................................................................17
RELACIONAMENTO INTERIOR: A HISTÓRIA DE UMA JORNADA.........22
A CONVERSA MENTE E CORPO ..........................................................30
CONSIDERAÇÕES FINAIS: O SENTIDO DA FAIXA PRETA .....................44
O MITO DE QUÍRON

– Como é que então você encontrou o tema trauma?


– Ou como é que o trauma me encontrou? – provocou ela.
– Como é que o trauma te encontrou?
– Eu diria que não é a gente que escolhe ser terapeuta de
trauma... Muitos de nós só vamos saber que existe
terapia de trauma porque tivemos trauma. Então, eu
podia dizer até assim: como é que o trauma me
encontrou? Que é o que nos move com o impulso e desejo
para conhecer um pouco mais dessa ferramenta. Eu vou
contar um mito, posso?
– Claro!

Nesse momento de nossa conversa, meu coração deu alguns saltos,


pois imediatamente percebi que lá estava Quíron novamente,
acenando pra mim, novamente falando comigo, e tenho a sensação
de que falará com você que lê isso agora...
***
“Quíron era um centauro: metade bicho, metade homem. Ele era um
‘curadorzinho de beira de estrada’ e trabalhava com ervas. Não era
nenhum nome super conhecido. Enquanto centauro, ele era imortal.
Um dia, ele estava fazendo um veneno para colocar nas flechas de
Hércules e se feriu com este próprio veneno, e então ele ficou
condenado.
Um ser imortal que padeceria de uma ferida que doía imensamente,
para a qual ele não encontrava cura e que não tinha perspectiva de
finalizar, porque ele era imortal.

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Então, ele saiu pelo mundo, desesperado, buscando recursos para


curar essa ferida. Aí, foi à procura da experiência somática, foi
procurar coaching, Psicologia Analítica, EMDR, Psicanálise, todos os
recursos que ele podia colocar na caixinha de ferramentas para que
conseguisse um alívio do sofrimento. Duas coisas foram acontecendo
ao longo dessa jornada de Quíron. Primeira, ele foi criando uma caixa
de ferramentas com um vasto repertório de recursos; segunda, a
partir da dor que ele sentia, foi tendo a capacidade de se sintonizar
mais empaticamente com a dor que os outros sentiam. Isso fez com
que ele pudesse encontrar a medicina mais apurada que ele podia
oferecer para aquele paciente.
Dessa forma, ele se transformou em um grande curador. Ele é
conhecido como “O grande curador”, “O curador ferido”.
No Pantheon grego, na mitologia grega, esse é um mito grego. Ele se
transformou em um grande curador não a despeito da ferida
traumática, mas pela ferida traumática.
Então, uma das coisas que eu digo, que é muito importante: a gente
acaba ensinando aquilo que a gente precisa aprender...”
(Trecho da entrevista com Liana Netto)

CLIQUE AQUI PARA ASSISTIR A ENTREVISTA COMPLETA

***
Os mitos, os arquétipos e os símbolos falam conosco diretamente na
instância interna, na instância onde precisamos aprender a
compreender; falam por meio dessa forma que este lugar fala
conosco, se comunica conosco, se manifesta em nós.
Mantendo essa perspectiva simbólica, o “mito” que trago nesta
escrita é a reflexão sobre tornar-se faixa preta. O faixa preta em
definição é aquele que “aprendeu a aprender”. Engana-se quem acha
que um faixa preta já um mestre; longe disso: assim como o faixa preta
é o faixa branca que fez a jornada, a maestria vem em ser um faixa
preta que continua sua jornada, assim como Quíron.
Segundo Jonathan Maberry, um faixa preta de 1º grau é um “iniciante
avançado” ou aquele que aprendeu a aprender, como citei, e a

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transição da faixa branca até a preta deve ser mais voltada à


metodologia e aos procedimentos necessários para aprender a pensar
como um artista marcial.
Aqui temos mais uma metáfora que me chama a atenção: para mim,
isso que fazemos se trata de ARTE, trata-se de se tornar uma artista
daquilo que fazemos.
Hoje, minha vida é ensinar – e, se possível, com alguma arte. Foi minha
jornada como terapeuta que me tornou professora, sendo esse meu
grande sonho de menina, e foi essa pequenina que mora em mim
quem jamais me deixou esquecê-lo; você a conhecerá também nesta
nossa jornada.
Assim, na companhia de Quíron, convido você a
mergulhar comigo na jornada que este livro
propõe... Também convido a descobrir a jornada
simbólica que as artes marciais propõem.
O convite é à descoberta do Quíron que reside em
você e o caminho para sua faixa preta, para você
mesmo, então apoiando outras pessoas...
Você conhecerá algumas jornadas aqui. Todas
elas falarão com você. Apenas deixe Quíron te
guiar...

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UMA FORMAÇÃO QUE COMEÇOU BEM CEDO

“Toda sensação ruim é uma energia potencial no sentido de um modo mais ‘correto’
de viver se você lhe der espaço para buscar o que é ‘certo’”.
(Eugene Gendlin – criador da Focalização)

Foi com uma sensação indescritivelmente arrebatadora de ter


encontrado o tesouro que eu procurava há anos que encontrei a
Focalização do Relacionamento interior. Foi por meio da fala:

“No método da focalização, a gente não empurra nada para


fora. Teremos um relacionamento gentil com cada algo difícil no
corpo, com cada local difícil, com cada emoção, cada sensação
difícil do corpo, pois cada local do corpo que esteja tenso, que
esteja desconfortável, é parte de quem nós somos. Tudo dentro
de você é como sua família e, se a gente empurra para fora um
membro da nossa família, fica tudo triste.
Todos ficam tristes lá dentro...”

Essa foi uma das falas dentre as diversas que dali em diante me
marcariam. Ainda tenho esta anotação em meus materiais e, a partir
daquele meu primeiro curso com Ann Weiser Cornell, Professora
Internacional de Focalização (e hoje minha professora de formação),
ainda posso sentir seu impacto em mim.
Para chegar a este ponto da história e compartilhar mais dos tesouros
que encontrei, preciso voltar um pouco no tempo... Mais
precisamente, na primavera de 1981, quando nasci e, já muito cedo,
desde muito criança, tive uma verdadeira obsessão pelas questões
humanas.
Sempre me perguntei de onde viemos, para onde vamos, qual o
propósito da vida... Aliada a estas indagações constantes, existia em

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mim uma sensibilidade muito grande que, por anos da infância,


promovera grande sofrimento.
Devido a essa minha grande sensibilidade e por ter sentimentos que
outras crianças não tinham, como angústia, medo, previsões
catastróficas e indagações existenciais, cresci com um sentimento
bastante ruim em relação a mim mesma, chegando a ser classificada
como depressiva. Cresci com a sensação constante de que, com
certeza, havia “algo errado” comigo e que eu não era “normal”. Minha
sensação de não ser normal me trazia uma sensação de ser algo ruim
ou defeituoso. Assim eu, muito menina, sentia que precisava me
consertar...
Houve outros desafios em minha história inicial. Houve questões
ligadas a meu desenvolvimento, que não sinto necessidade de
compartilhar neste momento e, embora tenha sido bem difícil quando
criança carregar esses sentimentos e indagações e estes outros
desafios, foram esses mesmos sentimentos que me fizeram ir em
busca de respostas e soluções. Foi essa busca que me guiou durante a
vida, pois, para mim, se havia “algo errado” comigo, eu precisaria
consertar.
Os modelos de corrigir erros que recebi não foram, digamos assim,
muito gentis. Não havia muito espaço para não agir da maneira
considerada “certa”, e assim também foi uma forma como aprendi a
lidar comigo mesma.
Deste lugar minha jornada começou – muito cedo e muito antes
de eu imaginar que estava em uma jornada. Uma jornada em
busca da cura pra minha “ferida mortal” ou, nas possíveis
palavras da época, da correção “do que havia de errado
comigo”.
Meus passos nessa busca de “me consertar” ou de “me aceitar”
passaram por vários caminhos. Os primeiros foram pelas religiões;
depois, terapias, ressignificações, reprogramações mentais e, por fim,
pelo conhecimento, por meio de formações diversas na área de
desenvolvimento humano. Mais tarde, formações focadas do manejo
terapêutico de traumas. Foi a entrega pessoal completa em
compreender as questões humanas deste âmbito que me levaria a

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tornar-me terapeuta e então professora desta área. Mas antes disso


muitas águas rolaram.
Assim como Quíron, eu conheci muitas “medicinas”. Conheci e me
formei em vários métodos e abordagens; mergulhei profundamente
no aprendizado, e isso foi me tornando cada vez mais apurada neste
conhecimento. Porém, sem perceber, eu também passei a ficar ainda
mais severa comigo mesma. Mais e mais eu olhava para mim como
algo a ser consertado, devido à minha ferida inicial, e passei a usar
estes conhecimentos para olhar para mim como alguém a ser
realmente muito consertada, cheia de traumas, com crenças
limitantes, com questões “inconscientes a ressignificar”, com mais
medo de meus “padrões inconscientes” que eu acreditava me
sabotarem; enfim, eu me tornei uma verdadeira vigia de mim mesma,
tão severa com qualquer erro ou qualquer coisa que não estivesse
funcionando ou como deveria funcionar que não percebia os níveis
de estresse e tensão em que meu corpo vivia e não percebia o quão
identificada eu estava com partes em mim que tinham aprendido a
ser assim e interpretar meus aprendizados em leituras de mim mesma
dessa forma.
E, por falar em tensões no corpo, por falar em corpo: que corpo?
Eu não tinha qualquer relacionamento com a ideia de me relacionar
com meu corpo no sentido de prestar atenção no que era sentido. Eu
apenas buscava os porquês, eu buscava apenas mudar minha mente,
pensar e pensar em como mudar o que eu concluíra no passado. Eu
realmente estava empenhada em “me consertar”, em me mudar, se
possível me mudar de mim mesma – e na época eu falava curar...
Por outro lado, eu sempre carreguei em meu íntimo que devia haver
alguma forma de me sentir bem comigo mesma que não fosse por
meio desse caminho que tinha ficado bem apertado. Devia haver
alguma outra forma que não fosse mudar todas minhas “crenças
limitantes”, todos meus sentimentos difíceis, todos meus traumas
passados, tudo que estava me atrapalhando viver minha “melhor
versão” ...

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Eu comecei a ficar exausta. Eu, na verdade, havia estabelecido, sem


perceber, uma verdadeira guerra contra qualquer coisa em mim que
de alguma forma “estivesse me sabotando” ...
De alguma forma, Quíron protege e guia os peregrinos, sendo
peregrino aquele que está na jornada. O coração de um peregrino é
puro de intenção e, mesmo que ele esteja se perdendo, haverá uma
forma de encontrar o caminho, porque, na verdade, só se acha o que
estava perdido, e se perder faz parte do caminho de se achar.
Havia uma voz em mim que, em alguns momentos, sussurrava que eu
precisava voltar a sentir, que eu precisava voltar a me sentir bem
comigo mesma.
Eu, de alguma forma sentia, intuía e tinha a
necessidade de encontrar uma forma de sentir o
que era o melhor para mim, sentir e seguir meu
coração. Eu sentia saudade do meu coração. Eu de
fato queria sair da constante sensação de não
sentir de forma clara qual era meu próximo passo.
Enfim, foram diversas escolas, diversas formações
e um desejo sincero de encontrar o que eu estava
buscando e, relembrando estes eventos todos
hoje, posso afirmar: eu não sabia ao certo o que eu
estava procurando, porém havia uma instância em
mim que sabia.
Eu fui chegando cada vez mais perto dessa
abordagem que hoje sigo, baseada em aceitação e
relacionamento interior. Eu tenho muitos mestres e
escolas a agradecer; realmente me sinto abençoada
por ter encontrado esses diversos faixas pretas que
continuam sua jornada para a maestria, dentre eles,
Khalis Chacel e Tárika Lima, mestres de minha
formação em Renascimento – um caminho de
encontro comigo por meio da respiração e da
meditação que não somente mudou minha vida
mais também me acompanha até hoje.

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Eu me sinto abençoada por ter encontrado Dr. Stephen Paul Adler e


ter sido ele meu mestre não só em Hipnose Ericksoniana, mas também
ter me apresentado o tema TRAUMA e todo seu trabalho com isso. Foi
com ele e sua visão que encontrei uma paixão por este tema, que
nunca acaba. Também foi com ele minha primeira formação neste
tema (Resolução Neurobiológica do Trauma), e foi por ele que conheci
todas as outras escolas nas quais eu viria me formar: Somatic
Experiencing (Experiência Somática, em português, é uma abordagem
terapêutica psicobiológica poderosa para tratamento do trauma,
desenvolvida pelo Neurocientista Dr. Peter Levine); uma formação
denominada Tratando Feridas de Apego Precoce, com a especialista
americana Dra. Diane Poole Heller, quando me apaixonei pelo tema
trauma de desenvolvimento e algumas coisas começaram a ficar
claras para mim; também em Psicologia Pré e Perinatal, com Dr.
William Emerson, que me ensinou sobre minha jornada até o
nascimento; e então eu conheci a Focalização, por meio do Dr.
Stephen, quando tudo se encaixou e toda minha jornada começava a
chegar a um ponto que me dizia:

“Hora de encerrar a busca e iniciar uma nova jornada”


“Vamos mudar de faixa”

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FOCALIZAÇÃO: UM NOVO RELACIONAMENTO COM O QUE


É SENTIDO
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“Quem um dia irá dizer que existe razão nas coisas feitas pelo coração?
E quem irá dizer que não existe razão?”
(Renato Russo)

Parafraseando Renato Russo começo este capítulo. Reconhecendo e


honrando essa sabedoria interna que me guiou e me provocou a
continuar minha busca, reconheço também que foi essa mesma
sabedoria que me disse em alto e bom som: VOCÊ ENCONTROU!
No final daquele primeiro treinamento com Ann, percebi que essa
“voz” não vinha da minha cabeça: vinha de todo meu corpo e, mais
especificamente, do meu peito, do meu coração. Foi assim que
comecei minha jornada de entender a conversa mente–corpo ou
“razão e emoção...”, e hoje eu a chamo corpo, coração e mente.
Embora tudo esteja dentro de um mesmo corpo, que é a
integralidade, promover a comunicação entre as instâncias desse todo
é que nos dá a vivência de todo. Mas vamos compreender isso melhor
durante a jornada; no momento, estamos vendo a fase da vivência de
viver fragmentado.
Você já teve a sensação de viver guerras internas? De sentir que
dentro de você tem sempre algo te cobrando ou te criticando? Já
sentiu que, por mais que faça, há sempre uma sensação de que há
algo faltando? Eu não sei você, mas eu vivi isso por anos e inúmeras
vezes, e também testemunhei meus clientes fazendo o mesmo.
Ter que escolher um lado ou ter que reprimir, rejeitar e eliminar um
dos lados do que está sendo sentido é realmente difícil e muitas vezes
doloroso, porém, quando não temos outra forma de lidar com nossas
experiências internas, é o caminho possível. Então, eu também sei e
realmente acredito que fazemos o melhor que podemos diante do
que sabemos e sei que há mais para aprender. Ainda bem que não
fiquei apenas com o que eu sabia... Ufa!

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Por meio da Focalização, eu aprendi outra forma de me relacionar


com o que sinto e assim pude apoiar meus clientes a encontrarem esta
outra forma. Hoje meu trabalho é ensinar isso, e chegarei a isso
também daqui a pouco, porque quero compartilhar antes outra
jornada, de um faixa preta que virou mestre. Quero contar um pouco
da história da Focalização e de onde ela vem.
Eugene Gendlin, o homem que desenvolveu a Focalização, nasceu em
1926 e era um estudante de Filosofia na Universidade de Chicago na
década de 1950. Ele estava se debatendo com um problema de
Filosofia, e ninguém do departamento conseguia ajudá-lo.
A questão que ele refletia era: como pode ser que tenhamos uma
vivência, uma experiência, antes de termos palavras para essa
vivência, essa experiência? Todo mundo conhece isso, de ter uma
vivência e não ter as palavras para expressar completamente essa
vivência ou não ter as palavras apropriadas para expressar essa
experiência. Se a gente pensa e acredita que nossos pensamentos
causam nossa experiência – que primeiro vêm os pensamentos e,
depois, vem a experiência –, nós podemos dar uma segunda olhada
nisso e perceber que há experiências para as quais não há palavras,
não há pensamentos que vieram antes. Uma experiência conhecida é
quando você está ali tentando expressar uma vivência importante que
você teve para outra pessoa e a pessoa diz que não entendeu, e então
você tenta de novo, de outra forma, e volta para o significado daquilo
que você estava tentando explicar, até que você encontra outra
maneira de dizer isso.
Não importa o que sentimos ou pensamos; nós conseguimos
encontrar outra maneira de dizer isso. Isso é um exemplo da Filosofia
a partir do qual a Focalização se desenvolveu: há uma dimensão da
experiência, da vivência que é real, que tem seu sentido, e há também
a dimensão que é mais que as palavras, que está além, que está
implícita.
Então, o jovem Eugene estava se debatendo com essa questão
filosófica, de como é que podemos ter uma experiência, uma vivência
que não vem das palavras, que podemos não ter palavras para
expressá-la. Ele não estava encontrando ajuda, respostas no

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Departamento de Filosofia, e então ouviu que alguém da área de


Psicologia poderia ajudá-lo. Naquela época, na Universidade de
Chicago, havia nada mais, nada menos, que Carl Rogers ( preciso citar
que Rogers foi outro faixa preta que continuou a jornada até a
maestria?!).
No Departamento de Psicologia, sob a orientação de Carl Rogers,
havia grupos onde as pessoas estavam tendo vivências e encontrando
formas de colocá-las em palavras. Que sincronicidade perfeita, não
acha? Penso que os mestres ou aqueles que buscam a maestria se
atraem.
Eugene Gendlin entrou para o programa do Departamento de
Psicologia, embora ele tenha permanecido sempre como aluno de
Filosofia. Formou uma parceria com Carl Rogers, e desta parceria
surgiu a pesquisa que o levou à Focalização.
Essa pesquisa visava ao estudo da Psicoterapia bem-sucedida versus
Psicoterapia malsucedida e a compreender o que tornava o processo
psicoterapêutico bem-sucedido. O julgamento em relação a se aquela
Psicoterapia havia sido bem-sucedida ou não era determinado por
três fatores: (1) identificar se o terapeuta pensava que a terapia fora
bem-sucedida, (2) observar se o cliente pensava que a terapia havia
sido bem-sucedida e (3) mensurar, por meio de testes aplicados no
início da terapia e ao final, se houve mudanças.
Imagine este cenário: digamos que tenhamos as sessões de terapia
bem-sucedidas de um lado e, do outro, as malsucedidas, e nós
estejamos tentando encontrar o fator determinado. Na época, essas
sessões foram gravadas em áudios e não, em vídeo; então, os
pesquisadores buscavam escutar indícios de quais seriam os
diferenciais entres esses dois grupos de terapia.
Primeiramente, escutaram o que o terapeuta vinha fazendo: será que
a gente consegue ouvir uma diferença entre o que os terapeutas
fazem em uma sessão que é bem-sucedida versus o que o terapeuta
faz em uma sessão malsucedida?
Foi uma completa surpresa quando os pesquisadores descobriram
que não estava ali a diferença. De acordo com todas as medidas que

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eles estavam usando para mensurar, os terapeutas estavam sendo


igualmente empáticos e sábios, dando suporte tanto quanto eles
conseguiam perceber; então, os pesquisadores voltaram sua atenção
para os clientes.
Como era esperado que ao final do processo terapêutico os clientes
da terapia bem-sucedida fossem diferentes dos clientes da terapia
malsucedida, os pesquisadores não foram ouvir as sessões ou o final
da terapia: eles decidiram escutar a primeira ou segunda sessão
apenas. Era a primeira ou segunda sessão de alguém cujas sessões
mais tarde seriam bem-sucedidas comparadas à primeira ou segunda
sessão de alguém cuja terapia ao final se mostraria malsucedida.
Foram milhares de sessões ouvidas, foram anos de pesquisa.
O que foi descoberto é que havia uma diferença, uma diferença da
qual os próprios clientes não tinham consciência, mas os
pesquisadores conseguiram ouvir, e de fato era uma diferença muito
peculiar.
Foi identificado, nas primeira e segunda sessões, com aqueles clientes
que mais tarde seriam bem-sucedidos, que havia alguns momentos
quando eles ficavam desarticulados. A pessoa parava de falar tão
rapidamente e começava a ficar “caçando” palavras, buscando
palavras que descreveriam sua vivência naquele exato momento. Na
gravação, você ouviria algo como “Eu não sei como dizer isso” ou “Está
bem aqui”, e dá para identificar, mesmo que haja apenas o áudio de
quando a pessoa fala "Está bem aqui”, um tipo de gesto apontando
para o corpo ou mesmo dizendo “Em minha garganta, em meu
estômago, em meu peito”.
Essas características da vivência no exato momento, a dificuldade de
colocar as palavras, um tipo de procura (“Eu não sei como dizer isso”),
um tipo de interrupção no fluxo de histórias e pensamentos e essa
referência ao corpo foram identificados na primeira ou segunda
sessão dos clientes que estavam no grupo das pessoas com terapia
bem-sucedida.
Os clientes que faziam isso espontaneamente, sem que fossem
convidados pelo terapeuta, seriam aqueles bem-sucedidos na terapia,

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em contraste àqueles que terminaram não tendo uma terapia bem-


sucedida.
Quando as pesquisas mostraram que os clientes de terapia bem-
sucedida tinham essa forma de se relacionar com a questão que
trouxeram para seu processo terapêutico, que a diferença era a
presença desta habilidade, Eugene Gendlin decidiu que ele deveria ser
capaz de ensinar a aprender essa habilidade de forma que todos os
clientes pudessem ter uma psicoterapia bem-sucedida.
Se concordarmos com a definição que o faixa preta é aquele que
aprendeu a aprender, temos algumas pistas aqui nesta jornada. Assim
nasceu a Focalização. Eugene chamou essa habilidade de entrar em
contato com a vivência da qual ainda não se tem muita clareza de
Focalização. Embora a pesquisa esteja na área de Psicoterapia, esse
processo de Focalização tem sido aplicado em diversas áreas, como
criatividade, educação, negócios... Minha paixão é a aplicação para
crescimento pessoal, desenvolvimento de um novo relacionamento
consigo mesmo baseado em compaixão e gentileza,
autoconhecimento sem precedentes e para uma nova forma de atuar
como terapeuta e professora.
A maneira como conto essa história é retirada de uma das aulas com
Ann em meus cursos iniciais de Focalização. Foi a forma mais pura e
mais tocante como conheci esta jornada e esta história. Ela é contada
com mais ou menos riquezas de detalhes devido ao tamanho impacto
que as pesquisas de Eugene tiveram. Ele foi premiado 5 vezes pela
Associação Americana de Psicologia (APA) por seu método de
desenvolvimento da Psicoterapia Experimental. Eugene realmente
permaneceu e permanece na jornada e, mesmo tendo falecido em
2017, aos 91 anos, sua jornada continua viva a cada novo focalizador.

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RELACIONAMENTO INTERIOR: A HISTÓRIA DE UMA


JORNADA

“Gosto de pessoas ‘sentipensantes’, que não separam a razão do coração.


Que sentem e pensam ao mesmo tempo.
Sem divorciar a cabeça do corpo, nem a emoção da razão”
(Eduardo Galeano)

Ann Weiser Cornell estava recebendo seu doutorado em Linguística


pela Universidade de Chicago quando conheceu e estudou com
Eugene Gendlin, em 1972. Aprender Focalização com ele a levou para
um processo longo, uma vida de descobertas e desenvolvimento
pessoal.
Em 1980, Eugene Gendlin
convidou Ann para ajudar nas
oficinas de Focalização. Isso a
iniciou em um caminho para se
tornar uma professora de
Focalização e, em 1990, Ann
tornou-se a primeira pessoa a
viver em tempo integral como
professora de Focalização.
Esses dois parágrafos são a apresentação que Ann faz em seus
materiais, e eu posso garantir a você que estas linhas refletem apenas
um pouco do muito que você conhecerá dessa faixa preta que está na
jornada da maestria, embora apenas ela possa saber onde é sua
maestria. Para mim, Ann é uma grande mestra e é uma honra ser sua
aluna.
Hoje, Ann é reconhecida internacionalmente como uma das principais
inovadoras e teóricas da Focalização. Ela já ensinou a Focalização em
mais de 20 países. Eu a conheci quando veio ao Brasil, em 2014. Seus
livros e manuais de Focalização foram traduzidos para outras 11
línguas; dentre eles, um best-seller, mas infelizmente não há tradução
para o português.

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TERAPEUTA DE SI E ENTÃO DE MAIS ALGUÉM Cecília Lauriano

Estima-se hoje que haja mais de 1 milhão de praticantes da


Focalização no mundo, sendo uma comunidade crescente e atuante,
porém ainda pouco conhecida aqui.
Eu amo contar a história de Ann. Ela, para mim, conforme citei há
pouco, tem sido uma mestra e também uma amiga e uma inspiração.
Me identifico com diversos pontos de sua jornada, em especial com a
dificuldade de sintonizar e perceber no corpo e por termos ambas tido
e crescido com pais alcoólatras. Obviamente que para cada uma de
nós isso teve impactos singulares e representa um ponto relevante de
nossas feridas “quirônicas”, mas deixo destacado que tanto eu quanto
ela falamos disso publicamente, não sendo uma exposição de
conteúdos privados.
Por meio da dificuldade de sentir o corpo, Ann desenvolveu um
desdobramento da Focalização que recebeu o nome de Focalização
do Relacionamento Interior. Sua premissa fundamental é a aceitação
radical de tudo, uma atitude que propicia o que eu chamo de Alquimia
da Mudança: a integração corpo, coração e mente.
Aprender a Focalização do Relacionamento Interior é aprender
o idioma do mundo interno ou aprender o idioma que o corpo
fala: é aprender a aprender! E lembrando que aquele que
aprende a aprender se torna um _____________?
Eu quero contar isso em detalhes agora. Quero compartilhar os
eventos que levaram à criação deste método tão poderoso e ao
mesmo tempo tão tocante.
Reforço novamente que o que vou compartilhar é público, é
compartilhado pela própria Ann em seus materiais, aulas e site. Muito
do que está aqui é uma tradução livre de suas falas, com o objetivo de
transmitir a essência de sua comunicação, de sua jornada e de sua
peregrinação. Então, vamos à história...
Ann havia vivido um rompimento de relacionamento. Nesta época,
tinha por volta de 22 anos. Ela sentiu “não ter participado da decisão”
mediante a perceber atos e situações, que vivenciara em decorrência
deste rompimento, em seu comportamento. Nesta experiência, ela
fez uma resolução para si, uma resolução que seria capaz de ter mais

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TERAPEUTA DE SI E ENTÃO DE MAIS ALGUÉM Cecília Lauriano

consciência do que atuava nela e seus comportamentos: queria


conhecer com mais clareza SEU QUERER, queria saber o que decidia
dentro dela.
Poucos meses depois de fazer essa resolução, ela ouviu falar sobre
uma pessoa que ensinava algo chamado Focalização em seu bairro
universitário. Seus amigos lhe disseram que a Focalização era uma
maneira de ouvir a si mesmo e descobrir o que você realmente quer,
por estar mais consciente de algo que seu corpo sente. Para mim,
Cecília, um evento típico de sincronicidade perfeita.
É interessante observar que Ann compartilha não saber o porquê de
isso ter lhe chamado atenção. Talvez ela tivesse um pressentimento
ou aquela voz interior talvez soubesse, e este saber de certa forma a
tenha guiado. Ela, de alguma forma, sentiu que seu saber, o saber o
que quer que seja, seria encontrado em algum lugar ao sul de seu
pescoço e, mesmo que normalmente, como estudante de doutorado,
sua tendência fosse a ser orientada para a cabeça, seu corpo seria o
último lugar onde ela teria pensado em procurar informações.
Aprender Focalização não foi fácil para ela. Ann diz que
estava tão longe da consciência de seu próprio corpo que mal sabia
que tinha um corpo, quiçá seus próprios sentimentos e necessidades.
Ann diz: “Eu poderia simplesmente pegar emprestado os sentimentos
e necessidades da pessoa sentada ao meu lado, porque não tinha ideia
dos que eram meus.”
A triste verdade é que Ann diz ter crescido muito melhor para
sintonizar os sentimentos, necessidades e emoções de outras pessoas
do que as próprias... Esse é outro dos pontos com o qual me identifico
em sua história e que vejo frequentemente nos terapeutas que
atendo ou que são meus alunos.
Quíron andou por aqui também ;)
O que ajudou Ann a compreender e vivenciar a Focalização foi estar
em Parcerias de Focalização, uma prática desta comunidade.
Eu quero fazer uma pausa aqui para destacar este diferencial da
Focalização em relação a qualquer outra técnica que eu conheça.
Eugene Gendlin criou a comunidade de Focalização, onde você, ao

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TERAPEUTA DE SI E ENTÃO DE MAIS ALGUÉM Cecília Lauriano

aprender a técnica por meio de um curso com um professor


certificado, pode fazer parte de um grupo para encontrar parceiros de
trocas, de parceria, ou seja, você encontra pessoas, marca com a
pessoa e acompanha a pessoa Focalizando; depois, você é
acompanhado, SEM CUSTO!
A parceria de Focalização, esta comunidade, é um dos maiores
presentes que encontrei. É um dos tesouros que citei: ter alguém com
quem contar e compartilhar, uma parceria para olhar para seu mundo
interno, uma comunidade a pertencer. Não tem preço e é um de meus
recursos essenciais para ser terapeuta e professora, afinal, como
profissional desta área, os cuidados consigo mesmo são premissas
fundamentais, e vamos aprofundar este item mais à frente.
Voltando à história, Ann se encontrava toda semana com outra pessoa
do grupo para fazer as trocas na parceria: durante meia hora, era sua
vez de fazer a Focalização e, por meia hora, era a vez da outra pessoa.
Quando ela finalmente conseguiu aprender a Focalizar, foi uma
mudança de vida, um salva-vidas, “como um milagre”, nas palavras de
Ann. Ela diz ter se recuperado novamente – foi exatamente assim que
se sentiu – e então Ann se perguntou se havia uma maneira para que
outras pessoas não tivessem dificuldade de aprender focalizar como
foi para ela. Mal sabia ela na época que isso se tornaria o trabalho de
sua vida e o que criaria a partir daí!
O grande sonho de Ann era escrever um livro, um livro que realmente
ajudasse as pessoas, e o problema é que Ann tinha bloqueio de
escritor. Ela simplesmente não conseguia escrever.
Por esta altura (início dos anos 1990), ela esteve focalizando por mais
de 20 anos. A focalização lhe guiara por inúmeras decisões
importantes e também a ajudara a sentir um senso mais forte de si
mesma. Ela teve parceiros da Focalização e trocava sessões de
Focalização com eles toda semana. Porém, a Focalização parecia não
estar ajudando com o bloqueio de escritor.
Ela também tentou outras coisas: quase todo livro de autoajuda ou
técnica da nova era de que tivesse ouvido falar, fosse por um amigo
ou na TV. Nada ajudou.

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Ann sentia-se desencorajada, autocrítica e atormentada por um


desejo não realizado de dar ao mundo o livro que ela sabia que estava
dentro dela.

“Toda sensação ruim é uma energia potencial no sentido (direção) de um modo mais ‘correto’ de viver, se
você lhe der espaço para buscar o que é ‘certo’.”
(Eugene Gendlin – criador da Focalização)

Com um desejo como esse, Ann simplesmente não conseguia


desistir. Então, decidiu dar mais uma chance para focalizar com o
bloqueio do escritor. Só que, desta vez – quem sabe por que – ela
tomou uma abordagem diferente. Em vez de apenas convidar a
sensação corporal do problema (a técnica da Focalização consiste em
entrar em contato com a percepção sentida da questão e convidar a
sensação corporal; é uma técnica de muita precisão e não irei entrar
em detalhes dela neste momento), Ann decidiu convidar a parte dela
que não queria escrever. Ela se deu conta de que provavelmente havia
algo nela que não queria escrever. Ela teve esse “palpite”.
Essa sessão de Focalização foi diferente da habitual. A parte dela que
não queria escrever realmente apareceu, em um primeiro momento,
como uma sensação tensa no peito, que se transformou em uma
sensação de se abaixar, que por sua vez se metamorfoseou em uma
sensação de estar em um campo de tiro desviando das balas. Essa
parte de Ann sentia claramente que escrever era um convite para ser
alvejada, baleada, atingida! Ao perceber isso em sua sessão, Ann
ficou curiosa em relação a quem ou pelo que essa parte sentia que
poderia ser alvejada, atingida, e então percebeu a imagem de seu pai
surgindo; seu pai sarcástico veio à sua mente. Ann se deu conta de
que essa parte que não queria escrever realmente não queria que ela
fosse baleada, atingida pelo sarcasmo do pai (não importava que por
esta altura seu pai estivesse morto há cerca de cinco anos; este era o
pai de sua infância, ainda vivo e atacando dentro dela mesma). Ann
esperou, permanecendo em contato com o sentimento e a imagem,
esperando uma noção do que seria certo fazer a seguir.
Esse certo a que me refiro aqui – e que Eugene traz em sua frase:
“Toda sensação ruim é uma energia potencial no sentido (direção) de

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um modo mais ‘correto’ de viver, se você lhe der espaço para buscar
o que é ‘certo’ – se refere ao próximo passo de nosso organismo,
próximo passo da vida”. Eugene dizia: “Tudo que está vivo implica,
pressupõe um próximo passo”. Quando inspiramos, o “CERTO” é
expirar, ou seja, o próximo passo é expirar; quando comemos, o
próximo passo é a digestão – ou o “CERTO”. Nosso corpo sabe o
próximo passo certo, e é neste sentido que usamos a palavra “certo”,
e não no sentido moral de certo ou errado.
Retomando a história novamente, quando Ann então se deu conta de
que havia algo nela que sentia que escrever seria ser baleada pelo
sarcasmo e isso se relacionava com seu pai, ela manteve sua atenção
no que viria a seguir, no próximo passo a seguir. E o que veio foi: Deixe
saber que você a ouve. Deixe essa parte de você saber que você
realmente ouve. Ann deixou essa sua parte saber que ela (Ann) estava
ouvindo; deixou aquela parte dela saber que não era de se espantar
que ela (a parte) se sentisse assim; se era isso que ela sentia que
aconteceria, caso Ann escrevesse, não era de se espantar que ela não
a permitisse escrever.
Ao fazer isso, ao ouvir essa parte dela com empatia profunda, a
resposta dentro dela foi imediata. A tensão no peito foi liberada e ela
respirou aliviada. É como se essa parte dela estivesse dizendo: "Você
me ouviu!". E porque Ann ouviu, essa parte não precisava mais
segurar.
No dia seguinte, escrever foi mais fácil. Em 1996, seu primeiro livro,
The Power of Focusing (O poder da Focalização), foi publicado.
Tornou-se um best-seller, foi traduzido para seis idiomas, e Ann adora
ouvir as pessoas dizerem que o livro mudou suas vidas.
O que Ann aprendeu naquele dia foi o começo de uma nova fase de
sua jornada com a Focalização. Juntamente com sua amiga, Barbara
McGavin, criou esse desdobramento, que combina o processo de
Focalização com uma consciência de “partes” e como trabalhar com
elas a partir de um lugar de compaixão, que recebeu o nome de Self
In Presence. Assim, nasceu a Focalização do Relacionamento Interior,
que é tão eficaz e transformadora para todos os tipos de problemas
que Ann se sente profundamente feliz e realizada, sendo capaz de

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realmente ajudar as pessoas a realizarem suas próprias vidas! E pensar


que tudo começou com o término de um relacionamento, quando ela
percebeu que havia uma instância nela que sabia qual era seu próximo
passo, mesmo que ela, de alguma forma, ainda não soubesse.
Em outras palavras, tudo começou com uma jornada em direção ao
próximo passo, ao próximo nível, à próxima faixa, que simboliza o
próximo nível.
Ann aprendeu a ouvir e a conversar com essa instância. Ann me
ensinou e continua a me ensinar. Eu hoje ensino e continuo a
aprender. Estou aprendendo a aprender, e tudo começou em uma
jornada e continua sendo uma jornada, uma jornada de aprender em
si mesmo.

Continuando nossa jornada...

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A CONVERSA MENTE E CORPO

É impressionante o quanto podemos aprender por meio das histórias,


das jornadas, das vivências... Nestas histórias que estou
compartilhando com você, há alguns pontos que gostaria de destacar
para levar sua atenção para o saber que existe em nós, que sabe mais
que nós.
Talvez esta frase pareça estranha, soe sem sentido, porque ela nos
desafia a reconhecer que, sim: há diversas instâncias em nós que não
sabemos e que estas instâncias são muito maiores do que a instância
sabida, e eu não estou me referindo apenas aos aspectos
inconscientes e até mesmo a traumas passados: estou me referindo a
um saber em nós que nos impulsiona para uma direção de que muitas
vezes só vamos nos dar conta depois, ou
seja, depois de sabermos.
Tanto eu como Ann, Eugene e tantos outros
perseguimos determinadas perguntas,
determinados desejos, sonhos, buscas e
jornadas que acabaram por resultar em
encontrar aquilo que procurávamos sem
saber o que especificamente estávamos
procurando, mas reconhecemos assim que
encontramos.
Eugene queria encontrar essa instância onde
ainda não há palavras, mas uma vivência.
Encontrou a Focalização e mudou a vida de
milhões de pessoas. Ann queria encontrar
primeiramente seu querer e assim ter
melhores relacionamentos. Encontrou a
Focalização, depois queria ser escritora e,
por meio de seu bloqueio, encontrou a
Focalização do Relacionamento Interior, realizou seu sonho e vem

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transformando sua vida e a de milhões de pessoas com seus livros,


cursos e sabedoria adquirida em sua jornada. Ela aprende a aprender.
Quando eu era menina, desde novinha falava incessantemente que
queria ser professora. Sonhava com isso, me sentia ansiosa pelo dia
quando seria eu quem estaria à frente daquele quadro negro que eu
tanto amava. Quando cresci, me distanciei disso. Muitos desafios e
dificuldades financeiras me colocaram no mercado de trabalho já aos
14 anos. Nesta jornada pessoal e de trabalho, acabei trabalhando em
banco e me distanciando desse sonho, praticamente o sepultando
sem saber.
Os meus desconfortos aumentaram; minha inabilidade de lidar com o
que eu sentia também, e assim mergulhei na jornada de
desenvolvimento pessoal. Nela, encontrei a Terapeuta que sou hoje,
encontrei a terapeuta que vem cuidando de si mesma e que vem
apoiando o processo de muitas pessoas, e foi neste processo que eu
reencontrei meu sonho de menina. Foi assim que eu me reencontrei
com o ser professora, o ensinar, a pedagogia que sempre existiu em
mim e que eu já não ouvia mais, já não sentia mais, não trazia para o
mundo mais.
A Focalização vem me ensinando a ouvir o próximo; o próximo passo
me leva pra o próximo nível, e este passo reside em mim, nesta
instância implícita do meu corpo. É um caminho de desenvolvimento
destas habilidades que continua e continua.
Sabe? Como terapeutas, estamos acostumados a ouvir as dores, as
perdas, as feridas e os traumas e queremos ser capazes de lidar com
tudo isso para que a pessoa possa realizar seu potencial inerente, para
que se cure, para que se transforme; porém, além de tudo isso, nós
também podemos aprender a ouvir essa instância de saber em nós, a
qual pode nos guiar com muito mais assertividade e realização na vida,
e isso é na minha visão o Graal da Alquimia da transformação
pessoal.
A diferença que encontrei entre a Focalização do Relacionamento
Interior e meu trabalho e estudos em relação a trauma é que nós não
temos a intenção nem a ação de lutar, eliminar, expulsar, empurrar,
ressignificar e mudar nenhuma dessas coisas que citei no parágrafo

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anterior; ao contrário: nós temos a intenção de conhecer e de


desenvolver um relacionamento gentil, uma amizade com cada uma
dessas coisas e, ao fazermos isso, sem brigas, sem lutas, SEM
CONSERTOS, apenas com empatia profunda e aceitação amorosa de
cada uma dessas coisas. Estas mesmas questões, dores, emoções
difíceis e traumas e tudo mais que não aceitamos em nós é o que nos
conduzirá em direção aos locais onde porções preciosas de nós
ficaram esquecidas, no caminho, pontos de paradas onde o fluxo da
vida foi interrompido.
É no relacionamento por meio da conversa com nosso mundo interno,
aprendendo a falar esse idioma que você não aprende nas escolas de
idiomas, que você encontra a voz que te conduz e te leva a encontrar
os tesouros que residem em você.
Não se trata de consertar a si mesmo: trata-se de conhecer a si mesmo
nas instâncias que não puderam ser conhecidas por falta de espaço,
de compaixão e de habilidade para fazer isso.
Não adianta apenas saber o que nos aconteceu e provocou
determinadas crenças ou comportamentos em nós, mas, sim,
aprender a se aliar com tudo que mora em você e, no retorno à
integridade, seguir o próximo passo de vida que já reside aí em seu
próprio corpo.
É muito mais simples aprender a ouvir e amar do que procurar e
consertar, e isso é um aprendizado que propõe novos
paradigmas.
Quando Eugene descobriu em sua pesquisa essa instância de
percepção corporal a que ele deu o nome de Felt Sente (percepção
sentida, em uma tradução livre), ele descobriu o portal de sabedoria
residente em cada ser humano, e atravessar o portal é jornada
pessoal.
Como terapeutas, aprendemos inúmeras coisas para poder cuidar das
outras pessoas e talvez tenhamos esquecido que a pessoa que somos
é o instrumento que cuidará do outro; sem os cuidados necessários,
esta construção desafinará, e com o tempo não mais emitirá suas
lindas notas.

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Aprender este relacionamento comigo mesma me tornou terapeuta,


e me tornar terapeuta me levou à direção para a qual a flecha de
Quíron já apontava; nesta jornada, tornei-me professora, professora
da “medicina” que me curou e ainda me cura. Afinal, aquilo que
ensinamos é o que precisamos aprender e aprendemos mais do que
ensinamos.
Quando aprendemos a fazer isso em nós com facilidade, levamos o
ensinamento para nossas práticas terapêuticas; na minha visão,
avançamos de nível, mudamos de faixa e nossos clientes recebem a
oportunidade de aprender a aprender com eles mesmos também.
O significado psíquico do mito de Quíron continua a evoluir, já se
escreveu bastante a respeito dele. Geralmente é descrito como “O
Curador Ferido”, como vimos. Quíron é o princípio arquetípico com o
qual nós, terapeutas, temos nos identificado. Ele pode ser encarado
como um indicador da “ferida quirônica”, a “ferida psíquica” que
representa os problemas ou danos psicoemocionais não resolvidos,
provenientes de traumas na infância ou experiências posteriores,
questões que muitas vezes são acessíveis, mas frequentemente
reprimidas ou até dissociadas, mas que ainda vivem em nós. Porém,
muitas vezes a ferida psíquica é exatamente este dom oculto que age
como estímulo para a descoberta do si mesmo.

Carl Jung disse: “Seu sintoma não está aí para ser curado, ele
está aí para curar você”... Eugene disse que toda sensação ruim
é um indicativo da distância entre você e seu próximo passo
certo em direção à vida, e eu gostaria de dizer pra você, agora:
VÁ EM DIREÇÃO A QUALQUER COISA QUE DOA EM VOCÊ, NÃO
PARA CURÁ-LA OU MUDÁ-LA, MAS PARA DESCOBRIR O
TESOURO A VOCÊ RESERVADO.

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Aprender a aprender sobre a conversa mente e corpo é uma linda


arte, que pode ser como a arte marcial, e tenho certeza de que você
amará as histórias que seu corpo tem para lhe contar. Como qualquer
bom papo que você tenha com alguém, depende de ter um
relacionamento bacana, e assim é também com o que mora em seu
corpo; é por meio de suas sensações e emoções que você
desenvolverá este relacionamento e aprenderá esta conversa.
Ninguém poderá te transformar em faixa preta. Apenas você poderá
ir até lá, e para isso você precisará encontrar um mestre. A boa notícia
é que ele mora em seu interior.

A Focalização pode te levar até lá.

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“Não basta escutar o corpo: é preciso aprender como escutar o corpo para
que o corpo possa trazer esse governo de autorregulação, de transformação.
E eu digo que a atenção se torna o forno da nossa alquimia. Se você colocar
leite, manteiga, fermento e ovos, mexer e colocar no forno por cinco
minutos, o que vai acontecer? Vira uma pasta que é nada, certo? Mas, se
você colocar por 40 minutos, a alquimia se torna um bolo. Então, quando eu
presto atenção em alguma coisa, eu preciso dar tempo para que o corpo, de
alguma maneira, me revele com suas palavras, que não são palavras
linguísticas – são palavras procedurais, são sensações, são dores, aperto,
constrição, fluxo, rigidez. Então, ele nos conta o registro de nossas
experiências e, através disso, a atenção posta por tempo suficiente cria uma
alquimia – e é extraordinário. Não significa abrir mão da cognição: significa
usar a cognição em uma perspectiva diferente, e a cognição não é uma
força-diretriz. Ela é o vaso que ampara o fluxo da experiência, recepciona
matéria-prima da experiência. Depois da matéria-prima ter sido sentida,
elabora-se e burila a experiência para dar sentido, significado e
interpretações. Então, existe uma questão importante: qual a ordem das
coisas? Se, antes de eu sentir, eu me orientar para o que está acontecendo
no corpo, eu começo a burilar; eu estou fazendo uma elaboração sem ter
matéria-prima para isso. Primeiro eu sinto. Sentir me permite integrar e
receber de volta porções de mim. Aquilo que eu sinto me permite elaborar.
O que eu posso elaborar, eu também posso liberar. O que eu não posso
sentir, paradoxalmente, é o que mais vai se perpetuar, porque eu não
consigo integrar, e aquilo acaba criando formas de possessão.”

(Palavras de Liana Netto, expressadas por meio da entrevista)

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TERAPEUTA DE MIM E DE OUTRAS PESSOAS


CLIQUE E ASSISTA
Nossa tarefa de ser terapeuta, psicólogo, coach, assistente social,
profissional da área saúde ou de desenvolvimento humano é um
desafio grande, muito grande. É um desafio como dos guerreiros das
artes marciais. Em muitos momentos eu percebo que nem todos os
profissionais têm a dimensão do tamanho que é.
Sentar-se com a dor do outro implica se sentar com a própria dor...
Levar, conduzir e apoiar processos de autoconhecimento implica
nosso autoconhecimento e cuidar de pessoas implica cuidar da pessoa
que cuida: VOCÊ!
O tatame é a hora quando você executa sua técnica
aprendida e praticada. Maior ou menor habilidade
está diretamente ligada ao que você fez e faz antes de
entrar no tatame. Eu sempre digo isso e direi muitas
vezes, é de fato uma de minhas metáforas mais
precisas a respeito deste tema e também tem a ver
com arte.
Agora, a arte da música.
Um cantor que não cuida de sua voz com o tempo a
perderá; na verdade, ele gritará tanto por não
conhecer suas extensões e por não saber como
desenvolvê-la que irá machucar-se e, então, perderá
capacidades. Precisará descobrir a necessidade dos
exercícios vocais, do descanso e de muitos outros
manejos de suas cordas vocais que, se não os fizer,
além de jamais usar toda sua potencialidade, com o
tempo os machucados e maus-tratos constantes a
suas cordas o farão perder seu dom. Em outras
palavras, apenas voz bonita e afinação não são suficientes! Dom não
cobre a necessidade de desenvolvimento constante. Ter o “dom” para
cuidar de pessoas não é o suficiente para alcançar uma performance
que toque os corações como fazem os grandes cantores!

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Embora o cantor cante para que o outro o ouça, é de suas cordas


vocais que o som sai. Embora você faça o manejo terapêutico do
processo de alguém, é da sua habilidade consigo mesmo que este
manejo, que esta habilidade, é mais ou menos afinada. E isso pode ser
mais e mais bonito com o tempo, com prática, treino e o processo
certo!
Andrea Bocceli, cantor e tenor italiano, indiscutivelmente um faixa
preta que continua na jornada, compartilha em sua biografia o quanto
teve de aprender isso e o quanto precisou descobrir suas capacidades
de alcance de notas agudas e sustentação de voz, embora sempre
fosse elogiado pela beleza e timbre dela. Foram muitas as avaliações
e os testes negativos por não ter uma técnica apurada e por ter um
baixo autoconhecimento de seu canto.
Eu entendi isso ao longo de meus anos de consultório e ao longo do
meu processo de me tornar professora nesta área, em especial ao me
tornar professora internacional de Focalização do Relacionamento
Interior. Aprendi que aprender o manejo do meu mundo interno,
aprender o relacionamento com as minhas emoções, com o que eu
sinto, era o caminho para a maestria – era e é o caminho da faixa preta
que eu busco.
Não se trata apenas de curar a si mesmo ou estar consciente de seus
padrões que podem ser desengatilhados em um atendimento: isso é
mais que pré-requisito para a boa execução de nosso trabalho – afinal,
nosso trabalho depende de nossa percepção, tanto para não interferir
no mundo do outro quanto para sabermos o que é nosso e o que é do
outro. Eu penso que isso deva ser claro para a maioria. Ao que me
refiro mais especificamente é que precisamos ter habilidade técnica e
processo diário para podermos cuidar de nós mesmos e assim
podermos estar em “boa forma” para a execução de nosso trabalho.
Da mesma forma que um atleta precisa treinar para conseguir jogar,
não adianta ter o talento do Messi se não fizer o treinamento diário
para estar com seus músculos disponíveis para a hora de correr atrás
da bola. Sem a bola, não conseguirá expor ao mundo sua habilidade;
em outras palavras, sem as condições físicas para correr, não poderá
executar sem dom.

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A musculatura de um terapeuta é psíquica; ele não consegue treinar


na academia. Ela é desenvolvida e se torna disponível para quando
entramos em campo, no tatame, no palco, se fizermos os treinos de
habilidades – e estes “treinos de habilidades” são feitos em relação a
nós mesmos.
Não se trata de fazer terapia todo dia: trata-se de como você lida com
o que você sente, com suas dores, com seus temores, com suas
angústias, anseios, sonhos, frustrações, como você se apoia, como se
consola, como se ouve e como se orienta.
Nosso trabalho é apoiar as pessoas a desenvolverem isso nelas
também. Elas também estão na jornada de uma melhor relação com
o que sentem em si mesmas. Sempre se trata do sentir. Por mais que
possa haver crenças limitantes, como a pessoa se sente devido às
crenças é que causa o desconforto que lhe faz procurar ajuda. Nós
precisamos aprender a conversar com o que é sentido primeiro em
nós, e então levar isso adiante.
Outro ponto importante a destacar. Nós, desta área, por sabermos
que precisamos de alguma congruência em relação a como somos e
como fazemos nosso trabalho com outras pessoas, possivelmente
temos a tendência de nos cobrarmos muito, seja para sermos bem-
sucedidos, seja para estarmos vivendo o tipo de transformação que
queremos proporcionar às outras pessoas.
Se ensinamos ou conduzimos processos de desenvolvimento pessoal,
acreditamos que devemos ter alcançado esse desenvolvimento, e isso
pode gerar uma cobrança interna massacrante. Podemos viver em
maus-tratos emocionais constantes até mesmo sem perceber, assim
como o cantor que está gritando com a linda voz e não imagina os
machucados que suas cordas vocais estão desenvolvendo.
Eu me sinto muito tocada quando vejo um terapeuta perdendo sua
linda voz ou sua resistência física. Fico muito tocada em ver que não
consegue correr, pois sua musculatura está tão cansada que não
consegue pegar a bola para mostrar ao mundo suas habilidades, seus
talentos e, mais que mostrar ao mundo, não pode ter o prazer de
conhecer seus dons e em especial vivê-los.

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Cuidar de quem cuida no sentido de ensinar essas habilidades que


aprendi em minha jornada – e, mais especificamente, ensinar a
Focalização do Relacionamento Interior para profissionais de
desenvolvimento humano – se tornou meu sonho à medida que fui
vivenciando isso em mim e vendo diante dos meus olhos a quantidade
de transformação que essas habilidades causam.
Como você deve ter notado ao longo de sua leitura, todo esse
conhecimento vem de fora do Brasil. Há uma comunidade muito
grande fora do Brasil e pequeníssima aqui. Eu decidi aprender inglês,
tamanhos o amor e a paixão com que me arrebatou essa técnica. Eu
me certifiquei como professora reconhecida pelo The Focusing
Resources e The Focusing Institute em uma formação toda em inglês,
que durou dois anos, além de em todos os outros cursos presenciais
que fiz no Brasil quando Ann esteve por aqui e na Argentina, quando
esteve lá. Foi uma dedicação intensa e um dos motivos (foram muitos
os motivos que me moveram a isso) foi poder trazer para o Brasil este
aprendizado, poder ensinar em português, dentro da nossa cultura,
com todas as percepções, dores e potenciais que temos.
Meu sonho atual, um deles, é não apenas ver terapeutas incluírem a
Focalização em suas técnicas e manejos terapêuticos (pois a
Focalização é como um motor-turbo para diversas abordagens e uma
potência em si mesma), mas incluírem a Focalização em suas vidas,
pois com ela será muito mais fácil entrar em campo, no palco ou no
tatame, para estar realmente preparado e cuidado; a maestria com o
tempo chegará.
Quero ver no Brasil uma comunidade de Focalizadores para que as
parcerias aconteçam, para que tenhamos com quem trocar, uma
comunidade a pertencer, onde se possa aprender a aprender, e que
em especial tenhamos ao alcance dos nossos ouvidos o processo de
ouvir o próprio corpo, o próprio coração, em uma amizade sincera
consigo mesmo, assim nos orientando a vida como grandes parceiros
de nós mesmos. Que tenhamos conosco os recursos para sermos
nossos próprios terapeutas e que tenhamos o grupo, a comunidade,
para nos apoiarmos quando isso não for possível. Acreditem:
precisamos do outro! As pesquisas já indicam que o vínculo é o
instrumento de melhor cuidado para com o Sistema Nervoso Humano,

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TERAPEUTA DE SI E ENTÃO DE MAIS ALGUÉM Cecília Lauriano

apresentando os melhores resultados no manejo terapêutico de


transtornos que envolvem depressão. O vínculo terapêutico com o
cliente é um instrumento de cura e, para sermos capazes de fazer isso,
precisaremos cuidar dos nossos padrões de vínculos por meio de
relações sadias, seguras e nutritivas. As parcerias de focalização
pressupõem esses requisitos.
Que possamos aprender a habilidade de não mais se perder de si para
estar com outro e que não mais nos fechemos em nós mesmos para
nos esconder do mundo. Que possamos aprender a estar em nós
mesmos e com o outro e estar com o outro e nos mantermos em nós.
Esses são os pressupostos do apego seguro.
Esse é meu sonho atual: ver cada vez mais terapeutas faixa preta da
própria jornada colocando suas lindas vozes no mundo, tocando os
corações sem perder a voz.
Eu comecei esta jornada na busca de encontrar a medicina mais
apurada para minha ferida da flecha envenenada que havia me ferido.
Conheci as mais diversas formas de promover cura e transformação,
porém, quem me cura de muitas formas, quem vem me curando (uma
vez que esse processo não termina, pois Quíron é imortal), é minha
própria ferida. Foi ela quem me guiou a cada passo da minha jornada.
Ela tem sido, minha mestra. Foi ela quem me disse “Você está mais
perto” ou “Você está mais longe”. Foi ela quem alertou: “Sim, é isso,
você encontrou!”. Foi ouvindo ela que descobri o amor que vivia lá
dentro, fui conhecendo naquela pequeninha que sonhava ser
professora e que um dia acreditou que era algo quebrado que eu
encontrei o que estou compartilhando com você, agora. Foi
aprendendo a ouvir meu corpo que minha mente serenou e vem
serenando. Foi com ela que aprendi a aprender, e, se você colocou
atenção neste ponto lá no início e em alguns outros pontos da jornada
deste livro, você reparou que aprender a aprender é o verdadeiro
significado de ser faixa preta.
Foi pelo encontro da minha porção mente – representada pelas
aspirações de Quíron que apontam para os céus – com minha porção
bicho – que representa o corpo – que venho experimentando a
possibilidade de ser integral como Quíron nos convida a ser.

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Volto a dizer: esse aprendizado nunca acaba, eu continuo minha


jornada. Diante de tanta beleza e transformação que pude vivenciar
em meu caminho, não há como não compartilhá-las com você, amigo
de jornada, que tem suas próprias feridas, para que possa aprender a
escutar aí dentro, tornando-se assim o grande curador que Quíron nos
inspira a ser – porém, agora sem a obrigação de ser, sem o peso de
ser, sem a necessidade de salvar alguém para se sentir aceito ou
amado, sem o peso de ser perfeito para então se permitir ser aceito
por você mesmo, sem chicotes, sem severidade, apenas com amor,
gentileza e amizade. Para mim, Quíron é o grande faixa preta que
virou mestre.
Meu desejo é levar informação e conhecimento que realmente
transforme seu relacionamento consigo mesmo(a) e,
consequentemente, transforme sua prática profissional, de forma
prazerosa e expansiva, permitindo o desenvolvimento de
potencialidades adormecidas.
Se você quer ir para seu próximo nível, sua próxima faixa até chegar à
faixa preta, que é apenas o primeiro passo para a jornada da maestria,
você precisará encontrar sempre o próximo passo, e agora você já
sabe onde encontrar e o método que ensina você a aprender a
aprender isso.
Relacionamento Interior é o caminho que eu aponto para essa
transformação profunda da forma como você enxerga a si
mesmo, trata a si mesmo, investe em si mesmo, cuida de si
mesmo e então cuida de outras pessoas.
Para mim, a Focalização é o método, o processo, a técnica, assim
como a arte marcial escolhida é o meio para seu praticante
alcançar a faixa preta de si mesmo.
Convido você a descobrir esta arte e esta ciência!
Aqui está quase terminada a jornada deste livro.
Desejo que você, mesmo que não tenha mais contato com nada
disso que escrevi aqui, aceite apenas um presente meu: que você se
lembre de ouvir aquela voz que rodeia você e que sabe o que sua

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mente ainda não sabe, pois ela geralmente se localiza ao sul do seu
pescoço...
De alguma forma, a gente se encontra lá,
neste lugar que você sabe!

Clique aqui e receba meus sinceros agradecimentos!

Que a vida te seja leve e que seu amor e relacionamento com você
cresçam e floresçam a cada dia.
Assim, você apoiará cada vez mais pessoas a viverem o mesmo!

Com amor,
Cecília Lauriano

PS: Caso você queria saber mais sobre mim, não deixe de visitar meu
site, me acompanhar nas redes sociais – onde procuro postar
frequentemente vídeos e textos que apoiem você e sua jornada.
https://www.youtube.com/cecilialauriano
MEU E-MAIL: atendimento@cecilialauriano.com.br
http://www.cecilialauriano.com.br/programadefocalizacao/

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CONSIDERAÇÕES FINAIS: O SENTIDO DA FAIXA PRETA

Imagino que o leitor (a) já tenha percebido minha intenção de trazer


a ideia simbólica da faixa preta como forma de compreender o
caminho para o próximo passo que te leva para o próximo nível. Não
tive a intenção – e não a tenho – de ser uma dominante de seu
significado para aqueles que efetivamente são lutadores e praticam
as artes marciais.
Apesar desta não ser a intenção, li e leio muito sobre este tema e
escolhi alguns trechos de um artigo de Ana Calazans sobre o sentido
da faixa preta que se encaixam perfeitamente em nossa jornada
vivenciada até aqui.
***
“Adotada apenas no século XIX como símbolo de maestria nas artes
marciais, a faixa preta possui um sentido muito mais complexo do
que suspeita o senso comum.
Alguns praticantes de artes marciais treinam por longos anos e
alcançam um excelente nível técnico. Seus cinturões ou faixas pretas
exibem as marcas que atestam o número de graus ou dan que
atingiram e, do ponto de vista físico, sua energia, potência e
agilidade impressionam. Para eles, no entanto, o treino e a técnica
vão significar sempre um meio para chegar a um determinado fim,
seja a aceitação social, a projeção de uma imagem de poder e
sucesso ou a melhoria da autoestima.
Esses praticantes por alguma razão não descobriram ao longo de sua
jornada uma joia escondida, que é ao mesmo tempo a “técnica” mais
difícil e a que traz maior realização: o entendimento de que a prática
da arte é um fim em si mesmo e seu grande ensinamento é uma
unidade dualista: a percepção de que somos simultaneamente uma
singularidade integrada de corpo, mente e espírito e parte de um
todo com o qual nos comunicamos. Esse ensinamento se torna
objetivo por via da busca contínua do conhecimento de si mesmo, do
autodesenvolvimento, que tem como consequência direta o serviço
ao mundo.

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Para muitos praticantes essa conversa pode soar como uma


bobagem mística vazia e banal, mas ela é a imensa raiz que sustenta
o tronco das artes marciais em seu berço, o Oriente. Embora a faixa
preta seja um símbolo tardio, adotado no século XIX e difundido por
Jigoro Kano, o sistematizador do judô, é a essa raiz que seu
significado remete.
Muitos textos sobre artes marcais registram que a cor preta da faixa
reflete a ideia da morte, da escuridão e do desconhecido. Os
samurais costumavam usar trajes pretos e o Bushido, seu código
moral, tem como eixo principal o destemor à morte. Mas alcançar tal
estado só é possível de maneira paradoxal, através do
adentramento, entrega na vida. A disciplina marcial, o
desenvolvimento da percepção da energia (chi, ou ki) e a meditação,
repetidas diligentemente por um praticante sério, permitem que ele
se torne cada vez mais desperto, atento ao instante e a todas as suas
possibilidades, mergulhado na vida.
No caminho dos guerreiros, o destemor à morte se tornava também
amor à vida, à sua riqueza e beleza escondidas que se mostram não
apenas no perfeito, mas também no imperfeito, no falho e no
inacabado – espelhos do homem.
Antes de qualquer coisa, o tatame traz para aqueles que o abordam
com coragem a humildade. A coragem aqui não é a bravura
beligerante que nos dispõe a atacar e a ser atacado; a batalha é
travada em nosso interior.
Lidar com a quebra de expectativas – a nossa e a dos outros –, com a
frustração e a aceitação de que somos imperfeitos e limitados é o
primeiro ensinamento. Depois vem outro mais desafiante: criar
intimidade com um estranho esquecido: nós mesmos! Muitas vezes
ao ser arremessada no tatame a “persona” cuidadosamente
construída do adulto firme e seguro dá lugar ao menino humilhado e
magoado derrubado pelos colegas no recreio.
Meus mestres costumam dizer que uma das maneiras mais rápidas
de conhecer o temperamento de um aluno, ou seus traços mais
marcantes no enfrentamento da vida, é observar como ele luta.

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A luta é a síntese da arte marcial. Todo o trabalho físico de


fortalecimento e condicionamento, de técnicas, formas com armas e
de mãos de um estilo e o treinamento da mente e da respiração
estão à serviço do combate. Um faixa preta que entendeu o
verdadeiro sentido de sua técnica vai cristalizando essa compreensão
ao longo de seus anos de treino. Para os orientais a prática é uma
forma de partilhar a natureza de buda (e do tao) penetrando em seu
fluxo, que nada mais é do que a percepção da conexão profunda
entre nós e a natureza. Mas essa conexão só se torna real se a
prática se tornar a própria vida.
Embora todos esses conceitos remetam à ideia de desenvolvimento
de um “poder” que pode ser notado ou sentido de maneira objetiva
ou intuitiva pelos outros – muitos se referem a ele como um
“carisma”, “presença”, “aura”, “autoridade” ou “energia” – o real
valor dele é algo privado e interior e está menos ligado a uma
projeção física do que ao desenvolvimento de traços de caráter como
a compaixão, a lealdade, a coragem e a generosidade; “não se trata
daquilo que fazemos questão de mostrar aos outros. É secreto”. Tem
a ver com autonomia, com agir segundo sua própria natureza e
espírito, ouvir lá dentro. A faixa preta tem valor não como uma
bengala externa que justifica quem a porta frente aos outros, mas
como um lembrete mental de que ela é o símbolo de um caminho que
só vai fazer sentido se continuar a ser trilhado.”

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