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Hablar con Dios, Francisco

Fernández-Carvajal
TEMPO COMUM. QUINTA SEMANA. TERÇA-FEIRA

38. O QUARTO MANDAMENTO

– Bênção de Deus para quem cumpre este mandamento. O


“dulcíssimo preceito”.

– Amor com obras. O que significa honrar os pais.

– O amor aos filhos. Alguns deveres dos pais.

I. NO EVANGELHO DA MISSA de hoje1, o Senhor declara o


verdadeiro alcance do quarto mandamento do Decálogo em face das
explicações errôneas da casuística dos escribas e fariseus. O próprio
Deus dissera por boca de Moisés: Honra teu pai e tua mãe, e quem
maldisser o seu pai ou a sua mãe será réu de morte.

O cumprimento deste mandamento é tão grato a Deus que Ele o


revestiu de muitas promessas de bênção: Quem honra seu pai expia
os seus pecados; e quando reza, será escutado. Quem honra sua
mãe é semelhante àquele que acumula um tesouro. Quem respeita
seu pai gozará de vida longa2. Esta promessa de uma vida longa
para quem ama e honra os seus pais repete-se constantemente.
Honra teu pai e tua mãe; assim prolongarás a vida na terra que o
Senhor, teu Deus, te dará3. E São Tomás, ao explicar esta passagem,
ensina que a vida é longa quando é plena, e esta plenitude não se
mede pelo tempo, mas pelas obras. Vive-se uma vida plena quando
está repleta de virtudes e de frutos; então vive-se muito, ainda que o
corpo morra jovem4.
Apesar da clareza com que o mandamento é exposto nestas e em
muitas outras passagens do Antigo Testamento, os doutores e os
sacerdotes do Templo haviam torcido o seu sentido e
cumprimento5. Ensinavam que, se alguém dizia ao seu pai ou à sua
mãe: Qualquer coisa que da minha parte possas receber ou
necessitar é “corban”, isto é, oferenda6, os pais já não podiam tomar
nada desses bens ainda que estivessem muito necessitados, pois
cometeriam um sacrilégio apropriando-se de algo que fora
declarado oferenda para o altar. Este costume era freqüentemente
um mero artifício legal para as pessoas continuarem a desfrutar dos
seus bens e sentirem-se desobrigadas do dever natural de ajudar os
pais necessitados7. O Senhor, Messias e Legislador, explica no seu
justo sentido o alcance do mandamento, desfazendo os profundos
erros que havia naquela época sobre o tema.

O quarto mandamento, que é também de direito natural, exige de


todos os homens, especialmente daqueles que querem ser bons
cristãos, a ajuda abnegada e cheia de carinho aos pais, sobretudo
quando estes entram na velhice ou passam necessidade8. Deus
nunca pede coisas contraditórias, e por isso sempre há mil maneiras
de viver o amor aos pais, mesmo que se tenham de cumprir primeiro
outras obrigações familiares, sociais ou religiosas. Abre-se aqui um
grande campo à responsabilidade, que os filhos devem examinar
com freqüência na sua oração pessoal.

Deus paga com a felicidade, já nesta vida, a quem cumpre com amor
esses deveres, ainda que vez por outra possam ser custosos. O
Bem-aventurado Josemaría Escrivá costumava chamar ao quarto
mandamento “dulcíssimo preceito do Decálogo”, porque é uma das
mais gratas obrigações que o Senhor nos deixou.

II. O CUMPRIMENTO AMOROSO do quarto mandamento tem as suas


raízes mais profundas no sentido da nossa filiação divina. Deus, de
quem deriva toda a paternidade no céu e na terra9, é o único que se
pode considerar Pai em toda a sua plenitude, e os nossos pais, ao
gerar-nos, participaram dessa paternidade divina que se estende a
toda a criação. Vemos neles um reflexo do Criador: ao amá-los e
honrá-los retamente, estamos honrando e amando neles o próprio
Deus como Pai.

Na quadra do Natal, contemplávamos a Sagrada Família – Jesus,


Maria e José – como modelo e protótipo de amor e espírito de
serviço para todas as famílias. Jesus deixou-nos o exemplo e a
doutrina que devemos seguir para cumprir o doce preceito do quarto
mandamento tal como Deus o quer.

Antes de mais nada, Jesus afirmou que o amor a Deus tem uns
direitos absolutos, e que a ele se devem subordinar todos os amores
humanos: Quem ama seu pai ou sua mãe mais do que a mim não é
digno de mim; e quem ama o seu filho ou a sua filha mais do que a
mim não é digno de mim10. Por isso, é contrário à vontade de Deus
– e portanto não é verdadeiro amor – o apegamento à própria família,
quando se converte em obstáculo para cumprir a vontade de Deus: E
Jesus disse-lhes: Deixa que os mortos enterrem os seus mortos; tu,
porém, vai e anuncia o reino de Deus11.

Jesus deixou-nos um exemplo cabal de entrega plena à vontade do


Pai celestial – Não sabíeis que devo ocupar-me das coisas de meu
Pai?12, dirá a Maria e a José quando o encontram em Jerusalém –,
mas, ao mesmo tempo, é o Modelo perfeito de como devemos
cumprir o quarto mandamento e do apreço que devemos ter pelos
vínculos familiares: viveu sujeito à autoridade de seus pais13 e
ajudou São José a sustentar o lar; realizou o seu primeiro milagre a
pedido de sua Mãe14; escolheu entre os seus parentes três dos seus
discípulos15; e, antes de morrer por nós na Cruz, confiou a São João
o cuidado de sua Mãe Santíssima16; sem contar os inúmeros
:
milagres que realizou movido pelas lágrimas ou pelas palavras de
uma mãe17 ou de um pai18. As orações dos pais pelos filhos
chegam a Deus com um acento muito particular.

São imensos os modos de honrar e de amar os pais. “Honramo-los


quando suplicamos submissamente a Deus que tudo lhes corra
prosperamente; que gozem da estima e consideração dos homens e
que sejam bem aceitos aos olhos de Deus e dos Santos que estão
no céu.

“Honramos igualmente os pais quando os socorremos, ministrando-


lhes o necessário para o seu sustento e para uma vida digna. Prova-
o a palavra de Cristo ao censurar a impiedade dos fariseus... Esse
dever é mais exigente sobretudo quando os pais ficam gravemente
doentes. Cumpre-nos então cuidar de que não omitam a Confissão e
os demais Sacramentos que todos os cristãos devem receber na
iminência da morte [...].

“Por último, quando morrem, honram-se os pais cuidando do


funeral, promovendo condignas exéquias, preparando-lhes uma
honrosa sepultura, garantindo os sufrágios e Missas de aniversário e
executando fielmente as suas declarações de última vontade”. Assim
se expressa em resumo o Catecismo Romano19.

Se, por infelicidade, os pais estão longe da fé, o Senhor dar-nos-á a


graça necessária para realizarmos com eles um apostolado cheio de
afeto e respeito, que consistirá, ordinariamente, em orar por eles, em
dar-lhes o apoio de uma conduta filial alegre, exemplar, cheia de
carinho, juntamente com o empenho em procurar ocasiões de
aproximá-los de pessoas que lhes possam falar de Deus com mais
autoridade do que nós, porque os filhos não podem arvorar-se por
iniciativa própria em mestres de seus pais.

III. O PRIMEIRO DEVER dos pais é amarem os filhos com um amor


:
verdadeiro: interno, generoso, ordenado, que não olha para as suas
qualidades físicas, intelectuais ou morais, e que sabe querer-lhes
com os seus defeitos. Devem amá-los. Devem amá-los por serem
seus filhos e também por serem filhos de Deus.

Por isso é um dever fundamental dos pais amarem e respeitarem a


vontade de Deus sobre os seus filhos, mais ainda quando estes
recebem uma vocação de entrega plena a Deus – muitas vezes, os
pais até a desejarão e pedirão a Deus para este ou aquele filho –,
porque “não é sacrifício entregar os filhos ao serviço de Deus; é
honra e alegria”20.

Este amor deve ser operativo, deve traduzir-se eficazmente em


obras. Manifestar-se-á no real esforço para que os filhos sejam
trabalhadores, austeros e sóbrios, bem educados no sentido pleno
da palavra... Que ganhem raízes neles essas bases do caráter que
são as virtudes humanas: a rijeza, a responsabilidade, a
generosidade, a lealdade, o amor à verdade, a simplicidade, o
otimismo...

O amor verdadeiro levará os pais a preocuparem-se pelo colégio em


que os filhos estudam, permanecendo muito atentos à qualidade do
ensino que recebem, e, particularmente, ao ensino religioso, pois
dele pode depender que sejam bons cristãos e, em última análise,
que se salvem. Movê-los-á a buscar um local adequado para a
época de férias e para os fins de semana – sacrificando não raras
vezes as suas preferências pessoais –, de modo a evitarem aqueles
ambientes que tornariam impossível, ou pelo menos muito difícil, a
prática de uma verdadeira vida cristã. Os pais não devem esquecer –
e devem expô-lo aos filhos no momento oportuno – que são
administradores de um enorme tesouro de Deus e que, por serem
cristãos, não são uma família como outra qualquer, antes formam
uma família em que Cristo está presente e que por isso tem umas
:
características inteiramente novas.

Esta viva realidade levará os pais a serem exemplares em todas as


ocasiões (nas conversas, à mesa, no modo de cumprirem os deveres
profissionais, pela sua sobriedade, pela ordem e asseio, pela
delicadeza de maneiras...). E os filhos encontrarão neles o caminho
que conduz a Deus. “No rosto de toda a mãe pode-se captar um
reflexo da doçura, da intuição, da generosidade de Maria. Honrando
a vossa mãe, honrareis também aquela que, sendo Mãe de Cristo, é
igualmente Mãe de cada um de nós”21.

Terminemos a nossa oração pondo as nossas famílias sob a


proteção da Santíssima Virgem e dos santos Anjos da Guarda.

(1) Mc 7, 1-13; (2) Ecle 3, 4-5, 7; (3) Ex 20, 12; (4) cfr. São Tomás,
Sobre o duplo preceito da caridade, Marietti, n. 1245; (5) cfr.
Sagrada Bíblia, Santos Evangelhos, págs. 299-300; (6) Mc 7, 11; (7)
cfr. B. Orchard e outros, Verbum Dei, Barcelona, 1963, vol. III; (8)
Conc. Vat. II, Const. Gaudium et spes, 48; (9) Ef 3, 15; (10) Mt 10, 37;
cfr. também Lc 9, 60; 14, 2; (11) Lc 9, 60; (12) Lc 2, 49; (13) Lc 2, 51;
(14) cfr. Jo 2, 1-11; (15) cfr. Mc 3, 17-18; (16) cfr. Jo 19, 26-27; (17)
cfr. Lc 7, 11-17; Mt 15, 18-26; (18) cfr. Mt 9, 18-26; 17, 14-20; (19)
Catecismo Romano, III, 5, 10-12; (20) Josemaría Escrivá, Sulco, n. 22;
(21) João Paulo II, Alocução, 10-I-1979.
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