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ESPECIALIZAÇÃO EM PSICOLOGIA TOMISTA - AULA 01

AULA 1

Perigo dos atalhos


Ignorância, fraqueza ou
malícia

Maria Clara Rodrigues de Sousa - mariaclara66@hotmail.com - CPF: 097.439.616-82


PERIGO DOS ATALHOS – IGNORÂNCIA, FRAQUEZA OU MALÍCIA

Considerando a imagem
do losango vertical do qual
falamos na aula introdutória,
vamos tratar aqui da linha
do meio.

A linha do meio representa


um atalho, não virtuoso, que
o terapeuta pode ser tentado
a tomar para alcançar seu
paciente, ignorando os
caminhos (transcendentes)
necessários para alcançar
verdadeiramente a pessoa
que busca sua ajuda.

Aqui é importante lembrar


que, apesar de Aristóteles
afirmar que a virtude está
no meio1 , nós devemos
considerar a virtude não
somente como meio termo,
mas como um meio termo
elevado.

1 Em Ética a Nicômaco, Aristóteles afirma que a virtude consiste em encontrar o meio termo entre dois extremos.

Maria Clara Rodrigues de Sousa - mariaclara66@hotmail.com - CPF: 097.439.616-82


PERIGO DOS ATALHOS – IGNORÂNCIA, FRAQUEZA OU MALÍCIA

Vamos considerar o que diz Echavarría2


“Assim como para Santo Tomás a soberba se levanta sobretudo contra a autoridade de
Deus, para Adler a forma mais extrema da vontade de poder é o afã de autodivinização: ‘A
ambição não conhece limites em seu crescimento, sendo interessante observar que, tanto
nos contos como na realidade, o aumento do afã de domínio e poder pode desembocar em
uma espécie de ideal de divindade. Não é preciso procurar muito para encontrar indivíduos
que se conduzem como se fossem Deus mesmo ou seus representantes, ou cujos desejos
e objetivos são tais que, se realizados, convertê-los-iam em deuses. Este fenômeno, o afã
de divindade, é o ponto extremo da pretensão de rebaixar os limites da personalidade. Em
nosso conceito, contemplar e compreender um indivíduo implica libertá-lo das aberrações
às quais o obriga seu estéril e exaltado afã de autodivinização, e, ademais, capacitá-lo à
convivência humana e ao sentimento de comunidade’. Adler vê no fundo dessa atitude a
tentativa de superar o sentimento de insegurança e inferioridade próprio, segundo ele, de
cada homem.”

Nesse sentido, podemos compreender que:

A busca por atalhos no processo terapêutico é um ato


de soberba que evidencia fraqueza e insegurança.
Esse ato soberbo pode se manifestar num pensamento do tipo: “eu não preciso
me ‘rebaixar’ fazendo tal curso para acessar meu paciente” ou ainda na fala
estufada “eu sou o psicólogo, salvo o mundo” de quem se contenta com o título
que alcança na faculdade e acredita que isso basta - autodivinização3.

Vejamos também o que diz Santo Tomás a esse respeito:


“Se a docilidade deve ser considerada parte da prudência. Por onde, no atinente à
prudência, sobretudo, o homem precisa ser ensinado por outrem; e principalmente,
pelos velhos, que alcançaram compreensão exata sobre os fins das ações. Por isso,
diz o Filósofo4: devemos atender, não menos que às demonstrações dos juízos e às
opiniões indemonstráveis dos experimentados, dos mais velhos e dos prudentes; pois,

2 ECHAVARRIA, Martin. A práxis da psicologia e seus níveis epistemológicos segundo Santo Tomás de Aquino. Rio de
Janeiro: Ed. CDB, 2021.p. 502
3 Conceito de Adler para o fenômeno brevemente descrito na citação de Echavarría.
4 Aristóteles é conhecido como “O filósofo”.

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PERIGO DOS ATALHOS – IGNORÂNCIA, FRAQUEZA OU MALÍCIA

por experiência, compreendem os princípios. Donde o dizer a Escritura5: Não te estribes


na tua prudência; e, noutro lugar: Acha-te na assembleia dos velhos sábios, isto é, dos
anciãos, e aceita de coração a sabedoria deles. Ora, é próprio da docilidade tornar-nos
prontos em receber o ensino. Por onde e convenientemente, a docilidade é considerada
parte da prudência. Sth, II, q49, a3

Concluímos então que,

Ao buscar atalhos somos soberbos e imprudentes!


O terapeuta que não estuda, não busca mestres nem meios de aperfeiçoamento
pessoal, incorre no grave e grande perigo de perder a docilidade necessária ao
processo de formação do terapeuta.

Precisamos ter uma reta intenção: ser bom! Não por vaidade ou soberba, mas
por desejo de ser virtuoso. Não para ter um consultório lotado e um IG numeroso
(para isso bastam umas poucas palavras-chave, um bom marqueteiro e um bom
designer), mas para ser bom para aqueles que buscam nosso atendimento.

Não podemos nos contentar com atendimentos pífios, intervenções ao acaso, altas
inseguras! Esses são exemplos de fraquezas que estão escondidas nos atalhos.
Examine-se!

Podemos até ter dificuldades em vencer nossas fraquezas, mas NÃO podemos
ignorá-las ou ser indiferentes a elas, pois são obstáculos no processo de
autoconhecimento.

Quem busca desenvolvimento pessoal e profissional precisa estar disposto a gastar:


tempo, dinheiro e energia. As primeiras são mais óbvias, mas atenção especial
para a última questão, pois quem não quer cansar-se, desgastar-se na busca pelo
aperfeiçoamento não traz em si o chamado, o dom de ser terapeuta como assinala
Zelmira Seligmann.

Não queira atalhos!

5 Provérbios 3,5

Maria Clara Rodrigues de Sousa - mariaclara66@hotmail.com - CPF: 097.439.616-82


PERIGO DOS ATALHOS – IGNORÂNCIA, FRAQUEZA OU MALÍCIA

1. Ignorância culpável
Atalhos decorrem de 2. Fraqueza
3. Malícia

1. Ignorância culpável – Diz respeito à exclusão ou negligência de algo que não


deveria ser excluído ou negligenciado.

Santo Tomas ajuda a compreender:


“A ignorância é uma privação da ciência que aperfeiçoa a razão e a razão, enquanto dirige
os atos humanos, é um impedimento ao ato de pecado.6 ” Sth, II, q76, a1

Nesse sentido, cabe uma pergunta que vale para a perspectiva pessoal e
profissional: o que você deveria conhecer e está negligenciando?

Uma vida ordenada não é uma vida de atalhos!

a sua responsabilidade
Não ignore: o seu amadurecimento
o seu aperfeiçoamento7

Remédio para a ignorância: buscar conhecimento, de modo dócil e humilde.


Sem atalhos!

6 Pecado no sentido de ato contrário à natureza racional do homem.


7 O aperfeiçoamento é a vocação primária do homem, nascemos para a perfeição.

Maria Clara Rodrigues de Sousa - mariaclara66@hotmail.com - CPF: 097.439.616-82


PERIGO DOS ATALHOS – IGNORÂNCIA, FRAQUEZA OU MALÍCIA

2. Fraqueza – Diz respeito a um domínio da vontade por uma paixão que leva à
uma escolha equivocada.

Santo Tomás ajuda a compreender:


“Conforme cada um encontra-se disposto na sua sensibilidade, este ou aquele fim lhe
parecerá conveniente”. Sth, II, q58, a5

Por exemplo, ao guloso comer todo um pote de sorvete após uma feijoada e uma
macarronada pode-lhe parecer conveniente.

Aqui precisamos entender o perigo da fraqueza de quem se impressiona com a


quantidade de seguidores, de likes ou de compartilhamentos. Mas, devemos estar
atentos não só às fraquezas psicológicas, mas também às fraquezas espirituais,
afetivas e físicas8.

Além disso, outro ponto fundamental se relaciona à emoção dominante9 sobre


a qual cabe também uma pergunta reflexiva: quais são as suas emoções
dominantes?

A Psicologia Tomista nos coloca frente a um


espelho para que possamos enxergar a nossa vida
e busquemos corrigi-la da melhor maneira possível,
dentro das possibilidades de cada um.
Aqui cabe uma reflexão de extrema necessidade, um convite que requer uma
adesão completa: você precisa mudar de vida!

Remédio para a fraqueza: reconhecer as próprias fraquezas e emoções


dominantes e buscar combatê-las com vistas ao aperfeiçoamento. Sem atalhos!

8 Atenção às fraquezas físicas de ordem nutricional e relacionadas ao tônus muscular.


9 Diz respeito à uma emoção que se impõe com determinada força que atrapalha o julgamento prático, que escraviza
a vontade para fazer determinado ato que só beneficia aquela emoção/paixão.

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PERIGO DOS ATALHOS – IGNORÂNCIA, FRAQUEZA OU MALÍCIA

3. Malícia ou maldade – Diz respeito a uma escolha má conscientemente


arquitetada. Na malícia há uma inclinação da vontade para o mal10.

A pergunta aqui é:
Quais são as maldades que você pensa?
Quais são as maldades que você fala?
Quais são as maldades que você pratica?

A Psicologia Tomista traz em si o processo de


reestruturação da personalidade11 inclinando-a para
a reta ordem.
Remédio para a malícia: – Lutar pelo bem considerando o que diz Santa Teresa:
é justo que muito custe o que muito vale12.

EM RESUMO:
Frente aos malefícios do atalho nós precisamos:

nos afastar da ignorância nos libertar da malícia

nos fortalecer para o combate das fraquezas

10 Apesar da vontade estar sempre ordenada em função de um bem, no homem desordenado a vontade percebe o
mal a partir de uma razão de bem, ou seja, algo mal é percebido pela vontade como bom.
11 Aqui não se trata de uma estruturação errada, mas de uma educação errada, uma formação errada.
12 Santa Teresa D´Ávila em sua obra O Castelo Interior afirma: “o que vale muito custa muito. Ainda mais quando é
para purificar a alma” p.169

Maria Clara Rodrigues de Sousa - mariaclara66@hotmail.com - CPF: 097.439.616-82


PERIGO DOS ATALHOS – IGNORÂNCIA, FRAQUEZA OU MALÍCIA

O atalho visa o gozo imediato e aquele que vive de gozo imediato perde aquilo
que é a grandeza da construção de uma vida. Isso vale para terapeutas e
pacientes!

Prática na clínica Tomista

Na psicoterapia é importante mostrar ao paciente a beleza da jornada, incluindo a


jornada na terapia – evoluções, construções.

Na dinâmica da ignorância, o terapeuta precisa ser o porta voz da ordem para o


paciente: apontar os goísmos e as injustiças.

A Psicoterapia Tomista é uma psicoterapia pedagógica que mostra o erro e


aconselha o caminho reto que o paciente é livre para aceitar ou não. Trata-se
de tirar o paciente da ignorância, oferecendo “esmola espiritual” com paciência,
mansidão, caridade e, especialmente, com prudência13.

Na dinâmica da fraqueza, o terapeuta precisa orientar o trabalho de


fortalecimento pessoal contra as emoções dominantes. Para um paciente que fala
demais, a proposta terapêutica será trabalhar o silêncio; para aquele que é calado
demais, a proposta será trabalhar a fala. Considerando, obviamente, a dinâmica
de cada caso.

Aqui cabe também aconselhar o fortalecimento físico/corporal: organizar a


alimentação, verificar a necessidade de suplementação e propor uma rotina de
exercício físico. Isso porque não se pode falar de fortalecimento emocional sem
fortalecimento físico.

Na dinâmica da malícia, o terapeuta precisa ajudar o paciente a contemplar a


bondade das pessoas que ele admira, propor a realização de atos bondosos.
Para combater a maldade voluntária, o terapeuta força uma bondade voluntária,
mesmo com a sensação de “falsidade” que poderá surgir inicialmente – uma vez
que a bondade não lhe é comum. Precisamos considerar que aquele que pensa
mal, sente mal e escolhe mal; mas aquele que começa a pensar corretamente,
passa a sentir corretamente e a escolher corretamente.

13 A prudência requer considerar o que falar, como falar e quando falar ao paciente sobre sua ignorância (que pode
estar em seus critérios de escolha, por exemplo).

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PERIGO DOS ATALHOS – IGNORÂNCIA, FRAQUEZA OU MALÍCIA

A Psicologia Tomista é um projeto de amor: amar


mais é ser mais saudável, amar (ordenadamente) é
conservar a sanidade mental.
Trata-se aqui de um processo, um compromisso consigo mesmo, pois quem
descuida da própria vida é imprudente.

Vamos lá! Estamos só começando, mas com a


disposição de enfrentar a nós mesmos, buscar a
sabedoria, a força e a bondade como princípio,
meio e fim de cada ação.

Meus amigos: esqueçam os atalhos!

Maria Clara Rodrigues de Sousa - mariaclara66@hotmail.com - CPF: 097.439.616-82

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