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Ayoub Hanna Ayoub

Caso City/Havan e o Direito à Cidade:


Imprensa, Poder Econômico e o Confronto Ideológico na Cidade de Londrina

PALAVRAS-CHAVE:
Direito à Cidade, Jornalismo, Manipulação, Classe Dominante.

Este trabalho pretende demonstrar que a Folha de Londrina, parte da chamada


Grande Imprensa, é utilizada para veicular de forma parcial a posição do empresariado
mesmo em situações de crise. A análise de algumas matérias sobre as irregularidades na
construção do empreendimento “City Shopping Londrina” pretende mostrar que a
imprensa reflete o pensamento e as atitudes da classe dominante — a mesma que detém
o poder e que controla o Estado em nosso país.
Em pleno Centro Histórico de Londrina essa edificação — medindo
aproximadamente 28 mil metros quadrados — desafia as leis, a prefeitura e,
acintosamente, enfrenta a cidade em desrespeito ao planejamento urbano. O
empreendimento, chamado “City Shopping Londrina”, foi construído entre 2012 e 2013
no local onde funcionava um hotel, o Berlin, remanescente de uma época importante
para o desenvolvimento da cidade e demolido sem qualquer consideração com o seu
papel histórico. O imóvel tem como “âncora” uma filial das lojas Havan e mais um
grupo de pequenos estabelecimentos, além de um grande estacionamento.
As irregularidades começaram na fase de construção, persistiram após a
inauguração, e provocaram a intervenção do Ministério Público. É um exemplo clássico
de como o chamado “empresariado” de Londrina entende a cidade: o local para seus
negócios e lucros, acima das questões coletivas, do direito e da perspectiva de
cidadania. A empresa construtora e o proprietário do imóvel, em ato de desrespeito às
normas de edificação, provocaram um confronto direto com o direito à cidade, inerente
ao conjunto da população.
2
O noticiário dos jornais da cidade de Londrina mostrou os fatos conforme foram
surgindo denúncias. No caso do City, persiste o agravante de não haver autorização da
prefeitura para funcionamento do prédio, o chamado “Habite-se”. Como consequência
não pode haver alvará para funcionamento das empresas.
A soma de erros de procedimento e flagrantes desafios (desrespeito) à legislação
vigente motivaram o Ministério Público a várias atitudes, começando pela exigência de
regularização da situação, notificando judicialmente o prefeito Alexandre Kireeff, a
Secretaria de Obras, O IPPUL — Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de
Londrina — e a Câmara de Vereadores.
Hoje, a manipulação da informação é praticada pela maioria da chamada grande
imprensa do Brasil. O assunto foi analisado pelo jornalista e sociólogo Perseu Abramo
que definiu os parâmetros dos “Padrões de Manipulação na Grande Imprensa”.
Um exemplo da manipulação da informação está na ausência do Estudo de Impacto de
Vizinhança (EIV) e na tentativa de se contornar a obrigatoriedade de sua realização.
Mais uma vez é direito coletivo que está sendo questionado. A ideia central do EIV é a
cidadania. Ao contrário da visão elitista e empresarial, o EIV não pode ser considerado
barreira ou entrave ao empreendimento, mas deve ser visto e garantido como direito e
conquista da sociedade.
Este trabalho pretende fazer a análise do noticiário em questão utilizando os
referenciais dos pesquisadores do jornalismo, para se comprovar a manipulação, na
perspectiva dos estudos de planejamento urbano e do direito à cidade.
O noticiário dos jornais da cidade de Londrina mostrou os fatos conforme foram
surgindo denúncias. No dia 12 de abril de 2014, a Folha de Londrina1, divulgou (via
Folha Web) a seguinte matéria: “MP dá 5 dias para solução do caso Havan”,
informando que esse era o prazo para a prefeitura providenciar as devidas correções na
obra:

1
Disponível em
http://www.folhadelondrina.com.br/politica/mp-da-5-dias-para-solucao-do-caso-havan-878013.html
Acessado em agosto de 2014.
3
A Promotoria de Defesa do Patrimônio Público de Londrina oficiou a
prefeitura para que tome as medidas cabíveis para que cessem as
irregularidades envolvendo o empreendimento City Shopping Londrina,
onde está instalada a loja de departamentos Havan. A recomendação,
assinada pelos promotores de Justiça Leila Schimiti Voltarelli e Renato
de Lima Castro, dá cinco dias para que a administração informe as
medidas adotadas.
(...) A medida visa solucionar os problemas existentes e evitar que uma
lei seja elaborada para adequar a lei ao estabelecimento.

Em 23 de abril a Folha de Londrina2 publica um texto — “Caso Havan segue


sem solução” — explicando que a prefeitura pediu mais prazo (20 dias) ao Ministério
Público para responder aos questionamentos referentes às irregularidades do City
Shopping.
A cobertura jornalística sobre o City volta às páginas da Folha de Londrina3 em
28 de abril com a reportagem “Falta de alvarás pode interditar lojas de shopping em
Londrina”. O jornal informa que as quatro lojas do City receberam notificação para
regularizarem os alvarás de funcionamento (provisórios e vencidos). A ação se deve à
notificação do Ministério Público (11 de abril) determinando à prefeitura a
regularização do City Shopping. Essa matéria foi publicada no caderno “Folha
Economia & Negócios”, a única da série já que todas as outras estavam no caderno
“Política”.
No caso do City, persiste o agravante de não haver autorização da prefeitura para
funcionamento do prédio, o chamado “Habite-se”. Como consequência não pode haver
alvará para funcionamento das empresas.
A soma de erros de procedimento e flagrantes desafios (desrespeito) à legislação
vigente motivaram o Ministério Público a várias atitudes, começando pela exigência de
regularização da situação, notificando judicialmente o prefeito Alexandre Kireeff, a

2
Disponível em
http://www.folhadelondrina.com.br/politica/caso-havan-segue-sem-solucao-879044.html
Acessado em agosto de 2014.

3
Disponível em
http://www.folhadelondrina.com.br/politica/caso-havan-segue-sem-solucao-879044.html
Acessado em agosto de 2014.
4
Secretaria de Obras, O IPPUL — Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de
Londrina — e a Câmara de Vereadores.
A reação da prefeitura ao Ministério Público aparece em seguida por meio de
ações do IPPUL, noticiadas pela imprensa, para corrigir a situação dando nova versão
aos fatos. Na Folha de Londrina4 (via Folha Web) do dia 8 de maio deste ano, saiu a
seguinte notícia: “Ippul reconsidera irregularidades na Havan”.
Amparado em parecer da Procuradoria-Geral do Município (PGM), o
Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Londrina (Ippul)
voltou atrás e considerou que não há irregularidades na construção do
City Shopping, onde está instalada a Havan, na Avenida Benjamin
Constant (Centro). Inovando na interpretação das leis aplicáveis ao
zoneamento urbano, a PGM entendeu que não é necessário recuo de 5
metros naquela via e que um polo gerador de tráfego (PGT) pode sim
ser instalado em Zona Comercial Um (ZC1).

A postura da prefeitura significa uma sujeição às irregularidades da obra e, ao


mesmo tempo, confronto com as ordens do próprio ministério público. Em vez de
cumprir as determinações do MP, o IPPUL muda seus pareceres com intenção de
camuflar a ilegalidade da obra, como mostra a sequência do mesmo texto:
(...) Em recomendação administrativa expedida em 11 de abril, a
Promotoria de Defesa do Patrimônio Público considerou que "há farta
evidência" de que a construção do shopping "violou expressas
disposições municipais" e pediu providências ao prefeito e órgãos
envolvidos.

A reação do Ministério Público foi imediata. A mudança de interpretação dos


órgãos da prefeitura a respeito das irregularidades do City Shopping não foi bem aceita
pelos promotores de Defesa do Patrimônio Público. Os procuradores do município
foram convocados a dar explicações. No dia 9 de maio, a Folha de Londrina5 (via

4
Disponível em
http://www.folhadelondrina.com.br/politica/ippul-reconsidera-irregularidades-na-havan-880518.html
Acessado em agosto de 2014.
5
Disponível em
http://www.folhadelondrina.com.br/politica/mp-convoca-procuradores-para-prestar-depoimento-
880628.html
Acessado em agosto de 2014.
5
Folha Web) publicou outra matéria (“MP convoca procuradores para prestar
depoimento”):
(...) "É bastante estranho a PGM alegar que existe uma interpretação
dúbia quando era clara e objetiva a posição anterior sobre as
irregularidades e ilegalidades da construção", restringiu-se a afirmar o
promotor Renato de Lima Castro.

O MP contesta a mudança de pareceres, justamente quando as irregularidades


são investigadas. Os novos pareceres da prefeitura demonstram a intenção de dar certa
legalidade “retroativa” ao processo. A mesma matéria explica a posição dos
procuradores do município:
Na continuação do texto aparecem afirmações do prefeito Alexandre Kireeff
sobre a legalidade da obra e os possíveis desdobramentos. Segundo a Folha de
Londrina, Kireeff não descartou o fechamento temporário das lojas do local, já que o
processo de liberação do empreendimento não foi concluído. No entanto, o próprio
prefeito afirma que haveria “dúvidas sobre a interpretação da lei de zoneamento
urbano”. No entendimento de Kireeff, esse tipo de polêmica deve acabar, com a
apresentação de um novo projeto de lei, específico para a rua Benjamin Constant.
No mesmo dia (9), a Folha de Londrina6 (via Folha Web) apresenta outra
matéria, desta vez sobre o relatório de uma Comissão de Trabalho da Câmara de
Vereadores (“Relatório ‘aprova’ prédio e aponta problemas documentais”):
A questão, para os parlamentares, é meramente documental: a
construção antes das liberações de alvarás impediu a regularização
posterior. Os impasses foram gerados, em grande parte, pela própria
burocracia da administração, aliada a um processo acelerado de
construção.

O noticiário do dia seguinte, 10 de maio, apresenta a continuidade do que fora


divulgado, explicando as atitudes do Ministério Público com relação aos procuradores
do município que haviam sido convocados para explicar as mudanças nos pareceres. A

6
Disponível em
http://www.folhadelondrina.com.br/politica/relatorio-aprova-predio-e-aponta-problemas-documentais-
880641.html
Acessado em agosto de 2014.
6
Folha de Londrina7 (via Folha Web) informou que pelo menos dois procuradores
foram ouvidos no Ministério Público na condição de investigados. O título da
reportagem é apresentado de forma enfática: “MP apura improbidade no Governo
Kireeff”:
Membros da administração do prefeito de Londrina, Alexandre Kireeff
(PSD), estão sendo investigados por possível prática de improbidade
administrativa, segundo informou ontem a promotora de Defesa do
Patrimônio Público, Leila Schimiti. O Ministério Público (MP) quer
saber porque a Procuradoria-Geral do Município (PGM) mudou de
entendimento sobre as ilegalidades na construção do City Shopping,
onde está localizada a Havan, na Rua Benjamin Constant (Centro).

Ainda no mesmo dia 10, a Folha de Londrina8 (via Folha Web) apresenta outro
texto (“Prefeito aplica multa de quase 3 milhões”), que perde impacto devido à ação do
Ministério Público contra os procuradores do município.
A próxima edição a tratar desse assunto foi a de 13 de maio9, com dois textos. O
primeiro afirma que o “Ippul reconsidera irregularidades na Havan”:
O segundo texto tem como título “Situação da Havan continua indefinida”. A
matéria10 trata do depoimento da presidente do IPPUL, Ignes Dequech, ao Ministério
Público. Apesar de afirmar que a presidente do IPPUL não deu declarações à imprensa,
a matéria apresenta informações a respeito do conteúdo do depoimento, onde Dequech
teria feito afirmações sobre a nova possibilidade de realização do Estudo de Impacto de

7
Disponível em
http://www.folhadelondrina.com.br/politica/mp-apura-improbidade-no-governo-de-kireeff-880733.html
Acessado em agosto de 2014.

8
Disponível em
http://www.folhadelondrina.com.br/politica/prefeito-aplica-multa-de-quase-r-3-milhoes-880754.html
Acessado em agosto de 2014.
9
Disponível em
http://www.folhadelondrina.com.br/politica/ippul-reconsidera-irregularidades-na-havan-881002.html
Acessado em agosto de 2014.

10
Disponível em
http://www.folhadelondrina.com.br/politica/situacao-da-havan-continua-indefinida-880985.html
Acessado em agosto de 2014.
7
Vizinhança — EIV — alterando decisão anterior. A reportagem apresenta também o
valor das multas impostas ao empreendimento: R$ 2,9 milhões.
No dia seguinte, 14 de maio, a Folha de Londrina11 (via Folha Web) dá
continuidade ao assunto com o texto “Corregedoria adia investigação do caso Havan”.
O noticiário (15 de maio) da Folha de Londrina12 (via Folha Web) volta a
mostrar o andamento das investigações do Ministério Público e informa, já no título,
que o “Ippul legalizou City Shopping”:
O Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Londrina (Ippul)
efetivamente considerou legal a construção do City Shopping, onde está
localizada a loja de departamentos Havan, na Rua Benjamin Constant
(centro), (...) cuja postura em 2012 era contrária.

No mesmo dia (15), a Folha de Londrina13 apresenta uma segunda matéria:


“Ex-secretário teria sugerido recuo de 2,5 metros”.
A exemplo do que já havia afirmado publicamente o empresário Rachid
Zabian, o arquiteto Henrique Rainato, responsável pelo projeto do City
Shopping, disse ontem, em depoimento ao MP, que o ex-secretário de
Obras Fernando Bergamasco, engenheiro concursado da prefeitura de
Londrina, havia afirmado que o recuo poderia ser de 2,5 metros.

A Folha de Londrina14 publicou no dia 21 de maio, o texto “City Shopping vai


à Justiça contra multa”. Apesar de trazer informações sobre o recurso contra a multa de
R$ 2,9 milhões, a nota tem um problema: é o que se chama no jornalismo de “matéria

11
Disponível em
http://www.folhadelondrina.com.br/politica/corregedoria-adia-investigacao-do-caso-havan-881083.html
Acessado em agosto de 2014.

12
Disponível em
http://www.folhadelondrina.com.br/politica/ippul-legalizou-city-shopping-881209.html
Acessado em agosto de 2014.
13
Disponível em
http://www.folhadelondrina.com.br/politica/ex-secretario-teria-sugerido-recuo-de-2-5-metros-
881210.html
Acessado em agosto de 2014.

14
Disponível em
http://www.folhadelondrina.com.br/politica/city-shopping-vai-a-justica-contra-multa-881802.html
Acessado em agosto de 2014.
8
fria”, porque a ação judicial é do dia 16 e não contém nenhuma novidade. Os advogados
das empresas envolvidas insistem na tese de que o município foi omisso na fiscalização
da obra.
Somente no dia 24 de maio, a Folha de Londrina15 (via Folha Web) volta a
publicar informações sobre esse assunto: “Juiz nega liminar e repreende City
Shopping”. Trata-se da decisão do juiz da 1ª Vara da Fazenda Pública de Londrina,
Marcos José Vieira, negando o pedido de tutela antecipada apresentado pela defesa das
empresas. A ação solicitava o cancelamento da multa e autorização para manter as
atividades até aprovação do EIV.
A Folha de Londrina16 retoma o assunto no dia 31 de maio para relatar a vitória
que o empreendimento obteve no Tribunal de Justiça, em Curitiba (“TJ impede sanções
ao City Shopping”)
O assunto é retomado jornalisticamente depois de um longo intervalo com a
notícia sobre a atitude de entidades representativas de empresários que criticaram o
Ministério Público em documento publicado nos jornais na forma de anúncio (ou
matéria paga). A nota recebeu críticas dos representantes do MP como relata, no dia 29
de julho, a Folha de Londrina17 (via Folha Web) que publica a seguinte matéria sobre
o caso: “Caso City Shopping opõe MP e entidades”:
A Associação Paranaense do Ministério Público (APMP) rebateu as
críticas de entidades londrinenses e considerou "exagerado" o
posicionamento delas contra a ação civil pública por improbidade
administrativa no caso do empreendimento City Shopping, localizado na
rua Benjamim Constant, área central de Londrina. Em manifesto
intitulado "Londrina não tem donos", assinado pela Associação
Comercial e Industrial de Londrina (Acil), Clube de Engenharia de

15
Disponível em
http://www.folhadelondrina.com.br/politica/juiz-nega-liminar-e-repreende-city-shopping-882149.html
Acessado em agosto de 2014.
16
Disponível em
http://www.folhadelondrina.com.br/politica/tj-impede-sancoes-ao-city-shopping-882784.html
Acessado em agosto de 2014.

17
Disponível em
http://www.folhadelondrina.com.br/politica/caso-city-shopping-opoe-mp-e-entidades-888708.html
Acessado em agosto de 2014.
9
Londrina (Ceal), Sindicato da Construção Civil do Norte do Paraná
(Sinduscon), Sindicato da Habitação e Condomínios (Secovi) e
Sociedade Rural do Paraná (SRP), o MP é acusado de tomar "decisões
midiáticas" e de embasar o processo em "autoritarismo e
fundamentalismo jurídico".

IMPRENSA EM LONDRINA

Hoje, a manipulação da informação é praticada pela maioria da chamada grande


imprensa do Brasil. O assunto foi analisado pelo jornalista e sociólogo Perseu Abramo
que definiu os parâmetros dos “Padrões de Manipulação na Grande Imprensa”.
No caso específico das reportagens selecionadas para esta investigação, foi
observado o seguinte método. Em primeiro lugar, usando o sistema de busca do próprio
jornal Folha de Londrina, procurando por “City Shopping”, foram encontrados vários
textos. Optamos por descartar os textos opinativos, desde as manifestações de leitores
na seção de cartas, aos artigos de opinião e editoriais. Assim definimos nosso Corpus
com matérias que correspondem ao período de 12 de abril até 29 de julho de 2014.
No conjunto das matérias apresentadas não aparece de maneira explícita o
interesse da classe dominante. Como o tema é bem polêmico, o jornal consegue tratá-lo
de forma superficial dando um aspecto de neutralidade, e até de bom jornalismo. As
informações básicas estão presentes: as irregularidades do empreendimento, as ações do
Ministério Público e da prefeitura.
Algumas considerações devem ser feitas de imediato: não é o conjunto do setor
empresarial que concorda com tamanho desafio às leis e regras vigentes. Afinal, o
beneficiário pode ter seu poder de concorrência aumentado. Por outro lado, enfraquecer
o poder público poder ter consequências desastrosas quando houver necessidade do uso
do seu poder de polícia em ações contra os interesses das classes menos favorecidas.
Exemplo disso é a forma como a prefeitura reprime com rigor o comércio ambulante.
Além de mostrar as denúncias sobre o City, o noticiário apresenta com destaque
as ações do Ministério Público. No primeiro momento, o MP estava exigindo
10
providências e regularização. No entanto, quando o MP propõe ações por improbidade
administrativa contra pessoas ligadas aos interesses da chamada classe dominante, a
reação surge com destaque como, por exemplo, no manifesto das entidades que
representam os empresários. É preciso considerar o destaque ao fato dessas entidades
não admitiram a hipótese levantada de haver demolição do prédio em questão.
Dessa forma pode haver questionamentos sobre existência de manipulação do
noticiário, neste caso específico, para se beneficiar os interesses da classe dominante.
Como as reportagens falam das denúncias e dão destaque ao Ministério Público, existe a
possibilidade de se interpretar isso como sendo uma forma de jornalismo equilibrado,
sem pender para o lado empresarial.
O conflito de interesses fica mais evidente se a análise for aprofundada e a
investigação atingir o conteúdo das reportagens que é muito superficial. É exatamente
na superficialidade da cobertura que reside a manipulação na forma descrita por
ABRAMO (2003, p 25), caracterizando assim a presença do Padrão de Ocultação:
É o padrão que se refere à ausência e à presença dos fatos reais na
produção da imprensa. Não se trata, evidentemente, de fruto do
desconhecimento, e nem mesmo de mera omissão diante do real. É, ao
contrário, um deliberado silêncio militante sobre determinados fatos da
realidade. (...)

A manipulação está presente, neste caso, na omissão, na ocultação dos aspectos


centrais dessa discussão: as Leis e o Plano Diretor da cidade, uma garantia mínima de
planejamento urbano. É fundamental para a cidade — e o jornalismo obrigatoriamente
deve refletir isso — que sejam explicitadas as leis (e seus pontos) onde há desrespeito
por parte do empresário/proprietário do City Shopping. A desobediência à regra do
recuo, por exemplo, fere um direito coletivo de todos os londrinenses. A área em
questão deveria ser reservada para futuras ampliações da via pública e eventuais
definições de corredores para o transporte coletivo. Essas questões foram colocadas na
lei por respeito ao interesse coletivo. Fazem parte, portanto, do planejamento do futuro
da cidade.
11
Mais grave é a omissão da imprensa (seja por comentário ou por
aprofundamento do debate) sobre as afirmações do prefeito de Londrina, Alexandre
Kireeff, de que vai providenciar mudanças nas leis para regularizar a situação do
empreendimento. Melhor seria dizer que é uma espécie de anistia para o empresário e o
enterro de critérios de lei de interesse coletivo.
Outro aspecto da manipulação da informação está na ausência do Estudo de
Impacto de Vizinhança (EIV) e na tentativa de se contornar a obrigatoriedade de sua
realização. Mais uma vez é direito coletivo que está sendo questionado. A ideia central
do EIV é a cidadania. É a possibilidade de vizinhos de empreendimentos serem ouvidos
e respeitados. Ao contrário da visão elitista e empresarial, o EIV não pode ser
considerado barreira ou entrave ao empreendimento, mas deve ser visto e garantido
como direito e conquista da sociedade.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O processo de manipulação da informação no caso da cobertura da Folha de


Londrina em relação ao City Shopping fica evidente com a caracterização do padrão de
manipulação de ocultação, conforme definição de Perseu Abramo. A cobertura realizada
apresenta uma superficialidade que vai contra as regras do bom jornalismo, deixando de
apresentar as questões cruciais para o interesse coletivo e, portanto, da maioria da
população.
Deixar de apontar questões cruciais explicita o papel dessa grande imprensa
dominada financeira e ideologicamente pelo poder econômico, pelas elites da cidade e
do país.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ABRAMO, Perseu. Padrões de Manipulação na Grande Imprensa. São Paulo:


Editora Fundação Perseu Abramo, 2003.
12
ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DOS JORNALISTAS. Pelo Direito à
Informação. (Declaração da OIJ à Conferência Mundial de Direitos Humanos —
Viena, 14 a 25 de junho de 1993). Madri, Espanha: Organização Internacional dos
Jornalistas, 1993.

SINDICATO DOS JORNALISTAS PROFISSIONAIS DO NORTE DO PARANÁ.


Manual de Ética do Jornalista. Londrina: UEL, 1999.

http://www.folhadelondrina.com.br/politica/mp-da-5-dias-para-solucao-do-caso-havan-
878013.html

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