Você está na página 1de 16

A TEORIA DO COMÉRCIO INTERNACIONAL: UMA RESENHA* Reinaldo

Gonçalves**

RESUMO O texto apresenta uma resenha da teoria do comércio internacional.


São elencados, de forma didática, os principais elementos dessa que é uma
das mais antigas áreas do pensamento econômico. Também é destacada a
inexistência seja de uma teoria geral, seja de uma nova teoria do comércio
internacional.

INTRODUÇÃO O objetivo deste texto é o de apresentar um panorama das


diferentes teorias de comércio internacional. Na verdade, este é um campo de
estudos que desenvolveu-se a tal ponto que não é possível tratá-lo num único
artigo. Pode-se listar, entre seus tópicos, a teoria “pura” do comércio
internacional; o comércio internacional e a concorrência imperfeita; os teste
empíricos da teoria; a teoria e a prática da proteção; a economia política do
comércio internacional; políticas comerciais estratégicas; comércio,
crescimento e desenvolvimento; integração econômica internacional;
comércio de serviços; comércio e produção internacional; negociações
comerciais multilaterais; e comércio internacional e a macroeconomia
aberta. Na realidade, cada um destes tópicos implica em um campo de
estudos específico. Não é nosso objetivo apresentar uma resenha exaustiva da
literatura sobre a teoria do comércio internacional e suas aplicações. Este
trabalho limita-se a mostrar apenas uma visão panorâmica a respeito da teoria
pura do comércio internacional, concentrando-se nos seus determinantes
básicos. Trata-se de uma resenha que procura facilitar o estudo tanto de
estudantes como os profissionais que não encontram livrostexto, trabalhos ou
artigos que apresentem o núcleo duro da teoria do comércio internacional.
Traduzido do original, “The Theory of International Trade: back to basics”, por
José Deolindo Menck. Texto publicado em Economia Ensaios, Volume 12, No.
1, dezembro 1997, p. 3-20.

** * Professor Titular de Economia Internacional na Universidade Federal do


Rio de Janeiro 1

1
Só para ilustrar, podemos dizer que não apenas tem havido um exagero na
importância (e na “novidade”) dos modelos mais recentes que lidam com
economias de escala e com concorrências imperfeita, mas também tanto
os analistas como os profissionais têm tido uma tendência a sobrevalorizar a
influência de variáveis específicas, tais como a tecnologia. Parece-nos que
teria sido mais apropriado que, ao invés de se falar tanto em uma “nova teoria”
do comércio internacional, se falasse apenas a respeito de “novos modelos”. O
desenvolvimento do pensamento econômico a respeito do comércio
internacional não pode ser sumariado aqui. Por ora, basta dizer, mesmo
correndo o risco de uma simplificação exagerada, que os recentes
desenvolvimentos e elaborações poderiam ser convenientemente
classificados dentro dos seguintes grupos: teorias neofatoriais; teorias
neotecnológicas; economias de escala; estrutura de mercado; e
influências de demanda. Ao longo do texto faremos referência apenas aos
principais estudos pioneiros em cada grupo. Para aprofundamento e para
referências à literatura, vale recorrer às notas de rodapé e ao apêndice. Não se
pode esquecer que o argumento básico subjacente a esta pesquisa é a
inexistência de uma teoria geral do comércio internacional, tal como Jacob
Viner salientou a, aproximadamente, meio século atrás. De fato, dada a
complexidade dos temas e a influência de variáveis heterogêneas, não é
possível obter-se uma teoria geral e única do comércio internacional. É de
suma importância, portanto, ter-se um balanço em termos da importância
relativa dos diferentes determinantes do comércio internacional. 1. O
PRINCÍPIO DAS VANTAGENS COMPARATIVAS A maior parte da teorização
sobre comércio internacional trata dos determinantes básicos dos padrões de
comércio de bens e das implicações do comércio sobre o bem-estar. As
principais teorias de comércio internacional baseiamse, em sua maioria,
no princípio da vantagem comparativa, ou seja, supõem serem as trocas
internacionais de bens o resultado das diferenças entre os países em
termos de custos relativos e, conseqüentemente, de preços relativos. O
princípio da vantagem comparativa significa enfocar os determinantes do
comércio internacional pelo lado da oferta. Contudo, o papel da demanda
foi reconhecido pela escola clássica inglesa na medida em que fatores pelo
lado da

2
demanda sejam de importância especial na determinação dos preços relativos.
Modelos de comércio internacional que se apartem do princípio das vantagens
comparativas e que lidem com as influências da demanda mais diretamente
também são discutidos neste trabalho. Como regra geral, qualquer país
tenderá a exportar produtos nos quais tenha vantagem comparativa. O
problema teórico básico é, por conseguinte, a explicação dos determinantes
primeiros das diferenças entre os países em relação aos custos comparativos.
2. A TEORIA RICARDIANA OU O MODELO CLÁSSICO Na origem do
princípio das vantagens comparativas está o modelo ricardiano de
comércio internacional, baseado na teoria clássica do valor trabalho. De
acordo com este modelo, os custos comparativos são determinados pela
produtividade relativa do trabalho. Variações nessa produtividade entre
os países adviriam principalmente de diferenças tecnológicas entre eles.
A análise ricardiana começa com uma crítica ao princípio das vantagens
absolutas de Adam Smith, ou seja, de que o comércio internacional seja
determinado por diferenças absolutas na produtividade do trabalho. Em seu
modelo, Ricardo supôs que as funções de produção são diferentes entre
países e que elas apresentam retornos constantes de escala. O modelo
clássico do comércio internacional tem, provavelmente, seu melhor resumo
numa nota de pé de página na principal obra deste autor: “Parece-nos,
portanto, que um país que possua vantagens consideráveis em maquinaria e
qualificação [do trabalho], e que, por isso mesmo, esteja apto à manufatura de
bens com muito menos trabalho que seus vizinhos possa, em troca por tais
bens, importar uma parte dos cereais necessários ao seu consumo, mesmo
que sua terra seja mais fértil e que os cereais pudessem ser cultivados com a
utilização de menos trabalho do que no país do qual ele é importado”. 1
Inúmeras tentativas têm sido feitas para testar a teoria do comércio
internacional2. O teste empírico mais conhecido 1 do modelo clássico é o de G.
David Ricardo, On the Principles of Political Economy and Taxation, 1817,
Cambridge, University Press (Sraffa’s edition), 1951. Para uma análise da
teoria do comércio internacional, ver D.P. O’ Brien, The Classical Economists,
Oxford, Clarendon Press, 1975, cap. 7, pp. 136 e segs. Uma pesquisa recente
é a de E. L. Leamer, “Testing Trade Theory”, em D. Greenaway e L. Alan

3
Winters, Surveys in International Trade, Oxford, Basil Blackwell Ltda, 1984, pp.
66-106.

MacDougall, que examinou as exportações britânicas e estadunidenses para


outros mercados. De acordo com seus testes, existia uma correlação positiva
entre a produtividade relativa do trabalho e o desempenho relativo das
exportações dos dois países. Tais resultados garantiram evidências em favor
das hipóteses indicadas no modelo ricardiano3. A variável independente no
teste de MacDougall foi a razão do produto estadunidense por trabalhador
sobre a mesma variável britânica, sua variável dependente foi a razão de
quantidade exportada pelos Estados Unidos sobre a exportada pelo Reino
Unido (sempre para terceiros mercados). Sua amostra incluía 25 grupos de
produtos e seus dados referiam-se a 19374. Uma das principais críticas
levantadas contra o teste de MacDougall é que, ao concentrar sua análise na
produtividade do trabalho, ele colocou de lado a influência dos outros fatores
de produção. As diferenças de produtividade entre os países associam-se a
variações nos padrões de comércio, mas tais diferenças representam a
produtividade total dos fatores, que depende da interação do trabalho com os
outros fatores de produção.

3. A TEORIA DE HECKSCHER-OHLIN OU O MODELO NEOCLÁSSICO Um


século após Ricardo ter estabelecido o princípio das vantagens comparativas,
Eli Heckscher combinou os “preços dos agentes de produção” com o comércio
internacional, seguindo a tradição da escola neoclássica5. Parece-nos
justificada a inserção, aqui, de uma citação retirada do trabalho pioneiro de
Heckscher: “Deve-se enfatizar aqui que o termo “fator de produção” não se
refere simplesmente às amplas categorias de terra, capital e trabalho, mas às
diferentes G. D. A . MacDougall, “British and American Exports: A Study
Suggested by The Theory Of Comparative Costs”, Economic Journal, vol. 61,
n.º 244, dezembro de 1951, reimpresso em R. E. Caves e H.G Johnson (eds.),
Readings in International Economics, Londres, George Allen and Unwin, 1968,
pp. 553-578. Para uma crítica ao trabalho de MacDougall, ver J. Bhagwati, “The
Pure Theory of International Trade: A survey”, Economic Journal, vol. 74, março
de 1964, pp. 1-84, reimpresso com um adendo em J. Bhagwati, Trade, Tariffs
and Growth , Londres, Weidenfeld and Nicolson, 1969, pp. 3-122. Ver o

4
prefácio de Heckscher à edição inglesa de seu artigo publicado originalmente
na Suécia em 1919: “The Effect of Foreign Trade on the Distribution of Income”,
em H. S. Ellis e L. A . Metzler (eds.), Readings on the Theory of International
Trade, Londres, George Allen and Unwin Ltd, 1950, pp. 272-300. 5 4 3 4

qualidades de cada uma destas. O número dos fatores de produção, portanto,


é praticamente ilimitado”. Neste sentido, a versão simplificada da teoria
neoclássica, que termina em modelos do tipo 2x2x2 (dois fatores, dois produtos
e dois países) parece se constituir em um rompimento importante com a
concepção original de Heckscher sobre os determinantes do comércio. Na
verdade, as teorias neofatoriais sobre comércio internacional voltam a esta
concepção original, como será mostrado abaixo. Ao incorporar outros fatores
de produção (além da terra, trabalho e capital) em sua análise, Heckscher
ampliou o modelo ricardiano, no qual os preços relativos refletiam a
produtividade relativa do trabalho. Contudo, é a suposição de uma igualdade
internacional de tecnologia que gera as bases para as propostas principais do
modelo neoclássico do comércio exterior (o modelo de Heckscher - Ohlin). Em
verdade, no seu artigo, Heckscher se preocupa principalmente com a relação
entre o comércio internacional e a distribuição de renda. A esse respeito ele
discute a hipótese de eqüalização dos preços relativos dos fatores de
produção6. Tal hipótese foi desenvolvida, posteriormente, por Samuelson no
final dos anos 40 e início dos anos 50 7. Além disso, o modelo de Heckscher foi
reformulado por Ohlin em sua tese de doutorado em 1924, que foi publicada
em inglês poucos anos depois8. Por isso, a análise neoclássica do comércio
internacional tornou-se conhecida como a teoria de Heckscher-Ohlin ou a teoria
de Heckscher-Ohlin-Samuelson. No modelo neoclássico, as diferenças de
dotações de fatores entre países é o principal determinante das vantagens
comparativas. As diferenças de escassez relativa de fatores de produção
afetam os custos relativos e, por conseguinte, os padrões de comércio.
Conseqüentemente, o teorema neoclássico básico do comércio internacional é
que qualquer país tende a exportar mercadorias que usam quantidades
relativamente altas de seus fatores de produção mais abundantes. Os padrões
de vantagens comparativas são, portanto, determinados pela escassez relativa
dos fatores de produção de tal forma que, por exemplo, os países mais ricos

5
em capital tendem a exportar produtos intensivos em capital. 6 7 Ibid., p. 287 A
. P. Samuelson, “International Trade and Equalization of Fator Prices”,
Economic Journal, vol. 58, junho de 1948, pp. 163-84. 8 B. Ohlin, Interregional
and International Trade, Harvard University Press, 1933. 5

Com relação aos testes empíricos do modelo de Heckscher-Ohlin, o estudo de


maior impacto foi realizado por Wassily. Leontief e analisou o comércio
internacional dos Estados Unidos9. Sua análise das exigências de capital e
trabalho domésticos das exportações e das importações estadunidenses
baseou-se na matriz de insumo-produto da economia norte-americana de 1947
e em uma desagregação de 200 setores de atividades. Nesse estudo ficou
claro que as exportações embutiam menos capital por trabalhador que as
importações, ou seja, num país industrial, rico em capital, as exportações eram
mais intensivas em trabalho que as importações. Este resultado, que era
contrário ao esperado do modelo de Heckscher-Ohlin, ficou conhecido como o
Paradoxo de Leontief, e estimulou o desenvolvimentos de estudos teóricos e
análises empíricas do comércio internacional10.

4. AS TEORIAS NEOFATORIAIS As teorias do neofatoriais seguem o modelo


Heckscher-Ohlin no sentido de que a vantagem comparativa de um país
seria o resultado das diferenças internacionais nas dotações de fatores.
Este modelo leva em conta, explicitamente, a influência dos recursos naturais e
do “capital humano” como determinantes da vantagem comparativa e do
comércio internacional. A influência das diferenças nas dotações de recursos
naturais é especialmente importante para que se explique os padrões de
vantagens comparativas nos produtos intensivos nesses fatores11. Estudos
empíricos têm tratado também da complementaridade dos recursos naturais
com relação aos demais fatores de produção. Além disso, vale a pena observar
a influência dos manufaturados intensivas nesses recursos no caso das
exportações de países em desenvolvimento. Deve-se levar em conta,
entretanto, que há um certo viés na literatura sobre comércio internacional na
medida em que ela tende a minimizar a influência dos recursos naturais. Por
exemplo: no bem conhecido W. W. Leontief, “Domestic Production and Foreign
Trade: The American Capital Position Reexamined”, Proceedings of the
American Philosophical Society, vol. 97, 1953, reimpresso em J. Bhagwati,

6
International Trade, Harmondsworth, Penguin Books Ltd, pp. 93-139. Resenhas
da literatura encontram-se em J. Bhagwati, op. cit.; R. M. Stern. “Testing Trade
Theories”, em International Trade and Finance, Frontiers from Research,
Cambridge University Press, 1975, pp. 3-49; e A . V. Deardoff, “Testing Trade
Theories and Predicting Trade Flowes”, em R. W. Jones and P.B. Kenen (eds.),
Handbook of International Economics, vol.1, Elsevier Publishers B.V., 1984, pp.
467-517. Ver, por exemplo, J. Vanek, The Natural Resource Content of United
States Foreign Trade, 18701955, Cambridge, MIT Press, 1963. 11 10 9 6

estudo de Hufbauer, a amostra de 24 países foi escolhida excluindo,


explicitamente, aqueles que apresentavam algum grau de especialização em
manufaturas baseadas em tais recursos12. A hipótese da influência do “capital
humano”, associado ao trabalho qualificado, como um determinante importante
da vantagem comparativa tem, também, recebido uma atenção especial em
estudos empíricos, o que tem gerado evidência em favor desta hipótese13. A
esta altura vale a pena mencionar que Ricardo reconheceu a importância do
trabalho qualificado em sua análise do comércio exterior. Nos “Princípios”, ele
explicitamente argumentou sobre sua influência nas relações entre o comércio
internacional e o valor do dinheiro14. Por outro lado, vista no contexto do
modelo Heckscher-Ohlin, a inclusão do capital humano nos testes empíricos
tem sido particularmente útil para a explicação dos padrões de comércio de
países altamente industrializados, nos quais este fator seria relativamente mais
abundante do que o capital físico e que o trabalho não-qualificado15.

5. TEORIAS NEOTECNOLÓGICAS No que respeita à influência da tecnologia


no comércio internacional, pode-se mencionar o modelo da “defasagem
tecnológica” (technology gap) desenvolvido durante os anos 6016. De
acordo com esse modelo, o processo de inovação tecnológica gera
vantagens comparativas e influencia o padrão de comércio internacional
do país. Por um lado, a criação de vantagens tecnológicas específicas em
um dado país faz surgir o comércio; por outro, leva os produtores de fora
do país (competidores em potencial), a responderem através da imitação
à inovação. Conseqüentemente, o desempenho das exportações basear-se-á
nas diferenças de custos comparativos G.C. Hufbauer, “The Impact of National
Characteristics and Technology on the Commodity Composition of Trade in

7
Manufactured Goods”, em R. Vernon (ed.), The Technology Factor in
International Trade, Nova Iorque, National Bureau of Economic Research,
1970, pp. 145-231. Ver, por exemplo, D. Keesing, “Labour Skill and
International Trade: Evaluating Many Trade Flowes With a Single Measuring
Device”. Review of Economics and Statistics, Vol. 47, agosto, 1965, pp. 28794.
14 15 13 12 Ver Ricardo, op. cit., pp. 142-5. Um resumo de diversos estudos
que tratam da influência do capital humano associado a especializações sobre
os padrões de comércio encontra-se na obra de Stern de 1975, op. cit., pp. 12-
6. Ver, por exemplo, o estudo pioneiro de M. V. Posner, “International Trade
and Technical Change”, Oxford Economic Papers, Vol. 13, n.º 3, outubro de
1961, pp. 323-41. 16 7

induzidos pela mudança tecnológica e dependerá do tempo em que durar a


defasagem para a imitação. A idéia de que padrões de vantagens comparativas
possam alterar-se ao longo do tempo foi melhor elaborada no modelo do “ciclo
de vida do produto”, no qual, contudo, o foco da análise centra-se na
diferenciação de produtos17.Neste modelo, o desempenho das exportações de
um país em relação a um produto específico se alterará ao longo do ciclo de
vida do produto. O ciclo de vida divide-se em três fases, a saber: inovação,
maturidade e padronização. Na primeira, a localização da produção fica
confinada aos mercados de altas rendas e substancial capacidade tecnológica
substancial e as exportações são orientadas para os países com níveis de
renda e gostos similares. Na segunda fase, a produção de uma mercadoria em
maturação pode ser direcionada para outros países, na medida em que os
custos de produção, como determinantes da competição nos mercados
internacionais, começam a ser mais importantes do que as características do
bem. Na terceira fase, a produção de um produto padronizado pode até ser
transferida para os países nos quais os custos da mão-de-obra são
significativamente mais baixos do que os dos locais responsáveis pela
inovação. Testes empíricos sobre a influência das variáveis relacionadas à
tecnologia sobre os padrões de comércio têm dado suporte a estas teorias. A
maioria dos estudos tem tratado dos casos de setores ou países
específicos18.Com relação aos estudos empíricos, vale a pena salientar que “é

8
difícil distinguir-se a evidência que coloca a tecnologia da que coloca o capital
humano ou o trabalho qualificado como determinantes do comércio”19.

6. ECONOMIAS DE ESCALA E CONCORRÊNCIA IMPERFEITA R. Vernon,


“International Investment and International Trade in the Product Cycle”,
Quarterly Journal of Economics, Vol. 80, maio de 1966, reimpresso em J. H.
Dunning, International Investment, Harmondsworth, Penguin Books Ltd., 1972,
pp. 305-25. Uma série de estudos sobre indústrias e países com relação a esse
modelo encontra-se em L.T. Wells, Jr. (ed.), The Product Life Cycle and
International Trade, Boston, Graduate School of Business Administration,
Harvard University, 1972. Ver, também, a reelaboração, feita por R. Vernon,
“The Product Cicle Hypothesis in a New International Environment”, Bulletin of
Economics and Statistics, Vol. 41, novembro de 1979, pp. 25567. O efeito da
tecnologia sobre os padrões de comércio é analisado por Hufbauer (1970), op.
cit., pp. 184-97. 19 18 17 Deardoff (1984), op. cit., p. 499. 8

Na abordagem que trata do impacto das economias de escala sobre o


comércio internacional, o argumento básico é bem simples: quando as
funções de produção exibem retornos de escala crescentes, os padrões
de comércio e o desempenho das exportações dependem do tamanho
absoluto do mercado doméstico. Conseqüentemente, os países maiores
terão vantagens comparativas em setores com economias de escala
significativas. Neste sentido, as economias de escala podem ser importantes
em produtos finais homogêneos e diferenciados, bem como em bens
intermediários, através da especialização intra-setorial. Aqui é importante
mencionar que os pioneiros da teoria do comércio internacional (Ohlin, por
exemplo) já chamavam a atenção para as influências das economias de
escala20. Todavia, em versões simplificadas do modelo neoclássico (de
Heckscher-Ohlin), supõe-se que as funções de produção exibam retornos
constantes de escala e que os fatores de produção têm uma produtividade
marginal decrescente. Também deve ser dito que as economias de escala
foram discutidas até como uma variável importante no contexto das
exportações de manufaturados dos países em desenvolvimento21. Entretanto,
a conclusão básica é que “a pesquisa empírica sobre a importância das
economias de escala no padrão do comércio internacional tem tido resultados

9
variados”22. No passado recente, o argumento das economias de escala tem
sido associado principalmente com os modelos de comércio baseados em
estruturas de mercado imperfeitamente concorrenciais23. Uma das
conclusões básicas destes modelos é que “em um mundo no qual os
retornos crescentes existem, a vantagem comparativa resultante das
diferenças entre os países não é a única razão para a existência do
comércio. As economias de escala criam um incentivo adicional e gerarão
comércio mesmo se os países forem idênticos em gostos, tecnologias e
dotações de fatores”24. 20 21 Ohlin (1933), op. cit., capítulos III (pp. 54-8) e
VI (pp. 106-8) R. Vernon, “Problems and Prospects in the Export of
Manufactured Goods from Less-developed countries”, Proceedings of the
United Nations Conference on Trade and Development, Geneva, 23 de março a
16 de junho de 1964, Vol. IV, pp. 200-10. 22 23 Deardoff (1984), op. cit., p. 511.
Ver, por exemplo, os modelos de comércio desenvolvidos por E. Helpman e P.
R Krugman, Market Structure of Foreign Trade, Increasing Returns, Imperfect
Competition and International Economy, The MIT Press, 1985. 24 Ibid., p. 261.
Para uma resenha da literatura , ver A. Jacquemin, “Imperfect Market Structure
and International Trade Some Recent Research”, Kyklos, Vol. 35, nº 1, 1982,
pp. 75-93; E. Helpman, 9

Vale a pena mencionar que a idéia dos retornos crescentes também se


relaciona à acumulação de experiência, ou seja, às economias da
aprendizagem. A este respeito, economias de escala dinâmicas do tipo “curva
de aprendizagem” criam uma vantagem comparativa para uma firma ou setor,
que pode afetar a estrutura nacional de vantagens comparativas25.

7. AS TEORIAS PELO LADO DA DEMANDA A influência da demanda na


determinação do comércio internacional foi reconhecida pela escola inglesa de
economia clássica26.Porém, é na análise dos ciclos de negócios e na mais
recente literatura sobre comércio que se pode encontrar teorias que tratam da
demanda como um importante determinante dos padrões e desempenho do
comércio. Primeiramente, pode-se mencionar a hipótese da “pressão de
demanda” que tem sido particularmente importante na especificação das
funções de exportação. O argumento básico é que a pressão da demanda
interna tenderá a deslocar os bens que antes eram destinados ao

10
mercado externo, trazendo-os para si27. Neste sentido, o desempenho
das exportações e os padrões de comércio dependem do nível de
absorção doméstica. No contexto de “excesso” de demanda interna, o
desempenho das exportações e a estrutura do comércio exterior
dependem não apenas da dotação de fatores, tecnologia, etc., mas
também da combinação (mix) e da natureza das medidas de política
macroeconômica. Em segundo lugar, a abordagem da “similaridade de
preferências” diz que a semelhança de padrões de demanda também pode
constituir-se numa base para o “Increasing Returns, Imperfect Markets and
Trade Theory”, em Jones e Kenen, op. cit., cap. 7; e A. Smith, “Imperfect
Competition and International Trade”, Greenaway e Winters, op. cit., pp. 43-65.
Ver P.R. Krugman, “Import Protection as Export Promotion: International
Competition in the Presence of Oligopoly and Economics of Scale”, em H.
Kierzkowski (ed.), Monopolistic Competition and International Trade, Oxford,
Clarendon Press, 1984, pp. 180-93. J.S. Mill introduziu o conceito de demanda
recíproca para explicar as condições de equilíbrio do comércio. Ver seus
Principles of Political Economy, (1848), Londres, The Standard Library
Company, Livro III, cap. 18. Para uma breve revisão do argumento tradicional
relacionado à hipótese de pressão da demanda, ver I.S. Mintz, Cyclical
Fluctuations in the Exports of the United States Since 1879, National Bureau of
Economic Research, Nova Iorque, 1967, pp. 10-8. A maior parte da discussão
sobre a relação entre demanda doméstica e o desempenho das exportações foi
feita em relação à experiência do Reino Unido. Ver, por exemplo, R. A. Cooper,
Export Performance and the Pressure of Demand. A Study of Firms, Londres,
George Allen and Unwin Ltd., 1970. 27 26 25 10

comércio28. Dado que a renda é desigualmente distribuída no interior de cada


país, os consumidores de diferentes níveis terão padrões de demanda
diversos, por exemplo, em termos de “qualidade” do produto. Por outro lado, os
consumidores com níveis de renda similares, mesmo considerando-se países
distintos, tenderão a apresentar padrões de demanda semelhantes. No
contexto de economias de escala e mercados de produtos diferenciados, os
padrões de demanda superpostos tenderão a gerar diferenças entre países em
termos de vantagens comparativas e, portanto, influenciarão o comércio

11
internacional. Finalmente, a terceira teoria de comércio internacional orientada
para a demanda está relacionada à diferenciação de atributos ou
características dos produtos. De acordo com esta visão, os consumidores
maximizariam uma função objetivo cujos elementos seriam as características
dos bens e não sua quantidade, dada a restrição orçamentária.
Conseqüentemente, a quantidade de bens consumidos seria determinada
através da maximização de uma função utilidade composta das características
ou atributos dos bens29. Dadas as difusões de gostos semelhantes entre
países, as diferenças entre estes com relação ao tamanho de seus mercados e
os retornos crescentes de escala, pode ser que os consumidores de
determinado país demandem bens que incorporem um conjunto de atributos
que só podem ser produzidos eficientemente e a um baixo custo em algum
outro país30. Portanto, a diversidade de preferências em relação aos atributos
dentro de cada país pode criar uma certa base para comércio internacional. 8.
CONCLUSÕES É importante chamar a atenção do leitor para alguns aspectos-
chaves relacionados à discussão acima sobre os determinantes básicos do
comércio internacional. 28 S. B. Linder, An Essay on Trade and
Transformation, Nova Iorque, John Wiley & Sons, 1961. Existem muitas
implicações da hipótese de Linder. Para uma discussão dessas implicações e
para referências à literatura, ver Deardoff (1984), op. cit. ,pp. 504-6. K. J.
Lancaster, “A New Approach to Consumer Theory”, Journal of Political
Economy, Vol. 74, abril de 1966, pp. 132-57. 29 K.J Lancaster, “Intra-Industry
Trade Under Perfect Monopolistic Competition”, Journal of International
Economics, Vol. 10, 1980, pp. 151-75. 30 11

Para começar, inexiste uma teoria geral sobre comércio internacional, no


sentido de que o poder explicativo das existentes é limitado a produtos, setores
e países específicos. Por isso é que Jacob Viner, baseando-se em sua análise
da teoria clássica do comércio internacional, disse: “É por causa deste (tão
complexo) mundo que não há nem pode haver alguma teoria geral
relevante”31. Ao lado disso, deve-se ter em mente que explicações teóricas
estão incrustadas em seu próprio tempo e só podem ser entendidas num
contexto histórico. Isto quer dizer que, para determinado país, certa teoria pode
explicar um fluxo de comércio particular em determinado momento. Contudo,

12
com todas as alterações ao longo do tempo nos processos de industrialização,
acumulação de capital, inovações tecnológicas, estratégias e crescimento das
empresas no país em questão e em todo o mundo, é provável que haja
variações no poder explicativo de qualquer teoria. Este fenômeno é
particularmente importante para os países em desenvolvimento que têm
passado por rápidos processos de transformação econômica. Além disso, as
estratégias das grandes corporações transnacionais também influenciam esse
comércio (direção, volume, composição e termos de troca). Não há dúvida de
que, dadas a heterogeneidade e a complexidade dos determinantes do
comércio trocas internacional (elementos de oferta e de demanda, influências
econômicas, determinantes específicos relativos ao produto, empresa, setor de
atividades ou país), não é possível ter-se uma teoria geral que possa ser
aplicada a todos os casos e a qualquer momento! Conseqüentemente, a
abrangência de cada uma das teorias ou modelos de comércio que tente
explicar casos reais é bastante limitada. De acordo com Joan Robinson, “não
há ramo da economia no qual exista uma lacuna maior entre a doutrina
ortodoxa e os problemas reais do que na teoria do comércio internacional”32. É
interessante citar uma observação de um especialistas a respeito da evidência
empírica: “Obviamente, boa parte dos esforços ao longo dos anos têm sido
gasto na tentativa de testar as teorias do comércio. Embora seus resultados
raramente tenham sido conclusivos, muitos, com certeza, têm sido sugestivos,
mas, de qualquer maneira, 31 32 J. Viner, International Economics, Glencoe,
Illinois, Free Press, 1951, p. 16. J. Robinson, “The Need a Reconsideration of
the Theory of International Trade”, em M. B. Connely e A . K. Swoboda (eds.),
International Trade and Money, Londres, George Allen and Unwin Ltd., 1971, p.
15. 12

todos eles têm conseguido estimular o avanço da teoria em direções mais


consistentes com a realidade empírica”33. Além do mais, deve-se salientar que
as mais recentes teorias de comércio internacional têm sido, de modo geral,
orientadas para a explicação dos padrões e desempenho dos países altamente
industrializados34. A dinâmica subjacente ao desempenho das exportações e
aos padrões de comércio é muito complexa e, embora os modelos básicos
tenham proporcionado um entendimento geral dos problemas, isto não deve

13
deixar de fora a análise dos fatores que influenciam o comércio internacional e
que ficam, em geral, além da abrangência das teorias tradicionais. Neste
sentido, pode-se mencionar as políticas macroeconômicas, por exemplo, as
taxas de câmbio, juros, tributos e salários) e a orientação estratégica (e.g., as
prioridades em relação à alocação de recursos e as definições de objetivos).
Por fim, cabe assinalar que não há uma “nova” teoria do comércio internacional
assentada em economia de escala, diferenciação do produto e concorrência
imperfeita. Nos anos 80 houve uma onda de modelos de comércio internacional
que, de uma forma ou de outra, formalizaram a influência destas variáveis e
chegaram a resultados que há eram conhecidos, seja na teoria de comércio
internacional, seja na teoria do desenvolvimento econômico. Neste ponto vale
apresentar a opinião de um dos mais destacados especialistas norte-
americanos em comércio internacional (Kindleberger, 1993, p. 56) sobre a
importância relativa das contribuições recentes de um dos expoentes dos
novos modelos de comércio internacional35 : “Eu confesso alguma irritação
com a defesa de Krugman de que sua teoria do comércio internacional é nova
somente porque oferece em forma de equação uma verdade já bastante
usada.” APÊNDICE 33 34 Deardoff (1984), op. cit., p. 511. Ver F. Stewart.
“Recent Theories of International Trade: Some Implications for the South”, em
Kierzkowski (1984), op. cit., pp. 84-108. Charles P. Kindleberger, “How ideas
spread among economists: Examples from International Economics”, em D.
Colander e A. W. Coate, (orgs.), The Spread of Economic Ideas, Cambridge,
Cambridge University Press, 1993, pp. 43-60. 35 13

Neste apêndice tem-se uma lista de alguns estudos e pesquisas recentes que,
ao lado dos mencionados nas notas de pé de página, podem ajudar os leitores
a aprofundarem o entendimento dos assuntos relacionados ao comércio
internacional. Aqueles que são bastante usados nos países desenvolvidos
estão marcados com um asterisco. Com dois estão marcados os livros
importantes que lidam com o comércio no contexto da economia política
internacional e, com três, os estudos recentes que têm o escopo de uma
resenha. Todas essas referências são em inglês ou francês, e para um livro-
texto recente tratando da teoria pura do comércio internacional, ver:
REINALDO GONÇALVES, RENATO BAUMANN, LUIS CARLOS PRADO E

14
OTAVIANO CANUTO, A Nova Economia Internacional. Uma Perspectiva
Brasileira, Rio de Janeiro, Ed. Campus, 1998. BALDWIN, R. E., "Are
economists' traditional trade policy views still valid?", Journal of Economic
Literature, Vol. 30, June 1992, pp. 804-29.(***) CAVES, R. E., "International
differences in industrial organisation", em R. Schmalensee e R. D. Willig,
Handbook of Industrial Organization, Vol. II, Elsevier Science Publishers B.V.,
1989, pp. 1225-50.(***) CHIPMAN, J. S., "International trade", em The New
Palgrave . A Dictionary of Economics, vol. 2, London, The Macmillan Press, pp.
922-54.(***) DEARDOFF, A. V., "Testing trade theories and predicting trade
flows", em R. W. JONES E P. B. KENEN (ed.), Handbook of International
Economics, Vol. I, Elsevier Science Publishers B.V., 1984.(***) ETHIER, W. J.,
Modern International Economics, New York, Norton, 1988.(*) FALVEY, R. E.,
"The theory of international trade", in D. GREENAWAY AND L. ALAN
WINTERS (eds.), Surveys in International Trade, Oxford, Basil Blackwell Ltd.,
1994, pp. 9-42.(***) GILPIN, R., The Political Economy of International
Relations, Princeton University Press, 1987.(**) GREENAWAY, D. AND L.
ALAN WINTERS (eds.), Surveys in International Trade, Oxford, Basil Blackwell
Ltd., 1994.(***) GUILLOCHON, B., Économie Internationale, Paris, Dunod,
1993.(*) HELLIER, J., Macroéconomie Ouverte, Paris, PUF, 1994.(*) 14

HELPMAN, E., "The noncompetitive theory of international trade and trade


policy", Proceedings of the World Bank Annual Conference on Development
Economics 1989, The World Bank, 1990, pp. 193-230.(***) INGRAM, J.C.,
International Economics, John Wiley & Sons, 1988.(*) KENEN, P., The
International Economy, Cambridge University Press, 1992.(*) KRUGMAN, P. E
OBSFELD, M., International Economics. Theory and Policy, Scott Foresman,
1988.(*) MARKUSEN, J.R. E MELVIN, J.R., The Theory of International Trade,
Harper & Row, 1988.(*) MUCCHIELLI, J-L., Principes d'Economie
Internationale, Paris, Economica, 1987.(*) OCAMPO, JOSÉ ANTONIO, "New
theories of international trade and trade policy in developing countries", in M. R.
AGOSIN AND D. TUSSIE (eds.), Trade and Growth. New Dilemmas in Trade
Policy, London, The Macmillan Press Ltd, 1993, pp. 121-41.(***) ODELL, J. S.,
"Understanding international trade policies. An emerging synthesis", World
Politics, Vol. 43, October 1990, pp. 139-67.(***) SALVATORE, D., International

15
Economics, Macmillan, 1987.(*) SPERO, J.E., The Politics of International
Economic Relations, London, Unwin Hyman Ltd, 1990.(**) STEWART, F.,
"Recent theories of international trade: Some implications for the South", em H.
KIERZKOWSKI (ed.) Monopolistic Competition and International Trade, Oxford,
Clarendon Press, 1984.(***) STRANGE, S., States and Markets: An Introduction
to International Political Economy, New York, Basil Blackwell, 1988.(**) 15

16

Você também pode gostar