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Meio ambiente e Poluição no século XXI

Você é capaz de parar as mudanças climáticas?

Nunca antes na história da civilização humana fomos tão ricos, tão avançados e
poderosos. Ainda assim nos sentimos impotentes diante das mudanças climáticas. O que
parece ser simples, gases de efeito estufa aprisionam a energia vinda do sol e a mantém na
nossa atmosfera. Isso causa invernos menos frios, verões mais quentes, piora a seca em
lugares secos e aumenta a pluviosidade de lugares chuvosos. Inúmeros ecossistemas irão
morrer enquanto os mares engolirão as regiões costeiras das cidades onde vivemos. Como
prevenir tudo isso? O debate público acerca das mudanças climáticas tende a focar em alguns
pontos principais, como termelétricas, carros e vacas arrotando, logo as soluções mais fácil
seriam energia solar, andar de bicicleta, qualquer discurso de sustentabilidade e
responsabilidade pessoal; focando em como você deveria mudar seu estilo de vida para
prevenir as rápidas mudanças climáticas.
A sociedade moderna construída nos últimos 150 anos é altamente prejudicial para o
planeta. Basicamente tudo que utilizamos para tornar nossas vidas mais fácil, segura e
confortável está tornando a biosfera pior. Da comida que consumimos, da roupa que usamos,
da estrada que construímos que pisamos em cima, da tecnologia que usamos, sejam
smartphones, computadores, smartwatches, ao ar condicionado que deixa a temperatura mais
agradável, tudo tem uma pegada de CO2. Enquanto a maior parte da população sabe sobre os
impactos da produção agropecuária, produção energética, a emissão de carros e aviões,
muitos outros aspectos altamente poluentes da vida moderna, mal são mencionados. As
emissões vindas de aterros sanitários são tão significantes daquelas vindas de toda a aviação,
cerca de 940 milhões de toneladas de CO2. Em 2016, 5.4 bilhões de toneladas de CO2 foram
emitidas para manter o funcionamento residencial, principalmente do hemisfério norte - onde o
uso do aquecimento é indispensável no inverno - em comparação com 3.5 bilhões de toneladas
emitidos por transporte rodoviário. A emissão produzida ao fabricar um carro novo é
equivalente a construir 2 metros de rodovia, 5.6 toneladas para aquele e 5.2 toneladas de CO2
para este. Logo, é bom trocar para um carro elétrico, mas não é isso que vai resolver o
problema, quando a estrada que estamos andando em cima tem equivalente a mesma pegada
de emissão de carbono.
Muitas das soluções que temos não são facilmente aplicáveis, porque muita das vezes
estão inseridas dentro de um debate numa área muito cinzenta, moralmente falando, por
exemplo, a divisão da responsabilidade e das ações de ricos e pobres. Existe uma clara
conexão entre a riqueza e prosperidade de uma nação e sua porcentagem de emissão de
carbono. Pessoas mais ricas tendem a emitir mais, logo, a solução mais simplista seria que
toda a população mais rica abrisse mão de grande parte de seu estilo de vida. Entretanto, isso
apenas atenuaria mas não resolveria o problema, cerca de 63% das emissões globais vêm de
países emergentes ou subdesenvolvidos. Criar riqueza automaticamente aumenta a emissão, e
exigir de países pobres que diminuam suas emissões pode parecer uma tentativa de mantê-los
pobres. É complicado exigir de um país que ele mantenha e preserve suas florestas e que
invista seu dinheiro em placas solares ao invés de carvão quando ele não consegue suprir suas
necessidades básicas a um nível adequado de sua população. Cortar emissões não é uma
demanda popular, principalmente se essas demandas estão sendo feitas por países que se
tornaram ricos com os danos causados ao planeta no passado. Para bilhões de pessoas mais
emissões significa, a um nível mais pessoal, uma coisa boa. Quando essas considerações são
deixadas de lado, tende-se a propor soluções inaplicáveis. Tome como por exemplo o concreto,
cerca de 8% de toda emissão de CO2 vem da produção de concreto. Ele é muito barato pois é
de fácil produção e é a principal matéria prima nas construções de países em desenvolvimento.
Na tentativa de diminuir as emissões de gases de efeito estufa, nem a dieta alimentar
escapa. Estimativas preveem que até 2080 a população humana no planeta será de 10 bilhões,
não é possível produzir tanta comida sem emitir gases. Em 2016, a produção de arroz liberou
tanto gás metano quanto a aviação. Quanto mais calórica a comida que consumimos, mais gás
ela emite, 57% das emissões de comida vem de origem animal, embora ela seja somente 18%
do suprimento de caloria global e 37% da proteína global. Quanto mais uma nação vai ficando
rica, mais carne sua população consome, embora tradicionalmente na maioria das culturas, a
dieta alimentar era mais baseada em produtos naturais, plantas vegetais, com uma adição de
carne. Com o crescimento da agropecuária e da indústria da carne, ela se tornou um alimento
padrão nas mesas de países desenvolvidos, e até símbolo de status em países
subdesenvolvidos. Cerca de 38,5% de toda terra habitável no mundo é utilizada para produção
de carne, equivalente a todo continente americano. Todo esse território poderia ser território
natural, florestas inteiras, que absorveriam toneladas de gases da atmosfera, mas que é
utilizada para alimentar vacas. Apenas uma parcela muito pequena da população está disposta
a deixar de comer carne, existe um grande fator cultural e psicológico aí. Outro ponto é que
esse discurso pode ser facilmente transferido para outro ponto, como comparar com a emissão
de termelétrica, da aviação e a lista continua “ad nauseam”.
Acontece que deixar de comer carne também não resolverá as mudanças climáticas,
entretanto, sem que diminuamos o consumo de carne, dificilmente vamos frear as mudanças
climáticas, e o mesmo se aplica às outras coisas não essenciais para nossa vida, mas que
dificilmente nos livraremos delas, tal qual aviação, transporte por navios, mineração e a
produção das tecnologias que usamos hoje. Isso significa que devemos abdicar do estilo de
vida que temos hoje em dia? Não existe alguma tecnologia capaz de nos salvar e permitir que
continuemos avançando enquanto sociedade, construindo grandes centros urbanos,
tecnologias cada vez melhores, produzindo cada vez mais alimentos e consumindo carne?
Sendo direto, essa tecnologia já existe, chamada de Direct Air Capture of CO2 (tradução livre
Captura de CO2 direta do ar), que como o nome diz captura o CO2 do ar que pode depois ser
armazenado e/ou utilizado industrialmente. O que impossibilita a aplicação dessa tecnologia
em massa são seus custos, cerca de 10 trilhões de dólares, metade do PIB dos EUA, e muito,
mas muito mais que o PIB brasileiro. Esse dinheiro todo tem que vir de algum lugar e jogar todo
ele nas indústrias mais poluentes, como mineradoras, termelétricas de carvão aumentariam os
custos dessas indústrias e acabariam falindo. Outra alternativa seria os governos financiarem
esse custo, mas o que muitos governos do mundo fazem é justamente o oposto, criam
subsídios para indústrias poluentes, como no Brasil por exemplo, cerca de R$ 670 milhões são
destinados para a indústria de carvão. Essas políticas são difíceis de serem desfeitas, já que
são elas que mantêm artificialmente baixo os preços das coisas que são consumidas no
dia-a-dia, desde o supermercado, até as roupas na vitrine, o que impacta a vida de bilhões de
pessoas no mundo, que cria lobbies políticos, que mantém as regras do jogo como estão, e por
consequência o ciclo de financiamento e subsídios, fazendo com que seja muito difícil parar a
produção de combustíveis fósseis.
Pode-se argumentar que a solução seria nos livrarmos do capitalismo, ou que os
mercados deveriam não ter qualquer intervenção estatal como subsídios, ou até mesmo que
devemos abandonar a busca pelo crescimento per se, retornar a um passado da espécie onde
tudo isso não existia. A verdade é que até o momento nenhum sistema político demonstrou ter
capacidade de solucionar o problema, e o Relógio do Apocalipse está correndo enquanto
debatemos teorias do que deve ser feito. Voltando à pergunta inicial desse texto: 'você é capaz
de parar as mudanças climáticas?’ Parece claro e ao mesmo tempo amedrontador admitir que
não, enquanto indivíduo não podemos parar as mudanças climáticas. A narrativa atual tem
colocado toda a responsabilidade no indivíduo, “compre um carro elétrico, instale placa solares,
reduza o consumo de carne, não faça isso, não faça aquilo, tudo isso é apenas para desviar o
foco dos maiores emissores, e trazer um alívio mental de estar fazendo o mínimo, ao mesmo
tempo que a indústria continue ganhando dinheiro vendendo essas soluções fáceis. Mesmo se
toda a população dos países ricos mudassem seu estilo de vida e a população dos países
emergentes não buscassem o crescimento e desenvolvimento, o problema não seria resolvido.
Durante o primeiro ano da pandemia do coronavírus, que ainda não acabou, onde vários
países decretaram lockdowns e houve uma grande queda de produção e consumo de tudo,
não houve uma mudança expressiva na emissão de gases, cerca de apenas 7% em
comparação ao ano anterior. Todo o trabalho do indivíduo é ínfimo dentro de uma cadeia
sistêmica de emissão. Se um indivíduo eliminasse 100% das emissões para o resto da vida,
numa estimativa de 70 anos de vida, apenas 1 segundo das emissões globais seriam afetadas.
Posto dessa forma, o desafio traz apenas cansaço, tristeza e desesperança, o que pode
levar o indivíduo a negligenciar mais ainda suas ações. Dessa forma, o que um indivíduo pode
realmente fazer para fazer a diferença? Devemos tratar o problema de forma sistêmica, um
problema sistêmico necessita de soluções sistêmicas. É necessário engajamento político, que
as pessoas que estão na tomada de decisões, decisões que afetam a vida de bilhões de
pessoas no mundo, que elas que as pessoas que os colocam nessas posições querem
mudanças e soluções. E se essas pessoas que estão no poder não quiserem tomar as
decisões difíceis, com medo de perda de dinheiro de campanhas, de lobbies de empresas, que
elas percam seus mandatos, que sejam trocados por outros políticos que realmente se
importam e queiram fazer a diferença, tomando decisões que passam por tudo, desde
produção e transporte de comida, energia, construções e estradas. Se essas indústrias se
recusam a mudar seus hábitos é necessário criação de leis, leis que visem o investimentos em
tecnologias que irão ajudar no combate às mudanças climáticas, mas também que a
população, que tem poder de boicote e elas precisam de lucro, pressione por mudanças.
Nenhuma medida será 100% popular e alguém ficará insatisfeito, porém pelo bem do planeta e
da maioria é justificável. Dificilmente todas as medidas serão tomadas a níveis globais, mas
tem que começar em algum ponto, de forma que, como num efeito dominó, as mudanças vão
acontecendo e contribuindo de fato nesse grande desafio para a raça humana e para o planeta.

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