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1 Véra Motta 1
O sentido da letra
Desde sua fundação por Freud, a psicanálise enquanto teoria tem seus
pressupostos básicos fundamentados na linguagem humana, cujas leis são correlativas
às que regem o inconsciente freudiano. Com seu retorno a Freud, Jacques Lacan vem
operar uma revolução nos conceitos e postulados da teoria e prática psicanalíticas,
radicalizando, por assim dizer, o pensamento freudiano. Sua máxima, hoje tornada
quase universal, segundo a qual o inconsciente é estruturado como uma linguagem, é
por si só definidora da posição que ocupa a linguagem na psicanálise com Lacan.
No parágrafo inicial da Parte I, cujo título se anuncia acima, Lacan (1998a)
reitera sua tese: o que a experiência psicanalítica desvela, no inconsciente, é toda a
estrutura da linguagem. E o que ela encontra? A letra. Em sua definição primeira, letra é
o “suporte material que o discurso concreto toma emprestado da linguagem” (LACAN,
1998a, p. 498).
Por materialidade da letra, entende Márcio Peter Leite (1998) não no sentido
molecular da matéria, de corpo, mas no sentido de “tudo aquilo que produz efeito”.
Trata-se, para este autor, da ideia de letra como uma construção psíquica e teórica para
falar de algo que produz efeitos, mas que não é passível de ser vista. Por discurso,
adotemos a leitura de Jorge Massanet (1998), para quem o discurso localiza-se de forma
equidistante, a meio caminho entre a linguagem e a fala de Saussure. O discurso
participa, a seu ver, do caráter transindividual da língua e do sujeito intersubjetivo da
fala.
Importa considerar aqui a dupla condição para a definição proposta por Lacan:
a) que a linguagem não se confunde com as funções somáticas e psíquicas que se
produzem no sujeito falante; e b) que a linguagem, com sua estrutura, preexiste à
entrada do sujeito num dado momento de seu desenvolvimento mental.
O sujeito é assim servo da linguagem e do discurso, tendo seu lugar inscrito
desde o nascimento, sob a forma do nome próprio. Basta ver como na trajetória de um
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indivíduo, por exemplo, a designação de seu nome traz consequências que o fazem
interrogar, na análise, a razão dessa escolha, vendo aí não um simples acaso ou
circunstância, mas sobredeterminações ou múltiplas causalidades que certamente
surpreenderiam aquele ou aquela que tramou, sem o saber, tal designação.
O conceito de letra na teoria lacaniana conhece diferentes acepções. Em “A
instância da letra...”, que se situa num período qualificado pelos comentadores da obra
de Lacan como próprio do Simbólico, pode-se definir a letra dentro da noção de cadeia
significante. Por cadeia significante, entende-se uma sequência ao infinito de tal sorte
que é necessário, para produzir uma cadeia, isolar algo que valha por uma unidade.
Assim, “anéis cujo colar se fecha no anel de um outro colar feito de anéis” (LACAN,
1998a, p. 505) são a modalidade que constitui uma cadeia significante, deduzida da
segunda propriedade do significante.
Para amparar sua definição de letra em “A instância...”, Lacan recorre às duas
dimensões apontadas por Jakobson (1995) em seu artigo de importância capital para a
reviravolta lacaniana da teoria psicanalítica: “Dois aspectos da linguagem e dois tipos
de afasia”. Trata-se da combinação e da seleção, ou, no dizer de Lacan, “duas vertentes
do efeito significante do que aqui chamamos de letra, na criação da significação”.
(1998a, p. 498).
A tese de Jakobson (1995) no artigo que mencionamos, é a de que a afasia é um
problema linguístico, retomando os pressupostos de Hughlings Jackson (1915). Em
primeiro lugar, Jakobson reconhece a regressão afásica como um espelho da aquisição
de sons da fala pela criança, ou seja, ela nos mostra o desenvolvimento de uma criança
ao inverso. Ademais, adverte que a pesquisa sobre a ordem das aquisições e das perdas
e sobre as leis gerais de implicação não pode ser limitada ao sistema fonológico, mas
deve estender-se ao sistema gramatical.
Para Jakobson (1995), os modos de arranjo do signo linguístico se repartem em
dois: a combinação e a seleção. Esses modos de arranjo estabelecem o duplo caráter da
linguagem, aspectos essenciais também na fala. A combinação pressupõe a concorrência
de entidades simultâneas e a concatenação de entidades sucessivas, sob os quais os
constituintes linguísticos se combinam em unidades cada vez mais complexas, do nível
fônico ao sintático. Isso significa que qualquer unidade linguística serve, ao mesmo
tempo, de contexto para unidades mais simples e/ou encontra seu próprio contexto em
uma unidade linguística mais complexa. Combinação e contextura são as duas faces de
uma mesma operação. A exemplo, podemos dizer que uma unidade linguística como a
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sílaba [ba] pode servir de contexto para uma unidade mais simples, como o fonema [b]
e encontra por sua vez seu contexto em uma unidade mais complexa, como a palavra
bala; esta, por sua vez, inclui-se numa unidade de complexidade maior, como a frase A
bala do garoto é de hortelã ou ainda em A bala perdida atingiu o garoto.
A seleção, por sua vez, implica a possibilidade de um termo substituir outro,
equivalente ao primeiro num aspecto e diferente noutro. A exemplo, podemos retomar a
sílaba [ba] do primeiro modo de arranjo, e substituir o fonema [b] pelo fonema [p], uma
consoante igualmente oclusiva, bilabial, mas diferente de [b] apenas pelo traço de
sonoridade, presente neste último e ausente em [p].
Seleção e substituição, como combinação e contextura, são faces de uma mesma
operação. Os constituintes de qualquer mensagem estão necessariamente ligados ao
código por uma relação interna e à mensagem por uma relação externa. A linguagem,
em seus diferentes aspectos, utiliza os dois modos de relação.
O exemplo que trazemos para ilustrar os dois modos de arranjo do signo é
retirado do próprio Jakobson (1995). Trata-se do diálogo entre Alice e o Gato de
Cheshire (capítulo 6, “Porco e pimenta”) da obra de Lewis Carroll (1980), Aventuras de
Alice no país das maravilhas. Na versão que utilizamos da obra, a fala do Gato é a
seguinte: “–Você disse ‘leitão’ ou ‘letão’? perguntou o Gato. – Eu disse ‘leitão’,
respondeu Alice”. (CARROLL, 1980, p. 83) Na versão dos tradutores do artigo de
Jakobson, temos: “‘Você disse porco ou porto?’ perguntou o Gato. ‘Eu disse porco,
respondeu Alice’”.(JAKOBSON, (1995), p. 37)
Dentro desses enunciados, o destinatário felino esforça-se por captar uma
escolha linguística feita pelo remetente. No primeiro caso, leitão/letão, a diferença
repousa entre, de um lado, uma vogal oral média, anterior, fechada, seguida de uma
semivogal linguopalatal, e, de outro, apenas uma vogal oral média, anterior, fechada. Na
segunda versão, porco/porto, a diferença reside entre uma consoante oclusiva velar
surda e uma consoante oclusiva linguodental surda. No último exemplo, graças apenas a
um traço distintivo, velar/linguodental, pôde Alice escolher (seleção) um dos dois
termos opostos e, no mesmo ato de fala, ela combinou (combinação) essa solução com
alguns outros traços simultâneos: /k/ é surdo, em oposição a /g/, sonoro; oclusivo,
distinto de /x/, fricativa velar surda. Desse modo, todos esses atributos foram
selecionados e combinados em um feixe de traços distintivos no que se chama um
fonema. O fonema /k/ em porco é precedido pelos fonemas /p/ /o/ /x/ e seguido por /o/,
sendo todos esses fonemas conjuntos de traços distintivos produzidos simultaneamente.
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A B
mais diversas, constitui o eixo que veio a ser designado posteriormente de eixo do
paradigma, embora Saussure (1979) não lhe tenha emprestado tal designação.
Relações sintagmáticas e relações associativas ou paradigmáticas, para Saussure
(1979) definem-se segundo dois aspectos: “A relação sintagmática existe in praesentia;
repousa em dois ou mais termos igualmente presentes numa série efetiva. Ao contrário,
a relação associativa une termos in absentia numa série mnemônica virtual”. (p.143).
Voltemos ao texto lacaniano. A reviravolta teórica procedida por Jacques Lacan,
encontrando suporte na teoria linguística, não se contenta em reconstituir os passos de
Saussure (1979) e Jakobson (1995), mas, ao contrário, estende ao máximo os limites da
teoria, numa formalização cada vez mais rigorosa. Neste artigo, Lacan (1998a, p. 500)
aponta o algoritmo da ciência linguística:
S
s
e “que se lê significante sobre significado, correspondendo ‘o sobre’ à barra que separa
as duas etapas”. (LACAN, 1998a, p. 500)
O algoritmo é, na ciência matemática, um processo de cálculo ou de resolução
de um grupo de problemas semelhantes, em que se estipulam, com generalidade e sem
restrições, regras formais para a obtenção do resultado ou da solução do problema. O
recurso à formalização matemática em Lacan aparece desde cedo, e vai encontrar sua
expressão máxima nos matemas. De acordo com Geneviève Morel (1989), a pretensão
da psicanálise com relação ao matema se justifica por uma analogia, não por uma
identidade entre a matemática e o discurso analítico: as duas não operam senão pela
linguagem, e fabricam um saber que dá acesso ao real.
Como vemos, o algoritmo da ciência linguística recebe de Lacan tratamento
diverso da concepção do mestre genebrino. Em Saussure (1979, p.80), o esquema do
signo define as relações associativas entre seus dois elementos, uma relação íntima e
estreita, em que um reclama a presença do outro, de tal modo que um sem o outro não
pressupõe a existência sígnica.
Em Lacan, o algoritmo define uma prevalência, ou seja, uma posição dominante
do significante sobre o significado, de maneira que a barra entre essas duas ordens de
elementos tem uma função: a de resistir à significação. (LACAN, 1998a, p. 500).
Roland Barthes, em Elementos de semiologia (1979), analisa o tratamento
lacaniano do esquema do signo em Saussure, afirmando que o grafismo utilizado por
Lacan é espacializado, diferente da representação saussuriana em dois pontos: a) o
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Conceito
Imagem
acústica
Daí Lacan afirmar: “Por essa via, as coisas não podem fazer mais que
demonstrar que nenhuma significação se sustenta a não ser pela remissão a uma outra
significação”. (1998a, p. 501). Neste sentido, considera ilusória a pretensão de que o
significante possa atender à função de representar o significado, ou seja, de que o
significante responda de algum modo por uma significação qualquer.
Para melhor ilustrar sua posição, Lacan recorre ao exemplo saussuriano da
representação do signo, em que, na parte superior, aparece o desenho de uma árvore, e,
no piso inferior, a palavra latina arbor (árvore, em português). (SAUSSURE, 1979, p.
81)
Arbor
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HOMENS MULHERES
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S ...............
s................ (LACAN, Anexo ao Seminário livro 5, 1999, p.527)
S s (id.ibid.)
S S’
Nesse esquema articula-se para Lacan (1998b) o que ele designa de ponto de
basta, pelo qual o significante detém o deslizamento da significação, de outro modo
indefinido. Desse ponto de basta, assinala o autor, encontra-se a função diacrônica na
frase, “na medida em que ela só fecha sua significação com seu último termo, sendo
cada termo antecipado na construção dos outros e, inversamente, selando-lhes o sentido
por seu efeito retroativo”. (LACAN, 1998b, p. 820). Daí Lacan afirmar, em “A
instância...”, “que o significante, por sua natureza, sempre se antecipa ao sentido,
desdobrando como que adiante dele sua dimensão”. (1998a, p. 505)
Dois pontos de cruzamento nesse primeiro grafo interessam-nos aqui: um,
conotado por A, é o lugar do tesouro do significante, o que Lacan (1998b) faz não
equivaler ao código, na medida em que, para ele, “o significante só se constitui por uma
reunião sincrônica e enumerável, na qual qualquer um só se sustenta pelo princípio de
sua oposição a cada um dos demais” (LACAN, 1998b, p. 820). O outro ponto, ele o
designa por s (A), significado do Outro, equivalente à pontuação, ponto em que a
significação constitui-se como produto acabado.
Cumpre assinalar na teoria lacaniana a dissimetria entre A e s (A): o primeiro,
um local, mais lugar do que espaço; o outro, um momento, mais escansão do que
duração. “Ambos participam da oferta ao significante que o furo no real constitui, um
como um oco de receptação, outro como brocagem para a saída” (LACAN, 1998b, p.
822). Em A, Lacan institui o lugar do Outro, sítio prévio do puro sujeito do significante,
que ocupa a posição mestra de dominação.
S s(A) A
S’
S ∆
O esquema do ponto de basta foi apresentado por Lacan no seu seminário sobre
as psicoses, na aula de 6 de junho de 1956, quase um ano antes da escrita do artigo “A
instância da letra...”. Para ilustrá-lo, Lacan (1985, p.295) recorre ao esquema de
Saussure da língua, em que este faz representar a língua em seu conjunto, como uma
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Metonímia e metáfora
Quanto às duas figuras de estilo indicadas por Jakobson (1995) como modos de
arranjo do signo linguístico, e apontadas por Lacan (1998a) para representar as
modalidades de funcionamento do aparelho linguageiro que estrutura o inconsciente,
vejamos a seguinte passagem:
O que essa estrutura da cadeia significante revela é a possibilidade que
eu tenho, justamente na medida em que sua língua me é comum com
outros sujeitos, isto é, em que essa língua existe, de me servir dela
para expressar algo completamente diferente do que ela diz. Função
mais digna de ser enfatizada na fala que a de disfarçar o pensamento
(quase sempre indefinível) do sujeito: a saber, a de indicar o lugar
desse sujeito na busca da verdade. (LACAN, 1998a, p. 508, grifo do
autor)
Para Lacan (1998a), a função propriamente significante que se desenha na
linguagem tem um nome, que ele encontra entre as figuras de estilo, ou tropos: é a
metonímia, e o exemplo que dá é retirado de Quintiliano: “trinta velas”, metonímia para
“barco”. (LACAN, 1998a, p. 509). Sua explicação, logo a seguir, dá indicações seguras
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de que se trata, em realidade, de uma sinédoque: “Com efeito, a parte tomada pelo todo,
dizíamos a nós mesmos, se a coisa é para ser tomada no real, não nos deixa uma grande
ideia do que convém entender sobre a importância da frota que, no entanto, essas trinta
velas supostamente aquilatam”. (LACAN, 1998a, p. 509)
Tomemos o trabalho de Sigmund Freud (1897, p. 361), mais exatamente um
exemplo de sonho, referido por este na Carta 73 a Wilhelm Fliess, datada de 31 de
outubro de 1897, em que Freud faz referência a um sonho de Ana, sua filha de um ano e
meio à época, como um sonho de realização de desejo: “Molangos, com molangos,
omelete, pudim”. O cardápio recitado no sono tem a ver com a abstinência forçada da
criança, que havia vomitado em razão de ter comido morangos na véspera. Trata-se de
recurso metonímico.
Em “A instância...”, vemos aparecer o primeiro exemplo de metáfora: “Seu feixe
não era nem avaro nem odiento...” (LACAN, 1998a, p. 510), em que se verifica a
presença da metáfora a partir da atribuição de qualidades (avaro e odiento) a um mero
feixe, que outro não é senão Booz, personagem de Victor Hugo, de onde foi extraído o
verso do poema. Se feixe remete a Booz, ele o substitui na cadeia significante, ou seja,
ele equivale, no enunciado, ao outro. Vejamos a definição de metáfora de Lacan e sua
aplicação ao exemplo.
A centelha criadora da metáfora não brota da presentificação de duas
imagens, isto é, de dois significantes igualmente atualizados. Ela brota
entre dois significantes dos quais um substituiu o outro, assumindo
seu lugar na cadeia significante, enquanto o significante oculto
permanece presente em sua conexão (metonímica) com o resto da
cadeia (LACAN, 1998a, p. 510).
Se a metáfora brota, por assim dizer, entre dois significantes, feixe e Booz, dos
quais um substitui o outro, o significante oculto – Booz – permanece presente pela sua
conexão metonímica com o resto da cadeia – seu feixe. Uma palavra por outra, eis a
fórmula da metáfora para Lacan: "Se o feixe remete a Booz, como efetivamente faz, é
por substituí-lo na cadeia significante, no exato lugar que o esperava, por ter-se elevado
em um grau mediante a remoção do entulho da avareza e do ódio. (LACAN, 1998a, p.
511).
Nessa operação, diz Lacan (1998a), há uma espécie de usurpação, em que o feixe
usurpa, por assim dizer, as qualidades que seriam atribuíveis a Booz. Adiante, declara:
Portanto, é entre o significante do nome próprio de um homem e
aquele que o abole metaforicamente que se produz a centelha poética,
ainda mais eficaz aqui, para realizar a significação da paternidade, por
reproduzir o evento mítico em que Freud reconstruiu a trajetória, no
inconsciente de todo homem, do mistério paterno (LACAN, 1998a, p.
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511).
Outro exemplo de metáfora utilizado por Lacan no mesmo artigo é “O amor é
um seixo rindo ao sol” (LACAN, 1998a, p. 512), em que a metáfora se coloca no ponto
exato em que o sentido se produz no que Lacan define como não sentido, não senso,
cujo exemplo exemplar é o dito do espírito, ou chiste, ao qual Freud dedicou uma
alentada análise 1. O esclarecimento dessa questão nos remete ao Seminário de Lacan
(1985) sobre as psicoses, mais exatamente às aulas de 2 e 9 de maio de 1956, que
constituem, respectivamente, os capítulos “Metáfora e Metonímia (I): ‘Sa gerbe n'était
point avare, ni haineuse” e “Metáfora e Metonímia (II): articulação significante e
transferência de significado”.
Nessas aulas, Lacan (1985) irá analisar, entre outros aspectos, a estrutura de
discurso de um psicótico, a partir de exemplos coligidos do escrito produzido por
Daniel Paul Schreber, em que frases como “Agora é o momento que... ele seja
mortificado!” (LACAN, 1985, p. 246) são interrompidas, para que as vozes d’almas as
completem.
Segundo Lacan (1985), a voz se detém no ponto em que obriga o sujeito a
proferir a significação de que se trata na frase, ou seja, as vozes forçam, por assim dizer,
Schreber a enunciar a frase que atenta contra ele próprio. O sujeito, desse modo, no
discurso da alucinação é, ao mesmo tempo, agente e paciente, pois o delírio é tanto mais
sofrido por ele quanto menos ele o organiza.
1
Ver FREUD (1905). Os Chistes e Sua Relação com o Inconsciente.
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BIBLIOGRAFIA COMPLEMENTAR
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Paulo: Cultrix, 1979.
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1899). Edição Standard Brasileira das Obras Psicológicas Completas de Sigmund
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_____ (1905). Os chistes e sua relação com o inconsciente. Edição Standard
Brasileira das Obras Psicológicas Completas de Sigmund Freud. Rio de Janeiro: Imago,
1977, v. VIII.
_____ (1911). Notas psicanalíticas sobre um relato autobiográfico de um caso de
paranoia (dementia paranoides). In: _____. O caso de Schreber, artigos sobre técnica
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Completas de Sigmund Freud. Rio de Janeiro: Imago, 1969, v. XII.
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MOREL, Geneviève. Escrituras do matema. La lettre mensuelle, 80, Paris, França,
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e Albert Sechehaye. 9 ed. Tradução de Antônio Chelini, José Paulo Paes e Izidoro
Blikstein. São Paulo: Cultrix, [1979].
STAROBINSKI, Jean. As palavras sob as palavras; os anagramas de Ferdinand de
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