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HISTÓRIA DA TECNOLOGIA E MEIO AMBIENTE1

A história da tecnologia é quase tão antiga Professor: Paulo Gilberto


quanto a história da humanidade, segue desde quando Mossmann Sobrinho
os seres humanos começaram a usar ferramentas de Contato:
caça e de proteção. A tecnologia é consequentemente sobrinho.historia@gmail.com
embutida na cronologia do uso dos recursos naturais, Ementa: - Orientar o conhecimento
porque para serem criadas todas essas ferramentas para a compreensão da intervenção
são necessários recursos naturais adequados. A da ação humana na modificação das
paisagens geográficas, e as
história da tecnologia segue uma progressão das consequências dessas modificações
ferramentas simples e das fontes de energia simples às na sociedade contemporânea.
ferramentas complexas e às fontes de energia - Reconhecer a Revolução Industrial
complexa. As tecnologias mais antigas converteram como elemento de modificação social
recursos naturais em ferramentas simples. e ambiental, assim como as diversas
teorias que propunham sugestões
A tecnologia evoluiu ao longo dos anos e hoje durante o processo inicial da referida
somos uma sociedade verdadeiramente tecnológica. revolução.
Não conseguimos viver sem tecnologia, esta é a - Identificar os motivos que levaram ao
realidade e, se de um momento para o outro nos início das políticas de proteção
ambiental; analisar os motivos pelo
retirassem todas as nossas gadgets, nós deixávamos
qual as empresas atualmente
de viver! passaram a aplicar uma política mais
O ser humano, dotado de sua inteligência, significativa de proteção ambiental.
buscou formas, durante toda a história, de vencer os
obstáculos impostos pela natureza. Dessa forma, foi
desenvolvendo e inventando instrumentos tecnológicos
com o objetivo de superar dificuldades. Podemos dizer
que a necessidade é a mãe das grandes invenções
tecnológicas.

CRITÉRIOS DE AVALIAÇÃO DA DISCIPLINA DE HISTÓRIA DA TECNOLOGIA

Prova individual ou em dupla


Atividades diversas (pesquisas e tarefas extraclasse)
Trabalho em grupo
Qualitativa

A nota qualitativa, além do respeito das normas gerais da escola está atribuída às
seguintes observações:

- Responsabilidade pelos materiais utilizados e pelo seu ambiente de trabalho;


- Colaboração e participação de atividades em equipe;
- Responsabilidade com os prazos e metas previstas em cada atividade;
- Participação efetiva em aula;
- Comprometimento com o estudo dos conteúdos desenvolvidos;
- Frequência;
- Respeito e bom relacionamento com sua equipe de trabalho.

1Texto adaptado do site: http://escolainformaticablog.wordpress.com/2012/10/24/tudo-sobre-a-historia-da-tecnologia/ acesso em


11/02/2014
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SUMÁRIO

PREFÁCIO SOBRE A REVOLUÇÃO INDUSTRIAL 3

REVOLUÇÃO INDUSTRIAL 4

FATORES DA REVOLUÇÃO INDUSTRIAL 8

REVOLUÇÃO INDUSTRIAL 10

CONSEQUÊNCIAS DA REVOLUÇÃO INDUSTRIAL 19

HISTÓRIA DO DIREITO DO TRABALHO NO MUNDO E NO BRASIL 22

A INDUSTRIALIZAÇÃO NO BRASIL 25

CASA GRANDE & SENZALA – GILBERTO FREIRE 31

BARÃO DE MAUÁ 38

ORIGENS E ETAPAS DA INDUSTRIALIZAÇÃO NO BRASIL 41

A NOVA DINÂMICA ECONÔMICA COM OS IMIGRANTES TEUTOS NO 47

A INFLUÊNCIA DA NATUREZA NOS ACONTECIMENTOS HISTÓRICOS 51

A NATUREZA PREDATÓRIA EUROPEIA 54

DESMATAMENTO CIVILIZADOR: 55

OS IMPACTOS DA IMIGRAÇÃO ALEMÃ NO ESPAÇO NATURAL DO VALE DO


PARANHANA (RS): UMA ANÁLISE CRÍTICA SOBRE A OCUPAÇÃO DA REGIÃO
ATRAVÉS DA HISTÓRIA AMBIENTAL 65

PRIMEIRA CONFERÊNCIA BRASILEIRA DE PROTEÇÃO À NATUREZA 77

ANALISE DA TESE “A FIGUEIRA E O MACHADO” 79

QUATRO CAMPOS DO PENSAMENTO ECOLÓGICO (ECOLOGIA NATURAL,


ECOLOGIA SOCIAL, CONSERVACIONISMO E ECOLOGISMO) 81
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PREFÁCIO SOBRE A REVOLUÇÃO INDUSTRIAL2

Desde a Pré-História o homem tem transformado matérias-primas (pedras, barro,


peles, lã, trigo, etc.) em produtos úteis à sua sobrevivência. Trata-se de um antigo
método de transformação a que denominou artesanato. Nesse sistema, o artesão
trabalhava por contra própria, possuía os instrumentos (meios de produção) necessários
à confecção do produto, dominando todas as etapas da transformação, da matéria-prima
até chegar ao produto final. Tomando o sapateiro da Idade Média como exemplo,
verificamos que era ele quem preparava o couro que lhe pertencia, cortava-o com sua
tesoura ou faca e costurava-o com linhas e agulhas próprias, até ter pronto o sapato
(produto final), que ele venderia a algum interessado.
Já na Idade Moderna, buscando-se produzir crescentemente para o mercado, os
trabalhadores urbanos foram, muitas vezes, reunidos num mesmo local de trabalho, cada
um desempenhando uma atividade específica, utilizando principalmente as mãos para
transformar a matéria-prima, fez surgir a denominada “manufatura”. Esse sistema de
produção caracterizou-se basicamente pela divisão do trabalho e aumento da
produtividade. Dessa forma, numa fábrica manufatureira de tecidos do século XVII, por
exemplo, um trabalhador fiava, outro cortava até que a peça de pano ficasse pronta.
Finalmente, como o desenvolvimento da economia capitalista, a produção de
artigos para o mercado passou a ser feita em série com máquinas, dando origem às
maquinofaturas industriais. Os trabalhadores passaram a participar do processo
produtivo apenas com a força de trabalho que aplicavam na produção, já que os meios
de produção (instalações, máquinas, capitais, etc.) pertenciam à elite industrial, à classe
burguesa.
O uso de máquinas em grande escala foi implantado na Inglaterra a partir de 1760,
aproximadamente. Teve profunda influência sobre a economia mundial, ocasionando
significativas mudanças sociais, políticas e culturais para o homem contemporâneo. A
esse processo de alteração estrutural da economia, que marcou o início da Idade
Contemporânea, chamamos de Revolução Industrial. Para a sua eclosão, porém, foi
decisiva a acumulação de capitais verificada entre os séculos XV e XVIII.

2 Texto adaptado do site: http://www.portalbrasil.net/historiageral_revolucaoindustrial.htm


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REVOLUÇÃO INDUSTRIAL3
Renan Bardine

Dá-se o nome de Revolução Industrial a uma série de mudanças nas atividades


produtivas, iniciadas por volta de 1760 na Inglaterra. Naquela época e nas décadas
seguintes, o processo de produção foi acelerado por uma sequência de invenções cujo
ponto central era a utilização do vapor como força motriz.
A evolução técnica foi o cerne da Revolução Industrial, mas não seu elemento
único. Considerando que o termo revolução, em seu significado histórico, indica um
conjunto de transformações profundas, a Revolução Industrial corresponde plenamente
a essa acepção.
No plano técnico, houve alterações não apenas na produção de bens de capital
(máquinas, equipamentos) e de artigos de consumo, como também nas técnicas agrí-
colas e nos meios de transporte. Mas, acima de tudo, a Revolução Industrial foi marcada
pelas modificações econômicas e sociais. E acarretou ainda mudanças no campo
político, intelectual e comportamental.
A Revolução Industrial foi, portanto, um acontecimento histórico de enorme
amplitude, implicando transformações tão extensas que merecem ser denominadas
revolucionárias.
As mudanças tecnológicas, econômicas e sociais registradas entre 1760 e 1860
correspondem à Primeira Revolução Industrial. O período caracterizou-se pelo uso
das máquinas a vapor, feitas de ferro e tendo como combustível o carvão mineral.
Na década de 1860, o trinômio vapor-carvão-ferro começou a ser substituído pela
eletricidade, petróleo e aço, dando início à Segunda Revolução Industrial.

Etapas da atividade industrial

A palavra indústria é de formação latina; em seu sentido original, indicava o modo


de transformar matérias-primas em produtos a ser utilizados ou consumidos. Nessa
acepção, a indústria abrange três processos: o artesanato, a manufatura e a
maquinofatura - sendo os dois primeiros anteriores à Revolução Industrial.
O artesanato é a forma mais simples de indústria. Nele, todas as fases da
produção são realizadas pela mesma pessoa. Por exemplo: na tecelagem, quem
produzia fios também os tecia. Como o artesão trabalhava em casa, auxiliado apenas
pela família, esse tipo de atividade industrial é conhecido como sistema doméstico de
produção.
A manufatura representa um estágio mais avançado da atividade industrial. Nela,
um certo número de trabalhadores é concentrado no local da produção, onde ocorre uma
divisão do trabalho ou especialização: o processo produtivo é segmentado e cada
trabalhador passa a executar uma tarefa específica, sem precisar se deslocar ou trocar
de ferramentas. Com isso, há um ganho de produtividade. As manufaturas surgiram na
Europa Ocidental durante a Baixa Idade Média, impulsionadas pelo Renascimento
Comercial e Urbano.

3 Disponível em: http://www.coladaweb.com/historia/revolucao-industrial Acesso em 23/02/2015.


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A maquinofatura, que caracteriza a


Revolução Industrial, distingue-se pelo emprego
de máquinas, as quais substituem tanto as
ferramentas dos artesãos como os equipamentos
utilizados nas manufaturas.
Devemos portanto lembrar que a palavra
indústria pode, eventualmente, ser aplicada a
situações anteriores à Revolução Industrial. Claro
que, nesses casos, ela terá o sentido de
artesanato ou de manufatura - nunca o de
maquinofatura.
No artesanato, o produtor gozava de certa independência, graças à propriedade
dos instrumentos de produção. Com o advento das manufaturas, muitos trabalhadores
domésticos autônomos tomaram-se assalariados. Deixaram de comprar matéria-prima e
de ter ferramentas próprias, as quais passaram para o controle de seu empregador
(geralmente um grande comerciante que também era dono da manufatura). Dessa forma,
o ex-artesão receberia apenas o pagamento de seu trabalho, sem qualquer participação
nos possíveis lucros resultantes da venda dos produtos.
Uma variante do sistema doméstico de produção, surgida com o Renascimento
Comercial e Urbano e que sobreviveu durante um longo período, foram as oficinas
artesanais. Nestas, o proprietário trabalhava juntamente com alguns empregados, os
quais recebiam salários ou, em certos casos, tinham participação nas vendas. Esse foi
o sistema disciplinado pelas corporações de ofício da Baixa Idade Média.
Na Idade Moderna, apesar da crescente importância da manufatura, o sistema
doméstico de produção e as oficinas artesanais continuaram a existir, embora em
condições cada vez mais precárias.

Fatores da Revolução Industrial Inglesa

Diversos fatores contribuíram para fazer da Inglaterra o país pioneiro na


industrialização. Além dos elementos propriamente técnicos (inventos relacionados com
a produção têxtil, aperfeiçoamentos na metalurgia e emprego do vapor como força
motriz), devemos considerar aspectos econômicos, sociais, políticos e mentais.
O fator fundamental para a Revolução Industrial ter começado na Inglaterra foi de
ordem econômica: a grande acumulação primitiva de capitais realizada pela burguesia
do país na Idade Moderna.
As práticas mercantilistas carrearam para a Inglaterra uma imensa quantidade de
ouro e prata (metais amoedáveis, portanto equivalentes a dinheiro), acrescida de outras
formas de acumulação, como a pirataria e o tráfico negreiro. Essa disponibilidade
financeira iria facilitar os investimentos na indústria.
Por outro lado, desde o Ato de Navegação de 1651, e sobretudo após vencerem
a Holanda (até então a potência marítima hegemônica), os ingleses expandiram seu co-
mércio em escala mundial. A supremacia naval assegurou-lhes o domínio das rotas
oceânicas e, consequentemente, dos mercados consumidores e fontes de matérias-
primas.
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Outro aspecto econômico foi o fato de a Inglaterra, apesar de relativamente pobre


em recursos minerais, possuir abundantes jazidas de ferro e carvão- este último
necessário como combustível para produzir vapor, mas ainda mais importante na
metalurgia do ferro.
Entre os fatores sociais da Revolução Industrial, o mais relevante foi a ascensão
da burguesia inglesa, tanto em termos de força econômica como de poder político e
prestígio social. Tal ascensão teve duas causas interligadas: o enriquecimento
proporcionado pela expansão do comércio e a vitória contra o absolutismo, alcançada
com as Revoluções Inglesas do século XVII.
Outro destacado fator socioeconômico foi a enorme disponibilidade de mão-de-
obra, pois um grande número de desempregados (os quais Marx chama de exército de
reserva) inibe as reivindicações de quem estiver contratado e mantém os salários baixos,
aumentando os lucros dos empresários.
À época da Revolução Industrial, havia nas cidades inglesas milhares de pessoas
sem trabalho - em sua maioria, deslocadas das áreas rurais por força dos cercamentos.
Estes haviam começado no século XV, com a finalidade de proteger as áreas cultivadas
contra a voracidade dos rebanhos de ovinos. No século XVIII, o processo de cercar os
campos intensificou-se, em detrimento da classe dos yeomen - pequenos produtores
rurais viviam da agricultura, do pastoreio e, frequentemente, também da produção de lã.
Apoiada pela burguesia no Parlamento, a aristocracia fundiária ampliou o
cercamento das áreas rurais. Muitos yeomen, despojados das terras que cultivavam,
concentraram-se nas cidades, à disposição das manufaturas urbanas e da nascente
Revolução Industrial.
No plano político, as Revoluções Inglesas do século XVII (Puritana e Gloriosa)
deram à burguesia capitalista participação efetiva no governo do país. Isso fez com que,
no século XVIII, as autoridades implementassem medidas de incremento ao comércio,
tais como melhorar as estradas, abrir canais e modernizai' os portos. A circulação de
mercadorias foi facilitada, tanto pela eliminação de algumas taxas como pela
uniformização de outras.
Finalmente, há que considerar os fatores mentais (ou psicológicos) da Revolução
Industrial. Assim, ao analisar as atividades econômicas na Inglaterra durante os séculos
XVII e XVIII, não se pode menosprezar a influência do puritanismo. Embora este não
fosse o ramo protestante majoritário no país, ganhara forte impulso nos cem anos
anteriores à Revolução Industrial. Ora, a ética calvinista dos puritanos contribuiu para o
desenvolvimento do capitalismo, pois incentivava o trabalho e a poupança, além de
considerar o enriquecimento uma demonstração do favor de Deus e indício da salvação
da alma.

A Revolução Industrial fora da Europa

O primeiro país a realizar a Revolução Industrial foi a Inglaterra, a partir de


meados do século XVIII, seguida, no século XIX, por outras nações europeias:
Alemanha, Itália, Bélgica, Luxemburgo, Holanda, Suíça, Suécia, Áustria, e Rússia.
Fora do continente europeu, apenas Estados Unidos e Japão realizaram sua
Revolução Industrial ao mesmo tempo que os países da Europa. Na grande maioria dos
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países subdesenvolvidos o processo de industrialização chegou cerca de duzentos anos


atrasado em relação a Inglaterra. É ocaso da Revolução Industrial no Brasil, Argentina,
México, África do Sul, Índia...
O espaço geográfico dos países altamente industrializados da Europa Ocidental
caracteriza-se pelo menos por três aspectos: intensa industrialização, forte urbanização
e grande aproveitamento do aspecto físico por uma agricultura e pecuária em bases
modernas.
A Revolução Industrial dos Países da Europa ocidental apoiou-se em vários
fatores, que resumidamente são:
• Acumulação de capitais em decorrência da intensa exploração da atividade
comercial no mundo e particularmente nas colônias americanas, nas feitorias e nas
colônias asiáticas e africanas.
• Existência de abundantes reservas de carvão mineral, minério de ferro e
outras matérias primas industriais em muitos países europeus.
• Grande desenvolvimento das técnicas de produção mediante a aplicação de
dinheiro em pesquisas cientificas.
• Disponibilidade de mão de obra e intensa exploração da força de trabalho do
operário ou trabalhador mediante o pagamento de baixos salários.
• Expansão de empresas multinacionais ou transnacionais nos países
subdesenvolvidos.
Surgiram então, no séc. XIX, as estradas de ferro, que facilitaram muito o
transporte dos produtos manufaturados, tomando-os mais baratos e colaborando para a
Revolução Industrial. A invenção dos alto-fornos desenvolveu muito as indústrias de ferro
e aço. A população das cidades aumentou demais: um número cada vez maior de
pessoas deixava o campo para trabalhar nas fábricas. O povo sofreu bastante com os
vários problemas ligados a salários e condições de trabalho, tendo a Grã-Bretanha que
importar cada vez mais gêneros alimentícios para suprir sua população sempre
crescente.
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FATORES DA REVOLUÇÃO INDUSTRIAL4


Cristiana Gomes

As máquinas foram inventadas, com o propósito de poupar o tempo do trabalho


humano. Uma delas era a máquina a vapor que foi construída na Inglaterra durante o
século XVIII. Graças a essas máquinas, a produção de mercadorias ficou maior e os
lucros também cresceram. Vários empresários; então, começaram a investir nas
indústrias.
Ilustração da paisagem inglesa
durante a Revolução Industrial. As
grandes chaminés expelindo fumaça
representava desenvolvimento.
Com tanto avanço, as fábricas
começaram a se espalhar pela Inglaterra
trazendo várias mudanças. Esse período
é chamado pelos historiadores de
Revolução Industrial e ela começou na
Inglaterra.
A burguesia inglesa era muito rica e durante muitos anos continuou ampliando
seus negócios de várias maneiras:
• Financiando ataques piratas (corsários);
• Traficando escravos;
• Emprestando dinheiro a juros;
• Pagando baixos salários aos artesãos que trabalhavam nas manufaturas;
• Vencendo guerras;
• Comerciando;
• Impondo tratados a países mais fracos.
Os ingleses davam muita importância ao comércio (quanto mais comércio havia,
maior era a concorrência).
Quando se existe comércio, existe concorrência e para acabar com ela, era
preciso baixar os preços. Logo, a burguesia inglesa começou a aperfeiçoar suas
máquinas e a investir nas indústrias.
Vários camponeses foram trabalhar nas fábricas e formaram uma nova classe
social: o proletariado.
O desenvolvimento industrial arruinou os artesãos, pois os produtos eram
confeccionados com mais rapidez nas fábricas. A valorização da ciência, a liberdade
individual e a crença no progresso incentivaram o homem a inventar máquinas.
O governo inglês dava muita importância à educação e aos estudos científicos e
isso também favoreceu as descobertas tecnológicas.
Graças à Marinha Inglesa (que era a maior do mundo e estava em quase todos
os continentes) a Inglaterra podia vender seus produtos em quase todos os lugares do
planeta.

4 Disponível em site: http://www.infoescola.com/historia/revolucao-industrial/acesso em 23/02/2015.


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No século XIX a Revolução Industrial chegou até a França e com o


desenvolvimento das ferrovias cresceu ainda mais.
Em 1850, chegou até a Alemanha e só no final do século XIX; na Itália e na Rússia,
já nos EUA, o desenvolvimento industrial só se deu na segunda metade do século XIX.
No Japão, só nas últimas décadas do século XIX, quando o Estado se ligou à
burguesia (o governo emprestava dinheiro para os empresários que quisessem ampliar
seus negócios, além de montar e vender indústrias para as famílias ricas), é que
a industrialização começou a crescer. O Estado japonês esforçava-se ao máximo para
incentivar o desenvolvimento capitalista e industrial.
Adam Smith (pensador escocês) escreveu em 1776 o livro “A Riqueza das
Nações”, nessa obra (que é considerada a obra fundadora da ciência econômica), Smith
afirma que o individualismo é bom para toda a sociedade.
Para ele, o Estado deveria interferir o mínimo possível na economia. Adam Smith
também considerava que as atividades que envolvem o trabalho humano são
importantes e que a indústria amplia a divisão do trabalho aumentando a produtividade,
ou seja, cada um deve se especializar em uma só tarefa para que o trabalho renda mais.
A Revolução Industrial trouxe riqueza para os burgueses; porém, os trabalhadores
viviam na miséria. Muitas mulheres e crianças faziam o trabalho pesado e ganhavam
muito pouco, a jornada de trabalho variava de 14 a 16 horas diárias para as mulheres, e
de 10 a 12 horas por dia para as crianças.
Enquanto os burgueses se reuniam em grandes festas para comemorar os lucros,
os trabalhadores chegavam à conclusão que teriam que começar a lutar pelos seus
direitos.
O chamado Ludismo foi uma das primeiras formas de luta dos trabalhadores. O
movimento ludista era formado por grupos de trabalhadores que invadiam as fábricas e
quebravam as máquinas. Os ludistas conseguiram algumas vitórias, por exemplo, alguns
patrões não reduziram os salários com medo de uma rebelião.
Além do ludismo, surgiram outras organizações operárias, além dos sindicatos e
das greves.
Em 1830, formou-se na Inglaterra o movimento cartista. Os cartistas redigiram um
documento chamado “Carta do Povo” e o enviaram ao parlamento inglês. A principal
reivindicação era o direito do voto para todos os homens (sufrágio universal masculino),
mas somente em 1867 esse direito foi conquistado.
Thomas Malthus foi um economista inglês que afirmava que o crescimento da
população era culpa dos pobres que tinham muitos filhos e não tinham como alimentá-
los. Para ele, as catástrofes naturais e as causadas pelos homens tinham o papel de
reduzir a população, equilibrando, assim, a quantidade de pessoas e a de comida.
Além disso, Malthus criticava a distribuição de renda. O seu raciocínio era muito
simples: os responsáveis pelo desenvolvimento cultural eram os ricos e cobrar impostos
deles para ajudar os pobres era errado, afinal de contas era a classe rica que patrocinava
a cultura.
O Parlamento inglês (que aparentemente pensava como Malthus) adotou, em
1834, uma lei que abolia qualquer tipo de ajuda do governo aos pobres. A desculpa
usada foi a que ajudando os pobres, a preguiça seria estimulada. O desamparo serviria
como um estímulo para que eles procurassem emprego.
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REVOLUÇÃO INDUSTRIAL5

A Revolução Industrial consistiu em um conjunto de mudanças tecnológicas com


profundo impacto no processo produtivo em nível econômico e social. Iniciada na
Inglaterra em meados do século XVIII, expandiu-se pelo mundo a partir do século XIX.
Ao longo do processo (que de acordo com alguns autores se registra até aos
nossos dias), a era agrícola foi superada, a máquina foi suplantando o trabalho humano,
uma nova relação entre capital e trabalho se impôs, novas relações entre nações se
estabeleceram e surgiu o fenômeno da cultura de massa, entre outros eventos.
Essa transformação foi possível devido a uma combinação de fatores, como o
liberalismo econômico, a acumulação de capital e uma série de invenções, tais como o
motor a vapor. O capitalismo tornou-se o sistema econômico vigente.

Contexto histórico

Antes da Revolução Industrial, a atividade produtiva era artesanal e manual (daí


o termo manufatura), no máximo com o emprego de algumas máquinas simples.
Dependendo da escala, grupos de artesãos podiam se organizar e dividir algumas etapas
do processo, mas muitas vezes um mesmo artesão cuidava de todo o processo, desde
a obtenção da matéria-prima até à comercialização do produto final. Esses trabalhos
eram realizados em oficinas nas casas dos próprios artesãos e os profissionais da época
dominavam muitas (se não todas) etapas do processo produtivo.
Com a Revolução Industrial os trabalhadores perderam o controle do processo
produtivo, uma vez que passaram a trabalhar para um patrão (na qualidade de
empregados ou operários), perdendo a posse da matéria-prima, do produto final e do
lucro. Esses trabalhadores passaram a controlar máquinas que pertenciam aos donos
dos meios de produção os quais passaram a receber todos os lucros. O trabalho
realizado com as máquinas ficou conhecido por maquinofatura.
Esse momento de passagem marca o ponto culminante de uma evolução
tecnológica, econômica e social que vinha se processando na Europa desde a Baixa
Idade Média, com ênfase nos países onde a Reforma Protestante tinha conseguido
destronar a influência da Igreja Católica: Inglaterra, Escócia, Países Baixos, Suécia. Nos
países fiéis ao catolicismo, a Revolução Industrial eclodiu, em geral, mais tarde, e num
esforço declarado de copiar aquilo que se fazia nos países mais avançados
tecnologicamente: os países protestantes.
De acordo com a teoria de Karl Marx, a Revolução Industrial, iniciada na Grã-
Bretanha, integrou o conjunto das chamadas Revoluções Burguesas do século XVIII,
responsáveis pela crise do Antigo Regime, na passagem do capitalismo comercial para
o industrial. Os outros dois movimentos que a acompanham são a Independência dos
Estados Unidos e a Revolução Francesa que, sob influência dos princípios iluministas,
assinalam a transição da Idade Moderna para a Idade Contemporânea. Para Marx, o
capitalismo seria um produto da Revolução Industrial e não sua causa.

5
Disponível em: http://www.administradores.com.br/artigos/economia-e-financas/revolucao-industrial/27484/
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Com a evolução do processo, no plano das Relações Internacionais, o século XIX


foi marcado pela hegemonia mundial britânica, um período de acelerado progresso
econômico-tecnológico, de expansão colonialista e das primeiras lutas e conquistas dos
trabalhadores. Durante a maior parte do período, o trono britânico foi ocupado pela rainha
Vitória (1837-1901), razão pela qual é denominado como Era Vitoriana. Ao final do
período, a busca por novas áreas para colonizar e descarregar os produtos maciçamente
produzidos pela Revolução Industrial produziu uma acirrada disputa entre as potências
industrializadas, causando diversos conflitos e um crescente espírito armamentista que
culminou, mais tarde, na eclosão, da Primeira Guerra Mundial (1914).

O pioneirismo da Grã-Bretanha

A Grã-Bretanha foi pioneira no processo da Revolução Industrial por diversos


fatores:
• Pela aplicação de uma política econômica liberal desde meados do século XVIII. Antes
da liberalização econômica, as atividades industriais e comerciais estavam cartelizadas
pelo rígido sistema de guildas, razão pela qual a entrada de novos competidores e a
inovação tecnológica eram muito limitados. Com a liberalização da indústria e do
comércio ocorreu um enorme progresso tecnológico e um grande aumento da
produtividade em um curto espaço de tempo.
• O processo de enriquecimento britânico adquiriu maior impulso após a Revolução
Inglesa, que forneceu ao seu capitalismo a estabilidade que faltava para expandir os
investimentos e ampliar os lucros.
• A Grã-Bretanha firmou vários acordos comerciais vantajosos com outros países. Um
desses acordos foi o Tratado de Methuen, celebrado com a decadência da monarquia
absoluta portuguesa, em 1703, por meio do qual conseguiu taxas preferenciais para os
seus produtos no mercado português.
• A Grã-Bretanha possuía grandes reservas de ferro e de carvão mineral em seu subsolo,
principais matérias-primas utilizadas neste período. Dispunham de mão-de-obra em
abundância desde a Lei dos Cercamentos de Terras, que provocou o êxodo rural. Os
trabalhadores dirigiram-se para os centros urbanos em busca de trabalho nas
manufaturas.
• A burguesia inglesa tinha capital suficiente para financiar as fábricas, adquirir matérias-
primas e máquinas e contratar empregados.
Para ilustrar a relativa abundância do capital que existia na Inglaterra, pode se
constatar que a taxa de juros no final do século XVIII era de cerca de 5% ao ano; já na
China, onde praticamente não existia progresso econômico, a taxa de juros era de cerca
de 30% ao ano.

O liberalismo de Adam Smith

As novidades da Revolução Industrial trouxeram muitas dúvidas. O pensador


escocês Adam Smith procurou responder racionalmente às perguntas da época. Seu
livro A Riqueza das Nações (1776) é considerado uma das obras fundadoras da ciência
econômica. Ele dizia que o egoísmo é útil para a sociedade. Seu raciocínio era este:
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quando uma pessoa busca o melhor para si, toda a sociedade é beneficiada. Exemplo:
quando uma cozinheira prepara uma deliciosa carne assada, você saberia explicar quais
os motivos dela? Será porque ama o seu patrão e quer vê-lo feliz ou porque está
pensando, em primeiro lugar, nela mesma ou no pagamento que receberá no final do
mês? De qualquer maneira, se a cozinheira pensa no salário dela, seu individualismo
será benéfico para ela e para seu patrão. E por que um açougueiro vende uma carne
muito boa para uma pessoa que nunca viu antes? Porque deseja que ela se alimente
bem ou porque está olhando para o lucro que terá com futuras vendas? Graças ao
individualismo dele o freguês pode comprar boa carne. Do mesmo jeito, os trabalhadores
pensam neles mesmos. Trabalham bem para poder garantir seu salário e emprego.
Portanto, é correto afirmar que os capitalistas só pensam em seus lucros. Mas,
para lucrar, têm que vender produtos bons e baratos. O que, no fim, é ótimo para a
sociedade.
Então, já que o individualismo é bom para toda a sociedade, o ideal seria que as
pessoas pudessem atender livremente a seus interesses individuais. E, para Adam
Smith, o Estado é quem atrapalhava a liberdade dos indivíduos. Para o autor escocês,
"o Estado deveria intervir o mínimo possível sobre a economia". Se as forças do mercado
agissem livremente, a economia poderia crescer com vigor. Desse modo, cada
empresário faria o que bem entendesse com seu capital, sem ter de obedecer a nenhum
regulamento criado pelo governo. Os investimentos e o comércio seriam totalmente
liberados. Sem a intervenção do Estado, o mercado funcionaria automaticamente, como
se houvesse uma "mão invisível" ajeitando tudo. Ou seja, o capitalismo e a liberdade
individual promoveriam o progresso de forma harmoniosa.

Principais avanços tecnológicos


• Século XVII
• 1698 - Thomas Newcomen, em Staffordshire, na Grã-Bretanha, instala um motor a
vapor para esgotar água em uma mina de carvão.
• Século XVIII
• 1708 - Jethro Tull (agricultor), em Berkshire, na Grã-Bretanha, inventa a primeira
máquina de semear puxada a cavalo, permitindo a mecanização da agricultura.
• 1709 - Abraham Darby, em Coalbrookdale, Shropshire, na Grã-Bretanha, utiliza o
carvão para baratear a produção do ferro.
• 1733 - John Kay, na Grã-Bretanha, inventa uma lançadeira volante para o tear,
acelerando o processo de tecelagem.
• 1740 - Benjamin Huntsman, em Handsworth, na Grã-Bretanha, descobre a técnica do
uso de cadinho para fabricação de aço.
• 1761 - Abertura do Canal de Bridgewater, na Grã-Bretanha, primeira via aquática
inteiramente artificial.
• 1764 - James Hargreaves, na Grã-Bretanha, inventa a fiadora "spinning Jenny", uma
máquina de fiar rotativa que permitia a um único artesão fiar oito fios de uma só vez.
• 1765 - James Watt, na Grã-Bretanha, introduz o condensador na máquina de
Newcomen, componente que aumenta consideravelmente a eficiência do motor a vapor.
• 1768 - Richard Arkwright, na Grã-Bretanha, inventa a "spinning-frame", uma máquina
de fiar mais avançada que a "spinning jenny”.
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• 1771 - Richard Arkwright, em Cromford, Derbyshire, na Grã-Bretanha, introduz o


sistema fabril em sua tecelagem ao acionar a sua máquina - agora conhecida como
"water-frame" - com a força de torrente de água nas pás de uma roda.
• 1776 - 1779 - John Wilkinson e Abraham Darby, em Ironbridge, Shrobsihire, na Grã-
Bretanha, constroem a primeira ponte em ferro fundido.
• 1779 - Samuel Crompton, na Grã-Bretanha, inventa a "spinning mule", combinação da
"water frame" com a "spinning jenny", permitindo produzir fios mais finos e resistentes. A
mule era capaz de fabricar tanto tecido quanto duzentos trabalhadores, apenas utilizando
alguns deles como mão-de-obra.
• 1780 - Edmund Cartwright, de Leicestershire, na Grã-Bretanha, patenteia o primeiro
tear a vapor.
• 1793 - Eli Whitney, na Geórgia, Estados Unidos da América, inventa o descaroçador
de algodão.
• 1800 - Alessandro Volta, na Itália, inventa a bateria elétrica.
• Século XIX
• 1803 - Robert Fulton desenvolveu uma embarcação a vapor na Grã-Bretanha.
• 1807 - A iluminação de rua, a gás, foi instalada em Pall Mall, Londres, na Grã-Bretanha.
• 1808 - Richard Trevithick expôs a "London Steam Carriage", um modelo de locomotiva
a vapor, em Londres, na Grã-Bretanha.
• 1825 - George Stephenson concluiu uma locomotiva a vapor, e inaugura a primeira
ferrovia, entre Darlington e Stockton-on-Tees, na Grã-Bretanha.
• 1829 - George Stephenson venceu uma corrida de velocidade com a locomotiva
"Rocket", na linha Liverpool - Manchester, na Grã-Bretanha.
• 1830 - A Bélgica e a França iniciaram as respectivas industrializações utilizando como
matéria-prima o ferro e como força-motriz o motor a vapor.
• 1843 - Cyrus Hall McCormick patenteou a segadora mecânica, nos Estados Unidos da
América.
• 1844 - Samuel Morse inaugurou a primeira linha de telégrafo, de Washington a
Baltimore, nos Estados Unidos da América.
• 1856 - Henry Bessemer patenteia um novo processo de produção de aço que aumenta
a sua resistência e permite a sua produção em escala verdadeiramente industrial.
• 1865 - O primeiro cabo telegráfico submarino é estendido através do leito do oceano
Atlântico, entre a Grã-Bretanha e os Estados Unidos da América.
• 1869 - A abertura do Canal de Suez reduziu a viagem marítima entre a Europa e a Ásia
para apenas seis semanas.
• 1876 - Alexander Graham Bell inventou o telefone nos Estados Unidos da América (em
2002 o congresso norte-americano reconheceu postumamente o italiano Antonio Meucci
como legítimo inventor do telefone).
• 1877 - Thomas Alva Edison inventou o fonógrafo nos Estados Unidos da América.
• 1879 - A iluminação elétrica foi inaugurada em Mento Park, New Jersey, nos Estados
Unidos da América.
• 1885 - Gottlieb Daimler inventou um motor a explosão.
• 1895 - Guglielmo Marconi inventou a radiotelegrafia na Itália.
14

O motor a vapor

As primeiras máquinas a vapor foram construídas na Inglaterra durante o século


XVIII. Retiravam a água acumulada nas minas de ferro e de carvão e fabricavam tecidos.
Graças a essas máquinas, a produção de mercadorias aumentou muito. E os lucros dos
burgueses donos de fábricas cresceram na mesma proporção. Por isso, os empresários
ingleses começaram a investir na instalação de indústrias.
As fábricas se espalharam rapidamente pela Inglaterra e provocaram mudanças
tão profundas que os historiadores atuais chamam aquele período de Revolução
Industrial. O modo de vida e a mentalidade de milhões de pessoas se transformaram,
numa velocidade espantosa. O mundo novo do capitalismo, da cidade, da tecnologia e
da mudança incessante triunfou.
As máquinas a vapor bombeavam a água para fora das minas de carvão. Eram
tão importantes quanto as máquinas que produziam tecidos.
As carruagens viajavam a 12 km/h e os cavalos, quando se cansavam, tinham de
ser trocados durante o percurso. Um trem da época alcançava 45 km/h e podia seguir
centenas de quilômetros. Assim, a Revolução Industrial tornou o mundo mais veloz.

A classe trabalhadora

A produção manual que antecede à Revolução Industrial conheceu duas etapas


bem definidas, dentro do processo de desenvolvimento do capitalismo:
• O artesanato foi a forma de produção industrial característica da Baixa Idade Média,
durante o renascimento urbano e comercial, sendo representado por uma produção de
caráter familiar, na qual o produtor (artesão) possuía os meios de produção (era o
proprietário da oficina e das ferramentas) e trabalhava com a família em sua própria casa,
realizando todas as etapas da produção, desde o preparo da matéria-prima, até o
acabamento final; ou seja não havia divisão do trabalho ou especialização para a
confecção de algum produto. Em algumas situações o artesão tinha junto a si um
ajudante, porém não assalariado, pois realizava o mesmo trabalho pagando uma “taxa”
pela utilização das ferramentas.
• É importante lembrar que nesse período a produção artesanal estava sob controle das
corporações de ofício, assim como o comércio também se encontrava sob controle de
associações, limitando o desenvolvimento da produção.
• A manufatura, que predominou ao longo da Idade Moderna e na Antiguidade Clássica,
resultou da ampliação do mercado consumidor com o desenvolvimento do comércio
monetário. Nesse momento, já ocorre um aumento na produtividade do trabalho, devido
à divisão social da produção, onde cada trabalhador realizava uma etapa na confecção
de um único produto. A ampliação do mercado consumidor relaciona-se diretamente ao
alargamento do comércio, tanto em direção ao oriente como em direção à América. Outra
característica desse período foi a interferência do capitalista no processo produtivo,
passando a comprar a matéria-prima e a determinar o ritmo de produção.
A partir da máquina, fala-se numa primeira, numa segunda e até terceira e quarta
Revoluções Industriais. Porém, se concebermos a industrialização como um processo,
seria mais coerente falar-se num primeiro momento (energia a vapor no século XVIII),
15

num segundo momento (energia elétrica no século XIX) e num terceiro e quarto
momentos, representados respectivamente pela energia nuclear e pelo avanço da
informática, da robótica e do setor de comunicações ao longo dos séculos XX e XXI
(aspectos, porém, ainda discutíveis).
Na esfera social, o principal desdobramento da revolução foi a transformação nas
condições de vida nos países industriais em relação aos outros países da época,
havendo uma mudança progressiva das necessidades de consumo da população
conforme novas mercadorias foram sendo produzidas.
A Revolução Industrial alterou profundamente as condições de vida do trabalhador
braçal, provocando inicialmente um intenso deslocamento da população rural para as
cidades. Criando enormes concentrações urbanas; a população de Londres cresceu de
800 000 habitantes em 1780 para mais de 5 milhões em 1880, por exemplo. Durante o
início da Revolução Industrial, os operários viviam em condições horríveis se
comparadas às condições dos trabalhadores do século seguinte. Muitos dos
trabalhadores tinham um cortiço como moradia e ficavam submetidos a jornadas de
trabalho que chegavam até a 80 horas por semana. O salário era medíocre (em torno de
2.5 vezes o nível de subsistência) e tanto mulheres como crianças também trabalhavam,
recebendo um salário ainda menor.
A produção em larga escala e dividida em etapas iria distanciar cada vez mais o
trabalhador do produto final, já que cada grupo de trabalhadores passava a dominar
apenas uma etapa da produção, mas sua produtividade ficava maior. Como sua
produtividade aumentava os salários reais dos trabalhadores ingleses aumentaram em
mais de 300% entre 1800 até 1870. Devido ao progresso ocorrido nos primeiros 90 anos
de industrialização, em 1860 a jornada de trabalho na Inglaterra já se reduzia para cerca
de 50 horas semanais (10 horas diárias em cinco dias de trabalho por semana).
Horas de trabalho por semana para trabalhadores adultos nas indústrias têxteis:
• 1780 - em torno de 80 horas por semana
• 1820 - 67 horas por semana
• 1860 - 53 horas por semana
• 2007 - 46 horas por semana
Segundo os socialistas, o salário, medido a partir do que é necessário para que o
trabalhador sobreviva (deve ser notado de que não existe definição exata para qual seja
o "nível mínimo de subsistência"), cresceu à medida que os trabalhadores pressionam
os seus patrões para tal, ou seja, se o salário e as condições de vida melhoraram com o
tempo, foi graças à organização e aos movimentos organizados pelos trabalhadores.

Movimentos

Alguns trabalhadores, indignados com sua situação, reagiam das mais diferentes
formas, das quais se destacam:

Movimento Ludista (1811-1812)

Reclamações contra as máquinas inventadas após a revolução para poupar a


mão-de-obra já eram normais. Mas foi em 1811 que o estopim estourou e surgiu o
16

movimento ludista, uma forma mais radical de protesto. O nome deriva de Ned Ludd, um
dos líderes do movimento. Os luditas chamaram muita atenção pelos seus atos.
Invadiram fábricas e destruíram máquinas, que, segundo os luditas, por serem mais
eficientes que os homens, tiravam seus trabalhos, requerendo, contudo, duras horas de
jornada de trabalho. Os manifestantes sofreram uma violenta repressão, foram
condenados à prisão, à deportação e até à forca. Os luditas ficaram lembrados como "os
quebradores de máquinas".
Anos depois os operários ingleses mais experientes adotaram métodos mais
eficientes de luta, como a greve e o movimento sindical.

Movimento Cartista (1837-1848)

Em sequência veio o movimento "cartista", organizado pela "Associação dos


Operários", que exigia melhores condições de trabalho como:
• particularmente a limitação de oito horas para a jornada de trabalho
• a regulamentação do trabalho feminino
• a extinção do trabalho infantil
• a folga semanal
• o salário mínimo
Este movimento lutou ainda pelos direitos políticos, como o estabelecimento do
sufrágio universal (apenas para os homens, nesta época) e extinção da exigência de
propriedade para se integrar ao parlamento e o fim do voto censitário. Esse movimento
se destacou por sua organização, e por sua forma de atuação, chegando a conquistar
diversos direitos políticos para os trabalhadores.

As "trade-unions" (união da classe operária)

Os empregados das fábricas também formaram associações denominadas trade


unions, que tiveram uma evolução lenta em suas reivindicações. Na segunda metade do
século XIX, as trade unions evoluíram para os sindicatos, forma de organização dos
trabalhadores com um considerável nível de ideologização e organização, pois o século
XIX foi um período muito fértil na produção de ideias antiliberais que serviram à luta da
classe operária, seja para obtenção de conquistas na relação com o capitalismo, seja na
organização do movimento revolucionário cuja meta era construir o socialismo
objetivando o comunismo. O mais eficiente e principal instrumento de luta das trade
unions era a greve.

A industrialização na Europa: a partir de 1815

Até 1850, a Inglaterra continuou dominando o primeiro lugar entre os países


industrializados. Embora outros países já contassem com fábricas e equipamentos
modernos, esses eram considerados uma "miniatura de Inglaterra", como por exemplo
os vales de Ruhr e Wupper na Alemanha, que eram bem desenvolvidos, porém não
possuíam a tecnologia das fábricas inglesas.
17

Na Europa, os maiores centros de desenvolvimento industrial, na época, eram as


regiões mineradoras de carvão; lugares como o norte da França, nos vales do Rio
Sambre e Meuse, na Alemanha, no vale de Ruhr, e também em algumas regiões da
Bélgica. A Alemanha nessa época ainda não havia sido unificada. Eram 39 pequenos
reinos e dentre esses a Prússia, que liderava a Revolução Industrial. A Alemanha se
unificou em 1871, quando a Prússia venceu a Guerra Franco-Prussiana.
Fora estes lugares, a industrialização ficou presa:
• às principais cidades, como Paris e Berlim;
• aos centros de interligação viária, como Lyon, Colônia, Frankfurt, Cracóvia e Varsóvia;
• aos principais portos, como Hamburgo, Bremen, Roterdã, Le Havre, Marselha;
• a polos têxteis, como Lille, Região do Ruhr, Roubaix, Barmen-Elberfeld (Wuppertal),
Chemmitz, Lodz e Moscou;
• e a distritos siderúrgicos e indústria pesada, na bacia do rio Loire, do Sarre, e da Silésia.

De 1830 a 1929: A Expansão pelo mundo

Após 1830, a produção industrial se descentralizou da Inglaterra e se expandiu


rapidamente pelo mundo, principalmente para o noroeste europeu, e para o leste dos
Estados Unidos da América. Porém, cada país se desenvolveu em um ritmo diferente
baseado nas condições econômicas, sociais e culturais de cada lugar.
Na Alemanha com o resultado da Guerra Franco-prussiana em 1870, houve a
Unificação Alemã que, liderada por Bismarck, impulsionou a Revolução Industrial no país
que já estava ocorrendo desde 1815. Foi a partir dessa época que a produção de ferro
fundido começou a aumentar de forma exponencial.
Na Itália a unificação política realizada em 1870, à semelhança do que ocorreu na
Alemanha, impulsionou, mesmo que atrasada, a industrialização do país. Essa só atingiu
ao norte da Itália, pois o sul continuou basicamente agrário.
Muito mais tarde, começou a industrialização na Rússia, nas últimas décadas do
século XIX. Os principais fatores para que ela acontecesse foram a grande
disponibilidade de mão-de-obra, intervenção governamental na economia através de
subsídios e investimentos estrangeiros à indústria.
Nos Estados Unidos a industrialização começou no final do século XVIII, e foi
somente após a Guerra da Secessão que todo o país se tornou industrializado. A
industrialização relativamente tardia dos EUA em relação à Inglaterra pode ser explicada
pelo fato de que nos EUA existia muita terra per capita, já na Inglaterra existia pouca
terra per capita, assim os EUA tinham uma vantagem comparativa na agricultura em
relação à Inglaterra e consequentemente demorou bastante tempo para que a indústria
ficasse mais importante que a agricultura. Outro fator é que os Estados do sul eram
escravagistas o que retardava a acumulação de capital, como tinham muita terra eram
essencialmente agrários, impedindo a total industrialização do país que até a segunda
metade do século XIX era constituído só pelos Estados da faixa leste do atual Estados
Unidos.
O término do conflito resultou na abolição da escravatura o que elevou a
produtividade da mão de obra. Aumentando assim a velocidade de acumulação de
18

capital, e também muitas riquezas naturais foram encontradas no período incentivando


a industrialização.
A modernização do Japão data do início da era Meiji, em 1867, quando a
superação do feudalismo unificou o país. A propriedade privada foi estabelecida. A
autoridade política foi centralizada possibilitando a intervenção estatal do governo central
na economia, o que resultou no subsidio a indústria. E como a mão-de-obra ficou livre
dos senhores feudais, ocorreu assimilação da tecnologia ocidental e o Japão passou de
um dos países mais atrasados do mundo a um país industrializado.

As consequências da Revolução Industrial

A partir da Revolução Industrial o volume de produção aumentou


extraordinariamente: a produção de bens deixou de ser artesanal e passou a ser
maquinofaturada; as populações passaram a ter acesso a bens industrializados e
deslocaram-se para os centros urbanos em busca de trabalho. As fábricas passaram a
concentrar centenas de trabalhadores, que vendiam a sua força de trabalho em troca de
um salário.
Outra das consequências da Revolução Industrial foi o rápido crescimento
econômico. Antes dela, o progresso econômico era sempre lento (levavam séculos para
que a renda per capita aumentasse sensivelmente), e após, a renda per capita e a
população começaram a crescer de forma acelerada nunca antes vista na história. Por
exemplo, entre 1500 e 1780 a população da Inglaterra aumentou de 3,5 milhões para
8,5, já entre 1780 e 1880 ela saltou para 36 milhões, devido à drástica redução da
mortalidade infantil.
A Revolução Industrial alterou completamente a maneira de viver das populações
dos países que se industrializaram. As cidades atraíram os camponeses e artesãos, e
se tornaram cada vez maiores e mais importantes.
Na Inglaterra, por volta de 1850, pela primeira vez em um grande país, havia mais
pessoas vivendo em cidades do que no campo. Nas cidades, as pessoas mais pobres
se aglomeravam em subúrbios de casas velhas e desconfortáveis, se comparadas com
as habitações dos países industrializados hoje em dia. Mas representavam uma grande
melhoria se comparadas as condições de vida dos camponeses, que viviam em
choupanas de palha. Conviviam com a falta de água encanada, com os ratos, o esgoto
formando riachos nas ruas esburacadas.
O trabalho do operário era muito diferente do trabalho do camponês: tarefas
monótonas e repetitivas. A vida na cidade moderna significava mudanças incessantes.
A cada instante, surgiam novas máquinas, novos produtos, novos gostos, novas modas.
19

CONSEQUÊNCIAS DA REVOLUÇÃO INDUSTRIAL6


Felipe Araújo

Após a Revolução Industrial ocorreu um aumento extraordinário da produção. Isso


aconteceu da seguinte forma: o que era feito artesanalmente, notavelmente os bens de
consumo, começou a chegar à economia a partir da maquinofatura, o que levou bens
industrializados à população, em escala muito maior. Assim, os populares deslocaram-
se aos centros urbanos em busca de trabalho nas fábricas. Desta forma, milhares de
trabalhadores começaram a praticamente viver dentro das fábricas, que naquela época
apresentavam jornadas de trabalho que variavam entre 14 e 16 horas por dia. Esses
operários vendiam sua força de trabalho em troca da remuneração.
Com isso, a economia começou a
crescer de forma rápida, sendo que em
momentos anteriores à Revolução Industrial
a renda per capta aumentava com a demora
de séculos. Sendo assim, a população
começou a crescer de uma forma nunca
vista antes. Apenas como exemplo, no
período entre os anos de 1500 e 1780,
apenas na Inglaterra, houve um aumento
populacional de cerca de 3 milhões de
habitantes para 8 milhões. Em 1880, este
índice já estava em mais de 30 milhões. Isso
ocorreu devido à queda drástica da mortalidade infantil.
Em outro aspecto, a forma de vida em sociedade e o cotidiano da população foram
mudados completamente. Com a Revolução Industrial, os artesãos e, em geral, as
pessoas que viviam no campo, passaram a viver nas cidades e se tornaram ferramentas
fundamentais para a industrialização. Além disso, as urbes simbolizavam progresso e
tornaram-se enormes e de grande importância àquela época.
Em 1850, na Inglaterra, as pessoas mais pobres viviam como podiam.
Aglomeravam-se à margem, em subúrbios, moradias antigas e sem o menor conforto,
além de enfrentarem a insalubridade. A diferença entre a vida na urbe e a vida no campo
era basicamente, que as choupanas saíam de cena, dando a vez aos ratos, esgoto, ruas
esburacadas e falta de água encanada. Em meio à miséria da população mais pobre,
via-se, paradoxalmente, o surgimento de modas, inovações nos bens de consumo e a
formação de uma elite industrial.
De acordo com alguns estudos, com a Revolução Industrial e os novos produtos
e máquinas surgindo a todo minuto, a média de altura dos homens da região norte da
Europa ficou 7,6 centímetros abaixo da dos homens da Alta Idade Média. Ao longo do
tempo, o índice de variação na altura do homem é um dos indicativos do bem estar social.
Percebe-se, à época da Revolução Industrial, que apesar da melhora nos processos de
produção, ocorreu, também, uma desvalorização do ser humano.

6 Disponível em site: http://www.infoescola.com/historia/consequencias-da-revolucao-industrial/ acesso em 23/02/2015.


20

Empresários e Proletários7

O novo sistema industrial transforma as relações sociais e cria duas novas classes
sociais, fundamentais para a operação do sistema. Os empresários (capitalistas) são os
proprietários dos capitais, prédios, máquinas, matérias-primas e bens produzidos pelo
trabalho. Os operários, proletários ou trabalhadores assalariados, possuem apenas sua
força de trabalho e a vendem aos empresários para produzir mercadorias em troca de
salários.
Os avanços da medicina preventiva e sanitária e o controle das epidemias
favorecem o crescimento demográfico. Aumenta assim a oferta de trabalhadores para a
indústria.
No início da revolução os empresários impõem duras condições de trabalho aos
operários sem aumentar os salários para assim aumentar a produção e garantir uma
margem de lucro crescente. A disciplina é rigorosa mas as condições de trabalho nem
sempre oferecem segurança. Em algumas fábricas a jornada ultrapassa 15 horas, os
descansos e férias não são cumpridos e mulheres e crianças não têm tratamento
diferenciado.

Movimentos Operários

Surgem dos conflitos entre operários, revoltados com as péssimas condições de


trabalho, e empresários. As primeiras manifestações são de depredação de máquinas e
instalações fabris. Com o tempo surgem organizações de trabalhadores da mesma área.
Resultado de um longo processo em que os trabalhadores conquistam
gradativamente o direito de associação. Em 1824, na Inglaterra, são criados os primeiros
centros de ajuda mútua e de formação profissional. Em 1833 os trabalhadores ingleses
organizam os sindicatos (trade unions) como associações locais ou por ofício, para obter
melhores condições de trabalho e de vida. Os sindicatos conquistam o direito de
funcionamento em 1864 na França, em 1866 nos Estados Unidos, e em 1869 na
Alemanha.

Curiosidade

Primeiro de maio - É a data escolhida na maioria dos países industrializados para


comemorar o Dia do Trabalho e celebrar a figura do trabalhador. A data tem origem em
uma manifestação operária por melhores condições de trabalho iniciada no dia 1º de
maio de 1886, em Chicago, nos EUA. No dia 4, vários trabalhadores são mortos em
conflitos com as forças policiais. Em consequência, a polícia prende oito anarquistas e
os acusa pelos distúrbios.
Quatro deles são enforcados, um suicida-se e três, posteriormente, são
perdoados. Por essa razão, desde 1894, o Dia do Trabalho, nos Estados Unidos, é
comemorado na primeira segunda-feira de setembro.

7 Texto adaptado do site: http://www.historiadomundo.com.br/idade-moderna/revolucao-industrial.htm acesso em 11/02/2014.


21

Consequência do Processo de Industrialização

As principais são a divisão do trabalho, a produção em série e a urbanização. Para


maximizar o desempenho dos operários as fábricas subdividem a produção em várias
operações e cada trabalhador executa uma única parte, sempre da mesma maneira
(linha de montagem). Enquanto na manufatura o trabalhador produzia uma unidade
completa e conhecia assim todo o processo, agora passa a fazer apenas parte dela,
limitando seu domínio técnico sobre o próprio trabalho.

A revolução Industrial mudou a vida da humanidade.

A vida nas cidades se tornou mais importante que a vida no campo e isso trouxe
muitas consequências: nas cidades os habitantes e trabalhadores moravam em
condições precárias e conviviam diariamente com a falta de higiene, isso sem contar
com o constante medo do desemprego e da miséria.
Por um outro lado, a Revolução Industrial estimulou os pesquisadores,
engenheiros e inventores a aperfeiçoar a indústria. Isso fez com que surgisse novas
tecnologias: locomotivas a vapor, barcos a vapor, telégrafo e a fotografia.
22

HISTÓRIA DO DIREITO DO TRABALHO NO MUNDO E NO BRASIL8


Filipe Siviero

1) Qual a origem da palavra trabalho?

R) Hoje predomina o entendimento de que provém do neutro latino palum, através


do adjetivo tripalis (composto de três paus) de que se deduziu tripalium, designativo de
instrumento feito de três paus aguçados, algumas vezes até munidos de pontas de ferro,
no qual os agricultores batiam as espigas de trigo ou de milho e também o linho, para
debulhar as espigas, rasgar ou esfiar o linho. Era também uma canga que pesava sobre
os animais ou um instrumento de tortura, constituído de cavalete de pau, também usado
para sujeitar os cavalos no ato de lhes aplicar a ferradura. Mais tarde, ganhou o sentido
moral de sofrimento, fadiga, encargo, e depois adquire o sentido de trabalhar, labutar.

2) Na sociedade pré-industrial as relações de trabalho predominantes foram: a


escravidão, a servidão e a locação. Fale sobre cada uma delas.

R) A primeira forma de trabalho foi à escravidão, em que o escravo era considerado


apenas uma coisa, não tendo qualquer direito, muito menos trabalhista. O escravo,
portanto, não era considerado sujeito de direito, pois era propriedade do dominus. Nesse
período, constatamos que o trabalho do escravo continuava no tempo, até de modo
indefinido, ou mais precisamente até o momento em que o escravo vivesse ou deixasse
de ter essa condição. Entretanto, não tinha nenhum direito, apenas o de trabalhar.
Num segundo momento, encontramos a servidão. Era a época do feudalismo, em
que os senhores feudais davam proteção militar e política aos servos, que não eram
livres, mas, ao contrário, tinham de prestar serviços na terra do senhor feudal. Os servos
tinham de entregar parte da produção rural aos senhores feudais em troca da proteção
que recebiam e do uso da terra. Nessa época, o trabalho era considerado um castigo.
Os nobres não trabalhavam.
A locatio conductio é o contrato de arrendamento ou locação de empreitada. Havia
três diferentes operações: a locatio rei, a locatio operarum e a locatio operis faciendi.
Tinha por objetivo regular a atividade de quem se comprometia a locar suas energias ou
resultado de trabalho em troca de pagamento. Assim, estabelecia a organização do
trabalho do homem livre. A locatio rei era o aluguel (arrendamento) de coisas. A locatio
operarum (locação de serviços) é a prestação de serviços. Os serviços eram locados
mediante pagamento. Tinham por objeto os serviços manuais não especializados, de
homens livres. Corresponde ao contrato de prestação de serviços. É apontada como
precedente da relação de emprego moderna. Já a locatio operis faciendi (locação de
obra ou empreitada) era a execução de uma obra, na qual o conductor se comprometia
a trabalhar sobre uma coisa que lhe confiava o locator, sobre promessa de retribuição.

8 Disponível no site: http://www.investidura.com.br/biblioteca-juridica/resumos/direito-do-trabalho/317-hist-dir-trab.html Acesso em

15/03/2011.
23

3) Em que período nasceu e se desenvolveu o direito do trabalho?

R) No século XIX, sucedem fatos, ingredientes sociais que propiciaram o surgimento


do direito do trabalho. O marco principal é a Revolução Industrial, a mecanização do
trabalho humano em setores importantes da economia. Afirma-se que o Direito do
Trabalho e o contrato de trabalho passaram a desenvolver-se com o surgimento da
Revolução Industrial.

4) Qual a principal causa econômica, política e jurídica do aparecimento do


direito do trabalho?

R) Constata-se, na época da Revolução Industrial, que a principal causa econômica


do surgimento da Revolução Industrial foi o aparecimento da máquina a vapor como
fonte energética. Havia necessidade de que as pessoas viessem, também, a operar as
máquinas não só a vapor, mas as máquinas têxteis, o que fez surgir o trabalho
assalariado. Daí nasce uma causa jurídica, pois os trabalhadores começaram a reunir-
se, a associar-se, para reivindicar melhores condições de trabalho e de salários,
diminuição das jornadas excessivas e contra a exploração de menores e mulheres.
Posteriormente, Começa a haver necessidade de intervenção estatal nas relações
do trabalho, dados os abusos que vinham sendo cometidos, de modo geral, pelos
empregadores a ponto de serem exigidos serviços em jornadas excessivas para
menores e mulheres, de mais de 16 horas por dia ou até o pôr-do-sol, pagando metade
ou menos dos salários que eram pagos aos homens. Passa, portanto, a haver um
intervencionismo do Estado, principalmente para realizar o bem-estar social e melhorar
as condições de trabalho.

5) Qual a primeira lei que dispôs sobre a idade mínima para o trabalho o e sobre
a duração diária do trabalho?

R) A Lei de Peel (Moral and Health Act), de 1802, que foi feita por um industrial
inglês, sensibilizado com a condição nefasta a que eram submetidos os menores.
Passou a adotar práticas humanitárias em suas indústrias. A lei teve o propósito de
diminuir a exploração dos trabalhadores menores de idade, proibindo o trabalho noturno
e diminuindo a jornada diurna. Peel lançava os fundamentos de um direito novo e mais
humano.

6) Qual a primeira constituição brasileira a tratar especificamente sobre o


direito do trabalho? Fale sucintamente sobre o tema.

R) A Constituição de 1934 é a primeira constituição brasileira a tratar


especificamente do Direito do Trabalho. É a influência do constitucionalismo social, que
em nosso país só veio a ser sentida em 1934. Garantia a liberdade sindical, isonomia
salarial, salário mínimo, jornada de oito horas de trabalho, proteção do trabalho das
mulheres e menores, repouso semanal, férias anuais remuneradas (art. 121).
24

7) Como podemos entender a CF de 1937 sob o aspecto político? Explique.

R) A carta Constitucional de 10-11-1937 marca uma fase intervencionista do Estado,


decorrente do golpe de Getúlio Vargas. Era uma Constituição de cunho eminentemente
corporativista, inspirada na Carta del Lavoro, de 1927, e na Constituição polonesa. O
próprio art. 140 da referida Carta era claro no sentido de que a economia era organizada
em corporações, sendo consideradas órgãos do Estado, exercendo função delegada de
poder público. O Conselho de Economia Nacional tinha por atribuição promover a
organização corporativa da economia nacional (art. 61, a). Dizia Oliveira Viana, sociólogo
e jurista - que foi o inspirador de nossa legislação trabalhista da época - que o liberalismo
econômico era incapaz de preservar a ordem social, daí a necessidade da intervenção
do Estado para regular tais situações. A Constituição de 1937 instituiu o sindicato único,
imposto por lei, vinculado ao Estado, exercendo funções delegadas de poder público,
podendo haver intervenção estatal direta em suas atribuições. Foi criado o imposto
sindical, como uma forma de submissão das entidades de classe ao Estado, pois este
participava do produto de sua arrecadação. Estabeleceu-se a competência normativa
dos tribunais do trabalho, que tinha por objetivo principal evitar o entendimento direto
entre trabalhadores e empregadores. A greve e o lockout foram considerados recursos
antissociais, nocivos ao trabalho e ao capital e incompatíveis com os interesses da
produção nacional (art. 139).

8) O que é CLT? Quando nasceu e qual seu objetivo?

R) Existiam várias normas esparsas sobre os mais diversos assuntos trabalhistas.


Houve a necessidade de sistematização dessas regras. Para tanto, foi editado o Decreto-
lei n.º 5.452, de 1. °-5-1943, aprovando a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). O
objetivo da CLT foi apenas o de reunir as leis esparsas existentes na época,
consolidando-as. Não se trata de um código, pois este pressupõe um Direito novo. Ao
contrário, a CLT apenas reuniu a legislação existente na época, consolidando-a.

9) Quais as diretrizes básicas da CF/88?

R) Em 5-10-1988, foi aprovada a atual Constituição, que trata de direitos trabalhistas


nos arts. 7. ° a 11. Na Norma Magna, os direitos trabalhistas foram incluídos no Capítulo
II, "Dos Direitos Sociais", do Título II, "Dos Direitos e Garantias Fundamentais", ao passo
que nas Constituições anteriores os direitos trabalhistas sempre eram inseridos no
âmbito da ordem econômica e social. Para alguns autores, o art. 7. ° da Lei Maior vem a
ser uma verdadeira CLT, tantos os direitos trabalhistas nele albergados.
Trata o art. 7.º da Constituição de direitos individuais e tutelares do trabalho. O
art. 8. ° versa sobre o sindicato e suas relações. O art. 9. ° especifica regras sobre greve.
O art. 10 determina disposição sobre a participação dos trabalhadores em colegiados.
Menciona o art. 11 que nas empresas com mais de 200 empregados é assegurada a
eleição de um representante dos trabalhadores para entendimentos com o empregador
25

A INDUSTRIALIZAÇÃO NO BRASIL9

O Brasil, como uma antiga colônia de uma nação europeia, faz parte de um grupo
de países de industrialização tardia.
A história da industrialização no Brasil pode ser dividida em quatro períodos
principais: o primeiro período, de 1500 a 1808, chamado de "Proibição"; o segundo
período, de 1808 a 1930, chamado de "Implantação"; o terceiro período, de 1930 a 1956,
conhecido como fase da Revolução Industrial Brasileira e finalmente o quarto período,
após 1956, chamado de fase da internacionalização da economia brasileira.

Primeiro período (1500 - 1808): ou de "Proibição"

Nesta época fazia restrição ao desenvolvimento de atividades industriais no Brasil.


Apenas uma pequena indústria para consumo interno era permitida, devido às distâncias
entre a metrópole e a colônia. Eram, principalmente, de fiação, calçados, vasilhames.
Na segunda metade do século XVIII algumas indústrias começaram a crescer,
como a do ferro e a têxtil. Isso não agradava a Portugal porque já faziam concorrência
ao comércio da corte e poderiam tornar a colônia independente financeiramente,
adquirindo a possibilidade da independência política. Assim, em 5 de janeiro de 1785, D.
Maria I assinou um alvará, extinguindo todas as manufaturas têxteis da colônia, exceto
a dos panos grossos para uso dos escravos e trabalhadores.

Segundo Período (1808-1930)

Primeira fase (1808-1850)


Em 1808 chegando ao Brasil a família real portuguesa, D. João VI revogou o
alvará, abriu os portos ao comércio exterior e fixou taxa de 24% para produtos
importados, exceto para os portugueses que foram taxados em 16%. Em 1810, através
de um contrato comercial com a Inglaterra, foi fixada em 15% a taxa para as mercadorias
inglesas por um período de 15 anos. Neste período, o desenvolvimento industrial
brasileiro foi mínimo devido à forte concorrência dos produtos ingleses que plenamente
"invadiram" o mercado consumidor brasileiro.
Em 1828 foi renovado o protecionismo econômico cobrando-se uma taxa de 16%
sobre os produtos estrangeiros, agora para todos os países, sem exceção. Porém essa
taxa era ainda insuficiente para promover algum desenvolvimento industrial no País.
Em 1844 o então Ministro da Fazenda Manuel Alves Branco decretou uma lei (Lei
Alves Branco) que ampliava as taxas de importação para 30% sobre produtos sem
similar nacional e 60% sobre aqueles com similar nacional. Assim, algumas atividades
industriais do país foram protegidas.
Em 1846 a indústria têxtil obteve incentivos fiscais e, no ano seguinte, as matérias-
primas necessárias à indústria do país receberam isenção das taxas alfandegárias.

9
Disponível em: http://www.administradores.com.br/artigos/economia-e-financas/revolucao-industrial/27484/
26

Mas nem esses incentivos foram suficientes para alavancar o desenvolvimento


industrial. A escravidão ainda estava presente. Faltavam trabalhadores livres e
assalariados para constituir a base do mercado consumidor. Além disso, as elites
enriquecidas pelo café ainda não estavam dispostas a investir na indústria.

Segunda fase (1850-1930)


Em 1850 é assinada a Lei Eusébio de Queirós proibindo o tráfico de escravos, e
que trouxe duas consequências importantes para o desenvolvimento industrial:
• Os capitais que eram aplicados na compra de escravos ficaram disponíveis e foram
aplicados no setor industrial.
• A cafeicultura que estava em pleno desenvolvimento necessitava de mão-de-obra. Isso
estimulou a entrada de um número considerável de imigrantes, que trouxeram novas
técnicas de produção de manufaturados e foi a primeira mão-de-obra assalariada no
Brasil. Assim constituíram um mercado consumidor indispensável ao desenvolvimento
industrial, bem como força de trabalho especializada.
O setor que mais cresceu foi o têxtil, favorecido em parte pelo crescimento da
cultura do algodão em razão da Guerra de Secessão dos Estados Unidos, entre 1861 e
1865.
Na década de 1880 ocorreu o primeiro surto industrial quando a quantidade de
estabelecimentos passou de 200, em 1881, para 600, em 1889.
Esse primeiro momento de crescimento industrial inaugurou o processo de
Substituição de Importações.
Entre 1914 e 1918 ocorreu a Primeira Guerra Mundial e, a partir daí, vamos
constatar que os períodos de crise foram favoráveis ao nosso crescimento industrial. Isso
ocorreu também em 1929 com a Crise Econômica Mundial e, mais tarde, em 1939 com
a 2ª Guerra Mundial, até 1945.
Nesses períodos a exportação do café era prejudicada e havia dificuldade em se
importar os bens industrializados, estimulando dessa forma os investimentos e a
produção interna, basicamente indústria de bens de consumo.
Em 1907 foi realizado o 1° censo industrial do Brasil, indicando a existência de
pouco mais de 3.000 empresas. O 2° censo, em 1920, mostrava a existência de mais de
13.000 empresas, caracterizando um novo grande crescimento industrial nesse período,
principalmente durante a 1ª Guerra Mundial quando surgiram quase 6.000 empresas.
Predominava a indústria de bens de consumo que já abastecia boa parte do
mercado interno. O setor alimentício cresceu bastante, principalmente exportação de
carne, ultrapassando o setor têxtil. A economia do país continuava, no entanto,
dependente do setor agroexportador, especialmente o café, que respondia por
aproximadamente 70% das exportações brasileiras.

Terceiro Período (1930-1956): de "Revolução Industrial"

O outro foi marcado pela Revolução de 1930, com Getúlio Vargas, que operou
uma mudança decisiva no plano da política interna, afastando do poder do estado
oligarquias tradicionais que representavam os interesses agrários-comerciais. Getúlio
Vargas adotou uma política industrializante, a substituição de mão-de-obra imigrante
27

pela nacional. Essa mão-de-obra era formada no Rio de Janeiro e São Paulo em função
do êxodo rural (decadência cafeeira) e movimentos migratórios de nordestinos. Vargas
investiu forte na criação da infraestrutura industrial: indústria de base e energia.
Destacando-se a criação de:
• Conselho Nacional do Petróleo (1938)
• Companhia Siderúrgica Nacional (1941)
• Companhia Vale do Rio Doce (1943)
• Companhia Hidrelétrica do São Francisco (1945)
Foram fatores que contribuíram para o desenvolvimento industrial a partir de 1930:
• o grande êxodo rural, devido à crise do café, com o aumento da população urbana que
foi constituir um mercado consumidor.
• a redução das importações em função da crise mundial e da 2ª Guerra Mundial, que
favoreceu o desenvolvimento industrial, livre de concorrência estrangeira.
Esse desenvolvimento ocorreu principalmente em São Paulo, Rio de Janeiro,
Minas Gerais e Rio Grande do Sul, definindo a grande concentração espacial da
indústria, que permanece até hoje.
Uma característica das indústrias que foram criadas desde a 1ª Guerra Mundial é
que muitas delas fazem apenas a montagem de peças produzidas e importadas do
exterior. São subsidiárias das matrizes estrangeiras.
No início da 2ª Guerra Mundial o crescimento diminuiu porque o Brasil não
conseguia importar os equipamentos e máquinas que precisava. Isso ressalta a
importância de possuir uma Indústria de Bens de Capital.
Apesar disso as nossas exportações continuaram a se manter acarretando um
acúmulo de divisas. A matéria-prima nacional substituiu a importada. Ao final da guerra
já existiam indústrias com capital e tecnologia nacionais, como a indústria de autopeças.
No segundo governo Vargas (1951-1954), os projetos de desenvolvimento
baseados no capitalismo de Estado, através de investimentos públicos no extinto
Instituto Brasileiro do Café (IBC, em 1951), BNDES, dentre outros, forneceram
importantes subsídios para Juscelino Kubitschek lançar seu Plano de Metas, ainda que
a um elevado custo de internacionalização da economia brasileira.

Quarto Período (1956 em diante): de "Internacionalização"

Ao final da Segunda Guerra Mundial o Brasil dispunha de grandes reservas de


moeda estrangeira, divisas, fruto de ter exportado mais do que importado.
Houve um crescimento de 8,9% de 1946 a 1950.
Enquanto nas décadas anteriores houve predominância da indústria de bens de
consumo, na década de 40 outros tipos de atividade industrial começam a se
desenvolver como no setor de minerais, metalurgia, siderurgia, ou seja, setores mais
sofisticados tecnologicamente.
Em 1946 teve início a produção de aço da CSN (Companhia Siderúrgica
Nacional), Volta Redonda, que abriu perspectivas para o desenvolvimento industrial do
pais, já que o aço constitui a base ou a "matriz" para vários ramos ou tipos de indústria.
Em 1950 alguns problemas de grande importância dificultaram o desenvolvimento
industrial:
28

• falta de energia elétrica;


• baixa produção de petróleo;
• rede de transporte e comunicação deficientes.
Para tentar sanar os dois primeiros problemas, o presidente Getúlio Vargas
inaugurou a Companhia Hidrelétrica do São Francisco, Usina Hidrelétrica de Paulo
Afonso e criou a Petrobras.
No governo de Juscelino Kubitschek, 1956 a 1961, criou-se um Plano de Metas
que dedicou mais de 2/3 de seus recursos para estimular o setor de energia e transporte.
Aumentou a produção de petróleo e a potência de energia elétrica instalada,
visando a assegurar a instalação de indústrias. Desenvolveu-se o setor rodoviário.
Houve um grande crescimento da indústria de bens de produção que cresceu 37%
contra 63% da de bens de consumo.
Percebe-se, por esses números, que na década de 50 alterou-se a orientação da
industrialização do Brasil. Contribuiu para isso a Instrução 113 da Superintendência da
Moeda e do Crédito (SUMOC), instituída em 1955, no governo Café Filho. Essa Instrução
permitia a entrada de máquinas e equipamentos sem cobertura cambial (sem depósito
de dólares para a aquisição no Banco do Brasil).
O crescimento da indústria de bens de produção refletiu-se principalmente nos
seguintes setores:
• siderúrgico e metalúrgico (automóveis);
• químico e farmacêutico;
• construção naval, implantado no Rio de Janeiro em 1958 com a criação do Grupo
Executivo da Indústria de Construção Naval (GEICON).
No entanto, o desenvolvimento industrial foi calcado, em grande parte, com capital
estrangeiro, atraído por incentivos cambiais, tarifários e fiscais oferecidos pelo governo.
Nesse período teve início em maior escala a internacionalização da economia brasileira,
através das multinacionais.
A década de 60 começou com sérios problemas políticos: a renúncia de Jânio
Quadros em 1961, a posse do vice-presidente João Goulart, discussões em torno de
presidencialismo ou parlamentarismo. Esses fatos ocasionaram um declínio no
crescimento econômico e industrial.
Após 1964, os governos militares, retomaram e aceleraram o crescimento
econômico e industrial brasileiro. O Estado assumiu a função de órgão supervisor das
relações econômicas. O desenvolvimento industrial pós 64 foi significativo.
Ocorreu uma maior diversificação da produção industrial. O Estado assumiu
certos empreendimentos como: produção de energia elétrica, do aço, indústria
petroquímica, abertura de rodovias e outros, assegurando para a iniciativa privada as
condições de expansão ou crescimento de seus negócios.
Houve grande expansão da indústria de bens de consumo não-duráveis e
duráveis com a produção inclusive de artigos sofisticados.
Aumentou, entre 1960 e 1980, em números significativos a produção de aço, ferro-
gusa, laminados, cimento, petróleo
Para sustentar o crescimento industrial, houve o aumento da capacidade
aquisitiva da classe média alta, através de financiamento de consumo. Foi estimulada,
também, a exportação de produtos manufaturados através de incentivos
29

governamentais. Em 1979, pela 1ª vez, as exportações de produtos industrializados e


semi-industrializados superaram as exportações de bens primários (produtos da
agricultura, minérios, matérias-primas).
Após um período de inflação ascendente, foi lançado em 28 de fevereiro de 1986
pelo Governo Sarney o Plano Cruzado, que embora tivesse objetivos implícitos eleitorais,
foi caracterizado por uma tentativa de promover o crescimento da produção econômica
brasileira sem passar pela penosa austeridade fiscal e monetária que seria a marca
registrada do Plano Real, em 1994. No entanto, a proteção alfandegária que existia na
época, que restringia as importações e o desabastecimento principalmente de produtos
de primeira necessidade promovido por setores oligopolizados da economia condenaram
o plano econômico ao fracasso, não obstante sua política de manter o câmbio congelado
e a taxa real de juros baixa fizesse o PIB conhecer uma bolha de consumo interna sem
precedentes na sua história.
O ajuste das contas públicas pós-Plano Real, e a adoção de medidas tanto
políticas como jurídicas de apoio à micro e pequena indústria, bem como a entrada de
capital estrangeiro atraído pelos programas de privatizações de estatais, tornaram o
investimento do capital de risco no setor industrial atraente.
Também contribuíram para isso a desejada estabilidade nas regras que regiam a
economia nos oito anos do mandato que Fernando Henrique Cardoso exerceu a
Presidência da República (1994-2002), e a decisão do seu sucessor, Luís Inácio Lula da
Silva, reeleito em 2006, de manter as mesmas regras, não obstante as divergências
ideológicas de alguns grupos internos ao seu partido (que viriam a se retirar do mesmo).
Com a autossuficiência no setor de petróleo, que minimizou o problema da
dependência do setor industrial em relação ao mesmo, só falta ao Brasil enfrentar um
desafio atual, cada vez mais imposto pelo mundo globalizado: a geração de tecnologia
de ponta nacional.

Sindicalismo no Brasil

No Brasil, com a abolição da escravatura e a proclamação da República, a


economia se diversificou, e as atividades manufatureiras surgiram nos centros urbanos
e no litoral brasileiro, atraindo levas de imigrantes.
Porém, alguns imigrantes tinham condições de trabalho ruins e encontravam
dificuldades. Para poderem melhorar sua situação começaram a se unir, formando então,
os sindicatos.
O movimento sindical mais forte no Brasil ocorreu em São Paulo, onde os
imigrantes integravam a massa de trabalhadores das fábricas e indústrias. Os
sindicalistas ativos eram os anarquistas que, surpreendendo os governantes,
desencadearam violenta repressão policial.
Com a industrialização, o sectarismo ideológico das correntes sindicais, com a
organização dos empresários, dos latifundiários, dos banqueiros, dos industriais e com
a influência norte americana, os movimentos sindicais foram enfraquecidos e o sistema,
sorrateiramente, começou a formar lideranças sindicais "pelegas”.
30

Em 1930

Em 1930, o Governo Federal criou o Ministério do Trabalho e em 1931


regulamentou, por decreto, a sindicalização das classes patronais e operárias. Criou as
Juntas de Conciliação e Julgamento e, com a promulgação da Constituição do Estado
Novo, a unicidade sindical.
A regulamentação do trabalho e os institutos de previdência social ocorreram
também naquele momento histórico. As organizações sindicais passaram a ter caráter
paraestatal, a greve foi proibida e foi instituído o imposto sindical. Em 1955, o movimento
sindical brasileiro voltou a expandir-se, havendo sido formados, em 1961, o Comando
Geral dos Trabalhadores (CGT) e o Pacto de Unidade e Ação (PUA).

Golpe Militar de 1964

Com o golpe militar de 1964, contudo, os sindicatos e sindicalistas foram


duramente reprimidos, limitaram a Lei de Greve e substituíram a estabilidade no emprego
pelo Fundo de Garantia, dentre outras medidas. Em 1968, em Osasco, São Paulo e
Contagem, os trabalhadores se levantaram em greve de grande envergadura. Em 1970
surgiram novas lideranças sindicais e, a partir de 1980, os trabalhadores rurais das
usinas de açúcar e álcool, no Nordeste e São Paulo, e das plantações de laranja do
interior de São Paulo, juntaram-se aos desempregados, e sob a influência da Central
Única dos Trabalhadores (CUT), de partidos de esquerda e de poucos parlamentares
progressistas, organizaram-se em movimentos a exemplo do Movimento dos Sem Terra
(MST). Apesar das centenas de mortes, muitas deles sem punição, em defesa da terra,
esses trabalhadores persistem na realização da justiça social.

Dias atuais

Atualmente, o sindicalismo brasileiro passa por um momento de renovação por


conta das novas demandas, como a empregabilidade, a globalização dos serviços e cada
vez mais, a luta por condições dignas de trabalho.

Saúde e bem-estar econômico

Estudos sobre as variações na altura média dos homens no norte da Europa,


sugerem que o progresso econômico gerado pela industrialização demorou várias
décadas até beneficiar a população como um todo. Eles indicam que, em média, os
homens do norte europeu durante o início da Revolução Industrial eram 7,6 centímetros
mais baixos que os que viveram 700 anos antes, na Alta Idade Média. É estranho que a
altura média dos ingleses tenha caído continuamente durante os anos de 1100 até o
início da revolução industrial em 1780, quando a altura média começou a subir. Foi
apenas no início do século XX que essas populações voltaram a ter altura semelhante
às registradas entre os séculos IX e XI. A variação da altura média de uma população
ao longo do tempo é considerada um indicador de saúde e bem-estar econômico.
31

CASA GRANDE & SENZALA – GILBERTO FREIRE10

Em 1933, após exaustiva pesquisa em arquivos nacionais e estrangeiros, Gilberto


Freyre publica Casa-Grande & Senzala, um livro que revoluciona os estudos no Brasil,
tanto pela novidade dos conceitos quanto pela qualidade literária.
Gilberto Freyre foi buscar nos diários dos senhores de engenho e na vida pessoal
de seus próprios antepassados a história do homem brasileiro. As plantações de cana
em Pernambuco eram o cenário das relações íntimas e do cruzamento das três raças:
índios, africanos e portugueses.
Em Casa-Grande & Senzala, o escritor exprime claramente o seu pensamento.
Ele diz: "o que houve no Brasil foi a degradação das raças atrasadas pelo domínio da
adiantada”. Os índios foram submetidos ao cativeiro e à prostituição. A relação entre
brancos e mulheres de cor foi a de vencedores e vencidos.
"Casa-Grande & Senzala foi a resposta à seguinte indagação que eu fazia a mim
próprio: o que é ser brasileiro? E a minha principal fonte de informação fui eu próprio, o
que eu era como brasileiro, como eu respondia a certos estímulos."
Havia tempos Gilberto Freyre procurava escrever sobre o ser brasileiro. Pressões
políticas e familiares o levaram, entre 1930 e 1932, a viver o que chamou de "a aventura
do exílio". Partiu para a Bahia e pesquisou as coleções do Museu Afro-Brasileiro Nina
Rodrigues e a arte das negras quituteiras na decoração de bolos e tabuleiros. Observou
que a culinária baiana era neta da velha cozinha das casas-grandes.
Depois da Bahia partiu para a África e Portugal. Iniciou em Lisboa as pesquisas eestudos
que sedimentariam o livro Casa-Grande & Senzala. De Portugal foi, como professor
visitante, para a Universidade de Stanford, nos Estados Unidos, onde viajou pelo Sul e
pôde constatar a existência, durante a colonização americana, do mesmo tipode regime
patriarcal encontrado no nordeste brasileiro.
"Eu venho procurando redescobrir o Brasil. Eu sou rival de Pedro Álvares Cabral.
Pedro Álvares Cabral, a caminho das Índias, desviou-se dessa rota, parece já baseado
em estudos portugueses, e identificou uma terra que ficou sendo conhecida como Brasil.
Mas essa terra não foi imediatamente autoconhecida. Vinham sendo acumulados
estudos sobre ela... mas faltava um estudo convergente, que além de ser histórico,
geográfico, geológico, fosse... um estudo social, psicológico, uma interpretação. Creio
que a primeira grande tentativa nesse sentido representou um serviço de minha parte ao
Brasil."
Durante o período de estudos na universidade americana, o escritor elaborou uma
linha de pensamento que diferenciava raça e cultura, separava herança cultural de
herança étnica; trabalhou o conceito antropológico de cultura como o conjunto dos
costumes, hábitos e crenças do povo brasileiro.
"Gilberto Freyre diz que Franz Boas foi a figura de mestre que nele ficou maior
impressão, porque foi com Franz Boas que ele aprendeu a distinguir raça de cultura, e
nessa distinção ele se baseou para escrever Casa-Grande & Senzala. Agora, o conceito
de antropologia de Freyre era muito mais amplo, ele partiu para uma interpretação
globa1.do povo brasileiro. É uma história ao mesmo tempo econômica, religiosa,
folclórica, sociológica. Édson Nery da Fonseca, historiador (Olinda, PE)
"Quando, em 1532, se organizou econômica e civilmente a sociedade brasileira,
já foi depois de um século inteiro de contato dos portugueses com os trópicos; de
demonstrada na Índia e na África sua aptidão para a vida tropical. Formou-se na América

10
Retirado do Site: http://www.vestibular1.com.br/resumos_livros/casa_grande_e_senzala.htm acesso em
23/08/2014
32

tropical uma sociedade agrária na estrutura, escravocrata na técnica de exploração


econômica, híbrida de índio, e mais tarde de negro, na composição. Trecho de Casa-
Grande & Senzala.
Portugal, um país largamente marítimo, recebia sempre povos de todos os lugares
do mundo. Seus portos eram rota de comércio e de migrações. O contato com
estrangeiros estimulava, no povo português, tendências cosmopolitas, imperialistas e
comerciais. Na Península Ibérica as raças se misturavam havia milênios.
O encontro das culturas árabes e romana impregnava a moral, a arte, a economia
e a vida do português. Os árabes - excelentes técnicos navais - e os judeus - financistas
e com altos cargos de administração, no conselho real -, emprestavam conhecimento e
dinheiro para o empreendimento das navegações e dos descobrimentos. A burguesia
comercial ganhava mais poder que a aristocracia territorial portuguesa e buscava no
além-mar terras e riquezas nunca exploradas.
Além da mobilidade, o português tinha a capacidade de se misturar facilmente
com outras raças. Os homens vinham sem família, sozinhos. Chegavam carentes de
contato humano e começavam a se reproduzir primeiro com as índias e depois com as
negras escravas. Era preciso povoar o território. No momento em que embarcou na
aventura ultramarina, Portugal tinha três milhões de habitantes. O Brasil era imenso;
então, como povoar esse território?
"Durante quase todo o século XVI a colônia esteve escancarada a estrangeiros,
só importando às autoridades que fossem de fé católica. Temia-se no adventícioacatólico
o inimigo político capaz de quebrar aquela solidariedade que em Portugal se
desenvolvera junto com a religião católica. Essa solidariedade manteve-se entre nós
esplendidamente através de toda a nossa formação colonial. Trecho de Casa-Grande
& Senzala.
Foi aqui que chegou...dia 02 de março de 1535...um português chamado Duarte
Coelho Pereira, viu essa bela vista e deu uma exclamação: Oh! linda situação para se
construir uma vila. Por isso que a cidade se chama Olinda. Antigamente chamava Marino
Caetês, habitada pelos índios. Em Pernambuco e no Recôncavo baiano, a colonização
se desenvolvia à sombra das grandes plantações de cana-de-açúcar e das casas-
grandes de taipa ou de pedra e cal, longe das cabanas de aventureiros e do extrativismo
predatório.
"A casa-grande do engenho que o colonizador começou, ainda no século XVI, a
levantar no Brasil - grossas paredes de taipa ou de pedra e cal, telhados caídos num
máximo de proteção contra o sol forte e as chuvas tropicais - não foi nenhuma
reprodução das casas portuguesas, mas expressão nova do imperialismo português. A
casa-grande é brasileirinha da silva. Trecho de Casa-Grande & Senzala.
Num processo de equilíbrio de antagonismos, o branco e o negro se misturavam
no interior da casa-grande e alteravam as relações sociais e culturais, criando um novo
modo de vida no século XVI. As relações de poder, a vida doméstica e sexual, os
negócios e a religiosidade forjavam, no dia-a-dia, a base da sociedade brasileira.
A casa-grande abrigava uma rotina comandada pelo senhor de engenho, cuja
estabilidade patriarcal estava apoiada no açúcar e no escravo. O suor do negro ajudava
a dar aos alicerces da casa-grande sua consistência quase de fortaleza. Ela servia de
cofre e de cemitério. Sob seu teto viviam os filhos, o capelão e as mulheres, que
fundamentariam a colonização portuguesa no Brasil. Embora diretamente associada ao
engenho de cana e ao patriarcalismo nortista, a casa-grande não era exclusiva dos
senhores de engenho. Podia ser encontrada na paisagem do sul do país, nas plantações
de café, como uma característica da cultura escravocrata e latifundiária do Brasil.
O clima tropical e as formas agressivas de vida vegetal e animal impossibilitavam
a implantação de uma cultura agrícola, nos moldes do costume europeu. O português
teve então de mudar seus hábitos alimentares. A mandioca substituía o trigo; no lugar
33

das verduras, o milho; e as frutas davam um colorido novo à mesa do colonizador. Mas
sua dieta ficava empobrecida, devido à ausência de leite, ovos e carne, que só apareciam
em datas especiais, festas e comemorações.
A terra foi usada para o cultivo da cana em detrimento da pecuária e da cultura de
alimentos, o que provocou a apatia, a falta de robustez e a incapacidade para o trabalho.
Males geralmente atribuídos à mestiçagem. Os portugueses não traziam para o Brasil
nem separatismos políticos, nem divergências religiosas, e não se preocupavam com a
pureza da raça. Assim o país se formava. E a unidade dessa grande extensão territorial
com profundas diferenças regionais, garantida muitas vezes com o uso da força,
aconteceu devido à uniformidade da língua e da religião.
A Igreja desenvolvia planos ambiciosos de evangelização da América Latina, toda
ocupada por países de tradição católica. Nessa quase cruzada no Novo Mundo, os
padres jesuítas desempenhavam um papel importante na tentativa de implantar uma
sociedade estruturada com base na fé católica. Para catequizar os índios, os jesuítas
decidiram vesti-los e tirá-los de seu hábitat. Já o senhor de engenho tentava escravizá-
los. Nos dois casos, o resultado era o extermínio e a fuga dos primitivos habitantes da
terra para o interior.
"Os portugueses, além de menos ardentes na ortodoxia que os espanhóis e
menos estritos que os ingleses nos preconceitos de cor e de moral cristã, vieram
defrontar-se na América com uma das populações mais rasteiras do continente... Uma
cultura verde e incipiente, sem o desenvolvimento nem a resistência das grandes semi-
civilizações americanas, como os Incas e os Astecas. Trecho de Casa-Grande &
Senzala.
"O ambiente em que começou a vida brasileira foi de grande intoxicação sexual.
O europeu saltava em terra escorregando em índia nua. Os próprios padres da
Companhia precisavam descer com cuidado, se não atolavam o pé em carne. Trecho
de Casa-Grande & Senzala.
A sociedade brasileira, entre todas da América, era a que se formava com maior
troca de valores culturais. Havia um aproveitamento de experiências dos indígenas pelos
colonizadores. Mesmo quando inimigo, o índio não provocava no branco uma reação
que levasse a uma política deliberada de extermínio, como a que ocorria no México e
Peru. A reação dos índios ao domínio do colonizador era quase contemplativa.
O português usava o homem para o trabalho e a guerra, principalmente na
conquista de novos territórios, e a mulher para a geração e formação da família. Esse
contato provocava o desequilíbrio das relações do índio com o seu meio ambiente.
"Eu sou índio da tribo pataxó. Eu aprendi com meus pais a fazer artesanato. A
gente faz cocares..., a gente vive só disso, de artesanato, a não ser no inverno, quando
a gente tem que pescar mucussu. Mucussu é peixe. A gente planta mandioca para fazer
cuiúna, feijão e arroz. A gente fala em pataxó: jocana baixu significa mulher bonita e
jocana baixa é mulher feia. Paturi, índio pataxó (Coroa Vermelha, BA)
"A grande presença índia no Brasil não foi a do macho, foi a da fêmea. Esta foi
uma presença decisiva, a mulher índia tomou-se de amores pelo português, talvez até
por motivos fisiológicos, porque, segundo pude apurar quando escrevi Casa Grande &
Senzala, as sociedades ameríndias ou índias, inclusive a brasileira, eram sociedades
que precisavam de festivais como que orgiásticos para provocar nos homens, nos
machos, desejos sexuais. O que há de acentuar é o grande papel da índia fêmea na
formação brasileira, essa índia fêmea não só através do relacionamento mencionado
sexual, mas através do papel social que ela começou a desempenhar magnificamente,
tornou-se uma figura capital na formação brasileira."
"Da cunhã é que nos veio o melhor da cultura indígena. O asseio pessoal. A
higiene do corpo. O milho. O caju. O mingau. O brasileiro de hoje, amante do banho e
sempre de pente no bolso, o cabelo brilhante de loção ou de óleo de coco, reflete a
34

influência de tão remotas avós. Ela nos deu, ainda, a rede em que se embalaria o sono
ou a volúpia do brasileiro. Trecho de Casa-Grande & Senzala.
A união do português com a índia havia gerado os mamelucos que atuavam como
bandeirantes e, junto com os índios, formavam a muralha movediça da fronteira colonial.
O mameluco e o índio, que excediam o português em mobilidade, atrevimento e ardor
guerreiro; que defendiam o patrimônio do senhor de engenho contra o ataque de piratas
estrangeiros, nunca firmaram as mãos na enxada. Os pés de nômades não se fixavam
na plantação da cana-de-açúcar.
"Essa arte é descendência dos índios, né! Aí nós somos seguidores já dos índios.
A gente ficou fazendo as panelas de barro, que eu aprendi com meu pai. Meu pai já
trabalhava, aí eu fiquei trabalhando. Agora meus filhos também trabalham na mesma
arte.Zé Galego, artesão (Caruaru, PE).
Dos costumes dos primitivos habitantes da terra eram as relações sexuais e de
família, a magia e a mítica que marcavam a vida do colonizador. A poligamia e a
sexualidade da índia iam ao encontro da voracidade do português, ainda que a vida
sexual dos indígenas não se processasse tão à solta quanto o relatado pelos viajantes
que aqui estiveram.
Para as tribos mais primitivas, a união do macho com a fêmea tinha época; o
costume de oferecer mulheres aos hóspedes era prática de hospitalidade, quase um
ritual. A mulher nativa resgatava o sonho da ninfa, que se banhava no rio e penteava os
longos cabelos negros. Uma imagem deixada pela invasão moura na Península Ibérica
e adormecida no inconsciente do português.
"Figura vaga, falta-lhe o contorno ou a cor que a individualize entre os imperialistas
modernos. Assemelha-se nuns à do inglês; noutros, à do espanhol. Um espanhol sem a
flama guerreira nem a ortodoxia dramática do conquistador do México e do Peru; um
inglês sem as duras linhas puritanas. O tipo do contemporizador. Nem ideias absolutas,
nem preconceitos inflexíveis. ...Um rio que vai correndo muito calmo e de repente se
precipita em quedas de água... Trecho de Casa-Grande & Senzala.
Os portugueses davam uma contribuição criativa ao novo mundo através da
produção de açúcar. E implantavam um sistema econômico que aprenderam com os
mouros durante a ocupação da Península Ibérica. Os mouros, de grande tradição
agrícola, introduziram a laranjeira, o limoeiro e a tangerina e implantaram a tecnologia
do fabrico do açúcar em Portugal. O engenho mouro é avô do engenho pernambucano.
Essa contribuição criativa é que diferenciava o português do holandês e do francês,
que para cá traziam apenas aperfeiçoamentos tecnocráticos. O choque dasduas
culturas, a europeia e a ameríndia, no Brasil colônia, se dava mais lentamente, nãopor
meio da guerra, mas nas relações entre homem e mulher, mestre e discípulo. A Igreja
ganhava no Brasil capelas simples dentro do complexo arquitetônico da casa-grande. Lá
morava o capelão, que dela tirava seu sustento. E essa mesma Igreja, através dos
jesuítas, partia maciça e indiscriminadamente para a catequização dos índios.
O animalismo e a magia impregnavam a vida dos índios: desde o berço, quando
a mãe entoava cantigas de ninar e, já meninos, nas brincadeiras de imitar animais. Entre
os jogos infantis dos curumins, o jogo de cabeçada com a bola de borracha ficava como
contribuição da cultura indígena. Apesar de crescerem livres de castigos corporais e de
disciplina paterna, os meninos estavam sempre em contato com rituais da vida primitiva.
Na puberdade eram levados para o baíto, a casa secreta dos homens, onde passavam
por provas de iniciação à fase adulta.
Para os padres da Companhia de Jesus, os índios acreditavam em tudo e
aprendiam e desaprendiam os ensinamentos rapidamente. Havia uma enorme
quantidade de aldeias espalhadas pela floresta, que falavam diferentes línguas. Era
preciso unificar as tribos para poder pregar a doutrina católica. O menino indígena servia
de intérprete aos jesuítas, que aprendiam com ele as primeiras palavras em tupi. Os
35

padres puderam então escrever uma gramática, unificando a língua dos Brasis. Estava
criando o tupi-guarani.
Tanto a Igreja quanto o senhor de engenho fracassavam nos esforços de
enquadrar o índio no sistema de colonização que iria criar a economia brasileira. Fora
de seu hábitat natural, o índio não se adaptava como escravo: morria de infecções, fome
e tristeza. Para suprir a deficiência da mão-de-obra escrava, os senhores de engenho
de Pernambuco e do Recôncavo baiano começavam a importar negros caçados na
África.
Agora, as escravas negras substituíam as cunhãs tanto na cozinha como na cama
do senhor. Na agricultura, a presença do negro elevava a produção de açúcar e o preço
do produto no mercado internacional. O Brasil, esquecido por quase duzentos anos,
despertava finalmente o interesse do Reino de Portugal.
Entre os africanos que vinham para o Brasil, eram os negros muçulmanos, de
cultura superior não só à dos índios como também à da maioria de colonos brancos, que
aqui chegavam e viviam quase sem nenhuma instrução, que para escrever uma carta
necessitava da ajuda do padre-mestre. O movimento malê da Bahia, em 1835, foi
considerado um desabafo da cultura adiantada, que era oprimida por outra menos nobre.
Contava-se que os revoltosos sabiam ler e escrever em alfabeto desconhecido. Eram
negros que liam e escreviam em árabe.
"Pode-se juntar à superioridade técnica e de cultura dos negros sua predisposição
como que biológica e psíquica para a vida nos trópicos. Sua maior fertilidade nas regiões
quentes. Seu gosto pelo sol. Sua energia sempre fresca e nova quando em contato com
a floresta tropical. Trecho de Casa-Grande & Senzala.
O Brasil importava da África não somente o animal de tração que fecundou os
canaviais, mas também técnicos para as minas, donas de casa para os colonos,
criadores de gado e comerciantes de panos e sabão. Os negros vindos das áreas de
cultura africana mais adiantada eram um elemento ativo, criador e pode-se dizer nobre
na colonização do Brasil, degradados apenas pela condição de escravos. O negro
escravo e a cana-de-açúcar fundamentavam a colonização aristocrática e a estrutura
básica do mundo dos coronéis se repetiria nos ciclos do ouro e do café, em Minas Gerais,
Rio de Janeiro e São Paulo, com o mesmo fundamento: a ocupação da terra.
Na sociedade escravocrata e latifundiária que se formava, os valores culturais e
sociais se misturavam à revelia de brancos e negros. Sua convivência diária favorecia o
intercâmbio de culturas e gerava sadismos e vícios, que influenciavam a formação do
caráter do brasileiro. A escravatura degradava senhores e escravos.
"Na verdade, senhores, se a moralidade e a justiça de qualquer povo se fundam,
parte nas suas instituições religiosas e políticas, e parte na filosofia, por assim dizer
doméstica de cada família, que quadro pode apresentar o Brasil quando o consideramos
debaixo desses dois pontos de vista? Trecho de Casa-Grande & Senzala.
O senhor de engenho, um homem extremamente rico e poderoso, passava a
maior parte do tempo deitado na rede, cochilando e copulando. Quando saía, a passeio
ou em viagem, o negro era seus pés e mãos. O sinhô não precisava levantar-se da rede
para dar ordens aos negros, bastava gritar.
Os negros veteranos, os ladinos, iniciavam os recém-chegados na moral e nos
costumes dos brancos. Ensinavam a língua e orientavam nos cultos religiosos
sincretizados. Eram ainda os ladinos que ensinavam aos boçais a técnica e a rotina na
plantação da cana e no fabrico do açúcar.
A escravidão desenraizava o negro de seu meio social e desfazia seus laços
familiares. Além dos trabalhos forçados, ele era usado como reprodutor de escravos: era
preciso aumentar o rebanho humano do senhor de engenho. As crias nascidas eram
logo batizadas e ainda assim consideradas gente sem alma. A Igreja, esteio dos
poderosos, agia da mesma forma no tratamento dado ao negro. A mulher escrava fazia
36

a ponte entre a senzala e o interior da casa-grande e representava o ventre gerador. As


negras mais bonitas eram escolhidas pelo sinhô para serem concubinas e domésticas.
Objeto dos desejos sádicos dos homens, do senhor de engenho ao menino
adolescente, a negra sofria por parte da mulher branca os castigos mais variados. Se a
beleza dos seus dentes incomodava a desdentada sinhá, esta mandava arrancá-los. A
escrava adoçava a boca do senhor e recebia chicotadas ao mando da senhora, mas
cumpria as tarefas que normalmente estariam destinadas à mãe de família. As damas
da sociedade se casavam entre os doze e os quinze anos com homens muito mais
velhos.
O conhecimento que tinham da vida de casada, os acontecimentos de fora do
engenho e outras histórias - nem sempre românticas - elas ouviam da boca das
mucamas. As sinhazinhas sentadas à mourisca, tecendo renda ou deitadas na rede e as
escravas a lhes catar piolho ou fazendo cafuné.
Cedo se casavam e cedo morriam por causa de sucessivos partos ou se tornavam
matronas aos dezoito anos. O ócio e a vida reclusa faziam das sinhás mulheres
amarguradas. E ignorantes: era raro encontrar uma que soubesse ler e escrever. A
presença da negra na vida do menino vinha desde o berço, quando ela o amamentava
e acalentava o seu sono. A ama de leite ensinava as primeiras palavras num português
errado, o primeiro "pai nosso", o primeiro "oxente", e amaciava com a própria boca a
comida do menino de engenho.
Os sofrimentos da primeira infância - castigos por mijar na cama e purgante uma
vez por mês os meninos descontariam tornando-se pequenos diabos. O moleque, o
pequeno escravo, companheiro do sinhozinho em brincadeiras e aventuras, servia
também de saco de pancadas. Tornava-se objeto do prazer mórbido de tratar mal os
inferiores e os animais, prazer de todo menino brasileiro filho do sistema escravocrata.
Criança mimada e educada para ser o herdeiro todo-poderoso, o menino desde o início
da adolescência era entregue aos cuidados eróticos da fulô.
"Costuma dizer-se que a civilização e a sifilização andam juntas. O Brasil,
entretanto, parece ter-se sifilizado antes de se haver civilizado. A contaminação da sífilis
em massa ocorreria nas senzalas, mas não que o negro já viesse contaminado. Foram
os senhores das casas-grandes que contaminaram as negras das senzalas. Por muito
tempo dominou no Brasil a crença de que para um sifilítico não há melhor depurativo que
uma negrinha virgem.Trecho de Casa-Grande & Senzala.
Os senhores de engenho casavam-se sucessivas vezes, sempre preferindo as
jovens sobrinhas; exagerava-se, então, o sentimento da propriedade privada. As
heranças eram disputadas por filhos legítimos e parentes próximos. Aos filhos bastardos,
gerados nas casa-grande e paridos na senzala, restava a tolerância do senhor, que ao
morrer os libertava.
Nomes e sobrenomes se confundiam: os escravos mais próximos, que ganhavam
a simpatia do senhor, conseguiam adotar o sobrenome dos brancos. Na tentativa de
ascensão social, os negros imitavam dos senhores as formas exteriores de
superioridade. Mas muitos nomes ilustres de senhores brancos vinham dos apelidos
indígenas e africanos das propriedades rurais - a terra recriava os nomes dos
proprietários à sua imagem e semelhança.
A música, o canto e a dança dos escravos tornavam a casa-grande mais alegre.
A risada do negro quebrava a melancolia e o silêncio infinito do senhor de engenho. As
mães negras e as mucamas, aliadas aos meninos, às moças das casas-grandes e aos
moleques, corrompiam o português arcaico ensinado pelos jesuítas aos filhos do senhor.
A nova fala brasileira não se conservava fechada nas salas de aula das casas-grandes,
nem se entregava de todo à maior espontaneidade de expressão da senzala. Mas o
modo carinhoso do brasileiro colocar os pronomes: me diga, me espere... vem do
37

africano. Também do seu modo de falar ficaram as formas diminutivas: benzinho,


nézinho, inhozinho.
Era um novo jeito de falar, um novo jeito de andar, um novo jeito de comer... A
culinária da senzala aproveitava as sobras de carnes da casa-grande, usava o aipim
indígena e as verduras, misturava aos temperos africanos, principalmente o dendê e a
pimenta malagueta. Surgiam a feijoada, a farofa, o quibebe, o vatapá.
Alimentos que combinavam com a dureza do trabalho no cativeiro. As crenças e
magias trazidas pelos portugueses eram transformadas em feitiçaria nas mãos dos
africanos. Aos negros feiticeiros recorriam os senhores brancos idosos a procura de
afrodisíacos; as jovens sinhás, que não conseguiam engravidar; e as belas mucamas,
que aprendiam a receita do café mandingueiro, um filtro amoroso feito com café bem
forte, muito açúcar e sangue de mulata.
Na religião conviviam a cultura do senhor e a do negro. O catolicismo praticado
aqui era uma religião doce, doméstica, de intimidade com os santos. Os padres se
vangloriavam de conceder aos negros certas vantagens, como o direito de manifestar
suas tradições nas festas do terreiro. Nasciam então as religiões afro-brasileiras: São
Jorge é o orixá Ogum e Nossa Senhora é Iemanjá.
"Esse terreiro tem 110 anos. A minha avó era descendente de escravos. Tinha
uma aldeia que se chamava Catongo. Nessa aldeia ela também cultivava os orixás,
quando chegavam assim os escravos chicoteados de outros lugares, fazendas,
engenhos, essas coisas. Aí ela curava com aquelas difusões de ervas, né, aqueles
remédios das folhas, e curava esses escravos, que ficavam gratos e acabavam ficando
com ela. Quer dizer, ela era assim uma espécie de protetora desses escravos. E a minha
mãe falava que era uma senzala, onde ela abrigava esses escravos. Ilza R.P. Santos,
mãe-de-santo (Ilhéus, BA) (??)
"Não foi só de alegria a vida dos negros escravos dos ioiôs e das iaiás brancas.
Houve os que se suicidaram comendo terra, enforcando-se, envenenando-se com ervas
e potagens dos mandingueiros. O banzo deu cabo de muitos. O banzo - a saudade da
África. Houve os que de tão banzeiros ficaram lesos, idiotas. Não morreram, mas ficaram
penando. Trecho de Casa-Grande & Senzala.
Os negros, muitos agora, libertos pela alforria, pela revolta ou pelas fugas, unidos
nos quilombos, lutavam pelo fim da escravidão. Aliavam-se aos ideais libertários os filhos
de poderosos senhores de engenho que se tornavam abolicionistas por motivos
econômicos, humanitários ou, simplesmente, pelo apego que tinham às suas mães de
leite.
" Os brancos diziam que em nenhum país do mundo essa nefanda instituição foi
tão doce como no Brasil. Agora não me passa pela cabeça - não deve passar pela
cabeça de ninguém - que essa nefanda instituição, como os próprios brancos chamavam
a escravidão, que ela pudesse ser doce em algum lugar. Ela só pode ser doce da
perspectiva de quem estivesse na casa-grande e não na perspectiva de quem estivesse
na senzala. Florestan Fernandes, cientista social.
Em 1984, numa de suas últimas entrevistas, o escritor Gilberto Freyre resumia o
seu pensamento sobre a situação presente do negro, lembrando o abolicionista
pernambucano Joaquim Nabuco:
"O problema é que a abolição da escravatura, embora tenha sido fato notável na
história da formação brasileira, foi muito incompleta."
Com a abolição, os problemas do negro estariam apenas começando. Mas quem
se interessou por isso? Ninguém se interessou.
O negro livre deixou as fazendas e os engenhos e foi inchar as periferias das
cidades. Abandonado, constituiu-se num sub-brasileiro.
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BARÃO DE MAUÁ11
Miriam Ilza Santana

O Barão de Mauá – Irineu Evangelista de Souza –, foi um


brilhante industrial, banqueiro, político e diplomata, nasceu no Brasil,
em uma cidade chamada Arroio Grande, pertencente ao município
de Jaguarão, Rio Grande do Sul.
Muito cedo perdeu o pai e, ao lado de um tio que era capitão
da marinha mercante, mudou-se para o Rio de Janeiro.
Com 11 anos de idade já trabalhava na função de balconista
em uma loja de tecidos; graças à sua esperteza foi progredindo
aceleradamente. No ano de 1830 empregou-se em uma firma de
importação de propriedade de Ricardo Carruther, com quem
aprendeu inglês, contabilidade e a arte de comercializar. Com 23
anos subiu de posição, tornou-se gerente e pouco tempo depois sócio da companhia.
Após realizar uma viagem à Inglaterra, em 1840, concluiu que o Brasil precisava
de capital para investir na industrialização.
Irineu decidiu sozinho avançar em direção ao progresso, edificou os estaleiros da
Companhia Ponta da Areia, construiu, no ano de 1846 a indústria náutica brasileira, que
se estabeleceu no Rio de Janeiro, mais precisamente em Niterói.
Em questão de um ano já possuía a maior indústria do país, contribuindo para
colocar no mercado de trabalho mais de mil operários, fabricando caldeiras para
máquinas a vapor, investindo em engenhos de açúcar, guindastes, prensas, armas e
tubos para encanamento de água.
Quando houve as batalhas contra Oribe, Rosas e López, a Companhia Ponta da
Areia forneceu os navios e canhões necessários.
Deste momento em diante, Irineu Evangelista resolveu se dedicar a duas
atividades em potencial – dividiu-se entre a profissão de industrial e a de banqueiro.
Foi precursor na área dos serviços públicos, entre várias de suas atuações
podemos citar:
1851 – Rio de Janeiro – Construiu uma companhia de gás voltada para a
iluminação pública do Rio de Janeiro.
1852 - Colocou em ordem as corporações de navegação a vapor no Rio Grande
do Sul e no Amazonas.
1854 – Introduziu a primeira estrada ferroviária, que ia da Raiz da Serra à cidade
de Petrópolis, no Rio de Janeiro.
1854 – Contribuiu com a fase inicial da União e Indústria, a primeira estrada
ladrilhada do país, que compreendia o trecho de Petrópolis a Juiz de Fora.
1874 - Ajustou o assentamento do cabo submarino, entre tantas outras
realizações.
Através de uma sociedade firmada com capitalistas da Inglaterra e cafeicultores
de São Paulo, tomou parte na construção da Recife and São Francisco Railway

11
Disponível em: http://www.infoescola.com/historia/barao-de-maua/ Acesso em 12/03/2012.
39

Company, da estrada de ferro dom Pedro II – hoje a Central do Brasil -, e da São Paulo
Railway – atual Santos-Jundiaí.
Deu início à edificação do canal do mangue, no Rio de Janeiro, e respondeu pela
implantação dos primeiros cabos telegráficos e submarinos, conectando o Brasil à
Europa.
No final do ano de 1850, o então visconde inaugurou o Banco Mauá, MaCGregor
& Cia, com várias filiais espalhadas pelas capitais brasileiras, e também no exterior,
como em Londres, Nova Iorque, Buenos Aires e Montevidéu.
Era considerado um liberal, abolicionista e peremptoriamente antagônico à Guerra
do Paraguai, concedeu os recursos financeiros imperiosos para a defesa de Montevidéu
quando esta cidade se sentiu acuada pela liderança imperial que decidiu intervir, em
1850, nas questões do Prata. Com suas atitudes contra o governo, acabou por se
transformar em uma pessoa não bem vista pelo Império.
Suas fábricas foram sabotadas, ações criminosas aconteceram, sem a menor
cautela, e suas transações comerciais foram atingidas pela lei, que passou a cobrar taxas
exorbitantes sobre as importações.
Na carreira política foi deputado pelo Rio Grande do Sul em vários mandatos,
porém, em 1873, renunciou ao seu encargo para poder se dedicar a seus negócios que
se encontravam em risco desde a crise bancária de 1864.
Em 1875, Irineu sofreu um duro golpe, amargou a falência do Banco Mauá, em
vista disso ele foi obrigado a vender a maior parte de suas empresas a capitalistas do
exterior.
Encontrava-se então doente, era portador de diabetes, porém só sossegou
quando finalmente conseguiu liquidar todas as suas contas.
De cabeça erguida, viu encerrada a sua vida de grande empreendedor,
nobremente se retirou da vida de industrial e terminou seus dias sem nenhum patrimônio,
mas com algo que valia mais que qualquer bem material, dignidade e fidelidade às suas
convicções.
Durante o período em que esteve na ativa, foi merecedor de vários títulos: em
1854 conquistou o de Barão e em 1874 o de Visconde de Mauá.

Era Mauá12
Felipe Araújo

A Era Mauá é determinada pelas ações do Barão de Mauá, político e industrial


brasileiro, no intuito de acelerar o cenário industrial do País. No começo do século XIX,
o panorama socioeconômico nacional apresentava-se da seguinte forma: concentração
de interesses no campo, trabalho escravo e uma aristocracia que investia somente em
terras e na própria segurança. Todos estes fatores atravancavam o crescimento do Brasil
no que se refere à industrialização e ao capitalismo. A preocupação com o comércio e a
indústria era mínima, assim como a continuidade do escravismo, que dificultava o
desenvolvimento da economia.

12 Disponível em: http://www.infoescola.com/historia/era-maua/ Acesso 12/03/2017.


40

Isso começa a mudar no ano de 1844, quando a produção interna do País é


favorecida com a Tarifa Alves Branco, pois as alíquotas, que são percentuais de
incidência de imposto no valor tributado, aumentaram no que se refere aos importados.
Ou seja, o mercado de produção interna tornava-se mais competitivo com os produtos
que vinham do exterior. Outro fator que ajudou na mudança dos rumos da economia
brasileira foi o fim do tráfico de escravos (1850). Assim, uma grande quantidade de
capital incidiu sobre o setor industrial e comercial.
Ainda naquele ano foi criado o Código Comercial, que era uma ferramenta de
regulação em transações comerciais e para companhias capitalistas que surgiam. Desta
forma, essa combinação de fatores favoreceu a economia brasileira e, entre os anos de
1850 e 1889, diversas pequenas fábricas de muitos setores começaram a surgir. Entre
as áreas econômicas que se desenvolveram, destacam-se as que produziam couro,
sabão, papel e bens de consumo.
Neste momento surge a figura do Visconde de Mauá, como era conhecido Irineu
Evangelista de Souza. Entre suas ações para o impulso da economia, estão: criação de
estaleiros e fundições, companhias de linhas telegráficas, ferrovias, iluminação a gás,
transporte urbano, entre outros negócios. O Barão tinha, até mesmo, bancos no Brasil e
no exterior. Porém, o crescimento industrial brasileiro incomodava a elite rural escravista
e os países concorrentes.
Assim, começa um processo que levaria o Barão à falência. O mercado interno
ainda não estava completamente estabilizado, pois os escravos não tinham participação
nas trocas monetárias e as relações de mercado não se desenvolviam de forma plena.
A constante oposição dos senhores rurais freavam o crescimento econômico, além de
Mauá possuir diversos inimigos no Brasil e no exterior. Devido a isso, as transformações
na economia tornaram-se ações isoladas de alguns empresários. O País continuava
dominado pela elite rural arcaica, o que gerou o fim da Era Mauá.
41

ORIGENS E ETAPAS DA INDUSTRIALIZAÇÃO NO BRASIL13

O desenvolvimento industrial brasileiro se deu lentamente e somente aconteceu


após o rompimento de obstáculos e de medidas políticas, como nos governos de Getúlio
Vargas e Juscelino Kubistchek, que foram imprescindíveis para que as indústrias se
proliferassem no Brasil. Pois, os longos anos em que o território brasileiro foi colônia
portuguesa, a economia se restringiu à prática da agricultura conhecida também como
monocultura, isto é, o plantio de um único tipo de produto, como o açúcar.
A coroa portuguesa proibia a instalação do comércio manufatureiro no Brasil para
justamente impedir o crescimento de sua colônia, para que ela continuasse somente
fornecendo produtos agrícolas para o mercado externo. Porém, foi a partir do processo
de independência do Brasil que iniciaram pequenas mudanças econômicas,
principalmente, na metade do século XIX, com o desenvolvimento da economia cafeeira
em que os altos lucros propiciaram investimentos em outras atividades econômicas,
como a indústria.
Foi nesse cenário dos grandes lucros da economia cafeeira que surgiram
empresários como Irineu Evangelista de Souza (o Barão de Mauá), preocupados com o
desenvolvimento das estradas de ferro, das cidades e de toda infraestrutura necessária
para o crescimento do país. Contudo, as primeiras indústrias foram surgindo de maneira
paulatina, no final do século XIX e início do XX, elas representavam ainda uma baixa
participação na economia nacional.
Mediante a isso, o Brasil importava praticamente todos os produtos
industrializados, pois suas indústrias não haviam desenvolvido o suficiente. A Europa,
como a região do globo que mais se industrializava, não queria o desenvolvimento
industrial brasileiro, pois perderia mercado consumidor. O Brasil, portanto, dependeu
exclusivamente da economia agrícola até a metade do século XX e, por isso, enfrentou
sérios problemas econômicos e políticos.
A crise de 1929 foi um exemplo da fragilidade da economia brasileira e também
um aviso de que o país necessitava diversificar sua produção. Foi com a entrada de
Getúlio Vargas em 1930 que o processo de industrialização tornou-se o eixo norteador
das discussões e medidas políticas. Foi também na Era Vargas que importantes medidas
aconteceram para o desenvolvimento industrial brasileiro.
Um exemplo da política varguista foi a construção da Usina de Volta Redonda no
Rio de Janeiro para o fornecimento de energia elétrica para as indústrias e para o país,
como também as construções da Companhia Vale do Rio Doce, destinadas à exploração
do minério de ferro em Minas Gerais, e da Petrobrás em 1953, que contribuíram bastante
para o aceleramento do crescimento industrial. Além disso, Vargas criou as leis
trabalhistas preparando o país para a organização no crescimento das indústrias, como
foi o caso da CLT – Consolidação das Leis do Trabalho.
O crescimento industrial ganhou maior dimensão a partir do governo de Juscelino
Kubistchek (1956 – 1961) com a criação de medidas alfandegárias para a vinda de

13 Texto adaptados dos sites: http://www.grupoescolar.com/materia/origens Aceso em 03/03/2011;


etapas_da_industrializacao_no_brasil.html Acesso em 03/03/2011; http://www.coladaweb.com/economia/analise-setorial-a-
industria-brasileira Acesso em 12/02/2014 e http://www.brasilescola.com/historiab/industrializacao-brasileira.htm Acesso em
12/02/2014
42

empresas internacionais para o Brasil. Esse período foi conhecido pelo seu otimismo no
que tange ao crescimento da economia brasileira em que medidas como o Plano de
Metas incentivaram a produção industrial.
Essa política do JK para estimular o crescimento industrial ficou conhecida como
nacional-desenvolvimentista, ela concentrava suas atenções em investimentos na
área de energia e de transportes. Para isso, JK utilizou o capital estrangeiro permitindo
a entrada de empresas multinacionais para o Brasil, como a montadora de automóveis,
Volkswagen.
Destarte, foram com essas medidas políticas do governo de Getúlio Vargas e de
Juscelino Kubistchek que a industrialização brasileira adquiriu vida própria e obteve um
crescimento vertiginoso, principalmente nos últimos anos do século XX e início do século
XXI
O próximo período é o do chamado “Milagre Econômico Brasileiro”. Esta fase se
caracteriza por rápido crescimento econômico, com as taxas situando-se em torno de
10% a.a., com destaque para o produto industrial que cresceu à média de 14% a.a. Neste
período, manteve-se a tendência de maior crescimento nos setores mais intensivos em
capital. Algumas médias de crescimento setorial ilustram este fato:
• Setor de bens de consumo duráveis: 23,6% a.a.;
• Setor de bens de capital: 18,1% a.a.;
• Setor de bens intermediários: 13,5% a.a.
A construção civil ao longo do milagre cresceu a uma taxa média de 15% a.a. e o
setor de bens de consumo leves foi o que apresentou o pior desempenho: o setor têxtil,
por exemplo, cresceu ao longo de todo o período apenas 31%, e o de alimentos 61%.
A fase seguinte é caracterizada por uma série de investimentos estatais e
incentivos ao setor privado, para o desenvolvimento do setor de bens intermediários, no
primeiro caso, e de bens de capital, no segundo. Esta fase é o chamado II PND (II Plano
Nacional de Desenvolvimento).
As taxas de crescimento no período foram menores que ao longo do Milagre, mas
ocorreram profundas mudanças estruturais na economia. A indústria como um todo
cresceu 35% entre os anos 1974/79. Os principais setores foram o metalúrgico, que
cresceu 45%, o setor de material elétrico, 49%, papel e papelão, 50%, o setor químico,
48%. O setor têxtil cresceu 26% e o de alimentos 18%. O setor de material de transportes
cresceu 28%. Percebe-se, novamente, um redirecionamento na atividade industrial,
agora para o setor de insumos e de máquinas e equipamentos.
Com o investimento industrial enquanto centro dinâmico do crescimento
econômico, houve aumento significativo na participação da indústria no PIB, sendo este
o setor com melhor desempenho no período 1930/80.
A década de 80, marcada pela crise cambial da economia brasileira e pela
aceleração inflacionária, trouxe uma crise generalizada para a indústria, com profundas
oscilações no produto industrial. A indústria foi o setor que mais sofreu com o processo
de ajustamento na década de 80. Este baixo crescimento industrial levou vários autores
a chamarem a década de 80 de “A Década Perdida”. Algumas qualificações devem ser
feitas a esse respeito. A indústria passou por um amplo processo de saneamento neste
período. Este fato pode ser visto pelo aspecto financeiro, em que as indústrias deixaram
de ser devedoras líquidas e passaram a apresentar posições credoras, ou seja, ficaram
43

em geral com seus passivos saneados e numa posição líquida para retomar os
investimentos. Observou-se amplo processo de racionalização de custos e busca de
maior eficiência, em especial a partir do governo Collor e do processo de abertura
comercial ao exterior, que levou a profundos ganhos de produtividade.
“O processo de industrialização brasileiro, tinha como uma de suas características
o protecionismo, que levava a uma despreocupação com a questão da eficiência. A
necessidade de sobrevivência, ao longo da crise, levou vários setores e indústrias
específicas a um processo de modernização e de busca de competitividade. Este
processo levou, inclusive, a um aumento nas exportações de manufaturados, uma vez
que a crise forçou as empresas a buscar novos mercados consumidores”. (FORTUNA,
1995, p. 117)
Assim, chamar a década de 80 de perdida, com base nos dados globais de
produção industrial, é encobrir um importante processo de reorganização
microeconômica da estrutura produtiva.
Este último ponto torna-se extremamente importante ao analisarmos a tendência
de abertura comercial brasileira. Várias empresas que se modernizaram ao longo da
crise possuem hoje competitividade internacional, em especial se algumas reformas
institucionais forem realizadas no sentido de se reduzir o chamado “custo Brasil”. Entre
estas destacam-se a readequação da infraestrutura (transporte, energia, sistema
portuário etc.), a reforma tributária com a diminuição da cunha fiscal sobre as empresas,
a reforma financeira que permita a consolidação de linhas de financiamento com prazos
e custos adequados.
Algumas características, porém, ainda permanecem no setor empresarial
brasileiro que necessitarão de transformações. O modelo de industrialização brasileira
baseou-se no chamado tripé: capital estatal, capital privado nacional e capital privado
internacional. Ao primeiro caberia o setor de infraestrutura e as indústrias intermediárias
(de base) - setores que necessitavam de alta escala de capital. Ao terceiro caberia os
setores de ponta, tecnologicamente mais avançados, os setores dinâmicos do
desenvolvimento (bens de consumo duráveis, químicos etc.). O capital privado nacional
ficou responsável pelos setores tecnologicamente mais simples e onde menores escalas
de capital fossem necessárias; neste sentido incumbiu-se do setor de bens de consumo
leve e dos setores fornecedores de insumos ao capital estrangeiro e ao capital estatal.
Com isso, a empresa nacional é de pequeno porte, em comparação com as
empresas internacionais, possuindo pequena escala de produção. Este fato pode ser
explicado por vários motivos; entre eles, podemos destacar o pequeno mercado
consumidor nacional, dado o processo concentrador de renda que se verificou no Brasil
e a ausência de financiamento adequado para as empresas. Esta pequena escala
permite a existência de empresas de caráter tipicamente familiar, que vão passando de
pais para filhos, em que muitas vezes se sacrifica a expansão da empresa para não se
perder o controle familiar. Com isso, várias ineficiências administrativas se colocam em
várias empresas por uma resistência à profissionalização da administração e à quebra
do controle familiar.
Outro ponto é que, dadas as características do mercado de trabalho no Brasil e
em virtude do protecionismo, que permitia despreocupação com a eficiência, as
empresas nacionais não possuem tradição de investir em pesquisas e desenvolvimentos
44

tecnológicos. Com isso produzem produtos com baixa intensidade tecnológica e


pequeno valor adicionado, não conseguindo entrar nos setores dinâmicos da indústria
moderna. Assim, estas empresas têm grande dificuldade de atingir escalas de operações
globais, cada vez mais necessárias no mundo moderno.

A Concentração Industrial No Sudeste14

A distribuição espacial da indústria brasileira, com acentuada concentração em


São Paulo, foi determinada pelo processo histórico, já que no momento do início da
efetiva industrialização, o estado tinha, devido à cafeicultura, os principais fatores para
instalação das indústrias, a saber: capital, mercado consumidor, mão-de-obra e
transportes.
Além disso, a atuação estatal através de diversos planos governamentais, como
o Plano de Metas, acentuou esta concentração no Sudeste, destacando novamente São
Paulo. A partir desse processo industrial e, respectiva concentração, o Brasil, que não
possuía um espaço geográfico nacional integrado, tendo uma estrutura de arquipélago
econômico com várias áreas desarticuladas, passa a se integrar. Esta integração reflete
nossa divisão inter-regional do trabalho, sendo tipicamente centro-periferia, ou seja, com
a região Sudeste polarizando as demais.

A descentralização industrial

Atualmente, seguindo uma tendência mundial, o Brasil vem passando por um


processo de descentralização industrial, chamada por alguns autores de
desindustrialização, que vem ocorrendo intra-regionalmente e também entre as regiões.
Dentro da Região Sudeste há uma tendência de saída do ABC Paulista, buscando
menores custos de produção do interior paulista, no Vale do Paraíba ao longo da Rodovia
Fernão Dias, que liga São Paulo à Belo Horizonte. Estas áreas oferecem, além de
incentivos fiscais, menores custos de mão-de-obra, transportes menos congestionados
e por tratarem-se de cidades-médias, melhor qualidade de vida, o que é vital quando se
trata de tecnopólos.
A desconcentração industrial entre as regiões vem determinando o crescimento
de cidades-médias dotadas de boa infraestrutura e com centros formadores de mão-de-
obra qualificada, geralmente universidades. Além disso, percebe-se um movimento de
indústrias tradicionais, de uso intensivo de mão-de-obra, como a de calçados e
vestuários para o Nordeste, atraídas sobretudo, pela mão-de-obra extremamente barata.

Processos

Processo de expansão industrial ocorrido no Brasil nas décadas de 40 e 50. A


partir da segunda metade dos anos 50, o setor passa a ser o carro-chefe da economia
do país.
Os primeiros esforços para a industrialização do Brasil vêm do Império. Durante o
Segundo Reinado (1840-1889), empresários brasileiros como Irineu Evangelista de
Souza, o Visconde de Mauá, e grupos estrangeiros, principalmente ingleses, investem

14 Fonte: http://geocities.yahoo.com.br
45

em estradas de ferro, estaleiros, empresas de transportes urbanos e gás, bancos e


seguradoras.
A política econômica, porém, privilegia a agricultura exportadora. Beneficiadas
pelo investimento de parte das rendas do café e da borracha, as atividades industriais
limitam-se a marcenarias, tecelagens, chapelarias, serrarias, moinhos de trigo, fiações e
fábricas de bebidas e conservas. Metalúrgicas e fundições são raras. O país importa os
bens de produção e parte dos bens de consumo.
Indústria de base – Os efeitos da crise de 1929 sobre a agricultura cafeeira e as
mudanças geradas pela Revolução de 1930 modificam o eixo da política econômica, que
assume um caráter mais nacionalista. Já em 1931, Getúlio Vargas anuncia a
determinação de implantar uma “indústria de base”.
Com ela, o país poderia produzir insumos e equipamentos industriais e reduzir
sua importação, estimulando a produção nacional de bens de consumo. As medidas
concretas para a industrialização, contudo, são tomadas durante o Estado Novo, em
1937.
As dificuldades causadas pela 2ª Guerra Mundial (1939-1945) ao comércio
mundial favorecem essa estratégia de substituição de importações. Em 1943, é fundada
no Rio de Janeiro a Fábrica Nacional de Motores. Em 1946, começa a operar o primeiro
alto-forno da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), em Volta Redonda, no estado do
Rio. A Petrobrás, que detém o monopólio da pesquisa, extração e refino de petróleo, é
criada em outubro de 1953. Todas elas são empresas estatais.
Anos JK – O nacionalismo da era Vargas é substituído pelo desenvolvimentismo
dos anos JK (governo Juscelino Kubitschek, de 1956 a 1961). O governo implanta uma
política tarifária protecionista. Amplia os serviços de infraestrutura, como transportes e
fornecimento de energia elétrica, atraindo grandes investimentos de capital estrangeiro.
Com os investimentos externos estimula a diversificação da economia nacional,
aumentando a produção nacional de insumos, máquinas e equipamentos pesados para
mecanização agrícola, fabricação de fertilizantes, frigoríficos, transporte ferroviário e
construção naval.
A industrialização consolida-se com a implantação da indústria de bens de
consumo duráveis, sobretudo eletrodomésticos e veículos, com o efeito de multiplicar o
número de fábricas de peças e componentes. No início dos anos 60, o setor industrial
supera a média dos demais setores da economia brasileira.
“Milagre econômico” – O desenvolvimento acelera-se e diversifica-se no período
do chamado “milagre econômico” (1968-1974). A disponibilidade externa de capital e a
determinação dos governos militares de fazer do Brasil uma “potência emergente”
viabilizam pesados investimentos em infraestrutura (rodovias, ferrovias,
telecomunicações, portos, usinas hidrelétricas, usinas nucleares), nas indústrias de base
(mineração e siderurgia), de transformação (papel, cimento, alumínio, produtos
químicos, fertilizantes), equipamentos (geradores, sistemas de telefonia, máquinas,
motores, turbinas), bens duráveis (veículos e eletrodomésticos) e na agroindústria de
alimentos (grãos, carnes, laticínios).
Em 1973, a economia apresenta resultados excepcionais: o Produto Interno Bruto
(PIB) cresce 14%, e o setor industrial, 15,8%.
Já em meados dos anos 70, a crise do petróleo e a alta internacional nos juros
desaceleram a expansão industrial. Inicia-se uma crise que leva o país, na década de
80, ao desequilíbrio do balanço de pagamentos e ao descontrole da inflação. O Brasil
46

mergulha numa longa recessão que praticamente bloqueia a industrialização. No início


dos anos 90, a produção industrial é praticamente a mesma de dez anos atrás.
Indicadores sociais – Sustentada na urbanização e em um modelo industrial, a
modernização da economia brasileira é conservadora. Apesar de deixar de ser apenas
um país agrário, exportador de alimentos e matérias-primas, e de desenvolver uma
apreciável base industrial e tecnológica, há uma grande distorção na distribuição de
renda.
A política industrial favorece alguns setores, como os de bens de capital e bens
de consumo durável. Ao mesmo tempo, concentra os investimentos nas regiões Sul e
Sudeste, principalmente em setores geradores de empregos e com efeito multiplicador
da economia.
No Nordeste os investimentos limitam-se a setores de consumo não-durável,
como a indústria têxtil, que não tem um efeito dinâmico sobre a economia. O resultado é
um alargamento das diferenças econômicas entre as regiões geográficas brasileiras e,
dentro de cada região, entre as classes sociais. A situação torna-se crítica sobretudo nas
áreas de saúde pública, habitação, alimentação e educação.
47

A NOVA DINÂMICA ECONÔMICA COM OS IMIGRANTES TEUTOS NO


RIO GRANDE DO SUL
Paulo Gilberto Mossmann Sobrinho

A partir da característica de proximidade com os rios, foi propiciado o


desenvolvimento agrícola comercial nas zonas de imigração. Esse desenvolvimento é
fruto de uma agricultura de policultura, em que o excedente produzido era destinado para
a venda ou a troca, uma vez que a moeda corrente de maior frequência utilizada nas
colônias, principalmente durante o séc. XIX, era a troca de mercadorias, especialmente
a troca de produtos enviados e trazidos a Porto Alegre. Aliás, a troca comercial entre
Porto Alegre e as colônias determinou o forte desenvolvimento econômico da capital do
Rio Grande do Sul, engendrando uma relação de clientelismo, ao criar sua base
econômica através da dependência de seus produtos para as colônias. Em contrapartida
ao fortalecimento econômico porto-alegrense, as outras duas grandes cidades sul-rio-
grandenses: Rio Grande e Pelotas, que destinavam sua produção basicamente de
produtos pecuários (charque, couro) para o sudeste e nordeste do Brasil, ficavam na
dependência do instável mercado imperial.
As relações comércio eram realizadas principalmente pela fluvial durante grande
parte do séc. XIX, na medida em que ocorria o enriquecimento e aumento de produção
nas colônias, era necessário melhorar as condições de armazenamento e de transporte
para essas mercadorias. Assim, nasceram as companhias de navegação, que com o
passar do tempo foram expandindo seus negócios não só para a província sul-rio-
grandense, como também para a região sudeste do Brasil. Reinheimer (2000) descreve
como seria o funcionamento dessas companhias de navegação:

O comércio, por sua vez, ocorria da seguinte forma: os portos ou entreposto


comerciais na Região Colonial mantinham um importante comércio com as
'vendas' estabelecidas nas 'linhas' ou 'picadas' dos núcleos coloniais. Junto aos
portos, localizavam-se os depósitos e armazéns que normalmente pertenciam às
companhias de navegação ou, em sociedades, aos proprietários das
embarcações [...] O agricultor-colono entregava seus produtos na 'venda' local.
Essas 'vendas' detinham sua influência e alcance comercial dentro de uma certa
área e, então, o vendeiro tratava de transportar: por carroça ou pequenas
embarcações, os produtos até o porto, nos depósitos [...]. (REINHEIMER, 2000,
p. 32).

Essa dinâmica comercial da venda das colônias com a capital impulsionou o


surgimento do mercado de consumidor, alavancou o mercado interno do Rio Grande do
Sul. Moure defende essa tese:

A formação de um mercado interno gaúcho tem sua dinâmica calcada no caráter


especifico da imigração alemã e italiana. A produção agrícola da tona colonial,
com base na pequena propriedade, 'marcou profundamente a formação e a
potencialidade do mercado gaúcho, dotando-o de uma parcela maior da
população com médio poder aquisitivo. O imigrante possuía um poder de compra
bem maior do que daqueles que, radicados em outras regiões do país, se
integram à massa assalariada do campo e da cidade. (MOURE, 1987. p. 102).
48

Desse modo, após cinco décadas do princípio do processo imigratório alemão


para o Rio Grande do Sul (1824), os núcleos das colônias já estabelecidos iniciaram uma
nova fase de sua dinâmica comercial. Findada a fase de consolidação de abastecimento
interno do próprio núcleo colonial, iniciou o processo de comercialização do excedente
de produção para outras regiões. Soma-se à venda de excedentes agrícolas, a própria
produção artesanal do respectivo núcleo colonial, uma vez que:

O próprio desenvolvimento da atividade agrícola permitiu que uma parte dos


colonos não dedicasse integralmente ao cultivo da terra e pudesse especializar-
se na produção artesanal e na venda do próprio produto para o mercado.
Tratava-se, basicamente de uma produção mercantil não capitalista, na qual o
artesão, com ferramentas simples, produzia para o consumo local e para o
mercado, com o auxílio da mão-de-obra familiar. (PESAVENTO, 1985, p. 26).

Essa produção artesanal estava diretamente relacionada à necessidade desse


colono, muitos produtos eram destinados às lides do campo, como por exemplo, rodas
de carroça e ferramentas para lavoura. Outros, à alimentação, como azeites, licores,
banha, farinha e cerveja. Além disso, tinha-se, ainda, para cumprir o objetivo de suprir
as necessidades básicas, a fabricação de como tijolos para a construção, sapatos e
roupas para vestimentas. No entanto, destaca-se, sobre as oficinas dessa época, que:

Nessa época, as oficinas que tinham instalações simples e precárias – apenas


algumas mesas, cavaletes e bancos – empregavam, no máximo, dois
funcionários que eram também aprendizes, e que, em geral, não recebiam
salários pelo seu trabalho, exceto a comida, e eram normalmente da própria
família ou tinham relações de amizade ou de vizinhança com o dono da oficina.
Os instrumentos e as ferramentas de trabalho eram rudimentares e pertenciam
ao dono do estabelecimento. (SCHEMES, FAY e PRODANOV, 2010 p. 164)

A partir dessas condições, a venda desses produtos oportunizou a inserção do


colono europeu (principalmente o alemão e o italiano) na nova dinâmica econômica do
Rio Grande do Sul. Aliás, não seria nenhum absurdo inferir que o colono europeu não se
inseriu na nova dinâmica e sim que ele foi o principal agente para elaboração dessa nova
dinâmica econômica. A acumulação do lucro, obtida através do comércio de produtos
diversificados, foi um dos fatores determinantes para os investimentos necessários ao
surgimento da indústria, no Rio Grande do Sul, no final do século XIX.
Notabiliza-se que esse comércio dependia de uma maior relação de
intermediação do interior com a capital. Assim, núcleos coloniais como os de São
Leopoldo, São Sebastião do Caí e Santa Cruz do Sul apresentavam maiores chances
de acumulação de divisas e seus respectivos investimentos na industrialização. Destaca-
se o caso da cidade de São Sebastião do Caí, de onde derivaram grandes indústrias
como a Renner, Ritter, Mentz e Oderich.
A ligação com Porto Alegre era fundamental não só pelo fato de criar uma relação
com um grande centro consumidor, como também de ter a capital como um intermediário
para exportar os produtos das colônias para outras províncias e/ou estados brasileiros
ou até mesmo outros países, como também a ter um intermediário que trouxesse as
tecnologias (motores, locomoveis, equipamentos para a indústria) necessárias para o
desenvolvimento industrial nas colônias.
49

Porto Alegre constitui-se, de fato, como o maior centro urbano do estado sul-rio-
grandense. Isso, graças a essa dinâmica econômica relacionada com as áreas coloniais
e o desenvolvimento industrial incipiente nessa nova dinâmica.
Contudo, salienta-se que a questão da industrialização no Rio Grande do Sul nem
sempre ocorreu em consequência de uma evolução artesanal que se intensificou, na
medida em que se aumentavam os investimentos oriundos dos excedentes agrícolas.
Em alguns casos, constata-se a presença de investidores que não passaram pelo estágio
do artesanato, tendo seu foco comercial já relacionado com a instalação de maior porte.
Esses investimentos eram do “burguês imigrante” (PESAVENTO, 1985, p.32), um
imigrante respaldado pela sua experiência profissional (entendimento técnico e
econômico/capitalista). No ramo industrial, via no crescente mercado consumidor sul-rio-
grandense/brasileiro um excelente investimento.
Ressalta-se que, muitas vezes, esse “burguês imigrante” via no colonato uma
excelente oportunidade para obter uma mão-de-obra qualificada. Esse colono, que
serviu de mão-de-obra para as nascentes indústrias sul-rio-grandense, se caracterizou
por ser um pequeno produtor rural que não teve recursos suficientes para se modernizar
e competir comercialmente com outros colonos. Dessa forma, esse pequeno produtor
acabou servindo como uma excelente mão-de-obra para a indústria, pois além de existir
um laço étnico entre o imigrante burguês e o imigrante pequeno colono, havia também
uma noção de trabalho artesanal por parte desse pequeno colono, o que facilitava o
trabalho nas indústrias.
No que tange à matéria prima para a indústria oriunda dos imigrantes, estava
relacionada diretamente com a produção sul-rio-grandense, com a indústria se
destinando ao beneficiamento, principalmente de alimentos e vestimentas, destacando-
se a produção de banha, cerveja, farinha, fumo, roupas e sapatos. Evidencia-se,
também, a indústria metalomecânica, que apesar de depender de matéria prima externa,
tinha como finalidade a produção destinada para atender às necessidades internas, ou
seja, relacionadas com o setor de produção agrícola. Conforme Schemes, Fay e
Prodanov (2010):

Evidentemente, não podemos esquecer que existiam algumas condições


favoráveis a esse surto industrial do final do século XIX, como o fornecimento de
matéria-prima, o couro, para a indústria de calçados, por exemplo, ou o capital
acumulado pelos comerciantes imigrantes que poderia subsidiar alguns
negócios. (SCHEMES, FAY e PRODANOV, 2010, p. 163).

Para agilizar o comércio desses produtos entre as regiões, foi necessário um


aprimoramento da questão logística. Nesse sentido, além da questão da navegação, já
citada, tem-se a instalação da primeira ferrovia interligando Porto Alegre a São Leopoldo
(primeiro núcleo de imigração alemão no Rio Grande do Sul), no ano de 1874. A ferrovia
foi criada com a intenção de diminuir o tempo e as limitações do transporte fluvial, que
era muito suscetível à cheia do rio dos Sinos, pelo fato de o mesmo ser um rio
considerado raso para suportar embarcações de maior porte.
Além disso, a ferrovia aproximou a exportação dos produtos coloniais, também
facilitou a importação de máquinas vindas da Europa, que eram de extrema necessidade
para as indústrias locais. Assim,
50

[...] o processo de imigração/colonização que se desenvolveu no Rio Grande do


Sul no Rio Grande do Sul estabeleceu formas de vinculação orgânicas com a
indústria nascente, tanto no que diz respeito a formação do capital, quanto no
que se refere a liberação da força-trabalho, fornecimento de matéria-prima,
aquisição de tecnologia e formação de um mercado consumidor para produtos
manufaturados. (PESAVENTO, 1985, p. 37).

Esse mercado consumidor (principalmente interno – Rio Grande do Sul) foi


decisivo para a constituição da indústria sul-rio-grandense. Indústria essa que começou
ainda no século XIX, a partir do ano de 1875, uma série de exposições, que, além de
divulgação dos avanços industriais, servia como uma excelente possibilidade de
fechamento de negócios.
Com o enriquecimento obtido com as indústrias, o “burguês-imigrante” – que tinha
no comércio a atividade principal e, na indústria, um investimento por vezes fundamental,
por vezes complementar ao seu negócio – passasse a ter na indústria seu principal foco
de investimentos. Dava-se, assim, origem a uma “burguesia industrial”
(PESAVENTO,1985, p. 48).
51

A INFLUÊNCIA DA NATUREZA NOS ACONTECIMENTOS HISTÓRICOS


Paulo Gilberto Mossmann Sobrinho

Os estudos relativos à história ambiental representam a possibilidade de uma


maior percepção aos fatos ilustrados a partir da história social. Vários aspectos através
do olhar da história ambiental passaram a ser revistos na elaboração da pesquisa
histórica. Pode-se destacar, entre outros tantos aspectos, a revisão da questão do tempo
na história e as influências da natureza na constituição dos acontecimentos históricos.
Esses dois pontos são cruciais para a compreensão do fato histórico pesquisado.
O significado do tempo para o historiador é algo imprescindível para a reprodução do
memento a ser retratado. Contudo, o tempo apresentado pela história de cunho social
passou por uma profunda revisão em meados do séc. XIX, influenciado diretamente
pelos estudos da história ambiental. Sabe-se que o historiador se detém especificamente
em estabelecer a temporalidade em séculos, décadas e anos, desprezando muitas vezes
a precisão das horas, minutos e segundos. Contudo, a história natural no séc. XIX iniciou
uma nova recontagem da temporalidade do planeta Terra, rompendo com a teoria
fundante do planeta exposto na bíblia, fixando uma nova temporalidade e uma nova
exigência da escala tradicional do tempo histórica ampliando a existência do planeta de
milênios para centenas de milhões de anos e posteriormente bilhões de anos. Dessa
forma:

Pelo fato de repensar a história da terra e dos seres vivos numa escala de
centenas de milhões de milênios, um punhado de cientistas naturais do século
XIX provocou um cataclismo no sistema “ocidental” de contagem do tempo [...].
Esse foi um fato central na vida intelectual europeia do século XIX e os seus
choques perduram. Entre profissões de fé materialistas e antimaterialistas,
escândalos, excomunhões e polêmicas canhestras sobre a ancestralidade símia
dos humanos, a história natural do século XIX e as suas diversas herdeiras
desafiaram o tempo do Velho Testamento e da cultura europeia e ocidental.
(DRUMMOND, 1991, p. 178).

No que tange à questão da influência do meio ambiente na história, tem-se, assim


como a questão da temporalidade, uma nova perspectiva da história ambiental.
Pesquisadores sociais costumavam estabelecer os fatos ocorridos como se fossem
estabelecidos através da vontade dos homens. No entanto:

Circunstâncias extra-científicas ainda bem recentes, mencionadas no artigo de


Worster - principalmente movimentos sociais ambientalistas e certas crises
ambientais localizadas - desafiaram as ciências sociais deste fim de século XX a
ir além deste marco “humanista”. Não era mais possível pensar na sociedade
humana sem ancoragem no mundo natural. Curiosamente, foram cientistas
naturais que de novo lideraram, nos movimentos ambientalistas ou nas
instituições de pesquisa, um entendimento “ecológico” da sociedade e da cultura
humanas. (DRUMMOND, 1991, p. 180).

Fica evidente o caráter reformista da história ambiental ante a história social


imposta. Dentre os países onde está em maior evidência os estudos ambientais para a
história há de se destacar as pesquisas realizadas na França e especialmente na
Inglaterra e Estados Unidos. As novas concepções estabelecidas pela história ambiental
acabam por entrar em conflito com pesquisadores adeptos da história social. No entanto,
52

cabe ao historiador estabelecer novos conceitos ao realizar a sua pesquisa. Drummond


retrata a necessidade dessa mudança entre os historiadores:

Precisa ficar claro que pensar sobre a relação entre o “tempo geológico” e o
“tempo social”, combinar a história natural com a história social, colocar a
sociedade na natureza, enfim - implica necessariamente atribuir aos
componentes naturais “objetivos” a capacidade de condicionar significativamente
a sociedade e a cultura humanas. Não há meias palavras quanto a isso. Não se
trata de fazer apenas metáforas ambientais, ecológicas ou naturais, como as que
predominaram, por exemplo, na famosa escola de “ecologia humana”
desenvolvida na Universidade de Chicago a partir dos anos 1920 [...]. Trata-se
de uma mudança séria de paradigma nas ciências sociais. Significa que o
cientista social dá às “forças da natureza” um estatuto de agente condicionador
ou modificador da cultura. (DRUMMOND, 1991, p. 180).

Para que a história ambiental atinja realmente o seu objetivo de se intercalar com
a história social, e dessa forma melhor reconstituir o fato histórico, é necessário que o
pesquisador adepto a este cientificismo histórico siga uma série de procedimentos
metodológicos. Pode-se estabelecer este procedimento metodológico a partir de cinco
vieses:
Primeiro, julga-se necessário o reconhecimento da região a ser pesquisada:
relevo, hidrografia, clima, a população presente, a intervenção do homem na natureza.
Analisando especificamente essas áreas, o historiador poderá perceber as influências
do meio ambiente na vida social.
Segundo, a apropriação de estudos de outras ciências naturais como a geologia,
geomorfologia, climatologia, meteorologia, biologia, agronomia e engenharia florestal.
Dessa forma, as ciências naturais, além de “aliadas”, podem ser também parte do próprio
objeto de estudo, como manifestações culturais que ajudam a entender os padrões de
uso dos recursos naturais. (DRUMMOND, 1991, p. 181)
Terceiro, trata-se de relacionar a utilização dos recursos naturais existentes no
ambiente local e o uso feito pela sociedade. Há de se salientar que nem todas as
sociedades que possuem os mesmos recursos naturais tiveram a sua mesma utilização.
Tudo dependeu dos avanços científicos e culturais para a melhor exploração do material.
Um exemplo desse acontecimento está no fato de que diversas sociedades dominavam
o uso do fogo, mas nem todas estas utilizavam do fogo para beneficiar metais e
produzirem instrumentos ou ferramentas para uso do cotidiano.
Quarto caracteriza-se pela diversidade de fontes que podem ser usados na
pesquisa de história ambiental, inclusive fontes usadas ou estabelecidas pela história
social, os relatos de viajantes que percorreram o Mundo a partir do séc. XV. As viagens
de cientistas naturais do séc. XVIII constituem uma significativa fonte de pesquisa.
O quinto e último aspecto a ser levantado está ligado ao trabalho da pesquisa de
campo, onde os historiadores ambientais vão até o local de interesse para conhecer
melhor o meio ambiente. O trabalho de campo serve para identificaras marcas deixadas
na paisagem pelos diferentes usos humanos, marcas essas que nem sempre constam
de documentos escritos. (DRUMMOND, 1991, p. 182)
Seguindo estes procedimentos, o historiador ambiental terá subsídios suficientes
para qualificar a sua pesquisa.
53

No que tange a publicações e trabalhos já desenvolvidos para a história ambiental,


há de se destacar a revista estadunidense Environmental Review (atualmente intitulada
como Environmental History Review), fundada em 1976 e publicada pela Associação
Norte-Americana de História Ambiental, que tem em suas publicações uma verdadeira
referência para os pesquisadores de história ambiental.
Além da revista Environmental History Review, pode-se destacar como referência
para os adeptos da história ambiental as obras de: Donald Worster (University of
Kansas), William Cronon (Yale University), Alfred Crosby (University of Texas), Stephen
J. Pyne (University of Arizona). Leo Marx London, Oxford University Press), Roderick
Nash, (Yale University Press). Frederick Turner: (University Press), Warren Dean (New
York University).
No Brasil, apesar de não se ter até o presente momento (1991) nenhum
historiador intitulado como historiador ambiental, tem-se diversas abras com autores
apresentando aspectos ambientais na reprodução do fato histórico. Pode-se destacar
neste sentido trabalhos desenvolvidos por: Sérgio Buarque de Holanda, Gilberto Freyre,
Aziz Ab’Saber, Alberto Ribeiro Lamego, Euclides da Cunha, Oliveira Vianna, Alberto
Torres, Capistrano de Abreu, Caio Prado Jr, além de obras de viajantes estrangeiros que
ajudam ao historiador ambiental a compreender melhor o seu objeto de pesquisa.
Esses pesquisadores, sejam eles adeptos ou não a história ambiental, acabam
por auxiliar nas fontes de pesquisa nessa área que ainda sofre restrições por parte dos
historiadores sociais. Mas, gradativamente, com o desenvolvimento de pesquisas séries
e bem fundamentadas e com o advento das ideias estabelecidas pela
interdisciplinaridade da nova história cultural, vêm ganhando cada vez mais credibilidade
e espaço na fundamentação de pesquisas históricas.

Referência

DRUMMOND, José Augusto. A HISTÓRIA AMBIENTAL: temas, fontes e linhas de


pesquisa. Estudos Históricos, Rio de Janeiro, vol. 4, n. 8, 1991, p. 177-197
54

A NATUREZA PREDATÓRIA EUROPEIA


Paulo Gilberto Mossmann Sobrinho

A natureza predatória europeia, somada a exploração de uma vasta região onde


a natureza imperava de modo que ao mesmo tempo demonstrava uma suposta infinitude
auspiciada por Deus e sendo assim, a concretização de um novo éden, serviam de
argumentos para justificar a caça predatória e as práticas de desmatamento e má
utilização do solo nas terras brasileiras.
No entanto, a referida percepção de infinitude dos recursos naturais começa a se
ruir com as primeiras visões das concepções de estudos sobre a natureza e a
constatação de significativa diminuição dos recursos naturais.
Diversos viajantes percorreram o Brasil no período colonial e registraram o
descaso dos explorados com relação à utilização dos recursos naturais e a destruição
de florestas e mananciais.
A cobiça dos conquistadores, que visavam um enriquecimento rápido nas terras
portuguesas na América, conduziu diversos ciclos econômicos no Brasil colonial a
constituírem prejuízos ambientais. Até nos dias atuais, cerca de 300, 400 anos depois
da sua exploração inicial, ainda ficaram os seus danos ambientais de espólios para a
sociedade contemporânea.
O Ciclo da mineração destruiu vegetações, ecossistemas inteiros, desviou rios e
levou a um rápido processo de empobrecimento de solo. Os ciclos da cana-de-açúcar e
do café fizeram da monocultura uma prática econômica que devastou ares de florestas
e, através de muitas vezes, queimadas acabaram dizimar significativa parte da Mata
Atlântica.
Tinha-se como base na exploração desses ciclos, uma mão-de-obra escrava de
técnicas rudimentares, sendo considerados estes escravos tão hostis e rudimentares
quanto à vida selvagem que se levava nestas terras conquistadas pelos lusos.
E, ainda como forma de compensação, a fracassada procura por prata, ouro ou
pedras preciosas os exploradores fizeram da fauna e da flora artigos “exóticos” para
venda no Velho Mundo, e dessa forma, restituir parte dos prejuízos oriundos da
exploração.
Essa situação de exploração e depredação formou a base da cultura brasileira
que terá seus reflexos evidenciados no século XX - quando movimentos ecológicos se
depararam contra uma estrutura social montada com a ideia de que o selvagem, a
natureza e os pobres (oriundos por vezes dos escravos) representam o atraso do país
em contrapartida ao desenvolvimento que deveria acontecer para a nação enriquecer.
Este será um dos grandes obstáculos a ser quebrado pelo movimento ecológico,
especialmente a partir da década de 70 do século citado.
55

DESMATAMENTO CIVILIZADOR:
A história ambiental da colonização europeia no Rio Grande do Sul (1824-1924)
Juliana Bublitz

Introdução

Durante mais de um século, milhares de imigrantes europeus atravessaram o


Atlântico para estabelecer vida nova no continente americano. O Brasil meridional
recebeu suas primeiras levas de colonos – notadamente portugueses insulares – na
segunda metade do século XVIII. Mas a ocupação sistemática das áreas de mata da
então Província de São Pedro do Rio Grande do Sul só seria intensificada a partir do
século XIX, com o início da grande imigração europeia à região.
Esse processo se desencadearia em 1824, com os incentivos à imigração alemã
e o estabelecimento de colônias em áreas florestais da depressão central e da encosta
da serra, onde viviam principalmente tribos guaranis. A partir de 1875, um novo fluxo de
imigrantes, notadamente de origem italiana, aceleraria a ocupação da região serrana da
província, coberta pela mata de araucária e habitada principalmente por coroados.
O final do século XIX ainda seria marcado pelo início da ocupação das últimas
áreas florestais da Província, com a implantação das chamadas “colônias mistas” no
norte do território que hoje compreende o Rio Grande do Sul. Em princípios do século
XX, seria desencadeado o povoamento sistemático do Alto Uruguai e do Alto Jacuí,
acompanhando os trilhos do trem (Gelpi e Wickert 2005) e fazendo recuar os grupos
indígenas remanescentes. Erechim (1908), Santa Rosa (1915) e Guarita (1917)
surgiriam nesse processo e se tornariam “enormes clareiras na mata”, das quais seria
impulsionado o povoamento “em todas as direções, estabelecendo a junção entre os
núcleos iniciais” (Bernardes 1997, p.77). Em 1924, cem anos após o início da
colonização, todas as áreas de mata da província já estariam praticamente ocupadas.
Novas pesquisas acerca desse processo, conduzidas a partir da perspectiva de
abordagem da história ambiental, vêm atestando o impacto ambiental implícito a essa
marcha colonizadora (Bublitz 2004, 2005; Bublitz e Correa 2004, 2005; Gerhardt 2005;
Wendt 2004). Apesar disso, a historiografia regional permanece, em grande medida,
alheia às questões ambientais e à análise das consequências diretas e indiretas das
relações estabelecidas entre colonos e natureza. Neste artigo, pretende-se analisar
alguns aspectos relacionados à última fase da colonização no Rio Grande do Sul,
atentando para as implicações desse processo de ocupação na transformação da
paisagem sulina.

A marcha rumo à floresta

Ao final do século XIX, muitos dos descendentes dos antigos colonos já


estabelecidos no Rio Grande do Sul deixaram suas famílias e partiram em busca de
novas terras por colonizar. A frente colonizadora seguiu em direção às florestas ainda
não desbravadas do Norte da Província, onde passaram a ser constituídas novas
colônias. Convergiram para tais núcleos, colonos de diferentes nacionalidades, assim
como imigrantes recém-chegados da Europa. Nesse processo, densas florestas
56

entremeadas por áreas de campo e caracterizadas por uma enorme biodiversidade


deram lugar a um cenário colonial não apenas multiétnico, mas devastador do ponto de
vista ecológico.
Até o início da colonização, mato e campo coexistiam no Planalto setentrional –
suas linhas divisórias não eram bem definidas. Na borda da serra e no Alto Uruguai,
havia ainda florestas densas, nativas, “matas de galeria coalescidas pela vizinhança das
bacias fluviais”, como informou mais tarde Balduíno Rambo, em sua Fisionomia do Rio
Grande do Sul (2000, p.256), para quem o quadro vegetal do Planalto representava
efetivamente a “cópia mais ampla e mais rica do que já estudamos na campanha, no
sudeste, na Depressão Central e parcialmente até no litoral”. Mais do que isso: conforme
o botânico suíço C. Lindmann ([1906]1974, p.176), “as grandes florestas do Brasil [...]
aparecem típicas especialmente nas vertentes dos planaltos”, sendo que “até onde
existem campos, o Brasil do Sul produz também vegetação arborescente de formas
diversas e em diferentes graus de perfeição”.
À época da chegada dos primeiros colonos àquela região, uma ampla mata de
pinhais e uma grossa cobertura florestal subtropical eram onipresentes no Planalto, cuja
variedade paisagística também se revelava em extensos trechos de vegetação
essencialmente campestre – os chamados Campos de Cima da Serra –, recortada aqui
e ali por sobressalentes capões. A despeito dos campos, esparsamente ocupados por
criadores de gado luso-brasileiros desde de 1828, foi na floresta subtropical de folhas
caducas, de solo considerado mais fértil, que se constituíram boa parte das novas
colônias (Roche, 1969, p.50-51), conforme se observa no mapa a seguir (mapa 1).

Mapa 1: Áreas de mata nativa no Rio


Grande do Sul e região onde se
difundiram as colônias mistas.
Fonte: RAUBER, Alexandre.
Departamento de
Geoprocessamento da Universidade
de Santa Cruz do Sul (Unisc), 2004,
com dados adaptados de Bernardes
(1987) e RadamBrasil 1996.

Essa área estendia-se


por pelo menos duas grandes
zonas do Planalto: o Alto
Jacuí, aberto à colonização no
início do século XX, e a região
do Alto Uruguai, abrigo das
primeiras colônias locais e, ao
mesmo tempo, última zona
pioneira do Estado, cujas
bordas foram ocupadas mais
tarde, durante as duas grandes guerras mundiais. Já a área marcada pela floresta de
pinhais (ou de araucárias), na região setentrional do Planalto, foi aos poucos desbravada
principalmente por colonos dissidentes dos núcleos italianos estabelecidos na parte
superior da Serra rio-grandense.
57

As novas colônias, implantadas sobre terras naturalmente adubadas, ricas em


minerais, recortadas em lotes de cerca de 25 hectares em média, foram alvo de colonos
vindos de distintos núcleos coloniais já estabelecidos na Província. Homens, mulheres e
crianças de origem diversa – alemã, italiana, polonesa, suíça, francesa, etc. – migraram
para aquela região. Muitos ainda seguiram rumo ao oeste catarinense e mesmo à
Argentina. Os que permaneceram formaram núcleos de povoamento misto, aos quais
iam se juntando outros imigrantes, vindos diretamente da Europa, embora em menor
escala.
A enxamagem foi, por certo, o ingrediente básico desse processo de diáspora
colonial e de dilapidação ambiental, como já apontou Roche (1969) – que comparava a
constante migração dos enxames de abelhas à migração interna dos colonos, sempre à
procura de novas terras, deixando para trás solos degradados pela prática da queimada,
ou “técnica do fósforo”, nas palavras de Olívio Manfroi (1987, p.179). Como ele, Rambo
(2000, p.313) também perceberia o “grave inconveniente” do que considerava um
modelo de apropriação de terras absolutamente insustentável:
A expansão rápida das colônias transformou-se bem cedo numa verdadeira
corrida para a mata virgem [...] Uma série de fenômenos naturais e sociais se deve a
este fato. Antes de tudo, é o desmatamento progressivo da fralda da serra. Praticamente
todos os terrenos já perderam sua capa selvática; o que resta são os trechos
imprestáveis nos flancos mais íngremes e rochosos das montanhas e as cintas de mato
que ladeiam os degraus da serra. Capoeiras e matos secundários sujos caracterizam a
estrada trilhada pela agricultura de exploração dos cem anos passados.
A busca por novas terras foi, portanto, a tônica da marcha rumo ao Alto Uruguai.
Em 1850, a cobertura florestal do Rio Grande do Sul era de 36%, e a área desbravada
não passava dos 0,5% (Roche 1969, p.53). Trinta anos mais tarde, os terrenos
arroteados já representariam 5,8% do total, enquanto que a área de mata nativa
diminuiria para 30,7%. De acordo com os cálculos de Roche, em 1914 esses números
se tornariam ainda mais preocupantes: 11,5% das florestas já haviam sido desmatados,
e a área verde restante era de 25% à época. Com base em dados dos últimos inventários
florestais apresentados pela Fundação Estadual de Proteção Ambiental (FEPAM 2001),
sabe-se que em 1983 havia um resquício de apenas 5,62% do total da mata nativa que
um dia manchou de verde o Estado. Atualmente, depois de um processo de regeneração
de algumas dessas áreas, a cobertura florestal representa 17,5% do total. Essa
regeneração, porém, envolve uma vegetação secundária. O avanço da frente pioneira
teve relação direta com esses números.
Apesar disso, é importante ressaltar que não se pretende aqui taxar os colonos
como “culpados” pela devastação das áreas verdes no Estado. A maioria deles sequer
imaginava que seus atos poderiam implicar futuros problemas de ordem ecológica.
Além disso, seria deveras simplista e bastante discutível considerar unicamente o
fator “colonização” em face da complexidade dos processos ligados à degradação dos
ecossistemas regionais. Se o desmatamento nas áreas de colonização, assim como a
extinção de algumas espécies de animais, foram muito marcados pela ação das
primeiras gerações de colonos, a poluição do solo e dos recursos hídricos se deu bem
mais tarde. Isso ocorreu, em grande parte, com a introdução de herbicidas e de
58

agrotóxicos nas lavouras, a partir da chamada “Revolução Verde”, das décadas de 1960
e 70.
Feita essa ressalva, cabe lembrar que, a partir do final do século XIX, dois
processos simultâneos marcaram o desenvolvimento da Província: ao passo que
imensas massas florestais desapareciam em velocidade vertiginosa, as colônias
floresciam. Da nova leva de colônias criadas pelo governo da Província, os primeiros
núcleos foram Mariana Pimentel (1888) e Barão do Triunfo (1888), entre a Depressão
Central e a Serra do Sudoeste; Vila Nova (1888) e Marquês do Herval (1891), na borda
da Serra geral; Antônio Prado (1889) e Guaporé (1892), no centro; Dona Francisca e
Botucaraí (1890), em Cachoeira; Jaguari (1889), à Oeste e, no Planalto setentrional, Ijuí
(1890) e Guarani (1891). Pouco a pouco, as colônias difundiam-se sobre a zona da mata.
Mas esses núcleos não foram suficientes para absorver os imigrantes que
continuavam a desembarcar no Brasil meridional e mesmo os descendentes dos
pioneiros – inclusive porque, após a proclamação da República, o governo provincial
passaria gradativamente a rejeitar a grande imigração, preferindo resolver o problema
da população colonial interna excedente, ou seja, os filhos dos primeiros colonos que
buscavam assento em novas paragens. Assim, o governo da Província acabaria criando
mais uma leva de colônias no Planalto, ampliando a zona pioneira: surgiriam Erechim,
em 1908, Ijuizinho, em 1910, e São João Batista, em 1912, entre outras. Nesse período,
também seriam criadas inúmeras colônias particulares no Estado, inclusive Planalto
adentro, como Não-me-Toque (1897), General Osório (1898), Dona Ernestina (1900),
Selbach (1906) e Dona Júlia (1912).
O processo de constituição dos novos núcleos foi acompanhado pelos trilhos do
trem e pela abertura de estradas. Em 1894, a ferrovia chegaria à colônia de Cruz Alta e,
poucos anos depois, a Passo Fundo, Erechim, Marcelino Ramos, Ijuí e Santo Ângelo,
todas localizadas na região setentrional do Estado. Com a implantação das estradas de
ferro, houve uma acentuada valorização de terras na região (Roche 1969, p.63) e um
significativo incremento populacional. Somente Erechim, cinco anos após a sua criação,
já contava com 18 mil habitantes (Ducatti Neto,1981). No ano de seu cinquentenário, a
ex-colônia seria definida, em reportagem publicada no jornal Correio do Povo, por Rubem
Neis, como a “nova Terra de Promissão”, para onde se deu “um verdadeiro êxodo das
colônias velhas”. Teria sido a “excelência das terras”, segundo Frainer, autor do Álbum
do município de Erechim, o principal atrativo da colônia. E não apenas dela: os
dissidentes das antigas colônias, cujas propriedades estavam desgastadas pelo uso
intensivo e pelas constantes queimadas, migravam em direção ao Planalto exatamente
para recomeçar a vida em novas terras – nesse caso, as terras mais férteis. Nas
pequenas propriedades, dedicaram-se inicialmente à policultura. Com o passar dos
anos, porém, o trigo e a soja passaram a se destacar na região, assim como as serrarias.
A partir do primeiro decênio do século XX, as colônias do Planalto passariam a
figurar no cenário regional como as principais produtoras de madeira do Rio Grande do
Sul. Nas antigas colônias, a mata já havia sido devastada para dar lugar às lavouras e,
na maioria dos casos, a madeira derrubada se transformara em cinzas ou apodrecera
entre as plantações. Isso porque, no início da colonização, a falta de vias de transporte
e as dificuldades de comunicação impediam a comercialização das toras. Como registrou
a imigrante belga Marie van Langendonck (2002, p.53), “a falta quase total de vias de
59

comunicação obrigava a destruição, pelo fogo, da madeira cortada”. Os troncos, de


acordo com seu relato, ficavam muitas vezes “apodrecendo ao ar livre”. A imigrante,
porém, considerava esse procedimento um desperdício, imaginando “que imenso
rendimento não dariam essas belas madeiras, enviadas à Europa, para marcenaria e a
construção”.
Somente mais tarde, com a abertura de estradas e a criação das ferrovias, se
tornaria possível o aproveitamento comercial das toras abatidas pelos colonos, nos
núcleos onde as florestas ainda existiam. A produção de madeira acabaria ocorrendo
principalmente nas colônias italianas, localizadas da serra, e nas colônias mistas do norte
da Província, onde as serrarias em pouco tempo se multiplicariam, principalmente à
custa da derrubada das araucárias, um bioma exclusivo do Sul do Brasil que atualmente
está em extinção. Em 1916, os municípios do Planalto já eram responsáveis pelo
fornecimento de 49% de toda a madeira produzida no Rio Grande do Sul, sendo que em
poucos anos o volume exportado pelo Estado apresentou um crescimento significativo:
de 39.499 toneladas, em 1931, para 76.814, em 1940, quando o Rio Grande do Sul já
ocupava “o primeiro lugar entre os estados brasileiros, graças à exploração das enormes
reservas de araucárias do Planalto” (Roche 1969, p.89).
Conforme o relatório da Secretaria de Obras Públicas do Estado de 1918, a
superfície de terras devolutas no Rio Grande do Sul à época era de 22 mil quilômetros
quadrados. Consta do documento que no norte se encontravam as melhores terras sul-
rio-grandenses: “Aquela extensa área fica na zona norte, ao longo essencialmente do
vale do rio Uruguai. Toda ela é coberta de florestas, as melhores do Estado. As terras
são as mais férteis, prestando-se a variadas culturas.” Essa condição certamente
contribuiu para que muitos dos povoados da região ganhassem nomes como Floresta,
Mata, Derrubadas e Erval Grande, por exemplo.
Cerca de 40 mil hectares de uma área desse tipo, em Erechim, estavam sob os
domínios da Empresa Colonizadora Luce, Rosa e Cia. Ltda., que dividiu esse espaço em
1.279 lotes, sendo que “toda esta área estava coberta de mata virgem”, segundo Ducatti
Neto (1981, p.93). O mesmo autor informa que até 1922 a empresa abriu 120 quilômetros
de estradas de rodagem, 110 de estradas vicinais e 530 quilômetros de estradas para
tropas. O impacto ambiental suscitado na área de Erechim foi de grandes proporções e
pode ser tomado como exemplo do impacto ambiental relacionado à instituição das
colônias novas.
A despeito disso, o próprio Ducatti Neto (1981, p.93-94) exaltaria sua gratidão pela
atuação (tão predatória quanto insustentável, diga-se de passagem) da Empresa
Colonizadora Luce, Rosa e Cia. Ltda. Segundo ele, o município de Erechim teria “um
dever especial de gratidão para com essa empresa, que colaborou para sua mais rápida
colonização e progresso, introduzindo nesses territórios gente ordeira e trabalhadora”,
gente que, “substituindo as seculares árvores gigantescas pelo pé de trigo, transformara
a ‘Rainha do Mato’ em Capital do Trigo”.
60

Das “ricas florestas do Alto Uruguai”

A implantação das colônias novas seguiu a mesma lógica de constituição dos


antigos núcleos coloniais da Província, nos quais se dava preferência para áreas
localizadas às margens de rios e cobertas por grandes florestas. Um dos relatos mais
significativos acerca do território que deu espaço aos últimos núcleos coloniais instalados
no Rio Grande do Sul partiu do viajante e agrimensor alemão Maximiliano Beschorem,
que viveu na província entre 1875 e 1887. Beschorem trabalhou na demarcação das
terras que viriam a abrigar as novas colônias, percorrendo praticamente todo o norte da
província, principalmente o vale do Rio Uruguai, quando o mesmo ainda era habitado por
luso-brasileiros ligados à pecuária e por indígenas, negros e caboclos, que se dedicavam
principalmente a atividades extrativas, como àquela ligada à produção de erva-mate.
Impressionado com a riqueza e grandiosidade das matas que adentrou, o alemão chegou
a dedicar um capítulo inteiro de seu diário à “extraordinária vegetação da floresta do Alto
Uruguai” (Beschorem 1989, p.49-50).
Segundo Beschorem (1889, p.49), a floresta da região, “formada por pinheiros,
erva-mate e pequenas ilhas de mata rasteira”, surpreendia pela densidade: “Eu nunca
havia encontrado uma mata assim, tão fechada!”, admitiu o alemão. Ainda conforme o
agrimensor (1989, p.104), tratava-se de “uma magnífica floresta” que cobria “muitas
léguas à margem do rio Uruguai e seus afluentes”, sendo que “a maior parte da floresta”
era constituída “de mato branco, perto dos campos e florestas de araucária nas
elevações, formando ilhas dentro do extenso mar de floresta de folha caduca”. Para
Beschorem (1989, p.104), as araucárias erguiam-se “em direção ao céu”, “como colunas
de um templo”, sobre as quais se arqueava “o teto formado pela coroa de folhas
transparentes”. Na opinião do agrimensor (1989, p.104), comparando com o resto da
vegetação, essas florestas são indícios de ‘clarões’ acessíveis. Por outro lado,
encontram-se, em muitos lugares, abundantes gravatás, que tornam o solo improdutivo.
Para se transpor o ‘mato branco’, só com fortes golpes de facão se consegue abrir
caminho nesse caos de vegetação. O mato torna a floresta inacessível. Que imensa e
variada vegetação opõe-se a nós! Que árvores gigantescas! De uma para outra, se
entrelaçam cipós, em múltiplas formas, cobertas por raras e belas orquídeas. No solo
um impenetrável enredo de fetos, espinhos, juncos, cipós e árvores caídas. A selva arma
e atemoriza o invasor, pela impressão causada dos vegetais e o caos inextricável.
O sentimento de uma natureza selvagem e opressora em relação ao homem não
foi uma exclusividade de Beschorem. A questão também aparecia em relatórios
provinciais, em textos redigidos por políticos e intelectuais luso-brasileiros e nas obras
dos historiadores do Brasil que atuaram no século XIX. É o caso de Varnhagen. No
primeiro tomo de sua História Geral do Brasil, o sorocabano apresentou uma minuciosa
descrição do país, na qual ressaltou não apenas a diversidade da flora e da fauna, mas
também o embate constantemente travado entre a civilização e a natureza. Segundo ele
(1975, p.16), “o braço do homem, com auxílio do machado, mal pode vencer os
obstáculos que de contínuo encontra na energia selvagem da vegetação”. Energia, esta,
que o historiador descreveu (1975, p.16) quase como uma barreira à dominação
humana: “É tanta a força vegetativa que, ao derrubar-se e queimar-se qualquer mato
virgem, se o deixais em abandono, dentro em poucos anos aí vereis já uma nova mata
61

intransitável”. Ao percorrer o sul do Brasil ao final do século XIX, Beschorem teria a


mesma sensação, que ganha espaço em outros trechos de seu diário. Ao mesmo tempo,
porém, ressaltaria os benefícios dessa biodiversidade, que estaria à espera da
operosidade humana: “neste Vale”, afirmava ele (1989, p.51), “a mãe natureza oferece
por si mesma a dádiva da abundância, facilitando a vida dos homens”.
Em uma descrição mais detalhada, o agrimensor (1989, p.49) ainda analisa
algumas das principais árvores encontradas no Vale do Uruguai à época e que, segundo
ele, permaneciam subaproveitadas. “Reina aqui”, escrevera Beschorem (1989, p.49),
“um conjunto de plantas que formam a floresta, algumas novas, até então me eram
desconhecidas, como o Sassafrás”. Esse tipo de árvore, de acordo com o viajante,
“possui madeira resistente” e, “quando recém-abatido, sente-se em sua superfície uma
oleosidade e um odor muito agradável”. De sua casca, fazia-se chá, “que todo pessoal
tem logo a mão”. Vale ressaltar que o Sassafrás é hoje uma árvore ameaçada de
extinção no Estado, conforme a lista divulgada pela Secretaria do Meio Ambiente do
Estado do Rio Grande do Sul (SEMA) em 2002.
Beschoren também escreve sobre a Guariganga, que classifica como uma
“palmeira-anã”, e que “aparece em diversos lugares na sublevação da região
montanhosa e de maneira tão numerosa que forma uma pequena floresta dentro da
floresta”. As folhas dessas árvores, conforme o alemão, forneciam material “para a
cobertura dos ranchos”, daí o apelido de “palhal”. Outra planta que lhe chamou atenção
foi a Paineira, que fornecia “uma matéria fibrosa, semelhante ao algodão”, utilizada para
o “enchimento de travesseiros”.
Por essa e por outras razões, o viajante (1989, p.51) lamentava o fato de que a
onipresente floresta do Alto Uruguai permanecia pouco explorada à época em que
passou pela região. Até então, as “esplêndidas matas” por onde o agrimensor andava
compreendiam uma “extensa área quase sem caminhos e atalhos”, “distante três léguas
dos próximos moradores”. Quando muito, Beschorem (1989, p.103) dizia encontrar
“antigos caminhos pouco usados, trilhados pelos índios, para chegarem aos lugares de
caça e pesca”, onde tratava de “abrir as linhas de medição na floresta completamente
emaranhada” (1989, p.101). Segundo Beschorem (1989, p.51), porém, “certamente com
o correr do tempo, esta situação se modificará. Quando iniciar a colonização do Alto
Uruguai, então ‘ela’ arrastará as regiões do Goio-En, expandindo-se até às margens da
Província do Paraná, cujas imensas e inexploradas florestas serão colonizadas”. Na
concepção desse europeu, caberia ao braço do colono a missão de vencer a floresta, de
civilizar aquelas terras e de levar o almejado progresso à região. Beschoren não previu,
no entanto, o impacto ambiental que viria a ser suscitado por esse empreendimento.

O ponto de vista governamental

Como o viajante alemão Maximiliano Beschorem, muitos presidentes da província


também não se deram conta da devastação ambiental que se configurava à medida que
os núcleos de povoamento multiplicavam-se sobre as matas do Rio Grande do Sul. A
partir da análise de relatórios provinciais relacionados à colonização, percebesse que,
do ponto de vista governamental, não houve, de maneira geral, uma preocupação mais
efetiva em relação ao meio ambiente e à devastação ligada à implantação de colônias.
62

Sob o signo do progresso, as preocupações de ordem ambiental eram ainda exceções


no Brasil, como já demonstrou José Augusto Pádua (2002).
Em geral, o que se percebe a partir de uma leitura mais cuidadosa dos
documentos oficiais da época é que o futuro da Província parecia depender da
transformação das até então abundantes “terras incultas” em territórios “civilizados”,
onde o caos da floresta sucumbisse à ordem, à racionalidade, à agricultura, considerada
um símbolo da presença e da engenhosidade do homem civilizado. A natureza devia ser
subserviente ao homem. Com o advento da industrialização e do colonialismo, como
destaca Shiva (2000, p.300), a natureza passaria a ser considerada nada mais do que
um “repositório de matérias-primas”, uma fonte “infindável” de recursos meramente
funcionais, destinados à produção de mercadorias. Essa tendência pode ser verificada
em inúmeros relatórios provinciais da época.
Em 1888, o vice-presidente da província, Barão de Santa Thecla (1888, p.18),
escreveria em seu relatório anual que, para garantir o progresso da província, era
essencial “atirar-se à agricultura e cobrir de sementeiras e searas grande parte dos
terrenos incultos e mesmo muitas terras de campo” – o que tinha ligação direta com a
colonização. Ainda segundo o vice-presidente, inclusive culturas consideradas até então
secundárias, devido à baixa rentabilidade, se desenvolveriam quando fossem “cultivadas
com actividade a maior parte das mattas das serras”. Para o Barão (1888, p.19), “nenhum
trabalho, nenhum esforço dos legisladores e administradores da Província lhes poderá
dar maior satisfação em um futuro próximo e maior direito à gratidão das gerações por
vir” do que a “civilização” das chamadas “terras incultas”. A atenção voltada às futuras
gerações – por ironia hoje fortemente vinculada ao conceito de desenvolvimento
sustentável – surge novamente ao final do relatório. Para o vice-presidente, “tudo o que
neste sentido autorisar e decretar a Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul será
obra de patriotismo que melhorará as condições de vida para as gerações próximas”.
A ideia de sustentabilidade, de fato, não predominava no discurso político da
época, com raras exceções, como José Bonifácio de Andrada e Silva e Baltasar da Silva
Lisboa. Em seu discurso, Barão de Santa Thecla não avaliou os custos ambientais do
desenvolvimento. As lavouras prescindiam das florestas, que eram queimadas sem
deslindes. O ciclo repetia-se, e a terra passava, pouco a pouco, a dar mostras de
exaustão, até ser completamente inutilizada. Novas áreas, então, sofriam o mesmo
processo. Mesmo que na Europa cientistas de renome, como Vandelli e Humboldt, já
atentassem para os problemas advindos de práticas como essa, entre a maior parte dos
integrantes do poder público brasileiro reinava o despreparo e a negligência. A
colonização europeia no Estado teve uma gama de efeitos não planejados pelos
promotores e organizadores desse empreendimento.
Pode-se dizer que somente em setembro de 1913, quando boa parte do norte da
província já se encontrava ocupado pelas colônias novas e, diga-se de passagem,
devastado pelas queimadas, a questão ambiental passou a aparecer com maior
destaque nos relatórios provinciais. A preocupação em relação à devastação das
florestas partiu de Borges de Medeiros, que durante duas décadas presidiu a província
e, sob a égide do positivismo, imprimiu uma série de mudanças no Rio Grande do Sul.
Em mensagem enviada à Assembleia Legislativa em setembro de 1913, Borges (1913,
p.44) ressaltou que “o desmatamento nas regiões colonizadas, restringindo
63

continuamente a área florestal do Estado, impõe o dever de zellar a conservação das


mattas, a exemplo dos países mais adiantados, que lhe dedicam pacientes cuidados e
gastos avultados”. A explicação para isso era simples: “É que as florestas”, firmava o
presidente (1913, p.44), “interessando à climatologia e no regimen das águas pluviais,
são também necessárias à existência do homem e da sociedade, valendo ainda como
riquezas jacentes”. Para o presidente, “a indústria humana não pode prescindir dessa
matéria prima”, isto é, da natureza enquanto fonte de recursos funcionais, destinados à
produção de mercadorias.
Na sequência de seu relatório, Borges de Medeiros ainda citaria os artigos da lei
em elaboração que passaria a regular a exploração madeireira no Rio Grande do Sul.
Segundo ele (1913, p.47), este regulamento implicaria a “criação de receita
especial para o Estado”, pois “o comércio de madeira é hoje um dos mais lucrativos”. A
ideia do governante (1913, p.46) era promover o “aproveitamento da riqueza florestal,
que atualmente representa um capital morto e sujeito mesmo a ser parcialmente
destruído”. É significativo que, para o presidente, era importante preservar a natureza
unicamente para garantir a sua exploração.
Em um primeiro momento, conforme o registro de Borges de Medeiros (1913,
p.45), o governo estadual delimitaria uma área de mata ao longo da estrada de ferro
Passo Fundo-Uruguai, “onde mais convier à immediata exploração das madeiras, e que
possa em seguida ser entregue à colonização”. Note-se que a região em questão
localizava-se no norte da província, na principal área florestal do Estado. Segundo o
regulamento, “enquanto não for possível realizar-se a prévia subdivisão em linhas e lotes
coloniais das mattas delimitadas [...], poderão ser cortadas todas as árvores adultas”.
Ainda assim, a lei previa que cada colono receberia o seu lote com a metade da mata
previamente existente, sendo obrigado a zelar por uma parte dela.
Para evitar a exploração ilegal das florestas, o regulamento também previa o
estabelecimento de um “serviço de vigilância e conservação das mattas nos municípios
vizinhos, a começar por Passo Fundo, Lagoa Vermelha, Palmeira e Soledade” – todos
localizados no norte do Estado. Com isso, também se planejava instituir a “aplicação de
penalidade contra os intrusos” – a definição dos indígenas, caboclos e negros que
historicamente viviam nessas regiões e usavam a mata como refúgio e meio de
sobrevivência.
Todas essas medidas, segundo Borges de Medeiros (1913, p.46), contribuiriam
para o “melhoramento das florestas, pois a sua exploração ordenada, em vez de
reduzilas, permitte, pela retirada das árvores adultas, a entrada de luz e de ar
indispensáveis ao desenvolvimento das que se acham no período de crescimento”. Além
disso, o presidente acreditava que “o primeiro corte nas florestas espessas, como são
as mattas do Estado, é mesmo um grande benefício, libertando-as das árvores mortas e
parasitas e do excesso de vegetação”. Vale lembrar que, na concepção de Borges de
Medeiros (1914, p.26), “conservar a matta não quer dizer deixa-la virgem, assim como
explorar não quer dizer destruí-la”. Do ponto de vista desse governo, que esteve no
comando do Estado durante o período em que as florestas do norte sucumbiram à
expansão das colônias, a mata deveria “ser explorada porque a exploração, quando feita
methodicamente, concorre para a sua conservação”, o que “não exclui o seu povoamento
que, feito sob determinadas condições, facilitará a conservação e concorrerá para
64

augmentar o seu valor”. O resultado desse processo, apesar das boas intenções do
governo, foi bastante diferente do previsto. A exploração do meio ambiente acabou se
mostrando intensa e desmedida.

Considerações Finais

A colonização europeia no Rio Grande do Sul, baseada no regime de trabalho


familiar e predominantemente livre do imigrante, na distribuição de pequenos lotes de
terras e na opção pela policultura, quase sempre figurou na historiografia gaúcha como
um dos principais fatores do desenvolvimento regional. Entretanto, esse processo de
ocupação envolveu formas de apropriação da natureza que alteraram de forma decisiva
o meio ambiente sulino.
Embora ausentes da historiografia regional da colonização, as questões
ambientais vêm sendo cada vez mais incluídas não apenas no debate sobre
desenvolvimento, mas também nas análises de cunho histórico. Como destaca José
Augusto Drummond (1991, p.180), as disciplinas ligadas às ciências sociais foram
desafiadas pelos movimentos ambientalistas e pelos cientistas naturais a superarem o
seu paradigma exclusivista, incorporando variáveis naturais ao seu repertório. Passou a
ser necessário, mais do que nunca, “colocar a sociedade na natureza” (Cronon 1983),
rejeitando a premissa convencional de que “a experiência humana se desenvolveu sem
restrições naturais [...] e de que as consequências ecológicas de seus feitos passados
podem ser ignoradas” (Worster 1991, p.199).
No caso do Rio Grande do Sul, é mais do que oportuna uma revisão historiográfica
do seu processo de colonização, em que a dimensão ambiental se aproxime da
dimensão socioeconômica da história do desenvolvimento. De maneira introdutória,
buscou-se aqui analisar o processo de constituição dos últimos núcleos coloniais do
Estado, que implicou uma marcha migratória rumo à floresta e a devastação de uma
biodiversidade que ainda não foi totalmente avaliada. Novas pesquisas poderão ainda
contribuir para uma compreensão mais efetiva das relações estabelecidas entre colono
e natureza, das concepções do imigrante em relação às florestas tropicais e das técnicas
de exploração por ele adotadas, entre outros fatores. É possível afirmar, porém, que a
colonização europeia promoveu mudanças profundas na fauna e na flora sul-rio-
grandenses, provocando impactos ecológicos a partir de uma agricultura baseada em
queimadas, da caça indiscriminada de animais silvestres e da exploração madeireira. E
a importância de se atentar para esses aspectos do processo histórico, para usar a
expressão de Enrique Leff (2005, p.21), reside na possibilidade de se estabelecer um
“vínculo entre el pasado insustentable y un futuro sustentable” – que seria uma das
implicações da história ambiental. Como afirma Certeau (2002, p.93), “a história é
sempre ambivalente: o lugar que ela destina ao passado é igualmente um modo de dar
lugar a um futuro”.
65

OS IMPACTOS DA IMIGRAÇÃO ALEMÃ NO ESPAÇO NATURAL DO VALE DO


PARANHANA (RS): UMA ANÁLISE CRÍTICA SOBRE A OCUPAÇÃO DA REGIÃO
ATRAVÉS DA HISTÓRIA AMBIENTAL
Rosane Maria Kaspary
Daniel Lucia Gevehr

O espaço natural e a Mata Atlântica

A mata atlântica é um dos biomas mais importantes da América do Sul, e o mais


complexo pela sua natureza endêmica, com uma diversidade de vida animal peculiar,
principalmente de espécies menores e de anfíbios, e pela sua diversidade vegetal
heterogenia, que compõe espécies únicas, sendo considerada a mais rica do planeta em
biodiversidade (DEAN, 1996).
Atualmente, a Mata Atlântica (MA), em função da exploração predatória de muitos
séculos, desde o ano de 1500, não possui a mesma diversidade e continuidade por toda
a sua extensão, mas ainda assim compõe a geografia de 15 estados brasileiros, (dos 17
em 1500) desde o leste até o sul do Brasil.
A mata atlântica inicia no Rio Grande do Norte, e percorre toda a costa leste até
a região central do Rio Grande do Sul, com mais de 83.500 Km2 de área, que representa
apenas 8% da floresta nativa existente em 1500, quando o Brasil foi descoberto por
Portugal. Chegou a cobrir uma área de 1 milhão de Km² (DEAN, 1996) e (DI BITETTI,
2003). A maior parte desta floresta nativa (primária), situa-se na Serra do Mar que vai do
Rio de Janeiro até o norte de Santa Catarina. A Serra do Mar é uma das 15 Ecorregiões
da mata atlântica, que foi assim dividida pelo WWF (World Wildlife Fund) para ações
mais regionalizadas, considerando que a mata atlântica está entre as florestas mais
ameaçadas do planeta pelo alto grau de desmatamento (DI BITETTI, 2003).
Vale lembrar que além da importância da biodiversidade animal e vegetal, a região
da mata atlântica é onde se concentra 70% da População do Brasil. Outra característica
importante da mata atlântica é a composição hídrica, pois abriga 7 das 9 maiores bacias
hidrográficas do Brasil, sendo elas: Atlântica Sul; Atlântico Leste; Atlântico Nordeste
Oriental; Atlântico Sudeste; Paraná; São Francisco e Uruguai. (IBAMA/MMA, 2010).
A composição da vegetação da mata atlântica, em sua maioria de florestas
latifoliadas perenes e pluviais, algumas espécies passam dos 40 metros de altura. Parte
da mata atlântica é formada por Araucárias, que por sua característica poderia ter sido
substituída por latifoliadas, porém, neste caso a ação do homem foi benéfica,
contribuindo para a sua preservação.
A mata atlântica pode ser identificada como secundária quase na sua totalidade,
pois sofreu intervenção do homem, pelas derrubadas seletivas, pelo extrativismo,
queimadas ou pela poluição do ar. É praticamente impossível saber como era a mata
atlântica antes da chegada do homem, principalmente porque a mata atlântica é diferente
da Floresta Amazônica, não sendo possível fazer uma analogia entre elas. A mata
atlântica é diferente de todas as demais florestas do planeta, considerando a sua
biodiversidade endêmica (VICTOR, 2005). A floresta pode se regenerar em 20 ou 30
anos, porém, jamais com as mesmas características e mesma consistência.
66

As áreas de fazendas (clareiras) ou agrícolas podem impedir a regeneração,


talvez para sempre (MAHUS, 2002). A mata atlântica é rica em biomassa vegetal, porém
pobre em biomassa animal, mesmo assim a variedade (biodiversidade) de plantas,
animais, insetos, etc., estimulam e facilitam o retorno da floresta. Considerando também
as condições climáticas: sol, chuva, ventos, temperatura.
Os primeiros habitantes na mata atlântica datam de aproximadamente 40 mil
anos, e praticavam basicamente a caça como forma de sobrevivência. Aos poucos
descobriram a agricultura e assim foram modificando a mata atlântica. Desde aquela
época eram realizadas queimadas para limpar e fertilizar o solo.
A agricultura era itinerante, desta forma a floresta, depois de ocupada, era deixada
pra trás num intervalo de pelo menos 20 para a regeneração, a qual era acompanhada
pelos agricultores itinerantes. Algumas espécies preferidas eram transplantadas para a
sua preservação (DEAN, 1996). Em regiões de seca, as queimadas por vezes saíam do
controle, provocando alterações na mata atlântica, incluindo mudanças nas condições
climáticas. Com a atividade itinerante, havia a disputa de grupos por determinadas
regiões. Na região litorânea a exploração agrícola era realizada por grupos Tupis, haviam
poucos grupos no planalto, região interior da mata atlântica.
Os europeus quando chegavam ao litoral encontravam basicamente os Tupis, e
ficavam dependentes destes pois conheciam tudo sobre a região, formas de caça,
técnicas de agricultura, formas de sobrevivência na floresta, etc. Aos poucos ensinaram
tudo que sabiam para estes europeus. Como a planície costeira já estava bastante
modificada quando os europeus chegaram no século XVI, não encontraram dificuldade
em adentrar centenas de quilômetros seguindo as trilhas do Tupis, principalmente na
região que hoje é o Rio de Janeiro.
Neste período a extração de Pau Brasil era de 1.200 toneladas por ano, toda a
madeira era enviada para Portugal. Em 1764 o Marquês de Pombal indicou o doutor da
Universidade de Pádua Domênico Vandelli para a Universidade de Coimbra, com o
intuito de substituir a Filosofia pelas Ciências, o que ocorreu em 1772, inclusive muitos
brasileiros se formaram em Ciências Naturais com Vandelli. Segundo Dean (1996), em
1779 em Lisboa foi criada a Academia Real de Ciências, o objetivo principal da aplicação
destas ciências no Brasil era a exploração de plantas medicinais na mata atlântica.
Neste mesmo período foi criado o Jardim Botânico para a preservação de algumas
espécies da mata atlântica e também o cultivo de novas espécies trazidas da Ásia e da
África. Após a independência do Brasil, pouca coisa mudou em relação à exploração da
floresta, a extração de madeira, principalmente o Pau Brasil aumentou, tanto para o
pagamento da dívida externa como para o enriquecimento de grandes proprietários ou
senhores. Mesmo com a condição de preservação, onde 1/6 do total de cada proprietário
deveria ser conservado, mas na prática isto não ocorreu. (DEAN, 1996).
O século XIX foi o período em que ocorreram muitas extinções de espécies
vegetais e animais, praticamente tudo era exportado. Com esta exploração mercantil
sem limites os exploradores avançavam das regiões litorâneas para o interior da mata
atlântica, abrindo assim caminho para as migrações. Consequentemente aumentando a
corrente do capitalismo, que visava a maximização dos lucros agregando valor a tudo
que se obtinha da floresta. (DEAN, 1996; DUARTE, 2008).
67

Apesar da intensa exploração da madeira, mesmo contabilizando as mais nobres,


o valor destes produtos representavam apenas 2% do valor total das exportações. Os
nobres do Rio de Janeiro importavam madeira nobre da África e outras regiões a valores
absurdamente mais altos.
De acordo com Dean (1996), outro fator importante no desmatamento e redução
da floresta foi o aumento da população, principalmente na região sudeste, em 1808
haviam aproximadamente 1 milhão de pessoas, enquanto que em 1890 já eram 6,4
milhões de pessoas. Desta forma, aumentou a necessidade do uso de madeira. Se
utilizava madeira para tudo, construção, móveis, lenha para carvão, etc. Foram abertas
grandes áreas para pastagens e nenhuma árvore era plantada para a regeneração da
floresta, não havia a preocupação com o reflorestamento. (DEAN, 1996).
Neste período iniciaram as construções de estradas de ferro e o uso de barco a
vapor, também se intensificaram as queimadas no interior da mata atlântica,
principalmente em regiões mais secas de Minas Gerais ao Paraná. Até a aprovação do
Código Florestal existiam apenas duas reservas de preservação da mata atlântica, a do
Alto da Serra, na região de Cubatão em São Paulo e na Serra da Mantiqueira extremo
oeste do Rio de Janeiro.
Apesar dos esforços para tentar proteger a mata atlântica, a legislação
apresentava muitas falhas, os proprietários poderiam cortar a madeira nativa e deixar a
capoeira crescer. Outra falha ocorria com a parte que deveria ser preservada, a parte da
propriedade que deveria permanecer intacta, ou seja, 1/4, poderia ser vendida a outro
proprietário e este novamente reduzir a área de preservação a 1/4. (DEAN, 1996;
BRASIL, 1965).
Com o desmatamento, as queimadas, o cultivo sem controle e outras atividades
exploratórias, muitas regiões principalmente as mais íngremes iniciaram um processo de
deslizamentos e erosões, alterando inclusive leitos de rios e nascentes. Para evitar
maiores danos à mata atlântica e consequentemente ao equilíbrio ambiental, o
movimento de ambientalistas foi fundamental para o aumento de áreas preservadas
criando diversos parques e reservas. (DEAN, 1996). Na constituição de 1988 a mata
atlântica foi declarada “Patrimônio Nacional”, juntamente com a Floresta Amazônica e o
Pantanal. (BRASIL, 1988).

Desbravando as terras do Vale do Paranhana

O vale do Paranhana compõe a Mata Atlântica possuindo remanescentes de


diversas espécies raras ou ameaçadas de extinção tais como: bugio-ruivo, gatos do
mato, jaguatirica e ainda espécies de madeira. (BLOCHTEIN, 2008). A região também
possui diversas unidades de Conservação que se estendem até as regiões vizinhas
como o litoral norte do Rio Grande do Sul e a Floresta Nacional de São Francisco de
Paula.
Segundo Schierholt (1974) a região foi colonizada por sucessivas levas de
imigrantes de origem lusa, germânica, italiana, suecos, poloneses e austro-húngaros. Os
lusos começaram a colonizar a região a partir de 1750, mas a maior parte dos imigrantes
antes mencionados chega a partir de 1890.
68

De acordo com Projeto Manduri (2006) a vegetação original ainda pode ser
encontrada apresentando componentes das florestas estacional, semi-decidual e
ombrófilas densa e mista, em área de tensão ecológica. De acordo com o estudo
realizado por Marcos Cornélio Bernardes em 2011, conforme informações de moradores
antigos, a ocupação da região ocorreu no meio da vegetação existente, onde a Floresta
Estacional cedeu espaço para o povoamento, causando com isso um significativo
processo de desmatamento e consequentes “impactos ambientais”.
Os moradores entrevistados também relatam histórias de árvores imensas sendo
abatidas, além de animais como onças, hoje não vistos na região, sendo caçados.
(BERNARDES, 2011). Ainda segundo Bernardes (2011), durante o processo de leitura
da paisagem da pesquisa de campo realizada (2010), identificou-se três zonas
agroecológicas.
As singularidades entre as zonas vêm das relações entre clima, relevo, vegetação,
fauna e também de causas e efeitos da ocupação humana. A Zona de Várzea é uma
planície aluvial com altitudes entre 30 e 55 metros acima do nível do mar e que concentra
a maior parte da população e onde se localizam as sedes urbanas dos municípios.
Bastante antropizada, com lavouras de tamanho maior, indústrias, comércios e
moradias. É também a zona com maior ocorrência de impactos ambientais devido à
pressão antrópica. De acordo com Gehrke (2010) esta área possuía uma vegetação
composta por matas ribeirinhas e paludosas, porém, tal condição já não está mais
presente. A Zona de Encosta é representada pelos seus declives e aclives, penhascos,
platôs e arroios com muitas cascatas possuindo boa cobertura vegetal.
Nesta área situa-se a agricultura tradicional, porém visivelmente decadente no
que tange à mão de obra. Conforme os dados do IBGE (2010) a população rural sofre
um processo de envelhecimento, considerando que os jovens são atraídos para centros
urbanos onde encontram estilos de vida mais atraentes.
A cobertura florestal é mais abundante em relação a zona de várzea, composta
de um entremeado de capoeira, de pequenos reflorestamentos de Pinus, Eucalipto ou
Acácia recortados de também pequenas roças ou desflorestamentos normalmente com
área de até dois hectares. (GEHRKE, 2010). Porém, antes do sistema colonial esta
região era totalmente coberta de florestas nativas. A maior parte dos reflorestamentos
com exóticas ocorre nesta Zona que se estabelece entre os 55 a 700 metros acima do
nível do mar. (BERNARDES, 2011).
A terceira Zona Agroecológica delimitada no estudo de Bernardes é a Zona de
Serra, com as maiores altitudes e uma floresta mais densa, inclusive com Floresta
Nativa, abrangendo áreas de preservação como os Campos de Cima da Serra e Áreas
de Proteção Ambiental com unidades de conservação. (GEHRKE, 2010).
As altitudes variam entre os 700 e os 1000 metros acima do nível do mar. Estes
declives tornarem-se maiores próximos a zona de encosta, formando escarpas. Devido
ao maior isolamento ocorrem florestas mais conservadas. Nesta região são evidenciadas
atividades de produtores de hortigranjeiros e também consideráveis extensões de
reflorestamentos com Pinus e Eucalipto. A figura 01 representa a toposequência com as
três zonas.
69

A partir do ano de 1970, quando a floresta nativa encontrava-se criticamente


reduzida, tiveram início empreendimentos de reflorestamentos com espécies exóticas.
Conforme Gehrke (2010). O Eucalipto foi inicialmente cultivado para suprir a demanda
por madeira de lenha, para caldeiras e estufas de secagem de fumo e também na
construção civil como madeiras de escora. Posteriormente foram introduzidas espécies
de Pinus formando maciços florestais, suprindo a demanda regional das serrarias.
Um fator preocupante da região, principalmente nas zonas de encosta, é o
deslocamento de massas. (RIFFEL, 2012). A constituição arenosa do solo somada ao
relevo em declive e ainda a pouca espessura sobre um substrato rochoso, torna a região
mais suscetível a este movimento, além é claro, da atividade antrópica.
Conforme dados da Defesa Civil do Rio Grande do Sul, entre 2003 e 2011 foram
registradas 37 ocorrências de desastres naturais, sendo o município de Taquara o mais
atingido com 11 ocorrências. Segundo Riffel (2012), áreas de proteção ambiental ou
sujeitas a risco são ocupadas para a instalação de condomínios, pois os órgãos
municipais sofrem a pressão imobiliária, impulsionados pelo aumento populacional e
consequentemente pelo crescimento urbano, favorecendo assim a retirada da vegetação
e o corte das encostas, este desmatamento acelera o processo erosivo contribuindo
desta forma para os desastres ambientais, mais precisamente, os movimentos de massa.
Outro aspecto importante da região é a sua composição hídrica, pois abrange
praticamente todos os municípios e os rios são amplamente utilizados para diversas
atividades, no lazer, incluindo atividades turísticas, na agricultura, na indústria, no
abastecimento público, na dessedentação de animais, etc. (PANTE, 2006).
Estes usos são competitivos e ainda podem restringir algumas atividades
conseguintes, interferindo inclusive no uso da água em outras regiões, como é o caso
do Vale do Rio dos Sinos que é banhado pelo Rio dos Sinos, pois este já chega
comprometido, tanto pela escassez como pela poluição- Fundação Estadual de Proteção
Ambiental (FEPAM)15. A derrubada da mata nativa e as demais atividades antrópicas
fazem com que a classificação dos níveis de poluição das águas, inclusive nas

15
Dados: FEPAM, disponível em: http://www.fepam.rs.gov.br/qualidade/qualidade_sinos/sinos.asp
70

nascentes, atinjam o nível mais alto – Classe 4 – para a maioria dos parâmetros
estabelecidos na legislação, em boa parte do curso dos rios que formam a bacia, PRÓ-
SINOS16 .
Na figura 2 é possível verificar a composição hídrica da região e sua posição
geográfica no Rio Grande do Sul. O impacto ambiental provocado pela construção de
duas pequenas centrais hidrelétricas no município de Canela também deve ser
considerado no processo de transformação da região que compõe a mata atlântica, pois
foram construídas nas nascentes do rio Paranhana – principal rio da região – afluente do
rio dos Sinos.
Com significativas alterações na mata atlântica pela inundação das áreas afetadas
e desvios nos cursos dos rios e nascentes. Atualmente estes e outros impactos são
monitorados e através do projeto MONALISA – Monitoramento Ambiental Local de
Impactos Sobre Arroios. (CEEEGT, 2011).

Contribuições para a história ambiental do Vale do Paranhana

A paisagem do Mundo Novo teve uma transformação acentuada a partir do século


XIX com as “migrações” dos colonos alemães e/ou euro brasileiros. A região
compreendida entre os Rios dos Sinos, Santa Maria e Rolante até então habitada por
indígenas e famílias lusas proprietários de fazendas ou pequenas propriedades
(REINHEIMER, 2005).
O processo desta transformação começou com o desmatamento dos pinheiros,
alterando além da paisagem natural, a paisagem cultural dos chamados “Bugres”, como
eram conhecidos os índios e alguns lusos. Este processo foi motivado pelo Império que
tinha o intuito de substituir a mão de obra escrava e “branquear” a população. Roche

16
O Pró-Sinos é um consórcio de direito público formado por até o momento 26 dos 32 municípios que compõem a
Bacia do Rio dos Sinos, disponível em: http://www.consorcioprosinos.com.br/
71

(1969) por seu turno, descreve o colono alemão na região do Mundo Novo como
“fabricante de terra”, pelo desmatamento/desbravamento da floresta, pois quanto mais
desbravada a terra mais riqueza poderia ser produzida, principalmente de gêneros
alimentícios.
A Colônia do Mundo Novo foi fundada em 1846 por Tristão Joze Monteiro, que
adquirira as terras um ano antes. A colônia foi então dividida em lotes (colônias menores)
que foram vendidos para colonizadores de diferentes etnias (REINHEIMER, 2005).
Segundo Magalhães (2003) estes lotes podiam ainda ser divididos em colônias menores.
Os colonos alemães ocuparam principalmente as encostas do Planalto que eram
bastante íngremes, terras consideradas mais férteis, porém necessitavam de
ferramentas mais braçais, diferente da tecnologia utilizada na Europa, como o Império
na época previa que seria utilizada no Brasil. As áreas foram totalmente “limpas”,
deixando apenas os Jerivás (espécie de coqueiro) para alimentação e pastagens do
gado, com as pedras retiradas da floresta, os alemães faziam cercas e taipas.
(REINHEIMER, 2005, pg. 23).
A ocupação do solo foi intensa, boa parte das áreas rurais ou de preservação, é
coberta com vegetação mais rasteira e tipos de capins. Este processo transformador da
mata atlântica foi mais consistente na região, pois os lotes vendidos por Tristão Monteiro
no final do século XIX foram financiados, facilitando sua aquisição, e a rápida mudança
do espaço agregou valor à terra e a produção podia ser rapidamente escoada,
primeiramente por barcas e a partir de 1903 pela estrada de ferro. (ROCHE, 1969).
Com a estrada de ferro chegando à região, foi necessária a construção de uma
nova ponte para cruzar até o outro lado da Colônia, esta ponte também foi muito utilizada
pelos colonos com suas carretas, pois as pontes construídas anteriormente – a primeira
uma ponte pênsil e a segunda uma ponte de madeira – não resistiram às enxurradas que
com as fortes correntezas traziam árvores, galhos e troncos. O trajeto por trem porém,
durou pouco, o primeiro trem chegou em 1903 e em 1963 a ponte foi desativada em
função do encerramento das atividades férreas na região (ENGELMANN, 2004).
Mesmo assim, em 1970, foi inaugurada uma nova ponte no local, desta vez
construída com material mais consistente, feita de concreto deixando as pontes de
madeira apenas nos registros históricos. Apesar do curto período em que as ferrovias da
região foram utilizadas, o transporte ferroviário foi um grande impulsionador no
desenvolvimento da região, favorecendo o escoamento da produção agrícola,
contribuindo desta forma para o aumento da população. Com este novo processo de
desenvolvimento, iniciou também a urbanização e industrialização da região.
A expansão da colonização seguia fervorosa, tanto que após 30 anos desde a sua
chegada, as áreas ocupadas pelos imigrantes já representavam 5,8% do total, porém a
área verde diminuira para 30,7%. Em 1914 estes dados já apresentavam outros
números, restando 25% de área verde, contabilizando um desmatamento de 11,5%.
(ROCHE, 1969). Segundo o inventário florestal realizado pela FEPAM (Fundação
Estadual de Proteção Ambiental) em 1983, havia apenas 5,62% de mata nativa, mas
com as políticas ambientais e a criação de reservas de proteção ambientais algumas
áreas puderam ser regeneradas, a cobertura vegetal aumentou para 17,5%, porém com
uma vegetação secundária (BUBLITZ, 2006).
72

A poluição do solo e dos recursos hídricos também devem ser considerados no


levantamento histórico do desbravamento da floresta pelos imigrantes, pois para garantir
a boa fertilidade da terra, foi necessária a introdução de herbicidas e de agrotóxicos a
partir da década de 1960 com a chamada “Revolução Verde”. Marcando de forma
vertiginosa o florescimento das colônias e o desaparecimento da floresta (BUBLITZ,
2006).
Na região situada na zona de serra, conhecida como Boa Esperança, a mata
nativa encontra-se preservada, nesta área de encosta que abriga os afluentes do Rio
dos Sinos já existe uma mata secundária, no entanto, a mata de Araucárias está presente
em toda a região mas de forma descontinuada em função do desmatamento, tornando a
paisagem desta espécie fragmentada.
As alterações da flora e fauna da mata atlântica na região do Vale do Paranhana
são difíceis de mensurar em função da falta de registros de todas as espécies existentes
à época e os inventários mais recentes do que restou neste processo de transformação
da floresta com sua biodiversidade. Mas pode-se observar nos registros em Roche
(1969) que a cobertura florestal do Rio Grande do Sul por volta de 1850 era de 36%,
enquanto a área desbravada era de apenas 0,5%. Segundo o inventário Florestal
realizado pela Secretaria do Meio Ambiente do Rio Grande do Sul, publicado em 2010,
a cobertura florestal nativa em seus estágios iniciais, médios e avançados de sucessão
na Bacia do Rio dos Sinos é de 1.652,74 km² correspondendo a 0,585% da cobertura do
Estado, enquanto que 19,51 km² corresponde a área de reflorestamento com Eucaliptos,
Pinus e Acácia-negra.
Nos estágios iniciais, dessa bacia hidrográfica as espécies predominantes foram
Baccharis dracunculifolia: Vassourinha/Vassoura; Myrsine umbellata: Capororoca;
Casearia sylvestris: Chá-de-Bugre; Cupania vernalis: Camboatá-vermelho; Luehea
divaricata: Açoitacavalo; Acacia mearnsii: Acácia negra; Baccharis sp.: Carquejão;
Baccharis semiserrata: Vassoura e Cordia trichotom: Louro (SEMA, 2010).
A permanência dos Jerivás por toda a mata atlântica é um fato bastante curioso,
pois apesar de todas as áreas terem sido desmatadas integral ou parcialmente, esta
espécie de coqueiro permanece imponente por toda sua extensão. Na mata atlântica
foram catalogadas 40 espécies de Palmeiras, algumas inclusive, ocorrem somente neste
bioma, sendo consideradas espécies endêmicas (LORENZI, 2004).
Com relação à botânica do coqueiro, este possui características peculiares, pois
o fruto é fonte de alimento de vários pequenos animais – aves e mamíferos – sendo
inclusive utilizado na culinária brasileira, principalmente o palmito. A madeira apesar de
não ser considerada nobre foi utilizada em algumas construções, principalmente nas
áreas rurais. O Jerivá, como é mais conhecido, possui um alto valor ornamental, pois o
crescimento é rápido, a árvore exige poucos cuidados, as raízes não são profundas,
sendo muito utilizado na arborização de ruas e jardins, conferindo um aspecto tropical
ao ambiente. O plantio do Jerivá é ainda utilizado na recomposição de áreas degradadas,
em plantios mistos, considerando a sua resistência ao transplante, mesmo as árvores
adultas (LORENZI, 2000).
Apesar dos esforços em manter as áreas de preservação, principalmente pela
necessidade de conservação da mata ciliar das margens dos rios, que formam suas
importantes nascentes, as necessidades criadas pela atividade antrópica, seja por
73

questões de sobrevivência, ou pela era de consumo voltada para o capitalismo, deve ser
igualmente considerada. O modo de produção mais voltado para o consumo imprime um
novo modo de vida que inclusive confunde “qualidade de vida com quantidade de coisas”
(KASPARY, 2014).

O calçado e a industrialização na região do Vale do Paranhana

A industrialização – iniciada ainda na década de 1920 na região – principalmente


de aglomerados calçadistas, também tiveram uma parcela significativa para o impacto
ambiental na região do Vale do Paranhana.
A história do calçado no Vale do Paranhana se confunde com o processo de
colonização e das migrações dos imigrantes alemães na região, pois foram estes que
trouxeram o conhecimento em curtimento de couros, as técnicas de fabricação de
arreios, selas, artigos de montaria e principalmente a fabricação de calçados
rudimentares a partir das aparas de couro. Estas atividades promoveram a expansão
das colônias ao longo do Rio dos Sinos e seus afluentes, incluindo o Rio Paranhana –
inicialmente chamado de Rio Santa Maria (CALANDRO, 2013).
A primeira fábrica de calçados da região data de 1922, na cidade de Três Coroas
e segundo o pesquisador Armindo Lauffer, em 1959 o município já contava com 9
fábricas de calçados (ENGELMANN, 2004). A partir da década de 1960, com a
internacionalização do mercado, ocorreu uma forte ampliação da área produtora,
abrangendo todas as cidades da região transformando novamente a geografia bem
como a economia das cidades.
Neste período até a década de 2000, a economia da região cresceu 20% mais do
que o Rio Grande do Sul, se considerar apenas o crescimento industrial, o percentual foi
ainda maior. No entanto, com o crescimento industrial e forte participação da economia
da China no mercado mundial, houve uma queda significativa na exportação de calçados
com uma consequente queda na produção.
Apesar da crise do setor para a exportação – a partir da década de 2000 – com a
economia interna crescendo, os aglomerados calçadistas mantiveram uma forte
participação no PIB do Rio Grande do Sul (CALANDRO, 2013). Esta permanência da
indústria também se deve em função das alterações nos processos de fabricação e
recuperação dos danos ambientais gerados por décadas.
A indústria calçadista foi uma grande fonte poluidora desde o curtimento do couro
até o produto final (OLIVEIRA, 2010). Porém, com novas legislações ambientais, todo o
setor precisou se reorganizar no sentido de criar metodologias específicas para o
processamento do couro, bem como os processos de fabricação diminuindo
consideravelmente os subprodutos, resíduos sólidos e efluentes, necessitando em
alguns casos a substituição completa de alguns componentes, como o caso do cromo,
que foi o responsável pela mortandade de várias espécies aquáticas (CONSEMA, 2006).
O impacto ambiental gerado pela indústria, no processo de colonização e na
urbanização da região, ainda afetam o desenvolvimento econômico local. Este impacto
também afeta outras regiões em razão do Vale do Paranhana ser banhado por
importantes fontes hídricas afluentes dos rios locais e estes por sua vez, são afluentes
74

do Rio dos Sinos que além de ser utilizado para consumo humano ainda é utilizado na
agricultura para irrigação e também na indústria (SEMA-RS, 2010).
Além das fontes hídricas afetadas pela indústria calçadista, o crescimento da
população também deve ser considerado nas transformações ambientais, pois com a
demanda por Mão de obra na região, houve um aumento da população urbana, este
processo ocorreu em função das migrações do rural para o urbano, e ainda de regiões
vizinhas.
A taxa de urbanização no período de foi superior à taxa de urbanização no estado.
O percentual de crescimento da população foi de 4,72% a.a., enquanto que no estado
foi de 1,48% a.a. (GALVÃO, 1999). Apesar da forte industrialização e do
desenvolvimento gerado, a região do Paranhana ainda é dependente da região do Vale
dos Sinos, uma vez que os insumos demandados pelo setor calçadista advêm do Vale
dos Sinos.

Algumas considerações (não) finais

As consequências deste impacto ambiental provocado pela colonização a partir


do século XIX ainda são desconhecidas em sua maioria, pois não envolve apenas o
desmatamento da floresta primária da mata atlântica. As alterações ocorreram na
mudança da paisagem natural, na cultura de forma geral, hábitos alimentares e estilos
de vida, alteração da flora e fauna, com severas extinções, alteração no curso de rios, e
na extinção de outros, criação de políticas ambientais, entre outros aspectos.
Porém algumas destas alterações podem ser definitivas e provocar novos ciclos
de mudanças, como é o caso das alterações no clima, novas migrações, etc. A
preservação da mata ciliar também é o foco dos principais projetos de preservação e
recuperação de áreas afetadas por desmatamentos ou por poluição ou ainda pela
contaminação de solo e água das atividades antrópicas.
No Brasil, atualmente existem diferentes organizações independentes ou do
próprio governo, criadas a partir das legislações e políticas públicas para a manutenção
e recuperação da mata atlântica como um todo, porém não há como diagnosticar com
exatidão quais foram as áreas mais afetadas e como restaurá-las, considerando que a
natureza está em constante processo de transformação, seja pelas atividades humanas
ou naturais.
O objetivo deste trabalho foi estudar a forma de colonização dos imigrantes
alemães frente ao meio ambiente, buscando analisar as dificuldades enfrentadas, a
forma como desbravaram as terras, consideradas por eles selvagens, o conhecimento
que adquiriram com a conquista da terra nova, bem como algumas derrotas superadas.
É importante ainda destacar o desenvolvimento das regiões colonizadas a partir
do desbravamento da mata atlântica, as diferenças entre as regiões pelos também
diferentes colonizadores ou pelos diferentes processos de colonização. Embora alguns
pesquisadores vêm incluindo as questões ambientais na historiografia regional, é
importante destacar as dificuldades nos registros históricos com relação ao processo da
transformação ambiental que esta região sofreu no período de colonização.
Das poucas imagens registradas, destaca-se o jerivá, que se mantém imponente
depois da conquista dos alemães e algumas imagens que visam a conservação do
75

registro das obras físicas enquanto patrimônio histórico, não considerando o meio
ambiente como patrimônio e como fonte para o entendimento das transformações
ambientais e humanas.

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77

PRIMEIRA CONFERÊNCIA BRASILEIRA DE PROTEÇÃO À NATUREZA


Paulo Gilberto Mossmann Sobrinho

A Primeira Conferência Brasileira de Proteção à Natureza ocorreu no ano de


1934, nas vésperas do afloramento do nacionalismo brasileiro imposto pelo governo
Vargas. Sendo assim, a ideia de uma conferência nessa temática estaria também por
defender e vincular aspectos da natureza com a identidade nacional.
O discurso inicial da Conferência sediada no Rio de Janeiro ficou a cargo de
Leôncio Correa, presidente da Sociedade dos Amigos das Arvores, sendo essa entidade
a principal responsável pelo evento. Seguindo um clima patriótico, Correa define que a
Sociedade que ele preside tem por objetivo ser “a sentinela vigilante do nosso ameaçado
patrimônio florestal”, ficando a tônica de um discurso patriota e nacionalista. No mesmo
discurso Corrêa relatou que os processos que estavam levando à devastação estavam
em contínuo aumento e seria necessária que todas as nações civilizadas entrassem na
causa da proteção da natureza. Há de se destacar ainda a solicitação de Corrêa para
que se constituíssem leis severas aos crimes contra a natureza e que estas mesmas leis
fossem postas em prática.
Fruto de um contexto de discussões ambientais em diversas nações, a
Conferência Brasileira de Proteção à Natureza acabou por incorporar algumas
concepções discutidas em outras conferências desta temática em outros países. Uma
dessas concepções foi influenciada pelos debates estabelecidos na América do Norte a
respeito da divisão da preservação da natureza a partir do olhar de dois grupos: os
conservacionistas e os preservacionistas. Tais grupos acabaram por estabelecer
referências e estratégias para o cuidado da natureza.
A diferença de pensar destes grupos estava no fato de o grupo dos
conservacionistas estar preocupado, sobretudo com a racionalidade da exploração dos
recursos naturais, enquanto o segundo estava mais voltado para preocupações
estéticas.
A criação de parques nacionais sem dúvida representa um avanço para a
preservação da natureza sob a ótica dos conservacionistas, pois além de preservar a
natureza, um parque nacional possibilitaria que cientistas e biólogos estudassem a
natureza sem a depredar, devido ao caráter protecionista imposta nas leis dos parques
nacionais.
Segundo os conservacionistas, sob a ótica do cientista alemão Gifford Pinchot:

[...] os conservacionistas, acreditava na possibilidade de uma exploração racional


de recursos como o solo, as florestas e a água. Estes próximos da tradição de
manejo florestal desenvolvida na Alemanha. [...] sintetizavam os objetivos do
movimento em três princípios básicos: desenvolvimento (o uso dos recursos
existentes pela geração presente), a prevenção do desperdício, e o
desenvolvimento dos recursos naturais para muitos, e não poucos. (FRANCO,
2002, p. 82).

Dessa forma, os conservacionistas acabaram por iniciar a ideia do que


atualmente chama-se de desenvolvimento sustentável. No caso deles, para a exploração
da natureza.
A experiência conservacionista norte-americana serviu de base para a silvicultura
no Brasil, ao mesmo tempo em que os parques nacionais também entravam na pauta de
78

discussão. Essas duas questões foram abordadas durante a Primeira Conferência


Brasileira de Proteção à Natureza.
A ideia da silvicultura é explicitada com o a proposta de reflorestamento com
eucaliptos, além de matas nativas. Os problemas ambientais seriam resolvidos com o
reflorestamento da natureza (reflorestamento em morros e em margens de estradas, no
nordeste para prevenir a seca, e na utilização da madeira para dormentes, móveis e
construção civil).
Na questão das reservas, ou parques naturais, se fortaleceu a ideia paisagística
de jardins botânicos e hortos municipais, dando um aspecto de “natureza jardim” o que
acabaria também gerando riquezas pelo fato de atrair turistas devido à beleza. Assim,
além de proteger a natureza estaria se criando uma fonte de renda alternativa.
Há de se destacar que o modelo norte-americano seguido no Brasil, além de
possuir o intuito de arrecadação financeira oriunda do turismo, também tinha a
preocupação de ter a natureza como objeto de estudo científico, e sendo assim, extrair
dela novos conhecimentos. Com tudo isso, se fazia necessária a preservação da
natureza devido à riqueza que ela proporcionaria.
Os resultados apresentados pela Conferência acabaram por estabelecer:

Cooperação internacional no campo da proteção à natureza; estudos que


viessem a aumentar o grau de conhecimento das áreas dos elementos do mundo
natural que deveriam ser objeto de proteção especial; iniciativas na área da
educação centradas na conscientização da importância da preservação das
riquezas naturais [...] um maior conhecimento técnico - cientifico para a utilização
mais eficiente dos recursos naturais; harmonizar o artifício humano e as criações
da natureza. (FRANCO, 2002, p. 82).

Mesmo com perspectivas vantajosas com a preservação da natureza, as


dificuldades eram significativas. A falta de uma consciência, ou de uma cultura de
preservação ante a população era uma das barreiras que dificultavam a propagação da
ideia de preservação. Apesar da inspiração do modelo alemão em ensinar estes
aspectos de preservação nas escolas, no Brasil a situação não apresentou os mesmos
resultados do modelo teuto.
A falta de uma legislação abrangente para a temática, tanto no que diz respeito a
sua preservação e exploração, acabou por limitar uma exploração sustentável da
natureza.
E talvez ainda a pior dificuldade estivesse mesmo com a precariedade da
legislação a respeito da preservação da natureza ela ainda não era cumprida. O que
acabava ocasionando uma preservação ineficiente.
Na medida em que o aspecto predatório da exploração da natureza era justificado
em troca de um progresso econômico, desenvolvimentista material e urbano, acabou-se
por gerar frustrações e ressentimentos aos cientistas defensores da causa da
preservação da natureza, que perceberam que suas ideias estavam abandonadas ante
a uma visão menos científica e mais predatória e lucrativa, ao menos em curto prazo.

Referências

FRANCO, José Luis de Andrade. A Primeira Conferência Brasileira de Proteção à Natureza e a


questão da Identidade Nacional. In Varia História. Universidade de Minas Gerais, nº. 26, 2002.
79

ANALISE DA TESE “A FIGUEIRA E O MACHADO”


Paulo Gilberto Mossmann Sobrinho

A tese de doutorado de Daniel Porciúncula Prado, intitulada “A Figueira e o


Machado – raízes da educação ambiental no sul do Brasil: práticas educativas e
militância ambiental na perspectiva do cronista Henrique Luiz Roessler” apresenta
através das crônicas, publicadas no jornal Correio do Povo entre 1957 e 1963, de
Henrique Roessler, os problemas ambientais, ocorridos nesse período, especialmente
no Rio Grande de Sul.
Fruto de um contexto de transformações econômicas/sociais, oriundas do
processo de capitalismo industrial iniciado na era Vargas e intensificado na década de
cinquenta do século XX por Juscelino Kubitschek, a década de sessenta do referido
século originou uma série de movimentos sociais que reivindicavam revisões, mudanças
e até mesmo quebra de paradigmas influenciados por esse espírito de transformações
em que o mundo estava passando. Dentre os movimentos sociais que mais se
destacaram nesse período, há de se salientar o movimento feminista, o movimento da
contracultura, movimento contra a segregação racial, entre outros. Aproveitando-se
desse momento de protestos, os ambientalistas também iniciaram o movimento em prol
da defesa do meio ambiente.
Henrique Luiz Roessler vivenciou este momento e colaborou na constituição de
discussões relativas à preservação ambiental através de suas crônicas, que por um
período de sete anos, foi vinculada junto a um dos jornais de maior circulação do Brasil
e o maior do Rio Grande do Sul, O Correio do Povo. Contudo, a vinculação deste autor
junto às causas ambientais é anterior ao período das publicações de seus periódicos.
Nascido em Porto Alegre no ano de 1896, Henrique Luiz Roessler era contabilista de
profissão, mas grande parte de sua vida foi vinculada às causas ambientais, sendo ele
fiscal ambiental voluntariamente no decorrer das décadas de quarenta, cinquenta e
sessenta, sendo este período, conforme já referido, de profundas mudanças
econômicas/sociais, vinculadas a um intenso processo de industrialização no Brasil.
E justamente este processo de industrialização que foi responsável por gerar uma
ideia dialética entre o progresso versus preservação. A oposição de ideias se deu pela
perspectiva de enriquecimento pelo desenvolvimento industrial, somado a crença de que
os recursos naturais seriam inesgotáveis, ante a uma ideia de preservação ecológica,
pela perspectiva dos danos que seriam causados com a destruição dos recursos
naturais.
Roessler, a partir desta dialética foi um dos primeiros a apresentar com bases
objetivas a elaboração de crescimento sustentável, ou seja, a possibilidade de progredir
sem afetar a natureza, propondo essa visão de desenvolvimento sustentável através da
reorganização das atividades humanas com relação à natureza.
Dessa forma, Henrique Luiz Roessler acabou por lançar as bases para a
discussão de uma Educação Ambiental no Rio Grande do Sul. Para isso, utilizando-se
principalmente de suas crônicas, que acabaram por transmitir mensagens de alerta e
informações para que se perpassasse a mensagem de alerta dos danos ambientais que
estavam ocorrendo num período onde se predominava a ideia de industrializar para
80

crescer, com Roessler, desse modo, passando de forma intrínseca e extrínseca, através
da imprensa, os perigos de uma industrialização desenfreada e mal planejada.
Prado salienta que mesmo com a identificação de Henrique Luiz Roessler com a
Educação Ambiental suas ideias acabaram por servir como fundamento para essa área,
é necessário destacar que suas concepções diferem das concepções apresentadas
atualmente pelos adeptos da educação Ambiental. Conforme Prado:
A visão ambientalista apresentada por Roessler, através de suas crônicas,
valoriza o meio natural a partir de uma crítica as representações do progresso
capitalista, pois abarcaram desde orientações de como educar os filhos e alunos
contra a prática de matança de passarinhos, até a costura de uma contundente
crítica contra a indústria coureiro-calçadista do Vale dos Sinos, que, com a
contaminação hídrica, desorganizava a vida das populações ribeirinhas.
(PRADO, 2008, p. 181).

Roessler sugere o plantio de mudas e sementes, sendo essa ideia também


presente nos aspectos que serviram de concepções para a Educação Ambiental.
Críticas ao consumismo serviram de inspiração para as críticas de Henrique Luiz
Roessler, especialmente no que diz respeito ao consumo de produtos da natureza. A
perspectiva de uma conscientização relativa à “ética ambiental” passava por uma
reflexão e divulgação da questão de se repensar o consumismo para o estabelecimento
de preservação de recursos naturais.
Dentre as medidas sugeridas por Henrique Luiz Roessler está à preservação das
árvores como forma de manter o equilíbrio ecológico para a fauna e mananciais de rios,
arroios e águas submersas. No que tange a preservação da fauna, além de preservar as
matas seria necessário também controlar com maior rigor a caça e a pesca, havendo
além de uma fiscalização mais eficaz uma legislação que regulamentasse a caça e a
pesca de forma sustentável sem causar danos ambientais.
Temas vinculados à exploração da água, especialmente à bacia do Rio dos Sinos,
foram retratados por Roessler, como por exemplo, preocupações relativas com o
bombeamento de água de arroios e do rio para o plantio de arroz, que acabava por
ocasionar a morte de cardumes de peixes que eram tragados pelas bombas. Além do
bombeamento imprudente das águas da bacia do Rio dos Sinos, outra preocupação de
Henrique Luiz Roessler é relativa à poluição das águas, no que tange ao Rio dos Sinos,
aos resíduos químicos despejados pelas indústrias coureiro-calçadistas, e em relação
ao litoral sul-rio-grandense, os resíduos dos petroleiros existentes na faixa litorânea.
A tônica herdada das crônicas de Henrique Luiz Roessler com relação à Educação
Ambiental está na ideia da mudança de comportamento, tanto individual, quanto coletivo
a partir da educação, seja esta desenvolvida em escolas, igrejas, famílias. O importante
era conscientizar para preservar.
No decorrer deste artigo percebeu-se que as ideias de preservação ambiental
andaram ao lado da questão do desenvolvimento industrial, gerando assim uma questão
dialética entre ambientalistas e desenvolvimentistas. Infelizmente fica transparecido nos
dias atuais que as ideias dos ambientalistas, em destaque neste artigo Henrique Luiz
Roessler, teve sua opinião difundida, mas não vencedora. Contudo, as ideias defendidas
Roessler serviram de inspiração para grupos ambientalistas, que apesar do passar de
quatro décadas têm ainda neste cronista uma fonte de referência para a discussão e
formalização de suas ideias.
81

QUATRO CAMPOS DO PENSAMENTO ECOLÓGICO (ECOLOGIA NATURAL,


ECOLOGIA SOCIAL, CONSERVACIONISMO E ECOLOGISMO)
Paulo Gilberto Mossmann Sobrinho

O conceito “ecologia”, que nos dias atuais apresenta um significado bastante


amplo tanto na sua concepção quanto na sua discussão, teve sua primeira definição
através dos trabalhos do biólogo alemão Ernest Haeckel, no ano de 1866. Derivado da
palavra grega Oikos (casa) o termo ecologia (que significa ciência da casa) em seus
primórdios era designado para representar o estudo das relações entre as espécies
animais com o meio ambiente orgânico e inorgânico17.
Cabe neste trabalho discutir o contexto de cerca de um século, onde se deu a
transição das discussões ecológicas que passaram de uma discussão científica em seus
primórdios passando a se tornar uma questão de interesse cientifico, político e social.
Há de se destacar que uma mudança tão ampla quanto esta ocorrida no campo
das discussões sobre a ecologia demonstram também a fragmentação que tal tema
atingiu. No decorrer de um século, diversos grupos passaram a se interessar sobre a
temática ecológica, e sendo assim, cada grupo passou a ver o viés ecológico de acordo
com os seus interesses, sendo estes obviamente ligados ao contexto histórico
vivenciado.
Pádua & Lago (1985) a partir dessa constatação definem as divisões dos grupos
que procuram debater sobre as questões ecológicas em quatro grandes grupos: Ecologia
Natural; Ecologia Social; Conservacionismo e Ecologismo.
A Ecologia Natural ficou focada especialmente nas questões biológicas.
Originária diretamente das pretensões do trabalhar ecológico de Ernest Haeckel, a
Ecologia Natural passou a obter mais investimentos para o aprofundamento de estudos,
o que propiciou a subdivisão de estudos em diversas áreas como Ecologia Florestal,
Ecologia Marinha. Baseada nos estudos de ecossistemas, a Ecologia Natural demonstra
que não existe na natureza sistemas independentes. Todos os seres da fauna e flora
geram uma relação de cumplicidade e dependência dos recursos naturais, o que nos
possibilita destacar seis características básicas da relação ecossistêmica:
interdependência; ordem dinâmica; equilíbrio autorregulado (homeostase); maior
diversidade – maior estabilidade; fluxo constante de matéria e energia e reciclagem
permanente.
A Ecologia Social tem como base a reflexão da relação dos homens, da sociedade
com relação à utilização dos recursos naturais, propondo e arguindo sobre temas
relativos à utilização e má utilização dos homens em relação aos recursos naturais.
Apesar de se verificar discussões sobre a questão da utilização e má utilização dos
homens dos recursos naturais desde a antiguidade, a temática se evidenciou com o
processo de industrialização e os danos causados por tal fato ganharam maior evidencia
com o fim da 2ª Guerra Mundial, pois a devastação da guerra acabou por propiciar
escassez de recursos naturais que atingiu as classes mais favorecidas economicamente,
outrora somente as classes menos favorecidas estavam passando por tal escassez.
Dessa forma, o meio acadêmico passou a refletir sobre o assunto. A possibilidade de

17 PÁDUA, José Augusto et LAGO, Antônio. O que é ECOLOGIA. São Paulo: Abril Cultural/Brasiliense, 1985. p. 07
82

escassez, ou até mesmo a falta de recursos naturais para a subsistência humana entrou
em pauta nos meios acadêmicos. A ação humana deveria ser regulada em relação aos
recursos naturais, no entanto, a ganância de uma sociedade capitalista-industrial até nos
dias atuais dificulta o processo de conscientização iniciado há mais de meio século.
O Conservacionismo é fruto exatamente do contexto anteriormente citado do fim
da 2ª Guerra Mundial e especialmente na década de 60 do século XX, onde a percepção
já evidenciada pelos ecologistas sociais motiva outro grupo de ecólogos em defender a
natureza lutando de forma mais prática pela sua preservação. Voltados exclusivamente
na defesa das questões ambientais, os conservacionistas criticam o modelo econômico
capitalista-industrial da sociedade contemporânea em virtude dos danos ambientais
causados pela desenfreada exploração dos recursos naturais oriundos desse sistema
econômico.
O Ecologismo se constitui num projeto mais abrangente do que as demais áreas
em defesa da natureza. Os ecologistas apresentam discussões abrangentes em defesa
de políticas sociais em defesa do meio ambiente. Diferentemente dos conservadores, os
ecologistas ampliam as suas discussões além das questões ambientais, discussões
sociais, abrangendo a sua preocupação ao todo social. Buscando assim não só garantir
a sobrevivência da espécie humana, como também em garantir a sobrevivência pela
construção de formas culturais e sociais, visando atingir o ideal de liberdade, igualdade
e fraternidade18.
Fruto de uma verdadeira revolução cultural e social: os operários solicitavam
melhores condições de trabalho, camponeses reclamavam por uma reforma agrária,
indígenas buscavam a valorização e reconhecimento de sua cultura, mulheres visavam
às igualdades entre os sexos, negros lutavam contra a submissão e preconceito racial,
os homossexuais lutavam pela direito à diferença e à indiscriminação e os jovens
propunham a contracultura; mas o movimento ecológico não contou com esta
homogeneização característica dos outros movimentos. A luta, no entanto, se dava
presente em diversos seguimentos dos demais movimentos e por vezes entrava em atrito
com outros. Um exemplo pode ser caracterizado quando grupos de ecologistas lutavam
contra a instalação ou ampliação de uma indústria em contrapartida aos interesses do
movimento operário, que buscava conseguir mais empregos.
As já referidas transformações ocorridas na década de 60 representam a
consolidação de um desejo coletivo que desde o fim da Segunda Guerra Mundial vinham
se desenhando. As vitórias de grupos sociais ocorridas no séc. XX, como por exemplo,
os operários que passaram a gozar de carga horária diária limitada em oito horas, férias,
hora extra, representam avanços sociais no sistema capitalista industrial. Nesse sentido,
parte-se para outra questão a ser analisada no contexto da década de 60: não estava se
buscando exclusivamente melhoramentos do segmento social e sim uma crítica e/ou
alternativa nova para o modo de vida, para o cotidiano.
Os beatnik e os hippies se encaixam neste novo padrão que busca uma nova
sociedade e um novo modo de vida, a contracultura entra em pauta. O movimento
pacifista está intrínseco neste contexto de Guerra Fria. Com este viés pacifista se
fortalecerá o movimento ecológico, que buscava na paz a alternativa contra perigos para

18 PÁDUA et LAGO, 1985, p. 37.


83

a humanidade oriundos da guerra - a ameaça nuclear, guerra bacteriológica, corrida


armamentista.
Sendo assim, impulsionados pelos diversos movimentos sociais, alavancados na
década de 60 do séc. XX, o movimento ecologista abrangeu uma diversa camada social.
Dos inseridos na causa destaca-se economistas, biólogos, filósofos, sociólogos entre
outros tantos. Essa diversidade em sua composição propiciou uma hetereogenização no
movimento ecológico, que apesar de tão diverso em sua composição apresenta como
filosofia central a busca de melhorar o relacionamento do homem com a natureza.
Outro grupo participante do movimento ecológico bastante significativo e
representativo do movimento é composto por integrantes que visavam e ainda visam agir
politicamente para propor a conscientização coletiva da preservação da natureza. Esta
atuação política acabou por originar em diversos países o Partido Verde, cuja crescente
participação e votação em nações industrializadas na Europa demonstram o crescimento
do processo de conscientização iniciado pelo movimento ecológico.
No Brasil, o movimento ecológico terá um retardo de cerca de uma década, sendo
impulsionado com maior evidência com a anistia política promovida pela ditadura militar.
Percebe-se então que o país está passando por um momento em sentido contrário ao
contexto europeu e estadunidense. Enquanto se buscava maior liberdade e um novo
modo de se viver no Brasil estava vigente um regime autoritário e conservador. E foi
justamente a postura conservadora que tomou o partido da elite brasileira, que na
contramão da política esquerdista via na exploração do imperialismo desenfreado o
principal motivador pelo fato do Brasil ser subdesenvolvido. Para a concepção elitista a
justificativa para o país ser subdesenvolvido estava na origem escravocrata de mão-de-
obra desqualificada da população.
Embasada num projeto desenvolvimentista onde a industrialização representava
o progresso, qualquer tentativa de bloquear a implantação de uma indústria devido ao
impacto ambiental que esta causaria, levava a concepção de retardo promovido por
comunistas de esquerda, sendo considerados assim os ecologistas de retrógrados, de
impedirem o desenvolvimento nacional. Enquanto na verdade estes grupos de esquerda
estavam por demonstrar as ideias ecologistas e a preocupação com o futuro da
população que sofreria com os impactos gerados pela indústria. No entanto, o slogan
adotado pelos burocratas da ditara era a “pior poluição é a da miséria”.
Soma-se a essa ideia desenvolvimentista o passado latifundiário, onde o
desmatamento para o aumento o cultivo da monocultura acabava por determinar a
destruição de áreas de preservação ambiental em prol de um aumento da produção
alimentícia.
Apesar de uma década consideravelmente desfavorável às ideias de preservação
ambiental, tem-se no Rio Grande do Sul referência ao ecologista José Lutzemberger, e
no estado do Rio de Janeiro, dois focos de defesa às causas ecológicas.
Os anos 80 do séc. XX representam a consolidação do pensamento ecológico
não só no Brasil como no Mundo. Como já se destacou os Partidos Verdes ligados às
causas ecológicas aumentaram significativamente sua presença na esfera política
internacional. Contudo, ainda existem muitas barreiras a serem superadas. Os
interesses econômicos ainda predominam sobre os interesses ambientais, o que acaba
ocasionando um desequilíbrio entre o crescimento, ou desenvolvimento sustentável e o
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desenvolvimento predatório. O que poderá determinar, caso não haja reflexões e ações
imediatas das nações mais ricas e responsáveis pelo desenvolvimento predatório, um
caminho sem volta.

Referências:

GONÇALVES, Carlos Walter Porto. Os (des)caminhos do meio ambiente. São Paulo:


Contexto, 2005

PÁDUA, José Augusto et LAGO, Antônio. O que é ECOLOGIA. São Paulo: Abril
Cultural/Brasiliense, 1985.

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