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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RECÔNCAVO DA BAHIA

CLEIDSON CASTRO

Estrutura da Matéria

Amargosa - BA

4 de setembro de 2022
CLEIDSON CASTRO

ESTRUTURA DA MATÉRIA

Este documento é um conjunto de notas de aula para o curso de Estrutura da matéria do curso de
Licenciatura em Física do Centro de Formação de Professores da Universidade Federal do Recôncavo da
Bahia. É importante dizer que estas notas são apenas um RESUMO dos livros [1] EISBERG, Robert
Martin; RESNICK, Robert. Física quântica: átomos, moléculas, sólidos, núcleos e partículas . Rio de
Janeiro: Campus, c1979. 928 p. ISBN 85-7001-309-4 e [2] BREHM, John J; MULLIN, William J.
Introduction to the structure of matter: a course in modern physics. New York: Wiley, c1989. xviii, 912,
17, 12 p. ISBN 9780471605317 .
SUMÁRIO

1 RADIAÇÃO TÉRMICA . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 5
1.1 Radiação térmica . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 6
1.2 Teoria clássica da radiação da cavidade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 8
1.3 Teoria de Plank da radiação de cavidade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 14
1.4 Aplicações da lei da radiação de Plank . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 19
1.4.1 Termometria . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 19
1.4.2 Calor específico dos sólidos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 19
1.5 O postulado de Plank e suas implicações . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 20

2 PROPRIEDADES CORPUSCULARES DA RADIAÇÃO . . . . . . . . . . . . . . . . 23


2.1 O efeito fotoelétrico . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 23
2.2 Produção de Raio-X . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 29
2.3 O efeito Compton . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 34
2.4 Produção e aniquilição de pares . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 40
2.5 Seção de choque para absorção e espalhamento de fótons . . . . . . . . . . . . . . . 44
5

1 RADIAÇÃO TÉRMICA

Em 1900, Max Plank apresentou para a Sociedade Física Germânica seu artigo sobre a teoria da
Lei de Distribuição de Energia. Este foi o início de uma revolução da física. Estava para nascer um nova
teoria que visava responder questões que a física clássica não conseguia. Nascia a partir daí a mecânica
quântica. Na primeira parte do século XX muito trabalhou-se para o seu desenvolvimento. Na verdade,
esta primeira parte é chamada de "velha"mecânica quântica que, por meio dos conceitos por detr’as,
direcionou para a moderna mecânica quântica.

Antes de discutirmos necessariamente o tema radiação de corpo negro, vamos fazer uma pequena
abordagem histórica antes da descoberta de Plank. Por volta de 1860, o físico alemão Gustav Robert
Kirchhoff (1824-1887), enquanto estava em frente a uma lareira em uma noite de inverno, interregou-se
pelo o fato das brasas de brilho emitirem luz de cores diferentes de acordo com sua temperatura. Este
fenômeno já era bem conhecido desde a Antiguidade pelos padeiros, vidreiros e outros para verificar a
temperatura do fogo graças a sua cor (750 graus Celsius para vermelho vivo, 1 000 graus Celsius para
amarelo, 1 200 graus Celsius para o branco ...)

Para compreender o conceito por detrás deste fenômeno, Kirchhoff imaginou o conceito de corpo
negro, uma espécie de forno ideal que absorve toda a radiação que ele recebe. kirchhoff aquece gradualmente
o corpo negro a fim de analisar as frequências das ondas eletromagnéticas, visivel ou não.

Nesta primeira parte do curso, focaremos em experimentos e teorias que abrangem ramos da
física clássica: mecânica, termodinâmica, mecânica estatística e eletromagnetismo. É importante salientar
que até o início do sec. XIX esta radiação resumia-se à apenas luz vísivel. Pouco a pouco, os físicos foram
descobrindo outras radiaçẽs de de mesma natureza mas não perceptível aos olhos humanos. À mesma época,
James Calrk Maxwell demonstrou que uma radiação eletromagnética é composta de um campo elétrico
e de um campo magnética a qual se propaga à velocidade da luz. Conforme mostra a Fig. 1, todas as
radiações são diferentes apenas pelo seu comprimento de onda, portanto, de suas frequências. A experiência

Figura 1 – Caption
6 Capítulo 1. Radiação térmica

Figura 2 – Cavidade em um corpo negro conectada com o meio externo por meio de um pequeno orifício.
A radiação incidente sobre o objeto é totalmente absorvida pela cavidade e após isto ocorre
sucessivas reflexões nas paredes internas do objeto.

de Kirchhoff confirma que as temperaturas s ao relacionadas as mesma radiações eletromagnéticas, que


permanece verdadeira independente do material queimado. Ele

1.1 Radiação térmica

Chamamos de radiação térmica a radiação de um corpo como o resultado de sua temperatura (??).
Todos os corpos a nossa volta estão constantemente absorvendo ou emitindo radiação témica. Podemos
calcular a taxa de absorção e de emissão de radiação térmica. Caso o corpo esteja mais quente que a sua
vizinhança, a emissão irá predominar sobre a absorção. Caso esteja mais frio, a absorção irá predominar.
Estando o corpo em equilíbrio térmico com a sua vizinhança, a emissão será igual a absorção.

Matéria em seu estado condensado (isto é, sólido ou líquido) emite um espectro contínuo de
radiação. Geralmente, o espectro da radiação térmica emitida por um corpo quente dependerá da
composição deste corpo. No entanto, há uma classe de corpos que emite um espectro de caráter universal,
isto é, a radiação não depende da forma e da composição do corpo mas apenas de sua temperatura. Esses
corpos são chamados de corpo negro. A definição mais simplista que podemos fornecer é que um corpo
negro é um objeto de cor preta com a propriedade de absorver toda a radiação incidente sobre ele. O
nome é apropriado pois estes corpos não reflete a luz.Vamos agora imaginar um corpo negro mais geral,
isto é, vamos considerar uma cavidade que contém um pequeno orifício. A radiação incidente sobre o
orifício é refletida seguidamente pelas pareder internas da cavidade e, dificilmente, conseguirá sair pela
cavidade. Veja a Fig. 2. Uma vez que o orofício absorve toda a radiação incidente sobre ele, podemos
considerá-lo também, com uma boa aproximação, um corpo negro.

Para estudarmos o espectro de radiação emitida por um corpo a temperatura T especificamos a


quantidade R(T ) denominada radiança espectral definida de modo que R(T )dµ corresponde à energia,
por unidade de área e por unidade de tempo, emitida pela radiação térmica de frequência entre ν e ν + dν.
Isto e, Z ∞
RT = RT (ν)dν (1.1)
0

RT aumenta rapidamente com o aumento do aumento da temperatura. De fato, este resultado é chamado
de Lei de Stefan e foi primeiramente postulado na forma de uma equação empírica

RT = σT 4 , (1.2)
1.1. Radiação térmica 7

onde σ = 5.67 × 10−8 W/m2 - K4 é a chamada constante de Stefan-Boltzmann.

Experimentalmente as características de RT dependem muito pouco da constituição do corpo


que emite radiação. Este resultado é chamado lei de deslocamento de Wien

νmax ∝ T, (1.3)

onde νmax é frequência máxima a qual RT (ν) possui seu valor máximo para determinador T .

Voltemos ao caso de um objeto contendo uma cavidade, Fig. 2. Vamos assumir que as paredes
da cavidade são uniformemente aquecidas a temperatura T . As paredes emitirão radiação térmica que
preencherão toda a cavidade. A pequena fração desta radiação incidente do interior da cavidade passará
pelo buraco de modo que este buraco atuará como um emissor de radiação térmica. Desde que o buraco
deve ter proporiedades da superfície de um corpo negro, a radiação emitida pelo buraco deve possuir
um espectro de corpo negro; mas desde que o buraco é simplesmente uma amostra da radiação térmica
presente na cavidade, está claro que a radiação na cavidade deve ter também um espectro de corpo negro.
Vamos retornar aos argumentos físicos vistos na Eq. 1.1. O espectro emitido pelo buraco na cavidade
é especificado em termos do fluxo de energia RT (ν). É conveniente especificar o espectro da radiação
dentro da cavidade, chamada radiação da cavidade, em termos de uma densidade de energia ρT (ν) a
qual é definida como a energia contida em uma unidade de volume da cavidade a uma temperatura T no
intervalo de frequência ν e ν + dν. É evidente que estas quantidades são proporcionais umas a outras, isto
é,
ρT (ν) ∝ RT (ν). (1.4)
Por isso, a radiação dentro da cavidade cujas paredes que estão a temperatura T possui o memsmo caráter
de radiação emitida pela superfície de um corpo negro.

Exemplo 1.1

a) Desde que λν = c, a velocidade constante da luz, a lei de deslocamento de Wien pode ser colocada
como
λmax T = constante (1.5)
onde λmax é o comprimento de onda a qual a radiância espectral possui seu valor máximo para uma
temperatura particular T . O valor experimental da constante de Wien é 2,898 × 10−3 m - K. Se
assumirmos que as superfícies estelares comportam-se como corpo negro podemos obter com uma
concordância sua temperatura medindo λmax . Para o Sol λmax = 5100Å, enquanto que para "North
Star"λmax = 3500Å. Encontre a temperatura da superfície destas estrelas. Lembre-se que 1 Å =
10−10 m
Solução Para o Sol
2, 898 × 10−3
T = = 5700K. (1.6)
5100 × 10−10
Para "North Star"
2, 898 × 10−3
T = = 8300K. (1.7)
3500 × 10−10
b) Usando a lei de Stefan e as temperaturas obtidas no item anterior, determine a potência radiada de
1 cm2 da superfície estelar.
Solução Para o Sol
4 2 2
RT = σT 4 = 5.67 × 10−8 (5700) = 5, 90 × 107 W/m ≈ 6000 W/cm

(1.8)

Para North Star


4 2 2
RT = σT 4 = 5.67 × 10−8 (8300) = 2, 71 × 107 W/m ≈ 27.000 W/cm

(1.9)
8 Capítulo 1. Radiação térmica

1.2 Teoria clássica da radiação da cavidade

Um pouco depois da virada deste século, Rayleigh, e também Jeans, fizeram um cálculo da
densidade de energia da radiação da cavidade que apontava um sério conflito entre física clássica e
resultados experimentais.

Para abordarmos este conflito e os conceitos físicos por detrás deste, considere uma cavidade com
paredes metálicas aquecidas uniformemente a temperatura T . As paredes emitem radiação eletromagnética
no intervalo térmico de frequências. Isto ocorre basicamente devido aos movimentos acelerados dos
elétrons nas paredes metálicas que surgem da agitação térmica. Entretanto, não é necessário estudar o
comportamento dos elétrons nas paredes da cavidade em detalhes. Rayleigh e Jeans procederam suas
experiências da seguinte forma: primeiramente, teoria clássica eletromagnética é usada para mostrar que
a radiação dentro da cavidade deve exstir ina forma de ondas estacionárias com modos na superfície
metálica. Fazendo uso de argumentos geométricos, é feita contagem destas ondas estacionárias no intervalo
de frequência de ν a ν + dν a fim de determinar como os números dependem de ν. Então, o resultado da
teoria cinética clássica é usado para calcular a energia média total destas ondas quando o sistema está
em equilíbrio térmico. Esta energia média total depende, na teoria clássica, apenas da temperatura T .
Vale ressaltar ainda que as ondas eletromagnéticas correspondem a campos elétricos oscilantes na direção
perpendicular à direção de propagação. Nas posições extremas (isto é nas paredes), essas ondas devem ter
amplitude sempre nula, pois o campo elétrico paralela à superfície de um metal não pode ser diferente,
sendo sempre cancelado pela mobilidade das cargas elétricas nos metais. O número de ondas estacionárias
no intervalo de frequências multiplicado pela energia média das ondas, dividido pelo volume da cavidade,
fornece a quantidade de energia média por unidade de volume no intervalo ν a ν + dν. Esta quantidade
requerida, densidade de energia ρT (ν). Vamos, então, obter a função que descreve a densidade de energia
eletromagnética no interior de uma cavidade

Por simplicidade, considere uma cavidade cúbica metálica de aresta a preenchida com uma
radiação eletromagnética. A radiação é refletida para frente e para trás entre as paredes de forma que
podemos fazer uma análise qualitativa nas direções perpendiculares definidas pelas arestas do cubo. Como
as paredes opostas são paralelas entre si, as três componentes da radiação não se misturam e podemos
tratá-las separadamente. Primeiramente, considere a componente x e a parede metálica em x = 0. Toda a
radiação desta componente a qual é incidente sobre a parede é refletida por ela, e as ondas incidentes e
refletidas se combinam para formar uma onda estacionária. Desde que radiação eletromagnética é uma
~ perpendicular a direção de propagação, e desde que a direção
vibração transversa com o campo elétrico E
de propagação para este componente é perpendicular a parede em questão, seu campo elétrico é paralelo
a parede. Em uma parede metálica não pode haver um campo elétrico uma vez que cargas podem sempre
~ para este componente deve sempre ser zero
fluir de tal forma a neutralizar o campo elétrico. Entretanto, E
na parede. Isto é, a onda estacionária com componente x da radiação deve ter um nó (amplitude zero) em
x = 0. A onda estacionária deve sempre ter um nó em x = a pois não pode haver paralelo campo elétrico
na parede correspondente. Condições semelhantes aplicam-se para outras componentes. Estas condições
colocam uma limitação nos possíveis comprimentos de ondas e, portanto, nas possíveis frequências da
radiação eletromagnética na cavidade.

Nosso próximo passo então é contar o número de ondas estacionárias com nós nas superfícies
da cavidade cujos comprimentos de onda encontrams-se no intervalo de λ a λ + dλ, o qual corresponde
ao intervalo de frequência ν a dν. Para este objetivo, vamos considerar por simplicidade apenas uma
componente, x, de modo que praticamente estaremos abordando uma "cavidade unidimensional". Este
método é conveniente pois mais adiante faremos a generalização para tratar o caso de uma cavidade
cúbica.
1.2. Teoria clássica da radiação da cavidade 9

Figura 3 – Padrões de amplitude de onda estacionária em uma corda de violão. Podemos tratar este
exemplo para uma onda estacionária em uma cavidade unidimensional com as paredes em
x = 0 e em x = a.

O campo elétrico para ondas estacionárias unidimensional pode descrito pela função
 
2πx
E(x, t) = E0,x sin sin (2πνt), (1.10)
λ

onde λ é o comprimento de onda, ν é sua frequência e E0 sua amplitude máxima. As duas primeiras
quantidades estão relacionadas pela equação ν = c/λ, onde c é a velocidade de propagação de ondas
eletromagnéticas. Para compreender melhor podemos fazer uma analogia desta situação como o caso
simples de uma corda de violão. A condição de ondas estacionárias numa corda de violão de comprimento L
implica na amplitude nula das ondas nas extremidades de fixação da corda. Portanto as ondas estacionárias
2L
poderão ter comprimentos de onda λ1 = 2L, λ2 = L, λ3 = 2L/3, . . . , ou de um modo geral λn = n . Veja
uma ilustração desta condição na Fig. 3. Como ν = c/λ, as frequências possíveis correspondentes são
c
dadas por ν = 2L n.

Com esta ilustração podemos voltar ao nosso problema de uma cavidade unidimensional com
radiação eletromagnética. Para satisfazer a condição de que ondas têm nós em ambos fim da cavidade
unidimensional escolhemos a origem do eixo x a ser um dos fim da cavidade (x = 0) e então imposmos a
condição na outra extremidade (em x = a)

2x
= n, (1.11)
λ
onde n = 1, 2, 3, 4, . . . . Esta condição determina um conjunto de valores permitidos para o comprimento de
onda λ. Estes valores determinam padrão de ondas estacionárias com a mesma aparência das amplitudes
das ondas estacionárias em uma corda de violão. Veja novamente a Fig. 3. Em termos das frequências,
temos que
cn
ν= . (1.12)
2a

Podemos apresentar estes valores de frequência em termos de um diagrama consistindo de um


único eixo na qual plotamos um ponto em todos valores inteiros de n. Neste diagrama o valor da frequência
permitida ν correspondendo ao valor particular de n é ν = c/2a multiplicado pela distância d da origem
ao ponto apropriado, ou a distância d é 2a/c multiplicado pela frequência ν. Veja a Fig. 4

Figura 4 – Valores permitidos de frequência ν em uma cavidade unidimensional de comprimento a.


10 Capítulo 1. Radiação térmica

Figura 5 – Frequências permitidas para uma cavidade tridimensional, 3-D, de aresta a.

Este diagrama é muito útil para o cálculo do número de valores permitidos em um intervalo
de frequência de ν a ν + dν. Este número, esta quantidade, chamamos de N (ν)dν. Vale dizer ainda
que na radiação de corpo negro estamos interessados principalmente na faixa de frequências acima do
infravermelho. Como os comprimentos de onda da radiação eletromagnética nessa região são menores que
10−6 m, com cavidades de dimensões da ordem de alguns cm, os n correspondentes são 104 ou maiores.
Voltemos a nossa contagem. Desde que os pontos estão uniformemente distribuído ao longo do eixo n
é evidente que o número de pontos que caem entre os dois limites serão proporcionais a dν mas não
dependerá de ν. De fato, é fácil ver que
2a
N (ν)dν =
dν. (1.13)
c
Da expressão acima temos uma densidade uniforme de ondas por unidade de frequência. Entretato, ainda
devemos multiplicar a Eq. 1.13 por um fato adicional 2 visto que para cada frequência permitida há, na
realidade, duas ondas independentes correspondentes aos dois possíveis estados de polarização de ondas
eletromagnéticas. Deste modo, temos
4a
N (ν)dν = dν. (1.14)
c
Com esta discussão finalizamos o caso unidimensionl. O procedimento para o caso mais geral
vamos abordar uma cavidade tridimensional, 3-D. Veja a Fig. 5. O conjunto de pontos uniformemente
distribuídos em valores inteiros ao longo de um único eixo n é substituído por um arranjo de pontos
tridimensional uniforme cujas coordenadas ocorrem a valores inteiros ao longo de cada um dos eixos
perpendiculares n. Cada ponto do arranjo corresponde a uma onda estacionária particular permitida 3-D.
Os valores especificados (inteiros) nx , ny e nz especificado por cada ponto fornece o número de nós das
componentes x, y e z, respectivamente, da onda 3-D. Desta forma temos que
2a 2a 2a
nx = , ny = , nz = . (1.15)
λx λy λz

O número de frequências permitidas no intervalo de ν a ν + dν é igual ao número de pontos


contidos entre as cascas de raio correspondentes às frequências ν e ν + dν, respectivamente. O número
1.2. Teoria clássica da radiação da cavidade 11

de frequências permitidas será proporcional ao volume contido entre estas duas cascas, desde que os
pontos estejam uniformemente distribuídos. Desta forma, N (ν)dν será proporcional a ν 2 dν, onde ν 2 é
proporcional a área das cascas e dν é a distâncias entre elas. Com isto encontramos que
8πV 2
N (ν)dν = ν dν (1.16)
c3
sendo V = a3 o volume da cavidade.

Exemplo 1.2 Demonstre a Eq. 1.16.

Esta equação fornece o número de ondas eletromagnéticas permitidas em cada intervalo de


frequência para o caso de uma cavidade 3-D na forma de um cubo de aresta a. Considere uma radiação
de comprimento de onda λ e frequência ν = c/λ, propagando-se numa direção definida pelos ângulos α,
β e γ. Veja a Fig. 6. Nesta, identificamos alguns dos nós fixos desta onda estacionária por um conjunto
de ondas planas perpendiculares a direção de propagação. A distância entre os nós é λ/2. Além disso,
podemos expressar uma relação que fornece os nós desta onda plana nas direções das três componentes:
λx , λy e λz . Logo,
λx λ
= cos α (1.17)
2 2
λy λ
= cos β (1.18)
2 2
λz λ
= cos γ (1.19)
2 2
A magnitude dos campos elétricos nos três eixos das três componentes são dadas por
 
2πx
E(x, t) = E0,x sin sin (2πνt) (1.20)
λx
 
2πx
E(y, t) = E0,y sin sin (2πνt) (1.21)
λy
 
2πx
E(z, t) = E0,z sin sin (2πνt) (1.22)
λz
onde Ex é dada pela Eq. 1.10. Analogamente para as Eqs. Ey e Ez .

Figura 6 – Ondas planas propagando-se em determinada direção no interior de uma cavidade 3-D.

Para satisfazer a condição de que a componente x tem um nó em x = a, a componente y tem um


nó em y = a e a componente z tem um componente z = a, rotulamos o conjunto de equações usando a
12 Capítulo 1. Radiação térmica

Figura 7 – Representação de modos de ondas estacionárias em uma cavidade tridimensional.

Eq. 1.15:

nx = 2x/λx , (1.23)
ny = 2x/λy , (1.24)
nz = 2x/λz . (1.25)

onde nx = 1, 2, 3, . . . ; ny = 1, 2, 3, . . . ; nz = 1, 2, 3, . . . . Usando as equações acima e elevando ao quadrado


n2i (i = x, y, z), obtemos
 2
2a
n2x + n2y + n2z = cos2 α + cos2 β + cos2 γ

(1.26)
λ

. Os ângulos α, β e γ possuem a propriedade cos2 α + cos2 β + cos2 γ = 1. Assim,


2a q 2
= nx + n2y + n2z , (1.27)
λ
onde nx , ny e nz tomam os possíveis valores inteiros. A Eq. 1.27 descreve a limitação que existe para os
possíveis comprimentos de onda da radiação na cavidade. Substituindo na equação acima ν = c/λ temos
que r
c n2x ny 2 n2
ν= 2
+ 2 + 2z . (1.28)
2 a a a
Portanto, o número de ondas de frequências menores ou iguais a ν corresponde a todas as combinações de
nx , ny e nz tais que o valor do membro direito da Eq. 1.28. Para encontrar esse número vamos colocar
num gráfico 3-D, com os eixos x = nx /a, y = ny /a e z = nz /a pontos correspondentes a cada valor
de nx , ny e nz . Lembre-se que somente faz sentido valores positivos para estas quantidades de modo.
Então, temos apenas o octante de um esfera. Veja a Fig. 7 O volume ocupado por cada ponto é igual a
1/a3 . Portanto, a densidade de pontos (número de pontos por unidade de volume) é ρ = a3 . O volume
14 3
correspondentes aos valores de nx , ny e nz que fornecem frequências menores que ν é V = 8 3 πr com
q
n2 n2 n2
r = a2x + a2y + a2z . Portanto o número total n de ondas estacionárias é dado por

4 3  ν 3
n=ρ×V = πa (1.29)
3 c
. Podemos então obter a fração (dn) de ondas com frequências entre ν e ν + dν pode ser obtida derivando-se
a expressão acima:
4πa3 2
dn = N (ν)dν = ν dν. (1.30)
c3
1.2. Teoria clássica da radiação da cavidade 13

Figura 8 – Predição de Rayleigh e Jeans (linha tracejada) comparada com dados experimentais (linha
sólida) para densidade de energia de uma cavidade de corpo negro. Este resultado mostra uma
séria discrepância denominada catastrófe ultravioleta.

Como dizemos anteriormente, para cada uma dessas frequências temos na verdade duas ondas independentes
com a direção do campo elétrico em duas direções perpendiculares. Sendo assim, o número total de ondas
estacionárias na cavidade é o dobro da quantidade obtida acima:

8πa3 2
N (ν)dν = ν dν (1.31)
c3

O Teorema de equipartição de energia diz que cada grau de liberdade na expressão para a energia
de um sistema corresponde a uma energia média 12 kT . No caso de osciladores e ondas, a cada oscilador ou
onda temos dois graus de liberdade (energias cinética e potencial elástica; no caso de ondas, temos energias
no campo elétrico e magnético). Portanto, a energia média por onda estacionária será kT . Obtemos então
um espectro de densidade de energia por unidade de volume (a3 ) e por unidade de frequência das ondas
na cavidade:
1 8πν 2
ρ(ν)dν = kT N (ν)dν = kT. (1.32)
V dν

Esta é a fórmula Rayleigh-Jeans para radiação de corpo negro. Podemos obter a fórmula de Rayleigh-Jeans
em termos do comprimento de onda. Devemos lembrar que o número de ondas com frequência entre ν1
e ν2 = ν1 + dν é o mesmo que o de ondas com comprimento de onda entre λ1 = c/ν1 e λ2 = λ1 + dλ.
Um dado dν positivo corresponde um dλ negativo. Temos, então, dn = ρ(λ)dλ = −ρ(ν)dν. Além disso,
dν = −(c/λ2 )dλ. Logo,

8πkT 2 8πkT 8πk


ρT (λ)dλ = − ν dν = dλ = 5 λT dλ. (1.33)
c3 λ4 λ

A Eq. 1.33 é a lei de Rayleigh-Jeans para radiação de corpo negro. A medida que a frequência do
espectro aumenta (tendendo a frequência do ultravioleta) , ρ(ν) cresce continuamente, enquanto a curva
experimental tende a zero. Esta falha na previsão clássica ficou conhecida como a catástrofe do ultravioleta.

A Fig. 8 mostra uma comparação da Eq. 1.32 com dados experimentais. A discrepância é evidente.
No limite de baixas frequências o espectro clássico aproxima-se dos resultados experimentais mas conforme
a frequência aumenta a predição teória vai ao infinito. Experimento mostra que a densidade de energia
sempre permanece finita, como obviamente deve ser, e de fato, a densidade de energia vai a zero a
frequências muito elevadas.
14 Capítulo 1. Radiação térmica

1.3 Teoria de Plank da radiação de cavidade

No final do Sec. XIX, Max Plank procurava uma solução para o problema de radiação de corpo
negro. Sabendo que o entendimento desse fenômeno era fundamental, conclui que deveria haver alguma
falha nas teorias, mas cujas origens não eram até então conhecidas. Plank foi então levado a considerar a
hipótese de violação da lei de equipartição da energia sobre a qual a teoria se baseou. Conforme vimos na
Fig.8 a lei fornece resultados satisfatórios para baixas frequências. Portanto, podemos supor
ν→0
Ē −−−→ kT, (1.34)

isto é, a energia toal média tende a kT quando a frequência se aproxima de zero. Poderíamos eleiminar a
discrepância caso houvesse algum corte de forma que
ν→∞
Ē −−−−→ 0 (1.35)

Em outras palavras, Plank descrobriu que, nas circunstâncias que predominam o caso da radiação,
as energias médias das ondas estacionárias é uma função de frequência Ē(ν) com as propriedades indicadas
nas Eqs. 1.34 e 1.35. Isto é uma contradição a lei de equipartição de energia que associa a energia média
Ē um valor independente de frequência.

Para darmos prossseguimento a nossa discussão e de como Plank desenbolveu sua teoria que
explica a radiação de corpo negro, precisamos voltar à origem da lei da equipartição. Ela surge da
distribuição de Boltzmann e aqui a usamos da seguinte forma:

e−E/kT
P (E) = , (1.36)
kT
na qual P (E)dE é a probabilidade de encontrar um dado ente de um sistema com energia no intervalo
entre E e E + dE, quando o número de estados de energia para o dado nesse intervalo independe de
E. As energias dos dados que estamos considerando, um conjunto de ondas estacionárias oscilando em
movimento harmônico simples em equilíbrio térmico em uma cavidade de corpo negro, são governadas
pela Eq. 1.36.

A distribuição de Boltzmann fornece informação completa sobre as energias dos dados do sistema
incluindo o valor médio de E das energias. Esta quantidade pode ser obtida a partir da Eq. 1.36:
R∞
EP (E)dE
Ē = R0 ∞ . (1.37)
0
P (E)dE
O numerador da equação acima é a energia com peso da probabilidade do dado a ser encontrado com esta
energia. Enquanto o denominador é a probabilidade de encontrar o ente com qualquer energia e, portanto,
tem valor igual a um.

Para continuarmos nossa discussão, é conveniente observarmos os gráficos plotados na Fig. 9. No


parte superior desta figura temos o plote da Eq. 1.36 como função de E. É fácil ver que seu valor máximo
ocorre para E = 0 e o valor de P (E) decresce suavemente com E → ∞. A parte de baixo desta figura
indica o cálculo de Ē a partir de P (E).

A contribuição de Plank veio quando ele descobriu que poderia obter o corte necessário se
modificasse o cálculo que leva de P (E) a Ē, tratando a energia como ela fosse uma variável discreta em
vez de uma variável contínua, como sempre foi considerada na física clássica. Plank, então, assumiu que a
energia E poderia ter apenas certos valores discretos, em vez de qualquer valor, e que os valores discretos
de energia fossem uniformemente distribuídos:

E = 0, ∆E, 2∆E, 3∆E, 4∆E, . . . , (1.38)


1.3. Teoria de Plank da radiação de cavidade 15

Figura 9 – Cima: Distribuição de probabilidade de Boltzmann, dada pela Eq. 1.36. Baixo: Plote de EP (E).
A área sob a curva dá o valor de Ē.

a qual forma um conjunto de valores possíveis da energia. Aqui ∆E é um intevalo uniforme entre sucessivos
valores permitidos da energia.

A Fig. 10 ilustra um caso no qual ∆E  kT . Neste caso o resultado obtido é Ē ≈ kT . Isto é, um


valor essencialmente igual ao resultado clássico desde que ∆E é muito pequeno se comparado ao intervalo
de 0 a kT no qual P (E) varia de forma significativa. Na parte do meio desta mesma figura, ilustra o
caso no qual ∆E ≈ kT . Aqui encontramos Ē < kT , porque a maioria dos eventos têm energia E = 0, já
que P (E) tem um valor muito pequeno para o primeiro valor possível não nulo ∆E, de forma que E = 0
domina o cálculo do valor médio de E, e obtem-se um resultado menor. Na parte de baixo da figura mostra
o efeito mais claro de E ser discreto, o qual ilustra o caso ∆E  kT .

Recapitulando, Plank descobriu que poderia obter Ē ≈ kT quando a diferença entre energias
sucessivas ∆E for pequena, e Ē é grande. Plank fez mais alguns cálculos e descobriu que a relação mais
simples possível entre ∆E e ν é uma função crescente (em ν). Isto porque Plank precisava obter o primeiro
resultado para frequências baixas e o segundo para frequências mais altas. Logo,

∆E ∝ ν. (1.39)

Escrevendo na forma de equação, temos


∆E = hν, (1.40)

onde h é a constante de proporcionalidade. Cálculos posteriores permitiram Plank determinar o valor


de h que melhor ajustava os dados experimentais. O valor obido por ele estava bem próximo do valor
atualmente aceito
h = 6, 63 × 10−34 joule − s. (1.41)

Esta é famosa constante de Plank. A fórmula obtida por Plank para Ē é


Ē(ν) = (1.42)
ehν/kT −1
16 Capítulo 1. Radiação térmica

Figura 10 – Topo: A integral utilizada para o cálculo do valor médio Ē deve ser substituída por uma soma,
caso a energia E seja discretizada. Meio: ∆E ≈ kT e Ē tem um valor menor do que no caso
da figura de cima. Baixo: ∆E  kT é mais reduzido ainda. Nas três figuras os retângulos
mostram a contribuição para a área total de EP (E), para cada energia possível. O retângulo
para E = 0 possui sempre altura zero.

como ehν/kT → 1 + hν/kT quando hν/kT → 0, vemos que Ē(ν) → kT neste limite, como previsto na
Eq. 1.34. No limite hν/kT → ∞,ehν/kT → ∞, e Ē(ν) → 0, de acordo com a Eq. 1.35.

A fórmula obtida por Plank para a densidade de energia do espectro do corpo negro, usando esse
resultado para Ē(ν) em vez do clássico Ē = kT , é

8πν 2 hν
ρT (ν)dν = dν. (1.43)
c3 ehν/kT − 1

Este é o espectro de corpo negro de Plank.

Exemplo 1.3 Obtenha a expressão de Plank para a energia média Ē e também para o espectro
de corpo negro.

A ideia de Plank é discretizar a energia, E = nhν. Com isto substituimos as integrais na Eq. 1.36
por somatórios:


X
EP (E)
n=0
Ē = ∞ . (1.44)
X
P (E)
n=0
1.3. Teoria de Plank da radiação de cavidade 17

Figura 11 – Previsão de Plank para a densidade de energia (linha sólida) comparada aos resultados
experimentais (círculos) para a densidade de energia de um corpo negro.

Usamos agora a distribuição de Boltzmann, P (E) = e−E/kT /kT , e a substituimos na Eq. 1.44:

∞ ∞
X nhν −nhν/kT X
e nαe−nα
n=0
kT
E= ∞ = kT n=0
∞ (1.45)
X 1 −nhν/kT X
−nα
e e
n=0
kT n=0


onde, por conveniência, denotamos α = kT .

Verifique que podemos fazer a seguinte substituição:

α ∞ α
X X d −nα X

d
−α dα e−nα − α e nαe−nα
d X n=0 n=0
dα n=0
−α ln e−nα = α = ∞ = α . (1.46)
dα n=0 X
−nα
X
−nα
X
−nα
e e e
n=0 n=0 n=0

Logo,
∞ ∞
!
d X d X
Ē = kT −α ln e−nα = −hν ln e−nα . (1.47)
dα n=0 dα n=0

Mas

X
e−nα = 1 + e−α + e−2α + e−3α + · · ·
n=0
= 1 + X + X2 + X3 · · · (1.48)

e
−1
(1 − X) = 1 + X + X2 + X3 + · · · , (1.49)
18 Capítulo 1. Radiação térmica

Figura 12 – Densdidade de energia de Plank de radiação de corpo negro para várias temperaturas em
função do comprimento de onda.

de forma que

d
Ē = −hν ln(1 − e−α )−1

−hν −α −2 −α
=
−α −1 (−1)(1 − e ) e
(1 − e )
hνe−α hν hν
= −α
= α = hν/kT . (1.50)
1−e e −1 e −1

Conclusão: obtivemos uma expressão para a energia média de uma onda estacionária eletromag-
nética de frequência ν.

É conveniente expressarmos o espectro eletromagnético de corpo negro em termos do comprimento


de onda λ. Obter ρT (λ), a expressão para o espectro de Plank en função do comprimento de onda, a
partir de ρT (ν), a expressão de espectro em função da frequência. A quantidade ρT (λ) é definida a partir
da igualdade ρT (λ)dλ = −ρT (ν)dν. O sinal (−) indica que, embora ρT (λ) e ρT (ν) sejam ambos positivos,
dν e dλ têm sinais opostos, isto é, um acréscimo na frequência causa um decréscimo correspondente no
comprimento de onda. Da relação ν = c/λ, temos dν = −(c/λ2 )dλ, ou dν/dλ = −(c/λ2 ), de forma que

dν c
ρT (λ) = −ρT (ν) = ρT (ν) 2 . (1.51)
dλ λ

. Se fizermos ν = c/λ, obtemos


8πhc dλ
ρT (λ)dλ = 5 hc/λkT
. (1.52)
λ e −1

A Fig. 11 mostra uma comparação do resultado da teoria de Plank (em termos do comprimento
de onda) com os resultados experimentais para uma temperatura T = 1595 K.
1.4. Aplicações da lei da radiação de Plank 19

Figura 13 – Representação esquemática de um pirômetro óptico.

1.4 Aplicações da lei da radiação de Plank

1.4.1 Termometria
Abordamos nesta seção uma das aplicações da lei de Plank para radiação de corpo negro. Em
particular com a termometria apresentamos o funcionamento do pirômetro óptico. Este instrumento é um
sensor de temperatura que usa a radiação eletromagnética como informação emitida pelo corpo a medir.
A base de funcionamento do pirômetro é a comparação entre temperaturas. Tomamos uma referência
padrão de temperatura T1 de modo que a temperatura T2 é determinada relativamente a este valor. Aqui
usamos a lei de radiação de Plank que fornece a radiância sobre uma faixa finita de comprimentos de
onda. Para radiação monocromática de comprimento de onda λ, a razão entre as intensidades espectrais
emitidas por fontes a T2 e T1 é dada por

ehc/λkT1 − 1
, (1.53)
ehc/λkT2 − 1

A Fig. 13 mostra uma representação esquemática de um pirômetro óptico, usado para temperaturas
acima do ponto de fusão do outro (T = 1068 ◦ C). Queremos medir a temperatura da fonte de luz. A luz
emitida pela fonte é focalizada no filamento da lâmpada do pirômetro e variamos a corrente na lâmpada
até que pareça desaparecer na imagem da fonte.

Textos bastante interessantes sobre o funcionamento dos pirômetros podem ser encontrados no
TCC de Alexandre A. Batista da Universidade Católica de Brasília e no artigo da Revista Brasileira de
Ensino de Física, v.28, n.1, p. 101-114 (2006).

1.4.2 Calor específico dos sólidos


Podemos utilizar a hipótese de Plank para calcular o calor específico dos sólidos. Considerando
que os átomos de um mol de moléculas como um conjunto de osciladores harmônicos, a capacidade
calorífica a volume constante será  
dU
Cv = = 3R. (1.54)
dT v
Experimentalmente este é o valor obtido para altas temperaturas. No entanto, Cv tende a zero quando
T → 0.

Em 1908, Einstein usou o postulado de Plank para a energia média, considerando um conjunto
de átomos do sólido como um conjunto de osciladores harmônicos de 3N osciladores de frequência ν.
Portanto, a energia média por mol é dada por

U = 3N hEi = 3N . (1.55)
ehν/kT −1
20 Capítulo 1. Radiação térmica

Obtemos então:
  


hν/kT
− 2 e 2 " #
ehν/kT
  
dU  kT  hν
Cv = = 3N hν −
 2  = 3N k
 2 . (1.56)
dT v ehν/kT − 1 kT ehν/kT − 1

Sabendo que a constante dos gases ideiais é R = N k (k é a constante de Bolztamnn que viemos tratando
ao longo deste capítulo), podemos reescrever esta última equação como
2 " #
ehν/kT


Cv = 3R 2 . (1.57)
kT ehν/kT − 1

No limite para altas temperaturas,

ehν/kT → 1 (1.58)

e
 2 !2  2    2
 2 hν 1 hν hν 1 hν
hν/kT
e −1 = 1+ + + ··· − 1 = 1+ + ··· . (1.59)
kT 2 kT kT 2 kT

Com isto,
Cv = 3R, (1.60)

como previsto. É fácil verificar que o resultado tende a zero quando T → 0. Para cada sólido devemos
encontrar o valor da frequência ν dos osciladores. Este valor pode ser definido em termos da chamada
temperatura de Einstein, TE = hν/k.

1.5 O postulado de Plank e suas implicações

Podemos colocar as ideias de Plank na forma de um postulado:

Qualquer ente físico com um grau de liberdade cuja "coordenada"é uma função
senoidal do tempo (isto é, executa oscilações harmônicas simples) para possuir apenas
energias totais E que satisfaçam à relação

E = nhν, n = 0, 1, 2, 3, · · · (1.61)

onde ν é a frequência da oscilação, e h uma constante universal.

Este postulado pode ser ilustrado na forma de um diagrama, como mostra a Fig. 14.Neste
diagrama vemos a diferença de comportamento da energia em termos da física clássica e do postulado de
Plank. No lado esquerdor da figura, temos a representação da de uma distribuição uniforme contínua ao
que seria esperado pela física clássica. No lado direito, é indicado por uma linha horizontal cada um dos
possíveis estados de energia. A distância entre as linhas sucessivas é hν. Além disso, na física clássica, o
ente pode ter qualquer energia de zero a infinito de modoq que o diagrama de níveis de energia consiste
em um contínuo de linhas que se estendem oara cima a partir do zero. Por outro lado, o ente executando
oscilações harmônicas simples pode ter apenas energias discretas: 0, hν, 2hν, hν, · · ·
1.5. O postulado de Plank e suas implicações 21

Figura 14 – Esquerda: Energias permitidas para um sistema clássico. As energias são distribuídas de
forma contínua. Direita: Energias permitidas de acordo com o Postulado de Plank. Estas
energias são distribuídas uniformemente de forma discreta uma vez que só podem assumir
valores de nhν.
23

2 PROPRIEDADES CORPUSCULARES DA RADIA-


ÇÃO

No Cap. 1 vimos como se deu a quantização da energia, isto é, pelo postulado de Plank a energia é
discretizada de modo que Ē = nhν, onde n são números inteiros positivos, h é uma constante, chamada de
constante de Plank e ν é a frequência do sistema. Com esta quantização abordaremos neste capítulo uma
de suas consequências que é a interação da radiação com a matéria; chamamos aqui de comportamento
corpuscular da radiação. Neste sentido, vamos aobordar diferentes tipos de interação da radiação com a
matéria, não deixando de analisar também evidências experimentais.

2.1 O efeito fotoelétrico

Começamos nossa discussão da interação da radiação com a matéria sobre o efeito fotoelétrico.
Muitos estudantes acreditam que a descoberta do efeito fotoelérico é devido unicamente ao cientista
alemão Albert Einstein. Mas não. Não podemos negar que Einstein deu uma ampla contribuição para
tal fenômeno. No entanto, o efeito fotoelétrico foi descoberto por Hertz no ano de 1887, bem antes da
formulação de Plank para a radiância espectral do corpo negro e após a demonstração da natureza
eletromagnética da luz. Em poucas palavras, o efeito fotoelétrico é um processo de emissão de cargas
elétricas por uma superfície metálica quando esta é incidida por uma radiação eletromagnética.

Antes de estudarmos de forma quantitativa o experimento em questão, acreditamos que seja


válido fazer uma abordagem qualititativa do mesmo. Para começar, é importante dizer que este fenômeno
não contradiz em nada a teoria clássica. Philip Lenard, físico alemão, que foi aluno Hertz, foi estudar o
efeito fotoelétrico e ele usou um aparelho mostrado na Fig. 15 a qual consiste de um tubo de gás rarefeito
(para que a passagem dos elétrons nesse tubo não seja atrapalhada pela presença desse gás). Há também
um cátodo que será iluminado, através da janela; os elétrons ejetados do cátodo irão em algum momento
aparecer no anodo. Quando eles aprecerem neste último significa que haverá uma corrente elétrica que por
sua vez pode ser medida por meio de um amperímetro (também mostrado na Fig. 15). Podemos regular
a diferença de potencial coletiva de todo o sistema produzida pela bateria. O objetivo de Lenard neste
experimento era estudar de que maneira corrente elétrica que aparece no circuito depende dos parâmetros
que compõem o sistema: a frequência ν e a intensidade I da radiação (luz).

Ao realizar o procedimento experimental, Lenard fez as seguintes observações :

1. Se não há luminosidade na placa, então não surgirá nenhuma corrente elétrica no circuito. Como é
de se esperar. No entanto, quando há incidência de luz no cátodo, observamos que quanto maior a
intensidade luminosa maior será o valo da corrente elétrica que aparece no circuito. Isto nos leva a
afirmar que a corrente elétrica i depende da intensidade luminosa I.

2. A corrente eléttica medida no amperímetro aparece quase que instantanemanete assim que ligamos a
luz. Isto não depende da intensidade da luz I (do valor do campo elétrico da radiação eletromagnética).
O tempo para incidir a radiação e aparecer a corrente é ∆t ≈ 0. Classicamente, isto não é trivial
de entender. A luz (radiação eletromagnética) movimenta o elétron presente na placa metálica do
cátodo até que a energia dele seja suficiente para escapar do metal e, então, aparece a corrente.
Se a intensidade da radiação é muito baixa então levaria mais tempo para que o elétron ganhe
24 Capítulo 2. Propriedades corpusculares da radiação

Figura 15 – Arranjo experimental de efeito fotoelétrico. Figura retirada de "Textos de apoio ao professor
de física, n. 14, UFRGS (2003).

energia suficiente para escapar do metal. Temos aqui o primeiro problema: não sabemos explicar
classicamente o porquê de ∆t ≈ 0 independer de I.

3. Só há corrente elétrica para determinadas frequências da radiação. Para que tenhamos i 6= 0, é


necessário que ν > ν0 . Isto é, temos uma frequência de corte ν0 . Isto não é possível classicamente.
Além disso, esta frequência de corte depende da composição do cátodo.

Nas três observações acima, Lenard está variando os parâmetros da luz incidente sem mexer na
bateria, isto é, com ∆V = 0 ou ∆V > 0. Vale dizer ainda que diferença de potencial positiva significa que
a placa do anodo possui um potencial maior que o da placa do cátodo o que significa que a direção do
campo elétrico é do anodo para o cátodo. Uma vez que a carga do elétron é negativa, ele sofre uma força
atrativa na direção do anodo. Lenard descobre que o papel da diferença de potencial é que, se ∆V > 0,
então a corrente i é praticamente constante. Como podemos entender isto? Bem, primeiramente vamos
considerar que que a diferença de potencial é igual a zero. A luz ao incidir sobre o cátodo, os elétrons
ejetados possuem trajetórias aleatórias. Claro, alguns irão incidir sobre o anodo mas não há nenhum
motivo para que todos os elétrons ejetados sigam em direção ao anodo uma vez que o campo elétrico
entre as placas é igual a zero. Se agora colocarmos uma diferença de potencial positiva, haverá um campo
elétrico entre as placas, conforme explicado anteriormente, e os elétrons seguirão trajetórias em direção ao
anodo. Uma diferença de potencial não muito grande fará com que todos os elétrons (ejetados) sigam em
direção ao anodo. Além disso, após um certo valor de ∆V não adianta muito aumentar seu valor pois a
corrente se estabiliza. É fácil compreender esta situação. Um ∆V não muito grande será suficiente para
fazer com que todos os elétrons que sairam do cátodo cheguem no anodo (note que até o momento não
mexemos mais na intensidade I da luz). Podemos fazer com que a bateria produza uma diferença de
potencial negativa. Isto fará com que os elétrons ejetados pela luz sejam atraídos pelo catodo. Pode até
ser que algum elétron alcance o anodo. No entanto, chegará o ponto que ao diminuir cada vez mais ∆V ,
mesmo os elétrons com maior energia não alcançarão o anodo que, consequentemente, teremos, para um
certo valor de ∆V , i = 0. Podemos resumir isto tudo em um gráfico de i versus ∆V , conforme mostra a
Fig. 16. Por enquanto se atenha à apenas ao gráfico (b). Toda nossa descrição até agora está refletida
nesta curva. Mais diante você compreenderá o porquê disto.

Para melhor compreender esta situação a que estamos, vamos imaginar o que está acontecendo
dentro do cátodo metálico. Um elétron está localizado sobre esta superfície metálica; a luz incide sobre ele
2.1. O efeito fotoelétrico 25

Figura 16 – Gráfico da corrente versus diferença de potencial. Não é necessário uma diferença de potencial
alta para que elétrons sejam ejetados do cátodo. Note que após determinado de valor para ∆V
há uma saturação na corrente. Isto significa que todos os elétrons que deveriam ser ejetados
do cátodo já foram. Quando trocamos a polaridade da bateria, isto é, quando invertemos o
potencial, os elétrons ejetados no catodo são atraídos de volta para o cátodo pois desta o
campo elétrico está invertido em comparação à configuração anterior. Pode atá acontecer
de elétrons mais energético conseguirem chegar ao anodo. Com isto, com a diminuição da
diferença de potencial vai chegar um certo onde mesmo os elétrons mais energéticos não
conseguem mais chegar ao anodo. Então, aparece uma diferença de potencial que chamamos
de V0 , indicado na figura.

e faz com que ganhe uma certa energia. Para que o elétron consiga escapar do metal é necessário que esta
energia seja maior do que a energia de ligação. O que é esta energia de ligação? Bem, para melhor explicar
isto vamos fazer a seguinte analogia: considere que você está diante de uma piscina completamente cheia.
Você concordará comigo que é mais fácil retirar uma gota d’água que está próxima a borda do que outra
que se encontra no fundo. A energia para retirar uma gota d’água da piscina depende de sua localização
inicial. Então é necessário um certo valor mínimo que eu preciso fornecer às gotas para que elas consigam
sair (uma energia adicional do tipo mgh). Em nosso caso, para "arrancar"o elétron é necessário fornecer a
ele uma energia, uma energia de ligação, uma energia elétrica que liga os elétrons aos metais. A energia
elétrica mínima que eu preciso dar aos elétron para que ele escape do metal é a energia que eu preciso
fornecer para o elétron que está mais perto da superfície do metal (na borda); chamamos esta energia de
função trabalho, representada pela letra ω (historicamente esta energia é representada pela letra φ, mas
como estamo seguindo o livro do Eisberg de Física Quântica fazemos o uso de ω). Assim,

Emínima = função trabalho (ω). (2.1)

A luz incidente fornece ao elétron uma certa energia E. Se esta energia for maior que a função trabalho
(E > ω), alguns elétrons irão escapar. Nem todos. Os elétrons que estão próximo à superfície metálica sim,
mas aqueles que estiverem mais afastados precisarão de mais energia para escapar. Quando os elétrons
escapam, eles saem com uma energia cinética K que é a diferença entre a energia E, que eles ganharam
da luz incidente para escapar, e a energia que eles gastaram para sair do metal, ∆Egasto . Em termos
matemáticos:
K = E − ∆Egasto . (2.2)

Para elétrons próximos à superfície, ∆Egasto = ω. Para os mais afastados, ∆Egasto > ω. Podemos então
26 Capítulo 2. Propriedades corpusculares da radiação

inferir que os elétrons que escapam pelo efeito fotoelétrico (os fotoelétrons) terão uma energia cinética
máxima dada por
Kmsx = E − ω. (2.3)

Agora podemos entender porque acontece o potencial de corte V0 . Conforme aumentamos o


potencial que contraria a ida dos elétrons para o anodo, os elétrons vão perdendo energia devido a presença
deste potencial, ou seja, a energia cinética vai sendo consumida por causa desta diferença de potencial
retardadora.Se a energia cinética que os elétrons têm no início for maior do que a energia consumida pelo
potencial retardador, eles ainda conseguem chegar no anodo. Se for a energia cinérica for menor, o elétron
é freado e volta. Chegará um certo valor para o potencial para a qual mesmo os elétrons mais energético
(são aqueles que possuem o valor de energia dado pela Eq. 2.3) serão freados pela presença deste potencial
retardador. Esta energia perdida pelos elétrons é −e∆V , onde e é carga elétrica do elétron. Quando esta
diferença de potencial for o potencial de corte, teremos (em valores absolutos):

Kmax = eV0 . (2.4)

Portanto, este potencial de corte é


Kmax
V0 = . (2.5)
e
Estas observações descritas acima não contrariam a teoria clássica uma vez que não usamos nenhum
ingrediente que não fosse clássico para chegar a esta explicação. Note que até aqui não mexemos na
intensidade da luz, ou seja, não variamos o valor de I para realizar esta experiência. Se agora incidirmos
mais luz (ou seja, aumentarmos o valor de I), mais fotoelétron irão escapar da superfície metálica do
catodo e, considerando inicialmente que ∆V = 0, mais fotoelétrons irão chegar ao anodo. Isto implica
então que a corrente elétrica medida pelo amperímetro será maior. Volte por um instante a Fig. 16 e
compare os gráficos (a) e (b). Cada elétron está recebendo uma intensidade de luz maior, o que significa
que está recebendo maior energia E. O lado direito da Fig. 16, do ponto de vista clássico, não há nenhum
problema. O que a teoria clássica não explica é o lado esquerdo desta figura. Isto porque quando fazemos
a diferença de potencial ser mais negativa, a corrente elétrica começa a diminuir como no primeiro caso
mas o potencial de corte é o mesmo! Esta situação a teoria clássica não consegue explicar. Vamos voltar
as Eqs. 2.3 e 2.5. A função trabalho ω é o mesmo (a função trabalho depende apenas da composição do
metal de que é feito o catodo). Então, é de se esperar (do ponto de vista clássico) que a energia cinética
Kmax é maior visto que a energia E é maior pois a intensidade luminosa aumentou. Com Kmax maior,
teríamos de ter um maior valor de potencial de corte, V0 , de acordo com a Eq. 2.5. Mas não é isto o que
acontece.

Neste ponto aparece em nossa história o físico alemão Albert Einstein. Em 1905, Einstein vai
propor uma propor uma explicação para o efeito fotoelétrico naquilo em que a teoria clássica não consegue
explicar. Para isto, Einstein vai propor alguns postulados a respeito da composição da luz (radiação
eletromagnética). Estes postulados do Einstein para o efeito fotoelétrico surgiram da ideia de Plank,
proposta cinco anos antes para a explicação da radiação de corpo negro. Como vimos no Cap. 1, a hipótese
de Plank era de que as trocas de energia entre matéria e radiação eram quantizadas, ou sejam, os valores
de troca de energia seriam múltiplos de hν, sendo h uma constante e ν a frequência da radiação. Esta
ideia é totalmente fenomenológica. Plank conseguiu encontrar uma função matemática que descrevia os
dados experimentais. Einstein propôs algo similar com os seguintes postulados:

1. Não só as trocas de energia entre radiação e matéria sejam quantizadas, mas que a própria luz
(a energia lumunisa) seja quantizada. Isto é, sempre que há luz o que existe não é uma energia
espalhada por todo o espaço mas sim um conjunto muito grande de pequenos aglomerados de energia,
chamados de quanta de luz. Cada um deste aglomerado tem uma energia que é dada por hν.
2.1. O efeito fotoelétrico 27

2. Na interação entre um fóton e um elétron, o fóton fornece ao elétron uma energia hν. O fóton ou
transmite toda a energia ou não transmite nenhuma. Não é possível transmitir uma parte da energia
do fóton.

3. No efeito fotoelétrico só há interação de pares, isto é, um fóton só fornece para um elétron.

Com estes três postulados o que era inexplicável passa a ser explicável. Primeiramente, vimos que
o tempo decorrente entre a emissão de luz e o aparecimento de corrente elétrica acusada pelo amperímetro
é praticamente igual a zero (∆t ≈ 0). Se a luz incidente tiver uma frequência relativamente alta, basta
apenas um fóton para interagir com um elétron de modo que a energia do fóton seja transmitida ao elétron
e esta seja maior do que a função trabalho ω. O elétron então irá escapar do catodo com energia cinética
dada pela Eq. 2.3. Não é necessário esperar um tempo para que haja uma transferência de energia. Basta
apenas uma colisão entre um fóton e um elétron para que tenhamos um fotoelétron escapando do catodo
e, consequentemente, uma corrente elétrica diferente de zero (i 6= 0). Quanto a existência da frequência de
corte ν também já não é mais um problema. Esta frequência de corte tem a ver com a energia que o elétron
vai receber na interação com um fóton. Se a energia que um fóton tem for maior que a função trabalho
daquele metal, então os elétrons que estão próximos a borda vão receber energia suficiente para conseguir
escapar. Se a energia de um quantum (hν) for maior que ω, haverá algum fotoelétron ejetado, aquele
que está próximo a borda. Ao contrário, se hν < ω, nenhum elétron será ejetado. Assim, conseguimos
relacionar a frequência de corte com a função trabalho do metal:
ω
hν0 = ω → ν0 = . (2.6)
h

É natural, agora, que a frequência de corte dependa do material (da função trabalho ω) e de uma constante
da natureza (a constante de Plank). Antes de iniciarmos a discussão dos postulados de Einstein para o
efeito fotoelétrico, ou seja, de acordo com a teoria clássica vimos que a presença do potencial de corte era
explicável; o que não era explicável é que ela fosse sempre a mesma para qualquer intensidade luminosa.
O potencial de corte era calculado por meio da Eq. 2.5. Veremos como ficam os cálculos desta equação
com os postulado vistos acima, isto é, como calcular a energia cinética máxima Kmax de luz "granulada".
A energia E que um elétron irá recebe de um único fóton é hν. Então,

hν − ω
V0 = . (2.7)
e
A energia cinética máxima é Kmax = hν −ω. Note que novamente não apareceu o parâmetro da intensidade
luminosa I. A intensidade I não importa para calcular o valor de V0 . Como já vimos o valor de I importa
para determinarmos o valor da corrente i. Substitua agora na Eq. 2.7 o valor da função trabalho, dada
pela Eq. 2.6, e teremos
h
V0 = (ν − ν0 ) . (2.8)
e

Einstein foi mais além. Além de explicar todas as observações feitas por Lenard propõem uma
nova observação: "se a minha teoria está correta, então deve acontecer o que está por detrás da Eq. 2.8,
ou seja, determinar o potencial de corte como função da frequência da luz incidente."Esta experiência
foi feita por Robert Millikan (o mesmo descobridor da carga do elétron) em 1916 cujo resultado está
resumido no gráfico da Fig. 17. Einstein com os postulados descritos acima, os quais uma forte conexão
com o trabalho de Plank, consegue explicar o resultado experimental que o precedeu (o efeito fotoelétrico)
e faz uma previsão do que não tinha sido observado ainda. O experimento que corrobora essa previsão
só foi feito onze anos mais tarde com Millikan. Essa capacidade preditiva é fundamental para qualquer
teoria que queira ser científica. Além disso, o resultado experimental fornece outro elemento. Millikan
consegue obter a constante h, independente de Plank. Lembre-se que Plank obteve o valor de h através do
28 Capítulo 2. Propriedades corpusculares da radiação

Figura 17 – Resultado do trabalho de Robert Millikan.

ajuste da função que ele havia intuído com os dados experimentais da radiação de corpo negro. Isto é,
temos dois fenômenos completamente diferentes, sem nenhuma conexão. Dada uma medida da constante
de Plank h feita usando o experimento de Millikan e que é o mesmo valor proveniente do experimento de
Plank, então estamos dando um passo muito importante para a consagração da ideia de que um quantum
de radiação possa ser associado a este produto. E foi isto que Millikan encontrou.

Exemplo 2.1 Calcule a energia de um quantum de luz vísivel, de uma radiação com comprimento
de onda λ = 550 nm.

A energia deste quantum é


hc 1240 eV · nm
E = hν = = = 2, 25 .eV (2.9)
λ 550 nm

Lembre-se que 1 eV é aproximadamente igual a 1,60 × 10−19 J e note quão pequena é esta energia
se compararmos com energia de algum objeto do mundo macroscópico. Por exemplo, para levantarmos
um objeto de massa 1 kg a uma altura de 1 m (consideradno g ≈ 10 m/s2 ), precisamos de 10 J de energia.
O que é uma energia da ordem de grandeza de 10−19 J comparada com 10 J ?

Exemplo 2.2 O Lítio foi um dos metais utilizados por Millikan em sua experência para testar
a equação de Einstein (Eq. 2.8). Sabendo que a função trabalho fotoelétrica do Lítio é ω = 2, 42 eV,
determine a frequência de corte ν0 e o correspondente comprimento de onda máximo. Calcule também o
número de fótons emitidos por segundo pela fonte a qual está distante 1 m e supondo uma potência de 1
W.

Da Eq. 2.6, temos que


ω (2, 42eV)(1, 60 × 10−19 J/eV)
ν0 = = = 5, 84 × 1014 Hz. (2.10)
h 6, 63 × 10−34 J · s
O correspondente valor do comprimento de onda máximo λmax é então dado por
c 3 × 108 m/s
λmax = = = 514nm. (2.11)
ν0 5, 84 × 1014 Hz
Um valor dentro da faixa do espectro vísivel. Supondo 1 W de fonte de luz monocromática com este
comprimento de onda iluminando a superfície de Lítio a distância de 1 m, o número de fótons emitidos
pela fonte por segundo é
1J/s
n= = 2, 58 × 1018 fótons/s (2.12)
(2, 42eV/fóton)(1, 60 × 10−19 J/eV)

Exemplo 2.3 A Fig. 18 mostra um gráfico das medidas de Millikan do potencial limite no sódio
em várias frequências. O limiar de frequências ν0 = 4, 39 × 1014 Hz. Obtenha a função trabalho ω para o
sódio.
2.2. Produção de Raio-X 29

Figura 18 – Resultado experimental de Millikan para o potencial limite para o sódio. A frequência de
corte é ν0 = 4, 39 × 1014 Hz.

A interseção da linha reta na figura com eixo horizontal fornece a frequência de corte, ν0 =
4, 39 × 1014 Hz. Substituindo este dado na Eq. 2.6 temos

1eV
ω = hν0 = (6, 63 × 10−24 J · s)(4, 39 × 1014 1/s) = 2, 92 × 10−19 J × = 1, 82 eV. (2.13)
1, 60 × 10−19 J

2.2 Produção de Raio-X

Nesta seção iremos falar de mais um exemplo de interação da radiação com a matéria. Trata-se do
Raio-X. Podemos dizer que esta forma de interação radiação-matéria é o simétrico do efeito fotoelétrico.
Neste último, vimos na seção anterior que a radiação incidente sobre uma superfície adequada provoca
a ejeção de elétrons. Vamos ver que elétrons podem, por sua vez, provova a emissão de fótons, ou seja,
radiação.

Os raios X foram descoberto no final do Sec. XIX, especificamente no ano de 1895, pelo físico
alemão Wilhelm Conrad Röntgen. Röntgen fez esta descoberta de forma ocasional, pois na verdade ele
estava estudando a propagação de raios catódicos para fora de um tubo de vidro (chamado tubo de
Crookes). Enquanto realizava experimentos para este estudo, o físico alemão percebeu o brilho de uma placa
feita de um material fluorescente, chamada Platinocianeto de Bário, colocada próximo (ocasionalmente)
próximo de tubo de Crookes. A radiação observada era proveniente da extremidade do alto potencial do
tubo e tinha notável abilidade de penetrar em materiais de baixas densidades além de causar ionização da
matéria. A natureza da radiação permaneceu obscura até 1912 quando raios X foram conclusivamente
demonstrados a ter propriedades ondulatórias como resultado de experimentos do também físico alemã Max
Theodor Felix von Laue. Estes estudos envolviam a difração de feixes usando cristais cujo espaçamento da
rede era pequeno o suficiente para fornecer comprimentos de onda da ordem nanometros da radiação.Além
disso, mostrou-se que a radiação possuía características de propagação e polarização em comum com
outros tipos de radiação eletromagnética.

A partir de um arranjo experimental disposto na Fig. 19, vamos examinar, mesmo que sucintamente,
como Röntgen fez sua descoberta. Nesta figura temos uma ampola com vácuo (parcial), dentro da qual
temos um anodo e um catado que estão estabelecidos a uma diferença de potencial V0 . O catodo é
aquecido, por um segundo circuito que contém um resistor (filamento), que faz com que haja emissões de
elétrons (emissão térmica de elétrons) e estes saem com velocidade muito pequena, praticamente zero. No
entanto, os elétrons estão em um ambiente praticamente evacuado onde há uma diferença de potencial,
cuja ordem de grandeza é 35 keV, favorece sua aceleração em direção ao anodo (indicado na figura). Em
30 Capítulo 2. Propriedades corpusculares da radiação

Figura 19 – Representação esquemática de um arranjo experimental para a produção de Raios-X.

algum momento eles colidem no anodo, desenhado de tal que possamos focalizar a radiação em algum
lugar. Então, a colisão do elétron com o anodo gera o que chamamos de Raio X. Para que esta radiação
seja emitido é necessário que esta diferença de potencial eceleradora seja da ordem de grandeza de kilo
volts.

Hoje sabemos que os raios X são radiação eletromagnética com comprimento de onda muito menor
que o comprimento de onda da luz vísivel, cerca de 1000 vezes menor. Este fato dificultou a identificação
de que se tratava de uma radiação eletromagnética, ou seja, de que se tratava de fenômeno que podia
ser entendido como um fenômeno ondulatório. Para este entendimento, precisamos do conhecimento
dos fenêomenos de interferência e difração. De forma bem resumida, podemos dizer que o fenômeno de
interferência dar-se por meio da superposição de duas ou mais ondas na mesma região do espaço. Quanto
a difração, podemos dizer que ocorre quando a onda é obstruída de alguma maneira por meio de algum
obstáculo da ordem de grandeza comparável ao seu comprimento de onda.

Para que a interferência ou difração sejam eficazes na demonstração de que, a descoberta feita
por Röntgen, trata-se de um fenômeno ondulatório, é necessários que a distância entre as fendas, no caso
de interferência de dupla fenda, ou o tamanho da fenda, no caso do fenômeno da difração, seja da ordem
do comprimento de onda da radiação cujo comportamento ondulatório desejamos evidenciar.

Conforme vimos anteriormente, hoje sabemos que o comprimento de onda do raio X está em
torno de λX = 0, 1 nm. Isto é muito pequeno. De fato, isto dificulta muito o trabalho na identificação do
raio X como uma onda eletromagnética. Na verdade, é muito difícil onstruir uma tela com duas fendas
que tenham esta distância. Sabemos também, hoje, que esta distância é interatômica.

Com esta ideia em mente, o físico alemão Max Theodor Felix von Laue sugere que se tente
identificar a natureza ondulatória do raio X usando o que chamamos de uma rede de difração, o qual
é um conjunto de centros espalhadores da luz cuja distância seja da ordem de λX . Com esta distância,
estamos tratando de um arranjo no qual os centros espalhadores são átomos disposto em um cristal, por
exemplo, que é muito utulizado para evidenciar a natureza ondulatórios dos raios X.

Vamos representar este arranjo de átomos cristalino, como na Fig. 20. Os pontos representam
os átomos dispostos a intervalos regulares.Temos a radiação incidindo (representados por setas no lado
esquerdo) a qual irá de encontro a alguns centros espalhadores. A radiação será espalhada no sentido de
que esta colide com algo e é refletida. O ângulo de incidência θ da radiação sobre o centro espalhador
é definido em relação ao plano que contém este centro espalhador. Diferente de como é feito na óptica
geométrica onde o ângulo de incidência é medido em relação a normal da superfície. Vale dizer ainda
que as radiações refletidas por dois centros espalhadores estarão em fase somente se os caminhos ópticos
2.2. Produção de Raio-X 31

��

� ��
��

.
Figura 20 – Reflexão de Bragg de raios X em uma rede cristalina.

percorridos forem iguais. Para isto é necessário que os ângulos de reflexão sejam os mesmos. Vamos
agora comparar os caminhos ópticos de raios que ultrapassam o primeiro plano deste arranjo de centros
espalhadores do cristal. Veja que na Fig. 20 temos dois raios: um raio 1 incide em algum átomo do
primeiro plano e o raio 2 incide em outro átomo pertencente ao segundo plano que está distante d do
primeiro. Para que tenhamos interferência construtiva entre os raios 10 e 20, raios refletidos pela primeira
e segunda camada respectivamente, é necessário que a diferença de caminho óptico seja múltiplo inteiro
do comprimento de onda. Esta diferença de caminho óptico é dado por

∆l = 2d sin θ. (2.14)

Portanto, para que haja interferência construtiva é necessário que ∆l seja um múltiplo inteiro do
comprimento de onda da radiação,
∆l = 2d sin θ = nλ. (2.15)

Na prática, apenas n = 1 possui alguma importância pois os outros máximos são muito menores
do que o primeiro. A este primeiro chamamos de o o primeiro máximo de Bragg no qual temos que
2d sin θ = λ. Foi a identificação da presença deste máximo que os físicos concluíram que os raios X eram
uma radiação eletromagnética, isto é, um fenômeno ondulatório.

Como explicar que esta radiação seja produzida pelos elétrons acelerados, conforme explicado no
início desta seção? Bem, é muito difícil ver do ponto de vista clássico porque, como sabemos, quando uma
partícula carregada é acelerada, ela emite radiação eletromagnética.

De acordo com a eletrodinâmica, uma carga acelerada irradia e ao penetrar na matéria, um


elétron acaba perdendo rapidamente sua energia cinética em sucessivas colisões com os núcleos dos átomos,
emitindo portanto radiação a cada colisão. A radiação eletromagnética emitida nesse processo tem o nome
genérico de radiação de bremsstrahlung, termo germânico para radiação (strahlung) de freamento (brems).
Do ponto de vista quântico, um fóton é emitido após cada colisão, no que pode ser interpretado como o
inverso do efeito fotoelétrico. No efeito fotoelétrico, um fóton é absorvido e sua energia é transferida para
um elétron. No processo de produção de raio-X, um elétron cede parte de sua energia para criar um fóton,
o núcleo recebendo uma pequena parte da energia, mas atuando para garantir conservação do momento
linear.

Podemos utilizar a difração de Bragg de várias maeneiras. A primeira delas consiste em inferir o
espaçãmento entre os planos espalhadores em alguns cristais. Para alguns esta é uma tarefa fácil. Dado
32 Capítulo 2. Propriedades corpusculares da radiação

alguns parâmetros, como a massa atômica, determina-se uma estimativa da separação entre os átomos.
Logo, a váriável d que aparece na fórmula de Bragg, para alguns cristais é facilmente estimável.

Considere um feixe de raio X monocromático, isto é, um feixe (toda a radiação) com o mesmo
comprimento de onda. Se desejamos calcular o espaçamento entre os planos dos centros espalhadores do
cristal, então, usamos um detector a fim de sabermos o valor do ângulo θ para saber para qual valor ocorre
o primeiro máximo de Bragg e, por fim, calculamos o comprimento de onda do raio X que foi espalhado.

Considere agora que temos um feixe branco. Este feixe significa que temos vários comprimentos
de onda representados nele. Podemos usar a difração de Bragg para identificar quais comprimentos de
onda presentes. Como há vários comprimentos de onda, teremos vários máximos de Bragg, um para cada
valor de λ. O detector irá percebeer vários máximos de Bragg em várias configurações diferentes. Cada
uma destas configurações identifica um valor do comprimento de onda (λ). Podemos também determinar
com que intensidade cada λ comparece nesse feixe branco. Fazemos um estudo espectral de raio X desta
maneira. Com isto, o aparelho da Fig. 19 colocado neste contexto chamamos de espectrômetro de raio X.

Uma terceira aplicação da difração de Bragg consiste no estudo de estrutura cristalinas, em


outras, na caracterização de novos materiais. Para esse tipo de uso, temos um emissor de raio X do
qual podemos extrair feixes monocromáticos. Usamos um destes feixe para incidir sobre uma estrutura
cristalina desconhecida. Com esta experiência podemos obter o valor de d (espaçamento interatômico). É
um conjunto extremamente díficil pois é possível que o cristal vários planos (de centro espalhador). Foi
com esta técnica que os pesquisadores a utilizaram para identificar de que maneira o DNA era formado,
ou seja, identificar a estrutura de uma molécula biológica de suma importância.

Com estes três exemplos acima sobre a aplicação da difração de Bragg, iremos nos focar novamente
sobre o processo de radiação dos raios X. O que espera-se de uma radiação de frenagem (bremsstrahlung)
é que se tenha radiação emitida em qualquer comprimento de onda ou em uma faixa muito larga de
frequência.

Vamos utilizar um espectrômetro para uma fonte de raio X, em princípio desconhecida, e vamos
fazer um levantamento de que frequências existe neste feixe. Na Fig. temos o gráfico que mostra a
intensidade de um feixe de radiação (uma medida da quantidade de radiação que ele está transportando)
versus frequência. Isto é o que é esperado do ponto de vista clássico: a intensidade I tendendo a zero à
medida que o valor da frequência ν tende ao infinito. Veja a Fig. 21.

Figura 21 – Comportamento esperado, do ponto de vista clássico, da intensidade versus frequência.


Espera-se que a intensidade vá a zero conforme a frequência aumenta.
2.2. Produção de Raio-X 33

No entanto, não é isto diposto na Fig. 21 que é obervado.O que observa-se, na verdade, é um
"fundo"parecido com o disposto nesta figura mas há um superposto a este fundo caracterísiticas novas.
Em primeiro lugar, o espectro de I × ν não deveria dependeer do material do anodo. De fato, para vários
materiais diferentes temos o espectro diposto na Fig. Nela temos um espectro medido com a presença de
picos. Além disso, este espectro termina numa determinada frequência máxima a qual não depende da
composição do anodo. Note também que há frequências predominantes neste espectro (nos picos) as quais
chamamos de frequências características. Estas frequências têm esse nome pois se trocarmos o anodo (por
outro de composição diferente) teremos um espectro análogo mas com picos localizados diferentemente,
ou seja, em outra frequência. Logo, a posição dos picos catacteriza, identifica, a composição do anodo. Por
outro lado, se repertimos esta experiência com materiais diferentes do anodo mas mantendo o potencial
acelerador, essa frequência máxima é sempre igual.

Figura 22 – Picos no espectro de raio X. Note que há frequências predominante neste espectro. Note que
o gráfico possui o mesmo "fundo"do gráfico esperado pela teoria clássica. Além disso, estamos
considerando o potencial acelerador V0 fixo.

A explicação para o fato o de haver uma frequência máxima não é difícil se levarmos o contexto
do raio X as mesmas ideias vistas no efeito fotoelétrico. De fato, se entendermos a radiação emitido pelo
anodo composta por fótons e onde cada fóton possui energia hν, a energia máxima que um fóton emitido
pode ter é a energia que o elétron tem quando alcança o anodo. A energia que o elétron tem quando
alcança o anodo depende do potencial acelerador. Logo,

Eeletron = e V0 . (2.16)

Se toda esta energia é utilizada para a emissão de um fóton, então o fóton de máxima que podemos ter é
aquele que possui uma frequência máxima. Com isto, podemos escrever

Eeletron = e V0 = hνmax . (2.17)

Portanto, a frequência máxima que pode acontecer na emissão de raio X é


e V0
νmax = . (2.18)
h
Com isto entendemos porque a frequência máxima não depende do material do anodo. Depende apenas
do potencoial acelerador. Além disso, temos mais uma forma de medir o valor de h.

Como podemos entender a presença dos picos no espectro? Lembre-se que eles são específicos
para cada composição do anodo. Estes picos devem estar relacionado com a estrutura atômica do material
de que é feito o anodo. Na verdade, iremos que estes picos estão associados ao fato de que a energia de
34 Capítulo 2. Propriedades corpusculares da radiação

Figura 23 – Arranjo experimental de Compton. Um feixe raio X monocromático incidente sobre um alvo
(grafite). A distribuição da intensidade do comprimento de onda do raio X espalhado é medido
em qualquer ângulo θ.

um átomo também é quantizada. Note que mais uma vez a teoria clássica esbarra em uma situação onde
ela não consegue explicar sobre a natureza da matéria. Seremos levados, então, à quantização da matéria.
Um dos fatos que corrobora isto é o fato que as energias que um átomo pode ter são também discretas.
Os picos presentes no espectro de raio X estão associados a este fato.

2.3 O efeito Compton

Em 1918, Arthur Compton, físiclo americano, começou estudar um dos efeitos associdados ao
espalhamento de raios X. Efeito o qual leva o nome de seu descobridor, efeito Compton, não possui
explicação na teoria clássica. A experiência feita por Compton foi uma confirmação dramática para a
natureza corpuscular da luz. Claro, Einstein já havia demonstrado isto em seu trabalho sobre o efeito
fotoelétrico, mas acredito que a comunidade científica à época ainda tinha muita resistência em aceitar
que uma natureza que não seja ondulatória para a luz.

À época, havia na literatura reportes mostrando situações nas quais a frequência de raio X
espalhado era menor que a do raio X incidente. Diante disto, Compton realizou um experimento cuja
descrição está ilustrada na Fig. 23. Para vários ângulos de espalhamento, ele mediu a intensidade do feixe
espalhado de raio X como uma função de seu comprimento de onda. O resultado deste experimento está
mostrado na Fig. 24. Podemos ver que embora o feixe incidente consiste essencialmente de um único
comprimento de onda λ, o feixe espalhado apresenta picos na intensidade em dois comprimentos de onda.
Um deles é o mesmo comprimento de onda do feixe incidente e o outro, λ0 , é maior que λ por uma
quantidade ∆λ.

Este efeito não pode ser explicado com argumentos da teoria clássica, isto é, a presença de λ0
não pode ser compreendida se os raios X incidente forem encarados como uma onda eletromagnética.
Considere, por exemplo, uma onda eletromagnética com frequência ν o qual incide sobre um elétron.
Este começa a oscilar com a mesma frequência da onda incidente e responde de forma a irradiar ondas
eletromagnéticas cuja frequência também é λ. Portanto, de acordo com a teoria clássica a onda espalhada
tem o mesmo comprimento de onda da onda incidente.
2.3. O efeito Compton 35

Figura 24 – Resultado experimental de Compton.

Compton teve o raciocínio de associar uma energia a um Quantum de Radiação a um momento.


Na verdade, a Relatividade já sugere isto, uma que a relação

E 2 = p2 c2 + (m0 c2 )2 (2.19)

verifica-se relativisticamente. Sabemos ainda que a radiação eletromagnética está associada a objetos cuja
massa é zero, o que nos leva a
E = pc. (2.20)
Portanto, da Eq. 2.20 vem uma conexão entre objetos de massa nula e seu momento. Foi pensando desta
forma que Compton sugere um experimento para demonstrar que fótons de massa zero e energia E = hν
também têm momento, como proposto pela Relatividade. Note então que Compton não só resolveu o
problema do espalhamento de raio X, onde a onda espalhada possui uma frequência menor que a incidente,
como também demonstrou (veremos a seguir) que fótons têm momento.

A Fig. 25 mostra a interpretação de Compton. Um fóton de comprimento de onda λ incide em


um elétron em repouso. Na colisão, o fóton é espalhado a um ângulo θ cujo comprimento de onda λ0
e o elétron é recuado. No início desta seção dizemos que o experimento de Compton não poderia ser
36 Capítulo 2. Propriedades corpusculares da radiação

Figura 25 – Caption

explicado classicamente. No entanto, este processo não é muito difícil de entender se imaginarmos este
processo de colisão como sendo de partículas. Pois bem, se temos um fóton incidente está com energia
E0 = hν0 e momento p0 e colide com um elétron, este último irá recuar devido a colisão. Se há recuo
do elétron significa que parte da energia da partícula incidente será transmitida para o elétron. Com
isto, sobrará menos energia para o fóton espalhado o que significa uma frequência menor (comprimento
de onda maior) para o fóton espalhado. Obteremos uma expressão associada a este experimento para o
qual o elétron originalmente em repouso. Lembre-se que a experiência original foi feita sobre um sólido
(grafite); os elétrons deste material não estão parados, estão em movimento (ao redor do núcleo), há uma
certa energia associda a eles. O que siginifica então quando dissemos que o elétron está em repouso? Isto
significa que a energia para ejetar elétrons que estão mais afastados do núcleo atômico são da ordem
de alguns elétron-volts (eV). Estamos falando aqui de raio X cuja energia típica da ordem de "dezenas
de keV"(1000 eV). Estamos tratando aqui da razão de 104 entre a energia inicial do fóton incidente e
a energia do elétron. Logo, em primeira aproximação podemos desprezar a energia inicial do elétron e
considerá-lo como estando em repouso.

Estudamos o processo de colisão do fóton com o elétron usando leis de conservação. Mais gostaria
de enfatizar que estamos em um contexto relativístico e que a dinâmica relatívistica foi construída de
modo a conservar as leis de conservação. Escrevemos então as equações para o momento e a energia,

p~0 = p~ + p~e (2.21)


E0 + mc2 = E + Ee (2.22)

onde p~0 é o momento inicial do fóton, p~ é o momento do fóton espalhado, p~e é o momento do elétron
após a colisão, E0 é a inicial do fóton (hν0 ), mc2 é a energia de repouso do elétron, E é a energia do
fóton espalhado (hν) e Ee é a energia do elétron após a colisão. Para obter o momento do fóton espalhado
eliminamos o momento do elétron e a energia do elétron nas duas equações acima. Da Eq. 2.22, isolamos
Ee e o elevamos ao quadrado usando a relação pitagórica:

Ee2 = h2 ν02 + m2 c4 + h2 ν 2 + 2hν0 mc2 − 2h2 ν0 ν − 2mc2 hν. (2.23)

Da Eq. 2.19, temos que


2
m2 c4 + [(~
p0 − p~)c] . (2.24)
Igualando estas duas últimas equações e sabendo que ν = c/λ:

2 h2 c2 h2 c2 c c2 hc
m2
 c4 + [(~
 p0 − p~)c] = 2 + m2
c4 + 2 + 2h mc2 − 2h2
 − 2mc2 . (2.25)
λ0 λ λ0 λ0 λ λ
2.3. O efeito Compton 37

Usando as relações:

(p~0 − p~) = p0 − p~) · (~


(~ p0 − p~) (2.26)
= p20 + p2 − 2 p~0 · p~
| {z }
pp0 cos θ

e
E0 hν0
p0 = = (2.27)
c c
E hν
p = = (2.28)
c c
.

Das relações obtemos:

h2 h2 h2
(p~0 − p~) = + − 2 cos θ. (2.29)
λ20 λ2 λ0 λ

Com isto obtemos

h2 h2 h2 h2 h2 hc h2 c


2 + 2 − 2 cos θ = 2 + 2 + 2m − 2 − 2mh
λ0 λ λ0 λ λ
0  λ λ 0 λ0 λ λ
h2 hmc hmc h2
cos θ = − − (2.30)
λ0 λ λ0 λ λ0 λ
.

Lembrando que desejamos encontrar o comprimento de onda do fóton espalhado. Para isto
multiplicamos a Eq. 2.30 por λ0 λ e obtemos

−h cos θ = mc(λ − λ0 ) − h. (2.31)


| {z }
∆λ

Esta é a mudança do comprimento de onda devido a colisão:


h
∆λ = (1 − cos θ) 0 ≤ ∆λ, ≤ 2 (2.32)
mc
onde ∆λ é chamado de deslocamento de Compton e λc = h/m0 c = 0,0243 Å é o comprimento de onda
Compton para o elétron. A Fig. mostra o resultado do experimento de Compton.

Veja que quando θ = 0 significa dizer que não houve espalhamento. θ = π significa dizer que o
fóton se "chocou"com o elétron e voltou na direção incidente.

A partir do momento que Compton mostra que o efeito observado pode ser completamente
explicado a partir da concepção de que o fóton pode ser interpretado (em certo fenômenos) como uma
partícula de massa zero, ele faz a conexão entre o comportamento do fóton visto como uma radiação
(como uma onda) e o comportamento do elétron visto como uma partícula. Um fato curioso que vale a
pena mencionar é que na equação para o deslocamento do comprimento de onda não leve em conta o
comprimento de onda original. Isto significa que este desvio ∆λ deve ser observado para qualquer radiação;
em particular, deveria ser verdade também para a luz vísivel. No entanto, isto não é verdade e os motivos
são basicamente dois. O primeiro, no caso da luz vísivel o que interessa não é o valor absolto de ∆λ mas
sim desvio fracional, ∆λ/λ0 . Este é o valor medido pelo físico experimental. Deste modo, ao fazemos a
experiência usando raios X, cujo comprimento de onda vai de décimos até milésimos de nanometro, a
razão ∆λ/λ0 pode ter ordem de grandeza significativa. Ao contrário da luz vísivel, de modo que esta
razão é muito díficil de ser observado. Em termos técnicos, estamos falando de uma ordem de grandeza de
38 Capítulo 2. Propriedades corpusculares da radiação

Figura 26 – Resultado do experimento de Compton.

uma diferença entre os raios X e a luz vísivel de 104 . Em segundo lugar, o raciocínio que nos motivou para
entender o efeito Compotn como sendo o produto da colisão entre um fóton e um elétron "parado", usamos
o fato de que o fóton tinha uma energia alta. Lembre-se, que a energia do fóton inicidente é da ordem
de grandeza de algumas dezenas de keV enquanto que o do elétron é alguns eV. Deste modo, podemos
desprezar a energia do elétron em comparação com a do fóton e considerá-lo como estando em repouso.
No entanto, este argumento não pode ser levado em consideração quando falamos da energia do fóton da
luz vísivel, cuja energia é da ordem de eV. Então, esta energia do fóton é da mesma ordem de grandeza de
a do elétron (átomo), e não podemos mais considerá-lo como estando em repouso. Por esses dois motivos
não exergamos o efeito Compton para a luz vísivel.

Além disso, Compton observou raios X espalhados com comprimento de onda orginal. Então, não
havia apenas comprimento de onda dado pela Eq. 2.32. O motivo é fácil de entender. Quando fazemos
raio X incide sobre um átomo, em alguns sofrerá colisão com o elétron externo ao átomo mas também
pode colidir com o elétron interno ao átomo e até com o próprio núcleo. Neste caso, todo o raciocínio
para chegar na equação para o deslocamento do comprimento de onda não é mais a massa do elétron, é a
massa ou do núcleo ou do elétron preso ao núcleo que não se movimento sozinho, ou seja, ao se movimenta
junto com todo o núcleo. Lembre-se que a massa do átomo é da ordem de grandeza 104 vezes maior que a
do elétron. Com isto, observando novamente a Eq. 2.32 vemos que com m (massa do átomo) de 104 , o
valor de ∆λ estará em terno de 10−5 , ou seja, difilmente é observado. Por isso que podemos considerar
que não houve mais desvio no comprimento de onda.

É notório dizer que, após toda essa discussão, a luz, a radiação eletromagnética, ora apresenta um
comportamento típico de de onda, como no experimento de dupla fenda Young e no experimento de difração
de Bragg (no raio X), ora apresenta um comportamento típico de partícula, como no efeito fotoelétrico
e no esplhamento Compton. Então, a radiação ela se comporta de acordo de com sua interação com a
matéria: como uma onda ou como uma partícula. Essas duas visões para a radiação estão intrinsicamente
relacionadas com o fato de que construímos o fóton a partir de expressões como

h
E = hν (Energia) e p = (momento). (2.33)
λ

Essas duas expressões exprimem de forma clara o que chamamos de dualidade onda-partícula.
2.4. Produção e aniquilição de pares 39

Exemplo 2.4 Considere um feixe de raio X com λ = 1, 00Å, e também um feixe de raio γ vindo
de uma fonte de 137
Cs com λ = 1, 88 × 10−2 Å. Se a radiação espalhada pelos elétrons livres é observada
a 90◦ do feixe incidente: (a) Qual é o deslocamento Compton em cada caso? (b) Que energia cinética é
cedida ao elétron em cada caso? (c) Que porcentagem da energia fóton incidente é perdida na colisão em
cada caso?

Solução

a) Note que o deslocamente ∆λ é independente do comprimento de onda λ.

h 6, 63 × 10−34 J · s
∆λ = (1 − cos θ) = = 2, 43 × 10−12 m = 0, 0243Å
m0 c 9, 11 × 10−31 kg × 3, 00 × 108 m/s

b) No efeito Compton, a conervação de energia relativística impõe que

E0 + m0 c2 = E1 + K + m0 c2 ,

onde E0 é a energia inicial do fóton (hν0 ), E1 é a energia final do fóton (hν1 ), K é a energia cinética
do elétron após a colisão e m0 c2 é a energia de repouso do elétron. Desta equação, temos que
K = E0 − E1 . Além disso, a energia relativística do fóton é E = pc, onde p é o momento do fóton.
Então, K = (p0 − p1 )c. Assim,
 
hc hc hc hc ∆λ 1
K= − = − → K = hc
λ0 λ1 λ0 λ0 + ∆λ λ λ + ∆λ

Para o feixe de raio X com λ = 1, 00Å:

K = 4, 73 × 10−17 J = 295eV

Para o feixe de raios γ, λ = 1, 88 × 10−2 Å:

K = 5, 98 × 10−14 J = 378eV.

c) A energia dos fótons de raio X incidente é

hc
E = hν = = 12, 4KeV
λ

A energia perdida pelo fóton é a energia cedida ao elétron, 295 KeV, de forma que a perda percentual de
energia é
0, 295 keV
× 100% = 2, 4%
12, 4 keV

A energia dos fótons de raios γ incidente é

hc
E = hν = = 660 keV.
λ

A energia perdida pelo fótoné igual a ganha pelo elétron, 378 keV„ de modo que a perda percentual de
energia é
378 keV
× 100% = 57%
660 keV
40 Capítulo 2. Propriedades corpusculares da radiação

Figura 27 – Representação na produção de pares: um fóton colide com um núcleo criando um par elétron-
pósitro.

2.4 Produção e aniquilição de pares

Além dos efeitos fotoelétrico e Compton há outro processo no qual os fótons perdem sua energia na
interação com a matéria que é o processo de produção de pares. Neste processo um fóton de frequência ν
colide com um núcleo cedendo toda sua energia e criando um par elétron-pósitron com determinada energia
cinética. A Fig. 27 ilustra este processo. Um pósitron é uma partícula que tem todas propriedades de um
elétron exceto pelo sinal da carga (e de seu momento magnético); o pósitron é um elétron positivamente
carregado.

Na produção de pares, a energia de recuo absorvida pelo núcleo é desprezível por causa de su
grande massa, e assim a equação de conservação da energia total relativística no processo é simplesmente

hν = E− + E+ = (m0 c2 + K− ) + (m0 c2 + K+ ) = K− + K+ + 2m0 c2 , (2.34)

onde E− e E+ são as energias relativísticas totais, e K− e K+ são as energias cinéticas do elétron e do


pósitron, respectivamente. O pósitron é produzido com uma energia cinética um pouco maior que a do
elétron pois a interação coulombiana do par com o núcleo positivamente carregado causa uma aceleração
no pósitron e uma desaceleração no elétron.

Vamos ignoar os detalhes da interação considerando apenas as situações antes e depois da colisão.
As leis de conservação envolvidas neste processo são a energia relativística, momento e carga. Destas leis
não é difícil mostrar que um fóton não pode simplesmente desaparecer no espaço, criando um par. A
carga é automaticamente conservada desde que o fóton não tem carga e o par criado tem carga total nula.
Da Eq. 2.34 vemos que a energia mínima necessária para um fóton crie um par é
 
2 −31 8 2 −13 1eV
2m0 c = 2(9, 109×10 kg)(2, 998×10 m/s) = 1, 6374×10 J = 1, 02 MeV. (2.35)
1, 60 × 10−19 J

Esta energia equivale a um comprimento de onda de 0,012 Å. Se o comprimento de onda for menor que
isto, correspondendo a uma energia maior que o valor limite, o fóton produz o par com uma certa energia
cinética, além da energia de repouco. O fenêmeno de produção de pares é um fenêmeno de altas energias,
devendo os fótons estar na região do raios X de grande energia ou na região dos raio γ. Veja a Fig. 28
Deste modo, vemos que a interação de fótons com a matéria ocorre a baixas energias no efeito fotoelétrico,
a energias intermediátia no efeito Compton e a altas energias na produção de pares.

Temos ainda um processo inverso ao de produção de pares que é o processo aniquilação de pares.
Um elétron e um pósitron, estando essencialmente em repouso próximos um do outro, se unem e são
aniquilados. A matéria desaparece e em seu lugar obtemos energia radiante. Uma vez que o momento
2.4. Produção e aniquilição de pares 41

Figura 28 – Espectro eletromagnético mostrando comprimento de onda, frequência e energia por fóton
em uma escala logaritmica.
42 Capítulo 2. Propriedades corpusculares da radiação

Figura 29 – Aniquilação de pares produzindo dois fótons.

inicial do sistema é igual a zero, e o momento deve ser conservado, não podemos ter um único fóton pois
um único fóton não pode ter momento zero. Assim, a maior probabilidade é a criação de dois fótons que
se movem com o mesmo momento em sentidos opostos. Menos provávelm, mas é possível, é a criação de
três fótons.

Como mostrado na Fig. 29, a conservação do momento é

0 = p~1 + p~2 , (2.36)

de forma que os momentos dos fótons são iguais em módulos têm sentidos opostos. Portanto,

p1 = p2
hν1 hν2
=
c c
ν1 = ν2 = ν. (2.37)

A conservação de energia relativística impõe então que

m0 c2 + m0 c2 = hν + hν. (2.38)

Portanto, hν = m0 c2 = 0,51 MeV correspondendo a um comprimento de onda do fóton iguais.

Os pósitrons são criados no processo de processo de produção de pares. Ao passar pela matéria um
pósitron perde energia em sucessivas colisões até de combinar com um elétron formando um sistema ligado
chamado positrônico. O átomo de positrônico tem uma vida curta, decaindo em fótons em aproximadamente
10−10 s depois de sua formação. Presume-se que o elétron e o pósitron movem-se em torno de seu centro
de massa em uma espécie de "dança da morte"até se aniquilarem mutuamente.

Exemplo 2.5

a) Suponha que a Fig. 29 represente o processo de aniquilação em um sistema de referiencia S no qual


o par elétron-pósitron esteja em repouso e os dois fótons resultantes da aniquilação movam-se ao
longo do eixo x. Encontre o comprimento de onda λ desses fótons em função de m0 , a massa de um
elétron ou de um pósitron.
Solução Vimos que cada fóton no processo de aniquilação tem a mesma energia de modo que
podemos abandornar os índices das relações hν = m0 c2 e p = E/c:

p = E/c = hν/c = m0 c2 /c = m0 c.

Mas também a relação


p = h/λ

de forma que
λ = h/p = h/m0 c.

Portanto, no sistema de repouso do positrônio cada fóton tem o mesmo comprimento de onda
λ = h/m0 c.
2.4. Produção e aniquilição de pares 43

b) Agora considere a mesma aniquilação sendo observada no referencial S 0 , que se move com velocidade
~v para a esquerda em relação S. Que comprimento de onda este observador (em movimento) mede
para os fótons?
Solução
No referencial S 0 temos a conservação de energia e momento dadas pelas equações

2mc2 = p01 c + p02


2mv = p01 − p02
p
onde m é a massa relativística dada por m = m0 / 1 − v 2 /c2 . Perceba também que o momento
inicial do elétron e do pósitron não é mais zero uma vez que eles se movem com velocidade v em S 0 .
Multiplicando por c a segunda equação acima e somando com a primeira obtemos
r
0 m0 (c + v) (1 + v/c) c+v
p1 = m(c + v) = p = m0 c p = m0 c . (2.39)
2
1 − v /c 2 (1 + v/c)(1 − v/c) c−v

Mas p01 = h/λ01 , de modo que r r


h c−v c−v
λ01 = =λ .
m0 c c+v c+v
Da mesma forma, subtraindo a segunda equação da primeira, obtemos
r r
0 h c+v c+v
λ2 = =λ .
m0 c c − v c−v

Os fótons não têm o mesmo comprimento de onda, pois estes são alterados pelo efeito Doppler em
relação ao valor λ que possuíam no referencial em repouso da fonte (o átomo de positrônio). Se um
observador está no eixo x0 de forma que a fonte se aproxima dele, ele detectará o fóton 1 com uma
frequência maior do que a frequência de repouso. Se um observador está situado no eixo x0 de forma
que a fonte se afasta dele, ele detectará o fóton 2 com uma frequência menor do que a frequência de
repouso. Na verdade este exemplo é o efeito Doopler longitudinal da teoria da Relatividade.

A equação de Schrodinger, que veremos mais adiante na Sec. 5, é a equação básica da mecânica
quântica não relativística. Corresponde ao caso onde a energia total da partícula é
p2
E= + V, (2.40)
2m
onde o primeiro termo corresponde à energia cinética e o sengudo à energia potencial. Algum tempo
Dirac desenvolveu a equação relativística corresponde para descrever o movimento do elétron. A energia
relativística de uma partícula, na ausência de potenciais externos é dada por

E 2 = p2 c2 + m20 c4 , (2.41)

e a equação de Dirac terá a forma


p
E = ± p2 c2 + m0 c2 . (2.42)

No caso da partícula livre, com momento nulo, E = − m0 c2 = −m0 c2 corresponde a uma partícula com
energia (massa) negativa. Se o momento for nulo, teremos energias ainda mais negativas. Em muitos
cáculos relativísticos ignoramos a solução negativa. No entanto, Dirac observou que que não havia razão
para ignorar esta solução e, assim, previu existência de elétrons com energia negativa. De acordo com a
equação acima só pode haver elétrons com energia E ≥ m0 c2 ou E ≤ −m0 c2 , conforme mostra a Fig. 30.

Temos o que chamamos de energia relativística negativa, um conceito tão estranho à mecânica
relativítica quanto à mecânica clássica. Dirac, então, explorou as consequências da solução completa
44 Capítulo 2. Propriedades corpusculares da radiação

Figura 30 – Níveis de energia de um elétron livre de acordo com Dirac.

Figura 31 – Feixe de fótons passando através de uma lâmina.

para tratar das interpretações físicas. Se o contínuo de energias existe, todos os elétrons livres de energia
positiva poderiam sofrer transições para esses níveis , acompanhadas de emissão de fótons de energia
apropriaadas. Isto não está de acorodo com a experiência pois não observa-se emissão espontânea de fótons
com energia hν ≥ 2m0 c2 por parte dos elétrons livres. No entanto, Dirac observou que esta dificuldade
pode ser removida assumindo que todos os níveis de energia negativa estã normalmente ocupados em cada
ponto do espaço. De acordo com esta hipótese, um váciuo consiste de um mar de elétrons em níveis de
energia negativos.

2.5 Seção de choque para absorção e espalhamento de fótons

Considere um feixe paralelo de fótons atravessando uma lâmina de matéria como está mostrado
na Fig. 31. Os fótons podem interagir com a matéria por meio de três processos: fotoelétrico , produção de
pares e espalhamento Compton. Os dois primeiros absorvem completamente os fótons enquanto o último
espalha, ms todos eles retiram fótons do feixe. Perguntamos então qual a probabilidade de acontecer cada
um destes processos de acordo com as condições dadas.

A probabilidade de um fóton com uma dada energia ser absorvido, por exemplo, pelo efeito
2.5. Seção de choque para absorção e espalhamento de fótons 45

fotoelétrico ao passar pela lâmina é dada pelo valor da seção de choque fotoelétrico σfe . Esta medida da
probabilidade de ocorrência do efeito fotoelétrico é definida de forma que o número NFE de absorções
fotelétricas que ocorrem seja dado por
NFE = σfe In (2.43)

quando um feixe contendo I fótons incide sobre uma lâmina que contém n fótons por unidade de área.
Supõe-se aqui que a lâmina é suficientemente fina para que a probabilidade de um fóton ser absorvido
ao passar por ela seja menor do que um. Quando dizemos que a lâmina deve ser suficientemente fina
queremos dizer que seus átomos não farão "sombra"uns aos outros, relativamente ao feixe incidente. Então
o número Nfe também deve ser diretamente proporcional ao número n de átomos por unidade de área da
lâmina. Portanto, deveremos ter
Nfe ≈ I n. (2.44)

Vemos que a seção de choque, cujo valor depende tanto da energia do fóton quanto do tipo de
átomo, mede o quanto esses átomos são afetivos na absorção de fótons pelo efeito fotoelétrico. Note que
Nfe e I são adimensionais, e n tem dimensão de (area)−1 , fica claro que σfe tem dimensão de (area).

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