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A MULHER EM SITUAÇÃO DE RUA E AS POLÍTICAS PÚBLICAS

HACK, Neiva Silvana; professora Serviço Social Uninter; neiva.h@uninter.com


GOMES, Rosilaine Santos; aluna Serviço Social Uninter; rosilaine.estudos@gmail.com
SOUZA, Marcia Romovicz; aluna Serviço Social Uninter; ssouza.marcia@yahoo.com.br

Grupo de trabalho: SERVIÇO SOCIAL E POLÍTICAS PÚBLICAS


Centro Universitário Internacional - UNINTER

Resumo
Ao longo dos estudos realizados no projeto de pesquisa “População em situação de rua em
Curitiba: perfil e vivências no território central da cidade”, uma questão que ganhou evidência
foi a reduzida quantidade de informações e produções acerca das mulheres que fazem
vivência de rua. Em revisão bibliográfica realizada nos portais Scielo e Periódicos Capes,
foram selecionados 55 artigos tratando da população em situação de rua no Brasil e apenas
um tratava da questão da mulher. Observando dados do Cadastro único de programas
sociais, observou-se que, em Curitiba, as mulheres representam 10% da população de rua
cadastrada (FAS, 2018). Em todas as fontes de consulta buscadas pelos alunos e professores
do grupo de pesquisa, confirma-se a escassez de informações precisas acerca da quantidade
e do perfil da população em situação de rua em Curitiba. Mas quando se refere à mulher, além
da ausência de informações, há também ausência de visibilidade na produção científica.
Considerando tal cenário, objetivou-se com este estudo compreender as especificidades das
demandas das mulheres em situação de rua, além de buscar conhecer as políticas voltadas
à mulher e em que medida estas se efetivam quando se trata da mulher em situação de rua.
A metodologia de pesquisa adotada foi de uma pesquisa bibliográfica que, segundo Lakatos
e Marconi (2001, p.183) “é [...]toda bibliografia já tornada pública em relação ao tema
estudado,[...]”, assim pode-se dizer que “a sua finalidade é colocar o pesquisador em contato
direto com tudo o que foi dito, escrito ou filmado sobre determinado assunto”(LAKATOS e
MARCONI, 1996, p.66). A busca bibliográfica específica acerca de mulheres em situação de
rua não foi suficiente para alcançar o objetivo proposto, uma vez que se confirmou a escassez
de produções disponíveis sobre o assunto. Assim, os resultados da pesquisa compreenderam
a discussão acerca da situação de rua, compreendendo este fenômeno como uma expressão
da questão social e como resultante de sucessivos processos geradores de desigualdades
sociais (IAMAMOTO e CARVALHO, 1982; NASCIMENTO, 2000); a reflexão sobre as
desigualdades de gênero que amplificam as exclusões sociais presentes na sociedade
capitalista; e o debate acerca da violência contra a mulher, suas formas de proteção/defesa
e sua concretização no cotidiano da mulheres em situação de rua (BRASIL, 2006; OLIVEIRA
e PAIVA, 2007). Observa-se que a evidência da violência e das discriminações implica em um
status de perda da cidadania (GUSTIN, 2005; RODRIGUES e MIRANDA, 2011). A partir desta
pesquisa foi possível concluir que as mulheres são vítimas de uma exclusão histórica e cultural,
que ainda se reproduz com intensidade na atual sociedade brasileira. As exclusões sociais que
decorrem na situação de rua, tornam-se mais graves para as mulheres, potencializando
situações de risco para a violência. O Brasil ainda conta políticas frágeis para as mulheres, pois
volta-se mais para as questões da mulher-mãe ou da violência doméstica, sem constituir uma
legislação abrangente de proteção ao gênero feminino. Nesta conjuntura, as mulheres em
situação de rua encontram-se mais ameaçadas do que homens e menos assistidas pelas
políticas públicas do que outras mulheres, que possuam uma referência de domicílio.

Palavras-chave: população em situação de rua, mulher em situação de rua, gênero feminino,


desigualdades sociais.
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INTRODUÇÃO
Ao longo dos estudos realizados no projeto de pesquisa “População em
situação de rua em Curitiba: perfil e vivências no território central da cidade”, uma
questão que ganhou evidência foi a reduzida quantidade de informações e produções
acerca das mulheres que fazem vivência de rua.
Em revisão bibliográfica realizada nos portais Scielo e Periódicos Capes, foram
selecionados 55 artigos tratando da população em situação de rua no Brasil e apenas
um tratava da questão da mulher. Observando dados do Cadastro único de programas
sociais, observou-se que, em Curitiba, as mulheres representam 10% da população
de rua cadastrada (FAS, 2018). Em todas as fontes de consulta buscadas pelos alunos
e professores do grupo de pesquisa, confirma-se a escassez de informações precisas
acerca da quantidade e do perfil da população em situação de rua em Curitiba. Mas
quando se refere à mulher, além da ausência de informações, há também ausência
de visibilidade na produção científica.
Considerando tal cenário, objetivou-se com este estudo compreender as
especificidades das demandas das mulheres em situação de rua, além de buscar
conhecer as políticas voltadas à mulher já que o Brasil ainda conta com políticas frágeis
e em que medida estas se efetivam quando se trata da mulher em situação de rua.
A metodologia de pesquisa adotada foi de uma pesquisa bibliográfica que,
segundo Lakatos e Marconi (2001, p.183) “é [...]toda bibliografia já tornada pública em
relação ao tema estudado [...]”, assim pode-se dizer que “a sua finalidade é colocar o
pesquisador em contato direto com tudo o que foi dito, escrito ou filmado sobre
determinado assunto”(LAKATOS e MARCONI, 1996, p.66).
Os resultados da pesquisa compreenderam a discussão acerca da situação de
rua, compreendendo este fenômeno como uma expressão da questão social e como
resultante de sucessivos processos geradores de desigualdades sociais (IAMAMOTO
e CARVALHO, 2000; NASCIMENTO, 2002); a reflexão sobre as desigualdades de
gênero que amplificam as exclusões sociais presentes na sociedade capitalista; e o
debate acerca da violência contra a mulher, suas formas de proteção/defesa e sua
concretização no cotidiano da mulheres em situação de rua (BRASIL, 2006; OLIVEIRA
e PAIVA, 2007).
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PESSOAS EM SITUAÇÃO DE RUA: UMA EXPRESSÃO DA QUESTÃO SOCIAL


Para o entendimento da temática da “população em situação de rua”, é
necessário que se compreenda as razões que constroem este fenômeno. Para além
das razões individuais, é preciso apreender tal fenômeno de forma ampla, na
construção da sociedade capitalista. Esta “razão” ampla/coletiva está alicerçada no
surgimento do capitalismo, que tem como base estruturante a acumulação do capital
e a apropriação de riqueza produzida coletivamente. O resultado da sua própria lógica
produtiva, como a forma de distribuição de renda e a falta de investimentos em políticas
públicas, traz fatores que contribuem para o acirramento das desigualdades sociais.
Segundo Nascimento (2002, p. 58) desigualdade social refere-se a uma
“distribuição diferenciada, numa escala de mais ou menos, das riquezas materiais e
simbólicas produzidas por uma determinada sociedade e apropriada por seus
participantes”.
A questão social está diretamente relacionada ao conflito entre o capital e o
trabalho, entre a acumulação capitalista e a exploração da classe trabalhadora, entre
a produção da riqueza sem justa e igualitária distribuição. Este conflito impacta em
uma série de desigualdades e demandas sociais, tais como a miséria, a pobreza, o
não acesso a serviços básicos, a reprodução da violência, entre outros. A tais
fenômenos, chama-se de expressões da questão social (IAMAMOTO e CARVALHO,
2000).
A questão social não é senão as expressões do processo de formação e
desenvolvimento da classe operaria e de seu ingresso no cenário político da
sociedade, exigindo seu reconhecimento como classe por parte do
empresariado e do Estado. É a manifestação, no cotidiano da vida social, da
contradição entre proletariado e a burguesia, a qual passa a exigir outros tipos
de intervenção mais além da caridade e repressão. (IAMAMOTO e
CARVALHO, 2000, p. 77)

Assim, a situação de rua é marcada por um acúmulo de expressões da questão


social que incidem sobre indivíduos e sobre uma população que se vê excluída das
relações de mercado, próprias ao capitalismo. As desigualdades sociais provocadas
pela questão social fomentam o surgimento de uma grande massa de pessoas
vulneráveis, excluídas, “invisíveis”, que não são absorvidas pelo sistema capitalista.
Exemplo disso é o fenômeno vivenciado pelas pessoas que se veem em situação de
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rua. Estas, ao perder tudo, como o emprego, o lar, a família; ao ter seus direitos
negados; e que, em muitas vezes, tem seus pertences limitados ao que cabe em suas
mãos, fazem parte de um segmento populacional crescente, que pode ser
reconhecido como uma expressão da questão social, das mais gritantes aos olhos da
sociedade contemporânea. Os fenômenos decorrentes das desigualdades originadas
pelo modo de produção capitalista implicam em risco para o exercício dos direitos
humanos.
Segundo o artigo 5° da Constituição Federal do Brasil de 1988, todos os
cidadãos são iguais perante a Lei e devem ser respeitados em seus direitos
individuais, sociais e políticos. Uma forma de afirmar e efetivar os direitos da
população em situação de rua é a implementação da Política Nacional para a
População em Situação de Rua (BRASIL, 1988, 2009).
A Política Nacional da População em Situação de Rua, foi instituída pelo
Decreto n°7.053 de 23 de dezembro de 2009. Esta considera população em situação
de rua como
“o grupo heterogêneo que possui em comum a pobreza extrema, sem
vínculos familiares ou fragilizados e a inexistência de moradia, e que utiliza
os espaços públicos como domicilio e dela retira seu sustento, temporária ou
permanentemente, utilizando esporadicamente unidades de acolhimento
para pernoite ou como moradia provisória.” (BRASIL, 2009)

Percebe-se que o conceito adotado pela Política Nacional implica em um


conjunto de diferentes expressões da questão social, como a pobreza extrema, a não
efetividade do direito social à moradia, a dependência de políticas sociais e mesmo o
impacto destes e outros agravantes nas relações familiares. (BRASIL, 2009)
Aos elementos de caráter político, social e econômico que incorrem na situação
de rua, são somados elementos que envolvem os vínculos e as relações familiares. É
possível, assim, deduzir que a mola propulsora para o indivíduo que já se encontra
em vulnerabilidade seja o rompimento de vínculos familiares. Para Mioto (2010, p.05),
a família constitui-se como: “Um espaço altamente complexo. É construída e
reconstruída histórica e cotidianamente, através das relações e negociações que
estabelece entre seus membros e outras esferas da sociedade, tais como Estado,
trabalho e mercado”. A ida para rua e permanência neste espaço está diretamente
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relacionada a situações de rompimento ou fragilidade nos vínculos familiares, tal como


aponta o próprio conceito definido pela Política Nacional para população em situação
de rua, como também os resultados da Pesquisa Nacional sobre a População em
Situação de Rua, publicada pelo Ministério de Desenvolvimento Social e Combate à
Fome, no ano de 2009 (BRASIL 2009, 2009b).

A MULHER EM SITUAÇÃO DE RUA


A escolha do recorte mulher em situação de rua se deu pelo fato de que muito
pouco material se tem disponível, tornando-se relevante este estudo. Contudo,
entender a temática da mulher em situação de rua só é possível se levada em
consideração a situação da mulher na sociedade capitalista contemporânea, bem
como as expressões de desigualdades por ela sofrida historicamente, de forma com
que a desigualdade seja reproduzida como natural. É necessário, então, um breve
histórico sobre o papel da mulher na sociedade.
Tendo em vista a construção histórica e cultural do papel da mulher na
sociedade, a qual resumidamente era de gerar filhos, cuidar das atividades do lar e
do esposo, a subordinação, a inferiorização a submissão, estigmatizava-a como
pessoa frágil, vulnerável e digna de relacionamentos abusivos (CARMO, ISCHIARA e
CARNEIRO, 2011). Aqui cabe fazer um adendo de que na atualidade este ainda é um
fato não totalmente superado pela classe feminina.
Com esse histórico e com a urgente necessidade da mulher se impor perante a
sociedade, buscar seus objetivos, esta perspectiva foi se alterando gradativamente, e
de certa forma, a repressão vivida por estas mulheres, fizeram com que estas
ganhassem forças e passassem a lutar e conquistar os espaços que desejavam,
provocando profundas mudanças no papel da mulher na sociedade (CARMO, ISCHIARA
e CARNEIRO, 2011). Como exemplo, a mulher hoje em dia, consciente de sua
capacidade e de seu lugar no mundo, tem autonomia, possui meios de sobreviver sem
necessariamente estar atrelada a um relacionamento, muitas vezes abusivo, violento.
Dentre diversos e possíveis fatores como a quebra de vínculos; as relações de
trabalho em que a mulher é desvalorizada pelo simples fato de ser mulher; e o
desemprego são elementos que cooperam com o processo de ida das mulheres para
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a rua. Destaque-se, contudo, que um fator que se destaca, em conjunto com aqueles já
citados, é a violência sofrida pelas mulheres (PRATES, PRATES e MACHADO, 2011).
A Pesquisa Nacional Sobre População em Situação de Rua (BRASIL, 2009b)
aponta dados que apresentam o subgrupo das mulheres em situação de rua, ainda
que em números significativamente menores, se comparados ao público masculino. A
Pesquisa indica que 82% (22.669) das pessoas entrevistadas eram homens, e apenas
18% (isso equivale a 4.964) eram mulheres. Esta diferença não acontece por acaso.
A vida na rua apresenta desafios intensos para uma mulher. Em condições
extremamente adversas, a vulnerabilidade, a diferentes tipos de situações à qual está
exposta, estas se tornam invisíveis aos olhos da sociedade. (BRASIL, 2009b)
Esta diferença significativa não acontece por acaso. A vida na rua apresenta
desafios muito intensos para a vida de uma mulher, em função de suas
especificidades em relação aos homens. As obriga a lidar com uma realidade
profundamente masculinizada e cheia de preconceitos, situação esta que se
impõe de forma muito mais brutal do que os casos de violência e preconceitos
vivenciados cotidianamente por grande parte das mulheres que não estejam
em situação de rua (BRASIL, 2009b, p. 157).

Como estratégias de proteção, algumas mulheres se sujam com urina e fezes


afim de afastar pessoas que possam tentar se aproximar, além de não raros os casos
onde as mulheres fazem uso de vestimentas e cortes de cabelo masculinizados, que
as façam passar despercebidas em meio a tantos homens na rua, como formas de
sobrevivência no ambiente de rua, essas são algumas estratégias adotadas por elas,
no intuito de se proteger. (BRASIL, 2009b; FRANGELLA, 2004)
Constam, portanto, especificidades da vivência das mulheres na rua e dos
desafios por elas enfrentados. Estas precisam ser contempladas pelas políticas
públicas para que se possa efetivar a mais adequada proteção social a uma população
significativamente vulnerável.

POLÍTICAS PÚBLICAS PARA AS MULHERES


Importante destacar que as poucas políticas voltadas à mulher, no Brasil, são
resultados da pressão por parte de movimentos sociais, na década de 1970 e
seguintes. Estas buscam ofertar proteção às mulheres que sofreram algum tipo de
violação de direito, seja ele qual for. As políticas públicas sociais, desde a Constituição
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de 1988, compreendem entre seus princípios a universalização, todavia são


excludentes, principalmente quando se trata de mulher em situação de rua. Há uma
certa invisibilidade da mulher em situação de rua aos olhos do Estado (BRASIL, 1988;
COSTA, 2005).
Políticas públicas compreendem diretrizes e princípios norteadores das
relações/mediações entre atores da sociedade e do Estado. Visam atender demandas
de segmentos vulneráveis, tais como os grupos sociais excluídos . Neste sentido,
políticas públicas destinadas as mulheres, tem o intuito de estabelecer pautas políticas
especificas e/ou direcionadas às mulheres (BRASIL, 2018).
O Plano Nacional de Políticas para as Mulheres 2013-2015 contribuiu “para o
fortalecimento e a institucionalização da Política Nacional para as Mulheres aprovada
a partir de 2004, e referendada em 2007 e em 2011, pelas respectivas conferências”.
(BRASIL, 2012, p. 09). Busca a igualdade efetiva entre mulheres e homens em todos
os âmbitos. Participação ativa das mulheres em todas as fases das políticas públicas,
dentre outros. (BRASIL, 2013)
Para a Política Nacional da População em Situação de Rua, a mulher aparece
somente como mais uma pessoa vulnerável, em situação de rua, e não
especificamente como mulher, ou seja, não há especificidades dentro desta política
que atenda à mulher. (BRASIL, 2009)
Porém a aplicabilidade da referida legislação se torna pequena, discutível e
aberta à interpretações. Nota-se que há um dificultador do processo da aplicabilidade
destas políticas, pelo fato de estas serem “pensadas, tratadas e estruturadas de forma
pontual e fragmentada” (SANTOS, 2014).

A VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER EM SITUAÇÃO DE RUA


Como pontuado anteriormente, a mulher pelo simples fato de ser mulher, já se
encontra em maior vulnerabilidade social. Quando se refere à violação de direitos, é
importante destacar que independente de fatores como religião, classe econômica,
etnia, estas estão expostas a diversos tipos de violência e violação de direitos (IPEA,
2018). Neste contexto, a mulher em situação de rua é atingida amplamente, pois está
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desprotegida, não só pela falta de moradia em si, mas também pela falta de proteção
básica. (BRASIL, 2009b; IPEA, 2018)
Os diversos tipos de violência à qual a mulher em situação de rua convive pode
ser motivada por disputas de território, pontos de prostituição, pontos de tráfico de
drogas, entre outros.
Também na expectativa de sofrer menos violência, encontram companheiros
que muitas vezes farão uso de violências com as mesmas, como a violência sexual
por exemplo. Por medo ou submissão a seus companheiros, sujeitam-se a viver desta
forma, afim de evitar serem violentadas por diversos outros. Entretanto, a escolha de
um único companheiro, não as livra dos abusos e violências advindas dos mesmos.
Tal situação torna difícil a denúncia e o relato, pois o vínculo com o agressor torna a
mulher ainda mais vulnerável e também pelo fato de não haver legislação especifica
voltada para a proteção destas mulheres (DIAS et al, 2018; TIENE, 2004).
Tiene (2004) afirma que muitas das mulheres em situação de rua habitam nela
por opção, pois foram em busca , da tão sonhada liberdade, o que é confirmado nos
resultados da Pesquisa Nacional sobre população em situação de rua. Muitas optaram
pela rua para fugir dos maus tratos do marido, como também dos conflitos familiares.
No entanto, mesmo nas ruas elas continuam a buscar a tão esperada proteção
(BRASIL, 2009b; TIENE, 2004).
Nota-se que não há uma lei especifica que dê conta da violência sofrida pela
mulher em situação de rua. A lei Maria da Penha, reconhecida como a principal lei de
proteção à mulher no Brasil é bastante especifica, e não se aplica, de forma imediata,
aos casos de violência contra a mulher em situação de rua. Esta lei volta-se para as
questões especificas da mulher-mãe que sofre a violência num contexto de lar, tal
como se pode observar no seguinte trecho:
a violência doméstica ou familiar contra a mulher é toda ação ou omissão,
baseada no gênero, que cause morte, sofrimento físico, sexual ou psicológico
e dano moral e patrimonial, no âmbito da unidade doméstica, da família e em
qualquer relação íntima de afeto, em que o agressor conviva ou tenha
convivido com a agredida (BRASIL, 2006).

Embora parte das agressões ocorra por parceiros que convivem com a mulher
vítima na rua, há o limitador de que tais relações não sejam compreendidas como
familiares ou domésticas, excluindo estas mulheres da proteção legal que lhes seria
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necessária. Desta forma, se pode inferir que a Lei 11.340/2006 não constitui uma
legislação abrangente de proteção ao gênero feminino. Observa-se, então, que as
mulheres em situação de rua encontram-se mais ameaçadas do que homens e menos
assistidas pelas políticas públicas do que outras mulheres, por não possuírem uma
referência de domicílio/lar.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
O presente estudo objetivou compreender as especificidades das demandas
das mulheres em situação de rua, além de buscar conhecer as políticas voltadas à
mulher e em que medida estas se efetivam quando se trata da mulher em situação de
rua.
A partir desta pesquisa foi possível concluir que as mulheres são vítimas de uma
exclusão histórica e cultural, que ainda se reproduz com intensidade na atual sociedade
brasileira. As exclusões sociais que decorrem na situação de rua, tornam-se mais
graves para as mulheres, potencializando situações de risco para a violência.
O Brasil ainda conta políticas frágeis para as mulheres, pois volta-se mais para
as questões da mulher-mãe ou da violência doméstica, sem constituir uma legislação
abrangente de proteção ao gênero feminino. Nesta conjuntura, as mulheres em
situação de rua encontram-se mais ameaçadas do que homens e menos assistidas
pelas políticas públicas do que outras mulheres, que possuam uma referência de
domicílio.
Observa-se, por fim, que a evidência da violência e das discriminações implica
em um status de perda da cidadania (GUSTIN, 2005; RODRIGUES e MIRANDA, 2011).

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2009.
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