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UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA

FACULDADE DE ARQUITETURA E URBANISMO


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ARQUITETURA E URBANISMO

CAROLINA DE SOUZA LEÃO MACIEIRA GESTER

LADRILHOS HIDRÁULICOS EM BELÉM: SUBSÍDIOS


PARA A SUA CONSERVAÇÃO E RESTAURAÇÃO

SALVADOR-BA
2013

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CAROLINA DE SOUZA LEÃO MACIEIRA GESTER

LADRILHOS HIDRÁULICOS EM BELÉM: SUBSÍDIOS PARA A SUA


CONSERVAÇÃO E RESTAURAÇÃO

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-


graduação em Arquitetura e Urbanismo, da Faculdade de
Arquitetura e Urbanismo, Universidade Federal da Bahia,
como parte dos requisitos para a obtenção do grau de
Mestre em Conservação e Restauro.
Orientadora: Profª. Drª. Cybèle Celestino Santiago

SALVADOR-BA
2013

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CAROLINA DE SOUZA LEÃO MACIEIRA GESTER

LADRILHOS HIDRÁULICOS EM BELÉM: SUBSÍDIOS PARA A SUA


CONSERVAÇÃO E RESTAURAÇÃO

BANCA EXAMINADORA

__________________________________________________________________
Profª. Dra. Cybèle Celestino Santiago (orientadora)
Doutora pela Universidade de Évora, Portugal
Programa de Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo – Universidade Federal da Bahia

__________________________________________________________________
Prof. Dr. Mário Mendonça de Oliveira
Título de Notório Saber em Arquitetura, Universidade Federal da Bahia
Programa de Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo – Universidade Federal da Bahia

___________________________________________________________________
Profª. Dra. Thais Alessandra de Bastos Caminha Sanjad
Doutora pela Universidade Federal do Pará, Brasil.
Programa de Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo – Universidade Federal do Pará

SALVADOR-BA
2013
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AGRADECIMENTOS

Agradeço a todos que me apoiaram e que contribuíram de alguma maneira,


para a realização deste trabalho. Principalmente à minha família, minha mãe, meu
pai (in memoriam) e minha irmã, por estarem sempre ao meu lado. Impossível
conseguir expressar o meu sentimento de gratidão.

Pai, agradeço por ter sido meu pai com toda força e essência da palavra, por
ter me incentivado, junto com a minha mãe, ir a busca dos meus sonhos. Hoje sei
que estás orgulhoso da minha conquista.

Ao tio João Cezar Moura, meus agradecimentos pelas passagens cedidas, de


tantas idas e vindas à Salvador, as quais permitiram presenciar momentos
importantes, mesmo que estes tenham sido difíceis, junto com a minha família.

Agradeço, em especial, ao meu noivo Rui Borges, por sua companhia


fortalecedora. Obrigada por estar sempre ao meu lado.

Aos professores Cybèle Santiago e Mário Mendonça, meus sinceros


agradecimentos pela confiança e pela dedicação a mim e ao meu trabalho.
Agradeço pela compreensão, devido a meus momentos de ausência. Minha
admiração por vocês motivou a minha ida à Salvador, assim como a enfrentar todas
as dificuldades.

Agradeço aos amigos baianos, pela ajuda e companhia. Com destaque as


amigas Sthefania Habeyche e Ana Cristian Magalhães, pelo apoio às minhas
estadias em Salvador e, principalmente, pela amizade. E Lisa Sahadia, pelos
momentos de trabalho juntas.

À professora Thais Sanjad, pela participação intensa em todos os momentos


de decisão, com dedicação e sabedoria. Obrigada pelos anos de confiança e por
todo apoio. Dedico-lhe imensa admiração.

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Obrigada aos amigos do LACORE, que estão sempre dispostos a contribuir,
nem que seja apenas com palavras de desespero. Com carinho especial, agradeço
às amigas Flávia Palácios e Juliana Fortes, com as quais muitas vezes dividi
experiências e compartilhei o mesmo teto de maneira muito divertida. À professora e
amiga, Rose Norat, o meu agradecimento pelas contribuições e incentivos.

Aos laboratórios da UFPA e da UFBA que possibilitaram a realização das


análises laboratoriais: Laboratório de Conservação, Restauração e Reabilitação
(LACORE/UFPA), Laboratório de Caracterização Mineral (LCM/UFPA), Laboratório
de Mineralogia e Geoquímica Aplicada (LaMIGA/UFPA), Laboratório de Microscopia
Eletrônica de Varredura (LABMEV/UFPA) e Núcleo de Tecnologia da Preservação e
da Restauração (NTPR/UFBA).

Ao Prof. Flávio Nassar, que gentilmente autorizou fotografar os catálogos


antigos que pertenciam ao seu avô, José Sidrim. Aos entrevistados, Nelson Vale,
Divo Picazio Júnior, Carlos Antônio Barbosa da Silva e José Leitão de Almeida
Viana, pela disponibilidade.

À CAPES, pela bolsa de mestrado a mim concedida.

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RESUMO

Em Belém, o ladrilho hidráulico está presente em várias edificações, principalmente


as da década de 40 e 50, do século XX, quando alcançou o período auge da
produção. Este material foi aplicado em palacetes e em edificações mais modestas,
de uso residencial, e foram confeccionados majoritariamente pela produção local. A
decadência da fabricação do ladrilho hidráulico ocorreu ao mesmo tempo em que
novos revestimentos chegaram à cidade, como os “São Caetano”. Atualmente, em
obras de restauro, este revestimento de piso é normalmente substituído por outros
materiais. Na maioria dos casos, isso ocorre devido à falta de domínio de técnicas
restaurativas compatíveis. O ladrilho hidráulico é composto por duas camadas. A
primeira, que é superficial, pode ser decorada e possuir relevo em cimento branco
pigmentado. A segunda, mais espessa, é constituída por cimento, areia e,
eventualmente, pó de pedra finamente moído. Este material é conhecido pelo seu
desempenho contra desgaste, pela facilidade de manutenção e por apresentar valor
estético diferenciado, por ser um revestimento rústico e elegante. Este trabalho visa
o estudo histórico e tecnológico de ladrilhos hidráulicos do século XX e réplicas do
século XXI, presentes em Belém. Para isso, foi dividido em três etapas: 1) pesquisa
histórica; 2) pesquisa tecnológica; 3) investigação laboratorial. A primeira etapa
abrange a investigação acerca da origem do material, evolução tipológica,
tecnologias de produção e de conservação e restauração. Tais informações foram
pesquisadas em fontes primárias, como relatórios dos governantes do Estado do
Pará dos séculos XIX e XX, notícias em jornais e periódicos da época, catálogos de
fábricas de ladrilho, entre outros. A segunda etapa consiste na investigação sobre o
processo de produção do ladrilho hidráulico, a partir de visitas a fábricas atuais de
diversas cidades, e entrevistas com herdeiros, proprietários e funcionários dessas
fábricas. Na última etapa realizou-se caracterização física, mineralógica e química
das amostras de ladrilhos hidráulicos coletadas. Primeiramente, as amostras foram
mapeadas quanto às patologias existentes com o auxílio do software CorelDraw 15.
Para a caracterização física, as etapas foram: 1) identificação das fábricas das
amostras; 2) dimensionamento com o auxílio de régua; 3) avaliação das cores
utilizadas na decoração com o uso do colorímetro; 4) ensaio de absorção total em
água; 5) ensaio de densidade pelo picnômetro de Hubbard; 6) ensaio de dureza; 7)
teste de abrasão; 8) análise morfológica por meio de microscópio ótico e por
6
Microscópio Eletrônico de Varredura (MEV); 9) Análise de traço provável por meio de
ataque ácido; 10) granulometria. Quanto à caracterização mineralógica e química,
foram utilizadas, respectivamente, a Difração de Raios-X (DRX) e a Fluorescência
de Raios-X (FRX). Por meio da pesquisa histórica e tecnológica foi possível
entender a abrangência do uso do ladrilho hidráulico em Belém, e a ocorrência de
várias fábricas locais, nos séculos XIX e XX, tais como a A. Pinheiro Filho e Cia, de
maior destaque na produção da cidade. Por meio das análises laboratoriais pode-se
perceber que a amostragem utilizada na pesquisa é de formato quadrado, variando
de 15 a 20 centímetros de lado. São materiais de pouca porosidade, entre 5 a 12%,
e resistentes à abrasão. As imagens de microscópio mostram uma matriz
homogênea e partículas distribuídas com formatos arredondados ou com formatos
irregulares, de diferentes tamanhos. Em relação às cores, o colorímetro indicou
variações entre as amostras. Por meio da caracterização química pode-se perceber
que as amostras são constituídas principalmente de Ca, Si e Al, elementos
provenientes do cimento. Os pigmentos utilizados para a coloração são constituídos
de Fe, Mn e Cu, para as cores amarelo, marrom e azul, respectivamente. Elementos
como Ti, Na e Cl também estão presentes, sugerindo a adição de componentes com
outras funções ou contaminação. A areia é caracterizada pelos elementos Si e O. As
análises de DRX indicaram, a presença de larnita, portlandita, calcita, biotita e
quartzo. Os resultados obtidos na pesquisa são importantes para a conservação e a
restauração deste tipo de material, pois auxiliam na investigação tecnológica para
futuras intervenções restaurativas adequadas. As informações adquiridas também
são essenciais para a documentação dos ladrilhos hidráulicos, como subsídio para
salvaguarda de sua técnica construtiva, para entender técnicas de produção,
procedência e uso.

Palavras-chave: Ladrilhos hidráulicos em Belém; história de ladrilhos hidráulicos;


tecnologia de ladrilhos hidráulicos; caracterização de ladrilhos hidráulicos.

7
ABSTRACT

In the city of Belém, floor tiles are present in several buildings, especially the ones
from the 40’s and 50’s, of the twentieth century, during its peak in production. This
construction material was applied in buildings of different social classes, and made
by local production. The decay of the floor tile fabrication occurred at the same time
in which new construction materials arrived in the city, such as “São Caetano” type.
Currently, in restorative interventions, original floor tiles are normally substituted for
other materials. In most of the cases, this occurs due to the lack of knowledge of
compatible restoration techniques. Floor tiles are composed of two main layers. The
first one is superficial and may be decorated and have relief made of pigmented
white cement. The second one is thicker and constituted by cement, sand, and
sometimes rock powder. Floor tiles are known for its performance against wear, to its
ease of maintenance, and presentation of different esthetic value, for being rustic and
elegant. This research aims to study floor tiles from the XX and XXI centuries in
Belém, in a historic and technological approach. This study was divided in three main
parts: 1) historical survey; 2) technological studies; 3) laboratorial investigation. The
first part covers research on floor tiles origin, typological evolution, production
technologies, and also conservation and restoration. Such information was found in
original sources, such as records from Pará’s State Governors, and catalogues of tile
manufacturers, among others. The second part consists in the investigation of floor
tiles production, with factories visiting in several cities, and interviews with heirs and
employees in factories. The last part covers the physical, mineralogical and chemical
characterization of floor tiles samples. First, the samples were mapped according to
weathering actions with the use of the software CorelDraw 15. The physical
characterization was divided into the following steps: 1) identification of the samples’
factory; 2) samples measurement; 3) evaluation of the colors on the sampling with
the use of a colorimeter; 4) water absorption tests; 5) density test with the use of
Hubbard’s picnometer; 6) hardness tests; 7) abrasion tests; 8) morphological
analysis, with the use of optical microscopy and Scanning Electron Microscope
(SEM); 9) probable trace analysis; 10) grains analysis. For mineralogical and
chemical characterization it was used X-Ray Diffraction (XRD) and X-Ray
Fluorescence (XRF), respectively. Through the historical and technological research
it was possible understanding the basis of floor tiles in Belém, and the occurrence of
8
several local factories in the nineteenth and twentieth centuries, such as A. Pinheiro
Filho e Cia, of great participation in the city’s production. Through the laboratorial
analysis it was possible to observe that the samples used in the research are square
shaped, varying from 15 to 20 centimeters. The samples are of low porosity, between
5 and 12%, and abrasion resistant. Microscope’s images show a homogenous
matrix, and particles with different shapes and sizes distributed along the sampling.
The colorimeter indicated variations in colors among the sampling. The chemical
analysis indicated mainly Ca, Si and Al, elements from the cement, and Fe, Mn and
Cu for the pigments used for coloring, for the colors yellow, brown and blue,
respectively. Elements such as Ti, Na and Cl are also present, suggesting the
addition of components that provide other functions or sample’s contamination. The
sand used is characterized by Si and O. Mineralogical analysis indicated larnite,
portlandite, calcite, biotite, and quartz. The results obtained on the research are
important for conservation and restoration of floor tiles: they improve technological
investigation for future interventions. The information acquired are also essential for
this construction material documentation, as subside for the safeguard of its
manufacturing techniques, as well as to understand its production, origin and use.

Key-words: Floor tiles in Belém; floor tiles history; floor tiles technology; floor tiles
characterization.

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LISTA DE FIGURAS
Figura 1: Rua João Alfredo, a artéria comercial mais importante da cidade, em 1908. ....................... 19
Figura 2: Palacete Vitor Maria da Silva: (A) lavatório em porcelana decorada inglesa, (B) painel de
azulejos franceses da fábrica Choisy Le Roi, (C) forro em chapas metálicas decoradas e (D) ladrilhos
cerâmicos. ............................................................................................................................................. 20
Figura 3: Ladrilhos aplicados na parede do hall de entrada do Solar do Barão de Guajará em Belém.
............................................................................................................................................................... 21
Figura 4: Fábrica da Phebo em Belém ................................................................................................. 22
Figura 5: Seção transversal de ladrilho hidráulico que indica as camadas que o constituem. ............ 23
Figura 6: Sala de refeições do Instituto Lauro Sodré ............................................................................ 24
Figura 7: Comparação entre (A) mosaico de pedra e ladrilho hidráulico, (B) azulejo e ladrilho
hidráulico e (C) ladrilho cerâmico e ladrilho hidráulico. ........................................................................ 28
Figura 8: Exemplos de prensas mecânicas utilizadas para fabricação de ladrilhos hidráulicos: (A) de
mão, (B e C) prensa parafuso e (D) prensa hidráulica para fabricação de ladrilhos ............................ 30
Figura 9: Anúncio em periódico referente à premiação da fábrica Orsola, Solá e Compañia .............. 32
Figura 10: (A) Forma utilizada para a fabricação do ladrilho hidráulico de Gaudí e (B) o ladrilho
hidráulico pronto .................................................................................................................................... 33
Figura 11: Catálogo da fábrica Devesas contendo imagens de ladrilhos cerâmicos (A) e ladrilhos
hidráulicos (B)........................................................................................................................................ 34
Figura 12: Fábrica de Ladrilhos Lunardi & Machado, (A) antes e (B) depois de 1990 ......................... 37
Figura 13: Anúncio da Emanuele Cresta & Comp. no Almanak da Cidade de Minas .......................... 38
Figura 14: Fábrica de Mosaicos, uma das fábricas mais antigas de ladrilho hidráulico do Brasil ........ 39
Figura 15: Galpão de produção da fábrica Dalle Piagge. ..................................................................... 40
Figura 16: (A) Imagem da capa do catálogo da A. Pinheiro Filho e (B) artefatos de marmorite
produzidos por ela ................................................................................................................................. 43
Figura 17: Ladrilhos produzidos na A. Pinheiro Filho assentados na capela do Colégio Marista ........ 44
Figura 18: Anúncio da fábrica de ladrilhos e marmorite Hercules ........................................................ 46
Figura 19: Ladrilhos hidráulicos antigos aplicados atualmente em balcão de uma padaria em
Belém/PA............................................................................................................................................... 47
Figura 20: (A) Ladrilho hidráulico do Colégio Santo Antônio e (B) ladrilho cerâmico do Palacete do
Parque da Residência. .......................................................................................................................... 49
Figura 21: Variação de tonalidade de acordo com o cimento utilizado ................................................ 54
Figura 22: Fábrica de ladrilhos hidráulicos em atividade no final do séc. XIX ...................................... 56
Figura 23: Operário manuseando a prensa hidráulica. ......................................................................... 57
Figura 24: (A) Depósitos com as misturas de cimento branco com pigmentos a serem utilizados nos
ladrilhos hidráulicos, (B) derramamento da mistura no gabarito com o “calchalote”. ........................... 58
Figura 25: (A) Adição da massa de cimento e (B) ladrilho hidráulicos sendo pressionados. ............... 59
Figura 26: (A) Ladrilhos hidráulicos secando em estantes, (B) tanque onde os ladrilhos hidráulicos são
imersos para a cura e (C) resultado final. ............................................................................................. 60
Figura 27: Composição de ladrilhos hidráulicos (A) geométricos e (B) florais. .................................... 61
10
Figura 28: (A) faixas sendo utilizadas como moldura, (B) rodapé em faixa de ladrilho hidráulico. ...... 62
Figura 29: (A) ladrilhos hidráulicos sextavados e (B) composição de ladrilhos hidráulicos oitavados
com tozetos. .......................................................................................................................................... 63
Figura 30: Exemplo de padrões de ladrilhos hidráulicos semelhantes, porém com procedência
distinta. (A) Salvador Bulet y Cia, Barcelona-Espanha, (B) Procedência desconhecida e (C) Mosaic
del Sur, Málaga-Espanha. ..................................................................................................................... 64
Figura 31: Eflorescência salina nos ladrilhos da parede do Solar Barão de Guajará. ......................... 66
Figura 32: Piso em ladrilho hidráulico com fissuras devido à acomodação do terreno, na Farmácia
República (Belém/PA). .......................................................................................................................... 67
Figura 34: Piso em ladrilho hidráulico com fissuras decorrentes de processos de dilatação térmica, na
igreja de São Pedro dos Clérigos, em Salvador (BA). .......................................................................... 68
Figura 35: Remoção de ladrilho hidráulico de maneira imprópria, no antigo cinema de Cachoeira (BA).
............................................................................................................................................................... 68
Figura 37: Pisos desgastados por abrasão. .......................................................................................... 69
Figura 38: Piso com diferentes tipos de deposição: tinta, argamassa e poeira, na Farmácia República
(Belém, PA). .......................................................................................................................................... 69
Figura 33: Ladrilhos hidráulicos com lacunas, sendo (A) com preenchimento e (B) sem
preenchimento. ...................................................................................................................................... 70
Figura 36: Peça de ladrilho hidráulico apresentando sulco produzido por Makita. .............................. 71
Figura 39: Peças de ladrilho hidráulico apresentando mudança de cor. .............................................. 71
Figura 40: Piso da biblioteca do Colégio Nazaré (Belém, PA) com aspecto brilhoso. ......................... 72
Figura 42: (A) algas na superfície de ladrilhos hidráulicos, (B) plantas localizadas nas juntas. .......... 73
Figura 43: Excrementos de pombos depositados no piso. ................................................................... 74
Figura 44: (A) Pisos em ladrilhos hidráulicos com preenchimento de cimento e (B) e substituição. ... 75
Figura 45: (A) Antes e (B) depois da peça restaurada pelo IEPHA/MG ............................................... 77
Figura 46: Processo de aplicação de novos ladrilhos hidráulicos. (A) Piso em ladrilho hidráulico
apresentando lacuna, (B) contrapiso nivelado, (C) assentamento das réplicas e (D) resultado final .. 78
Figura 47: Piso coberto com papelão e gesso ...................................................................................... 79
Figura 48: Piso com a aplicação do emplasto ...................................................................................... 81
Figura 49: (A) Antes e (B) depois (B) da aplicação do ácido oxálico.................................................... 82
Figura 50: Peças de vidro com plotagem substituindo ladrilhos hidráulicos originais. ......................... 82
Figura 51: Aluna do CECI restaurando ladrilho hidráulico. ................................................................... 84
Figura 52: (A) área do piso, na qual já foram tiradas as peças originais, (B) ladrilhos originais
empilhados pós-remoção e (C) caixa contendo as peças de substituição. .......................................... 85
Figura 53: Piso apresentando ladrilhos novos e ladrilhos antigos. ....................................................... 86
Figura 54: Desenho esquemático da avaliação das dimensões dos ladrilhos hidráulicos. .................. 90
Figura 55: Espectrocolorímetro PANTONE COLORCUE e tabela de cores PANTONE...................... 90
Figura 56: (A) Corte da amostra e (B) pesagem em balança técnica (B). ............................................ 91
Figura 57: (A) Picnômetro de Hubbard cheio de mercúrio, (B) pesagem do picnômetro com mercúrio
em balança semi-analítica, (C) picnômetro com mercúrio e a amostra e (D) pesagem da amostra. .. 92
11
Figura 58: Equipamento para teste de abrasão: abrasímetro .............................................................. 93
Figura 59: Amostra dividida por camadas. ............................................................................................ 95
Figura 60: Ataque ácido às amostras. .................................................................................................. 95
Figura 61: Filtragem do material suspenso. .......................................................................................... 96
Figura 62: Difratômetro de Raios-X do Laboratório de Caracterização Mineral do Instituto de
Geociências da UFPA. .......................................................................................................................... 97
Figura 63: Metalizador do LABMEV do Instituto de Geociências da UFPA. ........................................ 98
Figura 64: Dimensionamento e configuração do tardoz das amostras. ............................................. 101
Figura 65: Imagem de MEV de seção transversal da amostra AM-4. ................................................ 103
Figura 66: Identificação das camadas na amostra AM-8. ................................................................... 104
Figura 67: Identificação das amostras de superfície lisa e das amostras de superfície áspera. ....... 104
Figura 68: Imagens de MEV identificando as características morfológicas dos ladrilhos de superfície
lisa. ...................................................................................................................................................... 106
Figura 69: Imagem de MEV da amostra AM-6. ................................................................................... 107
Figura 70: Imagem de MEV da amostra AM-7. ................................................................................... 108
Figura 71: Imagem de MEV da amostra AM-8. ................................................................................... 108
Figura 73: Separação das amostras por tipo de agregado. ................................................................ 112
Figura 74: Digrafograma da amostra AM-1. ........................................................................................ 113
Figura 75: Caracterização química por MEV/SED da amostra AM-1 ................................................. 114
Figura 76: Difratograma da amostra AM-2. ......................................................................................... 115
Figura 77: Caracterização química por MEV/SED da amostra AM-2. ................................................ 115
Figura 78: Difratograma da amostra AM-3. ......................................................................................... 116
Figura 79: Caracterização química por MEV/SED da amostra AM-3. ................................................ 116
Figura 80: Difratograma da amostra AM-4. ......................................................................................... 117
Figura 81: Caracterização química por MEV/SED da amostra AM-4. ................................................ 117
Figura 82: Difratograma representativo das amostras AM-5, AM-6, AM-7 e AM-8. ........................... 118
Figura 83: Caracterização química por MEV/SED das amostras AM-5, AM-6, AM-7 e AM-8. .......... 118
Figura 84: Difratograma da amostra AM-9R. ...................................................................................... 119
Figura 85: Caracterização química por MEV/SED da amostra AM-9R. ............................................. 119
Figura 86: Difratograma da amostra 10R. ........................................................................................... 120
Figura 87: Caracterização química por MEV/SED da amostra AM-10R. ........................................... 120
Figura 88: Difratograma da amostras AM-11R. .................................................................................. 121
Figura 89: Caracterização química por MEV/SED da amostra AM-11R. ........................................... 121
Figura 90: Difratograma da amostra AM-12R. .................................................................................... 122
Figura 91: Caracterização química por MEV/SED da amostra AM-12R. ........................................... 122
Figura 92: AM-1 com fragmentação total e parcial. ............................................................................ 124
Figura 93: Amostra AM-5 apresentando fissuras................................................................................ 125
Figura 94: Amostras AM-2 e AM-5 apresentando sujidade. ............................................................... 125
Figura 95: (A) Amostra AM-4 com deposição de pingos de tinta e (B) amostra AM-1 com deposição de
argamassa. .......................................................................................................................................... 126
12
Figura 96: Amostra AM-11R com eflorescência. ................................................................................ 126
Figura 97: Alteração cromática na amostra AM-7............................................................................... 127
Figura 98: Marca causada pela máquina de corte na amostra AM-11R. ........................................... 127
Figura 99: Imagem-resumo das etapas de caracterização, diagnóstico e intervenção. ..................... 136

13
LISTA DE TABELAS

Tabela 1: Relação das amostras da pesquisa........................................................................ 88


Tabela 2: Classificação das cores da decoração dos ladrilhos hidráulicos de acordo com a
tabela de referência PANTONE.............................................................................................. 102
Tabela 3: Traço provável da camada inferior das amostras................................................... 109
Tabela 4: Absorção total em água e massa específica das amostras.................................... 110
Tabela 5: Desgaste das amostras por meio do teste de abrasão........................................... 110
Tabela 6: Percentual de desgaste em pedras ornamentais.................................................... 111
Tabela 7: Composição química das amostras........................................................................ 121

14
LISTA DE SIGLAS
APD – Automatic Powder Diffraction
CECI – Centro de Estudos Avançados de Conservação Integrada
DRX – Difratometria de Raios-X
EDTA – Ácido etilenodiamino tetra-acético
FAU – Faculdade de Arquitetura e Urbanismo
ICDD – Internacional Center for Diffraction Data
IEPHA/MG – Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais
IG – UFPA – Instituto de Geociências da Universidade Federal do Pará
IPHAN – Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional
LACORE – Laboratório de Conservação, Restauração e Reabilitação
LCM – Laboratório de Caracterização Mineral
MEV – Microscopia Eletrônica de Varredura
MEV/SED – Microscopia Eletrônica de Varredura com sistema de energia dispersiva
NBR – Norma Brasileira
NOSELOUR – Nossa Senhora de Lourdes
NTPR – Núcleo de Tecnologia da Preservação e da Restauração
SCIAL – Sociedade de Construções e Indústrias Anexas
UFBA – Universidade Federal da Bahia
UFPA – Universidade Federal do Pará

15
SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO........................................................................................... 18

2 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA...................................................................... 27
2.1 CONTEXTO HISTÓRICO.......................................................................... 27
2.1.1 Contexto internacional............................................................................ 27
2.1.2 Contexto nacional.................................................................................... 36
2.2 SEMELHANÇAS E DIFERENÇAS ENTRE LADRILHOS HIDRÁULICOS
E LARILHOS CERÂMICOS....................................................................... 49
2.3 PRODUÇÃO DE LADRILHOS HIDRÁULICOS.......................................... 51
2.3.1 Matéria-prima utilizada............................................................................ 51
2.3.2 Etapas da produção................................................................................. 55
2.4 VARIAÇÕES TIPOLÓGICAS..................................................................... 60
2.5 FATORES DE DEGRADAÇÃO.................................................................. 65
2.5.1 Agentes físicos......................................................................................... 65
2.5.2 Ataque químico........................................................................................ 72
2.5.3 Agentes biológicos.................................................................................. 72
2.6 TÉCNICAS JÁ USADAS EM CONSERVAÇÃO E RESTAURAÇÃO DE
LADRILHOS HIDRÁULICOS..................................................................... 74

3 MATERIAIS E MÉTODOS.........................................................................
88

4 RESULTADOS E DISCUSSÕES............................................................... 100


4.1 CARACTERIZAÇÃO FÍSICA...................................................................... 100
4.2 CARACTERIZAÇÃO MINERALÓGICA E QUÍMICA.................................. 111
4.3 IDENTIFICAÇÃO DAS PATOLOGIAS NA AMOSTRAGEM...................... 123

5 CONCLUSÕES.......................................................................................... 129

6 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.......................................................... 138

7 ANEXOS.................................................................................................... 144

16
17
1 INTRODUÇÃO

A cidade de Belém, capital do Pará, foi fundada em 12 de janeiro de 1616, por


Francisco José Caldeira Castelo Branco. As primeiras construções constituíram os
dois núcleos iniciais denominados de Cidade e Campina.

Relatos de viajantes do século XVIII e meados do XIX1 descrevem a cidade


de Belém com aspecto de aldeia em função da simplicidade da maioria das
construções, principalmente da arquitetura civil, cujos materiais empregados foram
aqueles que a região poderia oferecer, ou seja, o barro, a madeira, a palha e as
pedras. No entanto, algumas construções, como igrejas e palácios, já se
destacavam nesse cenário, pela sua arquitetura monumental, principalmente a partir
de 1753, com a chegada do arquiteto italiano Antônio José Landi, cujos projetos
contribuíram para mudar ainda mais a aparência da cidade.

A arquitetura de Landi introduz o estilo neoclássico em Belém, mas é só a


partir de meados do século XIX até o início do século XX que a cidade iria passar
por profundas modificações patrocinadas pela riqueza gerada na economia da
borracha. As ruas passaram a ser pavimentadas e as edificações construídas com
materiais nobres importados da Europa. Belém se revela como uma das principais
cidades brasileiras, cuja aparência em nada se assemelhava aos relatos mais
antigos (Figura 1).

1
BATES, Henry Walter. Um naturalista no rio Amazonas. Belo Horizonte: Itatiaia; São Paulo: Ed.
da Universidade de São Paulo, 1979.

18
Figura 1: Rua João Alfredo, a artéria comercial mais importante da cidade, em 1908. Fonte:
Lemos, 1902 – 1909 .

As modificações foram também impulsionadas pelo código de posturas


municipal de Antônio José de Lemos, intendente de Belém entre os anos de 1897 a
1912, que obrigava a substituição de beirais por platibandas com sistema de
captação de águas pluviais, a eliminação das “puxadas”2 das edificações, entre
outras, em prol de melhores condições de higiene na cidade e nas suas edificações.

O período da borracha também provocou mudanças culturais nas pessoas


que residiam em Belém. A cidade tornou-se palco também de intensa vida social,
com reuniões, bailes e espetáculos de ópera. Esses eventos faziam parte do
cotidiano das pessoas mais “bem nascidas” e para atender a estas atividades as
edificações passaram a ter salões ricamente ornamentados com pinturas artísticas,
chapas metálicas estampadas, ladrilhos, azulejos etc., tudo importado, resultado do
intenso comércio entre Belém, a Europa e os Estados Unidos. A residência Victor
Maria da Silva é um dos exemplos mais representativos dessa época (Figura 2).

2
As "puxadas" seguiam o modelo tradicional português, com ambientes anti-higiênicos, sem
ventilação e iluminação natural, e com ambientes que eram verdadeiras estufas, provocadas pela
colocação de extensos planos envidraçados.
19
A B

C D
Figura 2: Palacete Vitor Maria da Silva: (A) lavatório em porcelana decorada inglesa, (B) painel
de azulejos franceses da fábrica Choisy Le Roi, (C) forro em chapas metálicas decoradas e (D)
ladrilhos cerâmicos.

Os mais avançados produtos de construção das principais fábricas europeias


foram utilizados nas edificações de Belém. No que se refere aos revestimentos de
piso, a mudança foi significativa pois, do século XVII ao início do século XIX, os
materiais empregados como revestimentos correspondiam à madeira em tábuas
espessas e largas aplicadas uma ao lado da outra, sem a preocupação de formar
desenhos geométricos ou outros tipos de composição; a tijoleira, principalmente nas
igrejas, fortificações, palácios; e o lioz, mas, em termos de piso, este ficou muito
restrito às calçadas de Belém, às soleiras das mais diversas edificações e às lápides
de túmulos dentro das igrejas.

Com as facilidades advindas pelo intenso comércio a partir de meados do


séc. XIX, surgem outros tipos de revestimentos. A madeira, mesmo sendo, ainda, de
origem local, passou a ser aplicada diferentemente de até então, com composições
constituídas por mais de um tipo de madeira e formando composições geométricas,
20
com técnica de parquetagem. O lioz continuou a ser muito utilizado. A novidade
estava em outros tipos de pedras e nos ladrilhos.

Os ladrilhos foram muito utilizados em áreas externas e no pequeno hall que


antecede à escada que dá acesso ao interior da edificação. Em alguns casos, como
no Solar do Barão de Guajará (Figura 3), foi aplicado na parede. Além de atribuir
beleza pelas suas cores e composições geométricas e/ou orgânicas, os ladrilhos
proporcionaram melhores condições de limpeza nestes ambientes.

Figura 3: Ladrilhos aplicados na parede do hall de entrada do Solar do Barão de Guajará em


Belém.

A higiene e a resistência levaram o ladrilho a ser utilizado também no interior


de fábricas de Belém, pela necessidade de manter o piso sempre limpo e de
suportar o peso das máquinas (Figura 4).

21
Figura 4: Fábrica da Phebo em Belém (Fonte: www.ibge.gov.br).

São dois os tipos de ladrilhos que chegaram a Belém, o cerâmico e o


hidráulico, que apesar de terem a aparência muito semelhante, inclusive com os
mesmos desenhos e cores, e serem materiais que passam por processos de
moldagem, prensagem e secagem, são completamente distintos quanto à técnica de
produção e à matéria prima utilizada. O ladrilho cerâmico corresponde a um material
produzido com pasta cerâmica (argilas e óxidos metálicos) queimada a altas
temperaturas. Já o ladrilho hidráulico é elaborado com cimento e pigmentos. Este
trabalho se dedicará a estudar o ladrilho hidráulico, que corresponde ao material
utilizado com maior frequência em Belém, além de ter sido produzido nesta cidade.

Segundo a NBR 94573, o ladrilho hidráulico é uma placa de concreto de alta


resistência ao desgaste para acabamento de paredes, pisos internos e externos,
contendo uma superfície lisa ou em relevo, colorida ou não, de formato quadrado,
retangular ou outra forma geométrica definida.

3
ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 9457: Ladrilhos hidráulicos –
Especificação. Rio de Janeiro, 1986.
22
Esta definição, porém, não está completamente correta, pois o ladrilho
hidráulico não pode ser tratado como uma placa de concreto, já que não apresenta
agregado graúdo em sua composição. Ele é uma placa de cimento.

Eles são constituídos por duas camadas facilmente reconhecidas, a


decorativa e a base. A primeira é a parte superior do material que fica aparente
quando assentado. A segunda corresponde ao suporte da decoração, e geralmente
apresenta impresso no seu tardoz4, o nome e/ou a marca da fábrica que o produziu.

A grande diferença do ladrilho para outros revestimentos é que ele não tem
uma camada de pintura e nem possui impressão, mas sim uma camada decorada
por volta de 5 mm, o que garante a maior durabilidade da decoração (Figura 5).

Camada decorativa

Camada inferior

Figura 5: Seção transversal de ladrilho hidráulico que indica as camadas que o constituem.

O ladrilho hidráulico possui diferentes significados em função das linguagens


de diferentes culturas. A expressão mais antiga que se conhece é a de “mosaico”5.
Apesar da denominação “mosaico” ser muito utilizada para ladrilhos hidráulicos, este
termo deve ser considerado impróprio, pois a definição de mosaico é o conjunto de
peças, cerâmicas, de pedra, de vidro ou outro material, embutidas em um plano,
formando desenhos ou não.

No Brasil é chamado ladrilho o material em placas regulares para pavimentos,


que pode ser cerâmico ou de cimento. A denominação ladrilho hidráulico dá-se por
ser um material para revestimento fabricado a partir de cimento hidráulico.

4
Tardoz corresponde à face inferior do ladrilho.
5
ORTEGA, Carmen; LORA, Ana Mitila. El Mosaico Hidráulico: Arte em evolucioón. República
Dominicana: Grafisfon, 2008, p. 26.
23
Apesar da sua importância histórica e estética, o ladrilho hidráulico é
constantemente substituído por outro tipo de material nas intervenções em
edificações da cidade de Belém, por diversos motivos. Entre eles pode-se citar: 1) a
ideia equivocada da “volta ao original” na arquitetura religiosa, de modo a substituir o
ladrilho assentado posteriormente à construção por tijoleira atual, esta sem valor
histórico e estético; e 2) o nível de desgaste das peças aliado ao desconhecimento
dos meios técnicos adequados à sua conservação.

Um dos exemplos mais marcantes de remoção de ladrilhos diz respeito à


Igreja de Sant’Anna, edificação do século XVIII, restaurada recentemente, cujos
ladrilhos foram desenhados por Joseph Casse, segundo relatos do historiador Aldrin
Figueiredo. Provavelmente em função do estado de conservação da tijoleira original
e diante da novidade de produção local, os ladrilhos foram provavelmente lá
assentados na primeira década do século XX e estavam inseridos na unidade
artística do monumento, contribuindo assim para o valor estético do mesmo. A
substituição por novas tijoleiras descaracterizou a edificação e não alcançou o
mesmo efeito adquirido pelo ladrilho ao longo desses anos.

Outra edificação que teve seus ladrilhos removidos foi o Instituto Lauro Sodré,
atual Tribunal de Justiça do Estado. A edificação possuía uma grande variedade de
ladrilhos hidráulicos (Figura 6), provavelmente produzidos pela fábrica paraense A.
Pinheiro Filho e Cia Ltda. uma vez que todos estão no catálogo de produtos
cimentícios da referida indústria. Os ladrilhos foram substituídos por porcelanato, o
que contribuiu significativamente para a descaracterização da edificação.

Figura 6: Sala de refeições do Instituto Lauro Sodré (Fonte: Pará, SECULT, 1998).
24
Dessa maneira, o objetivo deste trabalho consiste em estudar o ladrilho
hidráulico, sob o viés histórico e tecnológico, da cidade de Belém de modo a traçar
subsídios para a sua conservação e restauração.

Os objetivos específicos dessa pesquisa consistem em:

 Identificar o contexto histórico da comercialização e produção dos


ladrilhos hidráulicos, o início e o auge da utilização deste material em
Belém;
 Caracterizar o processo de fabricação do ladrilho e os materiais
utilizados na sua produção;
 Identificar prováveis diferenças e/ou semelhanças entre ladrilhos
hidráulicos antigos e réplicas produzidas atualmente;
 Caracterizar fisicamente o ladrilho hidráulico e sua composição química
e mineralógica, de modo a identificar os melhores meios de
preservação deste material.

25
26
2 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

2.1 CONTEXTO HISTÓRICO

O ladrilho hidráulico está presente em vários locais do mundo. A


contextualização histórica do surgimento e aplicação do material em diversos locais
subsidia o entendimento da importância do mesmo como patrimônio artístico e
histórico.

2.1.1 Contexto internacional

O cimento revolucionou a indústria da construção e passou a ser utilizado em


diversos elementos arquitetônicos, entre eles, o ladrilho hidráulico. Apesar das
diversas hipóteses quanto à origem dos ladrilhos hidráulicos, não há dúvidas de que
são derivados do cimento tipo Portland.

O ladrilho hidráulico, assim como os elementos arquitetônicos em ferro e o vidro,


pode ser considerado exemplo de produto advindo pós Revolução Industrial que,
fabricado sob base artesanal, sobretudo, com aplicação de recursos relativamente
inovadores para a época, tem técnica de produção manufatureira que transcendeu e
se mantém viva, paralelamente ao processo industrial6.

A técnica usada para a fabricação de ladrilhos hidráulicos baseia-se na técnica


banchetto, que surgiu na Itália, no século XII7. A partir desta técnica, estima-se que a
fabricação de ladrilhos hidráulicos imitativos de mármores tenha surgido entre os
séculos XVII e XVIII na Itália, usando uma mistura de cal compactada em um molde
de ferro, com sucessivas camadas de cor adicionadas e polidas à mão8.

É comum no desenvolvimento de uma nova técnica que sua base esteja pautada
em técnicas antecedentes Observam-se também na técnica do ladrilho hidráulico

6
MACHADO, Luiz Gomes. Apresentação: texto para exposição “Se esta rua fosse minha”.
Museu da casa Brasileira. 2005. Disponível em: http://www.mcb.sp.gov.br.
7
NAVARRO, Mario Arturo Hernández. Puerto Rico Tile Designs. Pepinpress, 2012. p. 37.
8
JOYNT, Anna. Cuban Mortar Tiles. International Cooperation and Regeneration through the
Rediscovery of a Lost Craft. Havana: 2009. Faculty of Architecture, University of Havana, s/p.
27
elementos residuais de outros revestimentos precedentes, como dos azulejos, dos
ladrilhos cerâmicos e dos mosaicos.

Na Figura 7 podem-se notar, comparativamente, as semelhanças entre ladrilhos


hidráulicos (organizados na linha inferior) e exemplos anteriores de mosaico de
pedra, azulejo antigo e ladrilho cerâmico (linha superior). Claramente, a composição
formal, padrões e cores denotam a influência de mosaicos, azulejos e ladrilhos
cerâmicos antigos na decoração dos ladrilhos hidráulicos.

A B C

Figura 7: Comparação entre (A) mosaico de pedra e ladrilho hidráulico, (B) azulejo e
ladrilho hidráulico e (C) ladrilho cerâmico e ladrilho hidráulico.

Detalhadamente, observa-se: (A) o ladrilho hidráulico replica o desenho


reticulado do mosaico; (B) semelhança na composição formal dos padrões
decorativos entre azulejo e ladrilho hidráulico e (C) repetição de padrão formal
decorativo com alteração somente das cores entre ladrilho cerâmico e ladrilho
hidráulico.
Alguns países destacam-se na produção e popularização dessa técnica como a
França, Espanha e Portugal, na Europa, o que viria influenciar a produção na
América Latina e no Brasil.

28
 França
Na França, o ladrilho hidráulico surgiu por volta de 1850, logo depois da
implantação da primeira fábrica de cimento no país, chamada Guilhon & Barthelemy,
a qual foi responsável pela fabricação e exportação de peças, moldes e todos os
utensílios necessários para a fabricação do ladrilho hidráulico para outras partes do
mundo. Além desses materiais ela fornecia, também, um manual explicativo com os
procedimentos necessários para o processo de fabrico e com a sugestão de que
cada fabricante buscasse o desenvolvimento de suas peças, com desenhos
próprios, estimulando a variedade de novas padronagens que se identificassem com
seu local de origem9.

Foi na França que o ladrilho hidráulico passou por uma revolução em seu
processo de fabricação, impulsionando sua produção. A Guilhon & Barthelemy, já
referida, introduziu a prensa hidráulica no processo de fabricação do ladrilho
hidráulico, o que proporcionou melhor qualidade ao produto final, já que, com a nova
prensa, as peças eram comprimidas com maior homogeneidade.

Antes da prensa hidráulica, as prensas utilizadas para compactação dos


ladrilhos hidráulicos eram de mão e, depois, em parafuso, necessitando maior
esforço físico em sua operação e, naturalmente, levando à diferença nos resultados
(Figura 8).

9
ORTEGA, Carmen; LORA, Ana Mitila. El Mosaico Hidráulico: Arte em evolución. República
Dominicana: Grafisfon, 2008, p. 39-42.
29
A B

C D
Figura 8: Exemplos de prensas mecânicas utilizadas para fabricação de ladrilhos hidráulicos:
(A) de mão, (B e C) prensa parafuso e (D) prensa hidráulica para fabricação de ladrilhos.
Fontes: (A) http://ardecol.inforoutes.fr, (B) Autora, (C) Segurado, s/d, (D) Autora.

As prensas manuais, em geral, não atingem pressão superior a 30 ou 50 quilos


por centímentro quadrado (3 à 5 MPa). Já as prensas hidráulicas podem atingir 150
quilos por centímetro quadrado (15 MPa)10.

O Institut Promoció de Ceràmica11 descreve que a mecanização do processo


permitiu o aumento da produção e a diminuição da fadiga do trabalhador,
ressaltando, contudo, que a produtividade é sempre limitada pelas operações
manuais, indispensáveis em todo o processo, principalmente na decoração.

Ressalte-se que a França foi a principal responsável pela propagação da técnica


de produção do ladrilho hidráulico, ao contribuir para a sistematização do processo

10
SEGURADO, João Emílio dos Santos. Biblioteca de instrução profissional: Materiais de
construção. Lisboa: Livraria Bertrand, 7ª ed., s/d, p. 152.
11
http://www.ipc.org.es/home.html.
30
de fabricação e introduzir e estimular o tema de propriedade dos desenhos. O uso
deste material expandiu-se assim pela Europa, Norte da África e América Latina.

Inicialmente, os ladrilhos hidráulicos revestiam pisos de ambientes importantes,


em edificações de alto padrão e em edifícios públicos. Porém, em meados do século
XX, seu uso foi popularizado e passou a ser utilizado em vivendas em várias cidades
francesas.

Seu esplendor ocorre em consonância ao Art Nouveau, no final do século XIX,


quando surgem modelos que reproduzem elaborados desenhos em linhas sinuosas
e composições assimétricas, preferencialmente com motivos de vegetais estilizados.

Devido à grande recessão no período entre as grandes guerras, os ladrilhos


hidráulicos caíram em desuso na Europa. A partir da década de 1960, foram
substituídos por outros materiais mais modernos no processo de reconstrução pós-
guerra e de renascimento econômico refletido na indústria da construção, resultando
no desaparecimento das fábricas de ladrilhos hidráulicos12.

 Espanha
A origem do ladrilho hidráulico é discutida por vários autores e, por vezes,
atribuída à diferentes países da Europa. Navarro 13, cita a Espanha como o país que
primeiro desenvolveu este tipo de material, sendo que a cidade de Barcelona seria a
pioneira na produção, iniciada a partir de 1857. O auge das produções ocorreu
durante o Art Nouveau, em 1880, e alcançou o mercado internacional.

Uma das fábricas mais importantes da Espanha é a Bustsems y Cia, que é


considerada a primeira do país, iniciando a produção de ladrilho hidráulico, em 1857.
Entre os arquitetos que fizeram parceria com esta fábrica figura a personalidade
marcante de Antoni Gaudí.

12
ORTEGA, Carmen; LORA, Ana Mitila. El Mosaico Hidráulico: Arte em evolución. República
Dominicana: Grafisfon, 2008, p. 44.
13
NAVARRO, Mário Arturo Hernádez. Havana tile designs. Singapura: Pepin Press, 2007, s/p.
31
Outras fábricas de grande reconhecimento na Espanha são as Orsola, Solá y
Compañia e a Garret, Rivet y Cia. A primeira destacou-se na exposição de
Barcelona em 1888, recebendo diploma de honra em Bruxelas, devido a seu
reconhecimento como maior produtora nacional e internacional, com grande
diversidade de modelos e ótima qualidade, enquanto a segunda caracterizava-se
como das mais tradicionais produtoras de ladrilhos hidráulicos no país14 (Figura 9 e
Anexo 1).

Figura 9: Anúncio em periódico referente à premiação da fábrica Orsola, Solá e Compañia.


Fonte: httpupload.wikimedia.orgwikipediacommons66fAnunci_orsola-sola.jpg.

A Escofet, Fortuna y Cia, fundada em 1886, também desfrutou de muito prestígio


e ficou conhecida por seus desenhos inovadores e rápida expansão por toda a
Espanha e América Latina. O arquiteto Antoni Gaudí contribuiu para esse sucesso
ao desenhar alguns modelos de ladrilhos hidráulicos para esta fábrica. Um exemplo
é o ladrilho hidráulico hexagonal, com tema marinho (Figura 10), produzido
especialmente para a casa Batlló (1904), que, no entanto, não foi utilizado nesta
edificação e, sim, na casa Milá (1906), do mesmo arquiteto.

14
ORTEGA, Carmen; LORA, Ana Mitila. El Mosaico Hidráulico: Arte em evolución. República
Dominicana: Grafisfon, 2008.
32
A B
Figura 10: (A) Forma utilizada para a fabricação do ladrilho hidráulico de Gaudí e (B) o ladrilho
hidráulico pronto. Fonte:ORTEGA y LORA, 2008.

Segundo o Institut Promoció de Ceràmica, nas primeiras décadas do século


XX, não havia cidade alguma ou município da Espanha que não possuísse fábricas
de “mosaico hidráulico”. De acordo com o anuário geral de construção, de 1958, em
fase inicial de declínio, havia 1.021 fábricas de mosaico hidráulico na Espanha,
sendo 151 na província de Madri, 109 em Barcelona, 42 em Bilbao, e 36 em
Alicante.

 Portugal
Em 1910, a fábrica Devesas, famosa por fabricar azulejos, lançou um
catálogo contendo específicações e imagens dos produtos oferecidos pela mesma.
Entre esses materiais, estão os ladrilhos hidráulicos e os ladrilhos cerâmicos (Figura
11). Algumas fábricas de azulejos produziam também ladrilhos cerâmicos. Outro
exemplo é a fábrica Villeroy & Boch, na Alemanha. Em Portugal, até o presente
momento, ainda não foi encontrada referência de outra fábrica que trabalhasse
principalmente com peças cerâmicas, e que produzisse, também, ladrilhos
hidráulicos.

33
LADRILHOS CERÂMICOS LADRILHOS HIDRÁULICOS

Figura 11: Catálogo da fábrica Devesas contendo imagens de ladrilhos cerâmicos (A) e
ladrilhos hidráulicos (B). Fonte: Catálogo Devesas, 1910.

Em Portugal, tem-se resgistro, também, da Sociedade de Construções e


Industrias Anexas, conhecida por Mosaicos SCIAL, de 1921, certamente uma das
principais fábricas do país. Seu objetivo era produzir ladrilhos hidráulicos de boa
qualidade, com arestas vivas e perfeitas, desenhos e cores inalteráveis e com
resistências compatíveis com os ladrilhos estrangeiros. A fábrica critica a produção
do material em outras fábricas, destacando que a matéria-prima e o processo
utilizado nas demais, não garantiam bom resultado15.

Os primeiros operários da SCIAL, os quais foram responsáveis por repassar


toda a técnica de fabricação dos ladrilhos hidráulicos para os operários portugueses

15
Sociedade de Construções e Industrias Anexas. Mosaicos Scial. Lisboa.
34
eram de Barcelona. O cimento utilizado na produção era importado da França:
Extra-Blanc LAFARGE e Gris LAFARGE. Os pigmentos também eram importados e
garantiam concentração nas cores empregadas.

 América Latina
A vinda dos ladrilhos hidráulicos da Europa para a América aconteceu devido
à grande imigração espanhola, no final do século XIX e início do XX, quando os
imigrantes trouxeram suas culturas e experiências de um negócio rentável, com
grande potencial de produção. Além disso, em 1867, a empresa Garreta, Rivet y Cia,
de Barcelona, exibiu sua coleção na Exposition Universelle de Paris. A sua
popularização extravasou as fronteiras do continente europeu para as colônias16.

Cuba foi o primeiro país da América Latina a fabricar ladrilhos hidráulicos. Por
volta de 1884 e, em 1899, já contava com quatro fábricas17.

A fábrica “A Cubana”, fundada em 1903, era considerada, na época, como a


maior fábrica do mundo, com suas instalações que ocupavam dez mil metros
quadrados. A fábrica era conhecida por utilizar ferramentas modernas e matéria-
prima de primeira qualidade, como areia, constituída somente por silicatos e livre de
sais, o que favorecia a qualidade das cores; cimento da indústria Lafarge e
pigmentos da Ritcher. Além disso, muitos de seus trabalhadores eram antigos
operários das fábricas Escofet, Orsola y Bustsems.

Antes do século XX, os modelos usados nos ladrilhos hidráulicos de Cuba,


em sua maioria, eram praticamente iguais aos de Barcelona. A fábrica La Havana,
entretanto, aumentou a concorrência no mercado, depois que passou a elaborar sua
própria coleção, utilizando cores e ornamentos diversos, fazendo com que a
variedade de padrões aumentasse consideravelmente no país inteiro. Os ladrilhos
hidráulicos passaram a ter desenhos compatíveis com a cultura local18.

16
NAVARRO, Mario Arturo Hernández. Puerto Rico Tile Designs. Pepinpress, 2012. p. 37.
17
ORTEGA, Carmen; LORA, Ana Mitila. El Mosaico Hidráulico: Arte em evolucioón. República
Dominicana: Grafisfon, 2008, p. 49.
18
NAVARRO, Mário Arturo Hernádez. Havana tile designs. Singapura: Pepin Press, 2007, p. 27.
35
No México, os ladrilhos chegaram por influência italiana e espanhola. Em
1885, Eugenio Talleri, de origem italiana, começou a importar algumas peças de
Milão e, posteriormente, de Barcelona, passando, em 1896, a produzir seus próprios
ladrilhos hidráulicos.

Em 1900, surgiu a segunda fábrica, de propriedade do alemão Wilhem


Stevens Sarto o qual, a princípio, importava toda a matéria-prima e o maquinário da
Alemanha.

Somente em 1910 o México passou a produzir seus próprios ladrilhos


hidráulicos, iniciando a popularização do material no país e, consequentemente, a
abertura de diversas fábricas.

Os ladrilhos hidráulicos espanhóis também influenciaram o início da produção


na Argentina. Em 1896, o espanhol José Maria Cirtés fundou a Mosaicos
Tradicionales Argentinos, uma das primeiras fábricas de pisos em Buenos Aires,
passando a líder de mercado e, décadas depois, convertendo-se em exportador da
mercadoria para países da Europa. Também, no século XX, a Argentina já exportava
ladrilhos hidráulicos para o Brasil, Paraguai, Bolívia e Chile.

2.1.2 Contexto nacional


No Brasil, este material foi importado principalmente de Portugal, da França,
da Bélgica e da Alemanha. Foi no final do século XIX que os segredos das técnicas
de manufatura do ladrilho hidráulico foram passados aos imigrantes residentes no
Brasil e, então, começaram a ser instaladas aqui as primeiras fábricas.

 Minas Gerais
A primeira fábrica de ladrilhos hidráulicos do Brasil foi fundada em Juiz de
Fora/MG, em 1889. Depois foi transferida para Belo Horizonte/MG, em 1896. O
fundador da fábrica foi o italiano Giovanni Lídio Lunardi, neto de Giovanni Lunardi,
que foi presidente sindical das Indústrias de Ladrilhos Hidráulicos e Produtores de
Cimento de Belo Horizonte.

36
A fábrica Lunardi & Machado era localizada na área comercial central da
capital mineira, na Rua Curitiba, 158, em uma área de quatro mil metros quadrados.
A fábrica possuía máquinas elétricas da fábrica francesa A. Guilhon et Fils, as quais
podiam produzir diariamente quatro mil ladrilhos hidráulicos de variadas cores e
desenhos. O maquinário da fábrica era composto por oito prensas hidráulicas, uma
bateria de bombas hidráulicas, um moinho para tintas e um britador, tudo acionado
por um motor inglês de vinte cavalos.

Além de ladrilhos hidráulicos, a fábrica produzia, também, artefatos de


cimento armado, como manilhas de “qualquer diâmetro”, soleiras, banheiras,
degraus, ornamentos para fachada de prédios e outros. Era também oficina
marmoarista19.

A Figura 12 mostra a fachada da loja e fábrica de ladrilhos hidráulicos da


família Lunardi, em Belo Horizonte, em dois momentos distintos. Apesar da imagem
“A” não ser datada, pode-se perceber que deve ser anterior a 1900, já que o cartão
postal é desta data “B”. A fábrica já tinha sofrido reformas em sua fachada.

B
A

Figura 12: Fábrica de Ladrilhos Lunardi & Machado, (A) antes e (B) depois de 1990. Fonte:
LLOYD, 1913.

19
LLOYD, Reginald. Impressões do Brazil no Século Vinte. Londres: Lloyd's Greater Britain
Publishing Company, 1913, p. 765.
37
Quando da construção de Belo Horizonte, como a nova capital de Minas
Gerais, foram importados diversos materiais construtivos do Rio de Janeiro para as
obras. Na apresentação desses materiais eram utilizados catálogos de divulgação
dos produtos, como o caso da Emanuele Cresta & Comp, que, dentre diversos
materiais, fornecia também ladrilhos hidráulicos20 (Figura 13). Nesse período, as
fábricas A Predial, Antiga Fábrica e Empresa Industrial, atendiam a demanda local
por ladrilhos hidráulicos.

Figura 13: Anúncio da Emanuele Cresta & Comp. no Almanak da Cidade de Minas. Fonte: Lima,
1900.

Nas três primeiras décadas do século XX foram abertas mais duas fábricas, a
Indústria Nacional e a Fábrica de Ladrilhos e Oficina Artística de Mármore Lupini &
Comp.

20
CAMPOS, Cláudia Fátima. História do Ladrilho Hidráulico em Belo Horizonte. 2011.
Dissertação (Mestrado em Ambiente Construído e Patrimônio Sustentável) – Universidade Federal
de Minas Gerais, p. 94.
38
Na década de 1940 existiam seis fábricas de ladrilhos hidráulicos, em Minas
Gerais21.

 Rio Grande do Sul


A Fábrica de Mosaicos localizada em Pelotas/RS é uma das fábricas mais
antigas do país ainda em funcionamento. Fundada em 1914, a fábrica surgiu em
meio a uma efervescência econômica no país e disputava o mercado com mais
dezesseis fábricas de ladrilhos hidráulicos22. Em consonância à prosperidade
econômica, vieram também grandes artistas e arquitetos estrangeiros. Com isso, o
gosto pelo ladrilho hidráulico tornou-se mais presente. A Fábrica de Mosaicos
(Figura 14) possui, ainda hoje, mais de 300 modelos, do início do século, nos mais
diversos padrões: art nouveau, art deco, florais e geométricos23.

Figura 14: Fábrica de Mosaicos, uma das fábricas mais antigas de ladrilho hidráulico do Brasil.
Fonte: www.fabricademosaicos.com.br.

Apesar da importância e recorrência de uso do ladrilho hidráulico no país, há


poucos registros sobre este material, mesmo com sua constante presença nas
edificações e calçadas de cidades históricas. Considerando a relevância desse
material, foi desenvolvido em Pelotas um inventário dos ladrilhos hidráulicos usados

21
CAMPOS, Cláudia Fátima. História do Ladrilho Hidráulico em Belo Horizonte. 2011.
Dissertação (Mestrado em Ambiente Construído e Patrimônio Sustentável) – Universidade Federal de
Minas Gerais, p. 94-95.
22
http://fabricademosaicos.com.br/
23
LEÓN, Zênia de. Pelotas: casarões contam sua história. 2ª edição. Editora: Dm. Hofstatter. 1º
Vol. 1993, p. 257.
39
em calçadas da cidade, reconhecendo esse instrumento de registro como um
importante passo para a preservação de bens culturais24.

 São Paulo
Em São Paulo, a fábrica Dalle Piage, uma tradicional produtora de ladrilhos
hidráulicos, está em funcionamento desde 1922. Seu nome é inspirado em seu
fundador, o italiano Federico Dalle Piagge, um dos precursores da técnica no Brasil.
A fábrica Dalle Piagge, assim como diversas outras fábricas de ladrilhos hidráulicos,
passou por um período de estagnação entre 1960 e 2000, tendo sido fechada neste
período. Foi, entretanto, reaberta pela quarta geração da família em 2000.
Atualmente a Dalle Piagge é uma das fábricas mais importantes do país (Figura 15).

Figura 15: Galpão de produção da fábrica Dalle Piagge.

Outra fábrica de ladrilhos hidráulicos tradicional de São Paulo/SP é a Ornatos.


Ela tem a sua origem na década de 30, porém fechou as portas na época de crise
do material. Já na década de 80, voltou a funcionar, com o principal objetivo de
trabalhar com peças para restauro de edifícios. Os ladrilhos hidráulicos de
substituição, preparados para obra de restauro do Palacete Pinho, foram produzidos
nesta fábrica. Segundo o site da mesma, as peças são de 2004.

24
ZECHLINSKI, Ana Paula Polidori; ALMEIDA, Lílian Borges; OLIVEIRA, Ana Lúcia Costa. Ladrilho
hidráulico: tentativa de preservação. Revista de pesquisa & Pós-graduação. Ano 2, volume 2, nº 2.
Ouro Preto. 2000.
40
 Maranhão
Os ladrilhos hidráulicos de São Luís começaram a ser importados de
Portugal, Inglaterra, França e outras países da Europa a partir do século XIX. Na
cidade, também foi desenvolvido um trabalho de pesquisa sobre o assunto,
abordando o contexto histórico e político-econômico da inserção do ladrilho
hidráulico na cidade, apontando algumas edificações históricas que possuem o
ladrilho hidráulico utilzado especialmente como revestimeento de pisos25.

 Pará
Apesar de não ter sido encontrado, até o momento, registro algum
documental que comprove a importação de ladrilhos hidráulicos em Belém/PA,
possivelmente os primeiros exemplares da cidade foram importados da Europa,
especialmente da França, Portugal e Alemanha, seguindo a lógica da chegada de
praticamente todos os materiais construtivos utilizados na capital paraense no
apogeu da economia do látex da região, entre o final do século XIX e início do XX,
na Belle Epóque.

Primeiramente, chegaram os ladrilhos cerâmico, que foram usados em


diversas edificações importantes da cidade, como o Palacete Pinho e o Palacete
Vitor Maria da Silva. Os ladrilhos cerâmicos eram originados nos principais pólos
cerâmicos do mundo, a exemplo da fábrica alemã Villeroy & Boch. O uso desse
material construtivo era justificado por sua beleza e durabilidade, porém, era um
produto que somente pessoas de alto padrão aquisitivo poderiam obter.

Já os ladrilhos hidráulicos, eram de mais fácil acesso, devido ao seu processo


de fabricação ser mais simplificado, com relação ao ladrilho cerâmico, e,
consequentemente, possuir menor custo.

A difusão do uso do ladrilho hidráulico em Belém está provavelmente


relacionada ao início da produção local, resultando em maior acessibilidade ao

25
SILVA, Svetlana Maria Farias da. Ladrilhos de São Luís: reflexos estéticos de uma época. São
Luis: Secretaria de Estado da Cultura – SESC, 2005, p. 29.

41
material e ao preço final de revenda. Com a possibilidade de adquirir peças na
própria cidade ocorreu maior estímulo ao comércio de compra e venda desse
material.

A primeira fábrica em Belém deve ter sido a que foi fundada por Domingos
Acatauassú Nunes em sociedade com o alemão Guilherme Frederico Humdemark.
Segundo o senhor Nelson Vale, em entrevista concedida durante essa pesquisa em
2012, o seu avô, Guilherme Frederico Humdemark, foi o responsável pela chegada
da produção de ladrilhos hidráulicos em Belém. O relato, destaca que Guilherme
possuía o conhecimento da produção de ladrilhos hidráulicos trazido da Alemanha,
contudo não detinha recursos financeiros para montar uma fábrica própria.

Guilherme, então, propôs sociedade à Domingos Acatauassú, dividindo a


responsabilidade da gestão administrativa para o sócio, enquanto que ele próprio se
encarregava do gerenciamento e produção das peças. Apesar desses relatos, ainda
não foi possível precisar a data de fundação da fábrica, tampouco sua denominação
oficial.

Outra fábrica de muito prestígio na cidade era a A. Pinheiro Filho, localizada


na Travessa Quintino Bocayuva, Nº 31. Além da fabricação de ladrilhos hidráulicos,
esta fábrica produzia outros elementos construtivos e de ornamentação, tais como:
marmorite (pedra artificial), escadarias, soleiras, peitoris, colunas, balaustradas,
portais, tampos de mesas para bares, bancos de jardim, vasos, bacias com sifão
para banheiro, pias, postes, estátuas, túmulos, guarda-corpos entre outros (Figura
16).

42
Figura 16: (A) Imagem da capa do catálogo da A. Pinheiro Filho e (B) artefatos de marmorite
produzidos por ela. Fonte: Catalogo A. Pinheiro Filho e Cia Ltda, 1927.

Os catálogos da fábrica eram ricos e bem ilustrados. Um volume de 1927 da


A. Pinheiro Filho relata que o objetivo da fábrica era oferecer um material que
atendesse aos mais modernos requisitos de higiene e técnica, contando com o mais
moderno em máquinas.

Os ladrilhos produzidos na A. Pinheiro Filho eram prensados com força de


150 a 200 Atm, com “esquadrias perfeitas e arestas vivas” 26. A fábrica oferecia
também grande variedade de desenhos criados por outras indústrias estrangeiras
especialistas em ladrilhos, e a coloração dos desenhos era resultado de pigmentos
de primeira qualidade, importados da Europa.

A. Pinheiro Filho forneceu ladrilhos hidráulicos para diversas edificações da


cidade, principalmente para escolas e prédios públicos. O Colégio Marista possui
vários ladrilhos, distribuídos em diversos ambientes, produzidos por esta fábrica.

26
Catálogo A. Pinheiro Filho e Cia Ltda, 1927.
43
A Figura 17 mostra a capela do colégio, com ladrilhos hidráulicos assentados
no piso e os modelos dos ladrilhos utilizados no catálogo da fábrica.

Figura 17: Ladrilhos produzidos na A. Pinheiro Filho assentados na capela do Colégio Marista.
Fonte: Catálogo da fábrica A. Pinheiro Filho e Cia Ltda, 1927.

O filho do alemão Guilherme Frederico, suposto pioneiro na produção de


ladrilhos hidráulicos em Belém, Henrique Ferreira do Vale, herdou a prática de
produzir ladrilhos e também trabalhou como mestre ladrilheiro. Foi proprietário da
fábrica de Ladrilhos Cruzeiro, a partir de 1946, até o momento de decadência do
ladrilho hidráulico, com a introdução das lajotas cerâmicas.

Em 1961, seguindo a tradição da família de trabalhar na produção de ladrilhos


hidráulicos, o engenheiro Nelson Vale, filho de Henrique Vale, deu continuidade à
fabricação do material, com a fábrica CONSTAR. Inicialmente, começou com a
fábrica no quintal de seu sogro. Já em 1963, mudou-se para uma casa maior, onde
fabricou ladrilhos até 1968.
44
Em sua entrevista, Nelson Vale relatou que chegou a ter quatro prensas
funcionando e vinte funcionários trabalhando em sua fábrica, no período em que o
ladrilho era mais valorizado. As prensas eram provenientes da fábrica de máquinas
J. Gimines.

Outra fábrica de ladrilhos hidráulicos que funcionava em Belém/PA foi a


Fábrica Nossa Senhora de Lourdes, conhecida também como NOSELOUR. Essa
fábrica iniciou seu funcionamento em 1959 e registrou falência em 1970.

Em contato pessoal com o engenheiro José Leitão de Almeida Viana, filho de


Orlando Viana, fundador da fábrica, este explicou que acompanhou do surgimento
até a decadência a fábrica de ladrilhos do pai. Assim, sabe-se que Orlando Viana
iniciou carreira militar aos 17 anos, e aos 38 anos já entrava para a reserva. A busca
de um novo ofício o levou a comprar equipamentos para a fabricação de ladrilho, os
quais foram adquiridos de uma fábrica em Icoaraci e instalados em seu quintal.

Além dos equipamentos, foram contratados também, os operários que


trabalhavam na fábrica de Icoaraci, com o objetivo de repassar a técnica de
produção para os demais funcionários. No início do funcionamento, em 1959, a
fábrica contava com uma prensa com quatro operários, mas, em 1961, a produção
dobrou, sendo adquirida mais uma prensa, na qual também trabalhavam quatro
operários.

José Viana garante que o material produzido por seu pai possuía ótima
qualidade e que o ladrilho era muito utilizado na época. O modelo mais procurado
pelo público era o tipo marmorizado, o qual imitava mármores, modelo que era
produzido exclusivamente pela NOSELOUR. As peças possuíam dimensões de
20cm x 20cm ou 30cm x 30cm, sendo que os maiores eram mais adequados para
assentamento em calçadas. Na face posterior, as peças possuíam um círculo como
sua marca.

O maior comprador dos ladrilhos produzidos pela NOSELOUR era o


município, que os usava para o revestimento de pisos de escolas e repartições

45
públicas. Infelizmente, muitos desses pisos não existem mais devido a demolições e
reformas.

Existiram outras fábricas de ladrilhos hidráulicos na cidade de Belém. Apesar


de não se ter muitas informações sobre elas, foram encontrados anúncios em jornais
de propagandas da Fábrica Hercules, por exemplo (Figura 18).

Figura 18: Anúncio da fábrica de ladrilhos e marmorite Hercules. Fonte: O liberal, 1943.

A queda da produção de ladrilhos hidráulicos, em todo o país, ocorre a partir


da popularização das lajotas cerâmicas, as quais apresentavam preços muito mais
baixos que os dos ladrilhos. No Pará, esta queda vem juntamente com a abertura da
rodovia Belém-Brasília, a partir de 1960, que tinha por objetivo a integração
comercial entre o norte e o sul do país. Através da rodovia, a comercialização de
diversos produtos foi favorecida, incluindo materiais de construção como as lajotas.

Hoje em dia, os ladrilhos hidráulicos voltaram a ser utilizados, principalmente


por indicação de arquitetos de interiores e decoradores. Observam-se na atualidade
ações antagônicas em relação ao uso de ladrilhos hidráulicos: ao mesmo tempo em

46
que o material tem sido substituído por outros tipos de revestimentos, também estão
sendo aplicados em diversas construções contemporâneas e até mobiliário.

O gosto por revestir pisos e paredes tende a voltar. A aplicação de ladrilhos


hidráulicos é facilmente encontrada em estabelecimentos comerciais e residências,
sendo principalmente utilizados como elementos decorativos. Os ladrilhos
hidráulicos aplicados em edificações contemporâneas podem ser de fabricação atual
ou antiga, provenientes de demolições (Figura 19).

Figura 19: Ladrilhos hidráulicos antigos aplicados atualmente em balcão de uma padaria em
Belém/PA.

Atualmente, existem duas fábricas em funcionamento em Belém/PA:


CONSTAR e Ladrilharq.

A fábrica CONSTAR, citada anteriormente, voltou a produzir ladrilhos


hidráulicos em 2006, devido à procura por este material no Estado, já que foi
observado que para adquirir ladrilhos, até então, era necessário recorrer a fábricas
de outros lugares do país.

A CONSTAR conta com uma prensa e possui três funcionários, que


produzem 20m² por dia. Os quarenta moldes utilizados na produção, todos originais
da Alemanha, são herança do avô do proprietário.

47
A Ladrilharq funciona há 10 anos e pertence ao arquiteto Carlos Antônio
Barbosa da Silva, com escritório situado à Rua José Bonifácio, em Belém/PA,
enquanto sua produção concentra-se no município de Abaetetuba/PA.

Em entrevista realizada com o proprietário, o mesmo relatou que a


idealização da fábrica de ladrilhos surgiu a partir do seu gosto pessoal pelo material,
presente em sua memória, a partir das diversas edificações ladrilhadas de sua
cidade natal, a cidade histórica de Óbidos/PA, no interior do estado.

O arquiteto relatou ainda que, ao se interessar em abrir a fábrica, lembrou-se


de um amigo de infância, cuja família possuía uma fábrica de ladrilhos na década de
1940 e de onde comprou, como sucata, sua antiga prensa. As demais prensas foram
adquiridas em Abaetetuba/PA (duas) e Benevides/PA (uma), provenientes de
fábricas desativadas.

Em Abaetetuba, os padres locais haviam produzido ladrilhos no seminário,


anteriormente, indicando também funcionário treinado nesse ofício, que foi
contratado para a nova fábrica.

Atualmente, a fábrica conta com o trabalho de 15 pessoas, sendo sete na


produção do material e dois operários em cada prensa. A fábrica produz,
aproximadamente, 200 peças simples por dia, por operário. A Ladrilharq possui
ladrilhos assentados durante obras de intervenção restaurativa em diversas
edificações em Belém, destacando o Museu da Universidade Federal do Pará e o
Asilo Dom Macedo Costa, ambos importantes edificações históricas da cidade.

48
2.2 SEMELHANÇAS E DIFERENÇAS ENTRE LADRILHOS HIDRÁULICOS E
CERÂMICOS

No desenvolvimento da pesquisa, foi verificado que é muito comum a


generalização do termo ladrilho hidráulico. Com frequência, os ladrilhos cerâmicos,
pela semelhança de desenho, ou mesmo por desconhecimento das diferenças, são
errôneamente enquadrados como “ladrilhos hidráulicos”.

Isto acontece devido às semelhanças em aspecto entre os dois materiais.


Contudo, há sensíveis diferenças entre os dois tipos de ladrilhos, especialmente
quanto à sua estrutura e composição. Um olhar atento observará que os materiais
diferem bastante entre si.

O ladrilho hidráulico é constituído principalmente de cimento, enquanto que o


cerâmico é confeccionado com o uso de argilas e é queimado em temperatura
elevada (Figura 20).

A B
Figura 20: (A) Ladrilho hidráulico do Colégio Santo Antônio e (B) ladrilho cerâmico do Palacete
do Parque da Residência.

É provável que o ladrilho hidráulico tenha surgido com a intenção de substituir


o ladrilho cerâmico, pois sabe-se que o declínio de sua produção aconteceu no fim
do século XIX, quando os ladrilhos hidráulicos foram desenvolvidos. Outro aspecto
fundamental é de caráter econômico, pois os ladrilhos hidráulicos eram muito mais
baratos que os cerâmicos, o que atendia à crescente economia de massa.
49
Em Belém/PA, é possível destacar algumas edificações que apresentam o
ladrilho cerâmico como pavimentação de piso. Entre eles está o Palacete Pinho,
edificado no final do século XIX, em 1897, quando o comerciante Antônio José de
Pinho, proprietário do imóvel, contratou o engenheiro Camilo de Amorim para
executar a obra.

O palacete apresentava ladrilhos cerâmicos em toda área externa de


varandas e pátios, em áreas de circulação e áreas molhadas. Até sua restauração
finalizada em 2011, era possível encontrar ladrilhos cerâmicos franceses no
palacete, porém estes ladrilhos cerâmicos da fábrica francesa Sand & Co foram
substituídos por réplicas em ladrilho hidráulico com o intuito de complementar áreas
com peças degradadas ou faltantes. Segundo relatos, não foi identificada, na época,
a diferença entre ladrilhos hidráulicos e ladrilhos cerâmicos na edificação: o piso em
ladrilho cerâmico teria sido identificado como piso em ladrilho hidráulico, daí a
substituição.

O caso do Palacete Pinho reflete a perda das informações dos materiais e de


técnicas antigas, que permitam, por exemplo, a identificação correta entre os
diferentes ladrilhos.

A identificação dos ladrilhos do Palacete Pinho poderia ter sido feita ainda in
loco, utilizando ácido clorídrico (HCl), já que o ladrilho hidráulico é uma material
carbonático, o qual sofreria efervescência na presença do ácido, enquanto que o
ladrilho cerâmico não sofreria alteração alguma.

Justifica-se assim, a relevância da identificação correta dos materiais,


principalmente quando estes forem objetos a serem restaurados e conservados
adequadamente de acordo com sua composição e características próprias.

50
2.3 PRODUÇÃO DE LADRILHOS HIDRÁULICOS

O conhecimento sobre a matéria-prima e o processo de produção do material


apresenta grande importância no seu âmbito histórico e tecnológico. A fabricação do
ladrilho hidráulico corresponde a uma técnica artesanal, e por isso, tradicional. Ter
registro sobre as etapas do processo torna possível retornar ao trabalho dos antigos
mestres ladrilheiros.

2.3.1 Matéria-prima utilizada

A matéria-prima utilizada na fabricação de ladrilhos hidráulicos é composta


por cimento Portland cinza, cimento Portland branco, areia, pó de pedra fino,
pigmentos inorgânicos e água.

 Cimento Portland cinza


Em 1824, o construtor inglês Joseph Aspdin patenteou o cimento Portland.
Ele queimou conjuntamente pedras calcárias e argila, transformando-as em um pó
fino. Percebeu que obtinha uma mistura que, após secar, tornava-se tão dura quanto
às pedras empregadas nas construções.

Após isto, houve um desenvolvimento do material, cujo uso ganhou força, por
apresentar algumas vantagens com relação à cal.

No Brasil, as primeiras toneladas de cimento foram produzidas e colocadas


no mercado em 1926. Até então, o consumo de cimento no país, dependia
exclusivamente do produto importado27, o que implica que, provavelmente, até esse
momento os ladrilhos hidráulicos aqui produzidos utilizaram o cimento importado
como matéria-prima.

O cimento Portland é produzido a partir de mistura controlada de calcário e


argila, ainda com outras matérias-primas minerais, em menores proporções. É uma

27
http://www.abcp.org.br.
51
mistura rica em sílica, alumina e ferro que, após moída, é sujeita à calcinação a
uma temperatura da ordem dos 1400 a 1500 ºC28.

O cimento é o aglomerante mais utilizado, atualmente, na construção civil.


Trata-se de um pó fino acinzentado, que é constituído de silicatos e aluminatos de
cálcio, os quais, quando misturados à água reagem e, após endurecimento, são
capazes de desenvolver elevada resistência mecânica. Sua composição é formada
substancialmente por óxidos de silício, de cálcio, de alumínio e de ferro.

Segundo o catálogo da Mosaicos SCIAL29, a análise química de bons


cimentos Portland podia variar entre os seguintes limites:

Sílica................................................................. 20 – 26 %
Alumina............................................................ 04 – 10 %
Óxido de Ferro................................................. 02 – 05 %
Cal.................................................................... 58 – 65 %
Magnésio.......................................................... 01 – 03 %
Anidrido Sulfúrico........................................... Traços – 02 %
Álcalis.............................................................. Traços – 03 %

 Cimento Portland branco


O cimento Portland branco é fabricado desde a década de 1930 30. No Brasil,
o cimento branco começou a ser fabricado cerca de vinte anos depois da fabricação
do cimento cinza, em 1952. Porém, só passou a ser distribuído em 1954, com a
marca Irajá, a qual integra a linha de produtos da fábrica Votorantim.

28
VELHO, José Lopes. Mineralogia industrial. Princípios e aplicações. Lisboa: LIDEL, 2005, p.
520.
29
Sociedade de Construções e Indústrias Anexas. Mosaicos Scial. Lisboa.
30
CONCRETO: ensino, pesquisa e realizações, Vol.2 – Concreto Branco. Ed.Geraldo Cechella
Isaia – São Paulo: IBRACON, 2005. 2v.
52
Já o cimento branco estrutural teve o início da sua produção, em 1984, para
atender à demanda de construções mais arrojadas de concreto aparente, pré-
fabricados e pisos de alta resistência.

Provavelmente, os primeiros ladrilhos hidráulicos eram fabricados apenas


com cimento cinza, já que eles antecedem o início da produção do cimento branco.

Atualmente, o cimento branco utilizado na composição do ladrilho hidráulico é


do tipo estrutural. O cimento branco estrutural é utilizado para argamassas brancas,
com classe de resistência 25, 32 e 40 MPa, ao contrário do cimento branco não
estrutural, que é utilizado apenas para acabamentos, como rejuntamentos de
azulejos.

O cimento branco estrutural é adequado para a decoração do ladrilho


hidráulico devido à sua resistência e também à versatilidade de poder ser associado
a pigmentos.

As matérias-primas utilizadas, o processo de fabricação e as adições minerais


incorporadas, na etapa da moagem, são responsáveis por determinarem a cor do
cimento branco. Para a obtenção de cimento de qualidade, as matérias-primas
necessitam ter baixos teores de óxido de ferro e manganês. Além disso, ele precisa
também de condições especiais em seu processo de fabricação, especialmente com
relação ao resfriamento e à moagem do produto31.

 Pigmentos inorgânicos
As cores das pastas são obtidas com a adição de pigmentos. A qualidade do
pigmento está relacionada com o poder de dispersão e pigmentação, que é
fundamental para obter durabilidade e estabilidade de cores, ao longo dos anos,
diminuindo a manutenção e a intervenção32.

31
MEHTA, P. K. MONTEIRO, Paulo J. M. Estrutura, Propriedades e Materiais. São Paulo: PINI,
1994.
32
VOTORANTIM CIMENTOS. Apostila Cimento Votoran Branco. s/p.
53
Os pigmentos utilizados são à base de óxidos. O óxido de ferro preto (Fe 3O4)
garante a cor preta, o óxido de ferro amarelo (α-FeOOH), a cor amarela, o óxido de
ferro vermelho (α-Fe2O3), a cor vermelha, o óxido de cromo (Cr2O3), o verde e o
óxido de cobalto (Co(Al,Cr)2O4), a cor azul.

Esses pigmentos podem ser adicionados tanto ao cimento branco como ao


cimento cinza, porém, quando são adicionados ao cimento cinza, a pasta não
representa a coloração fiel utilizada. A Figura 21 mostra a variação na tonalidade
das cores azul e amarela, em diversas concentrações, de acordo com o cimento
utilizado, cinza ou branco.

Concentração de pigmento azul

CIMENTO CINZA

CIMENTO BRANCO

Concentração de pigmento amarelo

CIMENTO CINZA

CIMENTO BRANCO

Figura 21: Variação de tonalidade de acordo com o cimento utilizado. Fonte: Votorantim
cimentos.

 Agregados: areia e/ou pó de pedra


Os agregados utilizados na produção de ladrilhos hidráulicos são areias e pó
de pedras. Esses agregados influenciam na durabilidade e na resistência do
material.

A areia utilizada deve estar seca e ser bem fina. Na camada de decoração,
não é utilizado o pó de pedra, somente a areia, a qual é ainda mais fina que a
utilizada no suporte. Devido à utilização do cimento branco na camada decorada, a

54
areia também deve possuir cor clara, pois os agregados possuem influência direta
na coloração do cimento.

Na fábrica Ladrilharq, o pó de pedra utilizado é de dolomita CaMg(CO 3)2. A


presença deste mineral ajuda a dar resistência ao ladrilho hidráulico, já que a
dolomita possui dureza entre 3,5 e 4, na escala de Mohs33.

 Água
Com relação à água utilizada na produção dos ladrilhos hidráulicos, ela deve
ser analisada em dois aspectos: quantidade e qualidade.

A água tem fundamental importância no preparo da argamassa de cimento


dos ladrilhos hidráulicos. O cimento, quando hidratado, sofre reação química
exotérmica, que resulta no seu endurecimento.

Quando existe na massa mais água do que o cimento necessita para


endurecer, este excesso não é absorvido na reação e “sobra” água na argamassa,
afetando a porosidade, a densidade e a resistência mecânica. A proporção entre os
dois constituintes tem que ser adequada. Esta relação entre água e cimento é
chamada de “fator água/cimento”.

A qualidade da água também deve ser observada, posto que esta deve ser
limpa, ou seja, livre de impurezas orgânicas e de substâncias prejudiciais.

2.3.2 Etapas da produção

As visitas às fábricas de ladrilhos hidráulicos Manoel do Ladrilho, em


Cachoeira/BA e Dalle Piagge, em São Paulo/SP, permitiram o conhecimento das
fases necessárias para a produção deste material. Assim, foi compreender
exatamente como os ladrilhos hidráulicos antigos eram produzidos.

33
VELHO, José Lopes. Mineralogia industrial. Princípios e aplicações. Lisboa: LIDEL, 2005, p.
178.
55
Desde o início da produção de ladrilhos hidráulicos, até a atualidade, os
mesmos foram fabricados de maneira semi-artesanal, por mestres ladrilheiros. O
termo “semi-artesanal” é aplicado devido ao fato de a produção ser feita
manualmente, porém com auxílio de máquina: a prensa.

Atualmente, na maioria das vezes, os ladrilhos hidráulicos são


confeccionados em fábricas de pequeno porte e com poucos funcionários, devido à
pouca demanda. Porém, no auge da produção do material, as fábricas contavam
com grandes espaços produtivos e muitos funcionários ativos (Figura 22).

Figura 22: Fábrica de ladrilhos hidráulicos em atividade no final do séc. XIX. Fonte:
www.byggogbevar.no.

No Brasil, as fábricas tradicionais de ladrilhos hidráulicos utilizavam


normalmente prensas mecânicas, do tipo parafuso. Por algum motivo, que não se
conseguiu descobrir, até o presente momento, as fábricas não aderiram totalmente à
prensa hidráulica, que é mais moderna e exige menos esforço de seus operários.

Atualmente, a fábrica Dalle Piagge está fazendo um teste com uma prensa
hidráulica. A ideia é verificar a eficiência da máquina e a qualidade do material
produzido por ela. Nesta fase de experiência, estão sendo produzidos apenas
ladrilhos hidráulicos simples, lisos e sem decoração (Figura 23).

56
Figura 23: Operário manuseando a prensa hidráulica.

A primeira etapa da fabricação consiste no derramamento da mistura de


cimento Portland branco estrutural, pigmento e areia fina no molde previamente
untado com o óleo desmoldante, sendo que cada mistura colorida é derramada
individualmente no local correspondente com o “calchalote”, de acordo com o que se
pretende ter como resultado (Figura 24). Essa camada possui espessura variável
devido à técnica artesanal da produção e, dependendo da quantidade de “tinta”
derramada no gabarito, ela pode ficar mais ou menos espessa.

57
A

B
Figura 24: (A) Depósitos com as misturas de cimento branco com pigmentos a serem
utilizados nos ladrilhos hidráulicos, (B) derramamento da mistura no gabarito com o
“calchalote”.

Com o término da adição da mistura no gabarito, correspondente à decoração


desejada, o gabarito é retirado rapidamente e em seguida é disposta uma fina
camada chamada de “secante” que é composta de cimento cinza puro em pó. O
secante possui a função de endurecer a mistura, retirando parte da água, de modo
que as cores não se misturem.

Após a aplicação da camada de secante, a camada seguinte, mais espessa,


feita de massa composta de cimento Portland, areia e água, é colocada na forma,
para que, assim, seja fortemente compactada pelo ladrilheiro, na prensa (Figura 25).
A água deve ser adicionada, em pequena quantidade, de maneira que a massa fique
apenas úmida.

58
A

B
Figura 25: (A) Adição da massa de cimento e (B) ladrilho hidráulicos sendo pressionados.

Depois do ladrilho hidráulico devidamente moldado e prensado, ele passa


pelo processo de secagem ao ar livre, por 24 horas, e depois é imerso totalmente
em água, por mais 24 horas, para que haja a cura do material (Figura 26).

59
B

C
Figura 26: (A) Ladrilhos hidráulicos secando em estantes, (B) tanque onde os ladrilhos
hidráulicos são imersos para a cura e (C) resultado final.

2.4 VARIAÇÕES TIPOLÓGICAS DE LADRILHOS HIDRÁULICOS

A variação tipológica dos ladrilhos hidráulicos está associada ao seu desenho,


ao seu emprego, formato e sua dimensão. O ladrilho hidráulico pode ter dois tipos de
decoração: lisa ou desenhada, sendo que este último pode ser geométrico ou floral.

60
O desenho geométrico, normalmente, apresenta pouca variação de cor,
exibindo duas ou três cores. Já o floral, possibilita mais cores em sua composição, e
quanto mais complexo o seu desenho, mais cores podem lhe ser aplicadas. Essa
variação de desenhos e cores, muitas vezes, implica valores adicionados ao custo
final da peça, pois quanto maior a quantidade de cores utilizadas em um ladrilho,
mais caro ele é, devido aos pigmentos e ao trabalho dispensado (Figura 27).

A B
Figura 27: Composição de ladrilhos hidráulicos (A) geométricos e (B) florais.

São bem comuns os pisos em ladrilho hidráulico que imitam tapetes. Quando
isso acontece, os ladrilhos localizados no centro são chamados de “centro” e os da
borda são chamados de “faixas”.

As peças de união das faixas sempre apresentam desenho diferenciado do


restante da faixa, fazendo o acabamento de encontro entre elas. As faixas marcam o
limite do “tapete”, e servem de moldura. O mesmo padrão de faixa pode ser utilizado
com diversos padrões de centro, mais sempre fazendo uma composição harmônica.
O mesmo “tapete” pode apresentar mais de uma composição de faixa. As faixas,
também, podem exercer a função de rodapé (Figura 28).

61
CENTRO

CANTO DE FAIXA FAIXA

CANTO DE FAIXA FAIXA

CANTO DE FAIXA
FAIXA

B
Figura 28: (A) faixas sendo utilizadas como moldura, (B) rodapé em faixa de ladrilho hidráulico.

A Mosaicos SCIAL recomenda a utilização de ladrilhos hidráulicos entre a


faixa e a parede, pois uma casa ladrilhada com faixa, sem a cercadura lisa, produz o
efeito de que as paredes foram construídas após o pavimento34.

Quanto ao formato, geralmente, os ladrilhos se apresentam quadrados, porém


existem ainda os retangulares, os sextavados e os oitavados. Os ladrilhos

34
Sociedade de Construções e Indústrias Anexas. Catálogo de Mosaicos Scial. Lisboa, s/a, s/p.
62
hidráulicos retangulares são utilizados em faixas e os sextavados, assim como
oitavados são sempre de centro.

Os ladrilhos hidráulicos oitavados recebem o “tozeto”, ladrilho hidráulico


quadrado com 5 cm de lado e que serve de acabamento para a união dos cantos
chanfrados (Figura 29).

TOZETO

Figura 29: (A) ladrilhos hidráulicos sextavados e (B) composição de ladrilhos hidráulicos
oitavados com tozetos.

A partir da observação de vários pisos em ladrilhos hidráulicos pode-se


verificar que há grande repetição, ou similaridade de padrões entre eles, mesmo que
a origem das peças seja distinta.

O mesmo padrão de molde poderia ser vendido a diversos fabricantes de


ladrilhos hidráulicos e isso colaborava para a similaridade entre as peças,
principalmente daquelas com padrões mais simples35.

A Figura 30 mostra três ladrilhos hidráulicos com procedências distintas, mas


que apresentam padrões de decoração similares. Este exemplo demonstra
claramente como era comum a repetição de padrões entre as fábricas, pois havia o
costume de se copiar desenhos de catálogos de outros fabricantes. Outro motivo
para essas semelhanças é o fato de que o mesmo artesão poderia fornecer moldes
para várias fábricas. Esses fatores explicam porque, corriqueiramente, são

35
JOYNT, Anna. Cuban Mortar Tiles. International Cooperation and Regeneration through the
Rediscovery of a Lost Craft. Havana: 2009. Faculty of Architecture, University of Havana, s/p.
63
encontrados ladrilhos hidráulicos tão semelhantes em lugares, até mesmo países,
diferentes, demonstrando o quão internacionais e difundidos foram esses elementos
construtivos.

A B

C
Figura 30: Exemplo de padrões de ladrilhos hidráulicos semelhantes, porém com procedência
distinta. (A) Salvador Bulet y Cia, Barcelona-Espanha, (B) Procedência desconhecida e (C)
Mosaic del Sur, Málaga-Espanha.

A partir do conhecimento sobre o processo de fabricação dos ladrilhos


hidráulicos e de suas variações tipológicas, as análises laboratoriais e a
caracterização das amostras contribuem para o conhecimento, mais específico, do
material, quantificando e qualificando suas propriedades.

Essas referências e estudos técnico-científicos complementam-se de forma a


corroborar para uma atuação consistente na conservação e restauro dos ladrilhos
hidráulicos.

64
2.5 FATORES DE DEGRADAÇÃO

Apesar de ladrilhos hidráulicos serem excelentes materiais de pavimentação,


eles podem apresentar inúmeros fatores de degradação, pois, assim como todo
material poroso, eles também recebem intensa influência do meio que se encontram.
Devido à inexistência de um glossário de degradação específico para ladrilhos
hidráulicos, os conceitos revisados neste item tomaram como base degradações
ocorrentes em materiais porosos36 e padrões de deterioração de pedras37.

Os principais fatores de degradação dos ladrilhos hidráulicos podem ser


classificados em: agentes físicos, agentes químicos e agentes biológicos. Além
desses fatores, ainda devem ser considerados danos provocados por ação humana,
como vandalismo e restaurações inadequadas.

2.5.1 Agentes físicos

Também podem ser identificados como agentes mecânicos. Correspondem


às ações que enfraquecem o material como consequência de tensões provocadas
por fatores internos ou externos ao material, ocasionando microfissuras, ou até
mesmo desprendimento da peça do seu suporte. Nos ladrilhos hidráulicos foram
observadas as alterações a seguir:

 Cristalização de sais
A cristalização de sais solúveis, como cloretos, sulfatos e nitratos, leva ao
aparecimento de eflorescências e subflorescências, que também podem ser
provenientes da cristalização de sais menos solúveis, como o carbonato de cálcio
(CaCO3), o sulfato de bário (BaSO4), ou mesmo a sílica amorfa (SiO2.nH2O)38. Os
sais podem ter origem na argamassa de assentamento, na alvenaria, no solo, no ar
(aerossol salino), de material orgânico e até mesmo do próprio material, já que o

36
TORRACA, Giorgio. Porous Building Materials: materials science for architectural
conservation. Roma, Third Edition, 1988.
37
ICOMOS – International Council on Monuments and Sites. Illustrated glossary on stone
deterioration patterns. Champigni/ Marne, França, 2008.
38
ICOMOS – International Council on Monuments and Sites. op.cit.
65
sulfato de cálcio está presente no cimento utilizado no ladrilho hidráulico 39. As
eflorescências possuem aspecto esbranquiçado, em pó ou cristais, sobre a
superfície. São mal coesas, ou seja, fracamente ligadas ao material (Figura 31),
porém quando ocorrem dentro da porosidade do material (subflorescência), podem
levar à ruptura.

Figura 31: Eflorescência salina nos ladrilhos da parede do Solar Barão de Guajará.

Quando retirado do tanque, onde fica em processo de cura, o ladrilho


hidráulico sempre fica com grau elevado de umidade, a água migra para a superfície
e evapora, formando assim uma camada de deposição de carbonato de cálcio na
superfície do ladrilho. A eflorescência tende a ocorrer com mais frequência em
peças recém-fabricadas.

 Cargas produtoras de compressão, flexão ou choque


Os ladrilhos estão sujeitos aos efeitos das tensões que ocorrem no substrato
que foram assentados, seja este a parede ou o piso. A fissuração, uma das
consequências mais comuns desse processo, resulta da separação de uma parte da
outra e pode ser percebida a olho nu.

39
TORRACA, Giorgio, op. cit.
66
A Figura 32 mostra um trecho de piso pavimentado com ladrilhos hidráulicos.
As fissuras e as lacunas indicadas são resultantes de processos de acomodação do
terreno da edificação.

Figura 32: Piso em ladrilho hidráulico com fissuras devido à acomodação do terreno, na
Farmácia República (Belém/PA).

 Dilatação térmica
Pode ser ocasionada por fenômenos de mudanças de temperatura devido a
agentes climáticos, ciclos de calor e frio e por incêndio, ou pela insuficiência ou
ausência de juntas de dilatação.

Normalmente, o assentamento de ladrilhos hidráulicos é realizado sem juntas


de dilatação. Quando aplicados em áreas extensas, isso pode trazer consequências
para o material, como o surgimento de fissuras diversas (Figura 33).

67
Figura 33: Piso em ladrilho hidráulico com fissuras decorrentes de processos de dilatação
térmica, na igreja de São Pedro dos Clérigos, em Salvador (BA).

 Uso de técnicas impróprias para remoção do suporte original

Na maioria das vezes a remoção danifica a peça e pode causar fissuras e


fragmentação. A Figura 34 mostra a remoção de ladrilhos hidráulicos da parede que
estão assentados, cujos remanescentes foram danificados.

Figura 34: Remoção de ladrilho hidráulico de maneira imprópria, no antigo cinema de


Cachoeira (BA).

 Abrasão
Erosão devido ao desgaste por meio de atrito. No caso dos ladrilhos
hidráulicos, a abrasão é mais percebida quando atinge a camada inferior. O
desgaste é percebido com mais facilidade após a perda da camada decorativa ou,

68
no caso dos ladrilhos com ranhuras na superfície, quando estes perdem a textura.
Geralmente são mais comuns nas áreas com maior tráfego de pessoas (Figura 35).

Figura 35: Pisos desgastados por abrasão.

 Deposição, sujidade e crosta


Acúmulo de material exógeno. A diferença entre deposição e sujidade
consiste que a deposição possui espessura variável, como salpico de tinta ou
argamassa, poeira. A deposição geralmente tem aderência à superfície, enquanto
que a sujidade é uma película mais fina, com partículas de fuligem, por exemplo, e
não tem muita aderência à superfície. (Figura 36).

Figura 36: Piso com diferentes tipos de deposição: tinta, argamassa e poeira, na Farmácia
República (Belém, PA).

69
Quando ocorre a acumulação coerente dos materiais na superfície, podendo
ser uma evolução de depósitos e de sujidades, temos a crosta. Uma crosta pode
incluir depósitos exógenos em combinação com materiais derivados do material. A
crosta negra é a mais comum entre as crostas, geralmente se desenvolve em áreas
protegidas da chuva ou do escoamento de água no ambiente urbano.

Alguns efeitos ocasionados pelas degradações de origem mecânica são:

 Lacuna
Corresponde a áreas com ausência de ladrilhos ou parte dele. Ela pode estar
ou não preenchida com outro material (Figura 37).

A B
Figura 37: Ladrilhos hidráulicos com lacunas, sendo (A) com preenchimento e (B) sem
preenchimento.

 Fragmentação

Ruptura parcial ou total de uma peça de ladrilho hidráulico, em porções de


diferentes dimensões. Normalmente é ocasionada por sobrecarga.

 Sulco e ranhura
Perda de material superficial e em linha. Pode ser decorrente da perda de
material devido ação de ferramenta de corte (Figura 38) ou devido à ação de algum
objeto pontiagudo em atrito com a superfície do ladrilho.

70
Figura 38: Peça de ladrilho hidráulico apresentando sulco produzido por Makita.

 Descoloração
Mudança de cor, alteração cromática. Pode ter “ganho” de cor
(escurecimento) ou branqueamento. A Figura 39 mostra a diferença entre peças do
mesmo padrão com e sem processos de mudanças cromáticas.

Figura 39: Peças de ladrilho hidráulico apresentando mudança de cor.

 Aspecto brilhoso

A superfície reflete total ou parcialmente a luz. A superfície fica com aspecto


espelhado. Pode ser consequência de polimento, intencional ou não, ou de presença
de película transparente. A Figura 40, mostra um piso com aspecto brilhoso,
provavelmente devido à aplicação de resina.

71
Figura 40: Piso da biblioteca do Colégio Nazaré (Belém, PA) com aspecto brilhoso.

2.5.2 Ataque químico

O material deteriora por meio de reações químicas provocadas pela presença


de água e outras substâncias químicas. A origem dessas reações está
principalmente na poluição atmosférica e nos processos de
umidificação/evaporação. Por exemplo, o dióxido de enxofre, lançado por
combustíveis de veículos, em contato com as moléculas de água, produz ácido
sulfúrico, atacando, entre outros minerais, os silicatos e principalmente os
carbonatos. O ataque ácido por uso de materiais inadequados na limpeza, como o
ácido muriático, também é um exemplo de degradação por agentes químicos, que
consiste na deterioração parcial ou seletiva do material. Também acontece
principalmente em materiais carbonáticos.

2.5.3 Agentes biológicos

Os agentes biológicos são divididos em microorganismos (algas, fungos e


líquens); e organismos superiores, como plantas e animais. O ataque biológico
depende também da espécie que ataca o material (autótrofa ou heterótrofa). Os
autótrofos produzem seus próprios alimentos, enquanto que os heterótrofos não são

72
capazes de produzir seu próprio alimento e dependem da composição do material
para se alimentar.

As condições atmosféricas também são decisivas para a proliferação


biológica. As zonas quentes e úmidas favorecem o crescimento de organismos,
enquanto que locais secos e frios não apresentam boas condições de sobrevivência.
Por isso, a capacidade de absorção de água que um material possui é outro fator
importante a considerar, já que o organismo precisa de água para o seu
metabolismo e suas reações enzimáticas. Quanto mais poroso for o material, mais
propício à proliferação de organismos40.

O clima tropical úmido favorece o ataque de materiais de construção por


algas, uma vez que a umidade é a principal condição de existência, juntamente com
o pH, a temperatura e a luminosidade. As algas desenvolvem-se na superfície do
material devido à necessidade de luz para sua sobrevivência. A Figura 41 “A” mostra
a presença de algas na superfície do material: elas ficam concentradas na área mais
úmida e do piso, próximas ao jardim. Na Figura 41 ”B” é possível observar o
desenvolvimento de plantas nas áreas de rejunte das peças.

A B
Figura 41: (A) algas na superfície de ladrilhos hidráulicos, (B) plantas localizadas nas juntas.

40
Caneva, Giulia; NUGARI, Maria Pia & SALVADORI, Ornella. Biology in the Conservation of
Works of art. Roma: Internacional Center for the Study of the Preservation and the Restoration of
Cultural Property, 1991.
73
A biodegradação também é considerada um fenômeno físico, devido à
instalação de plantas cujas raízes deformam (ou quebram) pisos e paredes; e
químico devido à ação de ácidos orgânicos a partir da decomposição da matéria
orgânica e do excremento de animais (Figura 42).

Figura 42: Excrementos de pombos depositados no piso.

2.6 TÉCNICAS JÁ USADAS EM CONSERVAÇÃO E RESTAURAÇÃO DE


LADRILHOS HIDRÁULICOS

Atualmente, é comum em Belém, e em outras cidades, como Salvador, que


ladrilhos hidráulicos sejam descartados em obras de reforma, devido à falta de
domínio do conhecimento sobre o material. Quando o leigo se depara com peças
desgastadas, manchadas ou quebradas, as alternativas são a substituição do piso
por outro tipo de revestimento, por réplicas ou por ladrilhos hidráulicos com padrão
diferente do original (Figura 43).

74
A B

Figura 43: (A) Pisos em ladrilhos hidráulicos com preenchimento de cimento e (B) e
substituição.

A substituição de peças originais por outro padrão de revestimento implica na


alteração visual do piso, que perde sua unidade estética. Com o preenchimento de
uma lacuna com um material qualquer, a intenção restringe-se à recomposição
funcional do piso, vedando um vazio, porém a aparência geral do piso também será
prejudicada.

O piso original em ladrilho, quando de sua idealização, propõe uma


composição formal conjunta e unitária, ainda que conjugue padrões diferenciados
para tal, tais como em bordas e componentes complementares. No momento em
que são inseridos elementos construtivos estranhos a esse conjunto, há uma ruptura
na imagem total do piso, que em si caracteriza uma unidade temática.

Técnicas para sua manutenção são destacadas em manuais e catálogos dos


fabricantes. Observa-se, por exemplo, no catálogo da fábrica A Catalana, a
recomendação da boa limpeza do piso como sendo a principal base da
conservação. Assim, recomendava-se que a manutenção fosse realizada
simplesmente com água e sabão neutro e que jamais fossem utilizados produtos
ácidos ou alcalinos, pois os mesmos atacariam o cimento. A aplicação de cera
diluída com aguarrás seria a melhor opção para a conservação dos ladrilhos.

75
O problema da manutenção dos pisos em ladrilho hidráulico consiste na falta
de fornecimento de novos ladrilhos hidráulicos, ou pela ausência de fábricas locais,
ou pelo preço elevado das peças. Apesar de não concordar com a substituição do
ladrilho hidráulico original, Joynt41 sugere que os ladrilhos hidráulicos em mau
estado de conservação sejam substituídos por réplicas.

O IEPHA/MG42 sugere que a intervenção em ladrilhos hidráulicos quebrados


se inicie pela lavagem das peças com água e esponja, e que posteriormente deve
ser feita a colagem dos fragmentos com adesivo e resina de poliéster. Para a
remoção de manchas, recomenda que sejam feitos ensaios para a escolha do
melhor produto a ser utilizado. Primeiro, deve ser aplicada água com esponjas e
escovas de cerdas macias, em seguida, acetona com “Suobi” e EDTA (ácido
etilenodiamino tetra-acético), usando compressas de pasta de celulose por 20
minutos. Posteriormente, deve ser feita a lavagem com água para a remoção do
produto. Importante destacar que embora citado na indicação supra, não foi
encontrada nenhuma referência que indicasse o significado do termo “Suobi”. Logo,
não se pode referendar tal indicação.

Ainda de acordo com as especificações do IEPHA/MG, é sugerido que a


reintegração das partes faltantes deve ser feita com estuque de Polyfilla43, usando
molde de cera odontológico como suporte. Esse estuque fica abaixo da superficie.
Sobre a camada de estuque é aplicada resina acrílica Primal AC33, diluída em água
a 5%. Em seguida, completa-se com pó de mármore e pigmento conforme a cor do
desenho. O nivelamento é feito com lixa grossa e o acabamento com lixa fina. A
Figura 44: (A) Antes e (B) depois da peça restaurada pelo IEPHA/MG.Figura 44
mostra o resultado de todo o processo que, aparentemente, alcançou o objetivo de
maneira satisfatória.

41
JOYNT, Anna. Cuban Mortar Tiles. International Cooperation and Regeneration through the
Rediscovery of a Lost Craft. Havana: Faculty of Architecture, University of Havana, 2009 p. sn.
42
IEPHA/MG, Ministério do trabalho da Itália. Restauração de cerâmicas e materiais pétreos. Belo
Horizonte, 2001, p. 34-35.
43
Massa plástica de marca italiana.
76
A B

Figura 44: (A) Antes e (B) depois da peça restaurada pelo IEPHA/MG. Fonte: IEPHA, 2001.

No site da fábrica Old Craft Tile44, representante e distribuidora da fábrica Del


Sur, em Madri, destaca-se que, com o passar do tempo e com o uso, os ladrilhos
hidráulicos se desgastam, levando à redução da proteção contra os efeitos nocivos
do derramamento de certos líquidos. A fim de retornarem à beleza original, devem
ser considerados os vários tipos de danos que podem ocorrer com o material:
quebras, rachaduras, manchas de óleo, ferrugem, ácido e outras substâncias.

Em continuidade às recomendações, destaca-se que, quando os ladrilhos


hidráulicos estiverem soltos, estes devem ser remontados, cuidadosamente, tendo
em conta o seu nível e a harmonia com o restante do piso. Os ladrilhos hidráulicos
rachados ou quebrados podem ser substituídos por novos ou emendados. Se as
peças para substituição não estiverem mais disponíveis na edificação, peças novas
podem ser fabricadas para compor em perfeita harmonia o desenho existente
(Figura 45).

44
http://www.oldcrafttiles.com/
77
A B

C D
Figura 45: Processo de aplicação de novos ladrilhos hidráulicos. (A) Piso em ladrilho
hidráulico apresentando lacuna, (B) contrapiso nivelado, (C) assentamento das réplicas e (D)
resultado final. Fonte: http://www.mosaicoart.es/restauracion_baldosa_hidraulica_1.html.

O site da fábrica MosaicoArt45 sugere que o piso deve ser polido por meio de
uma máquina especial, de acordo com as diferentes necessidades de cada área.
Uma vez que os ladrilhos hidráulicos estejam devidamente secos, deve ser aplicado
fluorsilicato de alumínio [(Al(F,OH))2SiO4], diluído, para dar um acabamento
brilhante. Isso também ofereceria uma sensação de piso liso, tornando-o resistente e
devolvendo-lhe as cores originais. Imediatamente, o selante deve ser aplicado para
dar o acabamento escolhido. Quando as peças estiverem secas e limpas dos
processos anteriores, deve ser aplicado, cuidadosamente, um revestimento
impermeabilizante para assegurar a proteção completa do ladrilho hidráulico.

A experiência de restauro da Sala do Instrumento do Pavilhão do Círculo


Meridiano Gautier – Museu de Astronomia e Ciências Afins, no Rio de Janeiro,

45
http://www.mosaicoart.es/
78
apresenta um exemplo de intervenção em piso de ladrilhos hidráulicos. O piso da
Sala do Instrumento era formado por uma laje apoiada por vigas metálicas, revestida
com ladrilhos hidráulicos.

Devido à exposição às intempéries, os ladrilhos hidráulicos do museu


perderam a camada de verniz e encontravam-se bastante deteriorados. Além disso,
cerca de 25% deles haviam-se perdido com a ruína da laje. Não havendo maneira
de recuperar o piso e/ou de retirá-lo, de modo a conservar sua integridade, algumas
peças originais foram resgatadas e guardadas para exposição e novos ladrilhos
hidráulicos foram confeccionados, nos moldes do original46.

Devido a atrasos na obra, foi necessário assentar o piso em cerca de 90% de


sua totalidade, antes da construção da cobertura, e o mesmo não recebeu a
proteção em resina acrílica naquele momento. Em face de possíveis danos que
poderiam ocorrer no decorrer dos trabalhos , optou-se por proteger o piso com uma
superfície de papelão corrugado, seguida de uma camada de gesso que variou de 2
a 3cm de espessura, porém, esta camada de gesso (Figura 46) foi aos poucos,
sendo danificada devido ao tráfego na obra47.

Figura 46: Piso coberto com papelão e gesso. Fonte: RESENDE e GRANATO, 2007.

46
RESENDE, Ive Luciana C. da Costa; GRANATO, Marcus. Técnicas empregadas na restauração
da Sala do Instrumento do Pavilhão do Círculo Meridiano Gautier – Museu de Astronomia e
Ciências afins/ RJ. Revista Brasileira de Arqueometria, Restauração e Conservação. Vol 1, No 5.
AERPA, 2007, p. 222.
47
RESENDE, Ive Luciana C. da Costa; GRANATO, Marcus. loc. cit, p. 222.

79
Nesse relato, nota-se que determinados cuidados e não foram observados
durante o processo. Sabe-se que uma obra de restauro exige cuidados ainda
maiores que uma obra nova. Os ladrilhos hidráulicos, nesse caso, não poderiam ter
sido assentados antes da finalização da cobertura, até porque sequer receberam a
camada de proteção eficiente que pudesse assegurar, ou melhorar, sua resistência
às intempéries.

Além disso, a camada de papelão e gesso que deveria auxiliar na proteção


das peças atuou, na verdade, de forma inadequada, pois o papelão, provavelmente,
umedeceu e manchou as peças, enquanto o gesso não deveria ter sido utilizado,
devido à sua solubilidade e à presença de sais.

Este equívoco de procedimento resultou na necessidade de uma intervenção


restaurativa em peças novas, recém-fabricadas.

Para reparar as manchas encontradas nas peças, foi feito teste preliminar
com a solução de EDTA (ácido etilenodiamino tetra-acético – C10H16N2O8),
bicarbonato de sódio (NaHCO3) e bicarbonato de amônio [(NH4)2CO3], que produziu
resultados animadores, porém, na prática, ao ser aplicada em toda a extensão de
piso afetada, não houve resultado satisfatório. As manchas provocadas pela
aderência parcial do emplastro provocaram outras manchas com o efeito de onda.

Não significa que o método tenha sido impróprio, entretanto, requer uma
execução mais cautelosa, respeitando o acúmulo de sujidade impregnada em cada
ladrilho hidráulico, individualmente48 (Figura 47).

48
RESENDE, Ive Luciana C. da Costa; GRANATO, Marcus. Técnicas empregadas na restauração
da Sala do instrumento do Pavilhão do Círculo Meridiano Gautier – Museu de Astronomia e
Ciências afins/ RJ. Revista Brasileira de Arqueometria, Restauração e Conservação. Vol 1, No 5.
AERPA, 2007
80
Figura 47: Piso com a aplicação do emplasto. Fonte: RESENDE e GRANATO, 2007.

As manchas de ferrugem não foram removidas devido à ausência de um


composto químico que atuasse ativamente nessa remoção. O ácido fosfórico
(H3PO4) poderia, por exemplo, ter sido adicionado à solução, pois ele eliminaria a
mancha49.

Uma segunda solução encontrada foi a aplicação de cera para limpeza e


bicarbonato de amônio (NH4HC03) com o auxílio de escovão e enceradeira. Este
método foi capaz de reduzir as manchas em 60%. Com isto, o processo de limpeza
do piso ganhou rapidez.

As manchas mais incrustadas nos ladrilhos hidráulicos receberam um


tratamento mais pesado, com a utilização do ácido oxálico (H2C2O4), conhecido
comercialmente por Semorin. O resultado final foi uma limpeza de cerca de 90% das
sujidades50. Porém, a Figura 48, mostra que ainda existem manchas consideráveis
nos ladrilhos.

49
OLIVEIRA, Mário Mendonça de. Tecnologia da conservação e da restauração: materiais e
estruturas: um roteiro de estudos. 3ª ed. Salvador: EDUFBA, 2006. p. 102.
50
RESENDE, Ive Luciana C. da Costa; GRANATO, Marcus. Técnicas empregadas na restauração
da sala do instrumento do Pavilhão do círculo meridiano gautier – Museu de Astronomia e
Ciências Afins/ RJ. Revista Brasileira de Arqueometria, Restauração e Conservação. Vol 1, No 5.
AERPA, 2007, p. 223.
81
A B

Figura 48: (A) Antes e (B) depois (B) da aplicação do ácido oxálico. Fonte: RESENDE e
GRANATO, 2007.

Campos51, em relato sobre a restauração da edificação que abriga, desde


2010, o Memorial Minas Gerais, descreve que durante a intervenção foi constatada a
presença de peças de ladrilho hidráulico. A princípio, a ideia era repor o piso
reproduzindo os padrões encontrados. Contudo, o custo para produzir os moldes e,
também, as dificuldades em elaborar a tonalidade exata das cores, principalmente
os tons de azul e vermelho, tornaram sua execução impraticável. Desta forma, o
recurso utilizado e implantado foi a técnica de plotagem em vidro representando o
padrão da estampa. As peças em vidro foram assentadas no piso, substituindo os
ladrilhos hidráulicos originais (Figura 49).

Peças de vidro com plotagem


imitando o padrão do ladrilho.

Figura 49: Peças de vidro com plotagem substituindo ladrilhos hidráulicos originais. Fonte:
CAMPOS, 2011.

51
CAMPOS, Cláudia Fátima. História do Ladrilho Hidráulico em Belo Horizonte. 2011.
Dissertação (Mestrado em Ambiente Construído e Patrimônio Sustentável) – Universidade Federal de
Minas Gerais, p. 166.
82
Vale ressaltar que essa técnica não é adequada quando usada em
pavimentações, pois as peças em vidro depois de assentadas apresentaram
arranhões e desgaste da plotagem com pouco tempo de uso.

Segundo o manual de conservação preventiva do IPHAN52, a conservação do


piso em ladrilho hidráulico deve ser diária. A varrição deve retirar a maior quantidade
possível de poeira e a limpeza deve ser executada com aplicação de sabão neutro e
água, por meios de uma esponja macia. Caso o piso apresente peças com lesões e
desgaste, elas devem ser substituídas ou reconstituídas por meio de emenda. Na
presença de umidade, as peças devem ser retiradas. Solucionado o problema de
umidade, tratar as peças e reassentá-las. Para o caso de peças soltas, mas que
estejam íntegras, sugere-se que sejam reassentadas com outra argamassa.

A sugestão do IPHAN é relevante, porém, não há como prever a varrição e a


limpeza (lavagem) diárias desses elementos, seja em edificações públicas ou
privadas. Por outro lado, o excesso de limpeza pode não ser benéfico ao material,
pois o mesmo será submetido em demasia à água e ao próprio desgaste mecânico
da varrição/limpeza, o que pode acelerar seu processo de desgaste a alterações.

Em Recife, o Centro de Estudos Avançados de Conservação Integrada


(CECI) desenvolve oficina de mosaico e ladrilhos hidráulicos. Esta oficina é
resultado das pesquisas realizadas pelo CECI através do curso Gestão e Prática de
Obras de Conservação e Restauro do Patrimônio Cultural – Gestão de Restauro. Na
oficina, os alunos aprendem a confeccionar, restaurar e preservar ladrilhos
hidráulicos.

A Figura 50 mostra um ladrilho hidráulico passando por intervenção


restaurativa, limpeza, enxerto, nivelamento e reintegração cromática no CECI.

52
IPHAN. Manual de Conservação Preventiva para Edificações. Brasília: MINC;
IPHAN/Monumenta, 2006, p. 35.
83
Figura 50: Aluna do CECI restaurando ladrilho hidráulico. Fonte: http://www.ceci-
br.org/ceci/br/pesquisa/lcp-m/of-mosaicos.html.

Em Corumbá/MS, houve uma oficina de ladrilhos hidráulicos, coordenada pela


Superintendência Regional do IPHAN, em parceria com poderes públicos e
iniciativas privadas locais. Segundo o site da Fundação Cândido Rondon, o objetivo
da oficina foi promover a inclusão social de jovens em situação de risco, através da
qualificação profissional na confecção de ladrilhos hidráulicos, resgatando técnicas
antigas e tradicionais, que estão sendo utilizadas na conservação e preservação do
patrimônio cultural de Corumbá. Os produtos gerados por esses jovens foram
utilizados na recuperação de construções como o prédio da Alfândega e a sede da
Associação dos Artistas de Corumbá53.

Em Belém/PA, algumas intervenções foram realizadas pela empresa de


ladrilhos hidráulicos Ornatos. Segundo o site da empresa54, foram realizadas
restaurações no Teatro da Paz, no Palacete Pinho e no Palacete Lauro Sodré,
porém constatou-se que o termo “restauração” não é aplicado corretamente pela
empresa, pois na verdade houve apenas a substituição de peças antigas por novas.

53
Centro de Estudos Avançados de Conservação Integrada. Oficina de mosaicos e ladrilhos
hidráulicos. Disponível em: www.ceci-br.org.
54
http://www.ornatos.com.br.
84
Atualmente, o Solar Barão do Guajará sede do Instituto Histórico e Geográfico
do Pará, está passando por uma obra de restauro e antigos ladrilhos hidráulicos,
aplicados no piso da edificação, também estão sendo substituídos por novos. Foi
contratada uma empresa paulista para a produção das novas peças com o mesmo
padrão de decoração (Figura 51).

B
Figura 51: (A) área do piso, na qual já foram tiradas as peças originais, (B) ladrilhos originais
empilhados pós-remoção e (C) caixa contendo as peças de substituição.

Algumas áreas do piso vão permanecer no estado original, porém algumas já


tiveram suas peças substituídas, e outras ainda vão passar pelo processo.

A Figura 52 mostra uma área com peças originais e com peças novas. O
contraste é feito pela coloração diferenciada entre as peças. Foi adicionada,
também, uma peça com padrão diferente da paginação da área.

85
NOVO
ANTIGO

Figura 52: Piso apresentando ladrilhos novos e ladrilhos antigos.

86
87
3 MATERIAIS E MÉTODOS

Os materiais desta pesquisa correspondem a oito amostras de ladrilhos


hidráulicos antigos e quatro amostras de réplicas de ladrilhos cerâmicos produzidas
para o Palacete Pinho na última intervenção restaurativa (Tabela 1). Estas quatro
réplicas são ladrilhos hidráulicos.

Tabela 1: Relação das amostras da pesquisa.


AMOSTRA OBSERVAÇÕES AMOSTRA OBSERVAÇÕES

Ladrilho hidráulico Ladrilho hidráulico


antigo antigo
AM-1 AM-7

Ladrilho hidráulico Ladrilho hidráulico


antigo antigo
AM-2 AM-8

Ladrilho hidráulico Ladrilho hidráulico –


antigo réplica
AM-3 AM-9R

Ladrilho hidráulico Ladrilho hidráulico –


antigo réplica
AM-10R
AM-4

Ladrilho hidráulico Ladrilho hidráulico –


antigo réplica
AM-5 AM-11R

Ladrilho hidráulico Ladrilho hidráulico –


antigo réplica
AM-6
AM-12R

Para a seleção das amostras foram considerados os ladrilhos, ou fragmentos


destes, que apresentavam características distintas quanto à textura, cor e espessura
das camadas, de modo a buscar certa representatividade dentre os diferentes tipos
88
de ladrilhos hidráulicos existentes nas edificações de Belém. As amostras
selecionadas pertencem à coleção do Laboratório de Conservação Restauração e
Reabilitação (LACORE), da Universidade Federal do Pará (UFPA). Foram
selecionadas para esta pesquisa as peças fragmentadas da coleção.

Para alcançar os objetivos estipulados, a pesquisa foi dividida em cinco etapas,


que estão descritas a seguir:

1ª Etapa – Pesquisa histórica e tecnológica


A pesquisa histórica abrangeu os assuntos voltados para a história do ladrilho
hidráulico, considerando a origem do material, evolução tipológica, tecnologias de
produção e de conservação e restauração. Os métodos utilizados consistem em: 1)
Pesquisas em fontes primárias como relatórios públicos dos governantes do Estado
do Pará, notícias em jornais e periódicos de época, catálogos de fábricas de ladrilho,
entre outros; 2) Pesquisas em livros e artigos científicos sobre os assuntos
mencionados.

Já a pesquisa tecnológica consistiu na investigação sobre o processo de


produção do ladrilho hidráulico a partir de: 1) Pesquisas em sites sobre as fábricas
atuais; 2) Visita às fábricas atuais de diferentes cidades brasileiras (Belém – Vila de
Icoaraci e Abaetetuba no Pará; Cachoeira na Bahia e São Paulo capital); e 3)
Entrevistas com herdeiros, proprietários e funcionários de fábricas de ladrilhos
hidráulicos (históricas e atuais).

3ª Etapa – Investigação laboratorial

1) Caracterização física
Quando à caracterização física, as análises realizadas foram: 1)
Dimensionamento com o auxílio de paquímetro digital e régua de 30 cm; 2)
Identificação das cores utilizadas na decoração das amostras; 3) Ensaio de
absorção total em água; 4) Ensaio de densidade pelo picnômetro de Hubbard; 5)
Ensaio de dureza; 6) Teste de abrasão; 7) Análise morfológica por meio de
microscópio ótico e por microscópio eletrônico de varredura (MEV) do Instituto de

89
Geociências da UFPA; 8) Análise de traço provável por meio de ataque ácido; e 9)
Granulometria.

 Dimensionamento
O dimensionamento das arestas foi feito com auxílio de paquímetro digital e
régua de 30 centímetros. As medidas foram lidas em milímetros (Figura 53).
B
A

Figura 53: Desenho esquemático da avaliação das dimensões dos ladrilhos hidráulicos.

 Classificação das cores


As cores da decoração dos ladrilhos hidráulicos foram classificadas de acordo
com a referência PANTONE, por meio de análise comparativa utilizando a própria
tabela de cores e o espectrocolorímetro PANTONE COLORCUE, pertencente ao
NTPR (Figura 54).

Figura 54: Espectrocolorímetro PANTONE COLORCUE e tabela de cores PANTONE.

 Análise morfológica

As análises foram realizadas utilizando o microscópio ótico da marca


OLYMPUS, modelo BX41, do NTPR e o microscópio eletrônico de varredura com
sistema de energia dispersiva da marca LEO, modelo 1430 VP, do Instituto de
Geociências da UFPA.

90
Para analisar as amostras, foram preparadas seções polidas de fragmento
transversal de todas as amostras, as quais foram polidas com a sequência de lixas
de 400, 600, 1200 e 1400 mesh, com polimento final feito com veludo e pasta
diamantada.

Para as análises de MEV/SED, todas as seções foram metalizadas com Au


ou Pl, no equipamento da marca EMITECH K550X.

 Absorção total de água

O ensaio utilizado para avaliar a capacidade de absorção de água pelas


amostras foi uma adaptação da metodologia descrita na NBR 12766, utilizada para
rochas de revestimento, de determinação da massa específica aparente, porosidade
aparente e absorção d'água aparente.

As amostras foram preparadas com auxílio de disco de corte e depois foram


secas em estufa por 24 horas, em temperatura de 70 ºC. As amostras devidamente
secas e resfriadas em dessecador, foram pesadas em balança técnica, sendo
posteriormente imersas em água, em outro dessecador, desta vez com bomba de
vácuo acoplada, a qual ficou em funcionamento durante uma hora de modo a
facilitar e induzir a condução da água para os poros do material. As amostras
ficaram 24 horas imersas em água e, então, foram repesadas em balança técnica. O
ensaio foi realizado no NTPR (Figura 55).

A B
Figura 55: (A) Corte da amostra e (B) pesagem em balança técnica (B).

91
Foi feito o cálculo de absorção total em água, de acordo com a equação:

Ab = Mu – Ms x 100
Ms

Onde:
Ab = Absorção de água (%)
Mu = Massa úmida (g)
Ms = Massa seca (g)

 Massa unitária

A massa unitária é determinada a partir de massa das amostras em relação à


massa específica do mercúrio. A análise segue o determinado na norma italiana
Normal 4/80 de caracterização física de pedra natural.

Primeiramente, o picnômetro de Hubbard é pesado completamente cheio de


mercúrio; depois é adicionada a amostra seca no picnômetro de Hubbard cheio de
mercúrio para que seja pesado o conjunto picnômetro mais amostra; por último, a
amostra é pesada individualmente. As pesagens foram realizadas em balança
técnica, no NTPR (Figura 56).

A B

C D

Figura 56: (A) Picnômetro de Hubbard cheio de mercúrio, (B) pesagem do picnômetro com
mercúrio em balança semi-analítica, (C) picnômetro com mercúrio e a amostra e (D) pesagem
da amostra.
92
Por último, foi feito o cálculo para a determinação da massa unitária.

Pa = M3 x 13,60
M1 - M2 + M3

Onde:
Pa = Massa unitária da amostra (g/cm³)
M1 = Massa do picnômetro cheio de mercúrio (g)
M2 = Massa do picnômetro cheio de mercúrio + amostra (g)
M3 = Massa da amostra seca (g)
13,60 = Massa específica do mercúrio (g/cm³)

 Resistência à abrasão
O ensaio de abrasão foi realizado com o abrasímetro, que foi desenvolvido no
NTPR, assim como o procedimento do ensaio, tendo por base um equipamento
similar desenvolvido na Itália (Figura 57).

Figura 57: Equipamento para teste de abrasão: abrasímetro. Fonte: MAYAN, 2004.

Para cada amostra foi necessário um corpo de prova com dimensões 5,0 cm
x 5,0 cm. Os corpos de prova foram colocados em estufa, a 70 ºC, por um período
de vinte quatro horas. Após este período, as amostras são esfriadas em dessecador,
pesadas e, posteriormente, ensaiadas. O ensaio consiste em submeter as amostras
a um processo de desgaste em um intervalo de 30 a 40 segundos sob um
carregamento de 2Kg, sendo que, neste período, deve ser passado um metro de lixa
de 120 mesh.

93
Depois de realizado o ensaio, as amostras foram devidamente limpas e
novamente pesadas. Coletados os dados, foi calculada a média percentual do
desgaste das amostras.

 Determinação da composição das camadas


O ensaio determina a proporção dos componentes da argamassa analisada:
ligante, agregado, finos e grossos. Importante destacar que este método de análise
é uma adaptação da Normal italiana55, já que ela é para argamassas de cal e foi
usada para cimento.

Os resultados deste ensaio não definem o traço utilizado nas amostras já que,
o cimento (ligante) não possui características iguais ás da cal. A cal utilizada na
argamassa é completamente decomposta na presença de HCl, enquanto que o
cimento é apenas parcialmente decomposto, já que não é completamente
carbonático.

Dessa maneira, o ensaio foi realizado para obter resultados que possam
servir de comparação entre as amostras selecionadas, podendo apresentar
informações sobre diferentes ou semelhantes composições utilizadas. Este ensaio
foi realizado apenas para a análise da composição da camada inferior das amostras.

Para isso, as amostras foram cortadas de modo a separar as duas camadas


(Figura 58). Essa separação de camadas permitiu que a camada inferior pudesse
ser avaliada individualmente.

55
TEUTONICO, Jeanne Marie. A laboratory manual for architectural conservators. Roma:
Internacional Center for the Study of the Preservation and Restoration of Cultural Property, 1988.
94
Figura 58: Amostra dividida por camadas.

A concentração de pigmentos está relacionada à cor desejada para os


desenhos. Se a cor for clara ou escura, há necessidade de concentrar para mais ou
menos, a mistura de cimento com o pigmento. Por consequência, esta concentração
influencia na composição da camada de decoração. Por este motivo a camada de
decoração não foi analisada, já que os resultados teriam muitas variáveis, devido
cada ladrilho possuir uma concentração de pigmentos diferente, isso dificultaria as
interpretações, confundindo o que seria parte do cimento e o que seria pigmento.

Primeiramente, o material foi desagregado de maneira que os grãos não se


quebrassem e passou um período de 24 horas em estufa para secagem.
Posteriormente o material foi pesado em balança analítica e colocado em béquer de
100 ml (previamente pesado). Depois, foi adicionado HCl diluído 1:4 com uma pipeta
para que fosse decomposto quantas vezes necessário (Figura 59).

Figura 59: Ataque ácido às amostras.

95
Para a separação dos finos, foi adicionada água deionizada sobre o material e
feita a agitação do béquer para deixar as partículas finas em suspensão. Assim, foi
despejado o líquido sobre o papel filtro (previamente pesado), tendo-se cuidado para
que as partículas maiores não se misturassem com as finas. Esta etapa foi repetida
até que a água de lavagem saísse limpa (Figura 60).

Figura 60: Filtragem do material suspenso.

Após o processo de separação dos finos e grossos, feita a secagem do papel


filtro com os finos e o béquer com os grossos, em estufa, por 24 horas.
Posteriormente, o material foi resfriado em dessecador e foi pesado em balança
analítica. Depois, foram calculadas as proporções prováveis de finos e grossos das
amostras.

2) Caracterização mineralógica
As análises mineralógicas foram realizadas por Difração de Raios-X (DRX),
pelo método de pó, no laboratório de raios-X do Instituto de Geociências da
Universidade Federal do Pará (IG/UFPA), utilizando o difratômetro modelo X’PERT
PRO MPD (PW 3040/60) da PANalytical. O intervalo de varredura contínua utilizado
foi de 5 a 65º 2θ (Figura 61).

96
Figura 61: Difratômetro de Raios-X do Laboratório de Caracterização Mineral do Instituto de
Geociências da UFPA.

A interpretaçâo dos difratogramas foi feita utilizando o software X’PERT High


Score da PHILIPS. Foram analisados os tardozes de todos os ladrilhos hidráulicos.
Para isso, o material foi pulverizado em gral e pistilo de ágata.

3) Caracterização química
A caracterização química das amostras foi realizada por meio da
Espectrometria de Fluorescência de Raios-X, no Laboratório de Caracterização
Mineral (LCM) da UFPA. Foi utilizado o espectrômetro WDS sequencial, modelo
Axios Minerals da, marca PANalytical, com tubo de raios-X cerâmico, anodo ródio
Rh e máximo nível de potência 2,4KW.

As amostras foram analisadas por disco fundido com 1g de amostra (somente


subtrato) e 6g de fundente (tetraborato de lítio – Li2B4O7), mistura fundida a 1000ºC
por 10 minutos.

Antes da preparação das pastilhas foi feita a etapa de perda ao fogo, a qual
consiste na pesagem do material antes e depois de uma queima a 70ºC. Assim, foi
verificada a diferença em sua massa quando submetida à temperatura.

As aquisições e o tratamento dos dados foram realizados por meio do sofware


SuperQ Manager da PANanalitical.

97
A caracterização química também foi realizada por meio de microscópio
eletrônico de varredura com sistema de energia dispersiva (MEV/SED). Pôde-se
fazer uma avaliação semi-quantitativa dos compostos químicos presentes na parte
decorativa e no tardoz dos ladrilhos hidráulicos. As análises de MEV/SED foram
realizadas no equipamento da marca LEO, modelo 1430 VP, o mesmo utilizado na
análise física, pertencente ao Instituto de Geociências da UFPA.

As amostras foram metalizadas com platina (Pt) ou ouro (Au). O metalizador


utilizado é da marca EMITECH K550X, que metaliza as amostras a partir da
interação entre o alvo e íons de ar, a uma pressão de 2.10 -1µbar, depositando uma
camada de Pt ou Au sobre as amostras (Figura 62). A análise em MEV foi realizada
utilizando seções polidas, as mesmas empregadas na análise em microscópio ótico.

Figura 62: Metalizador do LABMEV do Instituto de Geociências da UFPA.

98
99
4 RESULTADOS E DISCUSSÕES

Para avaliar ladrilhos hidráulicos é necessário conhecê-los enquanto matéria.


Para isso, os selecionados para esta pesquisa foram avaliados quanto a suas
características físicas, mineralógicas e químicas. Por fim, as amostras foram
caracterizadas quanto a suas patologias.

4.1 CARACTERIZAÇÃO FÍSICA

As amostras analisadas, em sua totalidade, apresentavam formato quadrado,


com dimensões variando entre 15 e 20cm de largura. Dentre as réplicas, observou-
se a dimensão padrão de 15cm, e para os ladrilhos antigos a dimensão de 20 cm.

Em relação às espessuras totais das amostras, as mesmas variam entre 1,7 e


2,0cm. A camada de decoração possui espessura irregular, sendo que a variação de
espessura ocorre nas próprias amostras devido ao processo artesanal de
fabricação. Em geral, as espessuras variam entre 2 mm e 8 mm.

Os tardozes dos ladrilhos apresentam marcas provenientes das prensagens


de fabricação, e em alguns casos, a impressão é exclusiva para identificação da
fábrica. Dentre as amostras desta pesquisa, a única identificada corresponde à AM-
4, que mostram as letras “ONP” no tardoz. As demais amostras possuem apenas a
marca do tampão utilizado na prensagem, gerando círculos centralizados ou
quadrados contornando a peça. As amostras AM-9R, AM-10R, AM-11R e AM-12R,
com proveniência da fábrica Ornatos, possuem a mesma impressão circular em seus
tardozes (Figura 63).

100
ONP

Figura 63: Dimensionamento e configuração do tardoz das amostras.

Com relação à camada decorativa das amostras, as cores mais frequentes


são: cinza, amarelo, azul, verde, vermelho e marrom. No entanto, os tons dessas
cores são bastante variados (Tabela 2). Algumas amostras não apresentam a
correspondência ideal entre a cor da decoração, e a cor existente na tabela

101
PANTONE. Nesses casos, optou-se pela escolha do tom mais próximo, apenas para
dar um ideia.
Tabela 2: Classificação das cores da decoração dos ladrilhos hidráulicos de acordo com a
referência PANTONE.
AMOSTRAS REFERÊNCIA PANTONE
AM-1

Warm Gray 1 U Cool Gray 10 U 490 U


AM-2

Cool Gray 10 U 442 U


AM-3

426 U 468 U 7523 U 7531 U


AM-4

473 U 4965 U
AM-5

7506 U 1817 U
AM-6

181 U 5493 U
AM-7

1817 U
AM-8

Warm Gray 3 U Warm Gray 6 U 7502 U 1817 U


AM-9R

401 U 425 U 426 U 7502 U 476 U 2925 U 5493 U


AM-10R

7534 U 7507 U 532 U 209 U


AM-11R

7634 U 7402 U 553 U 476 U 446 U


AM-12R

401 U 426 U 7502 U 476 U 2925 U

102
Em geral, a camada de decoração, de acordo com o MEV, apresenta grãos
menores, arredondados e angulosos, em menor quantidade, enquanto que a
camada inferior possui grãos maiores, de formatos diferentes, principalmente
angulosos, a exemplo da amostra AM-4 (Figura 64).

CAMADA CAMADA DE
INFERIOR DECORAÇÃO

Figura 64: Imagem de MEV de seção transversal da amostra AM-4.

Apesar das duas camadas serem constituídas de cimentos diferentes


(cimento cinza para a camada inferior e cimento branco para a camada de
decoração), as mesmas são identificadas com mesma coloração nas imagens de
MEV, indicando semelhança entre as composições químicas.

Existe uma zona intermediária entre a camada de decoração e a de suporte.


Essa zona de interseção é criada no momento da prensagem do material, quando as
camadas se compactam, garantindo, assim, boa aderência entre elas (Figura 65).

103
Camada de decoração

Zona de interseção

Camada de suporte
Figura 65: Identificação das camadas na amostra AM-8.

Após verificação visual, as amostras foram divididas em dois grupos:


amostras com superfícies lisas e amostras com superfícies ásperas. As amostras
AM-1, AM-4, AM-5, AM-9R, AM-10R, AM-11R e AM-12 fazem parte do grupo das
amostras com superfície lisa, e as amostras AM-2, AM-3, AM-6, AM-7 e AM-8
pertencem ao grupo das amostras com superfície áspera (Figura 66).
SUPERFÍCIE LISA

AM-1 AM-4 AM-5

AM-9R
AM-10R AM-11R AM-12R

SUPERFÍCIE ÁSPERA

AM-2 AM-3 AM-6 AM-7 AM-8


Figura 66: Identificação das amostras de superfície lisa e das amostras de superfície áspera.

104
Apesar da semelhança, as camadas de decoração das amostras possuem
variações quanto à concentração e tipos de grãos. Nas amostras com superfície lisa,
os grãos se distribuem uniformemente na matriz cimentícia.

A Figura 67 exemplifica seis amostras com essa característica. Na AM-4 são


identificados apenas grãos de diversos tamanhos misturado à matriz de cimento
pigmentado, sendo os maiores mais arrendados e os menores angulosos.

As amostras AM-1 e AM-5 apresentam grãos bem pequenos, o que indica


que, possivelmente, a camada de decoração das mesmas é constituída apenas de
cimento branco e pigmento. Nestas amostras, foram identificadas também
microfissuras perpendiculares à superfície da amostra.

As amostras AM-11R e AM-12R exibem dois tipos de grãos, um em tom mais


claro e outro mais escuro, indicando que outros agregados, além da areia, foram
adicionados à mistura. Essas duas amostras também se destacam das demais do
grupo por terem alguns poros maiores, identificados pelos pontos mais escuros das
imagens. Esses vazios podem ser indícios de falhas na produção, ou de prensagem
ou de má distribuição da massa na forma.

105
AM-1 AM-4

Decoração
Decoração

AM-5 AM-9R

Decoração

Decoração

AM-11R AM-12R

Decoração
Decoração

Figura 67: Imagens de MEV identificando as características morfológicas dos ladrilhos de superfície lisa.

Nas amostras de superfície áspera, nota-se que as peças apresentam


algumas particularidades quanto às características da camada de decoração.

106
Na amostra AM-6, por exemplo, os grãos são maiores e predominantemente
angulosos, em comparação às demais amostras. Os mesmos estão em menor
quantidade, e por isso mais dispersos. Neste caso, a característica dos grãos da
areia utilizada influencia diretamente no aspecto áspero da superfície do material.
Ainda nesta amostra é possível verificar diversas microfissuras, que se espalham de
maneira aleatória em toda a amostra, indicando assim a ocorrência de retração do
material (Figura 68).

AM-6

Decoração

Figura 68: Imagem de MEV da amostra AM-6.

A amostra AM-7 possui textura áspera em sua camada de decoração,


apresentando grãos pequenos e em pouca quantidade imersos na matriz, assim
como as amostras de superfície lisa. Porém, esta camada possui duas áreas com
características distintas: a área superior contem vazios espalhados pela matriz, e a
outra, mais abaixo, apresenta-se mais compacta e com menos vazios. Isto indica,
possivelmente, que esta peça já possuiu superfície lisa, mas que passou por
alterações, podendo ter sido agredida por um método de limpeza inadequado ao
material, utilizando ácido clorídrico (Figura 69).

107
AM-7 Área alterada

Decoração

Figura 69: Imagem de MEV da amostra AM-7.

A amostra AM-8 também possui camada de decoração com aspecto liso, com
grãos pequenos e ausência de poros visíveis à ampliação utilizada. Isto indica que a
característica áspera provém apenas das ranhuras produzidas no momento de sua
fabricação (Figura 70).
AM-8

Decoração

Figura 70: Imagem de MEV da amostra AM-8.

108
Para melhor conhecimento sobre a composição das amostras utilizadas,
foram verificados os traços prováveis das camadas de substrato das amostras.

A partir tabela 3 é possível perceber que os traços para estas camadas são
bastante semelhantes. As amostras possuem dosagens maiores de areia (grossos)
do que de finos (elementos do cimento). Os traços encontrados são,
aproximadamente, de 1:3, usuais para argamassas de cimento.

Tabela 3: Traço provável da camada inferior das amostras.


Amostra 1 2 3 4 5 6 7 8 9R 10R 11R 12R
Finos (%) 2,66 3,61 6,93 7,21 3,39 2,70 5,28 6,09 8,06 8,02 4,63 11,08
Grossos(%) 61,60 66,28 52,54 60,10 63,20 64,83 66,71 66,61 59,97 43,55 44,05 52,54
Ligante (%) 35,74 30,11 40,53 32,69 33,41 32,47 28,01 27,30 31,97 48,43 51,32 36,38
TRAÇOS 1 2 3 4 5 6 7 8 9R 10R 11R 12R
Ligante 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1
Finos 0,1 0,1 0,2 0,2 0,1 0,1 0,2 0,3 0,3 0,2 0,1 0,4
Grossos 2,3 2,9 1,5 2,4 2,5 2,7 3,2 3,3 2,5 1,2 1,1 1,9

Conforme pode ser notado na tabela 3, as amostras AM-2, AM-7 e AM-8


possuem as maiores concentrações de areia, já as amostras AM-3, AM-10R e AM-
11R apresentam menor porcentagem de areia que as demais.

A relação de cheios e vazios das amostras foi verificada por meio das
análises de absorção total de água (%) e massa unitária (c/m³) pelo picnômetro de
Hubbard. Por meio desses ensaios, foi observado que as amostras possuem de 5,17
a 13,34 % de poros acessíveis, e as massas específicas variam entre 1,85 e
2,17g/m³.

Segundo a NBR 945756: 1986, a absorção de água deve ser, no máximo, 8%


em ladrilhos hidráulicos. A partir do ensaio realizado, foi verificado que a maioria das
amostras está acima da porcentagem estabelecida pela norma, porém duas (AM-2 e
AM-11R), entre as oito amostras que estão acima do limite, não chegam a atingir 9%
de absorção de água (Tabela 4).

56
ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 9457: Ladrilhos hidráulicos –
Especificação. Rio de Janeiro, 1986.
109
Tabela 4: Absorção total em água e massa unitária das amostras
ABSORÇÃO TOTAL MASSA UNITÁRIA
AMOSTRAS
EM ÁGUA (%) g/cm³
AM-1 6,09 2,14
AM-2 8,82 2,15
AM-3 5,33 2,17
AM-4 12,96 1,90
AM-5 7,20 2,13
AM-6 5,17 2,17
AM-7 10,02 2,06
AM-8 13,34 1.98
AM-9R 10,30 2,07
AM-10R 12,66 1,85
AM-11R 8,50 2,13
AM-12R 10,40 2,12
Abaixo de 8% Acima de 8%

No ensaio de abrasão, foi verificado que as amostras possuem alguma


resistência ao desgaste por abrasão. As amostras obtiveram desgaste de, no
máximo, 0,22 gramas (Tabela 5).

Tabela 5: Desgaste das amostras por meio do teste de abrasão


AMOSTRAS DESGASTE (%) SUPERFÍCIE
AM-1 0,008 Lisa
AM-2 0,062 Áspera
AM-3 0,111 Áspera
AM-4 0,051 Lisa
AM-5 0,018 Lisa
AM-6 0,048 Áspera
AM-7 0,011 Áspera
AM-8 0,308 Áspera
AM-9R 0,017 Lisa
AM-10R 0,035 Lisa
AM-11R 0,011 Lisa
AM-12R 0,000 Lisa

Este teste mostrou, também, que há uma relação entre o desgaste das peças
e a textura da superfície das mesmas. Os ladrilhos hidráulicos que possuem
superfície áspera obtiveram maior perda em seu material. Das cinco amostras mais
desgastadas, quatro são de superfície áspera.
110
Para efeito de comparação, foi verificado que as amostras de ladrilhos
hidráulicos possuem resultados semelhantes às amostras de rochas ornamentais. O
desgaste das rochas ornamentais varia entre 0,01% à 0,06%. As amostras
verificadas foram: Calcário de Carnaíba Preto (CCP), Calcário de Carnaíba Branco
(CCB), Calcário de Carnaíba Rosa (CCR), Nero Marquina Nacional (NM), Bege
Bahia (BB), Mármore Branco Nacional (BN), Arabescato (AR), Arenito (AT), o
Mármore Rosa de Camacã (MRC) e Mármore Verde Jaspe (VJ) ( Tabela 6).

Tabela 6: Porcentual de desgaste em pedras ornamentais. Fonte: Mayan, 2004


Amostra CCP CCB CCR NM BB BN AR AT MRC VJ
% Perda 0,02 0,06 0,06 0,03 0,01 0,02 0,02 0,02 0,06 0,05

4.2 CARACTERIZAÇÃO MINERALÓGICA E QUÍMICA

Os minerais presentes nas amostras selecionadas possuem dois tipos de


procedência: ligante e agregado. As análises dos difratogramas permitiram a
caracterização destes dois componentes. A caracterização mineralógica da
amostragem permite interpretações sobre a matéria-prima utilizada. É importante
destacar que nem todos os componentes do cimento são possíveis de identificar,
pois possuem estrutura amorfa.

Os minerais identificados foram: calcita (CaCO3) e portlandita Ca(OH)2,


provenientes do cimento portland; quartzo (SiO2); biotita
[K(Mg,Fe)3(OH,F)2(Al,Fe)Si3O10]; albita (NaAlSi3O8); microclínio (KAlSi3O8);
perovskita (CaTiO3); ortoclásio (KAlSi3O8); cordierita [(Al3Mg,Fe)2Si5AlO18] e
muscovita [KAll2(Si3Al)O10(OH,F)2], provenientes do agregado.

A calcita é o mineral mais estável do CaCO3. Já a portlandita (Ca(OH)2), é


uma fase mineral mais instável que tende a se transformar em calcita por meio da
reação entre o hidróxido de cálcio (portlandita) e o gás carbônico da atmosfera,
como na equação a seguir.
Ca(OH)2 + CO2 → CaCO3 + H2O
O quartzo aparece, principalmente, em função da areia adicionada. O quartzo
também está presente no granito, porém não é o indicativo determinante para a
111
identificação do pó de granito, pois, apesar de ter presença em 20 a 40% na pedra,
também está presente em outros componentes do ladrilho hidráulico, como no
cimento e na areia.

Os feldspatos – albita (NaAlSi3O8), microclínio (KAlSi3O8) e ortoclásio


(KAlSi3O8); as micas – biotita [K(Mg,Fe)3(OH,F)2(Al,Fe)Si3O10] e muscovita
[KAll2(Si3Al)O10(OH,F)2]; e a cordierita [(Al3Mg,Fe)2Si5AlO18] e a perovskita(CaTiO3),
são derivados de pó de granito, que podem ou não ser adicionados aos ladrilhos
hidráulicos.

A partir da identificação das amostras, conforme a Figura 71, foi verificado


que as mesmas podem ser divididas por tipo de agregado: areia (AM-1, AM-5, AM-6,
AM-7 E AM-8); e areia mais pó de granito (AM-2, AM-3, AM-4, AM-9R, AM-10R, AM-
11R e AM-12R).

AREIA AREIA + PÓ GRANITO


AMOSTRA LIGANTE AGREGADO AMOSTRA LIGANTE AGREGADO

Quartzo, albita,
AM-1

AM-2

Calcita,
Quartzo Calcita biotita e
portlandita
microclínio

Quartzo,
AM-5

AM-3

Calcita Quartzo Calcita microclínio e


perovskita

Quartzo,
AM-6

AM-4

Calcita Quartzo Calcita ortoclásio e


microclínio
AM-9R

Quartzo, biotita,
AM-7

Calcita Quartzo Calcita ortoclásio e


microclínio
AM-10R
AM-8

Quartzo, biotita e
Calcita Quartzo Calcita
albita
AM-11R

Quartzo, albita,
Calcita biotita, cordierita e
ortoclásio
AM-12R

Quartzo,
Calcita
muscovita e albita

Figura 71: Separação das amostras por tipo de agregado.

112
A amostra AM-1 apresenta calcita, portlandita e quartzo em sua composição
mineralógica. A presença da portlandita mostra que a amostra ainda não foi
completamente carbonatada. Por meio do MEV/SED, é possível identificar grãos de
quartzo na amostra pela presença o Si e do O, nas áreas de tom cinza escuro.

Os elementos químicos que compõem a calcita e a portlandita também são


identificados na matriz da amostra. A altura do pico sugere a alta concentração de
Ca na amostra. O Al e Fe estão presentes na amostra, porém não foram
identificados minerais com estes elementos em sua composição. Isto acontece
porque, provavelmente, estão no estado amorfo (Figura 72 eFigura 73).

Q
C – Calcita
P – Portlandita
Q – Quartzo

Q
Q
Q
C Q Q Q Q
Q Q Q
C Q
P P
C

Figura 72: Digrafograma da amostra AM-1.

113
Figura 73: Caracterização química por MEV/SED da amostra AM-1

O difratograma da amostra AM-2 mostra que os minerais identificados na


mesma são calcita, quartzo, albita e biotita. Na imagem de MEV/SED, os elementos
químicos identificados correspondem aos minerais da amostra (Figura 74 e Figura
75).

B C – Calcita
Q Q – Quartzo
A – Albita
B – Biotita
M – Microclínio
A

M
C

Q
Q
A Q
A C C C Q Q
A
C
Q

114
Figura 74: Difratograma da amostra AM-2.

Figura 75: Caracterização química por MEV/SED da amostra AM-2.

Na amostra AM-3 foram identificados os minerais calcita, quartzo, microclínio


e perovskita, indicando que a amostra é composta por cimento carbonatado, areia e
pó de granito (Figura 76). O ponto 1 da imagem de MEV indica a presença de
elementos químicos do cimento na matriz das amostras, assim como os elementos
identificados no ponto 2. O ponto 3 identifica os elementos K, Al, Si e O, que podem
ser referentes ao microclínio. A presença de Fe pode ser indício do pigmento
utilizado na camada de decoração da amostra (Figura 77).

115
Q C – Calcita
Q – Quartzo
M – Microclínio
P – Perovskita

Q
C
Q
M Q Q
Q Q
QQ Q Q
C CP C C CC
C C Q

Figura 76: Difratograma da amostra AM-3.

Figura 77: Caracterização química por MEV/SED da amostra AM-3.

A AM-4 possui calcita, quartzo, ortoclásio, cordierita e biotita. O ponto 1 indica


a presença de quartzo, o espectro do ponto 2 mostra elementos que compõem o
ortoclásio e o espectro do ponto 3 apresenta elementos químicos que podem ser
tanto do cordierita ou da biotita (Figura 78Figura 79).

116
Q
C – Calcita
Q – Quartzo
B
O – Ortoclásio
Co – Cordierita
B – Biotita

Q Q Q
Co Q
O Co QC Q
C CC
C O OO
C C

Figura 78: Difratograma da amostra AM-4.

1
2

Figura 79: Caracterização química por MEV/SED da amostra AM-4.

As amostras AM-5, AM-6, AM-7 e AM-8 apresentam apenas cimento e areia


em sua composição, pois seus difratogramas indicam a presença de calcita e de

117
quartzo, enquanto a amostra AM-7 apresenta também o mineral portlandita. As
Figura 80 e Figura 81 mostram gráficos representativos dessas amostras.

Q
C – Calcita
Q – Quartzo
P – Portlandita

C Q
Q C Q
Q Q
P Q Q Q
C P C Q CC Q Q
C C

Figura 80: Difratograma representativo das amostras AM-5, AM-6, AM-7 e AM-8.

Figura 81: Caracterização química por MEV/SED das amostras AM-5, AM-6, AM-7 e AM-8.

118
A amostra AM-9R possui calcita, quartzo, biotita, microclínio e ortoclásio. Os
espectros de MEV/SED apontam indícios de elementos do cimento e o quartzo
(Figura 82 eFigura 83).

Q C – Calcita
Q – Quartzo
B – Biotita
M – Microclínio
O – Ortoclásio

O
B
O
Q
C
Q
Q Q Q
O Q Q
CM O Q MQ Q
O C CC C Q
C

Figura 82: Difratograma da amostra AM-9R.

Figura 83: Caracterização química por MEV/SED da amostra AM-9R.

119
A Figura 84 mostra o difratograma e os espectros da amostra 10R. Estão
presentes os minerais calcita, quartzo, biotita e albita. Os espectros dos pontos 1 e 3
indicam elementos dos agregados albita e quartzo e o espectro 2 resulta da
composição do cimento (Figura 85).

Q
Calcita
Quartzo
Biotita
Albita

C
A
B
Q

Q Q
Q
A A Q Q
AC A C C CC
Q
Q Q
C
Q

Figura 84: Difratograma da amostra 10R.

Figura 85: Caracterização química por MEV/SED da amostra AM-10R.

120
A amostra AM-11R é constituída de calcita, quartzo, biotita, albita, cordierita e
ortoclásio. Como já foi dito, a calcita é um mineral do cimento que indica que o
material foi carbonatado. Os demais minerais identificados são de procedência do pó
de granito constituinte do agregado (Figura 86 eFigura 87).

B C – Calcita
Q – Quartzo
B – Biotita
A – Albita
Q Co – Cordierita
O – Ortoclasio
A

Co
Q C
A Co C C C
AC A OO
A QC C Q Q
B

Figura 86: Difratograma da amostras AM-11R.

Figura 87: Caracterização química por MEV/SED da amostra AM-11R.

121
Há na amostra AM-12 calcita, quartzo, albita e muscovita (Figura 88). Os
espectros de MEV/SED indicam a presença dos elementos químicos constituintes
desses minerais (Figura 89).

C – Calcita
Q Q – Quartzo
A – Albita
M – Muscovita

A
M
C
Q

Q
Q
Q Q
A AC Q
M A Q C Q
C Q M C Q
Q

Figura 88: Difratograma da amostra AM-12R.

Figura 89: Caracterização química por MEV/SED da amostra AM-12R.

122
A análise química por fluorescência de raios-X complementa os resultados de
análise química pontual de MEV/SED. Identificou-se que as amostras são
constituídas principalmente por SiO2, CaO e Al2O3, em quantidade elevada em
relação aos demais óxidos analisados. Importante destacar que essa análise foi
realizada, também, apenas para a camada inferior das amostras, portanto, os
elementos cromóforos não foram identificados (Tabela 7).

Tabela 7: Composição química das amostras.


Composição química (%)
Amostra
P2O5 TiO2 MgO Fe2O3 Al2O3 CaO SiO2 Na2O K2O MnO2 P.F.
AM-1 0,05 0,18 0,37 1,44 2,66 18,95 65,83 - - - 10,51
AM-2 0,23 0,42 1,07 3,66 10,83 16,47 52,17 1,91 2,18 - 12,06
AM-3 0,06 0,14 0,62 1,12 3,65 20,39 57,51 0,38 0,89 - 15,24
AM-4 0,16 0,46 1,49 2,44 7,35 23,08 46,95 1,17 1,89 0,14 14,86
AM-5 0,05 0,13 0,15 0,96 1,31 10,99 75,24 - - - 11,15
AM-6 0,05 0,18 0,49 1,43 1,55 19,23 66,20 - - - 10,86
AM-7 0,07 - 0,10 0,69 1,20 13,76 71,38 - - - 12,80
AM-8 0,05 0,26 0,21 0,79 3,08 11,55 74,11 - - - 9,96
AM-9R 0,07 0,24 0,87 1,29 8,22 15,90 58,49 2,18 1,41 0,15 11,20
AM-10R 0,06 0,23 1,43 1,49 7,90 25,75 43,50 1,69 - 0,17 16,59
AM-11R 0,26 0,45 1,72 3,83 10,55 23,37 42,06 2,08 2,08 0,21 13,38
AM-12R 0,11 0,17 1,13 1,34 8,83 19,33 53,72 1,83 1,78 0,10 11,65

De acordo com os resultados obtidos, o SiO2 está em maior concentração,


atingindo até 75%, na amostra AM-5. O P2O5 está em baixa concentração e não foi
identificado nas análises por MEV/SED. A presença dos óxidos Na 2O, K2O e MnO2
está relacionada à presença dos minerais albita, biotita e muscovita, no entanto,
podem estar relacionados também à composição do cimento.

4.3 IDENTIFICAÇÃO DE PATOLOGIAS NA AMOSTRAGEM

A partir do que foi visto no item 2.5, foi possível identificar as patologias
presentes na amostragem de ladrilhos hidráulicos da presente pesquisa. As
patologias encontradas foram: lacuna, fragmentação, sujidade, deposição,
cristalização de sais, corrosão, fissura, alteração cromática e sulcos.

Foram identificadas lacunas em todas as amostras, resultado de


fragmentações das peças por causas diversas.

123
As amostras AM-1e AM-6 encontram-se em fragmentos. As duas amostras
estão em cinco pedaços e cada uma apresenta ainda áreas com fragmentação
parcial. Normalmente, a camada de decoração é mais atingida que a camada
inferior, na fragmentação parcial. As amostras AM-5 e AM-8 também apresentam
áreas fragmentadas parcialmente (Figura 90).

Fragmentação
parcial

Figura 90: AM-1 com fragmentação total e parcial.

Em todos os casos, os fragmentos são de formatos e tamanhos diferentes, e


estão localizados nas bordas das peças. A fragmentação das peças está
relacionada com a remoção das amostras do seu suporte original, com técnicas
impróprias. Para a remoção do material, quase sempre, os operários utilizam
ferramentas, como martelos e talhadeiras, de maneira despreocupada à
preservação do material. Nestes casos, os ladrilhos hidráulicos não resistem ao
estresse mecânico aplicado e quebram.

A AM-5 é a única amostra que apresenta fissuras em sua superfície. Essas


fissuras também são resultantes de estresse mecânico. Provavelmente, foram
geradas a partir da fragmentação da amostra, pois estas finas fissuras estão
localizadas em proximidade às áreas fragmentadas e de lacuna (Figura 91).

124
Figura 91: Amostra AM-5 apresentando fissuras.

Apenas as amostras AM-2 e AM-5 possuem sujidade em suas superfícies. A


AM-2 possui superfície áspera, o que contribui para a permanência das partículas de
sujeira. Já a AM-5, apesar de apresentar superfície lisa, também possui sujidade,
porém, diferentemente da AM-2, a sujidade desta amostra encontra-se de maneira
heterogênea, concentrada nas bordas da peça (Figura 92).

Figura 92: Amostras AM-2 e AM-5 apresentando sujidade.

As amostras AM-1, AM-3, AM-4, AM-5 e AM-6 apresentam deposições na


superfície. A AM-1 possui argamassa de cimento e salpicos de tinta, a AM-3 possui
pequenas áreas com deposição de cera e a AM-4 possui deposição de pingos de
tinta, assim como a AM-5, sendo que a primeira, em maior quantidade, com pingos
espalhados por toda a superfície da amostra (Figura 93).

125
A B
Figura 93: (A) Amostra AM-4 com deposição de pingos de tinta e (B) amostra AM-1 com
deposição de argamassa.

Outra patologia identificada é cristalização de sais. Ela está presente em


quatro amostras: AM-4, AM-11R e AM-12R. Essa patologia é característica de peças
de ladrilho hidráulico com fabricação recente ou pouco utilizadas, como é o caso das
réplicas elencadas para a pesquisa. Apesar da AM-4 não ter sido identificada como
réplica, ainda assim, apresenta eflorescência, sendo que em menor intensidade que
as demais (Figura 94).

Figura 94: Amostra AM-11R com eflorescência.

Com base na análise morfológica do material, por meio das imagens de MEV,
foram identificadas alterações na superfície da amostra AM-7. Foi verificado que a
mesma sofreu uma dissolução em sua superfície. Provavelmente a dissolução
possui origem em reações químicas que atacaram os carbonatos, resultando na
aspereza do material.

126
A AM-7 apresenta, também, alteração cromática. Esta alteração tende à cor
vermelha e está localizada em uma das bordas da peça. Provavelmente esta
alteração está relacionada à influência de outro material, de cor avermelhada, que
esteve em sua proximidade por algum período (Figura 95).

Figura 95: Alteração cromática na amostra AM-7.

A amostra AM-11R apresenta, ainda, uma área de desgaste ocasionado por


uma máquina de corte (Figura 96).

Figura 96: Marca causada pela máquina de corte na amostra AM-11R.

127
128
5 CONCLUSÕES

A pesquisa, desenvolvida em cinco frentes principais, mostra a importância da


manifestação histórica, artística e tecnológica do ladrilho hidráulico como elemento
arquitetônico tradicional. A mesma atingiu seus objetivos de adquirir informações
detalhadas sobre a história dos ladrilhos hidráulicos em Belém, sobre o processo de
produção dos ladrilhos antigos e das réplicas atuais, sobre as características
tecnológicas do material, sobre alterações do material, assim como sobre os
subsídios para a conservação e restauração de ladrilhos hidráulicos.

Conforme a pesquisa efetuada, foi constatado que Belém apresenta grande


quantidade de edificações que usaram ladrilhos hidráulicos como material de
revestimento. Os mesmos são encontrados em grande variedade de padrões, por
terem proveniência diversa, visto que podiam ser importados de diversos países ou
também serem produzidos na cidade.

A produção local de ladrilhos hidráulicos favoreceu o uso mais intenso deste


material nas edificações, levando-o a popularização. As fábricas produziam dos tipos
mais simples aos mais rebuscados, em termos decorativos, resultando em preços
diferenciados. Este fator pode ser constatado a partir do tipo de ladrilho utilizado nas
edificações: as mais simples apresentam desenhos mais simples, e as edificações
mais suntuosas, ladrilhos mais elaborados. No entanto, apesar da variedade de
tipos, é comum verificar edificações com o mesmo padrão de ladrilho aplicado no
piso. Isto acontece devido à limitação de aquisição de moldes para a confecção
deste material. Os moldes não eram produzidos pela própria fábrica, mas por
artesãos especializados em metais forjados. O mesmo artesão fornecia moldes para
diversas fábricas de ladrilhos, e a dificuldade do trabalho em metais não permitia, na
época, grande diversidade de desenhos, ao contrário dos azulejos, por exemplo, que
eram pintados por meio de gabaritos de papel ou de gesso.

Nesta pesquisa foram estudados ladrilhos hidráulicos antigos e réplicas,


sendo possível traçar diferenças da produção destes materiais devido à matéria-
prima utilizada. Os primeiros eram produzidos com cimento e pigmentos importados,
devido à falta de matéria-prima local, bem como pela facilidade de importação
129
desses com as relações comerciais Brasil-Europa. Entretanto, a partir do século XX,
as fábricas começaram trabalhar com produtos nacionais. Atualmente, algumas
fábricas produzem ladrilhos hidráulicos com pigmentos importados, já que os
pigmentos nacionais não possuem características de qualidade e fixação de cores
que propiciem uma boa durabilidade do material, em comparação com os outros.

Nos dias de hoje, poucas pessoas se interessam em trabalhar na produção


de ladrilhos, o que significa a má qualificação dos ladrilheiros, resultando em peças
com desenhos não tão bem acabados e com prensagem falha.

Os estudos tecnológicos efetuados nas amostras selecionadas permitiram o


melhor conhecimento do ladrilho hidráulico como matéria. Esta é uma etapa de
fundamental importância para o desenvolvimento de um trabalho de tecnologia do
restauro, já que o conhecimento dos materiais é pré-requisito para uma intervenção
bem estudada. Nesta etapa foram realizadas análises para a caracterização física,
mineralógica e química.

Em análises macroscópicas foi possível determinar o dimensionamento e as


cores das amostras. O dimensionamento destas contribuiu para a identificação do
padrão de dimensão 20 x 20 cm em ladrilhos hidráulicos em Belém. Esta informação
indica a diferenciação, primeiramente, de ladrilhos hidráulicos e cerâmicos: os
ladrilhos cerâmicos costumam medir 15 cm de lado, ao passo que os hidráulicos
apresentam 5 cm a mais, em cada lado.

Com base no dimensionamento das espessuras das camadas de decoração e


nas imagens de MEV, é possível afirmar que as amostras estudadas ainda possuem
vida útil longa, apresentando 4,5mm de espessura e poucas alterações.

A identificação da coloração das amostras permite intervenções restaurativas


e produção de réplicas compatíveis com a cor da decoração original. Em relação às
cores, foi utilizada, como referência, a tabela PANTONE para sua determinação.

130
No contexto microscópico, as imagens de MEV possibilitaram perceber que a
camada de decoração e a camada inferior possuem conformações diferenciadas.
Consequentemente, cada camada se comporta de maneira diferente. Por isso, é
destacada a importância da metodologia de caracterização individual de cada
camada.

As análises de MEV permitiram, ainda, a verificação da diferença morfológica


entre a camada de decoração das amostras que possuem superfície lisa e das
amostras que possuem aspereza na superfície. Conclui-se que os dois tipos de
ladrilhos (liso e áspero) podem se comportar de maneira diferente no meio ambiente,
diferenciando a velocidade de ações intempéricas.

No que tange à composição física, os resultados obtidos da camada inferior


mostraram que as fábricas, no geral, tendem a seguir um padrão de traço para a
produção dos ladrilhos.

Foi verificado que o aspecto liso ou áspero da superfície das amostras pode
não ser resultado da proporção entre os diversos componentes utilizados: as
amostras que possuem superfície lisa nem sempre possuem menos agregado que
as de superfície áspera. Estas características podem estar mais relacionadas ao
tamanho e ao formato dos grãos do que à quantidade contida na amostra.

O ensaio de absorção total de água mostra que a maior parte da amostragem


possui absorção acima da estipulada na norma para ladrilhos hidráulicos. A
porosidade do material pode ser resultado da matéria-prima utilizada ou por
deficiência da prensagem.

A baixa porosidade do material é importante para a sua conservação, tendo


em vista que, quando o mesmo possui baixa absorção de água, contribui para que
seja pouco atingido por patologias causadas pela influência de água, como manchas
de umidade, eflorescências e presença de microorganismos.

131
Em comparação com outros tipos de revestimentos, principalmente os
cerâmicos, os ladrilhos hidráulicos mostram-se mais porosos. Porém, deve ser
levado em consideração que, na maioria das vezes, os ladrilhos hidráulicos estão
acompanhados por uma camada de resina aplicada pelos usuários, responsável
pela proteção da superfície do material, diminuindo a influência da água.

Quanto mais antigo for o ladrilho hidráulico, mas resistente ele é, devido à sua
hidraulicidade. A sua resistência aumenta com o tempo, pois a umidade natural e a
proveniente de lavagens favorecem, consideravelmente, seu endurecimento e
carbonatação.

Quanto às características mineralógicas, a calcita e o quartzo estão presentes


na totalidade das amostras, devido à composição típica do material: cimento e areia.
Porém, também foi verificada a presença de outros minerais, tais como micas e
feldspatos, indicando que algumas amostras possuem, ainda, pó de granito em sua
composição.

A utilização de pó de granito pode estar relacionada à facilidade de aquisição


da matéria-prima pelo fabricante. É muito comum que fábricas de ladrilhos
hidráulicos trabalhem, também, com outros produtos fabricados com cimento, como
o granilite, o qual também utiliza resíduos de granito como matéria-prima.

Não foram verificadas diferenças sensíveis entre os resultados das análises e


testes das amostras originais e das réplicas, não sendo possível realizar
diferenciação entre elas. Entretanto, dentre as réplicas, as quais se sabem a
procedência e período de fabricação, ocorrem diferenças em suas características.

A não uniformização dos resultados obtidos para as réplicas indica que as


peças não são fabricadas com as mesmas características.

 Sobre as alterações do material


Nos ladrilhos hidráulicos, bem como em diversos materiais de construção a
restaurar, a etapa de mapeamento de danos, na qual são registradas as patologias,

132
é importante para reconhecer as alterações, mas, também, entender seus motivos e
proveniências.

As patologias encontradas nos ladrilhos hidráulicos analisados, em sua


maioria, são superficiais. As alterações ocorrem na interface exposta do material
com o meio ambiente. Entretanto, também foram encontradas alterações próprias do
material, como eflorescência e fissuras de retração.

As réplicas estão mais propícias às eflorescências, devido à evaporação de


solução de carbonato de cálcio. Já as fissuras podem estar associadas à pouca
quantidade de agregado na camada de decoração.

As patologias mais comuns identificadas nas amostras, causadas por


intemperismo, são: lacuna, fragmentação, deposição e sujidade. As duas primeiras
influenciam ativamente nas peças, e as intervenções realizadas, nestes casos,
demandam mais cautela. Já as deposições e as sujidades acumulam-se em
decorrência da aspereza do material, mas são de fácil remoção.

Foi verificado que as patologias estão sempre associadas: a fragmentação


gera lacuna, enquanto que a sujidade pode evoluir para crosta e causar alteração
cromática.

Os pisos em ladrilhos hidráulicos precisam ser constantemente preservados.


Por se tratar de material carbonático, as intervenções devem ser cautelosas e pouco
incisivas, tais como varrição e limpeza com água e sabão neutro, medidas
adequadas para evitar o desenvolvimento de patologias, como sujidade, deposição,
crostas e ataques biológicos.

A utilização de sabão neutro garante a preservação da camada mais externa


do ladrilho. Além disso, o sabão neutro, ao contrário do sabão comum, possui
menos hidróxido de sódio em sua composição, agredindo menos o material.
Enquanto isso, outros produtos de limpeza não devem ser aplicados a ladrilhos
hidráulicos. São eles: hipoclorito de sódio e cloro, principalmente por alterarem a

133
coloração da decoração da peça, resultando em cor esbranquiçada; e ácido
muriático (HCl diluído), pois decompõe os carbonatos presentes no cimento.

Como já foi dito anteriormente, ladrilhos hidráulicos são materiais resistentes


ao desgaste por abrasão. A informação correta sobre esse dado permite melhor
escolha de qual instrumento utilizar na limpeza por abrasão branda.

As escovas de cerdas duras podem ser utilizadas para limpeza do material


sem causar arranhões e desgastes. A palha de aço, por sua vez, deve ser evitada,
pois, apesar do ladrilho hidráulico se mostrar resistente à abrasão, a palha de aço
pode deixar seus resquícios e manchar o material, já que quando em contato da
água, os restos do aço entram em processos corrosivos. O jato de água com
pressão reduzida também pode ser utilizado na remoção de sujidades, deposições e
crostas.

Em casos de pisos com superfícies desniveladas, por desgaste ou com


sujidades e deposições, a regularização e a limpeza podem ser feitas com
polimento. Entretanto, primeiramente deve ser feita investigação sobre a espessura
da camada de decoração, assim como deve ser avaliada a resistência à abrasão.

A espessura da camada de decoração determina até que ponto a mesma


pode ser desgastada pelo polimento: caso a camada seja muito fina, o polimento
não poderá ser realizado. O dado sobre a resistência à abrasão indica o limite da
intensidade que o polimento deve ser aplicado. Se o material não apresentar boa
resistência à abrasão, o polimento deve ser realizado de maneira cautelosa.

Nos casos das reconstituições de perda de material, como lacunas e


fragmentações, deve-se recorrer a algum método de reintegração. Para as lacunas,
a melhor solução é o uso do próprio cimento e de pigmentos, baseado na proporção
entre os diversos componentes do material e na sua composição química, com
adição de areia fina e moída, que contribui para a diminuição da retração do
material.

134
Para colagem de fragmentos em que é possível o encaixe, ainda que com
pequenas falhas, o cimento pode ser utilizado, pois possibilita melhor acabamento.
Em contrapartida, quando os fragmentos apresentarem junção perfeita, a cola epóxi
é mais indicada, já que é mais resistente e permite aplicação com pouca espessura.

O preenchimento com argamassa polimérica não é muito adequado devido à


diferença de resistência entre material de reintegração e o ladrilho, apesar de ser de
fácil execução.

Os resultados obtidos na pesquisa caracterizam-se como subsídios para a


conservação e restauração de ladrilhos hidráulicos. A partir dos dados adquiridos
podem ser traçados métodos de intervenção seguros e eficientes para este tipo de
material (Figura 97).

A pesquisa pode ser utilizada como base para trabalhos futuros, tanto pela
contribuição histórica quanto tecnológica. Testes e avaliações das intervenções
indicadas podem ser realizados para verificação da eficiência das técnicas
propostas.

135
Figura 97: Imagem-resumo das etapas de caracterização, diagnóstico e intervenção.

136
137
6 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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142
143
7 ANEXOS

ANEXO 1 – Transcrição de texto


“MOSAICOS HIDRÁULICOS. ORSOLA, SOLÁ Y COMPAÑIA. –
BARCELONA. PROVEEDORES DE LA REAL CASA – MEDALLA DE ORO EN LA
EXPOSICIÓN DE BARCELONA DE 1888 – En La Exposición Universal de Paris de
1889, la ÚNICA MEDALLA DE ORO acordada á la fabricación de MOSAICOS
HIDRÁULICOS, fué concedida á nuestros productos, en competencia con los de las
demás naciones del mundo. GRAN DIPLOMA DE HONOR EN BRUSELAS 1892 –
Fábrica la más importante de cuantas hay establecidas tanto en España como en el
extranjero, la que cuenta con mayor número de dibujos y existencias, y la que ha
logrado una fabricación más perfeccionada. – Pavimento el más durable y
consistente que se conoce, lo garantizan 16 años de constante éxito. – Fabricación
de objetos de cemento y granito. Producción anual: 4.500.000 piezas. Fabrica en
Barcelona: calles de Calabria, Rocafort y Consejo de Ciento. Casa en Madrid:
Caballero de Gracia, 56. – DESPACHO CENTRAL: Plaza de la Universidad, 2
Barcelona”.

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