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UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA

FACULDADE DE ARQUITETURA
MESTRADO EM ARQUITETURA E URBANISMO

NAJLA LUCRESIA DE SALES RIBEIRO

O “ECLETISMO” DOS GRADIS MODERNOS DE


SALVADOR

Salvador
2007
NAJLA LUCRESIA DE SALES RIBEIRO

O “ECLETISMO” DOS GRADIS MODERNOS DE


SALVADOR

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-


Graduação em Arquitetura e Urbanismo, da
Faculdade de Arquitetura, da Universidade
Federal da Bahia, como requisito parcial para
obtenção do grau de Mestre em Urbanismo.

Orientador: Prof. Mario Mendonça de Oliveira

Salvador
2007
Ribeiro, Najla Jorge Lucresia de Sales.
R484 O “ecletismo” dos gradis modernos de Salvador / por Najla Jorge Lucresia de

Sales Ribeiro. – 2007.

185 f. : il.

Orientação: Prof. Dr. Mario Mendonça de Oliveira.


Dissertação(mestrado) – Universidade Federal da Bahia, Fac. de Arquitetura, 2007.

1. Trabalhos em ferro (Arquitetura) – Salvador, BA. 2. Grades (Serralharia). 3. Ferro. I. Título.


CDU: 72.04(813.8)

CDU : 72.01(813.8)
TERMO DE APROVAÇÃO

NAJLA LUCRESIA DE SALES RIBEIRO

O “ECLETISMO” DOS GRADIS MODERNOS DE SALVADOR

Dissertação apresentada como requisito parcial para obtenção do grau de Mestre em


Arquitetura e Urbanismo na Universidade Federal da Bahia, pela seguinte banca
examinadora:

Luís Alberto Ribeiro Freire____________________________________________


Doutor em História da Arte pela Universidade do Porto – Portugal.

Gilberto Corso Pereira _________________________________________________


Doutor em Geografia pela Universidade Estadual Paulista – Rio Claro– SP

Mário Mendonça de Oliveira (Orientador) __________________________________


Notório Saber pela UFBA.

Salvador, 27 de Fevereiro de 2007.


5

À
Cidade do Salvador, Bahia,
terra mágica de gente hospitaleira,
que me mostrou novos caminhos na busca
da felicidade.
6

AGRADECIMENTOS

Dirijo-os, sinceramente, a todos que me apoiaram e que, de alguma forma, contribuíram para
a realização deste trabalho; algumas pessoas foram imprescindíveis e, sem elas, certamente,
seria muito difícil conclui- lo.

Aos meus professores do PPG-AU, que sempre abriram caminho para sugestões e críticas
no processo de construção desta pesquisa. Ao Prof. Mario Mendonça de Oliveira, meu
orientador, que reconheceu a importância do tema e me incentivou a relizar o trabalho; ao
Prof. Pasqualino Romano Magnavita, que me apontou novos caminhos na pesquisa; ao Prof.
Edivaldo Couto, do Mestrado de Artes Visuais da Escola de Belas Artes, o primeiro a me
estender a mão; ao Prof. Luís Alberto Ribeiro Freire, do Mestrado de Artes Visuais, da
Escola de Belas Artes, que comigo dividiu longas conversas sobre a mesma paixão pelos
gradis, e ao Prof. Gilberto Corso que, juntos, muito contribuíram no exame de qualificação,
através de críticas e sugestões para que o trabalho adquirisse uma nova dimensão; à Profa.
Elyana Barbosa, que me auxiliou muito além da metodologia.

À arquiteta Liliane Araújo, amiga e incentivadora; aos arquitetos Daniel Colina, do Instituto
dos Arquitetos do Brasil, e Antônio Marmo da Rocha Oliveira, da Fundação Mario Leal
Ferreira, pelo material e informações disponibilizados; aos artistas plásticos Juarez Paraíso e
Bel Borba, pelo apoio e preciosas informações; à direção do Museu de Arte Moderna da
Bahia (MAM), pelas imagens concedidas e documentos fornecidos. Aos serralheiros Silvio
Roberto Andrade Costa, João da Conceição Libório e Carlos Pietrasik, e ao arquiteto José
Rivas, pelas entrevistas e material disponibilizados.

Ao amigo Rodrigo Portugal que, desde o início, me auxiliou em todas as dúvidas sobre os
programas de informática, com muita paciência. À Lourdes Pinto Nogueira, professora e
amiga, que se mostrou sempre solícita com o trabalho.

Aos meus familiares, principalmente o Prof. Jorge Luís de Sales Ribeiro, meu marido,
professor de psicologia da Universidade Federal da Bahia e mestre em Lingüística, que
soube me ouvir, sempre com uma opinião pronta sobre o trabalho.

Finalmente, aos meus amigos, que indiretamente, ofertaram sua colaboração.


RESUMO

Este texto traz uma abordagem da presença do gradil de ferro na Cidade do Salvador
mostrando como este elemento pode ser testemunho de mudanças sociais. O projeto investiga
como eles se modificaram ao longo dos anos, na segunda metade do século XX, através de
desenhos, formas e técnicas. A proposta da pesquisa foi construída a partir da análise de dados
fotográficos realizados em alguns bairros de Salvador e embasada em um suporte teórico e
bibliográfico, visando objetivar uma classificação dos dados, análise e compreensão da sua
relação de evolução dentro do contexto histórico, econômico e social. Demonstra-se que, até
o início do século XX, a influência dos modelos ingleses se tornou marcante, mas ao longo do
século passado e ínicio deste, o ferro articulado com as inovações tecnológicas possibilitou a
criação de novos padrões. Dentro do cenário da modernidade, os gradis se modificam e
atualmente, diante da paranóia, do medo e do grande crescimento da violência nas grandes
cidades, os gradis e portões se fazem cada vez mais presentes como elementos delimitadores
do espaço público e privado. Atualmente, alguns são produzidos como obras de arte dentro do
contexto urbano. Mostra-se como os seus desenhos adquirem, cada vez mais, identidade e
simbolismo, com design e funções diferenciadas, criando elementos geométricos puros ou
elementos ligados à natureza, como animais, plantas ou até mesmo símbolos específicos
relacionados à instituições ou à cultura religiosa.

Palavras-chave: Ferro. Forja. Gradil. Ornamento. Serralheria – Salvador/Bahia.


ABSTRACT

This short text is all about the usage of railings and iron bars on building in Salvador city as a
testimony of social changes. This project investigates why they have modified throughout the
years on the second half of the 20th century, changing in design, shape and techniques. The
aim of this research has been reached through careful analysis of photographic data from
different sites in Salvador and extensive search in books, attempting to classify data and
understanding their connection with historic, economic and social context. Until the beginning
of the 20th century, they had been strongly influenced by the English architecture, but since
then, jointed iron started to be used as a techinical innovation and new patterns were created.
Nowadays, railings are constantly changing and due to a large growth on violance, paranoia
has invaded homes and buildings in big cities. Therefore, railings and gates have become even
more necessary to set borders in both public and private sites. Currently, they have been
created as a work of art, reflecting the urban context where they are set . Their design has
become more and more conceptual, incorporating identities and symbolism with several
functions using pure geometric elements or nature-like shapes, such as animals and plants and
even religious or corporation symbols.

Key words: Iron. Forge. Grille. Ornament. Locksmith - Salvador/Bahia.


LISTA DE FIGURAS

pag.
1 – Fotografia parcial do gradil da Ponte do Rio Caji 23
2 – Fotografia do gradil radrizado 23
3 – Linhas auxiliares do desenho do gradil radriazado 23
4 – Desenho do gradil no Auto CAD 23
5 – Gradil Modelo 148 – Gerdau 36

6 – Gradil Modelo 149 – Gerdau 37

7 – Gradil Modelo 150 – Gerdau 38

8 – Gradil Modelo Medici – Ind. I.A. 41

9 – Gradil Modelo Orleans – Ind. I.A. 42

10 – Gradil Modelo Windsor – Ind. I.A. 43

11 – Foto de máquina de solda “Tigre” para aço inox 46

12 – Foto de máquina de solda elétrica para ferro 46

13 – Foto de lixadeira para acabamento final 46

14 – Foto de forja artesanal 46

15 – Foto de politriz – polimento de aço inox 47

16 – Foto de prensa essêntrica – para ornatos em série 47

17 – Foto de calandra para chapas 47

18 – Foto de calandra de perfil até 2” 47

19 – Foto de policorte portátil 1 47

20 – Foto de policorte portátil 2 47

21 – Foto de policorte fixa 47

22 – Foto de limalha – máquina de corte – Policorte 48

23 – Foto de calandra de perfil até ¾” 48

24 – Foto de prensa essêntrica 48

25 – Foto de torno mecânico – peças torneadas 48

26 – Foto de viradeira – virar a chapa 48

27 – Foto de guilhotina – cortar de forma reta 48


10

28 – Foto de tico-tico – recortar – “tesoura” 48

29 – Praça da Piedade 66

30 –Gradil da Praça da Piedade 67

31 – Praça do Campo Grande 69

32 – Gradil do Monumento ao Dois de Julho 70

33 – Praça do Campo Grande 72

34 – Praça do Campo Grande 72


76
35 – Gradil da Praça da Piedade – (1912)
76
36 – Gradil da Praça do Campo Grande – (1853)
76
37 – Gradil da Praça do Campo Grande – (1895)
79
38 – Organograma das Categorias de Análises

39 – Hospital Aliança – Gradil Pórtico Principal 82

40 – Hospital Aliança – Gradil Mural A 84

41 – Hospital Aliança – Gradil Mural B 84

42 – Hospital Aliança – “Parque das Crianças” 86

43 – Hospital Aliança – “Parque das Crianças”– Gradil Pavão 87

44 – Hospital Aliança – “Parque das Crianças”– Gradil Borboleta 87

45 – Hospital Aliança – “Parque das Crianças” – Gradil Sereia 87

46 – Hospital Aliança – “Parque das Crianças” – Gradil Cavalo-Marinho 87

47 – Hospital Aliança – Gradil Papagaio 88

48 – Hospital Aliança – Gradil Acesso “Ala das Crianças” 88

49 – Hospital Aliança – Gradil de Segurança na “Ala das Crianças” 89

50 – Hospital Aliança - Gradil do Portão do Oxigênio 89

51 – Hospital Aliança – Gradil Mural Carrossel 90

52 – Hospital Aliança – Gradil Mural Cavalo 91

53 – Detalhe em ferro da escada do Hotel Solvay de Horta (Bégica 1895 e


1900) 92

54 – Vitrais coloridos do Hotel Solvay de Horta (Bélgica 1895 e 1900) 92

55 – Grade de ferro batido da Casa Vicens, de Gaudi ( c.1880) 92


11

56 – Hospital Aliança – Gradil Coreto 94

57 – Hospital Aliança – Detalhe do Gradil Borboleta 94

58 – Hospital Aliança – Gradil Coreto Carrossel 95

59 – Hospital Aliança – Gradil do Detalhe Pássaro Mural A 96

60 – Hospital Aliança – Gradil do Detalhe Passaro Mural B 96

61 – Gradil da residência de Silvio Roberto A. Costa – garagem 98

62 – Gradil da residência de Silvio Roberto A. Costa 98

63 – Gradil Ycaro Vital Metalúrgica 99

64 – Gradil do Museu de Arte Moderna – MAM – portão 100

65 – Gradil do Museu de Arte Moderna – MAM – detalhe 101

66 – Gradil do Museu de Arte Moderna – MAM – mural 101

67 – Gradil da Praça da Piedade 102

68 – Gradil da Praça da Piedade – portão 103

69 – Gradil da Praça Dois de Julho – portão 105

70 – Gradil da Praça Dois de Julho 105

71 – Gradil da residência de Rosana Lance Saloio 107

72 – Gradil da residência de Rosana Lance Saloio 107

73 – Gradil da residência de Pasqualino Romano Magnavita 108

74 – Gradil da residência de Pasqualino Romano Magnavita 108

75 – Gradil de residência da Ilha de Itaparica 109

76 – Gradil do Restaurante Cantina Tia Romana 110

77 – Gradil do Canela e Cia Restaurante 111

78 – Gradil do Canela e Cia Restaurante – portão 111

79 – Gradil do Condomínio Residencial Jardim 113

80 – Gradil da loja Revestimentos Eliane 113

81 – Gradil da loja Revestimentos Eliane – portão 113

82 – Gradil da Casa Branca do Engenho Velho 115


12

83 – Gradil da Escola de Inglês EBEC 117

84 – Gradil da Fundação Pierre Vergê 119

85 – Gradil da Loja Pneu – Service 119

86 – Gradil do Instituto Goethe 119

87 – Gradil do Teatro Castro Alves 121

88 – Gradil do Centro de Convenções 122

89 – Gradil da Praça Nossa Senhora da Luz 124

90 – Gradil do Shopping Grê-Center 124

91 – Gradil do Colégio Integral 125

92 – Gradil do Edifício Residencial Beta 126

93 – Gradil de residência – Condomínio Encontro das Águas 126

94 – Gradil da Faculdade de Arquitetura – UFBA 127

95 – Victor Vasarely. Gyemant – 33 128

96 – Luís Sacilotto. Composição Abstrata, sem data.Têmpera sobre tela 128

97 – Gradil residencial em Itapuã – portão 1 130

98 – Gradil residencial em Itapuã – portão 2 131

99 – Gradil residencial em Itapuã – janela 131

100 – Gradil residencial em Itapuã –portão 3 131

101 – Gradil portão 1 – desenho de João da Conceição Libório 133

102 – Gradil portão 2 – desenho de João da Conceição Libório 133


133
103 – Gradil portão 3 – desenho de João da Conceição Libório

104 – Gradil residencial em Itapuã – portão 4 136

105 – Gradil residencial em Itapuã – portão 5 136

106 – Gradil residencial em Lauro de Freitas – portão 1 137

107 – Gradil residencial em Lauro de Freitas – portão 2 137

108 – Gradil residencial no Bonfim – portão 1 138

109 – Gradil residencial no Bonfim – portão 2 138

110 – Gradil do Colégio ACBEU 139


13

111 – Gradil do Cemitério Abrigo Salvador 140

112 – Gradil da Igreja Batista Monte das Oliveiras – fachada 141

113 – Gradil da Igreja Batista Monte das Oliveiras 141

114 – Gradil da Escola Acalento 142

115 – Gradil da Escola Acalento 142

116 – Gradil da Escola Acalento – detalhe 142

117 – Gradil do Instituto do Cacau 143

118 – Gradil da Ponte do Rio Caji 144

119 – Gradil residencial em Lauro de Freitas 1 145

120 – Gradil residencial em Lauro de Freitas 2 145

121 – Gradil residencial em Lauro de Freitas 3 145

122 – Gradil residencial em Lauro de Freitas 4 145

123 – Gradil residencial no Costa Azul 146

124 – Gradil residencial no Canela 146

125 – Gradil da Passarela Urbana – FAEC 147

126 – Gradil urbano – Piatã 1 148

127 – Gradil urbano – Piatã 2 148

128 – Gradil da residência de Ivanildo Barbosa Dias 149

129 – Gradil da residência de Ivanildo Barbosa Dias 150

130 – Gradil do Edifício Margarida Costa Pinto 151

131 – Gradil residencial do Condomínio Encontro das Águas 151

132 – Gradil residencial do Condomínio Ecovilas 152


14

LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS

ACBEU Associação Cultural Brasil Estados Unidos


ASCAVI Associação dos Moradores e Amigos do Campo Grande, Canela e Vitória
CEAB Centro de Estudos da Arquitetura da Bahia
EBEC Escola Bahiana de Expansão Cultural
EDUSP Editora da Universidade de São Paulo
FAEC Fábrica de Equipamentos Comunitários
IAB Intituto dos Arquitetos do Brasil
Ind. I.A. Indústria Italiana Arteferro
IPHAN Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional
MAM Museu de Arte Moderna
PPG-AU Programa de Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo
SEPLAN Secretaria de Planejamento
SPHAN Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional
SUCON Superintendência de Controle e Ordenamento do Uso do Solo do Município
TCA Teatro Castro Alves
UFBA Universidade Federal da Bahia
USIBA Usina Siderúrgica da Bahia S.A.
15

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 17

1 FERRO 25
1.1 HISTÓRIA DO FERRO E A REVOLUÇÃO INDUSTRIAL 25
1.2 FERRO NO BRASIL 28

2 GRADIL 32
2.1 DEFINIÇÕES 32
2.2 A PRODUÇÃO INDUSTRIAL DE HOJE 33
2.3 DESENVOLVIMENTO DAS TÉCNICAS DA MANUFATURA DO
FERRO 50
2.4 FERRO FORJADO 52
2.5 FERRO FUNDIDO 55
2.6 AÇO 58

3 O GRADIL DE FERRO NA PAISAGEM URBANA


SOTEROPOLITANA 61
3.1 OS GRADIS NAS REURBANIZAÇÕES CONTEMPORÂNEAS –
ESPAÇOS PÚBLICOS 61
3.2 INTERVENÇÃO NAS PRAÇAS HISTÓRICAS DE SALVADOR 64
3.2.1 Praça da Piedade 65
3.2.2 Praça Dois de Julho ( Campo Grande) 68

4 O GRADIL EM SALVADOR NO SÉCULO XX 77


4.1 A FORMA DO GRADIL 77
4.2 A TIPOLOGIA DO GRADIL EM SALVADOR 80
16

4.2.1 Gradis orgânicos 80


4.2.1.1 Estilizados, baseados na natureza 81
4.2.1.2 Estilizados, baseados nos símbolos 114
4.2.2 Gradis geométricos 120
4.2.2.1 Efeito de movimento 120
4.2.2.2 Influência dos desenhos ingleses 129
4.2.2.3 Módulo simples 134
4.2.2.4 Módulo composto 139
4.2.2.5 Movimento moderno 145
4.2.2.6 Estruturais 147
4.2.2.7 Aços especiais 149

5 CONCLUSÃO 153

REFERÊNCIAS 159

APÊNDICES – ENTREVISTAS 164

ANEXOS – RELAÇÃO DE PROJETOS 181


INTRODUÇÃO

As transformações de uma sociedade em diferentes épocas são salientadas através de


sua arquitetura. O papel do ferro diante de tais metamorfoses foi imprescindível no processo
de mudanças da forma urbana, dando suporte para que tais avanços se concretizassem. Em
períodos diferentes, a arquitetura vai-se adaptando às necessidades de mudança de cada época
na qual o ferro desempenhou papel importante.
O século XIX foi, sem dúvida, marcado por grandes acontecimentos e nele os gradis
estiveram no seu apogeu. As tendências artísticas neoclássicas, ecléticas e modernas, que
acompanharam as transformações sociais, políticas e econômicas do século XIX, refletiram-
se, de certo modo, nos gradis de ferro. Segundo Pevsner (1980), as principais fontes do
movimento moderno são o estilo Art Nouveau e as grandes engenharias do século XIX, pois
se baseavam amplamente no emprego do ferro fundido.
O ferro, como material transformador dos conceitos artísticos da Revolução Industrial,
foi capaz de traduzir as aspirações de uma sociedade.

O ferro fundido vai sempre afinando para a extremidade achatada em forma de


leque, tomando uma forma decorativa. Evidencia-se assim uma vinculação com um
material em sintonia com uma aspiração estética e a respectiva visão da natureza,
numa determinada época e uma determinada sociedade. (MOTTA, 1983, p.460).

É possível que a presença dos ingleses em Salvador, nesse período, tenha sido o
grande responsável pela contribuição da difusão de novos processos técnicos e artísticos na
cultura local e, de forma indireta, na arquitetura.
À medida que a Inglaterra torna-se num dos pólos mais importantes da Revolução
Industrial e dos avanços na Siderurgia e, “[...]a partir do século XX, as relações funcionais
entre a arquitetura e sociedade se transformam radicalmente, e esta ruptura afeta sua
expressão formal.” (DOIS, 1976, p.26).
A arquitetura busca uma nova articulação com a realidade, diante das transformações
do mundo moderno. Os modernistas do século XX carregam os conceitos da funcionalidade e
da adequação de soluções “práticas”, de modo que este desenho formal leve os princípios da
adaptação da forma aos fins de sua função. A arquitetura funcional tendeu a eliminar o
supérfluo, contudo o ornamento não é incompatível com a ótica funcionalista da arquitetura.
A arquitetura moderna rompe vínculos, não só formais como também estruturais e de
18

princípios, com a arquitetura de estilos históricos, e os princípios que regem então o desenho,
são os da funcionalidade.
Segundo Assis (2003, p.9), “[...] com as vanguardas, que negam valores defendidos
pelas correntes anteriores, rompe-se com a tradição, a arte adquire outras potencialidades e a
interação homem – objeto artístico amplia-se com outros recursos.”
Atualmente, com os vários problemas das cidades modernas, os espaços continuam
refletindo a estrutura da sociedade, buscam o processo de transformação e trazem de volta os
gradis de ferro em vários locais públicos e privados, buscando, cada vez mais, abrigo e
proteção para o homem contemporâneo que à cada dia vive mais enclausurado na busca da
segurança. Hoje o homem habita um espaço que necessita de adaptação para vencer os
“perigos” causados pela sociedade moderna, sendo cada vez mais presente o uso dos gradis de
ferro na paisagem das cidades atuais, com a função de dar segurança e de coibir atos de
vandalismo. A sensação de confinamento e ruptura do espaço com o seu exterior, às vezes é
sentida de forma traumática, quando obriga a população ao comportamento de segregação
dentro da cidade ou de um local fechado. Diante da paranóia do medo da violência das
cidades, os gradis e portões residenciais se transformaram em elementos, acima de tudo,
limitadores, que criam obstáculos nas relações entre o público e o privado. Em geral, são eles
acrescidos do simbolismo da ameaça, agressão, ataque como “armadilhas”, e pelas formas
simplificadas, mas sistematicamente pontiagudas, como garras inclinadas para fora. No
entanto, muitas vezes os artistas plásticos, artesãos e arquitetos conseguem transformar o ferro
em verdadeiras obras de arte, desempenhando um papel fundamental na intervenção da
cidade, pois, além da função de segurança, os gradis tambem podem desempenhar o papel
decorativo e até informativo.
O tema dos gradis torna-se relevante na medida em que contribui para a compreensão
de como os desenhos estão atrelados às novas necessidades dos usuários e de como estes estão
relacionados às mudanças tecnológicas. Apesar disso, pudemos constatar que nenhuma
pesquisa ou levantamento tinha sido realizado, até então, sobre gradis modernos. O que
percebemos é que muitos julgam-na como sendo de menor importância dentro da arquitetura,
o que nos encorajou ainda mais em nosso objetivo.
Diante de todas essas considerações, levantamos alguns itens que suscitam
questionamentos dentro da pesquisa:
1. O século XX difere do século anterior e cria seus desenhos de gradis com maior
liberdade formal, sem seguir determinadas regras, desse modo, é possível classificar os gradis
dentro de determinadas categorias?
19

2. Existem diferenças nos desenhos de gradis para os diferentes usos como em


projetos de condomínios fechados, residências e edifícios públicos, igrejas, cemitérios e
praças?
3. A Cidade do Salvador sempre se destacou no cenário brasileiro por suas crenças
religiosas, suas festas populares, sua arte e outras manifestações de sua cultura. Em Salvador
existem, atualmente, gradis com desenhos influenciados nas tradições culturais?
4. Se o conhecimento afeta o espaço arquitetônico, é sabido que os arquitetos e
artistas, com o auxílio da tecnologia, criaram novas formas. Segundo Assis (2003), as grades
de ferro do século XIX mantinham um padrão mais formal da estética européia, para só depois
apresentarem estilo próprio. Os padrões dos gradis produzidos no século XX, em Salvador,
criaram estilo próprio ou sofrem ainda as influências de outros países?
5. A empresa Saracen Foundry foi fundada em dezembro de 1850, por Walter
MacFarlane, que produzia uma grande variedade de produtos manufaturados em ferro, próxima
à Glasgow, Escócia. Walter MacFarlane possuía grande competência para os negócios e
também era desenhista e técnico em metais, o que se evidencia na confecção de catálogos
cuidadosamente executados, através dos quais expunha toda linha de seus produtos. “Estes
catálogos são extraordinários, com centenas de páginas, nos quais as peças, chamadas de
examples, vêm numeradas, separadas em seções e perfeitamente explicitadas quanto aos
detalhes, proporções e medidas” (COSTA, 1994, p.47). Além disso, são apresentadas através
de desenhos técnicos detalhados que ajudavam na hora do comprador escolher e fazer
combinações com fácil visualização. Os arquitetos, construtores e compradores em geral
podiam entender todos os detalhes estruturais das peças, suas dimensões, ornamentos e formas
de aplicação e também serviam como forma de propagar o nome da empresa. Na produção de
gradis em Salvador, são artesãos, artistas plásticos e arquitetos que criam seus modelos.
Existem atualmente catálogos bem detalhados ou desenhos feitos em série que se repetem em
vários projetos e são utilizados pelos artesãos? E como hoje se apresenta a divulgação destes
materiais no mercado de Salvador?
6. Como já citado anteriormente, a criação, na Cidade do Salvador, passa por estilos
muito diferenciados ao longo do século XX. Depois do movimento moderno, a arte busca
novas maneiras de se ver a identidade brasileira. É possível identificar padrões de gradil que
ocorrem com maior freqüência nas edificações de Salvador, em determinada época?
7. Os gradis, além de sua função reguladora das relações entre público e privado,
possuem desenhos decorativos e acabamentos, quase sempre em forma de lanças verticais, que,
de modo agressivo, traduz em limites e, simbolicamente, proteção e defesa. O gradil como
20

elemento de segurança aparece em que tipo de projeto arquitetônico e quais as suas diferenças
em relação aos gradis com funções mais decorativas?
Nos dois últimos séculos que se seguiram à Revolução Industrial, o ferro sempre
esteve presente, mostrando ser facilmente adaptado em diferentes formas, graças a sua boa
resistência, a esforços específicos, fácil modulação e possibilitando a criação de desenhos os
mais diversos. No século XX, a plasticidade foi uma qualidade muito explorada através de
tramas novas, sejam elas através da forja ou pela reprodução das mais variadas linguagens
formais por meio de fôrmas que moldavam o ferro fundido.
A partir dessas observações, buscamos realizar um levantamento e estudo dos gradis
no século XX em Salvador, com suas elaborações artísticas e técnicas, com os seguintes
objetivos específicos:
1. Procurar levantar os modos de produção na confecção dos gradis de ferro na
Bahia, diferenciando as técnicas da forja, da fundição e do aço, indicando quais os avanços
proporcionados pela indústria, e destacando o aperfeiçoamento das técnicas da forja neste
último século.
2. Identificar outras funções que os gradis podem cumprir nos diferentes projetos
arquitetônicos, além de elemento limitador dos espaços público e privado.
3. Estabelecer tipologias, a partir da análise de alguns exemplares, que
representem os gradis do século XX, em períodos diferentes.
4. Identificar os elementos visuais que compõem e caracterizam os gradis do
século XX. Buscar o entendimento da transformação dos gradis, tentando estabelecer, por
exemplo, relações com as influências dos conceitos da arte contemporânea.
5. Identificar espaços tombados como patrimônio cultural que, em sua
reurbanização ou preservação, receberam gradis de ferro como solução contra possíveis atos de
vandalismo, considerando que, nos últimos anos, tem havido um esforço maior na preservação
e valorização do Patrimônio Histórico na Bahia. Verificar o papel dos gradis nessas
intervenções.
6. Cadastrar e analisar as formas estruturais e ornamentais dos gradis do séc. XX.
Os artistas, mediante o testemunho de suas obras, podem descrever a história e seus
acontecimentos. Segundo Assis (2003, p.42): “Essas descrições relatam processos históricos
através dos símbolos, revelando o homem no seu contexto social.”
Entendemos por símbolos, elementos gráficos que representem ou indiquem de forma
convencional, um elemento importante para o esclarecimento de alguns fatos sociais.
Podemos observar uma grande preocupação nestas últimas décadas pela preservação da
21

natureza, com movimentos em defesa da ecologia. Estas reflexões da sociedade


contemporânea se refletem na linguagem dos gradis, nos quais, atualmente, elementos
figurativos da natureza aparecem em obras espalhadas pela cidade.
O objetivo deste trabalho de forma mais geral será identificar quais seriam os
símbolos, que, através dos gradis, traduzem o homem no contexto social na Bahia no século
XX, e para isso levantamos as seguintes questões:
1. O que determinou a mudança de estilo no século XX dos gradis de ferro na
Bahia?
2. As mudanças de estilo condizem com o pensamento social e cultural da época?
O homem como artista consegue colocar toda sua capacidade de expressão através da
arte e comunicar-se dentro do contexto social e histórico em que vive. A arte é um fazer
contínuo de objetos e manifestações que marcam no tempo nossa sociedade de valores e
costumes.
Vemos claramente a grande herança que a arte do século XIX, transfere para a
contemporaneidade, criando novos modelos. As novas “esculturas contemporâneas” dentro da
cidade nos chamam a atenção e nos indagam para um entendimento maior do que seria a
arquitetura.
Este trabalho traz uma abordagem geral da presença dos gradis de ferro na Cidade do
Salvador, que, como parte constituinte da arquitetura e do urbano, refletem o modo de vida
da sociedade soteropolitana dos últimos cinquenta anos. O gradil desempenha papel
importante na transformação da arquitetura e nas mudanças do cenário social que estão
intimamente ligadas à relação do homem com os problemas do espaço que ele habita.
Vários são os problemas da cidade contemporânea e de seu processo de transformação.
O homem atual vem buscando, cada vez mais, abrigo dentro da cidade e se enclausurando
em espaços gradeados. O gradil nunca esteve tão presente como nos dias de hoje, com a
função de dar segurança. Atualmente, os espaços públicos e privados vêm recebendo gradis
com os mais diferentes e criativos desenhos, rompendo com as estruturas formais do século
XIX e desenvolvendo novas técnicas em sua confecção. O gradil de ferro, que no passado
era visto como símbolo de ascensão social, volta a ter status e ganhar destaque nas
construções, em geral, na Cidade do Salvador.
Com a função de dar segurança, eles são algumas vezes carregados de elementos que
simbolizam a agressão, tais como lanças pontiagudas, garras inclinadas para fora; em outras,
possuem desenhos extremamente criativos que amenizam o caráter de segregação. Alguns
modelos nos dão a sensação de confinamento e ruptura com o espaço exterior, outros
22

possuem a preocupação de integração dentro do contexto urbano, nos quais o desenho pode
cumprir papel fundamental.
Nesta pesquisa, entendem-se os gradis não apenas como objetos de segurança ou
segregação, mas vistos como uma forma de arte democrática, feita também para ser
contemplada no contexto da cidade, e que busca, através dela, ser testemunho de aspectos
sociais.
O termo “ecletismo dos gradis modernos”, sugerido aqui, nos remete às várias
tendências atuais que, de certa forma, estão fundadas na exploração e conciliação de estilos e
técnicas do passado.
Para o entendimento do trabalho, foram desenvolvidas reflexões acerca dos
acontecimentos históricos, com destaque para o desenvolvimento tecnológico de materiais e
técnicas relacionados ao ferro, que cumpriram um importante papel na estória desde as
antigas civilizações, passando pela Revolução Industrial até chegar à modernidade.
A pesquisa baseou-se em leituras correlacionadas ao assunto “ferro”, e em
depoimentos de pessoas ligadas à produção da cultura artesanal deste em Salvador, tais como
serralheiros, artistas plásticos e arquitetos. Tendo como interesse principal os gradis de ferro,
foram apontados aspectos da análise formal, conhecendo-se melhor sua natureza, funções e
relações.
Durante o levantamento do tema, constatou-se uma escassez de material bibliográfico
sobre gradis do século XX na Bahia. Por este motivo, um registro documental dos
exemplares mais importantes executados na segunda metade do século XX até a atualidade,
bem como uma análise deste material foram considerados como de grande importância.
Os gradis das últimas décadas, cada vez mais, foram criados com requinte de obras
esculturais, por arquitetos e artistas plásticos. A formação de mão-de-obra qualificada e
diferenciada produz resultados diversos na criatividade, com conseqüente busca de novas
técnicas de confecção.
Para a análise e interpretação dos gradis da segunda metade do século XX, o trabalho
se baseou numa pesquisa bibliográfica, iconográfica, documental e histórica, o que culminou
na seleção e catalogação de 71 gradis, através da reprodução de desenhos e fotos. O processo
de obtenção dos desenhos dos gradis para a análise deu-se através de medições no local e de
tomadas de fotografias. Estas foram armazenadas no programa “Paint” para, em seguida,
serem “orto-retificadas” pelo programa de “Radrizamento” (Figura 1,2,3 e 4), que permitiu
corrigir possíveis distorções em perspectivas. Após este processo, as imagens foram
repassadas para o programa “AutoCAD”, no qual os gradis foram desenhados para obtenção
23

Figura 1– Fotografia parcial do gradil da Ponte do Rio Caji.

Figura 2 – Fotografia do gradil radrizado.

Figura 3 – Linhas auxiliares do desenho do gradil “radrizado”.

VISTA
parcial do
gradil

Figura 4 – Desenho do gradil no Auto CAD.

de detalhes como cotas e outras informações julgadas necessárias para análise. Os dados
foram catalogados com a identificação quanto a local, autor, data, descrição do material e
técnica utilizada. Tal procedimento de desenhos proporcionou uma aproximação com as
formas, e permitiu o detalhe dos elementos de composição, das linhas básicas das grades, das
cores e dos tipos de barras que serviram de subsídio para a análise formal.
A pesquisa enfrentou algumas dificuldades em relação à precisão de cotas: primeiro,
porque alguns locais foram inacessíveis para a medição, que só foi possibilitada pelo
levantamento fotográfico; segundo, porque o trabalho de reprodução das imagens
fotográficas para o desenho geométrico, através dos programas, muitas vezes pode trazer
24

margem de pequenos erros cumulativos. Outra dificuldade foi a imprecisão das informações
sobre nomes e datação dos gradis, que, algumas vezes, não possuíam registros ou até mesmo
por se tratar de obras efêmeras, muitas deles instaladas e reestruturadas independentemente
do edifício, em datas posteriores ao final da obra.
A escolha dos 71 exemplares de gradis deu-se dentro de um universo muito amplo,
no qual foram procurados os modelos que possuíam mais significado, ou seja, que pudessem
expressar um conceito para as diferentes tipologias estabelecidas. Em linhas gerais, foi
efetuada a seleção de exemplares de gradis que se enquadravam nos seguintes critérios:
1. Gradis valorizados como obra de arte, dentro da cidade de Salvador, independente dos
locais específicos de sua implantação.
2. Gradis cujos desenhos e formas pudessem ser agrupados numa classificação de
análise formal.
3. Gradis que representam novas soluções de materiais e técnicas de confecção dentro
da modernidade.
4. E, por fim, gradis com expressão formal ligadas às questões sociais e costumes da
Bahia.
Considerando a grande gama de tipos de gradis que podem ser levantados no
universo de meio século, foi dada prioridade aos gradis de edificações públicas.
Não houve restrição sobre a técnica utilizada e a autoria dos gradis selecionados, os
quais foram elaborados, indiferentemente, por artistas plásticos, serralheiros ou arquitetos.
Apresentamos este trabalho em quatro capítulos. No primeiro, desenvolvemos o
resumo histórico do ferro e a sua trajetória, que culminou com a Revolução Industrial. O
segundo define o gradil, bem como o desenvolvimento das técnicas artesanais da forja, da
fundição e do aço utilizados na serralheria. No terceiro capítulo, já tratando da realidade
soteropolitana, destacamos a interferência dos gradis de ferro nas reurbanizações
contemporâneas dos espaços públicos, dando ênfase às praças do Campo Grande e da
Piedade. O último capítulo trata da análise formal, através da classificação dos gradis
selecionados e aborda os materiais e as técnicas que foram empregados na confecção das
peças.
Esta pesquisa aponta, ainda, algumas transformações da sociedade e como elas se
refletiram no desenho dos gradis, como forma de adequação à arquitetura. Nosso maior foco
foi a segunda metade do século XX, com a ótica voltada para os gradis de ferro e de aço, por
entendermos que este período foi mais significativo e também por apresentar uma maior
diversidade de estilos e soluções.
1 FERRO

1.1 HISTÓRIA DO FERRO E A REVOLUÇÃO INDUSTRIAL

Sabemos que o ferro não é um material novo. Remontam à época da pré-história


exemplos de aplicação, e seu uso não aparece nos grandes edifícios da Antiguidade clássica,
pois os gregos e romanos preferiam o bronze por se tratar de um material com maior
resistência para as trocas atmosféricas.
Há mais de 4.000 anos, já se fabricavam objetos de ferro no Egito, conforme ficou
comprovado em pesquisas arqueológicas feitas em velhos túmulos e nas grandes pirâmides ali
existentes.
Aristóteles, o notável sábio da Grécia (384 a 222 a.C.), já mencionava o fabrico do aço
na Índia. Supersticiosos ao extremo, egípcios e babilônios apelidaram o ferro de “Pedra do
Céu”, julgando-o talvez proveniente dos espaços siderais sob a forma de meteorito. O próprio
vocábulo siderurgia vincula-se, segundo Menezes (1938), à existência de uma estrela,
conhecida por “Sidus”.
No Renascimento, pouco se aplicou o ferro como material de construção. Segundo
Giedion (2004), o seu emprego pode ser visto meramente como elemento de amarração,
utilizado por Michelangelo para fixar a cúpula de São Pedro ou mesmo mais tarde, o ferro
ainda era considerado adequado somente para esta função. Por se tratar de um material com
baixa resistência à exposição ao ar livre e pelas dificuldades em produzi-lo em alta escala,
talvez por isso tenha, até então, desempenhado papel modesto nas construções até esta época.
Somente com a industrialização o ferro assumiu nova importância, quando os avanços
da história da química, da fisíca e do estudo comparativo da resistência dos materiais
trouxeram conhecimentos essenciais para possibilitar a produção industrial do ferro. A cada
nova descoberta, novos desafios foram surgindo. A Revolução Industrial é prova disso, pois
proporcionou uma mudança no modo de produção.
O século XIX é, sem dúvida, palco de grandes transformações de toda ordem pelas
quais passou a sociedade, um momento de ruptura com as técnicas tradicionais de edificação,
quando se inicia a época da construção industrial, através de elementos pré-fabricados, com o
aparecimento de novos materiais e, principalmente, o uso do ferro fundido.
26

A princípio, o material era destinado à fabricação de máquinas e utensílios de ferro


fundido. Somente em 1767, o ferro passa a ser empregado na fabricação de perfis para as
primeiras pontes.
O desejo de passar da produção artesanal para a industrial também existiu em outros
países. Grandes cidades do século XIX, como Paris, transformaram-se com o
desenvolvimento do comércio na área têxtil e com o impulso da industrialização. Com a
introdução do ferro, com o surgimento das ferrovias e, logo posteriormente, em estruturas de
construção civil, muitas foram as transformações diante dos interesses do capital.
O ferro articulado com as inovações tecnológicas, como processos recém-descobertos
de fundição, possibilitou criar novos padrões para a arquitetura na metade do século XIX.
Como material de construção, trouxe rapidez para as obras como fábricas, galerias e ferrovias
expandindo a rede de relações da cidade. Os sistemas construtivos mais empregados nesta
época, eram as estruturas de ferro com grandes panos de vidro, e o grande marco deste
período foi o início da iluminação à gás.
Com todos esses avanços, a cidade moderna mistura-se nas passagens e galerias,
confundindo os moradores com muita luz e alegoria, impulsionando o capitalismo. “Essas
imagens são imagens do desejo e, nelas, a coletividade procura tanto superar quanto
transfigurar as carências do produto social, bem como as deficiências da ordem social da
produção” (BENJAMIN, 1985, p.32).
Nesse período, a grande característica da arquitetura, talvez seja o apego por “peças de
época” como cita Gideon (2004, p.206): “Todos os seus edifícios importantes, todos aqueles
que faziam o espectador imaginar-se captando uma séria emoção estética, exibiam-se em
elaborados trajes históricos”.
No início do século XX, o modernismo reagiu posicionando-se contra os ornamentos
inúteis em produtos manufaturados e os resquícios que ficaram da arquitetura gótica e
clássica. William Morris, já no final do século XIX, por exemplo, defendia a simplicidade do
desenho, eliminando todo desperdício e possíveis imitações das artes decorativas. Sua idéia
era que, através da combinação da capacidade dos artistas e artesãos, poderia criar-se uma
arte simples e mais popular.
Segundo Pevsner (1980, p.135), as origens principais do movimento moderno foram
William Morris e o Artes e Ofícios, o movimento da Art Nouveau e as obras arquitetônicas
dos engenheiros do século XIX, com a larga utilização do ferro. O movimento Art Nouveau,
da década de 90 do século XIX, também chamado de Jugendstil, Liberty, Secession, conforme
cada país, foi significativo, pois constituiu a primeira alternativa nova às tradições do design,
27

que há muito estavam rígidas, realçando as formas orgânicas, curvas e as linhas prolongadas.

É preciso reconhecer aos arquitetos do Liberty um mérito essencial e de indiscutível


alcance: o de terem tido a brilhante intuição da natureza do material que utilizavam,
o de terem compreendido que com o cimento e o ferro se podiam criar formas novas,
formas resultantes precisamente da função de tais materiais e plenas de uma singular
poesia (DORFLES, 1986, p. 23).

A contribuição do ferro foi fundamental para possibilitar a articulação da


funcionalidade com a estética, resultando em peças de beleza surpreendente. Motta (1983)
relaciona a beleza das peças, em diferentes formas, com a visão da natureza, situando a época
e a sociedade.
Como se sabe, nos diferentes períodos da história, a arquitetura vai-se adaptando às
suas diferentes necessidades. O ferro, diante de tais evoluções, tornou-se imprescindível ao
processo de transformação da “forma urbana”, dando suporte para que os avanços se
concretizassem.
Nos trinta anos que se seguiram à Segunda Guerra Mundial, a arquitetura moderna
atinge seu auge. As propostas da Escola Bauhaus e do arquiteto Le Corbusier apresentam o
modernismo “sem floreados” e são divulgadas por todo o mundo, com suas formas
retangulares bem definidas e superfícies simples. Destaca-se, também, a obra de outro
arquiteto importante, Mies van der Rohe e seu estilo “pele e osso”, em que os “ossos” seriam
as vigas de aço e a “pele”, a fina parede de vidro (RELPH,1980).
Os modernistas do século XX traduzem os conceitos de funcionalidade e adequação
de soluções práticas, de modo que esse desenho formal tem os princípios da adaptação da
forma aos fins de sua função.
Segundo José Dois (1979, p.35): “A arquitetura funcional tendeu a eliminar o
supérfluo. Contudo, o ornamento não é incompatível com a óptica funcionalista da
arquitetura”. Esta mesma tendência pode-se verificar nos gradis do século XX, que seguem
uma forma simplificada, mas não eliminam, totalmente, seus detalhes ornamentais.
A arquitetura moderna rompe vínculos, não só formais como também estruturais, bem
como com os princípios da arquitetura dos “estilos” históricos. O princípio que rege, então, o
desenho, é a funcionalidade onde a “forma segue a função”. O emprego do ferro passa a ter
um papel importante na funcionalidade das estruturas limpas, sem rebuscamento.
No final dos anos 60 do século XX, as grandes transformações modernas do meio
ambiente, foram alvo de grandes críticas pelos mais respeitados arquitetos e urbanistas, como
Gordon Cullen. Nos anos 70, a arquitetura moderna é criticada pelos seus aspectos repressivos
28

e rotulada como autoritária. O funcionalismo, os planos interiores abertos, a pureza da forma e


a falta de ornamentação são vistos como “conceitos absurdos” para o meio ambiente
moderno. Emergiram, então, novas concepções na arquitetura, agora rotuladas como pós-
modernistas, com um maior interesse pelo patrimônio histórico e com novas abordagens
arquitetônicas.
A arquitetura pós modernista significa literalmente o revitalismo selectivo e
autoconsciente de elementos de estilos mais antigos, e isto é exatamente o que tem
estado a acontecer na revitalização, preservação e design urbanos (RELPH, 1980,
p.189).

Atualmente, o ferro se emprega muitas vezes a uma arquitetura com grande tendência
a volumes escultóricos. Os arquitetos estão criando, cada vez mais, seus espaços com
expressões de volumes de diferentes formas, alturas e posições, como a arte de um escultor, e
o ferro tem um importante papel neste contexto. Além disso, o ferro é importante na
revitalização de espaços, como por exemplo, na utilização dos gradis que permitem variadas
funções tais como a ornamentação, divisão dos espaços e proteção.

1.2 FERRO NO BRASIL

A presença do ferro na arquitetura do Brasil remonta à colonização portuguesa. No


século XVII, a primeira fundição que surgiu era de canhões, importantes na defesa da cidade
de Salvador. Depois disso, o uso do ferro intensificou-se, principalmente, através dos gradis
no século XIX, século este que viu a serralheria artesanal conviver com o ferro
industrializado. Isto não ocorreu de forma fácil pois, segundo Flexor (1974, p.55), “nos
meados do século passado já havia nítida distinção entre o técnico, especialmente o
estrangeiro, e o artífice tornado desprezível por seu trabalho manual em contraposição àquele
da máquina”.
A fase inicial da industrialização no Brasil iniciou-se em meados de 1850, quando
existiam poucas fábricas, mas, apesar disso, já apareciam produtos oriundos dos processos de
fundição. No censo de 1920, das 13.336 indústrias existentes, somente 35 eram anteriores a
1850, e 240 antes de 1880. As poucas fábricas existentes produziam rapé, sabão e ferro
fundido (OLIVIERI, 2001).
29

Apesar disso, a produção siderúrgica no Brasil foi pequena, e as fundições aqui


estabelecidas, praticamente atenderam às necessidades da indústria açucareira, como destaca
Silva (1986, p.83):

Algumas fundições aqui, nesta época, com o propósito de fornecer máquinas e peças
de reposição para engenhos centrais de açúcar. Dentre ela, se destaca a Fundição
D’Aurora, a ”Aurora Foundry” ou “Star & Cia”, fundada em 1829 pelo inglês
Christopher Starr, e que funcionou no Recife até 1973.

No período compreendido entre1860 e 1870, surgem as primeiras fundições nacionais,


que permitirão a construção de obras importantes, como novas pontes, estradas de ferro e,
tambem, a expansão da indústria têxtil, que criaram um novo cenário para o Brasil.
Nesse período, destaca-se, na Bahia, a fundação da Fábrica Todos os Santos, em
Valença, que, segundo Olivieri (2001), acabou dando grande notoriedade à cidade quando
passou a ser industrial, sob a égide da Lei de nº 368 de 10/11/1849. Segundo ele,
“[...]executavam-se grades e portões em grandes dimensões, já permitindo, de certa forma, o
uso da tecnologia do aço forjado”. É nesta fase que surge o interesse por produtos nacionais,
muitas vezes como símbolos de nacionalidade contra a concorrência de produtos importados.
No século XIX, a valorização da cidade é marcada como vitrine da civilização,
período de profundas modificações na configuração do espaço das cidades mais importantes.
É quando surge o grande apogeu dos gradis de ferro, com grandes transformações que
marcaram o design da arquitetura, não só na Bahia como em outros Estados.
No Brasil, o ferro adquire grande importância a partir da Revolução Industrial e, na
década de 70, se apresenta bem aos artifícios ornamentais em gradis nas praças públicas,
como podemos verificar nas praças da cidade do Recife, em Pernambuco,

[...] começou a voga dos gradis de ferro cercando as praças públicas e os adros das
igrejas, aqueles segundo o modelo do Largo do Rodo do Rio de Janeiro. O primeiro
colocado(1872) foi o Jardim da Praça Conde d´ Eu (atual Maciel Pinheiro), com 800
palmos (176 metros), iniciativa dos moradores do bairro, à frente o vereador e
médico Dr. Pedro de Ataíde Lobo Moscoso (Diário de 18 e 21.V.1872), seguido do
Jardim do Campo das Princesas) como se chamava na época a atual Praça da
República), esta mandado fazer, juntamente com as estátuas de ferro que ainda ali se
encontram, na Inglaterra, pelo Conselheiro João José de Oliveria Junqueira,
presidente da província [...](MELLO, 2006)

Nessa época, também se importa todo tipo de elementos em ferro fundido. O


historiador Carlos Eduardo Barata (A ARTE, 2004) relata que, “[...] no fim do século XIX, o
Brasil intensificou suas importações de ferro pois, o grande avanço da industrialização na
30

França, barateou os custos e fez com que o Brasil passasse a importar adornos para as
construções”. Segundo Silva (1987), a maior contribuição das fundições à construção civil
nesse período foi a fabricação de grades e portões, porém grande parte dos componentes
arquiteturais metálicos utilizados no Brasil foram pré-fabricados em países europeus,
principalmente na Grã-Bretanha, França, Bélgica e Alemanha, incorporando assim à
arquitetura, componentes de excepcional valor estético, conforme atesta Costa (1994, p.158):

A belíssima estrutura, construída dentro da mais estrita concepção modular,


alterna as grades, os painéis em semicírculo e as colunas, tirando partido do
efeito causado pela repetição desses elementos pré-fabricados, que
contrastam com os trabalhos em ferro forjado dos painéis sob os balcões.
Elementos em latão dourado pontuam os ritmos das peças, confirmando as
declarações de Mac Farlane em seus catálogos: As mais elegantes formas
pitorescas e traçados como rendas.

Nesse contexto, como se viu anteriormanete, os gradis de ferro têm importante papel,
salientando as transformações da arquitetura. A Cidade do Salvador, no século XIX, passa por
estilos muitos diferenciados, tais como o Neoclássico, que culminou com o Primeiro e o
Segundo Império, e nos finais do século XIX, com o Ecletismo que se firmou aproveitando a
influência arquitetônica de várias épocas e de vários países, predominando até a Proclamação
da República e o primeiro quartel do século XX.
O apogeu dos gradis de ferro foi, sem dúvida, o século XIX, com muitas mudanças
que marcaram o design da arquitetura brasileira, que sofreu grande influência dos ingleses no
papel para esta transformação.
Ainda no século XIX, o uso do ferro dava-se a partir de experimentações determinadas
pela produção industrial, que se adequavam à estética da época, subordinadas às propriedades
naturais do material, à criação de elementos construtivos orgânicos florais que buscavam
associar beleza a suas funções.
No Brasil, a evolução da ocupação dos lotes de terreno, nas cidades, introduziu o uso
de gradis de ferro e portões nos limites e acessos às propriedades residenciais e também nos
edifícios públicos e religiosos. Ferraz (2000) esclarece:

Além de sua função reguladora e explicitadora das relações entre publico e privado,
seus desenhos os transformavam em elementos também decorativos e os
acabamentos, quase sempre em forma de lanças verticais, reproduziam
simbolicamente a proteção, a defesa e o limite. Essas lanças espaçadas limitavam e
emolduravam os lotes, mantendo certa transparência, expondo as casas e os jardins.
Os portões, muitas vezes, produziam um aspecto pomposo e majestoso pela
suntuosidade dos desenhoso e acabamentos.
31

Elementos novos de ferro vão sendo introduzidos, ao longo do tempo, proporcionando


o surgimento da “Arquitetura do Ferro” (SILVA,1986), fruto dos avanços da Revolução
Industrial, compondo um perfil bem marcado da arquitetura eclética em várias cidades
brasileiras.
No Brasil, final do século XIX e início do século XX, entre as primeiras e mais
significativas obras em São Paulo a utilizar o ferro, destacamos: o Mercado São João (1890),
o Viaduto do Chá (1892) e o Viaduto Santa Efigênia (1910) ( KÜHL, 1998). Outros exemplos
não menos importantes aparecem na cidade do Recife, o Mercado São José e os gradis da
Igreja da Ordem Terceira de Nossa Senhora do Carmo (1854), em Fortaleza o Teatro José de
Alencar (1910), em Belém, o Mercado da Carne (1911), e, na Bahia na cidade de Cachoeira a
Ponte Imperial D.Pedro II (1865), dentre outros (SILVA, 1987).
Convém ainda lembrar o impacto causado pelo ferro nas estações ferroviárias do
Brasil e no panorama internacional, uma vez que o desenvolvimento de cidades se deu
principalmente pela implantação de muitas estações ferroviárias, como a Estação da Luz, do
Brás e a Júlio Prestes, em São Paulo, além de outras várias cidades brasileiras.

[...] na década de 1850-1860, da construção da Estrada Mauá (do Porto da Estrela à


Raiz da Serra de Petrópolis), da Pedro II (primeira seção) e do Mariano Procópio –
com que se iniciou o surto rodo e ferroviário que, com o emprego das primeiras
pontes de ferro fabricadas na Europa e montadas aqui por engenheiros das empresas
de que provinham (uma delas na Estrada de Mauá, como noticiou o Jornal do
Comércio foi montada numa só noite, à luz de archotes), que começou também, na
construção, a Era Industrial, e no da arquitetura, o surto dito Moderno (SANTOS,
1981, p.71).

A partir dos anos 40, com a decadência dos transportes ferroviários no Brasil, muitas
estações foram desativadas e abandonadas, embora tivessem estruturas imponentes. Apesar
disso, as ferrovias marcaram a paisagem das cidades brasileiras. Algumas com suas vias e
edifícios permanecem até hoje.
Conclui-se, então, que o século XX cria a arte e seus estilos a partir de necessidades
geradas pela Revolução Industrial, trazidas da técnica e de formas de pensamentos novos. Os
movimentos de vanguarda negam os valores defendidos no passado, rompendo com tradições;
a arte adquire outras potencialidades com a ajuda dos recursos técnicos e humanos, numa
nova integração com o homem. As conseqüências destas mudanças são marcadamente vistas
nos dias de hoje quando o ferro adquiriu papel importante no contexto urbano, com grande
número de gradis espalhados pelas cidades.
2 GRADIL

2.1 DEFINIÇÕES

Sabemos que o ferro é um material que já vem sendo trabalhado há mais de 4.000 anos
através de processo artesanal de queima em fornalhas. Até os fins da Idade Média, difundiu-se
lentamente e, na arquitetura, as grades ornamentais estiveram presentes tanto nas civilizações
clássicas quanto no período medieval.
No dicionário etimológico, a palavra “gradil originou-se do latim gratem que quer
dizer armação de peças encruzadas ”(CUNHA, 1982, p.392). A partir do século XIII, ela sofre
mudanças em sua terminologia, significando engradado, gradeado no século XIX e, somente
no século XX, vai aparecer como gradil.
A grade1 é uma armação constituída de barras de ferro, ou ripas de madeira em cruz
com intervalos, destinada a proteger ou vedar algum lugar. O significado de gradil nada mais
é do que uma grade com funções mais ornamentais, mas que, ainda assim, possui as funções
de separar ou proteger. Os gradis podem referir-se a grades de madeira ou ferro, com muita
ou pouca altura, que se destinam a circular pátios e jardins. O presente trabalho apenas se
propõe a estudar os gradis de ferro, em sua ampla utilização, as técnicas relacionadas a ele e
todos os elementos variantes deste metal.
Sobre o surgimento dos gradis, Assis (2003, p.86) nos esclarece que:

[...] relacionando-se a utilidade do gradil e as transformações sociais no decorrer do


século XIX e início do século XX, período em que aconteceram na Europa
exposições universais, vimos que nesse momento se teve a intenção de satisfazer o
que se acreditava ser a “necessidade da arte”, através de um “bem de consumo” o
qual pudesse promover a difusão do ornamento. As mudanças de valores culturais e
materiais, provocadas pela industrialização principalmente na Inglaterra e França,
atingiram o patrimônio privado. Surgiu a necessidade de se proteger o bem material
e aos poucos os gradis afirmaram sua função primordial de proteção. Além de
separar, fechar passagens, as grades cada vez mais presentes nas edificações
urbanas, passaram a fazer parte não só da arquitetura, mas também da condição
psicológica do indivíduo cada vez mais ameaçado pela violência urbana, pela
natureza instável da vida social que constantemente o submetia a várias situações de
risco.

1
“On peut définir une grille: une ouevre composée de piéces de bois ou de metal croisées ou entrelacées de
manière à constituer une enceinte autour d ´um objet que l´on désire protéger contre les appoches du public”
(D´ALLEMAGNE, 1943, p.172).
33

A partir dessas definições, observamos que são várias as possibilidades de utilização


dos gradis na contemporaneidade. Dentre elas, a função de segurança como gradis de varanda,
janelas, portões, alguns acrescidos de elementos pontiagudos como lanças. A delimitação dos
espaços arquitetônicos restringe-se mais a áreas externas de residências e estabelecimentos
públicos e privados, como forma de proteger e coibir o acesso de pessoas não autorizadas.
Caldeira (2003) observa que o gradil é usado hoje não só por razões de segregação e
segurança, mas tambem por razões estéticas e de status.

Todos os elementos associados à segurança tornaram-se parte de um novo código


para a expressão da distinção, um código que chamo de estética da segurança.
Esse é um código que incorpora a segurança num discurso sobre o gosto,
transformando-o em símbolo de status... cercas e barras são elementos de decoração
e de expressão de personalidade e inventividade. São elementos de um novo código
estético. Esses elementos têm de ser sofisticados não só para proteger contra o
crime, mas também para expressar o status social dos moradores (CALDEIRA,
2003, p.294).

2.2 A PRODUÇÂO INDUSTRIAL DE HOJE

Atualmente, é comum o gosto pelo gradil como objeto do desejo ornamental. Com os
avanços tecnológicos, a indústria disponibilizou uma grande variedade de perfis e peças,
possibilitando a diversidade dos gradis em cores, formatos e tamanhos, que são apresentados
através de catálogos.
Grandes empresas como a Comercial Gerdau – Aços especiais, a Companhia
Siderúrgica Belgo Mineira e a Aço Minas apresentam enorme variedade em produtos e
serviços especializados. A Comercial Gerdau, com filiais em todo o Brasil, possui catálogos
de produtos em várias bitolas diferentes, produzidos de acordo com as normas técnicas e com
aço de baixo teor de carbono, empregados para grades, portões e outros fins. São eles:
· barras quadrada – barras com seção transversal quadrada;
· barra chata – barras com secção transversal retangular;
· barra redonda mecânica – barras com seção transversal circular;
· cantoneira abas iguais – barras com secção transversal em forma de ângulo reto,
com abas iguais;
· perfil I – barras com secção transversal em forma de “I”;
34

· perfil U – barras com secção transversal em forma de “U”;


· perfil T – barras com secção transversal em forma de ‘T”;
· perfil estrela – perfil laminado em formato exclusivo, com cavidade ao longo da
barra.
Os artesãos, arquitetos e artistas podem usar em suas composições um único tipo de
perfil ou barra ou combinados em um ou mais tipos de perfis e barras, empregando ou não
técnicas como a do ferro forjado e o laminado. As possibilidades de maleabilidade que o ferro
oferece, podem beneficiar uma grande variedade de ricas combinações.
Os gradis também podem ser criados com outros materiais como chapas e acessórios,
com disponibilização de serviços agregados como cortes simples e térmicos (Oxicorte,
Plasma ou Laser).
A empresa Gerdau (2002) desenvolveu um catálogo (Coleção Serralheria), destinado a
serralheiros ou pessoas afins, interessadas em confeccionar gradis; apresenta 50 modelos
diferentes de portões e gradis. Em cada sugestão, encontra-se a quantidade do material
necessário para a realização do trabalho, para evitar desperdícios, consumo aproximado de
solda para cada módulo do gradil e modelo para cálculo de custo de matéria-prima. De forma
acessível, através de tabelas, ajuda a organizar o trabalho do artesão em todos os processos.
O fabricante aconselha que, de posse do catálogo, é possível também misturar, por
exemplo, a parte superior de um modelo com a inferior de outro. Desta forma, serão
desenvolvidos modelos exclusivos e personalizados, dependendo do gosto do cliente e da
criatividade do artesão. Ressalta, também, além das vantagens de maleabilidade, o grande
número de opções estéticas que as barras de aço carbono proporcionam.
Para cada modelo desenvolvido, encontramos os dados de produto, bitola,
comprimento e peso na tabela. Caso o artesão queira substituir algum modelo ou bitola, isto é
possível através do folheto de barras e perfis. Os modelos vêm acompanhados de fotos dos
gradis, em escala menor do que o desenho, inseridas num contexto residencial, em
composições principalmente com ângulos e linhas retas. Os desenhos são, na maioria,
baseados em figuras geométricas simples de quadrados, triângulos, retângulos e círculos, pois,
o maior interesse da Gerdau é, provavelmente, vender os perfis para a elaboração de gradis.
Selecionamos tres modelos do catálogo que servem de exemplo (Figuras 5, 6, 7 com seus
respectivos desenhos).
35

Figuras 5 a 7 –

Gradil Modelo 148 – Gerdau


Gradil Modelo 149 – Gerdau
Gradil Modelo 150 – Gerdau

Fonte : Catálogo Gerdau - 2002


36

Gradil Modelo 148


37

Gradil Modelo 149


38

Gradil Modelo 150


39

Além dos catálogos da siderúrgica nacional, podem ser encontrados outros catálogos
de indústrias estrangeiras como, por exemplo, o catálogo Ferrum Amantilus2, da empresa
Indústria Italiana Arteferro, que fabrica artefatos de ferro forjado utilizado na montagem de
gradis. É possível que essas peças fabricadas industrialmente (em série) reduzam
substancialmente o custo de fabricação dos gradis, mas os custos para o transporte comercial
não têm mostrado vantagens para o consumo em alta escala.
No Brasil, a Indústria Italiana Arteferro, localizada no Rio Grande do Sul, na cidade
de São Marcos, vende peças prontas produzidas e distribuídas através de catálogos
(Ind.I.A.Brasil Ltda – catalogo 2005), ricos em fotografias e desenhos, que acabam servindo
de inspiração para o trabalho de artesãos baianos e, deste modo, influenciando na tipologia
dos gradis de Salvador. Os catálogos são totalmente ilustrados com fotos de gradis, alguns
extremamente elaborados, com sugestões para balcões, escadas, corrimões e portões em
diferentes tamanhos, utilizando as peças do catálogo. Possui mais de mil itens catalogados por
tipo de modelo em perfis padronizados como barras, fechaduras, lanças e detalhes muito
elaborados, como folhas, rosetas3, gregas, ornatos em “C” e “S”, pinhas, cachos de uva e
borboletas, para a fabricação de gradis. As peças ou a composição de módulos são, na
maioria, fabricadas ainda com forte influência dos desenhos ingleses do século XIX, como as
volutas em forma de “C” ou “S”.
O catálogo ainda comercializa modelos diferentes de gradis criados pelos arquitetos
Stefania Buccio e Bruno Gonzato (Figuras 8, 9, 10 com seus respectivos desenhos) com
possibilidade para gradil: mural, portão-pedestre e portão-garagem, todos com perfis verticais
com detalhes de lanças na sua extremidade e detalhes de volutas mais ou menos elaborados na
sua composição. A altura dos portões gradis varia entre 2,50 e 2,80m de altura, todos com
lanças na extremidade dos perfis verticais, mostrando que ainda é forte o gosto por este tipo
de padrão formal e preocupação com segurança.

2
IND.I.A. Brasil (2005) Industria Italiana Arteferro. São 4 volumes do catálogo: Volume 1 (Ferro Amantibus),
v.2 (Homo Faber), v.3 (In ferro Qualitas) e v.4 (Faber Ferrarius) com aproximadamente 232 páginas ilustradas
em cada volume.
3
Roseta – “elemento decorativo que se assemelha a uma rosa ou a alguma flor de pétalas radiais, usado em
várias formas de expressão artística e em diferentes épocas históricas” (HOUAISS, 2001).
40

Figuras 8 a 10 –

Gradil Modelo Medici


Gradil Modelo Orleans
Gradil Modelo Windsor

Fonte : Catálogo da Ind. I. A. – Indústria Italiana Arteferro


41

Modelo Medici
42

Modelo Orleans
43

Modelo Windsor
44

Portanto, apesar dos diferentes objetivos apresentados pelos dois catálogos: Coleção
Serralheria, que comercializa perfis e barras, com gradis de formas geométricas mais simples,
e o Ferrum Amantibus, que comercializa artefactos prontos, conservando os valores artesanais
do passado adaptados às exigências modernas, com gradis de formas mais complexas e
rebuscadas, ambos servem de inspiração para o trabalho de artesãos baianos e podem ser
encontrados facilmente nas lojas que comercializam o material para a montagem de gradis de
ferro.
A Indústria Italiana Arteferro disponibiliza ainda no mercado, outros tipos de livros e
catálogo como Do It yorself que, por encomenda, atende à entrega de perfis escolhidos através
de catálogo específico, para que se desenvolvam peças exclusivas. O livro Designs parte de
sugestões de soldagem e montagem e oferece exemplos de balcões, gradis para portões e
janelas, etc., utilizando os produtos padronizados pelo catálogo, e o livro Le Scale com
desenhos de gradis para escadas internas e externas que completam a coleção.
Além da forma, nos ultimos anos, pode-se tirar proveito das cores, uma vez que o
desenvolvimento da indústria de tintas disponibilizou no mercado uma grande variedade de
produtos aplicáveis aos gradis, com diversas qualidades de cores e tons novos.
Tudo isso, somado ao desenvolvimento das técnicas de manufatura do ferro, bem
como à capacidade de criação dos serralheiros, artistas plásticos e arquitetos baianos,
proporcionou à Cidade do Salvador as mais diversas possibilidades de gradis através do
manuseio do material. Podemos caracterizar este acervo de gradis de ferro como uma grande
diversidade de formas, resultado da justaposição de conceitos do passado, combinados com os
benefícios das novas tecnologias, adequadas às necessidades de beleza e segurança do mundo
moderno. As várias doutrinas, métodos e estilos do passado (como as influências do
movimento Art nouveau) e as técnicas antigas (do ferro forjado) são possibilidades exploradas
no grande universo da modernidade.
A criatividade do ferro, experimentada pelas várias técnicas em desenhos orgânicos e
geométicos das mais variadas formas, nos leva a afirmar que os gradis do século XX possuem
características bastante diversificadas, sem a observância de uma única linha de pensamento
ou rígidez, e é possível que tais escolhas sejam reflexo dos caminhos da arquitetura
contemporânea.
Os artistas plásticos e arquitetos propõem gradis de ferro em módulos de até vinte
metros de comprimento sem repetição ou gradis sem módulos de repetição, ou seja, painéis
que se justapõem, numa seqüência sempre inédita. A simetria bilateral absoluta do desenho e
das formas, muitas vezes em busca da harmonia e beleza resultantes de proporções
45

equilibradas, é muito empregada, indistintamente, nos gradis de portões, murais, etc. Não
existem regras para a liberdade formal dos gradis, quase sempre determinada pelo limite das
possibilidades tecnológicas.
A inspiração para os motivos, muitas vezes, é o cenário da própria cidade. Salvador é
rica em belezas naturais e expressões culturais, cidade de clima tropical, onde se desenvolvem
flores e animais diversos. Todo este rico universo serve de inspiração através das técnicas
para a arte do ferro.
A herança cultural das crenças religiosas foi a inspiração que o artista plástico Bel
Borba foi buscar para representar os orixás da Bahia, que ele reproduziu em gradis de ferro
por meio de técnicas, como a forja e o recorte da chapa de ferro, que veremos em detalhes no
Capítulo 4.
Com os grandes avanços do mercado consumidor e o seu alto grau de competitividade,
cada vez mais acirrado, alguns gradis surgem para assumir outras funções além da beleza e
segurança dentro da modernidade. Estes gradis de ferro acabam por desempenhar uma função
importante dentro de empresas comerciais de Salvador, cuja inspiração se aloja no próprio
contexto da proposta de vendas da empresa. Idealizados de modo a divulgar produtos ou
serviços, passam a ser peça integrante de um sistema de identidade visual, inspirado muitas
vezes na marca criada pelo designer. Esta fonte de inspiração é, geralmente, buscada por
arquitetos, muito possivelmente por ser ele um profissional que congrega, com outros
designers, uma formação profissional que às vezes se mescla. O desenho do arquiteto ou
artista para o gradil é adaptado, conforme o caso, a determinada técnica e materiais que
possam expressar melhor a idéia da marca, buscando o maior grau de percepção possível. Este
tipo de gradil, enquanto marca, exige uma responsabilidade maior do desenhista, pois tanto a
técnica quanto o material escolhido para a criação desse gradil devem obedecer ao intuito de
se ter clara interpretação da imagem da marca, pois, do contrário, as funções de expressar
identidade visual estariam anuladas.
Outra fonte de inspiração para os arquitetos e artistas é a própria edificação. Neste
caso, o gradil é uma conseqüência natural da linguagem formal do edifício, sendo muitas
vezes observado um detalhe do material empregado na edificação, como um tijolo cerâmico
ou uma porta de madeira ou, ainda, a própria forma da elevação tridimensional ou
bidimensional da fachada. Geralmente, este tipo de partido adotado é inspiração do arquiteto
responsável pelo projeto executivo da edificação.
A busca da solução da criação do gradil de cada profissional tem a ver com seu
próprio universo. Muitas vezes, o serralheiro sofre a influência dos trabalhos que estão no
46

limite de sua visão, ou seja, trabalhos de outros parceiros serralheiros, arquitetos e artistas, ou
até o acesso a catálogos que, como já dissemos, estão disponibilizados para a venda
justamente nos locais onde o artesão compra a matéria-prima para a realização de sua arte. A
serralheria mais popular, ou seja, os gradis criados por serralheiros, são ainda muitos deles
inspirados no século XIX com desenhos de volutas, ou gradis mais simples com peças de
ferro forjadas em desenhos geométricos de retângulos, triângulos e círculos. Muitas vezes, a
criação dos trabalhos dos serralheiros está limitada pela não disponibilidade de máquinas para
trabalhos mais elaborados. Contudo, o mercado disponibiliza um grande número de máquinas
para auxiliar o trabalho de confecção dos gradis de ferro e aço inox, tais como:

Figura 11 – Foto de Máquina de solda Figura 12 – Foto de Máquina de solda elétrica


“Tigre” para aço inox. para ferro.

Figura 13 – Foto de Lixadeira para Figura 14 – Foto de Forja Artesanal.


acabamento final.
47

Figura 15 – Foto de Politriz Figura 16 – Foto de Prensa Essêntrica


Polimento de aço inox . para ornatos em série.

Figura 17 – Foto de Calandra para Figura 18 – Foto de Calandra de perfil até 2”.
Chapas.

Figura 19 – Foto de Figura 20 – Foto de Figura 21 – Foto de


Policorte portátil 1. Policorte portátil 2. Policorte Fixa.
48

Figura 22 – Foto de máquina de corte Figura 23 – Foto de Calandra de perfil até ¾”


Policorte.

Figura 24 – Foto de Prensa essêntrica. Figura 25 – Foto de Torno mecânico – peças torneadas.

Figura 26 – Foto de Viradeira Figura 27 – Foto de Guilhotina Figura 28 – Foto de -


para virar a chapa. cortar de forma reta. Tico-Tico “tesoura”.
49

Com os artistas e arquitetos, o processo de criação é mais amplo. Devido a sua própria
formação, cada um, dentro do seu contexto, está mais ligado às artes plásticas e arquitetura, às
formas novas, aos movimentos modernos de vanguarda e, deste modo, propõe soluções
inovadoras para os gradis da modernidade.
O artista plástico Juarez Paraíso4 declarou que, atualmente, os arquitetos de maior
renome determinam e ditam a moda, quando fazem seus projetos especiais, e desenham todos
os detalhes da obra, inclusive os gradis. Para ele, o arquiteto moderno ou pós-moderno acaba
propondo todas as soluções da obra, numa atitude que ele chama de auto-suficiente, e acredita
ter havido, ao longo dos anos, uma desintegração das atribuições desses dois profissionais
dentro da arquitetura. Isto nos leva a afirmar que, possivelmente, os gradis não seguem regras
para modelos específicos em cada tipo de projeto. As influências da criação desta arte
dependem muito mais das experiências de quem as idealiza e de suas próprias percepções do
mundo.
Existe, porém, um forte fator que é determinante para a confecção de um gradil de
ferro mais elaborado, que é o econômico. Os custos de confecção podem estar mais
disponíveis somente para uma parcela da população com maior poder aquisitivo, que pode
contratar um artista ou arquiteto para uma “nova idéia”, sem se preocupar tanto com os custos
finais. É fato também que, nos últimos anos, os gradis de ferro têm adquirido status de obra
de arte, e uma arte mostrada de modo democrático dentro da cidade, para todos os
transeuntes, faz parte de uma edificação ou é peça fundamental no contexto da cidade.
Ainda hoje, alguns gradis de ferro invocam, através do seu desenho, elegância e
pujança e também podem coibir pessoas indesejadas. A arte do gradil, ao mesmo tempo que
nos convida a olhar, também reserva a função reguladora e explicitadora entre público e
privado. Seus desenhos os transformam, também, em elementos decorativos e os
acabamentos, algumas vezes em forma de barras verticais pontiagudas, como garras
inclinadas para fora, e lanças, reproduzem simbolicamente a proteção, a defesa, bem como o
limite.
Os artistas, de modo geral, defendem a idéia do gradil como necessidade defensiva,
mas também como elemento que se pode tornar transparente, no sentido de permitir uma
integração mais razoável com a beleza dentro do contexto da cidade.

4
Juarez Marialva Tito Martins Paraíso concedeu entrevista em setembro de 2005 em Salvador. Embora
Paraíso afirme que atualmente os arquitetos desenham todos os detalhes da obra, já no Art Nouveau, arquitetos
como Gaudi e Horta, tambem desenhavam muitos detalhes da obra, inclusive os gradis (PEVSNER, 2001).
50

Na opinião de Paraíso, “[...]a cidade toda está se tornando prisões, já que temos de
fazer esta prisão, façamos com um valor estético” (PARAISO, 2005). No seu depoimento, o
artista reforça a idéia de que o gradil é um mal necessário, dentro do contexto urbano da
modernidade, porem, é possível tirar partido do gradil, enquanto arte, além das funções de
beleza e proteção, tentando amenizar a sensação de confinamento.

2.3 DESENVOLVIMENTO DAS TÉCNICAS DA MANUFATURA DO FERRO

O ferro é o material predominante na construção dos gradis. É um dos corpos simples


da natureza, de cor cinza, variando para o azulado com aspecto granulado, sendo que seus
grãos tornam-se cada vez mais finos quanto maior for a pureza do material. Ele possui
características de boa maleabilidade e soldabilidade, importantes nas confecções dos gradis e
é um dos materiais que melhor suporta grandes tensões sem se partir. Com estas qualidades, é
um dos elementos encontrados na natureza que mais têm servido ao homem nas suas
transformações do espaço social.
O ferro é, sem dúvida, em nossa civilização atual, o mais útil de todos os metais. Sem
ele, grandes empreendimentos industriais não seriam possíveis. Encontra-se na natureza em
forma de óxido, nos minérios de ferro, e ocorre mais comumente como liga com o níquel e
outros metais. Após reduzido, o ferro é o maior constituinte de uma gama de produtos
metalúrgicos , tais como ferro forjado, ferro laminado, ferro fundido e o aço. O ferro é um dos
metais mais espalhados na superfície do globo terrestre, conquanto raras vezes seja
encontrado em estado de pureza. Via de regra, aparece combinado com outros metais, dos
quais torna-se difícil separá-lo. A combinação mais freqüente é a do ferro com o oxigênio, a
qual se dá o nome de óxido de ferro, mas existem, por igual, carbonatos e sulfuretos de ferro.
Segundo Menezes (1938), estes óxidos, como também os carbonatos e sulfuretos, geralmente
estão estreitamente ligados às matérias terrosas, cujo conjunto é conhecido por ganga. São
principalmente compostos de alumínio, cromo, cobre, chumbo, zinco, titânio, arsênio,
enxofre, silício, fósforo, molibdênio, manganês e água. Portanto, em última análise, o minério
de ferro é composto de óxido e ganga, que se separam mediante o emprego de uma qualidade
considerável de energia.
A primeira característica que deve ser conhecida no minério é a proporção de metal
51

que ele contém e que se denomina teor metálico. No Brasil, teoricamente, é encontrado o mais
elevado teor, que é de 78% de ferro. O ferro utilizável é considerado rico quando tem de 40 a
60% e pobre quando esta proporção se encontra entre 40 e 25%. Quando o teor metálico for
inferior a 25%, o minério não é considerado bom para nenhuma atividade.
O segundo elemento que deve ser conhecida é sua canga, em particular seu teor em
silício e em cal. Estes dois elementos são importantes, quase sempre, para determinar a
facilidade e até as possibilidades de tratamento do minério. A maior proporção em que a sílica
e a cal podem entrar na composição do minério de ferro é de 20%. Dificilmente estes teores
são iguais no mesmo minério; quase sempre predomina um sobre o outro, o metal é extraído
dos óxidos e carbonatos.
Os processos industriais destinados à extração do metal são objeto da siderurgia. A
siderurgia industrial nasceu na Inglaterra e o ferro foi um dos grandes responsáveis pela
Revolução Industrial, quando possibilitou a introdução da máquina.
A siderurgia é indústria relativamente nova, contemporânea da máquina a vapor, que
foi aperfeiçoada em 1773. Ela tem por fim o estudo das propriedades, extração e
aplicabilidade deste metal e também o preparo de suas ligas.
A siderurgia ensina a ligar o ferro, em proporções variáveis, a outro corpo simples,
também em larga escala na natureza, que é o carbono. Desta combinação ferro e carbono,
podemos destacar três classes:
· Os ferros com menos de 0,05% de carbono;
· Os aços, tendo 0,05% a 1% de carbono, alguns autores classificam entre 0 a 2%;
· As “fontes”, tendo praticamente de 3 a 4% de carbono.
A qualidade e suas propriedades variam de acordo com a forma de obtenção, o teor de
carbono presente no produto e a quantidade de outros elementos que são adicionados.
O ferro é extraído,

[...] quase sempre, por meio de um forte aquecimento em presença de coque (carvão
mineral) ou carvão de madeira, em fornos adequados, nos quais o oxido é reduzido e
o resultante ligado ao carbono. Forma-se assim uma liga de ferro e carbono que
depois de refinada, constitui a matéria-prima para a fabricação da grande maioria das
peças metálicas atualmente empregadas [...] Os produtos siderúrgicos comuns são
ligas ferro-carbono com teor de carbono compreendido entre 0 e 6,7%
(industrialmente entre 0 e 4,5%) (COLPAERT, 1974, p.1).

Através dos anos, o desenvolvimento da manufatura do ferro proporcionou um grande


avanço em algumas técnicas como o ferro forjado, o ferro fundido e o aço.
Ao tratar dos gradis de ferro de Salvador, fica latente a necessidade de, primeiramente,
52

entender como são os processos de obtenção do ferro e de seus componentes. Este trabalho
não tem a pretensão de se aprofundar em outras áreas do conhecimento, tais como a química e
a engenharia e, sim, apenas criar subsídios para fundamentá-lo com conceitos, termos e
elementos que serão necessários à compreensão do universo dos gradis de ferro.

2.4 FERRO FORJADO

O ferro forjado é o mais antigo dos produtos e as técnicas para a sua obtenção foram
desenvolvidas no Oriente Médio por volta de 450 anos a.C. O primeiro meio utilizado na
obtenção do ferro é chamado de redução direta. O óxido de ferro é aquecido em contato com
o carbono, o que resulta na combinação do carbono com o oxigênio do minério, deixando
livre o metal ferro. Com a evolução dos fornos em tijolos cozidos cobertos por cúpulas, foi
possível o desenvolvimento de um novo processo chamado redução indireta. Com este
processo, a obtenção do ferro forjado foi possível através de dois estágios de produção.
Primeiro, o minério de ferro era aquecido a uma temperatura superior a 1500° C e fundido
para produzir, depois de frio, o ferro gusa. Em seguida, o ferro forjado era martelado à mão,
sendo por isso chamado de ferro batido. Este processo resultava num produto bastante puro e
resistente, com menos de 1% de carbono que podia ser torcido, enrolado, cortado e esticado, a
quente ou frio.
No passado, era comum os ferreiros utilizarem a forja artesanal, e trabalhavam o
material através de batidas a frio para deixá-lo mais maleável. Este procedimento
provavelmente se originou na Idade Média, período em que houve a expansão e difusão das
técnicas, isto é, por volta do século XI, quando se dispunha de poucas ferramentas de
trabalho.
Mesmo com as precárias condições de trabalho e as poucas alterações nos
procedimentos de execução, os ferreiros, ao longo dos anos, até o século XIX, produziram
verdadeiras obras de arte.
Atualmente, é grande o emprego de gradis executados ainda com esta técnica milenar.
O conhecimento do ferreiro deve ir além do conhecimento da técnica. As colorações que o
ferro adquire no processo são de grande importância para a execução do trabalho com a forja.
Os anos de prática do ferreiro ajudam a identificar a cor certa do ferro para o momento exato
53

de obter as peças desejadas da produção da forja. Dentro do processo de levar o ferro ao fogo,
ele adquire colorações que vão do vermelho mais forte ao mais claro, até o estágio certo para
serem trabalhadas suas formas. Esta intimidade do forjador com o ferro permite avaliar a
qualidade do material.
Segundo Assis (2003, p.111):

[...] constatando eventualmente a presença de grãos em relevo que denotam rigidez;


testando o ferro com a lima para definir solidez e verificar se tem bom polimento, e
ainda levando a barra ao calor para ver “puxar” a cor. A capacidade para realizar
procedimentos de reconhecimento define e qualifica o bom profissional, que, além
disso, deve dominar as várias técnicas utilizadas para emendar o ferro.

Além dos aspectos técnicos, o mínimo de conhecimento artístico e noções de


proporção e modulação ajudam na atividade do serralheiro, para obter um desenho agradável
e equilibrado entre os perfis e os espaços vazados, que são, geralmente, o resultado dos gradis
de ferro forjado.
Após a Revolução Industrial, é cada vez maior o numero de máquinas que estão a
disposição dos trabalhos da serralheria. Todos os equipamentos para o trabalho de corte,
enrolamentos, torsão e soldas, além de facilitar o trabalho, hoje possibilitam executar gradis
de ferro em muito menor tempo do que no passado.
De acordo com Assis (2003, p.109):

[...] o progresso industrial impulsionou a técnica da forja, facilitando a


comercialização de peças metálicas de diversas formas, tamanhos e espessuras
(redondos, quadrados e planos), dando possibilidades de curvaturas e produção de
novos desenhos essenciais à construção dos gradis.

Atualmente a indústria produz ferro laminado de várias formas, como ferro chato,
ferro cantoneira, ferro tee, ferro redondo ou ferro quadrado, que podem ser empregados na
confecção de gradis. A laminação do ferro consiste em reduzir a secção de um lingote ou
barra de metal através da passagem do linguote entre dois cilindros que giram à mesma
velocidade, em sentidos contrários, sendo que a distância entre os cilindros deve ser de
espessura menor que a espessura inicial do linguote. Os produtos são arrastados pelo cilindro
sob o efeito de forças de atrito, que se originam na superfície de contato dos cilindros e do
metal laminado. A importância do atrito é fundamental para o processo, pois, na ausência
dessas forças de atrito, não haveria possibilidade de laminação. Durante a passagem pelos
cilindros do laminador, o material é estendido no sentido longitudinal, o que se traduz por um
54

forte alongamento do produto laminado. Durante a laminação, as propriedades mecânicas do


material são modificadas, tendo a resistência e a dureza aumentadas e a ductibilidade
diminuída.

Ao passar pelos cilindros, o metal sofre deformação plástica e elástica; a espessura é


reduzida e o comprimento e a largura são aumentados, sendo o aumento mais acentuado no
sentido da laminação.

Existem dois tipos de laminação: a quente, que se aplica normalmente a operações


iniciais como desbaste, onde são necessárias grandes reduções de seções, e a laminação a frio
empregada na produção de bobinas e chapas. A laminação a frio desenvolveu-se com a
demanda por material com características mecânicas bem determinadas e com as exigências
cada vez maiores de uniformidade de bitola. Através da laminação, o perfil obtido pode ser o
definitivo e a peça resultante pronta para ser usada na confecção do gradil, ou o produto
obtido pode ser submetido a outros processos de conformação mecânica como, por exemplo,
o forjamento de peças para gradis.

Na segunda metade do século XX, surge em maior escala conhecimentos de solda com
oxiacetileno, a chamada solda mecânica, que veio substituir os processos de soldas artesanais,
vindos muito provavelmente da Alemanha, e que hoje são de fácil acesso a toda serralheria.
A soldagem de um gradil consiste em unir duas ou mais peças, garantindo a
continuidade do seu conjunto. Atualmente, a operação pode ser realizada por aquecimento, ou
por pressão, ou por ambos, com ou sem emprego de aditivo, e a temperatura de fusão é da
mesma ordem de grandeza do material de base. A soldagem autógena5 é aquela cujo metal de
base participa por fusão da constituição da solda, com ou sem emprego de metal adicional. O
acabamento da soldagem é uma das grandes preocupações na execução de gradis de ferro,
pois pode comprometer todo o bom desempenho da criação do artista quando não são
executados com capricho, evidenciando, deste modo, os nós de amarração dos perfis de ferro.
Apesar dos avanços tecnológicos da área siderúrgica, muitos serralheiros ainda
trabalham com a forja servindo-se dos princípios artesanais, como pudemos constatar no
atelier do Sr. João da Conceição Libório, na Rua Pacífico Pereira nº 98, Garcia, que desde a
década de 50 executa gradis de ferro.
O aprimoramento das técnicas na confecção das barras possibilitou, cada vez mais, o

5
Soldagem Autógena – a soldagem elétrica com arco é do tipo autógena, em que o arco elétrico é usado como
forma de calor (LAROUSSE, 1999, p.5446 ).
55

aproveitamento do ferro. Utilizando técnicas mais modernas, e com a grande variedade de


perfis disponibilizados no mercado, os profissionais evoluíram seus desenhos além das
volutas e ornamentos, que eram detalhes mais específicos do passado, e introduziram também
uma grande variedade de desenhos orgânicos e geométricos em módulos diferenciados.
A maneira de construir o gradil varia muito da experiência de cada profissional, como
já dissemos, mas a grande maioria se baseia na confecção de gabaritos sobre uma bancada de
trabalho. Dependendo do grau de complexidade do gradil, faz-se necessário o desenho na
escala 1:1, que serve de base para a composição, o que é normalmente fornecido pelo
arquiteto ou artista plástico que o idealiza. Outras vezes o profissional que executa o trabalho
possui conhecimento suficiente para elaborar sozinho tais gabaritos e acaba sendo responsável
por toda criação e execução, como pudemos constatar no atelier do Sr. Silvio Roberto
Andrade Costa, na Av. Afrânio Peixoto n º46, Suburbana.
Observamos que a grande concentração de profissionais que trabalham com a técnica
do ferro forjado se encontra, na periferia de Salvador, onde os índices de violência são
maiores, e também muito provavelmente por se tratar de uma técnica relativamente de menor
custo. Apesar disso, alguns serralheiros têm encontrado muita dificuldade em trabalhar com o
ferro forjado atualmente, como é o caso do artesão Sr. Carlos Pietrasik, com atelier na Rua
Direita do Uruguai há mais de cinqüenta anos e que aprendeu o ofício com seu pai. O artesão
alega que, nos últimos anos, o interesse por gradis em ferro forjado está diminuindo, e está
sendo substituído aos poucos por gradis de Metalon6 ou alumínio, por se tratar de material
mais leve, com custo menor e mais resistente à corrosão. Além disso, a mão-de-obra do ferro
forjado para gradis pode ser muito mais complexa, do que em perfis de alumínio ou Metalon,
que são hoje facilmente fabricados para portões e grades em escala industrial, com grande
simplificação formal e custos bem menores.

2.5 FERRO FUNDIDO

O ferro fundido é uma liga de Fe-C (Ferro Carbono), obtida por via líquida,
compreendendo um teor de carbono que se situa entre 2% e 6,7%. Quando o percentual de

6
Metalon – Aço galvanizado conseguido através de um processo metalúrgico chamado “galvanização a fogo”,
acessível às empresas com grande volume de produção. Material resistente muito usado na fabricação de gradis e
portões (PORTÕES, 2006).
56

carbono é de até 2%, obtemos o aço. O composto pode ter outros elementos na sua
constituição como silício, manganês, fósforo, enxofre, etc., geralmente em menor quantidade,
por ser considerado impuro.
O ferro fundido, segundo Chiaverini (1981, p.413), [...] “é a liga ferro-carbomo-sílicio,
de teores de carbono geralmente acima de 2,0%, com quantidade superior à que pode ser
retida em solução na austenita, de modo a resultar carbono parcialmente livre, na forma de
veios ou lamelas de grafita”.
Dentro da denominação geral de ferro fundido, podemos distinguir vários tipos de
liga: ferro fundido cinzento, branco, mesclado, maleável, nodular, dependendo das variações e
proporções das mesclas dos materiais.
A invenção do alto-forno resultou um avanço significativo na produção, que, até então,
tinha ainda um caráter bastante artesanal. A partir da segunda metade do século XVIII, a
produção do ferro fundido começou a ganhar um novo impulso, com vantagens de baixos
custos, facilidade de produção em série e possibilidades infinitas de formas de estilo
arquitetônico. Na “Arquitetura do Ferro” do século XIX e início do século XX, o ferro
fundido foi de grande destaque para um grande numero de obras espalhadas pelo mundo
inteiro, como já citamos no capítulo anterior.
Enquanto o ferro forjado, pelo tratamento da forja, tem aumentada sua elasticidade, na
fundição, o ferro fundido ganha maior rigidez e, segundo Colpaert (1974), é um excelente
material de construção que pode substituir a madeira e a pedra, com vantagens na maior parte
de suas atribuições. Por outro lado, requer maiores cuidados nos processos de fabricação, pois
exige domínio de outras técnicas.

Diferentemente da forja, a fundição é uma técnica que requer maiores cuidados, pois
o seu procedimento exige auxílio de outras técnicas como as moldagens7 de forma,
etapa fundamental para reprodução em série, e que é considerada a característica
fundamental da técnica (ASSIS, 2002, p.126).

Para se obter o ferro fundido, é necessário um modelo da peça que se queira criar, seu
respectivo molde e o metal em sua forma líquida. O processo é dividido em duas etapas onde
num alto-forno se obtém o gusa ou ferro fundido bruto, e onde são colocados, em proporções
adequadas, minério de ferro, coque ou carvão vegetal, que fornece o calor e o CO2 necessários
para a redução e fundir o calcário que deve fluidificar as impurezas e formar uma escória mais

7
Moldagem – técnica que se acomoda ou comprime numa forma o material que, solidificado, reproduzirá sua
configuração e servirá de molde (modelo) (HOUAISS, 2001).
57

fusível. Em seguida, o líquido é escoado em formas onde irá esfriar e solidificar. Esse produto
é chamado gusa ou ferro de primeira fusão, com percentual de carbono em torno de 3,5% e
4,5%, que servirá de matéria prima para a confecção de gradis ou de outros componentes.
O processo de fundição tem por objetivo uma “estampagem”, ou seja, a técnica dará
forma a uma peça ornamental, através da confecção do molde previamente criado de onde
obteremos a fabricação das peças. Este processo de fabricação se torna mais econômico e
permite a reprodução de um mesmo motivo em série. O aparecimento desta técnica deu-se,
principalmente, com o advento da Revolução Industrial, quando começou a época da
construção industrial com o surgimento de muitos elementos pré-fabricados em ferro fundido
de grades e portões.
Apesar de o ferro fundido apresentar a vantagem de ter um baixo custo e facilidade de
ser trabalhado em série, a partir dos últimos anos do século XIX, começa a ser relegado a um
segundo plano na Europa, talvez por estar muito ligado ao estilo eclético, que o leva a ser
desprezado pelos arquitetos modernistas.
As grades de ferro fundido expandiram-se pouco pela Cidade do Salvador na segunda
metade do século XX. Tiveram maior repercussão em finais do século XIX, com a influência
da arquitetura eclética, e com a presença de muitos artesãos estrangeiros que dominavam o
mercado. A técnica do ferro fundido não aparece nos gradis de ferro da modernidade, mas
torna-se importante na medida em que sua presença é notada nos detalhes de algumas peças
para confecção dos gradis de ferro.
O ferro fundido, além de ser um material barato, com resistência relativamente boa à
compressão, à usura e à abrasão, apresenta algumas desvantagens que são apontadas por
alguns engenheiros projetistas (TEICHERT, 1953, p.349),

[...] como material quebradiço, possuindo pouca resistência à tração e ao


cisalhamento, não tendo praticamente ductibilidade alguma[...] O ferro fundido era,
além disso, considerado como um material de pouca confiança, uma vez que suas
propriedades variavam muito de peça para peça, não eram suscetíveis de
modificações por qualquer espécie de tratamento após a solidificação.

Apesar da expansão e do desenvolvimento industrial, que gerou o aperfeiçoamento da


técnica com a introdução da indústria, os quais permitiram o aprimoramento técnico para se
trabalhar o ferro, o que ocorre, ainda hoje, é a maior procura pela técnica da forja aliada às
possibilidades tecnológicas, deixando a técnica da fundição, geralmente, para ser empregada
somente na confecção de alguns detalhes para gradis.
58

É possível que, pela falta de qualificação profissional e pela desvantagem da


impossibilidade de se trabalhar possíveis modificações nos gradis de ferro, os artesãos, de
modo geral, ainda prefiram as técnicas do ferro forjado.

2.6 AÇO

Com a “Exposição Universal em Paris”, inaugurada em meados de 1889, os anos


seguintes foram marcados por transformações que, aos poucos, foram substituindo o ferro
ornamentado pelo aço que inicialmente era utilizado na estrutura de arranha-céus ou no
concreto armado.
Com o avanço da tecnologia e das grandes indústrias do século XX, o aço tem feito,
cada vez mais, parte do cenário da modernidade.
A obtenção de aços especiais e inoxidáveis e a soldagem autógena, em 1928,
permitiram soluções arquitetônicas em que o metal e o vidro expressem o seu rigor desde a
Casa do Povo de Clichy até o Centro Pompidou e a corrente high-tech. Com Mies Van der
Rohe e J. Prouvé, o aço destacou-se em grandes construções. Outras obras mais específicas
são as estruturas geodésicas do americano Buckminster Fuller e as estruturas atirantadas
aplicadas por René Sarger no pavilhão francês da exposição de Bruxelas em 1958 (GIEDION,
2004).
Dessa época até hoje, a produção do aço cresceu muito, estabilizando-se em 1975, e a
demanda impulsionou o aumento da produção no final da década de 80. O Brasil, como um
dos novos países industriais, é um dos dez maiores produtores mundiais de aço8.
O aço, segundo Chiaverini (1981, p.19),

[...] é uma liga de natureza relativamente complexa e sua definição não é simples,
visto que a rigor, os aços comerciais não são ligas binárias: de fato, apesar dos seus
principais elementos de liga serem o ferro e o carbono, eles contêm sempre outros
elementos secundários, presentes devido aos processos de fabricação.

O produto é considerado aço quando o teor de carbono está compreendido entre 0 e


2%, contudo a transposição de aço para ferro fundido é gradual e o limite de 2% corresponde

8
“O Brasil (26Mt) e a Coréia do Sul (22Mt), estão dentro os dez primeiros produtores mundiais, tendo
ultrapassado o Reino Unido, e a França (cerca de 19 Mt cada)” ( LAROUSSE, 1998, p.50 ).
59

a certo ponto do diagrama de equilíbrio das ligas de ferro-carbono, que foi tomado como
ponto de separação convencional entre o aço comum e o ferro fundido comum. Podemos
considerar dois tipos fundamentais de aço:
· aço-carbono ou liga ferro-carbono contendo geralmente 0,008% até cerca de 2,0%
carbono, além de certos elementos residuais resultantes dos processos de
fabricação;
· aço-liga ou aço-carbono que contém outros elementos de liga ou apresenta os
elementos residuais em teores acima do que são considerados normais. Os
elementos de liga como níquel e cromo produzem aço inoxidável, que, por conta
desses elementos, se tornam estremamente caros.
Estas novas tendências refletiram-se nos projetos contemporâneos, dos arquitetos
brasileiros e podem ser uma das razões pelas quais os arquitetos, em geral, estão empregando
cada vez mais o material aço inox nos seus projetos arquitetônicos, como gradis para portões
e sacadas.
Atualmente, falar de algo produzido em aço é o mesmo que pensar em resistência e
rigidez, qualidades importantes também para os gradis da contemporaneidade.
Nas últimas décadas, o aço inox tem sido sinônimo de status e beleza em algumas
obras arquitetônicas, utilizado de forma criativa em projetos para residências e edifícios de
alto luxo em Salvador.
O aço inox normalmente é forjado na máquina industrial, evitando-se, com isso,
manusear com batidas para possíveis ajustes, com o risco de afetar a superfície do aço que já
vem de fábrica com acabamento final. Os desenhos mais elaborados que requerem muitos
pontos de solda entre os perfis, também são evitados nos gradis de aço inox, pois necessitam
de mão-de-obra especializada de custo elevado. Por isto aparecem, principalmente nas
residências, com desenho de linhas retas, combinado com materiais frios e claros, como o
vidro, e materiais mais nobres. Os gradis de aço inox, geralmente, aparecem elaborados
apenas com cortes de perfis em encaixes com parafusos ou peças, com um mínimo de
soldagem, explorando a beleza do próprio material, em acabamentos que podem ser do tipo
escovado ou lixado ou de ambos numa mesma peça de gradil.
Apesar do emprego dos gradis de aço representarem custos mais elevados para a
obra, possui a vantagem do material ser resistente à corrosão, comuns à Cidade do Salvador.
Existem atualmente, no mercado, serralherias equipadas com máquinas para trabalhar
com peças exclusivas em aço inox, como é o caso do arquiteto José Rivas, na Ladeira Cruz da
Redenção 96, Brotas, que desenha e fabrica vários modelos de gradis.
60

Além das máquinas mais convencionais no auxílio da serralheria, técnicas novas de


recorte a laser9 podem ser empregadas para gradis de aço inox em projetos especiais.
Empresas especializadas disponibilizam no mercado corte de chapas em aço carbono 16mm
ou aço inox até 12mm para serem recortadas.
O custo dessa técnica ainda se mostra alto e, deste modo, alguns artistas a utilizam
somente como detalhe em gradis mais elaborados, como é o caso do artista plástico Juarez
Paraíso no gradil elaborado para o Hospital Aliança, que veremos em detalhes no Capítulo 4.
Os recortes são feitos com precisão milimétrica, com auxílio de programas especiais de
computador. A peça de aço é recortada baseada num desenho específico, onde se eliminarão
os vazios de parte do desenho e, deste modo, resultará no gradil final. O processo é bastante
interessante, na medida em que apresenta vantagens em dispensar os processos de solda entre
perfis de aço e obter um acabamento final impecável para o gradil.
Nos últimos anos, vem crescendo a preferência em se utilizar o aço como material para
gradis de varandas, portões e, principalmente, como corrimão de escadas, às vezes,
associados pelos artistas e arquitetos contemporâneos, com cabos de aço e vidro temperado, e
tem sido um novo desafio explorá-lo técnica e formalmente.

9
Buzas laser Service –alta tecnologia em corte a laser (CORTE , 2000).
3 GRADIL DE FERRO NA PAISAGEM URBANA SOTEROPOLITANA

3.1 GRADIS NAS REURBANIZAÇÕES CONTEMPORÂNEAS – ESPAÇOS PÚBLICOS

A nova sociedade urbana vem, cada vez mais, sendo caracterizada pela extrema
velocidade e troca de informações. Todos estes avanços, que são fenômenos da urbanização,
levaram as cidades a se tornarem lugares de medo e insegurança, fruto de um capitalismo
desenfreado, escondido em uma suposta modernidade.

A cidade que no passado, era o lugar fechado e seguro por antonomásia, o seio
materno, torna-se o lugar de insegurança, da inevitável luta pela sobrevivência, do
medo, da angústia, do desespero.Se a cidade não se tivesse tornado a megalópole
industrial, se não tivesse tido o desenvolvimento que teve na época industrial, as
filosofias da angústia existencial e da alienação teriam bem pouco sentido e não
seriam – como no entanto são – a interpretação de uma condição objetiva da
existência humana (ARGAN, 1992, p.212).

O homem contemporâneo vem percebendo suas obras com velocidade e rapidez do


olhar, o tempo para observar a cidade se reduziu aos poucos minutos que ele tem para chegar
ao trabalho do outro lado da cidade.

Desapareceu a possibilidade do encontro entre as pessoas, na rua, [...] Hoje temos


apenas ou o rosto ou a paisagem. A fotografia converteu-se então na postulação do
encontro impossível, evocação do instante em que a fisionomia dos indivíduos
corresponde à da cidade (BRISSAC, 1996, p.63 ).

Muitas cidades são mal administradas, atormentadas pelos crimes e toda sorte de
problemas como a violência, a sujeira e a deterioração do Patrimônio Histórico.
Marx e Engels (1848) citam, em seu Manifesto Comunista, as transformações da
sociedade burguesa ante o maquinário, as invenções da máquina a vapor, das estradas de
ferro, do telégrafo, dos processos de industrialização, como sendo contribuições que
trouxeram um alto custo à sociedade: violência, destruição de tradições, opressão, redução da
avaliação de toda atividade ao frio cálculo do dinheiro e do lucro.
No entanto, ainda assim muitas pessoas são estimuladas a viver dentro dessas cidades
62

tão complexas, pois elas oferecem a seus moradores a possibilidade de desenvolver uma
melhor consciência de si mesmo e também um aprendizado mais rico com a convivência de
outros seres humanos, dentro desta grande complexidade. E esta é a vantagem da diversidade
dentro das cidades contemporâneas mais avançadas.
O projeto urbanístico evolui ou se transforma da mesma maneira que a sociedade está
sempre em transformação. As novas necessidades caminham juntas neste novo processo para
o projeto. O homem contemporâneo vem procurando outros tipos de abrigo dentro da cidade
em transformação: espaços de lazer fechados (praças e parques), condomínios residenciais
(casas e apartamentos), shopping centers (lojas, bancos e serviços diversos), onde se oferece
maior segurança ao homem moderno.
As marcas da atual paisagem urbana podem ser compreendidas, através de aspectos
relacionados ao passado, como as influências das inovações tecnológicas, e o que tudo isso
refletiu na arquitetura ao longo dos anos.
Os últimos anos caracterizaram-se pelas transformações mais profundas na sociedade,
e estamos atravessando contradições e desordens de toda ordem. Os progressos da ciência,
tecnologia e indústria estão sendo cada vez mais rápidos, trazendo uma defasagem constante e
a necessidade de readaptação do homem diante dessas mudanças.
A arquitetura no processo de desenvolvimento da cidade e o modo como se apresenta
nos seus diferentes períodos, são o reflexo das mudanças sociais de seu tempo. O meio, como
espaço no qual se insere à sociedade, seria um meio transformado pela técnica. “O espaço é
uma categoria histórica, e, por conseguinte, o seu conceito muda, já que se apresentam novas
variáveis no curso do tempo” (SANTOS, 1996, p.243).
Essas variáveis podem ser expressas pelos gradis, que buscam servir às novas
necessidades da cidade, transformando significativamente as relações do homem com o
espaço em que vive. O gradil de ferro é um dos elementos mais presentes na paisagem urbana
das cidades modernas neste último século, nas construções em geral, modificando a imagem
do urbano.
Dentre os espaços públicos que possibilitam a vivência sociocultural, as ruas e as
praças são os mais significativos, porque algumas representam os primeiros espaços do núcleo
de origem das cidades. A praça é um segmento que faz parte da paisagem e vem-se
modificando enquanto imagem urbana. A praça representa um espaço aberto encontrado nas
pequenas e grandes cidades, surge como confluência de ruas e geralmente é rodeada por
edificações. O seu significado está relacionado com o espaço urbano e é um ponto de
referência que permite estabelecer posição no contexto.
63

As praças contam a história de um determinado momento da sociedade, e sua


transformação mostra que esta sociedade está em constante mudança nos hábitos e costumes.
A história da cidade também passa por suas praças, onde seus cidadãos, com conteúdo e um
significado de valor, acabam “[...]comunicando a história da cidade em uma perspectiva
ideológica, tendo em vista um desenvolvimento coerente com as premissas dadas” (ARGAN,
1992, p.244).
Segundo Lopes (2004, p.02), as praças como,

[...] espaços públicos urbanos devem ser essencialmente espaços de lazer, isto é,
lugares de dinâmica cultural onde o lúdico faça ressaltar um conjunto de expressões
e rituais, sinônimos do direito à cidade e de usufrutos de lugares agradáveis para
viver. Lugares que ofereçam uma grande escolha de atividades e que, ao
prolongarem a vida interior, sirvam de receptáculo de muitas aspirações por vezes
contraditórias, mas onde os cidadãos procurem sempre, mais ou menos
conscientemente, estar em osmose com a sua unidade de vizinhança, o seu bairro, a
sua cidade.

Diante dos problemas da cidade contemporânea, podemos salientar que, dentro desse
novo processo de transformação em que se observam o adensamento de áreas centrais e a
expansão dos limites periféricos da malha urbana, os espaços livres públicos irão reafirmar-se
como indispensável opção de lazer para a cidade. As praças, inseridas nos bairros, são
elementos necessários para a coletividade e têm perdido, nos últimos anos, a boa qualidade de
suas funções.
A praça contemporânea é um dos espaços que não ignora a crise da cidade e tende a
uma transformação, como espaço de lazer público. Vem sofrendo alterações ao longo dos
anos para uma nova adaptação de uma sociedade sempre mutante e a caminho de novas
adequações. Os gradis vêm sendo incorporados ao desenho urbano por motivos diversos nas
reurbanizações das praças. Esta prática não é nova. Desde de 1870, na Europa, já estavam em
voga, quando várias praças centrais foram cercadas com gradis de ferro. Antigamente, entre
nós, foi comum também o emprego de gradis de ferro fundido ou forjado, circundando os
jardins ou parques públicos. Atualmente, retornam ao contexto urbano, como solução para o
enfrentamento dos problemas de vandalismos e para tornar as praças locais mais “seguros”
nas cidades grandes. Exemplo disso, são as praças da Piedade e Dois de Julho no centro de
Salvador, que, após um longo período sem grades, recebem novos gradis com desenhos
orgânicos muito elaborados, especialmente criados por artistas e arquitetos.
64

3.2 INTERVENÇÃO NAS PRAÇAS HISTÓRICAS DE SALVADOR

O grande avanço que a Cidade do Salvador obteve no último século, o processo de


industrialização crescente e o grande desenvolvimento econômico no sentido de
modernização da cidade e de melhores condições de vida, para alguns dos seus habitantes, nos
fazem questionar, também, o quanto isto trouxe problemas para esta mesma cidade.
A atração exercida pela cidade decorrente do processo urbano provocou um rápido
aumento do contingente populacional que não obteve um ganho sociocultural adequado. A
cidade não estava preparada para uma demanda, cada vez maior de serviços e obras públicas.
Grande parte desta população não teve acesso às escolas e às condições adequadas de
moradia.
Atrelado a este desenvolvimento e ao grande incentivo do uso do automóvel, criou-se
uma ideologia da necessidade de se ter, cada vez mais, grandes obras viárias, em detrimento
de espaços urbanos livres para a população. Pode-se observar que, andar pelas ruas de
Salvador se tornou perigoso e indesejável em certos pontos da cidade. Alguns espaços livres
foram apenas sobras de área de uma cidade mal planejada e sem integração.
Na década de 80, do século XX, o problema se agrava mais com a extinção da
Superintendência de Parques e Jardins, que era um dos órgãos que poderia impedir a
degradação das praças e áreas verdes.
Atualmente, a preocupação com a qualidade de vida volta a ser discutida e coloca em
pauta a urgência da revitalização e reurbanização das praças de Salvador no centro histórico e
em outros locais, enfocando também a importância de se preservar o Patrimônio Histórico da
Cidade. Para tanto, as praças Dois de Julho e Piedade recebem, como solução, novos gradis de
ferro e deixam de ser locais de livre acesso para se tornarem locais de acesso temporário.
Essas praças, ao longo dos anos, passaram por mudanças no uso e alterações no
desenho arquitetônico. Atualmente, problemas de abandono, vandalismos e mau uso do
Patrimônio Cultural trazem de volta soluções que foram concebidas no passado: os gradis;
porém, com outros valores estéticos e arquitetônicos. A praça Dois de Julho, no Campo
Grande, e a Praça da Piedade, no Largo da Piedade, são exemplos que, idealizadas no
passado, hoje não representavam, efetivamente, o mesmo significado, não expressavam a sua
função de origem, ou seja, o caráter de espaço de convivência.
Atualmente, pretende-se complementar os parques com a criação de “parques de
bairro”, bem como as praças, conforme consta do Projeto de Revitalização Urbana para a
65

Cidade do Salvador, onde as atividades de lazer se desenvolvem em conformidade com a


identificação coletiva e individual das pessoas com estes microespaços.
Na sua forma mais simples, o objetivo do gradeamento é delimitar a propriedade,
excluindo dela pessoas e animais indesejáveis (CULLEN,1983). O gradil nos espaços abertos,
no contexto atual, tende a excluir todo elemento indesejável, para que possa garantir
condições seguras e saudáveis aos novos usuários. A cidade então, encontra soluções de
compensação para as suas tenções, gradeando as praças centrais, criando possivelmente um
quadro de segregação e discriminação entre os usuários. Os espaços gradeados e não
democráticos tentam substituir o que deveria ser público: o direito ao lazer da população, à
cidade e ao convívio.
Os espaços públicos se tornam espaços fechados rigidamente segmentados e
controlados, mas, ao que parece, foi a única solução encontrada para que ainda se tivesse
alguma revalorização da vida pública e para que os moradores pudessem usufruir de algum
lazer em suas praças.

3.2.1 Praça da Piedade

A Praça da Piedade, tal como nós entendemos hoje, só tomou forma a partir do
final da metade do século XVIII.
Estudos mostram que,

[...] após a construção, em 1702 da Igreja e Convento dos Frades Capuchinhos, o


morro que existia a sua frente, coberto de mato, onde se açoitavam vagabundos e
criminosos foi desmontado e constituiu-se assim a Praça da Piedade, a mais antiga
da cidade e eleita pelos poetas a Praça Nacional da Poesia. (SECCO; GARZEDIN,
1987, p. 11).

No coração da cidade, muitos foram executados no patíbulo da praça, quando lutaram


por seus ideais de liberdade.
A Praça da Piedade localiza-se em um espaço aberto, apresenta forma próxima do
retângulo, com quatro caminhos pavimentados que partem dos quatro lados em direção a um
pátio central onde existe uma fonte luminosa e canteiros gramados, com arbustos e árvores.
Chega-se à Piedade passando pelo Instituto Geográfico e Histórico da Bahia, edifício
monumento, construído e projetado pelo engenheiro Theoodoro Sampaio. A praça encontra-se
66

delimitada pelo prédio de esquina da Piedade com a Av. Sete de Setembro, um dos edifícios
que, no projeto do arquiteto José Alioni, que estudou arquitetura na Bélgica, possuía duas alas
simétricas divididas por um corpo central mais alto, com uma cúpula pequena, mas elegante.
Em nome do progresso, uma de suas alas é demolida para dar passagem à Av. Sete de
Setembro inaugurada em 1912. O outro prédio importante que compõe o entorno, é o
Gabinete Português de Leitura, construção do século XX no estilo manuelino. Atualmente, a
praça está circundada pelas Igrejas da Piedade e de São Pedro Velho. À sua volta abrigam-se
o Gabinete Português de Leitura e o Consulado Português, a Secretaria de Segurança Pública,
a Faculdade de Economia da UFBA e algum comércio variado.
Já se pode perceber, através dos registros iconográficos e segundo Teixeira (19??),
que na época da construção do Gabinete Português de Leitura, “[...]o Largo da Piedade estava
cercado de grades conforme pode ser visto em fotografia coeva. Somente agora as grades
retornaram, depois de largo tempo, o largo da Piedade em aberto”.
Com altura total de aproximadamente dois metros, perfis de ferro numa modulação
regular foram apoiadas em uma alvenaria de pelo menos sessenta centímetros de altura, pela
avaliação que se pode fazer com as figuras de pessoas nas fotos. Os desenhos eram pouco
rebuscados e não apresentavam volutas, permitindo integração visual dos transeuntes que ali
passavam. (Figura 29 e 30).

Figura 29 – Praça da Piedade (1912).


Fonte: Teixeira, (19??).
67

Figura 30 – Gradil da Praça da Piedade (1912).


Fonte: Teixeira, (19??).

Os perfis verticais dos gradis de ferro da praça possuiam na sua extremidade,


acabamentos de lanças metálicas, e estão estruturados em módulos iguais muito
provavelmente coincidindo com o desenho da base em alvenaria (Figura 35). Teixeira (19??)
se refere a ele nesse capítulo:

No começo da década de 30 o Largo da Piedade, que antes já fora cercado de


grades, sofreu grandes modificações. No centro, a prefeitura municipal colocou uma
“Fonte Luminosa”cuja presença inaugurou na cidade o “Footing Jovem”, até então
desconhecido.

Descrevendo como era esse logradouro no ano de 1936, o engenheiro Lauro Fontes
(DÓREA,1999) registra que, naquele tempo, havia ali no centro da praça majestosa fonte
luminosa, com jatos de água colorida, jardins floridos, bancos por toda parte, limpeza
impecável, largos passeios circundando a praça onde, aos domingos à noite, a Banda
Sinfônica da Polícia Militar reunia centenas de pessoas em suas apresentações.
Segundo Teixeira (19??), pouco tempo depois, o governo do Estado inicia obras de
construção na área, com ideais revolucionários para o tempo, que ainda guardava fielmente
os estilos do Barroco e do Neoclássico da praça, onde certamente nesta época os gradis já
haviam sido retirados.
O que, nos anos 30, era ponto de concentração da juventude da cidade, passou a ser
local de tráfego intenso. Neste processo, o espaço público de lazer e convivência foi, aos
68

poucos, perdendo suas características. A Praça da Piedade vem assistindo às modificações da


sociedade decorrentes das transformações econômicas, tornando-se cenário de perigos e de
vandalismos do Patrimônio Histórico.
Com o passar dos anos, a praça foi-se tornando local de pouca circulação com a
finalidade de passeio e o seu espaço interno acabou sendo utilizado para passagem de um
ponto a outro da praça, objetivando o alcance dos vários lugares do entorno.
Na tentativa de preservação da vegetação, provavelmente na década de 70, foi
colocada no perímetro dos jardins de diferentes níveis variando de 15 a 60cm de altura,
proteção com grades de ferro de 15cm de altura em forma de arcos a cada 20 cm, tentando-se
evitar o pisoteio dos canteiros.
A Praça da Piedade foi a primeira praça em Salvador a sofrer a intervenção do
governo com os planos de Revitalização e Restauração com novos gradis de ferro, em 1998.
O gradil de ferro que hoje circunda a praça, foi desenhado pelo artista plástico Carybé,
com o intuito de preservar o Patrimônio Histórico e Ambiental, para o usufruto coletivo da
população local e do turismo. Os gradis que atualmente se encontram no local possuem
desenhos orgânicos, fruto da inspiração do artista, numa homenagem aos costumes e crenças
da cultura bahiana. Estes gradis são catalogados e discutidos no Capítulo 4, com maiores
detalhes.

3.2.2 Praça Dois de Julho (Campo Grande)

Nos primórdios da ocupação urbana da Cidade do Salvador, a área onde fica a Praça
Dois de Julho era apenas um terreno bastante acidentado.
A partir de 1810, com o tratado entre Brasil e Inglaterra, a presença dos ingleses na
Bahia foi cada dia maior e, alguns anos depois, a colônia praticamente dominava os negócios
de exportação. Suas residências começaram a se formar em terrenos irregulares, próximas ao
Forte de São Pedro.
No fim da década de 30 do século XIX, realizam-se as primeiras obras de nivelamento
e urbanização do que viria a ser o Campo Grande de São Pedro. Em 1851, o terreno muito
irregular fora nivelado, surgindo assim a praça com o plantio de árvores e aberta a rua que dá
acesso ao Forte de São Pedro.
Em sua fala de 1853, Gonçalves Martins esclarece que a obra ainda se prolongaria até
69

junho daquele ano e “[...]ressalta a resolução de fazer passeios nos dois lados que se
comunicam com a estrada da Vitória”1(MARTINEZ, 1998, p.02).
É provável que já nessa época, segundo levantamentos iconográficos, tenha surgido o
primeiro gradil da Praça do Campo Grande, com altura de, aproximadamente, um metro e
trinta centímetros, com modulações de pilares circulares de ferro fundido a cada 2,50m,
estruturados de forma a receber quatro barras de ferro circulares na horizontal (Figura 31 e
32).

Figura 31 – Praça do Campo Grande (1853 )


Fonte: Martinez, (1998).

Esse gradil possibilitava visão clara dos transeuntes que passavam, tanto pelo seu
interior quanto pelo exterior, mostrando claramente ter sido introduzido para que fosse
delimitado o seu perímetro sem provavelmente inibir qualquer forma de acesso dos pedestres
(Figura 36). Aos poucos, foi-se tornando ponto de atração para a população que freqüentava a
praça, principalmente nos sábados e domingos, como lazer. Para o culto dominical da colônia,
foi erguida a Igreja Anglicana, com pórtico de colunatas, hoje em dia já destruída. Segundo
Carvalho (1998, p.287):

1
MARTINS, Francisco Gonçalves – Fala que recitou [...] na abertura da Assembléia Legislativa da mesma
província ( Bahia) no 1º de março de 1851, ( Constitucional Vicente Moreira, 1851, p.42 ).
70

[...] por interferência do Reverendo Parker, foi pedida anuência do governo da


Província para promover o aterro e o ajardinamento de uma área fronteiriça ao
referido templo, surgindo assim, um jardim ao gosto inglês, com largos gramados,
que logo se fizeram ponto de atração da cidade [o Campo Grande].

A população mais rica da cidade vai aos poucos instalando-se, com grandes casas em
terrenos largos, que progressivamente foram criando a conformação do entorno do largo. Em
1858, no Diário de Notícias de 1º de julho, há a seguinte notícia:

A idéia de um monumento ao Dous de Julho vai sendo aplaudida como era de se


esperar de um povo que amo muito de coração a esse dia.
Hoje publicamos uma correspondência que lembra um meio-prático de fazer-se
talvez uma boa colheita.
Já o dissemos: --a glória de comover para a realização da idéia não é pequena, para
que fique rejeitada.
Hontem foram para a Piedade os carros triunphaes dos festejos do Dous de Julho e
hoje serão conduzidos a Lapinha pelos batalhões patrióticos (apud MARTINEZ,
1998, p.11).

Figura 32 – Gradil do Monumento ao Dois de Julho


(1853).
Fonte: Martinez, (1998).
71

Em 1895, inaugura-se a Praça Dois de Julho, que reflete os princípios do iluminismo


francês posto em prática no Rio de Janeiro por Gladiou. A sua composição é em forma de
cruz, cujo eixo é marcado pelo maior monumento da América do Sul. Dois espelhos de água
ladeavam a entrada principal com fontes, e o retângulo cercado por grades foi prodigamente
embandeirado para esta data. O traçado octogonal com eixos de circulação radiais se
conservam até hoje.
Um fato curioso é que, à época da sua inauguração, a praça chamava-se Campo
Grande ou Parque Duque de Caxias. A denominação atual de Praça Dois de Julho só veio
depois.
De acordo com os arquivos iconográficos (Figuras 29 e 30) feitos na época pode-se
notar que esta data foi um grande acontecimento para a cidade, com a praça criando status
social, e toda população mais rica participa do acontecimento.

É este campo aplainado com vegetação que encontramos não só na planta Wyell,
mas também no detalhado desenho do arquivo do CEAB (Centro de Estudos da
Arquitetura da Bahia) de aproximadamente 1860. Nesta planta estão assinalados
gradis, os passeios do lado da Vitória, os trilhos dos bondes puxados a burro e os
famosos palacetes que marcaram a área como erudita, entre os quais o palacete do
Visconde de S. Lourenço, onde hoje é o Hotel da Bahia e o Dr. Pacífico Pereira, no
local do Teatro Castro Alves ( MARTINEZ, 2002, p.8 ).

Apesar das grades ricamente trabalhadas nas casas ao redor, em leve estilo grego ou
italiano, muitas com pilastras, estátuas e arabescos variados para demonstrar o valor das
moradias de novos ricos, os novos gradis da Praça do Campo Grande mostravam sua
imponência, principalmente na altura e nos pilares. Os portões entre os pilares quadrados com
cerca de três metros de altura marcavam a entrada e apresentavam detalhes mais elaborados
em ferro em forma de lanças (elementos usados nos arremates das grades de acabamento
pontiagudo em formato triangular simples) e motivos decorativos de volutas no formato da
letra “C”( Figura 37 ). O restante do conjunto do gradil de ferro ainda se apoiava em uma base
de alvenaria, combinando com o mesmo acabamento dos pilares da entrada.
72

Figura 33 – Praça do Campo Grande (1895).


Fonte: Martinez, (1998).

Figura 34 – Praça do Campo Grande (1895).


Fonte: Martinez, (1998).

As proporções desse novo gradil, além de cumprir as funções estéticas, acabaram


reservando o espaço interno para as camadas sociais mais privilegiadas. Apesar da ostentação
do gradil, seu desenho é bastante simples, mostrando poucos detalhes, em contraponto à
arquitetura da época.
73

A maneira como a marca do neoclassicismo se manifestou nas grades foi diferente


da forma como se manifestou na arquitetura, quando esta voltou a descobrir a
profusão decoração do estilo clássico. Efetivamente, nas grades, nenhuma
modificação radical foi introduzida. Em verdade, as marcas presentes nos gradis
provêm do vocabulário do barroco e do rococó que possibilita um flexível diálogo
com o neoclássico (ASSIS, 2003, p.213).

Até a metade da década de 40, o cenário do Campo Grande era de ricos palacetes
construídos no século XIX e início do século XX, com amplos jardins laterais, circundados
com seus gradis de ferro. Daí por diante, a especulação imobiliária vai mudando as feições da
praça e interferindo no seu entorno com outros tipos de edificações.
Na década de 60, uma intervenção se fez necessária para ligar a Avenida do Contorno
ao Vale do Canela e um acesso ligando o Campo Grande a esta nova articulação, subtraindo-
lhe parte da área. Os gradis concebidos no passado desaparecem, fazendo com que a praça se
torne, principalmente, lugar de passagem para os transeuntes.
A partir dos anos 70, a praça serviu para atrair moradores pelas condições de
centralidade e pela quantidade de área verde. Ao longo dos anos, os novos hábitos da
televisão e passeios aos shopping centers e playgrounds acabaram por afastar a população
local da praça.

Atualmente, apenas umas poucas casas integrantes daquele imponente conjunto


original sobrevivem por força de circunstâncias diversas: ou por serem tombadas
pelo S.P.H.A.N. (Palácio Episcopal); ou por pertencerem ao poder público (a Casa
das Rosas que funciona a Procuradoria Geral do Estado); ou por sofrerem restrições
por gabarito de altura (conjunto entre o Hotel da Bahia e a Rua Visconde de São
Lourenço); ou ainda por estarem situadas em terrenos pequenos, despertando pouco
interesse ao mercado imobiliário (conjunto na esquina da Avenida Araújo Pinho)
(MARTINEZ, 2002, p.17).

A praça, então, passa a ser ocupada por pessoas estranhas ao local que, de visitantes,
passam a freqüentadores cotidianos. Novos hábitos começam a proliferar e,
conseqüentemente, vem o descuido com a manutenção, tornando-a um dos piores focos de
violência da cidade.
Essa constatação do sentimento de perda impulsiona não só a decisão municipal de
intervir na praça, como tambem os moradores a formar a Associação dos Moradores e
Amigos do Campo Grande, Canela e Vitória, a ASCAVI, e reivindicar grades com portões,
guaritas com guardas e outras séries de exigências, no sentido de trazer de volta a “qualidade
de vida” do espaço da praça.
No projeto de Restauração e Revitalização para a nova praça, um dos itens de
74

intervenção é a recolocação dos gradis de fechamento. Os responsáveis pelo projeto acreditam


que o “acesso franco por todo o perímetro da praça” tem sido o principal responsável pela má
qualidade de manutenção da vegetação de forração dos seus diversos jardins. Os transeuntes,
para encurtar caminho, transpõem qualquer obstáculo, danificando-os. Esta franquia ampla e
irrestrita dificultava, também, o controle de segurança e facilitava a ação dos marginais.
Diante desses problemas e por solicitação dos moradores, ficou decidido que se iria
reconstruir o gradil circulando a praça, deixando de fora a calçada atual de pedra portuguesa
em toda a sua largura, sendo interrompida por portais de acesso, situados nas extremidades
dos eixos e caminhos principais.
Segundo as arquitetas Arilda Maria Cardoso Souza e Maria Ângela Barreiros Cardoso,
autoras do projeto de arquitetura e paisagismo, que venceu a seleção realizada pela prefeitura
em 1998, a proposta de reforma arquitetônica do Campo Grande foi conservar as diretrizes do
equipamento construído no começo do século XX, mantendo o seu entorno de circulação e
elementos significativos, mas com um toque de modernidade.
A Praça Dois de Julho, então, atravessa mais um século e, no início de 2003, todo o
seu perímetro é cercado por um gradil de ferro com motivos inéditos, baseados nos desenhos
deixados pelo artista plástico Carybé. O gradil passou a contar com dez portões instalados ao
redor da área, sendo que os dois maiores localizados no eixo principal. Estes gradis são
discutidos em detalhes no Capítulo 4.
A revitalização das praças como um espaço de nova ideologia, dotado de
funcionalidade e dinâmica própria, é capaz de transformar hábitos da sociedade e trazer outros
usos. Quando se intervém espacialmente no contexto desse espaço aberto, alterado pela
colocação dos gradis em seu perímetro, obtém-se uma nova leitura para todo o grupo de
usuários, seja ele pedestre ou usando veículos. Este elemento perimetral das praças pode ser
visto como aglutinador do espaço interno, porém claramente exclui a população
marginalizada.
É possível que o gradil, como símbolo de confinamento e segmentação, possa
influenciar o usuário inibindo-o, quando cria uma nova relação de funcionalidade dentro deste
espaço público. Ele determina que as relações comportamentais do usuário podem ocorrer
somente no espaço interno voltado para um núcleo central e, a partir dele, causando uma
ruptura com o entorno da praça. Assim sendo, o desenho dos gradis pode desempenhar um
papel de grande importancia no grau de integração dos espaços externo e interno da praça.
O conceito de praça “como espaço livre, que deve ser destinado ao lazer” (ROBBA,
MACEDO, 2002, p.37), estaria então ameaçado, em função dos elementos limitadores,
75

dificultando ou impossibilitando a ação da praça como agente aglutinador e centralizador em


relação aos demais equipamentos do seu entorno.
Falar em modernidade e acompanhar as mudanças desse contexto implica adaptações
ao mundo moderno, que podem gerar novas funções ou exclusão de uma pequena população
dentro do contexto urbano. “Os limites inerentes ao processo de acumulação são muito
evidentes em Salvador e vão demonstrar na prática a retórica do urbanismo moderno, suas
ambigüidades e ineficiências” (SAMPAIO, 1999, p.29).
As decisões de usar gradis de ferro nas praças contemporâneas, na intenção de se ter
uma maior qualidade de vida e preservação do Patrimônio Histórico, podem gerar
ambigüidades e ineficiências, podendo ainda gerar novos conceitos para as praças da cidade
como “espaços de lazer fechados”.
76

Figura 35, 36, 37 - gradil da Praça Dois de Julho e Piedade


4 GRADIL EM SALVADOR NO SÉCULO XX

4.1 FORMA DO GRADIL

A Cidade do Salvador é, hoje, quase um museu a céu aberto, com grande variedade de
gradis, que se espalham por condomínios, praças, hospitais, escolas, empresas, residências e
outros edifícios. A diversidade está nas formas, cores, espessuras, técnicas e desenhos mais ou
menos elaborados, que refletem a transformação da identidade destes elementos arquiteturais.
As influências que podem gerar essas formas dos gradis, tanto na plástica como no
desenho da elaboração da criação, variaram muito no final do século XX.
Uma das questões fundamentais para se entender a evolução da forma pode estar
atrelada ao modo de vida do ser humano e aos avanços tecnológicos, neste último final de
século. Segundo Harvey (2000), somos cada vez mais “arquitetos em evolução”, em virtude
da capacidade científica, técnica e cultural que adquirimos.

O efeito disso é tornar a velocidade e a escala da adaptação ao ser de nossa espécie,


e ao ambiente dela, bem como de sua transformação, altamente sensíveis ao ritmo e
à direção das mudanças culturais, tecnológicas, econômicas, sociais e políticas.
(HARVEY, 2000, p.27).

Essa evolução se faz presente também na configuração da paisagem urbana e age


diretamente no modo como o ser humano escolhe sua maneira de formular seus espaços de
moradia.
Atualmente, como já destacamos, diante do crescimento da violência nos grandes
centros urbanos, os gradis e os portões se fazem cada vez mais presentes, funcionando como
uma barreira, limitando e até decorando os espaços público e privado. O ferro como material
responde às ações criativas dos arquitetos, artistas e artesãos que o transformam em gradis,
conferindo-lhe outro significado no desenvolvimento das cidades.
A múltipla variedade de estilos da serralheria contribuiu para uma concepção formal
diversificada. Uma delas, a base linear, ainda tem sido muito explorada, por exemplo, por
meio das barras de ferro forjado.
78

A forma e o conteúdo no contexto das linguagens, não verbais, são para o processo
artístico tão imprescindíveis como o alfabeto o é para a linguagen verbal. Através
dos processos de criação, as possibilidades formais sugeridas pela matéria permitirão
reformulações originando novas características. (OSTROWER, 1995, p.219).

As formas dos gradis, além dos limites exteriores de que são constituídos, são também,
por sua vez, configurações estruturais que podem ser as mais variadas possíveis.
Os elementos visuais que constituem a “matéria-prima” para os que projetam os gradis
de ferro são quase sempre as linhas. Elas fazem parte da estrutura espacial e podem ser
estáticas ou dinâmicas, sugerindo movimento como nas curvas e aspirais, podendo também
descrever contornos que funcionam como limites, regulares ou irregulares. Cada segmento
linear, dentro da técnica do ferro forjado, cria essencialmente uma dimensão no espaço. A
linha sempre é vista como indicadora de movimento direcional, sem nunca expressar uma
condição estática. Na arte de desenhar gradis, é o elemento fundamental que pode definir ou
não contornos nas composições.
Segundo Giedion (1965, p.431), existem duas tendências compositivas diferentes que
aparecem, sempre, ao longo da história, uma racional e geométrica, e a outra irracional e
orgânica: “A través de la Historia persisten dos tendencias diversa, una hacia lo racional y lo
geométrico, y otra hacia lo irracional y lo orgánico: dos diversas maneras para conseguir
ajustarse al ambiente, o para dominarlo.”
Os gradis de ferro da segunda metade do século XX são testemunhos claros dessas
duas grandes tendências. Os desenhos orgânicos são inspirados nos motivos da natureza, na
sua grande maioria, de animais e de plantas. Os gradis baseados nas formas geométricas,
geralmente menos elaborados, possuem, alguns deles, intenções claras de buscar um
movimento ilusório ou uma tridimensionalidade para o observador ou simplesmente formar
composições com figuras geométricas. Muitas vezes, um mesmo gradil também pode
apresentar as duas tendências, ou seja, orgânica e geométrica juntas, porem, apesar das
formas mistas, são poucos os gradis que apresentam soluções técnicas diferentes numa mesma
peça. As formas resultantes dos gradis estão geralmente atreladas às técnicas que determinam
seu processo de construção.
Para entendermos melhor essas duas classificações do ponto de vista da análise
formal, classificamos os gradis em orgânicos e geométricos (Figura 38) e efetuamos uma
análise e classificação de 71 exemplares nestas categorias.
79

Figura 38 - QUADRO RESUMO DAS CATEGORIAS


80

4.2 A TIPOLOGIA DO GRADIL EM SALVADOR

O conjunto de tendências e características formais e estéticas que identificam os estilos


dos gradis de ferro da segunda metade do século XX é bastante heterogêneo e difícil de
classificar, dado o grau de diversidade e complexidade dos materiais e técnicas empregados
ao longo dos últimos anos.
Vários fatores determinaram as mudanças adotadas por artesãos, arquitetos e artistas
plásticos, na proliferação desses vários estilos como: o econômico, o social e o cultural.
Um dos problemas enfrentados, ao analisarmos os gradis para enquadrá-los nas
classificações, foi que muitos deles possuíam formas tão variadas que poderiam pertencer a
mais de uma categoria. Para a pesquisa, a dificuldade de um gradil possuir detalhes tão
diversos pode suscitar, ainda, outros critérios de classificação, dependendo da análise
interpretativa que se faça. Os critérios adotados neste trabalho não inviabilizam tal condição,
somente buscam os melhores exemplos para cada grupo de conceito aqui proposto. Podemos
citar, como exemplo, o Gradil da Empresa Pneu Service, que está classificado na categoria
dos “Gradis Estilizados baseados em símbolos”e também pode servir de exemplo para a
classificação dos “Gradis Orgânicos inspirados nos motivos da natureza”, por se tratar da
estilização de um trevo de quatro folhas.

4.2.1 Gradis Orgânicos1

Todos os gradis orgânicos possuem características estruturais semelhantes, em


princípio, às formas vegetais ou animais. De modo mais geral, podemos identificar como
gradis cujos contornos e formas irregulares se assemelham aos encontrados na natureza. A
abstração de algumas formas pode chegar a ter aspectos muito simplificados, pois muitas
vezes, entre o desenho e a execução, são necessários ajustes para concretizar determinadas
idéias, resultando em formas mais simplificadas. Porém sua estrutura, geralmente bidimensional,
é vista como atendendo perfeitamente às exigências funcionais e compõe um todo intelectualmente
lúcido e íntegro, não perdendo semelhança com as formas vegetais ou animais.

1
Do Anexo A, constam 34 exemplificações de projetos de gradis orgânicos. Neles, também constam as
especificações de cada um destes projetos.
81

4.2.1.1 Estilizados, baseados na natureza

Os sinais simbólicos de vegetação são encontrados em toda a história do desenho


pictórico, como expressão fundamental da vida, do crescimento e da fertilidade. A árvore é
um dos símbolos humanos mais importantes. Flores e folhas são frequentemente usadas nos
meios artísticos de comunicação, com maior ou menor grau de estilizações. Desenhos de aves
e outros animais, como peixes, também são vistos com freqüência.
Em Salvador, alguns artistas plásticos, arquitetos e artesãos da serralheria foram
buscar inspiração nos motivos da natureza e, entre eles, os que mais se destacam são os
trabalhos elaborados pelos artistas plásticos Juarez Marialva Tito Martins Paraíso e Julio
Paride Bernabó, que era conhecido como Carybé.
Juarez Paraíso se impõe como um dos artistas baianos que mais experimentaram
técnicas do universo da expressão artística e por conceber um desenho de diferentes graus de
abstração.
Em 2000, o artista foi convidado a criar um conjunto de gradis para a área externa do
Hospital Aliança da Bahia, que já possuía obras de outros profissionais conceituados, como
Bel Borba, Goinha e Celso Cunha. Os trabalhos elaborados por Paraíso se destacam pelo grau
de detalhes nas estilizações, principalmente de animais e vegetais, e na inovação da técnica
construtiva de alguns desses gradis.
A modulação do espaço, em termos de dimensão dos objetos, e a localização das obras
de arte foram sugeridas previamente pela direção do hospital. Paraíso afirma que a escolha do
tema ficou a critério dele. O material e a técnica escolhidos para este trabalho têm relação
com a possibilidade de se “conseguir um desenho de figura e fundo”, além de permitir a
integração dos desenhos do piso com o desenho dos gradis.
As funções dos gradis do Hospital Aliança, além de ornamentais, são defensivas e de
complementação arquitetônica, entre outras. De modo geral, servem de anteparo (segurança) e
proteção nas descidas de escadas, para evitar quedas. O artista afirma: “[...] nada é gratuito,
possuem funções claras além da beleza estética (PARAÍSO, 2005)2.
Em relação à composição estética, segundo Paraíso, o objetivo maior era o de
transformar o “design das grades em volumes”. Desta forma, o artista trabalhou os gradis com
a função de grade e de escultura ao mesmo tempo, conseguindo um resultado plástico

2
Juarez Marialva Tito Martins Paraíso concedeu entrevista em setembro de 2005, em Salvador.
82

surpreendente. Os gradis possuem tamanhos e formas variadas, adaptando-se, muitas vezes, à


arquitetura do prédio como janelas e gradis de segurança. Em outras situações, adquirem
status de grandes esculturas, como carrosséis, que, com formas lúdicas, interagem-se com a
natureza do lugar.
Destacamos alguns deles:
· Hospital Aliança: Gradil do Pórtico Principal
· Gradil do Mural A
· Gradil do Mural B
· Gradil do portão – “Parque das Crianças” – Pavão
· Gradil do portão – “Parque das Crianças”– Borboleta
· Gradil da janela – “Parque das Crianças” – Sereia
· Gradil da janela – “Parque das Crianças” – Cavalo-Marinho
· Gradil janela – “Ala das Crianças”– Papagaio
· Gradil do portão de acesso à “Ala das Crianças”
· Gradil de segurança à “Ala das Crianças”
· Gradil do portão do oxigênio – Peixes.
· Gradil do mural Carrossel
· Gradil do mural Cavalo
· Gradil: detalhe – Coreto
· Gradil: detalhe – Mural B.

A maioria dos gradis articula-se com os muros e, por isso, o artista dá o nome da obra
de escultopinturas ou escultomurais (PARAÍSO, 2005).

Eles envolvem mais os volumes escultóricos nas laterais em função de um muro


propriamente dito, só que eu confiro a este muro um valor formal, próprio em
termos de perfis, então eu o transformo numa relativa escultura.

No “Parque das Esculturas”, como o local é chamado, o gradil do Pórtico Principal


(Figura 39), na entrada, com 7,20m de comprimento, destaca-se por sua imponência e
originalidade (ver Anexo A: Projeto gradil 01). O artista associou o gradil de ferro à alvenaria,
em uma composição simétrica com barras de perfis em curva, lembrando os trabalhos do Art
Nouveau do início do século XX.
As formas mais suaves, que combinam com o ferro forjado, são semelhantes as
características definidas por Pevsner (2001, p.66):
83

[ ...] as formas são menos agressivas e mais insinuantes, e o feitio parabólico do


portal é tão inesperado e livre de referência do passado como as ondulações do ferro.
A facilidade de entortar o ferro batido e sua ductibilidade, permitem obter os mais
delicados filamentos como hastes, fizeram do ferro um material favorito do Art
Nouveau.

O gradil de ferro faz parte de um conjunto indissociável do piso de pedra portuguesa e


do pórtico, deixando transparecer a paisagem de Salvador ao fundo. As formas do ferro
forjado não têm a intenção de evidenciar o gradil como porta de entrada, pois a composição
é vista como um grande painel. A obra, com grande exuberância, pode ser notada a muitos
metros de distância e é um marco dentro da Cidade do Salvador.

Figura 39 – Hospital Aliança – Gradil do Pórtico Principal.

Ainda na entrada do hospital, dois trabalhos em escala grandiosa, também se destacam


pela beleza e técnica: são dois gradis murais (Figuras 40 e 41), com respectivamente, 20,20 m
e 13,80 m de comprimento (ver Anexo A: Projeto gradil 02/03). O artista trabalhou tambem,
com simetria bilateral, estilizações que lembram figuras humanas, plantas e flores e introduziu
peças inspiradas em pássaros e insetos na parte superior, com diferentes técnicas, em forma de
84

espelhamento. O trabalho merece destaque pelo resultado plástico alcançado com as várias
formas do ferro forjado, numa composição criativa com os recortes no muro.

Figura 40 – Hospital Aliança – Gradil Mural A.

Figura 41 – Hospital Aliança – Gradil Mural B.


85

A composição do gradil mural é quase toda ela monocromática, somente os detalhes


dos insetos e alguns pássaros recortados em chapa de aço são pintados de branco, para que
fossem destacados do conjunto. O artista nesse trabalho, tambem associou o gradil de ferro
do mural com a alvenaria, que possui, em sua superfície, baixos relevos e vazios e que se
combina com o ferro forjado, num jogo de formas orgânicas bastante dinâmicas. Estas
relações dinâmicas no trabalho do artista podem também ser observadas em outras obras,
como nos murais feitos para o Cine Art I e II3 em Salvador, que hoje estão documentadas
através de ilustrações, e a que Magnavita denominou “de repertório orgânico-barroco do
artista”. Magnavita (2001, p.87) assim explica o processo criativo do artista:

Na verdade, trata-se de uma exuberante demonstração do príncipio gestáltico


adotado pelo artista, aquele da reversibilidade das formas. Processo constatado tanto
nas formas mestras da composição, quanto nas micro-organizações que as mesmas
abrigam, à guisa de grandes receptáculos, úteros predispostos à germinação, à
proliferações e reproduções formais auto-similares.

Com a leveza das formas e as poucas vibrações das cores, Juarez Paraíso consegue
estabelecer um diálogo harmonioso entre o gradil de ferro e a fachada do hospital, e também
com a paisagem onde ele está inserido.

No “Parque das Crianças” (Figura 42), o artista elaborou um conjunto de peças que
mostram sua admiração e influência pela obra do artista catalão Antonio Gaudi4. Na estrutura
de fechamento do parque, a construção mural de formas curvas é devidamente trabalhada
com cores vibrantes, numa variação de combinações aleatórias de pastilhas e cerâmicas
coloridas que recebem os gradis de ferro forjado, que são executados sob medida para os
vãos.

No conjunto do parque, os maiores destaques são dois portões de gradis de ferro, um


deles com um desenho estilizado de uma borboleta e o outro, de um pavão (Figuras 43 e 44),
com 2,06 m e 2,00 m de comprimento, respectivamente (ver Anexo A: Projeto gradil 04 e 05).
Outros gradis menores tambem fazem parte do conjunto, com funções semelhantes a janelas
ou gradis de segurança .

As formas dos desenhos do muro, dos gradis e do piso novamente se combinam; os

3
Cine Art I e II, cinemas que receberam murais inspirados no mito da cultura afro: Oxumaré, 1979 e 1988,
respectivamente ( MAGNAVITA, 2001,p.87)
4
Antonio Gaudi – Parque Guell, Sagrada Família e outros, em Barcelona, Espanha.
86

gradis que merecem maior destaque pelo artista recebem cores vibrantes, que contrastam com
o colorido das cerâmicas.

Figura 42 – Hospital Aliança – “Parque das Crianças”.

Em linhas gerais, os gradis de ferro criados para o Hospital Aliança são, na sua
maioria, de cores neutras e linhas predominantemente orgânicas, dando, assim, uma
percepção não muito clara do que seja o desenho. O artista explica tal intenção da seguinte
forma:

A cor unificada, que achata e dissimula um pouco o desenho, torna-se um pouco


reversível, ou ambígua, à estrutura. Não fica evidente e explícita a figuração, ele é o
gradil mergulhado, assim, numa estrutura mais ou menos de reversibilidade.
(PARAÍSO, 2005).

As composições com perfis de ferro, na maioria curvos, formam um desenho orgânico


com simetria absoluta. Com bitolas diferentes, o artista consegue dar ênfase às peças
estruturais principais, diferenciando os detalhes mais delicados com perfis mais finos.
Consegue, ainda, definir a abertura dos portões curvos na parte superior, de modo a não
interferir no desenho do conjunto.
87

Figura 43 – Hospital Aliança – Figura 44 – Hospital Aliança – “Parque das


“Parque das Crianças” – Gradil Pavão. Crianças” – Gradil Borboleta.

Destacamos também do conjunto, dois gradis com a função de janelas – gradil Sereia e
gradil Cavalo Marinho (Figuras 45 e 46), com diâmetros de 1,45 m e 1,40 m respectivamente,
e que se destacam pela forma circular (ver Anexo A: Projeto gradil 06/07). O conjunto
reproduz um mundo mágico para as crianças, onde se encontram os mais diversos tipos de
animais e figuras mitológicas, predominantemente usando a suavidade das curvas na
transformação do ferro.

Figura 45 – Hospital Aliança – “Parque das Figura 46 – Hospital Aliança – “Parque das
Crianças” – Gradil Sereia. Crianças” – Gradil Cavalo-Marinho.
88

A integração de todos os elementos, muros e pisos com a sinuosidade das formas dos
gradis de ferro, consegue estabelecer, dentro do conjunto arquitetônico do hospital,
conotações visuais bastante harmônicas com as imagens da natureza.
Outro gradil com função de janela foi elaborado para o edificio do hospital, na ala
das crianças, com motivo estilizado de um papagaio e folhagem (Figura 47), nas dimensões
de 1,60m x 1,63 m (ver Anexo A: Projeto gradil 08). Nesse trabalho, como em outros, o
artista emprega as barras chatas na elaboração dos detalhes menores, como circunferências de
raio muito pequeno, com o intuito de facilitar a execução da forja e, esteticamente, conseguir
menor tensão visual, como, por exemplo, nos detalhes das asas do papagaio, e deixando as
barras quadradas para as formas com maior tensão visual.

Figura 47 – Hospital Aliança – Figura 48 – Hospital Aliança –


Gradil Papagaio. Gradil acesso à “Ala das Crianças”.

A simetria bilateral foi um recurso muito explorado pelo artista na maioria dos gradis,
como no caso do portão de acesso à “Ala das Crianças” (Figura 48), com 1,60m x 2,17 m
(ver Anexo A: Projeto gradil 09). A composição, com barras curvas de duas diferentes bitolas,
lembra as formas de animais como o caracol e outras formas orgânicas da natureza.
Paraíso, no Parque Infantil, teve ainda a intenção de criar um módulo de repetição,
que são curvas formando o desenho de ondas que se entrelaçam e aparecem na maioria dos
gradis da área externa do Hospital Aliança, fazendo composições com outros elementos
89

estilizados como peixes, caracóis, pássaros, cavalos. Deste modo, consegue dar unidade ao
conjunto da obra. Este desenho de curvas formando ondas é usado, por exemplo, no gradil de
Segurança do ar condicionado, na “Ala das Crianças” (Figura 49), com 3,00m de
comprimento, com perfis de barras chatas 7/8x5/16 e quadradas 7/8x7/8 (ver Anexo A:
Projeto gradil 10). Outro gradil que repete a mesma modulação é o Gradil do Portão do
Oxigênio (Figura 50), que serve para dar segurança aos cilindros de oxigênio, no qual o
artista obtém um jogo interessante com a continuidade das formas, em uma alusão ao
movimento de ondas do mar, reforçado com o detalhe central da estilização de dois peixes
em sentido contrário no portão de acesso (ver Anexo A: Projeto gradil 11).

Figura 49 – Hospital Aliança – Gradil de Segurança na “Ala das Crianças”.

Figura 50 – Hospital Aliança – Gradil do Portão do Oxigênio.


90

No gradil Mural Carrossel (Figura 51), com quase 19 m de comprimento, Paraíso usa
a mesma forma de modulação na base, que se repete na associação do ferro com o muro (ver
Anexo A: Projeto gradil 12). O artista usa o mesmo elemento como suporte para receber
figuras de cavalos e outras formas como detalhes florais. Segundo o responsável por sua
execução, o arquiteto José Rivas (2005)5, [...] foram empregadas barras chatas (3/4x1/4 e
7/8”x5/16”) para a seção de cavalos e nos demais detalhes florais, e barras quadradas (7/8”)
para salientar o contorno do gradil.

Figura 51 - Hospital Aliança – Gradil Mural Carrossel.

O carácter lúdico da composição é reforçado pela repetição do desenho de quatro


cavalos e detalhes florais estilizados, que produzem a ilusão de movimento, lembrando um
carrossel de parque de diversões. Importante salientar que o gradil possui proporções
adequadas ao espaço a que foi destinado, desempenhando também a função de segurança.
Os módulos de repetição da composição de 2,55 m de comprimento, estruturados por
barras circulares, não se repetem numa mesma lógica, apenas alguns elementos florais e
outros detalhes orgânicos são repetidos ou espelhados.

5
José Rivas concedeu entrevista em setembro de 2005, em Salvador.
91

No detalhe do Gradil Mural Cavalo (Figura 52), podemos observar o desenho


estilizado feito pelo artista com maiores detalhes, que coloca o cavalo em posição de galope e
lhe dá asas como se fosse voar, reforçando a idéia de dinamismo que envolve grande
atividade, criatividade e agilidade, como são as brincadeiras infantis (ver Anexo A: Projeto
13).

Figura 52 - Hospital Aliança – Gradil Mural Cavalo

O trabalho de Paraíso lembra algumas formas orgânicas do final do século XIX e


início do século XX, como a obra do arquiteto Horta, um dos principais arquitetos do Art
Nouveau da Bélgica, no brilhante trabalho de ferro do corrimão da escada e nos vitrais do
Hotel Solvay, onde explorou as mesmas formas suaves (Figuras 53 e 54).
A conformação do ferro em ondulações também pode ser observada como influência
da primeira casa de Gaúdi, a Casa Vincens, em Barcelona (1878-1880), onde aparece a
mesma curvatura na parte inferior da grade de ferro forjado (Figura 55).
A grade é “[...] medievalizada, embora de forma semimourisca, e também são
92

fantásticas as palmas ou estrelas pontiagudas da cerca de ferro” (PEVSNER, 2001, p.66).

Figura 53 – Detalhe da escada de ferro;


Figura 54 – Vitrais coloridos do Hotel Solvay Figura 55 – Grade de ferro batido da Casa Vicens,
de Horta (1895 e 1900). de Gaudi (c.1880).
Fonte: Pevsner, (1980, p. 93). Fonte: Pevsner, (1980, p. 64).

Paraíso aponta todo tipo de dificuldade na execução dos gradis do Hospital Aliança,
desde o desenho, a confecção, até a instalação. Segundo o artista, os gradis têm um desenho
próprio e não podem ser muito complicados, pois correm o risco de se tornarem inexeqüíveis
e não adequados às possibilidades técnicas da forja.
Os gradis foram trabalhados geralmente com duas ou três bitolas de ferro diferentes
cada um, empregando os mais diferentes tamanhos em barras quadradas (1”, 3/4", 7/8”) e em
barras chatas (¾”x1/4”, 1”x3/8”, 1”x1/4”, 7/8”x5/16”, 7/8”x1/4”).

Os contornos [são feitos] com uma barra mais forte, mais evidente (uma polegada
sempre), o que quase sempre é muito difícil para se entortar a peça. As ferramentas
vão sempre estourando porque a pressão é muito forte. O método mais antigo é
muito mais interessante porque você esquenta o ferro (PARAÍSO, 2005).

Alguns desenhos de gradis menos elaborados foram passados para o artesão e ele
próprio reproduz em verdadeira grandeza (1:1), mas, na maioria das vezes, os moldes para a
forja são confeccionados pelo artista em chapas de compensado com tinta lavável e na bitola
definitiva, pois a transposição do desenho pelo serralheiro pode, na ampliação, perder algum
93

detalhe da forma do desenho. No molde fornecido pelo artista, já está expressa a intenção das
diferentes bitolas, dando maior evidência a alguns contornos.
O artista conta que, para trabalhar as bitolas diferenciadas do gradil, ele simula a
própria espessura do traço no projeto do desenho na bitola desejada, ou seja, “[...] faço a
minha escala de 1/10, para ficar bem grande, ou 1/25, ou 1/20” (PARAISO, 2005). Quando
não é muito grande o desenho, ele prefere a escala de 1/10, porque consegue representar uma
polegada no traço. Em seguida, é feito o projeto executivo, em que se coloca a bitola do ferro
para a escala real de 1/1. Com a representação do desenho já na bitola certa, com as diferentes
espessuras das linhas, salienta o artista que fica mais fácil estudar os contrastes, para
evidenciar as formas e criar as tensões visuais necessárias. O trabalho é todo ajustado
previamente em relação aos materiais utilizados, para que sejam obtidos a melhor precisão e
acabamento no produto final.
Um grande problema enfrentado para a confecção dos gradis do Hospital Aliança
foram as junções das barras curvas, pois foi preciso muito cuidado para que as juntas não
ficassem grosseiras demais e malfeitas, o que ele denomina de “estrombudo”, apontando
assim as possíveis imperfeições no acabamento do material:

As convergências, principalmente às vezes, precisam ser bem elaboradas pois esses


acabamentos dão muito trabalho. Ao criar um ângulo de 45° ou 60°, seja lá qual for,
conquanto que termine com a periferia externa desejada. Os tangenciamentos de
uma reta com a curva também são outra grande preocupação, ou tangenciamentos de
duas curvas (encontro de duas curvas), pois você pode superpor, se for o caso, e ter
um ponto de tangência ou pode cortar ela entrando e predominar a parte externa,
quando elas saem, saindo de um ponto comum. Por exemplo: dois centímetros de
cada, o encontro pode ser um centímetro, mas tem que dar os cortes adequados para
quando elas saírem, cada uma sair com sua independência, ou então executar
superpondo, quando são várias curvas (PARAÍSO, 2005).

O artista explica, ainda, que a solda resolve bem a solução da superposição, porém
para que não haja “bolotas”, ou seja, protuberâncias, é preciso fazer um furo entre os dois
perfis, colocar a solda no buraco e depois lixar para o acabamento final. Deste modo, a solda
não aparece, pois ficará na parte interna do perfil, resultando num melhor acabamento.
O nível de complexidade do trabalho se instaura em todas as fases de produção, desde
a elaboração dos desenhos até a confecção das grades e a sua instalação. Porém, para os
gradis com a forma espacial cilíndrica, como aparece no gradil do Coreto, no detalhe do
Gradil Borboleta e no Gradil do Coreto Carrossel (Figuras 56, 57 e 58), com detalhes de
grandes borboletas e cavalos, é ainda mais complexo (ver Anexo A: Projeto gradil 14). O
94

desenho é planificado e moldado no local, através da projeção vertical da curva. O gradil é


confeccionado no plano, no tamanho exato da projeção, e depois, de acordo com o desenho, o
gradil entra na calandra até que se ajuste à curvatura desejada. O processo é um pouco
complicado, pois precisa ser ajustado aos raios de curvatura encontrados no local, contudo o
gradil sai pronto da serralheria, mas sempre se tem a possibilidade de soldar e cortar para
fazer algumas acomodações de ajustes finais no período da instalação.

Figura 56 – Hospital Aliança – Gradil Coreto.

Figura 57 – Hospital Aliança – Detalhe do gradil Borboleta.


95

Figura 58 – Hospital Aliança – Gradil Coreto Carrossel.

Segundo o responsável por quase 90% da execução dos gradis do Hospital Aliança, o
artesão Silvio Roberto Andrade Costa6, antes da instalação no local, as peças passaram, ainda,
por um tratamento que compreendem três fases:

· decapação – processo químico – em que o gradil é imergido num tanque, num


ácido para que se retirem todas as possíveis capas de ferrugem e impurezas;

· galvanização – processo eletrolítico – galvanização a frio ou a quente. A quente é

6
Silvio Roberto Andrade Costa concedeu entrevista em setembro de 2005, em Salvador.
96

muito mais resistente, porém de custo mais elevado. No Hospital Aliança, usou-se
galvanização a frio;

· pintura – todos os gradis foram pintados. Foi feita uma pintura à base de epóxi
(prime-epóxi), para a proteção contra a oxidação e também para dar aderência,
pois o galvanizado não possui tanta aderência para receber a tinta automotiva das
cores indicadas, conforme o projeto do artista.

Além da técnica da forja, alguns detalhes dos gradis, como os pássaros de asas abertas
e as libélulas que fazem parte do conjunto do Gradil Mural A e B da entrada (Figura 59 e 60),
foram executados em “chapa recortada a laser” (ver Anexo A: Projeto gradil 15). Este
processo, nunca antes feito na Bahia, foi executado em São Paulo e requerem ajuste preciso
do desenho na escala 1/1 para ser recortado. O artista criou um desenho estilizado da ave, que
precisou ser adaptado à técnica, ou seja, permitir fazer recortes vazados na chapa de ¼” em
aço inox. Desta forma, a peça possui contornos fechados que foram retirados após o recorte da
chapa, deixando em evidência as formas do pássaro. Portanto, o artista projetou o gradil
articulado com o tipo de técnica que seria empregada na sua execução.

Figura 59 – Hospital Aliança – Gradil do Figura 60 – Hospital Aliança – Gradil do


Detalhe Pássaro Mural A. Detalhe Pássaro Mural B.

Paraíso (2005) declara ainda que, “alguns problemas de execução dos gradis de ferro
muitas vezes podem ser evitados, inicialmente, pelo projeto do artista, que antevê no traço as
dificuldades da execução”.
A influência do artista é percebida, sensivelmente, no trabalho de criação do artesão
Silvio Roberto Andrade Costa, que, como já dissemos, foi responsável por grande parte da
97

execução dos gradis de ferro do Hospital Aliança, um dos que mais merecem destaque por
seu grau de complexidade e criatividade. Salientamos, a seguir, três gradis de ferro de sua
autoria, que possivelmente sofreram influência direta do trabalho do artista plástico Juarez
Paraíso.
O gradil da garagem da residência Costa (Figura 61) foi especialmente desenhado para
a residência do artesão com 3,20 m x 2,76 m e executado em perfis quadrados 5/8” x 5/8” e
barras chatas 1” x ¼.” (ver Anexo A: Projeto gradis 16). O desenho idealizado com tema
fundo do mar possui clara influência de Paraíso, principalmente no que tange às formas,
material empregado e às soluções técnicas. O gradil é dividido em três módulos que, juntos,
formam uma única composição. A fonte de inspiração, segundo ele, “é a própria paisagem”
(COSTA, 2005). Os desenhos criados pelo artista, como cavalo-marinho, conchas e estrelas
do mar e ondas que se entrelaçam, fazem parte da composição do gradil que tem as imagens
reais do mar como pano de fundo, numa composição simétrica, rica em detalhes e formas.
Na mesma residência, outro gradil com borboletas (Figura 62) com 5,50 m x 1,03 m,
foi executado com perfis de barras quadradas 1”x1” e barras chatas 1”x1/4” e 1”x 3/8”(ver
Anexo A: Projeto gradis 17). O desenho surpreende pela beleza da estilização simétrica dos
elementos florais e seus detalhes. O tema central da composição faz referência ao trabalho do
gradil do coreto de borboletas de Juarez Paraíso, mas o artesão consegue um resultado
surpreendente, com o acréscimo de outros desenhos orgânicos como flores e folhas, ajustados
à escala do local.
O terceiro gradil selecionado, da Ycaro Vital Metalúrgica (Figura 63), com 3,20 m x
2,76 m, também idealizado e executado por Costa, com barras quadradas 5/8” x 5/8” e barras
chatas 1”x1/4”, possui as mesmas características de simetria e composição dos anteriores (ver
Anexo A: Projeto gradil 18). O artista utiliza o detalhe dos cavalos de forma muito
semelhante à obra do carrossel do Hospital Aliança, com o acréscimo de desenhos estilizados
como um grande sol, estrela e lua, numa nova composição. Ele consegue, mediante os
desenhos já criados, elaborar composições novas com precisão de escala, emprego correto dos
perfis para o peso visual do desenho, revelando noções de simetria ao determinar uma
composição que possui coerência e equilíbrio para suas funções segurança e beleza.
Outros gradis de ferro de Juarez Paraíso são tratados mais adiante neste capítulo, em
classificação de gradis geométricos, os quais tambem serviram de inspiração para outros
profissionais.
98

Figura 61 – Gradil da residência de Silvio Roberto A. Costa – garagem.

Figura 62 – Gradil da residência de Silvio Roberto A. Costa.


99

Figura 63 – Gradil Ycaro Vital Metalúrgica.

Outro artista plástico de grande renome para a classificação dos gradis orgânicos é
Hector Julio Páride de Bernabó, que para muitos, foi simplesmente Carybé. O escritor baiano
Jorge Amado, que também foi seu cúmplice em muitas histórias da Bahia, assim o define:
“[...] pintor de tamanha fama por essas bandas no Brasil, no além-mar e nos cinco continentes,
que pinta maravilhosas paisagens da Bahia [...]” (AMADO, 1997, p.6).
Carybé foi apaixonado por gradis de ferro e nos deixou um grande legado. Entre seus
trabalhos, estão dois gradis executados com a técnica do ferro forjado: o gradil do Museu de
Arte Moderna (MAM), no Solar do Unhão, e o gradil da Praça da Piedade.
O gradil de ferro do MAM, desenhado especialmente para o Parque de Esculturas,
surpreende pela grandiosidade da obra de arte feita em ferro forjado.
Os jornais na época, como o Correio da Bahia, A Tarde e o Diário Oficial do Estado,
publicaram notas sobre a inauguração no MAM, e Jorge Amado deu depoimentos sobre a
importância da obra para a Cidade do Salvador.
100

[...] O espetáculo que resultará dos desenhos do artista tendo como fundo o azul do
céu da Bahia, será certamente de uma beleza infinita e única.

[...] Vai ser bom. Vai ficar uma coisa bonita, porque o pôr-do-sol vai dar ali e vai
ressaltar bem os desenhos (ALBERNAZ, 1996, p. 3 ).

O gradil do MAM é um conjunto formado por dois gradis: gradil do portão (Figura
64), com dimensão de 4,00 m x 3,5 m, e o gradil-mural (Figuras 65 e 66), com 20 m,
totalizando 24 m de comprimento (ver Anexo A: Projeto gradil 19). O gradil da porta de
entrada do jardim é uma das últimas obras do artista, que traz como temática “os costumeiros
motivos de Carybé” (AMADO,1996), ou seja, figuras humanas com a arte da capoeira e
santos do Candomblé, que são o estilo de seus quadros e murais. O artista tinha a intenção de
ressaltar os desenhos com o fundo do pôr-do-sol e o azul da Baía de Todos os Santos. O gradil
de ferro é trabalhado com linhas e contornos com barras de perfis diferentes, com o objetivo
de causar tensões. O gradil do portão possui simetria bilateral de composição, mas os
elementos em detalhe não se repetem: são peixes, aves, mamíferos e figuras humanas bem
estilizadas.

Figura 64 – Gradil do Museu de Arte Moderna (MAM) – portão.


101

Figura 65 – Gradil do Museu de Arte Moderna (MAM) – detalhe.

Figura 66 – Gradil do Museu de Arte Moderna (MAM) – mural.


102

O gradil mural tem a intenção de reproduzir um grande quadro com desenhos que se
integram com o mar e o sol ao fundo, e a temática desenvolvida pelo artista reflete a história e
os costumes da Bahia. Esta paisagem linear é criada com o ferro forjado, através de módulos
seqüenciais que se justapõem. As figuras de contorno possuem detalhes com perfis de barras
retas, com peso visual menor em diferentes sentidos dentro dos contornos fechados, com a
função de criar textura na composição, e ao mesmo tempo, atender aos aspectos de segurança
do gradil.
Como já dissemos anteriormente, Carybé foi convidado, em 1998, a participar do
“Projeto de Restauração e Revitalização” da Praça da Piedade, em Salvador. Um dos itens do
projeto era a recolocação dos gradis de fechamento da praça. Segundo o arquiteto Daniel
Colina, responsável pelo projeto, a idéia de se gradear as praças surgiu com o arquiteto Luís
Paulo Conde, no Rio de Janeiro. A idéia logo contaminou arquitetos baianos que pensavam
em preservar o Patrimônio Histórico.

No gradil da Praça da Piedade (Figuras 67 e 68), o artista criou desenhos estilizados


da natureza (plantas e animais) com barras de ferro quadradas 1”x1”(ver Anexo A: Projeto
gradil 20). Colina conta que o artista Carybé, “gostava de coisas que fossem usufruto público,
por isso talvez a opção por motivos orgânicos no seu desenho que lembram as formas do Art
Nouveau” (COLINA, 2005)7.

Figura 67 – Gradil da Praça da Piedade.

7
Daniel Colina concedeu entrevista em novembro de 2005, em Salvador.
103

Figura 68 – Gradil da Praça da Piedade – portão.

Colina (2005) ainda confidencia,

Carybé possuía um grande fascinação por gradis de ferro, e sempre comprava gradis
antigos, alguns até do século XVIII. Os gradis, para ele, lembravam um pouco a
influência da tradição do ferro na cidade de Barcelona, na Península Ibérica, no final
do século XIX.

No gradil do portão principal, com 6,50 m de comprimento, o artista elaborou ainda


desenhos mais detalhados, lembrando também a capoeira, o candomblé e o folclore, que
contam a história da gente e dos costumes da Bahia. De acordo com Colina, na Praça da
Piedade, por vontade de Carybé, o desenho seria todo idealizado sem repetições. Para que
pudesse se viabilizar melhor sua execução, porém, foi sugerido ao artista que trabalhasse em
módulos, que foram idealizados com 25 m de comprimento.
Segundo o arquiteto da Fundação Mario Leal Ferreira, Antonio Marmo da Rocha
Oliveira8 (2005):

8
Antonio Marmo da Rocha Oliveira concedeu entrevista em novembro de 2005, em Salvador.
104

Os gradis da Praça da Piedade, precisavam ter uma altura compatível com a escala
da praça, e por isso foi determinada a inclusão de barras verticais, a princípio na
parte superior, e depois, para que os desenhos fossem mais destacados, se propôs
uma inversão, onde as barras ficassem na parte inferior.

No trabalho de Carybé, é fácil compreender o modo de vida da Bahia, através de


todos os personagens e animais típicos que ele delineia nos gradis, com profundo respeito
pelo povo, pelas crenças religiosas e procurando, ainda, exaltar as belezas naturais da região.
A maestria do traço do artista mostra os usos, os costumes e, principalmente a sensualidade,
através das curvas suaves obtidas com a técnica do ferro forjado. Quando se trabalha com
esta técnica, não são utilizadas várias bitolas, como no trabalho anteriormente descrito de
Juarez Paraíso, que explora as tensões visuais dos materiais. No trabalho de Carybé, a
preocupação não foi ressaltar o perfil de ferro, mas colocá-lo como parte do contexto da
paisagem.
Outra praça que recebeu gradis de ferro e que consta do Projeto de Restauração e
Revitalização, foi a praça Dois de Julho, no Campo Grande (Figuras 69 e 70), também sob a
responsabilidade do arquiteto Daniel Colina (ver Anexo A: Projeto gradil 21 e 22). O
arquiteto relata que, para a Praça do Campo Grande, a idéia foi redesenhar os gradis a partir
dos motivos da Praça da Piedade, pois Carybé já havia falecido, e, segundo ele, a nova
recomposição do desenho foi feita pelo seu neto, Gabriel Carybé, que é designer gráfico. O
gradil do Campo Grande foi desenhado a princípio com 1,80 m de altura em módulos de 25 m
que se repetem, optando-se depois, por 2,20 m de altura, por considerarem esta altura mais
adequada à escala da praça. O gradil recebeu, em 2004, portais com desenhos em barras
quadradas de aço, nas bitolas de 1”, ¾”, e ½”, acabamento em primer epóxi e tinta de
acabamento em poliuretano, de forma industrial9, tendo sido calandrados, prensados e,
finalmente, soldados no local da instalação. Os elementos de modulação nas laterais são de,
aproximadamente, 15 metros. O gradil de fechamento da praça recebeu pequenas luminárias
para iluminação difusa, locadas no topo dos elementos verticais de suporte das grades, para
enriquecer a iluminação dos passeios anexos, tanto quanto o desenho do próprio gradil.
Apesar de o gradil ter sido idealizado a partir dos desenhos deixados por Caribé, o
efeito final do projeto, dentro da escala da praça, acabou resultando num trabalho
diferenciado, pois se optou em não utilizar as barras verticais do gradil da Praça da Piedade.

9
Executados 800 m de gradil, através do sistema semi-industrial, pela Empresa Logus (BA).
105

No seu lugar, aparecem desenhos orgânicos estilizados de animais e plantas, a fazer


composição com a estrutura dos pilares de fiberglass de 40 x 40 cm, com iluminação interior.

Figura 69 – Gradil da Praça Dois de Julho – portão.

Figura 70 – Gradil da Praça Dois de Julho.


106

A grade está estruturada em módulos, com barras de ferro quadradas de 1”, criando
lindos desenhos que se entrelaçam, de vegetação (como folhas e flores) e animais (como
patos, peixes e anfíbios). As portadas de entradas são bem marcadas com pilares e portões de
fechamento, em duas dimensões diferenciadas, e seguem o mesmo estilo dos gradis dos
módulos A e B, numa seqüência quase imperceptível de ajuste de um módulo para o outro.

Importante salientar que a solução para a execução dos gradis na técnica do ferro
forjado e a escolha do emprego de perfis relativamente delgados permitiram uma maior
integração dos espaços internos da praça com seu entorno e também um respeito pela
intervenção no Patrimônio Histórico.

Os desenhos dos gradis de ferro das duas praças já citadas, serviram de inspiração
para a artesã Marisol Vieira Barini10, que se uniu à Empresa Recrinor, para a elaboração e
execução do gradil (Figuras 71 e 72) da residência de Rosana Lance Saloio em Vilas do
Atlântico (ver Anexo A: Projeto gradil 23). Segundo a artesã, a idéia foi inspirada em outro
gradil de ferro forjado, que foi executado para uma pousada na Praia do Forte, com
características muito semelhantes aos desenhos de Carybé. Barini buscava para o gradil,
apesar dos 12 m de comprimento, uma solução que resultasse esteticamente num desenho
com pouco peso visual no contexto do jardim e que deveria integrar-se a área da piscina,
tornando a área de lazer agradável. A solução foi compor um desenho estilizado de animais
aquáticos, como polvo, estrela do mar, patos, aves e plantas, que se relacionam melhor no
contexro da piscina. Além dos animais e plantas, a artesã propõs tambem outros contornos
estilizados como fruteiras e folhas de coqueiro. A proposta resultou em módulos variáveis de
1,07 m a 1,20 m de largura, com perfis de ferro quadrado de 3/8” (o mesmo perfil empregado
na Praça Dois de Julho) e perfis de 5/8” para a estruturação dos módulos.

Podemos observar que a justaposição dos módulos do gradil de ferro forjado


ocasionou desencontros das linhas dos perfis de ferro, contudo não diminuiu seu valor
estético. Problemas de outra ordem também são salientados pela artesã como, por exemplo, a
solução do sol, elemento de ligação entre os coqueiros, com a função específica de amarrar a
composição e que teve que receber perfis de barra chata de 3/8”, para que as pontas não
causassem qualquer perigo às pessoas, mas que, desta forma, descaraterizaram a composição
em alguns pontos.

10
Marisol Vieira Barini concedeu entrevista em outubro de 2006, em Salvador.
107

A proporção entre os perfis, a escala do desenho, a escolha dos elementos orgânicos e


o emprego de perfis mais delicados são características semelhantes na obra dos gradis de ferro
de Carybé, aqui descritos. Outra característica importante é a solução de deixar os elementos
orgânicos soltos na parte superior do gradil, sem perfis de amarração estrutural, como
acontece nos gradis das praças do Campo Grande e da Piedade. Esta solução reforça, mais
ainda, a idéia de integração do gradil com o paisagismo do entorno, pois os desenhos se
encontram livres para continuar crescendo, como é a própria natureza.

Figura 71 – Gradil da residência de Rosane Lance Saloio.

Figura 72 – Gradil da residência de Rosane Lance Saloio.


108

A arte dos gradis também foi de interesse de arquitetos em Salvador, como


Pasqualino Romano Magnavita11, que se diz “um apreciador dos gradis de ferro forjado, e de
objetos feitos com o ferro” (MAGNAVITA, 2005). Dentre algumas de suas obras, destacamos
dois gradis que representam bem seu trabalho: uma delas, em sua própria residência (Figuras
73 e 74), é um conjunto de dois portões retangulares de 1,30m x 2,25 m e 2,20 m x 2,25 m,
que têm a função de dar segurança à porta de entrada, com uma estrutura simples vertical em
barras quadradas de 1” e 5/8” ( ver Anexo A: Projeto gradil 24).

Figura 73 – Gradil da residência de Figura 74 – Gradil da residência de


Pasqualino Romano Magnavita. Pasqualino Romano Magnavita.

A composição é permeada com delicados desenhos da natureza como um jardim, em


perfis de barras chatas de 5/8”. A barra é forjada para criar flores e folhas delicadas e
estilizadas, que se misturam na composição com formas curvas semelhantes.
O segundo gradil (Figura 75) destacado é um portão de garagem, retangular, de
2,40m x 2,23 m, para uma residência familiar (ver Anexo A: Projeto gradil 25). Com uma
estrutura vertical em barras quadradas de 1”, o arquiteto insere barras chatas e quadradas de
3/8” e 5/8”, formando desenhos diferenciados de peixes em tamanhos variados e barras
levemente curvas como se fossem ondas do mar. No conjunto bem equilibrado, alguns perfis
são evidenciados pela cor e se integram, desta forma, com a paisagem do entorno, já que o
mar é a grande inspiração do arquiteto para este trabalho.

11
Pasqualino Romano Magnavita concedeu entrevista em outubro de 2005 na Ilha de Itaparica.
109

Figura 75 – Gradil de residência da Ilha de Itaparica.

Os motivos orgânicos são encontrados em vários segmentos pela Cidade do Salvador,


desde residências, hospitais, oficinas, museus, condomínios fechados, lojas, etc., sempre se
adaptando ao contexto do espaço onde se encontram inseridos. A criatividade do artista pode
resultar em gradis completamente diversos. Como referência, mostramos dois trabalhos de
arquitetos distintos que trabalham o mesmo tema, com a técnica do ferro forjado em dois
diferentes restaurantes de Salvador.
O arquiteto Antonio Souto Aderne12, desenhou um conjunto de gradis retangulares de
1,67 m x 1,30 m com barras chatas simples (Figura 76), para o fechamento externo do
Restaurante Cantina Tia Romana (ver Anexo A: Projeto gradil 26). Segundo ele, o trabalho
foi inspirado nos bancos do arquiteto Antonio Gaudí da cidade de Barcelona e no estilo Art
Nouveau, o que ele chamou de “gradil desorganizado, concebido como é a natureza”
(ADERNE, 2005).

12
Antonio Souto Aderne condeu entrevista em agosto de 2005, em Salvador.
110

Figura 76 – Gradil do Restaurante Cantina Tia Romana.

O arquiteto conta que não houve nenhum desenho pré-elaborado, e que a idéia surgiu
imediatamente no chão, quando conversava com o serralheiro que iria executar o trabalho.
Munido de um giz branco, riscou o retângulo no chão do tamanho predeterminado na escala
de 1:1 e dentro dele o desenho, que definiu de “braços de árvores, e a partir desses braços
outros riscos, que formaram os galhos, folhas tipo canoas” (ADERNE, 2005). Os espaços em
branco resultaram em flores, formadas por um círculo central com outros ao redor. Explica
ainda que, pelos espaços vazados (as folhas), não poderia passar “a cabeça de um menino”,
ou seja, não poderiam ser maiores do que 22 cm, para que se cumprisse a função de
segurança. Caso isso acontecesse, imediatamente era colocada uma flor para diminuir o vão
do espaço no gradil. Como resultado, temos um conjunto de cinco módulos de gradis
diferentes um do outro, mas que, ao mesmo tempo, possuem elementos semelhantes de
composição, formados pela barra levemente curva, exceto pelas flores que são formadas por
circunferências idênticas que se destacam do conjunto.
Já o desenho de gradil de ferro para o Canela e Cia Restaurante (Figuras 77 e 78), da
arquiteta Inês Matos foi trabalhado de modo diferente dos desenhos já citados com inspiração
orgânica (ver Anexo A: Projeto gradil 27). A arquiteta elaborou o gradil em ferro, com alguns
perfis forjados, num desenho estilizado de folhas, numa escala muito maior. O conjunto
111

possui dois painéis, o gradil do portão da garagem que são módulos que se repetem
exatamente iguais de 1,50 m x 2,25 m, formando as portas de correr da garagem e o gradil
mural de 6,00 m x 1,25 m.

Figura 77 – Gradil do Canela e Cia Restaurante.

Figura 78 – Gradil do Canela e Cia Restaurante – portão.


112

Cada módulo do gradil do portão da garagem é composto pelo desenho de uma grande
folha estilizada dentro do perímetro do portão, com perfis de barra chata de 1 ½”. A solução
adotada, pela arquiteta, para diminuir os grandes vãos e aumentar a segurança, foi inserir
barras chatas de 3/8”, que são soldadas dentro do contorno da folha no sentido inclinado,
como se fizessem parte da estrutura da própria folha. Na parte externa ao desenho do contorno
das folhas, as mesmas barras chatas são colocadas num sentido contrário, vertical ou
inclinadas, com espaçamentos menores para contrastar com os outros perfis.
No gradil mural, o desenho repete a mesma idéia das folhas em sentido horizontal e,
do prolongamento do contorno de suas linhas, resultam formas curvas entrelaçadas,
lembrando um botão de rosa. A composição com linhas retas e curvas sobressai na paisagem
da rua, formando um conjunto harmônico. Os perfis de ferro inclinados funcionam como
textura dos contornos mais fortes dentro da composição, prestando-se às funções de
segurança.
Dos gradis orgânicos que levantamos nesta análise, os motivos que mais aparecem
são, sem dúvida, as folhagens, o que, muito provavelmente, além da beleza, está ligado
também à facilidade de se forjar o ferro com a forma suave dos contornos das folhas.
Outro exemplo é o conjunto de gradis da entrada do Condomínio Residencial Jardins
(Figura 79) e, segundo a responsável pela criação e execução (ver Anexo A: Projeto gradil
28), Thereza Sá13, da empresa Ferro Batido, “a idéia surgiu da adaptação de um desenho visto
em revista” (SÁ, 2005). Os três gradis são semelhantes e se complementam: portão-garagem
de 3,50 m x 2,10 m, portão de pedestres 0,80 m x 2,60 m e gradil de 3,50 m x 1,40 m. Neles
foram usados perfis de barras chatas numa composição muito semelhante ao trabalho
executado pelo arquiteto Antonio Souto Aderne (Figura 72), porém, na composição do gradil
do condomínio, os desenhos das folhas são numa escala maior, com vãos vazados de
aproximadamente 0,35 cm entre as peças. Neste caso, é fácil entender o desenho, pois a
segurança do condomínio é reforçada pela pessoa física, não precisando o gradil ter vãos
menores. Os dois gradis possuem soluções de desenho e técnica muito semelhantes, apesar de
terem sido elaborados de modos diferentes e terem sido executados por artesãos diferentes,
em locais distintos e funções específicas.
Dessa forma, podemos concluir que o desenho de um gradil de ferro, além de estar
associado à técnica, precisa concordar com a função que ele desempenha em determinado
local, em relação ao seu grau de segurança. Pode um mesmo desenho, servir a propósitos

13
Theresa Sá concedeu entrevista em novembro de 2005, em Lauro de Freitas.
113

diferentes, ou seja, o desenho não está vinculado ao tipo de projeto em si, mas às condições de
gosto pessoal e facilidades técnicas.

Figura 79 – Gradil do Condomínio Residencial Jardim.

A empresa Ferro Batido também assina a execução do gradil (Figuras 80 e 81) da loja
de representação Eliane Revestimentos (ver Anexo A: Projeto gradil 29). O projeto idealizado
para o gradil é formado por perfis em linha curva que se desenrolam num plano de modo
irregular a partir de vários pontos, numa composição livre e entremeados com pequenos
detalhes de animais estilizados em chapa recortada.

Figura 80 – Gradil da loja Revestimento Eliane. Figura 81 – Gradil da loja Revestimento


Eliane.
114

O gradil foi desenhado com dois módulos de 1,80 m x 0,75 m e um portão de 0,63 m
x 1,79 m. Sua altura e localização sugerem que sua principal função é decorativa, além de
limitar o espaço exterior da loja. Na sua execução, foram empregados perfis circulares de 3/8”
para as espirais e desenhos orgânicos, um perfil circular de 5/8” para as barras verticais e para
a sua estrutura de contorno, um perfil circular de 1 5/8”, todos pintados na cor bronze. O
destaque fica para o interessante desenho do prolongamento de alguns perfis em espiral,
resultando em partes de animais como: o rabo do esquilo ou a cauda da baleia, que se
integram com o conjunto, lembrando as volutas inglesas. As formas estão soltas, sem nenhum
rigor aparente de modulação; alguns perfis sugerem a idéia de peças incompletas, com
grandes vãos. Os perfis circulares e o portão em forma de arco pleno criam uma unidade
com as formas do ferro forjado, que se integram com as formas da natureza.

4.2.2.2 Estilizados, baseados nos símbolos

Os gradis estilizados, baseados em símbolos, referem-se a imagens ou figuras que


expressam uma idéia. Encontramos, na imagem simbólica, também uma tendência à
simplificação, muitas vezes passando por uma representação básica da sua forma.
Destacamos, no particular, a obra do artista plástico Alberto José Costa Borba, mais
conhecido como Bel Borba, dois exemplos importantes: o gradil do Terreiro da Casa Branca
e o gradil da Escola de Inglês EBEC, ambas propostas de técnicas inovadoras para gradis de
ferro.
O Terreiro da Casa Branca, cujo nome em iorubá é Ilê Yá Nassô, foi tombado como
Patrimônio Histórico e Cultural desde 1984, é um dos santuários de candomblé mais antigos
e importantes de Salvador. Ordep Serra, antropólogo e ogã do terreiro, calcula que ele tenha
mais de 150 anos, conforme reportagem do Correio da Bahia ( IMBASSAHY, 2002).
Em 2003, foi entregue pelo artista plástico Bel Borba, um conjunto de dezessete
gradis de 6m² cada um, e um portão-gradil para a entrada (Figura82), que são parte do
fechamento do Terreiro da Casa Branca do Engenho Velho (ver Anexo A: Projeto gradil 30,
a,b,c,d,e,f ). O conjunto é formado por painéis decorados com motivos africanos e símbolos
da religião afro-brasileira, executados com chapa de aço-carbono de 7/8” de 3,00 m x 2,00 m,
interligados por perfis de ferro “I” de 10 cm x 15 cm. Os painéis são módulos que recebem,
115

cada um deles, desenhos exclusivos que representam os símbolos do candomblé, lembrando


os trabalhos de xilografia dos artistas baianos.

Figura 82 – Gradil da Casa Branca do Engenho Velho.

Segundo o Ogan Léo (2007)14, os painéis são assim discriminados:


· Portão de entrada vazado com formas simétricas.
· Painel 1 – As ondas do mar de Yemanjá.
· Painel 2 – Filhas de santo dançando e um alabê tocando.
· Painel 3 – Oxóssi nas matas.
· Painel 4 – Os animais que são oferecidos aos orixás.
· Painel 5 – Homens louvando Oxóssi e seu ofá.
· Painel 6 – Iroko ou roko, Gameleira branca que simboliza o orixá.
· Painel 7 – Alabês tocando atabaques.
· Painel 8 – Ibirê de Nanã e Ogun com sua espada e alguns animais.
· Painel 9 – Dendezeiros fazem o mariô, cortina do Candomblé.
· Painel 10 – Os galhos da árvore Cajazeira que são usados no Candomblé.
· Painel 11 – Giré, festa do Candomblé.
· Painel 12 – Omolu ou Obaluaê, Nanã e Yemanjá.
· Painel 13 – Opoxorô, o cajado de Oxalá.
· Painel 14 – Oxum com seu abebé.
· Painel 15 – Ferramentas de Ogun.
· Painel 16 – Peixes nas águas.
· Painel 17 – Oxê, o machado de Xangô.
A idéia, diz Borba, lhe pareceu muito óbvia, quando buscou embasamento em alguns
livros e imagens, obedecendo às exigências de ornamentação e da função de ser grade.

14
Ogan Léo, Presidente da Associação da casa Branca do Engenho Velho concedeu entrevista em janeiro de
2007, em Salvador.
116

Não poderia ser muito chapado, e o vazado não poderia ser vazado demais, porque
as pessoas passam ao redor, e porque acabaria no lugar comum de todas as grades; e
no caso, obscurecer um pouco não seria tão grave. Tinha que ter o cuidado de não
deixar nenhum lugar fechado demais, porém em alguns casos aconteceu, como por
exemplo no painel do Xangô (BORBA, 2005)15.

Nem todos os orixás têm representação no gradil, somente alguns: Omulu ou Obaluaê
(Deus da varíola, das pestes e de outras doenças contagiosas), Oxóssi (Deus da caça, orixá da
fartura), Iansã (Deusa dos raios, dos ventos e das tempestades), Iemanjá (Deusa dos grandes
rios, do mar e da maternidade, venerada como mãe dos orixás, dos seres humanos e dos
peixes), Xangô (Deus do trovão e da justiça) e Oxalá (Deus da Criação, o orixá que criou o
homem), que são deuses africanos:

Os negros africanos trouxeram consigo os seus deuses, os orixás, e aqui refizeram a


sua religião, que é chamada de candomblé. O culto dos orixás é celebrado nos
terreiros, que são templos da religião dos orixás, sempre com cantos e danças ao
som de tambores. Os orixás cultuados no Brasil são cerca de vinte. Segundo os
ensinamentos do candomblé, cada orixá é responsável por uma porção do mundo,
zelando por uma parte específica da natureza e controlando aspectos do ser humano
e das relações sociais (PRANDI, 2004, p.58).

Outros gradis do conjunto são inspirados nas casinhas e nas árvores sagradas, com os
animais por perto. O gradil painel de objetos está mais ligado a Ogun, que não poderia faltar,
já que é o “Deus da Guerra, do ferro, da metalúrgica e da tecnologia” (PRANDI, 2004, p.59).
A técnica usada por Bel Borba foi a de recortar as chapas com maçarico, a partir dos
desenhos previamente idealizados. O artista explica as razões da escolha do material e da
técnica da seguinte forma:

Minha intenção era transformar a chapa em uma renda. Em muitos objetos, eu já uso
esse processo de recortes vazados, então isso é um pouco a minha cara para outras
situações. Além disso, buscava causar impacto com a robustez na obra, com as
técnicas mais simples e rústicas que evidenciam um pouco o tempo. A cor do óxido
de ferro natural, também foi explorada como se lembrasse um pouco, os africanos
acorrentados do passado (BORBA, 2005).

Declara, ainda, que não enfrentou nenhum tipo de dificuldade. O trabalho foi
executado em seis dias, com planejamento prévio para a execução, [...] “quando você faz um

15
Alberto José Costa Borba concedeu entrevista em setembro de 2005, em Salvador.
117

trabalho bem planejado, as dificuldades se transformam em soluções, foi feito um projeto, um


mapa de ação, as dificuldades e problemas se transformam em soluções técnicas” (BORBA,
2005).
O processo todo envolveu cinco homens, cada um com seu próprio maçarico
recortando a chapa, e o artista previamente riscando os desenhos e acompanhando os cortes.
Devido ao peso de cada gradil e às dificuldades no manuseio, utilizou-se uma empilhadeira
para virar, carregar e tornar o trabalho mais fácil.
Antes da execução, foi feita uma simulação do resultado final de cada chapa de gradil,
através de pranchas de acetato. O preto era a própria chapa e a parte transparente, o vazado
correspondente ao gradil, para se verificar o efeito pretendido.
Para a estrutura da obra como um todo, contou-se com a colaboração do engenheiro
Álvaro Vilas Boas, que ajudou na execução e cálculo dos perfis de vigas e pilares. Foi criada
uma viga simples no chão e, em seguida, instalados os pilares em perfil “I”. Sobre cada
perfil, foi colocada uma escultura de uma moringa em ferro que, no Candomblé, chamam de
quartinha. Os painéis foram instalados a seguir nos seus espaços correspondentes ao projeto.
O tratamento de óleo foi dado no acabamento final para sua manutenção contra a oxidação e a
própria ferrugem, vira proteção da peça do gradil.
Outro trabalho do artista, de menor escala, é o gradil para a varanda superior da Escola
de Inglês EBEC (Figura 83), onde empregou a mesma técnica em chapa dobrada e recortada
de ½ polegada, mais fina que o trabalho citado anteriormente (ver Anexo A:Projeto gradil 31).
O gradil, com a função de dar segurança à varanda, possui um comprimento total de 4,40 m e
1,00 m de altura, e está engastado na parede por ambos os lados. A proposta do gradil é de um
desenho baseado na Pop Art16, que esta mais ligado à idéia da escola.
A Pop Art voltou-se para uma cultura mais popular formada pelas imagens do
cotidiano urbano e dos meios de comunicação de massa (imagens publicitárias, fotos de
imprensa, astros e estrelas, histórias em quadrinhos e objetos industriais). Os desenhos dos
gradis são de figuras humanas estilizadas que se misturam com outros, que nos remetem ao
símbolo da comunicação visual e oral, lembrando histórias em quadrinhos com alusões às
falas dos desenhos dos gibis.

16
Pop Art – Corrente artística essencialmente anglo-americana, surgida na Inglaterra em torno de 1954-1955,
que reagiu à subjetividade do expressionismo abstrato e da abstração lírica. (GRANDE ENCICLOPÉDIA,
1999).
118

Figura 83 – Gradil da Escola de Inglês EBEC.

Nos dois trabalhos prevalece o estilo do artista em retratar uma idéia por meio dos
símbolos, porém a percepção das imagens do gradil se perde quando são vistas de perto. A
compreensão do desenho é mais sentida quando nos posicionamos a uma certa distância do
conjunto, ou seja, torna-se mais evidente quando se tem uma visão clara de toda composição.
Os gradis de ferro de Bel Borba são uma obra de arte na paisagem da cidade, que embeleza
e ao mesmo tempo cumpre a função de dar segurança.
O arquiteto Daniel Colina também se inspirou em símbolos do candomblé quando
desenhou o gradil do portão de entrada (Figura 84), para a Fundação Pierre Verger (ver
Anexo A: Projeto gradil 32). Colina usou o ferro com perfis circulares de 1/4”. O gradil
possui um desenho simples, estruturado com perfis verticais e arcos na parte superior, e faz
claramente uma homenagem ao orixá Xangô. Na estrutura de um dos lados do gradil, o
arquiteto introduz o símbolo do orixá, que aparece em verde . O arquiteto declara que, “ por
um erro de execução, o gradil foi pintado de verde no local, mas foi idealizado na cor
vermelha, que é a cor de Xangô” (COLINA, 2005), Deus do trovão e da justiça. O símbolo de
Xangô é um machado de duas lâminas chamado oxé, que representa a justiça. Suas cores são
o vermelho, ou marrom, e o branco. Neste caso, a cor e a forma são componentes simbólicos
importantes que não poderiam estar desassociados no gradil.
O desenho de um gradil orgânico estilizado por símbolos pode, ainda, ter outras
formas de inspiração, como é o caso do gradil da Empresa Pneu Service (Figura 85), que foi
idealizado com base na representação simbólica da marca da empresa ( ver Anexo A: Projeto
gradil 33). O desenho do gradil com 2,20 m x 2,27 m, é um trevo de quatro folhas (90 cm x
90 cm), reproduzido com chapas de ferro recortadas, pintadas na cor amarela, e barras chatas
forjadas contornando e evidenciando o símbolo.
119

Figura 84 – Gradil da Fundação Figura 85 – Gradil da Loja Pneu - Service.


Pierre Verger.

A proposta do desenho do gradil, que tem como função dar segurança a uma das
portas frontais da empresa, agrega-se à função de comunicador visual da marca. O gradil,
neste caso, é um dos elementos gráficos que caracterizam visualmente esta empresa, que
cumpre o papel de reforçar a identidade visual, comunicando sua cultura e filosofia perante o
público interno e externo. No mundo contemporâneo tão competitivo, tais ideologias são
cada vez mais bem aceitas pelas empresas, visando funções específicas.
O gradil do Instituto Goethe (Figura 86), projeto do arquiteto Carl von Hauenschild,
também deixa clara a intenção de se criar um desenho a partir do símbolo da marca da
instituição para sua divulgação (ver Anexo A: Projeto gradil 34).

Figura 86 – Gradil do Instituto Goethe.


120

O arquiteto declara que: “[...] possui outros projetos com a mesma ideologia, porém
sempre priorizando a segurança e que normalmente procura utilizar chapas de barra chata que
possibilitem serem calandradas” (HAUENSCHILD, 2006)17.
Nesse trabalho, particularmente, usou barra chata de 2” associada à chapa lisa
recortada e a tela quadriculada para compor o gradil . O resultado marca, de forma definitiva,
o símbolo da escola e sua identidade visual para todos que transitam no local.
Na criação do gradil de ferro com essa proposta, é importante que o projetista tenha
sensibilidade na escolha dos materiais, proporções e técnica. O material e a técnica devem
estar de acordo, de modo a atender às necessidades de transmitir a percepção correta do
símbolo. Se o artista não tiver sensibilidade para produzir uma tensão visual correta dos
elementos da composição, poderá acarretar a perda de percepção do símbolo da marca para o
espectador.
No gradil do Instituto Goethe, o arquiteto conseguiu reunir as funções de segurança e
divulgar a instituição, num desenho bastante claro da marca.

4.2.2 Classificação dos Gradis Geométricos18

Os gradis geométricos apresentam, predominantemente, traçados ou motivos retilíneos


ou curvilíneos (linhas retas ou curvas, círculos, quadrados etc.) em suas composições.

4.2.2.1 Efeito de movimento

O que difere os gradis geométricos com efeito de movimento dos demais, são as
percepções dinâmicas que temos do conjunto da composição. O modo como compreendemos
o gradil pode dar-nos uma percepção do objeto, que sugere a idéia de deslocamento, uma
realidade ambígua de bidimensional para o tridimensional ou, simplesmente, uma intenção de
induzir o olhar.

17
Carl von Hauenschild concedeu entrevista em maio de 2006, em Lauro de Freitas.
18
Do Anexo B, constam 37 exemplificações de projetos de gradis geométricos. Neles, também as especificações
de cada um destes projetos.
121

Nos gradis que se seguem, a linha é o elemento mais presente e faz parte de um
conjunto dissociável. De acordo com Ostrower (1995, p.67): “A Linha (cada segmento linear)
cria essencialmente, uma dimensão no espaço. Ela é vista como portadora de movimento
direcional”. Para termos a compreensão exata das intenções da composição, temos que olhar
com certo distanciamento para percebermos a idéia de movimento. Podemos destacar, como
exemplos de gradil que nos faz atrair o olhar, o gradil do Teatro Castro Alves e o gradil do
Centro de Convenções.
O Teatro Castro Alves foi projetado por José Bina Fonyat (1957-1958), com
capacidade para 1.700 lugares, “[...] com concepção mais ligada ao racionalismo e às
circunstâncias locais, um alicerce mais clássico e uma estabilidade profunda apesar do
dinamismo marcante do ângulo extremamente agudo lançado por ele ao espaço” (BRUAND,
2003, p.219).
Inicialmente, no projeto não foi previsto seu fechamento com gradis, segundo o
arquiteto Heliodoro Sampaio. Somente em 1992, quando o Teatro Castro Alves passou por
uma longa reforma, é que os órgãos públicos decidiram cercá-lo com gradis para que se
preservasse o patrimônio. O projeto do gradil de ferro (Figura 87) é do arquiteto Luís Simas
que teve a preocupação de respeitar a forma triangular do teatro e por isso propôs um projeto
com elementos vazados inspirados nos detalhes das paredes laterais internas do teatro,
resultando num desenho seqüencial de forma triangular (ver Anexo B: Projeto gradil 35). O
arquiteto justifica que “teve a intenção de ser o mais fiel possível ao projeto de Bina Fonyat”
(SIMAS, 2006)19.

Figura 87 – Gradil do Teatro Castro Alves.

19
Luís Simas concedeu entrevista em abril de 2006, em Salvador.
122

Os módulos com 3,00 m de largura se repetem, alternando sua posição de forma


espelhada, formando um desenho seqüencial que, no conjunto da obra, nos dá a idéia de um
movimento ondulatório. O ferro de barra chata de 1 ½” escolhido para o gradil ajuda, ainda, a
formar um jogo de sombras interessante, com os perfis levemente inclinados para fora.
O Centro de Convenções da Bahia, projetado pelos arquitetos Fernando Frank e Oton
Gomes, foi idealizado lembrando a forma de uma ponte metálica que ligaria as duas dunas de
areia. A paisagem da Praia de Armação contrasta com o arrojo de suas linhas arquitetônicas
com seus 35.000 metros quadrados de área construída. Em seus sete pavimentos, distribuem-
se auditórios, área para exposições, salas de reunião, bares e lojas, restaurantes e serviços de
apoio. Ocupa uma área de apenas 4,4% da área de 270.000 metros quadrados onde está
implantado.

Figura 88 – Gradil do Centro de Convenções.

Os gradis de ferro do Centro de Convenções (Figura 88), que cercam o seu perímetro,
foram projetados pelo arquiteto Fernando Almeida em 1998, seis anos depois da execução dos
gradis do Teatro Castro Alves (ver Anexo B: Projeto gradil 36). Os desenhos dos gradis de
ambos os projetos são muito semelhantes. O arquiteto Fernando Almeida, responsável pelo
projeto do gradil do Centro de Convenções, explica que há uma razão para essas semelhanças:
123

“[...] deveriam seguir o desenho e a técnica já executados no Teatro Castro Alves como um
estilo a ser seguido, ou seja, uma intenção de padrão para as obras do Governo do Estado”
(ALMEIDA, 2006)20.
O gradil está estruturado em módulos retangulares ligados com perfis de ferro de 4,5
cm x 8 cm que recebem barras chatas com 1 ½” na vertical e duas barras de travamento na
horizontal. No Teatro Castro Alves, os módulos retangulares são de 3,00 m x 1,28 m e no
Centro de Convenções, os módulos são mais altos com 3,00 m x 2,15 m. Ambos possuem
perfis de ferro na vertical de 1 ½ que são cortados na sua extremidade superior, a um ângulo
de 45° e inclinados para o exterior. Esta foi, possivelmente, a idéia encontrada pelo arquiteto
para que desempenhassem a função de lanças de proteção.
Almeida explica que, mesmo cumprindo as exigências do governo, criou um projeto
para o Centro de Convenções com a mesma tipologia de perfil de ferro e a mesma ideologia
de repetição do gradil do Teatro Castro Alves, porém com sutis diferenças no desenho
vazado. Na composição dos dois gradis, notamos a idéia de movimento seqüencial, o olho
acompanha sem interrupção um movimento que percorre um módulo seguido do outro.
Segundo Ostrower (1995, p.34): “Somos levados a perceber o movimento, acompanhando a
trajetória ao longo do traço, pois a linha funciona como uma seta que nos diz: siga por aqui”.
Outro gradil que também explorou, de forma diferente, a percepção de movimento, é o
gradil da Praça Nossa Senhora da Luz (Figura 89). A praça foi restaurada e reurbanizada a
partir do projeto da arquiteta Lucinei Carozo21 em 2000, e ganhou equipamentos novos para
crianças e um gradil de ferro. A arquiteta relata que, “seu interesse na criação da idéia era
fazer uma alusão às ondas do mar e ao referencial religioso, o que resultou num gradil na cor
azul com a forma de senóides22 intermitentes” (CAROZO, 2006). Os módulos retangulares de
3,00 m x 1,80 m estão estruturados com perfis de ferro na vertical de 2” com espaços de 12,5
cm em perfis de ½” (ver Anexo B: Projeto gradil 37).

20
Fernando Almeida concedeu entrevista em abril de 2006, em Salvador.
21
Lucinei Carozo concedeu entrevista em maio de 2006, em Salvador.
22
Senóide – curva cujas coordenadas cartesianas satisfazem a equação y = sen x (HOUAISS).
124

Figura 89 – Gradil da Praça Nossa Senhora da Luz.

Carozo nos esclarece ainda que “o projeto inicial incluía detalhes coloridos em resina
de objetos como flor, peixe, baleia e estrela na parte superior e inferior de cada curva, que
trariam referências lúdicas” (CAROZO, 2006). Estes enfeites tinham o objetivo de diminuir a
sensação de prisão. Segundo a arquiteta, estes elementos foram instalados e, logo em seguida,
foram retirados, pois o poder público concluiu que houve um excesso de sobreposições de
formas e cores na paisagem, o que poderia acarretar prejuízos à sinalização da cidade.
O gradil de ferro da praça passou também por um processo de galvanização a fogo e
recebeu garantia contra corrosão, já que está próximo ao mar.
Nos dois projetos comentados a seguir, do arquiteto Luís Cerqueira, foram usados
módulos seqüenciais criados para duas diferentes obras: Shopping Grê-Center e Colégio
Integral (Figuras 90 e 91). Os efeitos de movimento obtidos pela mesma forma de barra
forjada, empregadas de forma diferente, resultaram em gradis de ferro semelhantes (ver
Anexo B: Projeto gradil 38 e 39).

Figura 90 – Gradil do Shopping Grê-Center.


125

Figura 91 – Gradil do Colégio Integral.

A diferença dos dois projetos são as alturas e os afastamentos entre barras que acabam
produzindo diferentes percepções. Os gradis são formados por barras de ferro forjado
independentes, com duas alturas. No Shopping Grê Center, atingem 1,10 m e 1,30 m, com
perfis tubulares de 1 ¼” engastados num base de concreto de 15 cm. No Colégio Integral, as
barras mais altas são de 3,00 m. Nesta técnica, o arquiteto não precisou usar a solda entre os
perfis. Cada barra de ferro é forjada individualmente e engastada de forma independente na
alvenaria, amenizando, desta forma, possíveis ações de corrosão entre os pontos de solda.
Alguns gradis de ferro desta categoria podem, ainda, possuir caracteristicas de
composição que são bidimensionais, criando um efeito ilusório em tres dimensões e deste
modo, intencionalmente ou não, o gradil ganha volume, ou seja, os efeitos obtidos com luz
(conforme a posição do sol) ou com a profundidade dos perfis empregados criam ilusão de
tridimensionalidade . Estes efeitos curiosos são percebidos nos dois exemplos de gradis que
se seguem: gradil do Edifício Beta e gradil residencial no Condomínio Encontro das Águas,
de arquitetos desconhecidos (Figuras 92 e 93).
126

Figura 92 – Gradil do Edifício Residencial Beta.

O gradil do Edifício Beta está estruturado em módulos retangulares de 3,00 m x 1,40


m, com perfis quadrados de 8 cm entre eles, e de um portão com 3,90 m x 2,10 m ( ver
Anexo B: Projeto gradil 40). Na composição de cada um dos módulos, as barras chatas de ¾”
são forjadas em círculos de 1,38 m de diâmetro que se entrelaçam., soldados uns nos outros
nos seus pontos de tangência, para dar mais rigidez à estrutura, sendo travados com perfis de
barra chata de ¾” na horizontal.

Figura 93 – Gradil de residência – Condomínio Encontro das Águas.


127

A solução para o gradil residencial no Condomínio Encontro das Águas tem analogias
compositivas com o anterior. Os módulos retangulares são de 3,16 m x 1,77 m estruturados
com perfis de 10 cm x 4 cm entre eles (ver Anexo B: Projeto gradil 41). Neste caso, o perfil
de ferro foi forjado com barras chatas de 2” e resultou na figura geométrica de losangos que
também se entrelaçam. Os efeitos de sol e sombra sobre o gradil resultam em desenhos em
perspectivas e cores inusitados.
A solução adotada para os dois gradis é o entrelaçamento dos perfis de ferro forjado de
barras chatas com ¾” e 2”, respectivamente. O efeito de tridimensionalidade do gradil com
losângulos é maior, pois, além de empregar um perfil de ferro mais largo, a colocação dos
perfis é feita em dois planos distintos.
Em ambos os casos, a percepção do movimento só é sentida a partir do nosso próprio
deslocamento em relação ao gradil de ferro e, dependendo da posição em relação a ele, esta
tridimensionalidade tende a variar.
O gradil da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da UFBA (Figura 94),
aparentemente simples, também ganha outra conotação quando visto à distância. O arquiteto
Pasqualino Romano Magnavita, autor do projeto, declara que sua intenção era criar um efeito
tridimensional e que, “[...] o afastamento entre os perfis verticais foi dado no sentimento”
(MAGNAVITA, 2005).

Figura 94 – Gradil da Faculdade de Arquitetura – UFBA.


128

O gradil é composto por portões de 2,45 m x 2,85 m e gradis retangulares de


fechamento de 2,45 m x 2,20 m, com barras circulares de 3” e nas verticais barras circulares
de 1 3/4” espaçadas criteriosamente, para dar a sensação de movimento e volumetria (ver
Anexo B: Projeto gradil 42). Apesar de as barras estarem dispostas linearmente no desenho
em planta baixa, o efeito do conjunto é um movimento sinuoso, como se tivessem sido
posicionadas em curvas, o que de fato não acontece.
Esses efeitos ilusórios foram experimentados também no campo da pintura, da arte
23
contemporânea (Op.Art ). A partir dos anos 50, alternativas artísticas surgiram e se
desenvolveram pela geometria-concretista. Alguns pintores, como Luís Sacilotto (Figura 96),
em Composição Abstrata (80 x 59,5 cm), experimentaram as sensações tridimensionais
através do suporte bidimensional. Outro artista, Vitor Vasarelly (Figura 95), em Gyemant 33
(1 x 1 m) levou à frente pesquisas visuais, no estudo dos processos óticos e psicológicos da
percepção, com um método claramente científico.

Figura 95 – Figura 96 –
Victor Vasarely. Gyemant - 33 (1973) Luís Sacilotto. Composição Abstrata (s. data)
Fonte: Argan (1999). Fonte: Salzstein (1998).

23
Op. Art – é a forma abreviada de Optical Art, expressão inglesa que designa um movimento ou tendência
iniciada na Europa e logo propagada aos Estados Unidos em começos da década de 1960. A Op. Art opõe-se à
harmonia estática da arte contemporânea tradicional, visando inversamente atingir um certo dinamismo que
depende, muitas vezês, de estímulos visuais.
129

Segundo Argan (1992, p.562):


[...] em geral , as séries de formas geométricas coloridas vêm dispostas segundo uma
ordem que implica determinadas possibilidades de variação. Usualmente são
possíveis diversas leituras das séries: na vertical, na horizontal, nas diagonais, ou
mesmo invertendo a relação positivo-negativo entre as formas e os intervalos. A
exceção à regra que é sugerida pelo próprio contexto da composição determina
movimentos ilusórios, como se o próprio plano do quadro estivesse submetido à
tensões e trações variáveis.

Tanto na pintura de Vasarelly e de Sacilotto como no gradil de Magnavita, os


elementos seguem princípios rigorosos de distância e ordem, para que criem o efeito ilusório.
Segundo Argan (1992, p.570): “O efeito consiste em abolir as sensações reais e sensações
ilusórias, assim permitindo à consciência que utilize todas as informações visuais em
igualdade de valor” .
As percepções podem ser diferentes para cada grupo de indivíduos, a partir de um
mesmo dado, pois dependem de suas vivências diante do mundo e, portanto, é possível que
algumas pessoas não tenham a mesma percepção da imagem de um gradil com efeito
tridimensional.

4.2.2.2 Influência dos desenhos ingleses

Os artesãos, serralheiros mais simples que criam seus desenhos e executam seus
próprios gradis, ainda resistem às influências dos desenhos ingleses do século XIX, apesar do
progresso industrial ter propiciado algumas facilidades na arte da forja e ter colocado no
mercado uma grande gama de perfis de diferentes espessuras e formatos (redondos,
quadrados, e planos), já preparadas para receber as devidas curvaturas.
A principal característica dos gradis com influência dos desenhos ingleses são as
volutas e as linhas, os elementos mais utilizados nas composições e na identificação da
técnica da forja. Lemos e Corona (1979, p.472) assim definem uma voluta:

[...] ornato que aparece freqüentemente em capitéis de colunas principalmente no


jônico, com forma de aspiral. O centro da voluta, onde começa a espiral, em geral
em forma de pequeno disco chama-se olho. Voluta saliente é aquela em que o
“enrolamento” sai para fora do prumo, ao contrário da voluta reentrante, em que a
espiral é côncava. Voluta chanfrada é aquela em que as circunvoluções estão
separadas entre si, por um pequeno espaço às vezes decorado.
130

As volutas são formas carregadas de muita sensualidade que vêm sendo exploradas
desde os primórdios da história da serralheria, como está comprovado nas grades executadas
desde o século XII, no período românico.
A voluta foi uma idéia simples de se explorar, em decorrência da facilidade
operacional, que contribuiu para a forma espiralada perpassar séculos.

As volutas chegaram ao século XX com a básica estrutura de composição dos


enrolamentos. Com influências da art nouveau – um dos estilos que muito
exploraram o ferro – às volutas foram acrescentadas máscaras e rocalhas, elementos
comuns nos períodos barroco e rococó (ASSIS, 2003, p.144).

Para definirmos melhor as volutas, recorremos ao significado simbólico de espiral


dado por Jean Chevalier (2001, p.397), que afirma ser uma forma natural freqüente no reino
vegetal e animal. A espiral é formada por qualquer curva plana gerada por um ponto imóvel
que gira em torno de um ponto fixo, ao mesmo tempo em que dele se afasta ou se aproxima
segundo uma lei determinada. A aspiral é encontrada nas significações simbólicas de muitas
culturas através dos tempos.
As volutas podem ser criadas a partir de muitas possibilidades do uso da barra, formas
como a letra “C”, podendo ser mais ou menos alongadas a partir de suas hastes, resultando em
formas de coração (Figura 97) ou concha (Figuras 99 e 100). As volutas em forma de coração
são a combinação de duas volutas em “C”, que se tangenciam em posição invertida e com
terminação triangular. As volutas em forma de concha são a composição de duas volutas com
enrolamento concêntrico sugerindo a forma de uma concha.
As volutas podem também ser formadas a partir da forma da letra “S” e, sendo assim,
possuem um enrolamento duplo em sentido contrário (Figura 98).
A estrutura formal dos gradis com influência inglesa, apesar das semelhanças do
modelo inglês, tendem a elementos mais simplificados como volutas em “C” e formas
geométricas que predominam na composição. Os perfis de ferro forjados que reproduzem
volutas com a forma de “S” ou “C” se configuram a partir de unidades simples que se repetem
e que chamamos de módulos, estes fazem parte da estrutura rígida da composição e são
trabalhados de forma igual e repetida. A composição, neste caso, possui uma lógica de
repetição que tem direta ligação entre a proporção do tamanho do gradil e o tamanho de cada
módulo. O artesão terá que ter sensibilidade e noções de escala para poder calcular a
quantidade exata de módulos que deverão se repetir para se conseguir um conjunto harmônico
( ver Anexo B: Projeto gradil 43, 44 e 45).
131

Figura 97 – Gradil residencial em Itapuã

Figura 98 – Gradil residencial em Itapuã

Figura 99 – Gradil residencial em Itapuã. Figura 100 – Gradil residencial


em Itapuã.

Observando as composições dos quatro gradis das residências acima citados,


localizados em Itapuã, percebemos que todos possuem forte influência inglesa. Estes gradis
empregaram a técnica do ferro forjado em barras chatas mais ou menos elaboradas, numa
associação de barras retas e volutas, formando módulos que se repetem, produzindo diferentes
132

desenhos.
Esses gradis, normalmente, têm a função de proteção em varandas, janelas, portões,
corrimões de escadas, etc. Nas áreas mais pobres da periferia de Salvador, onde a violência se
instala com mais rigor, é fácil encontrar gradis com esses elementos formais sendo repetidos
exaustivamente. Este é o meio adotado para o isolamento e separação como modo de
proteção. É um universo imenso de gradis de ferro, onde os serralheiros exploram, com as
mais diversas possibilidades de tamanhos, diferentes espessuras de barras e desenhos mais ou
menos semelhantes entre si.
Para a construção de um gradil, o artesão deve ter conhecimento técnico da montagem
da peça, como tambem noções de composição para a criação modular dos desenhos.
As mãos habilidosas de alguns artesãos, ainda hoje, transformam o aspecto agressivo do
material em verdadeiras obras de arte, transformando o ferro em volutas, empregando a técnica
da forja de forma rudimentar.
Segundo o artesão João da Conceição Libório, hoje com 80 anos e, desde 1952,
trabalhando no oficio da serralheria, nas décadas de 60 e 70, eram muitos os trabalhos
executados em ferro forjado em Salvador. Ele explica como planejava seus desenhos:
“Riscava numa tabela para saber o tanto de espaçamento que ia ficar, e calculava quantas
peças iriam caber dentro da medida quadrada” (LIBÓRIO, 2005)24.
Libório declara que os projetos eram todos previamente detalhados e orçados aos seus
clientes e muitos deles, como os gradis do Hospital Professor José Silveira, em 1951, Hospital
Aristidez Maltez, em 1952, Hospital Santa Izabel de Nazaré (década de 60), Hospital
Evangélico de Brotas (entre as décadas de 60 e 70) não existem mais. É possivel que tenham
sofrido fortemente a ação da corrosão do ferro e foram substituídos ao longo dos anos, muito
provavelmente pelo alumínio, por ser um material de fácil manutenção. Infelizmente,
também, os projetos e os registros destes desenhos foram perdidos ao longo dos anos, por
falta de um interesse maior na preservação destas peças.
Alguns poucos projetos25 (Figuras 101, 102 e 103) foram guardados pelo artesão, onde
se observa a indicação detalhada das cotas e a precisão nos traços.
O artesão explica que, para a inspiração dos desenhos, as fontes eram variadas.
Normalmente, o cliente gostava de determinado gradil executado em algum lugar na cidade e
pedia para ele copiar. Para a realização de um trabalho deste tipo, muitas vezes eram
necessários adaptações e diversos ajustes, que podiam decorrer da qualidade da matéria-prima

24
João da Conceição Libório concedeu entrevista em setembro de 2005, em Salvador.
25
Os desenhos são de autoria do artista, mas não possuem data, registro de nome ou endereço do cliente.
133

ou do novo local a ser instalado, que muito provavelmente deveriam ter proporções diferentes.
Estes ajustes denotam o grau de habilidade que o artesão tinha que ter para conseguir um
trabalho satisfatório, pois o desenho precisaria ser adequado às novas medidas. Neste caso, o
módulo geralmente tem as mesmas proporções, e somente o número de repetições do módulo
é que se ajustam na medida da largura e da altura do novo gradil.

Figura 101 – Gradil portão 1– desenho de João da Conceição Líbório.

Figura 102 e 103 – Gradil portão 2 e 3 – desenhos de João da Conceição Líbório.


134

Outras vezes, o cliente deixava a critério do próprio artesão a escolha da composição,


vinculado apenas a contenções de custos e recomendações quanto à segurança através das
barras. Observando os desenhos, pode-se notar os cuidados que o artesão tinha com cotas,
instalação de fechaduras e possíveis pontos de solda no projeto. O projeto, além de constituir
um documento que visava a aprovação do cliente, servia de base para o orçamento e o cálculo
da quantidade de ferro a ser empregado. Os módulos eram detalhados à parte para facilitar a
execução.
Sendo assim, uma boa parte dos serralheiros baianos, que inicialmente, no século
XIX, criaram seus estilos a partir de cópias de padrões europeus, continuam até hoje fazendo
adaptações, de acordo com a realidade e as necessidades do século XXI.
Apesar do grande número de exemplares de gradis com influência européia, um estudo
mais detalhado da produção desses artistas não será abordado aqui, pois o objetivo deste
trabalho é descobrir, em âmbito mais geral, as várias formas e técnicas que o ferro adquiriu
como gradil na segunda metade do século XX.

4.2.2.3 Módulo simples

O gradil com módulos geométricos simples é aquele que tem, em seu desenho,
motivos retilíneos ou curvilíneos (linhas retas ou curvas, círculos, quadrados) em módulos
geométricos básicos que se repetem.
Alguns serralheiros buscaram caminhos diferentes, como a simplicidade das formas,
introduzindo cada vez mais os elementos geometrizados. As facilidades produzidas pela
Revolução Industrial, através de máquinas, e os mais variados componentes de perfis de ferro
na serralheria, ao longo dos anos, tenderam para uma simplificação das formas dos gradis da
segunda metade do século XX, até quase a própria eliminação das formas mais rebuscadas,
mantendo, porém, a herança de se trabalhar através de módulos iguais e justapostos.
Por essas alterações e transformações no desenho dos gradis, levantamos três hipóteses
prováveis:
· Facilidades com a introdução da máquina no trabalho da serralheria.
· Redução e simplificação de peças para eliminar custos.
· Evitar a corrosão que por ventura pudessem atacar o gradil de ferro nas junções com
muitos pontos de solda.
135

Segundo relato de Libório (2005), os desenhos se alteraram nos últimos anos para
desenhos mais simples sem volutas,

[...] devido à facilidade de se fazer gradis nas máquinas mais modernas como
Máquina de Corte, Máquina de Solda, Torno etc. As máquinas modernas não
facilitam certos acabamentos como volutas e tambem o custo torna-se maior quando
as peças são muito detalhadas.

A solda, como já vimos, é utilizada para unir entre si duas ou mais peças metálicas
formando um só corpo. Esses pontos de união tornam-se locais vulneráveis ao processo de
corrosão, que provoca deterioração substancial das superfícies metálicas. O ferro retém uma
quantidade tão elevada de cloreto que não é possível conter a corrosão, um dos problemas
mais graves ao se utilizar o ferro como solução arquitetural.
Segundo Oliveira (2002), os índices de corrosão podem ter várias características:
mudança de cor, de textura, aparecimento de pequenos orifícios, aparecimento de gotículas de
líquido (exsudação), manchas do tipo concha de retalhos e caminhos de rato. Desta forma, o
gradil de ferro pode apresentar, ao longo dos anos, variações que são causadas pela ação da
corrosão, que comprometem a estética da obra e trazem graves riscos à segurança e ao
funcionamento das peças de ferro.
O serralheiro Carlos Pietrasik, que aprendeu o ofício com o pai e dedica-se à profissão
há cinqüenta anos, desenhou e executou os gradis de sua residência há dez anos, no bairro do
Uruguai em Salvador. Para a composição do gradil, criou um desenho com elementos
circulares e outros detalhes menores que necessitavam de vários pontos de ligação entre as
peças, ou seja, pontos de solda, e, ao longo dos anos, ele próprio foi retirando os perfis um a
um. Para esta atitude, fornece uma explicação convincente – é que os pontos de solda
provocavam muita corrosão, comprometendo o aspecto estético e estrutural do gradil. A
retirada dos detalhes desses perfis, eliminando os elos de ligação entre as peças, diminuiu a
possibilidade de pontos de corrosão: “Quanto mais pontos de solda, maior a possibilidade de
aumentar a corrosão do gradil. Simplifica-se o desenho para evitar a corrosão dos pontos de
solda” (PIETRASIK, 2005)26.
É por esta razão que o artesão alega que muitos dos seus desenhos tendem a uma
simplificação, para evitar tais problemas futuros.
Os dois modelos de gradis selecionados a seguir (Figuras 104 e 105) são uma pequena
amostra do grande universo dentro da serralheria de Salvador, que mostra claramente as

26
Carlos Pietrasik concedeu entevista em outubro de 2005, em Salvador.
136

facilidades da criação e execução com a simplificação dos desenhos (ver Anexo B: Projeto
gradil 46/ 47 ). São formas geométricas simples como triângulos, quadrados e losangos, que
se repetem a partir de módulos. As combinações dos elementos são as mais variadas
possíveis, sempre dentro de uma lógica exata. Podemos tambem observar que existe uma
grande incidência de repetição de um mesmo desenho em vários pontos da cidade,
aparecendo, principalmente, em residências de baixo e médio padrão.

Figura 104 – Gradil residencial em Itapuã – portão 4. Figura 105 – Gradil residencial em Itapuã –
portão 5.

Os modelos dos gradis que se seguem (Figuras 106 e 107), são modelos diferentes
que foram gerados por perfis de ferro forjado com formas semelhantes.
É importante ainda observar que os módulos são formados por desenhos que se
repetem, ou seja, uma espécie de submódulos, que também estão dispostos dentro do conjunto
da composição, segundo certa regra. Estes desenhos de subdivisão do módulo podem também
gerar gradis diferentes quando se altera sua estrutura de composição ou pequenas variações
nos perfis de ferro e, com isso, reproduzem-se diferentes gradis (ver Anexo B: Projeto gradil
48/ 49).
137

Figura 106 – Gradil residencial em Figura 107 – Gradil residencial em


Lauro de Freitas – portão 1. Lauro de Freitas – portão 2.

Dessa forma, modificando os submódulos, estaremos variando também os módulos e,


por conseqüência, modificando todo o conjunto da composição. Interessante observar que,
para que isto aconteça, o tamanho do módulo continua inalterado. Quando o tamanho do
módulo se altera, o conjunto da composição resulta num outro efeito. Com um gradil de
mesmo tamanho, a partir de mudança na escala do módulo, todo o conjunto se ajustará em
outro desenho, com uma quantidade menor de perfis e, consequentemente, com custo menor
(ver Anexo B: Projeto gradil 50/ 51).
Em princípio, toda grade não poderia ser classificada como escultura, pois sua
estrutura é tida por linhas planas e seu efeito tridimensional reduzido ao mínimo, mas esta
forma bidimensional foi rompida em 1500 e surgiu, como cita Koch (1994, p.155): “[...] a
grade à espanhola, como um gradil de ferro artisticamente trabalhado , em forma de cesto, que
era anteposta às janelas no Renascimento”.
Alguns gradis, nos ultimos anos, tambem romperam sua forma bidimensional, por
força de necessidades de ordem prática e aparecem formados por módulos em formas
tridimensionais. Esclarecemos que, a partir do pós-guerra (1945), o desenvolvimento da
indústria automobilística, na década de 50, intensificou-se na Europa e Estados Unidos. Com
138

o governo Kubitschek, vieram incentivos para o desenvolvimento do setor automobilístico no


Brasil, e as primeiras linhas de montagem de veículos se tornaram mais intensas em vários
pontos do País. Um maior número de famílias passou a adquirir automóveis, e, como estas
famílias moravam em residências que não foram projetadas para guardar seus carros, diante
desta necessidade, começaram a transformar o espaço da entrada da frente da casa em
garagens. Muitas destas garagens não possuíam espaço suficiente para o comprimento dos
seus veículos e, para tanto, a serralheria criou soluções inusitadas para cada problema,
propondo formas tridimensionais aos gradis de ferro (Figuras 108 e 109).
Esses gradis possuem diferentes composições e formas. Cada desenho está vinculado à
forma do veículo a que se destina a garagem. As medições para o ajuste das grades são feitas
com o carro na garagem para que se possa ter uma idéia da sua projeção, além dos limites da
fachada da residência; estes limites são, em média, invadidos entre 20 a 50 cm de
profundidade em relação à fachada da residência. Na parte tridimensional, para se conseguir a
forma ajustada ao veículo, muitas vezes se usam apenas perfis de barras verticais, o que
tecnicamente torna mais fácil a sua execução (ver Anexo B: Projeto gradil 52/ 53).

Figura 108 – Gradil residencial no Bonfim – Figura 109 – Gradil residencial no Bonfim –
portão 1. portão 2.

Alguns gradis apresentam desenhos mais simples com formas geométricas, e outros
com desenhos de volutas associados às barras verticais, numa composição mista. As formas e
desenhos deste tipo de gradil para garagem estão, desta forma, vinculadas às funções de
proteção que o proprietário pretende dar ao seu veículo.
139

4.2.2.4 Módulo Composto

O gradil com módulo geométrico composto é aquele gradil que tem seu desenho
constituído pela combinação de dois ou mais módulos diferentes.
Os gradis modernos tendem a uma grande criatividade apesar de os desenhos serem
mais simplificados. As possibilidades de combinações são às vezes exploradas pela cor ou por
arranjos de posições diferentes entre os módulos. As arquitetas Leda Cristina de Castro Meira
e Idellene Gonçalves, responsáveis pela criação do gradil da Escola de Inglês ACBEU (Figura
110), exploraram bem tais características, quando analisaram o aspecto dinâmico das cores
(ver Anexo B: Projeto gradil 54). Apesar da simplicidade da forma, as arquitetas conseguiram
projetar um conjunto de gradis para o fechamento do portão de entrada, que é formado por
painéis quadrados interligados por perfis circulares. Estes painéis estão estruturados por um
perfil quadrado de 1” no seu perímetro e, internamente, por perfis de barra chata de 1”, todos
pintados em azul escuro, com tratamento antiferrugem. Cada painel é constituído por dois
módulos simples de repetição justapostos e diferentes com de 52 x 47 cm. O módulo se divide
em quatro submódulos iguais que recebem um quadrado de aproximadamente 10 x 10 cm
executados em chapa lisa recortada. Cada quadrado é soldado na estrutura dos módulos em
posições diferenciadas e é pintado de modo aleatório por uma das quatro cores selecionadas:
azul claro, verde claro, amarelo e o tom cinza. As cores escolhidas são suaves e fazem
contraste com a cor mais forte da estrutura. O resultado é um gradil alegre, dinâmico e
criativo como devem ser os princípios da escola.

Figura 110 – Gradil do Colégio ACBEU.


140

Outro gradil, que também explora o contraste da cor e a diferença entre módulos, são
os portões do Cemitério Abrigo Salvador (Figura 111).

Figura 111 – Gradil do Cemitério Abrigo Salvador.

Os gradis são executados em perfis tubulares ocos de 1” e 2” e se constituem de


módulos estilizados que se repetem, fazendo alusão ao sol27 principalmente por terem detalhes
pintados de amarelo (ver Anexo B: Projeto gradil 55). O sol como inspiração, representa o
estado de espírito positivo, a alegria e a esperança para aqueles que visitam o lugar. Para dar
destaque ao símbolo da instituição, alguns módulos da composição recebem o logotipo28
formado pelas letras “A” e “S” destacadas em verde e amarelo. De modo geral, os gradis
modernos, exploram mais os contrastes de cor nos diferentes perfis de ferro, procurando dar
mais ênfase à percepção de alguns detalhes.
Alguns arquitetos procuram ainda, através das formas geométricas, inspiração na
própria obra e, desta forma, os gradis podem ter relação direta com as formas arquitetônicas
da edificação. No gradil da Igreja Batista Monte das Oliveiras (Figuras 112 e 113), a fonte
de inspiração para o artista está na fachada, que explora a forma triangular para os módulos
do gradil (ver Anexo B: Projeto gradil 56). Os gradis foram executados com perfis de ferro de
barra chata de ¾” em dois diferentes módulos que se repetem no gradil do muro e no portão
de entrada. Possuem pequenas lanças na parte superior com a função de aumentar a
segurança.

27
Sol – o sol, por sua simetria e forma básica, é considerado também abstrato.
28
Logotipo – marca constituída por grupo de letras, siglas ou palavras.
141

Figura 112 – Gradil da Igreja Batista Figura 113 – Gradil da Igreja Batista
Monte das Oliveiras – fachada. Monte das Oliveiras.

Outro exemplo bastante ilustrativo é o conjunto de gradis da Escola Acalento (Figuras


114, 115 e 116), projeto do arquiteto Carl von Hauenschild que, para o processo de criação, se
inspira no próprio bloco da construção do edifício, do qual tira partido para a fachada da
escola (ver Anexo B: Projeto gradil 57). Para os gradis de ferro da edificação, que servem de
fechamento da escola, o arquiteto usou somente o perfil de barra chata de 1”; para o portão da
garagem, usou o perfil de barra chata de 1 ½”. Apesar das diferentes proporções de perfis de
ferro, o arquiteto consegue um resultado de conjunto, em que todos os gradis têm relação
entre si e com a própria obra.
Para que os gradis desempenhassem a função de dar segurança, os espaços entre os
perfis não poderiam ter grandes vãos. Deste modo, o arquiteto, com barras chatas, projeta um
desenho em módulo único e o reproduz através de um espelhamento na forma radial .
O arquiteto cria uma identidade entre as composições, apesar das várias formas
estruturais. Na fachada do edifício, a grade de ferro e a cerâmica possuem uma mesma
linguagem e se integram. No portão da garagem, quase não se percebem os perfis de ferro, e o
gradil se integra com a natureza. O arquiteto consegue dar segurança com os gradis de ferro
para a escola infantil, valorizando os materiais e o entorno, sem provocar sensação de
segregação.
142

Figura 114 – Gradil da Escola Acalento.

Figura 115 – Gradil da Escola Acalento. Figura 116 – Gradil da Escola Acalento –
Detalhe.

Os gradis do edifício do Instituto do Cacau (Figura 117), um dos prédios modernistas


mais importantes de Salvador, situado no bairro do Comércio, foi inspirado no processo de
modernização da cidade. O projeto do edifício é do arquiteto Alexander Buddeus e a obra foi
realizada em 1933-1936.
143

Figura 117 – Gradil do Intituto do Cacau.

Era um edifício construtivamente sofisticado, com lajes-cogumelos e estrutura para


abrigar salão para armazenamento, com equipamentos especiais como esteiras
subterrâneas automatizadas para transporte de sacarias até o porto, autoclaves para
expurgo do cacau, controle de umidade interna por meio de ventilação forçada e
filtros instalados na cobertura. (AZEVEDO, 1988 apud SEGAWA, 2002, p.69).

Na opinião do arquiteto Paulo Ormindo de Azevedo, pesquisador do Inventário de


Proteção do Acervo Cultural da Bahia, “o gradil de ferro que hoje ainda se encontra no local é
da mesma época e muito provavelmente da autoria do designer Joaquim Terreiro”.
O conjunto é formado por gradis individuais e iguais que se repetem ao longo das três
fachadas. Em sua estrutura, possui um desenho racionalista com linhas e figuras geométricas
que nos remetem aos conceitos de desenvolvimento e tecnologia, pertinentes à edificação
(ver Anexo B: Projeto gradil 58).
Cada gradil, com 4,44 m x 3,54 m de altura, foi executado com perfis de barras chatas
de 1 5/8” e pequenos detalhes geométricos com chapa lisa. O desenho da composição de cada
gradil é formado por nove módulos retangulares diferentes de 1,48 m x 1,18 m justapostos. Os
módulos, apesar de diferentes, estão associados entre si como uma grande “máquina”. Os
elementos do estilo da forma são constituídos por linhas que possuem angularidade e nos
remetem à percepção de conflito e dinamismo, típicos do homem moderno. Todos os
conceitos e a preocupação em atender às funções deste novo edifício parecem refletidos na
144

ousadia e criatividade dos painéis dos gradis.


Ainda nesta classificação, escolhemos outro importante trabalho do artista plástico
Juarez Paraíso, o projeto do gradil para a Ponte do Rio Caji no município de Lauro de Freitas
(Figura 118).

Figura 118 – Gradil da Ponte do Rio Caji.

O que mais surpreende é sua extensão, de aproximadamente 55 metros de


comprimento. A composição possui um complexo conjunto de módulos geométricos
repetidos e assimétricos entre si, com apenas dois tipos de perfis: barra chata 1” e perfil
quadrado de 1” (ver Anexo B: Projeto gradil 59). O ponto central é uma rosácea geometrizada
dentro de vários círculos, na cor bronze, que se destaca do conjunto. As linhas curvas formam
diferentes desenhos, numa concordância de várias circunferências e arcos. O gradil é formado
por desenhos de módulos que são divididos em submódulos num desenho extremamente
complexo, cumprindo as funções de segurança.
O gradil possui um desenho simétrico que é repetido dos dois lados da ponte, criando
impacto pela beleza e escala do conjunto.
Interessante observar que, nas ruas próximas ao local onde foi executado o gradil da
ponte, outros gradis de ferro executados pelo mesmo artesão sofreram influência do trabalho
de Juarez Paraíso. Mostramos aqui alguns exemplos (Figuras 119/120/121/122) que aparecem
em tamanhos e locais diferentes e têm, em sua composição, formas semelhantes ao gradil do
artista, ou seja, repetição de um dos módulos mais simples do gradil da ponte, empregando os
mesmos perfis e técnica do ferro forjado (ver Anexo B: Projeto gradil 60/ 61/ 62).
O artesão, apesar do conhecimento técnico, não se preocupou em fazer a adaptação
dos módulos ao tamanho total do gradil para o novo local, pois ele foi cortado sem nenhum
critério. Apesar disso, em outras situações, consegue criar um gradil extremamente elaborado,
a partir dos mesmos módulos de repetição.
145

Figura 119 – Gradil residencial em Figura 120 – Gradil residencial em


Lauro de Freitas. Lauro de Freitas.

Figura 121 – Gradil residencial em Figura 122 – Gradil residencial em


Lauro de Freitas. Lauro de Freitas.

A forma como se originaram estes gradis nos faz crer que muitos outros profissionais
da arte do ferro podem ter sido influenciados da mesma forma, buscarndo inspiração na obra
de artistas plásticos ou arquitetos, e é possível que esta seja uma tendência para os gradis de
ferro da contemporaneidade.

4.2.2.5 Movimento Moderno

A arquitetura moderna deu provas de muita imaginação e sempre esteve baseada na


racionalidade, apoiando-se num movimento de ordem e equilíbrio. Sua inspiração baseada
em figuras simples e geométricas influenciou um modelo de gradil (Figuras 123 e 124), que
146

ressalta estas mesmas características e que nesta pesquisa, classificamos como Gradis do
Movimento Moderno. Estes gradis surgiram por volta da década de 70 e alguns resistem até
hoje em bairros distintos, como Brotas, Canela e Costa Azul, como pudemos constatar no
local. Trata-se de gradis para portões, alguns deles de garagem, com proporção, desenho e
material muito semelhantes (ver Anexo B: Projeto gradil 63/ 64). Infelizmente, não existem
dados suficientes para entender por que aparecem com a mesma forma e desenho em
diferentes bairros. É muito provável que um mesmo projeto tenha sido copiado por artesãos,
já que seu módulo de repetição é facilmente adaptado a qualquer tamanho de gradil.
Nos bairros de Brotas e Canela, o gradil tem a função de portão de garagem de duas
residências unifamiliares. O do bairro do Costa Azul é o único que estava em péssimo estado
de conservação e foi retirado e enviado ao “ferro velho”, justamente no momento em que
documentávamos com fotografias.

Figura 123 – Gradil residencial Figura 124 – Gradil residencial no Canela.


no Costa Azul .

A execução do gradil é basicamente uma estrutura rígida formada por perfis circulares
3/8” na vertical, espaçados em aproximadamente 25 cm entre si, tiras de chapa de ferro lisa
com 14 cm de altura que se entremeiam pelas barras de ferro e são soldadas nas extremidades
da estrutura vertical. O resultado obtido é um gradil com duas faces distintas e que não possui
nenhuma abertura vazada, já que o entrelaçamento feito, alternadamente, vai de uma
extremidade a outra, passando por entre os dois lados do gradil.
Apesar do racionalismo, o gradil possui muito dinamismo na composição, pois, em
decorrência da sua estruturação, tende à tridimensionalidade das formas, obtidas pela
simplicidade dos materiais e da técnica.
147

4.2.2.6 Estruturais

Nos últimos anos, observou-se a necessidade de se criar mecanismos de segurança


para a grande população de pedestres que atravessa as grandes avenidas, cada vez mais
movimentadas, do centro de Salvador.
Na década de 80, o arquiteto João Filgueiras Lima projetou passarelas padronizadas
para as avenidas de vale de Salvador (Figura 125), que se baseiam na ampliação de um
sistema estrutural simples de treliças metálicas em aço especial resistente à oxidação, que
vencem vãos de até 35 metros. Os sistemas são apoiados em torres circulares, nas quais se
articulam eventuais derivações ou acessos: rampas ou escadas. Estas rótulas, que possibilitam
mudanças na direção ou no nível dos percursos das passarelas, são essenciais para
compatibilizar, de forma harmoniosa, sua implantação com o relevo acidentado da cidade.

Figura 125 – Gradil da Passarela Urbana – FAEC.

Esses sistemas em perfis de aço, ao mesmo tempo em que são estruturais, também
servem como gradis, para dar segurança aos pedestres que circulam pelas passarelas29 (ver
Anexo B: Projeto gradil 65) Os conjuntos possuem módulos constantes que se repetem em
vários locais da cidade, com diferentes cores de cobertura e gradis, criando uma identidade
para a cidade.
O arquiteto, ao projetar as passarelas, criou marcos visuais fortes, com os quais o

29
Passarelas Padronizadas – foram construídas pela FAEC (1986-1988) mais de 15 passarelas em Salvador,
além de outras no Rio de Janeiro, Brasília e Florianópolis.
148

sistema estrutural, além de agregar beleza e segurança, consegue diminuir custos.


Muito semelhante foi a solução do gradil na restauração do Mercado Modelo de
Salvador cujo projeto foi coordenado pelo arquiteto Paulo Ormindo de Azevedo que, fugindo
de posturas ortodoxas, utilizou, em sua cobertura, estruturas tubulares metálicas em cores
vivas, usuais de plataformas marítimas. A solução adotada como partido para os gradis são as
mesmas estruturas tubulares metálicas que servem de proteção aos guarda-corpos no subsolo
do edifício.
Esse tipo de estrutura tubular se fez corrente em outros locais da Cidade do Salvador.
Nos gradis das pontes ao longo da orla, na Praia de Piatã (Figuras 126 e 127), elas são mais
elaboradas, com detalhes coloridos, e serve de anteparo e segurança para os pedestres. Seus
módulos são formados por perfis tubulares de 2” e 4”, fixados em uma base de concreto,
alguns com pequenas diferenças nos desenhos (ver Anexo B: Projeto gradil 66/ 67). As peças
dos gradis são soldadas e pintadas nas cores azul, cinza e amarelo, que contrastam com a
paisagem da cidade.

Figura 126 – Gradil Urbano – Piatã l. Figura 127 – Gradil Urbano – Piatã 2.

Em locais mais afastados da orla marítima, nos bairros da Pituba e Rio Vermelho, os
gradis possuem um desenho mais simples e não são em cores variadas, geralmente são
pintados de amarelo. Não existe um modelo padrão para os desenhos dos gradis urbanos, o
que dificulta sua identificação, reposição e manutenção dos perfis tubulares, que sofrem a
ação da corrosão.
Os gradis mais coloridos desempenham, ainda, o papel de marco visual dentro da
cidade, como equipamento de sinalização na identificação do espaço urbano para os pedestres
que freqüentam estes locais.
149

4.2.2.7 Aços especiais

Os gradis de aço são, geralmente, desprovidos de detalhes, pois o material está


associado a projetos mais modernos, com linhas sóbrias, em residências e edifícios de alto
luxo. Nos últimos anos, cresce o interesse pelo material, principalmente por arquitetos, em
bairros mais nobres da cidade, sendo empregado principalmente em gradis de portões, apoios
de escadas e peitoris de varandas. Selecionamos para esta pesquisa a obra de quatro gradis de
arquitetos diferentes que utilizam o aço para gradis, com técnicas distintas.
O primeiro gradil, de autoria do arquiteto Neilton Dórea, é parte de um conjunto que
foi projetado para uma residência unifamiliar em condomínio fechado (Figuras 128 e 129). O
arquiteto utiliza o aço sem acabamento em barras de 1”, soldadas na estrutura de perfil (6cm x
6 cm) do portão de entrada. À primeira vista, o resultado é um gradil com peças que parecem
ter sido soldadas sem nenhum critério, lembrando as cêrcas de varas na zona rural que
supostamente são construídas aleatoriamente. Por trás desta impressão, observamos que o
arquiteto idealizou um módulo que se repete criteriosamente e, a partir dele, compõe um
conjunto homogêneo de interessante sobreposição. Os pontos de solda aparecem com tons
mais escurecidos, pois não houve preocupação em disfarçá-los ou escondê-los (ver Anexo B:
Projeto gradil 68). O arquiteto declara que teve a intenção de tirar partido desta solução e
“combinar com o estilo da proposta arquitetônica” (DÓREA, 2006)30.

Figura 128 – Gradil da residência de Ivanildo Barbosa Dias.

30
Neilton Dórea concedeu entrevista em abril de 2006, em Salvador.
150

Figura 129 – Gradil da residência de Ivanildo Barbosa Dias.

A proposta de Dórea é mostrar, sem refinamentos, um gradil com caráter mais


brutalista. Ele esclarece, ainda, que sua execução foi pensada, a princípio, a partir de peças
ocas, por questões de custo. Porém, por sugestão do cliente, que declarou ter facilidade em
obter peças maciças, optou-se por estas, o que não alterou sua forma final, trazendo mais
resistência aos efeitos da corrosão.
O segundo gradil selecionado, do arquiteto Ivan Smarchevsky, para os portões de
fechamento do Edifício Residencial Margarida Costa Pinto, situado no bairro da Vitória
(Figura 130), foi elaborado com perfis tubulares de aço inox polido de 2 3/8” e, ¾” para os
detalhes internos do gradil, que foram soldados na estrutura de aço inox de 3” e 4” (ver Anexo
B: projeto gradil 69). O arquiteto conseguiu ajustar o mesmo desenho aos portões para acesso
de pedestres e àqueles para automóveis. Apesar das diferentes medidas, o conjunto é
harmônico, pois, quando os dois portões são intercalados por gradis com formas mais simples
associadas ao vidro temperado incolor e presos à estrutura de aço de 3”, parecem ter as
mesmas dimensões. Esta feliz associação de aço inox e vidro é bastante explorada nos
projetos contemporâneos, pois são conciliados a estética, a leveza, o requinte, a durabilidade e
a transparência.
151

Figura 130 - Gradil do Edifício Margarida Costa Pinto.

Outro trabalho que destacamos é o da arquiteta Rosana Maria da Silva Carneiro, para
uma residência unifamiliar de alto luxo (Figura 131), que usa o aço não só nos gradis dos
portões da residência, como também nos detalhes dos gradis das varandas. O gradil é
executado com moldura em aço inox polido de 10cm e perfis tubulares de ¾ , perfis
quadrados de 1” alternados na horizontal (ver Anexo B: Projeto gradil 70). O emprego do aço
inox para gradis em residências geralmente está associado aos projetos de alto padrão mais
despojados, mais sóbrios e de linhas retas. Neste caso, o material não foi forjado, somente
soldado à estrutura com simplicidade, e sua maior função é dar limite à propriedade e não
segurança.

Figura 131 – Gradil residencial do Condomínio Encontro das Águas.


152

O projeto das arquitetas Marcia Teixeira e Ludmila Gouveia para o gradil do peitoril
da varanda, criado para uma residência unifamiliar de alto luxo (Figura 132), é baseado em
módulos que se repetem em uma estrutura de perfis de aço inox polido de 3”, 2” e perfis de
aço inox de ¾” (ver Anexo: Projeto gradil 71). Os perfis de aço, neste caso, foram levemente
curvados, o que resultou num desenho com módulos alternados, sem muito rebuscamento . Os
perfis são parafusados ou encaixados na estrutura, dispensando pontos de solda.
É comum os gradis de aço inox em alguns projetos, estarem associados com outros
gradis de aluminio, provavelmente por conta do peso e dos altos custos.

Figura 132 – Gradil residencial do Condomínio Ecovilas.

Nos últimos anos, vem crescendo a preferência em se utilizar o aço inox como
material para gradis, pela praticidade de manutenção e beleza, e tem sido um novo desafio
explorá-lo técnica e formalmente.
CONCLUSÃO

O papel do gradil torna-se destacado, diante de uma sociedade moderna que se fecha e
se enclausura, mostrando como este elemento de arquitetura está presente e pode ser
testemunha das mudanças sociais, culturais e econômicas.
Os primeiros gradis de Salvador desenvolvidos foram feitos a partir de cópias dos
europeus no séc. XIX, principalmente dos ingleses. Com o tempo incorporando lentamente a
cultura e desenvolvendo técnicas próprias, com criatividade e beleza, soubemos criar uma
gama de possibilidades, cada um dos seus autores, expressando-se com capacidade, nos
limites de sua formação.
Os gradis modificaram-se dentro do cenário da modernidade, com design diferenciado.
O “ecletismo”, como denominamos, dos gradis de ferro da segunda metade do século XX
reflete as várias vertentes de pensamento e comportamento que o homem moderno enfrenta,
aliadando-se às possibilidades tecnológicas.
O modernismo trouxe as ideologias da funcionalidade e racionalidade, refletindo-se
nos gradis em forma de racionalização de custos e simplificação das formas, porém não aboliu
completamente a preferência por detalhes elaborados.
Os gradis de ferro são peças importantes no contexto da cidade moderna, não só por
motivos de segurança, mas também por razões estéticas e de status. Suas funções podem,
também, ir além, e transformar-se em ferramentas importantes de identidade visual de uma
empresa para os interesses comerciais. Podem ser traduzidos como elementos de decoração e
expressão da personalidade, através da criação de seus desenhos. Em alguns casos,
contradizem os princípios do espaço moderno, quando privatizam o espaço público, criando
fronteiras fixas e acesso restrito. Para alcançar as metas de selecionar, isolar ou distanciar, os
gradis podem ser meios de produzir segregação do espaço urbano. Outras vezes, fazem-se
extremamente imprescindíveis, como em locais da cidade que oferecem riscos aos
transeuntes, onde pedestres transitam próximos às pontes.
Os resultados dos projetos dos gradis modernos, no entanto, são de grande
criatividade, com influências das mais diversas, associadas a tecnologias antigas (como o
ferro forjado) e novas tecnologias (como recortes em chapa a laser) que se mesclam com
desenhos exclusivos feitos por arquitetos, artistas plásticos e artesãos. É uma produção
variada, que mistura formas e desenhos (orgânicos, geométricos ou ambos), traduzindo as
154

necessidades do mundo moderno. Os limites de sua criação são determinados pelas técnicas,
pela liberdade de criar e pelas necessidades das funções específicas que cada gradil
desempenha no contexto.
O mercado disponibiliza uma grande variedade de produtos que facilitam as produções
e ajudam na criatividade de todos os artistas na arte do ferro. A tecnologia contribui com as
máquinas, que vieram facilitar o trabalho. A indústria colocou inúmeros materiais novos no
mercado, que servem de inspiração. A modulação dos desenhos se diversificou. Tudo isto,
atrelado à criatividade dos artistas, abriu novos caminhos.
O grande destaque dos gradis de ferro, neste último século, deve ser dado ao
aperfeiçoamento das técnicas da forja, que proporcionaram um grande avanço, resultado da
indústria, e uma possibilidade de formas de desenhos extremamente complexos, como
pudemos observar com o trabalho de artistas plásticos como Juarez Paraíso, Carybé e artesãos
muito habilidosos que, de certo modo, sofreram influência destes artistas.
No Capítulo 3, vimos que, diante dos problemas de violência da cidade
contemporânea, suas praças centrais apresentavam necessidade de uma reurbanização. No
passado, as praças do Campo Grande e da Piedade foram concebidas com gradis de ferro,
sempre associados a uma base em alvenaria. Para esta reurbanização, uma das propostas dos
projetos arquitetônicos era trazer de volta os gradis de ferro ao contorno das praças, como
solução para enfrentar os problemas de vandalismos, tornar os locais mais “seguros” e
preservar o Patrimônio Histórico.
A praça da Piedade, implantada no início do século XX, ganha seu primeiro gradil de
ferro por volta de 1912, com perfis simples na vertical, com lanças metálicas na sua
extremidade e modulação regular. Após sucessivas intervenções, os gradis de ferro são
retirados e, na década de 70, grades simples em forma de arco de 15 de cm de altura tentam
evitar o pisoteio dos canteiros, sem sucesso. Somente em 1998, com os planos de
Revitalização e Restauração do governo, a praça ganha gradis de ferro novos, desenhados
pelo artista plástico Carybé. Os gradis possuem desenhos orgânicos, através das curvas
suaves do ferro obtidas com a técnica do ferro forjado, com o intuito de fazer com que o
gradil se integre à paisagem.
Outra importante praça concebida com gradis de ferro, por volta de 1853, é a praça do
Campo Grande. Este gradil com perfis de ferro horizontais apoiados em pilares circulares de
ferro fundido possibilitava visão clara dos transeuntes. Somente em 1895, com sua
reinauguração, a praça ganha status e recebe gradis mais suntuosos, elaborados em forma de
lanças pontiagudas e acabamentos em volutas, que reservam o espaço interno para as camadas
155

sociais mais privilegiadas. Ao longo dos anos, após várias intervenções na praça, os gradis
desaparecem e somente em 2003, com o projeto de Restauração e Revitalização, recebem
novos gradis com motivos inéditos, baseados nos desenhos da praça da Piedade deixados por
Carybé. Os gradis de ferro forjado possuem desenhos orgânicos estilizados de animais e
plantas, numa seqüência quase imperceptível de ajuste de um módulo para outro. O resultado
final é de uma beleza surpreendente, pois, além de valorizar a praça, integra-se a ela.
Os gradis das praças públicas, além de cumprir seu papel de segurança, impulsionam o
sentimento de cidadania e orgulho na preservação do Patrimônio Histórico para o usufruto
coletivo da população em geral, carente de obras que homenageiem os costumes e crenças da
própria cultura. A importância destas obras para a Cidade do Salvador vão muito além de
serem simples gradis de ferro que fazem proteção, são esculturas para serem admiradas e
servem de inspiração para outros artistas e artesãos.
Os gradis de ferro da modernidade dividem-se em dois grandes “estilos”: os que
sofrem ainda forte inflluência das cópias de padrões importados do passado, que são
geralmente explorados por artesãos para as classes sociais de menor renda; e os que se
revelaram esteticamente, criando estilo próprio, explorando técnicas e materiais novos,
ditados principalmente pelos arquitetos e artistas plásticos. É bem verdade que a inflluência
destes se faz forte e presente nas gerações dos novos artesãos.
Artistas e arquitetos contribuíram para os novos caminhos de grande criatividade dos
gradis. O trabalho deles, apesar da enorme diversidade e da direção percorrida por cada um,
raramente possui a preocupação de interagir com a cidade. Podemos, no entanto, perceber que
seus trabalhos possuem um franco diálogo com as questões sociais e culturais, que não
podem ser dissociadas da cidade.
Em última instância, todo gradil é um trabalho de arte, que mesmo indiretamente,
dialoga com a cidade, lugar das decisões políticas, dando ênfase à subjetividade do artista, no
lado afetivo e humano, que é próprio da arte.
No Capítulo 4, identificamos uma possível amostra que representa esta variada
tipologia de gradis com características próprias, revelando que, em razão da profusão de
detalhes, a serralheria baiana muito contribuiu para a beleza dos edifícios e do espaço urbano
de Salvador na segunda metade do século XX. Com base nas observações de Giedion, o qual
afirma que, ao longo da história, se produzem duas tendências compositivas e, tambem,
devido à grande diversidade desta tipologia, estabelecemos nesta pesquisa uma classificação
para facilitar a análise dos gradis de ferro, divididos em dois grandes grupos: os gradis com
formas orgânicas e os gradis com formas geométricas.
156

Os gradis com formas orgânicas foram classificados, também, em dois grupos: os


estilizados baseados na natureza e os estilizados baseados nos símbolos. Os gradis baseados
na natureza usam predominantemente a técnica do ferro forjado em formas orgânicas em
princípio semelhantes à natureza, como animais e plantas estilizados. Dois grandes artistas
plásticos, Juarez Paraíso e Carybé, são possivelmente os que contribuiram siginificativamente
para esta classificação. Paraíso trabalha formas essencialmente orgânicas e se preocupa com
a integração dos gradis com o entorno, defendendo o gradil com funções não só de
segurança, mas também como complementação arquitetônica, além de servir às questões
estéticas. Em seu trabalho, explora a simetria e utiliza diferentes perfis de ferro com a
intensão de causar tensões no conjunto da obra. O artista não nega sua admiração pela obra
do arquiteto catalão Gaudi, que usava formas orgânicas semelhantes no final do século XIX.
Outro artista importante já citado, Carybé, nos deixou um expressivo acervo de
gradis de ferro, no qual evidencia a beleza da cidade, os costumes e a cultura baiana através
de formas curvilíneas suaves, obtidas com a técnica do ferro forjado. Interessante destacar que
o artista cria seus desenhos sem módulos de repetição ou com módulos de até 25 metros,
com perfis delgados de uma única bitola, que proporcionam leveza e integração com a
paisagem do lugar.
Os gradis estilizados baseados nos símbolos foram idealizados por diferentes
influências simbólicas como imagens ou figuras que expressam uma idéia. Esta idéia pode
estar na cultura afro-brasileira, como o trabalho do artista plástico Bel Borba, que vai buscar
inspiração no candomblé da Bahia, ou na influência em símbolos estilizados da identidade
visual de marcas comerciais ou, ainda, em símbolos ligados às artes, como a Art Pop, formada
por imagens do cotidiano urbano e dos meios de comunicação de massa como imagens
publicitárias, histórias em quadrinhos e objetos industriais. Os dois grupos estão bem
representados pelo trabalho de arquitetos, artistas plásticos e também de artesãos baianos.
Os gradis com formas geométricas são basicamente formados por traçados ou
motivos com linhas retas ou curvas, círculos e quadrados em suas composições. As técnicas
empregadas para os gradis desta classificação são muita variadas, e muitas vezes estão
atreladas aos seus diferentes materiais. Para facilitar a sua análise, dividimos esta categoria de
gradis em sete classificações distintas: efeito de movimento, influência dos desenhos ingleses,
módulo simples, módulo composto, movimento moderno, estruturais e aço especiais.
Os gradis com efeito de movimento exploram as percepções dinâmicas que temos do
conjunto do gradil, sugerindo uma idéia de deslocamento, com a intenção de induzir o olhar
ou provocar uma realidade ambígua de bidimensional para o tridimensional. Estes efeitos
157

ilusórios foram experimentados por pintores contemporâneos, a partir dos anos 50, pela Op.
Art e serviram de inspiração principalmente para os arquitetos que são os que mais
exploraram tais efeitos.
A segunda classificação, influência dos desenhos ingleses, é representada pela grande
quantidade de gradis que ainda resistem às influências dos desenhos ingleses do século XIX,
apesar de a indústria ter colocado facilidades para a técnica da forja, com uma variedade de
perfis de diferentes espessuras e formatos. Os gradis com tais influências são caracterizados
pela voluta (forma espiralada), que podem ser criadas a partir de algumas possibilidades do
uso da barra em formas como “C” ou “S”. Os gradis desta classificação são trabalhados,
essencialmente, a partir de módulos regulares repetidos, numa relação direta com o tamanho
do gradil. Os artesãos de bairros mais pobres são os que mais exploram este tipo de desenho
em gradis de ferro forjado, com a função de proteção em varandas, janelas e portões.
Os gradis com módulo simples possuem desenhos com motivos retilíneos ou
curvilíneos em módulos geométricos, mantendo a herança de se trabalhar com a repetição de
módulos iguais e justapostos. Os gradis possuem desenhos simples, geralmente trabalhados
com o ferro em barras simples ou levemente forjadas, com poucos pontos de solda, já que
estas junções são sucetíveis ao processo de corrosão. Alguns portões destinados a garagens
de automóveis tiveram, por força das circunstâncias, alterações para a forma tridimensional,
buscando diferentes composições e formas, a fim de adequar-se à forma do veículo a que se
destinava o espaço da garagem.
Os gradis com módulos compostos possuem desenhos constituídos pela combinação
de dois ou mais módulos diferentes. Apesar da simplicidade, possuem grande criatividade,
explorada muitas vezes pela cor e forma. Os artistas buscam inspiração através das mais
diversas fontes, como a própria edificação a que se destina, a fachada da edificação ou até
simplesmente a forma dos materiais que compõem uma edificação. Outros gradis desta
classificação podem ainda, através dos seus desenhos, transmitir os conceitos de
desenvolvimento e tecnologia, como é o caso dos gradis do Instituto do Cacau, tentando
marcar os conceitos de uma época.
A arquitetura moderna trouxe um modelo de gradil cuja inspiração baseava-se em
figuras geométricas, com uma técnica mista entre soldagem e entrelaçamento de tiras de
chapa de ferro lisa, numa estrutura rígida. O resultado desta composição racionalista, que
tende a uma tridimensionalidade, nos leva a classificar este gradil como gradil do movimento
moderno, cujos poucos exemplares ainda resistem às ações da corrosão.
Os gradis estruturais esão representados principalmente nas passarelas padronizadas
158

de estruturas de treliças metálicas em aço especial, projeto do arquiteto João Filgueira Lima,
e outros gradis tubulares que servem de anteparo e segurança para os pedestres na Cidade do
Salvador. Estes gradis coloridos, além das funções de segurança, servem como equipamento
de sinalização na identificação do espaço urbano, criando uma marca visual importante para a
cidade.
Por fim, vêm os gradis em aços especiais, que atualmente vêm sendo muito
empregados, com linhas mais sóbrias para residências e edifícios de alto luxo. O aço inox e
escovado são materiais muito utilizados pelos arquitetos em projetos de linhas mais
modernas, às vezes associados a outros materiais e técnicas diferentes, com grande
inventividade.
No que diz respeito à classificação, dos gradis, já esclarecemos que, muitos deles
poderiam pertencer a uma ou mais classificação, já que, técnicas, materiais e formas
diferentes às vezes se misturam num mesmo gradil, dificultando na classificação, podendo
levar a outras formas de entendimento.
É grande a responsabilidade de quem cria esta arte democrática que interfere na
paisagem das cidades modernas. Suas configurações podem transformar o espaço
arquitetônico em sensações de maior ou menor desconforto. O desenho pode ajudar a integrar
o espaço interno e externo das edificações ou trazer mais segregação e confinamento.
Para amenizar as sensações de confinamento, é papel do arquiteto e do urbanista
buscar soluções de não segregação do espaço público dentro da cidade, persistindo o desafio e
a responsabilidade por uma busca consciente de uma nova articulação com a realidade do País
ante as transformações sociais do mundo. Revela, ainda, uma busca por qualidade de vida
para o cidadão, independente de sua classe social, apesar dos danos causados pela desenfreada
luta dos interesses do capitalismo, mascarados no pseudônimo do modernismo.
Projetar a cidade nos dias atuais é tarefa difícil, quase uma utopia. Torna-se cada vez
mais uma trama complexa, incontrolável diante de escalas gigantescas de desenvolvimento. A
cidade, ao avançar nesses novos caminhos, precisa ser pensada com interdisciplinaridade,
com uma visão mais humana para todos os cidadãos. Os gradis podem acompanhar estes
novos caminhos do desenvolvimento, mas também não devem esquecer do elemento humano
que vive nas cidades, sem constatar principalmente, que fronteiras criam espaços não
modernos, e como conseqüência espaços públicos não democráticos.
É possível que o caminho a ser trilhado pelo século XXI seja cada vez mais inventivo,
com o respaldo de novos materias e tecnologias mais avançadas.
159

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164

APÊNDICES

- ENTREVISTAS -
165

APÊNDICE A

– Bel Borba –

Dados: artista plástico, autor e executor dos gradis da Casa Branca do Engenho Velho e da
Escola EBEC.
Período da entrevista: set. 2005.

1. Qual o seu nome completo e formação?


- Alberto José Costa Borba. Comecei Belas Artes e Direito e não concluí.

2. Quantos painéis compõe a obra da Casa Branca. do Engenho Velho?


- 17 painéis de 6 m² (3,00x2,00) e um portão para a entrada (3,00x2,00).

3. Qual o material empregado nos gradis?


- Aço-carbono vazado no massarico.

4. Enfrentou alguma dificuldade na realização do trabalho?


- Nenhum tipo de problema. Foram executados em seis dias com planejamento prévio para a
execução. Quando você faz um trabalho bem planejado, as dificuldades acabam em soluções.
Foi feito um projeto, um mapa de ação, as dificuldades e problemas se transformam em
soluções técnicas. Com uma equipe de cinco homens com maçaricos, eu fui riscando e
acompanhando os cortes com pouquíssimos erros. Utilizou-se a empilhadeira para virar,
carregar e ficar leve. Quando se trabalha com escultura, o tamanho e o peso se tornam uma
coisa desprezível .Mesmo sendo uma tonelada, você tem que encontrar os meios para
executar o trabalho.

5. Como foi pensada a idéia do projeto?


- Pareceu-me óbvio que seria concebido com motivos do candomblé. Foi feita uma pesquisa
em alguns livros e algumas imagens, e fiz como sempre faço meus trabalhos, que é a busca
direta no papel, pensando e riscando, obedecendo às exigências da função de ser grade; não
poderia ser [...] muito chapado, e o vazado não poderia ser muito vazado demais, porque as
pessoas passam ao redor. Ele não poderia ser vazado demais porque acabaria no lugar comum
de todas as grades, e, no caso, eu obscurecer um pouco não seria tão grave. Tinha que ter o
cuidado de não deixar nenhum lugar fechado demais, porém em alguns casos aconteceu,
como, por exemplo, no painel do “Xangô”.
166

6. Quais as funções que os gradis desempenham?


– Funções de segurança e ornamentação.

7. Quais são os orixás que estão reprtesentados nos gradis?


– Nem todos têm representação. Alguns, por exemplo, Oxóssi, Iansã, Iemanjá, Xangô e
[outros], são inspirados no habitat daquela localidade, nas casinhas e nas árvores sagradas
com os animaizinhos ali por perto e tudo isso é como eu conduzo e desenvolvo minha criação.
O painel de objetos, [estes] são mais ligados a Ogun.

8. Por que escolheu o material aço carbono?


– Minha intenção era fazer tipo uma renda. Transformar a chapa em uma renda. Em muitos
objetos que eu faço, já uso esse processo de recortes vazados, então isso é um pouco a minha
cara para outras situações.

9. Como foi pensada a estrutura da obra como um todo e a sua fixação?


– Foi criada uma viga simples no chão, e os pilares em perfil I. Sobre cada perfil, foi colocada
uma escultura de uma moringa em ferro, que eles, no candomblé, chamam de “quartinha”.

10. O resultado final foi o esperado para a obra.?


– Antes da execução, foi feita uma simulação do resultado final de cada chapa de gradil,
através de pranchas de acetato onde o preto era a própria chapa e a parte transparente, o
vazado para se verificar o efeito que seria alcançado.

11. Possui outros trabalhos de grande relevância para esta pesquisa?


– Sim, os gradis da Escola EBEC na rua do Banco HSBC, travessa da Manuel Dias da Silva,
tem uma proposta mais “Pop”, ligada à idéia da escola, onde foi usada chapa de ½ polegada,
mais fina do que esse trabalho, (na Casa Branca, foi usada chapa de 7/8, aproximadamente 2
cm). Minha intenção era o impacto da robustez na obra, com as técnicas mais simples e
rústicas (que evidenciam um pouco o tempo). A côr do óxido de ferro natural também foi
explorada como se lembrasse, um pouco, os africanos acorrentados do passado. O tratamento
de óleo será dado no acabamento final para sua manutenção contra oxidação. [Com] a
galvanização química – a própria ferrugem vira proteção da peça de gradil.

12. Houve colaboração de outros profissionais?


– Sim, do engenheiro Álvaro Vilas Boas [que] ajudou na execução e cálculo dos perfis de
vigas e pilares.
167

APÊNDICE B

– Carlos Pietrasik –

Dados: artesão, oficina na Rua Direita do Uruguai n° 54, tel. 3314-2146 e 3312-3181.
Período da entrevista: out. 2005.

1. Executou gradis de ferro importantes nos últimos anos.?


– Nos últimos anos, todas as obras são em Metalon, o ferro forjado está desaparecendo. Não
demora eu vou precisar fechar por falta de trabalho. Metalon é diferente do alumínio, material
resistente que muito se tem usado para a fabricação de grades e portões.

2. Qual a obra mais importante que realizou que poderia ser fotografada?
– Minha casa, há mais de 10 anos. Precisei colocar gradis e trabalhei com o ferro forjado.
Hoje, as pessoas procuram coisas mais simples e mais baratas.

3. Como aprendeu seu ofício?


– Meu pai trabalhou com o ferro, e eu cresci aprendendo com ele, já fazem 50 anos que me
dedico a profissão.

4. Como consegue fazer o efeito torcido da barra de ferro em seus portões, como em sua
residência ?
– A torção é feita com a força humana. Prende-se a barra em uma das extremidades e, com
um instrumento na outra extremidade, torce-se o quanto quiser.

5. Com quais máquinas trabalha?


– Viradeira – consegue virar a chapa, dobrá-la; guilhotina – consegue cortar a chapa de forma
reta; tico-tico – você faz o desenho na chapa que quiser e ela vai recortando. Como uma
tesoura.

6. O portão de entrada de sua residência foi elaborado com detalhes de círculos dentro de
quadrados, que depois foram retirados. Qual o motivo?
– Quanto mais pontos de solda, maior a possibilidade de aumentar a oxidação do gradil.
Simplifica-se para evitar a oxidação dos pontos de solda.
168

APÊNDICE C

– Daniel Colina–

Dados: arquiteto, responsável pela execução do gradil da Praça do Campo Grande.


Período da entrevista: nov. 2005.

1. Possui projetos de gradis executados, além da Praça do Campo Grande?


– Sim, na Fundação Pierre Verger, na Vila América, Vasco da Gama, em 2000; um gradil
simples com símbolo de Xangô. Deveria estar pintado de vermelho, mas pintaram de verde.

2. Por que se pensou no artista plático Carybé para o trabalho de gradear a Praça do Campo
Grande?
– Carybé possuía uma grande fascinação por gradis de ferro, e sempre comprava gradis
antigos, alguns do século XVIII. Os gradis lembram um pouco a influência da tradição do
ferro da cidade de Barcelona, na Península Ibérica no final do séc XIX. As igrejas da Ordem
Terceira de São Francisco em Salvador me lembram um pouco esta tradição.

3. Como foi pensado o projeto dos gradis da Praça do Campo Grande ?


– O Campo Grande foi pensado a partir de módulos de 25 metros, se eu não me engano, que
se repetem. Foram confeccionados de forma industrial, onde foram calandrados, prensados e
finalmente soldados. Foram executados pela empresa Logus do Sr. Geovani Pisanu (ele fica
na Casa de Itália pela manhã, tel. 9126-7020 e 3594-9383). Foram feitos [...] 800 metros de
gradil através do processo semi-industrial.

4. Como surgiu a idéia de gradear a Praça da Piedade e a Praça do Campo Grande?


– A idéia de se gradear as praças surgiu com o Arquiteto Luís Paulo Conde no Rio de Janeiro.
Sua boa relação com os arquitetos da Bahia, como Assis Reis e Manoel Lourenço e políticos
da época como Imbassay, levaram ao projeto de preservação do Patrimônio Histórico.
Na Praça da Piedade, houve a participação de Carybé na execução dos desenhos, já na
Praça do Campo Grande, ele já havia falecido e se teve a idéia de se redesenhar os gradis a
partir dos motivos da Praça da Piedade. Na Praça do Campo Grande, a princípio, o desenho
do gradil era em estilo inglês respeitando o desenho da praça, que foi desenhado no projeto
das arquitetas Arilda e Dange Cardoso, porem se achou por bem se fazer algo diferente e eu
me lembrei dos desenhos da Praça das Piedade.
A “nova recomposição” do desenho foi feita pelo neto de Carybé que é designer
169

gráfico – Gabriel Carybé. O gradil do Campo Grande foi desenhado com 1,80 m de altura em
módulos de aproximadamente 25 metros , mas optou-se por 2,20 m de altura por acharem
esta altura mais adequada à escala da Praça do Campo Grande. As barras são, nos dois
projetos, de ¾” que foram galvanizados a quente em Recife por apresentar um orçamento
menor. Na Praça da Piedade, por vontade de Carybé, o desenho seria todo idealizado sem
repetições mas, para que se pudesse viabilizar melhor sua execução, foi pedido ao artista que
se trabalhasse em módulos, que chegaram a 25 metros de comprimento. Segundo o arquiteto
da Fundação Mario Leal Ferreira Antonio Marmo da Rocha Oliveira, os gradis da Praça da
Piedade, precisavam ter uma altura compatível com a escala da praça, onde se determinou a
inclusão de barras verticais, a príncipio na parte superior; e depois, para que os desenhos
fossem mais destacados, se propôs uma inversão onde as barras ficaram na parte inferior.

5. E quanto ao estilo?
– Carybé gostava de coisas que fossem usufruto público. Por isso, talvez, a opção por
motivos orgânicos no seu desenho, que não deixam de lembrar a forma do art nouveau.

6. Qual a sua participação no projeto das praças?


– Na Praça do Campo Grande, somente fiz o projeto dos gradis, onde usei pilares de
fiberglass com iluminação interior. As placas amarelas eram para ficar mais escuras e não
mostrar o que tem por dentro. É possível que se façam ainda alguns motivos nos pilares, como
cajus, para esconder as lâmpadas.

7. Tem conhecimento de outros gradis idealizados pelo artista Carybé?


– Um gradil para a casa do escritor Jorge Amado, Rua Alagoinhas nº 13, perto da Vila Forma
Academia.

APÊNDICE D

– João da Conceição Libório–

Dados: artesão (80 anos), desde 1952 trabalha com ferro, Rua Pacífico Pereira, n° 98, Garcia
– tel. 3267-0113.
Período da entrevista: set. 2005.
170

1. Quais as máquinas com que trabalha hoje?


– Máquina de corte para alumínio, máquina de corte para ferro, máquina de solda, máquina de
esmerilhar, furadeira, safra para bater, torno, forja artesanal.

2. Onde compra seus materiais.?


– Na Karferro Comércio de Ferros Ltda, no Largo do Tanque – Praça 10 de Setembro 30 –
tel.33 89-7525 (Anilson).

3. Quais as obras de gradis mais importantes que já executou?


– Hospital Prof. José Silveira – Centenário – década de 50;
– Hospital Aristidez Maltez – Brotas – 1952;
– Hospital Evangélico - Brotas – década de 60 e 70;
– Hospital Santa Izabel – Nazaré – década de 60;
– Banco do Brasil – Comércio;
– Colégio Antônio Vieira – Garcia – décadas de 60 e 70;
– Telemar – Campo da Pólvora;
– Igreja Presbiteriana – Rua da Mangueira, Nazaré;
– Instituto do Cacau – Comércio– década de 80;
– Elevador Lacerda – gestão de Mario Kertz;
– Residência de Jorge Amado – Rio Vermelho;
– Residência de Nilo Coelho – Ondina;
– Antigo gradil do Hotel da Bahia – Campo Grande;
– Antigo gradil do Palácio do Governo – Ondina;
– Antigo gradil do Teatro Castro Alves (TCA) no Campo Grande – 1°gradil em 1951
(atualmente este é o 3° gradil);
– Antigo gradil do Shopping Iguatemi.

4. Como trabalhava fazendo seus gradis?


– Riscava numa tabela para saber o tanto de espaçamento que ia ficar, e calculava quantas
peças iriam caber dentro da medida quadrada.

5. Foi o senhor que confeccionou os gradis de Carybé para o MAM?


–Não. Oficina Belmonte – Tupy.

6. O que acha dos gradis de ferro atuais ?


171

– Os desenhos se alteraram, nos últimos anos, para desenhos sem volutas, devido à facilidade
de se forjar nas máquinas mais modernas. As máquinas modernas não possibilitam certos
acabamentos como volutas. E também o alto custo de se fazer peças muito detalhadas.
Antigamente, o ferro era sempre forjado através do fogo.

APÊNDICE E

– José Rivas –

Dados: arquiteto e artesão, responsável pela execução de alguns gradis do Hospital Aliança.
Período da entrevista: set. 2005.

1. As bitolas dos gradis foram estipuladas por Juarez Paraíso no desenho ou foram pensadas
por você na hora da execução?
– Quem determina é o artista, para sentir o traço maior ou menor da espessura no desenho.

2. Quais as bitolas e tipos de perfis usadas na execução dos gradis do Hospital Aliança?
– Barras quadrados de 3/4x3/4”, 1x1”, 7/8x7/8”;
Barras chatas de 3/4x1/4”, 1x3/8”, 1x1/4”, 7/8x5/16”, 7/8x1/4”.

3. Quais os materiais empregados especificamente nas obras?


– Seção de cavalos : 3/4x1/4”;
ondas: 7/8x7/8” e 7/8x 5/16”.

4. Qual o tratamento que receberam os gradis depois da sua execução?


– O aço carbono geralmente recebe o tratamento de galvanização e, depois, um prime epóxi
para proteção contra a oxidação, para dar aderência, porque o galvanizado não possui muita
aderência.

5. Quais as técnicas empregadas na confecção dos gradis?


– De modo geral, foram empregadas as técnicas do ferro forjado. Algumas peças, como as
172

libélulas e pássaros que são detalhes do painel do gradil frontal, foram chapas de ferro
cortadas a laser em São Paulo, e por isso possuem precisão maior no recorte do acabamento.
O desenho dos gradis com detalhe, com pequenos macacos, foi um dos primeiros gradis
executados, numa inovação feita com fibra de vidro, na intenção de se evitar o problema de
oxidação futura.

6. Existem arquivos destes desenhos?


– O projeto dos desenhos dos gradis foi arquivado no Hospital Aliança, não ficando nenhum
desenho comigo.

7. Qual o primeiro gradil a ser executado?


– O “coreto” foi o primeiro gradil a ser executado no Hospital Aliança.

8. E o segundo gradil?
– Existem duas meia-luas, proteção de uma porta, um touro para um teto que foi o segundo
gradil a ser executado no Hospital Aliança, ao lado da grade dos cavalos.

9. Quais as maiores dificuldades enfrentadas na confecção dos gradis?


– A maior dificuldade foi modelar os perfis quadrados em curvas pequenas formando, às
vezes pequenas circunferências, que precisavam ser aquecidas para se conseguir a forma, para
o desenho dos gradis.
10. Como se consegue, hoje, forjar o ferro e produzir gradis ?
– Através da máquina calandra e da máquina de soldar.

11. Como se deu o processo de fabricação a partir da idéia do artista?


– Alguns desenhos menos elaborados foram passados para o artesão e ele reproduziu no
papel grande, mas, na maioria das vezes, os moldes para a forja são confeccionados pelo
artista em chapas de compensado, pois a transposição do desenho pelo serralheiro pode, na
ampliação, perder algum detalhe da forma do desenho. Neste molde fornecido pelo artista, já
está expressa a intenção das bitolas diferenciadas, dando maior evidência para alguns
contornos.

12. Existem outros gradis que foram confeccionados por você, que merecem ser fotografados
para essa pesquisa?
– Sim, o gradil em aço carbono do sítio particular do arquiteto Fernando Franklim, em Lauro
de Freitas.

13. Quais os materiais que você emprega na produção de seus gradis?


173

– Aço carbono e aço inox, que podem ser polido ou escovados como acabamento final.

14. Existe uma lista das bitolas destes matérias, que estão disponíveis no mercado de
Salvador?
– Sim, existe um folheto com as bitolas dos gradis para serem escolhidas e se apresentam em
varas de 6 metros.

15. Os desenhos dos gradis sempre chegam para a confecção com as especificações das
bitolas que serão confeccionados?
– Sim, quando se trata de projetos, principalmente elaborados por arquitetos.

16. Serão fabricados gradis novos, para o Hospital Aliança?


– Sim. Serão fabricados gradis novos, já contratados pelo Hospital Aliança, para serem
fabricados em São Paulo.

17. Como se obtêm os perfis de ferro na fábrica?


– Ex. USIBA (Usina Siderúrgica da Bahia S.A.) – Processo da laminação: o material bruto
entra numa esteira e vai sendo laminado, para se conseguir o perfil do ferro desejado, ele
entra num rolo onde será esmagado, até ficar na forma da bitola desejada. Um lingote de
10x10 cm entra na esteira gigante, entra num rolo que vai esmagando ele, até se conseguir o
diâmetro menor desejado.

18. No Hospital Aliança se empregou o processo do ferro fundido.?


– Não. Somente o forjado, entra na forja, esquenta e dobra. Consegue as formas curvas
dobrando-se na calandra. Somente quando a curva é muito pequena, precisamos esquentar
para obter uma maleabilidade maior para poder forjar o material. Após isso, as peças são
soldadas.
174

APÊNDICE F

– Juarez Paraíso –

Dados: artista plástico, projetou os gradis do Hospital Aliança.


Período da entrevista: set. 2005.

1. Qual o seu nome completo e local de nascimento.?


– Juarez Marialva Tito Martins Paraíso, nasci em Arapiranga, um subdistrito de Rio de
Contas – BA.

2. Qual a data do início da colocação dos gradis no pátio do Hospital Aliança?


– Em 2000 fui, convidado a realizar o Parque Infantil do Hospital Aliança da Bahia; em
princípio, o Parque Infantil seria todo cercado de grades, mas o Dr. Paulo SérgioTourinho
perguntou se poderia transformar aquelas grades em volumes, o design propriamente em
volumes, e eu disse que poderia fazer as duas coisas. Então, você vai encontrar esculturas
e grades ao mesmo tempo, integradas, quer dizer, uma entrando na outra. Na verdade, ali
não são esculturas, eu dou o nome de escultopinturas ou escultomurais, porque eles
envolvem mais os volumes escultóricos nas laterais em função de um muro propriamente.
Só que eu confiro a este muro um valor formal próprio em termos dos seus perfis; então
eu transformo numa relativa escultura. Até predominantemente, o que você vai encontrar
lá como relevância são os murais que são articulados com as grades. Comecei no ano
2000, levei um ano fazendo o parque e terminei no ano de 2001.

3. Quais as obras que se seguiram?


– Em seguida, foi feito o “Coreto”, pois faz parte do parque, e ali no parque,
destacadamente, existem dois gradis pórticos (dois portões), que têm uma configuração
estilizada de uma borboleta, e o outro de um pavão. Não sei se dá para perceber porque a
cor unifica, achata e dissimula um pouco o desenho, torna um pouco reversível, ou
ambíguo à estrutura. Não fica tão evidente e explícita a figuração, ela é mergulhada
assim, numa estrutura mais ou menos de reversibilidade.
175

4. Doutor Paulo Tourinho interferiu de alguma maneira no motivo da criação ou deixou


a critério do artista?
– O Hospital é quase um museu de arte, possui obras de Brennand, azulejos antigos e
coloridos muito preciosos, portugueses, inclusive veio uma missão de Portugal só visitar
e documentar, estão lá nas paredes do Hospital; tem muita obra de Bel Borba, Goinha,
Celso Cunha. O Dr. Paulo, de um certo modo, é um amante das artes. [Sobre] o jardim,
que também é muito irrelevante, ele é uma espécie de maestro. Ele é que orquestra tudo
do ponto de vista da colocação de todas as obras de arte, uma espécie de arquiteto
urbanista, ele modula o tamanho das coisas que ele quer e o local, faz o planejamento da
colocação e realização das obras de arte. Ele planeja e tem muita sensibilidade espacial e
plástica também. Agora, ele não interfere na realização propriamente do objeto, ele não
escolhe o tema, deixa a critério do artista, porém é claro que ele chama a pessoa que tem
afinidade com ele, com o estilo dele. A modulação do espaço em termos de dimensão dos
objetos foi feita por ele, pois tem boa percepção para isso.

5. Quais as dificuldades que apontaria no processo de trabalho dos gradis?

– Todas as dificuldades, do começo até o fim. É um trabalho muito diferenciado e muito


específico, muito próprio, não tem nada a ver com o desenho com a pintura, com a
escultura com a gravura, tem um design próprio, uma confecção dificílima,
complicadíssima , tudo é duro. O desenho não pode ser muito complicado, porque senão
se torna inexeqüível, tem que ser adequado às possibilidades técnicas.
.
6. Como elabora um gradil, que tem a forma espacial de curva?
– Eu planifico o desenho e moldo no local. Faço a projeção das curvas pelo menos na
vertical , o que eu quero ali é a curvatura, porque ele vai na calandra; ele faz plano, a
gente faz no tamanho exato, depois, ele faz a curvatura que ele deseja de acordo com o
desenho na calandra, o desenho plano já todo pronto, aí a calandra força ele a curvar, e a
curvatura fica a depender da planta que eu dei ao serralheiro, eu faço uma projeção
vertical da curva., ele vai pela minha curva porque eu, lá no local, já estudei. Eu posso,
por exemplo, pegar um tubo, mesmo que seja acidentado, eu faço no plano horizontal eu
imagino no plano horizontal, mesmo que seja uma ladeira, e com o tubo eu posso ver qual
é a curva que eu quero, mas eu projeto no papel, depois eu retifico a curva, então eu faço a
grade toda no plano, depois entra na calandra, dando a curvatura desejada. É um pouco
complicado, depois você tem a possibilidade de soldar, de cortar. O gradil sai
completamente pronto da serralheria, mas algumas vezes é preciso se fazer algumas
acomodações no local.
176

7. Como, no desenho, trabalhou as bitolas diferenciadas ?


– Eu simulo a própria espessura do traço, no projeto do desenho na bitola desejada. Eu
faço, a minha escala, é sempre de 1/10, para ficar bem grande, ou 1/25, ou 1/20. Quando
não é muito grande o desenho, eu prefiro 1/10, porque dá para você representar uma
polegada no traço mesmo. Eu tenho um amigo aposentado da Universidade que faz o
desenho executivo, digamos assim, trabalhamos juntos, e ele coloca já na bitola, já do
ferro, eu dou o projeto na escala 1/10 e ele passa para a escala real de 1/1.
Ele vai ler e fazer a representação, na bitola certa, tem vários fios que ele coloca, e é só
contornar os fios; tem um fio de 1”, 2/3”, 2 mm, 4 mm, e isso ele já configura no
desenho para estudar os contrastes, para evidenciar as formas e criar as tenções visuais
necessárias, porque, se colocar tudo numa bitola só não se vê nada. Eu entrego ao artesão
o desenho no compensado, todo riscado com tinta lavável e na bitola definitiva. Eu facilito
o máximo possível a quem vai executar e exijo precisão no desenho.

8. Com quantas bitolas foram trabalhados os gradis?


– Foram trabalhados geralmente com 3 bitolas diferentes; os contornos com uma forma
mais forte, mais evidente, uma polegada sempre, e é bem duro para se entortar a peça. As
ferramentas vão sempre estourando porque a pressão é muito forte. O método antigo é
muito mais interessante porque você esquenta o ferro.

9. Como ocorreram as junções das curvas nesta técnica?


– Precisa se tomar muito cuidado com a parte técnica para não ficar engrossando demais
as juntas e acabar num negócio estrombudo. As convergências principalmente, às vezes
precisam ser bem elaboradas pois esses acabamentos dão muito trabalho. Ao criar um
ângulo de 45°, 60°, seja lá qual for, conquanto que termine com a periferia externa que eu
quero. Os tangenciamentos de uma reta com a curva também são outra grande
preocupação, ou tangenciamentos de duas curvas, encontro de duas curvas. Você pode
superpor, se for o caso, e ter um ponto de tangência, ou pode cortar ela entrando e
predominar a parte externa; quando elas saem, saem de um ponto comum, por exemplo:
dois centímetros cada. O encontro pode ser um centímetro, mas tem que dar os cortes
adequados para quando elas saírem, cada uma sair com sua independência, ou então fazer,
superpondo. E quando são várias, tem que ter um recurso, porque senão fica um monte
danado. Quando você superpõe a solda resolve fácil, porém para que não haja bolotas de
solda, [...] você precisa fazer um furo entre os dois, colocar a solda no buraco e depois
lixar para o acabamento final. A solda fica na parte interna do perfil. Eu exijo esse tipo de
acabamento para não aparecer a solda, mas infelizmente a tendência é se colocar a solda
pelo lado de fora porque é mais fácil .
177

10. Qual a aceitação do trabalho ?


– Tenho mais de quatro anos trabalhando lá, mas infelizmente não houve divulgação do
trabalho. Dr. Paulo pretende fazer um livro, com todas as obras que estão dentro do
Hospital Aliança. Não possui registros de divulgação da obra em jornais, somente o dia da
inauguração, de forma diluída.

11. Quais as obras de que mais gosta?


– O Coreto e o Parque Infantil, porque parecem com a obra de Gaudí. É uma estrutura
cilíndrica no próprio barro.

12. Quais as funções dos gradis?


– Tem a função ornamental, alguns têm funções defensivas e os demais mais
complementação arquitetônica. Mas de um modo geral quando serve de anteparo, já tem
uma função, para a pessoa não cair. Na verdade, todos têm a função de anteparo e de
amparo, nas decidas, para evitar as quedas, não tem nada gratuito, não é só fazer porque é
bonito.

13. Por que, somente no final do séc. XX, existe uma elaboração maior na criação dos
gradis de ferro?
– Há uma determinante que é econômica, pois é muito cara a confecção de um gradil.
Com toda certeza, quem manda é o arquiteto de moda, o arquiteto oficial, que tem
renome e fama. Então, ele faz projetos especiais, quase sempre ele não introduz muito a
colaboração do artista plástico. O arquiteto moderno ou pós-moderno é muito auto-
suficiente; da própria desintegração que houve ,o arquiteto substituiu muito o artista
plástico. São eles que fazem o mural, a escultura e a decoração. Existe também a falência
da arquitetura civil; são poucas as construções particulares hoje, são as grandes empresas
que fazem os grandes apartamentos. Na verdade, a sensibilidade das grandes construtoras
é nenhuma. Existem os padrões de caixotes já padronizados, com aparente luxo, com
funções duvidosas, mas que iludem o provável cliente. Eles entendem que o mármore atrai
muito mais do que um mural. É difícil substituir os aparatos superficiais, as aparências dos
materiais pseudo-nobres por trabalhos de arte e murais e objetos feitos com o barro e
coisas singelas. Isso não dá status e não vende apartamento classe A. E por isso fica muito
difícil, quando não há uma formação mais estética na cabeça do governante, do
construtor, e na cabeça de quem vende e de quem compra. A profissão do artista plástico
é uma profissão em extinção em todos os sentidos, porque ele não é compreendido como
uma necessidade dentro da cidade, incorporado a arquitetura, no sentido maior, que é o
conforto para as pessoas nas praças, nas ruas. Como produtor de obra de arte isolada,
também não tem nenhuma sobrevivência econômica. Os grandes talentos estão sofrendo
com os poucos marchands, e os custos altos com as galerias de arte e acabam
178

desaparecendo.
Atribuímos o fato de se ter uma preocupação maior com os gradis mais elaborados
pela necessidade mais defensiva talvez. Hoje estamos construindo as casas como prisões,
e a grade é muito legal porque é transparente, permite maior ação razoável, além de ficar
bonita, e, por menor que seja, esta determinante é importante. A cidade toda está se
tornando prisões, então ela é defensiva, e já que temos que fazer esta prisão, fazer com um
valor estético. Jamais pegar uma grade colonial e copiar, isso é realmente relevante. O
conceito de grade em jardim eu sou radicalmente contra. Dizem que é para preservar dos
mendigos. A praça tem que ser aberta para circular o povo, fazer comício, discursar e
fazer protesto. Protesto ao arquiteto Assis Reis que colocou granito e fossos de esqueletos
na Praça da Sé.

14. Possui outras obras importantes de gradis?


– O gradil da Ponte do Rio Caji.

15. Quem foram os artesãos que executaram os trabalhos?


– Artesão Silvio, Av. Suburbana, tel. 3314-4010 e 9918-9173;
– Arquiteto Rivas, Ladeira da Redenção, tel. 9964-6974 e 3351-6207.

16. Por que este material e técnica foram escolhidos para a obra do Hospital Aliança?
– Vedação do espaço linear, extensão dos desenhos, possibilita o desenho de figura e
fundo (vazios e linhas) e integração do chão com o gradil de ferro.

APÊNDICE G

– Silvio Roberto Andrade Costa –

Dados: artesão, responsável pela execução de alguns gradis do Hospital Aliança.


Período da entrevista: set. 2005.

1. Possui outros trabalhos importantes?


– Sim. Casa de vinhos no Salvador Trade Center, minha residência em Plataforma e o
179

gradil da oficina na Av. Suburbana.

2. Executou gradis importantes para outros arquitetos?


–Sim. Professor Pasqualino Magnavita, obras na Ilha de Itaparica.

3. Quais as técnicas empregadas nos trabalhos?


– Recorte a laser – Vitor Laser Ind. Com. Ltda (tel.011-4655-2220). Feito em chapa de
¼” em aço inox (fornecida pela Gerdau – Rua do Uruguai); ferro forjado.

4. Quais as principais bitolas de ferro usadas?


– 1x1”,1x1/4”,1x3/8”,3/4x3/4”,3/4x1/4”,7/8x7/8”,7/8x1/4”.Professor Humberto deixa
indicada cada bitola no desenho.

5. Quais as maiores dificuldades na execução?


– Entortar uma barra muito grossa com um raio pequeno.

6. Quais as inovações dentro do processo de confecção?


– Chapa a laser recortada. Pensado por mim e o professor Juarez Paraíso.

7. Como são executados os gradis curvos?


– Os gradis curvos são feitos no plano e passam na calandra maior para dar a curvatura
desejada.

8. Como são feitos os acabamentos dos gradis?


– Geralmente, os acabamentos dos gradis são sempre tangenciando. Para fazer o
acabamento da solda entre duas peças, a gente escareia, solda em seguida o acabamento,
esse por sua vez é feito na lixadeira.

9. E o tratamento final dos gradis de aço-carbono?


– Decapação – processo químico – ele é imergido num ácido. Retira todas as capas
(ferrugens e impurezas) no tanque por imersão - Empresa Elpron. Av Suburbana;
– Galvanização – processo eletrolítico – galvanização a frio ou quente. A quente é muito
mais resistente, porém muito mais caro. No Hospital Aliança, foram feitos os gradis por
galvanização a frio;
180

– Pintura – Todos os gradis foram pintados. É feita uma pintura à base de epóxi (para
proteger contra ferrugem). E a tinta de acabamento final com tinta automotiva, com as
cores a critério do artista ou dono da obra.
Em todos os gradis, em geral, são feitos os acabamentos acima descritos.
ANEXOS
– PROJETOS–
182

ANEXO A
– gradis orgânicos–
(1 a 34)
183

A lista seguinte, pretende ser um anexo ao texto e às ilustrações precedentes, para


mostrar detalhes e outras informações importantes dos gradis de ferro da segunda metade do
século XX.

1. Hospital Aliança: Gradil pórtico principal


2. Gradil Mural A
3. Gradil Mural B
4. Gradil do portão “Parque das Crianças” – Pavão
5. Gradil do portão “Parque das Crianças”– Borboleta
6. Gradil da janela “Parque das Crianças” – Sereia
7. Gradil da janela “Parque das Crianças” – Cavalo-Marinho
8. Gradil da janela “Ala das Crianças – papagaio
9. Gradil portão acesso à “Ala das Crianças”
10. Gradil de segurança à “Ala das Crianças”
11. Gradil do portão do oxigênio –Peixes.
12. Gradil mural Carrossel
13. Gradil mural Cavalo
14. Gradil detalhe – coreto
15. Gradil detalhe – Mural B
16. Gradil da residência de Sivio Roberto A. Costa -garagem
17. Gradil da residência de Silvio Roberto A. Costa
18. Gradil Ycaro Victal Metalurgicas
19. Gradil do Museu de Arte Moderna - MAM
20. Gradil da Praça da Piedade – Largo da Piedade
21. Gradil da Praça Dois de Julho – Campo Grande – Portadas
22. Gradil da Praça Dois de Julho – Campo Grande – Módulos
23. Gradil da Residência Rosana Lance Saloio
24. Gradil da Residência Paschoalino Romano Magnavita
25. Gradil da Residência Ilha de Itaparica
26. Gradil do Restaurante Cantina Tia Romana
27. Gradil Canela e Cia Restaurante
28. Gradil do Condomínio Residensial Jardim
29. Gradil da Loja Revestimentos Eliane
30. Gradil da Casa Branca do Engenho Velho
a. painel 1, 2 e portão
184

b. painel 3, 4 e 5
c. painel 6, 7 e 8
d. painel 9, 10 e 11
e. painel 12, 13 e 14
f. painel 15, 16 e 17
31. Gradil da Escola de Inglês EBEC
32. Gradil da Fundação Pierre Vergê
33. Gradil da Loja Pneu- Service
34. Gradil do Instituto Goethe
185

ANEXO B
– gradis geométricos –
( 35 a 71)
186

35. Gradil do Teatro Castro Alves


36. Gradil do Centro de Convenções
37. Gradil da Praça Nossa Senhora da Luz.
38. Gradil do Shopping Grê-Center
39. Gradil do Colégio Integral
40. Gradil do Edifício Residencial Beta
41. Gradil da Residência Encontro das Águas
42. Gradil da Faculdade de Arquitetura – UFBA
43. Gradil Residência 1
44 Gradil Residência 2
45. Gradil Residência 3
46.Gradil Residência 4
47.Gradil Residência 5
48. Gradil Residência 6
49. Gradil Residência 7
50. Gradil Residência – variações 1
51. Gradil Residência – variações 2
52. Gradil Residência 8
53. Gradil Residência 9
54. Gradil do Colégio ACBEU
55. Gradil do Abrigo Salvador
56. Gradil da Igreja Batista Monte das Oliveiras
57. Gradil da Escola Acalento
58. Gradil do Instituto do Cacau
59. Gradil da Ponte do Rio Caji
60. Gradil Residência 10
61. Gradil Residência 11
62. Gradil Residência 12
63. Gradil Residência 13
64. Gradil Residência 14
65. Gradil Urbano Passarela
66. Gradil Urbano 1
67. Gradil Urbano 2
68. Gradil da Residência Ivanidldo Barbosa Dias
69. Gradil do Edifício Margarida Costa Pinto.
70. Gradil da Residência Condomínio Encontro das Águas
71. Gradil da Residência Condomínio Ecovilas
187

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