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Cuidados Paliativos

com Enfoque Geriátrico


A Assistência Multidisciplinar

Editores
Niele Silva de Moraes
Ana Beatriz Galhardi Di Tommaso
Kátia Emi Nakaema
Polianna Mara Rodrigues de Souza
André Castanho de Almeida Pernambuco
EDITORA ATHENEU
São Paulo — Rua Jesuíno Pascoal, 30
Tels.: (11) 6858-8750
Fax: (11) 6858-8766
E-mail: atheneu@atheneu.com.br
Rio de Janeiro — Rua Bambina, 74
Tel.: (21) 3094-1295
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Belo Horizonte — Rua Domingos Vieira, 319 — Conj. 1.104

PLANEJAMENTO GRÁFICO/CAPA: Equipe Atheneu


EDITORAÇÃO ELETRÔNICA: Stampa Design

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)


(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)


(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

Cuidados paliativos com enfoque geriátrico a assistência multidisciplinar / editor Ana Beatriz
Galhardi Di Tommaso...[et al.]. -- 1. ed. -- São Paulo: Editora Atheneu, 2014.

Outros editores: André Castanho de Almeida Pernambuco, Kátia Emi Nakaema, Niele
Silva de Moraes, Polianna Mara Rodrigues de Souza
Vários colaboradores.
Bibliografia.
ISBN 978-85-388-0511-3

1. Cuidados de saúde 2. Cuidados paliativos 3. Envelhecimento - Prevenção - Obras de


divulgação 4. Geriatria 5. Gerontologia I. Di Tommaso, Ana Beatriz Galhardi. II. Pernambuco,
André Castanho de Almeida. III. Nakaema, Kátia Emi. IV. Moraes, Niele Silva de. V. Souza,
Polianna Mara Rodrigues de.

14-03588 CDD-616.029

Índices para catálogo sistemático:


1. Cuidados paliativos : Medicina 616.029

Moraes N, Tommaso A, Nakaema K, Souza P, Pernambuco A, et al..


Cuidados Paliativos com Enfoque Geriátrico – A Assistência Multidisciplinar
Direitos reservados à EDITORA ATHENEU — São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, 2014
Editores

Niele Silva de Moraes


Médica Geriatra. Especialista pela Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia – SBGG
e da Comissão Nacional de Residência Médica – CNRM. Preceptora do Ambulatório de Dor
e Doenças Osteoarticulares da Disciplina de Geriatria e Gerontologia da Escola Paulista de
Medicina da Universidade Federal de São Paulo – EPM/UNIFESP. Preceptora do Programa de
Residência Médica em Geriatria e Gerontologia da EPM/UNIFESP.

Ana Beatriz Galhardi Di Tommaso


Médica Geriatra. Especialista pela Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia – SBGG
e da Comissão Nacional de Residência Médica – CNRM. Preceptora do Ambulatório de
Longevos da Disciplina de Geriatria e Gerontologia da Escola Paulista de Medicina da
Universidade Federal de São Paulo – EPM/UNIFESP. Vice-Supervisora do Programa de
Residência Médica em Geriatria e Gerontologia da EPM/UNIFESP.

Kátia Emi Nakaema


Médica Geriatra. Especialista pela Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia – SBGG
e da Comissão Nacional de Residência Médica – CNRM. Preceptora do Ambulatório de
Neuropsiquiatria Geriátrica das Disciplinas de Geriatria e Psiquiatria da Escola Paulista
de Medicina da Universidade Federal de São Paulo – EPM/UNIFESP. Médica Assistente da
Equipe de Cuidados Paliativos do Instituto do Câncer do Estado de São Paulo – ICESP.

V
Polianna Mara Rodrigues de Souza
Médica Geriatra pela Universidade Federal de São Paulo – UNIFESP. Especialização
em Cuidados Paliativos pela Asociacion Pallium Latinoamerica, com Certificação
de Oxford International Center for Palliative Care. Coordenadora Científica do Comitê
de Dor no Idoso da Sociedade Brasileira para o Estudo da Dor. Médica do
Grupo de Suporte ao Paciente Oncológico do Centro de Oncologia e Hematologia
do Hospital Israelita Albert Einstein – HIAE.

André Castanho de Almeida Pernambuco


Médico Assistente da Disciplina de Geriatria e Gerontologia da Escola Paulista
de Medicina da Universidade Federal de São Paulo – EPM/UNIFESP.
Coordenador da Unidade de Cuidados Paliativos do Pronto-Socorro do Hospital
São Paulo/Hospital Universitário da UNIFESP.
Coordenadoras

Ana Beatriz Galhardi Di Tommaso


Médica Geriatra. Especialista pela Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia – SBGG
e da Comissão Nacional de Residência Médica – CNRM. Preceptora do Ambulatório de
Longevos da Disciplina de Geriatria e Gerontologia da Escola Paulista de Medicina da
Universidade Federal de São Paulo – EPM/UNIFESP. Vice-Supervisora do Programa de
Residência Médica em Geriatria e Gerontologia da EPM/UNIFESP.

Kátia Emi Nakaema


Médica Geriatra. Especialista pela Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia – SBGG
e da Comissão Nacional de Residência Médica – CNRM. Preceptora do Ambulatório de
Neuropsiquiatria Geriátrica das Disciplinas de Geriatria e Psiquiatria pela Escola Paulista
de Medicina da Universidade Federal de São Paulo – EPM/UNIFESP. Médica Assistente da
equipe de Cuidados Paliativos do Instituto do Câncer do Estado de São Paulo – ICESP.

Niele Silva de Moraes


Médica Geriatra. Especialista pela Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia –
SBGG e da Comissão Nacional de Residência Médica – CNRM. Preceptora do Ambulatório
de Dor e Doenças Osteoarticulares da Disciplina de Geriatria e Gerontologia da
Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo – EPM/UNIFESP.
Preceptora do Programa de Residência Médica em Geriatria e Gerontologia
da EPM/UNIFESP.

VII
Colaboradores

Alana Menêses Santos


Geriatra Titulada pela Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia – SBGG. Médica
Assistente do Ambulatório Geriatria de Dor e Doenças Osteoarticulares pela Escola Paulista
de Medicina da Universidade Federal de São Paulo – EPM/UNIFESP.

Alessandra Garcia Braz


Médica Especialista em Pneumologia pela Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia
– SBPT. Médica Assistente da Residência Médica em Clínica Médica da Disciplina de
Pneumologia do Hospital Ipiranga, São Paulo. Médica Pneumologista do Hospital Sepaco.
Médica Pneumologista do Centro de Combate ao Câncer, São Paulo.

Alexandre Aboud
Procurador do Estado de São Paulo. Juiz do Tribunal de Impostos e Taxas do Estado de São
Paulo. Especialista em Direito do Estado pela Escola Superior da Procuradoria Geral do
Estado – ESPGE. Especializando em Direito Processual Civil pela ESPGE.

Aline Arlindo Vieira


Graduação em Medicina pela Universidade Federal de São Paulo – UNIFESP. Especialista em
Residência em Clínica Médica pela UNIFESP. Médica Residente em Geriatria e Mestranda
pela UNIFESP.

Aline Tavares Domingos


Enfermeira da Unidade Hospitalar de Geriatria Hospital de São Paulo da Universidade
Federal de São Paulo HSP/UNIFESP. Preceptora da Residência Multiprofissional em
Envelhecimento da UNIFESP

Alisson Venazzi
Graduado em Medicina pela Universidade Estadual do Oeste do Paraná – UNIOESTE.
Médico do Departamento de Clínica Médica do Hospital Sepaco.

IX
Amanda Baptista Aranha
Médica Geriatra Especialista pela Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia – SBGG.
Professora de Geriatria da Universidade Federal do Rio Grande do Norte – UFRN.

Ana Beatriz Galhardi Di Tommaso


Médica Geriatra. Especialista pela Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia – SBGG
e da Comissão Nacional de Residência Médica – CNRM. Preceptora do Ambulatório de
Longevos da Disciplina de Geriatria e Gerontologia da Escola Paulista de Medicina da
Universidade Federal se São Paulo EPM/UNIFESP. Vice-Supervisora do Programa de
Residência Médica em Geriatria e Gerontologia da EPM/UNIFESP.

Ana Laura de Figueiredo Bersani


Médica Especialista em Geriatria pela Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal
se São Paulo – EPM/UNIFESP. Médica Especialista em Sociedade Brasileira de Geriatria
e Gerontologia – SBGG. Médica Especialista em Clínica Médica pela EPM/UNIFESP e
pela Sociedade Brasileira de Clínica Médica/Associação Médica Brasileira – SBCM/AMB.
Assistente do Ambulatório de Dor e Doenças Osteoarticulares da Disciplina de Geriatria e
Gerontologia da UNIFESP. Geriatra do Serviço de Assistência Domiciliar (Home Care) do
Hospital Israelita Albert Einstein – HIAE.

Ana Paula Maeda de Freitas


Nutricionista do Centro de Referência do Idoso – Zona Norte-SP. Especialista em
Gerontologia pela Universidade Federal de São Paulo – UNIFESP. Membro do Núcleo de
Estudos em Espiritualidade da Disciplina de Geriatria e Gerontologia da UNIFESP.

André Daniel Tavares


Geriatra Titulado pela Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia – SBGG. Preceptor da
Unidade Hospitalar da Disciplina de Geriatria e Gerontologia da Escola Paulista de Medicina
da Universidade Federal de São Paulo – EPM/UNIFESP.

Anna Maria Zaragoza Gagliardi


Doutora em Ciência pela Universidade Federal de São Paulo – UNIFESP. Médica Assistente
da Disciplina de Geriatria e Gerontologia da UNIFESP. Médica Responsável pelo Ambulatório
de Primeira Consulta da Disciplina de Geritatria e Gerontologia da UNIFESP.

Antonio Capone Neto


Coordenador Médico do Centro de Terapia Intensiva do Hospital Israelita Albert Einstein
– HIAE. Ex-Professor Visitante do Departamento de Medicina Intensiva do Sunnybrook
Hospital, Universidade de Toronto, Canadá.

Bruno Beraldo
Médico pós graduando da disciplina de Pneumologia da Escola Paulista de Medicina da
Universidade Federal se São Paulo – EPM/UNIFESP.

Carla Bezerra Lopes Almeida


Graduação em Medicina pela Universidade Federal do Ceará – UFC, Campus Sobral.
Especialista em Residência em Clínica Médica pela UFC. Médica Residente em Geriatria
e Mestranda pela Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal se São Paulo –
EPM/UNIFESP.

X
Carolina Lou de Melo
Nutricionista Graduada pela Universidade Federal de São Paulo – UNIFESP. Especialista em
Envelhecimento Pós-Graduada da UNIFESP.

Carolina Toniolo Zenatti


Médica Graduada na Universidade de Medicina de Santo Amaro – UNISA. Residente de
Infectologia do Instituto de Infectologia Emilio Ribas.

Caroline Nunes Santiago


Enfermeira Graduada pela Universidade de São Paulo – USP. Residente do Programa
Multiprofissional em Envelhecimento pela Universidade Federal de São Paulo – UNIFESP.

Clarice Cavalero Nebuloni


Nutricionista da Disciplina de Geriatria e Gerontologia pela Universidade Federal de
São Paulo – UNIFESP. Especialista em Gerontologia dos Hospital das Clínicas da Faculdade
de Medicina da Universidade de São Paulo – HCFMUSP. Gerontóloga pela Sociedade
Brasileira de Geriatria e Gerontologia – SBGG. Membro do Núcleo de Estudos em
Espiritualidade da Disciplina de Geriatria e Gerontologia da UNIFESP.

Cleofa Toniolo Zenatti


Psicóloga, Diretora de Atenção ao Cliente do Residencial Toniolo. Especialização em
Gerontologia Social pelo Instituto Sedes Sapientiae. Especialização em Neuropsicologia pelo
Centro de Diagnóstico Neuropsicológico – CDN. Especialização em Hotelaria Hospitalar pelo
Hospital Israelita Albert Einstein – HIAE.

Clineu de Mello Almada Filho


Médico Geriatra, Doutor em Ciências e Médico Assistente da Disciplina de Geriatria e
Gerontologia da Escola Paulista de Medicina Universidade
Federal de São Paulo – UNIFESP.

Daltro Mizuta Ishikawa


Médico Especialista em Geriatria pela Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia/
Associação Médica Brasileira – AMB/SBGG. Preceptor do Ambulatório de Geriatria da
Disciplica de Geriatria e Gerontologia da UNIFESP.

Daniela Areco
Advogada pela Ordem dos Advogados do Brasil – OAB. Formada pela Faculdade Ruy
Barbosa de Salvador, Bahia. Pós-Graduada em Direito do Estado pela Juspodivm, Salvador.

Dayane Alves da Silva


Graduada em Serviço Social pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC-SP.
Cursando Residência Multiprofissional em Envelhecimento pela Universidade Federal
de São Paulo – UNIFESP. Consultora em projeto "Guia Saúde Popular".

Deborah Carvalho Correia


Médica pela Universidade Estadual do Piauí – UESPI. Clínica Médica pela Universidade
Federal de São Paulo – UNIFESP. Médica Geriatra pela UNIFESP.

XI
Denise Piva
Psicóloga do Centro de Referência do Idoso – Zona Norte – SP. Especialista em
Neuropsicologia do Centro de Estudos em Psicologia da Saúde – CEPSIC – do Hospital das
Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo – HCFMUSP. Membro
do Núcleo de Estudos em Espiritualidade da Disciplina de Geriatria e Gerontologia da
Universidade Federal de São Paulo – UNIFESP.

Eduardo Brandão Elkhoury


Residência Médica em Geriatria pela Universidade Federal de São Paulo – UNIFESP.

Eduardo Canteiro Cruz


Médico Especialista em Geriatria pela Sociedade Brasileira de Geriatria e
Gerontologia/Associação Médica Brasileira – SBGG/AMB. Médico Assistente da Disciplina
de Geriatria e Gerontologia da Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São
Paulo – EPM/UNIFESP. Supervisor do Programa de Residência Médica da Disciplina de
Geriatria e Gerontologia da EPM/UNIFESP. Instrutor do curso TNT (Total Nutrition Therapy)
Geriatria no Brasil.

Erika Chaul Ferreira


Graduação em Medicina pela Universidade Federal de Goiás – UFG. Especialista/Residência
em Clínica Médica pela Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo
– EPM/UNIFESP. Especialista/Residência em Geriatria pela EPM/UNIFESP. Mestranda em
Geriatria pela EPM/UNIFESP.

Félix Martiniano de Magalhães Filho


Médico Geriatra pela Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia/Associação Médica
Brasileira – SBGG/AMB. Médico Preceptor da Disciplina de Geriatria e Gerontologia da
Universidade Federal de São Paulo – UNIFESP.

Fernanda El Ghoz Leme


Graduação em Medicina pela Universidade Federal do Paraná – UFPR. Especialista/
Residência em Clínica Médica pela Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de
São Paulo – EPM/UNIFESP. Médica Residente em Geriatria e Mestranda pela EPM/UNIFESP.

Fernanda Pinheiro da Silva


Nutricionista, Especialista em Envelhecimento pela Universidade Federal de São Paulo –
UNIFESP. Preceptora da Residência Multiprofissional em Envelhecimento da UNIFESP. Mestranda
do Programa de Pós-Graduação em Nutrição da UNIFESP.

Flávia Areco
Médica Geriatra. Especialista pela Escola Paulista de Medicina
da Universidade Federal de São Paulo – EPM/UNIFESP. Titulada pela
Sociedade Brasileira em Geriatria e Gerontologia – SBGG.

Flávia Kurebayashi Fonte


Nutricionista. Especialista em Envelhecimento pela Universidade Federal de São Paulo
– UNIFESP. Colaboradora no Ambulatório de Longevos da Disciplina de Geriatria e
Gerontologia da UNIFESP. Mestranda do Programa de Pós-graduação em Nutrição da
UNIFESP.

XII
Flávio Ferlin Arbex
Médico Pós-Graduando da Disciplina de Pneumologia da Escola Paulista de Medicina
da Universidade Federal de São Paulo – EPM/UNIFESP. Preceptor da Residência de
Pneumologia da EPM/UNIFESP.

Guilherme Liausu Cherpak


Graduação em Medicina pela Universidade Federal de Pernambuco – UFPE.
Especialista/Residência em Clínica Médica pela Escola Paulista de Medicina da
Universidade Federal se São Paulo – EPM/UNIFESP. Médico Residente em Geriatria
e Mestrando pela EPM/UNIFESP.

Helena Regina Comodo Segreto


Professora Associada do Departamento de Oncologia Clínica e Experimental do Setor
de Radioterapia e Coordenadora do Laboratório de Radiobiologia da Escola Paulista de
Medicina da Universidade Federal de São Paulo – EPM/UNIFESP.

Helio Toshio Ouk


Cirurgião Oncológico do Hospital de Câncer de Barretos (2010-2013). Cirurgião Geral
da Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo – EPM/UNIFESP
(2007-2009). Graduação em Medicina da EPM/UNIFESP (2001-2006).

Lanna Lacerda Sampaio Braga


Geriatra Associada a Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia – SBGG e AGS.
Professora de Medicina da UNIFOR. Mestrado em Ciências pela Universidade
Federal de São Paulo – UNIFESP.

Iara Alvite Romano


Graduação em Medicina pela Faculdade de Ciências Médicas e da Saúde da Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo – PUC-SP. Especialista/Residência Médica pelo
Complexo Hospitalar Edmundo Vasconcelos – CHEV. Médica Residente em Geriatria pela
Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo – EPM/UNIFESP.

Ismária Carvalho dos Santos


Graduada em Serviço Social pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC-SP.
Cursando Residência Multiprofissional em Envelhecimento pela Universidade Federal de São
Paulo – UNIFESP. Consultora em projeto "Guia Saúde Popular".

Julia Cabral Martuscello


Geriatra formada pela Universidade Federal de São Paulo – UNIFESP. Membro Titular da
Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia – SBGG. Geriatra Formada pela UNIFESP.

Juliana de Oliveira Gomes


Especialista em Clínica Médica pela Socidade Brasileira de Clínica Médica – SBCM.
Especialista em Geriatria pela Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia/Associação
Médica Brasileira – SBGG/AMB. Preceptora do Ambulatório de Geriatria da Disciplina de
Geriatria e Gerontologia da UNIFESP.

XIII
Juliana Marília Berretta
Graduação em Medicina pela Faculdade de Medicina de Jundiaí – FMJ. Especialista/
Residência em Clínica Médica pela Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo
– ISCMSP. Médica Residente em Geriatria pela Escola Paulista de Medicina da Universidade
Federal de São Paulo – EPM/UNIFESP.

Julliana Lianzza Fernandes Silva


Formada em Medicina pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte – UFRN.
Especializada em Clínica Médica pela Faculdade de Medicina de Botucatu da Universidade
Estadual Paulista – UNESP. Médica Residente de Geriatria e Mestranda pela Universidade
Federal de Sâo Paulo – UNIFESP.

João Toniolo Neto


Professor Adjunto da Disciplina de Geriatria e Gerontologia pela Escola Paulista de Medicina
da Universidade Federal de São Paulo – EPM/UNIFESP.

Karen Andrade Norremose


Neurologista, Membro Titular da Academia Brasileira de Neurologia – ABN.

Karina Kuraoka Tutiya


Médica Geriatra da Disciplina de Geriatria e Gerontologia pela Escola Paulista de Medicina
da Universidade Federal de São Paulo – EPM/UNIFESP.

Karina Pereira
Graduação em Fonoaudiologia pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo
– FMUSP. Fonoaudióloga Residente em Envelhecimento pelo Programa de Residência
Multiprofissional em Saúde da Universidade Federal de São Paulo – EPM/UNIFESP.

Kate Adriany da Silva Santos


Médica pela Universidade Federal do Pará – UFPA. Clínica Médica pelo Hospital do Sevidor
Público Municipal. Médica Geriatra pela Universidade Federal de São Paulo – UNIFESP.

Katia Emi Nakaema


Médica Geriatra. Título pela Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia – SBGG.

Lara Miguel Quirino Araújo


Coordenadora do Ambulatório de Longevos da Disciplina de Geriatria e Gerontologia pela
Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo – EPM/UNIFESP. Mestre
em Ciências e Especialista em Geriatria.

Leila Blannes
Enfermeira Estomaterapeuta. Coordenadora Assistencial de Enfermagem do Hospital
São Paulo. Professora Colaboradora do Programa de Pós-Graduação em Cirurgia
Translacional da Universidade Federal de São Paulo – UNIFESP.
Leonardo Brandão de Oliva
Médico Geriatra Formado na Universidade Federal da Bahia – UFBA. Especialista em Clínica
Médica pela Casa de Saúde Santa Marcelina, São Paulo. Especialista em Geriatria pela Escola
Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo – EPM/UNIFESP. Membro da
Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia – SBGG.

Lessandra Chinaglia
Geriatra Titulada pela Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia – SBGG. Médica
especialista em Geriatria pela Universidade Federal de São Paulo – UNIFESP.

Lia Antonioli
Pedagoga. Mestre no Programa de Integração da América Latina da Universidade de São
Paulo – PROLAN/USP. Aconselhadora Biográfica Escola de Livre de Estudos Biográficos –
ELEB/SP. Especialista em Educação pela Pontifícia Universidade Católica, São Paulo
– PUC/SP. Violência Doméstica do Instituto de Psicologia da USP. Avaliação Educacional
pela Universidade de Brasília – UNB. Cursando Especialização em Gerontologia pela Escola
Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo – EPM/UNIFESP. Membro do
Núcleo de Estudos em Espiritualidade da Disciplina de Geriatria e Gerontologia da UNIFESP.

Licia Caldas Figueiredo


Médica Pós-graduanda da Disciplina de Pneumologia pela Escola Paulista de Medicina da
Universidade Federal de São Paulo – EPM/UNIFESP.

Ligiane Rezende Corral


Médica Especialista em Geriatria pela Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia/
Associação Médica Brasileira – SBGG/AMB. Médica Responsável pelo Programa de
Assistência Domiciliar ao Idoso da Universidade Federal de São Paulo – UNIFESP.

Lilian Mariane Correia Bresque


Formada pela Universidade do Oeste Paulista. Especialista em Clinica Médica pelo Hospital
Municipal Tatuapé. Especialista em Geriatria pela pela Escola Paulista de Medicina da
Universidade Federal de São Paulo – EPM/UNIFESP. Médica Afiliada do Ambulatório de
Geriatria e Gerontologia da EPM/UNIFESP. Pós-Graduada em Medicina Intensiva pelo
Instituto Israelita Albert Einstein – HIAE.

Luciana Zimmermann de Oliveira


Especialista em Clínica Médica pela Sociedade Brasileira de Clínica Médica – SBCM.
Especialista em Geriatria pela Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia – SBGG.
Preceptora da Unidade Ambulatorial da Disciplina de Geriatria e Gerontologia pela Escola
Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo – EPM/UNIFESP.

Luciano Rodrigues de Oliveira


Enfermeiro Graduado pela Universidade de Marília. Especialista em Enfermagem
Gerontológica e Geriátrica pela Universidade Federal de São Paulo – UNIFESP.
Especialista em Gerenciamento de Serviços de Enfermagem pela UNIFESP.
Membro do GEPAG (Grupo de Estudos e Pesquisas em Administração de Serviços de Saúde e
Gerenciamento de Enfermagem) da UNIFESP. Enfermeiro Responsável pelo Serviço
de Desospitalização do Hospital Sírio-Libanês. Enfermeiro do Serviço
de Geriatria e Gerontologia do Hospital Sírio-Libanês.

XV
Lucíola de Barros Pontes
Oncologista Clínica do Hospital Hcor – HCor Onco – e do Instituto Brasileiro de Controle
do Câncer – IBCC. Responsável pelo Ambulatório de Oncogeriatria.

Lucíulo Melo
Graduação em Medicina pela Universidade Federal de Pernambuco – UFPE. Especialista/
Residência em Clínica Médica pela Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de
São Paulo – EPM/UNIFESP. Médico Residente em Geriatria e Mestrando
pela EPM/UNIFESP.

Maisa Carla Kairalla


Médica Geriatra pela Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia – SBGG. Mestrado
pela Universidade Federal de São Paulo – UNIFESP. Preceptora do Serviço de Geriatria e
Gerontologia da UNIFESP.

Marcela Teodoro Lazarini


Assistente Social, Especialista em Serviço Social em Hospital Universitário e Especialista
em Envelhecimento pela Universidade Federal de São Paulo – UNIFESP. Colaboradora
do Ambulatório de Cuidadores da Disciplina de Geriatria e Gerontologia da UNIFESP.
Assessora da Coordenação de Políticas para Idosos da Secretaria Municipal de Direitos
Humanos e Cidadania – SMDHC da Prefeitura de São Paulo.

Marcelo A Starling
Residência Médica em Medicina Física e Reabilitação pela Escola Paulista de Medicina
da Universidade Federal de São Paulo – EPM/UNIFESP. Especializado em Fisiologia do
Exercício pela EPM/UNIFESP. Graduado em Educação Física.

Marcia C. M. Macêdo
Residência Médica em Medicina Física e Reabilitação pela Escola Paulista de Medicina da
Universidade Federal de São Paulo – EPM/UNIFESP. Especialização em Acupuntura pela
EPM/UNIFESP. Título de Especialista em Acupuntura pelo Colégio Médico Brasileiro de
Acupuntura – CMBA.

Márcio Tomita da Rocha Lima


Médico Especialista em Geriatria pela Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia/
Associação Médica Brasileira – SBGG/AMB. Mestre Profissional em Tecnologias e Atenção à
Saúde pela Universidade Federal de São Paulo – UNIFESP.

Maria Carolyna Fonseca Batista


Médica Residente de Clínica Médica – Departamento de Medicina pela Escola Paulista de
Medicina da Universidade Federal de São Paulo – EPM/UNIFESP.

Mariana Celeghini Santiago


Enfermeira Graduada pela Universidade de São Paulo – USP. Especialista em Envelhecimento
pela Residência Multiprofissional em Envelhecimento pela Universidade Federal de São Paulo
– UNIFESP. Enfermeira Gerente de Desenvolvimento e Assistência da Toniolo Attend.

XVI
Mariana de Carvalho da Silva
Médica Formada pela Universidade Federal do Triângulo Mineiro – UFTM. Especialista em
Clínica Médica pelo Hospital Municipal Carmino Caricchio. Médica Residente de Geriatria e
Mestranda pela Universidade Federal de São Paulo – UNIFESP.

Mariane Aiko Simamura


Graduação em Medicina pela Faculdade Evangélica do Paraná – FEPAR. Especialista/
Residência em Clínica Médica pela Faculdade de Medicina da Universidade Estadual Paulista
“Julio de Mesquita Filho” – UNESP. Médica Geriatra Formada pela Disciplina de Geriatria e
Gerontologia da Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo
– EPM/UNIFESP.

Matheus Fernandes de Oliveira


Residente de Neurocirurgia do Hospital do Servidor Público Estadual de São Paulo. Mestrado
pelo Instituto de Assistência Médica ao Servidor Público Estadual de São Paulo – IAMSPE.

Mayra Zanetti
Médica pela Universidade Federal de São Paulo – UNIFESP. Clínica Médica pela UNIFESP.
Médica Geriatra pela UNIFESP.

Maysa Seabra Cendoroglo


Professora Adjunta da Disciplina de Geriatria da Escola Paulista de Medicina/UNIFESP. Mestre
em Epidemiologia e Doutora em Ciências da Nutrição pela Escola Paulista de Medicina da
Universidade Federal de São Paulo – EPM/UNIFESP. Geriatra pela Sociedade Brasileira de
Geriatria e Gerontologia/Associação Médica Brasileira – SBGG/AMB.

Milene Roldan Hirai


Médica Geriatra pela Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo
– EPM/UNIFESP. Médica Geriatra pela Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia –
SBGG. Assistente da Equipe AGI (Avaliação Geriátrica Inicial) da Disciplina de Geriatria e
Gerontologia da EPM/UNIFESP.

Milene S. Ferreira
Residência em Clínica Médica e Medicina Física e Reabilitação pela Escola Paulista de
Medicina da Universidade Federal de São Paulo – EPM/UNIFESP. Especialização em
Geriatria pela EPM/UNIFESP. Doutorado pela Disciplina de Neurologia da EPM/UNIFESP.
Médica do Hospital Israelita Albert Einstein – HIAE.

Myrian Spínola Najas


Docente da Disciplina de Geriatria e Gerontologia da Universidade Federal de São Paulo –
UNIFESP. Especialista em Gerontologia pela Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia
– SBGG. Coordenadora da Residência Multiprofissional em Envelhecimento da UNIFESP.

Naira Dutra Lemos


Assistente Social. Especialista em Gerontologia pela Sociedade Brasileira de Geriatria e
Gerontologia – SBGG. Mestre e Doutora em Ciências da Saúde pela Universidade Federal de
São Paulo – UNIFESP.

XVII
Niele Silva de Moraes
Médica Geriatra. Especialista pela Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia – SBGG
e Comissão Nacional de Residência Médica – CNRM. Preceptora do Ambulatório de Dor e
Doenças Osteoarticulares da Disciplina de Geriatria e Gerontologia pela Escola Paulista de
Medicina da Universidade Federal de São Paulo – EPM/UNIFESP. Preceptora do Programa de
Residência Médica em Geriatria e Gerontologia da EPM/UNIFESP.

Pedro Braga Neto


Neurologista pela Universidade Federal de São Paulo – UNIFESP.
Doutor em Ciências pela UNIFESP. Professor Adjunto do Curso de Medicina
da Universidade Estadual do Ceará – UECE.

Polianna Mara Rodrigues de Souza


Médica Geriatra pela Universidade Federal de São Paulo – UNIFESP. Especialização
em Cuidados Paliativos pela Asociacion Pallium Latinoamerica, com Certificação
de Oxford International Center for Palliative Care. Coordenadora Científica do Comitê
de Dor no Idoso da Sociedade Brasileira para o Estudo da Dor. Médica do Grupo de
Suporte ao Paciente Oncológico do Centro de Oncologia e Hematologia
do Hospital Israelita Albert Einstein – HIAE.

Priscila Gaeta
Médica Especialista em Geriatria pela Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia/
Associação Médica Brasileira – SBGG/AMB. Médica Afiada da Disciplina de Geriatria e
Gerontologia da Universidade Federal de São Paulo – UNIFESP.

Raquel Loiola Moreira


Médica pela Universidade Estadual do Pará – UEPA. Clínica Médica
pelo Hospital Universitário João de Barros Barreto. Médica Geriatra
pela Universidade Federal de São Paulo – UNIFESP.

Regina Helena Genovese


Mestre em Enfermagem pela Universidade Federal de São Paulo – UNIFESP. Especialista
em Enfermagem Pediátrica pela UNIFESP. Especialista em Enfermagem do Trabalho pela
Faculdade São Camilo. Especialista em Administração Hospitalar pela Faculdade São
Camilo. Especialista em Enfermagem em Neonatologia pela UNIFESP. Professora Adjunta da
Universidade Anhanguera – UNIAN. Enfermeira Encarregada do Ambulatório de Geriatria e
Gerontologia da UNIFESP. Enfermeira Encarregada pelo Programa de Assistência Domiciliar
ao Idoso – PADI – da UNIFESP.

Renato Laks
Médico Assistente dos Ambulatórios de Doenças Metabólicas e de Nonagenários da
Disciplina de Geriatria e Gerontologia pela Escola Paulista de Medicina da Universidade
Federal de São Paulo – EPM/UNIFESP. Especialista em Geriatria pela UNIFESP. Especialista
em Geriatria pela Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia – SBGG.

Roberto Araújo Segreto


Professor Associado do Departamento de Oncologia Clínica e Experimental e
Chefe do Setor de Radioterapia pela Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de
São Paulo – EPM/UNIFESP.

XVIII
Roberto Dischinger Miranda
Cardiologista e Geriatra. Chefe do Serviço de Cardiologia da Disciplina de Geriatria e
Gerontologia da Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo
– EPM/UNIFESP. Doutor em Cardiologia pela EPM/UNIFESP. Presidente do Departamento
de Cardiogeriatria da Sociedade Brasileira de Cardiologia – SBC (2010-2011). Vice-Presidente
da Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia – SBGG – Seção São Paulo (2007-2009).
Diretor Clínico do Instituto Longevità.

Roberto Muniz Junior


Médico Assistente e Preceptor de Residentes da UTI do Instituto de Infectologia Emilio Ribas.
Professor de Microbiologia da Faculdade de Medicina da Universidade Metropolitana de Santos.

Rodrigo Souza Dias


Formado em Medicina pela Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São
Paulo – EPM/UNIFESP. Residência em Radio-oncologia pela EPM/UNIFESP. Mestrado
e Doutorado em Radiologia Clínica pela EPM/UNIFESP. Médico Assistente do Setor de
Radioterapia da UNIFESP. Médico Radio-oncologista da Real e Benemérita Sociedade
Portuguesa de Beneficência.

Rodrigo Flora
Médico Geriatra pela Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia/Associação Médica
Brasileira – SBGG;AMB. Médico Preceptor da Disciplina de Geriatria e Gerontologia pela
Universidade Federal de São Paulo – UNIFESP.

Sílvia Cláudia dos Santos Braga


Médica Afiliada da Diciplina de Geriatria e Gerontologia da Universidade Federal de São Paulo
– UNIFESP. Especialista em Clínica Médica pela UNIFESP e pela Associação Médica Brasileira –
AMB. Médica Radioterapeuta pela UNIFESP.

Silvia Marcondes Pereira


Mestre em Dermatologia pelo Departamento de Dermatologia pela Escola Paulista de
Medicina da Universidade Federal de São Paulo – EPM/UNIFESP. Responsável pelo Grupo e
pelo Atendimento Ambulatorial do Grupo de Dermatologia Geriátrica do Departamento de
Dermatologia da EPM/UNIFESP (desde 1999).

Silvia Takahashi Ribeiro e Prado


Graduação em Medicina pela Faculdade de Medicina de Botucatu pela Universidade Estadual
Paulista – UNESP. Residência de Clínica Médica e Geriatria pela Universidade Federal de São
Paulo – UNIFESP – Título de Especialista em Geriatria pela Sociedade Brasileira de Geriatria
e Gerontologia – SBGG.

Tamyris Gonçalves
Graduação em Nutrição pela Universidade Federal da Bahia – UFBA (2011). Especialista/
Residência Multiprofissional em Envelhecimento pela Escola Paulista de Medicina da
Universidade Federal de São Paulo – EPM/UNIFESP.

Tereza Loffredo Bilton


Doutora em Ciências Radiológicas pela Universidade Federal de São Paulo – UNIFESP.

XIX
Thaila Maki Hiraga
Fisioterapeuta pela Universidade Federal de São Carlos – UFSCar. Especializada em
Gerontologia pela Universidade Federal de São Paulo – UNIFESP. Mestranda em
Gerontologia pela Universidade Estadual de Campinas – UNICAMP. Membro do Núcleo de
Estudos em Espiritualidade da Disciplina de Geriatria e Gerontologia da UNIFESP.

Thaisa Segura da Motta


Médica Geriatra da Disciplina de Geriatria e Gerontologia pela Escola Paulista de Medicina
da Universidade Federal de São Paulo.

Thayse Pavan
Médica Oncologista Clínica. Assistente do Hospital Sírio-Libanês.

Thiago Xavier Carneiro


Médico Especialista em Hematologia e Transplante de Medula Óssea. Titulado pela
Comissõa Nacional de Residência Médica – CNRM e Associação Brasileira de Hematologia,
Hemoterapia e Terapia Celular – ABHH. Preceptor do Ambulatório de Hematologia da
Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo – EPM/UNIFESP. Médico
Assistente do Serviço de Onco-Hematologia e Transplante de Medula Óssea
do Hospital Sírio-Libanês.

Tomaz Nunes Mota de Aquino


Graduação em Medicina pela Universidade Federal de Sergipe – UFS. Especialista/Residência
em Clínica Médica pela UFS. Médico Residente em Geriatria pela Escola Paulista de Medicina
da Universidade Federal de São Paulo – EPM/UNIFESP.

Vanessa Akemi Moromizato Hashimoto


Graduação em Medicina pela Universidade Estadual de Campinas – UNICAMP. Especialista/
Residência em Clínica Médica pela UNICAMP. Médica Residente em Geriatria e Mestranda
pela Universidade Federal de São Paulo – UNIFESP.

Vanessa Nishiyama
Graduação pela Universidade Metropolitana de Santos – UNIMES. Especialista/Residência
em Clínica Médica pela Faculdade de Medicina do ABC. Médica Residente em Geriatria e
Mestranda pela Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo
– EPM/UNIFESP.
Dedicatória

“Ao nossos pacientes que nos ensinam,


todos os dias, a valorizar o viver”

XXI
Agradecimentos

“Agradecemos aos nossos familiares, por


compreenderem a nossa ausência em muitos
momentos preciosos diante da dedicação à profissão.

Aos professores, que nos guiaram pela geriatria e nos


instigaram a buscar novos conhecimentos em uma
área ainda pouco difundida em nosso país.

E aos mestres (Dra. Maria Goretti Sales Maciel e


Dr. Toshio Chiba), que nos acolheram em seus
serviços, nos ensinaram a arte de paliar e seguem
como contínua fonte de inspiração”

XXIII
Prefácio

A história deste livro começa em 2010, quando 11 jovens médicos re-


cém-saídos da residência de Clínica Médica de diversos serviços, passa-
ram a compor o novo grupo de residentes de Geriatria da UNIFESP/Escola
Paulista de Medicina.
Naquele ano, foi idealizada e implementada pelo Dr. André Pernam-
buco, a primeira unidade de Cuidados Paliativos do Hospital São Paulo
(Hospital Universitário da UNIFESP), localizada no Pronto Socorro.
Da união do sonho do Dr. André Pernambuco em poder assistir me-
lhor os pacientes com doenças incuráveis, do apoio da Disciplina de Ge-
riatria e Gerontologia da UNIFESP ao abrir espaço para algo tão inovador,
e da vontade dos residentes daquele ano em fazer com que essa ideia se
concretizasse, surgiu o interesse em se aprofundar os estudos em cuidados
paliativos visando melhorar a assistência à população idosa em especial.
Contávamos com uma equipe multiprofissional (médicos, enfermeiros,
fisioterapeutas, nutricionistas, psicólogos, terapeutas ocupacionais, assis-
tentes sociais) que foi se envolvendo com extremo empenho ao longo do
processo, o que estimulou o estudo mais aprofundado do tema por todos.
Em poucos meses nos tornamos reconhecidos como o grupo que assistia
da forma mais ampla e humanizada possível os indivíduos internados.
Ao final dos dois anos de residência médica, ficou a enorme vontade de
dividir com todos os profissionais da área da saúde, gerontólogos ou não,
essa experiência tão rica.
Neste livro, vocês encontrarão uma revisão das evidências científicas
dos últimos 10 anos em cuidados paliativos no geral e em geriatria em
especial. Contamos com a participação de muitos profissionais (desde re-
sidentes até chefes de equipes; geriatras e gerontólogos; profissionais da
saúde ou não): indivíduos que lidam com idosos de alguma maneira em
sua profissão e que são considerados referência em suas áreas.

Boa leitura e bons estudos!

XXV
Sumário

PARTE 1- INTRODUÇÃO AO CUIDADOS PALIATIVOS


1. Conceitos e princípios, 3
Fernanda El Ghoz Leme, Lucíulo Melo, Poliana Mara Rodrigues de Souza

2. Indicações de cuidados paliativos em geriatria, 13


Iara Alvite Romano, Fernanda El Ghoz Leme,
André Castanho de Almeida Pernambuco

3. Interdisciplinariedade e multidisciplinariedade em cuidados


paliativos, 37
Fernanda Pinheiro da Silva, Flávia Kurebayashi Fonte,
Mariana Celeghini Santiago, Marcela Teodoro Lazarini, Myrian Spínola Najas

4. Estratégias de comunicação em cuidados paliativos, 41


Lilian Mariana Correia Bresque, Leonardo Brandão de Oliva,
Cleofa Toniolo Zenatti

5. Bioética e legislação em cuidados paliativos, 49


Flávia Areco, Alexandre Aboud, Daniela Areco

6. Diretivas antecipadas de vontade, 57


Flávia Areco, Alexandre Aboud, Vanessa Akemi Moromizato Hashimoto,
Aline Arlindo Vieira

7. Avaliação do paciente em cuidados paliativos, 63


Ana Beatriz Galhardi Di Tommaso, Ana Laura de Figueiredo Bersani, João Toniolo
Neto, Niele Silva de Moraes, Silvia Takahashi Ribeiro e Prado

8. Prescrição em cuidados paliativos, 73


Ana Beatriz Galhardi Di Tommaso, Ana Laura de Figueiredo Bersani, João Toniolo
Neto, Niele Silvade Moraes, Silvia Takahasshi e Prado

XXVII
9. Vias de Acesso em Pacientes em Cuidados Paliativos, 79
Juliana de Oliveira Gomes, Márcio Tomita da Rocha de Lima

10. Cuidados de enfermagem em paliação - higiene e conforto, 91


Aline Tavares Domingos, Caroline Nunes Santiago, Regina Helena Genovese,
Luciano Rodrigues de Oliviera

11. Nutrição e hidratação em cuidados paliativos no idoso, 97


Fernanada Pinheiro da Silva, Flávia Kurebayashi Fontes,
Juliana de Oliveira Gomes, Luciana Zimmermann de Oliveira

12. Feridas neoplásicas e úlceras por pressão: manejo em


cuidados paliativos, 105
Eduardo Brandão Elkoury, Leila Blannes

PARTE 2- CONTROLE DOS SINTOMAS EM CUIDADOS PALIATIVOS

13. Dor em cuidados paliativos, 117


Ana Laura de Figueiredo Bersani, Niele Silva de Moraes, Fânia Cristina Santos

14. Dispnéia em cuidados paliativos, 139


Ana Laura de Figueiredo Bersani, Niele Silva de Moraes

15. Tosse, hipersecreção de vias aéreas e hemoptise, 149


Alana Menêses Santos, Lessandra Chinaglia

16. Manejo de náuseas e vômitos em cuidados paliativos, 157


Ana Laura de Figueiredo Bersani, Priscila Gaeta

17. Constipação e diarreia em cuidados paliativos, 169


Tomaz Nunes Mota deAquino, Vanessa Nishyiama

18. Soluço, 177


Ana Laura de Figueiredo Bersani, Julia Cabral Martuscello, Daltro Ishikawa

19. Fadiga em cuidados paliativos e no idoso, 183


Erika Chaul de Paula, Mariane Aiko Simamura

20. Anorexia e caquexia, 195


Thaisa Segura da Motta, Karina Kuraoka Tutiya, Eduardo Canteiro Cruz

21. Prurido em cuidados paliativos, 203


Mayra Zanetti, Deborah Correira Carvalho, Silvia Marcondes Pereira

XXVIII
22. Ansiedade e depressão, 209
Carla Bezerra Lopes Almeida, Niele Silva de Moraes,
Ana Beatriz Galhardi Di Tommasco

23. Agitação e delirium, 219


Kate Adriany Santos, Raquel Loiola Moreria, Maisa Carla Kairalla

24. Os sintomas das últimas 48 horas, 227


Ana Beatriz Galhardi Di Tommaso, Márcio Tomita da RochaLima,
Maysa Seabra Cendoroglo

PARTE 3- SITUAÇÕES CRÍTICAS EM CUIDADOS PALIATIVOS

25. Manejo de sangramentos em cuidados paliativos, 233


Katia Emi Nakaema, Thiago Xavier Carneiro

26. Síndrome da compressão medular, 239


Karen Andrade Norremose, Matheus Fernades de Oliveira

27. Síndrome da veia cava superior, 247


Lucíola de Barros Pontes, André Daniel Tavares

28. Obstrução intestinal maligna, 253


Thayse Pavan

29. Hipercalcemia, 259


André Daniel Tavares, Renato Laks

30. Obstrução maligna das vias aéreas, 265


Alisson Venazzi, Alessandra Garcia Braz

PARTE 4- CONTROLE DOS SINTOMAS REFRATÁRIOS

31. Sedação paliativa, 279


Amanda Aranha, Clineu Mello Almada Filho

PARTE 5- ESTRATÉGIAS ADJUVANTES EM CUIDADOS PALIATIVOS

32. Cirurgia paliativa, 289


Mariana de Carvalho da Silva, Helio Toshio Ouki

XXIX
33. Radioterapia paliativa, 297
Silvia Claudia dos Santos Braga, Helena Regina Comodo Segreto,
Robeta Araujo Segreto,Rodrigo Souza Dias

34. C
 ontribuição da medicina física e reabilitação na abordagem do
paciente em cuidados paliativos, 301
Marcia C. M. Macêdo, Marcelo A. Starlng Milene S. Ferreira

35. Espiritualidade e cuidados paliativos em idosos, 311


Ana Paula Maeda de Freitas, Clarice Cavalero Nebuloni,
Denise Piva, Lia Antoniol, Thaila Maki Hiraga

36. A
 tuação do assistente social enquanto mediador no
Processo de luto, 317
Dayane Alves da Silva, Ismária Carvalho dos Santos,
Marcela Teodoro Lazarini, Naira Dutra Lemos

PARTE 6- CUIDADOS PALIATIVOS EM SITUAÇÕES ESPECÍFICAS

37. Síndromes demênciais avançadas, 325


Ana Beartriz Galhardi Di Tommasco, Kátia Emi Nakaema

38. Síndrome da imobilidade, 333


Félix Martiniano de Magalhães Filho, Rodrigo Flora

39. Cuidados paliativos na doença de parkinson, 339


Juliana Lianzza Fernades Silva, Milene Roldan Hirai

40. A
 bordagem fonoaudiológica na doença parkinson, 349
Karina Pereira, Tereza Lofredo Bilton

41. Cuidados paliativos em insuficiência cardíaca, 353


Mariana de Carvalho da Silva, Julliana Lianzza Fenandes Silva,
Roberto Dischinger Miranda

42. Cuidados paliativos em doença respiratória avançada, 363


Maria Carolyna Fonseca Batista, Licia Caldas Figueiredo, Bruno Beraldo,
Flávio Ferlin Arbex

XXX
43. C
 uidados paliativos em doenças neurológicas não doença de
alzheimer e parkinson em idosos, 375
Ianna Lacerda Sampaio Braga, Pedro Braga Neto

44. Cuidados paliativos em neoplasias hematológicas, 387


Thiago Xavier Carneiro

45. Cuidados paliativos no ambiente domiciliar, 395


Iara Alvite Romano, Carolina Lou Melo, Ligiane Rexende Corral

PARTE 7- SITUAÇÕES POLÊMICAS EM CUIDADOS PALIATIVOS

46. Terapia antimicrobiana em cuidados paliativos, 401


Carolina Toniolo Zenatti, Roberto Muniz Junior

47. Alimentação artificial em cuidados paliativos, 407


Guilherme Liausu Cherpak, Lucíulo Melo, Tamyris Gonçalves

48. Cuidados paliativos em unidade de terapia intensiva, 415


Carla Bezerra Lopes Alemida, Guilherme Liausu Cherpak, Antonio Capone Neto

49. Cuidados paliativos na sala de emergência, 425


Juliana Marília Barretta, Lara Miguel Quirino Araujo

XXXI
Parte 1
Introdução aos Cuidados Paliativos

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Conceitos e princípios 1
CAPÍTULO

Fernanda El Ghoz Leme


Lucíulo Melo
Polianna Mara Rodrigues de Souza

O envelhecimento traz novas faces e im- nicas graves, potencialmente ameaçadoras à


plicações em todos os aspectos da vida hu- vida, as quais ocorrem muitas vezes em asso-
mana, coletiva e individualmente. Impõem- ciação e levam ao declínio funcional. 1,2,3
se cada vez mais questões sociológicas e cul- Baseada nesta realidade, por vezes alar-
turais, urgem necessidades de reorientações mante, a Organização Mundial de Saúde
político-econômicas e a imprescindibilidade (OMS) aponta abordagens paralelas a serem
de cuidado específico para idosos – popula- adotadas pelas políticas de saúde públicas
ção que vem aumentando expressivamente e voltadas ao tema: deve-se focar na preven-
de forma acelerada – torna-se premente. ção efetiva de doenças e incapacidades, assim
Estimativas da Organização das Nações como na redução de danos e na preservação
Unidas (ONU) apontam que, em 2050, os da qualidade de vida através da disponibi-
idosos serão em torno de um bilhão e meio lização de suporte adequado àqueles que já
de habitantes em todo o mundo, o que repre- sofrem as consequências de doenças crôni-
sentará cerca de 20% da população mundial. co-degenerativas, irreversíveis e incuráveis.
Pelo Censo Demográfico publicado pelo Ins- Para essas condições, a OMS preconiza como
tituto Brasileiro de Geografia e Estatística valor central o cuidado digno, sensível e cen-
(IBGE), a população acima de 60 anos no trado no paciente e sua família, premissa
Brasil ultrapassava os 20 milhões em 2010. fundamental do Cuidado Paliativo. 4,5
Projeta-se que a população brasileira de ido-
sos em 2060 ultrapasse os 70 milhões, perfa- CONCEITUAÇÃO
zendo mais de 30% da população. Fruto dos A OMS, em 2002, definiu Cuidado Palia-
avanços tecnológicos na área da saúde que tivo como uma abordagem multidisciplinar
culminaram com a transição epidemiológica que visa melhorar a qualidade de vida de
e demográfica iniciada no último século, o pacientes e de seus familiares que enfrentam
envelhecimento populacional proporcionou uma doença ameaçadora de vida, através
um aumento na prevalência de doenças crô- da prevenção e alívio do sofrimento com a
Paliar, etimologicamente, deriva de pallium, que, em latim, significa manto. Palliar, também em
latim, cobrir com manto. 8

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Capítulo 1 - Conceitos e princípios

identificação precoce e acesso impecável aos proposto como um direito humano inter-
sintomas, bem como tratamento da dor e de nacional. 6,9,11
outros problemas de ordem física, psicológi- Desse modo, serviços eficientes de Cui-
ca ou espiritual. 6,7 dados Paliativos devem estar universalmente
O Cuidado Paliativo surge, então, como disponíveis e integrados em todos os níveis
uma necessidade global para a humanidade, de atenção à saúde, tais como hospitais ge-
a fim de melhorar o cuidado dos portadores rais – inclusive em emergências, hospitais de
de doenças potencialmente fatais, de forma reabilitação, ambulatórios, instituições de
mais importante para aqueles que já estão longa permanência, programas comunitários
em fases mais avançadas da doença, em que e atendimento domiciliar, além dos hospices
a chance de cura é muito pequena. Trata-se (estruturas especializadas no provimento de
de uma filosofia de cuidados de saúde que Cuidados Paliativos). Os serviços, idealmen-
combina ciência e humanismo na tentativa te, devem dispor de equipe multiprofissional,
de prevenir e tratar o sofrimento. 6 composta de médicos, enfermeiros, assisten-
O Cuidado Paliativo afirma a vida e en- tes sociais, nutricionistas, fisioterapeutas,
tende a morte como um processo natural psicólogos e capelães, preparada para identi-
(não tem por objetivo o prolongamento da ficar as necessidades dos pacientes e de seus
vida ou a aceleração da morte), integra os as- familiares. Para isso, é imprescindível que se
pectos espirituais e psicológicos, oferece su- desenvolvam políticas públicas de saúde coe-
porte para o paciente viver o mais ativo pos- rentes com a nova realidade que se impõe, as
sível até o fim da vida, promovendo melhora quais visem garantir essa estrutura articula-
da qualidade da mesma (podendo influenciar da de cuidado e promover educação profis-
positivamente no curso da doença), além de sional qualificada.6,9,11
dar suporte à família para conviver com a si- Existem diversos outros termos que têm
tuação de doença. 7,9 sido utilizados nas últimas décadas para se
A abordagem paliativa traz uma mudan- referir aos cuidados frente a uma doença
ça de foco do olhar da doença para o doente e ameaçadora de vida ou mesmo em fase final
para sua família, ou seja, “...acrescentar vida de vida, incluindo: care of the dying (cuidado
aos dias quando não se pode acrescentar dias no processo de morte ), terminal care (cuida-
à vida...”, parafraseando Cicely Saunders, dos terminais*), end-of-life care (cuidado do
uma das grandes responsáveis pelo Cuidado fim de vida*), continuing care (cuidados con-
Paliativo como reconhecido hoje. 10 tinuados*), total care (cuidado total*), holistic
A proposta do Cuidado Paliativo é man- care (cuidado holístico*), comprehensive care
ter uma abordagem que esteja presente desde (cuidado integral*), comfort care (cuidado de
o diagnóstico, mantenha-se concomitante ao conforto*), pain and symptom manegement
tratamento modificador de doença e cresça (manejo de dor e sintomas*) e quality-of-life
em proporção em relação a este, na medida care (cuidados para qualidade de vida*). Mais
em que se aproxima da fase final de vida, recentemente os termos supportive care (cui-
completando o seu objetivo com os cuidados dado de suporte*) e best supportive care (me-
com os familiares após o óbito. 6 lhor cuidado de suporte*) têm ganhado popu-
Existe uma interface e complementa- laridade. Frente a isso, fica evidente a neces-
ridade entre Cuidado Paliativo e direitos sidade de uma padronização, pois estudos já
humanos, uma vez que, independente do demonstram que o termo Cuidado Paliativo
processo de morte ocorrer em meio a mais pode ser confuso para médicos e pacientes.
sofisticada medicina ou com o cuidado Existem diversos termos referentes ao mesmo
mais básico de saúde, as necessidades são assunto, porém não existe uma definição clara
comuns entre todos os seres humanos:
conforto, dignidade e amor. Ao conside- * Correspondência dos termos entre inglês e português, em
rar esse contexto, o Cuidado Paliativo já é tradução livre.

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Capítulo 1 - Conceitos e princípios

para muitos desses. Isso representa uma bar- Services (HHS), o Center for Medicare & Me-
reira tanto para a comunicação (entre a pró- dicaid Services (CMS) e o National Quality
pria equipe ou mesmo entre médico-paciente), Forum (NQF). Nestes, Cuidado Paliativo se
bem como para a pesquisa científica.12 refere ao cuidado centrado no paciente e sua
Recente revisão bibliográfica, publica- família que otimiza a qualidade de vida atra-
da em 2013, teve por objetivo reunir as de- vés de medidas que antecipem, previnam e
finições para estes termos e a frequência em tratem o sofrimento; ao cuidado realizado no
que são utilizados na literatura médica. Em decorrer da doença, acessando as necessida-
relação aos termos best supportive care e su- des físicas, intelectuais, emocionais, sociais e
pportive care, todos os artigos estudados os espirituais, além de facilitar a autonomia do
trouxeram como termos empregados no paciente, o acesso à informação e a possibili-
contexto de controle de sintomas e melhora dade de escolha.9,13
da qualidade de vida e tinham em comum A utilização do termo hospice em sinoní-
como população-alvo os pacientes oncológi- mia a Cuidados Paliativos também motiva
cos. Definições bastante heterogêneas foram confusão em relação a conceitos. Hospices
identificadas para estes termos, os quais não são instituições adequadas para o atendi-
apresentaram definições claras em livros, mento especifico de pacientes em Cuidados
textos ou dicionários médicos. 12 Paliativos. Segundo o Medicare Hospice Co-
Em relação ao termo palliative care ou verage Criteria (critérios conforme o Medi-
palliative medicine, a mesma revisão estudou care – programa do governo federal ameri-
25 artigos. Em sua maioria, 24, os conceitos cano que garante o acesso ao seguro de saú-
foram comuns em incluir qualidade de vida de para determinados americanos, inclusive
e controle de sintomas, em 20 deles incluiu- idosos), hospices são instituições para os
se o cuidado interdisciplinar, em 22 deles, o pacientes que desejam conforto e alívio de
suporte aos cuidadores. Todos os artigos in- sintomas estressores em detrimento aos tra-
tegraram em seus conceitos o suporte ao pa- tamentos que prolonguem a sobrevida e que
ciente com doença avançada ameaçadora de tenham expectativa de vida inferior a seis
vida. A revisão mostrou que o termo palliati- meses. Em relação às definições para hospi-
ve care possuiu definições mais homogêneas ce abordadas na revisão supracitada, os pon-
do que os termos supportive care e best su- tos-chaves abordados nos conceitos foram
pportive care e que a essência é contemplada manejo de sintomas (totalidade dos artigos
pela definição da OMS, bastante utilizada em avaliados), cuidado multidisciplinar, envol-
nosso meio. Entretanto, praticamente meta- vimento dos cuidadores e cuidados após o
de dos artigos revisados referiu o termo pal- falecimento. Menos da metade dos artigos
liative care como confuso. 12 avaliados para este termo discutiu sobre os
A Academia Nacional de Cuidados Pa- critérios de admissão, baseado na sobrevida
liativos (ANCP), criada em 2005, estabele- inferior a seis meses. O hospice foi descrito
ce uma construção conceitual semelhante à nestes artigos com diferentes nuances, tais
OMS e aqui explorada. De modo similar, o como uma filosofia, um sistema, um progra-
National Consensus Project (NCP) for Qua- ma ou uma facilidade. 12,14
lity Palliative Care, organização americana Em termos cronológicos, o conceito de
que tem como um de seus objetivos criar um hospice foi o que surgiu primeiro, seguido
guideline periódico para auxiliar a prática do conceito de palliative care e mais recen-
clínica nos Estados Unidos para promover temente supportive care/best supportive care.
assistência de qualidade, com as melhores Hospice care – já com extensão ao termo pal-
evidências disponíveis em Cuidados Paliati- liative care – apresenta-se muito mais estig-
vos, define a abordagem paliativa em seu gui- matizado devido a sua associação com pro-
deline, publicado em 2013, da mesma forma cesso de fim de vida e morte. Em contraste,
que o US Department of Health and Human termos como supportive care e best supporti-

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Capítulo 1 - Conceitos e princípios

ve care, por serem mais recentes e não provo- • Manter uma comunicação efetiva com
carem essa conotação, têm ganhado popula- familiares e pacientes sobre diagnóstico
ridade por ter menor probabilidade de gerar e prognóstico, assim como as possibili-
essa ansiedade/desconforto em relação à fase dades, riscos e benefícios dos tratamen-
final de vida.12 tos possíveis, e, a partir das decisões
tomadas em conjunto, zelar para que
PRINCÍPIOS E METAS estas sejam respeitadas, reconhecendo
Os princípios do Cuidado Paliativo são que devem, sempre que possível, pre-
entremeados em sua própria conceituação. valecer os direitos e desejos do pacien-
Em suma, são fundamentos básicos e metas a te sobre os de sua família, quando sua
serem exaustivamente buscadas: 10,15,16 condição cognitiva assim permitir;
• Desenvolver de forma sistemática e in- • Auxílio para a família não apenas na
tegrada o acesso às necessidades físicas, doença, como apoio no luto;
psicológicas, sociais e espirituais. Bus- • Abordagem em equipe multiprofissional.
car atingir e manter um nível ótimo de
controle da dor e outros sintomas, utili- Como qualquer prática em saúde, o Cui-
zando-se da melhor evidência científica dado Paliativo também se apoia nos princí-
disponível, garantindo que os doentes pios bioéticos. O termo bioética é um neolo-
tenham acesso imediato a toda medida, gismo derivado do grego bios (vida) e ethike
medicamentosa ou não, necessária para (ética) e pode ser definido como o estudo
o controle adequado dos sintomas; sistemático das dimensões morais, incluindo
• Afirmar a vida e compreender o morrer visão, decisão, conduta e normas das ciências
como uma dimensão esperada do pro- da vida e dos cuidados da saúde, com o apor-
cesso de viver. Incluir medidas que as- te de metodologias éticas em um contexto
segurem aos pacientes os meios que os interdisciplinar. Existem quatro princípios
capacitem a viver da forma mais ativa, bioéticos essenciais: beneficência, autono-
produtiva e plena possível durante todo mia, justiça e a não maleficência.17
o curso da doença, acompanhando suas A beneficência, do latim bonum facere,
modificações ao longo da mesma; tem origem hipocrática e significa fazer o
• Não apressar e nem postergar a mor- bem, exercendo a tarefa protetora, a qual é
te. Não admitir qualquer medida que muito próxima da tarefa cuidadora existen-
abrevie de forma intencional a vida, te na prática médica. É um ato de bondade,
assim como medidas artificiais de pro- uma atuação benevolente, com intenção de
longamento de vida quando as mesmas promover o bem. Este princípio pressupõe
não são indicadas; o que não significa competência específica entre os profissionais
limitação das investigações e tratamen- de saúde para a ponderação dos benefícios e
tos necessários e adequados para cada dos danos através do conceito da proporcio-
situação, mas o uso racional dos mes- nalidade que será discutido adiante. 17, 18,19
mos e a não utilização de medidas con- A autonomia, derivada do grego autos (eu
sideradas fúteis; mesmo) e nomos (regra, autoridade e lei), tra-
• Considerar como unidade de cuidados duz a essência do cuidado paliativo, em que
o paciente e sua família, que devem ser a liberdade de cada ser humano deve ser res-
cuidados e respeitados em seus princí- guardada. A autonomia deve ser suscitada,
pios, culturas e crenças. Oferecer siste- protegida, reforçada e respeitada, devendo
ma de apoio para os mesmos tão ativa- ser evitada qualquer pressão ou imposição,
mente quanto possível até o momento por vezes inconsciente, da equipe profissional
de sua morte, melhorando a qualidade envolvida. O respeito à autonomia passa pelo
de vida e o conforto, segundo a concep- reconhecimento de que pontos de vista indi-
ção dos doentes e seus familiares; viduais embasados em crenças, valores e aspi-

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Capítulo 1 - Conceitos e princípios

rações pessoais podem se sobrepor aos mais respeitando o princípio da autonomia. Essa
comuns da sociedade, porém considerando comunicação pode ser difícil para o médico,
necessário prover o paciente e familiares de visto que muitas vezes há uma solicitação
todas informações técnicas possíveis para me- por parte da família ou do paciente de que
lhores decisões sobre sua assistência. 17,18, 19 não seja revelado tudo sobre a doença. Isso
O princípio da justiça diz respeito à dis- gera um ciclo vicioso denominado “conspi-
tribuição coerente e adequada de deveres e ração do silêncio”, o qual gera novas fontes
benefícios sociais. Defende a oferta a cada de sofrimento para os envolvidos. Existem,
um daquilo que necessita, ou seja, cada um, entretanto, algumas situações em que o si-
na sua individualidade como pessoa e na lêncio poderá ser necessário num primeiro
particularidade de sua condição médica, momento, visando a não maleficência, como,
necessita e tem direito de cuidados apro- por exemplo, em pacientes com quadros de-
priados e equitativos. É justo e de direito, pressivos graves ainda sem tratamento que
portanto, que o paciente portador de doença podem sofrer ainda mais com uma má no-
incurável ameaçadora à vida receba o devi- tícia em momento inapropriado. Portanto, a
do cuidado paliativo. 17,18 verdade deverá ser comunicada, mas sempre
E, por fim, a não maleficência, do latim se atendo cautelosamente a cada caso, ba-
malum non facere, que literalmente se traduz seada sempre nos demais princípios éticos já
por não fazer qualquer tipo de mal ao paciente, discutidos. Devemos sempre prestar atenção
ou seja, não causar lesões ou expô-lo a riscos. em como, quanto, quando, quem e a quem
A máxima médica primum non nocere dá-lhe a informação deverá ser dada, para que essa
destaque: acima de tudo, não fazer o mal. De- verdade seja moralmente boa aos envolvidos. 20
ve-se atuar para que sejam removidas situações O princípio da proporcionalidade te-
prejudiciais, sendo necessária ponderação e rapêutica se propõe a eleger a solução mais
cuidado, bem como a correta avaliação dos ris- razoável para o problema, dentro de cir-
cos e benefícios. Deve-se lembrar que o bene- cunstâncias sociais, econômicas, culturais e
fício e o malefício podem ser dois extremos de políticas envolvidas, sem se afastar dos parâ-
um mesmo ato, dependendo do ponto de vista metros legais. Em outras palavras, devemos
de quem os pratica. 17,18 empregar todas as medidas terapêuticas que
Aliados aos princípios do Cuidado Pa- tenham relação de proporção entre os meios
liativo, os princípios da bioética reforçam empregados e o resultado previsível. 17
a ética da tolerância, da responsabilidade O princípio do duplo efeito se funda-
e da solidariedade para com as questões do menta na Summa Theologiae, de São Tomás
cotidiano e das relações humanas, unindo de Aquino: “Nada impede um ato de ter
as pessoas corresponsáveis no processo de dois efeitos, um que é intencional, enquan-
doença e terminalidade pelo bem umas das to o outro está para além da intenção, vis-
outras e promovendo uma postura conscien- to que é acidental”. Na prática paliativista,
te na arte de cuidar do outro. 17, 19 este princípio ético se refere à permissibi-
Existem ainda os princípios éticos espe- lidade de ações nas quais dois efeitos serão
cíficos da Medicina Paliativa, relevantes aos simultâneos, um bom e outro desfavorável,
pacientes em fases terminais, sendo eles prin- porém previsível, tolerável e com possibili-
cípios da veracidade, da proporcionalidade te- dade de atuação para atenuá-lo numa rela-
rapêutica, do duplo efeito, da prevenção e do ção em que o bem buscado seja proporcio-
não abandono.17 nalmente maior do que o mal eventualmen-
O princípio da veracidade é a base para a te produzido. 17, 20
confiança nas relações interpessoais. Comu- O princípio da prevenção se refere a
nicar a verdade para o paciente e sua família estimar possíveis sintomas e complica-
é um benefício para eles, visto que permite ções oriundos da evolução natural de cada
a participação ativa na tomada de decisão, doença, de forma a adotar medidas para

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Capítulo 1 - Conceitos e princípios

que sejam evitados ou amenizados, bem do paciente. É expressamente diferente de


como aconselhar os familiares sobre as Cuidado Paliativo, eticamente vedada na
melhores ações a serem tomadas para tal prática médica e ilegal no Brasil. 21
situação.17 A distanásia ocorre quando há prolonga-
O princípio do não abandono, por fim, mento da vida de modo artificial, sem pers-
define que, salvo em grave objeção de cons- pectiva de cura ou melhora, por tratamentos
ciência, seria eticamente condenável abando- considerados fúteis. O termo fútil é derivado
nar o paciente que se recusa a determinada da palavra futilis, que significa furado. Os
terapia, mesmo se a mesma for inadequada tratamentos considerados fúteis são aqueles
do ponto de vista médico.17 que não adicionam benefícios concretos ao
paciente e que podem causar esforços inúteis
O PROCESSO DE MORRER, A à restauração da vida, à garantia do bem-es-
EUTANÁSIA E OS CUIDADOS PALIATIVOS tar e ao alívio do sofrimento. 21,23
O desenvolvimento da atenção à saúde, O Cuidado Paliativo, como discorrido
além de causar aumento da longevidade e previamente, entende e ratifica a morte como
mudança no perfil populacional de morbi- processo natural e preza, conceitualmente,
mortalidade (com substituição na prevalên- pela ortotanásia. A ortotanásia pode ser de-
cia de óbito na população adulta/idosa das finida como a “boa morte”: não há interfe-
patologias agudas, relacionadas a infecções, rência no momento da morte, não se procura
epidemias e causas externas, por doenças encurtar o tempo natural de vida nem adiá
crônicas, como neoplasias e doenças car- -lo indevida e artificialmente. A prática da
diovasculares), propiciou uma visão diversa ortotanásia, consoante com a prática de Cui-
do morrer na sociedade moderna. A morte dados Paliativos, visa impedir a distanásia,
no século XXI tende a ser vista como desfe- promovendo tratamentos proporcionais para
cho inesperado, um tabu, uma “derrota” na cada paciente em detrimento de obstinação
batalha, tanto para médicos e equipe como terapêutica. Eticamente, é amparada pelo
para familiares e cuidadores. Tal perspec- Código de Ética Médica (Resolução CFM Nº
tiva ajuda a explicar e se expressa também 1.931, de 17 de setembro de 2009): “Nos casos
na “hospitalização” em relação ao local de de doença incurável e terminal, deve o médi-
morte: no início do século passado, a maio- co oferecer todos os Cuidados Paliativos dis-
ria das pessoas falecia em casa e atualmente poníveis sem empreender ações diagnósticas,
a maioria dos óbitos ocorre em hospitais e terapêuticas inúteis ou obstinadas, levando
outros serviços. 21,22 sempre em consideração a vontade expressa
A possibilidade de inúmeras terapias, do paciente ou, na sua impossibilidade, a de
disponíveis com o avanço da medicina, seu representante legal”. 21,24
além de ter impulsionado o desenvolvi-
mento do estudo da ética médica, suscita PANORAMA HISTÓRICO E
discussões frequentes sobre o prolonga- PERSPECTIVAS FUTURAS
mento artificial da vida em situações extre- Os Cuidados Paliativos têm origem in-
mas, a obstinação terapêutica e a dignida- determinada, já que a assistência a doen-
de ao morrer. Paralelamente, surgem con- tes com doenças graves ou em fase final de
fusões acerca de termos frequentemente vida pode ser confundida até com rituais
envolvidos, como a eutanásia e distanásia religiosos em torno da terminalidade. Os
com o próprio Cuidado Paliativo. Cuidados Paliativos e o Movimento Hospice
A eutanásia, originalmente definida moderno tiveram rápido desenvolvimento
como a “boa morte” (no grego eu – bom e desde a década de 1960, a partir do trabalho
thanatos – morte), pode ser definida como pioneiro de Cicely Saunders, em Londres,
um apressamento do processo de morrer, que trouxe a atenção requerida para o cui-
depois de pedido voluntário e explícito dado necessário no fim de vida de pacientes

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Capítulo 1 - Conceitos e princípios

com doenças avançadas. Cicely teve for- No Brasil, na última década, foram cria-
mação em enfermagem, assistência social e das uma Câmara Técnica em Controle da
posteriormente médica, publicou diversos Dor e Cuidados Paliativos no Ministério da
artigos e revisões. Com ela, surgiram vários Saúde (Portaria MS 3150/2006) e uma Câ-
princípios utilizados em Cuidados Palia- mara Técnica sobre Terminalidade da Vida
tivos atualmente, como o conceito de dor no Conselho Federal de Medicina (Resolução
total (uma abordagem diferenciada da dor CFM 1805/2006), ambas com intuito pareci-
que traz uma visão holística que vai além do de motivar e reconhecer a prática de Cui-
do desconforto físico e inclui questões espi- dados Paliativos. A prática do Cuidado Pa-
rituais, sociais e psicológicas), o uso apro- liativo foi amparada eticamente no Código
priado de opioides para controle de dor e a de Ética Médica, publicado em 2009, como
atenção necessária também para familiares citado anteriormente. O reconhecimento da
e amigos de pacientes terminais. Cicely ain- Medicina Paliativa como área de atuação de
da é reconhecida pela fundação do primeiro diversas especialidades ocorreu em agosto de
hospice moderno, o Saint Christopher’s, em 2011 (Resolução CFM 1973/2011). 30,31,32
Londres, em 1967. Até então, pouco havia O que se vislumbra e espera para o futuro
sido publicado e estudado sobre o cuidado é que os Cuidados Paliativos sejam reais di-
de pacientes sem propostas terapêuticas reitos de todos e uma prática não apenas para
e no Reino Unido havia poucos hospices especialistas, mas sim uma continuidade de
(hospedarias com proposta diferente da cuidados de qualquer médico assistente, in-
atual, ou consistiam em locais de cuidado dependente da especialidade, assim como
especializados em terminalidade/paciente de equipes multidisciplinares, aos pacientes
moribundos, geralmente conduzidos por com doenças graves ou terminais.
fundações religiosas). 25,26,27,28 Para Geriatria e Gerontologia, os Cuida-
Nas últimas décadas, o cuidado de pa- dos Paliativos sempre surgirão como uma
cientes com doenças terminais avançadas e abordagem necessária e constante na vida
o manejo de sintomas durante a trajetória prática. A prática da Medicina Paliativa em
dessas doenças vêm se tornando parte indis- pacientes geriátricos impõe desafio maior:
sociável do tratamento curativo. O modo que a complexidade de multimorbidades nos
esse avanço ocorreu – e ocorre – é parte da idosos, a interação destas múltiplas comor-
história de uma nova especialidade médica, a bidades e seus tratamentos, a necessidade
Medicina Paliativa. A necessidade desse tipo frequente do uso concomitante de inúmeros
de cuidado, mundialmente, entretanto, ain- fármacos e as interações medicamentosas en-
da é bem maior, apesar de progressivamente tre esses; as alterações de metabolização de
haver mais reconhecimento por entidades fármacos próprias do processo de envelheci-
públicas e políticas de saúde. Em estudo mento e, devido a todos esses fatores, a maior
publicado em 2006, com intuito de estimar possibilidade de iatrogenia. É fundamental
a oferta de Cuidados Paliativos em todo o que o profissional responsável pelos Cui-
mundo, apenas 115 de 234 países estudados dados Paliativos de idosos saiba considerar
possuíam serviços estabelecidos de hospice/ com todas essas variáveis. Além disso, e tão
Cuidados Paliativos. Em apenas 35 desses importante quanto, ao se falar em Cuidados
115 países havia integração com serviços de Paliativos em idosos, levar em consideração
saúde tradicionais com política estruturan- todo um entrelaçado de história, vivências e
te de reconhecimento. O mesmo estudo, em os laços afetivos construídos ao longo da vida
2013, mostrou a existência de serviços em 136 que podem ser fragilizados em situações ad-
países. Tais dados contrastam com as reais versas, como doenças crônicas com incapaci-
necessidades globais: estima-se que 60% dos dades funcionais ou terminais. 33
pacientes que vão a óbito em todo o mundo O envelhecimento progressivo e a ace-
teriam benefício da proposta paliativa.26,29 lerado da população, conforme comentado

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Capítulo 1 - Conceitos e princípios

previamente, tornam mister o conhecimento 7. WORLD HEALTH ORGANIZATION.


básico de Cuidados Paliativos em Geriatria Definition of Palliative Care. Disponí-
e Gerontologia para todos profissionais de vel em: www.who.int/cancer/palliative/
saúde: invariavelmente, todos estarão envol- definition/en/.
vidos com pacientes idosos e suas especifici- 8. HOUAISS, ANTONIO (ED.). Grande Di-
dades, em diferentes níveis de complexidade. cionário Houaiss da Língua Portuguesa.
O reconhecimento desse panorama é funda- Disponível em: www.houaiss.uol.com.br.
mental para progressiva estruturação de ser- 9. NATIONAL CONSENSUS PROJECT. Cli-
viços e políticas públicas, além de incentivo nical practice guidelines for quality pallia-
à pesquisa e educação/formação de recursos tive care. Ed 3. Pittsburgh. 2009. Dispo-
humanos, especialmente voltados para a po- nível em: www.nationalconsensusproject.
pulação geriátrica. 4,5 org/guideline.pdf.
10. BERTACHINI L, PESSINI L. O que en-
“...me importo pelo fato de você ser tender por Cuidados Paliativos. São
você até o último momento de sua Paulo, Paulus. 2006.
vida, e faremos tudo o que estiver 11. BRENNAN F, GWYTHER L, HARDING
ao nosso alcance, não somente para R. Palliative Care as a Human Right.
ajudá-lo a morrer em paz, mas para Open Society Institute. Disponível em:
você viver até o dia de sua morte...” hospicecare.com/uploads/2011/8/pallia-
tive_care_human-right_brennan_gwy-
Cicely Saunders ther_harding.pdf.
12. HUI D, LA CRUZ M, MORI M, PARSONS
HA, KWON JH, TORRES-VIGIL I, ET
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População do Brasil por sexo e idade. Brasília, and textbooks. Support Care Cancer.
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envelhecimento da população mundial: um vos. Disponível em: www.paliativo.org.br.
desafio novo. Revista de Saúde Pública. São 14. INSTITUTE FOR CLINICAL SYSTEMS
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10

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Capítulo 1 - Conceitos e princípios

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Direito Penal brasileiro. Revista Bioética. coes/cfm/2011/1973_2011.htm.
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11

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Indicações de cuidados
paliativos em Geriatria 2
CAPÍTULO

Iara Alvite Romano


Fernanda El Ghoz Leme
André Castanho de Almeida Pernambuco

O envelhecimento associa-se ao aumen- ciplinar para prevenção e alívio dos sinto-


to de doenças crônicas e degenerativas. En- mas que causam desconforto e melhora da
tre as doenças crônicas mais comuns desta- qualidade de vida do doente e de seus fa-
cam-se: doença pulmonar obstrutiva crôni- miliares2,6. Assim, Cuidados Paliativos não
ca (DPOC), insuficiência cardíaca, doenças se limitam apenas aos cuidados de fim da
cerebrovasculares, doença renal crônica e vida, mas atuam em concomitância com
doença hepática avançada, que se caracte- tratamento da doença de base, para o con-
rizam por longos períodos de exacerbações trole dos sintomas de doenças crônicas gra-
sintomáticas, recorrentes hospitalizações, ves e das comorbidades durante anos, com
sofrimento físico e psicológico, declínio imprevisível tempo até a morte.7,8
funcional com evolução para terminalida- O envelhecimento da população mostra as
de e morte.2,3,4 novas necessidades de mudanças nos Cuidados
Diferentemente da evolução das neopla- Paliativos, modificando o conceito de cuidado
sias que apresentam no curso da doença um apenas no fim da vida, para assistência ofereci-
período de estabilidade com posterior declí- da aos pacientes em qualquer momento da tra-
nio acelerado, principalmente em sua fase jetória de doenças crônicas em conjunto com as
terminal, as doenças crônicas podem apre- terapias que prologam a vida.
sentar múltiplas e frequentes exacerbações
que levam à perda de funcionalidade e fre- CRITÉRIOS DE INCLUSÃO
quentemente à morte2,5. Cuidados paliativos em sua clássica defi-
Cuidados paliativos em Geriatria envol- nição estão indicados para aqueles pacientes
vem tratamento da doença de base, controle que esgotaram todas as possibilidades de tra-
das diversas comorbidades associadas (dia- tamento de manutenção ou prolongamento
betes, hipertensão, osteoartrose) e das sín- da vida, que apresentam sofrimento modera-
dromes geriátricas (incontinência urinária, do a intenso e que optam por manutenção do
comprometimento cognitivo, delirium, fra- conforto e dignidade da vida9,10.
gilidade, distúbios visuais e auditivos, alta Um dos critérios mais discutidos é o
propensão a quedas, imobilidade, úlceras que se refere ao prognóstico e ao tempo
de pressão), visando a integração intedis- de vida do paciente. A maioria dos guideli-

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Capítulo 2 - Indicações de cuidados paliativos em Geriatria

nes consideram expectativa de vida de seis Cuidados Paliativos; declínio de 40% para
meses para indicação de Cuidados Palia- 30% indica maior assistência domiciliar ou
tivos.11,12,13 Esse é um conceito importado hospice; queda de 20% para 10% indica ter-
do Medcare americano como critério de minalidade21. Outra escala que também au-
admissão em hospice,13,14,15 principalmente xilia na avaliação funcional é a escala de de-
aplicável a pacientes com doenças oncoló- sempenho de Zubrog (ECOG).21 (tabela 2.3)
gicas. Estimar prognóstico e evolução na Essas escalas, no entanto, foram desen-
maioria das doenças crônicas é uma tarefa volvidas para doentes oncológicos e assim
difícil, depende do julgamento clínico, da tendem a subdiagnosticar o comprometi-
complexidade da enfermidade, dos acha- mento funcional em idosos22. Uma forma
dos clínicos, da resposta terapêutica, de co- de complementar a avaliação de funciona-
morbidades, de fatores psicossociais e da lidade nesses pacientes é a avaliação das
velocidade de declínio funcional16.17. Nos atividades básicas diárias (Katz tabela 2.4)
pacientes geriátricos também deve-se levar e das instrumentais (Lawton tabela 2.5). As
em consideração a presença de síndromes atividades básicas são aquelas que se refe-
geriátricas, que podem ser definidas como rem ao autocuidado: tomar banho, vestir-
um grupo de sinais e sintomas que ocorrem se, promover higiene pessoal, transferir-se
com maior frequência nessa população, em da cama para cadeira, ter continência e ca-
especial nos idosos frágeis, e resultam não pacidade de alimentar-se. Já as instrumen-
só de doenças específicas, mas de múltiplos tais referem-se à realização de tarefas mais
déficits cumulativos, que levam à declínio complexas, como arrumar a casa, telefonar,
funcional e dependência. As principais sín- viajar, fazer compras, preparar alimentos,
dromes geriátricas são: delirium, demên- controlar e tomar remédios e administrar
cias, imobilidade, úlceras por pressão, fra- finanças. O comprometimento da funciona-
gilidade, incontinência e iatrogenia18. lidade gera significativo impacto negativo
A maioria dos modelos prognósticos não na qualidade de vida, podendo causar vul-
mostrou sensibilidade nem especificidade nerabilidade e dependência.23
para estimar a sobrevida em seis meses ou Outro instrumento que pode ser asso-
menos em idosos com doenças não neopla- ciado à funcionalidade na decisão de Cui-
sicas17,20. O status performance tem se mos- dados Paliativos é a avaliação dos sintomas.
trado uma ferramenta útil na avaliação da O número de sintomas e sua intensidade
sobrevida de pacientes com doenças crôn- têm correlação significativa com o perfor-
cias avançadas.9,17,20 Dentre as escalas mais mance status e com o prognóstico7,17. Sin-
utilizadas para avaliação de performance tomas como dispneia, disfagia, fadiga, ano-
status, destaca-se a de Karnofsky (tabela rexia e comprometimento cognitivo têm
2.1), desenvolvida para pacientes com cân- sido associados a uma menor sobrevida em
cer com objetivo de documentar declínio pacientes oncológicos17. Em pacientes ido-
clínico do paciente, avaliando sua capacida- sos com doenças crônicas, a prevalência de
de de realizar atividades básicas. A maioria sintomas é alta e muitas vezes esses não são
dos pacientes com pontuação inferior a 70% reconhecidos7,24,25,26,27.
tem indicação precoce de assistência em Existem diversas escalas validadas
Cuidados Paliativos, e performance de 50% para avaliação da presença e da intensida-
indica terminalidade.9 de dos sintomas7. A Edmonton Symptom
Outro instrumento disponível para ava- Assessment Scale (tabela 2.6)14 é um ins-
liação de funcionalidade, condição clínica e trumento valioso nessa tarefa. Consiste
prognóstica do paciente é a Escala de Perfor- de um questionário com nove sintomas e
mance Paliativa (PPS) (tabela 2.2). Declínio um décimo de livre escolha do paciente. A
do PPS de 70% para 60% sugere prognóstico cada sintoma solicita-se ao paciente que
de menos de seis meses e indica o início de atribua uma nota de 0 a 10, sendo 0 au-

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Capítulo 2 - Indicações de cuidados paliativos em Geriatria

Tabela 2.1 - Escala de Performance de Karnofsky


100% Sem sinais ou queixas, sem evidência de doença
90% Mínimos sinais e sintomas, capaz de realizar suas atividades com esforço
80% Sinais e sintomas maiores, realiza suas atividades com esforço
70% Cuida de si mesmo, não é capaz de trabalhar
60% Necessita de assistência ocasional, capaz de trabalhar
50% Necessita de assistência considerável e cuidados médicos frequentes
40% Necessita de cuidados médicos especiais
30% Extremamente incapacitado, necessidade de hospitalização, mas sem iminência de morte
20% Muito doente, necessita de suporte
10% Moribundo, morte iminente
Fonte: www.inca.gov.br/rbc/n_48/v02/pdf/condutas3.pdf

Tabela 2.2 - Palliative Performance Scale (PPS)


Atividade e evidência
% Deambulação Autocuidado Ingesta Nível de consciência
de doença
Atividade normal e trabalho sem
100 Completa Completo Normal Completo
evidência de doença
Atividade normal e trabalho,
90 Completa Completo Normal Completo
alguma evidência de doença
Atividade normal e trabalho, Nomal ou
80 Completa Completo Completo
alguma evidência de doença reduzida
Incapaz para o trabalho, doença Normal ou
70 Reduzida Completo Completo
significativa reduzido
Incapaz para hobbies/trabalho Assistência Normal ou Completo ou períodos de
60 Reduzida
doméstico, doença significativa ocasional reduzida confusão
Maior parte do
Incapacitado para qualquer Assistência Normal ou Completo ou períodos de
50 tempo sentado
trabalho, doença extensa considerável reduzida confusão
ou deitado
Maior parte do Incapaz para a maioria das Assistência Normal ou Completo ou
40
tempo acamado atividades, doença extensa quase completa reduzida sonolência,+/- confusão
Totalmente Incapaz para qualquer atividade, Dependência Normal ou Completo ou
30
acamado doença extensa completa reduzida sonolência,+/- confusão
Mínima a
Totalmente Incapaz para qualquer atividade, Dependência Completo ou
20 pequenos
acamado doença extensa completa sonolência,+/- confusão
goles
Cuidados
Totalmente Incapaz para qualquer atividade, Dependência Sonolência ou coma,+/-
10 com a
acamado doença extensa completa confusão
boca
0 Morte
Fonte: Victoria Hospice Society. J Pall Care, v9, n4, p 26-32. Tradução livre Maria Goretti Maciel/Ricardo Tavares de Carvalho

Tabela 2.3 - Escala de desempenho de Zubrod – ECOG


PS0 Completamente ativo; capaz de realizar todas as suas atividades sem restrição
PS1 Restrição a atividades físicas rigorosas; é capaz de trabalhos leves e de natureza sedentária
Capaz de cuidar de si totalmente, mas incapaz de realizar qualquer atividade de trabalho; ambulatorial e não
PS2 acamado em mais de 50% do tempo. Ocasionalmente necessita de assistência
Capaz de realizar somente autocuidados limitados, confinado ao leito ou cadeira mais de 50% das horas em que
PS3 o paciente está acordado. Ambulatorial 50% do tempo ou menos. Cuidados constantes
Completamente incapaz de realizar autocuidados básicos, totalmente confinado ao leito ou à cadeira. Pode
PS4 necessitar de hospitalização

Fonte: www.cbc.org.br/upload/emc/autoavaliacao/concologica/1/04_avaliacao_paciente.htm
www.inca.gov.br/rbc/n_48/v02/pdf/condutas3.pdf

15

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Capítulo 2 - Indicações de cuidados paliativos em Geriatria

sência de sintomas e 10, a sua maior inten- CUIDADOS PALIATIVOS


sidade. Inclui sintomas objetivos e subje- EM SITUAÇÕES ESPECÍFICAS
tivos. Na avaliação sintomática dos idosos
deve-se considerar comprometimento Oncologia
cognitivo, visual, auditivo e motor, assim A maioria dos guidelines considera como
a aplicação da escala de sintomas pode ser paliativo o paciente com câncer avançado
classificada com palavras leve, moderada, com piora do performance status, metátases
severa ou por uma escala pictória visual e/ou outras comorbidades graves, persistêcia
para facilitar a análise7. dos sintomas apesar do tratamento otimi-
Em pacientes com comprometimento zado ou fragilidade que impeça tratamento
cognitivo, a avaliação dos sintomas fica oncológico14,33,34.
prejudicada. Dessa forma, uma avaliação Estima-se que 50 a 60% dos casos novos
mais frequente, informações dos cuida- de câncer nos Estados Unidos ocorrem em
dores, atenção a distúrbios de humor, de- pessoas com 65 anos ou mais e mais de 70%
clínio funcional e mudanças de compor- das mortes acontecem nesse grupo. A proba-
tamento podem auxiliar na identificação bilidade de desenvolver câncer na população
de sintomas28,29. de 70 anos ou mais é de 37,8%. Dessa forma,
Duas revisões sistemáticas avaliaram a maioria dos pacientes que necessitarão de
critérios prognósticos em idosos com Cuidados Paliativos será idosa35. Os tipos
doenças crônicas, e os sintomas que mais mais comuns de neoplasias nas mulheres são
se associaram com preditores de sobre- de mama, pulmão e colorretal e nos homens
vida foram alta depêndencia funcional, são de pulmão, próstata e colorretal. O prog-
presença de comorbidades, desnutrição, nóstico para qualquer paciente depende da
perda de peso e alterações laboratorias, extensão do tumor ao diagnóstico e da res-
porém nenhum relacionado a uma doen- posta ao tratamento (cirurgia, quimioterapia
ça específica19,30. ou radioterapia)5.
Diversos guidelines13,31,32 que utilizam ca- Comorbidades e alterações fisiológicas
racterísticas clínicas de doenças avançadas decorrentes do envelhecimento podem limi-
têm sido utilizados na identificação de pacien- tar a capacidade do paciente em tolerar a te-
tes candidatos à paliação, porém é importante rapia antineoplásica. Além disso, o processo
ressaltar que eles auxiliam na decisão clínica de envelhecimento pode estar associado com
de paliação, mas em sua maioria não possui a diminuição de reserva afetando múltiplos
relação direta com o prognóstico de sobrevi- sistemas fisiológicos. Isso pode ser manifes-
da. Assim, status funcional e graduação dos tado como fragilidade e pode interferir no
sintomas têm grande relação com prognós- estado funcional do paciente, mesmo na au-
tico de pacientes com doenças graves avan- sência de comorbidades específicas22.
çadas e podem ser utilizados na avalição da A Avaliação Geriatrica Ampla (AGA)
necessidade de Cuidados Paliativos. Porém, tem se mostrado de grande valia na abor-
na população geriátrica, a alta prevalência de dagem do idoso portador de câncer, pois
comorbidades, além de diversas condições em seus domínios inclui: avaliação de co-
como demência, delirium, incontinência uri- morbidades, das condições socioeconômi-
nária, polifarmácia e fragilidade, mostram a cas, dependência funcional, identificação
necessidade de uma avaliação complemen- de fragilidade, condições emocionais e
tar e cuidadosa. Ainda faltam evidências e cognitivas e avaliação grosseira da expec-
diretrizes na condução desses pacientes que tativa de vida, com base no estado fun-
abordem os diversos sintomas das doenças cional, comorbidades, cognição, presença
crônicas em estágio avançado e os índices ou ausência de síndromes geriátricas. A
prognósticos de sobrevida principalmente AGA 36 permite a classificação do idoso
na população geriátrica. com câncer em três estágios:

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Capítulo 2 - Indicações de cuidados paliativos em Geriatria

Tabela 2.4 - Escala de Atividades Básicas de Vida Diária


Atividade Sim Não
Banho: não recebe ajuda ou somente recebe ajuda para parte do corpo 0 1
Vestir-se: pega as roupas e se veste sem ajuda (exceto amarrar sapato) 0 1
Higiene pessoal: vai ao banheiro, usa o banheiro, veste-se sem ajuda (exceto amarrar
0 1
sapato)
Transferência: deitar, sentar e levantar sem auxílio (pode usar andador ou bengala) 0 1
Continência: controla completamente urina e fezes 0 1
Alimentação: come sem ajuda
0 1
(exceto cortar carne ou passar manteiga no pão)

Pontuação: 6= independente; 4= dependência parcial; 2= dependência importante

Modificado de Katz et al.Jama 185 (12):914-916, 1963

Tabela 2.5 - Escala de Atividades Instrumentais de Vida Diária (LAWTON)


Atividades 3 (sem ajuda) 2 (ajuda parcial) 1 (não consegue)
Usar telefone
Ir a um lugar distante
Fazer compras
Preparar as próprias refeições
Trabalhos domésticos
Trabalhos manuais e reparos na casa
Lavar e passar roupas
Manuseio da medicação
Cuidar das finanças

Pontuação: 9= totalmente dependente; 10 a 15= dependência grave; 16 a 20= dependência moderada; 21 a 25=
dependência leve; 25 a 27= independência

Modificado Lawton, Brody, 1969

Tabela 2.6 - Escala de Avaliação de Sintomas de Edmonton - ESAS


Avaliação de sintomas
Data: Preenchido por:
Por favor, circule o que melhor descreve a intensidade dos seguintes sintomas neste
momento (também se pode perguntar a média durante as últimas 24 horas).
Sem dor 0 – 1 – 2 – 3 – 4 – 5 – 6 – 7 – 8 – 9 – 10 Pior dor possível
Sem cansaço 0 – 1 – 2 – 3 – 4 – 5 – 6 – 7 – 8 – 9 – 10 Pior cansaço possível
Sem náusea 0 – 1 – 2 – 3 – 4 – 5 – 6 – 7 – 8 – 9 – 10 Pior náusea possível
Sem depressão 0 – 1 – 2 – 3 – 4 – 5 – 6 – 7 – 8 – 9 – 10 Pior depressão possível
Sem ansiedade 0 – 1 – 2 – 3 – 4 – 5 – 6 – 7 – 8 – 9 – 10 Pior ansiedade possível
Sem sonolência 0 – 1 – 2 – 3 – 4 – 5 – 6 – 7 – 8 – 9 – 10 Pior sonolência possível
Muito bom apetite 0 – 1 – 2 – 3 – 4 – 5 – 6 – 7 – 8 – 9 – 10 Pior apetite possível
Sem falta de ar 0 – 1 – 2 – 3 – 4 – 5 – 6 – 7 – 8 – 9 – 10 Pior falta de ar possível
Melhor sensação de Pior sensação de
0 – 1 – 2 – 3 – 4 – 5 – 6 – 7 – 8 – 9 – 10
bem-estar possível bem-estar possível
Outro problema 0 – 1 – 2 – 3 – 4 – 5 – 6 – 7 – 8 – 9 – 10

Fonte: Regional Palliative Care Program, Capital Health, Edmonton, Alberta, 2003.
Traduzido e adaptado ao português por Neto, IG. 2006

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Capítulo 2 - Indicações de cuidados paliativos em Geriatria

• Pacientes funcionalmente indepen- cerbações e presença de comorbidades46.


dentes e sem comorbidades, candidatos A DPOC é uma doença sistêmica, carac-
a qualquer modalidade de tratamento terizada por alta prevalência de comorbida-
oncológico. des, como doença cardiovascular, perda de
• Pacientes frágeis (dependentes de ter- massa muscular e osteoporose, provavel-
ceiros para execução de uma ou mais mente ligadas por um mecanismo comum
atividades vitais diárias, portadores de relacionado à resposta inflamatória sistêmi-
três ou mais comorbidades e/ou de uma ca45,46. Depressão, ansiedade e desnutrição
ou mais síndrome geriátricas candida- também são comuns em idosos com DPOC.
tos apenas ao tratamento paliativo) Na doença pulmonar avançada predominam
• Pacientes que se situam entre os dois dispneia, fadiga, ansiedade, isolamento so-
estágios e que podem se beneficiar de cial e diminuição da capacidade funcional47.
uma abordagem farmacológica espe- A progressão da doença é evidenciada
cial, tal como redução da dose inicial pelo aumento de visitas à emergência por
da quimioterapia com subsequente es- exacerbações (duas em seis meses), hospitali-
calonamento. zações (uma por ano) por infecção pulmonar
Idosos com doenças neoplásicas apre- ou insuficiência respiratória. Necessidade de
sentam limitações nas atividades básicas e ventilação mecânica invasiva ou ventilação
instrumentais. Dois estudos multicêntricos não invasiva contínua durante a exacerbação
demostraram que pacientes com baixo status sugerem prognóstico de seis meses44.
funcional apresentavam maior toxicidade à Alguns indicadores sugerem abordagem
quimioterapia.37,38,39 paliativa na doença pulmonar crônica avan-
Em pacientes geriátricos com neopla- çada, são eles: volume expiratório no pri-
sia, perda de peso mostrou-se um fator in- meiro segundo (VEF1<30%), perda de peso
dependente de sobrevida e esteve associa- significativa, declínio no status funcional,
do com baixo performance status e com múltiplas admissões hospitalares, estimativa
baixa resposta à quimioterapia em alguns de sobrevida menor que seis meses, paciente
estudos35,40,41. expressa o desejo de morrer44,47.
Mais da metade dos casos de câncer Os NHO Medical Guidelines for Non-
ocorre na população idosa. Isso mostra a cancer Disease13 sugerem como critérios de
importância dos cuidados visando ques- doença avançada: hipoxemia (pO2 menor
tões geriátricas na abordagem, tratamento ou igual à 55mmHg na gasometria arterial
das neoplasias e nos cuidados de fim de ou saturação menor que 88% em oximetria
vida dessa população. de pulso), hipercapnia (pCO2 maior que 50
mmHg em gasometria arterial), evidência de
Doenças pulmonares cor pulmonale (sobrecarga de câmaras direi-
DPOC é a quarta causa de morte entre tas) e taquicardia (mais do que 100 batimen-
pessoas na faixa etária de 70 a 90 anos, com tos por minuto).
decréscimo na qualidade de vida. Estima-se
que em 2020 será a terceira causa de morte Doença vascular cerebral
em todo o mundo43,44. As doenças cerebrovasculares têm alta
O diagnóstico é feito através da espirome- prevalência em todo o mundo. Estima-se que
tria que demonstra uma relação VEF1/CVF haja 500 mil casos novos ou recorrentes de
menos que 0,7 após broncodilatador, porém acidente vascular cerebral (AVC) por ano nos
em idosos podem ocorrer falsos positivos45. Estados Unidos, dos quais 150 mil resultam
Segundo as recomendações da Global Initia- em morte48. Oitenta por cento dessas mor-
tive for Chronic Obstrutive Pulmonar Disea- tes foram decorrentes de evento isquêmico,
se (GOLD), 2011, o estadiamento é feito com 10 a 15% de hemorragia intracerebral e 5 a
base na gravidade dos sintomas, risco de exa- 10% de hemorragia subaracnóide ou hema-

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Capítulo 2 - Indicações de cuidados paliativos em Geriatria

toma subdural. A maioria das mortes ocorre funcionalidade, maior propensão a morrer
durante o estágio agudo (trinta dias após o na hospitalização e menos sintomas físicos
evento) e até 50% das mortes por acidente e psicológicos em relação aos pacientes com
vascular encefálico ocorrem no hospital. Dos doença crônica.
pacientes que sobrevivem, 30% desenvolvem Em 2004, a National Clinical Guidelines
incapacidades permanentes e 20% necessi- for Stroke incluiu uma pequena seção sobre
tam de até três meses de hospitalização49. os benefícios das intervenções paliativas,
Apesar disso, existem poucos estudos e principalmente no controle dos sintomas51.
seviços de abordagem de Cuidados Paliativos Os NHO Medical Guidelines for Non-can-
em paciantes com AVC. Esses pacientes pos- cer Disease52 sugerem como critérios de gra-
suem um alto grau de dependência e comor- vidade e admissão em hospice pacientes em
bidades49. Um estudo realizado com pacien- coma que apresentem os seguintes critérios:
tes internados por evento isquêmico agudo coma ou estado vegetativo com duração de
mostrou que até metade dos pacientes tinha mais de três dias do evento isquêmico ou he-
queixa de fraqueza, sensação de cansaço e so- morrágico; no AVC pós-anóxico, coma ou
nolência. Cinquenta por cento dos pacientes obnubilação grave acompanhados por mio-
relatavam dor, problemas de memória, dores clonia grave, persistência por mais de três
de cabeça e ainda queixas de problemas de dias após o evento anóxico; pacientes coma-
mobilidade, medo de cair, ansiedade e soli- tosos com qualquer uma das quatro caracte-
dão50. Esse mesmo estudo demonstrou que rísticas a seguir no terceiro dia de coma: res-
há falta de programas de abordagem paliati- posta anormal do tronco cerebral, resposta
va específica para esses pacientes. Em Hollo- verbal ausente, resposta ausente à retirada de
way49 et al, um estudo de seguimento de três dor, creatinina sérica maior que 1,5 mg/dl ou
anos de pacientes admitidos em um serviço idade maior que 70 anos. Para pacientes na
de Cuidados Paliativos comparou as neces- fase crônica do AVC, trinta dias após AVC,
sidades de pacientes com acidente vascular os critérios prognósticos são: escala de per-
cerebral e outras doenças crônicas como cân- formance status (PPS) menor ou igual a 40%,
cer, insuficiência cardíaca, doença pulmonar perda de peso maior que 10% em seis meses
obstrutiva crônica e demência. Os pacien- ou menos, albumina sérica menor que 2,5,
tes que sofreram eventos agudos cerebrais demência pós-AVC equivalente ao estágio 7C
hemorrágicos ou isquêmicos tinham pior da escala FAST, pneumonia aspitativa, infec-

Tabela 2.7 - Escore ICH

Escore de predição de mortalidade em 30 dias após hemorragia intracerebral

Somar os escores dos seguintes itens:


• Escala de Coma de Glasgow 3 a 4 (=2 pontos); 5 a 12 (=1 ponto) e 13 a 15 (=0 ponto)
• Hemorragia intracerebral de volume > 30 ml (1 ponto), volume < 30 ml (=0 ponto)
• Presença de extensão intraventricular da hemorragia (=1 ponto); ausente (= 0 ponto)
• Origem infratentorial: sim (= 1 ponto); não (= 0 ponto)
• Idade > ou igual a 80 anos (= 1 ponto) < 80 anos (= 0 ponto)

Escore total Mortalidade em 30 dias


1 13%
2 26%
3 72%
4 97%
5 100%

Adaptado de Baker NK. Enhancing the Quality of Life for Advanced Dementia Patients. Health
Prog. 2008;89(4):62-3

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Capítulo 2 - Indicações de cuidados paliativos em Geriatria

ção do trato urinário superior, sepse, úlceras 2.7), são variáveis, podendo durar anos com
de pressão estágios 3 ou 4 e febre recorrente incapacidade progressiva. Assim os Cuida-
após curso de antibióticos. dos Paliativos na doença de Parkinson não
A tabela mostra o escore de predição de devem se restringir ao fim de vida, mas sim
mortalidade em 30 dias após hemorragia intra- em concomitância com a terapêutica farma-
cerebral (ICH score).53-(tabela 2.7) cológica, com ação multidisciplinar visando
melhorar a qualidade de vida.55,56
Doença de Parkinson Os Cuidados Paliativos podem ser inicia-
A doença de Parkinson é um transtorno dos quando há incapacidade de tolerar a tera-
neurológico complexo e progressivo que afe- pia dopaminérgica, inadequação para cirur-
ta a saúde e a qualidade de vida dos pacientes gia e presença de comorbidades avançadas55.
e compromete a estrutura socioeconômica A Nacional Parkinson Foundation definiu
familiar. É caracterizada pela degeneração, doença de Parkinson avançada como: estágio
especialmente das células da camada ventral 3 ou mais na escala de Hehn e Yahr, presença
da parte compacta da substância nigra e do de demência, psicose ou estresse do cuidador
locus ceruleus. A patologia inclui a identifica- importante55. Para iniciar Cuidados Paliati-
ção de corpos de Lewy, que são inclusões eo- vos essas características com várias opções
sinofílicas intracitoplasmáticas constituídas possibilitam individualizar o atendimento e
por várias estruturas proteicas em neurônios iniciar mais precocemente uma abordagem
remanescentes, na parte compacta da subs- holística, permitindo que os pacientes e cui-
tância nigra. A incidência e a prevalência au- dadores expressem seus desejos de metas
mentam com o avançar da idade. A idade é o de cuidados, questões de reanimação e local
fator de risco mais consistente54. onde ocorrerão esses cuidados. A National
Os sinais cardinais da doença são: bra- Hospice Organization define como critérios
dicinesia, tremor de repouso e instabilidade de admissão em hospice na doença de Par-
postural, porém com avançar da doença os kinson53 a piora nutricional crítica por: in-
movimentos das extremidades tornam-se gestão de nutrientes e líquidos insuficiente
menos coordenados, com hesitação e paradas para manter a vida; perda de peso contínua,
frequentes. Além disso, os sintomas não mo- desidratação ou hipovolemia; ausência de
tores como psicose, demência, depressão e métodos artificias de alimentação; progres-
distúrbios do sono podem causar mais inca- são rápida da doença ou complicações nos úl-
pacidade do que os achados motores. Na tra- timos 12 meses, evidenciadas por progressão
jetória da doença podem ocorrer uma dete- de deambulação independente para estado
riorização progressiva que é acentuada com de cadeirante ou acamado; progressão de co-
quadros agudos (pneumonia aspirativa, in- munição normal para pouco inteligível; pro-
fecção do trato urinário, quedas, delirium)54. gressão da dieta normal para liquidificada; e
Ao longo do tempo, as intervenções e tra- progressão de independência na maioria das
tamentos tornam-se ineficazes. A duração de atividades instrumentais para dependência
cada fase, definidas por Hoehn e Yahr (tabela nas atividades básicas. Outras alterações que

Tabela 2.7 - Estágios da Escala de Hoehn e Yahr

0: sem sintomas
1: sintomas em apenas um lado do corpo
2: sintomas nos dois lados do corpo e sem dificuldade para caminhar
3: sintomas nos dois lados do corpo e com dificuldade mínima para caminhar
4: sintomas nos dois lados do corpo e com dificuldade moderada para caminhar

Fonte: Pinheiro JL. Doença de Parkinson e outros transtornos do movimento. In Freitas, et al Tratado de Geriatria e
Gerontologia. Terceira Edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan. 2011;p.285-287

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Capítulo 2 - Indicações de cuidados paliativos em Geriatria

suportam o diagnóstico de terminalidade: outras comorbidades associadas que compli-


dispneia em repouso, necessidade de oxigê- quem o seu manejo. Sendo assim, a cirrose
nio suplementar em repouso; paciente não nos idosos é causa de aumento de mortalidade
aceita ventilação mecânica; pneumonia aspi- tanto de causas hepáticas como não hepáticas.
rativa recorrente, infecção do trato urinário Existem poucos estudos avaliando a distri-
superior; febre recorrente após cursos de an- buição das causas de falência hepática entre
tibióticos; e úlceras por pressão estágios 3 e 4. os idosos. Hepatite C crônica e doença hepá-
A Edmonton Symptom Assessment Scale, tica alcoólica são as principais etiologias em
modificada para doença de Parkinson, acres- pacientes adultos jovens que levam ao trans-
cida de rigidez, disfagia, constipação, confusão plante hepático. A prevalência de hepatite C
e distúrbios do sono tem se mostrado um bom em adultos de 30-39 anos é de 3%, enquanto
instrumento na avaliação e abordagem dos em idosos de 60-69 anos é de 0,9%. Como a
sintomas. Myasaki et al57, evidenciaram que os incidência de hepatite C vem aumentando nos
pacientes com doença de Parkinson possuíam últimos 20 anos, assim como a expectativa de
mesmo grau de sintomas do que os pacientes vida da população, a prevalência e as compli-
com doença metástatica e respondiam ao tra- cações da mesma possivelmente aumentarão
tamento da mesma maneira. nos idosos. A doença hepática alcoólica fre-
quentemente se apresenta nos idosos, sendo
Doenças hepáticas que a taxa de mortalidade em um ano é maior
Pacientes portadores de doença hepática nos pacientes acima de 60 anos, comparados
em estágio terminal estão se tornando cada aos mais jovens. Existe também um pico de
vez mais prevalentes em virtude do aumen- incidência de cirrose biliar primária em ido-
to da expectativa de vida da população, do sos, com idade média ao diagnóstico de 60
número de portadores de hepatite C crôni- anos. Estes também têm maior taxa de mor-
ca que se tornam cirróticos, bem como da talidade em relação aos adultos portadores da
epidemia de obesidade. Apesar disso, o nú- mesma doença.60
mero de doadores de órgãos tem se mantido O cuidado paliativo deve ser aplicado
relativamente estável e muitos dos pacien- para aqueles com doença hepática em fase
tes não são elegíveis para transplante. Dessa terminal.61 A doença hepática em fase ter-
forma, há uma necessidade crescente de um minal é definida pelos pacientes que desen-
melhor suporte clínico destes doentes na volvem uma das complicações da cirrose,
ausência da possibilidade de cura. Sintomas sendo elas: ascite, hipertensão portal com
e complicações da doença afetam a sobrevi- varizes esofagianas ou retais e sangramento
da e a qualidade de vida, sendo que os prin- gastrointestinal ou encefalopatia hepática.
cípios dos Cuidados Paliativos e o manejo As principais causas de óbito são insuficiên-
das complicações clínicas destes doentes cia hepática, hepatocarcinoma, hemorragia
são importantes para promover a melhora digestiva, sepse e falência renal. A sobrevida
no seu estado de saúde. 58 em dois anos de um paciente com doença
No contexto de Cuidados Paliativos em hepática terminal é inferior a 50%. Pacientes
Geriatria, é importante ressaltar que as doen- que apresentam ascite refratária têm sobre-
ças hepáticas terminais atingem pacientes vida em seis meses de 50%. Para predizer o
mais jovens, sendo que a média de idade de prognóstico desses pacientes, muitas clas-
óbito entre os pacientes cirróticos é 57 anos. sificações foram criadas, tais como o Child-
Esta média de idade é significantemente me- Turcotte-Pugh e o Meld (vide tabelas 2.8 e
nor do que dos demais pacientes com doenças 2.9). Frente a esses dados, é importante que a
crônicas graves, como insuficiência cardíaca e abordagem inicial de Cuidados Paliativos se
doença pulmonar obstrutiva crônica.59 Porém, dê no momento da identificação do paciente
pacientes idosos portadores de doenças hepá- com doença hepática terminal não elegível
ticas crônicas têm um risco aumentado de ter para transplante, de forma adequada, sendo

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Capítulo 2 - Indicações de cuidados paliativos em Geriatria

Tabela 2.8 - Classificação de Child-Turcotte-Pugh


Classificação de CHILD-TURCOTTE-PUGH
1 Ponto 2 Pontos 3 Pontos
Bilirrubina total (mg/dL) <2 2-3 >3
Albumina (g/dL) >3,5 2,8-3,5 <2,8
RNI <1,7 1,7-2,3 >2,3
Ascite Ausente Leve Moderada a severa
Encefalopatia Ausente Grau I-II Grau III-IV
Classificação:
5-6 pontos: Child A: sobrevida em 1 ano – 100%; sobrevida em 2 anos – 85%
7-9 pontos: Child B: sobrevida em 1 ano – 81%; sobrevida em 2 anos – 57%
10-15 pontos: Child C: sobrevida em 1 ano – 45%; sobrevida em 2 anos – 35%

Prog.2008;89(4):62-3

Tabela 2.9 - Escore de MELD


MELD – Modelo para avaliação de doença hepática terminal

MELD = 3,78 [Ln bilirrubina sérica (mg/dL)] + 11,2 [Ln INR] + 9,57 [Ln creatinina sérica mg/dL)] + 6,43

Ln: Logarítimo natural

Fonte: Kamath PS, Wiesner RH, Malinchoc M, Kremers W, Therneau TM, Kosberg CL, D`Amico G, Dickson ER, Kim WR. A mo-
del to predict survival in patients with end stage liver disease. Hepatology. 2001;Feb.33(2):464-70

melhor do que a abordagem inicial no mo- ciência cardíaca têm idade acima de 65 anos.
mento de uma deteriorização aguda que ne- A definição prognóstica da insuficiência car-
cessite de hospitalização.58 díaca congestiva (ICC) com melhor acurácia
A Organização Nacional para Hospice e na expectativa de sobrevida desses pacientes
Cuidado Paliativo (NHPCO) publicou guide- é pior avaliada do que a de muitos tipos de
lines baseados em opinião de experts na área, cânceres, sendo este um dos maiores limi-
para uso do hospice em pacientes não porta- tantes na abordagem prática de Cuidados
dores de doenças malignas, como é o caso Paliativos nesses doentes. Entretanto, viven-
dos pacientes com doença hepática em fase ciamos a realidade de idosos que evoluem em
terminal, sendo os critérios para inclusão: estágios avançados da doença com qualidade
progressão clínica de uma doença limitante de vida muito ruim, com sintomatologia rica,
da vida bem documentada, múltiplos aten- marcada por dispneia, dor torácica, astenia,
dimentos em pronto-socorro ou internações ansiedade e depressão, além de frequen-
hospitalares nos últimos seis meses e com- tes idas ao pronto-socorro. Nesse contexto,
prometimento do estado nutricional decor- muitos deles prefeririam um tratamento de
rente da progressão da doença. Apesar disso, conforto, em detrimento a medidas invasi-
ainda é baixa a porcentagem de pacientes vas e tentativas de reanimação. A literatura
com doença hepática terminal admitidos em oferece pouca informação sobre o cuidado de
hospices, sendo 1,6% em 2003.52 pacientes com IC em fase final de vida.64,65,66
Dentre os critérios utilizados pela Orga-
Doenças cardiovasculares nização Nacional de Hospice e Cuidados Pa-
A insuficiência cardíaca (IC) é a fase fi- liativos para estimar a sobrevida desses pa-
nal da maioria das doenças cardiovasculares. cientes em seis meses, encontramos: pacien-
Mais de 95% das mulheres e mais de 92% dos tes em classe funcional IV com tratamento
homens admitidos no hospital por insufi- otimizado, fração de ejeção menor do que

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Capítulo 2 - Indicações de cuidados paliativos em Geriatria

20%, incapazes de controlar arritmias com elas dependência para atividades instrumen-
medicações, história prévia de reanimação tais de vida diária, disfunção cognitiva e sin-
cardiopulmonar, síncope, embolia cardíaca e tomas depressivos. Associar essas variáveis
infecção pelo HIV. 67 aos índices prognósticos baseados na seve-
Outro critério já proposto para identi- ridade das doenças melhora a capacidade de
ficar pacientes em fase terminal da ICC en- predizer morte em dois anos em idosos.69,70
globa baixa fração de ejeção com hiponatre-
mia e disfunção renal associadas, com Na Doenças renais terminais
<134mEq/L e Creatinina> 2mg/dL.67 A doença renal terminal é o estágio final da
Já o índice de comorbidade de Charlson (ta- doença renal crônica em que a taxa de filtração
bela 2.10) é um fator de risco independente para glomerular atinge níveis inferiores a 15mL/min
pacientes idosos com insuficiência cardíaca con- tornando-se insuficiente para as necessidades
gestiva. O prognóstico também dependerá da diárias do organismo. A incidência de doença
presença de fragilidade e da funcionalidade do renal terminal está aumentando na população
paciente, as quais não são incluídas na maioria atual em virtude do envelhecimento popula-
dos índices prognósticos. A funcionalidade é o cional e da maior prevalência de doenças crô-
principal fator independente de mortalidade em nicas, que são fatores de risco para disfunção
idosos hospitalizados, sobressaindo-se aos índi- renal, tais como aterosclerose e diabetes.71
ces que avaliam severidade de doenças. 67 Com o advento da diálise a partir da década
Estudo realizado por Inouye et al. identi- de 1960, os pacientes deixaram de ter como
ficou três variáveis independentes associadas opção apenas o tratamento clínico conserva-
à mortalidade em 90 dias e dois anos, sendo dor. À medida que a disponibilidade da diá-

Tabela 2.10 - Índice de Charlson


Índice de comorbidade de Charlson
Comorbidade Escore Mortalidade em 1 ano
Infarto do miocárdio 1 ESCORE TOTAL
0– 12%
Insuficiência cardíaca congestiva 1
1a2– 26%
Doença vascular periférica 1 3a4– 52%
≥5– 85%
Doença cerebrovascular 1
Demência 1
Doença pulmonar obstrutiva crônica 1
Doença reumatológica 1
Úlcera péptica 1
Doença hepática leve 1
Diabetes sem complicações com tratamento medicamentoso 1
Hemiplegia 2
Diabetes com complicações (neuropatia/nefropatia/retinopatia) 2
Doença renal moderada a severa 2
Neoplasia 2
Leucemia 2
Linfoma 2
Doença hepática moderada a severa 3
Neoplasia metastática 6
Síndrome da imunodeficiência adquirida 6

Fonte: Charlson ME, Pompei P, Ales KL, MacKenzie CR. A new method of classifying prognostic comorbidity in longitudinal
studies: development and validation. J Chronic Dis. 1987;40(5):373-83.

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Capítulo 2 - Indicações de cuidados paliativos em Geriatria

lise crescia, os pacientes podiam ser submeti- aqueles com doença renal terminal com pou-
dos à terapia renal substitutiva (TRS), a qual cas comorbidades e melhor chance de pro-
contribuiu para o aumento da sobrevida. Ou- longar a sobrevida com melhor qualidade.
tras formas de tratamento renal substitutivo, Este perfil de pacientes descrito pouco fre-
além da hemodiálise, são a diálise peritoneal quentemente é visto na população geriátrica.
e o transplante renal. Porém nem todos os Por esse motivo, precisamos avaliar de forma
pacientes são candidatos, e uma avaliação cautelosa a indicação de TRS nos idosos.71
individual de cada paciente, seus familiares, O tratamento renal conservador consiste
suas comorbidades, estilo de vida e sintomas em medidas clínicas para o controle da pro-
deve ser realizada para definir metas e priori- gressão da doença e de seus sintomas. É o
dades. É importante ressaltar que a TRS, ape- tratamento apropriado para os pacientes em
sar de promover aumento na sobrevida dos que a diálise provoca mais malefícios do que
pacientes com doença renal em fase terminal, benefícios para a qualidade de vida, conforto
quando comparamos com a população geral, e sobrevida. Apesar dos pacientes em trata-
a sobrevida dos que são submetidos à diálise mento conservador sobreviverem meses, até
é muito menor (tabela 2.11). anos, uma taxa de filtração glomerular infe-
Pacientes com doença renal terminal rior à 5mL/min é incompatível com a vida. A
apresentam taxa de mortalidade de 23% ao maior parte dos pacientes que são mantidos
ano, sendo aproximadamente 50% delas de- em tratamento conservador é idosa, acima
correntes de doenças cardiovasculares.72 Isso dos 80 anos, com prognóstico limitado de-
deve ser considerado no momento da esco- vido a múltiplas comorbidades. A incidên-
lha do tratamento, uma vez que existem os cia e severidade dos sintomas nos pacientes
riscos inerentes ao procedimento dialítico, renais terminais são comparáveis a outras
tais como infecções graves, instabilidade he- condições clínicas avançadas e necessitam
modinâmica e suas consequências, riscos da do manejo similar para controle rigoroso de
anticoagulação, risco de admissões hospita- sintomas (Tabela 2.12).71,72
lares, necessidade de frequentar clínicas de Em 2010, a Associação de Médicos Ne-
diálise, manutenção de um acesso vascular frologistas dos Estados Unidos – Renal Phy-
permanente, progressão da insuficiência vas- sicians Association – realizou a segunda
cular, insuficiência cardíaca e neuropatia pe- edição do guideline para auxiliar na decisão
riférica. Estas situações para pacientes e seus entre iniciar ou descontinuar a terapia renal
familiares podem ser encaradas como deleté- substitutiva em pacientes com doença renal
rias à qualidade de vida e isto ser utilizado de crônica terminal.74
forma consciente pelos envolvidos na decisão Existem situações bem definidas em que
sobre qual tratamento seguir. O tratamento podemos decidir por não iniciar ou inter-
renal substitutivo é mais apropriado para pa- romper a hemodiálise, sendo elas: pacientes
cientes com doença renal de causa reversível, com autonomia preservada, capazes de de-
que estão aguardando transplante, e para cidir, que foram completamente instruídos a

Tabela 2.11 - Expectativa de vida em anos na população geral e em diálise, por faixa etária

Idade População geral Diálise


60-64 anos 21 4,6
65-69 anos 17,2 3,9
70-74 anos 13,8 3,3
75-79 anos 10,8 2,8
80-84 anos 8,2 2,3
>85 anos 4,2 1,9

Fonte: US Renal Data System, 2008.73

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Capítulo 2 - Indicações de cuidados paliativos em Geriatria

Tabela 2.12 - Comparação da prevalência de sintomas em pacientes com doença renal terminal e outras
doenças crônicas
Sintomas Prevalência geral (%) DRT em diálise (%) DPOC/ICC (%) Câncer (%)
Dor 53 47 49 63
Náusea 26 33 28 45
Dispneia 61 37 86 23
Constipação 35 53 30 34
Prurido 74 55 26 27
Fadiga 76 71 84 73

DRT – Doença renal terminal, DPOC – Doença pulmonar obstrutiva crônica, ICC – Insuficiência cardíaca congestiva.
Fonte: Braithwaite D. Palliative Care in advanced renal disease. Handbook of Palliative Care, Ed. 3. 2012.

cerca dos prós e contras, bem como de seu os benefícios de prosseguir com o tratamento
prognóstico, e decidiram voluntariamente sejam reafirmados ou não, considerando-se a
por recusar o início da diálise ou interrompê opinião médica, do paciente ou representan-
-la; pacientes que não possuem capacidade de te legal e de seus demais familiares.74
decisão, porém em algum momento da vida, Com o intuito de melhorar a qualidade
quando a tinham, optaram por não iniciar do tratamento oferecido aos pacientes por-
ou descontinuar a diálise, bem como por de- tadores de doença renal terminal, foi criada
cisão de seu responsável legal; pacientes com a RPCI (Renal Palliative Care Iniciative) que
comprometimento neurológico importante tem por objetivo principal integrar os Cui-
irreversível que não exprimem pensamentos, dados Paliativos à prática da nefrologia. A
sentimentos, comportamento intencional e iniciativa partiu de oito clínicas de diálise e
consciência de si ou do ambiente.74 do Baystate Medical Center, o maior hospi-
Outras situações que podem ser consi- tal terciário no oeste da Inglaterra. Foram
deradas para não iniciar ou descontinuar a formados grupos compostos de nefrologis-
diálise são as seguintes: pacientes com condi- tas, enfermeiros e assistentes sociais que fo-
ções médicas que dificultam tecnicamente o ram submetidos ao treinamento didático em
procedimento de hemodiálise, tais como pa- Cuidados Paliativos e posteriormente este
cientes incapazes de cooperar (por exemplo, treinamento foi multiplicado para todos os
demências avançadas em que o paciente puxa profissionais envolvidos nas clínicas de diáli-
o cateter de diálise, condição clínica muito se e centros de transplante da área de abran-
instável, como hipotensão severa), pacientes gência. Foi criado um protocolo para acesso
com outra doença terminal, além da renal, aos sintomas bem como monitoramento dos
pacientes acima de 75 anos que possuem pelo resultados das intervenções realizadas. Fo-
menos dois dos critérios de mau prognósti- ram aplicados questionários aos familiares
co, sendo eles: impressão clínica do médico que perderam entes queridos para avaliar o
que não se surpreenderia se o paciente viesse controle de sintomas dos pacientes nos dias
a falecer no próximo ano, altos índices nos finais de vida. Vídeos informativos sobre a
escores de comorbidades (por exemplo, o ín- importância das diretrizes avançadas de vida
dice de Chalrson>8), dependência funcional estavam disponíveis frequentemente nas clí-
importante e desnutrição crônica (com albu- nicas de diálise, bem como suporte espiritual
mina <2,5g/dL).74 para pacientes e familiares. Dentre os resul-
Caso nos pacientes em que não foi pos- tados dessa iniciativa, o maior sucesso foi
sível alcançar um consenso ou em que o estimular o interesse em Cuidados Paliativos
prognóstico era incerto opte-se por iniciar a pelos profissionais envolvidos com pacientes
hemodiálise, programe um tempo limitado renais terminais, tornando-os mais confor-
para que esta indicação seja reavaliada, e que táveis para discussão sobre esse assunto e re-

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Capítulo 2 - Indicações de cuidados paliativos em Geriatria

ceptivos às medidas de controle rigoroso de tam 35,6 milhões de pessoas com demência
sintomas e promoção de qualidade de vida no mundo todo, com projeção para 115 mi-
para pacientes em fase terminal de vida.75 lhões em 2050.78
Uma revisão sistemática realizada em
Demências 2012 por Brown e colaboradores teve o intui-
Em virtude do envelhecimento populacio- to de identificar preditores de mortalidade
nal, cada vez mais os idosos têm atingido ida- em seis meses para pacientes portadores de
des mais avançadas, chegando a oitava e até a demência avançada. Dentre os principais fa-
nona década de vida, sendo que uma parte de- tores prognósticos encontrados estão: perda
les atinge o centenário. Nesse contexto, doen- de apetite, ingestão alimentar insuficiente,
ças neurodegenerativas relacionadas à idade, anorexia, desnutrição, perda de peso e boca
como é o caso das demências, têm aumentado seca (gerando disfagia). Além disso, alto ris-
em incidência, sendo que atualmente nos EUA co avaliado pelas escalas de demência, tais
existem mais de 5 milhões de portadores de como Fast, MDS/Mitchell Score e Adept
doença de Alzheimer.76,77 Estima-se que exis- (Advanced Dementia Prognostic Tool) (tabe-

Tabela 2.13 - ADEPT


ADEPT – Advanced Dementia Prognostic Tool Pontos
1. Institucionalizado < 90 dias 3,3
2. Idade
65-69 anos 1
70-74 anos 2
75-79 anos 3
80-84 anos 4
85-89 anos 5
90-94 anos 6
95-99 anos 7
>100 anos 8
3. Masculino 3,3
4. Dispneia 2,7
5. Presença de úlcera de pressão > grau II 2,2
6. Totalmente dependente para atividade de vida diária 2.1
7. Paciente acamado 2,1
8. Ingesta oral insuficiente 2,0
9. Incontinência intestinal 1,9
10. IMC < 18,5kg/m2 1,8
11. Perda de peso (5% em 30 dias, 10% em 180 dias) 1,6
12. Insuficiência cardíaca congestiva 1,5
Pontuação X Mortalidade em seis meses
1 – 6,5 – 7,9: 11,1%
8,0 – 8,9: 13,9%
9,0 – 9,7: 16,3%
9,8 – 10,5: 19,40%
10,6 – 11,5: 23,2%
11,6 – 12,5: 27,6%
12,6 – 14: 33,3%
14,1 – 16,1: 42,6%
>16,1: 62,1%

Fonte: Brown MA, Sampson EL, Jones L, Barron AM. Prognostic indicators of 6-month mortality in elderly people with advan-
ced dementia: A systematic review. Palliative Medicine. 2012;27(5);389-400. eMitchell SL, Miller SC, Teno, JM, Kiely DK,
Davis RB, Shaffer ML. Prediction of 6-month survivel of nursing home residents with advanced dementia using ADEPT vs
Hospice Elegibility Guidelines. JAMA. 2010 November 3;304(17):1929–1935.

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Capítulo 2 - Indicações de cuidados paliativos em Geriatria

la 2.13), demonstrou correlação com mor- tante da qualidade de vida, todos os pacientes
talidade em seis meses. A escala MSSE (Mi- com diagnóstico de demência estariam fada-
ni-Sufering State Examination) (tabela 2.14) dos a viver em condições inadequadas, tor-
também demonstrou estar associada com nando-os marginalizados. Neste contexto, é
aumento da mortalidade em seis meses. A importante que haja uma abordagem parti-
presença de pelo menos uma comorbidade cular de cada paciente, visando avaliar o que
relacionada à demência também foi pre- é qualidade de vida para a realidade daquele
ditora de pior desfecho, assim como ins- indivíduo e de seus familiares que com ele
tabilidade clínica, comprometimento da convivem.76 Além disso, o comprometimento
mobilidade e piora na funcionalidade para da comunicação e o julgamento do paciente
atividades de vida diária. Não existe um demenciado criam dificuldades para a toma-
consenso sobre qual escala é melhor para da de decisões, especialmente em situações
ser utilizada, inclusive esta revisão siste- críticas agudas que resultem em admissões
mática concluiu que seis dos sete estudos hospitalares, sendo frequentemente a decisão
revisados concordaram que a escala Fast baseada no parecer dos familiares ou cuida-
(tabela 2.15), a qual é a mais amplamente dores. Estes, se não tiverem sido abordados
utilizada nos Estados Unidos para admissão previamente, podem estar despreparados
em hospices, não é um preditor confiável de para esta tomada de decisão, culminando
mortalidade em seis meses, além de não ser com medidas muitas vezes fúteis que acabam
validada para outros tipos de demência que por prolongar o sofrimento do paciente e de
não Alzheimer. A escala Adept demonstrou seus familiares.80
possuir alta sensibilidade (acima de 90%), Devemos estar preparados para abor-
porém baixa especificidade (30%). Frente ao dar os objetivos do tratamento destes pa-
impacto das características nutricionais do cientes no momento do diagnóstico, de
indivíduo em sua mortalidade, concluiu-se preferência quando a demência ainda em
que indicadores prognósticos nutricionais fase inicial permite que o paciente possa
devem ser utilizados em associação às escalas expressar o que deseja, além do desejo de
funcionais para melhor predizer mortalida- seus familiares. É importante que identi-
de nesses pacientes.83 fiquemos como este paciente deseja viver
Considerando que a perda de memória a vida, estabelecendo o que é qualidade no
e de capacidade racional possa ser vista pela seu ponto de vista. É importante também
sociedade como comprometimento impor- que este paciente no momento inicial de

Tabela 2.13 - MSSE


MSSE – Mini-Suffering State Examination
1. Não calmo 1 ponto
2. Gritos 1 ponto
3. Dor 1 ponto
4. Úlceras de pressão 1 ponto
5. Desnutrição 1 ponto
6. Desordens alimentares 1 ponto
7. Medidas invasivas 1 ponto
8. Instabilidade clínica 1 ponto
9. Sofrimento de acordo com a avaliação médica 1 ponto
10. Sofrimento de acordo com a avaliação da família 1 ponto

Sofrimento baixo: 0-3; intermediário: 4-6; severo: 7-10

Fonte: Brown MA, Sampson EL, Jones L, Barron AM. Prognostic indicators of 6-month mortality in elderly people with advan-
ced dementia: A systematic review. Palliative Medicine.2012;27(5);389-400.

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Capítulo 2 - Indicações de cuidados paliativos em Geriatria

Tabela 2.14 - MDS


MDS / Mitchell Score
1. Totalmente dependente para atividades básicas de vida diária 1,9 ponto
2. Masculino 1,9 ponto
3. Câncer 1,7 ponto
4. Insuficiência cardíaca 1,6 ponto
5. Oxigenioterapia nos últimos 14 dias 1,6 ponto
6. Dispneia 1,5 ponto
7. Ingesta alimentar < 25% 1,5 ponto
8. Instabilidade clínica 1,5 ponto
9. Incontinência intestinal 1,5 ponto
10. Acamado 1,5 ponto
11. Idade > 83 anos 1,4 ponto
12. Dormindo a maior parte do dia 1,4 ponto
Total 0-19 pontos: % de mortalidade em 6 meses
0: 8,9 %
1-2: 10,8%
3-5: 23,2%
6-8: 40,4%
9-11: 57%
≥12: 70%

Fonte: Brown MA, Sampson EL, Jones L, Barron AM. Prognostic indicators of 6-month mortality in elderly people with advan-
ced dementia: A systematic review. Palliative Medicine. 2012;27(5);389-400.

Tabela 2.15 - FAST


FAST – Functional Assessment Stages
1 Sem incapacidades
2 Esquecimentos subjetivos
3 Capacidades de trabalho e de organização diminuídas
4 Dificuldade com tarefas complexas e atividades instrumentais de vida diária
5 Necessita supervisão para atividades de vida diária
6a Incapaz de se vestir adequadamente sem assistência ocasionalmente ou frequentemente nas últimas semanas
6b Incapaz de tomar banho adequadamente ocasionalmente ou frequentemente nas últimas semanas
6c Incapaz de usar o banheiro para higiene pessoal ocasionalmente ou frequentemente nas últimas semanas
6d Incontinência urinária ocasionalmente ou frequentemente nas últimas semanas
6e Incontinência intestinal ocasionalmente ou frequentemente nas últimas semanas
7a Habilidade para ao menos uma palavra inteligível
7b Todo o vocabulário inteligível está perdido
7c Não deambula
7d Incapaz de sentar sozinho
7e Incapaz de sorrir
7f Incapaz de sustentar a cabeça
Fonte: Mitchell SL, Kiely DK, Hamel MB, Park PS, Morris JN, Fries BE. Estimating prognosis for nursing home residents with
advanced dementia. JAMA. 2004;Jun 9;291(22):2734-40 e Fulton AT, Rhodes-Kropf J, Corcoran AM, Chau D, Castillo EH.
Palliative care for patients with dementia in long-term care. Clinics in Geriatric Medicine. 2011;(27):153-170.

sua doença defina quem será a pessoa (ou ticipar da tomada de decisões.76
pessoas) que tomará as decisões quando
o seu comprometimento cognitivo for im- Síndrome da fragilidade
portante a ponto de comprometer o seu Define-se frágil o paciente que possui
julgamento, tornando-se incapaz de par- capacidade diminuída de reestabelecer a

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Capítulo 2 - Indicações de cuidados paliativos em Geriatria

sua homeostase após um evento estressor, Muitas vezes o tratamento paliativo vol-
tornando-o vulnerável a desfechos clínicos tado para o alívio dos sintomas e melhora
adversos. A doença evolui de forma progres- da qualidade de vida é extremamente perti-
siva, está associada a comorbidades crônicas, nente nesses pacientes, visto que se tratam
piora com o avançar da idade e frequente- de pacientes vulneráveis que podem não se
mente é marcada por uma transição entre in- beneficiar de um tratamento ou procedimen-
dependência e dependência para as ativida- to mais agressivo, estando mais suscetíveis a
des de vida diária. Caracteriza-se por apre- iatrogenias. 87
sentar três dos seguintes fatores: perda de A fragilidade pode ser dividida em três
força, perda de peso não intencional, baixo estágios, como pode ser visto na tabela 2.16.
gasto energético, fadiga ou exaustão autorre- Independente do estágio da fragilidade,
ferida e diminuição da velocidade de marcha. é importante que o geriatra rotineiramente
A presença de pelo menos três destas carac- reestabeleça com seu paciente suas metas de
terísticas tornam o paciente mais suscetível a tratamento. Em pacientes frágeis em estágios
desfechos adversos, tais como quedas, piora avançados, frente à possibilidade diagnóstica
da funcionalidade, hospitalizações frequen- de uma doença oculta, por exemplo, um cân-
tes, institucionalização e morte. A associação cer, procedimentos diagnósticos invasivos e
entre fragilidade e desfechos adversos inde- até mesmo o tratamento dessa enfermidade
pende da presença de outras condições médi- podem trazer mais malefícios do que bene-
cas, sendo esta entidade conhecida como fra- fícios. Além disso, estudos mostram que as
gilidade primária. Já na fragilidade secundá- prioridades para pacientes com doenças crô-
ria, além dos critérios que definem o paciente nicas em estágios avançados ou terminais são
como frágil, há uma coexistência de comor- ter seus sintomas aliviados e sua qualidade
bidades em estágios avançados. Estudos têm de vida melhorada, evitar ser um problema
demonstrado que pacientes com fragilidade para seus familiares, ficar próximos daqueles
secundária possuem pior prognóstico do que que amam e manter um sentimento de con-
aqueles com fragilidade primária.87 trole da situação. Uma abordagem paliativa
A identificação destes pacientes deve ser pode ser mais fácil de ser instituída em pa-
incorporada à prática clínica. Nem sempre cientes frágeis em fase final, porém pode não
será um diagnóstico fácil se não buscado ati- estar clara para os médicos assistentes nos
vamente, uma vez que os sinais e sintomas pacientes em estágio inicial e intermediário
não se enquadram em modelos de doenças da doença. Nesses casos, é fundamental a
específicas e evoluem de forma lenta e pro- discussão frequente com o paciente a fim de
gressiva, podendo assim não ser percebidos definir diretrizes avançadas de vida, reafir-
pelo paciente, seus familiares e pelos pró- mando a evolução natural das doenças que o
prios médicos, ou mesmo serem encarados mesmo possui e as possibilidades de descom-
como parte do envelhecimento normal. O pensações agudas que este paciente pode vir
reconhecimento precoce da fragilidade per- a apresentar futuramente. O paciente pode
mite que intervenções adequadas sejam feitas desejar, por exemplo, não ser hospitalizado
e uma abordagem geriátrica e gerontológica numa próxima descompensação clínica de
possa ser estabelecida de forma apropriada. seu quadro de base, estando ciente dos ris-

Tabela 2.16 - Estágios da Fragilidade

Estágio Característica principal


Inicial Momento do diagnóstico
Médio Início da perda de funcionalidade
Piora da funcionalidade; doença ameaçadora de vida;
Final
iminência de morte

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Capítulo 2 - Indicações de cuidados paliativos em Geriatria

cos e benefícios dessa atitude. Nesse caso, serviços. Porém, um dos critérios de admissão
o médico deve respeitar e tomar as devidas é que o paciente tenha sobrevida menor do que
condutas no ambiente domiciliar, que pode seis meses. Nem sempre conseguimos definir o
ser suficiente para controlar os sintomas, evi- tempo de sobrevida de um paciente frágil, uma
tando riscos, por exemplo, de delirium e iatro- vez que ele pode estar estável em sua condição
genias no ambiente hospitalar. Estudos mos- de saúde e devido a um quadro infeccioso agu-
tram que controle de sintomas está associado do vir a falecer em poucos dias. Em decorrên-
a melhora da qualidade de vida, melhora na cia dessa dificuldade em estabelecer o tempo
funcionalidade e satisfação dos pacientes e fa- de sobrevida, a National Hospice and Palliative
miliares.87,88 Care Organization publicou guidelines para de-
Em relação à admissão em hospices, pacien- terminar o prognóstico de pacientes portadores
tes frágeis em estágio final se beneficiam do de doenças não malignas. Dentre os critérios de
atendimento multidisciplinar, do suporte de re- inclusão estão: múltiplas idas ao pronto-socorro
cursos humanos e materiais disponíveis nestes nos últimos seis meses, declínio funcional re-

Tabela 2.17 - ADEPT


Indicação de Cuidados Paliativos para os pacientes com critérios de doença avançada
Performance status:
Karnosfsky <50%
Avaliação inicial do idoso PPS <50%
ECOG <2
KATZ/Lawton
Incontinência
Delirium
Demência
Quedas
Síndromes geriátricas
Fragilidade
Imobilidade
Úlceras de pressão
Iatrogenia
Câncer avançado com piora dos performance status, metátases
Persistência dos sintomas apesar do tratamento otimizado

Avaliação geriátrica ampla (mau prognóstico)


Doenças neoplásicas
Frágeis
Dependentes
Uma ou mais síndromes geriátricas
Três ou mais comorbidades
VEF1 <30%
Hipoxemia (pO2 <55mmHg ou saturação <88%)
Hipercapnia (pO2 >50 mmHg)
Evidência de cor pulmonale
Taquicardia >100 bat/min
Doença pulmonar obstrutiva crônica
Perda de peso significativa
Declínio do estado funcional
Múltiplas admissões hospitalares (>1/ano)
Exacerbações frequentes (>2 em 6 meses)
Necessidade de VNI contínua nas exacerbações
Fase aguda:
Coma ou estado vegetativo >3 dias após o evento
Resposta anormal de tronco cerebral
Ausência de resposta verbal e dolorosa
Creatinina sérica >1,5mg/dl
Idade >70 anos
Acidente vascular encefálico
Fase crônica
PPS <40%
Perda de peso >10% em 6 meses
Albumina sérica < 2,5
Demência pós-AVC (7C na escala FAST)
Pneumonia aspirativa, ITU, sepse, UP estagio 3 ou 4
Febre recorrente apesar do uso de antibiótico

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Capítulo 2 - Indicações de cuidados paliativos em Geriatria

Estágio >3 na escala Hehn e Yahr


Demência
Psicose
Estresse do cuidador
Piora nutricional crítica
Doença de Parkinson
Progressão rápida da doença ou complicações no últimos 12 meses
Pneumonia aspirativa recorrente
Infecção do trato urinário
UP estágios 3 e 4
Febre recorrente apesar do uso de antimicrobianos
Doença hepática terminal não elegível para transplante
Cirrose avançada com uma ou mais complicações no último ano
Ascite refratária
Síndrome hepatorrenal
Encefalopatia hepática
Peritonite bacteriana
Doença hepática
Sangramento digestivo recorrente
Múltiplos atendimentos no pronto-socorro e internações hospitalares nos
últimos meses (seis meses)
Comprometimento do estado nutricional decorrente da doença
TP >2,5
Albumina <2,5
Classe funcional IV com tratamento otimizado
FE <20%
Arritmias sintomáticas
PAS <100 mmHg FC>100
Doença coronariana severa sem indicação
Insuficiência cardíaca História prévia de reanimação cardio pulmonar, síncope, embolia cardíaca
Hiponatremia
Cr>2mg/dl/ClCr <30ml/min
Albumina <2,5
Dependência para ABVD
Dois ou mais espisódios de descompensação com necessidade de DVA
Doença renal crônica avançada TFG <15 ml/min
Tratamento conservador com duas ou mais comorbidades
Deteriorização clínica apesar da terapia de substituição renal/persistência dos
sintomas ou aumento da dependência
Não candidatos à diálise ou com indicação de suspensão por:
Doença renal
• Pacientes com demências avançadas
• Condição clínica instável
• >75 anos com dois ou mais critérios de mau prognóstico: impressão clínica
do médico (doença avançada), Charlson >8, dependência funcional, albumina
<2,5g/dl
Incapaz de andar sem assistência
Incapacidade de se comunicar verbalmente
Perda de peso (10% peso em seis meses)
Diminuição do apetite/ingesta oral
Desnutrição (albumina <2,5mg/dl)
Demências
Infecção urinária recorrente
Alto risco nas escalas FAST e ADEPT
Incontinência fecal e urinária
Úlceras de pressão severas
Pneumonia aspirativa
Múltiplas idas ao pronto-socorro nos ultimos seis meses
Declínio funcional recente
Fragilidade
Perda progressiva e não intencional acima de 10% do peso nos últimos seis
meses

cente e perda progressiva não intencional acima que podem auxiliar na avaliação da necessidade
de 10% do peso em seis meses.87 de Cuidados Paliativos.
A tabela 2.17 sugere uma abordagem inicial
no idoso com doenças crônicas avançadas e reú- REFERÊNCIAS
ne diversos marcadores clínicos de gravidade e 1. VERAS R. Envelhecimento populacional con-
de indicações de hospice encontrados na litera- temporâneo: demandas, desafios e inovações.
tura11,13,17,31,32,52,83,88 em patologias determinadas, Revista de Saúde Pública. 2009. 43(3):548-54.

31

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Capítulo 2 - Indicações de cuidados paliativos em Geriatria

2. MORRISON, RS. Research Priorities in 15. KELLY B, BURNETT P, PELUSI D, BAD-


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Interdisciplinariedade e
multidisciplinariedade em
Cuidados Paliativos
3
CAPÍTULO

Fernanda Pinheiro da Silva


Flávia Kurebayashi Fonte
Mariana Celeghini Santiago
Marcela Teodoro Lazarini
Myrian Spínola Najas

INTRODUÇÃO doente, mas à sua família, que acontecia por


O cuidar é um princípio que está presen- um processo de aquisição de conhecimentos
te desde a geração da vida até sua finitude e habilidades técnicas específicas que tratava
e é nessa concepção que é norteada nossa de uma assistência de totalidade bio-psico-
prática em Cuidados Paliativos1. Em algu- social-espiritual, em que se tinha um olhar
mas situações de doença a possibilidade de expandido não se tratando mais da cura, mas
cura é inexistente ou rara, mas, sem dúvida, sim do cuidar melhor, aliviar sintomas e con-
há muito cuidado a se oferecer ao indivíduo duzir o paciente à “boa morte”2.
nesta fase da vida. A humanização na assistência – tão ne-
Atualmente, com o amadurecimento do cessária na atenção em Cuidados Paliativos –
conceito de Cuidados Paliativos, os profis- pressupõe o respeito ao paciente, tratamento
sionais vêm mudando suas características digno, solidário e acolhedor, ético por parte
e está surgindo uma nova identidade. De do profissional, assim considerando a essên-
acordo com Menezes2 , a assistência paliati- cia do ser humano bem como suas singulari-
va no Brasil surgiu por iniciativa de alguns dades e diferenças3. Temos a necessidade pri-
profissionais do Instituto Nacional do mária de desenvolver vínculos fortes com ele
Câncer e, com o passar do tempo e aumen- e com sua família, bem como de acolher seu
to da demanda desse atendimento, consti- sofrimento e distanciar o seu medo e insegu-
tuiu-se a primeira equipe interdisciplinar, rança. Para tanto, temos que desenvolver, a
– formada por profissionais pioneiros que priori, a prática pautada na humanização, no
transmitiam seus saberes àqueles ingres- bom senso, flexibilidade, compaixão, respei-
santes que não tiveram nenhum contato to, empatia, solidariedade, assim sendo capaz
com Cuidados Paliativos. de proporcionar proteção e consolo para nos-
Após a divulgação da assistência paliati- so paciente neste momento de sua vida.
va, fazer parte dessa equipe passou a ser uma O cuidado do paciente em sua termina-
escolha do profissional de saúde, o qual se lidade exige dos profissionais o desenvol-
identificava com a proposta. E a partir daí foi vimento de competências que vão além do
possível identificar uma mudança no com- conhecimento técnico. O profissional que se
portamento da equipe em relação não só ao habilita em trabalhar com o indivíduo em

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Capítulo 3 - Interdisciplinariedade e multidisciplinariedade em cuidados paliativos

sua morte, necessariamente, precisa conhe- integrantes de cada área profissional. Desta
cer a multidimensionalidade do ser humano maneira, partindo da heterogeneidade do sa-
e desenvolver instrumentos para trabalhar ber, busca-se a análise mais ampla das neces-
com ela. De fato, a assistência embasada nes- sidades de saúde, bem como a construção da
ta concepção exige intervenções cada vez homogeneidade das condutas práticas, ações
mais complexas, pois é imprescindível que se integradas, objetivos e valores de equipe, as-
atenda o indivíduo em seus aspectos biológi- sim distanciando da fragmentação de atenção
cos, psicológicos, espirituais e sociais. Dessa ao indivíduo e resgatando sua unidade e auto-
forma, o caráter multiprofissional e interdis- nomia na tomada de decisões1,4.
ciplinar do cuidado deve estar sempre pre- Assim, é necessário um trabalho em equi-
sente nos Cuidados Paliativos1. pe de um modo integrado e articulado, o que
implica que cada profissional saiba muito so-
TRABALHO EM EQUIPE bre sua área específica e que possam se rela-
A concepção do trabalho em equipe cionar para atender o paciente e sua família
multiprofissional com o enfoque interdis- de maneira integral e individualizada – vi-
ciplinar é antiga, embora ainda não seja sando seu conforto, bem-estar e qualidade de
encontrada em toda extensão do campo de vida, independentemente do grau da doença
atenção à saúde, e sua adoção torna-se cada em questão6,7.
vez mais necessária tendo em vista a com- Essa interação projetada para promover a
plexidade do adoecer humano 4. participação ativa de cada disciplina na assis-
Segundo o estudo de Pessini e Bertachini5, tência ao paciente requer uma dinâmica que
o relatório Europeu da Organização Mundial permita a reorganização e integração de sa-
da Saúde sobre Cuidados Paliativos enfati- beres de cada profissional, em cada momen-
camente afirma que “existe considerável evi- to, segundo a necessidade e situações8.
dência de que as pessoas idosas sofrem des- Todavia, trabalhar em equipe pode não
necessariamente, por causa de uma falta de ser uma tarefa fácil no dia-a-dia, trazendo
avaliação generalizada e tratamento de seus certas dificuldades. Para Bernardo, Rosado
problemas e falta de acesso a programas de e Salazar 9 citados por Fradique10, algumas
Cuidados Paliativos”. contrariedades são: “problemas de comu-
Assim, constata-se que a atuação de uma nicação entre os integrantes da equipe, di-
equipe interdisciplinar é indispensável para a ficuldade e lentidão na tomada de decisão,
assistência em Cuidados Paliativos ao pacien- necessidade de dedicação e co-responsabi-
te idoso, sendo essencial o envolvimento de lização, existência de confusão e conflitos
vários profissionais. Apesar da equipe central de funções, competitividade, confidencia-
ser composta por médico, enfermeira e assis- lidade, formalidade, ambiente tenso, fins
tente social, visando prover o cuidado faz-se mal definidos ou mal compreendidos, falta
necessário contar com a colaboração de uma de escuta, medo do ridículo ou da crítica,
equipe com mais profissionais – terapeutas crítica personalizada e destrutiva, tomadas
ocupacionais, fisioterapeutas, fonoaudiólogos, de decisões prematuras, atribuições pouco
nutricionistas, psicólogos, capelões, dentre claras e nunca analisar o funcionamento
outros.5 da equipe”. Em contrapartida, há também
Ao se abordar essa modalidade de traba- muitas vantagens desse trabalho que se so-
lho, é importante mencionar que este é ca- brepõem, como: “o apoio mútuo ultrapas-
racterizado por uma conjugação de conheci- sando as resistências individuais; reconhe-
mentos e práticas de diferentes profissionais cimento profissional; garantia na unidade,
trabalhando em equipe, pelas intensas trocas continuidade e diferenciação de cuidados;
de conhecimentos, envolvendo uma intera- partilha de experiências na tomada de deci-
ção contínua, com metodologia e objetivos sões e possibilidade de participar na forma-
comuns, pela colaboração recíproca entre os ção e no aperfeiçoamento de competências”.

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Capítulo 3 - Interdisciplinariedade e multidisciplinariedade em cuidados paliativos

A equipe deve realizar um processo con- 3. BACKES DS, FILHO WDL, LUNARDI VL.
tínuo de auto-avaliação e análise crítica e os A construção de um processo interdisciplinar
membros devem analisar os seus próprios de humanização à luz de Freire. Rev Texto
valores e como a sua participação está afe- Contexto Enferm. v.14, n.3. 2005. p.427-34.
tando a equipe e o atendimento ao paciente.10 4. TAVARES CMM. A interdisciplinariedade
como requisito para a formação da enfermei-
CONSIDERAÇÕES FINAIS ra psiquiátrica na perspectiva da atenção psi-
A equipe multiprofissional tem impor- cossocial. Rev Texto Contexto Enferm. v.14,
tante papel na assistência ao paciente em n.3, 2005. p.403-10.
Cuidados Paliativos, assim como a sua fa- 5. PESSINI L, BERTACHINI L. Novas perspec-
mília. Os múltiplos olhares que a equipe é tivas em Cuidados Paliativos: ética, geriatria,
capaz de trazer durante discussão de casos, gerontologia, comunicação e espiritualidade.
norteamento de condutas e levantamento de Mundo Saúde (Impr.). 2005. 29(4):491-509.
metas (que devem ser realistas a fim de se 6. CONSOLIM, L. Papel do médico na equipe de
evitar frustrações para equipe, paciente e fa- Cuidados Paliativos. In: Manual de Cuidados Pa-
mília) faz com que o paciente seja percebido liativos / Academia Nacional de Cuidados Palia-
e assistido em todos os seus aspectos, não tivos. Rio de Janeiro: Diagraphic. 2009. p.214-5.
apenas no aspecto clínico de sua doença. Sa- 7. MATOS E, PIRES DEP, SOUSA GW. Relações
be-se que dificuldades de acesso à serviços de trabalho em equipes interdisciplinares:
de saúde, sociais e medicamentos levam ao contribuições para novas formas de organiza-
sofrimento e devem tentar ser abordados e ção do trabalho em saúde. Rev Bras Enferm.
resolvidos da melhor maneira possível. De- v.63, n.5. 2010. p.775-78.
vemos ser facilitadores na resolução de pro- 8. HERBERT C. Changing the culture: Inter-
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39

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Capítulo XXXX

Estratégias de comunicação
em Cuidados Paliativos 4
CAPÍTULO

Lilian Bresque
Leonardo Oliva
Cleofa Toniolo Zenatti

INTRODUÇÃO A adequação da comunicação interpes-


A comunicação de qualidade com pacien- soal é importante não somente para as to-
tes, familiares e equipe de saúde é um pilar madas de decisões em relação à condução
fundamental para que os Cuidados Paliativos do tratamento, mas também para o bem-es-
sejam bem-sucedidos.1,2 A ineficácia no pro- tar da família. Familiares que tiveram uma
cesso comunicativo foi descrita como uma das reunião estruturada para falar a respeito
maiores barreiras para a otimização dos cui- de prognóstico e tratamento tiveram maior
dados no fim da vida.3 O ensino das técnicas grau de satisfação e maior sentimento de ali-
de comunicação é fundamental para ampliar vio, além disso mostraram-se menos depri-
o conhecimento nesta área. Entretanto, mui- midos e ansiosos após o óbito do familiar.8,9
tas vezes este assunto é negligenciado duran-
te o ensino médico.1,4 Estudos mostram que PARTICULARIDADES DO IDOSO
médicos residentes valorizam a oportunidade Déficits visuais e auditivos são situações
de aprender a se comunicar adequadamente bastante prevalentes na população idosa e
com pacientes em estado terminal, porém falta podem interferir diretamente com a efeti-
conhecimento sobre como fazer isso e de fee- vidade da comunicação nesta população. A
dback sobre o que poderia melhorar.5 Apesar perda auditiva significativa pode atingir 44%
de muitos considerarem-se competentes para dos indivíduos acima de 65 anos, chegando a
discutir diretivas antecipadas, viu-se que a cerca de 90% naqueles com 80 anos ou mais.
maior parte não faz uso de técnicas adequadas Como a perda auditiva relacionada à idade se
de comunicação.6 inicia nas frequências mais altas e interfere
Em estudo publicado por Wayne et. al em de forma importante na capacidade de dis-
2012, foram avaliados médicos residentes que tinguir sons em ambientes barulhentos, ga-
tiveram aulas teóricas e práticas sobre comuni- rantir um ambiente adequado e utilizar um
cação e viu-se que as habilidades melhoraram tom mais grave e em volume um pouco mais
e se mantiveram mesmo após um ano da inter- alto é fundamental na comunicação com
venção. Residentes que não tiveram nenhum idosos com déficits auditivos, especialmente
tipo de ensino, mesmo após a prática clínica, a presbiacusia. Além disso, permitir a leitura
não adquiriram as mesmas habilidades.7 labial e falar pausadamente ajuda a garantir

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Capítulo 4 - Estratégias de comunicação em cuidados paliativos

o bom entendimento. Em relação aos déficits decisões terapêuticas sejam tomadas em con-
visuais, boas condições de iluminação e o po- junto com o médico. Porém, o doente pode
sicionamento frente a frente com o paciente espontaneamente delegar essa função a um
são de fundamental importância.10 familiar, por não ter condições ou não querer
Problemas relacionados à perda cogni- decidir sobre tais assuntos. Se o paciente está
tiva, incluindo Doença de Alzheimer e ou- inconsciente e não pode exprimir suas von-
tras demências, podem impossibilitar a co- tades e pontos de vista, pode-se checar com
municação efetiva com o individuo idoso, a família se há algum documento relatando
principalmente em fases mais avançadas seus desejos sobre tratamento e suporte à
destas doenças. Sendo assim, o conheci- vida ou se o mesmo verbalizou essas vonta-
mento prévio da função cognitiva do pa- des a alguém, devendo ser respeitadas.16
ciente idoso é fundamental para o sucesso Do ponto de vista legal, se o paciente não
do processo comunicativo.11 tem o discernimento necessário para os atos
Outro ponto importante a se considerar é da vida civil, a curatela pode ser pleiteada por
que os pacientes mais velhos podem apresen- algum parente e assim o curador passa a res-
tar maior desconforto emocional e ansiedade ponder por essa pessoa, devendo ser infor-
quando visitam o médico. Esse fato pode es- mado prioritariamente sobre qualquer diag-
tar relacionado a déficit de memória e a difi- nóstico, tratamento proposto ou prognóstico
culdade de relatar corretamente os sintomas. do paciente e a tal curador caberá a tomada
Há evidências de que os pacientes idosos ten- de decisões.17
dem a questionar menos os médicos sobre
suas dúvidas.12 Entretanto, como os pacien- ESTRATÉGIAS DE COMUNICAÇÃO
tes têm tido acesso a mais informações, antes Alguns protocolos bem descritos na lite-
disponíveis apenas a classe médica, esse pa- ratura sugerem formas de como se comuni-
norama tem se modificado – o que significa car e como dar más noticias aos pacientes e
que as patologias devem ser mais discutidas, suas famílias. Seguir um protocolo pré-es-
as formas de tratamento claramente expostas tabelecido para este fim ajuda o profissional
e a tomada de decisão compartilhada.13 a transmitir informações de forma eficaz e
menos agressiva.
A QUEM PASSAR A INFORMAÇÃO. Em 2001, Robert Buckman publicou o
De acordo com a Lei nº 10.241, de 17 de protocolo CLASS (Context; Listening; Ack-
março de 1999, Artigo 2º, inciso VI, é direito nowledge; Strategy; Summary), descrito
do paciente receber informações claras, obje- pelo próprio autor como um instrumento
tivas e compreensíveis sobre: hipóteses diag- fácil de memorizar e de usar, que possui
nósticas; diagnósticos realizados; exames so- como característica importante englobar
licitados; ações terapêuticas; risco, benefícios em sua técnica o manejo das emoções de
e inconvenientes das medidas diagnósticas e forma bastante direta e objetiva.18 Já em
terapêuticas propostas, além das alternativas 2004, o mesmo autor estruturou um pro-
existentes no serviço de atendimento ou em tocolo mais específico para a comunica-
outros serviços; e o que julgar necessário.14 ção em situações difíceis, o qual destaca
O código de ética médica, capitulo V, Ar- as características mais importantes deste
tigo 34, diz que é vedado ao médico: deixar de processo de comunicação, sugere métodos
informar ao paciente o diagnóstico, o prog- para avaliar a situação e responder de for-
nóstico, os riscos e objetivos do tratamento, ma construtiva de acordo com a sua evolu-
salvo quando a comunicação direta possa lhe ção. Este protocolo foi batizado de SPIKES
provocar dano, devendo, nesse caso, fazer a (Setting; Perception; Invitation; Knowledge;
comunicação a seu representante legal.15 Explore emotions and empathize; Strategy
Sendo assim, o repasse das informações and summary), sendo um dos mais utiliza-
deve ser direcionado ao paciente para que as dos em Cuidados Paliativos.19

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Capítulo 4 - Estratégias de comunicação em cuidados paliativos

Seguindo estes protocolos, são descritos 3º passo: Descubra o quanto o paciente


a seguir os principais passos para uma comu- quer saber. Apesar da maioria dos pacientes
nicação mais efetiva e adequada: querer saber todos os detalhes do seu estado
1° passo: Prepare-se. Este passo se inicia de saúde, não se pode assumir isto em todos
com a escolha do local da conversa. Ideal- os casos. Sendo assim, deve-se perguntar di-
mente, um local privativo, como uma sala de retamente ao paciente o quanto ele quer sa-
reuniões. Caso tenha que ocorrer no quarto ber para que sua vontade seja respeitada. É
do paciente, é importante fechar cortinas importante estar atento aos sinais não ver-
em volta do leito ou manter a porta fechada. bais, como ansiedade, fácies de desconforto
Deve-se pedir ao paciente que desligue a te- e irritabilidade, pois podem indicar que o pa-
levisão ou rádio, além de minimizar outros ciente já ouviu o quanto queria ou suportava
possíveis fatores de distração. Todos devem ouvir naquele momento.
estar confortavelmente sentados, de prefe- 4° passo: Informe. As informações devem
rência com olhos na mesma altura. A distân- ser passadas de forma clara, com linguagem
cia entre o interlocutor e o paciente deve ser que possibilite o entendimento, evitando-se o
de aproximadamente dois metros, sem obs- uso de jargão médico. Deve-se falar pausada-
táculos entre os dois (como mesas, bandejas mente para que o paciente tenha oportunidade
de refeição, etc). Deve-se preferir a postura de questionar em caso de dúvida. As notícias
neutra (pés apoiados no chão, ombros re- devem ser transmitidas de forma gradual, sem-
laxados e mãos apoiadas nos joelhos) e de- pre tendo atenção às reações do paciente. É im-
monstrar calma e atenção. Além disso, deve- portante avisar ao paciente antecipadamente
se escolher quem irá participar da conversa, que más notícias serão dadas com expressões
incluindo familiares ou amigos do paciente, do tipo “eu sinto muito, mas as notícias que te-
de acordo com a escolha deste, como forma nho para você não são as melhores possíveis”,
de suporte emocional. Um número de pes- “sinto ter que te falar isto” ou “gostaria de ter
soas excessivo, entretanto, pode prejudicar notícias melhores, entretanto...”. Desta forma,
o processo. Outro aspecto fundamental nes- o paciente pode se preparar melhor para rece-
te momento é garantir a disponibilidade de ber a informação ruim.
tempo, evitando interrupções como telefone- 5° passo: Tenha empatia. Acolher os senti-
mas e batidas à porta. Caso haja necessidade mentos do paciente após uma conversa difícil
de uma pausa, é preconizado que esta ocorra é parte essencial do processo comunicativo.
por período curto, cabendo pedir desculpas Toque o paciente para oferecer apoio (geral-
após a interrupção. É adequado que no am- mente recomenda-se toque na região do om-
biente haja uma caixa de lenços para serem bro e antebraço) e mostre-se empático com as
oferecidos em momentos de emoção. emoções (mostrar que identifica, reconhece e
2° passo: Descubra o que o paciente sabe. valida as emoções). Este parece ser o momento
Ouvir antes de falar é sempre uma ótima es- mais difícil para o profissional de saúde du-
tratégia. Isto possibilita entender o que o pa- rante a comunicação.
ciente sabe sobre sua situação e o que espera da 6° passo: Resuma e programe. Ao final de
conversa, do diagnóstico e do tratamento. Nes- uma conversa, é interessante fazer um resu-
te momento também se identifica o nível de mo do que foi dito, como forma de confirmar
compreensão e o tipo de vocabulário que o pa- que todas as informações foram entendidas da
ciente e a família utilizam, facilitando na hora maneira correta. Também é o momento para
de passar as informações. Deve-se estimular o questionar se há alguma dúvida pendente e
paciente a falar através de perguntas genéricas esclarecê-la. Planejar o próximo encontro e
do tipo “o que já te disseram até agora?” ou “o tópicos para serem discutidos posteriormente
que você acha que está acontecendo?”. Caso o também faz parte desse último passo, mos-
paciente esteja em negação, este não é o mo- trando-se sempre à disposição para futuros
mento mais adequado para confrontá-lo. esclarecimentos.18, 19, 20, 21

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Capítulo 4 - Estratégias de comunicação em cuidados paliativos

COMUNICAÇÃO EM SITUAÇÕES CRÍTICAS incluir a retirada de suporte ventilatório, in-


terrupção de drogas vasoativas, parar terapia
Notícia de óbito de substituição renal por diálise, interromper
As situações de difícil comunicação em antibioticoterapia, entre outros. Estes atos vi-
Cuidados Paliativos frequentemente incluem sam não prolongar a vida a qualquer custo,
comunicar o óbito do paciente. Estudo de ação classificada como Distanasia.
Starzewski Jr. et al em 2005 descreve que os Há uma grande variação internacional e
casos relatados como de maior dificuldade mesmo regional sobre suspensão ou retenção
para os médicos envolvem pacientes jovens de suporte de vida, principalmente devido à
(43,4%) e morte por quadro agudo (56,6%).22 diversidade religiosa e cultural. O profissio-
Apesar destas situações normalmente não nal de saúde deve estar atendo a tais varia-
serem contempladas na assistência paliativa ções no momento de abordar este assunto.24
do idoso, notificar um óbito é sempre uma Em relação ao próprio profissional, parece
tarefa árdua. Sendo assim, utilizar estraté- haver maior dificuldade em relação à sus-
gias de comunicação pode tornar o processo pensão de cuidados já instituídos, mesmo
menos traumático, tanto para a equipe assis- que estes não estejam trazendo benefício ao
tente quanto para os familiares. paciente, se comparado à não ampliação do
Sabe-se que a forma que a notícia é trans- cuidado.25 Entretanto, não há diferença ética
mitida tem influência direta sobre o processo entre uma ou outra medida.26
de enfrentamento e de luto, sendo então im- Para a tomada de decisão de retirada de
portante que ela seja passada com cuidado e suporte à vida é necessário convergência de
respeitando as necessidades dos familiares. opinião entre os membros da equipe e entre
A sequência descrita anteriormente neste a equipe e o paciente/familiares. A decisão
capítulo pode ser adaptada para comunicar compartilhada é muito importante para que
um falecimento, enfatizando-se a Preparação o paciente possa ter o melhor cuidado.25,27
(passo 1) e principalmente a Empatia após a Neste sentido, promover uma reunião fami-
notícia (passo 5). Neste sentido, é necessário liar com a participação de todos os que es-
que o médico, antes responsável pelo cuidado tão envolvidos nos cuidados com o paciente
com o paciente, torne-se um ouvinte atencio- (médicos, enfermeiros, fisioterapeutas, fo-
so e forneça um bom suporte à família.23 noaudiólogos, psicólogos) e com os membros
Após a pessoa ser informada do óbito, da família torna-se de fundamental impor-
é muito importante que haja uma conversa tância.26 Nesta reunião deve-se utilizar as
com a equipe médica para esclarecimentos estratégias de comunicação já descritas neste
sobre o caso. Essa comunicação deve ser cla- capitulo, sempre levando em consideração as
ra, em local adequado e passando serenidade crenças, expectativas e desejos do paciente e
para a família que está vivendo um momento familiares para que este momento se torne
tão difícil. menos penoso e complicado.

Retirando suporte a vida Círculo do Silêncio


Quando pacientes com doenças agudas Muitas vezes profissionais de saúde li-
ou crônicas graves não melhoram, mesmo mitam a informação dada aos pacientes na
utilizando todo o tratamento disponível, ou tentativa de protegê-los de noticias poten-
quando o paciente em Cuidados Paliativos se cialmente ruins ou tristes. Apesar disto po-
encontra em fase terminal, deve existir um der estar relacionado com a dificuldade dos
questionamento sobre os tratamentos insti- profissionais em transmitir más notícias, na
tuídos até o momento, de maneira a avaliar maioria das vezes surge como uma decisão
se há maior beneficio em manter tais trata- da família em ocultar certas informações do
mentos ou em interromper a cadeia de ações seu familiar.28 Estabelece-se desta maneira
que podem estar sendo fúteis.16,24 Isto pode um Círculo de Silêncio ou Conspiração do

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Capítulo 4 - Estratégias de comunicação em cuidados paliativos

Silêncio, entre o paciente, equipe assistente Alguns elementos da comunicação mere-


e familiares, refletindo a crença paternalista cem destaque especial quando são observa-
de que protegendo o doente de más notícias, dos através da ótica dos Cuidados Paliativos.
diminui-se também a angústia e aumenta-se Eles incluem a construção de uma relação
a esperança. Entretanto, não existem dados médico-paciente adequada, a troca efetiva
na literatura que mostrem que a esperança de informações e conhecimentos, aconselha-
possa ser “tirada” ou que os pacientes possam mento apropriado, ajuda na tomada de deci-
ser prejudicados pela informação prognósti- sões e o manejo de emoções.
ca verdadeira, se for desejo do paciente saber Neste capítulo foi descrito um passo a
de sua condição e se esta for apresentada de passo bastante conhecido, muito efetivo e
uma forma razoável pelo seu médico.29 fácil de ser memorizado para ser utilizado
Este desejo de proteger os pacientes da como estratégia de comunicação. Inicial-
sua realidade geralmente cria dificuldades mente descrito para dar as más noticias, po-
ainda maiores. Embora a motivação por trás rém ele pode ser adaptado para diversas si-
da economia com a verdade muitas vezes seja tuações, dos momentos mais corriqueiros a
bem intencionada, uma conspiração de silên- situações mais difíceis e delicadas.
cio geralmente resulta em um elevado estado É importante salientar que os profissio-
de medo, ansiedade e confusão. Informações nais de saúde podem desenvolver a habilida-
ambíguas ou deliberadamente enganosas po- de de comunicar-se de forma adequada atra-
dem parecer benéficas em curto prazo, en- vés de estudo e treinamento específicos. Esta
quanto as coisas correrem bem, entretanto habilidade reflete um melhor cuidado para o
priva os indivíduos e suas famílias da opor- paciente, mas também uma maior satisfação
tunidade de reorganizar e adaptar suas vidas pessoal ao profissional.
em direção a metas mais atingíveis, esperan-
ças e aspirações realistas.30 REFERÊNCIAS
Foi documentado que a grande maioria 1. K ELLEY AS, BACK AL, ARNOLD RM,
dos pacientes idosos gostaria de receber ET AL. Geritalk: Communication Skills
informação clínica adequada em relação a Training for Geriatrics and Palliative Me-
sua doença, além de poder contar com os dicine Fellows, J Am Geriatr Soc. 2012 Feb.
membros da família nos processos de di- 60(2):332–337.
vulgação do diagnóstico e prognóstico e 2. DE HAES H, TEUNISSEN S. Communica-
nas tomadas de decisão. 31 Sendo assim, há tion in palliative care: a review of recent li-
necessidade de considerar questões especí- terature. Curr Opin Oncol. 2005. 17:345-50.
ficas relacionadas com a idade, incluindo 3. YABROFF K, MANDELBLATT J,
INGHAM J. The quality of medical care at
os aspectos sociais, culturais e emocionais
the end of life in the USA: existing barriers
e de compreender o papel que os membros
and examples of process and outcome mea-
da família desempenham na experiência de
sures. Palliat Med. 2004. 18:202-16.
adoecer do idoso, para que essa comunica- 4. TORKE AM, QUEST TE, KINLAW K.
ção seja mais efetiva, evitando-se a arma- A Workshop to teach Medical Students
dilha do Círculo do Silêncio. communication skills and clinical know-
ledge about End-of-Life Care. J Gen Intern
CONCLUSÃO Med. 2004. 19:540–544.
Comunicar-se de maneira adequada e efi- 5. SCHRODER C, HEYLAND D, JIANG X,
ciente com pacientes e familiares é de vital ROCKER G, DODEK P. Educating medical
importância nos cuidados de fim de vida. As- residents in end-of-life care: insights from
sim como controle exemplar da dor e outros a multicenter survey. J Palliat Med. 2009
sintomas, trabalho em equipe interdiscipli- May. 12(5):459–70.
nar e suporte familiar, a comunicação é com- 6. BUSS MK, ALEXANDER GC, SWITZER
ponente essencial dos Cuidados Paliativos. GE, ARNOLD RM. Assessing competence

45

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Capítulo 4 - Estratégias de comunicação em cuidados paliativos

of residents to discuss end-of-life issues. 16. WORKMAN S. A communication


J Palliat Med. 2005 Apr. 8(2):363–71. model for encouraging optimal care at
7. WAYNE DB, MOAZED F, COHEN ER, the end of life for hospitalized patients.
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Med 2012. 15(12):1325-1328. ponível em: www.planalto.gov.br/cci-
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tigo 2º, inciso VI. thholding or withdrawing therapy

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Capítulo 4 - Estratégias de comunicação em cuidados paliativos

in intensive care units: an analysis of LJ, MATSUYAMA R. Giving honest


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37:1696–1705. may. 24(6):521-5.
28. 
LOCATELLI C, PISELLI P, CICER- 30. FALLOWFIELD LJ, JENKINS VA
CHIA M, RAFFAELE M, ABBATE- AND BEVERIDGE HA. Truth may
COLA AM, REPETTO L. Telling bad hurt but deceit hurts more: communi-
news to the elderly cancer patients: The cation in palliative care. Palliat Med.
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47

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Bioética e legislação
em Cuidados Paliativos 5
CAPÍTULO

Flávia Areco
Alexandre Aboud
Daniela Areco

O termo “bioética” nasceu nos Estados novos problemas relacionados ao desenvolvi-


Unidos em 1971, com a publicação do livro mento e à utilização de tecnologias no campo
Bioethics: Bridge To The Future, de Van Ren- da biomedicina".2
sesealer Potter, pesquisador da área de on- Os avanços científicos e tecnológicos im-
cologia da Universidade de Wisconsin. Para puseram uma transformação da bioética,
ele: "Se existem duas culturas que parecem uma vez que as práticas profissionais muda-
incapazes de falar uma com a outra, essas ram mais rapidamente que as reflexões éti-
são: ciências e humanidades. Se isto faz parte cas. Vale lembrar que novos tratamentos, as
das razões para que o futuro se mostre tão possibilidades de cura e o aumento no tempo
incerto, então possivelmente nós teríamos de de vida emergiram junto a novos questiona-
estender uma ponte para o futuro, construin- mentos éticos, religiosos e jurídicos que aca-
do a disciplina de Bioética como ponte entre baram por exigir do Estado respostas sobre
duas culturas".1 os mais variados temas, como a ortotanásia e
No texto a seguir arriscaremos construir os Cuidados Paliativos.
uma ponte entre as ciências médica e jurídica. Neste contexto, como novos caminhos na
Deve ser ressaltado que importantes bioética estão sendo explorados, a área jurídica
marcos históricos, como o Relatório de também tem sido chamada para participar das
Belmont de 1978, que foi redigido pela discussões, vez que cabe ao Direito estabelecer
Comissão Nacional para a Proteção de As- o regramento da sociedade delimitada pelas
suntos Humanos em Pesquisas Científicas fronteiras do Estado, de forma a harmonizar os
dos Estados Unidos, e a publicação do livro diferentes interesses envolvidos.
The principles of Bioethics, de Beauchamp e Segundo Marco Segre, professor emérito
Childress, em 1979, impulsionaram as dis- de Medicina Legal e Bioética da Faculdade
cussões e as reflexões sobre essas relações de Medicina da Universidade de São Paulo:
humanas com a ciência.1 "Bioética é a parte da ética, ramo da filosofia,
Para Bourgeault, pesquisador da ética e que enfoca as questões referentes à vida hu-
educação na sociedade, da Universidade de mana e, portanto, à saúde. A Bioética, tendo
Montreal: “A bioética representa a conscien- a vida como objeto de estudo, trata também
tização ou disposição de se tentar resolver da morte (inerente à vida)".3

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Capítulo 5 - Bioética e legislaçâo em cuidados paliativos

Não há como se falar em Bioética sem se sideradas: física, psicológica, social, espiri-
adentrar nas discussões em Cuidados Pa- tual), visando oferecer o melhor tratamen-
liativos, uma vez que, essencialmente, esses to ao seu paciente, tanto no que diz res-
cuidados objetivam aliviar os sintomas, a peito à técnica quanto no que se refere ao
dor e o sofrimento em pacientes portadores reconhecimento das necessidades físicas,
de doenças crônicas, progressivas, avança- psicológicas ou sociais do indivíduo. Um
das, degenerativas, incuráveis ou doenças profissional deve, acima de tudo, desejar o
em estágio final.1 melhor para o seu paciente, para restabele-
A bioética é regida por alguns postulados cer sua saúde, para prevenir um agravo ou
básicos que a orientam, enquanto ciência. Es- para promover seu bem-estar.7
ses mandamentos de otimização que servem
de suporte a todo ordenamento jurídico exis- PRINCÍPIO DA JUSTIÇA
tente são chamados de princípios. Hoje, para a Este princípio se refere à igualdade de
Bioética, reconhece-se que há um consenso em tratamento e à justa distribuição dos recur-
torno de alguns deles que aqui explicamos.4 sos à saúde de todos. Costumamos acrescen-
tar outro conceito ao de justiça: o conceito
PRINCIPIO DA AUTONOMIA de equidade que representa dar a cada pes-
A autonomia é a capacidade de autodeter- soa o que lhe é devido segundo suas neces-
minação de uma pessoa, ou seja, o quanto ela sidades, ou seja, incorpora-se a ideia de que
pode gerenciar sua própria vontade, segundo as pessoas são diferentes e que, portanto,
seus valores e crenças, livre da influência de também são diferentes as suas necessidades.
outras pessoas. O profissional deve ouvir e De acordo com o princípio da justiça, é
respeitar a sua vontade, ou seja, ao paciente preciso respeitar com imparcialidade o direi-
é dado o direito de optar por um determina- to de cada um. Não seria ética uma decisão
do tratamento. Para que a autonomia possa que levasse um dos personagens envolvidos
ser exercida é fundamental que o paciente (profissional ou paciente) a se prejudicar.7
receba as informações necessárias, que o ins- É consensual reconhecer no Ocidente três
trumentalizem e o habilitem para a tomada escolas de bioética: a anglo-americana, a eu-
de decisões, diante das opções existentes em ropeia e a latino-americana. A primeira pri-
cada situação.5 vilegia a autonomia da pessoa, inspirando-
Cabe lembrar que, em muitos casos, es- se no pragmatismo liberal. A segunda, com
tamos diante de uma situação conflitiva, na base na tradição filosófica grega e judaico-
qual várias opções devem ser consideradas cristã, preocupa-se com questões relaciona-
– aliás, este é o fundamento das questões é- das à princípios morais. A latino-americana,
ticas. Como aponta Segre, faz-se necessária embora ainda em construção, alimenta-se
uma hierarquização desses conflitos, para das reflexões das escolas anteriores e se dis-
que se possa buscar uma resposta que atenda tingue de ambas por priorizar o social, dan-
às necessidades daqueles que estão sob nos- do igual ênfase para fatos científicos e valores
sos cuidados.6 morais anteriores, priorizando o social com
ênfase tanto para os fatos científicos quanto
PRINCÍPIO DA BENEFICÊNCIA/NÃO para os valores morais.8
MALEFICÊNCIA No X Congresso Brasileiro de Bioética,
Beneficência significa “fazer o bem” e ocorrido em 2013, o professor espanhol
não maleficência significa “evitar o mal”. Diego Gracia, um dos bioeticistas mais
Desse modo, sempre que o profissional festejados da atualidade, foi destaque nas
propuser um tratamento a um paciente, ele discussões de Cuidados Paliativos. Na oca-
deverá reconhecer a dignidade do paciente sião disse que “toda a ética surge de um
e considerá-lo em sua totalidade (todas as processo intelectual completo, que parte da
dimensões do ser humano devem ser con- pergunta: ‘o que devemos fazer?’”, e ressal-

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Capítulo 5 - Bioética e legislaçâo em cuidados paliativos

tou que há, pelo menos, quatro valores em como o sistema jurídico tutela esse direito.
conflito no contexto das decisões em fase Para viabilizar o conhecimento desse
final de vida. São eles: 1) a contra-indica- ordenamento jurídico é importante frisar
ção médica (princípio bioético da Não-Ma- que ele é composto por um conjunto de
leficência); 2) a futilidade terapêutica (que espécies normativas diferenciadas, que são
envolve a Beneficência); 3) a gestão eficien- hierarquizadas, escalonadas e emanadas
te de recursos (Justiça); e 4) a “decisão” do pelo próprio Estado.
paciente (Autonomia).9 Tal modelo foi proposto por Hans Kel-
Vale ressaltar que esses princípios foram sen, jurista alemão do século passado e
os norteadores de todo o arcabouço norma- consagra a supremacia da Norma Funda-
tivo existente em Cuidados Paliativos, sen- mental estabelecendo uma dependência
do que alguns deles foram inclusive previs- entre as demais normas, onde a norma de
tos explicitamente, tornando-se verdadeiras grau inferior sempre será válida quando
regras que tem como características um fundar-se nas normas superiores. A de-
maior grau de concretude. nominada Pirâmide de Kelsen, ilustrada a
Assim, centrados nesses princípios da seguir, retrata bem este sistema de escalo-
Bioética, existe um ordenamento jurídico vi- namento das normas.
gente, que apesar de disperso, cria regramen-
to específico para respaldar o profissional de DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL
saúde na aplicação dos Cuidados Paliativos. Verifica-se que a Constituição Federal
Importante que o profissional conheça ocupa o topo da pirâmide, sendo conside-
as normas existentes para que possa pautar rada a “lei fundamental”. Assim ela orga-
sua atuação de forma segura, com tomada niza os elementos essenciais do Estado tais
de decisões quanto ao tratamento a ser rea- como: forma do Estado e de seu governo,
lizado, principalmente levando em conta os modos de aquisição e exercício do Po-
que ele está tratando diretamente com a ter- der, seus órgãos com limites de ação; além
minalidade da vida. dos direitos e garantias fundamentais dos
Para Moraes10, o direito à vida é o mais cidadãos.
fundamental de todos os direitos, pois seu Percebe-se que ao longo de seu texto,
asseguramento impõe-se como um pré re- a Constituição consagra o direito à vida,
quisito à existência e exercício de todos os de- à saúde e à dignidade da pessoa humana
mais direitos. Daí a necessidade de conhecer como valores indispensáveis à existência

Constituição Federal (05/10/88)

Emendas
Constitucionais

Leis (Complementares, Ordinárias,


Delegadas) e Medidas Provisórias

Decretos (servem para regulamentar uma lei)

Resoluções, Instruções Normativas, Portarias, etc.

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Capítulo 5 - Bioética e legislaçâo em cuidados paliativos

do ser humano. Esses bens jurídicos são di- possuem respaldo constitucional em função
retamente abrangidos pelas ações dos profis- do princípio da dignidade humana.
sionais de saúde.
Assim, todas as normas que compõem o DAS LEIS
arcabouço normativo devem estar em conso- Logo abaixo da Constituição Federal, na di-
nância com o quanto estabelecido na Consti- visão traçada por Kelsen, encontram-se as leis.
tuição Federal, obedecendo seus parâmetros É verdade que até o momento não exis-
e princípios. te nenhuma lei federal que trate especifica-
O artigo 5º de nossa Constituição estabe- mente sobre os Cuidados Paliativos. Toda-
lece a inviolabilidade do direito à vida como via, apesar de inexistir uma codificação em
um direito fundamental.11 Cuidados Paliativos, há dispositivos esparsos
na legislação que, interpretados sistematica-
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, mente, respaldam a decisão do médico em
sem distinção de qualquer natureza, Cuidados Paliativos.
garantindo-se aos brasileiros e aos es- O Código Civil Brasileiro (Lei Federal
trangeiros residentes no País a inviola- 10.406 de 10 de janeiro de 2002) concretizou
bilidade do direito à vida, à liberdade, o princípio da autonomia da vontade, consa-
à igualdade, à segurança e à proprie- grado na Bioética.
dade, nos termos seguintes: (g.n). O Código Civil de 2002 estabelece em seu
artigo 15:13
Assim, ao assegurar o direito à vida,
cabe ao Estado fazê-lo em sua dupla acep- Art. 15. Ninguém pode ser constran-
ção, sendo a primeira relacionada ao direito gido a submeter-se, com risco de
de continuar vivo e a segunda de ter vida vida, a tratamento médico ou a in-
digna.10 tervenção cirúrgica
A vida digna de ser vivida encontra seu
respaldo no artigo 1º, inciso III, a Constitui- Pelo disposito verifica-se que o legislador
ção Federal que preconiza o princípio da dig- conferiu ao paciente o direito de participar
nidade da pessoa humana como norteador do processo de decisão sobre seus procedi-
dos demais direitos estabelecidos em todo o mentos diagnósticos e terapêuticos.14
texto constitucional. O mesmo princípio da autonomia está
Esse princípio da dignidade da pessoa também consagrado no Estatuto do Idoso
humana é fundamento da República Federa- (Lei federal nº 10.741 de 1º de outubro de
tiva do Brasil, sendo um valor-guia de todos 2003), que em seu artigo 17 estabelece:15
os outros Direitos Fundamentais e de toda a
ordem constitucional, razão por que ele é ca- Art. 17. Ao idoso que esteja no domí-
racterizado como princípio de maior hie- nio de suas faculdades mentais é as-
rarquia axiológico-valorativa.12 segurado o direito de optar pelo trata-
Nesta esteira, esse princípio deve nortear mento de saúde que lhe for reputado
toda conduta dos profissionais da saúde, con- mais favorável.
ferindo a eles um cuidar da vida do paciente
em toda sua amplitude, incluindo não só uma Parágrafo único. Não estando o idoso em
vida saudável, mas também uma morte dig- condições de proceder à opção, esta será feita:
na, com conforto físico, psíquico, espiritual
e familiar, sem seu prolongamento indevido. I – pelo curador, quando o idoso for
Dessa forma, o morrer com dignidade interditado;
representa respeito ao direito à vida consa- II – pelos familiares, quando o idoso
grado no artigo 5º da Constituição Federal. não tiver curador ou este não puder ser
Vê-se, portanto que os Cuidados Paliativos contactado em tempo hábil;

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Capítulo 5 - Bioética e legislaçâo em cuidados paliativos

III – pelo médico, quando ocorrer iminen- Estabelece o artigo 2º da referida lei:
te risco de vida e não houver tempo hábil Artigo 2º. São direitos dos usuários dos
para consulta a curador ou familiar; serviços de saúde no Estado de São Paulo:
IV – pelo próprio médico, quando não
houver curador ou familiar conhecido, XXIII – recusar tratamentos dolorosos
caso em que deverá comunicar o fato ou extraordinários para tentar prolon-
ao Ministério Público. gar a vida. (g.n)
XXIV- optar pelo local da morte.
Resta clara a intenção do legislador de
que o paciente participe de forma ativa no Observa-se que essa legislação precur-
processo decisório do procedimento a ser sora introduziu no Estado de São Paulo a
realizado pelo profissional de saúde. filosofia dos Cuidados Paliativos. Embora
Isto acompanha a mudança significativa não estabeleça o que venham a ser trata-
ocorrida no relacionamento dos profissio- mentos extraordinários, essa lei é conside-
nais da área médica e os pacientes, passando rada pela Doutrina um marco para o exer-
de um modelo tradicionalmente autoritário cício dos Cuidados Paliativos.
e paternalista para um mais equilibrado de Ainda no âmbito das leis existem projetos
responsabilidade compartilhada e parceria, em tramitação no Congresso Nacional que
onde o paciente torna-se mais atuante no tratam especificamente do tema de Cuidados
cuidado à sua saúde.16 Paliativos, porém nenhum deles encontram-
Esta postura está implicada no conceito se em estado avançado de tramitação e na
de Cuidados Paliativos, como podemos per- iminência de aprovação.
ceber na fala de Cicely Saunders, pioneira da
concepção do moderno Hospice: “Cuidados DAS RESOLUÇÕES
Paliativos se inicia a partir do entendimento A lei n.º 3.268, de 30 de setembro de 1.957
de que cada paciente tem sua própria histó- estabelece:
ria, relacionamentos, cultura e que merecem
respeito, como um ser único e original”. Ela Art. 2.º O Conselho Federal e os Con-
ainda conclui: "Este respeito inclui propor- selhos Regionais de Medicina são ór-
cionar o melhor cuidado médico disponível gãos supervisores da ética profissional
e disponibilizar a ele conquistas das últimas em toda República e ao mesmo tempo
décadas, de forma que todos tenham a me- julgadores e disciplinadores da classe
lhor chance de viver bem o seu tempo”.17 médica, cabendo-lhe zelar e trabalhar,
O dever do médico em informar seus por todos os meios ao seu alcance, pelo
pacientes a respeito do diagnóstico, prog- perfeito desempenho ético da medicina
nóstico e tratamentos se caso não cum- e pelo prestígio e bom conceito da pro-
prido, pode caracterizar infrações aos fissão e dos que a exercem legalmente;
ditames da ética médica. Todavia, apesar Ar. 15 – São atribuições dos Conselhos
do caloroso debate sobre a matéria, enten- Regionais:
demos que em situações confirmadas por h) promover, por todos os meios ao seu
iminente perigo de vida, o médico poderá alcance, o perfeito desempenho técni-
tomar unilateralmente a decisão em reali- co e moral da medicina e o prestígio e
zar determinado procedimento. bom conceito da medicina, da profis-
Ainda, trazemos à baila a Lei Estadual são e dos que a exercem.
Paulista nº Lei 10.241 de 1999, considerada
uma legislação vanguardista por normatizar Passo marcante do Conselho Federal de
o direito do paciente em recusar tratamentos Medicina é a sua normatividade técnica, ou
invasivos para apenas tentar prolongar a vida seja, o poder de regular matéria de ordem
a qualquer custo.18 técnica estrita a sua alçada.

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Capítulo 5 - Bioética e legislaçâo em cuidados paliativos

Essas resoluções do Conselho Federal de Art. 41. Abreviar a vida do paciente,


Medicina contém a maioria das orientações ainda que a pedido deste ou de seu re-
sobre os Cuidados Paliativos. No momento presentante legal.
três são as resoluções que podem incremen- Parágrafo único. Nos casos de doença
tar as discussões. São elas: a resolução nº incurável e terminal, deve o médico
1931/2009, a resolução nº 1805/06 e a resolu- oferecer todos os Cuidados Paliati-
ção nº 1955/2012.19,20,21 vos disponíveis sem empreender ações
A resolução nº 1931/2009, conhecida diagnósticas ou terapêuticas inúteis ou
como o novo Código de Ética Médica, que obstinadas, levando sempre em consi-
sistematiza as regras gerais de comporta- deração a vontade expressa do pacien-
mento do médico cuida especificamente dos te ou, na sua impossibilidade, a de seu
Cuidados Paliativos em diversos dispositi- representante legal. (g.n.)
vos. São eles:
Percebe-se nestes dispositivos uma con-
Capítulo I sonância com o princípio da dignidade da
PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS pessoa humana, tendo o Conselho Federal de
Medicina introduzido os Cuidados Paliativos
XXII - Nas situações clínicas irrever- em sua normativa por entender que em casos
síveis e terminais, o médico evitará terminais a morte deva ocorrer no seu tem-
a realização de procedimentos diag- po, ou seja, possibilitar a ortotanásia.
nósticos e terapêuticos desnecessários Antes mesmo do novo Código de Ética
e propiciará aos pacientes sob sua Médica, o Conselho Federal de Medicina já
atenção todos os Cuidados Paliativos havia editado a Resolução 1.805 de 2006 que
apropriados. (g.n) permitia ao médico limitar ou suspender na
fase terminal de enfermidades graves trata-
Capítulo IV mentos que prolonguem a vida do doente.
DIREITOS HUMANOS Tal resolução enfatizou a vontade da pessoa
É vedado ao médico: ou de seu representante legal e dispôs tam-
bém sobre a manutenção dos cuidados indis-
Art. 22. Deixar de obter consentimen- pensáveis para aliviar o sofrimento.
to do paciente ou de seu representante Em que pese a tentativa do Conselho
legal após esclarecê-lo sobre o pro- Federal de Medicina em normatizar a orto-
cedimento a ser realizado, salvo em tanásia, esta resolução foi alvo de ação civil
caso de risco iminente de morte. (g.n) pública proposta pelo Ministério Público
Art. 24. Deixar de garantir ao pa- Federal onde se questionou tanto o poder re-
ciente o exercício do direito de decidir gulamentador do Conselho como o seu con-
livremente sobre sua pessoa ou seu teúdo. Para o Ministério Público, a resolução
bem-estar, bem como exercer sua au- estaria tipificando uma conduta criminosa -
toridade para limitá-lo. (g.n.) a eutanásia.
A resolução só estabeleceu diretrizes so-
Capítulo V bre o que já estava constitucionalmente as-
RELAÇÃO COM PACIENTES E FAMILIARES segurado e que ela apenas ratifica o que já é
É vedado ao médico: permitido pelo ordenamento jurídico vigen-
te, a ortotanásia. A preocupação da resolução
Art. 31. Desrespeitar o direito do pacien- 1.805 de 2006 era resguardar o profissional
te ou de seu representante legal de decidir médico de qualquer responsabilidade e escla-
livremente sobre a execução de práticas recer a equipe médica que a prática da orto-
diagnósticas ou terapêuticas, salvo em tanásia se amoldava perfeitamente ao orde-
caso de iminente risco de morte. namento jurídico brasileiro.

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Capítulo 5 - Bioética e legislaçâo em cuidados paliativos

Entretanto, a decisão desta ação civil pú- livre sua vontade. Discutiremos tal assunto
blica foi no sentido de que a Resolução nº em outro capítulo.
1805/2006 em nada ofende o ordenamento Interessante notar que este documento
jurídico posto. deverá ser registrado no prontuário mé-
Segue abaixo, parte do parecer da Procu- dico e prevalecerão sobre qualquer outro
radora da República Luciana Loureiro Oli- parecer não médico, inclusive sobre os de-
veira, que foi utilizado para compor a senten- sejos dos familiares, respeitando os princí-
ça desta ação civil pública.22 pios da dignidade da pessoa humana e da
Nossa posição se resume, brevemente, em autonomia privada.
três premissas:
1. O CFM tem competência para edi- CONSIDERAÇÕES FINAIS
tar a resolução nº 1805/2006, que Os princípios da bioética foram baliza-
não versa sobre direito penal e, sim, dores de toda normatização em Cuidados
sobre ética médica e consequências Paliativos. A ponte entre as ciências jurídi-
disciplinares; ca e médica pode ser entendida através dos
2. A ortotanásia não constitui crime de princípios mais conceituados: autonomia,
homicídio, interpretado o código pe- beneficência e não-maleficência e justiça.
nal à luz da constituição federal; Leo Pessini diz que a bioética principia-
3. A edição da resolução nº 1805/2006 lista norte-americana pode ser insuficiente
não determinou modificação signifi- para o cuidado paliativo. Afirma: "uma ética
cativa no dia-a-dia dos médicos que do cuidado e das virtudes apresenta-se como
lidam com pacientes terminais, não apropriada e necessária em Cuidados Palia-
gerando, portanto, os efeitos danosos tivos". E explica que a ética não diz respeito
propugnados pela inicial; somente ao processo de decidir, mas também
4. A resolução nº 1805/2006 deve, ao envolve a qualidade das relações, tais como
contrário, incentivar os médicos a continuidade, abertura e confiança.18
descrever exatamente os procedi- Embora não exista uma codificação
mentos que adotam e os que deixam específica, os Cuidados Paliativos encon-
de adotar, em relação a pacientes ter- tram-se respaldados pelos princípios da
minais, permitindo maior transpa- dignidade humana e da autonomia, posi-
rência e possibilitando maior contro- tivados na Constituição Federal de 1988,
le da atividade médica; no Código Civil de 2002 e no Estatuto do
5. Os pedidos formulados pelo ministé- Idoso, respectivamente. Tais normativas
rio público federal não devem ser aco- conferem ao médico legitimidade para o
lhidos, porque não se revelarão úteis exercício dos Cuidados Paliativos sem ca-
as providências pretendidas, em face racterizar qualquer conduta criminosa
da argumentação desenvolvida. (G.N) descrita na legislação penal.
Salienta-se a importância da lei paulista
Diante desta decisão, a resolução deve nº 10.241 de 1999 como marco no estado de
ser utilizada como orientação norteado- São Paulo para a prática dos Cuidados Palia-
ra para comunidade médica sem que paire tivos. No entanto, há necessidade de regula-
qualquer dúvida acerca da sua legitimidade mentação para sua efetiva aplicação.
e sua vigência. Verificou-se que a maioria das orienta-
Já em 30 de agosto de 2012, o CFM editou ções acerca do tema são trazidas por reso-
nova Resolução nº 1955/201214. Esta nova luções do Conselho Federal de Medicina
resolução traz as diretivas antecipadas como que fazem parte do ordenamento jurídico
documento garantidor do exercício da auto- e foram editadas dentre do poder norma-
nomia do paciente caso este se encontre inca- tivo técnico. Assim, como essas resoluções
paz de se comunicar ou expressar de maneira estão em harmonia com os fundamentos e

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Capítulo 5 - Bioética e legislaçâo em cuidados paliativos

valores constitucionais e demais diplomas vida, também não existiria, pois a vida é, pre-
legais elas passam a nortear o tema dos cisamente, uma permanente despedida...”.23
Cuidados Paliativos.
No entanto, sendo o Brasil um Estado REFERÊNCIAS
Democrático de Direito, cabe ao legislador 1. OLIVEIRA A R, CARVALHO T R. Bioé-
disciplinar os Cuidados Paliativos para que tica: Refletindo sobre os Cuidados. In:
os profissionais da saúde possam ter uma Cuidado Paliativo. São Paulo, Cremesp.
atuação ainda mais segura, legitimando sua 2008. 573-580.
completa atuação com vistas sempre à digni- 2. BOURGEAULT G. Religião e Ética na me-
dade de seus pacientes em todas as fases da dicina. In: Ser Humano/Essência da ética,
vida, início, meio e fim. da medicina e da espiritualidade. Londri-
Enfim, o movimento dos Cuidados Palia- na: Eduel. 2000. 131-138.
tivos trouxe de volta, no século XX, a possi- 3. SEGRE M & COHEN, C.(ORGS). Bioética.
São Paulo: Edusp. 1995.
bilidade de (re)humanização do morrer, con-
4. SERTÃ C L R. Princípios da Bioética e do
trapondo-se a medicina mecanizada gerada
Biodireito. In: A Distanásia e a Dignidade
pelo desenvolvimento tecnológico que evita
do Paciente.Rio de Janeiro: ed. Renovar.
as discussões sobre a morte. Ou seja, nos 2005. 51-52.
Cuidados Paliativos, a morte é vista como 5. ABOUD A. Ortotanásia: Aspectos da Mor-
parte do processo da vida e, no adoecimen- te no Tempo Certo. In: Revista Escola Supe-
to, os tratamentos devem visar à qualidade rior da Procuradoria Geral do Estado. São
dessa vida e o bem-estar da pessoa, mesmo Paulo. 2009.
quando a cura não é possível.17,5 6. KÓVACS M J. Bioética na questões da
Concluímos que todo ser humano tem o vida e da morte. In Psicologia. USP. 2003.
direito de morrer sem sofrimento. Assim, os 14(2)115-167.
profissionais de saúde devem evitar o prolon- 7. JUNQUEIRA C R. Bioética: conceito, fun-
gamento do morrer baseando suas opções damentação e princípios. In: Módulo Bioé-
terapêuticas nos princípios da bioética e na tica/Especialização em Saúde da Família
ordenação jurídica de nosso país. - Modalidade a distância. UNASUS. Dispo-
Rubem Alves poeticamente descreve em nível em: www.unasus.unifesp.br/bibliote-
um dos seus contos no livro “O Médico”, o ca_virtual/esf/2/.../unidade18.pdf.
paliativista como morienterapeuta (moriens, 8. Centro de Bioética. Cremesp, SP. Disponí-
que quer dizer “que está morrendo"; e the- vel em: www.bioetica.org.br/.
rapeuein, que quer dizer "cuidar"). E conta: 9. 
SIQUEIRA JE. Definindo e aceitando
“Vida e morte não são inimigas. São irmãs. a terminalidade da vida. In: Conflitos
Chegada e despedida... Sem a frase que a en- Bioéticos do viver e do morrer. CFM, Bra-
cerra a canção não existiria. Sem a morte, a sília. 2011. 15-24.

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Diretivas antecipadas de vontade 6
CAPÍTULO

Flávia Areco
Alexandre Aboud
Vanessa Akemi Moromizato Hashimoto
Aline Arlindo Vieira

INTRODUÇÃO E DEFINIÇÃO O testamento vital é um documento es-


A palavra autonomia, do grego autos crito no qual o paciente, diante de uma pa-
(próprio) e nomos (regra, autoridade ou lei), tologia terminal, incurável ou irreversível,
foi empregada inicialmente para expressar com plena capacidade mental e de forma li-
o autogoverno das cidades-estados indepen- vre e consciente expressa antecipadamente
dentes. Na década de 1970, ela incorporou-se sua vontade a respeito da não realização de
à bioética médica para significar atribuição determinados procedimentos e terapêuticas
de poder para a tomada de decisões sobre que prolonguem futilmente a sua vida. Per-
assuntos médicos, sendo que, de lá para cá, mite-se dessa maneira uma morte digna e
essa palavra está cada vez mais incorporada sem sofrimento.3
à relação médico-paciente.1 As diretivas antecipadas surgiram pela
Essa relação, que anteriormente era pater- primeira vez nos Estados Unidos, em 1969,
nalista tendo o médico como soberano sobre através de um documento criado pelo advo-
as decisões clínicas, passou, de forma gra- gado Luiz Kutner no qual o próprio indivi-
dativa, a ser influenciada pelo princípio da duo declarava que deveriam ser suspensos os
autonomia, segundo o qual o paciente deve tratamentos médicos caso estivesse em esta-
participar do processo de decisão sobre seus do vegetativo.
procedimentos diagnósticos e terapêuticos.1 Nas décadas seguintes, a opinião pública
Além da autonomia, uma outra palavra americana foi mobilizada por processos ju-
vem ganhando espaço nos últimos anos, a diciais de grande repercussão, cujo objetivo
ortotanásia. Esta se refere à morte natural, era a comprovação das declarações prévias
com dignidade, com conforto físico, psíqui- de vontade. Cita-se como exemplo o caso de
co, espiritual e familiar, sem seu prolonga- Karen Ann Quilan, uma jovem de 22 anos
mento ou encurtamento indevido.2 em estado de coma, cujos pais solicitaram à
Assim, com o intuito de assegurar a auto- justiça a retirada dos aparelhos que a man-
nomia dos pacientes e garantir a ortotanásia, tinham viva, alegando a irreversibilidade
surgiram as diretivas avançadas que podem do quadro e a manifestação prévia da von-
ser expressas na forma do que alguns autores tade da filha. Casos como esse fizeram com
chamam de testamento vital. que muitas pessoas temessem ficar presas a

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Capítulo 6 - Diretivas antecipadas de vontade

tratamentos similares aos impostos àqueles de temporária. Por essa razão, caso a pessoa
pacientes, com a Justiça exigindo, ao final de queira fazer as duas modalidades de diretivas
suas vidas, provas das preferências prévias de antecipadas, o recomendado é que as faça se-
cada um. Assim, nesse período iniciou-se a paradamente cada uma delas, como acontece
regularização de documentos que expressem nos EUA e na Espanha, países que já adota-
a vontade prévia do paciente quanto a inter- ram a utilização do testamento vital.6
venções médicas para a manutenção da vida. Importante ressaltar que uma vez que o
Em 1991, surgiu uma lei de âmbito fede- mesmo documento se refira às duas modali-
ral, conhecida como Patient Self Determi- dades, este é tido como declaração prévia de
nation Act (lei federal de autodeterminação vontade do paciente terminal, inviabilizando
do paciente), que garantia a aplicação dos a utilização do procurador em caso de inca-
princípios das diretivas antecipadas. Após pacidade temporária.6
sua oficialização, essa legislação passou a ser Nos EUA e na Espanha, a análise da vali-
colocada em prática nas instituições hospi- dade da declaração pode ser pública ou pri-
talares governamentais no momento em que vada. Na primeira, o documento é registrado
o paciente dava entrada no hospital, quando em cartório, mediante escritura pública, sem
lhe era perguntado se já tinha elaborado suas a presença de testemunhas. Já na declaração
diretivas antecipadas. A partir desse mo- privada, o documento deve ser assinado por
mento, a aplicação das vontades antecipadas testemunha, a fim de garantir a segurança ju-
passou a ter uma ampla difusão chegando-se rídica6. Além disso, nesses países os pacientes
a ter, em 2010, 70% da população norte ame- podem modificar suas diretivas antecipadas
ricana com suas diretivas elaboradas.4 sempre que considerarem necessário.
Na Austrália, por sua vez, foi criado o
DIRETIVAS ANTECIPADAS NO MUNDO Consent to medical treatment and Palliative
Nos Estados Unidos, país onde as dire- Care (1995), que é uma lei geral sobre os di-
tivas antecipadas já são bem estabelecidas, reitos dos pacientes no qual pessoas a partir
existem dois tipos de diretivas que optamos dos 18 anos podem formular suas diretivas
chamar como Mandato Duradouro e Testa- antecipadas, de modo formal com duas tes-
mento Vital ou declaração prévia de vontade temunhas, e tomar decisões sobre o próprio
do paciente terminal.6 tratamento a partir dos 16 anos. Essa lei es-
O primeiro é um documento no qual o tabelece que nos casos de indicação de um
paciente nomeia um ou mais procuradores representante legal o mesmo não pode ser o
que deverão ser consultados pelo médico na médico do paciente e só será válido se a pes-
circunstância de sua incapacidade para deci- soa estiver em plenas condições de decidir
direm sobre seu tratamento e procedimentos sobre suas vontades. Além disso, não permite
a serem realizados. Nestes casos, o procura- ao representante decidir sobre administração
dor de saúde tomará a decisão baseado na de alimentos e água, drogas para aliviar a dor
vontade do paciente e não em suas próprias.6 ou qualquer forma de sofrimento e qualquer
Já o testamento vital ou declaração prévia medida que resulte no restabelecimento da
de vontade do paciente terminal é um docu- capacidade de decisão do paciente.
mento que deve estar ao alcance de todos no Assim como nos países já citados, a maio-
qual o paciente expõe os procedimentos e ria das províncias do Canadá possuem leis
tratamentos que deseja realizar ou não, dian- referentes às Diretivas Antecipadas. Nestas
te de uma enfermidade terminal.6 províncias, a diretiva pode ser realizada por
Enquanto a declaração prévia de vontade qualquer pessoa de 16 anos ou mais que seja
do paciente terminal só produzirá efeito nos mentalmente capaz de compreender sobre
casos de incapacidade definitiva (irreversi- sua situação de saúde, tratamentos e inter-
bilidade) do paciente, o mandato duradouro venções disponíveis e consequências relevan-
poderá ser também utilizado se incapacida- tes. O mesmo vale para o representante legal

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Capítulo 6 - Diretivas antecipadas de vontade

escolhido que deve ter 18 anos ou mais. Inte- Deve ser ressaltado que essa resolução foi
ressante o fato de que o documento das dire- questionada pelo Ministério Público Federal
tivas antecipadas está facilmente disponível (MPF), ação que tramitou na 14ª Vara Fede-
em livrarias e papelarias deste país. ral do Distrito Federal. Na referida ação, o
Enfim, vários são os países onde as di- MPF questionou a possibilidade do Conselho
retivas antecipadas são normatizadas. Aqui Federal de Medicina estabelecer o parâmetro
citamos outros exemplos: Portugal, Japão, ético de uma conduta tipificada como crime.
Holanda, Nova Zelândia, Reino Unido, Suí- Porém, a resolução do CFM trata da ortota-
ça, Noruega, Alemanha, Bélgica, Finlândia, násia, e não da eutanásia, como argumentado
Índia, Israel, Luxemburgo, Zimbábue, Uru- pela justiça. Fato é que são situações diferen-
guai e Argentina. tes, pois enquanto a eutanásia passiva, ainda
que consentida, pressupõe a suspensão de
DIRETIVAS ANTECIPADAS NO BRASIL meios terapêuticos proporcionados e úteis, a
Ao contrário desses países, ainda não ortotanásia na declaração prévia de vontade
existe no Brasil legislação específica para do paciente terminal suspende tratamentos
a ortotanásia e diretivas antecipadas. O extraordinários, ou fúteis.10 Em outras pala-
que temos atualmente são algumas reso- vras, na eutanásia passiva provoca-se a morte
luções do Conselho Federal de Medicina. e na ortotanásia ela ocorre de modo natural.6
Todavia, uma interpretação sistemática Não por isso, com base em seu poder nor-
da Constituição Federal, do Código Civil mativo, o Conselho Federal de Medicina edi-
e do Estatuto do Idoso autorizam a aplica- tou em setembro de 2009 A Resolução 1931,
bilidade da ortotanásia. aprovando O novo Código de Ética Médica
A Constituição Federal estabelece que o que também passou a prever a prática da
Estado Brasileiro tem como um de seus fun- ortotanásia. “Em casos de doença incurável
damentos a dignidade da pessoa humana. ou terminal, deve o médico oferecer todos
Já o Código Civil, de 2002, estabeleceu, em os Cuidados Paliativos disponíveis sem em-
seu artigo15, que: “Ninguém pode ser cons- preender ações diagnósticas ou terapêuticas
trangido a submeter-se, com risco de vida, a inúteis, levando sempre em conta a vontade
tratamento médico ou a intervenção cirúr- expressa do paciente e na impossibilidade, de
gica”11,12, assegurando assim o princípio da seu representante legal.”
autonomia. Assim como o Código Civil, o Esse poder normativo técnico do Con-
Estatuto do Idoso, de abrangência nacional, selho Federal de Medicina está respaldado
estabelece: “Ao idoso que esteja no domínio pela Lei n. 3268, de 1957, que estabelece que
de suas faculdades mentais é assegurado o o Conselho Federal e os Conselhos Regionais
direito de optar pelo tratamento de saúde que de Medicina são órgãos supervisores da ética
lhe for reputado mais favorável”. profissional em toda a República e ao mesmo
O Conselho Federal de Medicina (CFM) tempo julgadores e disciplinadores da classe
editou em 2006 a Resolução 1.805, permitindo médica, cabendo zelar e trabalhar pelo per-
ao médico limitar ou suspender tratamentos feito desempenho técnico e ético da medicina
que prolonguem a vida do doente na fase ter- e pelo prestígio e bom conceito da profissão e
minal, de enfermidades graves e incuráveis, dos que a exercem legalmente. Porém tal po-
respeitada a vontade da pessoa ou de seu repre- der ainda é tema de debate atual.
sentante legal. Além disso, o doente continuará Finalmente, em 30 de agosto de 2012, o
a receber todos os cuidados necessários para CFM editou nova Resolução 1955, baseado
aliviar os sintomas que levam ao sofrimento, nos princípios contidos no próprio Código de
assegurada a assistência integral, o conforto Ética Médica de 2009, que estabelece como
físico, psíquico, espiritual e social, inclusive as- um de seus fundamentos a questão da auto-
segurando-lhe o direito a alta hospitalar. Tal re- nomia do paciente, reconhecendo que ela não
solução disciplina os princípios da ortotanásia. destitui a autonomia do médico, mas sim re-

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Capítulo 6 - Diretivas antecipadas de vontade

conhece a alteridade presente nesta relação, para fundamentar sua decisão sobre
onde as decisões devem ser compartilhadas.11 conflitos éticos, quando entender esta
Assim, essa norma que reitera-se não se tra- medida necessária e conveniente.
tar de lei, disciplina as diretivas antecipadas. Como visto, a declaração prévia de von-
A seguir o conteúdo da resolução: tade do paciente terminal deve ser registrada
em prontuário e deve ser repassada para que
Resolução 1955/201213 toda equipe médica a conheça. O preenchi-
Art. 1°: Definir diretivas antecipadas mento do prontuário é de competência ex-
de vontade como o conjunto de desejos, clusiva do médico. Assim, ao ser informado
prévia e expressamente manifestados pelo paciente da existência e conteúdo da de-
pelo paciente, sobre cuidados e trata- claração, o médico deverá proceder à anota-
mentos que quer, ou não, receber no ção de tal instrumento no prontuário. Quan-
momento em que estiver incapacitado do há o documento formal, como nos países
de expressar, livre e autonomamente, citados anteriormente, este deve ser anexado
sua vontade. ao prontuário e a equipe multiprofissional
Art. 2°: Nas decisões sobre cuidados e deve se informada de sua existência.
tratamentos de pacientes que se encon- É importante salientar que é permitido
tram incapazes de comunicar-se, ou de ao médico, ante a declaração prévia de von-
expressar de maneira livre e indepen- tade do paciente terminal feita em desacor-
dente suas vontades, o médico levará do com os preceitos ditados pelo código de
em consideração suas diretivas anteci- ética, recusar-se a cumprir o ali constante.6
padas de vontade. Nesta circunstância, é necessário justificar o
§ 1º Caso o paciente tenha designado motivo da recusa baseado em razões éticas,
um representante para tal fim, suas in- morais, religiosas ou qualquer outra de foro
formações serão levadas em considera- íntimo, e encaminhar o paciente para os cui-
ção pelo médico. dados de outro médico. Não é possível que a
§ 2° O médico deixará de levar em con- recusa do médico seja injustificada.9
sideração as diretivas antecipadas de Atualmente existem alguns projetos de
vontade do paciente ou representante lei em andamento excluindo expressamente
que, em sua análise, estiverem em de- a ilicitude da ortotanásia e dispondo sobre
sacordo com os preceitos ditados pelo os direitos da pessoa em fase de doença ter-
Código de Ética Médica. minal. Ainda há projeto regulamentando a
§ 3° As diretivas antecipadas do pa- prática da ortotanásia no território nacio-
ciente prevalecerão sobre qualquer ou- nal. Observa-se através da propositura des-
tro parecer não médico, inclusive sobre ses projetos de lei que há tentativas parla-
os desejos dos familiares. mentares para a regulamentação da ortota-
§ 4° O médico registrará, no prontuá- násia e das diretivas antecipadas no Brasil.
rio, as diretivas antecipadas de vonta- Outro fato recente que corrobora a
de que lhes foram diretamente comuni- viabilidade de aplicação das diretivas an-
cadas pelo paciente. tecipadas é que o Conselho de Justiça Fe-
§ 5° Não sendo conhecidas as diretivas dera l aprovou enunciado favorável a sua
antecipadas de vontade do paciente, validade, com o seguinte teor: “garante
nem havendo representante designado, ao paciente plenamente capaz o poder de
familiares disponíveis ou falta de con- deliberar sobre todos os aspectos concer-
senso entre estes, o médico recorrerá ao nentes a tratamento médico que possa lhe
Comitê de Bioética da instituição, caso causar risco de vida, salvo as situações de
exista, ou, na falta deste, à Comissão emergência ou no curso de procedimentos
de Ética Médica do hospital ou ao Con- médicos cirúrgicos que não possam ser in-
selho Regional e Federal de Medicina terrompidos”.

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Capítulo 6 - Diretivas antecipadas de vontade

REFLEXÕES SOBRE AS tomadas conforme suas preferências, refle-


DIRETIVAS ANTECIPADAS tindo seus valores.
Na prática as diretivas antecipadas po- O princípio da não maleficência se refere
dem incitar algumas críticas. Nos países à obrigação de não cometer dano intencio-
onde há leis editadas sobre as diretivas nalmente. A formulação de critérios indivi-
avançadas, muitas vezes o funcionário que duais e pessoais de qualidade de vida permite
recebe diretamente o paciente não está de- ao médico diferenciar o fútil daquilo que é
vidamente habilitado para abordá-lo. Nos bom para o paciente. Assim, é possível dizer
EUA, por exemplo, os hospitais e centros que as diretivas antecipadas reduzem o so-
de saúde financiados pelo governo federal frimento, uma vez que trazem tranquilidade
perguntam aos pacientes no momento da ao paciente que sabe que suas vontades serão
internação se o mesmo possui uma diretiva respeitadas nas decisões relacionadas ao final
antecipada já elaborada, o que pode tornar a de vida.
relação do paciente com o provedor de saú- O princípio da justiça põe limites naqui-
de muito mecanizada. Tal fato pode fazer lo que o paciente pode solicitar ao médico. O
com que o paciente que não tenha diretiva paciente não poderá pedir menos do que a
previamente elaborada não seja assistido sociedade considera mínimo decente, assim
adequadamente. como não poderá pedir mais do que a socie-
Outro ponto a ser considerado é o fato de dade pode oferecer levando em conta a meta
que, em alguns países, para a elaboração das de distribuição equitativa de recursos.
Diretivas Antecipadas não ser exigido um Além de obedecer aos princípios da
diálogo prévio com o médico que assiste o bioética, é possível citar como argumento
paciente. Do ponto de vista ético, é muito im- favorável à elaboração das diretivas ante-
portante a participação ativa do profissional cipadas o fato de alguns trabalhos já mos-
de saúde que cuida do paciente no processo trarem evidências de benefício com o seu
de tomada de decisões. uso: os pacientes que tinham feito suas di-
A Resolução 1955/2012 do Conselho Fede- retivas avançadas tiveram seus cuidados de
ral de Medicina do nosso país apresenta uma fim de vida mais próximo do que deseja-
posição clara para o processo de tomada de vam.4 Além disso, foi associado a melhor
decisão em situações onde o paciente esteja uso de hospices e melhor comunicação com
incapacitado de participar ativamente neste familiares em relação a condição médica
processo, garantindo a possibilidade de que dos pacientes. Estudos mostraram tam-
seus desejos possam, ainda assim, ser levados bém gastos hospitalares menores com os
em consideração. Respeita os princípios cons- pacientes que tinham um documento sobre
titucionais da dignidade da pessoa humana e vontades antecipadas.7
da autonomia privada – princípios que propi-
ciam a coexistência de diferentes projetos de CONCLUSÃO
vida na sociedade democrática.6,11. Há poucas décadas, as decisões médicas
Como argumento favorável, as diretivas eram tomadas exclusivamente pelo médico.
antecipadas também respeitam os seguintes Nos dias atuais essas relações de saúde cons-
princípios da bioética: autonomia, não male- truídas sob o modelo paternalista estão mo-
ficência e justiça. dificadas, sendo que o processo de tomada
A autonomia de uma pessoa é respeitada de decisões é partilhado com o paciente em
quando se reconhece o direito de ter uma cada etapa e por isso as diretivas antecipadas
opinião, de tomar decisões e realizar ações tornam o melhor instrumento de apoio a este
baseadas em valores e crenças pessoais. Na processo decisório no final de vida.
criação de uma diretiva antecipada é encar- No Brasil não existe lei específica sobre o
regado ao paciente um papel mais ativo nos tema, porém esse vem ganhando força dentro
seus cuidados de saúde. Essas decisões são da prática médica, inclusive com a elaboração

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Capítulo 6 - Diretivas antecipadas de vontade

da Resolução 1955/2012 do CFM em 2012. vel em: jus.com.br/revista/texto/15066.


Em resumo, esta Resolução CFM 1955/2012 4. SILVEIRA MJ, KIM SYH, LANGA KM.
apresenta uma posição clara para o proces- Advance directives and outcomes of surro-
so de tomada de decisão em situações onde gate decision making before death. N Engl J
o paciente esteja incapacitado de participar Med. 2010. 362:1211-1218.
ativamente neste processo, garantindo a pos- 5. GRINBER M, CHEHAIBAR GZ. Testa-
sibilidade de que seus desejos possam, ainda mento Vital. Arq. Bras. Cardiol. 2012. 99(6).
assim, ser levados em consideração. Também 6. PENALVA, LD. Declaração prévia de von-
tade do paciente terminal. Revista de Bioé-
respeita os princípios constitucionais da dig-
tica. 2009. 17(3):523- 543.
nidade da pessoa humana e da autonomia
7. TENO JM, GRUNEIR A, SCHWARTZ Z,
privada – princípios que propiciam a coexis-
NANDA A, WETLE T. Association bet-
tência de diferentes projetos de vida na socie-
ween advance directives and quality of end
dade democrática.6,11 -of-life care: a national study. J Am Geriatr
Todavia, para importação desse modelo Soc. 2007. 55(2):189-94.
faz-se necessário que as diretivas antecipa- 8. Testamento vital (homepage na internet).
das não sejam apenas um papel previamente Legislação. Disponível em: http://www.tes-
preenchido com a assinatura do paciente, e sim tamentovital.com.br.
um instrumento que represente o diálogo fran- 9. HABERMAS J. O futuro da natureza hu-
co e aberto ocorrido entre médico e paciente. mana. São Paulo: Martins Fontes. 2004. p.5.
10. GARAY OE. Derechos fundamentales de
REFERÊNCIAS los pacientes. Buenos Aires: Ad-Hoc. 2003.
1. R IBEIRO DC. Autonomia: viver a própria 11. ALVES CA, FERNANDES MS, GOLDIM
vida e morrer a própria morte. Cad. Saúde JR. Diretivas antecipadas de vontade: um
Pública. 2006. 22(8):1749-1754. novo desafio para a relação médico-pa-
2. BURLÁ C, AZEVEDO DL. Paliação: cuida- ciente. Revista HCPA. 2012. 32(3):358-362.
dos do fim da vida. In: Freitas EV, Py L. Tra- 12. Brasil. Código Civil. Lei 10.406/2002. 2002.
tado de Geriatria e Gerontologia. Rio de Ja- 13. Conselho Federal de Medicina (CFM).
neiro: Guanabara Koogan. 2011. p.1226-1241. RESOLUÇÃO CFM no 1.995/2012. Dis-
3. GODINHO, AM. Testamento vital e o or- põe sobre as diretivas antecipadas de
denamento brasileiro. Jus Navigandi, Tere- vontade dos pacientes. Diário Oficial da
sina, ano 15, n. 2545, 20 jun. 2010. Disponí- União. 2012. Seção I(170): 269–270.

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Avaliação do paciente
em Cuidados Paliativos 7
CAPÍTULO

Ana Beatriz Galhardi Di Tommaso


Ana Laura de Figueiredo Bersani
João Toniolo Neto
Niele Silva de Moraes
Silvia Takahashi Ribeiro e Prado

INTRODUÇÃO AVALIAÇÃO INICIAL


Os profissionais que lidam com Cui- Na primeira avaliação, deve-se questio-
dados Paliativos devem compreender que nar de forma criteriosa como e quando foi
o paciente e seus familiares estão enfren- realizado o diagnóstico da doença de base,
tando um momento difícil que acarreta os tratamentos já realizados, as complica-
grande sofrimento e que requer tomada de ções relacionadas ao diagnóstico principal
decisões importantes e muitas vezes an- ou ao tratamento instituído, época de apa-
gustiantes. O paciente encontra-se bastan- recimento e condutas adotadas, os diag-
te fragilizado e precisa ser compreendido nósticos secundários/comorbidades e todos
como alguém que sofre, não somente, devi- os medicamentos em uso. Deve-se sempre
do à dor física, mas também por conflitos confirmar o diagnóstico da doença de base e
existenciais, e que apresenta necessidades estágio de evolução para a indicação correta
que os medicamentos e a alta tecnologia de Cuidados Paliativos.
não podem suprir. A família, por outro É importante o conhecimento da funcio-
lado, angustia-se por ver seu ente querido nalidade prévia à internação e a funciona-
sofrendo, por sentir-se impotente e por es- lidade atual, avaliando-se o impacto atual
tar sobrecarregada. da doença na rotina e qualidade de vida do
Para o melhor enfrentamento desta si- indivíduo. Devem ser investigadas quais são
tuação, é essencial que seja estabelecida as necessidades atuais do paciente e per-
uma boa relação entre o paciente, seus fa- guntar ativamente sobre a presença de sin-
miliares e a equipe assistencial. Deve ha- tomas, que, muitas vezes não são referidos
ver uma relação de confiança e respeito. O espontaneamente, mas estão presentes. O
paciente e seus familiares precisam sentir- exame físico deve ser cuidadoso, com aten-
se amparados, protegidos, confortados e ção à presença de possíveis causas de dor
compreendidos; necessitam compartilhar (como deformidades, úlceras por pressão) e
seus medos, anseios e sofrimento. Os pro- sinais de desconforto.
fissionais de saúde devem ser tolerantes, Ao final da avaliação inicial e ao final
transmitir segurança e se mostrarem sem- de todas as avaliações subsequentes, devem
pre disponíveis. ser oferecidas estratégias a curto prazo e

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Capítulo 7 - Avaliação do paciente em cuidados paliativos

deve ser desenhado um plano de cuida- as consultas deve-se avaliar a evolução dos
dos com o paciente, familiares e equipe sintomas e o impacto das medidas adota-
de saúde, provendo as necessidades atuais das. É importante estar atento para perce-
e prevenindo-se as complicações futuras, ber as angústias e necessidades do paciente
acolhendo o paciente como um ser biopsi- e perguntar sobre seus gostos e suas vonta-
cossocial através, não apenas do tratamen- des. O objetivo é mantê-lo com conforto e
to medicamentoso dos sintomas, mas tam- o máximo de qualidade de vida pelo maior
bém da abordagem não farmacológica e tempo possível. Deve-se atentar para os
acompanhamento multidisciplinar das de- detalhes porque, neste contexto, o mínimo
mandas físicas, psicológicas, sociais e espi- pode fazer grande diferença.
rituais. As medidas propostas serão segui-
das se forem aceitas pelos familiares e deve IDENTIFICAÇÃO
ficar claro que o paciente será submetido O paciente sempre deve ser chamado pelo
apenas aos tratamentos que concordar. nome ou apelido, em sinal de respeito à forma
Desde o primeiro contato, é essencial o como prefere ser lembrado. Para a constru-
estabelecimento de um bom vínculo com o ção de um bom vínculo entre o profissional
paciente e a família para que seja iniciada e o paciente e o estabelecimento de uma re-
uma relação de confiança e segurança. Este lação de confiança é de extrema importância
será uma ponte para os próximos conta- conhecer a história de vida desse indivíduo,
tos. O médico deve mostrar-se disponível seus interesses e gostos, saber quem são seus
para escutar, conversar, esclarecer dúvidas familiares e amigos mais próximos, em que
e discutir propostas de tratamentos. Deve trabalhava e o que gostava de fazer.
ser reforçado que o paciente será acompa-
nhado durante todo o curso da evolução da AVALIAÇÃO DOS SINTOMAS
doença, priorizando-se seu conforto e con- É fundamental perguntar sobre as ca-
trole dos sintomas desagradáveis, e que não racterísticas dos sintomas (duração, fre-
será abandonado. quência, caráter, intensidade, fatores de-
sencadeantes, fatores de melhora ou piora)
AVALIAÇÕES SUBSEQUENTES e tentar identificar suas causas para esta-
O paciente deve ser reavaliado frequen- belecimento do tratamento adequado. De-
temente, tendo em vista que nesta fase a ve-se atentar para sintomas secundários
sua situação se modifica constantemente ao uso de medicamentos, principalmente
e as suas demandas são grandes. Em todas em idosos, que são mais sensíveis aos efei-

Tabela 7.1 - Escala de Avaliação de sintomas de Edmonton (ESAS)- circular o número que melhor descreve a
intensidade dos sintomas nas últimas 24 horas.
Sem dor 0 – 1 – 2 – 3 – 4 – 5 – 6 – 7 – 8 – 9 – 10 Pior dor possivel
Sem cansaço 0 – 1 – 2 – 3 – 4 – 5 – 6 – 7 – 8 – 9 – 10 Pior cansaço possivel
Sem náusea 0 – 1 – 2 – 3 – 4 – 5 – 6 – 7 – 8 – 9 – 10 Pior náusea possivel
Sem depressão 0 – 1 – 2 – 3 – 4 – 5 – 6 – 7 – 8 – 9 – 10 Pior depressão possivel
Sem ansiedade 0 – 1 – 2 – 3 – 4 – 5 – 6 – 7 – 8 – 9 – 10 Pior ansiedade possivel
Sem sonolência 0 – 1 – 2 – 3 – 4 – 5 – 6 – 7 – 8 – 9 – 10 Pior sonolência possivel
Muito bom apetite 0 – 1 – 2 – 3 – 4 – 5 – 6 – 7 – 8 – 9 – 10 Pior apetite possivel
Sem falta de ar 0 – 1 – 2 – 3 – 4 – 5 – 6 – 7 – 8 – 9 – 10 Pior falta de ar possivel
Melhor sensação de Pior sensacao de
0 – 1 – 2 – 3 – 4 – 5 – 6 – 7 – 8 – 9 – 10
bem-estar possivel bem-estar possivel
Outro problema 0 – 1 – 2 – 3 – 4 – 5 – 6 – 7 – 8 – 9 – 10
Fonte: Regional Palliative Care Program, Capital Health, Edmonton, Alberta, 2003.
Traduzido e adaptado ao português por Neto, IG. 2006.

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Capítulo 7 - Avaliação do paciente em cuidados paliativos

tos adversos de medicamentos e nos quais lia a capacidade de realização das atividades
a polifarmácia é frequente, predispondo à instrumentais de vida diária (Tabela 7.3).
interação medicamentosa. Nos casos de idosos com demência de
Em Cuidados Paliativos, a escala mais Alzheimer, outra escala funcional pode ser
utilizada para mensuração da intensidade aplicada. Conhecida como FAST (funcio-
dos sintomas é a escala de avaliação de sin- nal assessment staging), esta escala per-
tomas de Edmonton (ESAS).1,2 Ela quanti- mite ser feita uma avaliação do estágio da
fica a intensidade dos principais sintomas demência através de dados sobre a funcio-
observados nos pacientes através de uma nalidade do paciente (Tabela 7.4). 5,6
escala numérica, na qual quanto maior o Em oncologia, as escalas mais utiliza-
número atribuído ao sintoma maior a in- das são as de Karnofsky 7,8 (Tabela 7.5) e
tensidade do mesmo (Tabela 7.1). ECOG9 (Tabela 7.6), que fazem uma avalia-
Porém, alguns pacientes, principalmen- ção do estado geral e da capacidade física
te idosos, têm dificuldade para informar a dos pacientes, avaliando assim sua elegibi-
intensidade dos sintomas (de 1 a 10). Por lidade para o tratamento.
isso, propomos que a descrição seja indi- Em Cuidados Paliativos a escala mais
vidualizada e adaptada para cada paciente utilizada é a Palliative Performance Scale
(ex: sintoma presente ou ausente; com in- (PPS)10,11. Seu uso é recomendado diaria-
tensidade leve, moderada ou forte; pontua- mente em pacientes internados, em todas
ção de zero a dez). as consultas ambulatoriais e nas visitas
domiciliares (tabela 7.7). Esta escala per-
AVALIAÇÃO FUNCIONAL mite uma avaliação ampla do estado geral
A avaliação funcional é fundamental do paciente, independentemente da doen-
em geriatria e em Cuidados Paliativos para ça presente.
a tomada de decisões. Duas escalas são lar-
gamente utilizadas em geriatria para ava- AVALIAÇÃO PROGNÓSTICA
liação da capacidade funcional em idosos. A avaliação prognóstica dos pacientes em
A escala de Katz 3, que avalia a capacidade Cuidados Paliativos é de suma importância
de realização das atividades básica de vida na elaboração do plano de cuidados. Estimar
diária (Tabela 7.2) e a de Lawton 4, que ava- o tempo de sobrevida permite à equipe loca-

Tabela 7.2 - Avaliação de atividades de Vida diária


Atividade Descrição Sim Nâo
Não recebe ajuda ou somente recebe ajuda
1. Banho
para uma parte do corpo.
Pega as roupas e veste-se sem ajuda,
2. Vestir-se
exceto para amarrar os sapatos
Vai e usa o banheiro, veste-se e retorna sem
3. Higiene Pessoal
qualquer ajuda.
Consegue deitar na cama, sentar na cadeira
4. Transfêrencia
e levantar sem ajuda.
5. Continência Controla completamente urina e fezes.
Come sem ajuda (exceto para cortar carnes
6. Alimentação
e passar margarina no pão)
Escore: 0 a 2 - totalmente dependente
3 a 4 - parcialmente dependente
5 a 6 - independente
(Sim= 0 pontos; Não = 1ponto)
Adaptado de: Katz, S. et al. The Index of ADL: A Standardized Measure of Biological and Psychosocial Function. JAMA, 1963.

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Capítulo 7 - Avaliação do paciente em cuidados paliativos

Tabela 7.3 - Atividades instrumentais de vida diária


Atividade Sem ajuda 3 Ajuda parcial 2 Não consegue 1
1. O Sr(a) consegue usar o telefone?
2. O Sr(a) consegue ir a um lugar distante, usando algum tipo de
transporte, sem necessidade de planejamentos especiais?
3. O Sr(a) consegue fazer compras?
4. O Sr(a) consegue preparar suas próprias refeições?
5. O Sr(a) consegue arrumar a casa?
6. O Sr.(a) consegue fazer trabalhos manuais, domésticos,
pequenos reparos?

7. O Sr.(a) consegue lavar e passar suas roupas?

8. O Sr.(a) consegue tomar seus remédios nas doses e horários


corretos?

9. O Sr.(a) consegue cuidar de suas finanças?

Escore: 9 - Totalmente dependente


10 a 15 - Dependência grave
16 a 20 - Dependência moderada
21 a 25 - Dependência leve
26 a 27 - Independente
Adaptado de: Lawton, et al. Assessment of older people: Self-maintaining and instrumental activities of daily living. Geron-
tologist 1969.

Tabela 7.4 - FAST (Funcional Assessment Staging) – Avaliação do Estágio Funcional


Estágio Característica
1 Adulto normal Nenhuma dificuldade objetiva ou subjetiva
2 Idoso normal Queixas de esquecimento de locais ou objetos. Dificuldades subjetivas no trabalho
Decréscimo do funcionamento no trabalho, evidente para os colegas. Dificuldades nas viagens
3 DA Incipiente
para novas localidades.
Decréscimo na habilidade de execução de tarefas complexas, manejo de finanças pessoais,
4 DA Leve
execução de compras, etc.
5 DA Moderada Requer assistência na escolha de trajes adequados
6A DA Moderada a Grave Dificuldade em vestir-se adequadamente
6B Incapaz de banhar-se adequadamente, pode desenvolver medo do banho
6C Incapacidade de manuseio da toalete
6D Incontinência urinária
6E Incontinência fecal
7A DA Grave Capacidade de falar limitada a meia dúzia de palavras ou menos, no curso médio de um dia
7B Capacidade de falar limitada a uma única palavra inteligível no curso médio de um dia
7C Capacidade de deambulação perdida
7D Perda da capacidade de se sentar sem assistência
7E Perda da capacidade de sorrir
7F Perda da capacidade de levantar a cabeça
7G Postura fletida

Adaptado de: Steven G, et al. Functional Assessment Staging (FAST) in Alzheimer’s Disease: Reliability, Validity, and Ordinali-
ty. International Psychogeriatrics, 1992.
DA= Demência de Alzheimer

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Capítulo 7 - Avaliação do paciente em cuidados paliativos

Tabela 7.5 - Índice de Karnofsky


Graduação Significado
100 Normal; ausência de queixas; sem evidências de doença
90 Capaz de realizar atividades normais; sinais e sintomas mínimos de doença
Atividade normal com esforço; alguns sinais ou sintomas de doença. Incapacidade para grande esforço
80
físico, consegue deambular
Não requer assistência para cuidados pessoais, mas é incapaz de realizar atividades normais, como tarefas
70
caseiras e trabalhos ativos
60 Requer assistência ocasional, mas consegue realizar a maioria dos seus cuidados pessoais
50 Requer considerável assistência e frequentes cuidados médicos
Incapacitado; requer cuidados especiais e assistência, autocuidado limitado. Permanece mais de 50% do
40
horário vigil sentado ou deitado
30 Severamente incapacitado, indicado hospitalização, embora a morte não seja iminente
Muito doente, necessário internação hospitalar e tratamento de suporte. Completamente incapaz de realizar
20
autocuidado. Confinado à cama
10 Moribundo, processo de morte progredindo rapidamente
Referência: http://www.inca.gov.br/rbc/n_48/v02/pdf/condutas3.pdf

Tabela 7.6 - ECOG Eastern Cooperative Oncology Group


OBS: comparando com a escala de Karnosky
0 Completamente ativo; capaz de realizar todas as suas atividades sem restrição (Karnofsky 90-100%)
1 Restrição a atividades fisícas rigorosas; é capaz de trabalhos leves e de natureza sedentária (Karnofsky 70-80%)
Capaz de cuidar de si totalmente, mas incapaz de realizar qualquer atividade de trabalho; ambulatorial e não-
2
acamado em mais e 50% do tempo. Ocasionalmente necessita de assistência (Karnofsky 50-60%)
Capaz de realizar somente autocuidados limitados, confinado ao leito ou cadeira mais de 50% das horas em que o
3
paciente está acordado. Ambulatorial 50% do tempo menos. Cuidados constantes (Karnofsky 30-40%)
Completamente incapaz de realizar autocuidados básicos, totalmente confinado ao leito ou à cadeira. Pode
4
necessitar de hospitalização (Karnofsky <30%)
Referência: http://www.cbc.org.br/upload/emc/autoavaliacao/concologica/1/04_avaliacao_paciente.htm
http://www.inca.gov.br/rbc/n_48/v02/pdf/condutas3.pdf

Tabela 7.7 - Escala de PPS


% Deambulação Atividade e evidência de doença Autocuidado Ingesta Nível da consciência
Atividade normal e trabalho, sem
100 Completa Completo Normal Completo
evidência de doença
Atividade normal e trabalho,
90 Completa Completo Normal Completo
alguma evidência de doença
Atividade normal com esforço, Normal ou
80 Completa Completo Completo
alguma evidência de doença reduzida
Incapaz para o trabalho, doença Normal ou
70 Reduzida Completo Completo
significativa reduzida
Incapaz para hobbies/trabalho Assistência Normal ou Completo ou períodos de
60 Reduzida
doméstico, doença significativa Ocasional reduzida confusão
Maior parte do tempo Incapacidade para qualquer Assistência Normal ou Completo ou período de
50
sentado ou deitado trabalho, doença extensa considerável reduzida confusão
Maior parte do tempo Incapaz para a maioria das Assistência Normal ou Completo ou sonolência,
40
acamado atividades, doença extensa quase completa reduzida +/- confusão
Incapaz para qualquer atividade, Dependência Normal ou Completo ou sonolência,
30 Totalmente acamado
doença extensa completa reduzida +/- confusão
Incapaz para qualquer atividade, Dependência Mínima a Completo ou sonolência,
20 Totalmente acamado
doença extensa completa pequenos goles +/- confusão

Incapaz para qualquer atividade, Dependência Cuidados com Completo ou sonolência,


10 Totalmente acamado
doença extensa completa a boca +/- confusão

0 Morte
Fonte: Victoria Hospice Society. J Pall Care, v.9, n. 4, p. 26-32. Tradução livre de Maria Goretti Maciel/ Ricardo Tavares de Carvalho

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Capítulo 7 - Avaliação do paciente em cuidados paliativos

lizar-se na evolução da doença e programar logia da insuficiência cardíaca isquêmica,


as estratégias para melhora na qualidade de hipertensiva, secundária a doença valvar ou
vida, de acordo com a expectativa existente. decorrente de outras causas, a evolução é se-
Uma das escalas mais utilizadas no con- melhante em todas elas e a presença de sin-
texto do paciente com diagnóstico oncoló- tomatologia também permite estimar a gra-
gico é o índice de prognóstico paliativo, ou vidade da doença. Assim, a New York Heart
mais comumente conhecido como PPI. Essa Association (NYHA) desenvolveu uma clas-
escala considera a combinação do status fun- sificação funcional para a ICC baseada na
cional, obtido através da escala de PPS10,11, presença e na intensidade dos sintomas (Ta-
com a presença de determinados sintomas, bela 7.10). Esta classificação permite estimar
sejam eles: diminuição da ingesta oral, ede- o estágio da doença do ponto de vista sinto-
ma, dispneia e delirium. Neste instrumento, matológico14 e a ocorrência de mortalidade
quanto maior a pontuação menor é o tempo dos pacientes em um ano. Pacientes com
estimado de sobrevida12 (Tabela 7.8). classe funcional IV apresentam taxa de mor-
Outro instrumento que permite a avalia- talidade em torno 45% em um ano, enquanto
ção prognóstica do paciente na presença de pacientes com classe funcional III, 30%.15
diferentes doenças clínicas é o índice de co- No contexto das doenças hepáticas crô-
morbidades de Charlson.13 Este instrumento nicas e da cirrose hepática a classificação de
atribui pesos de acordo com a presença de di- Child-Pugh16 é uma importante ferramenta
versas doenças, além de estratificar algumas na avaliação prognóstica. A partir de dados
delas de acordo com o grau de severidade. A clínicos e laboratoriais é possível estimar a
somatória dos pesos fornece o escore e, atra- gravidade da doença e com isso, estimar a
vés dele, é possível predizer a expectativa de sobrevida do paciente (Tabela 7.11).
mortalidade em 01 ano (Tabela 7.9).
Em se tratando de doenças cardíacas, a EXAME FÍSICO
insuficiência cardíaca congestiva (ICC) re- O adequado exame físico de pacientes
presenta a principal doença que leva à in- em Cuidados Paliativos não pode ser negli-
dicação de Cuidados Paliativos. Seja a etio- genciado. Devem ser pesquisados sinais de

Tabela 7.8 - Escala PPI


Palliative Prognostic Index (PPI)
Palliative 10 - 20 4.0
Performance 30 - 50 2.5
Scale > 60 0
Muito reduzida 2.5
Ingesta Oral Moderadamente reduzida 1.0
Normal 0
Presente 1.0
Edema
Ausente 0
dispneia de Presente 3.5
repouso Ausente 0
Presente 4.0
Delirium
Ausente 0
TOTAL MAX - 15

Escore total no PPI Sobrevida media em dias


0 - 2.0 90 dias
2.1 - 4.0 60 dias
≥ 4.1 12 dias
Adaptado de: Morita T, et al. The Palliative Prognostic Index: a scoring system for survival prediction of terminally ill cancer
patients. Supportive Care of Cancer, 1999.

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Capítulo 7 - Avaliação do paciente em cuidados paliativos

Tabela 7.9 - Índice de comorbidades de Charlson


Peso Condições clinicas
Infarto do miocárdio
Insuficiência cardiaca congestiva
Doença vascular perférica
Demência
Doença cérebro-vascular
1
Doença pulmonar crônica
Doença tecido conjuntivo
Hepatopatia leve
Diabetes
Doença ulcerosa
Hemiplegia
Doença renal moderada ou severa
Diabetes com complicação
2
Tumor
leucemia
Linfoma
3 Hepatopatia moderada ou severa
Tumor maligno, metástase
6
SIDA
Taxa de mortalidade em 1 ano
0 12%
1-2 26%
3-4 52%
≥5 85%
Adaptado de: Charlson ME, et al. A new method of classifying prognostic comorbidity in longitudinal studies: Development and
validation. Journal of Chronic Diseases, 1987.

Tabela 7.10 - Classificação Funcional de ICC – New York Heart Association


NYHA: Classes funcionais
Classe Descrição
Sem correspondência
Sem limitação para atividades físicas. Atividades habituais não causam dispneia,
I
cansaço ou palpitações.
Discreta limitação para atividades físicas. Atividades habituais causam dispneia,
II
cansaço ou palpitações
Importante limitação para atividades físicas. Atividades com intensidades
III
inferiores às habituais causam dispneia, cansaço ou palpitações.
IV Limitação para qualquer tipo de atividade física. Sintomas de IC em repouso.
Adaptado de: The Criteria Committee of the New York Heart Association. Nomenclature and Criteria for Diagnosis of Diseases
of the Heart and Great Vessels, 1994.

Tabela 7.11 - Classificação de Child-Pugh


Critério 1 Ponto 2 Pontos 3 Pontos
Bilirrubina total (mg/dl) <2 2-3 >3
Albumina sérica (g/dl) > 3,5 2,8 - 3,5 < 2,8
TP (s) / INR 1 - 3 / < 1,7 4 - 10 / 1,71 - 2,20 > 10 / >2,20
Ascite Nenhuma Leve Severa
Encefalopatia hepática Nenhuma Grau I - II (ou suprimida com medicação) Grau III-IV (ou refratária)

Pontos Classe Sobrevida em 1 ano Sobrevida em 2 anos


5-6 A 100% 85%
7-9 B 81% 57%
10 - 15 C 45% 35%
Adaptado de: Kamath PS, et al. A model to predict survival in patients with end-stage liver disease. Hepatology, 2001.

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Capítulo 7 - Avaliação do paciente em Cuidados Paliativos

desconforto, de evolução da doença, de toxi- presentes, se compreendem a situação, se es-


cidade por droga e os sinais das últimas 48 tão angustiados...).
horas (estes últimos, abordados em capítu- Deve-se sempre oferecer apoio à família,
los específicos). inclusive, acompanhamento com psicólogo
Alguns pacientes, como idosos, demen- e com assistente social, e após cada contato
ciados e pacientes nas últimas horas de vida, sempre revisar o que foi falado e perguntar
têm dificuldade em se comunicar e expres- o que entenderam, para certificar-se de que
sar o que sentem. O aumento da frequência a informação transmitida e captada está
cardíaca e da pressão arterial, inquietação e correta.
alterações súbitas de comportamento podem
significar desconforto. IMPRESSÃO
Em pacientes em fase final de vida, na Após cada avaliação, é importante registrar
maioria das vezes, não há necessidade de mo- a impressão sobre o paciente (ex: está confortá-
nitorização contínua, pois esta não modifica- vel, sereno; períodos de desconforto, necessitou
rá a conduta e causará ansiedade e descon- de muitas doses de resgate de morfina; apresen-
forto nos pacientes e/ou familiares. A atenta ta sinais das últimas 48 horas...). Alguns servi-
observação da fisionomia do paciente, da ços relatam a impressão sobre o prognóstico do
forma como se comunica ou até mesmo do paciente em horas a dias, dias a semanas, sema-
modo como respira parece ser mais preciosa nas a meses e meses a anos.
nessa fase da vida. Para facilitar a aplicação de todos esses
pontos acima descritos, segue (Modelo de
evolução diária de um paciente em Cuidados
FAMILIARES Paliativos) um modelo de evolução de uma
Os Cuidados Paliativos abrangem a aten- unidade de Cuidados Paliativos.
ção integral ao paciente e seus familiares.
Quando o paciente não tiver condições, a fa- CONCLUSÃO
mília tomará as decisões. É importante con- A avaliação do paciente em Cuidados Pa-
tatar e marcar reunião com todos os familia- liativos envolve muitos aspectos que vão além
res próximos, pois podem existir conflitos na de qualquer teoria possível de ser escrita.
família, as decisões podem ser divergentes e Sugerimos, no entanto, uma forma de
pode não haver uniformidade das informa- guiar a primeira abordagem de um indiví-
ções repassadas. duo que se encontra com uma doença dita
Durante o contato com os familiares, de- “terminal”, a fim de facilitar o trabalho da
ve-se ter cuidado com amenizações. Muitas equipe de saúde.
vezes, estes negam a doença e podem inter- Regras à parte, vale ressaltar que o olhar
pretar o que foi dito de maneira errada, como do profissional de saúde deve estar sempre
aquilo que gostariam de ouvir. no paciente e em seus familiares, sem jamais
No prontuário, é importante relatar dia- se esquecer da abordagem técnica e do trata-
riamente o contato com familiares (se estão mento adequado dos sintomas.

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Capítulo 7 - Avaliação do paciente em Cuidados Paliativos

MODELO DE EVOLUÇÃO DIÁRIA DE UM PACIENTE EM CUIDADOS PALIATIVOS

Modelo de Evolução diária de um paciente em Cuidados Paliativos

Data: _________ DIH:_____ Nome:___________________________ RH:_________ Idade:______ Leito:__________

Diagnósticos:
Diagnóstico Principal
Tratamento instituído e data
Complicações decorrentes da doença de base, período de aparecimento e condutas adotadas:
Comorbidades:

Funcionalidade: PPS ________ Karnofsky_______

Medicações em uso:___________________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________________________________

Queixas/ Avaliação dos sintomas: _______________________________________________________________________


____________________________________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________________________________

Assinalar presença e intensidade dos seguintes sintomas:

Dor: Depressão: Apetite: Sonolência: Falta de ar:

Cansaço: Ansiedade: Náusea: Bem-estar:

Controles de Ingesta, eliminações e sinais vitais

Aceitação da dieta:___________________________________________________________ Via: ( ) oral ( ) SNE ( ) GTT

Diurese _________________________________________ Evacuações_______________________________________

Controles: FC: ____________________ PA: _____________________ FR: ___________________ T: _______________

Exame físico: ________________________________________________________________________________________


____________________________________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________________________________

Situação dos familiares:_______________________________________________________________________________


____________________________________________________________________________________________________

Impressão clínica: ____________________________________________________________________________________


____________________________________________________________________________________________________

Conduta: ____________________________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________________________________

71

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Capítulo 7 - Avaliação do paciente em Cuidados Paliativos

American Journal of Clinical Oncology.


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72

Miolo.indd 72 17/04/2014 14:11:16


Prescrição em Cuidados Paliativos 8
CAPÍTULO

Ana Beatriz Galhardi Di Tommaso


Ana Laura de Figueiredo Bersani
João Toniolo Neto
Niele Silva de Moraes
Silvia Takahashi Ribeiro E Prado

Este capítulo tem como objetivo guiar o A diminuição do apetite, alterações no pa-
médico na elaboração da prescrição de pacien- ladar ou a ocorrência de outros sintomas, tais
tes em Cuidados Paliativos exclusivos em uni- como náuseas e vômitos, podem ser decorren-
dades hospitalares. Existem particularidades tes de determinados tratamentos, ou até mes-
em instituições de longa permanência, uni- mo de distúrbios metabólicos associados ou
dades de terapia intensiva, unidades de emer- não à sua prescrição.10 Reconhecer e tratá-los
gência e em domicílio que serão abordadas em pode permitir a recuperação do apetite e da
capítulos específicos deste livro. aceitação alimentar.
Comumente, a mudança do padrão ali-
DIETA mentar gera angústia e ansiedade ao paciente e
Como em toda prescrição, o primeiro item seus familiares e, nessas ocasiões, é frequente a
refere-se à dieta. A alimentação do paciente solicitação de vias alternativas de alimentação,
deve sempre ser estimulada, desde que não como por exemplo, através de sonda nasoente-
provoque sintomas ou cause desconforto. Res- ral.11. A ideia de que a morte possa ser provoca-
peitar o paladar e permitir que o paciente tenha da por inanição e não pela evolução da doença,
o prazer de comer os alimentos de sua prefe- e o sofrimento gerado pela impossibilidade de
rência é, sempre que possível, recomendável. alimentar quem se ama motiva a família a ado-
Entretanto, é preciso considerar que di- tar esta postura. Diante dessas situações, e por
versas condições interferem na capacidade de ser este um ponto de potencial conflito entre a
aceitação da dieta pelos pacientes. A anorexia equipe e a família, é preciso que seja explicado
é um sintoma comum na fase final de vida e aos familiares que tais medidas não promove-
pode derivar de diferentes situações.1 Neo- rão benefício ao paciente, não retardarão a evo-
plasias2, insuficiência cardíaca avançada3,4,5, lução da doença, colocarão o doente sob risco
AIDS6, doença pulmonar obstrutiva crônica de complicações e ainda, que são medidas que
grave7,8 e outras doenças em fase avançada, geram desconforto.12.
devido a um estado inflamatório crônico, Ainda em relação à dieta, vale ressaltar
provocam um processo hipercatabólico, que que existem condições em que o uso de alguns
culmina com o quadro de anorexia e, conse- alimentos pode aliviar sintomas. Em geral,
quentemente, de caquexia.9 pacientes que apresentam náuseas sentem-se

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Capítulo 8 - Prescrição em Cuidados Paliativos

melhor ao ingerir alimentos gelados e, comu- depressivos20, ao invés da prescrição de antide-


mente, mais azedos13. Nesses casos, a utili- pressivos, que demoram de 3 a 4 semanas para
zação de sorvetes, dentre os quais destaca-se iniciarem seus efeitos, deve-se considerar o uso
o de limão, pode servir de alternativa para a de estimulante central, como metilfenidato,
manutenção da alimentação por via oral sem por conta de seu rápido início de ação 21.
exacerbação de sintomas.14 As vias preferenciais de administração de
drogas em Cuidados Paliativos são a oral e a
HIDRATAÇÃO transdérmica. Quando há impossibilidade
Uma vez que esteja definido o primeiro de uso destas vias ou necessidade de contro-
item passamos então à prescrição da hidra- le rápido dos sintomas, deve-se optar pela via
tação. Preferencialmente, a via oral deve ser subcutânea ou endovenosa. Nestas condições,
adotada. As quantidades serão definidas de quando não houver contraindicação (distúrbio
acordo com a doença de base (que pode exigir de coagulação ou anasarca), a via subcutânea
certa restrição hídrica para prevenção de sinto- deve ser preferida por apresentar menor risco
mas), o estado de hidratação atual do paciente de complicações e ser menos dolorosa.22,23
e a capacidade de ingestão oral.15,16 Quando da Considerando que o controle dos sin-
impossibilidade de hidratação por via oral ou tomas é fundamental em Cuidados Paliati-
mesmo quando a alimentação não for possível, vos, tanto a equipe de saúde quanto os fam
a prescrição de soro glicosado 5% associado ou iliares devem ser treinados para identificar

não a soro fisiológico 0,9% pode servir de alter- sinais diretos ou indiretos de desconforto per-
nativa para fornecimento de aporte calórico e mitindo, dessa forma, a adoção precoce de me-
hídrico ao paciente.17 didas para alívio dos sintomas. Toda queixa
No entanto, é preciso ter cautela quanto ao deve ser valorizada e reavaliações constantes
volume a ser administrado. Evitar que o pa- são indispensáveis.
ciente fique congesto é de suma importância Ao iniciar uso de qualquer medicação, o
e mantê-lo em um certo grau de desidratação médico deve informar ao paciente, seus fami-
pode ser até benéfico no controle da dispneia e liares e à equipe de enfermagem seus possíveis
da produção de secreção.18 efeitos colaterais, adotando medidas para pre-
venção quando possível (ex: prescrição de laxa-
MEDICAÇÕES tivos para pacientes que iniciarão uso de opio-
O passo seguinte na elaboração da pres- ide). Além disso, é preciso estar atento para
crição consiste na escolha das medicações, sinais de toxicidade medicamentosa.
de suas doses e vias de administração. Todos Quando se está diante de um paciente que
esses elementos devem ser revisados diaria- apresenta dor, além da prescrição de um esque-
mente e adequados para atender as necessi- ma analgésico com intervalos definidos, é im-
dades de cada paciente. prescindível que sejam prescritas medicações
Deve-se evitar futilidade terapêutica e ia- de resgate, definidas como doses adicionais de
trogenias, priorizando o controle dos sintomas. analgésico a serem solicitadas de acordo com a
Deve-se prescrever medicações que tenham persistência do sintoma.24
benefício imediato e a curto prazo; ser mais fle-
xível com as metas (pressão arterial, glicemia CUIDADOS GERAIS
capilar) e com o controle dos sinais vitais, vis- Tão importante quanto a utilização de
to que estes pacientes tem uma expectativa de medicações são os cuidados para promoção
vida reduzida. Por exemplo, o uso de estatina de bem-estar. Mudança de decúbito, limpeza
para prevenção primária de doença cardiovas- e hidratação da boca, manutenção de um am-
cular perde seu valor, uma vez que o paciente biente agradável para que o paciente descanse
não viverá o suficiente para se beneficiar de (evitando interromper seu sono à noite com,
seus efeitos.19. Em um paciente com expecta- por exemplo, aferição de sinais vitais), per-
tiva de vida de dias, apresentando sintomas missão de acompanhante em tempo integral

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Capítulo 8 - Prescrição em Cuidados Paliativos

são medidas simples que podem beneficiar ve, fundamentalmente, o paciente, além dos
muito o doente e seus familiares nesses mo- profissionais e familiares em busca de um
mentos finais. 25,26 objetivo comum, promover alívio do sofri-
Outras medidas terapêuticas não farma- mento e gerar bem-estar ao paciente em sua
cológicas podem ser de extrema importância fase final de vida.
nessa fase. Recursos como a fisioterapia, em Na ocasião da alta hospitalar, o médico
suas diversas modalidades (cinesioterapia, deve verificar a acessibilidade do paciente às
termoterapia, massoterapia, fisioterapia res- medicações prescritas, garantindo o uso ade-
piratória) podem promover alívio de sinto- quado e manutenção do controle dos sintomas
mas e desconforto.27,28 A presença de um(a) em casa. A definição dos horários de ingesta
psicólogo(a) pode ajudar o paciente a solu- das drogas e o motivo de sua escolha devem es-
cionar ou amenizar sofrimentos tanto físicos tar claros. Uma estratégia que facilita a adesão
quanto emocionais. terapêutica é elaborar uma tabela contendo
Por fim, a elaboração da prescrição do estas informações para que o paciente e/ou
paciente em Cuidados Paliativos configura- familiar deixem em local de fácil visualiza-
-se como um processo dinâmico, que envol- ção para consulta diária (quadro 8.2)

Quadro 8.1 - Modelo de prescrição em uma unidade hospitalar

Prescrição

Nome:_______________________ Registro Hospitalar: _______________________ Leito: ______________________

1- Nutrição
- Dieta conforme aceitação

2- Hidratação
− Por via oral se possível
− Soro glicosado 5% + Soro fisiológico 0,9% (volume de acordo com as condições do paciente. Sempre lembrar
que o ideal é mantê-lo o menos congesto possível. Uma ligeira desidratação causa menos desconforto nos últimos
momentos da vida)

3- Medicações agudas / sintomáticas


− Doses regulares
− Doses de resgate
− Medicações se necessário (analgésicos, antieméticos, anti-piréticos)

4- Medicações de uso prévio (quando sua manutenção for adequada)

5- Medidas não farmacológicas / Orientações para a equipe de enfermagem


− Mudança de decúbito de 2/2 horas
− Decúbito elevado
− Cuidados com a boca
− Liberação de visita de amigos e familiares
− Cateter nasal de O2, se desconforto respiratório

Quadro 8.2 - Exemplo de prescrição na alta hospitalar


Medicamento/ Hora 8h 12h 16h 20h 24h 4h* Indicação
Morfina 5mg 1cp 1cp 1cp 1cp 2cp Dor
Bisacodil 5mg 1cp Laxante
Metoclopramida 10mg 1cp 1cp 1cp Enjôo e vômito
*Recomendações: Pode-se adiantar a dose da madrugada da morfina para meia noite (2cp às 24h), evitando-se acordar o
paciente na madrugada.

75

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Capítulo 8 - Prescrição em Cuidados Paliativos

CONCLUSÃO 9. KOTLER DP. Cachexia. Annals of Internal


O planejamento da assistência de qual- Medicine. 2000. 133:622-634.
quer paciente que necessita de cuidados de 10. MCCANN RM, HALL WJ, GROTH-
saúde começa com a elaboração de uma JUNCKER A. Comfort care for termi-
prescrição médica adequada. A tentativa nally ill patients - the appropriate use of
de transformá-la em um instrumento mais nutrition and hydration. JAMA. 1994.
humano faz com que o cuidado seja perso- 272(16):1263-1266.
nalizado, capaz de atender as demandas sem 11. DEL RÍO MI, SHAND B, BONATI P,
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76

Miolo.indd 76 17/04/2014 14:11:17


Capítulo 8 - Prescrição em Cuidados Paliativos

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77

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Vias de acesso em Cuidados Paliativos 9
CAPÍTULO

Juliana de Oliveira Gomes


Márcio Tomita da Rocha Lima

INTRODUÇÃO esta via tem a vantagem de que o fármaco


A hidratação artificial e a ingesta medi- evita o intestino e o fígado, não sendo inati-
camentosa podem ser oferecidos de diver- vado por esse metabolismo.1
sas formas, dentre elas, via oral, sublingual, Outra via utilizada é a retal. Cinquenta
retal, por sonda nasoenteral, gastrostomia, por cento da drenagem da região retal con-
jejunostomia e por via parenteral, que in- torna a circulação porta, assim, a biotrans-
clui as vias intravascular, intramuscular e formação hepática de fármacos é mínima.
subcutânea.1 Tanto a via sublingual como a retal tem a
A via preferencial e mais comum é a oral, vantagem adicional de evitarem a destrui-
desde que o paciente esteja em condições clí- ção do fármaco por enzimas digestivas ou
nicas para uso de tal via. Entretanto, é tam- pelo baixo pH do estômago. A via retal é útil
bém a mais variável e envolve o trajeto mais se o fármaco induz o vômito quando admi-
complicado de acesso aos tecidos. Certos fár- nistrado por via oral ou se o paciente já está
macos são absorvidos no estômago, porém em crise emética (a via retal também é usa-
o principal sítio de entrada para a circula- da para administrar agentes antieméticos).
ção sistêmica é o duodeno, em razão de sua Esta via tem como desvantagem o fato de
maior superfície de absorção. A maioria dos a absorção retal ser geralmente irregular e
fármacos absorvidos no trato gastrintestinal incompleta, sendo que muitos fármacos ir-
(TGI) entra na circulação porta e passa pelo ritam a mucosa do reto.1
fígado antes de ser distribuído pela circula- As sondas nasogástricas ou entéricas po-
ção sistêmica. O metabolismo de primeira dem ser introduzidas em quadros de agu-
passagem no intestino ou fígado limita a efi- dização da doença, por períodos curtos, até
cácia de muitos fármacos tomados por via quatro a seis semanas, quando há impossi-
oral. Além disso, a ingestão de fármacos com bilidade de ingesta alimentar ou de medi-
alimentos pode influenciar sua absorção.1 camentos por via oral. Esses procedimentos
A via sublingual permite ao fármaco não são isentos de riscos e acarretam descon-
difundir-se para a trama capilar mucosa e forto. Há relato de 2/3 dos pacientes ficarem
assim passar diretamente para a circulação agitados e removerem a sonda em cerca de
sistêmica. A administração de um agente por duas semanas de tratamento. Quando existe

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Capítulo 9 - Vias de acesso em Cuidados Paliativos

a perspectiva de permanência da impossibi- ra, devido à alta dos Cuidados Paliativos. Em


lidade de ingesta via oral por tempo prolon- 1979, Russel descreveu um método subcutâneo
gado (várias semanas) pode ser indicada a de administração de morfina para pacientes
realização de gastrostomia ou jejunostomia, com sintomas de câncer avançado. Na década
por via endoscópica. Existem complicações de 1980, a técnica voltou a ser utilizada. Foram
que são consideradas mais graves (pneumo- publicados estudos enfatizando a escolha da
nia aspirativa, mau posicionamento e perda via subcutânea, descrevendo esta via como se-
do dispositivo) e as mais simples (obstrução, gura e eficaz na alternativa da via oral para ad-
acotovelamento e dificuldade de inserção). 2 ministração de opioides e para hidratação. De
A administração parenteral é usada para acordo com as pesquisas realizadas em 1994, a
fármacos que são de difícil absorção pelo TGI técnica foi utilizada por um terço das institui-
e para agentes como a insulina que são estáveis ções geriátricas na Holanda.4,7
no TGI (esta via evita o TGI). Esta via de ad- A hipodermóclise é considerada uma técni-
ministração é usada também para pacientes ca segura, de fácil administração e boa absor-
com rebaixamento do nível de consciência e ção, semelhante à via intramuscular, por isso,
em circunstâncias que se requer rápido início desde a década de 80, vem sendo progressiva-
de ação. A administração parenteral permite o mente redescoberta como uma terapia alterna-
melhor controle sobre a dose real do fármaco tiva às infusões intravenosas, especialmente no
dispensada ao organismo. As três principais âmbito da geriatria e medicina paliativa.8,11
vias parenterais são a intravascular (intrave- A redução da ingesta oral, a dificuldade de
nosa), intramuscular e subcutânea. Cada uma acesso venoso e o emagrecimento com conse-
delas tem suas vantagens e desvantagens.2 quente distrofia muscular são comumente en-
A via endovenosa em geral é capaz de su- contrados nos pacientes em Cuidados Paliati-
prir as necessidades de líquido e de adminis- vos. Devido à dificuldade e/ou impossibilidade
tração de medicamentos.2,3 de administração por via oral ou intravenosa,
Outra via bastante utilizada é a hipoder- bem como o desconforto e sofrimento da via
móclise, um método de infusão de fluidos e intramuscular, a via subcutânea tende a ser a
medicamentos no tecido subcutâneo, transfe- via de escolha. A hipodermóclise propicia a
ridos para a corrente sanguínea por difusão e prevenção e alívio dos sintomas, tais como dor
perfusão tecidual.4 e outros sintomas físicos. Sendo assim, a admi-
A hipodermóclise é uma técnica antiga que nistração de medicamentos e fluidos estão em
vem sendo utilizada desde 1865, tendo sido ini- concordância com os princípios dos Cuidados
cialmente utilizada pelo médico italiano Can- Paliativos baseados no atendimento multidis-
tani. Há relatos de uso de tal técnica já duran- ciplinar que visa melhorar a qualidade de vida
te a epidemia de cólera na Índia em 1895. Por do paciente e da família, frente aos problemas
volta de 1903, a hipodermóclise já estava sendo associados às doenças sem cura.1
amplamente utilizada em pacientes desidrata-
dos. A partir das décadas de 1940 e 1950 obser- VANTAGENS E DESVANTAGENS
vou-se o abandono e/ou redução significativa DAS VIAS DE ACESSO
do uso dessa técnica em razão do aumento da EM CUIDADOS PALIATIVOS
utilização da via endovenosa e a indicação ina-
dequada da via subcutânea, a exemplo da ad- Via oral
ministração de grandes volumes de soluções e A administração de medicamentos por via
locais inapropriados, como braço, nos casos de oral é segura, conveniente, econômica e não
choque hipovolêmico e na administração con- requer técnica estéril na sua preparação. Nessa
comitante de soluções hipertônicas, resultando via, os medicamentos podem ser utilizados na
em colapso circulatório e consequentemente apresentação de comprimidos, drágeas, cápsu-
morte. No fim da década de 60, a hipodermó- las ou líquidos; são absorvidos principalmente,
clise teve um reposicionamento na Inglater- no estômago e intestino. 8

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Capítulo 9 - Vias de acesso em Cuidados Paliativos

Essa via não é indicada em pacientes partes das nádegas), no quadrante superior
apresentando náuseas, vômitos e dificulda- externo, evitando assim o risco de atingir o
de de deglutição. 8 nervo ciático.8
A hipoderme, ou tecido subcutâneo, é
Via sublingual composta por densas conexões e tecido adi-
Via sublingual (SL) é uma via de adminis- poso, abrigando os principais vasos sanguí-
tração que consiste na absorção de fármacos neos, linfáticos, nervos e glândulas. Sua prin-
embaixo da língua. Esta via evita o efeito de cipal função é o depósito nutritivo de reserva
primeira passagem hepática, pois a drenagem energética, que funciona como isolamento
venosa é para a veia cava superior. As muco- térmico e protetor mecânico do organismo
sas situadas na região sublingual são altamente às pressões e traumatismos externos. A dis-
vascularizadas, motivo pelo qual sua absorção tribuição do tecido subcutâneo depende dos
é altamente eficaz. Em comparação com a via fatores idade, hereditariedade e sexo. Por
oral, sua absorção se dá de forma muito mais ser dotado de capilares sanguíneos, o tecido
rápida, devido ao contato quase que direto com subcutâneo torna-se uma via favorável de ad-
os capilares sanguíneos situados nessa região. ministração de fluidos e medicamentos, uma
Mas, devido a essa rápida absorção, torna-se vez que serão absorvidos e transportados à
também uma via com riscos consideráveis. Sua macrocirculação.11
utilização também depende da ionização e li- A vascularização do tecido subcutâneo
possolubilidade do fármaco.8 abriga 6% do débito cardíaco e permite uma
taxa de absorção muito similar a via intra-
Via retal muscular, atingindo concentrações séricas
Apresenta como vantagem proteger os fár- menores, mas com tempo de ação prolonga-
macos suscetíveis da inativação gastrointesti- do, conforme a figura abaixo.11,12
nal e hepática, pois somente 50% do fluxo ve-
noso retal tem acesso à circulação porta.8
Tem como desvantagem a absorção erráti-
ca ou incompleta, especialmente em pacientes
com motilidade intestinal aumentada. Além
disso, pode irritar a mucosa retal.8

Via parenteral (intravenosa,


intramuscular e subcutânea) Figura 9.1 - Variação da concentração da corrente
sanguínea conforme o tempo e a via de administração.
A via endovenosa tem como vantagem a
ação mais rápida do fármaco administrado, Fonte: ANCP. Manual de Cuidados Paliativos. Associação
Nacional de Cuidados Paliativos. 1. ed. Rio de Janeiro: Dis-
com a introdução da medicação diretamente cographic, 2009; 14-36/186-194. 12
na veia. Os medicamentos injetados na veia
devem ser soluções solúveis no sangue. Podem A absorção de volumes infundidos por
ser líquidos hiper, iso ou hipotônicos, sais or- via subcutânea é mediada pelo equilíbrio en-
gânicos, eletrólitos, medicamentos não oleosos tre forças hidrostáticas e osmóticas, as quais
e não devem conter cristais visíveis em suspen- permitem que a solução atinja o espaço intra-
são. A desvantagem é que pode trazer descon- vascular. Estas relações condicionam o tipo
forto e dor para o paciente. 9 de soluto e as drogas a serem utilizados, além
A via intramuscular consiste na injeção das indicações clínicas. Teoricamente, uma
de uma substância diretamente dentro do droga com especificidade e indicação para
músculo, onde a substância fica armazenada administração via intramuscular poderia
em profundidade. Na injeção no glúteo, a lo- ser ministrada também por via subcutâ-
calização da picada é exatamente dois dedos nea, visto que os espaços intracelulares
acima da prega glútea (divisão entre os duas da hipoderme e dos músculos apresentam

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Capítulo 9 - Vias de acesso em Cuidados Paliativos

composição e pH semelhantes. Porém, ficultada na presença de déficit cognitivo,


esta teoria necessita de estudos compro- náuseas, vômitos, obstrução intestinal rela-
batórios. Na prática clínica, deve-se aten- cionada a neoplasia e disfagia. Nesses casos,
tar para a tolerância do paciente diante da a via subcutânea pode ser uma alternativa.1,11
administração da droga, reações locais no A via retal está indicada quando há re-
sítio de punção, reações sistêmicas após 45 baixamento do nível de consciência, náuseas
minutos da infusão e a titulação sanguínea ou vômitos. Muitos fármacos podem ser ab-
após a infusão.2 sorvidos pela mucosa retal, tais como o dia-
Os riscos da hipodermóclise são míni- zepam, metronidazol, alguns antiinflamató-
mos quando as substâncias são adminis- rios, antieméticos e anticonvulsivantes.8
tradas seguindo-se as orientações corretas. As indicações de gastrostomia são: pre-
As complicações podem ser descritas como sença de obstrução esofagiana; disfagia im-
locais e sistêmicas. Deve-se estar atento ao portante, mesmo sem obstrução; descom-
aparecimento de sinais flogísticos (edema, pressão intra abdominal em pacientes que
calor, eritema persistente e dor) no local da não desejem ter sonda nasogástrica. Em
infusão; endurecimento, hematoma; sinais Cuidados Paliativos, esse procedimento tem
de infecção (febre, calafrio e dor). Se ocor- valor altamente questionável, se não trouxer
rer uma destas complicações, deve-se sus- nenhum benefício fisiológico ou conforto
pender imediatamente a infusão, pois em para o paciente.2
casos mais graves pode ocorrer necrose do A via endovenosa principalmente no uso
tecido (complicação tardia). Alguns sinais, domiciliar implica em sérios riscos e neces-
como irritação local podem aparecer nas sita da supervisão de profissional treinado.
primeiras 4 horas, e recomenda-se mudar Além disso, a hospitalização é desagradável
o sitio de punção.12 Outras possíveis com- para o paciente e a família, e muitos pacientes
plicações são farmacodermia, granuloma, preferem ficar em casa. O custo de uma hos-
celulite e sangramentos discretos.13 pitalização e o perigo de infecções nosoco-
O acúmulo excessivo de líquido, cau- miais também são desvantagens, além de ser
sando edema e dor, aumento da frequên- uma via dolorosa, principalmente em idosos,
cia urinária e/ou incontinência, são sinais quando a obtenção de acesso venoso periféri-
que indicam a retirada imediata do escal- co é mais difícil.2
pe ou cateter do subcutâneo. Os sinais de A via subcutânea é indicada para manter
sobrecarga cardíaca (taquicardia, turgên- adequada hidratação em pacientes incapazes
cia jugular, hipertensão arterial, tosse, de ingerir fluidos de forma adequada ou que
dispneia) são indicativos de suspensão do estão leve ou moderadamente desidratados;
uso, uma vez que estas reações são consi- para administração de algumas medicações
deradas sistêmicas.14 a pacientes incapacitados de receber medica-
mentos por via oral e nos quais há dificulda-
INDICAÇÕES de na aquisição de uma via endovenosa. É
A hidratação oral e administração de uma via amplamente utilizada em Cuida-
medicamentos por esta via é geralmente di- dos Paliativos. 2,11

Tabela 9.1 - Principais indicações da via subcutânea. 2,11


• Lesões na cavidade oral;
• Náuseas e vômitos persistentes e intratáveis;
• Odinofagia ou disfagia grave;
• Fístula traqueobrônquica e broncoesofágica;
• Oclusão intestinal;
• Alteração do nível de consciência (delirium, sonolência, coma);
• Hidratação;
• Administração de sintomáticos para alívio da dor e de outros sintomas desagradáveis

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Capítulo 9 - Vias de acesso em Cuidados Paliativos

CONTRAINDICAÇÕES os locais preferidos são as coxas, o abdome e


A via oral é contraindicada em casos de a região mais externa e superior dos braços.
disfagia grave e sonolência.9 Às vezes, pode ser necessária a escolha de
Há poucas contraindicações para a hi- dois sítios para comportar a terapia. 9
podermóclise. Não deve ser utilizada nos O local de punção não deve coincidir
casos em que os fluidos devem ser admi- com os movimentos do paciente. Devemos
nistrados rapidamente e em grande quan- sempre perguntar qual o local de punção
tidade, como no choque hipovolêmico ou que o paciente deseja, porém é importante
hipotensão, distúrbios hidroeletrolíticos levar em consideração o quadro clinico. 15
graves ou desidratação importante. É tam- A mudança de sítio é recomendada a cada
bém contraindicada quando há lesões na 48 a 72 horas ou após a infusão de 1,5 ou 2
pele, edema local, anasarca, distúrbios da litros de solução; se o paciente não receber
coagulação e risco de congestão pulmonar, essa quantidade de fluido e não tiver sinais
como na insuficiência cardíaca congestiva flogísticos no local, o sítio pode ser o mes-
grave. 9,10,13 mo durante um período de até sete dias. Em

TÉCNICA PARA HIPODERMÓCLISE

Materiais necessários
• Solução preparada para ser instalada
• Equipo com dosador (ml/hora – ma-
crogotas/microgotas) ou bomba de in-
fusão
• Solução antisséptica
• Gaze e luva de procedimento
• Dispositivo (escalpe de calibre 21 a 27G
ou cateter de Teflon)
• Esparadrapo, de preferência transpa-
rente, para fixar e datar2

Sítio de punção
Para hipodermóclise podem ser utiliza-
dos os locais com quantidade razoável de te- Figura 9.2 - Principais locais para realização de
hipodermóclise.
cido celular subcutâneo: a parede lateral do
Fonte: Cuidados Paliativos Oncológicos – Controle de Dor –
abdome, a região subclavicular, interescapu- Centro de Suporte Terapêutico Oncológico (CSTO) – Instituto
lar e lateral da coxa. Em pacientes acamados, Nacional de Câncer - RJ. 2001

Tabela 9.2 - Principais contraindicações da via subcutânea. 9, 10,13


• Contraindicações absolutas:
- Áreas edemaciadas com lesões na pele
- Hematomas
- Comprometimento do sistema linfático (procedimentos cirúrgicos com comprometimento ganglionar
através da dissecção)
- Estado avançado de caquexia com comprometimento importante do subcutâneo

•Contraindicações relativas:
- Administração em áreas com capacidade reduzida de absorção (áreas irradiadas que são usadas para -
administração de volumes menores)
- Distúrbio de coagulação

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Capítulo 9 - Vias de acesso em Cuidados Paliativos

ambiente hospitalar, esse tempo pode variar uma agulha longa, capaz de ser introduzida
na dependência das recomendações da Co- através do tecido adiposo na base da prega da
missão de Controle de Infecção Hospitalar pele. Sendo assim, o comprimento da agu-
(CCIH). No cuidado domiciliar, o nível de lha deve ser da metade da largura da prega
independência do paciente para o autocuida- da pele. O ângulo de introdução pode variar
do, a higiene ambiental e a cultura familiar entre 45° e 90°.16,17 Em pacientes caquéticos
podem influenciar também nesse período, ou magros, a forma de punção deverá ser rea-
que geralmente varia de cinco a sete dias.10 lizada em áreas onde proeminências ósseas
Em caso de sinais flogísticos, o cateter não estejam tão salientes.15
deve ser retirado e o local de punção não Pode-se utilizar cateter agulhado ou não
deve ser mais utilizado por um período mí- (escalpe do tipo Butterfly nos calibres de 21
nimo de dez dias.10 e 27G ou cateter de Tefflon, sendo este com
maior tempo de duração - média de 11 dias).8
Instalação da punção Os catéteres não agulhados são os de eleição
Deve-se checar junto à prescrição médi- na assistência domiciliar, para prevenção de
ca: nome do paciente; medicamento/soro; via acidentes com material perfurocortante.11 O
de administração; intervalo da dose; calcular cateter agulhado é mais acessível devido o
a dosagem com atenção; identificar o frasco custo da aquisição ser menor. Já o custo dos
de soro com o nome do paciente, número do não agulhados é maior e, segundo relatos de
quarto e leito; levar bomba de infusão para pacientes, a punção é mais dolorosa.3
o local se necessário; verificar a pulseira de Após puncionar a pele na prega cutânea,
identificação do paciente se houver e explicar deve-se realizar uma rotação de 180° com o
ao cliente sobre o procedimento. bisel da agulha para baixo, a fim de evitar a
Após explicar ao paciente e família sobre obstrução da agulha causada pela gordura do
o procedimento, deve-se lavar as mãos, es- tecido cutâneo.6
colher o local para punção, considerando o Após a inserção no tecido subcutâneo,
maior conforto e segurança para o paciente, deve-se realizar aspiração cuidadosa a fim
preencher o circuito intermediário do escal- de identificar se um vaso sanguíneo foi atin-
pe com soro fisiológico 0,9% e realizar a an- gido e, se não houver refluxo de sangue, fi-
tissepsia local,20 sempre com algodão embe- xar o escalpe com adesivo transparente, que
bido em álcool a 70% no sentido distal para permita a monitorização do sítio de punção
proximal, virando os lados do algodão; com e observação do aparecimento de sinais flo-
a mão não dominante.13 gísticos locais. Em seguida, deve-se aplicar
Após a antissepsia, deve-se fazer uma pre- o medicamento ou conectar o escalpe ao
ga cutânea e introduzir o cateter em ângulo equipo da solução.11
de 30 a 45o, sendo mais próximo de 30o (30 – Após a infusão da solução ou da dose do
35o) nos pacientes emagrecidos. A orientação medicamento, manter sempre o escalpe salini-
deve ser centrípeta, evitando a proximidade zado. Nunca se esquecer de identificar a pun-
de estruturas vasculares e o bisel deve ser ção com data e hora. Trocá-la a cada 72 horas,
voltado para cima. Túneis menores são mais ou antes, se surgirem sinais flogísticos. 11
apropriados no caso de idosos com pele res- O local da inserção deve ser monitorado
secada e pouco elástica.10 a cada 15 minutos, durante a primeira hora
O peso corpóreo do paciente indicará a e após, no mínimo, a cada 6 horas.18
profundidade da camada subcutânea, faci-
litando a escolha do comprimento da agu- Fluidos
lha e do ângulo de introdução. Em pessoas É consenso que as soluções com eletró-
obesas a injeção subcutânea deve obedecer litos prescritas para a via subcutânea sejam
a um procedimento diferente: o profissional isotônicas. A solução mais recomendada é a
deve prensar o tecido entre os dedos e utilizar glicofisiológica, com NaCl 0,9% e glicose de

84

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Capítulo 9 - Vias de acesso em Cuidados Paliativos

Figura 9.3 - Antissepsia da pele no local da punção.* Figura 9.4 - Prega subcutânea e anguIação da inserção do
scalp na pele (30-45º).*

Figura 9.5 - Introdução do scalp.* Figura 9.6 - Fixação do acesso com filme transparente.*

*Fonte: Terapia subcutânea no câncer avançado. / Instituto Nacional de Câncer. – Rio de Janeiro: INCA, 2009

5% a 10%, embora NaCl 0,9% isoladamente de absorção. A dose recomendada é de 150U


e glicose a 5% também possam ser utiliza- para cada litro de solução.10,11
das. Caso seja necessário a administração de Os medicamentos que tem baixa solu-
cloreto de potássio (KCl), este poderá ser in- bilidade em água e, por isso, são veiculados
cluído na solução numa diluição máxima de em soluções de características oleosas, como
40mEq/L, em volumes até 100 ml, seguindo propilenoglicol, não apresentam bom perfi l
velocidade com intervalo de 60 a 125 ml/h.19 de segurança para utilização por hipoder-
Com infusão contínua, o volume diário móclise em função do dano que tais soluções
de fluidos administrados deve ser de, no podem causar ao tecido subcutâneo. Medi-
máximo, três litros, numa velocidade ini- camentos como diazepam e fenitoina apre-
cial de 0,5 a 2ml/minuto podendo chegar a sentam tal particularidade. Solucões com
8ml/minuto, dependendo das característi- extremos de ph (<2 ou >11) apresentam risco
cas das soluções infundidas e da tolerabili- aumentado de precipitação ou irritação local,
dade do paciente.10 sendo incompativeis com a via subcutânea.
Ainda não há consenso sobre a utiliza- Assim, contraindica-se a utilização de dia-
ção da hialuronidase, enzima adicionada à zepam, fenitoina, pamidronato, eletrólitos
solução prescrita ou administrada localmen- não diluidos e alguns antibióticos (exceto
te, que reduz a viscosidade do tecido celular ampicilina, cefepima, ceftazidima, cefotaxi-
subcutâneo ao degradar o ácido hialurônico. ma, ceftriaxona e tobramicina).11 As classes
A hialuronidase, portanto, aumentaria a di- de fármacos que podem ser administrados
fusão do fluido administrado e a velocidade por hipodermóclise estão citados na (tabela

85

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Capítulo 9 - Vias de acesso em Cuidados Paliativos

9.3) e, sua compatibilidade com fármacos na ção ou alteração de cor) e outras invi-
mesma infusão, na (tabela 9.4). síveis, mas comprometem a eficácia do
As interações ocorrem entre soluto e medicamento. Quanto mais medicações
solvente, soluto e soluto, solução e reci- forem administradas juntas, maior o ris-
piente. Algumas são visíveis (precipita- co de precipitação e eficácia reduzida.12

Tabela 9.3 - Fármacos administráveis por via subcutânea e doses iniciais.


Classe Fármacos Doses iniciais
Morfina 1/2 da dose oral

Analgésicos opiáceos Metadona 1/2 da dose oral

Hidromorfina 1/2 da dose oral

Haloperidol 1,5mg/24 horas


Antieméticos
Metoclopramida 30-60mg/24 horas

Análogos da somatostatina Octreotídeo NE

Sedativos Midazolam 5-30mg/24 horas

Hidroxizina NE
Anti-histamínicos
Prometazina 12,5-25mg/24 horas

Escopolamina NE
Anticolinérgicos
Atropina 2-3mg/24 horas

Corticosteroides Dexametasona NE

Bloqueadores de bomba Famitidona NE

H2 Ranitidina 15mg/24 horas

Anti-inflamatórios Ketorolac NE

Ampicilina 500mg/24 horas

Cefotaxima 500mg/24 horas

Ceftriaxone 1g/24 horas


Antibióticos
Ceftazidima 500mg/24 horas

Cefepime 1g/24 horas

Tobramcina 75mg/24 horas


NE: Não encontrado
*Fonte: Pereira I. Hipodermóclise. In: CREMESP – Cuidado Paliativo, São Paulo. 2008; 259-272.

Tabela 9.4 - Compatibilidade de fármacos na mesma infusão.


Dexametasona Haloperidol Metoclopramida Midazolam Morfina Prometazina Ranitidina
Dexametasona NC NC C C
Haloperidol NC C C C NC
Metoclopramida C C C C NC
Midazolam NC C C C C NC
Morfina C C C C C C
Prometazina C C C C
Ranitidina C C NC C
*Fonte: Pereira I. Hipodermóclise. In: CREMESP – Cuidado Paliativo, São Paulo. 2008; 259-272.

86

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Capítulo 9 - Vias de acesso em Cuidados Paliativos

Tabela 9.5 - Fármacos administrados por hipodermóclise


Tempo de infusão e
Medicamento Indicação Dose Diluente
observação
Pode ser nefrotóxico.
Administrar isolado
Cetorolaco Dor 30-60 mg/dia SF 0,9%
(não misturar com
outros medicamentos).
Água para injeção
se em infusão
25 a 50 mg 8/8h (máximo contínua. Não é compatível com
Ciclizina Náuseas e vômitos
150 mg/ 24h) Em bolus: não SF 0,9%.
precisa ser
diluída.
SF 0,9% 500 a
Clodronato Hipercalcemia 1.500 mg 4 a 6 horas
1000ml
a) Aumento da pressão a) 5 a 20 mg/dia
intra-craniana (hipertensão intracraniana)
b) Redução de edema b) 4 a 40 mg/dia (infusão
Geralmente
peritumoral contínua) SF 0,9% ou água
Dexametasona incompatível com a
c) Dispneia c) 8-24 mg/dia para injeção
maioria das drogas
d) Náusea e vômito d) 8- 20 mg/dia
e) Estimulante do apetite e) 2 -6 mg/dia
f) Compressão medular f) 16 -32 mg/dia
Pode ser irritante.
Não administrar
Dor (principalmente 150 mg/ 24h em bolus. Diluir o
Diclofenaco SF 0,9%
óssea) 75 a 150 mg/dia máximo possível. Não
misturar com outros
medicamentos.
Dipirona Dor 1g até 6/6h - volume 10 ml SF 0,9% -
Não pode ser
Fenobarbital Confusão 200 mg/dia Água para injeção administrado com
outros medicamentos.
Dispneia devido a
Furosemida 20 a 40 mg/dia SF 0,9% -
congestão pulmonar
100 a 1000 mcg/dia
(raramente 2000mcg/dia).
Taxa de infusão 1ml/h = 5
mcg/h (solução 500mcg +
Fentanil Dor SF0,9% -
100 ml de diluente - para
infusão contínua. Dose de
resgate 10 mcg (2ml) a cada
hora se necessário.
Infundir em 10 minutos
Granisetrona Náuseas e vômitos 3 a 9 mg/dia 50 ml SF0,9%
a dose de 3 mg.
2,5 a 10 mg/dia (dose
Náuseas, vômitos, máxima 30 mg para Pode precipitar se diluir
Haloperidol Água para injeção
alucinação e agitação agitação). A concentração em SF 0,9%
máxima deve ser de 2mg/ml
Hioscina, Cólicas intestinais, 60 a 180 mg/24h Até 7 dias
butilbrometo vômitos decorrentes de 20 a 120 mg/dia Água para injeção (incompatível com
(buscopam) obstrução intestinal 4 a 40 mg (infusão contínua) ciclizina)
Pode causar mais
a) Reduzir produção
Doses : 0,8 a 2,4 mg/dia ou sedação que o
de secreção em vias
Hioscina 3,2 mg/ dia buscopam, pois
respiratórias SF0,9% ou água
Hidrobrometo a)1,2 a 2,4 mg/dia atravessa a barreira
b) Cólicas para injeção
(escopolamina) b)0,8 a 1,2 mg/dia hematoencefálica.
c) Sialorréia, náusea e
c)0,2 a 0,8 mg/dia Efeito adverso: boca
vômitos
seca e confusão.

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Capítulo 9 - Vias de acesso em Cuidados Paliativos

Tempo de infusão e
Medicamento Indicação Dose Diluente
observação
Monitorar frequência
cardíaca e respiratória
nas primeiras 2 horas
de terapia. Rotação
100 a 150 mg/dia em
Dor de origem da punção para evitar
Cetamina infusão contínua. Aumentar SF 0,9%
neuropática necrose. Pode ser
a dose
administrada com
dexametasona 0,5
a 1,0 mg/dia para
reduzir irritação.
Pode ser irritante. Diluir
5 a 24 mg /24 h a depender
Náuseas e vômitos o máximo possível. É
do nível de sedação SF 0,9% ou água
Levomepromazina intensos, sedação e comum a ocorrência
conseguido (dose máxima para injeção
agitação de reação no local da
200mg para agitação)
aplicação.
Após a dose em bolus
lavar sempre com
Deve ser administrada 50% SF0,9% (60 ml/h
Metadona Dor intensa SF 0,9%
da dose por via oral em hipodermóclise
e rotação do local da
punção em 24h.
É irritante, diluir o
máximo possível.
30 a 120 mg/ dia (raramente
Metoclopramida Náuseas e vômitos Água para injeção Monitorar distonia em
180 mg/ dia)
casos de efeitos extra-
piramidais.
a)10 a 60 mg/24h
b)10 a 30 mg/24 h
a) Agitação e confusão c)30 a 60 mg/dia (máximo
em pacientes terminais 100 a 160 mg)
Água para injeção Pode ser irritante. Diluir
Midazolam b) Mioclônus multifocal d)Iniciar infusão contínua
ou SF0,9% o máximo possível.
c) Soluços intratáveis 1mg/h e aumentar até 4
d) Sedação mg/h (10 a 100 mg em 24h-
comumente prescrito na dose
de 10 a 30 mg/dia)
Pacientes sem uso prévio :
5 a 10 mg/dia. A dose SC é
metade da dose oral (SC dose
= VO/2) e EV= VO/3.
A dose de 10mg/ml pode
SF 0,9% ou água
Morfina Dor e dispneia ser administrada a cada 4
para injeção
horas e 1/10 a 1/6 de regate
da dose total a cada hora se
necessário. Também pode ser
usada em infusão contínua
para alívio dos sintomas.
a) Reduz secreção
a) 300 a 600 mcg /dia (dose
gastrointestinal, Pode ser irritante, diluir
máxima de 1.500 mcg)
motilidade gástrica, o máximo possível.
b) 250 a 500 mcg/dia
vômitos e diarreia em Preferir diluir com SF
Octreotide (máximo 750 mcg /dia) SF0,9%
grandes volumes 0,9%. Atentar para
c) 50 a 500 mcg/dia
b) Obstrução intestinal compatibilidade com
(máximo 1.500 mcg) – 50 a
ou gástrica outras drogas.
100 mcg de 8/8 h
c) Diarreia intratável
Náuseas e vômitos
Ondansetrona (náuseas químicas, Ex.: 8 a 24 mg/dia Água para injeção
uremia)

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Capítulo 9 - Vias de acesso em Cuidados Paliativos

Tempo de infusão e
Medicamento Indicação Dose Diluente
observação
Omeprazol Protetor gástrico 20 a 80 mg/dia Água para injeção
Não precisa ser diluída.
50 a 150 mg/24h (máximo Compatível com
Ranitidina Protetor gástrico Água para injeção
300 mg em 24 h) midazolam, ciclizaina e
morfina.
Tramadol Dor 100 a 400 mg /dia SF0,9% Até 7 dias

6. TAKAKI, CHRISTIANE YUMI ISHIKA-


Na tabela 9.5, citamos alguns me- WA; KLEIN, GILMARA DE FARIAS
dicamentos utilizados via subcutânea, SOUZA. Hipodermóclise: o conhecimento
com respectivas indicações, dose, dilui- do enfermeiro em unidade de internação.
ções e observações. Conscientiae Saúde. 2010. 9(3):486-496.
Disponível em: http://redalyc.uaemex.mx/
CONCLUSÃO redalyc/pdf/929/92915180020.pdf.
A administração de medicamentos e so- 7. YAP, L. K. P; TAN, S. H; KOO, W. H. Hypo-
luções pela hipodermóclise é segura e eficaz, dermoclysis or Subcutaneous Infusion Re-
devendo ser utilizada sempre que houver im- visited. Singapore Medical Journal. 2001.
possibilidade do uso da via oral, necessidade 42: 526-529. Disponível em: http://www.
de hidratação ou uso de medicações de forma sma.org.sg/smj/4211/4211a6.pdf.
intermitente/contínua, visando o conforto 8. FUCHS FD, WANNAMACHER L. Farma-
do paciente e da família, baseado nos princí- cologia Clínica. 2ª ed. 1998.(22):150-163.
pios dos Cuidados Paliativos. 9. K ASL, SANTOS AC. Hipodermóclise e
Administração de Medicamentos por via
REFERÊNCIAS Subcutânea: uma técnica do passado com
1. V
 YAS KS, WONG LK. Int J Burns Trauma. futuro. Prática Hospitalar Ano XI. 2009.
Oral rehydration solutions for burn mana- (6)5:109-114.
gement in the field and underdeveloped re- 10. SASSON M; SHVARTZMAN P. Hypoder-
gions: a review. 2013 Jul. 8;3(3):130-6. moclysis: An alternative Infusion Techni-
2. A MATO A, MORAES AC. Procedimen- que. Am Fam Physician. 2001. (64):1575-8.
tos Médicos - Técnica e Tática. São Paulo: 11. SCHELLACK G. Farmacologia na prática
Roca, 2008. p.31. clínica da área da saúde. São Paulo: Fun-
3. 
OLIVEIRA, R.A. Cuidado paliativo. São damento. 2006. (30):200-234.
Paulo: Conselho Regional de Medicina do 12. INCA. Ações de enfermagem para o con-
Estado de São Paulo. 2008. trole de câncer: uma proposta de integra-
4. A ZEVEDO, ELIETE FARIAS. Administra- ção ensino-serviço. 3a ed. Rio de Janeiro:
ção de antibióticos por via subcutânea: uma INCA. 2008. p.23-32/538-556.
revisão integrativa da literatura. Ribeirão 13. PONTALTI, GISLENE; RODRIGUES,
Preto, 2011. Disponível em: http://www.te- EDUARDO SANT ANNA; FIRMINO,
ses.usp.br/teses/disponiveis/22/22132/tde- FLÁVIA; FÁBRIS, MARCIA; STEIN, MI-
19012012-104714/pt-br.php. CHELLE ROCHICHNER; LONGARAY,
5. RUSSEL P. L. Analgesia in terminal malig- VANESSA KENNE. Via subcutânea: se-
nant disease. Br Med J. 1979. P.1-1561. gunda opção em Cuidados Paliativos.
20. SASSON M; SHVARTZMAN P. Hypoder- Revista HCPA. 2012. 32(2). Disponível
moclysis: An alternative Infusion Techni- em:ht tp://seer.ufrgs.br/hcpa/ar ticle/
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Capítulo 9 - Vias de acesso em Cuidados Paliativos

14. 
NORTH WEST MELBOURNE DIVI- 17. RODRIGUES, ANDREA BEZERRA; SIL-
SION OF GENERAL PRACTICE. Sub- VA, MYRIA RIBEIRO; OLIVEIRA, PA-
cutaneous Hydration. Clinical Informa- TRICIA PIRES DE.; CHAGAS, SOLAN-
tion Sheets - CIS Thirteen. Disponível GE SPANGHERO MASCARENHAS.
em: http://www.seslhd.health.nsw.gov. Semiotécnica: manual para assistência
au/Policies _Procedures _Guidelines/ de enfermagem. 3a ed. São Paulo: Iátria.
Clinical/Cancer_Services/Documents/ 2007. 23-27.
SESLHNPD20-PalliativeCareAdminO- 18. SILVA, MARCELO TARDELLI DA; SIL-
fAdultSubcutaneou. VA, SANDRA REGINA L.P. Tardelli da
15. 
MOREIRA, LUÍSA MARIA LEITÃO. Cálculo e admistração de medicamentos
Hipodermóclise. Uma forma de dignifi- na enfermagem. 3a ed. São Paulo: Marti-
car a “vida” na prestação de cuidados de nari. 2011. 75-78.
saúde no domicilio. Lisboa. 2010. Dispo- 19. Terapia subcutânea no câncer avançado.
nível em: http://repositorio.ul.pt/hand- Instituto Nacional de Câncer. Rio de Ja-
le/10451/3319. neiro: INCA. 2009.
16. 
R EICHEMBACH, MITSY TÂNNIA. 20. PALIATIVE CARE AUSTRALIA. Ma-
Administração de medicamentos por via nagement of subcutaneous infusions in
subcutânea: convenção ou controvérsia palliative care. Centre for Palliative Care
para a enfermagem? Revista Brasileira de Research and Education. Queensland Go-
Enfermagem. 2005. 58(5):602-606. Dispo- vernment. Australia. 2010. Disponível em:
nível em: http://www.scielo.br/pdf/reben/ http://www.health.qld.gov.au/cpcre/sub-
v58n5/a19v58n5.pdf. cutaneous/intro.asp.

90

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Cuidados de enfermagem
em paliação - higiene e conforto 10
CAPÍTULO

Aline Tavares Domingos


Caroline Nunes Santiago
Regina Helena Genovese
Luciano Rodrigues de Oliveira

BANHO DE ASPERSÃO infecções bacterianas, por isso deve se dar


O banho não tem somente o objetivo logo após o banho, com atenção especial
de limpeza da pele, proporciona também para a região dos pés e dobras de pele. O uso
bem-estar, estimula a circulação, promove o de hidratantes é de fundamental importân-
relaxamento muscular e alivia a fadiga; con- cia devido a pele dos indivíduos idosos ser
tribuindo assim para a recuperação dos pa- mais friável e com menos pêlos, o que au-
cientes hospitalizados, implementando saúde menta o risco de infecções.
e qualidade de vida.
O banho de aspersão ou banho de chu- BANHO NO LEITO
veiro exige que o indivíduo tenha condições O banho no leito é o mais recomendado
fisiológicas mínimas para enfrentar as condi- para pacientes totalmente acamados com
ções do ambiente físico, como a sustentação mobilidade reduzida no leito ou àqueles que
de tronco e consciência. sofrem de fadiga e fraqueza intensa. Para a
A pessoa que acompanhará o paciente realização desse procedimento muitas vezes
deve estar atenta as reações que o mesmo é necessário profilaxia de dor.
pode apresentar durante o banho, com o Ainda visando a melhor assistência e
intuito de evitar acontecimentos desagra- diminuição de desconforto é de suma im-
dáveis, como quedas, ferimentos e mesmo portância haver comunicação entre os pres-
fraturas. Para maior segurança pode-se lan- tadores de serviço e o paciente, explicando
çar mão do uso de dispositivos de segurança o procedimento e oferecendo alternativa
como barras de apoio, cadeira higiênica em para o melhor conforto como, por exemplo,
boas condições e ainda a boa conservação do o acompanhamento de um familiar. Quan-
piso do banheiro. Durante o banho, deve-se do o paciente é capaz de realizar pequenas
assegurar a privacidade do paciente. O ques- tarefas do autocuidado o profissional deve
tionamento ativo sobre as suas preferências sempre incentivá-lo.
deve ser sempre realizado para a preservação Em caso de continência, deve ser ofertado
da autonomia. o “papagaio” ou “comadre” 30 minutos an-
A secagem adequada da pele é essencial tes do inicio do procedimento respeitando a
para evitar o aparecimento de fungos ou privacidade do cliente. Objetivando a otimi-

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Capítulo 10 - Cuidados de enfermagem em paliação, higiene e conforto

zação do tempo, menor exposição do pacien- lizam vias alternativas de alimentação a sua
te, movimentação em bloco e diminuição do realização deve ocorrer de 4 em 4h.
risco de fraturas patológicas e outras compli- Deve-se utilizar escovas com cerdas ma-
cações, o banho no leito deve ser realizado cias e de dimensão pequena para facilitar o
por duas pessoas. acesso aos dentes molares em pacientes com
O material deve ser reunido antes do ini- pouca abertura de boca. Já em pacientes com
cio do procedimento, e deve ser colocado de ausência de dentes pode-se fazer uso de swab
forma acessível de forma que os envolvidos ou espátulas envoltas de gaze embebecidas de
no banho no leito não tenham que se ausen- solução antisséptica ou água bicarbonatada a
tarem durante a realização do procedimento. 10%. Em caso de sangramento gengival, re-
Antes de iniciar o banho devemos certificar comenda-se a contenção com soro fisiológico
que porta e janelas estejam fechadas para evi- a 0,9% gelado. Em pacientes inconscientes
tar correntes de ar e verificar a temperatura com ou sem sialorréia pode-se lançar mão
da água, sabe-se que a temperatura aquecida do uso de gluconato de clorexidina a 0,12% e
e constante (24ºC) pode evitar a queda de sa- aspiração da região subglótica 3 a 4 vezes por
turação de oxigênio. dia para a prevenção de pneumonia nosoco-
mial, endocartite e sepses.
HIGIENE DO COURO CABELUDO A limpeza de próteses dentárias totais ou
A higiene do couro cabeludo tem o intuito parciais deve ser feita rotineiramente, com a
de remover poeiras e descamações, prevenir mesma periodicidade da limpeza da mucosa
o aparecimento de dermatites, parasitoses e oral, utilizando sabão neutro.
infecções, além de proporcionar a inspeção
da pele desta região prevenindo o surgimen- HIGIENE ÍNTIMA
to de úlceras por pressão em pacientes total- A higiene íntima pode ser entendida
mente acamados; ainda para estes pacientes, como a lavagem da região genital e perianal
a higiene do couro cabeludo deve ocorrer no com o intuito de proporcionar conforto e
mínimo duas vezes por semana para evitar o bem-estar, além da prevenção de infecções.
aparecimento de seborréia e pediculoses. Em pacientes do sexo feminino deve-se
Em caso de pacientes com cabelos com- ter maior cuidado devido a proximidade da
pridos sempre penteá-los pelas pontas onde região anal com a vagina e a uretra, sendo
estão mais embaraçados. Em caso de mu- que a limpeza deve ser realizada sempre no
lheres, o cabelos pode ser trançados para sentido vagina- ânus, com especial atenção a
evitar a formação de nós. Pentes e escovas região da vulva (parte externa). Recomenda-
são materiais individuais que não devem se a higienização desta região três vezes ao
ser emprestados. dia ou após evacuações, de preferência com
água morna e sabonete líquido próprio para
HIGIENE ORAL a região com Ph em torno de 5 ou 6 (ácido), já
A higiene oral tem o intuito da remoção que os sabonetes em barra são mais alcalinos
mecânica de sujidade para diminuição da e de mais fácil contaminação.
colonização e assim prevenção e controle do É recomendado o uso de materiais como
aparecimento de infecções, além da manu- bolas de algodão ou panos de algodão macios
tenção da integridade da mucosa e promoção para evitar pequenas lesões na região duran-
do conforto. te a higienização. É importante observar se
Em pacientes que alimentam-se por via houve a retirada de todo o esmegma (resíduo
oral a higiene oral, principalmente de língua, branco composto de células epiteliais, óleo e
está estreitamente relacionada com a me- gordura genital). O tempo de higienização
lhor aceitação alimentar e, por isso, deve ser não deve ultrapassar 5 minutos para não ha-
realizada pela manhã, logo após as refeições ver o ressecamento e traumatismo da região.
e quando necessária. Em pacientes que uti- No caso dos pacientes masculinos, deve-

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Capítulo 10 - Cuidados de enfermagem em paliação, higiene e conforto

se proceder com o mesmo esmero, com aten- ja muito sensível devido ao quadro clínico,
ção especial para a região do prepúcio que opta-se por aparar os pêlos com tesoura, de
deve ser afastada e limpa no sentido meato modo cuidadoso.
uretral, raiz do pênis e bolsa escrotal, com es- A tricotomia facial deve ser entendida
pecial cuidado para aqueles em que a fimose em Cuidados Paliativos como eletiva, uma
não foi operada. Em caso de hipersensibili- vez que a presença de pêlos, principalmente
dade, recomenda-se o uso de sabonetes ínti- a barba em homens, caracteriza a identidade
mos com pH neutro. que o indivíduo construiu em toda sua vida,
e a retirada sem o consentimento do mesmo
TROCA DE FRALDAS ou dos familiares pode configurar uma gran-
Quando há a perda do controle urinário de frustração. Na manutenção de bigodes e
e/ou fecal torna-se necessário o uso de fral- barbas, a limpeza deve ser diária, devido ao
das. A utilização de dispositivos absortivos possível acúmulo de particulas de alimentos
oclusivos proporciona um ambiente quente e ou muco.
úmido, predispondo a proliferação de bacté-
rias, o que contribui para o aparecimento de APROPRIAÇÃO E ARRUMAÇÃO DA CAMA
dermatites por incontinência e o aumento do O leito do paciente deverá ser mantido
risco de infecções urinárias. limpo e confortável, com lençóis livres de
Com isso, a fralda ideal deve ter boa ca- rugas e dobras. Sempre garantir a privaci-
pacidade de absorção e permitir a ventilação. dade ao arrumar o leito do paciente e mini-
Outro cuidado é a troca de fraldas frequen- mizar desconforto sendo ágil e organizado.
te associada a limpeza delicada dos genitais É importante utilizar as posições do leito
com um pano macio objetivando a diminui- de forma a melhorar a condição clínica do
ção do atrito. Uma alternativa ao sabão co- paciente. Exemplo: Posição Fowler durante
mum, que provoca acidez da pele ocasionan- a alimentação ou aspiração traqueal; Semi-
do a diminuição da proteção natural, é o uso Fowler para aumentar a expansibilidade pul-
de produtos que agregam função de limpeza, monar e alimentação gástrica; Trendelenburg
hidratação e proteção com pH balanceado, para facilitar retorno venoso; Trendelenburg
ou ainda, a aplicação de limpadores sem en- reversa para promover esvaziamento gástri-
xágue. Também é indicado o uso separado de co; reta para dormir. É importante prover su-
agentes protetores como óxido de zinco. perfícies de alívio de pressão, como o colchão
piramidal, comumente chamado de caixa de
TRICOTOMIA FACIAL ovo, ou colchão pneumático (de preferência)
Primeiramente, verificar as preferências uma vez que são pacientes com maior risco
do paciente, perguntar se ele ou o familiar de desenvolvimento de lesões.
notou algum problema ou marcas incomuns
na pele. Oferecer a oportunidade para incluir TRANSFERÊNCIA E MOBILIZAÇÃO
preferências culturais ou de higiene pessoal. É importante avaliar a tolerância à ativi-
Verificar qual o produto que o paciente está dade, o nível de desconforto, a capacidade
habituado a passar no rosto e o que deixe me- cognitiva e a função músculo-esquelética
nor quantidade de resíduos. Indica-se a reali- do paciente antes de realizar transferência e
zação com aparelho de barbear que evite dor mobilização. Considerar analgesia pré-pro-
ou lesões, e deve ser feita de modo a preservar cedimento sempre que necessário. Deve-se
a integridade da pele. Atenção especial deve realizar a movimentação garantindo o ali-
ser dada a pacientes suscetíveis a sangramen- nhamento da coluna, preparar o ambiente
tos. Para evitar desconforto ou cortes, puxar para transferir o paciente de modo seguro,
levemente a porção da pele a ser barbeada e evitando-se queda.
usar movimentos firmes e curtos, na direção Na mobilização no leito utilizar disposi-
do crescimento dos pêlos. Caso a pele este- tivos que auxiliem na manutenção do con-

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Capítulo 10 - Cuidados de enfermagem em paliação, higiene e conforto

forto, como travesseiros, rolos e superfícies REFERENCIAS


piramidais. Atentar para aliviar a pressão 1. AQUINO AL, CHIANCA TCM, BRITO
sob lesões dolorosas ou membros plégicos. RCS. Integridade da pele prejudicada, evi-
Sempre deixar grades do leito elevadas. denciada por dermatite da área das fraldas:
revisão integrativa. Rev. Eletr. Enf. [Inter-
VESTUÁRIO net]. 2012 abr/jun;14(2):414-24. Available
Busca-se a utilização de roupas confor- from:http://www.fen.ufg.br/revista/v14/n2/
táveis. É importante oferecer ao paciente e à v14n2a22.htm.
família a oportunidade de vestir roupas de 2. BAHAMONDES MV ET AL. Use of a
sua preferência, desde que bem higienizadas lactic acid plus lactoserum intimate li-
quid soap for external hygiene in the pre-
e que não sejam contraindicadas para a situa-
vention of bacterial vaginosis recurrence
ção clínica do paciente.
after metronidazole oral treatment. Rev.
Assoc. Med. Bras. [serial on the Inter-
HIGIENE DO AMBIENTE net]. 2011 Aug [cited 2013 June 23] ; 57(4):
O ambiente em Cuidados Paliativos deve 415-420. Available from: http://www.
ser o mais agradável possível e conter infor- scielo.br/scielo.php?script=sci_arttex-
mações que o paciente deseja, como fotos e t&pid=S0104-42302011000400015&lng=-
objetos de estima. A higiene é garantida atra- en . ht t p://d x .doi .org /10.159 0/S 010 4 -
vés de rigorosa limpeza, com ênfase na mi- 42302011000400015.
nimização dos odores, boa circulação do ar 3. BUISÁN R, DELGADO JC. El cuidado del
e iluminação. paciente terminal. An. Sist. Sanit. Navar.
O nível de ruídos pode ser minimizado, 2007; 30(3) :103-112.
com conversas em baixo tom, campainhas, 4. FERNANDES JD, MACHADO MCR, OLI-
telefones e alarmes em volume mais baixo. VEIRA ZNP. Quadro clínico e tratamento
Peça sugestões ao paciente e ao familiar da dermatite da área das fraldas – Parte II.
sobre como arrumar os itens. É importante An Bras Dermatol. 2009;84(1):47-54
ajustar a temperatura, o barulho, os odores 5. GUTIERREZ BAO, CIAMPONE MHT.
e a ventilação do quarto para criar um am- Profissionais de enfermagem frente ao
biente mais confortável. A temperatura deve processo de morte de pacientes em unida-
ser mantida entre 20º e 23ºC, para reduzir as des de terapia intensiva. Acta Paul Enferm
demandas metabólicas do organismo. 2006;19(4):456-61.
Todos os equipamentos devem ser limpos 6. LOPES JL, NOGUEIRA-MARTINS LA,
diariamente com álcool 70%: mesa auxiliar GONÇALVES MAB, BARROS ALBL.
Comparação do nível de ansiedade entre o
para cama, cadeiras, suporte de soro e outros
banho de chuveiro e o de leito em pacien-
utensílios.
tes com infarto agudo do miocárdio. Rev.
Latino-Am, Enfermagem mar-abr 2010;
MASSAGEM DE CONFORTO 18(2):81-87.
Não massagear áreas avermelhadas da 7. M ACIEL SSA, BOCCHI SCM. Compreen-
pele, pois a massagem pode romper os ca- dendo a lacuna entre a prática e a evolução
pilares da superfície da pele e aumentar técnico-científica do banho no leito. Rev
riscos de úlceras por pressão ou desgaste. A Latino-am Enfermagem 2006 março-abril;
massagem no abdome em sentido horário 14(2):233-42
pode auxiliar o trânsito intestinal estimu- 8. MUSSI FC. Conforto e lógica hospitalar:
lando as eliminações. análise a partir da evolução histórica do
A estimulação cutânea por si só pode ali- conceito conforto na enfermagem. Acta
viar a dor e transmitir afeto. Devemos rea- Paul Enferm 2005; 18(1):72-81
lizar e encorajar familiares a realizarem, de 9. NAKATANI, A.Y.K.; SOUZA,A.C.S.;
acordo com a aceitação do paciente. GOMES, I.V.; SOUSA, M.M. O banho

94

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Capítulo 10 - Cuidados de enfermagem em paliação, higiene e conforto

no leito em unidade de terapia intensiva: 14. PEREIRA I; SERA CTN, CAROMANO


uma visão de quem recebe. Ciência, Cui- FA. Higiene e Conforto. In:Oliveira, RA
dado e Saúde Maringá, v. 3, n. 1, p. 13-21, (Coord). Cuidado Paliativo
jan./abr. 2004 15. PEREIRA I; SERA CTN, CAROMANO
10. OLIVEIRA AP, LIMA DVM. Evaluation FA. Higiene e Conforto. In: Conselho Re-
of bedbath in critically ill patients: impact gional de Medicina do Estado de São Pau-
of water temperature on the pulse oxime- lo. Cuidado Paliativo. São Paulo: Bioética;
try variation. Rev Esc Enferm USP 2010; 2008.p.195-219.
44(4):1034-40 16. R IBEIRO JU, BORGES EL. Revisão inte-
11. 
OLIVEIRA EA, GARCIA TR, SÁ LD. grativa do tratamento de dermatite asso-
Aspectos valorizados por profissionais de ciada à incontinência. Rev Estima - vol8
enfermagem na higiene pessoal e na higie- (1) 2010 p. 30 – 39.
ne corporal do paciente. Rev Bras Enferm, 17.POTTER PA. Fundamentos de Enferma-
Brasília (DF) 2003 set/out;56(5): 479-483 gem. Ed Elsevier, Rio de Janeiro, 2005.
12. ORLANDINI GM, LAZZARI CM. Co- 18. OLIVEIRA AC, SÁ L, SILVA MJP. O po-
nhecimento da equipe de enfermagem sicionamento do enfermeiro frente a au-
sobre higiene oral em pacientes criti- tonomia do paciente terminal. Rev Bras
camente enfermos. Rev Gaúcha En- Enferm 2007 maio-jun; 60(3):286-90.
ferm.2012;33(3):34-41. 19. European Pressure Ulcer Advisory Pa-
13. SILVA MF, FERNANDES MFP. A ética nel and National Pressure Ulcer Advi-
do processo ante o gerenciamento de sory Panel. Prevention and treatment of
enfermagem em cuidado paliativo. O pressure ulcers: quick reference guide.
mundo da saúde São Paulo: 2006: abr/ Washington DC: National Pressure Ulcer
jun 30 (2): 318-325 Advisory Panel: 2009.

95

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Nutrição e hidratação em Cuidados
Paliativos no idoso 11
CAPÍTULO

Fernanda Pinheiro Da Silva


Flávia Kurebayashi Fonte
Juliana De Oliveira Gomes
Luciana Zimmermann De Oliveira

INTRODUÇÃO portanto, deve ser levada em conta a vontade


Nutrição é o processo em que o organismo do paciente e da sua família, além de conside-
utiliza os alimentos para obtenção de energia, rações éticas, culturais e religiosas.3
manutenção da saúde, crescimento e funcio- Os pacientes em fase final da vida pos-
namento normal de todos os órgãos e tecidos. suem menos apetite, consomem alimentos
É um requisito básico para que haja a vida em menor quantidade, tem menos sede e a
humana, com importante papel na promoção recusa da alimentação ocorre em função de
da saúde e prevenção de doenças. Porém, a sintomas, como dor, náuseas, vômitos, cons-
alimentação significa mais do que prover nu- tipação, diarreia, entre outros. Também so-
trientes para o organismo, é uma experiência frem redução do paladar e tem o processo
prazerosa e importante para a interação so- de deglutição, digestão, absorção e excreção
cial, sendo parte integrante de comemorações alterados. É comum que haja por parte da
e eventos em diversas culturas, além de reme- família uma grande preocupação em rela-
ter ao cuidado com o outro.1,2 ção à diminuição ou cessação completa da
Portanto, nutrir e hidratar pessoas em alimentação por desejo do paciente, além da
qualquer condição clínica está relacionado ao dificuldade em entender que o doente apre-
ato de cuidar, principalmente aos que estão senta piora clínica por conta da evolução da
gravemente enfermos. Dentro da cultura lati- doença de base, e não pela falta dos alimentos
na isso se faz ainda mais presente. No entanto, e hidratação.2 O objetivo do tratamento nes-
em determinadas situações em que ocorre um ta fase deve ser a promoção da qualidade de
processo progressivo de deterioração funcio- vida, o alívio do sofrimento e a minimização
nal, esse cuidado pode não ser benéfico na do estresse, sendo fundamental que o desejo
evolução da doença de base, não melhorando do paciente seja atendido e respeitado.3
o prognóstico, podendo causar mais descon-
forto e piora da qualidade de vida.2 NUTRIÇÃO
Devemos sempre nos preocupar com o Os objetivos da intervenção nutricional
que está sendo ofertado ao paciente e a forma em Cuidados Paliativos variam de acordo
como é ofertado. Tanto a dieta quanto a hi- com a evolução da doença, sendo que nos
dratação podem proporcionar desconforto, estágios iniciais constitui de melhorar a qua-

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Capítulo 11 - Nutrição e hidratação em Cuidados Paliativos no idoso

lidade de vida do paciente, auxiliando na Segundo a American Dietetic Association


resposta ao tratamento, focando principal- (ADA), a nutrição em paciente com doenças
mente no controle dos sintomas, redução de avançadas deve oferecer: conforto emocio-
complicações, manutenção de um estado de nal, prazer, auxiliar na diminuição da an-
hidratação satisfatório e preservação o máxi- siedade, aumento da autoestima e indepen-
mo possível do peso e da composição corpó- dência, além de permitir maior integridade e
rea.4 A nutrição tem importante papel, pois é comunicação com seus familiares.4
capaz de proporcionar por meio de diferentes Para uma melhor avaliação e aconse-
vias de alimentação a prevenção da síndro- lhamento nutricional, é importante que os
me anorexia-caquexia que pode se instalar profissionais envolvidos no cuidado sejam
causando ainda mais sofrimento, além de sensíveis e criativos, com a finalidade de evi-
ressignificar o alimento para o enfermo em tar um maior comprometimento do estado
sua nova fase.5 nutricional, o qual pode interferir negativa-
Existem várias formas de nutrição e hi- mente na qualidade de vida do paciente e de
dratação artificiais, algumas mais invasivas seus familiares.9
que outras. Os custos, riscos e grau de invasão
variam de procedimento para procedimento. MANEJO NUTRICIONAL
Dentre as vias para nutrição, temos a via oral, A ingestão alimentar de pacientes em
sonda nasogástrica (SNG), nasoduodenal ou Cuidados Paliativos muitas vezes encon-
nasoenteral (SNE), gastrostomia (GTT) per- tra-se prejudicada. Desta forma, devem-se
cutânea endoscópica ou cirúrgica, e nutrição respeitar as vontades do indivíduo, ofertar
parenteral periférica (NPP) ou total (NPT). alimentos de sua preferência, oferecer re-
Para hidratação podemos utilizar hidratação feições nos horários em que sinta menos
oral, por hipodermóclise, infusão de fluidos sintomas desconfortáveis (fadiga, náu-
via retal ou acessos venosos periféricos ou em seas, dor), fracionando a dieta em seis a
veias centrais.5 sete refeições ou mais e f lexibilizando os
A alimentação, no sentido de prover co- horários conforme aceitação, escolher a
mida e bebida, é parte de um cuidado básico, consistência adequada (as mais toleradas
sustentador de vida, por isso, é importante são a semi-líquida e a líquida)7, além de
deixar claro, que diferente da alimentação utilizar estratégias propiciando condi-
natural, a nutrição e a hidratação artificiais ções para que o paciente se alimente de
são consideradas recursos terapêuticos, apli- forma mais independente (ex: adaptação
cados diante de uma indicação clínica.6 de talheres melhorando a limitação de
Além do que, a nutrição e hidratação rea- movimentos, utilização de canudos com
lizadas por via sonda, ostomias ou parenteral válvula unidirecional para evitar que uma
podem trazer sérias complicações, incluindo sucção prejudicada possa impossibilitar a
azotemia, síndrome da superalimentação, ingestão), permitir que a refeição ocorra
síndrome da sobrecarga gordurosa, hipertri- num ambiente tranquilo e que o paciente
gliceridemia, hiperglicemia, agitação, epis- possa alimentar-se com calma, de prefe-
taxe, necrose nasal, pneumonia aspirativa, rência na companhia de pessoas queridas
obstrução das vias aéreas, pneumotórax, hi- além de oferecer alimentos com consis-
drotórax, nasofaringite, esofagite, estenose tência adequada a cada situação.10
esofágica, infecção no local de inserção.7 Uma conduta simples que pode trazer
Há que se avaliar o risco-benefício das grande benefício para pacientes oncológicos,
terapias indicadas e, se esses recursos não é evitar a oferta dos pratos preferidos durante
oferecerem razoável esperança de benefícios a quimio e radioterapia, pois se caso houver
ao paciente ou não podem ser usados sem náuseas ou aversão alimentar nesse período,
danos excessivos, elas podem ser julgadas o paciente não os associará, evitando-se que
como extraordinárias.8 perca o prazer por estes alimentos.10

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Capítulo 11 - Nutrição e hidratação em Cuidados Paliativos no idoso

O objetivo da terapia nutricional varia de Com o avançar da doença e a proximidade


acordo com a fase de progressão da doença, e da morte, os objetivos mudam e a dietotera-
deve ter sempre a via oral como preferencial. pia para a recuperação do estado nutricional
Na fase inicial, em que o idoso se encon- pode ser considerada fútil, pois diversos es-
tra em tratamento, o ideal é garantir a oferta tudos mostram que a nutrição artificial não é
de 25 a 38 kcal/Kg de peso/dia, 1,0 a 1,8g de capaz de prolongar a vida ou melhorar quali-
proteína/Kg de peso/dia e 25mL de água/Kg dade de vida, o estado nutricional e as úlceras
de peso/dia para a manutenção e/ou recu- por pressão de idosos em estágio avançado de
peração do estado nutricional e hidratação demência e de doentes com câncer avançado.
satisfatória, e assim, tentar evitar a piora do Pode causar também muitos sintomas desa-
estado nutricional. Os complementos ente- gradáveis, como náuseas, vômitos, diarreia,
rais devem ser a primeira opção, quando a constipação e desconforto sem, no entanto,
ingestão alimentar for < 75% das recomen- reduzir o risco de broncoaspiração.14,15,16,17,18
dações em até 5 dias, sem expectativa de Deve-se então focar na qualidade de vida
melhora da ingestão.12 e no desejo do indivíduo, priorizando o sa-
Existem no mercado inúmeros tipos de bor dos alimentos, a apresentação do prato e
suplementos orais indicados para o paciente o ambiente no qual a refeição será realizada.
idoso, em pó ou prontos para o consumo. Os Nesses casos, o valor nutricional passa a ter
suplementos em pó são uma opção interessan- menor importância do que a apresentação da
te, pois podem ser adicionados em diversas pre- refeição, inclusive no tamanho das porções,
parações, podendo assim ser ofertado naquelas que devem ser menores e mais atraentes.
de maior aceitação, além de contarmos tam- Portanto, procura–se promover a sensação
bém com a opção de suplementos em pó sem de bem-estar e conforto, qualidade de vida e
sabor, que podem ser utilizados em prepara- alívio dos sintomas.3
ções doces ou salgadas. A opção pronta para o Ainda assim, com essas evidências, Pala-
consumo é também válida, pois contamos com cek e colaboradores notaram em seu estudo
diversos produtos, dos mais variados sabores, que a alimentação e hidratação por via al-
que conseguem oferecer até 2.0Kcal/mL de su- ternativa é muito utilizada, principalmente
plemento e um mix de vitaminas e minerais in- nos casos em que o paciente já não responde
dicados para essa faixa etária. A quantidade de por si próprio, como na demência avançada.
suplemento oferecida deve ser individualizada, Quando a família passa a responder por ele,
dependendo da ingestão calórica e proteica do acaba não concordando com a retirada per-
paciente ao longo do dia. O profissional nutri- manente da dieta, já que tem uma interpreta-
cionista deve, junto com a equipe de cuidados, ção errônea ao relacionar essa prática com o
estipular metas e fazer a prescrição necessária não cuidado.13
para alcance das necessidades energéticas, le- Para se estabelecer a conduta do uso ou
vando em conta a aceitação do paciente.12 não de terapia artificial, Bozzetti et al. de-
Quando não se torna mais possível a ali- senvolveram protocolos para a instituição de
mentação e a hidratação pela boca, devido a terapia nutricional enteral, nutrição parente-
evolução da doença, com a presença de dis- ral e hidratação para pacientes oncológicos
fagia, dificuldade de mastigação ou total ina- terminais em que devem ser considerados
petência, pode-se fazer uso de via alternativa oito passos, sendo eles: condição clínica, sin-
para que as necessidades do paciente sejam tomas, expectativa de vida, estado nutricio-
alcançadas. Em pacientes não elegíveis a Cui- nal, condições e aceitação de alimentação via
dados Paliativos, a nutrição enteral é indicada oral, estado psicológico, integridade do trato
nos casos em que não se consegue ingerir por gastrintestinal e necessidade de serviços es-
via oral de 2/3 a 3/4 das necessidades diárias peciais para oferecimento da dieta. O trata-
recomendadas, contando que se esteja com o mento e seus resultados devem ser reavalia-
trato gastrointestinal funcionante.13 dos periodicamente.19

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Capítulo 11 - Nutrição e hidratação em Cuidados Paliativos no idoso

VIAS ALTERNATIVAS No fluxograma 11.1 estão descritas as


A seguir serão descritas outras formas de possibilidades de nutrição em Cuidados Pa-
nutrição, seus métodos e riscos para o paciente. liativos, bem como a abordagem com os pa-
cientes e familiares.
Nutrição enteral A hidratação é o processo de reposição
É a via menos invasiva de nutrição, ex- da água no organismo, com a finalidade de
cluindo-se a via oral, e consiste em adminis- manter a composição corporal e a homeosta-
tração de dieta preparada (industrializada ou se. Philippi cita que a ingestão de água é con-
não) via SNG ou SNE, que são tubos plásticos trolada pela sensação de sede, mas é sabido
flexíveis, de fácil introdução pelo nariz, traje- que nos idosos esse mecanismo é alterado,
to esofágico findando no estômago ou duo- pelo fato da alteração da composição corpo-
deno conforme a extensão da sonda.18 ral que ocorre nesta fase da vida, portanto, é
Podem causar delirium e induzir agitação necessário que haja uma atenção quanto aos
em idosos. O risco de aspiração de conteúdo sinais de desidratação.17
gástrico não é prevenido por esse método e No final da vida, a hidratação oral pode
alguns estudos revelam que pode ser ainda ser complicada pela própria condição do pa-
maior que a alimentação via oral.17 ciente. A hidratação oral ainda é preferida
Estudo prospectivo que avaliou a mor- quando possível e pode ser ofertada através
talidade em idosos frágeis em uso de nu- de líquidos ou gelo (sorvetes, picolés).17
trição enteral revelou que 65% dos pacien- Existem argumentos contra e a favor da
tes morreram após sondagem.14 Distúr- hidratação não oral para pacientes em Cui-
bios hidroeletrolíticos significantes foram dados Paliativos exclusivos. Argumentos
observados nesses pacientes no estudo contra incluem prolongar a vida sem ameni-
Lubart e Cols. zar os sintomas, podendo causar náusea, vô-
mitos, aumento de secreções, edema, ascite
Gastrostomia e até lesões de pele. A hidratação parenteral
Consiste em procedimento invasivo para pode limitar a mobilidade do paciente além
colocação de sonda de alimentação. O menos de causar desconforto.18
invasivo é a colocação de sonda através da Soden e colaboradores não encontraram
via endoscópica percutânea. Também pode aumento na sobrevida de pacientes que rece-
ser colocada através da via cirúrgica a “céu beram hidratação parenteral contra os que
aberto” ou via radiológica.18 não receberam.18 Segundo Carvalho e Taque-
Na via endoscópica, há colocação da son- mori, indivíduos em fase terminal da doença
da perfurando a pele utilizando um endos- necessitam de quantidades muito menores
cópio como guia do local a ser posicionada de água do que indivíduos saudáveis.15 Vale
a sonda. Pode também ser posicionada no sempre ressaltar que a desidratação nas últi-
duodeno ou jejuno, caso o estômago do pa- mas horas de vida pode ser muito confortável
ciente esteja disfuncional.17 e protetora para o paciente.
A via cirúrgica requer a abertura da pele A oferta de líquidos, no entanto, deve ser
e estômago do paciente. Causa maior morbi- individualizada levando-se em conta o esta-
dade ao paciente além de proporcionar maior do de hidratação do idoso por meio de sinais
chance de complicações. 17 como mucosas secas, perda de turgor e elas-
A gastrostomia é a preferida por muitos ticidade da pele, oligúria, febre, constipação
cuidadores e familiares dos idosos com de- e observação de exames laboratoriais como
mência avançada por maior facilidade de uréia, creatinina e sódio.20
manipulação e conforto para o paciente, que A recomendação de água refere-se à água
não percebe nenhum incômodo em sua face. total, ou seja, a soma da água pura, da água
Entretanto, também não proporciona dimi- contida nas bebidas e da água presente nos
nuição na mortalidade desses indivíduos.16 alimentos. Para conseguirmos alcançar (ou

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Capítulo 11 - Nutrição e hidratação em Cuidados Paliativos no idoso

Fluxograma 11.1 - Abordagem da nutrição em Cuidados Paliativos

Pobre ingesta

Abordagem abrangente
com paciente e família

Modificações na alimentação e
hidratação oral para avaliar aceitação

Houve boa aceitação?

Sim Não

Bom paladar com a dieta oral Discutir opções de nutrição com o


(aumentar a consistência,se disfagia) e paciente e familiares
prevenção da xerostomia com sorvete,
gelo, higiene oral ou lubrificantes

Demência? Nutrição de
Prognóstico ruim e baixa
conforto oral e hidratação com
sobrevida
avaliação contínua
Não
Sim
Trauma, AVC, Discutir SNE e se a
Prognóstico ruim e baixa permanência for > 4 a 6 semanas,
sobrevida considerar gastro ou jejunostomia

Nutrição de conforto oral e


Não definido hidratação com avaliação contínua.
Considerar SNE ou Gastrostomia se
indicação ou a pedido da família.
Adaptado: Skelly RH,16

chegar próximo) da oferta hídrica, pode- Quadro 11.1 - Quantidade de água (mL) contida nos
alimentos (porção)
mos lançar mão de alimentos ricos em água,
como sorvetes e frutas.20 No quadro abaixo, Alimento Porção Ml de água

estão descritos alguns alimentos com a por- Abacaxi 1 Fatia média 95


ção de água equivalente. Caqui 1 Un.Média 135
Chuchu ½ Un.Média 100
VIAS ALTERNATIVAS Goiaba 1 Un.Média 170
Laranja 1 Un.Média 140
Hipodermóclise Maçã 1 Un.Média 145
Também conhecida como administração Mamão 1 Fatia média 85
subcutânea de fluidos é um método artificial Melancia 1 Fatia médio 175
de hidratação que tem sido muito utilizado
Melão 1 Fatia média 130
nas últimas duas décadas em todo o mundo
Mexerica 1 Un.Média 130
para idosos e adultos.14
Morango 8 Un. 100
É considerada uma via com liberação me-
Pêra 1 Un.Média 165
nos errática quando comparada com a intra-
venosa ou central. Fluidos são administrados Pessego 1 Un.Média 75

via “scalp” ou “butterfly” até o tecido celular Uva comum 10 Grãos 105

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Capítulo 11 - Nutrição e hidratação em Cuidados Paliativos no idoso

subcutâneo. Apesar das complicações como O aumento de endorfinas no sistema ner-


hiperemia ou infecção local, é considerada voso central é responsável pelos sintomas
uma via segura e eficaz, além de ser mais ba- de saciedade e tranquilidade nesta etapa da
rata que as outras.13 vida, na maioria dos pacientes, podendo até
É contraindicada em casos de emergên- ser observado um estado de euforia.21
cia (pela necessidade de oferta de fluidos ou A tabela 11.1 traz alguns benefícios da
medicações de forma rápida), edema genera- privação alimentar em pacientes na fase final
lizado (pela absorção errática neste contexto) de vida.3
e em pacientes com discrasia sanguínea (pelo
risco de complicações locais).14 Tabela 11.1 - Benefícios da privação alimentar para
Familiares e cuidadores podem, em al- os pacientes em fase final de vida
guns casos, considerar essa via menos efetiva • Privação alimentar leva a produção de opioides en-
que a endovenosa, o que não é verdade. Cabe dógenos

à equipe informar e orientar pacientes, fami- • Cetose gera sonolência e sensação de bem-estar

liares e cuidadores. • Redução da distensão gástrica diminui a ativação dos


receptores hipotalâmicos por peptídeos
• Redução dos metabólitos formados pelo ciclo da uréia
Proctóclise resulta em menor sensação de desconforto
Também chamada de hidratação retal, • Hipernatremia diminui a nocicepção e, portanto, pode
pode ser usada quando a via subcutânea está melhorar dor e desconforto
indisponível. Consiste na passagem de sonda Adaptado por: Nurses involvement in end of life decisions.
(gástrica ou enteral) via retal e administração Cancer 5,6
de fluidos pela mesma. Pode ser infundida
uma quantidade de 100 a 400ml/h de líqui- CONCLUSÃO
dos sem causar desconforto para o paciente.19 A decisão sobre hidratação e nutrição não
é fácil e depende do médico, paciente e famí-
Nutrição e hidratação parenteral total lia. O acompanhamento do paciente em Cui-
Esse método de nutrição e hidratação re- dados Paliativos requer uma equipe multi-
quer a passagem de catéteres em veias pro- profissional e interdisciplinar intergrada, que
fundas como subclávia, jugular interna ou tenha como objetivos proporcionar conforto
femoral do paciente. Esses procedimentos emocional, aliviar sintomas e sofrimento. A
são considerados mais expendiosos que os decisão de manter e preservar a alimenta-
anteriores, além de conter maiores riscos de ção e a hidratação deve ser individualizada
complicações como sepse, embolia gasosa, para cada paciente dependendo do estágio da
pneumotórax entre outros, que causam des- doença e das suas crenças e desejos. Nunca
conforto e sofrimento ao paciente. 18 devemos esquecer, no entanto, que cabe a
nós da equipe de saúde ponderar os riscos e
O PAPEL ANALGÉSICO DO JEJUM os benefícios para o paciente, na tentativa de
A privação prolongada dos alimentos promover qualidade até o último momento.21
e líquidos está associada a uma série de
modificações metabólicas e psicológicas, REFERÊNCIAS
que parecem ser mediadas por alterações 1. WORLD HEALTH ORGANIZATION.
hormonais e efeitos anorexígenos das ce- Preventing chronic diseases: a vital in-
tonas circulantes. A deficiência nutricio- vestment. Geneva: World Health Organi-
nal no final da vida produz um estado zation; 2005.
metabólico de cetose que reforça a falta de 2. M ATINS N, COBAS V, ET AL. Manual de
desejo por ingerir alimentos. Portanto, a Cuidados Paliativos, Rio de Janeiro. n 1 p
desidratação e a cetonemia compõem uma 227-229,2009.
resposta à adaptação fisiológica ao pro- 3. CARNEIRO HS. Comida e sociedade: sig-
cesso natural de morte. 21 nificados sociais na história da alimenta-

102

Miolo.indd 102 17/04/2014 14:11:19


Capítulo 11 - Nutrição e hidratação em Cuidados Paliativos no idoso

ção. História: Questões & Debates, Curiti- 15. P  ESSINI L, BERTACHINI L. Humani-
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Feridas neoplásicas e úlceras
por pressão: manejo em
Cuidados Paliativos
12
CAPÍTULO

Eduardo Brandão Elkhoury


Leila Blannes

FERIDAS NEOPLÁSICAS Realizar um curativo efetivo, confortável


e esteticamente aceitável torna-se, muitas
Introdução vezes, um desafio, devendo ser seu manejo
Estima-se que cerca de 5% a 10% dos pa- sempre individualizado. 2
cientes oncológicos sejam acometidos por le-
sões cutâneas malignas.1,2 Estas, por sua vez, Classificação
podem ser em decorrência de um tumor pri- As feridas oncológicas se classificam:3
mário ou de tumores metastáticos.1 • Quanto à localização e à topografia;
Apesar de as neoplasias de mama, pul- • Quanto à origem: primária (origina-
mão, trato gastrointestinal e o melanoma se no local do tumor primário) ou
serem os responsáveis pela maior parte das metastática (tem como origem um lo-
lesões, muitos outros tipos de câncer, tais cal de metástase);
como o de ovário, cabeça e pescoço, trato • Quanto à aparência: fungosa (aparên-
geniturinário ou mesmo de sítio primário cia fungosa, semelhante à couve-flor),
indeterminado podem cursar com acometi- ulcerativa (forma crateras) ou fungo-
mento metastático da pele.1 sa maligna ulcerativa (apresenta am-
Constituem, sem dúvida, mais um agravo bos os aspectos);
físico e psicológico na vida do ser humano • Quanto ao estadiamento.
portador de câncer, já que tais feridas, pro-
gressivamente, vão desfigurando o corpo e Avaliação e estadiamento
tornando-se friáveis, dolorosas e com odor A avaliação do paciente e de sua ferida é
fétido. O sofrimento relacionado à imagem essencial para o correto planejamento da te-
de um corpo mutilado e à sensação de perda rapia. Inicialmente, é importante identificar
da dignidade pode ser imensurável. 2,3 o impacto da lesão nas esferas psicológica,
Devido ao pequeno potencial de cura, social e espiritual do doente. Não é incomum
o objetivo da equipe de saúde que lida com encontrar indivíduos portadores de feridas
tal patologia deve se basear no controle dos malignas sofrendo de isolamento social e gra-
sintomas e na tentativa de manter ou me- ves problemas de relacionamento, que levam a
lhorar a qualidade de vida desses doentes.4 grande impacto na qualidade de vida.1,3

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Capítulo 12 - Feridas neoplásicas e úlceras por pressão: manejo em Cuidados Paliativos

Além disso, a localização, o tamanho, a dados oferecidos deve incluir a prevenção e


aparência, a presença de exsudato e de teci- o controle dos sintomas locais. Além disso,
do necrótico, o odor, as alterações na pele a manutenção do conforto e da qualidade de
adjacente e quaisquer sintomas relacionados vida do paciente e seus familiares é funda-
devem ser levados em consideração na hora mental e faz parte de toda terapia que alme-
de definir a terapêutica local e a escolha dos ja ser bem-sucedida.4
curativos e analgésicos.1
Após avaliar a lesão, o próximo passo Odor
é estadiá-la. A fim de facilitar a documen- O odor é citado na literatura como o sin-
tação das feridas e a comunicação entre os toma mais castigador destas feridas, em de-
profissionais de saúde, as enfermeiras Hais- corrência da sensação de enojamento e iso-
field-Wolfe e Baxendale-Cox propuseram, lamento social que imputa ao paciente. Ele é
em 1999, um estadiamento classificatório causado pelo crescimento de bactérias, prin-
com base naquele adotado universalmente cipalmente de anaeróbias, ou pela presença
para classificação das úlceras por pressão de tecido necrótico. Para combatê-lo, o tra-
(Quadro 12.1).1,3 tamento deve se basear na limpeza da ferida
Vale lembrar que o estadiamento pode através da irrigação com soro fisiológico, na
mudar ao longo do tempo conforme a agres- escolha do curativo adequado e no debrida-
sividade do tumor ou o sucesso da terapia mento da necrose.1,2,3
instituída. A ferida oncológica é uma entida- Além disso, o uso de antibioticoterapia
de clínica dinâmica e, por esse motivo, exige também é efetiva, pois combate a bactéria
preparo adequado da equipe para identificar responsável pelo odor. O antibiótico mais
os sinais presentes ou potenciais de compli- usado para esse fim é o metronidazol gel
cação. O paciente, a família e os cuidadores 0,8%. Geralmente, ele é aplicado sobre a feri-
devem ser treinados a identificar essas situa- da uma vez ao dia durante 5 a 7 dias, porém
ções e reportá-las aos profissionais de saúde.3 esse tempo pode ser prolongado até o total
controle do odor. Na presença de extensa ne-
Manejo crose, é necessário debridá-la antes de aplicar
A cicatrização completa da ferida neo- a medicação, caso contrário esta não será ab-
plásica é possível apenas em uma minoria sorvida. Na impossibilidade do gel, uma al-
dos casos. Desta forma, o objetivo dos cui- ternativa consiste em quebrar comprimidos

Quadro 12.1 - Descrição do estadiamento classificatório das feridas neoplásicas


Pele íntegra. Tecido de coloração avermelhada e/ou violácea. Nódulo visível e delimitado. Encontra-se em
Estágio 1
estado assintomático.
Ferida fechada ou com abertura superficial por orifícios de drenagem de exsudato límpido, amarelada ou
Estágio 1N de aspecto purulento. Tecido avermelhado ou violáceo, lesão seca ou úmida. Pode haver dor e prurido. Não
apresenta odor e configura-se sem tunelizações e/ou formação de crateras.
Ferida aberta, envolvendo derme e epiderme. Ulcerações superficiais podendo apresentar-se friáveis, sensí-
veis à manipulação, com exsudato ausente (lesões secas) ou em pouca quantidade (lesões úmidas). Intenso
Estágio 2 processo inflamatório ao redor, em que o tecido exibe coloração vermelha e/ou violácea e o leito da ferida
configura-se com áreas secas e úmidas. Pode haver dor e odor. Não formam tunelizações, pois não ultrapas-
sam o tecido subcutâneo.
Feridas que envolvem derme, epiderme e subcutâneo. Tem profundidade regular, mas com saliências e for-
mação irregular. São friáveis, com áreas de ulcerações e tecido necrótico liquefeito ou sólido e aderido.
Estágio 3 Fétidas, secretivas, já com aspecto vegetativo, mas que não ultrapassam o subcutâneo. Podem apresentar
lesões satélites em risco de ruptura iminente. Tecido de coloração avermelhada, violácea. O leito da lesão é
predominantemente de coloração amarelada.
Feridas invadindo profundas estruturas anatômicas. Tem profundidade expressiva, por vezes não se visua-
Estágio 4 liza seus limites. Tem exsudato abundante, odor fétido e dor. Tecido ao redor exibe coloração avermelhada,
violácea. O leito da lesão é predominantemente de coloração amarelada.

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Capítulo 12 - Feridas neoplásicas e úlceras por pressão: manejo em Cuidados Paliativos

de metronidazol, diluí-los em água destilada mente resolvem. Se há sinais de infecção


ou solução salina isotônica (1 comprimido generalizada, no entanto, a via parenteral
de 250mg em 250ml, podendo a concentra- é a de escolha.1
ção ser aumentada em até 4 comprimidos de Como as feridas neoplásicas comumente
250mg para 50ml de solução) e aplicá-los so- apresentam intenso processo inflamatório e
bre a ferida na forma de irrigação ou em gaze edema, pode haver saída de em abundante
embebida. É importante lembrar de umede- quantidade independente de estarem in-
cer a gaze antes de retirá-la a fim de evitar fectadas ou não. Sempre que houver muito
trauma, dor e sangramento.1,3 exsudato, devem ser feitos curativos com al-
Uma ótima alternativa para controle do ginato de cálcio ou carvão ativado, elemen-
odor é o uso tópico de gluconato de clorexi- tos dotados de alta capacidade absortiva. É
dina 4% emulsão ou solução aquosa a 1%.1,3 essencial lançar mão desse tipo de produto,
A aplicação, na ferida, de curativos de porque o paciente que passa pela experiên-
carvão ativado, que tem a propriedade de ab- cia de sujar as roupas ou a cama de maneira
sorver o mau cheiro, pode ser de boa utilida- inesperada pode ter o aspecto psicológico
de. É de bom tom evitar a troca dos curativos fortemente abalado.1,3
junto aos horários das refeições. Além disso, Além disso, deve-se atentar sempre para a
uma cesta com carvão ativado pode ser co- proteção da pele adjacente, uma vez que esta
locada sob a cama do paciente para ocultar pode estar fragilizada. Se a quantidade de ex-
o odor. Essências de hortelã ou outros pro- sudato é tanta a ponto de exigir trocas muito
dutos com propriedades de aromaterapia, frequentes do curativo, uma bolsa coletora
tais como vinagre, baunilha e grãos de café, pode ser colocada para ajudar no controle
também podem ajudar. Tomar cuidado para dessa desagradável complicação.1,2
não misturar diversas fragrâncias e provocar
náuseas no paciente.1,3 Hemorragia
Caso haja sinais de sepse ou no caso de O tecido em uma ferida maligna pode
odor extremamente forte e nauseante, a an- ser muito friável e sangrar com qualquer
tibioticoterapia deve ser aplicada preferen- tipo de manipulação, ainda que esta seja
cialmente por via parenteral. Para tanto, mínima. Além disso, pacientes com cân-
o médico que assiste o doente precisa estar cer podem apresentar distúrbios da crase
atento para a diferenciação entre infecção e sanguínea secundários ao tratamento ou à
colonização e para a real necessidade da anti- própria doença, o que aumenta o risco de
bioticoterapia sistêmica, em função do risco sangramento.1
de expor o doente a possíveis efeitos colate- Todo cuidado é pouco na hora de remo-
rais das drogas e à possibilidade de seleção de ver um curativo. Utilizar técnicas de retira-
germes multirresistentes.1 da adequadas e delicadas ajuda a prevenir o
dano.3 Também é indicado irrigar o curati-
Infecção e exsudato vo com solução salina morna a fim de evitar
Feridas não cicatrizadas são uma porta aderências no sítio ou na superfície e bordas
de entrada para a colonização por microor- da lesão. Contraindica-se, nesse caso, o uso
ganismos. A colonização, por si só, não pre- de óleos essenciais, como os triglicérides de
judica o processo de cicatrização. Por outro cadeia média (TCM), devido à sua proprie-
lado, quando há infecção, esse processo fica dade de estimular a neoangiogênese.1,2,3
prejudicado e a lesão pode ter um aspecto Em caso de sangramento ativo, a primei-
endurado ou eritematoso e pode haver dor, ra medida consiste em aplicar uma pequena
saída de exsudato purulento, febre e leuco- pressão com amparo de gaze, compressa ou
grama alterado.1 toalha (evitar a de cor branca) por 10 a 15
Para tratar a maior parte dos quadros minutos. Aplicação de soro fisiológico gelado
infecciosos, antimicrobianos tópicos geral- também pode ser útil. Curativos hemostá-

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Capítulo 12 - Feridas neoplásicas e úlceras por pressão: manejo em Cuidados Paliativos

ticos, como o alginato, são os preferidos. Se, importante distinguir entre dor nociceptiva e
apesar das medidas citadas, ainda não estiver dor neuropática, uma vez que o tratamento é
resolvido, pode-se aplicar gazes embebidas em totalmente diferente para cada uma.1
solução de epinefrina 1:1000, porém o efeito O manejo desse sintoma deve ser moni-
vasoconstritor da adrenalina pode causar ne- torado diariamente pela aplicação da ESAS
crose quando usado inadequadamente.1,2,3 (Edmonton Symptom Assessment Scale) e/ou
Medidas mais agressivas podem ser ne- da EVA (Escala Visual Analógica), quando
cessárias em pacientes com sangramento o paciente é capaz de responder, ou deve ser
intenso. Dependendo do perfil funcional do suspeitado quando há sinais indiretos de dor,
doente, essas medidas podem incluir antifi- tais como face de dor, taquicardia e taquip-
brinolítico, radioterapia, quimioterapia, em- neia, hipertensão arterial, inquietação, entre
bolização dos vasos que sangram e interven- outros. É assim que o médico reavalia diaria-
ção cirúrgica.1 mente a necessidade de alteração do esquema
Se um sangramento considerável acomete analgésico prescrito 5.
o doente na fase final da vida, usar toalhas Uma ferida neoplásica pode doer por aco-
de coloração escura para cobrir o foco reduz metimento de nervos, pela exposição de termi-
o impacto da cena e, consequentemente, a nações nervosas, por isquemia ou pela própria
ansiedade da equipe e familiares. Em último equipe de saúde quando esta emprega técnicas
caso, quando não atingimos o controle da si- inadequadas nos cuidados com a lesão. Por esse
tuação, apesar de tudo que foi tentado, a se- motivo, os profissionais da área devem sempre
dação paliativa está indicada.3,5 empregar técnica cautelosa, evitando esfregar o
leito ulceroso e retirando os adesivos cuidado-
Prurido samente após umedecê-los. Administrar anal-
As feridas cutâneas malignas podem ser gésicos apropriados antes de montar o curativo
extremamente pruriginosas. Inicialmente, ou de realizar um debridamento também é
é preciso investigar se a causa do prurido é muito importante.3
decorrente de produtos utilizados no cura- Já o tratamento farmacológico segue basica-
tivo, de efeitos colaterais de opioides, da mente a escada analgésica proposta pela OMS.
presença de escabiose ou candidíase, xero- A aplicação de gel anestésico (lidocaína 4%) so-
dermia, radio e quimioterapia ou causas sis- bre o leito da ferida pode ser considerada com
têmicas, como uremia. Uma vez descartadas o objetivo de complementar a terapia. Quando
essas possibilidades e, sendo o prurido atri- a dor apresentar características de neuropática,
buído à atividade do tumor, essa sensação medicações apropriadas, tais como anticonvul-
geralmente é pouco responsiva ao uso de sivantes e antidepressivos, deverão fazer parte
anti-histamínicos.2,3,5 do esquema analgésico.3,5
Como alternativas, podem ser aplicados Terapias não-farmacológicas, como
curativos de hidrogel resfriados, ou cremes à técnicas de relaxamento, musicoterapia e
base de calêndula 2 a 3 vezes ao dia. Consi- massagem, ajudam a reduzir a ansiedade
derar o uso de dexametasona pomada 0,1% do paciente e desviam a atenção da dor
no local ou a necessidade de terapia sistêmica causada pela ferida para outro foco. Além
nos casos persistentes.3,5 disso, outras terapêuticas complementa-
res, entre elas a acupuntura e até a hipno-
Dor se, podem ajudar no controle do estímulo
Há vários tipos de dor associados às fe- doloroso.5
ridas malignas. O manejo desse sintoma de-
pende fundamentalmente da identificação de Orientações e apoio emocional
qual receptor é o responsável pelo estímulo ao paciente e seu cuidador
doloroso. Somente assim a analgesia mais ade- As mesmas orientações fornecidas a pa-
quada poderá ser prescrita. É particularmente cientes portadores de feridas não-malignas

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Capítulo 12 - Feridas neoplásicas e úlceras por pressão: manejo em Cuidados Paliativos

devem ser passadas àqueles que possuem le- quantidade de água, na força do tecido elás-
sões cutâneas neoplásicas, bem como a seus tico e na integridade da junção dermoepidér-
cuidadores. Técnicas de lavagem das mãos, mica. Além disso, há atrofia das glândulas se-
assepsia, troca de curativos, controle de odor báceas, que deixa a pele seca e sem lubrifica-
e sangramento e estratégias de manejo da dor ção, e maior fragilidade dos pequenos vasos
precisam ser ensinadas e reforçadas.1,3 cutâneos. Todos esses fatores comprometem
O foco sobre o aspecto psicológico tam- a integridade da pele, facilitando a formação
bém não pode faltar. A localização, a apa- de úlceras por pressão.6
rência ou o odor da ferida podem ser causa As taxas de prevalência variam conside-
de vergonha e estresse para o doente e sua ravelmente nos diferentes estudos, devido à
família. Os pacientes podem ser isolar, tor- heterogeneidade das populações e serviços
nando-se deprimidos, e desenvolver pro- de saúde avaliados. A prevalência em pacien-
blemas de relacionamento com familiares tes hospitalizados varia de 3% a 11%, em in-
e amigos. Já os cuidadores podem sentir divíduos de instituições de longa permanên-
medo de fornecer os cuidados necessários e cia gira em torno de 10% a 25%, em pacientes
apresentar a sensação de que não estão con- recebendo atendimento em domicílio vai de
seguindo ajudar.4 7% a 12% e em hospices, de 14% a 28%. 6,8
A equipe de saúde, por sua vez, pode fa- As localizações mais comuns das úlce-
cilitar o relacionamento entre pacientes e ras por pressão correspondem às regiões de
cuidadores ao definir os objetivos reais do proeminências ósseas e áreas com quantida-
tratamento e ao discutir abertamente assun- de reduzida de tecido adiposo subcutâneo.7 O
tos-chave, como, por exemplo, o odor desa- local mais comum é a região sacra (60% de
gradável e o que fazer para controlá-lo. Além todas as úlceras). As tuberosidades isquiáti-
disso, ter o cuidado de montar um curativo cas, o grande trocanter e o calcanhar, juntos,
simétrico e esteticamente aceitável pode aju- colaboram com 15% dos casos. Outras áreas
dar o doente a lidar com o sentimento de ter
o corpo mutilado.1
Ao assistir o paciente e seu cuidador nas Tabela 12.1 - Fatores de risco para o desenvolvimen-
to de úlceras por pressão
principais complicações da lesão, consegui-
mos melhorar a vida dessas pessoas e contri- Fatores intrínsicos Fatores extrínsicos
buir para o bem-estar psicológico de todos. Imobilidade Pressão
Reavaliações frequentes da ferida e da tera- Alteração de sensibilidade
Fricção
pêutica constituem medida essencial na ma- da pele
nutenção da qualidade de vida dos portado- Incontinência urinária
Cisalhamento
res de feridas neoplásicas malignas.1 ou fecal
Alteração do nível de
Umidade excessiva
consciência
ÚLCERAS POR PRESSÃO
Medicações sedativas ou
Introdução Alteração cognitiva
hipnóticas
Define-se úlcera por pressão como uma
Idade avançada
área de lesão de pele, tecidos subjacentes, ou
Doença aguda
ambos, decorrente de pressão extrínsica apli-
cada sobre a superfície corpórea (e que persiste Doença crônica grave

mesmo depois de removida a pressão sobre o Estado terminal

local). Pressões maiores que 32 mmHg aplica- Comprometimento


circulatório
das sobre a pele por período maior que 2 horas
são necessárias para o seu desenvolvimento.6 Deficiência nutricional

Aproximadamente 70% dessas lesões Desidratação

ocorrem na população geriátrica.7 A pele Ocorrência prévia de


úlceras por pressão
desses indivíduos apresenta uma redução na

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Capítulo 12 - Feridas neoplásicas e úlceras por pressão: manejo em Cuidados Paliativos

Quadro 12.2 - Classificação atualizada das Úlceras por pressão:


Pele intacta com hiperemia de uma área localizada que não esbranquece, geralmente sobre proeminência
óssea. A pele de cor escura pode não apresentar esbranquecimento visível: sua cor pode diferir da pele ao
Estágio I redor. Descrição adicional: A área pode apresentar-se dolorosa, endurecida, amolecida, mais quente ou mais
fria comparativamente ao tecido adjacente. Feridas em estágio I podem ser difíceis de detectar em pessoas
de pele com tonalidades escuras. Pode indicar pessoas “em risco” (um sinal precursor de risco).
Perda parcial da espessura dérmica. Apresenta-se como úlcera superficial com o leito de coloração vermelho
pálida, sem esfacelo. Pode apresentar-se ainda como uma bolha (preenchida com exsudato seroso), intacta ou
Estágio II aberta/ rompida. Descrição adicional: Apresenta-se como uma úlcera superficial brilhante ou seca sem esfa-
celo ou arroxeamento (aspecto de equimose)*. Este estágio não deve ser usado para descrever skin tears, abra-
sões por adesivos, dermatite perineal, maceração ou escoriação. * indica suspeita de lesão tissular profunda.
Perda de tecido em sua espessura total. A gordura subcutânea pode estar visível, sem exposição de osso,
tendão ou músculo. Esfacelo pode estar presente sem prejudicar a identificação da profundidade da perda
tissular. Pode incluir descolamento e túneis. Descrição adicional: A profundidade da úlcera por pressão em
Estágio III estágio III varia conforme a localização anatômica. A asa do nariz, orelha, as regiões occipital e maleolar não
possuem tecido subcutâneo e, portanto, as úlceras podem ser rasas neste estágio. Em contraste, áreas com
adiposidade significativa podem desenvolver úlceras por pressão em estágio III bastante profundas. Ossos e
tendões não são visíveis nem diretamente palpáveis.
Perda total de tecido com exposição óssea, de músculo ou tendão. Pode haver presença de esfacelo ou esca-
ra em algumas partes do leito da ferida. Frequentemente, inclui descolamento e túneis. Descrição adicional:
A profundidade da úlcera por pressão em estágio IV varia conforme a localização anatômica. A asa do nariz,
Estágio IV orelha, as regiões occipital e maleolar não possuem tecido subcutâneo e, portanto, as úlceras podem ser
rasas neste estágio. As úlceras em estágio IV podem estender-se aos músculos e/ou estruturas de suporte
(como fáscia, tendão ou cápsula articular), possibilitando a ocorrência de osteomielite. A exposição de osso/
tendão é visível ou diretamente palpável.
A seguir estão descritas outras duas categorias que as UPs podem se apresentar:
• Suspeita de lesão tissular profunda: Área localizada de pele intacta de coloração púrpura ou castanha ou bolha sangui-
nolenta devidas a dano no tecido mole, decorrente de pressão e/ou cisalhamento. A área pode ser precedida por um
tecido que se apresenta dolorido, endurecido, amolecido, esponjoso e mais quente ou frio comparativamente ao tecido
adjacente. Descrição adicional: Lesão tissular profunda pode ser de difícil detecção em indivíduos com pele de tonali-
dades mais escuras. A sua evolução pode incluir uma pequena bolha sobre o leito escurecido da ferida. A lesão pode
evoluir e ficar coberta por uma fina escara. A evolução pode ser rápida com exposição de camadas tissulares adicionais
mesmo com tratamento adequado.
• Úlceras que não podem ser classificadas: Lesão com perda total de tecido, na qual a base da úlcera está coberta por
esfacelo (amarelo, marrom, cinza, esverdeado ou castanho) e/ou há escara (marrom, castanha ou negra) no leito da
lesão. Descrição adicional: A verdadeira profundidade e, portanto, o estágio da úlcera não pode ser determinado até que
suficiente esfacelo e/ou escara sejam removidos para expor a base da úlcera. Escara estável (seca, aderente, intacta,
sem eritema ou flutuação) nos calcâneos serve como “cobertura natural (biológica) corporal” e não deve ser removido.

que podem ser envolvidas são o cotovelo, joe- Alguns autores ainda dividem os fatores
lho, tornozelo e a região occipital.6 de risco em intrínsicos e extrínsicos (Tabela
O impacto dessas lesões em termos de 12.1). Os fatores intrínsicos incluem as con-
qualidade de vida, morbidade, mortalidade dições individuais predisponentes às lesões,
e custo de tratamento é bastante importan- enquanto os fatores extrínsicos seriam aque-
te. Desta forma, a abordagem das úlceras por les relacionados a condições externas desfa-
pressão deve constituir tópico essencial no voráveis à integridade cutânea.6
planejamento de ações nos diversos tipos de
serviços de saúde, em especial nas institui-
ções de longa permanência e hospices.6,8

Fatores de risco
O principal fator de risco é a imobilidade.
Porém, existem outros fatores de risco im-
Figura 12.1 - Classificação NPUAP para úlceras por pressão
portantes, entre eles: idade avançada, incon- (da esquerda para a direita, graus 1, 2, 3 e 4. Na extrema
tinência urinária ou fecal, alteração do nível direita, uma úlcera com necrose e, portanto, não classificável
pela NPUAP)
de consciência e desnutrição.6

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Capítulo 12 - Feridas neoplásicas e úlceras por pressão: manejo em Cuidados Paliativos

Classificação uma ideia errada de que a progressão da fe-


A classificação habitualmente adotada rida ocorre sempre da epiderme em direção
para as úlceras por pressão é a NPUAP (Na- ao subcutâneo e tecidos moles profundos.
tional Pressure Ulcer Advisory Panel), a qual Sabe-se que a lesão da epiderme pode ocor-
se baseia na profundidade do acometimento rer tardiamente, pois as células desse tecido
e nos limites entre tecidos lesados. Em 2007 suportam um período mais prolongado de
essa classificação foi melhor detlhadada hipoxia dos que as células dos tecidos mais
(Quadro 12.2):14 profundos tanto in vivo como in vitro.6,7
Essa classificação não deve ser aplicada,
portanto, em lesões com necrose, uma vez Tratamento
que esta impede a real percepção da pro- A prevenção é certamente o aspecto mais
fundidade da úlcera. É importante ressaltar, importante na abordagem das úlceras por pres-
no entanto, que a NPUAP pode conduzir a são. Mas, infelizmente, nem todas as lesões são

Tabela 12.2 - Aspectos envolvidos no tratamento das úlceras por pressão


Etapas Descrição
Aspecto mais importante.
Utilizar travesseiros, coxins de espuma ou outros materiais sob as proeminências ósseas.
Reposicionar o paciente a intervalos máximos de 2 horas.
Educar os indivíduos envolvidos nos cuidados com o doente.
Prevenção Evitar cabeceira elevada além de 30 graus.
Evitar uso de almofadas em forma de anel
Usar colchão de espuma viscoelastica ou mais sofisticados (pressão reduzida constante ou “ar fluidificado”,
pressão alternante).
Hidratar a pele e limpá-la após contato com irritantes, como fezes e urina.
Limpeza (remover tecido desvitalizado e fibrina em excesso) através de irrigação com solução salina
isotônica. Não efetuar extração mecânica com gaze, pois tecido viável também é retirado, o que prejudica a
cicatrização.
Manejo da
Curativos apropriados para cada tipo de ferida (ver adiante).
ferida
Evitar ambiente excessivamente úmido ou extremamente seco.
Evitar contato da úlcera com fezes ou urina.
Cuidados com a pele adjacente, que deve ser mantida lubrificada (evita fricção).
Consiste na remoção de tecido necrótico da lesão. Pode ser:
a. Cirúrgico: envolve o uso de bisturi. Indicado quando há sepse, necrose extensa ou espessa.
b. Mecânico não-cirúrgico: uso de solução salina isotônica, em forma de jato, para retirar tecido necrótico
solto ou exsudato excessivo.
c. Químico enzimático: aplicação de enzimas proteolíticas (colagenase, papaína 2% a 10%, fibrinolisina e
Debridamento
desoxirribonuclease).
d. Autolítico: usa curativos oclusivos ou semi-oclusivos, que permitem a degradação da necrose pelos
fluidos da própria lesão, ricos em células inflamatórias e enzimas. Indicado para úlceras superficiais, com
pouco exsudato e sem sinais de infecção.
e. Uso de larvas estéreis de moscas, que secretam enzimas proteolíticas.
Garantir aporte nutricional adequado, particularmente suplementos hiperproteicos, em pacientes sob
risco, a fim de prevenir a formação de úlceras por pressão.
Após instalação da ferida, o suporte nutricional deve ser individualizado. No contexto de doença grave,
como o Alzheimer avançado, não há evidência de que a nutrição enteral ou parenteral seja benéfica.
Nutrição
Dosagens séricas de albumina e da contagem de linfócitos podem ser obtidas, pois são marcadores de
desnutrição.
Não há evidências de suplementar micronutrientes (vitamina C, zinco) em pacientes que não apresentam
deficiência desses componentes.
Proteger a lesão com curativos adequados.
Odor forte, mudanças na quantidade ou aspecto do exsudato, hipergranulação e hiperemia ou calor na
Controle de pele adjacente podem ser sinais de infecção.
infecção Via de administração dos antibióticos deve ser escolhida conforme avaliação clínica.
Descartar osteomielite em úlceras com exposição óssea de difícil cicatrização.
Vale lembrar que padrão ouro diagnóstico é a biopsia de tecido para cultura
Controlar fatores locais, tais como infecção e isquemia.
Manejo da dor Usar analgésicos opioides, se necessário.
Aplicar doses de resgate antes da troca do curativo e do debridamento.

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Capítulo 12 - Feridas neoplásicas e úlceras por pressão: manejo em Cuidados Paliativos

preveníveis, em especial nos indivíduos com determinada área. Exemplos de superfícies


doença avançada.7 dinâmicas incluem sofisticados sistemas de
Medidas preventivas importantes incluem alternância de pressão, de pressão reduzida
reposicionar o doente a intervalos programa- constante e de “ar fluidificado”.6,7
dos e mantê-lo bem nutrido, além de hidratar Os sistemas dinâmicos apresentam me-
sua pele e evitar o contato prolongado com lhores evidências em relação aos colchões
fezes e urina. Não é indicado posicionar o convencionais tanto na prevenção como na
paciente diretamente sobre as proeminências cicatrização de úlceras por pressão. Por outro
ósseas, devendo-se utilizar travesseiros, co- lado, quando comparamos as diversas super-
xins de espuma ou outros materiais entre as fícies dinâmicas entre si, não há evidência de
áreas de sobrecarga e o leito.7 uma ser melhor que a outra em matéria de
Não é recomendado o uso de almofadas em prevenção, porém, uma vez já instalada a le-
forma de anel, pois privam de circulação a área são, o sistema de “ar fluidificado” parece ser
da pele que fica comprimida em seu centro. mais eficaz que os outros.6
Também não devem ser usadas luvas preenchi- Outras etapas do tratamento das úlceras
das com água, pois são ineficazes para garantir por pressão incluem o manejo da ferida, o de-
redistribuição pressórica.6 bridamento (quando necessário), a avaliação do
Além dos cuidados de posicionamento aspecto nutricional do doente, o controle de in-
e mudança de decúbito, o uso de colchões fecção e o manejo da dor (Tabela 12.2). 6
e superfícies de suporte especiais, que re-
distribuem a pressão sobre a pele e o tecido Tipos de curativos
subcutâneo, faz parte das estratégias de pre- A finalidade dos curativos, além da
venção. Essas superfícies podem ser estáti- proteção da ferida, é promover um ambien-
cas ou dinâmicas. As dinâmicas alternam te que favoreça a cicatrização. Ao se reali-
mecanicamente a pressão sob o paciente, zar um curativo, uma regra básica deve ser
melhorando, assim, a circulação daquela seguida: manter o leito da úlcera continua-

Tabela 12.3 - Tipos de curativos


Tipos Características
Polissacáride natural proveniente de algas marinhas.
Alta capacidade absortiva.
Indicado para lesões infectadas ou com exsudato em moderada a grande quantidade.
Alginato de cálcio
Possui também características hemostáticas, podendo ser usado em feridas com sangramento ou em
pós-operatório.
Não deve permanecer na ferida por mais de 7 dias.
Compostas de poliuretano.
Indicadas para feridas com bastante exsudato.
Espumas
Sua flexibilidade permite o encaixe em úlceras de qualquer tamanho e profundidade.
Pode permanecer na ferida por mais de 7 dias.
Altamente absortivas, também possui propriedades hemostáticas.
Hidrofibras Úteis em lesões com moderada a grande quantidade de exsudato.
Pode permanecer na ferida por mais de 7 dias.
Compostos de poliuretano, são filmes adesivos.
Filmes
Não tem a capacidade de absorver muito exsudato.
transparentes
Úteis em feridas superficiais (estágio 2), não secretivas ou nos estágios mais avançados de cicatrização.
Feitos de carboximetilcelulose, hidratam a lesão e promovem debridamento autolítico.
Indicados para feridas secas ou com pouco exsudato.
Hidrocoloides Não recomendados para lesões infectadas.
Podem deixar odor forte após a retirada, sendo necessário reavaliar a ferida após limpeza.
Trocar a cada 2 a 7 dias.
Constituído por polímeros hidrofílicos, hidrata e promove autólise.
Hidrogel Uso em lesões secas ou com pouco exsudato.
Deve ser trocado a cada 24 a 72 horas.

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Capítulo 12 - Feridas neoplásicas e úlceras por pressão: manejo em Cuidados Paliativos

mente úmido e a pele sadia na periferia da Manual de Cuidados Paliativos. Academia


lesão seca.6,7 Nacional de Cuidados Paliativos. Primeira
Um curativo ideal, além de proporcionar Edição. Rio de Janeiro: Diagraphic. 2009.
um ambiente úmido na ferida e protegê-la de p.258-268.
contaminação e traumas, deveria remover 4. NAYLOR WA. A guide to wound mana-
tecido necrótico e absorver secreções, pro- gement in palliative care. International
porcionar conforto ao paciente e aliviar a dor, Journal of Palliative Nursing. 2005. 11(11):
além de ser atóxico, hipoalergênico, hemostá- 572-579.
5. FIRMINO F, PEREIRA I. Tratamento de
tico, ser de fácil aplicação e ter custo acessível.7
Feridas. In: Cuidado Paliativo. Publicação
Existe no mercado uma enorme varie-
do Conselho Regional de Medicina do Es-
dade de produtos de aplicação tópica, dis-
tado de São Paulo (Cremesp). São Paulo.
poníveis nas mais diversas formas (placas,
2008. p.283-307.
filmes, pomadas), para o tratamento de úl- 6. M ARINI MFV. Úlceras de Pressão. In:
ceras por pressão, com diferentes caracte- Freitas EV, Py L, Cançado FAX, et al. Tra-
rísticas. Os principais grupos de produtos tado de Geriatria e Gerontologia. Segunda
e suas características estão relacionados na edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan.
tabela 12.3.6,7,8,9,10,11 2006. p.981-991.
7. GIST S, TIO-MATOS I, FALZGRAF S, ET
Terapias adjuvantes AL. Wound care in the geriatric client. Cli-
Apesar do uso de técnicas apropriadas de nical Interventions in Aging. 2009. 4:269-
tratamento, existem úlceras que não cicatri- 287.
zam. Várias terapias adjuvantes (estimulação 8.BATES-JENSEN BM. Pressure Ulcers. In:
elétrica, terapia por pressão negativa, ultra- Halter JB, Ouslander JG, Tinetti ME, et al.
som, terapia hiperbárica, aplicação de fatores Hazzard’s Geriatric Medicine and Geron-
estimuladores de crescimento na ferida, uso tology. Sixth edition. United States of Ame-
de laser, luz infravermelha ou ultravioleta) rica: McGraw-Hill. 2009. p.703-715.
tem sido estudadas. Porém, suas indicações 9. NAYLOR W. Guidelines for Wound Ma-
na terapia das úlceras por pressão de difícil nagement in Palliative Care. New Zealand:
cicatrização continuam incertas, havendo, Mercy Hospice Auckland (formely St Jose-
portanto, necessidade de maiores estudos ph’s Mercy Hospice). 2005. p.2-69.
neste momento.12 10. BANSAL C, SCOTT R, STEWART D, ET
AL. Decubitus ulcers: A review of the lite-
rature. International Journal of Dermato-
REFERÊNCIAS
logy. 2005. 44:805-810.
1. 
SEAMAN S. Management of Malignant
11. R ENDIC E, ALDEA V. Manejo Avanzado
Fungating Wounds in Advanced Can-
de Heridas. Rev Chilena Dermatol. 2008.
cer. Seminars in Oncology Nursing. 2006.
24(4):322-327.
22(3):185-193.
12. BERLOWITZ D. Treatment of pressure
2. FIRMINO F. Pacientes portadores de feri-
ulcers. Disponível em: UpToDate.
das neoplásicas em Serviços de Cuidados
13. POLETTI ET AL. Feridas Malignas. Re-
Paliativos: contribuições para a elaboração
vista Brasileira de Cancerologia. 2002.
de protocolos de intervenções de enferma-
48(3):411-417.
gem. Revista Brasileira de Cancerologia.
14. SANTOS VLCG, CALIRI MHL. Conceito
2005. 51(4):347-359.
e classificação de úlcera por pressão: atua-
3. 
CAMARÃO RR. Cuidados com feridas
lização do NPUAP. Tradução São Paulo:
e curativos. In: Carvalho RT, Bartz CD.
Revista Estima. 2007.

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Parte 2
Controle dos sintomas em Cuidados Paliativos

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Dor em Cuidados Paliativos 13
CAPÍTULO

Ana Laura de Figueiredo Bersani


Niele Silva de Moraes

INTRODUÇÃO ser explicado por inadequado conhecimen-


A dor é o sintoma mais frequente em pa- to sobre dor e seu tratamento, preocupação
cientes em Cuidados Paliativos, acarretando excessiva com os possíveis efeitos colaterais
grande sofrimento e influência negativa na dos medicamentos utilizados, insegurança
qualidade de vida. É um problema comum e dos pacientes e familiares e falta de conhe-
debilitante nos idosos, sendo geralmente tra- cimento e experiência dos médicos quanto
tada de forma deficiente.1,2,3 ao uso correto de opioides. 6,7
Dentre as principais causas de dor crôni- Em idosos e em pacientes com demência,
ca no idoso, destacam-se doenças osteoar- o diagnóstico e tratamento da dor represen-
ticulares (principalmente as degenerativas), tam um grande desafio, devido a maior di-
consequências da osteoporose, fraturas, ficuldade de sua avaliação. Em doentes com
doença vascular periférica, neuropatia dia- cardiopatias, doenças pulmonares ou neuro-
bética, neuralgia pós-herpética, síndrome lógicas avançadas, a presença de dor é muitas
dolorosa pós-AVE, dor do membro fan- vezes negligenciada.
tasma, polimialgia reumática, lombalgias,
desordens músculoesqueléticas, quaisquer DOR TOTAL
condições com prejuízo de mobilidade e Pacientes com doenças graves e fora de
doenças neoplásicas. 2-6 possibilidades reais de cura enfrentam gran-
A dor é o principal sintoma relacionado de sofrimento. O processo de adoecer, nes-
ao câncer e é o mais temido pelos pacien- ses pacientes, não causa somente a dor física,
tes e familiares. Está presente em 50% a causa também a dor emocional, social e es-
75% dos pacientes oncológicos em estágios piritual, relacionada à consciência da fragili-
avançados, sendo, na maioria das vezes, de dade humana e proximidade da morte. Este
moderada a forte intensidade. Em cerca de é o significado de dor total, introduzido pela
90% dos casos, a dor é passível de controle médica inglesa Cicely Saunders, na década
com medidas relativamente simples. Ape- de 1960, e que abrange vários componentes:
sar disso, ainda hoje, aproximadamente físico (dano tissular, compressão nervosa),
25% dos pacientes com câncer morrem com emocional (depressão, insônia, disfigura-
dor não controlada, o que, em parte, pode ção, fadiga crônica), social (perda da posição

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Capítulo 13 - Dor em Cuidados Paliativos

social, problemas econômicos) e espiritual sa e o seu impacto na afetividade e na fun-


(sentimento de culpa e insegurança perante cionalidade. Na avaliação de pacientes com
a morte).8,9,10 dificuldade de expressão, como aqueles com
Qualquer doente em fase terminal sem síndrome demencial, seus cuidadores devem
possibilidade curativa está sujeito a apresen- ser entrevistados.
tar dor total, devendo ser abordado de forma Para a avaliação da intensidade dolorosa,
ampla, com atuação de uma equipe multidis- dentre alguns instrumentos unidimensio-
ciplinar, composta por médicos, fisioterapeu- nais os mais utilizados são: escala de descri-
tas, enfermeiros, assistentes sociais, terapeu- ção verbal, escala numérica verbal, escala nu-
tas ocupacionais, psicólogos e religiosos.8,9,10 mérica visual, escala analógica visual e escala
Neste contexto, surgem os Cuidados Pa- de faces, descritas abaixo: 14,15,16
liativos, definidos pela Organização Mundial • Escala de descrição verbal (4 pontos) – É
de Saúde (OMS) como o cuidado ativo e total uma escala com quatro descritores verbais
nas doenças que não respondem ao trata- indicando diferentes magnitudes da intensi-
mento curativo e tem como meta melhorar dade da dor percebida. A intensidade 0 repre-
a qualidade de vida para os pacientes e seus senta “nenhuma dor”, a intensidade 1 signifi-
familiares, proporcionando controle dos sin- ca “dor leve”, a intensidade 2 “ dor modera-
tomas físicos e dos problemas psicológicos, da” e a intensidade 3 significa “dor severa”.
sociais e espirituais.1, 8,9,10 • Escala numérica verbal (0-10) - O paciente
estima sua dor numa escala de 0 a 10, com
ABORDAGEM DA DOR EM CUIDADOS 0 representando “nenhuma dor” e 10 indi-
PALIATIVOS cando “a pior dor imaginável”. A mensura-
O alívio da dor e de outros sintomas es- ção é feita verbalmente.
tressantes constitui um dos princípios mais • Escala numérica visual (0-10) - A men-
importantes dos Cuidados Paliativos. Por ser suração da dor é mostrada numa escala
uma experiência individual, que pode cau- numérica de 0 a 10, com 0 representando
sar profundo impacto na qualidade de vida, “nenhuma dor” e 10 indicando “a pior dor
qualquer queixa álgica deve ser devidamente imaginável”.
valorizada para que seja corretamente trata- • Escala analógica visual (EVA) – Consiste
da e evite sofrimento desnecessário.3,4,10 em uma linha de 10 cm, com âncoras em
Determinados pacientes, como os idosos ambas as extremidades, onde são coloca-
demenciados, têm dificuldade de comuni-
cação e não conseguem queixar-se de dor,
podendo apresentar somente manifestações
indiretas de sua presença, como taquicardia,
hipertensão, alterações do humor, gemência,
inquietação, delirium ou mudanças súbitas
de comportamento. Muitos desses indiví-
duos expressam a dor somente através do
isolamento social, confusão ou apatia. Sendo
assim, os profissionais de saúde e familiares Figura 13.1 - Escalas numéricas e visual analógica de dor

devem estar sensibilizados para identificar a


ocorrência de dor quando não manifestada
de forma explícita.11,12,13
Para o correto tratamento da dor em
Cuidados Paliativos, é necessário valorizar
a queixa do doente, avaliando-se cuidado-
samente a dor e suas dimensões, para que se
consiga definir o seu tipo, identificar sua cau- Figura 13.2 - Escala de faces do adulto17,18

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Capítulo 13 - Dor em Cuidados Paliativos

dos os descritores verbais “sem dor” e “dor tante para a compreensão do idoso com dor,
insuportável”. O paciente deve marcar um uma vez que a experiência dolorosa pode re-
ponto que indique a magnitude de sua dor sultar em depressão, ansiedade e isolamento
e uma régua de 0-100mm é utilizada para social e a abordagem destes fatores pode auxi-
quantificar a mensuração. liar no controle da dor.
• Escala de faces de dor – A escala de faces Durante o exame físico, deve ser realiza-
de Bieri e cols. utilizada inicialmente para da avaliação cuidadosa, com atenção espe-
crianças, foi adaptada e validada para ido- cial para a identificação de déficit sensorial,
sos caucasianos. Mostra-se para o paciente espasmos musculares, deformidades, con-
uma série de faces que representam pro- traturas, rigidez, sinais de neuropatia auto-
gressivamente os níveis de angústia que a nômica, presença de sinais flogísticos e de
dor leva e pede-se que o paciente escolha a úlceras por pressão.
que melhor expressa sua dor.17,18
Instrumentos multidimensionais forne- CARACTERIZAÇÃO DOS TIPOS
cem mais informações que as escalas uni- DE DOR CRÔNICA
dimensionais, porém são de aplicação mais É muito importante identificar o tipo e a
demorada. Como a dor crônica afeta o indi- causa da dor para que se possa fazer a me-
víduo em vários aspectos, muitos especia- lhor opção terapêutica e alcançar seu contro-
listas consideram essencial o uso de instru- le adequado.
mentos multidimensionais para apropriada
avaliação da dor.19,20 ABORDAGEM TERAPÊUTICA
• Inventário breve da dor (Brief Pain Inven-
tory – BPI) – questionário curto, prático, Tratamento não farmacológico
auto administrado validado em muitas lín- É de extrema importância a abordagem
guas para avaliação da dor oncológica e não multidisciplinar para tratamento da dor, visto
oncológica. Avalia localização e padrão da que é um sintoma com caráter multidimen-
dor, assim como crenças do paciente e im- sional, devendo ser abordada nos âmbitos físi-
pacto da dor na sua qualidade de vida. co, psíquico, social e religioso.3,4,5,6
• Versão curta revisada do questionário de dor Os recursos não-farmacológicos têm como
de McGill (SF-MPQ-2) – inclui seleção de pa- vantagens: o baixo custo de aplicação, o fato
lavras para caracterização das qualidades da de serem técnicas não invasivas que apresen-
dor, escala de intensidade da dor, localização tam pouco ou nenhum efeito colateral e, além
da dor, perguntas sobre uso de medicações disso, o fato de poderem ser utilizados de for-
analgésicas, experiência prévia de dor.19 ma coadjuvante à terapia farmacológica.3,22
• Questionário de Dor no Idoso (Geriatric São exemplos de terapia não farmacológi-
Pain Measure - GPM) – Avalia a dor e seu ca com enfoque multidisciplinar:22
impacto nos componentes afetivo, cogniti- • Terapia educacional: com informações
vo comportamental, nas atividades diárias sobre a causa e manejo da dor.
e, principalmente, na qualidade de vida. É • Reabilitação fisioterapêutica: o fisiote-
de fácil aplicabilidade e compreensão para rapeuta poderá atuar na diminuição da
uso na população idosa. Já foi traduzido e dor e do espasmo muscular, orientação
adaptado transculturalmente para o Brasil postural, melhora da funcionalidade e
e, atualmente, encontra-se em fase de apli- do condicionamento físico.
cabilidade para idosos (Disciplina de Ge- • Medidas físicas: Os agentes físicos li-
riatria e Gerontologia da UNIFESP/ EPM). beram energia de ação terapêutica lo-
Quanto maior a sua pontuação (mais pró- cal e sistêmica.
xima de 100), maior é o impacto da dor na O calor reduz a dor, a rigidez articular e
vida do indivíduo. 20 o espasmo muscular, sendo contra-indicado
A avaliação do estado psíquico é impor- se houver falta de sensibilidade local, déficit

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Capítulo 13 - Dor em Cuidados Paliativos

Tabela 13.1 - Caracterização dos tipos de dor crônica 21 . Incluimos as dores mistas, que são as mais frequen-
temente encontradas na presença de câncer, e ainda as dores psicogênicas
Tipo de dor
Etiopatogenia Subtipos Semiologia
crônica
- Dor somática: origina-se da
estimulação de receptores da pele - Somática: bem localizada, próxima da
Origina-se da e do sistema músculo-esquelético. lesão (Ex: osteoartrose grave, fratura/
estimulação de Pode ser subdividida em músculo- metástase óssea, infiltração de tecidos
Nociceptiva nociceptores por esquelética, inflamatória ou moles)
lesão tecidual ou mecânica/compressiva. - Visceral: mal localizada, profunda (Ex:
inflamação. - Dor visceral: surge pela metástase hepática, obstrução intestinal,
estimulação de receptores cólica renal)
localizados em vísceras
- Piora com a manipulação da área afetada,
Origina-se a partir de hiperalgesia/alodínea, queimor/ardência,
lesões ou compressões choque, parestesias (Ex: neuropatia pós-
- Dor central
Neuropática de estruturas do radioterapia ou quimioterapia, radiculopatia
- Dor periférica
sistema nervoso por compressão discal, neuropatia diabética,
central ou periférico. nevralgia pós-herpética, infiltração de plexos
ou neuroeixo)
Quando presente mais
de uma síndrome
Por exemplo: neoplasia de próstata com
Mista dolorosa ao mesmo
metástase para coluna
tempo (neuro e
nociceptiva)
Psicogênica Diagnóstico frequentemente de exclusão

cognitivo, inflamação aguda, tecido fibrosado, de dor secundária a espasmos muscula-


isquemia e hemorragia local. O uso do calor res, disestesias e nevralgias.
superficial pode ser feito através de bolsas de • Relaxamento: Tem como objetivo des-
água quente, compressas e imersão da área em viar a atenção da dor, com técnicas de
água quente. A temperatura deve ser próxima respiração profunda, de distração com
de 40 a 45° C e deve ser aplicado durante 20 a pintura e música, de imaginação.
30 minutos, uma a três vezes ao dia. • Intervenção psicológica ou psiquiá-
O frio também diminui a dor, a inflama- trica para controle da experiência do-
ção e os espasmos musculares e é contra-in- lorosa. A terapia psicológica com inter-
dicado na presença de falta de sensibilidade venção de autogerenciamento ajuda a
local, déficit cognitivo, isquemia e intolerân- aumentar a capacidade do paciente de
cia ao gelo. A aplicação do frio superficial em administrar sua dor.
bolsas de água fria, imersão em água fria, • Acompanhamento religioso pode aju-
sacos de gelo ou gelo “mole” (mistura conge- dar o paciente a enfrentar esse momen-
lada de duas partes de água com uma de ál- to de grande sofrimento e trazer-lhe
cool), compressas e aerossóis são muito utili- conforto.
zadas. A temperatura deve estar em torno de As medidas não farmacológicas propor-
15° C e a duração deve ser aproximadamente cionam melhora da dor, da funcionalidade e
15 minutos, duas a três vezes ao dia. possibilitam a redução do consumo de anal-
gésicos, o que é muito importante quando se
Hidroterapia tem algumas limitações, principalmente em
• Estimulação elétrica nervosa transcutâ- idosos.3,22
nea (TENS): Ativa o sistema supressor
da dor. É contraindicada na presença TRATAMENTO FARMACOLÓGICO
de dermatite, marcapasso, implantes A Organização Mundial de Saúde
elétricos e próximo ao seio carotídeo. (OMS) estabeleceu alguns princípios para o
• Laser: alivia a dor e acelera a cica- tratamento da dor oncológica, que podem
trização. ser aplicados à dor crônica de qualquer
• Acupuntura: pode ser usada em casos natureza. De acordo com estes princípios, o

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Capítulo 13 - Dor em Cuidados Paliativos

tratamento farmacológico da dor deve ser,


preferencialmente:23
• Por via oral, sempre que possível, pro-
porcionando ao paciente maior grau de
independência e conforto;
• Pelo relógio, com administração de
doses fi xas conforme tempo de ação de
cada medicação para alívio constante
da dor;
• Pela intensidade, obedecendo a escada Figura 13.3 - Escada Analgésica da OMS23
da dor (figura 13.3);
• Para o indivíduo, considerando suas são utilizados os três degraus da escada,
necessidades e permitindo controle isso significa que uma quantidade signifi-
adequado da dor com os mínimos efei- cativa de pacientes não obtêm alívio satis-
tos adversos; fatório da dor e necessita de outras estra-
• Com atenção aos detalhes, reavalian- tégias como outras vias de administração
do frequentemente a presença e carac- de drogas, bloqueios de nervos e plexos e
terísticas da dor, adequando o trata- procedimentos intervencionistas. 3,23
mento aos hábitos e rotinas do paciente Se após início do tratamento a dor persistir
e prevenindo efeitos colaterais previsí- ou piorar, deve-se otimizar as doses dos fár-
veis dos medicamentos utilizados. macos utilizados. Se mesmo assim não ocor-
O modelo para tratamento da dor con- rer controle adequado da dor, deve-se subir
forme a sua intensidade, desenvolvido pela um degrau na escada analgésica e não prescre-
OMS, é conhecido como escada analgésica. ver outro fármaco do mesmo degrau. 3,23
De acordo com a intensidade da dor, a tera- Apesar de alguns autores defenderem o
pêutica deve ser iniciada no degrau corres- uso de opioides fortes para controle da dor
pondente com doses adequadas. O primeiro crônica leve a moderada, objetivando alcan-
degrau da escada analgésica corresponde à çar alívio mais rápido e eficaz da dor, a esca-
dor de leve intensidade, devendo ser tratada da analgésica da OMS continua sendo o mé-
com analgésicos não opioides ou antiinfla- todo mais utilizado e recomendado para tra-
matórios não hormonais (AINH). Esses me- tamento da dor oncológica. Analgesia eficaz
dicamentos podem ser utilizados também em é obtida em 70 a 90% dos pacientes tratados
associação aos opioides nos outros degraus conforme a escada da OMS. Deve-se sempre
da escada. O segundo degrau corresponde usar a droga certa, na dose certa, com o in-
à dor moderada, sendo indicado tratamento tervalo correto e pela via mais adequada para
com opiódes fracos. No terceiro degrau en- maximizar o resultado do tratamento.5,9
contra-se a dor de forte intensidade que deve
ser tratada com opioides fortes. O quarto de- Analgésicos não opioides
grau corresponde a dor de forte intensidade, São usados isoladamente para tratamen-
refratária à farmacoterapia, quando são in- to da dor leve (EVN até 4) ou associados aos
dicados procedimentos intervencionistas em opioides para tratamento da dor moderada
associação com opioides fortes. Em qualquer ou severa, possibilitando redução da dose dos
degrau e desde o início do tratamento podem opioides sem prejudicar o controle adequado
ser associados fármacos adjuvantes (anti- da dor e reduzindo seus efeitos colaterais.
convulsivantes, antidepressivos triciclicos, Apresentam efeito teto, ou seja, dose má-
neurolépticos, relaxantes musculares, dentre xima a partir da qual não é possível obter
outros) para alívio da dor (Figura 13.3).3,23 mais analgesia. Atuam na redução de me-
Aproximadamente 10 a 30 % dos pa- diadores inflamatórios sobre os nocicepto-
cientes não têm sua dor controlada quando res. Têm como principais efeitos colaterais:

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Capítulo 13 - Dor em Cuidados Paliativos

insuficiência renal ou hepática, dispepsia e nicos. Induz intensa analgesia, sem interfe-
sangramento gastrintestinal. rência no estado de consciência, coordenação
motora, no sistema respiratório ou cardíaco.
Paracetamol Além de analgésico, tem efeito antitussígeno.
Apresenta ação analgésica e antipiréti- Sua dose é de 100mg a cada 6 horas.29
ca, sem ação antiinflamatória significativa.
Seu mecanismo de ação é pouco conhecido, Flupirtina
porém presume-se que tenha ação central. É um analgésico que age no sistema ner-
É considerado um analgésico seguro, sem voso central, atuando também como rela-
efeitos colaterais significativos. Pode ser xante muscular. A dose varia de 300 a 400mg
usado na dose de 500 a 750 mg em interva- ao dia, divididos em 3 ou 4 tomadas. Sua dose
los de 6 a 8 horas, não devendo ser ultrapas- máxima é de 600mg/dia e não deve ser usado
sada a dose de 4g/dia se usado cronicamente por mais de 4 semanas. Apresenta como con-
ou 6g/dia nos casos agudos, pelo risco de traindicações: gravidez, fraqueza muscular,
hepatotoxicidade.24,28 disfunção hepática e obstrução biliar. Não
deve ser associado com o paracetamol, pois
Dipirona poderá haver incompatibilidade. As reações
Atua no sistema nervoso central e perife- adversas mais comuns são: boca seca, sono-
ricamente inibindo a cicloxigenase, apresen- lência e tontura.30
tando ação analgésica e antipirética. Pode ser
administrada por via oral, retal, intramuscu- Antiinflamatórios não hormonais
lar, subcutânea e endovenosa. Tem duração São eficazes na dor somática (linfonodo-
de efeito de aproximadamente 4 a 6 horas, megalia, metástase óssea ou lesão cutânea),
independentemente da via utilizada, poden- visceral (distensão da cápsula hepática) ou
do ser administrada na dose de 500 a 1000 neuropática (compressão medular). Tem
mg em intervalos de 4 a 6 horas, com dose como sítio de ação o tecido lesado. Não apre-
máxima de 6g/dia. Pode provocar excitação sentam ação central. 2,331, 2,33,34
do sistema nervoso central, reações de hiper- Devem ser evitados em idosos, devido a
sensibilidade e raramente granulocitopenia, maior incidência de efeitos colaterais nessa
sendo por este motivo não aprovada para uso população. Quando necessários, devem ser
nos Estados Unidos pelo US Food and Drug usados de forma criteriosa. Podem causar
Administration (FDA).6,10,28 hemorragia gastrointestinal, diminuição
da função renal, retenção hídrica, discrasia
Viminol sanguínea, alterações neurológicas e pro-
Tem ação analgésica parcialmente escla- blemas cardiovasculares. Muitos trabalhos
recida. Parece inibir os estímulos nocicepti- têm evidenciado a ocorrência de hipertensão
vos por ação no sistema nervoso central em arterial, infarto do miocádio, isquemia cere-
nível subcortical, atuando na inibição da brovascular e exacerbação da insuficiência
percepção e elaboração dos estímulos algogê- cardíaca com o uso de diversos antiinflama-
Tabela 13.2 - Analgésicos não opioides
Fármaco Apresentação e dose Dose terapêutica/ Intervalo Ação: Início/Pico/Fim Efeito teto
Amp 2ml-500mg/ml
Dipirona Frs. 10ml 500mg/ml 500-1.000mg/4-6h 30min/2h/8h 6g
Cp. 500mg
Frs. 10ml 100mg/ml
Paracetamol 500-1.000mg/4-6h 30min/2h/8h 4g
Cp. 500mg e 750mg
Viminol Cp. 70mg 70-140mg/6-8h 560mg
Flupirtina Cp. 100mg 100 a 200mg/6-8h 20min/3h/10h 600mg
Abreviações: Cp (comprimido), Amp (ampola), Sol Oral (solução oral).

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Capítulo 13 - Dor em Cuidados Paliativos

tórios, especialmente dos inibidores seletivos Analgésicos Opioides


da cox-2, que podem reduzir em até 70% o Os opioides são substâncias derivadas do
risco de eventos gastrointestinais.31,33,34 ópio e são classificados em naturais ou sinté-
Recomenda-se avaliação mensal do he- ticos, de acordo com sua natureza química.
mograma, eletrólitos, função renal e hepática Quanto à intensidade de sua ação farmaco-
durante uso por tempo prolongado. Conco- lógica, são classificados em fracos ou fortes,
mitantemente ao uso de AINHs é recomen- sendo os primeiros indicados para a dor mo-
dado o uso de inibidor da bomba de prótons, derada e os últimos para a dor intensa ou for-
bloqueador H2 ou antiácidos para minimi- te. São antagonizados pela naloxona.10,36,38,39
zar os efeitos colaterais no trato digestivo e São os pilares do tratamento da dor de
sintomas que causam desconforto. moderada a forte intensidade, podendo ser
usados em todos os tipos de dor (somática,
Antiinflamatórios hormonais visceral e neuropática). Apresenta importan-
Agem diminuindo a liberação de subs- tes benefícios que superam seus efeitos co-
tâncias quimiotáticas e vasoativas através da laterais e seu potencial de dependência quí-
redução da permeabilidade capilar; inibem a mica. Deve-se usar apenas um opioide, esco-
síntese de prostaglandinas, reduzindo a in- lhido por sua intensidade e tempo de ação,
flamação e o edema. São muito eficazes no comodidade de via de administração, efeitos
controle da dor por lesão tumoral óssea e de adicionais e colaterais.10,36,38,39
partes moles, como da invasão hepática, do As doses iniciais devem ser mais baixas
plexo nervoso e da medula espinhal.6,31,32, 35 que as doses terapêuticas e os ajustes devem
Nos pacientes com câncer, podem agir seguir uma progressão em média de 30%
também diminuindo a massa tumoral e o para mais ou para menos, até que se obtenha
edema peritumoral, sendo indicados quan- o desejado controle analgésico aliado a efeitos
do há hipertensão intracraniana, compres- colaterais controláveis. Devem ser prescritas
são de estruturas nervosas ou de medula doses fixas e doses de resgate nos intervalos,
espinhal, metástases ósseas, obstrução in- se necessário.10,36,38,39
testinal e hepatomegalia (por distensão da Em idosos, recomenda-se início do tra-
cápsula de Glisson).6,31,36 tamento com doses menores e/ou intervalos
Apresentam como principais efeitos cola- mais prolongados, pela maior frequência de
terais: ansiedade, insônia, síndrome confu- intolerância e efeitos adversos com as doses
sional, hiperglicemia, candidíase oral, mio- usuais, devido às alterações fisiológicas que
patia e hemorragia gastrointestinal.31,32 ocorrem com o envelhecimento, ocasionan-
A dexametasona é o corticóide mais utili- do alterações na farmacocinética e farmaco-
zado em Cuidados Paliativos pela sua elevada dinâmica destes indivíduos.40
potência, possibilidade de administração por Quando houver necessidade de troca do
múltiplas vias, ação antiinflamatória prolonga- opioide, deve-se considerar a equipotência
da e mínima ação mineralocórticóide. 10,35,36,37 analgésica entre as medicações dessa classe. É
importante lembrar que os opioides nunca de-
vem ser suspensos abruptamente pelo risco de
Tabela 13.4 - Vias de administração e posologia causarem síndrome de abstinência. 10,36,38
dos antiinflamatórios hormonais mais usados em Os efeitos colaterais mais temidos, como
Cuidados Paliativos a sedação e a depressão respiratória, são ra-
Droga
Via de administração / ros com o emprego de doses adequadamente
Posologia ajustadas. Com exceção da obstipação in-
Dexametasona
VO, SC ou IV: 2 a 4mg a testinal, que deve ser tratada com alteração
cada 6h
da dieta e laxativos; outros efeitos como so-
Prednisona VO: 0,5 a 1mg/kg 1x/dia
nolência, confusão leve ou euforia, náuseas,
Deflazacort VO: 7,5 a 60mg 1x/dia vômitos, boca seca, sudorese, tremores e

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Capítulo 13 - Dor em Cuidados Paliativos

mioclônus são controláveis e tendem a desa- Codeína


parecer em 3 a 7 dias.19,35,40 A codeína é um derivado natural do ópio.
Embora os opioides não sejam as únicas É um agonista μ. Considerada uma pró-dro-
medicações indicadas para o tratamento da ga, é metabolizada in vivo em morfina. 10,36,38
dor em Cuidados Paliativos, seu uso deve ser No Brasil, existe na forma de compri-
iniciado sempre que o quadro clínico exigir. midos, isoladamente ou associada ao pa-
racetamol e ao diclofenaco, e na forma de
OPIOIDES FRACOS solução oral (3mg/ml). Os comprimidos
existentes contêm 7,5, 30, 50 ou 60 mg de
Tramadol codeína. Tem duração de ação de 4-6 ho-
É um análogo sintético da codeína, com ras. A partir de 360mg/dia, não apresenta
mecanismo de ação dual, ativando os re- mais vantagem, sendo recomendada sua
ceptores μ e inibindo a recaptação de se- substituição por um opioide forte. Tem po-
rotonina e noradrenalina. Deve ser prefe- tente ação antitussígena e com frequência
rida sua administração via oral, devido sua causa obstipação e sonolência.10,36,38
elevada biodisponibilidade (até duas a três Por tratar-se de droga cujos metabó-
vezes maior que a parenteral). As apresen- litos são de excreção renal, sua dose deve
tações orais podem ser em solução de 50 ou ser reduzida, assim como os intervalos de
100 mg/ml, comprimido de liberação ime- administração devem ser aumentados em
diata de 50 e 100 mg (4-6 horas), compri- pacientes com insuficiência renal. Deve ser
mido de liberação lenta (12 horas) de 100 evitada naqueles com insuficiência renal
mg ou ainda comprimido de 37,5 mg asso- grave ou dialítica.10,36,38
ciado a 325 mg de paracetamol. Se a opção A eficácia analgésica da codeína requer
for pelo uso parenteral, preferir adminis- conversão para morfina via CYP2D6, isoen-
trar na forma de infusão contínua intrave- zima do sistema hepático enzimático P450.
nosa ou subcutânea. 10,28,36,38,39,41,42 Cinco a dez por cento dos pacientes apresen-
Em pacientes com insuficiência hepá- tam uma variação genética levando à lenta
tica ou renal, sua dose deve ser reduzida ou metabolização da codeína por esta enzima,
seu intervalo de administração prolongado. sem conversão para sua forma ativa, por isso,
Como pode reduzir o limiar convulsivo, não apresentam pouco ou nenhum benefício tera-
se deve utilizar mais que 400mg em 24 horas, pêutico com uso da codeína. Por outro lado,
devendo ser evitado em indivíduos com tu- pacientes que apresentam metabolização
mores cerebrais que apresentam predisposi- muita rápida desta droga podem apresentar
ção a atividades epilépticas.10,36,38,39 aumento dos níveis séricos de morfina, com
Quando comparado à codeína, é menos maior número de efeitos adversos.43, 44
obstipante, mais nauseante e não tem ação
antitussígena. Pode causar tontura, boca OPIÓDES FORTES
seca, sedação e, menos comumente, depres-
são respiratória.10,36,38 Morfina
É considerada o opioide de eleição para
Quadro 13.1 - Equipotência analgésica entre trama- tratamento da dor moderada a forte. É uma
dol e morfina droga barata, eficaz e segura quando respei-
Tramadol oral 5mg = 1mg morfina oral tadas as orientações para sua utilização. Não
Tramadol parenteral 10mg = 1mg morfina oral apresenta teto posológico, sendo a dose limi-
te aquela que proporciona alívio completo da
dor ou aquela que causa efeito colateral into-
Quadro 13.2 - Equipotência analgésica entre codeína
e morfina
lerável. Tem duração de ação de 2 a 4 horas.
Sua dose deve ser titulada conforme a neces-
10mg codeína = 1mg morfina
sidade do paciente. 9, 28, 36, 38, 46, 47, 48

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Capítulo 13 - Dor em Cuidados Paliativos

Tabela 13.6 - Equipotência analgésica entre opioides


Está disponível no Brasil sob a forma de

630 mg

420 mg

320 mg

400 mg
210 mg
solução oral e de comprimidos de liberação

70 mg
imediata, contendo respectivamente 10 mg/
ml e 10 e 30 mg. Existem cápsulas de libe-

120 mg 150 mg 180 mg

360 mg 460 mg 540 mg

240 mg 300 mg 360 mg

180 mg 240 mg 280 mg

200 mg 300 mg 350 mg


60 mg
ração cronometrada (LC) para uso a cada 12
horas com 30, 60 e 100 mg. Esta apresentação
não deve ser usada por sonda enteral. As am-

50 mg
polas contêm 2 mg/ml ou 10 mg/ml e devem
ser usadas preferencialmente por via sub-

40 mg
cutânea de forma intermitente (a cada quatro
horas) ou contínua em 24 horas. Nos casos de
supositório, a dose da morfina retal é a mes-

125 mg 125/150 mg 150/200 mg


180 mg

140 mg
270 mg
90 mg

30 mg
ma da via oral.6, 10, 28, 48
Ao se iniciar o uso de morfina em pacien-
tes que nunca foram tratados com opioide,

120 mg
150 mg
240 mg
75 mg

25 mg
deve-se utilizar a dose inicial de 5 a 10 mg
de morfina de liberação rápida via oral ou 2
a 3mg via subcutâneo a cada 4 horas. Em pa-

180 mg

120 mg
60 mg

20 mg

90 mg
cientes idosos e debilitados, iniciar com me-
tade da dose usual e com intervalos maiores
Doses

(a cada 6 horas) para evitar sonolência ini-

75/100 mg
120 mg
40 mg

15 mg

90 mg

60 mg
cial, confusão e instabilidade.10, 28
Em pacientes submetidos a tratamento
prévio com opioides, a dose deve ser calcu-

50 mg 50/75 mg
30 mg

90 mg

60 mg

40 mg
lada baseando-se na tabela de equivalência 10 mg
analgésica dos opiódes, reduzindo-se essa
dose em 25-50%, para prevenir tolerância
20 mg

60 mg

40 mg

30 mg
7 mg

cruzada entre essa classe de drogas.9, 28, 36, 38, 45


Em pacientes com insuficiência renal,
75 mg 100 mg

15 mg

30 mg

20 mg

25 mg
5 mg

as doses da morfina ou a sua frequência de


administração devem ser reduzidas, devido
30 mg

20 mg

25 mg
10 mg

10 mg
3 mg

risco elevado de sedação e depressão respira-


tória. Não deve ser usada em pacientes com
100 mg

insuficiência renal grave ou dialítica.49, 50


60 mg

50 mg

15 mg
5 mg

2 mg

Os analgésicos devem ser adminis-


trados em doses fixas, conforme sua du-
25 mg 37,5 mg
45 mg

75 mg

ração de ação. Prescrever um analgésico


para um paciente em Cuidados Paliativos
“se dor” ou “se necessário” é inapropria-
30 mg

50 mg

do, pois, passando o efeito do analgésico,


a dor reaparecerá. Em associação às do-
12 horas

12 horas

72 horas
24 horas
4 horas

6 horas

6 horas

4 horas

4 horas
Tempo
ação

Tabela 13.5 - Conversão da via de administração


da morfina
Morfina parenteral/IV ou

Fentanil transdérmico/
Morfina parenteral/SC
Morfina oral de longa
Morfina oral de ação
Tramadol parenteral

Oxicodona oral

De morfina via oral para


Tramadol oral
Medicamento

Codeína oral

intermitente

SC continuo

1/2 da dose oral


subcutânea
SC ou IV

duração

adesivo
rápida

De morfina via oral para


1/3 da dose oral
endovenosa
De morfina via oral para
Mesma dose via oral
vai retal

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Capítulo 13 - Dor em Cuidados Paliativos

ses fixas dos opioides, devem ser prescri- Quadro 13.3 - Orientações práticas para
tas doses de resgate, se necessário, para uso de opioides 10,28
controle da dor que aparecer nos inter- Desfazer mitos sobre a morfina para o paciente, seus
familiares e para a própria equipe de saúde.
valos. A necessidade da dose de resgate
Informar sobre os possíveis efeitos colaterais com o uso
deve ser avaliada de hora em hora. As de opioides.
doses de resgate podem ser 1/6 ou 1/10 Prescrever opioides em doses fixas conforme sua duração
da dose diária total do opioide em uso, de ação.
exceto no caso do fentanil transdérmico Para pacientes em uso de morfina de liberação rápida via
e da oxicodona, que apresentam início de oral, prescrever dose dobrada da droga ao deitar e omitir
a dose da madrugada, para que o paciente não acorde
ação mais demorado, devendo, por isso, a com dor nem seja despertado para tomar a medicação,
terapêutica de resgate ser realizada com evitando assim o ciclo: dor-insônia-exaustão-dor.
morfina de liberação rápida.10, 28 Prescrever doses de resgate nos intervalos das doses fixas
Após 24 horas, a dose deve ser titulada (1/6 a 1/10 da dose diária total).
conforme a eficácia da dose prescrita e ne- Prescrever doses fixas de resgate antes de situações que
cessidade de doses de resgate, somando-se sabidamente causam dor no paciente, como mobilização,
banho ou troca de curativo.
as doses de resgate que foram utilizadas às Ajustar a dose do opioide após 24 horas conforme a
doses fixas e instituindo-se nova dose diá- necessidade de doses de resgate.
ria total, fracionada em intervalos a cada Estabelecer primeiramente a dose analgésica com opioide
4 horas. Por exemplo, paciente em uso de de ação imediata que, se possível, posteriormente, será
morfina oral de liberação rápida 10 mg de substituído por um opioide de ação lenta, facilitando a
posologia. Caso haja necessidade de doses de resgate,
4/4h (60 mg/dia). Necessitou de 3 doses de deve ser administrado opioide de ação rápida.
resgate durante o dia. Cada dose de resga- Sempre aumentar ou suspender a dose do opioide de
te corresponde a 6 a 10mg de morfina via forma gradual.
oral ou 2-3 mg de morfina via endovenosa. Caso seja possível a suspensão do opioide, como pode
Logo, no dia seguinte, o paciente deve rece- ocorrer em casos de dor controlada pós-radioterapia,
reduzir inicialmente ¼ da dose. Após, reduzir 50% e assim
ber mais 25 a 30 mg de morfina via oral que sucessivamente, até atingir a dose equivalente de 10 a 15 mg
serão divididas em 6 tomadas, correspon- de morfina diária e suspender o medicamento após 2 dias.
dendo a 12,5 a 15mg de 4/4h.10, 28 Lembrar que não devem ser associados opioides, exceto
Após a titulação da dose diária ne- quando se faz uso de fentanil transdérmico ou de
cessária, deve-se passar para morfina de oxicodona, pois como apresentam início de ação mais
demorado, a terapêutica de resgate é realizada com
liberação lenta que deverá ser iniciada morfina de liberação rápida.
no horário de administração de uma das Quando for necessária a troca de opioides considerar a
tomadas da morfina de liberação rápida, equipotência entre as drogas.
ressaltando-se que continua sendo fun-
damental a manutenção de terapêutica de Quando administrado via transdérmi-
resgate com morfina de liberação rápida ca, a derme funciona como um reservató-
e ajuste da dose de opioides diariamente. rio da droga, desta forma, o adesivo tem
O uso da morfina, assim como de qual- liberação constante e regular do opioide ao
quer outro opioide forte, pode ser dimi- longo de 72 horas e menores efeitos seda-
nuído ou interrompido quando a causa tivos, nauseantes e obstipantes. Oferece o
da dor for controlada, sempre de forma conforto terapêutico e a possibilidade de
gradual, com diminuição das doses na administração por uma via que pode per-
mesma progressão do seu aumento.10,28 durar até o final da vida, qualquer que seja
a condição do doente, sem causar descon-
Fentanil forto durante a administração. Ideal para
É um opioide sintético de ação semelhan- os pacientes com disfagia, oclusões gas-
te à morfina, porém 100 vezes mais potente, trointestinais, portadores de insuficiência
que pode ser administrado por via intramus- renal ou hepática graves, usuários de sonda
cular, endovenosa ou transdérmica. 6,10,28, 51,52 nasoenteral ou pacientes com altas doses

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Capítulo 13 - Dor em Cuidados Paliativos

diárias de morfina e com difícil controle oral e pode ser usado com segurança em pa-
de sintomas colaterais. 6,10,28,48,51 cientes com insuficiência hepática ou renal,
Os adesivos contêm 2,5, 5,0, 7,5 e 10 mg sem necessidade de ajuste das doses.6,32,40,55
de fentanil e proporcionam a liberação, res- Apresenta meia vida longa (10 a 75 ho-
pectivamente, de 25, 50, 75 ou 100 mcg do ras) e imprevisível, o que dificulta sua ava-
medicamento a cada hora. Deve ser prescrito liação. Sua concentração plasmática pode
em dose equipotente ao total de morfina oral levar uma semana para se estabilizar, com
usado em 72 horas. Após a remoção do adesi- risco de acúmulo e toxicidade graduais,
vo pode haver manutenção da concentração por isso seu uso deve ser cuidadosamente
plasmática do fentanil por até 8 a 12 horas, monitorado. 6,32,36,38,40,55
com efeitos colaterais tardios.10,28 Em pacientes idosos virgens de trata-
Quando se pretende passar de uma tera- mento com opioides é recomendado iniciar
pêutica via oral para administração transdér- o uso de metadona com 2,5 mg a cada 8 a 12
mica através da aplicação de adesivos, deve-se horas, ajustando-se a dose após 5 a 7 dias. A
sobrepor as administrações nas primeiras 24 duração de analgesia é de aproximadamente
horas, pois o adesivo só atinge o pico de ação 3 a 6 horas quando a terapia com metadona
em 24 a 48 horas. Por esse motivo também, o é iniciada, estendendo-se para 8 a 12 horas
fentanil transdérmico não está indicado em quando a terapia é mantida.6,32,49,55
pacientes que necessitem de uma titulação rá- Em relação à potência analgésica, inicial-
pida e em casos de dor aguda.6,10,28,45,52 mente 10 mg de metadona correspondem a
Deve ser preferido em relação à morfina 15 mg de morfina. Porém com o uso conti-
em pacientes com insuficiência renal, devido nuado, doses menores de metadona tem a efi-
à ausência de metabólitos ativos.52,53 cácia analgésica equivalente a doses maiores
A exposição do adesivo de fentanil ao calor de morfina (1mg metadona equivale a 10mg
(ex: aumento da temperatura corporal, contato de morfina). Náusea é um sinal de alerta para
com superfície quente) pode levar ao aumento intoxicação por opioide.10,28
da absorção sistêmica de fentanil, aumentando Pode ocasionar aumento do intervalo
o risco de depressão respiratória. Além disso, QT, predispondo a arritmias, principalmente
o adesivo de fentanil contém metal que pode torsades du pointe. É metabolizada em parte
ocasionar lesões por queimaduras cutâneas pela isoenzima CYP3A4, tendo sua concen-
durante a realização de ressonância nuclear tração afetada por drogas que inibem (ex:
magnética (RNM). Deve-se sempre remover o claritromicina, itraconazol, cetoconazol) ou
patch de fentanil antes da realização de RNM e induzem (ex: carbamazepina, oxicarbazepi-
substituí-lo após o exame.54 na, dexametasona, fenobarbital, rifampcina)
a atividade desta enzima.56
Metadona
É um opioide forte sintético, considerado Oxicodona
a principal alternativa à morfina para trata- A oxicodona é um opioide sintético com
mento da dor moderada a severa. É conside- boa disponibilidade via oral e menor inci-
rado excelente opioide para tratamento da dência de tolerância e efeitos colaterais quan-
dor neuropática.6,32,40,55,56 do comparado à morfina.6,32,49,57
Além de ser um agonista de receptores No Brasil, encontra-se disponível na for-
opioides, é um antagonista de receptores n-me- ma de comprimidos de 10, 20 e 40 mg admi-
til-D-aspartato (NMDA), o que pode justificar nistrados a cada 12 horas, que não podem ser
sua maior eficácia no controle da dor neuropá- triturados, amassados ou quebrados. Tem
tica e seu menor desenvolvimento de tolerância dupla camada de liberação, com primeiro
em comparação com a morfina.6, 40,55,56 pico em menos de 1 hora e segundo pico após
Tem menor custo quando comparado 6 horas. Como não há comprimidos de ação
à morfina, tem boa disponibilidade por via imediata e formulação injetável, é necessário

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Capítulo 13 - Dor em Cuidados Paliativos

utilizar morfina de liberação imediata nas do- Pacientes que desenvolvem efeitos ad-
ses de resgate. Possui ação 1,5 a 2 vezes maior versos intoleráveis, mesmo antes de alcan-
do que a morfina via oral. Na dose de até 20mg çar a analgesia adequada, devem receber
por dia é considerado opioide fraco. 6,32,48,57 tratamento efetivo para prevenir ou tratar
estes efeitos e apenas quando essa interven-
Hidromorfona ção falhar deve ser considerado o rodízio de
Tem como vantagem ser administrada opioides.10,28
em dose única diária, além de apresentar po-
tência analgésica cinco vezes maior do que a EFEITOS INDESEJÁVEIS DOS OPIOIDES
morfina e menos efeitos adversos. São dispo- Os opioides têm efeitos adversos pre-
níveis comprimidos de 8, 16 e 32 mg.6,32,49 visíveis que se não forem evitados ou mi-
A sua dose inicial de liberação prolongada nimizados podem dificultar a titulação da
deve ser de 8mg a cada 24 horas para pacien- dose e a adesão do paciente ao tratamento.
tes que não estejam recebendo nenhum outro Dentre os efeitos adversos mais frequentes,
opióde. Nos pacientes que já estão em uso de destacam-se: náuseas, vômitos, boca seca,
opioides, a dose inicial deve ser relacionada à obstipação, sedação e tolerância. Menos
dose diária do opioide em uso, utilizando-se comumente observam-se depressão respi-
a tabela de equipotência entre opioides. Para ratória, alterações cognitivas, hiperalgesia,
opioides que não a morfina, deve-se estimar mioclonias e prurido.6,10,28,38,40,45
a dose equivalente diária da morfina e deter-
minar a dose diária de hidromorfona. Pode Obstipação
ser usada em pacientes com insuficiência re- Efeito adverso mais comum dos opioi-
nal moderada e severa.6,32,49,55,58,59 des. Ocorre devido redução do peristaltismo
do trato gastrointestinal, o que prolonga a
RODÍZIO DE OPIOIDES permanência de fezes no intestino, levando
O rodízio de opioides deve ser considera- a maior absorção de água e obstipação. Não
do em pacientes que não apresentam controle desenvolve tolerância, devendo sempre ser
adequado da dor apesar da titulação da dose, prevenida e tratada. Recomenda-se sempre
naqueles que apresentam manifestações tóxi- prescrever laxativos em associação ao início
cas refratárias ao tratamento sintomático, na- da terapia com opioides, para prevenção de
queles que desenvolvem alterações cognitivas obstipação, sendo a melhor escolha os esti-
ou hiperexcitabilidade pelo opioide inicial ou mulantes, como o bisacodil, que atuam no
quando há necessidade de trocar a via de ad- mecanismo de indução de constipação por
ministração dos opioides. A troca de opioides estas drogas.6,10,28,38,40,45
tem como objetivo fornecer analgesia adequada
com o mínimo de efeitos adversos.6,10,28,35,38 Náuseas e vômitos
Tem como mecanismo a estimulação
Quadro 13.4 - Recomendações para o
da trigger zone, cujo neurotransmissor é a
rodízio de opioides
dopamina, e o atraso no esvaziamento gás-
Calcular a dose total do opioide nas 24 horas, incluindo as
doses de resgate;
trico, devido redução do peristaltismo. De-
vem ser excluídas outras causas potencial-
Utilizar as tabelas de equivalência analgésica para
calcular a dose do novo opioide, reduzindo-se em 20 a mente tratáveis, como hipertensão intra-
30% a dose correspondente total; craniana, compressão mecânica das alças
Estabelecer as doses de manutenção, dividindo-se a intestinais e distúrbios eletrolíticos. Fre-
dose total calculada do novo opioide pelo intervalo de quentemente desenvolve tolerância após a
administração, prescrevendo-se doses fixas; primeira semana de tratamento. Devem ser
Prescrever as doses de resgate; tratados com metoclopramida, bromopri-
Reavaliar constantemente o controle da dor e monitorar o da ou haloperidol, pelo efeito no peristal-
aparecimento de efeitos adversos.
tismo e efeito antidopaminérgico.32,36

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Capítulo 13 - Dor em Cuidados Paliativos

Tabela 13.7 – Opioides fracos e fortes


Equipotência analgésica em
Medicamento Dose terapêutica/ Intervalo Ação: Início/Pico/Fim
relação a morfina oral
Tramadol 50 a 100mg/6-8h 30m/2h/8h 1/5
Tramadol SR 50 a 200 mg/12-12h 30m/2h/12h 1/5
Codeína 7,5 a 120mg/4-6h 30m/2h/8h 1/5
VO 1
Morfina 5-200mg/4h (dose oral) 15m/2h/4h SC 1/2
IV 1/3
Morfina de ação longa 30 a 100mg/ 8 a 12h 1h/6h/14h 1
Fentanil transdérmico 12,5 a 100mcg/h a 72-72/h -/24h/72h 100 a 150
Metadona 10 a 50mg/ 6 a 12h 1h/12h/25h *
Oxicodona 10 a 40mg/ 12-12h 1h/8h/25h 1,5
Hidromorfona 8mg 1x/dia - 5
*potência analgésica da metadona é variável. inicialmente 10mg de metadona correspondem a 50mg de morfina. Com o uso
continuado, doses menores de metadona tem a eficácia analgésica equivalente a doses maiores de morfina (1mg metadona
equivale a 10mg de morfina).

Tabela – Apresentação e nome comercial dos opioides fracos e fortes


Droga genérica Nome comercial Apresentação
Cp 50mg e 100 mg
Tramadol Tramal, Tramadon, Dorless Amp 2ml - 50 mg/ml
Sol oral 100mg/ml
Tramadol SR Cp 50mg
Cp: 37,5 mg de tramadol +
Tramadol e paracetamol Ultracet, Paratam
375 mg de paracetamol
Cp 30mg e 60mg
Codeína Codein
Sol oral 3mg/ml
Cp: 7,5 mg ou 30 mg de codeína + 500
Codeína e paracetamol Tylex, Codex
mg de paracetamol
Cp: 50mg de codeína + 50 mg de
Codeína e diclofenaco de sódio Codaten
diclofenaco
Cp 10 e 30 mg
Sol oral 10mg/ml
Morfina Dimorf
Amp 1ml - 10mg/ml
Amp 2ml- 2 mg/ml
Morfina de ação longa Dimorf LC Cp 30, 60 e 100mg
Fentanil Durogesic Adesivos 25, 50, 75 e 100mcg/h
Cp 5 e 10mg
Metadona Mytedon
Amp 10mg/ml
Oxicodona Oxycontin Cp 10, 20 e 40mg
Cp de liberação prolongada com 8, 16
Hidromorfona Jurnista
e 32 mg
Abreviações: Cp (comprimido), Amp (ampola), Sol Oral (solução oral).

Tabela - Conversão de morfina para metadona


Dose prévia de morfina Equivalência de metadona
50 a 100mg/dia 5 mg de morfina – 1mg de metadona
100 a 1.000mg/dia 10 mg de morfina – 1 mg de metadona
> 1.000mg/dia 15 mg de morfina – 1mg de metadona

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Capítulo 13 - Dor em Cuidados Paliativos

Sedação de síndrome de abstinência, deve-se utilizar


Pode ocorrer nos primeiros dias de uso clonidina, metadona ou buprenorfina.
do opioide ou após aumento da dose. Geral- A dependência psíquica (adição) é uma
mente é um efeito transitório, desaparecendo síndrome psicológica e comportamental ca-
após 3 a 4 dias, porém pode ser o primeiro racterizada pelo desejo por opioide para pro-
sinal de overdose da medicação, devendo ser duzir efeito psíquico, associada a comporta-
considerada redução da dose. 6,10,35 mentos aberrantes, como busca compulsiva
pela droga, uso inapropriado, aumento da
Hiperalgesia dose, apesar dos danos a si próprio e aos ou-
Hiperlagesia induzida por opioide é um tros. Estudo realizado em pacientes oncoló-
estado de sensibilização nociceptiva com gicos mostrou que o risco de adição é muito
resposta paradoxal, fazendo com que um baixo quando opioides são usados para palia-
paciente em tratamento com opioides para ção de sintomas.6,10,28,35
controle da dor apresente maior sensibilida-
de a determinados estímulos dolorosos e, em Depressão respiratória
alguns casos, alodínea. É o efeito colateral mais temido dos
A ocorrência de dor abdominal severa opioides, porém raramente ocorre, visto
durante o uso de opioides deve levar à sus- que a dor é um importante estimulante
peita de hiperalgesia por opioide, iniciando- do sistema respiratório, desenvolvendo-
se redução gradual da dose do opioide.31 se rapidamente tolerância para este efei-
to. Depressão respiratória geralmente não
ocorre se o aumento da dose é gradual. Hi-
Tolerância e dependência poventilação, apnéia e miose podem signi-
Tolerância é a adaptação aos efeitos dos ficar ocorrência de overdose. Se necessário,
opioides, com redução dos efeitos colaterais pode ser utilizado o naloxone (antagonis-
com uso crônico da medicação. Tolerância à ta de opioides) para reversão deste efeito,
analgesia é rara em pacientes com dor crôni- além de suporte ventilatório.6,10,28,35
ca, sendo importante sempre considerar que
a necessidade de aumento da dose pode estar MEDICAÇÕES ADJUVANTES
relacionada com o agravamento da dor e não São fármacos cujo efeito primário não
à tolerância. Caso seja necessário, deve-se consiste em analgesia, mas que, em associa-
tratar a tolerância com troca de opioide ou ção com medicações analgésicas, melhoram
com associação de drogas adjuvantes. seu efeito analgésico. São usados com o ob-
A dependência física caracteriza-se por jetivo de aumentar a eficácia analgésica dos
síndrome de abstinência quando ocorre sus- opioides, prevenir e tratar sintomas conco-
pensão brusca da medicação. Pode ser evi- mitantes que exacerbam a dor e colaborar
tada com redução gradual da dose. Em caso com o manejo da dor neuropática. Podem

Tabela 13.8 - Mecanismos de ação das drogas adjuvantes e de alguns opioides 10,28
Mecanismo de ação Drogas
Potencializam as vias inibitórias (noradrenérgicas e
Antidepressivos (tricíclicos e ISRS), metadona e tramadol.
serotoninérgicas)
Estabilizam a membrana neuronal (bloqueadores de Anestésicos locais, antiarrítmicos (lidocaína, mexitilene, flecainida),
canais de sódio) anticonvulsivantes (carbamazepina, lamotrigina e fenitoína).
Anticonvulsivantes (valproato e vigabatrin), benzodiazepínicos,
Ativam o sistema inibitório GABA
baclofeno, fenobarbital.
Ketamina, anticonvulsivantes (carbamazepina, lamotrigina,
Inibem o sistema excitatório de glutamato fenitoína, gabapentina e valproato), metadona e
dextrometorfano.

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Capítulo 13 - Dor em Cuidados Paliativos

ser usados em todos os degraus da escada Antidepressivos Tricíclicos


analgésica da OMS.3,6,9,23 Apresentam início de ação entre 3 e 7 dias
Os principais fármacos incluídos nesta e seus principais efeitos colaterais são relacio-
categoria são: antidepressivos, anticonvul- nados à sua ação anticolinérgica: sonolência,
sivantes, antiinflamatórios, neurolépticos, confusão mental, hipotensão postural, reten-
bloqueadores dos canais do receptor NMDA, ção urinária e boca seca. São contraindica-
antiespasmódicos e relaxantes musculares. dos para pacientes com glaucoma de ângulo
O alívio da dor alcançado com a mor- fechado, prostatismo e com bloqueio de con-
fina e outros opioides está frequentemente dução. Seu uso em idosos deve ser realizado
limitado pelo fenômeno de “sensibilização com muita cautela, pelo alto risco de efeitos
central”, que ocorre pela hiperexcitabilida- colaterais.10,28, 60-62
de periférica produzida pela inflamação ou
pela injúria do nervo. Devido a este meca- Inibidores seletivos de recaptação de
nismo, as medicações adjuvantes apresen- noradrenalina e serotonina (ISRNS)
tam papel importante no controle da dor São inibidores potentes da recaptação de
crônica.3,6, 9,10,23,28 serotonina e norepinefrina e inibidores fra-
cos da recaptação de dopamina. Inibem a dor
Antidepressivos através das vias descendentes.
Atuam através do bloqueio da recapta-
ção da noradrenalina e/ou serotonina. Seu
efeito analgésico independe da melhora do
humor. Os mais utilizados como adjuvan- Quadro 13.5 - Indicação do uso de antidepressivos
tes no tratamento da dor são mencionados no tratamento da dor crônica. 10,28, 60
abaixo. O tratamento deve ser iniciado com Dor que não cede com o uso de analgésicos e suspeita
doses baixas, aumentando-se posterior- clínica de componente neuropático

mente, conforme a necessidade. Seus efeitos Dor em múltiplos sítios, com diferentes características
(nociceptivas, neuropáticas ou mistas)
colaterais estão relacionados à sua ação an-
ticolinérgica e adrenérgica e a sua ação no Dor associada à insônia

sistema nervoso central.6,10,28,60,61 Dor associada à depressão

Tabela 13.9 - Apresentação e nome comercial dos opioides fracos e fortes


Droga Apresentação Posologia
Iniciar com 12,5mg ao deitar. Titular a cada
Amitriptilina Cp 25 e 75 mg.
5 dias. Dose máxima de 50 a 75mg/dia
Iniciar com 10mg ao deitar. Titular a cada
Nortriptilina Cp 10, 25, 50 e 75 mg.
5 dias. Dose máxima 50mg/dia
Abreviações: Cp (comprimido), Amp (ampola), Sol Oral (solução oral).

Tabela 13.10 - Apresentação dos ISRNS e posologia para tratamento da dor.


Droga Apresentação Posologia
Iniciar com 37,5mg 1x/dia. Dose
máxima de 225mg/dia. Deve ser
Venlafaxina Cáp LP 37,5, 75 e 150 mg
ingerido junto com alimentos, pela
manhã ou à noite
Iniciar com 60 mg 1x/dia. Dose máxima:
60mg 2x/dia. Em pacientes com cirrose
Duloxetina Cp 60mg hepática, a dose deve ser reduzida pela
metade. É contraindicada em pacientes
com clearence de creatinina < 30ml/min.

Abreviações: Cáp (cápsula), LP (liberação prolongada)

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Capítulo 13 - Dor em Cuidados Paliativos

Devem ser evitados em pacientes com biodisponibilidade dos antidepressivos. Em


glaucoma de ângulo fechado. Podem causar: associação ao analgésico e antidepressivo, for-
náusea, boca seca, constipação intestinal, mam o “esquema tríplice de analgesia”.3,31,35
perda do apetite, fadiga, tontura, fraqueza, Também contraindicados em pacientes
síndrome da secreção inapropriada de hor- com glaucoma de ângulo fechado. São rea-
mônio antidiurético e predispor a sangra- ções adversas que podem ocorrer com doses
mentos cutâneos e de mucosa.10,28,60-62 baixas de neurolépticos: hipotensão ortos-
tática, efeitos anticolinérgicos, sonolência,
Anticonvulsivantes reações de ansiedade e alterações do humor.
Agem principalmente diminuindo a ve- Discinesias, síndrome extrapiramidal e aca-
locidade de recuperação dos canais de sódio tisia podem ocorrer com doses mais altas.
voltagem-dependentes. Seus principais efei- Olanzapina pode ocasionar ganho de peso e
tos colaterais são: sonolência (nos primeiros hiperglicemia.31,35,36,38
dias de tratamento), raciocínio lentificado,
tontura, lapsos de memória e edema de mem- Bloqueadores dos canais de NMDA
bros inferiores. Devem ser prescritas doses Agem inibindo os receptores NMDA
menores para idosos e para pacientes com na região dorsal da medula espinhal. São
insuficiência renal.10,28,36,38,63-66 representantes dessa classe cetamina e o
opioide metadona.
Neurolépticos A cetamina é usada nos pacientes com
Agem como moduladores da dor, alteran- dor neuropática, isquêmica e de membro
do a percepção da dor, através da modificação fantasma e naqueles com alodínia e hipe-
do seu aspecto afetivo e do bloqueio de recep- ralgesia, bem como nos pacientes com do-
tores de dopamina. Além disso, aumentam a res que respondem fracamente aos opioides.
Seus principais efeitos colaterais são elevação
transitória da pressão arterial, alucinações,
Quadro 13.6 - Indicação do uso de euforia e sonhos vívidos.67
anticonvulsivantes no tratamento da dor 10,28,62,63
Dor neuropática (periférica e central), atuando através da Relaxantes musculares
supressão de circuito hiperativo da medula e do córtex
cerebral e do bloqueio na condução nervosa periférica
São indicados principalmente na dor de
Dor em múltiplos sítios, com diferentes características
origem músculoesquelética. Destacam-se a
(nociceptiva, neuropática ou mista) ciclobenzaprina e o baclofeno, que além de
Dor neuropática que não responde aos antidepressivos
serem miorrelaxantes de ação central, apre-
tricíclicos sentam efeito antineurálgico. A flurpirtina é

Tabela 13.11 - Apresentação e posologia dos anticonvulsivantes usados no tratamento da dor.


Droga Apresentação Posologia
Iniciar com 100 mg de 12/12h. Pode-se
Cp 200mg e 400mg aumentar 200 mg a cada semana.
Carbamazepina
Sol oral 20mg/ml (100ml) Dose de manutenção: 400 a 600 mg de
12/12h. Dose máxima: 1200mg/dia
Iniciar com 600mg 2x/dia. Dose máxima
Cp divisíveis 300mg e 600mg 2400mg/dia. Em pacientes com
Oxicarbazepina
Sol oral a 6% com 100ml clearence de creatinina < 30ml/min,
reduzir para metade da dose.
Iniciar com 300 mg ao deitar. Aumentar
Gabapentina Cáp 300mg, 400mg e 600mg a cada 3 dias para 300 mg 3x/dia. Dose
máxima: 3600mg/dia.
Iniciar com 75 mg à noite.
Pregabalina Cp 75mg e 150mg
Dose máxima: 300 mg 2x/dia
Abreviações: Cáp (cápsula), Cp (comprimido), Sol oral (solução oral).

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Capítulo 13 - Dor em Cuidados Paliativos

miorrelaxante com ação analgésica potente, do tumor, principalmente em casos de me-


sendo boa opção.6,19,28,30,68 tástases ósseas. O alívio da dor por radiotera-
pia é rápido, ocorrendo em poucos dias.
Bisfosfonatos Quando a dor óssea é limitada a um
Inibem a reabsorção óssea mediada pelos único ou um número reduzido de sítios, a
osteoclastos. São utilizados para dor secun- radiação de feixe externo localizado para os
dária à metástases ósseas (principalmente as sítios dolorosos podem proporcionar alívio
produzidas por tumores de pulmão, mama, da dor em 80 a 90% dos casos, com a res-
próstata e mieloma múltiplo), prevenção de posta à dor completa obtida em 50% a 60%.
morbidade esquelética (fraturas e/ou dor) a A diminuição do tumor e liberação de me-
longo prazo e hipercalcemia. São contraindi- diadores químicos da dor são os principais
cados em pacientes com insuficiência renal. mecanismos pelos quais, provavelmente,
No início do tratamento podem ocasionar, age a radioterapia.
de forma transitória, síndrome influenza like A diminuição do tumor e a inibição da
(sintomas gripais e febre). Podem causar hi- liberação de mediadores químicos da dor
pocalcemia, por isso deve ser realizada do- parecem ser os mecanismos principais pelos
sagem de cálcio antes e durante o tratamen- quais a radioterapia atua. Esta terapia será
to. Raramente pode ocorrer osteonecrose de abordada em capítulo específico.70
mandíbula após meses de tratamento, mais
comumente associada ao uso de pamidrona- CIRURGIA PALIATIVA
to e ácido zoledrônico, menos comumente Nos tumores sólidos, a cirurgia curativa
associada ao uso de bifosfonatos orais.69 muitas vezes não é possível, por comprome-
timento de estruturas vitais, por risco elevado
RADIOTERAPIA para o paciente ou por possíveis complicações.
A radioterapia é indicada para pacientes Porém, em situações específicas, a cirurgia
com dor intratável apesar das medidas não pode ser realizada para paliar o câncer, con-
farmacológicas e farmacológicas, quando a trolando determinados sintomas, como a dor.
dor é localizada e consequente à progressão Será abordada em capítulo específico.

Tabela 13.12 - Apresentação e posologia dos principais neurolépticos usados no tratamento da dor crônica
Droga Apresentação Posologia
Iniciar com 25 mg divididos em 2
Cp 25mg e 10mg
tomadas. Dose máxima: 150mg/dia
Clorpromazina Sol oral com 20 ml
divididos em 2-3 tomadas. Aumento
(cada gota = 1 mg)
lento e gradual.
Cp 25 mg e 100mg
Levomepromazina Sol oral gotas 40mg/ml
Injetável 25mg/ml
Cp 2,5mg, 5mg e 10mg Dose inicial: 2,5mg/dia
Olanzapina
Cp orodispersível 10mg Dose máxima: 20mg/dia
Abreviações: Cp (comprimido), sol oral (solução oral).

Tabela 13.14 - Posologia dos bisfosfonatos usados


Tabela 13.13 - Posologia dos relaxantes musculares para o tratamento da dor crônica
Droga Posologia Droga Posologia
Ciclobenzaprina 5 a 10mg 1-2x/dia 60-90mg em 100ml
Pamidronato SF0,9% ou SG5% em 4h a
Baclofeno 10 a 20mg 2-3x/dia
cada 3-4 semanas
Flurpirtina 10 a 20mg 3-4x/dia
4 ou 5mg em 100ml
Dose variável conforme Ácido zoledrônico SF0,9% ou SG5% em 15
Carisoprodol
apresentação min a cada 3-4 semanas

133

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Capítulo 13 - Dor em Cuidados Paliativos

Fluxograma 13.1 - Tratamento da dor em Cuidados Paliativos

Avaliar a presença de dor, sua intensidade e características em todos os pacientes em Cuidados Paliativos. Em pacientes
com dificuldade de comunicação, avaliar a presença de sinais indiretos de dor

- prescrever analgesia de horário e não se necessário


Dor 7-10 | Degrau 3
- Prescrever doses de resgate com opioide de
Opioide forte (morfina, metadona, oxicodona, fentanil)
liberação rápida (1/6 a 1/10 da dose total em uso
+ analgésicos simples c/ ou s/ coadjuvantes
nas 24 horas), até de 1/1hora se necessário
- Prescrever doses de resgate fixas antes
de situações que sabidamente causam dor
Dor 4-6 | Degrau 2 (mobilização, limpeza de feridas)
Opioide fraco (Tramadol ou codeína) + analgésicos - Associar drogas adjuvantes
simples com ou sem coadjuvantes - Não associar 2 opioides regularmente, exceto no
caso de fentanil ou oxicodona
- Reavaliar a dor periodicamente
Dor 1-3 | Degrau 1 - Subir um degrau na escada analgésica caso haja
analgésicos simples (dipirona, paracetamol, AINH) falha da prescrição anterior

Tratar a constipação Avaliar e tratar efeitos Reavaliar em 24horas


profilaticamente adversos dos opioides Controle adequado da dor?

- Adequada ingestão de Náuseas e /ou vômitos Sim Não


líquidos, fibras na dieta, - Titular a dose do opioide
exercícios/deambulação lentamente
- Laxativos em esquema - Considerar haloperidol EVN 4-10 EVN até 3
regular durante uso de como adjuvante analgésico e - Iniciar via parenteral (IV - Manter esquema de
opioides (preferência por antiemético ou SC, não IM) analgesia
estimulantes e osmóticos, - prescrever antieméticos - Aumentar dose do
bisacodil 5-10mg 1-3x/ (metoclopramida, dimenidrinato, opioide conforme dose
dia ou lactulona 15-30ml ondasentron, dexametasona) total utilizada no dia
1-3x/dia ou senne 2cp
anterior (regular +
à noite) Sedação resgates)
- Casos refratários podem - Retirar outros medicamentos - Aumentar doses das
necessitar de Fleet com potencial sedativo medicações adjuvantes
Enema ou enteroclisma - Reduzir a dose de opioide se a - Considerar associação
- Metilnaltrexona pode dor estiver controlada de outras classes de
ser usada na constipação - Educar paciente, familiares adjuvantes
por opioides, mas tem e equipe de saúde que se a - Após aumento da
alto custo sedação for leve, desaparecerá dose, considerar rotação
alguns dias após introdução ou de opioide (tabela de
aumento da dose do opioide conversão)
- Considerar psicoestimulante - Considerar avaliação de
(metilfenidato) especialista em dor
Prurido
- Antihistamínico

Efeitos adversos dos opioides controlados?

Sim Não

Manter analgesia Rotação de opioide


segundo tabela de
equipotência analgésica

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Capítulo 13 - Dor em Cuidados Paliativos

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Capítulo 13 - Dor em Cuidados Paliativos

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Dispneia em Cuidados Paliativos 14
CAPÍTULO

Ana Laura de Figueiredo Bersani


Niele Silva de Moraes

INTRODUÇÃO sua intensidade, fatores desencadeantes, evo-


A dispneia é uma sensação subjetiva, de- lução, fatores de melhora ou piora.5
finida como percepção desagradável da di- Nos pacientes com dificuldade de comu-
ficuldade de respirar ou da necessidade de nicação devem ser procurados sinais eviden-
aumentar a ventilação, sendo decorrente da tes de desconforto respiratório, como uso de
interação de fatores fisiológicos, psicológicos musculatura acessória, batimento de asa do
e ambientais. Pode ser relatada como sen- nariz e fácies de desconforto, lembrando-se
sação de falta de ar, sufocamento, cansaço, que a presença de taquipneia não implica ne-
aperto torácico ou desconforto respiratório, cessariamente em dispneia.
nem sempre associados ao esforço físico.1,2,3 Para avaliar a intensidade da dispneia
É um sintoma altamente prevalente em podemos utilizar alguns instrumentos como
pacientes com doenças avançadas, acometen- a escala de avaliação numérica e a escala de
do cerca de 70% dos pacientes com câncer em Edmonton (Edmonton Symptom Assessment
fase terminal (últimas seis semanas de vida), Scale – ESAS). Na escala de avaliação numé-
46% dos pacientes com demência avançada, rica, a intensidade da dispneia é mencionada
60% dos pacientes com insuficiência cardía- numa escala de 0 a 10, onde 0 significa sem
ca grave e mais de 90% daqueles com doen- falta de ar e 10 a pior falta de ar possível.6
ça pulmonar obstrutiva crônica (DPOC) em A Escala de Sintomas de Edmond (ESAS)
estágio avançado. Tende a piorar de intensi- quantifica a intensidade dos principais sin-
dade e atingir seu pico na última semana de tomas físicos e psicológicos observados nos
vida e estudos mostram que seu controle no pacientes em Cuidados Paliativos através de
domicílio é pior quando comparado com o uma escala numérica na qual quanto maior
sintoma dor.4 o número atribuído ao sintoma maior a in-
tensidade do mesmo7 (é discutida no capítulo
ABORDAGEM DA DISPNEIA EM avaliação em Cuidados Paliativos). A mensu-
CUIDADOS PALIATIVOS ração da qualidade de vida é importante de
Por ser um sintoma subjetivo, o relato do ser determinada, incluindo a avaliação do
paciente é o dado mais importante na ava- impacto da dispneia na dimensão física, psí-
liação da dispneia. Deve-se questionar sobre quica e social.3,5,9

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Capítulo 14 - Dispneia em Cuidados Paliativos

Para o manejo adequado da dispneia é seus cuidadores e, quando possível, reverter


necessário investigação de sua causa. Para ou tratar a doença ou complicação de manei-
isso, deve-se realizar exame físico cuidado- ra apropriada.7
so em busca de sinais clínicos de hipoxemia,
anemia, ansiedade, broncoespasmo, insufi- TRATAMENTO SINTOMÁTICO
ciência cardíaca, dentre outros; podendo ser
necessários exames complementares, como Medidas não farmacológicas
oximetria de pulso, radiografia de tórax, he- Na maioria das vezes são medidas sim-
mograma e eletrocardiograma.7 ples que podem ser capazes de modificar a
Frequentemente a causa da dispneia é ób- percepção da dispneia. (Tabela 14.3)
via, mas algumas vezes é mais difícil de ser Terapia de reabilitação pulmonar (sessões
identificada.7 supervisionadas de exercícios aeróbicos leves
a intensos 3 a 4 horas 3 vezes por semana por
TRATAMENTO DA DISPNEIA 6 a 12 semanas) pode trazer benefícios para
No manejo da dispneia, o primeiro passo pacientes com DPOC estágio 3 ou 4 ou para
é identificar sua causa para instituir o trata- pacientes com dispneia severa desproporcio-
mento específico (tabela 14.2) e intervir em nal a severidade da doença. Alguns estudos
outras causas reversíveis (retenção urinária, clínicos demonstraram melhora da capaci-
ansiedade, dor, constipação intestinal). Ge- dade de exercício, redução da severidade da
ralmente, o tratamento requer uma equipe dispneia e melhora da qualidade de vida.
multidisciplinar com o objetivo de aliviar o Embora alguns pacientes em Cuidados Pa-
desconforto e sofrimento do paciente e de liativos possam se beneficiar desta terapia, é

Tabela 14.1 - Principais causas de dispneia em Cuidados Paliativos3,4,7


Comorbidades DPOC, asma, ICC
Sobreposição de doença aguda Atelectasia, pneumonia, embolia pulmonar
Obstrução brônquica, derrame pleural, linfangite
Complicações oncológicas carcinomatosa, síndrome da veia cava superior, invasão
tumoral do parênquima pulmonar
Cardiomegalia ou fibrose secundárias à quimioterapia,
Complicações relacionadas ao tratamento
fibrose por irradiação do parênquima, pneumotórax
Uremia, acidose, ascite, caquexia, estresse emocional, doença
Outras
neuromuscular, retenção urinária, constipação intestinal, dor

Tabela 14.2 - Tratamento de causas específicas3,4,7


Condições clínicas Tratamento específico
Otimizar broncodilatadores e corticoides
Asma / DPOC / Obstrução brônquica
Usar VNI em pacientes com DPOC
Derrame pleural volumoso Toracocentese de alívio / Pleurodese/Shunt pleuroperitoneal
Derrame pericárdico Drenagem pericárdica
Infecções Uso de antibióticos (quando indicado)
Tromboembolismo pulmonar Uso de anticoagulantes (quando indicado)
Hipóxia Oxigenioterapia
Linfangite Altas doses de corticóide
Doença endobrônquica Doses de corticóide, laser ou crioterapia
Considerar transfusão conforme nível de hemoglobina e
Anemia
sintomatologia
Insuficiência cardíaca descompensada Tratamento conforme perfil hemodinâmico
Síndrome da veia cava superior Corticoides em doses altas e radioterapia.

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Capítulo 14 - Dor em Cuidados Paliativos

Tabela 14.3 - Medidas não farmacológicas para tratamento


da dispneia em Cuidados Paliativos 4
Estabelecer relação de confiança e de ajuda com o paciente e seus familiares, explicando-lhes a origem do sintoma e
decidindo conjuntamente o tipo e os objetivos do tratamento para reduzir a angústia e ansiedade
Manter o paciente com companhia tranquilizadora
Manter o ambiente calmo e bem ventilado (com ventiladores e/ou janelas abertas)
Usar um ventilador direcionado para a face do paciente mostrou trazer conforto em alguns estudos
Orientar o posicionamento confortável no leito, mantendo a cabeceira elevada, preferencialmente com o paciente sentado
Manter a mucosa oral hidratada para trazer mais conforto
Dar orientações para evitar broncoaspiração
Evitar refeições em grande quantidade, pois dificultam a coordenação da deglutição e respiração. Orientar refeições
fracionadas em pequenas quantidades, evitando dispneia pós-prandial
Estimular exercícios respiratórios e técnicas de relaxamento
Propor sessões de toque-massagem, para favorecer o relaxamento
Acupuntura – Alguns estudos demonstraram benefício do uso de acupuntura em pacientes com dispneia secundária
ao DPOC e dispneia secundária ao câncer. 11,12 Porém, até o momento, não há evidências suficientes para recomendar
acupuntura como intervenção de rotina para controle da dispneia em Cuidados Paliativos.13
Adaptação do estilo de vida

uma intervenção cara e sem durabilidade de efeito pela administração do antagonista


benefício comprovada em pacientes com de- de opioide, naloxone.
terioração sistêmica progressiva, devendo ser Opioides, principalmente a morfina, tem
indicada somente em situações específicas.14 sido estudados em sua forma oral, parente-
ral e inalatória para tratamento da dispneia.
Medidas farmacológicas Uma revisão sistemática e meta análise de
ensaios placebo controlados sobre controle
Opioides da dispneia demonstraram efeito estatistica-
São a classe de medicamentos mais estu- mente significativo dos opioides orais e pa-
dados com efeito benéfico comprovado no renterais, mas não dos opioides inalatórios.
manejo da dispneia em Cuidados Paliativos, Duas revisões sistemáticas em pacientes on-
sendo as drogas de primeira linha neste con- cológicos, avaliando diferentes modalidades
texto.15,16 Seu mecanismo de ação para alívio de administração de opioides apresentaram
da dispneia ainda é pouco compreendido. conclusões semelhantes sobre a efetividade
Não alteram os parâmetros gasométricos nem dos opioides orais e parenterais.10,18 Pequeno
a função pulmonar, não reduzem a sobrevida, estudo realizado por Bruera e colaboradores19
porém reduzem de forma significativa a per- mostraram níveis de controle da dispneia se-
cepção de falta de ar, a resposta à hipóxia e à melhantes com uso de morfina via inalatória
hipercapnia, o consumo de oxigênio em re- e subcutânea, no entanto sete outros ensaios
pouso e durante o exercício e a ansiedade. Em placebo controlados não replicaram esses re-
doses adequadas e com titulação gradual, não sultados.
causam depressão respiratória. 9,10 Apesar de não haver evidências que com-
O efeito dos opioides na dispneia foi provem a eficácia da morfina inalatória ou
confirmado em 2009 num estudo que men- em nebulização, alguns autores recomendam
surou opioides endógenos durante a disp- o uso de opioides por esta via, devido menor
neia. Mahler e colaboradores17 mostraram potencial de efeitos adversos sistêmicos e pro-
em pacientes com DPOC sem uso de opioi- vável efeito benéfico em Cuidados Paliativos.20
des, durante exercício na esteira, atenuação Dois importantes ensaios clínicos forne-
da dispneia pela presença de opioides cir- ceram as bases para as recomendações atuais
culantes endógenos e reversibilidade deste de dosagem e titulação de opioides para alí-

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Capítulo 14 - Dispneia em Cuidados Paliativos

vio da dispneia.21,22 Em pacientes idosos sem Porém, estudos mostram que este receio é
uso prévio de opioides, pode-se administrar infundado. Clemens e colaboradores25,26
morfina na dose inicial de 2,5 a 5mg via oral examinando alterações nos parâmetros res-
a cada 4 ou 6 horas (ou dose equivalente por piratórios (saturação arterial, pressão arte-
via intravenosa ou subcutânea), conforme rial do dióxido de carbono, frequência res-
necessário, titulando-se a dose até o alívio piratória e frequência cardíaca) de pacientes
do sintoma. Em pacientes em uso crônico de paliativos dispnéicos, demonstraram signi-
opioides para tratamento de dor, recomen- ficativa redução na frequência respiratória e
da-se aumentar 25% a 50% da dose usual do melhora da dispneia com titulação de mor-
paciente para controle da dispneia. Em pa- fina e hidromorfona, mas sem alterações
cientes gravemente sintomáticos, pode ser significativas em outros parâmetros respi-
necessário o uso subcutâneo (1 a 2mg a cada ratórios, não observando depressão respira-
4 horas) ou a infusão contínua (endovenosa tória induzida por opióies. Estas conclusões
ou subcutânea na dose inicial de 5 a 10mg também foram encontradas em outra revi-
em 24 horas). são sistemática.10 Adicionalmente, Currow
Na ausência de dor, doses superiores a e colaboradores avaliaram mais de 30 anos
15mg a cada 4 horas via oral (ou dose equiva- de dados de pacientes com dispneia que fi-
lente por via endovenosa ou subcutânea) não zeram uso de opioides, sem evidência de de-
apresentam benefícios, devendo ser evitadas. pressão respiratória ou comprometimento
Para nebulização, a dose inicial é 5 a 10mg cognitivo nos idosos frágeis avaliados.23
em 2ml de solução salina, a cada 4 horas. Os benefícios comprovados e a falta de
Corrow e colaboradores23 recentemente evidência de aceleração da morte, levaram o
completaram a segunda fase de um estudo American College of Chest Phsicians desde
para determinar a mínima dose efetiva diá- 2010 a recomendar no “Consensus Statement
ria de opioides para controle da dispneia e on the Manegement of Dyspnea in Patients
para avaliar se os benefícios clínicos man- with Advanced Lung or Heart Disease” a ti-
tém-se ao longo do tempo. Foram avaliados tulação oral e/ou parenteral de opioides para
85 pacientes. Para 70% dos pacientes, a dose alívio da dispneia.27
benéfica de opioides foi de 10 mg por dia e Dentre os efeitos adversos mais comuns
benefício sustentado foi observado em 53% dos opioides, destacam-se constipação, náu-
dos pacientes em uso de qualquer dosagem. seas e vômitos. Os dois últimos tendem a de-
Este foi o primeiro estudo que demonstrou saparecer em até 2 semanas de uso, à medida
que baixas doses sustentadas de opioides tem que se desenvolve tolerância. Constipação
efeitos terapêuticos significativos e persisten- persiste e, por isso, sempre deve ser prescrito
tes na dispneia. laxativo para pacientes que usam opioides,
Opioides que não a morfina tem sido ava- de preferência estimulantes que atuam no
liados em um número limitado de estudos. mecanismo de indução de constipação por
Quando o paciente tem contra-indicação à estas drogas.1,8
morfina, pode-se prescrever oxicodona ou Outros efeitos adversos são: letargia, re-
hidromorfona para controle da dispneia. tenção urinária, mioclonias e delirium. Não
Pequeno estudo que analisou o uso de hi- foram notados aumento dos efeitos adversos
dromorfona em 14 pacientes, mostrou alívio com uso de opioides por via inalatóra.1,8
significativo da dispneia com dose média de
2,5mg de 6 em 6 horas.24 Benzodiazepínicos
A principal barreira para uso de opioides Os benzodiazepínicos são drogas com
no tratamento farmacológico da dispneia é efeito sedativo-hipnótico, ansiolítico e mior-
o receio dos profissionais de saúde e dos fa- relaxante, que interagem com subunida-
miliares da ocorrência de depressão respi- des dos receptores GABA centrais. São fre-
ratória e aceleração do processo de morte. quentemente usados no manejo da dispneia

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Capítulo 14 - Dor em Cuidados Paliativos

Tabela 14.4 - Via de administração e dose inicial dos


benzodiazepínicos alívio da dispneia e seus efeitos adversos mais
Via de administração /
frequentes (tontura e sonolência) são clinica-
Benzodiazepínicos
Dose inicial mente toleráveis. Publicação de Navigante e
Diazepam VO: 5-10mg/dia colaboradores demonstrou eficácia similar
VO: 0.25-0.5mg a cada e segurança com uso de midazolam oral em
Alprazolam
8-12hrs comparação com opioide oral.31
Lorazepam VO: 1-3mg/dia Seu uso deve ser iniciado com doses bai-
VO: 7,5 A 15mg à noite xas, aumentando-se a dose conforme a ne-
Midazolam
SC ou IV: 1-5mg cessidade. Deve ser considerada associação
Infusão contínua (SC ou IV):
5-10mg em 24horas
com neuroléptico se o paciente apresentar
confusão mental ou agitação.
Abreviações: VO (via oral), SC (subcutânea), IV (intravenosa).

Outros ansiolíticos e antidepressivos


Tabela 14.5 - Via de administração e posologia dos
broncodilatadores de curta duração
Ansiedade e depressão são condições al-
tamente prevalentes em pacientes com disp-
Via de administração /
Broncodilatadores
Posologia
neia. Observações da prática clinica sugerem
Inalação: 3-20 gotas de
que ansiolíticos, como a buspirona, e anti-
4/4h depressivos, como mirtazapina e sertralina,
Fenoterol
Associado ou não a podem apresentar efeito específico no alívio
brometo de ipatrópio
da dispneia, no entanto, até o momento, não
Inalação: 10-40 gotas de
há evidências que justifiquem seu uso em pa-
4/4h
Brometo de Ipatrópio
Associado ou não a cientes com doenças avançadas e dispneia re-
fenoterol fratária, sendo necessários mais estudos para
Terbutalina SC: 0,5 -1 mg 12/12h que sejam feitas recomendações específicas.20
Abreviação: SC (subcutânea).
Fenotiazinas
Tabela 14.6 - Via de administração e posologia dos As fenotiazinas apresentam grande varie-
corticoides dade de efeitos (antiemético, anticolinérgico,
Via de administração /
antidopaminérgico e antiadrenérgico), sendo
Corticóide
Posologia principalmente usadas como antipsicóticos
Dexametasona VO, IV ou SC: 4 a 8 mg/dia (clorpromazina) e sedativos ou como an-
Prednisona VO: 20 a 60mg/dia tihistaminicos (prometazina). Não existem
Metilprednisolona VO ou IV: 48 a 128mg evidências de que contribuem para reduzir
a dispneia, no entanto, podem ser úteis em
Abreviações: VO (via oral), SC (subcutânea), IV (intravenosa).
pacientes com alto nível de ansiedade.20
refratária em doenças avançadas, mas sem
benefícios comprovados.28 Se outras opções Broncodilatadores
de tratamento, como a morfina e terapias O broncoespamo pode ser difícil de ser
não farmacológicas, falharem em melhorar a identificado em pacientes terminais, por
dispneia, estas drogas podem ser usadas como isso em pacientes com dispneia refratária
terapia de segunda ou terceira linha. Além pode-se fazer teste terapêutico com bron-
disso, podem ser usados para tratamento da codilatadores. Se não houver melhora, de-
dispneia quando há importante componente ve-se suspendê-los. 20
psicológico associado (ansiedade).11,12 Seu uso
associado ao regime com opioide mostrou ser Corticoides
efetivo em alguns pacientes.29,30 Melhoram a sensação de dispneia nos ca-
São consideradas drogas seguras, sem sos de obstrução das vias aéreas, linfangite
evidência de causarem depressão respira- carcinomatosa, pneumonite actínica, sín-
tória com as doses usadas comumente para drome de compressão da veia cava superior

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Capítulo 14 - Dispneia em Cuidados Paliativos

e bronquite crônica, principalmente dimi- cor pulmonale ou outra evidência de dano


nuindo o edema peritumoral.20 orgânico causado pela hipoxemia. 38,39
Deve-se atentar para a ocorrência de efei- Estudo realizado por Eaton e colabo-
tos colaterais, especialmente para o apareci- radores 40 observou que em pacientes sem
mento de candidíase, que pode causar dor e hipoxemia em repouso, porém com queda
desconforto ao paciente, devendo ser preco- da saturação durante atividade física, a oxi-
cemente tratada. genoterapia ambulatorial melhorou a qua-
lidade de vida de 65% dos pacientes com
Furosemida inalatória DPOC analisados e melhorou a dispneia de
A furosemida é um diurético que aumen- 35% dos pacientes.
ta a eliminação de água corporal, sendo usa- Oxigenoterapia paliativa é geralmente
do principalmente no tratamento da insufi- considerada como administração de oxigeno-
ciência cardíaca com congestão, edema e/ou terapia especificamente para alívio da dispneia
ascite. Alguns estudos sugerem que a furo- quando PaO2< 55mmhg. Revisão sistemática
semida inibe o efeito reflexo da tosse e exer- publicada na Cochrane13 sobre oxigenoterapia
ce efeito preventivo na broncoconstrição em paliativa em adultos com doenças crônicas
pacientes com asma. Por via inalatória, pare- terminais incluiu oito estudos clínicos ran-
ce agir indiretamente na sensibilidade vagal domizados que mensuraram a intensidade
mediada no epitélio das vias aéreas. Embora da dispneia através de escalas padronizadas
seu uso pareça promissor no tratamento da em pacientes com câncer, insuficiência car-
dispneia, atualmente não existem evidências díaca e cifoescoliose. Todos os estudos incluí-
suficientes que comprovem seu beneficio por dos, individualmente, apresentavam pequeno
via inalatória.32,33 número de indivíduos analisados. Achados
Furosemida inalatória tem sido estudada conflitantes tornaram os resultados globais
em pacientes com DPOC e em pacientes com inconclusivos. Os autores concluíram que os
câncer. Ong e colaboradores34 e Jensen e cola- estudos avaliados falham em demonstrar efei-
boradores35 mostraram melhora significativa to consistente da oxigenoterapia na dispneia
do escores de dispneia com exercício. porém existem certas populações de pacientes
que podem significativamente se beneficiar
Oxigênio dessa intervenção.
A suplementação de oxigêncio é uma Os pacientes que mais se beneficiam de
das intervenções mais frequentemente re- oxigênio suplementar são aqueles com hipo-
queridas por pacientes e implementadas xemia comprovada. Na prática clínica, porém,
no ambiente hospitalar para alívio da disp- pode auxiliar no manejo da dispneia grave e
neia. 36,37 um teste terapêutico pode ser realizado por 3
Estudos em pacientes com DPOC de- a 4 dias para identificar pacientes que podem
monstram vantagens na sobrevida e quali- ter beneficio desta estratégia. O efeito parece
dade de vida com a oxigentoterapia na pre- ser mais psicológico do que objetivo. Em Cui-
sença de hipoxemia significativa. Ensaios dados Paliativos, é preferida a administração
clínicos demostraram aumento na sobrevi- de oxigênio através de cânula nasal, a não ser
da com uso de oxigenoterapia contínua ou que o paciente necessite de um fluxo maior ou
noturna para pacientes com DPOC e PaO2 apresente respiração bucal.20
<=55mmHg ou <= 60mmHg associada a
Ventilação não invasiva (VNI)
Embora a ventilação não invasiva (VNI),
Tabela 14.7 - Posologia da furosemida inalatória possa ser um tratamento efetivo para a insu-
para tratamento sintomático da dispneia
ficiência respiratória aguda, associada a exa-
Furosemida
Inalação: 1amp de 20mg cerbação de DPOC, edema agudo de pulmão e
até de 6/6h algumas doenças neuromusculares, a sua efe-

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Capítulo 14 - Dor em Cuidados Paliativos

tividade no alívio da dispneia é pouco estabe- Dispneia Terminal


lecida. A razão para o seu uso é que a redução Os pacientes com rebaixamento do nível
da carga da musculatura respiratória e, conse- de consciência nas últimas horas ou dias de
quentemente, o trabalho para se realizar a res- vida, podem apresentar alterações nos parâ-
piração, pode promover alívio da dispneia.12 metros respiratórios com períodos de apnéia
A VNI foi mais efetiva que oxigenoterapia e respiração de Cheyne-Stokes. Seus cuida-
na redução de dispneia e necessidade de uso dores e familiares devem ser informados que
de morfina em estudo envolvendo pacientes essas alterações não representam necessa-
com tumores sólidos e insuficiência respira- riamente dispneia, e devem ser orientados a
tória, particularmente naqueles com hiper- identificar sinais de desconforto.20
capnia. No entanto, 7% dos pacientes foram Diante da aproximação da morte, o reflexo
retirados do estudo devido intolerância.12 orofaríngeo diminui e há acúmulo de secre-
Em estudo descritivo de desfechos da ções nas vias aéreas. O ar que passa junto com
VNI em pacientes com diretivas antecipadas as secreções nas vias respiratórias superiores
de não intubação orotraqueal, 10% dos pa- resulta num ronco denominado sororoca e
cientes solicitaram suspensão da VNI e 76% esse ruído também pode ser interpretado er-
sofreram interrupção da qualidade do sono.13 roneamente pela família como dispneia.20
Para controle da sororoca, podem ser
Heliox usados anticolinérgicos, como a hioscina
É uma mistura de oxigênio (geralmente (buscopam®) na dose de 10 a 20mg a cada
20 a 28%) e hélio (72 a 80%). O hélio é um 4-6h por via subcutânea ou intravenosa para
gás de densidade menor que o nitrigênio, reduzir estas secreções. Na dispneia termi-
que ocorre naturalmente no ar ambiente e nal, deve-se administrar opioides e ansiolíti-
que produz menor resistência nas vias aé- cos por via oral ou subcutânea e se o paciente
reas quando inalado com oxigênio. Com- apresentar agitação ou confusão (às vezes,
parado com o oxigênio, o Heliox mostrou agravados pelo midazolam) deve-se consi-
aumentar a tolerância ao exercício em pa- derar associar um neuroléptico (haloperidol
cientes levemente hipoxêmicos com DPOC 2,5 a 5mg subcutâneo em bolus e repetir após
moderada a severa, aumentar saturação de 30 minutos se necessário).
oxigênio e diminuir escores de dispneia em O reposicionamento do paciente é impor-
pacientes com neoplasia pulmonar.13,14 Seu tante e também pode controlar esse ruido. A
alto custo e questões de viabilidade limitam aspiração orotraqueal geralmente é ineficaz
bastante seu uso.14 e não deve ser realizada pela dificuldade de
acesso do aspirador ao local contendo secre-
INTERVENÇÕES CIRÚRGICAS ção e por ser um procedimento que causa dor
Algumas doenças malignas torácicas po- e desconforto.
dem causar dispneia por obstrução de vias A dispneia terminal pode trazer grande
aéreas através de lesões volumosas ou mesmo desconforto para o paciente e seus familiares,
derrame pleural e, assim necessitar de proce- por isso deve ser precocemente identificada e
dimentos cirúrgicos como: pleurodese, dre- devidamente tratada.
nagem de tórax, pleurectomia, toracoscopia Caso os sintomas persistam, considerar
aberta ou vídeo assistida (VATS).16,17 Devemos a revisão das condutas para otimização das
sempre lembrar que condutas cirúrgicas devem medidas, sejam elas comportamentais ou
ser indicadas baseando-se principalmente na farmacológicas.13-15
funcionalidade do paciente e no real benefício
das intervenções no controle de sintomas. CONCLUSÃO
O alívio da dispneia na obstrução brôn- A dispneia é um sintoma que causa in-
quica maligna será abordado em capítulo tenso desconforto, sendo muito frequente
específico. em indivíduos durante a fase final de vida.

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Capítulo 14 - Dispneia em Cuidados Paliativos

Profissionais que atuam em Cuidados Palia- les. Ann Rheum Dis. 1978. 37:378–381.
tivos devem estar aptos a desenvolver abor- 7. NELSON JE, MEIER DE, OEI EJ ET AL.
dagens sistemáticas de controle da dispneia Self-reported symptom experience of criti-
que envolvam tratamento de causas anatô- cally ill cancer patients receiving intensive
mica e fisológicas reversíveis e terapias sin- care. Crit Care Med. 2001. 29:277–28.
tomáticas, quando doenças de base ou com- 8. BREADEN K. Recent Advances in the
plicações não podem ser revertidas. Management of Breathlessness. Indian J
Opioides orais e parenterais são a te- Palliat Care. 2011. 17:S29-S32.
rapia de primeira linha no tratamento sin- 9. BEN-AHARON I, GAFTER-GVILI A,
tomático da dispneia, porém ansiolíticos PAUL M, ET AL. Interventions for allevia-
e furosemida inalatória são terapias adju- ting cancer-related dyspnea: A systematic
vantes importantes que podem ser consi- review. J Clin Oncol. 2008. 26:2396–2404.
deradas em casos específicos. 10. GALBRAITH S, FAGAN P, PERKINS
Embora oxigenioterapia seja largamente P ET AL. Does the se of a handheld fan
utilizada para alívio da dispneia refratária improve chronic dyspnea? A randomized,
em pacientes em estágio terminal, seu uso controlled, crossover trial. J Pain Symp-
não deve ser considerado automaticamente tom Manage. 2010. 39:831–838.
em pacientes com dispneia sem hipoxemia e 11. JOBST K, CHEN JH, MCPHERSON K
não deve ser mantida nos pacientes que não ET AL. Controlled trial of acupunctu-
apresentam alívio da dispneia após 04 dias re for disabling breathlessness. Lancet.
de uso. Abordagem não farmacológica deve 1986. 2:1416–1419.
sempre ser realizada e é importante o en- 12. LEWITH GT, PRESCOTT P, DAVIS CL.
volvimento de equipe multidisciplinar para Can a standardized acupuncture techni-
adequado manejo da dispneia. que palliate disabling breathlessness: A
single-blind, placebo-controlled crosso-
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Capítulo 14 - Dor em Cuidados Paliativos

17. M AHLER DA, MURRAY JA, WATER- 26. CLEMENS KE, KLASCHIK E. Symp-
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Capítulo 14 - Dispneia em Cuidados Paliativos

35. J ENSEN D, AMJADI K, HARRIS 38. Continuous or nocturnal oxygen the-


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148

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Tosse, hipersecreção
de vias aéreas e hemotise 15
CAPÍTULO

Alana Menêses Santos


Lessandra Chinaglia

TOSSE sar dor abdominal e torácica, cefaléia, vômi-


tos, hemoptise, irritação da orofaringe, e até
Definição levar à síncope e fratura de costelas, quando
Tosse é definida como a expiração forçada muito intensa.1,3,6,7
de ar com a glote parcialmente fechada, que
produz um ruído.1,2 É produzida em decor- Etiologia
rência da transmissão de impulsos nervosos As causas de tosse são diversas. O envol-
aos centros integradores da tosse no cérebro, vimento de qualquer parte do sistema respi-
a partir de estímulos sensoriais (mecânicos, ratório pode ocasionar tosse e alguns medi-
químicos, inflamatórios e imunológicos) na camentos podem provocar este sintoma.2,4
árvore traqueobrônquica.3
É um mecanismo fisiológico complexo Avaliação
que protege as vias aéreas e pulmões através História clínica detalhada, exame físico
da remoção de muco e corpos estranhos.4 É e radiografia de tórax devem ser realizados
patológica quando não é efetiva e causa des- para identificação da causa de tosse. Na his-
conforto. Clinicamente, pode ser classificada tória, deve ser avaliado a frequência, severi-
em tosse produtiva (quando há excesso de se- dade, fatores provocativos, sintomas associa-
creção para limpeza das vias aéreas) e tosse dos à tosse e impacto na qualidade de vida e
seca (causada por irritação da via aérea). nas atividades de vida diária.1,2

Epidemiologia Manejo
A tosse tem uma prevalência de 47 a 86% Inicialmente, deve-se identificar e tratar
em pacientes com câncer de pulmão e de 23 a as causas reversíveis da tosse e afastar os fa-
37% em pacientes com câncer em geral.2 Em tores precipitantes. Muitas vezes, esta inves-
pacientes em Cuidados Paliativos, de uma for- tigação acaba sendo muito desconfortável ao
ma geral, sua prevalência varia de 29 a 83%.5,6 paciente, não sendo indicada.
A tosse crônica é um sintoma que causa Quando não for possível identificar a cau-
desconforto importante, podendo interferir sa da tosse e realizar tratamento específico,
na respiração, fala, apetite e sono. Pode cau- deve ser realizado tratamento apenas sin-

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Capítulo 15 - Tosse, hipersecreção de vias aéreas e hemotise

Tabela 15.1 - Causas de tosse


Não relacionadas ao câncer Relacionadas Ao Câncer
• Infecciosa
• Doença/lesão endobrônquica
• Insuficiência cardíaca
• Infiltração do parênquima pulmonar
• Asma
• Doença pleural (derrame pleural, mesotelioma)
• Doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC)
• Derrame pericárdico
• Bronquiectasias
• Comprometimento mediastinal
• Sinusopatia
• Linfangite carcinomatosa
• Doença do refluxo gastroesofágico (DRGE)
• Aspiração (EX. tumor de cabeça e pescoço, fístula traqueo-
• Presença de corpo estranho
esofágica, paralisia de cordas vocais)
• Irritantes: Tabagismo, fumaça, baixa umidade
• Radiação (induz fibrose, pneumonite)
• Drogas
• Quimioterapia
• Bronquite eosinofílica
• Pneumonia
• Aspiração (Ex. Esclerose múltipla, doença do neurônio
• Microembolismo
motor, demência avançada)

Adaptado de: Davis CL. ABC of palliative care. Breathlessness, cough, and other respiratory problems. BMJ. 1997 Oct
11;315(7113):931-4 e Palliative medicine in malignant respiratory diseases, Oxford Textbook of Palliative Medicine – Fourth
edition. 2010; 1108-1144.

Tabela 15.2 - Drogas que podem provocar tosse.


Classe de droga Droga específica
Inibidores da enzima conversora de angiotensina (IECA) Todos
Benzodiazepínicos Midazolam
Meios de contraste
Agentes citotóxicos Bleomicina, Metotrexato
Agentes inalatórios Ipatrópio, Salbutamol, Cromoglicato de sódio
Anti-inflamatórios não hormonais

Fonte: Dispneia, tosse e hipersecreção de vias aéreas. Manual de Cuidados paliativos. Academia Nacional de Cuidados Pa-
liativos, 2009; 104-116.

tomático. Em caso de acúmulo de secreção mentos, dieta fracionada, redução da quanti-


(tosse produtiva), deve-se melhorar a expec- dade oferecida, postura adequada).
toração (como inalação com soro fisiológico, As medidas não farmacológicas devem sem-
posicionamento adequado, fisioterapia respi- pre ser associadas ao tratamento farmacológico.
ratória) ou realizar medidas para diminuir a
quantidade de secreção (como inalação com Medidas não farmacológicas para tosse:
ipratrópio, uso de hioscina, colírio de atro- • Umidificação do ambiente
pina, brometo de propantelina). Em casos de • Nebulização com soro fisiológico
muito desconforto, pode-se iniciar medidas e • Fisioterapia respiratória para tosse pro-
drogas para supressão da tosse (ex: codeína, dutiva (drenagem postural, manobras
dextrometorfano). de higiene brônquica e exercícios de
O tratamento sintomático específico ba- reexpansão pulmonar)
seia-se em drogas que atuam nos receptores • Adoção de posturas que favoreçam a
de tosse espalhados pela via aérea superior, respiração e o conforto físico
árvore brônquica, diafragma, membrana tim- • Cabeceira elevada
pânica, seios paranasais, vasos pulmonares e • Evitar alimentos ácidos e muitos condi-
pleuras, que iniciam a condução do estimulo mentos, na suspeita de doença de reflu-
até o centro da tosse, no tronco cerebral.7,8 xo gastroesofágico
São muito importantes orientações quan- • Fracionamento da dieta
to à alimentação e nutrição para evitar bron- • Evitar ingestão de grandes quantidades
coaspirações (consistência adequada dos ali- de líquidos junto com os alimentos.

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Capítulo 15 - Tosse, hipersecreção de vias aéreas e hemotise

Tratamento específico para tosse via oral. Dose máxima de 60mg ao dia.
Em geriatria, é prática fundamental rea- A morfina também pode ser usada para
valiar constantemente as medicações em uso, alívio da tosse, principalmente em pacientes
evitando-se iatrogenia e polifarmácia. Em com dor intensa associada, iniciando-se com
pacientes com tosse, deve-se sempre atentar baixas doses, com aumento gradual (20% em
para o uso de drogas potencialmente provo- média), até melhora dos sintomas ou surgi-
cadoras de tosse e quando houver suspeita de mento de efeitos colaterais.1,4,9,10
tosse secundária ao uso de medicamentos, Outros opioides também são considera-
estes devem ser suspensos. dos como agentes antitussígenos, porém sem
estudos comparativos específicos.9
Tratamento medicamentoso sintomático – O dextrometorfano é um agente não
Drogas usadas para supressão da tosse opioide que tem demonstrado ação antitus-
sígena em estudos randomizados e controla-
Drogas de ação central dos. Suprime a tosse através de sua ação no
(opioides e não opioides) receptor opioide sigma e ação antagonista do
Os agentes antitussígenos mais eficazes são receptor n-metil-D-aspartato (NMDA). Pode
os opioides.4 A ação supressora da tosse é me- apresentar efeitos adversos no trato gastroin-
diada através dos receptores mu, kappa, delta testinal e sistema nervoso central (ex. aluci-
e sigma. São indicados em casos de tosse seca. nações). Tem duração da ação antitussígena
Dentre os opioides, a codeína é o princi- por 3-6 horas e é metabolizado no fígado.
pal medicamento usado para controle da tos- Pode ser encontrado em apresentações como
se. Tem duração de ação de 4 horas e meta- xarope, comprimidos e expectorantes. A
bolização hepática. A dose geralmente usada dose recomendada é de 10-20 mg a cada 4-6
é de 10-20 mg a cada 4-6 horas por via oral. horas por via oral, com dose máxima diá-
Apresenta dose máxima diária de 120 mg. ria de 120mg. Pode ser usado associado aos
Sua administração pode ser também via in- opioides.2
tramuscular ou subcutânea.5,6,9,10 O viminol é um analgésico simples, que
A hidrocodona é um derivado da codeína. tem efeito antitussígeno. Sua dose é de 100mg
Sua ação antitussígena tem duração de 4-6 ho- a cada 6 horas. O mecanismo de sua ação an-
ras. Dose usual de 5-10mg a cada 4-6 horas por titussígena ainda é pouco conhecido.11

Tabela 15.3 - Tratamento específico para tosse 5,6


Causa da tosse Tratamento específico
Tumor do parênquima pulmonar Radioterapia, quimioterapia, corticóide
Tumor endobrônquico Terapia endobrônquica, braquiterapia, laser e crioterapia
Fístula traqueoesofágica Inserção de stent
Linfangite carcinomatosa Corticóide
Lesão pulmonar pós radiação Corticóide
Derrame pleural ou pericárdico Retirada/aspiração do líquido
Pneumonia aspirativa Medidas de prevenção de aspiração, Antibioticoterapia
Insuficiência Cardíaca Diuréticos
Asma Broncodilatador, corticóide
Sinusopatia Anti-histamínico

DRGE Inibidor da bomba de prótons, bloqueador H2, orientação dietética

Bronquite eosinofílica Corticóide

Adaptado: Palliative medicine in malignant respiratory diseases, Oxford Textbook of Palliative Medicine – Fourth edition.
2010; 1108-1144.

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Capítulo 15 - Tosse, hipersecreção de vias aéreas e hemotise

Em casos de tosse persistente, refratária • Brometo de ipratrópio: agente anticolinér-


ao tratamento com opioides em doses ade- gico que tem sido proposto como tendo,
quadas, pode-se realizar sedação paliativa, pelo menos, 2 mecanismos que podem
de acordo com a vontade do paciente ou, na atuar no alívio da tosse:
impossibilidade de decisão deste, da família. • Bloqueio do reflexo eferente da tosse
nos pulmões
Drogas de ação periférica • Redução do estímulo aos receptores da
• Cromoglicato de sódio inalatório: reduz tosse por alteração dos fatores muco-
significativamente a tosse em pacientes ciliares1,4
com câncer de pulmão e não apresenta • Corticoides inalatórios – indicados quan-
efeitos adversos significativos. Dose reco- do houver suspeita de tosse secundária à
mendada: 2 “puffs” (40mg/dia)2 inflamação das vias aéreas.
• Nebulização com anestésico local: pode
aliviar a tosse crônica sem resposta a ou- HIPERSECREÇÃO DE VIAS AÉREAS
tras medidas. A efetividade e toxicidade A secreção das vias aéreas é produzi-
desses agentes ainda não foram totalmen- da pelas glândulas salivares e pela mucosa
te estabelecidas. A dose geralmente usada brônquica. Pacientes em Cuidados Paliativos
é de 5 ml de solução a 2% de lidocaína a podem apresentar-se hipersecretivos devido
cada 6 horas ou 5 ml de solução a 0,25% de afecções pulmonares ou de vias aéreas que
bupivacaína a cada 8 horas. É recomenda- podem manifestar-se em qualquer fase da
do o uso prévio de broncodilatador devi- doença de base. Define-se como broncorreia
do risco de broncoespasmo. Essa medida a expectoração acima de 100ml de secreção
reduz a sensibilidade do reflexo de vômito em 24 horas.6
e causa rouquidão transitória. Os pacien- O excesso de secreção em via aérea pode
tes devem ser orientados a não ingerir causar grande sofrimento, interfere no sono
alimentos 4 horas antes e 2 horas após a do paciente, induz tosse, predispõe a infec-
nebulização.1,4 ções e aumenta a ocorrência de dispneia.1
• Benzonatate: droga anestésica local que Sessenta a noventa por cento dos pacien-
age diminuindo o reflexo de estiramento tes em fase final de vida, quando evoluem
das vias aéreas inferiores e pulmão, redu- com rebaixamento do nível de consciência,
zindo a tosse. Tem início de ação em 15-20 apresentam aumento da produção de secre-
minutos e duração de 3-8 horas. Dose diá- ção, com acúmulo em vias aéreas, levando à
ria de 100-200 mg.1,4 congestão respiratória terminal, que se apre-
• Levodropropizina: age por inibição do refle- senta como uma respiração ruidosa, conhe-
xo da tosse, através da redução da excitabi- cida como “sororoca” ou “death rattle”. A
lidade dos receptores traqueobrônquicos.1,4 ocorrência de sororoca, na maior parte das

Quadro 15.1 - Drogas que podem ser usadas para aliviar broncorreia.
Droga Mecanismo de ação Dose
Hioscina Anticolinérgica 0,4mg SC 4/4h até 30/30min
2 gotas em casa bochecha a cada 6 a
Atropina Anticolinérgica
12h
Expectorantes
N-acetilcisteína Mucolítico Via oral ou inalatório
Prednisona / hidrocortisona /
Corticóide 0,5-1mg/kg/dia e doses equivalentes
dexametasona
inibe a síntese e secreção de muco pelos
Eritromicina 500mg de 6/6h
macrófagos pulmonares)
Broncodilatadores Fenoterol (nebulização)
Octreotide Efeito antisecretório 0,2-0,9mg/24h (alto custo)

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Capítulo 15 - Tosse, hipersecreção de vias aéreas e hemotise

vezes, causa angústia importante e sofrimen- O papel do fisioterapeuta é fundamental,


to nos familiares, devendo receber especial através de manobras de drenagem postural,
atenção da equipe de saúde, que deve expli- higiene brônquica e exercícios de reexpan-
car à família o que causa este problema e que são pulmonar.
este geralmente é um sinal que aparece nos O tratamento farmacológico sintomático
últimos dias ou horas de vida, preparando os baseia-se no uso de medicações para redução
familiares para este momento.6,8,10 da hipersecreção de vias aéreas, como agen-
tes anticolinérgicos, ou de medicações que
Manejo clínico auxiliem na eliminação da secreção, como
É importante identificar a causa do aumen- expectorantes e mucolíticos.
to de secreção das vias aéreas para que se pos- Para pacientes em cuidados de final de
sa instituir o tratamento adequado. Porém, a vida, visando evitar a ocorrência de broncor-
conduta em cada caso deve ser individualizada, reia e/ou diminuir a quantidade de secreção
considerando-se o status do paciente, o estágio produzida, deve-se evitar hiperhidratação
da doença, a causa identificada e a proposta venosa ou subcutânea.6
terapêutica, tendo sempre como base os prin-
cípios da beneficência, não maleficência e auto- HEMOPTISE
nomia. Desta forma, embora a aspiração de vias Hemoptise é a saída de sangue, oriundo
áreas não seja recomendada de forma rotineira das vias respiratórias, pela glote. É um sinal
por causar dor e desconforto, deve ser avaliada alarmante para pacientes e familiares, cau-
caso a caso, podendo ser útil em pacientes que sando grande angústia e ansiedade.6
persistem muito secretivos e com desconforto É o sintoma inicial em 7 a 10% dos pa-
respiratório, apesar do tratamento sintomático cientes com câncer de pulmão e está presente
otimizado; pacientes em fase final de vida, em em 40-70% dos pacientes em Cuidados Pa-
Cuidados Paliativos exclusivos, podem benefi- liativos em geral.6 As causas principais são
ciar-se de antibioticoterapia se for diagnostica- listadas na tabela 15.4.
do infecção como causa da broncorreia e esta
estiver causando intenso desconforto, sendo Manejo clínico
esta terapia instituída com o objetivo de pro- Inicialmente, é importante que seja iden-
porcionar controle do sintoma e conforto. tificado o local e a fonte do sangramento para
Uma medida simples, mas muito im- a escolha do melhor tratamento para cessar o
portante, que deve sempre ser realizada é o sangramento. Avaliação da função renal, he-
posicionamento adequado da cabeça e das pática e da presença de coagulopatia também
vias aéreas do paciente, facilitando a dre- são recomendadas. O sangramento pode
nagem de secreções, evitando acúmulo e, ter origem dos brônquios ou da circulação
assim, desconforto. pulmonar. A investigação pode ser feita por

Tabela 15.4 - Causas de hemoptise


Neoplásicas Paraneoplásicas Não neoplásicas
Câncer pulmão Trombocitopenia Pneumonia
Tumor traqueal Disfunção plaquetária Tuberculose
Coagulação intravascular disseminada
Tumor endotraqueal Infecção fúngica pulmonar
(CIVD)
Metástase endotraqueal (mama,
Embolia pulmonar Bronquiectasia
cólon, células renais)
Neoplasia hematológica Doença hepática
Fistula tumor-vaso sanguíneo Medicações (anticoagulante, AINH)
Fonte: Palliative medicine in malignant respiratory diseases, Oxford Textbook of Palliative Medicine – Fourth edition. 2010;
1108-1144.

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Capítulo 15 - Tosse, hipersecreção de vias aéreas e hemotise

exames de imagem não invasivos (radiogra- do. Alguns autores consideram a saída
fia de tórax ou TC de tórax) ou método in- de sangue >100ml em 24 horas. Situa-
vasivo (broncoscopia), devendo-se analisar ção de alta mortalidade (60-100%) que
criteriosamente cada caso.1 causa extremo desconforto e angústia
As opções de tratamento da hemoptise para o paciente e familiares. Deve ser
são: terapia medicamentosa, procedimentos iniciado o mais precocemente possí-
invasivos (broncoscopia, terapias endobrôn- vel sedação paliativa para alívio do
quicas, embolização arterial), tratamento desconforto e sofrimento. O uso de
oncológico (radioterapia) ou paliação exclu- toalhas e lençóis escuros para cobrir o
siva em caso de hemoptise fatal. paciente é útil para reduzir o impacto
visual da presença do sangramento.6,8
✓✓Hemoptise leve a moderada: sem indica- Pacientes em estágio final da vida
ção de tratamento específico. O ideal é devem receber medidas de conforto,
tranquilizar paciente e familiares.6 da forma menos agressiva possível. A
família deve ser informada da possi-
✓✓Hemoptise moderada a grave:6,8 bilidade de ocorrência de hemoptise e
• Reposição volêmica em caso de insta- devem ser discutidas antecipadamente
bilidade hemodinâmica as possibilidades de tratamento e me-
• Aspiração de vias aéreas e oxigeniote- didas de conforto. Suporte emocional
rapia para corrigir hipoxemia e atenção especial deve ser dado à fa-
• Posicionar o paciente em decúbito la- mília do paciente e toda equipe que
teral (para o lado do sangramento para acompanhou o paciente durante o
proteger o outro pulmão, quando pos- evento e morte, pois o impacto psico-
sível) lógico de presenciar a morte de um pa-
• Correção de coagulopatias ciente em hemoptise maciça é enorme.
• Uso de drogas anti-fibrinolíticas (áci-
do tranexâmico ou ácido aminoca- REFERÊNCIAS
próico) – usados empiricamente sem 1. B ONNEAU A. Cough in the palliative
efeitos comprovados. Dose do ácido care setting. Can Fam Physician. 2009
tranexâmico é de 1,5 g (ataque) segui- Jun. 55(6):600-2.
do de 1 g três vezes ao dia e do ácido 2. Palliative medicine in malignant res-
aminocapróico é de 5 g (ataque) segui- piratory diseases, Oxford Textbook of
do de 1 g quatro vezes ao dia. Palliative Medicine – Fourth edition.
• Vasopressina aerossol 2010. 1108-1144.
• Broncoscopia com terapêutica local e 3. Tosse, broncorreia e hemoptise em Cui-
angiografia com embolização arterial dados Paliativos. Cuidado Paliativo.
para controle do sangramento (avaliar Conselho regional de medicina do Esta-
benefício em pacientes em Cuidados do de São Paulo. 2008. 416-420.
Paliativos por se tratar de medida in- 4. DAVIS CL. ABC of palliative care.
vasiva) Breathlessness, cough, and other res-
• Radioterapia hemostática (taxas de su- piratory problems. BMJ. 1997 Oct 11.
cesso de 83-90%) e braquiterapia 315(7113):931-4.
• Cirurgia em casos específicos 5. K VALE PA, SIMOFF M, PRAKASH
UBS. Palliative Care. Chest. 2003. 123;
✓✓Hemoptise maciça: 284S-311S.
• É definida como a expectoração de 6. H ENSE J. Palliation for respiratory syn-
grande quantidade de sangue e/ou drome. Urologe A. 2007 Jan. 46(1):14-
sangramento em ritmo muito acelera- 20. Review. German.

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Capítulo 15 - Tosse, hipersecreção de vias aéreas e hemotise

7. Dispneia, tosse e hipersecreção de vias 10. K VALE PA, SELECKY PA, PRAKASH
aéreas. Manual de Cuidados paliativos. UB. American College of Chest Phy-
Academia Nacional de Cuidados Palia- sicians. Palliative care in lung cancer:
tivos. 2009. 104-116. ACCP evidence-based clinical practice
8. Manual of Palliative Care. International guidelines. 2nd edition. Chest. 2007.
Association for Hospice & Palliative Care. 132(3 Suppl):368S-403S.
2nd Edition. Published by IAHPC Press. 11. MORONI M, CAVALLI G, LODOLA
2008. E. Viminol analgesic activity in elderly
9. SCULLION JE, HOLMES S. Palliative patients with chronic pain: a controlled
care in patients with chronic obstructive evaluation, using self-rating question-
pulmonary disease. Nurs Older People. naires. Int J Clin Pharmacol Biopharm.
2011 May. 23(4):32-9. 1978. Nov. 16(11):513-5.

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Manejo de náuseas e vômitos em
Cuidados Paliativos 16
CAPÍTULO

Ana Laura de Figueiredo Bersani


Priscila Gaeta

INTRODUÇÃO dioterapia, medo ou ansiedade, dentre ou-


Náuseas e vômitos são sintomas muito tras). Aproximadamente 30% dos pacientes
prevalentes em Cuidados Paliativos1-4 e bas- que recebem opioides, na primeira semana
tante estressantes para o paciente e seus fa- de tratamento podem apresentar náuseas e
miliares4, assim, seu manejo adequado tem vômitos1,4,6 que desaparecem em poucos dias,
um impacto positivo na qualidade de vida mas que pode contribuir para o desenvolvi-
desses pacientes. A prevalência de náuseas mento da síndrome da anorexia-caquexia.
e vômitos nos idosos é expressiva e mais da O manejo terapêutico deve ser escolhido
metade desses indivíduos não recebem trata- conforme o provável mediador envolvido na
mento para esses sintomas. causa da náusea, isto é, dopamina, serotoni-
Náusea é uma sensação subjetiva de- na, histamina ou vias colinérgicas. Os prin-
sagradável em epigástrio e orofaringe que, cipais antagonistas dopaminérgicos, halope-
frequentemente, culmina com vômito3,5 E ridol e metoclopramida podem causar efeitos
vômito é a eliminação forçada do conteúdo extrapiramidais e o haloperidol deve ser usa-
gástrico através da boca.3,5 do com cautela na população geriátrica pelo
São mais frequentes em pacientes com efeito da sonolência.
neoplasia avançada, principalmente tumores
gástricos, ginecológicos e intestinais.3 Mas FISIOPATOLOGIA
não são apenas os pacientes oncológicos que Para melhor tratar esses sintomas, é impor-
apresentam esses sintomas, também aqueles tante compreender o mecanismo fisiológico de
com síndrome da imunodeficiência adquiri- náuseas e vômitos e seus mediadores.3,7
da (SIDA), insuficiência renal grave, insufi- • Centro do vômito (CV) – integra o
ciência hepática e doenças gastrointestinais.4 estímulo emetogênico com a atividade
A etiologia na maioria das situações de eferente motora e parassimpática para
náuseas e vômitos é múltipla e ocasional- gerar o reflexo de vômito. Esse reflexo
mente, é possível identificar e reverter a cau- é bastante complexo e envolve compo-
sa específica (fármacos, constipação ou obs- nentes motores do trato respiratório e
trução intestinal, alteração metabólica, tosse, salivar, vasomotores e somáticos. As-
uremia, monilíase oral, quimioterapia e ra- sim, o CV atua como o centro gerador

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Capítulo 16 - Manejo de náuseas e vômitos em Cuidados Paliativos

desse estímulo. O CV situa-se na for- estimular os receptores de ACh ou H13,


mação reticular lateral e recebe estí- provocando náusea ou vômito.
mulos aferentes de diferentes áreas. Os • Córtex cerebral e sistema límbico –
principais neurotransmissores envol- Apresenta múltiplos receptores que
vidos são acetilcolina (ACh), histami- podem ser estimulados por ansiedade,
na(H1) e hidroxitriptamina 2(5HT2).3 medo e outros sentimentos. E também,
• Zonas quimiorreceptoras - A mais por hipertensão intracraniana e irrita-
importante está localizada no assoalho ção meníngea.3-5
do quarto ventrículo e fora da barrei- • Trato gastrointestinal (TGI) – São
ra hematoencefálica. As projeções dos inúmeros mecanismos envolvidos,
neurônios da zona quimiorreceptora podemos citar a presença de quimior-
estendem-se até o núcleo do trato so- receptores na parede do TGI (seroto-
litário e formação reticular que são nina), o estímulo vagal mediado por
estruturas do CV. Os principais media- neurotransmissores ao núcleo do trato
dores nessa região são dopamina(D2) solitário (serotonina, dopamina, hista-
e serotonina(5HT3).4 Os estímulos po- mina, ACh e NMDA) e motilidade do
dem ser desencadeados por medica- TGI (dopamina e serotonina).3,5
mentos (opioides, antidepressivos tri-
cíclicos e inibidores seletivos da recep-
tação de serotonina, antiinflamatórios ABORDAGEM DA NÁUSEA E VÔMITO EM
e quimioterápicos), toxinas, infecção, CUIDADOS PALIATIVOS
insuficiência hepática e renal, fatores
tumorais, metabólicos, hipercalcemia e Diagnóstico
hiponatremia.3 Essa área também rece- A história clínica deve ser minuciosa,
be as vias aferentes do sistema vestibu- considerando a doença do paciente e os tra-
lar e do nervo vago.8 tamentos já realizados, os medicamentos
• Sistema vestibular – Discinesias ou atualmente em uso, o início da náusea e/ou
outras alterações vestibulares podem vômito, sua duração, frequência e intensida-

SNC
Hipotálamo/Tálamo/Córtex cerebral

Zona quimiorreceptora Ach


Centro do Vômito Sistema Vestibular
5HT3 D2 H1

Achh 5HT2T H1

Trato Gastrointestinal
Circulação sistêmica:
Drogas/ Toxinas/
Metabólitos Visceras e Serosas:
Cabeça e Pescoço
Tórax/Abdômen/Pelve

Figura 16.1 - Representa as vias, neurotransmissores, sistemas e regiões envolvidas na fisiopatologia da náusea e vômito 4 -
adaptado.

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Capítulo 16 - Manejo de náuseas e vômitos em Cuidados Paliativos

de em escala de 0 a 10 (através da Edmonton Tratamento


Symptom Assessment Scale– ESAS, quando Estratégias para a escolha da
possível ser aplicada ao paciente), fatores de- terapia antiemética
sencadeantes, fatores de melhora ou piora e • Identificar as causas mais prováveis da
as características do vômito (fecalóide, biliar, náusea e/ou vômito;4,5
alimentar, líquido de estase, em jato). Veri- • Identificar a via pela qual o reflexo de
ficar a presença de outros sintomas associa- náusea e/ou vômito foi desencadeado e
dos, como boca seca, perda de apetite, dor e quais os neurotransmissores envolvi-
fadiga.3 Esse sintoma precisará ser avaliado dos (dopamina, histamina, serotonina
periodicamente para seu adequado manejo. ou vias colinérgicas);4
No exame físico, buscar sinais de desi- • Escolher o antiemético mais potente como
dratação ou infecção, distensão abdominal, antagonista do receptor identificado;4
presença de massas abdominais ou ascite, ic- • Escolher a via de administração que
terícia, avaliar cavidade oral, exame de fundo assegure que o medicamento atingirá
de olho para afastar papiledema, rigidez de o sítio de ação (considerar uso retal e
nuca e sinais meníngeos, e também, exame subcutâneo);4,5
proctológico, quando necessário. • Titular a dose com cuidado, reavaliar o
De acordo com os achados da história e paciente frequentemente e administrar
exame físico, investigações complementares o antiemético regularmente;4,5
com hemograma, urocultura e radiografia de • Se os sintomas persistirem, rever as
tórax para afastar foco infeccioso: função re- causas mais prováveis da náusea e/ou
nal, eletrólitos e função hepática podem aju- vômito. Pode ser necessário um tra-
dar a esclarecer a causa do sintoma. Se houver tamento adicional ou um tratamento
suspeita de obstrução intestinal, radiografias alternativo para alguma causa que não
de abdome em pé e em decúbito horizontal foi identificada previamente.4,9
são importantes. Em casos de piora da fun-
ção renal, pode-se solicitar ultrassonografia Tratamento não farmacológico
de rins e vias urinárias, principalmente em • Roupas confortáveis;
pacientes com tumores pélvicos.3 • Manter um ambiente descontraído e
O idoso sempre deve ser avaliado na di- agradável;
mensão psicológica, física, social e espiritual, • Comer pouca quantidade e de forma
afim de analisarmos melhor sua biografia e fracionada. Se o paciente preferir não
assim conseguir proporcionar melhor quali- comer ou beber para evitar náusea/vô-
dade de vida. mito, respeitar sua decisão5;
O estabelecimento da performance do • Evitar alguns tipos de alimentos (do-
paciente através da Palliative Performance ces, gordura, sal em grande quantida-
Scale (PPS) é extremamente importante na de, tempero picante ou alimentos com
tomada de decisões terapêuticas. odores desagradáveis)4,5;
O médico deve explicar muito bem ao • Consultar nutricionista, se necessário;
paciente e seus familiares, o que está acon- • Controle do odor de colostomias, tu-
tecendo, sobre as investigações clínicas mores e úlceras por pressão4,5;
e as causas mais prováveis desse sintoma • Tentar terapias complementares (rela-
e assim, as possíveis condutas neste mo- xamento, massagem, acupuntura)1,4.
mento. 3 Compartilhar decisões sempre que
possível com o paciente e seus familiares Tratamento farmacológico
é fundamental em Cuidados Paliativos. A A. Drogas com ação em receptores específicos:
equipe profissional da unidade deve estar Antagonistas do receptor de Dopamina (D2)
orientada e atualizada sobre a situação de • Haloperidol: é o mais potente antagonista
cada paciente. de dopamina na zona quimiorreceptora.4

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Capítulo 16 - Manejo de náuseas e vômitos em Cuidados Paliativos

• Metoclopramida e Domperidona: tem causar problemas, como boca seca, íleo


certa ação antidopaminérgica na zona paralitico, retenção urinária e visão tur-
quimiorreceptora, antagoniza a dopa- va. Sonolência não é incomum. A hiosci-
mina no estômago e estimula os recepto- na não tem ação antiemética central, sua
res 5HT4 (a liberação de acetilcolina por ação anticolinérgica no estômago reduz o
esses receptores tem papel importante peristaltismo e inibe a secreção exócrina,
na reversão da gastroparesia e melhora contribuindo para o tratamento paliativo
a peristalse no trato gastrointestinal su- da dor abdominal e náusea na obstrução
perior). Os efeitos extrapiramidais são intestinal.4
comuns e esse uso está sendo substituído • Glicopirrolato: é um potente anticolinér-
por antagonistas específicos de 5HT3 na gico periférico, com potência semelhante
êmese pós-quimioterapia. Todos os agen- à atropina, porém com menor penetração
tes procinéticos podem induzir dor ab- no SNC. Pode ser usado como alternativa
dominal em obstruções intestinais. Não à hioscina.4
se deve associar drogas procinéticas com
anticolinérgicos, pois estes bloqueiam a Antagonistas do receptor da Serotonina (5HT3)
ação daqueles.4 Mostrou bons resultados na náusea de
• Fenotiazidinicos: são antagonistas menos aparecimento precoce pós-quimioterapia
potentes da dopamina. Eles antagonizam (primeiras 24 horas), mas não na êmese tar-
vários receptores, o que causa diversos dia. Embora seja extremamente efetivo na
efeitos colaterais, como hipotensão, seda- êmese induzida pela quimioterapia, não foi
ção e boca seca. Reações extrapiramidais demonstrado o papel dessa medicação no
podem ocorrer com todos os antagonistas manejo da náusea e/ou vômito por outras
da dopamina, embora com a domperido- causas. Essa droga não é capaz de reverter a
na seja mais rara. A levomepromazina náusea e/ou vômito induzida pela dopamina
em alta dose bloqueia um grande número (por exemplo, a induzida pelo opioide), e não
de receptores, porém é muita sedativa e foi adequadamente testada na síndrome da
hipotensora, principalmente em idosos. náusea e vômito associada a SIDA e neopla-
Em baixas doses é útil como antiemético sias avançadas. Para casos de pós-operató-
(5-12,5 mg em 24h por via oral ou sub- rios, foi aprovado nos EUA a ondansetrona,
cutânea).4 seu beneficio é esperado em 25% dos casos e
não é superior à metoclopramida.4
Antagonista do receptor de Histamina (H1) Pode haver um aumento na atividade
Os anti-histamínicos agem no receptor de reflexa eferente vagal e isso levar bradiarrit-
histamina do centro do vômito e na via afe- mias temporárias e prolongamento do inter-
rente do sistema vestibular. Somente a ciclizi- valo QTc em pacientes que recebem múlti-
na está disponível na formulação subcutânea7 plas doses.4 Não há ajuste de dose em idosos.
(porém não está disponível no Brasil). Existem vários antagonistas disponíveis,
porém não foi demonstrado superioridade
Anticolinérgicos entre eles.
• Hioscina (Escopolamina): bloqueia os
receptores muscarínicos da acetilcolina Antagonistas do receptor de Neurocinina
no centro do vômito e perifericamente. tipo 1 (NK1)
Pode ser administrada por via sublingual, Os receptores de NK1 são amplamente
subcutânea e transdérmica. Seus efeitos distribuídos pelo SNC e, principalmente, nas
colaterais são decorrentes do bloqueio áreas relacionadas com a êmese. Essas dro-
parassimpático, que até podem ser bené- gas mostram-se promissoras no controle da
ficos, como a diminuição de secreções e êmese de aparecimento tardio relacionada à
diminuição de dor abdominal (cólica) ou quimioterapia. Algumas análises demons-

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Capítulo 16 - Manejo de náuseas e vômitos em Cuidados Paliativos

traram que durante as primeiras 8 horas de- Essa combinação de efeitos o torna útil no
pois de uma quimioterapia emetogênica há tratamento paliativo da náusea causada por
estimulação de receptores 5HT3, posterior- obstrução intestinal, pois reduzindo a secre-
mente a ativação dos receptores NK1 e, en- ção exócrina do estômago ele reduz a dis-
tão, a perda da resposta dos antagonistas de tensão gástrica o que diminui o estímulo à
receptores 5HT3. O primeiro antagonista de náusea e cólica.4
NK1 só está disponível em formulação oral. Propofol: é um agente anestésico parente-
Sugere-se beneficio dessa droga em casos de ral, que promove diminuição da náusea no pós
pós-operatórios 4,10. -operatório. Estudos recentes demonstraram
que na dose subhipnótica tem ação antiemética
B) Outras drogas antieméticas em pós-anestésicos e na êmese induzida por
Corticóide: tem propriedade antiemética quimioterapia. A ação antiemética é mais longa
intrínseca e potencializa o efeito de outras do que a ação hipnótica, o que sugere que a hip-
drogas antieméticas. Acredita-se que o cor- nose e o efeito ansiolítico não são os mecanis-
ticóide poderia aumentar o tônus antiemé- mos antieméticos da droga. Provavelmente, há
tico na medula e o efeito anti-inflamatório uma ação subcortical juntamente com a zona
do corticóide pode diminuir o tamanho da quimiorreceptora e o CV.4
massa tumoral, reduzindo assim o estímulo Opioides: podem induzir ou inibir a
emético nos receptores autonômicos perifé- êmese em modelos experimentais, ambas as
ricos e tumores intracranianos 4. ações podem ser antagonizadas pelo naloxo-
Canabinóides: embora a Cannabis seja ne. Sugere-se que os receptores e/ou são
mais efetiva do que seus análogos sintéticos, emetogênicos enquanto que os receptores µ
estes tem efeito antiemético com ou sem ação são antieméticos. Ainda faltam estudos sobre
psicotrópica. O uso legalizado de canabinói- as drogas µ especificas e seu papel como te-
des é limitado pelo seu principal efeito cola- rapia antiemética. Experimentalmente, mos-
teral psicotrópico (disforia nos idosos). Esse trou-se que o fentanil em dose subanestésica
efeito pode ser reduzido com baixas doses de pode inibir a êmese causada pela morfina e
fenotiazidinicos, porém pode haver sonolên- pela cisplatina e ambos os efeitos são reverti-
cia o que pode inviabilizar o efeito terapêuti- dos pelo naloxone10.
co dessa classe. Mais estudos devem ser fei- O controle dos sintomas utilizando ape-
tos para o uso de canabinóides em neoplasia nas um antiemético é possível em 60% dos
avançada.4 pacientes. Porém um terço dos pacientes
Benzodiazepínicos: são usados em com- necessitará de uma segunda droga1,5. Nesses
binações de drogas antieméticas na quimio- indivíduos devem-se combinar drogas com
terapia. Embora eles tenham pouco efeito diferentes mecanismos de ação1.
antiemético propriamente dito, nessas com-
binações eles reduzem a ansiedade, reduzin- PRINCIPAIS SÍNDROMES
do a náusea antecipatória. Essas drogas são ASSOCIADAS A NAUSEA
sedativas e amnésticas e quando usadas em E VÔMITO EM CUIDADOS PALIATIVOS
doses efetivas podem ser muito úteis em pa- Nas doenças mais avançadas geralmente
cientes com náusea crônica.4 Nos pacientes a náusea e o vômito estão associados a mais
idosos, a droga deve ser usada com cautela de uma causa e envolvem mais de uma via.
pelo risco de causar delirium. Quando o tratamento adequado falhar no
Octreotide: é um análogo de longa ação controle desses sintomas, é necessário rever
da somatostatina que inibe as secreções en- causas adicionais e menos óbvias4,9,10,11.
dócrinas e exócrinas, além de promover a
reabsorção de eletrólitos no estômago. Há Causas químicas de êmese
evidências clínicas de que pode haver res- A náusea e vômito induzidos por dro-
tauração do trânsito gastrointestinal normal. gas podem acontecer pela ação química de

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Capítulo 16 - Manejo de náuseas e vômitos em Cuidados Paliativos

diversas drogas na zona quimiorreceptora, possíveis efeitos extrapiramidais.4


pela liberação de serotonina no estômago, • Náusea induzida por citotoxicidade
por irritação gastrointestinal e estase gás- secundária à quimioterapia: é media-
trica, ou pela combinação desses fatores.10 da pela zona quimiorreceptora e pelos
• Induzida por opioides: Um terço dos receptores de serotonina (5HT3) na via
pacientes apresenta esses sintomas de aferente do nervo vago no estômago. A
maneira transitória no início do trata- associação de outras drogas que agem
mento, notando-se uma melhora após em sítios diferentes pode melhorar a efe-
3 a 4 dias.12 Os sintomas podem reapa- tividade do tratamento, principalmente
recer quando houver aumento de dose e na êmese tardia. A combinação de anta-
pode permanecer de maneira persistente gonistas do receptor de 5HT3 com cor-
na minoria dos pacientes. Nesses casos, ticoide e/ou benzodiazepínico mostrou-
deve-se usar um antiemetico e também se bastante útil na êmese induzida pela
ajustar o uso do opioide (mudança do quimioterapia com cisplatina. A asso-
opioide ou da via de administração).12 ciação com os antagonistas do receptor
O aparecimento de náusea associada a NK1 também.4,10 Os idosos geralmente
outros sintomas de toxicidade por opioi- são mais sensíveis aos efeitos de náusea
de como pupila miótica, sonolência e e vômito induzidos por quimioterapia,
mioclonia rápida, em pacientes que já considerando a diminuição da função e
usavam opioides e que mostravam to- reserva de seus órgãos, e talvez possível
lerância à droga previamente, pode ser desnutrição e desidratação.
um sinal de declínio de função renal.4 A
dose e frequência de administração da Causas Gastrointestinais
droga devem ser diminuídas ou deve ser • Irritação faríngea: a região orofaríngea é
substituída por dose equivalente de ou- ricamente inervada pelo nervo glossofa-
tro opioide que não tenha excreção renal ríngeo e vago, portanto, muito sensível
de metabólito ativo (rodízio de opioi- ao toque. A irritação faríngea pela pre-
de).10 A morfina geralmente causa mais sença de escarro viscoso e candidíase na
vômito que a oxicodona e em relação à mucosa oral pode estimular o CV por es-
náusea não há muita diferença com as sas duas vias aferentes causando náusea
duas medicações. e vômito. A tosse induzida pela irritação
Alguns pacientes apresentam estase faringeana, também pode causar êmese.
gástrica induzida pelo opioide, e não Deve-se instituir terapia antimicrobiana
há desenvolvimento de tolerância a esse adequada para as infecções de cavidade
efeito.4 Deve-se associar um agente pro- oral, faringe, esôfago e trato respirató-
cinético, em doses elevadas ou substituir rio. E a fluidificação do escarro com ina-
por outro opioide se não houver melhora lações também pode ser necessária. A
sintomática. tosse noturna, que pode levar a vômito
• Causas metabólicas: comum em doen- e distúrbios do sono deve receber trata-
ças avançadas, principalmente quando mento paliativo com anestésicos locais.4
há falência orgânica (insuficiência renal • Retardo do esvaziamento gástrico (esta-
e/ou hepática), hipercalcemia, hipona- se gástrica e obstruções ao fluxo): pode
tremia e cetoacidose que geralmente ser decorrente de alteração fisiológica ou
apresentam-se de maneira insidiosa, mecânica. Entre as mecânicas temos as-
porém progressiva. A náusea pode ser cite, hepatomegalia, obstrução pilórica,
controlada com um antagonista do re- úlceras ou tumores duodenais e câncer
ceptor de dopamina (D2), nesses casos pancreático. Essas obstruções podem ser
altas doses de haloperidol podem ser parciais ou totais. Entre as fisiológicas,
necessárias (5-20mg/dia), resultando em inclui-se efeito anticolinérgico de drogas

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Capítulo 16 - Manejo de náuseas e vômitos em Cuidados Paliativos

e disautonomia.4 É um dos mecanismos Causas intracranianas


da êmese induzida pelos opioides. Há O aumento da pressão intracraniana
ativação do centro do vômito pelas vias pode apresentar-se de maneira precoce
aferentes do nervo vago através de meca- com náusea e vômito. A irritação menín-
norreceptores no estômago. gea, tumor intracraniano, metástase óssea
O tratamento pode ser feito com o uso de de crânio, sangramento intracraniano e
agentes procinéticos (a metoclopramida edema cerebral também podem desenca-
é a droga de escolha) e redução de se- dear êmese.4 O tratamento de escolha é o
creções gástricas com inibidores de H2, uso corticóide em dose alta.1,3,4 Pode ser
inibidores de bomba de prótons, octreo- necessário o uso de um antiemético que
tide e eritromicina (EV) nos casos não tenha ação no CV (dimenidrinato), prin-
responsivos.1 cipalmente se houver sintomas vestibula-
Nas obstruções gástricas totais o manejo res ou discinesia associados.1,4 Em alguns
deve ser feito como numa obstrução in- casos, pode ser indicado cirurgia, radio-
testinal alta. Deve-se interromper o uso terapia ou quimioterapia paliativa para
de prócinéticos. A passagem de sonda melhor controle desses sintomas. 3,4
nasogástrica (SNG) pode ser útil e bem
tolerada por alguns pacientes.1 Lembrar- Outras causas de êmese
se de retirar a SNG após melhora clínica. • Náusea e vômito induzida por ansie-
• Distensão e alteração anatômica do dade: é uma situação comum. O pa-
trato gastrointestinal: complicação ciente com doença avançada pode ser
comum de tumor abdominal, retrope- capaz de identificar a ansiedade como
ritoneal e pélvico, que através da ati- desencadeador da êmese ou associar os
vação de mecanorreceptores (parede sintomas com situações estressantes.
intestinal, serosa visceral e parietal No entanto, devem ser excluídas outras
de alguns órgãos abdominais e pélvi- causas de náusea e vômito. O tratamen-
cos) através do estiramento/distorção, to é identificar a ansiedade como causa
invasão direta pelo tumor ou aumento de êmese e instituir técnicas de relaxa-
da pressão transmural na região proxi- mento.4 Os benzodiazepínicos podem
mal a uma obstrução (exemplo, ureter ser úteis como terapia adjuvante a curto
ou cólon), o estímulo chega ao centro prazo3,4, preferindo-se os de meia vida
do vômito através do nervo vago e es- longa nos adultos, que são dados em
plâncnico. A inf lamação local pode dose única (dose noturna), como o dia-
potencializar a estimulação desses re- zepam. Já nos idosos, deve-se preferir
ceptores no trato gastrointestinal. Se os de meia vida média ou curta como
a causa for irreversível, pode ser feito o lorazepam e clonazepam, lembrando
tratamento paliativo da náusea e vômi- dos seus efeitos adversos como piora
to com antieméticos que atuam no cen- cognitiva e estado confusional agudo,
tro do vômito. O controle dos sintomas sonolência, hipotensão postural e maior
pode ser mais difícil se houver obstru- risco de quedas. Alguns pacientes be-
ção do trato gastrointestinal.4 neficiam-se dos tricíclicos, pela pro-
• Constipação: é uma causa importante priedade ansiolítica secundária, como a
de náusea e anorexia em doenças avan- nortriptilina, mas em idosos apresenta
çadas, deve-se tratar a constipação ade- efeitos anticolinérgicos importantes
quadamente e o uso de antieméticos que que devem ser considerados.
atuam no centro do vômito pode ser • Êmese antecipatória: é uma respos-
útil. Recomenda-se evitar drogas com ta condicionada que alguns pacientes
ação anticolinérgica, pois podem piorar apresentam após experimentar náusea e
a constipação.4 vômito provocado por droga citotóxica.

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Capítulo 16 - Manejo de náuseas e vômitos em Cuidados Paliativos

Qualquer estimulo que relembre a ex- Em qualquer situação, assim que contro-
periência prévia pode desencadear o vô- lado o sintoma e corrigido o fator desenca-
mito. Pode ser refratária ao tratamento deante, deve-se retornar progressivamente
e pode ser evitada com controle adequa- à dieta usual, voltar a prescrição prévia por
do da êmese no primeiro ciclo de qui- via oral e avaliar a necessidade de manu-
mioterapia. O tratamento é semelhante tenção do antiemético ou sua suspensão
à êmese induzida pela ansiedade.4 gradual3. Caso não seja possível retornar à

Tabela 16.1 - Principais causas de náusea e vômito e seu tratamento específico

Clínica Causa possível Tratamento


- Haloperidol 1-2mg SC até 3 doses/dia
QUÍMICO/METABÓLICO
- Metoclopramida 30-80mg/dia,
- Medicamentoso (opioide, antibiótico,
intervalo de 6/6horas, SC ou BIC
inibidor seletivo da receptação de seronina
- Ondansetrona 4-8mg SC de 8/8horas
e outros antidepressivos, digoxina)
- Náusea persistente, pouco alívio - levomepromazina (6,25-12,5mg SC ou
- Tumor extenso
após o vômito VO) / Clorpromazina (efeitos colaterais:
- Sepse
hipotensão ortostática e sonolência)
- Insuficiência renal e/ou hepática
- Rodízio do opioide
- ↑Cálcio, ↓Magnésio, ↓Sódio
- Hidratação e bifosfonato
- Quimioterapia e Radioterapia
- Antibiótico
-Prócinético: metoclopramida,
RETARDO DO ESVAZIAMENTO GÁSTRICO
domperidona, bromoprida
- Neoplasia localmente avançada
- Dexametasona (compressão
- Vômitos intermitentes que (estômago, pâncreas, fígado, metástase e
extrínseca, obstrução tumoral, tumor
melhoram a náusea ascite)
gástrico difuso): 4-20mg/dia VO ou SC
- Saciedade precoce - Morfina, anticolinérgico
- Inibidor bomba de prótons ou
- Outras alterações autonômicas - Gastroenterostomia
antagonista H2
como síncope e hipotensão - Neuropatia autonômica (diabetes,
- Considerar sondagem nasogástrica de
postural alcoolismo, doença renal crônica, doença
alívio se distensão abdominal e sintoma
celíaca, síndrome paraneoplásica, doença
muito intenso e retirar após melhora do
de Parkinson)
sintoma.
- Haloperidol até 15mg/dia
- Ondansetrona
- Dimenidrinato
- Restringir volume de hidratação
- Usar antissecretores: hioscina ou
- Vômitos intermitentes que OBSTRUÇÃO INTESTINAL
octreotide
aliviam náusea - Obstrução mecânica
- SNG até melhora da distensão e
- Obstrução mecânica colônica - Falência peristaltismo (carcinomatose,
redução do volume de drenagem. Retirar
- Constipação neuropatia autonômica)
se o paciente ou familiar concordar com
jejum.
- Corticóide para diminuir edema de alça
e massa tumoral
- Cirurgia
- Piora pela manhã DOENÇA CEREBRAL
- Cefaleia - Compressão, irritação tumoral - Dexametasona 16-20mg/dia, IV ou SC.
- Rigidez cervical - ↑pressão intracraniana
- Piora com movimento SISTEMA VESTIBULAR
- Dimenidrinato
- Vertigem - Doenças da base do crânio
- Levomepromazina
- Surdez - Doenças do tronco cerebral
- Náusea constante
- Abordagem psicoterápica
- Tristeza ANSIEDADE
- Benzodiazepínico nos casos refratários
- Irritabilidade/nervosismo

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Capítulo 16 - Manejo de náuseas e vômitos em Cuidados Paliativos

dieta, conversar com o paciente e/ou a fa- trarem-se ineficazes, falhando em aliviar
mília e orientá-los sobre sua suspensão e o os sintomas, pode-se tentar o uso empírico
benefício restrito da sondagem e dos fluidos de levomepromazina1 e a hipótese de seda-
parenterais nesse contexto. ção paliativa deve ser considerada. A seda-
A náusea e o vômito refratários podem ção paliativa deve ser mantida até o controle
estar relacionados a um quadro de disauto- adequado do sintoma ou o falecimento do
nomia. Assim, o tratamento paliativo deve paciente.8 E essa sedação pode ser feita com
ter como objetivo principal a melhora da midazolam ou mesmo com propofol. As des-
maior parte dos sintomas, e não apenas o vantagens do propofol são que só pode ser
controle total do sintoma. Nessa estratégia usado pela via endovenosa e possui maior
é útil que seja adotado um instrumento ou número de efeitos adversos, porém é impor-
uma graduação da intensidade da êmese, tante lembrar que apresenta ação antiemé-
para que seja possível a avaliação da respos- tica. A dose usada para sedação paliativa é
ta ao tratamento. Quando todas as medidas de 0,5mg/kg/h e pode-se aumentar 0,25 a
terapêuticas possíveis foram empregadas, 0,5mg/kg/h a cada 30-60minutos, se neces-
utilizando drogas que tenham ação em di- sário. Essa dose deve ser titulada de acordo
ferentes receptores, e mesmo assim, mos- com o nível de sedação e efeito colateral.

Tabela 16.2 - Medicamentos usados em náusea e vômito

Dose/Via
Medicamento Receptor Indicação Efeitos adversos
administração
Induzido por opioide 1-2mg dose única SC Sintomas
Haloperidol D2
(químico/metabólico) 5mg/24horas BIC extrapiramidais
10mg 6/6horas VO/SC
Induzida por opioide e Sintomas
Metoclopramida D2 40-100mg/24horas
estase gástrica extrapiramidais
BIC
5HT3 Retardo do esvaziamento 20mg 12/12h VO
Domperidona
D2 gástrico 90mg via retal 8/8h
6,25-12,5mg SC 12,5- Sedação, hipotensão
levomepromazina D2 Induzido por opioide
25mg VO postural
Boca seca, retenção
10-20mg até de 4/4h
Hioscina ACh Obstrução intestinal urinária, visão turva,
VO/SC/IV
íleo paralítico
Químico/Metabólico Cefaleia,
Ondansetrona 5HT2 4-8mg 12/12h VO/IV
(Quimioterapia) constipação
Compressão tumoral Esofagite, úlcera
GABA
Dexametasona Obstrução intestinal 4-20mg/dia VO/SC péptica, ganho de
H1
peso
Sonolência,
Obstrução intestinal 0,5 a 2mg VO/SC cada
Lorazepam confusão, maior
Ansiedade 4-6h
risco queda
Obstrução intestinal
H1 Sedação, boca seca,
Difenidramina Hipertensão Intracraniana 10-50mg IV
ACh visão turva
Síndromes vestibulares
50 a 150mcg VO/SC Hipoglicemia, boca
Octreotide Obstrução intestinal
cada 8-12h seca e visão turva
ACh Obstrução intestinal
Dimenidrinato 100mg 6/6h IV/VO Sonolência
H1 Síndrome vestibular

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Capítulo 16 - Manejo de náuseas e vômitos em Cuidados Paliativos

Questionar sobre Paciente em Cuidados


nausea e vômito Paliativos

Nausea e vômito presente

Esclarecimento claro e - Quando começou/Duração/Frequência


- Intensidade 1 a 10 (ESAS) Compartilhar as
objetivo ao paciente e
- Fatores desencadeantes/melhora/piora decisões terapêuticas
familiares
- Características do vômito
- Sintomas associados
- Medicamentos em uso
- Avaliação na dimensão psicológica, física, social
e espiritual
- Estabelecer a performace do paciente (PPS)
- Exame físico minucioso
- Exames complementares se necessário

- Roupas folgadas e confortáveis


Tratamento não - Dieta fracionada e pequenas porções Compartilhar as
farmacológico - Evita alimentos que possam desencadear o decisões terapêuticas
sintoma
- Respeitar a decisão do paciente de não comer
- Manter um ambiente descontraído e agradável
- Consultar nutricionistas, se necessário
- Controle de odores
- Tentar terapias complementares
- Reavaliar os sintomas frequentemente

Identificar as causas mais prováveis Tabela 1


Tratamento
farmacológico
Identificar as vias e neurotransmissores envolvidos Figura 1

Nausea e vômito - Considerar voltar com a dieta usual


resolvido ou controlado - Considerar voltar a prescrição prévia por via oral
- Avaliar a necessidade de manutenção do
- Discutir com a família e o paciente sobre a
suspensão da sonda e fluidos parenterais (caso não
seja possível retornar à dieta oral)

- Reavaliar o quadro e considerar causas menos óbvias


Nausea e vômito
refratária Quando várias classes de drogas foram
empregadas e outras medidas terapêuticas
também:

- Considerar quadro de disautonomia como causa


- Uso empírico de Levomepromazina
- Sedação paliativa: manter até o controle adequado
dos sintomas ou o falecimento do paciente

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Capítulo 16 - Manejo de náuseas e vômitos em Cuidados Paliativos

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d-of-Life Care (LEAP) facilitator manual -advanced cancer. Support Care Cancer.
version 1.1. Module 2, slide 5. 2006. 2004. 12:432-440.
6. MYOTOKU M, NAKANISHI A ET AL. 12. MYOTOKU M, NAKANISHI A. Reduc-
Reduction of opioid side effects by prophy- tion of opioid side effects by prophylactic
lactic measures of Palliative Care Team may measures of Palliative Care Team may re-
result in improved quality of life. Journal of sult in improved quality of life. Journal of
Palliative Medicine 2010. 13(4):401-406. Palliative Medicine. 2010. 13(4).

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Constipação e diarreia
em Cuidados Paliativos 17
CAPÍTULO

Tomaz Nunes Mota de Aquino


Vanessa Nishiyama

CONSTIPAÇÃO 2. A percepção subjetiva do paciente so-


A constipação é um dos sintomas mais bre a constipação e seu nível de descon-
comuns em Cuidados Paliativos, perdendo forto,2,4,5,6,10 comparando com o hábito
apenas para dor e anorexia.7 Sua prevalência intestinal prévio, e o impacto que tal
varia de 30 a 90% de acordo com os estudos alteração causa em sua vida.10
publicados e aumenta com a idade3,5,6, sendo
ainda maior em residentes de instituições Embora os critérios de Roma III para
de longa permanência. É duas a três vezes definição de constipação sejam amplamente
mais comum em mulheres idosas e também aceitos e úteis na investigação, eles são ra-
naqueles em uso de polifarmácia.4 Cerca de ramente usados na prática clínica, uma vez
50% dos pacientes admitidos em hospices são que nem todos os pacientes que precisam
obstipados, e esse dado ainda pode estar su- de tratamento se encaixam nos critérios.1,2
bestimado porque alguns pacientes já se en- Como princípio geral, o paciente que eva-
contram em uso de laxantes.1,5,8,9 cuar menos que três vezes na semana pode
Para a definição de constipação em pa- ser considerado como constipado e necessita
cientes em Cuidados Paliativos, dois aspectos de avaliação.2,4,5
devem ser considerados: A motilidade intestinal normal, que re-
1. A avaliação dos sintomas com relação sulta em evacuações frequentes com elimina-
à frequência e às características da eva- ção de fezes pastosas sem esforço excessivo
cuação2,5,6,10 - a constipação é caracteri- depende do equilíbrio entre três processos
zada por episódios de defecação difíceis fisiológicos básicos: coordenação dos movi-
ou dolorosas, associado à diminuição mentos peristálticos, transporte molecular
da frequência e/ou presença de fezes pela mucosa intestinal e reflexos evacuatórios
endurecidas.1,2,3,5,7,9 Os sintomas mais presentes. A peristalse consiste em duas fa-
frequentemente relatados por idosos ses: contração e relaxamento. A acetilcolina é
incluem: esforço evacuatório, necessi- mediadora da contração, enquanto peptídeos
dade de manobras manuais para auxi- vasoativos são mediadores do relaxamento.7.
liar no esvaziamento do reto e sensação De forma simplificada, a constipação in-
de evacuação incompleta.4 testinal pode ser classificada como primária

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Capítulo 17 - Constipação e diarreia em Cuidados Paliativos

ou secundária. A primária pode ser dividida creve um opioide deverá também prescrever
em três subtipos: trânsito normal (ou fun- um laxante.8
cional), trânsito lento, e disfunção anorretal
– provocada pela coordenação ineficaz da DIAGNÓSTICO
musculatura pélvica durante a defecação.13 A constipação deve fazer parte da avalia-
Idosos com doença avançada estão em ção de todo paciente em cuidado paliativo.2
grande risco de constipação, por uma gran- Ela inclui a história previa do hábito intesti-
de variedade de causas, sejam elas primárias nal,1,2,5 a constipação no contexto global do
ou secundárias: dietéticas, uso de medica- paciente, desde a doença primária, suas com-
mentos, inatividade, condições médicas que plicações e tratamentos, além de suas neces-
diminuem a motilidade intestinal, causas re- sidades fisicas, psicológicas, sociais e espiri-
lacionadas à própria progressão da doença de tuais.2 Deve-se atentar para variações recen-
base ou aos efeitos colaterais dos tratamentos tes em termos de frequência, consistência das
empregados14,15 (Tabela 17.1). fezes, esforço evacuatório, uso de medicações
Dentre esses diversos componentes en- e sintomas associados.1,2,3,4,8,10 Pode-se usar
volvidos na natureza multifatorial da cons- questionários ou escalas para avaliar sua pre-
tipação, destaca-se o uso de opioides. Os sença e severidade,1,2,5,10 mas estas requerem
receptores µ são os principais envolvidos na validação em nosso meio.
fisiopatologia e os mecanismos mais prova- A avaliação do paciente poderá revelar
velmente envolvidos relacionam-se à redução respiração malcheirosa, dor, confusão men-
da peristalse do intestino delgado e cólon, ao tal ou desorientação.8 O exame físico da re-
aumento da absorção de água e eletrólitos, ao gião abdominal inclui a inspecão à procura
comprometimento dos reflexos evacuatórios de distensão abdominal e peristaltismo visí-
e ao aumento do tônus do esfíncter anal.12,10 vel; a ausculta com aumento dos ruídos hi-
Cientes desses efeitos e levando-se em con- droaéreos; a palpação de massas fecais mó-
sideração que o uso de opioides em Cuidados veis e a percussão abdominal. O toque retal
Paliativos é muito frequente, seja para o contro- é importante para descartar fecaloma e obs-
le da dor ou dispneia, é imperativo que esteja- trução intestinal, avalia-se o tônus do esfínc-
mos atentos a esse importante efeito colateral. ter anal, a presença ou a ausência de fezes, a
Diferentemente da náusea ou de outros efeitos consistência, a presença de hemorroidas, fis-
colaterais dos opioides, a constipação não me- suras e abscessos anais.1,2,4,5,8,10
lhora com o tempo de uso e, portanto necessita Quanto aos exames complementares, de-
de atenção, fazendo-nos antecipar esse proble- ve-se buscar causas como distúrbios eletroli-
ma comum. Como premissa, a mão que pres- ticos e metabólicos. Quando o exame físico

Tabela 17.1 - Possíveis causas de constipação em idosos em Cuidados Paliativos


Causas Exemplos
Opioides, drogas com efeitos anticolinérgicos (hioscina, antidepressivos tricíclicos,
Drogas
antiparkinsonianos, fenotiazinas), diuréticos, anticonvulsivantes, suplementos de cálcio e ferro
Dietéticas Diminuição da ingesta líquida e alimentar, baixa ingestão de fibras
Desidratação, diabetes mellitus, hipotireoidismo, hipercalcemia, hiperparatireoidismo,
Endócrinas ou metabólicas
hipocalemia, hipomagnesemia, insuficiência renal crônica
Neoplasia colorretal, massa extra-intestinal, colite inflamatória ou isquêmica, estenoses
Orgânicas e anormalidades
cirúrgicas, bridas, fibrose actínica, fissuras e estenoses anais, hemorróidas, prolapso retal,
estruturais
doença inflamatória intestinal
Doença cerebrovascular, tumores cerebrais, lesão medular, doença de Parkinson, paraplegia,
Neurológicas
esclerose múltipla, neuropatia autonômica, demência
Ambientais Falta de privacidade, conforto, alterações dos hábitos de toalete
Outras Idade avançada, sedação, depressão, fraqueza, inatividade, confusão mental

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Capítulo 17 - Constipação e diarreia em Cuidados Paliativos

não é confiável ou o quadro for severo, sem Uma adequada ingestão de líquidos e fibras
resposta ao tratamento1,2,5 ou para distinguir e o estímulo à deambulação e atividade física
obstrução intestinal,8 pode-se recorrer a ra- seriam importantes para promover uma fun-
diografia simples de abdome. ção intestinal normal, porém muitas vezes
não são possíveis em pacientes em Cuidados
TRATAMENTO Paliativos, nos quais a hiporexia e a inativi-
Os princípios do controle de sintomas de- dade são muito frequentes.2,7 Nos pacientes
vem sempre ser aplicados:1 com boa aceitação de dieta oral, pode ser
• investigação criteriosa da causa; orientado o uso de suco laxativo pela manhã
• explicação do sintoma; (1 a 2 laranjas com bagaço, metade de um
• tratamento de causas reversíveis; mamão Papaya e uma ameixa).
• terapia medicamentosa individualiza- Sempre que possível, deve-se preservar
da; a privacidade do paciente no banheiro, evi-
• reavaliação contínua dos resultados tando-se o uso de fraldas – causa de des-
As metas principais no manejo da consti- conforto e sensação de sujeira, que leva o
pação incluem:2,5 paciente a manter uma posição antinatural,
• Aliviar a dor e o desconforto da consti- inibindo a defecação.8 Pode-se encorajar o
pação, melhorando a qualidade de vida paciente a se sentar no vaso sanitário 20 mi-
• Restabelecer hábitos intestinais para o nutos após o café da manhã, aproveitando o
conforto e satisfação do paciente reflexo gastrocólico matinal, que comumen-
• Restaurar o nível de independência dos te é o mais potente.2
seus hábitos intestinais Diante da frequente ineficácia das me-
• Prevenir ou tratar sintomas gastroin- didas não-farmacológicas quando aplicadas
testinais relacionados como náuseas, isoladamente, em geral o tratamento medi-
vômitos, distensão e dor abdominal camentoso é necessário, e deverá ser baseado
Medidas não farmacológicas devem ser nos mecanismos mais provavelmente envol-
consideradas no manejo da constipação. vidos na constipação intestina.l5

Tabela 17.2 - Laxantes disponíveis no Brasil


Doses Mecanismo Possíveis
Categoria Exemplos Latência (h)
(diárias) de ação efeitos colaterais
Distensão, flatulência
- Psilio Aumentam a massa fecal, o
1 unid 1-3x/d 12-72 e dor abdominal.
Formadores de - Metilcelulose conteúdo de água nas fezes
1 unid 1-3x/d 12-72 Impactação fecal nos
bolo - Policarbofila e o tempo de trânsito através
2-4cp/d 24-48 que não podem ingerir
cálcica do cólon
líquidos suficientemente
Atraem água para o lúmen Flatulência, cólicas
- Lactulose
15-60 mL 2-3x/d 24-48 intestinal, aumentam e distensão; sabor
- Hidróxido de
Osmóticos 25-50ml/ d 1-6 peso fecal, promovem o adocicado pode não
magnésio
1 unid 1-4x/d 24-72 peristaltismo por processos ser tolerado; distúrbios
- Macrogol
mecânicos de distensão hidroeletrolíticos
Podem diminuir
a absorção de
Emolientes/ - Óleo mineral 10-30mL 6-12 Lubrificam e
vitaminas lipossolúveis
lubrificantes - Docusato 60mg 1-2x/d 24-72 amolecem as fezes
e micronutrientes;
pneumonia lipídica
Alteram a permeabilidade da
mucosa intestinal
- Bisacodil Diarreia, cólicas,
10-30mg 1-2x/d 6-12 reduzindo a absorção de
- Sene desequilíbrio hidro-
Estimulantes 1-2 cps/dia 6-12 água, aumentam a
- Picossulfato eletrolítico e dermatite
5-10mg 1x/d 6-12 motilidade intestinal por
de sódio perianal
estimulação das terminações
nervosas na mucosa do cólon

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Capítulo 17 - Constipação e diarreia em Cuidados Paliativos

Os laxantes são substâncias que aceleram e formação de gás e por esse motivo mostra-
a evacuação. A maioria dos laxantes melho- se uma boa opção no contexto de Cuidados
ra a consistência das fezes por reterem água, Paliativos.4,7
aumentarem a secreção de água para o lúmen Laxantes salinos também configuram-se
intestinal e/ou estimularem o peristaltismo.16 como laxantes osmóticos. Alguns exemplos:
Os laxantes são classificados segundo o seu sulfato de sódio, fosfato de sódio, sulfato de
mecanismo de ação em: formadores de bolo, magnésio, hidróxido de magnésio, tartarato
osmóticos, emolientes/lubrificantes e esti- de sódio e tartarato de potássio, normalmen-
mulantes (Tabela 17.2). te menos utilizados.8 Os que contêm mag-
nésio não foram bem avaliados em idosos e
LAXANTES FORMADORES DE BOLO devem ser utilizados com cautela pelo risco
Promovem o efeito laxativo pelo aumento de hipermagnesemia.4
do conteúdo de água das fezes com diminui-
ção de sua consistência, assim estimulando o LUBRIFICANTES E EMOLIENTES
peristaltismo.8,10 Apesar do uso clínico fre- Esses laxantes lubrificam e amolecem as
quente, os dados objetivos sobre a eficácia fezes, permitindo sua eliminação mais fácil.
dessas medicações são inconsistentes. Além Estão incluídos nesse grupo óleos não absor-
disso, não são recomendados em pacientes víveis como a parafina líquida e o óleo mi-
em Cuidados Paliativos, que frequentemente neral. Devido a alguns efeitos colaterais, tais
estão acamados, com mobilidade compro- como irritação perianal e má absorção de vi-
metida, e incapazes de ingerir grande quan- taminas, tem sido considerado drogas obso-
tidade de líquidos, podendo inclusive preci- letas, mas ocasionalmente poderiam ser uti-
pitar obstrução intestinal.10,14,9 lizados na constipação induzida por opioides
em pacientes em Cuidados Paliativos.7 Com-
LAXANTES OSMÓTICOS prometimento dos reflexos de deglutição
Os agentes osmóticos diferenciam-se dos torna seu uso proibitivo devido ao risco de
formadores de bolo por gerarem um meio hi- aspiração com subsequente pneumonia lipí-
perosmótico que atraem água, aumentando o dica.9 Além disso, estas substâncias, quando
volume das fezes, com diminuição de sua con- usadas por sonda nasoentérica, podem cau-
sistência e estímulo da peristalse.8,10 Os estu- sar corrosão do material, contraindicando o
dos tem um bom nível de evidência em apoio seu uso por esta via.10
aos laxantes osmóticos – polietilenoglicol-
macrogol e lactulose – dada a sua eficácia na ESTIMULANTES
melhora da frequência de evacuações e consis- Esses laxantes atuam aumentando o pe-
tência das fezes em pacientes com constipação ristaltismo pela estimulação dos nervos en-
crônica.17 Flatulência e distensão abdominal téricos e também pelo aumento da secreção
são os principais efeitos colaterais do uso da de água e eletrólitos pela mucosa intestinal.
lactulose; além disso, esta deve ser utilizada O supositório de bisacodil pode ser usado em
com cautela em diabéticos5 e em pacientes pacientes nos quais a via oral não pode ser
muito debilitados, pois pode desencadear de- utilizada, por ser o único laxante administra-
sidratação e distúrbios hidroeletrolíticos.9 do por via retal, e que possui efeito sistêmico.
Já o polietilenoglicolmacrogol possui Apesar de o sene ser um dos laxantes mais
uma capacidade de ligação à água definida. comumente utilizados no Brasil, não existe
Fluidos administrados oralmente podem evidência clínica que suporte a sua recomen-
atingir o cólon e amolecer as fezes, sem dação, e que permita a sua comparação com
necessária difusão de líquido dos tecidos novos medicamentos para o tratamento da
para o lúmen intestinal. Parece, portanto, constipação intestinal.10
ser uma opção mais segura que a lactulose, Os laxantes orais devem ser usados pre-
além de não haver importante fermentação ferencialmente, porém nos casos em que se-

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Capítulo 17 - Constipação e diarreia em Cuidados Paliativos

jam ineficazes ou exista impactação fecal, os ções eletrocardiográficas (prolongamento


laxativos retais podem ser necessários e de- do intervalo QT).18
vem ser usados em combinação.5 Dentre os Uma das novas substâncias que têm sido
laxantes retais citamos a glicerina (supositó- utilizadas para o tratamento da obstipação in-
rio e solução) o fosfato de sódio e o sorbitol. duzida por opioides em pacientes com câncer
Estão indicados para situações específicas: é metilnaltrexona. Ela bloqueia seletivamente
tratamento da impactação fecal; como tra- receptores opioides periféricos, podendo ali-
tamento adicional em pacientes cuja cons- viar a constipação sem comprometer a analge-
tipação não responde adequadamente aos sia. Sua administração por via subcutânea es-
laxantes orais; como alternativa para aque- timula a evacuação nas primeiras duas horas
les que não toleram laxantes orais; e para o após sua administração, na dose de 0,15mg/
esvaziamento retal em pacientes com lesão kg, porém apresenta alto custo.2
medular.9,4 Em uma série retrospectiva, o Persiste uma incerteza sobre a “melhor''
uso de enemas de fosfato de sódio em ido- abordagem na constipação em idosos em Cui-
sos (idade média de 80 anos) foi associado dados Paliativos. Baseados nas melhores prá-
a complicações, incluindo hipotensão, de- ticas de consenso, o profissional de saúde deve
pleção de volume, hiperfosfatemia, hipo ou selecionar laxantes de maneira individualiza-
hipercalemia, acidose metabólica, hipocal- da, e um enema ou supositório pode ser neces-
cemia severa, insuficiência renal e altera- sário se a constipação não resolve16,5,2 (Fig 17.1)

Idosos em cuidados

Constipação

Sim Não

Exclua Prevenção/manutenção:
>Medidas não farmacológicas:
•Ingestão hídrica
•Estimular mobilidade
• Privacidade no toalete
Avalie as causas >Laxantes:
• Osmóticos: macrogol,
lactulona e/ou
Terapia laxativa: •Estimulantes: bisacodil, sene
•Osmóticos: macrogol,
lactulona e/ou Constipação
•Estimulantes: bisacodil, sene

Se uso de Não Sim


opioides: considere
metilnaltrexona

Terapia laxativa resgate:


•Aumente doses e
associe laxantes
•Supositórios e enemas

Figura 17.1 - Fluxograma sugerido no manejo de constipação em idosos em Cuidados Paliativos

173

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Capítulo 17 - Constipação e diarreia em Cuidados Paliativos

DIARREIA idosos, a constipacão com impactacão fecal


A diarreia é um sintoma constrangedor e e transbordamento ocorre em cerca de 50%
debilitante12, definida pela presença de mais dos casos de diarreia. Essa condição é conhe-
de três evacuações não formadas dentro de cida como diarreia por transbordamento ou
um período de 24 horas8,9,11;que pode aumen- diarreia paradoxal.18
tar o risco de desidratação, desequilíbrio ele- Tabela 17.3 - Causas de diarreia em Cuidados Paliativos9,12
trolítico, dermatites perianais, insuficiência
Uso excessivo de laxantes
renal e fadiga.11,12.
A diarreia pode ser dividida em dife- Drogas (antibióticos, antiácidos, AINES, preparos
contendo ferro)
rentes tipos e seu tratamento dependerá da
Impactação fecal com diarreia de transbordamento
etiologia: secretória, osmótica, mecânica ou
Radioterapia abdominal e pélvica
desordem de motilidade. O uso excessivo de
laxantes em Cuidados Paliativos é uma causa Má absorção (carcinoma cabeça de pâncreas,
gastrectomia, colectomia, ressecção ileal)
comum,8,12 outras causas estão na tabela 17.3.
Tumores colônicos ou retais
Em imunodeprimidos, é comum a diarreia
Tumores endócrinos raros
infecciosa por criptosporidium, giárdia, en-
tamoeba e citomegalovírus12. Em pacientes Hábitos alimentares prévios

Tabela 17.4 - Tratamento farmacológico da diarreia


Medicamentos
Indicações Dose usual Inicio de ação Efeitos adversos
antidiarréicos
Agentes absorventes (formadores de fezes) 8,9,11

1 colher de sopa (2 gramas Impactação fecal;


Metilcelulose
de fibras) ou 4 cápsulas 3 distensão abdominal;
(CitrucelR) *combinar com
vezes por dia 12 a 72 horas flatulência.
agentes adsorventes
Pectina-caolin 1 colher de sopa 4 vezes Interfere com absorção
(AtalinR, PectimaxR) por dia de medicações
Agentes adsorventes8,9,11
Caolin-pectina 2 a 6g cada 4 horas Impactação fecal;
distensão abdominal;
1,2g seguida 1,2g a cada
Atapulgita 12 a 72 horas flatulência.
evacuação até dose
(ColestaseR) Interfere com absorção
maxima de 8,4g
de medicações
Inibidores de prostaglandina8,9,11
Subsalicilato de *efeito 525mg a cada 30 minutos
bismuto antimicrobiano ate 5g/dia Aumenta risco
300mg a cada 4 horas ate de sangramento
Aspirina *colite actínica
4g/dia gastrointestinal
Mesalazina *colite ulcerativa 1,2 a 2,4g/dia
Agentes opioides8,9,11
*não ultrapassa
barreira 4mg/dia seguido de 2mg
Raros - sintomas
Loperamida hematoencefalica a cada evacuação até dose
gastrointestinais
*nao usar em diarreia maxima de 16mg/dia
infecciosa
Outros
*não tem ação no
100mg a cada 8 horas ate
Racecadotril sistema nervoso 1 a 3 horas
dose maxima 400mg
central
Enzimas *insuficiência
500U/kg/refeicao Raros - sintomas
pancreaticas11 pancreática
gastrointestinais
100-150mcg EV ou SC
*diarreia secretoria 3 vezes por dia, titular
Octreotide 11
em imunodeprimidos até 500mcg ou infusão
contínua 25-50mcg/h

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Capítulo 17 - Constipação e diarreia em Cuidados Paliativos

Na avaliação clínica deve-se atentar à MIKUS G. Pharmacological treatment of


dieta, às medicações em uso (incluindo os constipation in palliative care. CurrOpinSu-
laxantes), se há relação com a ingesta de lí- pportPalliatCare. 2013. (7):183–191.
quidos ou com a alimentação, além da des- 8. C onselho Regional de Medicina do Esta-
crição da quantidade e qualidade das fezes. do de São Paulo. Cuidado Paliativo. 2008.
O exame físico inclui a palpação abdominal e 427-444.
o toque retal12, visando a possibilidade de ha- 9. Academia Nacional de Cuidados Palia-
ver impactação fecal e obstrução intestinal.8 tivos. Manual de Cuidados Paliativos.
Geralmente, não há necessidade de exame de 2009. 124-131.
imagem12. Em caso de diarreia persistente, 10. Associação Brasileira de Cuidados Palia-
solicitar exames laboratoriais.8 tivos. Consenso brasileiro de constipação
O tratamento deverá buscar causas especí- intestinal induzida por opioides. Revista
ficas que justifiquem o quadro9 e incluir medi- Brasileira de Cuidados Paliativos. 2009.
das não farmacológicas, como hidratação oral 2(3)1-40.
e/ou parenteral, de preferência por hipoder- 11. CHERNY NI. Evaluation and manage-
móclise, exceto nos casos de desidratação se- ment od treatment related diarrhea in pa-
vera. Leite e derivados devem ser evitados.11,12 tients with advanced cancer: a review. J of
O tratamento medicamentoso para diarreia Pain and Symptom Management. 2008.
persistente encontra-se na tabela 17.4. 36(4):413-423.
12. ALDERMAN J. Diarrhea in palliative care.
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175

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Soluço 18
CAPÍTULO

Ana Laura de Figueiredo Bersani


Julia Cabral Martuscello
Daltro Ishikawa

INTRODUÇÃO respiratório e o hipotálamo, e também um


Soluço é definido como um espasmo in- mecanismo periférico de arco reflexo.4,5 O
voluntário do diafragma e músculos inter- arco-reflexo do soluço é composto por via
costais que causa uma inspiração súbita, com aferente e eferente e um mediador central. A
o fechamento abrupto da glote, levando a via aferente é composta pelos nervos frênico
emissão de um som característico “hic”.1 e vago e pela cadeia simpática,4,5 e a eferente
Geralmente é benigno, de início agudo e é formada pelo nervo frênico e seus ramos
auto-limitado, que cessa após poucos minu- que se direcionam à glote e aos músculos
tos. Raramente, o soluço pode tornar-se per- intercostais2. O nervo vago, em particular,
sistente (duração maior do que 48h ou ata- pode ser ativado em várias áreas anatômicas
ques recorrentes). Classificado como intratá- (vísceras torácicas e abdominais e estrutu-
vel se apresentar duração maior que um mês, ras da cabeça e pescoço). Por exemplo, irri-
pode desencadear quadros de desnutrição, tação do ramo auricular do nervo vago, que
perda de peso, fadiga, desidratação, insônia inerva o canal auditivo, por cerumem, cor-
e deiscência de feridas.2 po estranho, insetos ou até mesmo cabelo,
Apesar da incidência desse sintoma ser foram descrito como causa de soluço. O me-
desconhecida em idosos, é sabido que solu- diador central não está bem definido. Antes,
ço persistente ou intratável não é incomum era atribuído a uma localização na medula
no paciente gravemente enfermo, particular- espinhal entre C3 e C5, mas atualmente
mente em pacientes com SIDA (Síndrome da acredita-se que envolve a medula oblonga
Imunodeficiência Adquirida) e em pacientes e formações reticulares do tronco cerebral,
com câncer avançado. Nestes, a prevalência é núcleo do nervo frênico e hipotálamo. Já fo-
de 3,9% a 4,5%.3 ram relatados casos de soluço intratável em
pacientes com tumor metastático de região
FISIOPATOLOGIA posterior de medula oblonga e outras lesões
A patogênese do soluço é complexa e nesta mesma localização.
não totalmente esclarecida, mas acredita- Em 80% dos casos de soluço há envolvi-
se na correlação central entre o núcleo do mento de contração unilateral do hemidia-
nervo frênico, a formação reticular, o centro fragma esquerdo.2

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Capítulo 18 - Soluço

CAUSAS torácicas e do sistema nervoso central estão


Existem inúmeras causas de soluço. So- entre as causas mais comuns de soluço intra-
luços transitórios são em geral causados por tável em Cuidados Paliativos, tais como esofa-
distensão gástrica (devido à ingestão de bebi- gite erosiva ou infecciosa, distensão gástrica e
das gaseificadas e aerofagia), ingestão exces- obstrução intestinal.6 Além disso, pneumonia,
siva de álcool, tabagismo, ansiedade e estresse derrame pleural maligno, empiema e herpes-
emocional. Doenças do trato gastrintestinal, zoster de parede torácica podem estimular as
fibras aferentes resultando no soluço. Outras
causas de soluço são as drogas e, alguns dos
Tabela 18.1 - Etiologias de soluço em pacientes com
neoplasia agentes que são usados para tratar o soluço
podem também induzi-lo.
Malignidade
Câncer esofagogástrico
O ideal para o melhor manejo do soluço
Câncer de cólon é investigar sua etiologia, o que muitas vezes
Hepatoma não é fácil, devido aos diversos mecanismos
Leucemia potenciais para a indução do reflexo do so-
Câncer pulmonar
Linfoma
luço em pacientes com inúmeras comorbi-
Câncer de pâncreas dades como os idosos. Nestes casos, medidas
Câncer renal/Próstata gerais ou tratamento medicamentoso devem
Metástases hepáticas ser instituídos independente da etiologia. A
Alterações Metabólicas abordagem farmacológica é a terapia mais
Hiponatremia, hipocalemia, hipocalcemia
eficaz para esses pacientes. As tabelas 18.1 e
Falência renal
Uremia 18.2 mostram as principais causas de soluço
Diabetes Mellitus descompensado na população em Cuidados Paliativos.2,6
Hipoadrenalismo
Patologias do Sistema Nervoso Central (SNC) AVALIAÇÃO DO PACIENTE COM SOLUÇO
Tumores cerebrais (Ex.: gliomas, metástases) Acessos de soluço são comuns e não ne-
Acidente Vascular Cerebral Isquêmico
Hematoma/Hemorragia cerebral
cessitam de uma avaliação médica detalha-
Encefalite/Meningite da, principalmente se tiver duração menor
Abscesso cerebral/Toxoplasmose que 48 horas. Entretanto, soluço persistente
Desordens Gastrintestinais e intratável, sem uma causa aparente, requer
Esofagite erosiva
Esofagite infecciosa (Ex.: herpes, cândida)
Tabela 18.2 - Medicações que podem induzir soluço
Doença ulcerosa péptica
Hérnia de hiato/Refluxo gastro-esofágico Antibióticos
Distensão gástrica por comida, líquidos, ar, EDA
Benzodiazepínicos
Obstrução intestinal
Pancreatite Corticosteroides (principalmente dexametasona)
Ascite Esteróides anabolizantes
Colecistite
Barbitúricos
Abscesso subdiafragmático
Hidronefrose Anestesia geral inalatória
Desordens Cardiovasculares Opioides
Isquemia Miocárdica/Infarto Agentes quimioterápicos (predominância em homens)
Derrame Pericárdico/Pericardite Cisplatina
Desordens Torácicas/Pulmonares Carboplatina
Pneumonia Ciclofosfamida
Derrame Pleural/Pleurite Docetaxel
Herpes Zoster torácico Etoposide
Ventilação Mecânica Gencitabina
Irinotecan
Procedimentos Cirúrgicos/Anestesia Geral/Injeção
Paclitaxel
Epidural com Anestésico Local
Vindesina
Psicogênico Vinorelbine

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Capítulo 18 - Soluço

investigação diagnóstica a fim de excluir “status funcional”, a extensiva investigação


causas potencialmente reversíveis ou que de causa pode até ser prejudicial.6
ameacem a vida do paciente, 2 mesmo que
na maioria dos casos uma causa específica COMPLICAÇÕES DE SOLUÇO CRÔNICO E
não seja encontrada. Deve-se questionar so- INTRATÁVEL
bre a presença de outros sintomas do trato A população geriátrica em Cuidados Pa-
gastrointestinal alto, dor, sintomas psiquiá- liativos é de risco para o desenvolvimento
tricos, uso de álcool, uso de medicamentos de soluço persistente e intratável. Quando
(principalmente corticóide, benzodiazepí- isso ocorre, pode ser extremamente angus-
nicos e barbitúricos), 3 cirurgia torácica, ab- tiante e ter um impacto negativo significan-
dominal ou neurológica. te na qualidade de vida desses idosos e fa-
No exame físico, é importante avaliar a miliares. Este tipo de sintoma pode resultar
temperatura corpórea, canal auditivo (pre- em exacerbação de quadros depressivos e
sença de inflamação, corpo estranho, cabelo ansiosos, prejuízo do sono, levando a fadiga
ou cerumen impactado), orofaringe, tireóide, e sonolência diurna, piorando apetite e fun-
linfonodomegalia, exame torácico e abdomi- ção cognitiva.4,5,10
nal (sinais de distensão, sinais de peritonite) O soluço persistente aumenta o gasto de
e exame neurológico completo.7,8,9 energia através da contração da musculatura
Exames laboratoriais básicos incluindo e pode interferir na ingesta de líquidos e ali-
dosagem sérica de eletrólitos e função re- mentos e ainda resultar em desnutrição, per-
nal devem ser realizados, visto que hipo- da de peso e desidratação. Se houver soluço
natremia é etiologia comum de soluço em durante o ato da alimentação, pode ocorrer
pacientes gravemente enfermos, embora aspiração e causar obstrução de vias aéreas,
hipocalcemia, hipocalemia ou insuficiên- pneumonite aspirativa e insuficiência res-
cia renal também possam ser encontrados. piratória. Pressões intratorácicas negativas
Testes adicionais devem ser considerados geradas durante paroxismos severos de so-
em pacientes com sintomas específicos ou luço podem resultar em pneumomediastino.
fatores de risco. Eletrocardiograma deve
ser solicitado para pesquisar isquemia mio-
Tabela 18.3 - Complicações do soluço persistente
cárdica em pacientes com fatores de risco e intratável
cardiovascular. 2,4 Radiografia ou tomogra-
Ansiedade
fia computadorizada de tórax pode ser útil
Arritmias
para detectar anormalidades pulmonares e
Bradicardia/Bloqueios cardíacos
mediastinais que possam estar irritando os
nervos vago/frênico ou o diafragma em pa- Comprometimento da fala

cientes com dispneia. Endoscopia digestiva Deiscência de ferida

alta, especialmente em pacientes com dis- Depressão


fagia ou outros sintomas esofágicos, deve Desidratação
ser considerada para diagnosticar esofagite Desnutrição
ou compressão esofágica. Outros exames Dispneia/hipóxia
invasivos como punção liquórica (exclusão Dissecção carotídea
de infecção do sistema nervoso central), Distúrbio do sono
broncoscopia, ressonância nuclear mag- Enfisema subcutâneo
nética, provas de função pulmonar ou eso- Fadiga
fagomanometria devem ser realizados em
Perda de peso
situações individualizadas. 2
Pneumomediastino
Deve-se ressaltar que em pacientes com
Sindromes aspirativas
câncer avançado o soluço pode ser multifa-
Vômitos
torial. Assim, dependendo do prognóstico e

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Capítulo 18 - Soluço

Deiscência de incisões cirúrgicas mediasti- nos seus desenhos e conclusões.11 Tem como
nais também podem ocorrer. Alguns autores característica a segurança e os mínimos efei-
relataram morte como uma complicação de tos colaterais, mas pode ser difícil aplicar
soluço intratável, porém as múltiplas comor- esta técnica em pacientes muito enfermos,
bidades existentes na população geriátrica assim como achar profissionais capacitados e
com neoplasia ou não, dificultam esta distin- com prática nesta área.
ção. A tabela 18.3 mostra as principais com-
plicações do soluço persistente e intratável. MEDIDAS FARMACOLÓGICAS
Pacientes com soluço persistente ou refra-
TRATAMENTO tário geralmente necessitam de intervenção
A maior parte das abordagens terapêu- farmacológica, especialmente se a qualida-
ticas para o soluço são baseadas em estudos de de vida estiver prejudicada ou possíveis
observacionais, sem grupo controle. A lite- complicações forem aparentes. Entretanto, o
ratura carece de revisões sistemáticas no as- tratamento medicamentoso não deve excluir
sunto, e é composta basicamente por relatos uma avaliação detalhada com o objetivo de
de caso e “small series” que não comparam as descobrir a causa para melhor combatê-lo.
opções terapêuticas existentes.11 A única medicação aprovada para soluço
pela Food and Drug Administration (FDA)
MEDIDAS NÃO FARMACOLÓGICAS é o antipsicótico clorpromazina, porém não
Em geral, para o tratamento do soluço deve ser a primeira opção terapêutica em
transitório não há necessidade de medica- idosos pelos seus efeitos colaterais, como
mentos, com boa resposta às medidas não hipotensão, sonolência, boca seca, retenção
farmacológicas, como as listadas abaixo:2,12 urinária, glaucoma ou delirium.² A dose
• Interromper a respiração normal (pren- via oral deve ser de 25 a 50 mg três vezes
der a respiração, Manobra de Valsalva); ao dia durante 7 a 10 dias. A via de admi-
• Estimular a faringe e palato (com co- nistração endovenosa é mais eficaz, porém
tonete ou catéter, beber goles de água deve ser infundida lentamente. Seu efeito no
gelada, gargarejar com água, engolir tratamento do soluço se dá provavelmente
colher de chá de açúcar granulado ou devido ao efeito antidopaminérgico, além
pão seco); do forte poder antiemético que resulta em
• Aumentar estímulo vagal (pressionan- atividade anticolinérgica com importante
do o globo ocular); efeito sedativo.13
• Comprimir joelhos no peito, inclinar- Alguns anticonvulsivantes como car-
se o tronco para frente; bamazepina, ácido valpróico e fenitoína são
• Respirar num saco plástico; descritos para tratamento do soluço desde a
• Chupar limão; década de 70 e mais recentemente, estudos
• Induzir espirro com pimenta preta; com a gabapentina mostraram boa efetivi-
• Dar susto na pessoa com soluço; dade desta droga para o controle do soluço,
• Levantar a úvula com uma colher; com poucos efeitos colaterais, sendo o princi-
• Tracionar a língua; pal a sonolência.2 O fato de ter menor ligação
• Massagem digital retal. a proteínas plasmáticas torna ainda mais in-
Em idosos, estar sempre atento aos riscos teressante esta medicação para pacientes ido-
inerentes dessas manobras antes de orientá sos e/ou com câncer, com prevalência elevada
-las, pois podem resultar em engasgos com de hipoproteinemia devido à desnutrição ou
broncoaspiração, disautonomia, quedas, disfunção hepática. Além disso, esta medica-
dentre outras consequências. ção ajuda na modulação da dor neuropática e
A acupuntura parece ter um bom resulta- tem efeito anticonvulsivante. A dose inicial é
do no tratamento do soluço persistente ou re- de 300 mg, podendo-se chegar a doses de até
fratário, apesar dos estudos serem limitados 1200 mg por dia em casos selecionados.3

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Capítulo 18 - Soluço

Outra opção farmacológica que se mos- O neuroestimulante metilfenidato pode


trou efetiva foi o baclofeno, entretanto pode cessar o soluço através da inibição de recap-
não ser tão bem tolerado nos idosos, cau- tação de norepinefrina e dopamina. Pacien-
sando muita sonolência ou insônia, tontura, tes com depressão ou sedação induzida por
fraqueza, ataxia e confusão mental.5 A ami- opioides são bons candidatos ao tratamento
triptilina também deve ser utilizada com do soluço com esta droga.15
cautela nos idosos devido aos seus efeitos Existem relatos de caso de carvedilol
anticolinérgicos. como medicação efetiva no controle de solu-
Drogas mais seguras, porém menos efi- ço persistente. O mecanismo é desconhecido,
cazes que podem ser usadas são dimetico- mas provavelmente o antagonismo do com-
na, domperidona ou metoclopramida. Os ponente simpático da via aferente do soluço
bloqueadores de canal de cálcio nifedipina é o responsável pela efetividade dessa droga.
e nimodipina foram citados no controle de Há necessidade de mais estudos sobre o con-
soluço persistente, mas com risco de hipo- trole de soluço com beta-bloqueador.
tensão arterial, principalmente em pacientes Outra medicação descrita em alguns
desidratados ou em uso de opioides. casos com resposta efetiva para soluço per-
O haloperidol pode ser útil no controle de sistente foi a amantadina, introduzida para
soluços em pacientes com delirium hiperati- cessar o soluço de pacientes com Doença de
vo concomitante, porém a monitorização de Parkinson, mais susceptíveis aos efeitos co-
sinais extrapiramidais deve ser feita. A dose laterais das medicações comumente usadas
é de 1 a 4mg, até três vezes ao dia. para este sintoma.16 A tabela 18.4 mostra as
Apesar dos benzodiazepínicos, princi- principais medicações usadas no tratamento
palmente o diazepam, serem causadores de do soluço crônico.
soluço, a infusão endovenosa de midazolam O bloqueio do nervo frênico com agen-
pode ser uma opção no tratamento deste sin- tes anestésicos pode ser outra alternativa
toma em pacientes em fase final de vida.14 para os casos refratários à terapia medica-
Outra medicação que pode induzir o mentosa, quando houver profissionais ex-
soluço, mas que em determinadas situa- perientes, devido ao risco de complicações
ções é usada para tratá-lo, é a dexameta- pulmonares.17 O implante de um disposi-
sona, quando se quer reduzir irritação ou tivo semelhante a um marcapasso também
compressão em pacientes com tumor he- foi descrito em alguns casos como efetivo
pático ou cerebral. para soluço refratário.

Tabela 18.4 - Medicamentos e doses sugeridas para soluço persistente:


Ácido Valpróico 5mg/kg/d VO e aumentar para 250mg/semana
Amitriptilina 25-90mg/d VO
Baclofeno 5-10mg 2x/d até 20mg 3x/d VO (Evitar retirada abrupta)
Carbamazepina 600-1200mg/d VO
Clorpromazina 25-5-mg IV em 30-60min depois 10-25mg 3x/d até 50mg 4x/d
Dexametasona
(se compressão ou irritação 25-5-mg IV em 30-60min depois 10-25mg 3x/d até 50mg 4x/d
tumoral hepática ou cerebral)
Gabapentina 300mg 1-2x/d VO
Haloperidol 2mg IM depois 1-2,5mg 1-3x/d VO
Metoclopramida 10mg IV depois 10-20mg 3-4x/d VO
Midazolam (se refratariedade
10-30mg SC
de outros tratamentos)
Nifedipina 10-80mg/d VO

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Capítulo 18 - Soluço

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Fadiga em Cuidados Paliativos
e no idoso 19
CAPÍTULO

Erika Chaul de Paula


Mariane Aiko Simamura
Anna Maria Zaragoza Gagliardi

INTRODUÇÃO mário, mais da metade dos pacientes inves-


Fadiga é um sintoma bastante frequente tigados relataram que nunca tinham falado
no contexto de Cuidados Paliativos. É queixa sobre fadiga em uma consulta e os dois mo-
comum entre pacientes idosos, especialmente tivos mais frequentes foram: o fracasso dos
àqueles com doenças progressivas crônicas médicos para oferecer intervenções adequa-
potencialmente fatais, como neoplasias, in- das para o problema e a falta de consciência
suficiência cardíaca e doença pulmonar obs- dos próprios pacientes em reconhecer a fadi-
trutiva crônica em estágios avançados1. Em ga como um sintoma passível de tratamento
pacientes com câncer, é classificado como o efetivo12. Em vários estudos, a fadiga é des-
mais duradouro e perturbador sintoma2, com crita como um sintoma de menor relevância
o maior impacto sobre parâmetros de quali- do que dor ou dispneia pelos médicos. A jus-
dade de vida3,4. Em idosos, têm relação com tificativa seria que muitos a consideram evo-
diferentes fatores, como anemia, depressão lução natural de doenças avançadas, e que,
e diminuição de produção de energia neu- portanto, deveria ser um sintoma suportado9.
romuscular. Está associada com aumento da Além disso, a dificuldade em conceituá-la de
mortalidade por doenças cardiovasculares5,6, forma objetiva, torna sua definição comple-
acidente vascular cerebral7 e câncer de mama8. xa, abrangente, sendo necessário para o tra-
Também é causa de maior dependência fun- tamento haver uma abordagem multidimen-
cional, interrupção do tratamento da doença sional. Como exemplo, anemia, desnutrição,
de base e diminuição na qualidade de vida9,10. distúrbios de sono contribuem para o início
Alguns estudos sugerem, inclusive, que a du- da fadiga, assim como, outras condições clí-
ração mais prolongada de fadiga pode estar nicas podem ocorrer concomitante ao sinto-
relacionada com idade mais avançada9. ma, como depressão, ansiedade, síndrome de
Apesar de fadiga ser um sintoma comum caquexia e anorexia1. Apesar de, atualmente,
e com grande impacto sobre a qualidade de ser um tema bastante estudado, a fisiopatolo-
vida, a prevalência e importância da fadiga gia ainda não é clara e parece envolver vários
frequentemente não são reconhecidos em mecanismos diferentes que se complemen-
uma consulta médica11. Em um levantamen- tam, porém são insuficientes para justificar o
to realizado nos EUA, em atendimento pri- sintoma de forma isolada. Isso acaba influen-

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Capítulo 19 - Fadiga em Cuidados Paliativos e no idoso

ciando nas opções de tratamento disponíveis pode ser causado pela doença subjacente,
até o momento, sendo que, muitas vezes, a pelo tratamento da doença de base ou por
única intervenção proposta pela equipe de outras comorbidades. A Organização Euro-
saúde é a redução das atividades cotidianas péia para Pesquisa e Tratamento do Câncer
do paciente. sugere que sejam realizadas três perguntas
durante a anamnese que possam sugerir fa-
DEFINIÇÃO diga: “Você já se sentiu fraco?”, “Você estava
Entende-se por fadiga um estado de can- cansado?” e “Você precisa descansar?”1.
saço, tensão e perda de energia associada à Em pessoas saudáveis, a fadiga é definida
sensação de exaustão, mesmo na ausência de como um sentimento desagradável de fra-
qualquer sinal de fraqueza muscular. É um queza condizente com o ritmo circadiano
mecanismo de defesa do organismo contra e que normalmente alivia ao repouso. Por
o envolvimento do indivíduo em situações sua vez a fadiga crônica relacionada ao cân-
de estresse físico ou psicológico que possam cer ou a doenças crônicas é contínua, com
sobrecarregar sua reserva funcional11. Fadiga claras implicações físicas (diminuição de
em Cuidados Paliativos é um sintoma que energia, com necessidade de repouso cons-
tante), cognitivas (diminuição da atenção e
Tabela 19.1 - Definição de fadiga pela Classificação concentração) e afetivas (diminuição do in-
Internacional de Doenças (CID-10)
teresse e motivação). A redução de energia é
A1 e pelo menos 5 dos critérios descritos de A2 a A11 proporcional ao aumento da necessidade de
devem estar presentes na maioria dos dias, 2 semanas
consecutivas no último mês
repouso, reduzindo a concentração mental, a
motivação e o interesse em realizar ativida-
A
des diárias13 e não é completamente aliviada
- A1 Fadiga significante, com diminuição de energia e
aumento da necessidade de repouso, desproporcional ao
com o descanso14.
esforço No contexto oncológico, várias definições
- A2 Fraqueza generalizada, sensação de peso nos têm sido propostas para descrever fadiga.
membros Para tanto, a Fatigue Coalition, tem sugeri-
- A3 Diminuição da concentração e atenção
- A4 Diminuição da motivação e do interesse pelas
do a utilização da Classificação Internacio-
atividades do cotidiano nal de Doenças – décima revisão (CID -10)
- A5 Insônia ou hipersonia como critérios para a definição de fadiga
- A6 Sono não reparador relacionada ao câncer. Por essa classificação,
- A7 Percepção da necessidade de lutar para superar a
inatividade
exige-se presença obrigatória do primeiro
- A8 Sensibilidade emocional aumentada (tristeza, critério: “diminuição de energia ou aumento
frustração, irritabilidade) da necessidade de descanso, desproporcional
- A9 Dificuldade em completar atividades diárias ao nível de atividade e esforço do dia a dia”,
relacionadas aos sintomas de fadiga
- A10 Alteração de memória recente
mais a presença de pelo menos 5 dos 10 cri-
- A11 Sensação de mal-estar persistente por várias horas térios adicionais, descritos na tabela 19.1. Es-
B ses sintomas devem estar presentes na maior
Os sintomas devem causar sofrimento clinicamente parte dos dias por pelo menos 2 semanas
significativo ou prejuízo em atividades sociais ou consecutivas no último mês1.
ocupacionais com comprometimento de funcionalidade Existem consideráveis números de ins-
C trumentos para a avaliação de fadiga (ta-
Evidência na anamnese, exame físico ou resultados bela 19.2)9. Infelizmente, nenhum desses
laboratoriais, que os sintomas são consequência de instrumentos foi validado para a popula-
câncer ou do tratamento do câncer.
ção idosa, não existindo até o momento re-
D
comendações baseadas em evidências para
Os sintomas não devem ser consequência de esse seguimento populacional. A avaliação
comorbidades psiquiátricas, como depressão maior,
transtorno de somatização, transtorno somatoforme ou
da fadiga em indivíduos mais velhos repre-
delirium. senta um desafio especial, pois requer o de-

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Capítulo 19 - Fadiga em Cuidados Paliativos e no idoso

Tabela 19.2 - Intrumentos de medidas de fadiga


De todos esses instrumentos, o Multi-
Medidas dimensional Fatigue Inventory16, parece ser
Fatigue Sympton Inventory mais adequado para idosos por avaliar as cin-
Brief Fatigue Assessment Inventory
co dimensões da fadiga, permitindo avaliar
Functional Assessment of Cancer Therapy-F
Multidimensional Fatigue Inventory qual componente da fadiga é o mais prejudi-
Pearson-Byars Fatigue Checklist cado e ser de rápida aplicação. A escala é divi-
Piper Fatigue Scale dida em: Fadiga Geral (que inclui a declaração
Rhoten Fatigue Scale and Checklist
espontânea do paciente – “eu me sinto cansa-
do”), Fadiga Física (sensação física de cansaço
senvolvimento de instrumentos simples e desproporcional ao nível de atividade diária),
de fácil utilização que abranja todos os do- Atividade Reduzida, Motivação Reduzida e
mínios de fadiga. Além disso, relacionar o Fadiga Mental (dificuldade em concentra-
graus de fadiga e funcionalidade parece ser ção). Porém, ainda é um instrumento pouco
mais relevante em indivíduos com mais de conhecido, pouco reproduzido em trabalhos
60 anos, já que a fadiga está vinculada com científicos e sem validação no Brasil. Cada
diferentes grau de dependência funcional. item apresenta cinco níveis de intensidade e o
No momento, nenhum desses instrumen- paciente preenche de acordo com a intensida-
tos abrange funcionalidade. de de seus sintomas. (Tabela 19.3).

Tabela 19.3 - Multidimensional Fatigue Inventory (Questionário de Fadiga Multidimensional)

1. Eu me sinto apto. sim, é verdade. 12345 não, não é verdade.


2. Sinto-me capaz apenas de fazer um pouco sim, é verdade. 12345 não, não é verdade.
3. Eu me sinto muito ativo. sim, é verdade. 12345 não, não é verdade.
4. Eu sinto vontade de fazer todos os tipos de coisas
sim, é verdade. 12345 não, não é verdade.
boas.
5. Eu me sinto cansado. sim, é verdade. 12345 não, não é verdade.
6. Eu acho que faço muito em um dia. sim, é verdade. 12345 não, não é verdade.
7.Quando faço algo, eu consigo manter-me concentrado sim, é verdade. 12345 não, não é verdade.
8. Consigo suportar bem fisicamente. sim, é verdade. 12345 não, não é verdade.
9. Eu tenho pavor de ter que fazer coisas. sim, é verdade. 12345 não, não é verdade.
10. Eu acho que consigo fazer muito pouco em um dia. sim, é verdade. 12345 não, não é verdade.
11. Eu consigo me concentrar. sim, é verdade. 12345 não, não é verdade.
12. Eu me sinto descansado. sim, é verdade. 12345 não, não é verdade.
13. É preciso um grande esforço para me concentrar nas
sim, é verdade. 12345 não, não é verdade.
coisas.
14. Fisicamente, eu sinto que estou em uma condição
sim, é verdade. 12345 não, não é verdade.
ruim.
15. Eu tenho muitos planos. sim, é verdade. 12345 não, não é verdade.
16. Eu canso facilmente. sim, é verdade. 12345 não, não é verdade.
17. Eu fico muito cansada. sim, é verdade. 12345 não, não é verdade.
18. Eu não sinto vontade de fazer nada. sim, é verdade. 12345 não, não é verdade.

não, não é
19. Meus pensamentos facilmente perdem-se. sim, é verdade. 12345
verdade.

20. Fisicamente, eu sinto que estou em ótimas não, não é


sim, é verdade. 12345
condições. verdade.

Adaptado de Smets EM, Garssen B, Bonke B, et al. The multidimensional fatigue inventory (MFI). Psychometric qualities of an
instrument to assess fatigue. J Psychosom Res 1995;39:315–25.

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Capítulo 19 - Fadiga em Cuidados Paliativos e no idoso

EPIDEMIOLOGIA dade nos estudos deve-se a diferentes níveis


de atividade física entre o idoso e o adulto
Pacientes com câncer jovem. Pessoas idosas tendem a diminuir a
A fadiga é um dos sintomas mais fre- intensidade da atividade física e, portanto,
quentes do câncer e de seu tratamento. Em a percepção de fadiga pode ser menor nesse
um estudo americano com 1.000 pacientes seguimento etário.
em Cuidados Paliativos, a fadiga foi citada Em um estudo transversal, sobre a preva-
em 84% dos pacientes17. Em outro estudo lência de fadiga, em 199 idosos (média idade:
com 151 pacientes com câncer de ovário, a 88 anos, 82% mulheres) residentes em uma
prevalência de fadiga foi de 69%18, sendo que unidade de Cuidados Paliativos, 195 (98%)
entre as pacientes com doença metastática, a relataram algum cansaço, dos quais, 40%
prevalência de fadiga ultrapassou 75%. Em relataram fadiga moderada e 7% fadiga seve-
uma análise com pacientes em vigência de ra.29 De especial interesse, a fadiga foi asso-
quimioterapia adjuvante, 91% dos pacientes ciada com maior grau de dependência fun-
entrevistados classificaram a fadiga como o cional. Em outro estudo, foi constatado que
sintoma com maior impacto na vida diária.19 99% dos idosos com câncer, tratados com
Nessa análise, um dado interessante foi que, quimioterapia em ambulatório (idade média:
após o término das sessões de radioterapia e 71 anos), relataram algum nível de fadiga du-
quimioterapia, os pacientes classificaram a rante o período de tratamento.30,31
fadiga como o sintoma que mais afetou sua Com relação à associação entre fadiga e
vida diária, enquanto os médicos acredita- mortalidade em idosos, um estudo prospecti-
vam que a dor teria sido mais prejudicial.19 vo que acompanhou ao longo de 10 anos uma
população de idosos residentes na comunida-
Pacientes com doenças crônicas de, as taxas de mortalidade em 10 anos foi de
A fadiga também parece estar bastante 59% para idosos com fadiga, versus 38% para
presente em pacientes em Cuidados Palia- aqueles sem fadiga. Após o ajuste para fatores
tivos com doenças crônicas que não sejam de confusão, os participantes que estavam
câncer. Em um estudo transversal que ava- cansados no início do estudo tinham um
liou sintomas em pacientes com esclerose risco maior de morte do que aqueles que não
múltipla, mais da metade dos pacientes des- tinham. Nesse estudo, pacientes com fadiga
creveram a fadiga como um dos sintomas também apresentaram maior associação com
mais preocupante20. Resultado semelhante sintomas depressivos, com pior estado fun-
também foi descrito em pacientes com doen- cional e pior desempenho físico. A magnitu-
ça pulmonar obstrutiva crônica21, insuficiên- de da associação entre fadiga e mortalidade
cia cardíaca22 e HIV23,24. Assim como a fadiga foi similar à pacientes com diabetes mellitus
relacionada ao câncer, a etiologia é frequen- e doenças cardíacas.32,33
temente multifatorial.
FISIOPATOLOGIA
Idosos A fisiopatologia da fadiga relacionada não é
Na maioria dos estudos, a prevalência de totalmente entendida e na maioria dos pacien-
fadiga em adultos varia entre 5 a 50%. Al- tes é multifatorial. Importante diferenciar entre
guns estudos reportam ligeiramente mais a fadiga primária, provavelmente relacionada
fadiga em idosos do que em adultos jovens25, com a alta carga de citocinas e fadiga secundá-
enquanto outros sugerem que não há mu- ria, relacionada com o tratamento de síndro-
dança26 ou até diminuição de fadiga27 com o mes concomitantes e outras comorbidades1. Os
avançar da idade. Mulheres relatam duas ve- mecanismos potenciais causadores de fadiga
zes mais fadiga que homens e a percepção da podem ser classificados, de forma didática, em
fadiga em mulheres idosas parece ser maior centrais, periféricos e imunológicos, embora
do que em jovens28. Sugere-se que a dispari- haja uma grande sobreposição entre eles.

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Capítulo 19 - Fadiga em Cuidados Paliativos e no idoso

Mecanismos periféricos circadiano e interage com o sistema imuni-


A fadiga periférica é caracterizada pela tário e com o sistema de neurotransmissão
incapacidade de manter a força de contração cerebral38. Porém, há vários estudos que não
muscular e é comumente referida pelos pa- constataram a variação do cortisol em 24 ho-
cientes como fraqueza muscular. A miastenia ras em pacientes com fadiga versus paciente
gravis e a doença de McArdle são incluídas sem fadiga, sendo necessários mais estudos
nesse grupo.34 para comprovar essa hipótese. A fadiga tam-
Ainda há pouca pesquisa enfocando o bém parece estar envolvida com o metabo-
papel da arquitetura do músculo esquelé- lismo de serotonina cerebral. Em pacientes
tico na fisiopatologia da fadiga 35. Alguns doentes, há um aumento de 5-hidroxitripta-
autores sugerem que o descondicionamento mina, principal neuromodulador de 5-HT do
físico, por prejudicar a capacidade de exer- espaço sináptico, que aumenta em situações
cício, pode levar à atrofia muscular, gerando de aumento de TNF-alfa. Na fadiga, há um
sensação de fadiga. Por esse mecanismo, a aumento desse neuromodulador secundária
fadiga seria reversível com o treinamento e ao aumento de citocinas inflamatórias e con-
condicionamento físico, e é uma das razões sequente diminuição de serotonina na fen-
pelas quais muita pesquisa tem sido desen- da sináptica. 38
volvida nessa área, já que o exercício é uma A fadiga mental geralmente acomete os
das modalidades de tratamento não farma- seguintes domínios: memória, atenção, capa-
cológico. No entanto, alterações musculares cidade de aprender fatos novos e velocidade
parecem ocorrer apenas numa minoria dos de processamento de dados.34
doentes com fadiga crônica (aproximada-
mente 10%) e é uma característica que tam- Mecanismos imunológicos
bém ocorre como parte do processo natural Vários estudos têm tentado demonstrar
do envelhecimento36. associação entre fadiga e marcadores infla-
matórios. Não há consenso na literatura so-
Mecanismos centrais bre quais citocinas devem ser medidas e qual
Fadiga central refere-se à sensação subje- método deve ser escolhido para análise. Altas
tiva de fadiga, sem que necessariamente exis- concentrações de citocina têm sido relatados
ta uma alteração objetiva de força muscular. em associação com a fadiga em pacientes sub-
Ela é percebida em toda doença que altera o metidos à radioterapia e quimioterapia, bem
sistema nervoso central, autonômico e peri- como sobreviventes de câncer39,40. Os estudos
férico. Uma percepção de maior esforço para mostram aumento de receptor agonista (IL
realizar uma tarefa habitual e resistência di- -1ra), proteína C reativa, receptor solúvel de
minuída para realizar tarefas físicas e men- TNF de tipo II (sTNF-RII) e neopterin (atua
tais são características desse tipo de fadiga. na atividade de macrófagos). Também parece
Lesões estruturais ou de origem metabólica haver associação com leucopenia, em espe-
que alterem a condução do estímulo nervo- cial diminuição de linfócitos. Porém, apesar
so que conecta os gânglios da base, tálamo, de bem aceita, os mecanismos imunológicos
sistema límbico e o sistema cortical alto são não são exclusivos da fisiopatologia da fadi-
relacionadas à fadiga central.34 ga, e sim, de situações que aumentem o es-
A desregulação do eixo hipotálamo-hipó- tado pró-inflamatório do organismo, como
fise (EHH) tem sido sugerida como um pos- anemia, caquexia, febre e infecção, que por
sível mecanismo central de fadiga primária.37 sua vez, podem ser causa de fadiga secundá-
Sugere-se que o nível de cortisol diurno esteja ria ou agravar o estado de fadiga.
diminuído de forma sútil em pacientes com A patogênese da fadiga relacionada ao
fadiga, assim como à resposta ao cortisol em câncer é relacionada ao metabolismo energé-
situações de estresse parece estar abolida. O tico muscular do paciente oncológico, sono,
EHH é responsável pela regulação do ritmo ritmo circadiano, mediadores inflamatórios,

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Capítulo 19 - Fadiga em Cuidados Paliativos e no idoso

ativação do sistema imune, alterações hor- O segundo passo seria identificar algum
monais relacionadas aos efeitos sobre o eixo distúrbio do sono. A qualidade, a quantidade
hipotálamo-pituitário, menopausa precoce do sono assim como a existência da síndrome
ou privação androgênica em homens. das pernas inquietas ou episódios de apnéia
devem ser investigados.42
Causas de fadiga secundária Embora seja possível a coexistência de
Hipotireoidismo, hipogonadismo, desi- depressão e fadiga, é interessante que o mé-
dratação, distúrbios eletrolíticos, disfunção dico tente o máximo possível estabelecer um
hepática, insuficiência renal ou cardíaca, diagnóstico diferencial entre essas doenças.
distúrbios do sono, transtorno do humor e Pacientes com fadiga normalmente se quei-
ansiedade e caquexia cardíaca parecem estar xam de não possuírem energia para finaliza-
relacionados com sensação de fadiga crôni- rem tarefas que gostariam de realizar. Indi-
ca e são causas de fadiga secundária41. Asso- víduos deprimidos tendem a referir falta de
ciação com fadiga também tem sido descrita desejo em realizar tarefas antes prazerosas.
em várias drogas sedativas, regularmente Além disso a descrição de falta de energia
utilizadas em Cuidados Paliativos, como os tende a ser mais global, referida como “desâ-
analgésicos opioides, benzodiazepínicos, an- nimo para viver”.42
ti-depressivos e anti-convulsivantes.9 O exame físico pode sugerir causas se-
Transtornos ansiosos e depressivos são cundárias de fadiga como linfadenopatias
descritos em aproximadamente 40% dos pa- (linfoma ou metástases linfonodais); mu-
cientes com fadiga e essa associação é mais cosas hipocoradas (anemia); edema (insufi-
importante em idosos. Infelizmente a asso- ciência cardíaca); tônus muscular diminuído
ciação fisiopatológica da fadiga e da depres- (doenças neurológicas); bócio (tireoidopatia).
são não é clara. As tentativas de controlar a É importante, principalmente no idoso, afe-
fadiga utilizando antidepressivos inibidores rir a pressão arterial em decúbito dorsal e em
da recaptação de serotonina não atingiram ortostase, afim de se realizar diagnóstico di-
resultados satisfatórios.9 ferencial de hipotensão postural.42
Os altos níveis de citocinas inflamatórias O laboratório específico deve ser sem-
parecem diminuir a secreção de eritropoieti- pre solicitado embora altere em apenas 5%
na que, por sua vez, interferem na produção o manejo dos pacientes com fadiga. Dentre
de hemoglobina contribuindo para a anemia. os exames incluem-se: hemograma, VHS,
Quadros anêmicos são muito associados à TSH e T4 livre, glicemia, eletrólitos (sódio,
fadiga por diminuição da oferta de oxigênio potássio, cálcio, fósforo), CPK, ureia, crea-
muscular. Em um estudo relatado no traba- tinina, proteínas totais e frações, urina 1,
lho de Tralongo ET AL, pacientes oncológi- eletrocardiograma. Se o hemograma eviden-
cos com idade superior a 60 anos tiveram as- ciar anemia, deve-se solicitar ferro, ferritina,
sociação positiva entre intensidade de fadiga transferrina, vitamina B12, ácido fólico, áci-
e níveis de hemoglobina séricos.9 do metilmalônico e homocisteína sérica. Em
caso de suspeita de doença reumatológica ou
MANEJO CLÍNICO DE FADIGA neurológica, solicitar também exames mais
A análise dos diagnósticos diferenciais específicos como o painel de auto-anticorpos
deve inicialmente identificar causas co- e ressonância magnética de crânio.42
muns de fadiga. A causa mais frequente é a
medicamentosa e as classes de drogas com TRATAMENTO
maior prevalência são: sedativos-hipnóti-
cos, antidepressivos, relaxantes muscula- Manejo das causas
res, opioides, anti-hipertensivos, beta- blo- secundárias de Fadiga
queadores, anti-histamínicos e a maioria Medicamentos que podem causar fadiga
dos antibióticos.42 devem ser descontinuados ou substituídos se

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Capítulo 19 - Fadiga em Cuidados Paliativos e no idoso

possível. Uma boa higiene do sono deve ser fadiga do que o repouso. Exercícios de resis-
sempre incentivada, com recomendações es- tência duas vezes na semana também mos-
pecíficas: possuir horário fixo para levantar tram bons resultados. Alguns pacientes com
pela manhã, não dormir com rádio ou tele- câncer respondem bem à exercícios de flexi-
visão ligados, manter o silêncio noturno, não bilidade como o Yoga e à acupuntura. 43, 44,45,46
dormir durante o dia por períodos superio-
res a uma hora, evitar café, cigarro, álcool, Abordagem da dimensão
ingestão de quantidades copiosas de líquidos emocional da Fadiga
ou alimentos antes de deitar, incentivar ativi- A anamnese do paciente com fadiga deve
dades físicas diárias no período matutino ou abordar questões como estilo de vida, perso-
vespertino e não recomendá-las até 2 horas nalidade pré-mórbida e expectativas futuras.
antes do horário de se deitar. É importante É comum que pacientes com patologias psi-
investigar urge-incontinência urinária, sin- quiátricas somatizem ou prefiram queixar à
toma mais proeminente à noite e causa co- seus médicos problemas físicos, pois acredi-
mum de insônia com consequente fadiga. tam que terão mais atenção ou serão melhor
Devemos orientar ainda que o indivíduo vistos. Além disso, a experiência de fadiga é
utilize a cama apenas para o sono ou ativida- tão individual, complexa e vaga que muitas
des sexuais. Caso o paciente deite-se e esteja vezes o paciente não consegue definir ao mé-
ainda sem sono, o ideal é levantar e realizar dico essa experiência.42
atividades relaxantes. Caso essas medidas O exame mental deve conter avaliação do
não sejam eficazes, avaliar necessidade de humor, da função cognitiva, da memória e da
associação com terapêutica farmacológica.43 personalidade. Depressão, ansiedade genera-
Pacientes oncológicos, renais crônicos lizada, transtornos alimentares, déficits de
ou com insuficiência cardíaca com queixa atenção, abuso de álcool ou drogas e demên-
de fadiga tendem a ter piora dos sintomas cia não devem ser negligenciados.42
quando a hemoglobina cai abaixo de 10 g/ Muitos pacientes se beneficiam de tera-
dl4. É interessante tentar manter os níveis pia cognitivo-comportamental. É comum
acima deste limite, tratando a anemia de os pacientes com fadiga sentirem-se culpa-
acordo com sua causa base.43 dos por não corresponderem às expectativas
Pacientes com diagnóstico diferencial dos familiares. Sentem-se em posição des-
de depressão devem realizar curso com an- confortável quando precisam pedir ajuda. O
tidepressivo, preferencialmente inibidor de sentimento de inferioridade é comum. Mui-
recaptação de serotonina, por 6 semanas e tos possuem dificuldade de concentração e
posterior re-avaliação.43 diminuição da memória recente o que eles
normalmente atribuem à idade. Para se pro-
Manejo Geral tegerem e protegerem seus familiares tendem
à diminuir suas atividades e seu círculo so-
Mudança de estilo de vida cial, o que agrava a sensação de solidão e de
Realizar algum tipo de atividade física incapacidade.47
além de ajudar no sintoma físico de fadiga, Os elementos-chave nesse tipo de abor-
melhora as relações interpessoais e amplia dagem normalmente são: combate do medo
o círculo social do indivíduo. Retornar ao gerado pelos sintomas físicos (geralmente
trabalho, mesmo que de uma forma parcial medo da incapacidade ou medo da morte),
ou exercer trabalhos voluntários são associa- aceitação do incompleto, treino de não ado-
dos de forma consistente à melhora de fadi- tar postura extremamente rígida consigo
ga de qualquer etiologia. A atividade física mesmo, tentar se livrar da culpa diante de
aeróbica regular moderada (30 minutos de eventuais falhas. Atividades como passeios
caminhada diariamente ou 150 minutos por em parques, jardinagem ou pescaria são
semana) é associada a um melhor controle de associados ao bem-estar nesses pacientes.

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Capítulo 19 - Fadiga em Cuidados Paliativos e no idoso

Qualquer atividade que não demande grande minuição de apetite é também comum, mas
performance física deve ser encorajada.46,47 geralmente transitória.48
Apesar da evidência positiva do uso des-
Tratamento farmacológico te medicamento na fadiga, principalmente
• Metilfenidato em pacientes oncológicos, devemos lembrar
O metilfenidato é um estimulante do que se trata de um medicamento controlado,
sistema nervoso central, muito conhecido com potencial de dependência a longo prazo.
pelo seu nome comercial (ritalina). O me- Mais estudos são necessários para definir-
canismo pelo qual ele produz seus efeitos mos a população que possui real beneficio
psíquicos e comportamentais não está cla- com seu uso.48
ramente estabelecido.48
Existem algumas evidencias de que o • Modafinil
metilfenidato possui eficácia contra a fadi- O modafinil é um psicoestimulante cen-
ga. Bruera ET AL. realizou estudo com 112 tral utilizado no tratamento da narcolepsia.
pacientes oncológicos em cuidado paliativo É um tratamento efetivo nos pacientes que
com queixa de fadiga administrando me- possuem esclerose múltipla e sonolência
tilfenidato por 01 semana e Lower ET AL. diurna, doença de Parkinson ou distrofia
estudou 152 pacientes também oncológi- miotônica, embora uma quantidade maior
cos durante o tratamento quimioterápico e de trials sejam necessários para confirmar
manteve o medicamento por 8 semanas. Os a segurança do seu uso em larga escala. A
dois estudos indicaram uma redução estatis- dose utilizada para tratamento da narcolep-
ticamente significante do sintoma de fadiga sia é de 200 mg 1x/dia, pela manhã. Não há
quando comparado ao uso de placebo. Ape- evidência consistente que doses superiores
nas efeitos colaterais menores foram relata- a 400 mg confiram benefício adicional. Em
dos como náusea e cefaleia. A dose utilizada idosos, iniciar com doses menores, como
variou entre 10 e 20 mg/dia, a depender da 100 mg/dia. O modafinil no Brasil tem
resposta terapêutica.48 nome comercial de “Stavigile” e seu meca-
A substância ativa do metilfenidato é rá- nismo de ação é desconhecido.34
pida e quase completamente absorvida por
via oral. Pelo extenso metabolismo de pri- • Corticosteroides
meira passagem, sua disponibilidade sistê- Corticoides são comumente usados na
mica é de apenas 30% da dose. Sua ingestão prática do cuidado paliativo visando trata-
junto com alimentos acelera a absorção mas mento de náuseas, anorexia, dor óssea e fadi-
não tem efeito na quantidade absorvida e sua ga. A droga mais utilizada é a dexametasona,
meia-vida média de 2 horas.48 embora a prednisona, a hidrocortisona e a
As contraindicações ao uso do metilfeni- metilprednisolona também sejam opções. O
dato são: transtorno de ansiedade, hipertireoi- mecanismo de ação dos corticoides na fadiga
dismo, arritmia, angina, glaucoma e hipersen- é desconhecido, embora na oncologia a prin-
sibilidade ao metilfenidato. Também é con- cipal hipótese seja a de inibir algumas subs-
tra-indicado a pacientes com tiques motores, tâncias secretadas pelo tumor, graças a seu
história familiar ou diagnóstico de síndrome efeito anti-inflamatório.48
de Tourette. Deve ser administrado com cau- Uma metanálise realizada em 2012 por
tela em pacientes com epilepsia. A pressão Thiem et all incluiu apenas 11 estudos con-
arterial deve ser monitorizada, especialmente trolados de corticoterapia em pacientes pa-
naqueles com hipertensão. O nervosismo e a liativos, sendo 07 deles duplo cego, todos
insônia são as reações adversas mais comuns. feitos em pacientes oncológicos. O endpoint
Ocorrem no início do tratamento e são usual- primário foi o controle de náuseas ou o estí-
mente controlados pela redução da dose e pela mulo orexígeno em todos os estudos, e a me-
omissão da dose da tarde ou da noite. A di- lhora da fadiga foi considerada um endpoint

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Capítulo 19 - Fadiga em Cuidados Paliativos e no idoso

secundário. Esta metanálise continha quatro • Eritropoietina


estudos que avaliavam de forma quantitativa A revisão sistemática feita por Minton ET
a queixa de fadiga, num total de 206 pacien- AL também incluiu a análise de eritropoie-
tes tratados com corticoides e 249 pacientes tina no tratamento de fadiga em pacientes
com placebo ou outras drogas. O estudo de oncológicos anêmicos. Foram incluídos 10
Fossa ET AL foi o maior dentre eles e o único trials no estudo (oito dos quais envolvendo
que mostrou superioridade estatística da cor- pacientes em vigência de quimioterapia),
ticoterapia: de 201 pacientes com câncer de num total de 5712 pacientes, todos com he-
próstata resistentes à hormonioterapia, 101 moglobina abaixo de 12 mg/dl. Os tumores
receberam prednisona 20 mg por 6 semanas analisados eram de diversas etiologias e a
e tiveram melhora sintomática quando com- dose do medicamento variou entre 3000 a
parado ao uso de flutamida 750 mg nos de- 40000 unidades, uma e três vezes na semana.
mais 100 pacientes. Ainda assim, evidências Um efeito benéfico estatisticamente signifi-
cientificas que sustentem o uso do corticóide cante foi visto após 12 semanas de tratamen-
como terapia de escolha na fadiga são insufi- to. Apesar desse potencial efeito benéfico,
cientes até o momento.48 ainda faltam estudos orientando sobre dose,
frequência e grupo de pacientes que se bene-
• Androgênios ficiariam do tratamento. É prudente sempre
Androgênios são utilizados no alívio escolher a menor dose eficaz possível dado ao
sintomático da fraqueza muscular em inú- risco teórico de eventos troemboembólicos.48
meras doenças avançadas como DPOC, in-
suficiência renal crônica, distrofias muscu- • Outros
lares e atrofia muscular secundária ao HIV. Existem algumas particularidades no tra-
Esta medicação é essencial no tratamento do tamento da fadiga em doenças neurológicas,
hipogonadismo secundário, por exemplo, por exemplo, na esclerose múltipla a amanta-
pós-quimioterapia. O efeito anabólico dos dina (antiviral) é a droga mais eficaz no com-
androgênios é considerado útil no cuidado bate a fadiga.34
paliativo ao melhorar a sensação de fadiga Não existem evidências que suportem o
por aumento da força muscular. Exemplos de uso de antidepressivos inibidores de recap-
androgênios utilizados são a testosterona, a tação de serotonina na fadiga, a não ser que
oxandrolona, a nandrolona, dehidroepian- exista quadro de depressivo associado.43, 45,48
drosterona e a oximetolona.48 O guaraná (Paullinia cupana) é uma
Uma metanálise contendo 5 estudos planta originária da Amazônia que tem sido
controlados e randomizados utilizando an- utilizado como tratamento “caseiro” em di-
drogênios em pacientes HIV positivos foi versas moléstias, inclusive fadiga. Suas pro-
realizada em 2012 para análise de fadiga, em priedades energéticas e tônicas devem-se
um total de 184 pacientes recebendo testos- principalmente às metilxantinas presentes
terona ou oximetolona e 198 pacientes rece- em suas sementes, predominantemente a ca-
bendo placebo analisados. Os cinco estudos feína (trimetilxantina).50
detectaram melhora deste sintoma. Impor- A vitamina D vem também sendo estu-
tantes efeitos colaterais foram relatados: dada como medicamento capaz de aliviar fa-
irritabilidade, acne, disfunção ejaculatória, diga em pacientes não oncológicos, porém os
calvície, insônia, piora do HDL colesterol e resultados ainda são inconclusivos. Há vá-
toxicidade hepática.48 rias evidências de que a vitamina D participa
No momento as evidências são insufi- de dois aspectos importantes da função neu-
cientes para recomendar o uso desta classe ro-muscular: a força muscular e o equilíbrio.
de medicação para tratamento de fadiga no Especialmente no que se refere à célula mus-
contexto de cuidado paliativo, embora seja cular esquelética, sabe-se que a vitamina D
uma proposta promissora.48 atua através de um receptor específico, exer-

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Capítulo 19 - Fadiga em Cuidados Paliativos e no idoso

cendo ações que envolvem desde a síntese 2. CURT G, BREIBARY W, CELLA D ET AL.
proteica até a cinética de contração muscu- Impact of cancer related fatigue on the lives
lar, que repercutem na capacidade de realizar of patients: new findings from the Fatigue
movimentos rápidos que evitam uma queda. Coalition. Oncologist. 2000. 5:353-60.
Clinicamente, a deficiência de vitamina D, 3. BARNES EA, BRUERA E. Fatigue in pa-
bastante comum em idosos, tem sido relacio- tients with advanced cancer: A review. Int J
nada a um aumento da incidência de quedas, Gynecol Cancer. 2002. 12:424-428.
a uma diminuição da força muscular e a uma 4. ASBURY FD, FINDALY H, REYNOLDS B,
deterioração do equilíbrio, avaliada pela os- MCKERRACHER K. Canadian survey of
cilação do corpo na postura ereta. Por outro cancer patients experiences: are their needs
lado, tem sido demonstrado que a suplemen- being met? J Pain Symptom Manage. 1998.
tação associada de cálcio e vitamina D em 16:298-306.
idosos deficientes contribui para melhoria 5. PRESCOTT E, HOLST C, GRONBAEK M
destes aspectos da função neuro-muscular. ET AL. Vital exhaustion as a risk factor for
No entanto, ainda há muito a ser descoberto ischaemic heart disease and all-cause mor-
sobre o papel específico da vitamina D sobre tality in a community sample. A prospec-
o sistema nervoso central. Pesquisas futuras tive study of 4084 men and 5479 women
são necessárias para ratificar os benefícios da in the Copenhagen City Heart Study. Int J
suplementação oral de vitamina D sobre a Epidemiol. 2003. 32:990–997.
força muscular, oscilação postural e incidên- 6. APPELS A, MULDER P. Excess fatigue as
cia de quedas, tão comuns entre os idosos. 51 a precursor of myocardial infarction. Eur
Heart J. 1988. 9:758–764.
CONCLUSÃO 7. GLADER EL, STEGMAYR B, ASPLUND
O cuidado paliativo tem como objetivo K. Poststroke fatigue: a 2-year follow-up
o alívio sintomático do paciente, principal- study of stroke patients in Sweden. Stroke.
mente da dor, dispneia, náusea, depressão 2002. 33:1327–1333.
e fadiga. Embora cada um destes sintomas 8. GROENVOLD M, PETERSEN MA, IDLER
seja igualmente penoso, muitos estudos são E ET AL. Psychological distress and fatigue
realizados abordando tratamento de dor e predicted recurrence and survival in pri-
depressão em detrimento dos outros sinto- mary breast cancer patients. Breast Cancer
mas. A fadiga é o sintoma mais comum no Res Treat. 2007. 105:209–219.
cuidado paliativo, não apenas nos pacientes 9. TRALONGO P, RESPINI D, FERRAÙ
com câncer, mas em vários outros segmentos F. Fatigue and aging. Crit Rev Onc. 2003.
clínicos. Infelizmente, pelo número limitado 48:57-64.
de estudos clínicos direcionados para este 10. MENG H, HALE L, FRIEDBERG F. Pre-
sintoma, a fadiga não é adequadamente tra- valence and predictors of fatigue in mid-
tada.8 Este capítulo teve como objetivo reve- dle-aged and older adults: evidence from
lar a importância desse sintoma na condução the health and retirement study. J Am Ge-
de pacientes com doenças crônicas e facilitar riatr Soc. 2010. 58(10):2033-34.
o seu manejo. 11. VOGELZANG NJ, BREITBART W, CEL-
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Anorexia e caquexia 20
CAPÍTULO

Thaisa Segura da Motta


Karina Kuraoka Tutiya
Eduardo Canteiro Cruz

INTRODUÇÃO cluindo câncer2, insuficiência renal crônica3,


A perda ponderal não intencional no ido- insuficiência cardíaca congestiva e síndrome
so gera grande impacto negativo em sua qua- da imunodeficiência adquirida (SIDA)4.
lidade de vida. A perda de músculo e de mas-
sa óssea aumenta a chance de quedas, fratura DEFINIÇÃO
de quadril e institucionalização; já a perda de Anorexia é definida como perda do apeti-
gordura e a queda da albumina tem o poten- te ou da vontade de comer, mesmo em vigên-
cial de aumentar a toxicidade de determina- cia de privação calórica1,5.
das drogas. É uma condição frequente, prin- O termo caquexia tem origem grega: ka-
cipalmente em idosos após a alta hospitalar, kos, que significa má e hexis, que significa
podendo chegar a 50% dos casos, sendo tam- condição, descrevendo uma perda progressi-
bém encontrada em 5-10% dos residentes em va de gordura e massa muscular associada à
instituições de longa permanência.1 doença subjacente. A anorexia, a inflamação,
Existem seis causas principais de per- a resistência à insulina e o aumento da degra-
da de peso em idosos: anorexia, caquexia, dação das proteínas musculares são frequen-
má-absorção, hipermetabolismo, desidra- temente encontradas na caquexia. A lipólise
tação e sarcopenia. Neste capítulo, o enfo- aumenta os triglicerídeos e os ácidos graxos
que será dado aos aspectos relacionados à circulantes.1,5, 6, 7
anorexia e à caquexia. "Pré-caquexia" é uma condição associa-
A diminuição do apetite (anorexia) e o da com nenhuma ou pequena perda de peso
catabolismo de tecido magro são consequên- (menos de 5% de perda de peso corporal em
cias comuns de uma série de doenças crôni- 6 meses), com os mesmos comemorativos da
cas. Nessas doenças, os efeitos sinérgicos da caquexia, ou seja, doença subjacente, presen-
diminuição da ingestão calórica e do aumen- ça de alterações inflamatórias, imunológicas
to do gasto energético geram uma perda con- e metabólicas.
tínua de peso em que a massa muscular não Na anorexia, a restrição calórica em si in-
é adequadamente preservada. A presença de duz a uma perda de peso menos grave e uma
caquexia é um indicador de prognóstico ne- via metabólica diferente caracterizada por
gativo em uma infinidade de condições, in- diminuição do gasto energético e preserva-

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Capítulo 20 - Anorexia e caquexia

ção da massa magra às custas de preservação Tabela 20.1 - Método Mnemônico “Meals on
Wheels” para as causas tratáveis de perda de peso
da perda de gordura. Assim, a anorexia não
causa a perda de peso extrema causada na •M  edications (Medicações)
caquexia; além disso, terapia nutricional não •E  motional (Emocional/depressão)
•A  lcoholism (Alcoolismo)
reverte a caquexia.5
• L ate life paranoia (“Paranóia” do idoso)
Clinicamente, a síndrome anorexia ca- •S  walling problems (Disfagia)
quexia se apresenta com perda de peso, ape- •O  ral problems (Alterações em cavidade oral)
tite reduzido, saciedade precoce, atrofia mus- •N  osocomial infections / no Money (infecções
nososcomiais/ pobreza)
cular e fraqueza. Esse processo é observado
•W  andering/ Dementia (Perambulação/ demência)
em várias condições clinicas como: câncer, •H  yperthyroidism/ Hypercalcemia/ Hypoadrenalism
doenças cardíacas, renais, pulmonares.5 (Hipertireoidismo/ Hipercalcemia/ Hipocortisolismo)
•E  nteric Problems – malabsoption (Alterações
intestinais - má absorção)
INVESTIGAÇAO CLÍNICA •E  ating problems – tremor (Dificuldade para se
A anorexia do envelhecimento pode ser clas- alimentar – p.ex. tremor)
sificada em fisiológica, patológica, psicológica e • L ow salt, low cholesterol diet (Dieta pobre em sal e
gordura)
ambiental/social8. •S  hopping and meal preparation (Compra e preparo da
Na senescência, é esperada uma redução da comida)
ingestão alimentar em 30% nos homens e 20% Adaptado de: Morley JE. Undernutrition in older adults.
nas mulheres, a qual é denominada anorexia In: Family Practice 2012.
fisiológica do envelhecimento. Alguns fatores
precipitantes são: redução do paladar e do olfa- mento da massa gorda e decréscimo no gasto
to, retardo do esvaziamento gástrico e aumento energético15.
na liberação de colecistoquinina, que aumenta a A etiologia é multifatorial, geralmente re-
sensação de saciedade1,8. lacionada a uma doença de base, e associada
A anorexia patológica é secundária a uma a uma via central e periférica de sinalização
causa clínica.8 Pode-se citar a doença pulmo- neuroendócrina, que regula tanto o apetite
nar obstrutiva crônica (dispneia ao se alimen- como o gasto energético. Algumas citocinas
tar), angina mesentérica (dor abdominal após inflamatórias como fator de necrose tumo-
as refeições), constipação intestinal crônica ral (TNF) , interleucina (IL) - 6 e interferon
(sensação de saciedade), doenças neurológicas (IFN) - têm sido postuladas como tendo
(disfagia) e demência (indiferença à comida).8 papel principal na diminuição do apetite e
Medicamentos, particularmente a polifarmácia, aumento do gasto energético. O aumento das
são outra causa comum de perda de peso, assim citocinas no hipotálamo aumenta a produ-
como restrição alimentar, devendo ser evitada ção de triptofano, resultando na ativação de
em idosos frágeis9,10. O câncer totaliza menos de neurônios POMC e subsequente anorexia. 5
10% das causas de desnutrição em idosos.4 A idade avançada tem efeitos importantes
A principal causa de anorexia psicoló- na homeostase energética e desregulação das
gica em idosos da comunidade e residentes adipocinas, incluindo a leptina. A leptina é
de instituições de longa permanência é a de- um peptídeo produzido pelos adipócitos que
pressão11–14. age no sistema nervoso central estimulando a
Entre os aspectos sociais, vale ressaltar como saciedade e a produção de energia. Níveis bai-
principais causas a pobreza, solidão e o isola- xos de leptina estimulariam, via sistema ner-
mento social. voso central, uma resposta compensatória le-
vando ao aumento do apetite, diminuição do
FISIOPATOLOGIA gasto energético e ganho de peso. Entretanto,
A perda de peso em idosos é um forte pre- este mecanismo parece não estar preservado
ditor de morbidade e mortalidade. O enve- na maioria das doenças crônicas, apesar da
lhecimento normal envolve uma redução no perda de peso observada.5
apetite, diminuição da massa muscular, au- Níveis elevados de leptina associados à

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Capítulo 20 - Anorexia e caquexia

responsividade reduzida hipotalâmica têm TRATAMENTO


sido encontrados em modelos animais e hu- A base do tratamento da desnutrição é pri-
manos de envelhecimento. Idosos com ca- meiramente prover alimentação adequada.
quexia tendem a ter marcadores inflamató- Uma revisão na Cochrane mostrou que
rios elevados associados a baixos níveis de a suplementação nutricional oral diminuiu
leptina circulantes, ambos correlacionados mortalidade e tempo de internação, porém
com pior prognóstico.5 deve ser oferecida nos intervalos entre as re-
feições. Se administrada concomitantemen-
DIAGNÓSTICO te, pode resultar em redução da ingestão
Tabela 20.2 - Diagnóstico da Síndrome alimentar.17
Anorexia/Caquexia Duas estratégias terapêuticas podem ser
Perda de peso de pelo menos de 5% ou mais em 12 adotas no tratamento da caquexia do câncer:
meses, ou menos, na presença de doença subjacente,
além de três dos seguintes critérios estimuladores de apetite e neutralizadores
1 Diminuição da força muscular dos distúrbios metabólicos.
2 fadiga
3 Anorexia ESTIMULADORES DO APETITE
4 Baixo índice de massa magra corpórea Diversas drogas podem ser usadas como
5 Alteração bioquímica estimuladores do apetite. O acetato de meges-
(proteína C reactiva > 5,0 mg / l, IL-6 > 4,0 pg / ml, anemia (Hb < 12
g / dl), baixos níveis séricos de albumina (<3,2 g / dl))
trol e a medroxiprogesterona são progestáge-
Adaptado de Evans WJ, Morley JE, Argiles J, Bales C, nos e melhoram o apetite, a ingestão calórica
Baracos V, Guttridge D, et al. Cachexia: a new definition.
Clin Nutr. 2008.
e o status nutricional, além de impactarem
Figura 20.1 - Alvos terapêuticos para caquexia do câncer. Existem diferentes abordagens terapêuticas
para combater a anorexia e distúrbios metabólicos baseados na combinação de suporte nutricional,
medicamentos específicos e nutracêuticos, que são componentes isolados de alimentos que apresentam
propriedades terapêuticas. O objetivo para o tratamento da caquexia são dois: anti-catabólico (dirigido para
gordura e músculo) e anabólicos (levando à síntese de macromoléculas)

Caquexia

Alvos para o tratamento

Anorexia Distúrbio Metabólico

Tratamentos

Suporte nutricional Nutracêuticos Drogas

Objetivos

Anabólico Anti-Catabólico

Adaptado de: Argiles JM, Olivan M, Busquets S, López-Soriano FJ. Optimal management of cancer anorexia-cachexia
syndrome. Cancer Management and Research. 2010:2 27-38)

197

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Capítulo 20 - Anorexia e caquexia

positivamente na qualidade de vida. Acetato disso, o peptídeo inibe a expressão de leptina


de megestrol (Megestat®, Femigestrol®): dose e citocinas pró-inflamatórias22. Um estudo
mínima eficaz é de 160mg/dia, com objeti- experimental demonstrou que a adminis-
vo de atingir 480mg/dia (nível de evidencia tração repetida de grelina melhora a função
B). Acetato de Medroxiprogesterona (De- cardíaca e atenua o desenvolvimento de ca-
po®Provera®, Cycrin®, Farlutal®): dose míni- quexia cardíaca na insuficiência cardíaca.
ma é 200mg ao dia (nível de evidência B). Os Estes resultados sugerem que a grelina tem
principais efeitos colaterais são aumento do efeitos cardiovasculares e regula o metabo-
risco de tromboembolismo, motivo pelo qual lismo energético através de mecanismos GH-
não é recomendado para pacientes acamados dependente e GH- independente.23
e não deve ser utilizado por período superior Por conseguinte, a administração de gre-
a três meses19. lina pode ser uma nova estratégia no futuro.
Os canabinóides têm efeito sobre o ganho Os antagonistas de melanocortina: O re-
de peso e têm sido utilizados para aumentar ceptor da melanocortina (MC4) está envol-
ingestão de alimentos em doentes oncoló- vido na cascata anorexígena, modulando a
gicos. Postula-se que eles atuem através de ingestão de alimentos por dois mecanismos
receptores de endorfina ou pela inibição da diferentes que são tanto de leptina-depen-
síntese de prostaglandinas. Acredita-se ain- dente e quanto leptina- independente24. A
da que possam atuar na inibição da síntese utilização de antagonistas de MC4 provou
e secreção de citocinas. Contudo, estudo ser eficaz na prevenção da anorexia, perda de
clínico recente mostrou pouca eficácia tan- massa corporal magra e do gasto energético
to com a administração oral de extrato de basal em animais experimentais sofrendo
canabinóide ou delta 9-tetrahidrocanabinol de caquexia. No entanto, não existem dados
no tratamento de pacientes com síndrome de sobre o tema em humanos e futuros ensaios
anorexia-caquexia relacionada ao câncer.18,20 clínicos são necessários.25, 26
A ciproheptadina é um antagonista da
serotonina que atua bloqueando a ativida- NEUTRALIZADORES DOS DISTÚRBIOS
de serotoninérgica da caquexia oncológi- METABÓLICOS
ca. Estudos apontam que a ciproheptadina As citocinas agem em vários locais-alvo,
foi capaz de aumentar o peso corporal em tais como a medula óssea, miócitos, hepató-
crianças caquéticas, entretanto, em adultos citos, adipócitos, células endoteliais e neurô-
com câncer avançado, não impediu a perda nios, onde produzem uma cascata complexa
de peso progressiva.18 de respostas biológicas, que conduzem ao
Os corticosteroides têm sido usados para gasto energético associado à caquexia. As ci-
aumentar a ingestão alimentar em pacientes tocinas implicadas são: TNF - α, IL -1, IL-6
oncológicos; atuam minimizando sintomas e IFN-γ. Estas citocinas possuem os mesmos
como anorexia e astenia e propiciando sensa- efeitos metabólicos e exibem efeitos sinérgi-
ção de bem-estar. A dexametasona diminui cos quando administradas de forma associa-
significativamente a perda de apetite e per- da. Portanto, as estratégias terapêuticas têm
da de peso. Vale lembrar que o tratamento sido baseadas no bloqueio da síntese e da
prolongado pode levar a fraqueza, delirium, ação das mesmas18.
osteoporose e imunossupressão, alterações A pentoxifilina, um derivado da me-
normalmente presentes em pacientes com tilxantina, é um inibidor da fosfodiesterase
câncer avançado. Infelizmente, o tratamento que inibe a síntese de TNF por meio da di-
com corticosteroides parece não ter efeitos minuição da transcrição gênica. Estudos
significativos na redução da mortalidade.21 clínicos têm demonstrado que a droga não
A grelina é um mediador orexígeno. Tem conseguiu melhorar o apetite ou aumentar
um papel chave no aumento do apetite e, por o peso de pacientes caquéticos, e pacientes
conseguinte, na ingestão de alimentos. Além frequentemente relataram efeitos secundá-

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Capítulo 20 - Anorexia e caquexia

rios gastrointestinais. Novos ensaios clínicos tratados com etanercept combinado com um
randomizados são necessários para avaliar a agente antitumoral (docetaxel) tiveram me-
eficácia de pentoxifilina no tratamento da ca- nos fadiga e melhoraram a tolerabilidade do
quexia do câncer. tratamento antitumoral. No entanto, a uti-
A talidomida suprime o TNF-α em mo- lização rotineira de anticorpos anti-citocina
nócitos in vitro e normaliza níveis elevados é, atualmente, muito dispendiosa, devido ao
de TNF-α in vivo. Um estudo randomiza- fato deste tipo de terapia requerer um grande
do, placebo-controlado, em pacientes com número de moléculas de anticorpos, a fim de
caquexia do câncer mostrou que a droga foi bloquear a ação completa das citocinas29.
bem tolerada e eficaz para atenuar perda de Citocinas anti-inflamatórias e anabólicas:
peso e massa corporal magra em pacientes a gravidade da síndrome caquética não é só
com câncer pancreático avançado, embora dependente da produção de citocinas cata-
sem melhora na sobrevida18. bólicas pró-inflamatórias, mas também das
Os anticorpos e receptores solúveis: a uti- chamadas citocinas anti-inflamatórias (IL-4,
lização de anticorpos anti-citocina (mono IL-10 e IL-12. A IL-15) que têm sido implica-
ou policlonais) e antagonistas de receptores da como um fator anabólico para o músculo
de citocinas ou de receptores solúveis con- esquelético. Estas citocinas são capazes de
duziu a alguns resultados interessantes. Em diminuir a degradação proteica, diminuir a
ratos que carregam o Yoshida AH-130 asci- taxa de fragmentação de DNA e aumentar a
te hepatoma (um tumor altamente caqueti- expressão de UCP3 no músculo esquelético,
zante), o anti- TNF resultou numa reversão sendo estes os fatores mais importantes asso-
parcial das anormalidades associadas com ciados com perda de massa muscular duran-
o metabolismo de lipídios e proteínas18. Em te a caquexia do câncer.30,31
seres humanos, no entanto, os ensaios clí- Embora não haja dados clínicos disponí-
nicos com o tratamento anti-TNF levaram veis, o tratamento experimental da caquexia
a resultados pobres em reverter o catabolis- em animais com a IL-15 conduz a uma me-
mo proteico associado a caquexia da sepse lhoria da massa muscular e da performance.30
do câncer27. Em relação à IL-6, modelos ex- Os dados referem-se a estudos experi-
perimentais têm demonstrado que o uso de mentais e clínicos: + → leve efeito benéfico.
anticorpos é altamente eficaz na prevenção ++ → resultados relativamente bons. +++ →
da caquexia induzida pelo câncer18. Strass- tratamento satisfatório. - → tentativa mal su-
man et al demonstraram que a droga expe- cedida. ? → Desconhecido18
rimental suramina (que impede a ligação de
IL-6 nos receptores de superfície) bloqueia
parcialmente (até 60%) os efeitos catabólicos
associados ao crescimento do adenocarcino- Tabela 20.3 - Eficiência dos diferentes
ma do cólon em ratos28. Quanto às outras ci- tratamentos anti-caquexia
tocinas, a terapia anti-IFN-γ também foi efi- Drogas Eficiência
caz em reverter a caquexia em camundongos Derivados progestágenos ++
com o carcinoma de pulmão de Lewis. Além Canabinóides +
disso, o bloqueio da IL-1 por meio ações do Ciproheptadina +

antagonista do receptor IL-1 (IL-1ra), em Corticosteroides -

ratos portadores de tumor não teve qual- Grelina ++

quer efeito sobre peso corporal ou reversão Pentoxifilina ?

das alterações metabólicas. Uma abordagem Talidomida +


Anticorpos anti-citocinas
semelhante é a utilização de anti-citocina e receptores solúveis
-
como o etanercept. Monk et al mostraram,
Adaptado de: Argiles JM, Olivan M, Busquets S, López-Soriano
em um estudo clínico piloto com várias neo- FJ. Optimal management of câncer anorexia-cachexia
plasias malignas avançadas, que os pacientes syndrome. Cancer Management and Research. 2010.

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Capítulo 20 - Anorexia e caquexia

OUTROS zar os peptídeos orexígenos hipotalâmicos e


É comum na prática clínica a escolha de neurotransmissores35.
medicações cujos efeitos adversos contri-
buam no controle de outro sintoma apresen- ALIMENTAÇÃO ENTERAL
tado pelo paciente. A mirtazapina (Menelat®, A alimentação enteral pode ser uma al-
Zisprin®, Avanza®, Norset® e Remeron®) é um ternativa em pacientes que não conseguem
antidepressivo serotoninérgico e noradrenér- deglutir. Entretanto é sobreutilizado, prin-
gico aprovado para o tratamento do transtor- cipalmente em pacientes com demência, nos
no depressivo maior, que também estimula o quais não há evidência que diminua a mor-
apetite e/ ou aumento de peso corporal32. A talidade nem que aumente a qualidade de
dose terapêutica é entre 30 e 45mg por dia, vida1. Esse tema será melhor abordado em
porém, em idosos, deve ser iniciado de forma outro capítulo deste livro.
gradual, ou seja, com 15mg ao dia e aumento
de 15mg a cada duas semanas. Os resultados CONCLUSÃO
podem ser observados após uma semana do A anorexia e caquexia são condições clí-
início do uso e perduram por todo tratamen- nicas que ocorrem com frequência nos ido-
to. Tem como efeito colateral principal a se- sos por diversos fatores, reversíveis ou não.
dação33. Entretanto, na caquexia pelo câncer, Cabe ao clínico ou geriatra, individualizar as
tal droga não se mostrou eficaz34. opções terapêuticas, visando sempre manter
A buclizina (buclina®) é um derivado pi- a qualidade de vida e funcionalidade de seu
perazínico, com ações orexígena, anti-hista- paciente.
mínica e anti-emética. O mecanismo de ação
como estimulante do apetite não está bem REFERÊNCIAS
determinado, mas parece ser devido a um 1. 
MORLEY JE. Undernutrition in older
efeito hipoglicemiante e consequente esti- adults. In: Family Practice. 2012. 29i89-i93.
mulação do centro do apetite no hipotálamo. 2. TISDALE MJ. Cachexia in cancer patients.
Sua leve ação sedativa também contribuiria Nat Rev Cancer. 2002. 2:862–71.
para reforçar o efeito orexígeno. Possui tam- 3. WANG AY-M, SEAMM-M, TANG N,
bém um discreto efeito muscarínico central. SANDERSON JE, LUI S-F, LI PK-T, ET
Dose: 25mg antes do almoço e 25mg antes do AL. Resting energy expenditure and sub-
jantar. Há escassez de estudos com essa me- sequent mortality risk in peritoneal dialy-
dicação na população idosa. sis patients. J Am Soc Nephrol.. 2004.
15:3134–43.
TERAPIAS EMERGENTES 4. J CACHEXIA SARCOPENIA. Musce. 2010.
Alguns estudos recentes demonstra- 1:135–145. DOI 10.1007/s13539-010-0015-1.
ram que o ômega (ω) - 3 modula mudan- 5. ENGINEER DR, GARCIA JM. Leptin in
ças nas concentrações e ações de diversos Anorexia e Cachexia Syndrome. In: Inter-
neuropeptídeos anorexígenos e orexígenos, national Journal of Peptides. 2012. 1-13.
incluindo o neuropeptídeo Y, hormônio es- 6. SPRINGER J, VON HAEHLING S, AN-
timulante alfa-melanocítico e neurotrans- KER SD. The need for a standardized de-
missores como serotonina e dopamina. Em finition for cachexia in chronic illness.
pacientes com estado inflamatório agudo ou Nat Clin Pract Endocrinol Metab. 2006.
crônico, são encontradas altas concentra- 2:416–7.
ções de citocinas pró-inflamatórias e baixas 7. 
MUSCARITOLI M, ANKER SD, ARGI-
concentrações de ω-3, associado à anorexia LES J, AVERSA Z, BAUER JM, BIOLO G,
e à baixa ingestão alimentar. Alguns dados ET AL. Consensus definition of sarcopenia,
sugerem que a suplementação de ω-3 su- cachexia and precachexia: joint document
prime a produção citocinas inflamatórias e elaborated by Special Interest Groups (SIG)
melhora a ingestão alimentar por normali- “cachexia–anorexia in chronic wasting di-

200

Miolo.indd 200 17/04/2014 14:11:27


Capítulo 20 - Anorexia e caquexia

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Capítulo 20 - Anorexia e caquexia

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202

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Prurido em cuidado paliativo 21
CAPÍTULO

Mayra Zanetti
Deborah Correia Carvalho
Silvia Marcondes Pereira

O prurido pode ser definido como uma • Dermatológico: Ocorre quando os agen-
“sensação desagradável" que provoca o de- tes pruridogênicos originam-se na pele.
sejo de coçar. Não é um dos sintomas mais Ex: xerose, escabiose, dermatite atópica,
comumente observados em Cuidados Palia- psoríase, micose. (Figura 21.1 e 21.2 e 21.3)
tivos, porém afeta bastante a qualidade de • Sistêmico: quando é secundário a
vida. É descrito como queixa tão debilitante doenças sistêmicas. Ex: prurido urêmi-
quanto a dor crônica e com frequência está co, associado a neoplasia.
associado a desordens do sono ou alterações • Neurológico: quando é secundário a
do humor (ansiedade e depressão), que po- doenças do Sistema Nervoso Central
dem piorar o prurido. (SNC) ou Sistema Nervoso Periférico
Para seu manejo adequado, é importante (SNP). Ex: Notalgia parestésica causado
conhecer as possíveis causas de prurido, ca- por alteração da coluna torácica (Figu-
racterísticas associadas e o que esperar de um ra 21.5); Secundário ao acometimento
paciente com este sintoma. O primeiro gran- por herpes zoster.
de desafio para quem trata é como ter uma • Somatoforme: Relacionado a desor-
visão multidisciplinar do prurido e também dens psiquiátricas ou psicossomáticas.
como descobrir sua causa, que pode envol- (Figura 21.4)
ver desde doenças sistêmicas até problemas • Misto: Associação de várias etiologias.
psicológicos. O segundo desafio, é individua-
Figura 21.1
lizar o tratamento, que varia entre medidas a - Xerose (pele seca) b - Eczema xerótico por uso
comportamentais e uso de medicamentos1. inapropriado de tópicos

CLASSIFICAÇÃO
Segundo o “International Forum for the
Study of Itch” (IFSI) o prurido é conside-
rado crônico quando ele persiste por mais
de seis semanas. De forma geral pode ser
dividido em 2:

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Capítulo 21 - Prurido em cuidado paliativo

Figura 21.2 - Dermatofitose Figura 21.3 - Notalgia parestésica Figura 21.5 - Notalgia parestésica
–Tinea corporis – área pruriginosa inter escapular – área pruriginosa inter escapular
causando prurido com hipercromia com hipercromia"

• Prurido de origem indeterminada: cos, são mais fáceis de se achar o fator causal.
Ocorre quando nenhuma causa foi en- O prurido crônico está mais associado com
contrada as desordens de origem sistêmica.
O paciente com prurido deve ter longo
Anamnese e exame físico do paciente seguimento, mesmo não havendo sintomas,
com prurido uma vez que o prurido pode ser o primeiro
Em princípio, deve-se avaliar a presença sintoma de uma doença ainda não manifesta.
de lesões e o quão seca está a pele. Havendo Na abordagem do paciente com prurido
lesão, é necessário classificá-la como primá- também deve-se avaliar as doenças e cirur-
ria (doença dermatológica) ou secundária, gias pregressas, alergias, dieta, abuso de ál-
sendo esta decorrente do ato de coçar (es- cool, viagens, contato com animais, ocupa-
coriações, liquenificação, hipo ou hiperpig- ção oficial e extraoficial, hobbies e anteceden-
mentação residual). tes familiares.
Sempre é necessário descartar uma Por fim, durante a anamnese é importan-
possível causa sistêmica na ausência de te avaliar as condições emocionais, psicoló-
lesões cutâneas, quando há lesões secun- gicas do paciente, sua relação com familiares
dárias ou quando os sintomas persistem e cuidadores, pois tais dados podem contri-
após a hidratação da pele. Reforçando que buir para o diagnóstico e sucesso terapêutico
a presença de lesões cutâneas não elimina além de estreitar a relação médico-paciente.
a hipótese de doença de causa sistêmica e
a ausência de lesão não significa que haja Causas de Prurido em Cuidados
uma doença sistêmica 3. Paliativos
O exame físico deve ser completo e deve A pele seca acompanha muitas comorbi-
incluir a avaliação das mucosas, unhas, ca- dades e é a causa mais comum de prurido4.
belos, linfonodos, tireóide e visceromega- O prurido grave visto em pacientes com
lias. É importante avaliar o local em que o doença avançada é normalmente associado
prurido começou e se foi de forma locali- com uremia (pela insuficiência renal), coles-
zada ou generalizada, se o mesmo é agudo tase, secundário a opioide, aos tumores sóli-
ou crônico, contínuo ou intermitente e o dos (síndrome paraneoplásica) e decorrentes
tempo em que apareceu. de desordens hematológicas5,6.
Pruridos de início abrupto, podem mui-
tas vezes estar associados à farmacodermia, Prurido secundário a
micose ou dermatite de contato, sendo me- doença renal crônica
nos comum a hipótese de haver alguma Ocorre em pacientes dialíticos e não
doença sistêmica como causa. Quando agu- dialíticos. Pode ser generalizado ou loca-
dos e abruptos, apesar de muito sintomáti- lizado, paroxístico ou contínuo. Quarenta

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Capítulo 21 - Prurido em cuidado paliativo

por cento dos pacientes no fim da doença das podem ser tratadas com relativo su-
tem esta queixa. cesso. A intenção deste procedimento em
O prurido nestes pacientes está associa- Cuidados Paliativos é que haja melhora do
do com má qualidade de sono e depressão, prurido e icterícia10.
podendo haver exacerbações noturnas. As-
socia-se a isso comorbidades, como diabetes, Prurido induzido por opioide
hepatite, anemia e deficiência de ferro. Um A ocorrência deste tipo de prurido é
dos tratamentos, seja ele sintomático ou não, mais comum quando são utilizados opioi-
é o controle da doença de base7. des por via cateter peridural do que com
O tratamento pode ser tópico (emolientes opioides sistêmicos. O mecanismo exa-
de pele, capsaicina, ácido de linolenico), fí- to deste prurido é desconhecido; porém,
sico (fototerapia com radiação de UVB, acu- acredita-se ser mediado centralmente. Os
puntura) ou sistêmico (gabapentina, antago- opioides também podem ativar as vias de
nistas de opioide, ondasetrona). O receptor serotonina o que explica por que a ondan-
H1 não é o único responsável pela transdu- setrona (antagonista do receptor 5-HT3)
ção do prurido histaminérgico, sendo que a alivia o prurido secundário à morfina4 .
ausência de resposta a este pode levar a frus-
tação de quem trata. Prurido associado a tumores sólidos
Sabe-se que a paroxetina e a mirtazapina, Está presente no paciente oncológico
como reguladores da serotonina podem ter em cerca de 27% dos casos. Os tumores
algum efeito neste sintoma.4 A gabapentina sólidos podem ser associados com o pru-
também foi estabelecida como uma opção te- rido paraneoplásico sendo que este sinto-
rapêutica efetiva8. ma pode ser precedente ao diagnóstico por
meses ou anos. A fisiopatologia não é bem
Prurido em pacientes colestáticos esclarecida, mas parece envolver uma rea-
O prurido pode ser uma complicação da ção imunológica de antígenos tumor-es-
colestase independentemente de sua causa. pecíficos. Os anti-histamínicos não costu-
Entre as causas malignas, a infiltração por tu- mam ser eficazes.
mor hepático e a obstrução biliar por massa O prurido pode ser generalizado ou res-
tumoral ou linfonodos são as mais comuns. trito ao local do tumor: escrotal, se houver
A desobstrução da via biliar pode aliviar câncer de próstata, perianal em cânceres
completamente o sintoma, porém nem sem- de cólon ou vulvar em câncer cervical. Os
pre se consegue a desobstrução completa9,10. tumores sólidos também podem causar
O uso de colestiramina poderia ajudar prurido se houver obstrução biliar (comum
em pacientes urêmicos com alteração de sais no câncer de pâncreas); com possibilidade
biliares. A colestase é geralmente associada de melhora do sintoma se houver desobs-
com prurido, mas a patogênese ainda é obs- trução por colocação de stent8.
cura. Não há relação entre os níveis de sais bi-
liares e o nível de prurido. Outro mecanismo Doenças hematológicas
postulado é a transmissão de ópiodes centrais. O prurido pode vir associado com doen-
Por isso, o uso de antagonistas de opioides tem ças hematológicas, como na leucemia linfocí-
sido descrito como sintomático4. tica crônica (LLC), linfomas Hodgkin e não
Outras possibilidades terapêuticas in- Hodgkin, policitemia vera, micose fungóide,
cluem a paroxetina, mirtazapina e ondase- linfoma de células T, mieloma múltiplo. Ge-
trona. O uso de raios ultravioleta B também ralmente trata-se de um prurido generalizado
é um recurso considerado como tratamento e associado à febre, fadiga e sudorese noturna.
os anti histamínicos costumam ser ineficazes. O prurido associado à Policitemia Vera
Com o desenvolvimento da terapia en- tem como característica principal ser em
doscópica, estenoses de etiologias varia- caráter de pinicação, ocorrer após o banho

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Capítulo 21 - Prurido em cuidado paliativo

(prurido aquagênico) e pode preceder o podem também responder a agentes que blo-
diagnóstico hematológico por vários anos queiam os mediadores do prurido, por exem-
(ocorre em 30 a 50% dos pacientes). O pru- plo, a capsaicina que esvazia o neuropeptídeo P.
rido aquagênico também pode estar asso- O uso de raios ultravioleta B age dimi-
ciado à mielodisplasia, leucemias, linfomas, nuindo o número de células mastocitárias
hepatite C e hemocromatose. nas terminações nervosas livres da pele. Ge-
Nas fases avançadas, o prurido intenso ralmente, é feito 3 vezes por semana. Tem
causa uma sensação de queimação que se boa resposta nos casos de uremia, sendo
assemelha a dor neuropática. Devido a suas também utilizado para colestase e em casos
semelhanças, o uso de gabapentina tem sido de infiltração maligna4. Não é um regime
efetivo para o prurido8. prático para pacientes paliativos no fim de
A atividade anti pruridogênica da talido- vida e deve ser evitado nos pacientes com
mida nos tumores hematológicos pode ser predisposição a câncer de pele.
secundária a inibição do fator de necrose tu-
moral alfa (TNFα) e há relatos na literatura Tratamento Farmacológico
de benefício dos sintomas11. Reserva-se o uso de corticoide sistêmico
para os casos de urticária e reação aguda a
TRATAMENTO droga. No prurido crônico tem baixa eficácia
e recorrências frequentes.
Medidas não farmacológicas A ação nos inibidores do receptor H1
Não há um tratamento universal para o sempre foi o mecanismo de escolha para
prurido. Os cuidados gerais da pele são sem- qualquer tipo de prurido. Na realidade, são
pre importantes e primordiais. A pele seca úteis em casos em que a histamina é liberada
pode acompanhar todas as causas de pruri- na pele, sendo o principal responsável pelo
do em pacientes paliativos. A medida geral é prurido agudo (tem bom efeito na urticária
hidratar a pele regularmente, especialmente e mastocitose). Há os anti histamínicos de
depois de tomar banho12. primeira e segunda geração. O hidroxizine
Para sua efetividade, um hidratante deve é um exemplo do primeiro grupo, tem efeito
conter: substâncias oclusivas, umectantes sedativo, ação anticolinérgica e deve ser usa-
e emolientes. Novos sabonetes conhecidos do com cautela em idosos. Os de segunda ge-
como detergentes sintéticos (synthetic de-
tergents) apresentam em sua composição o Tabela 21.1 - Principais modalidades
ácido esteárico que é protetor e hidratante terapêuticas do prurido em Cuidados
Paliativos15
deixando o pH da pele em torno de 5,5 além
de ser menos adstringente. Tratamento sistêmico do prurido

Medidas comportamentais como com- •P  revenção da ansiedade, pele seca e de


traumas
pressas frias, roupas leves, banhos frios e am- • T ratar infecções cutâneas
bientes não abafados devem ser estimuladas. Medidas
gerais
•S
•E
 uspensão de drogas que causam prurido
 liminar agentes alergênicos (perfume,
O uso de corticoide tópico de média po- sabonete)
•A  plicar cremes gelados
tência pode ser prescrito quando houver •B  anhos com tratamento intrínseco
áreas de eczema ou liquenificação.13 Outros • L oções contendo mentol, fenol e canfora
agentes tópicos incluem o uso de 1% de men- Tratamentos •E  molientes
tópicos •A  nestésicos tópicos
tol ou 0.5% a 2% de fenol (pela sensação de •C  reme de capsaicina
gelado na pele). •A
 nti histamínicos
Para áreas localizadas de prurido, agen- •C
 olestiramina 4g 2 vezes ao dia
•N
 altrexone 25- 50mg/dia
tes com 2.5% de lidocaína podem anestesiar •P
 aroxetina 10- 20 mg/dia
Medicações
as terminações nervosas, porém, quantidades •M
 irtazapina 15- 30mg/dia
•O
 ndasentrona 4- 8 mg duas vezes ao dia
grandes devem ser evitadas por haver absorção •D
 oxepina 10- 25 mg duas vezes ao dia
do medicamento. Áreas localizadas de coceira •C
 imetidina 200mg quatro vezes ao dia

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Capítulo 21 - Prurido em cuidado paliativo

ração devem ser ajustados para função renal, prurido, é feito midazolam em doses baixas,
exemplos seriam: loratadina, desloratadina, sem o intuito sedativo, somente para contro-
fexofenadina, cetirizina e rupatadina. le sintomático14.
A paroxetina é um inibidor de recaptação
de serotonina. Como a serotonina poderia REFERÊNCIAS
ter um papel no prurido secundário a doen- 1. ZHANG H, YANG Y, CUI J, ZHANG
ça maligna, bem como também na colestase, Y. Gaining a comprehensive unders-
uremia e no prurido secundário a opioide, é tanding of pruritus. Indian J Dermatol
uma droga que pode ser considerada no pa- Venereol Leprol. 2012. 78(5):532-44.
ciente paliativo.4 Pode-se começar com doses 2. WEISSHAAR E ET AL. European Gui-
pequenas, como 5 a 10 mg à noite. Resultados deline on chronic pruritus. Acta Derm
normalmente podem ser observados dentro Venereol. 2012. 92:3-17.
de 24 a 48 horas4. 3. YOSIPOVITCH G AND BERNHARD
A mirtazapina é um antidepressivo que JD. Chronic Pruritus. N engl j med.
age nos receptores 5-HT2, 5-HT3, e que no 2013. (17):1625-1634.
receptor H1 tem papel antagonista. Pode 4. SECCARECCIA D, GEBARA N. Pru-
também ser usada em casos de colestase, ure- ritus in palliative care Getting up to
mia e em doenças malignas. O tratamento scratch. Palliative Care Files. Canadian
normalmente começa com um comprimido Family Physician. Le Médecin de fa-
de 15 mg a cada noite, mas iniciar com uma mille canadien. 2011. (57):1010- 1013.
dose mais baixa de 7.5 mg também pode ser 5. FERAMISCO J,BERGER T, STEI-
efetivo. Seus efeitos colaterais mais marcan- NHOFF M. Innovative management
tes são sonolência e aumento do apetite. of pruritus. Dermatol Clin. 2010.
A ondansetrona é um antagonista do re- (28):467-478.
ceptor 5-HT3 e pode ser usado para o pruri- 6. CASSANO N ET Al. Chronic pruritus in
do associado ao opioide, colestase, e uremia. the absence of specific skin disease. Am J
É bastante caro e pode causar constipação. Clin Dermatol. 2010. 11(6):399-411.
Tanto o naltrexone como o naloxone tem 7. 
YONG DSP, KWOK AOL, WONG
sido usados para o tratamento de prurido as- DML, SUEN MHP, CHEN WT AND
sociado a uremia, colestase e opioide induzi- TSE DMW. Symptom burden and
do. Estes medicamentos, no entanto, não são quality of life in end-stage renal disea-
recomendáveis nos pacientes paliativos, uma se: a study of 179 patients on dialysis
vez que muitos estão em uso de opioides para and palliative care. Palliat Med. 2009.
controle da dispneia e dor e seu antagonismo 23(2):111-119.
pode levar a piora importante dos sintomas e 8. ANAND S. Gabapentin for Pruritus in
a síndrome de abstinência. Nos casos de pru- Palliative care. AM J HOSP PALLIAT
rido induzido por opioide, a estratégia inicial CARE. 2013. 30(2):192-196.
é a rotação do opioide. E para os de adminis- 9. AGGARWAL R, PATEL F D, KAPOOR
tração epidural, a administração com bupi- R, KANG M, KUMAR P, SHARMA
vacaína, diminui o efeito pruridogênico. S C. Evaluation of high-dose-rate in-
A gabapentina é um anticonvulsivante traluminal brachytherapy by percuta-
aprovado pelo FDA para uso nas crises par- neous transhepatic biliary drainage in
ciais complexas e na neuralgia pós herpética. the palliative management of malig-
É uma droga bem tolerada e não precisa de nant biliary obstruction A pilot study.
monitorização de parâmetros laboratoriais. Brachytherapy. 2013. (12):162-170.
Não costuma ter interações com outras dro- 10.  H ARTMANN D, JAKOBS R,
gas devido a sua farmacocinética6. SCHILLING D, RIEMANN JF. En-
Em última instância, há casos na litera- doscopic and radiological interven-
tura em que devido a sintomas refratários de tional of benign and malignan bile

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Capítulo 21 - Prurido em cuidado paliativo

duct stenosis. Zentrabl Chir. 2003. Topical therapy. In: Zylicz Z, Twycross
128(11):936-943. R, Jones EA, editors. Pruritus in ad-
11. GONÇALVES F. Thalidomide for the vanced disease. Oxford, UK: Oxford
Control of Severe Paraneoplastic Pruri- University Press. 2004. 151-60.
tus Associated With Hodgkin’s Disease. 14. PRIETO LN. The use of midazolam to
American Journal of Hospice & Palliati- treat itching in a terminally ill patient
ve Medicine. 2010. 27(7)486-487. with biliary obstruction. J Pain Symp-
12. PATEL T, YOSIPOVITCH. Therapy of tom Manage. 2004. 28(6):531-532.
pruritus. Expert OpinPharmacother. 15. FISHER J. Palliating symptoms other
2010. 11(10):1673-1682. than pain. Australian Family Physi-
13. SZEPIETOWSKI J, TWYCROSS R. cian. 2006. 35(10):766-770.

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Depressão e ansiedade 22
CAPÍTULO

Carla Bezerra Lopes Almeida


Niele Silva de Moraes
Ana Beatriz Galhardi Di Tommaso

INTRODUÇÃO com 251 pessoas portadoras de câncer avan-


Sofrimento psicológico é uma das prin- çado. No total, 12% dos participantes reuni-
cipais causas de sofrimento entre os pa- ram critérios, de acordo com o Manual Diag-
cientes com doença avançada ou doença nóstico e Estatístico de Transtornos Mentais
terminal 1,2 . Embora o sofrimento emocio- IV (DSM-IV), para transtorno depressivo
nal seja natural e esperado em indivíduos maior, transtorno de ansiedade generaliza-
que experimentam uma doença grave e que da, transtorno do pânico ou transtorno do
confronte o fim de suas vidas, a diferencia- estresse pós-traumático.
ção entre uma reação normal e apropriada A ansiedade geralmente aumenta à me-
à morte contra um transtorno psiquiátrico dida que os pacientes se tornam conscien-
mais grave, como a depressão, pode ser cli- tes da relativa ineficácia dos tratamentos
nicamente desafiadora4 . médicos em evitar o progresso da doença
O diagnóstico de uma doença incurável e, consequentemente, de sua expectativa de
pode colocar os pacientes em crise, deixan- vida limitada. Temores da morte, invalidez,
do-os vulneráveis à depressão e ansiedade. desfiguração e dependência tornam-se cada
Embora a aflição psicológica seja bem docu- vez maior para pacientes que foram infor-
mentada em pacientes terminais, ela tende a mados de que o tratamento médico não irá,
ser subdiagnosticada e muitas vezes deixada com toda a probabilidade, levar a cura, mas
de lado. Isto acentua o sofrimento do pacien- será paliativo5.
te e da sua família, reduzindo a qualidade de Síndromes depressivas são um problema
vida e a habilidade de relacionamento inter- de saúde mental comum em medicina palia-
pessoal ou a capacidade para lidar com as tiva, mas ainda são amplamente mal com-
perdas iminentes3. preendidas, subdiagnosticadas e subtrata-
Em uma pesquisa com 100 pacientes com das 6,7,8,9,10. São altamente correlacionadas
câncer terminal, a falta de bem-estar, a de- com a redução da qualidade de vida, maior
pressão e a ansiedade foram associados com dificuldade em controlar o curso da doença
a frequência de pensamentos suicidas13. Ka- do paciente, diminuição da adesão ao trata-
dan-Lottick et al14 relatam os resultados de mento, e de admissão mais cedo para inter-
um estudo transversal, multi-institucional nação ou Cuidados Paliativos 6.

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Capítulo 22 - Depressão e ansiedade

Indivíduos com doença avançada que Uma alteração no estado metabólico ou


sofrem de síndromes depressivas também uma catástrofe clínica iminente pode ser
apresentam alto risco de suicídio e ideação anunciada por sintomas de ansiedade. Sin-
suicida, e eles têm um maior desejo de uma tomas de ansiedade que ocorrem de repente
morte prematura.9,11 como dor no peito, dificuldade respiratória,
Depressão, desesperança e sofrimento inquietação e um sentimento de "saltar fora
psicológico em geral também são constante- da pele” pode indicar uma embolia pulmo-
mente associados com o interesse em suicí- nar. Pacientes que estão com hipóxia muitas
dio assistido e na eutanásia12. vezes parecem ansiosos e sentem que estão
sufocando ou morrendo. Medicamentos,
DIAGNÓSTICO tais como broncodilatadores e os agonistas
dos receptores beta adrenérgicos, que são co-
Ansiedade mumente usados para doenças respiratórias
Os pacientes com ansiedade costumam crônicas, podem causar ansiedade, irritabi-
relatar sentimentos subjetivos de pressen- lidade e tremores. Pacientes que têm delírio
timento, apreensão ou medo que frequen- frequentemente manifestam sintomas de an-
temente intensificam-se quando eles perce- siedade, inquietação e agitação. Estes estados
bem que a morte é iminente. Sintomas de confusionais geralmente têm múltiplas cau-
ansiedade podem ser cognitivos ou somáti- sas, incluindo a hipoglicemia, falência de ór-
cos; os sintomas mais proeminentes, obser- gãos, desequilíbrio eletrolítico, insuficiência
vados com maior frequência em ataques de nutricional e infecção.5
pânico, são normalmente os somáticos e in- Entre os medicamentos usados em am-
cluem taquicardia, falta de ar, sudorese, des- bientes de Cuidados Paliativos, corticos-
conforto gastrointestinal e náuseas. Perda teroides são frequentemente uma causa de
de apetite, diminuição da libido e insônia, ansiedade e de sintomas como inquietação
sintomas também associados à depressão, motora e agitação. A acatisia, um efeito co-
são comuns em pacientes com ansiedade, lateral comum de neurolépticos (por exem-
assim como os sentimentos de hipervigilân- plo, metoclopramida e proclorperazina),
cia, inquietação e irritabilidade5. medicações usados para controlar náusea e
Em adição aos sintomas somáticos, pacien- para tratar agitação psicomotora, delírios ou
tes ansiosos com câncer diante da morte po- alucinações, pode muitas vezes causar an-
dem muitas vezes ser atormentados com pen- siedade e agitação. Pacientes com câncer de
samentos recorrentes desagradáveis, incluindo cabeça e pescoço, muitas vezes têm histórias
o medo da dor, da morte e da dependência dos não declaradas ou subnotificadas de abuso
outros. O estilo de pensamento da ansiedade de álcool, e podem ter aumento da ansiedade
do paciente é caracterizado por sobregenera- e da agitação como sinais de um estado de
lização e catastrofização; resultados negativos abstinência. Pacientes em Cuidados Paliati-
parecem inevitáveis, e os pacientes veem-se im- vos podem ter recebido benzodiazepínicos
potentes em uma situação desesperadora. No de curta ação (por exemplo, lorazepam e
contexto dos Cuidados Paliativos, pode não ser alprazolam) para controle de ansiedade ou
fácil distinguir as causas somáticas das psicoló- insônia, e apresentar ansiedade rebote com
gicas em indivíduos com ansiedade5. regimes de dosagens inadequadas.5
O controle subótimo da dor continua sendo O diagnóstico de ansiedade no contexto
uma causa comum de ansiedade e diminui- dos Cuidados Paliativos é geralmente deter-
ção da qualidade de vida no cenário paliativo. minado por perguntas em uma anamnese
Compreender a natureza específica do fenôme- (tabela 22.1). Em pacientes que são menos
no da dor do paciente pode ser útil em determi- debilitados e que estão cognitivamente intac-
nar o seu tratamento mais adequado e, conse- tos, a utilização de instrumentos de avaliação
quentemente, da ansiedade5. melhora o rastreio para os sintomas e facilita

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Capítulo 22 - Depressão e ansiedade

o acompanhamento da evolução do trata- pode ser distinguida da ansiedade pela


mento. Vários instrumentos têm sido usados presença dos sintomas psicológicos de de-
para medir a ansiedade. A Hospital Anxiety pressão, tais como desesperança, anedonia,
and Depression Scale (HADS) é um medida sentimento de inutilidade e ideação suici-
de auto-relato que avalia os itens cognitivos da. Delirium, um diagnóstico comum em
pacientes que estão recebendo Cuidados
Tabela 22.1 - Perguntas que auxiliam Paliativos, frequentemente tem ansiedade
a avaliação de ansiedade ou agitação como sintomas proeminentes,
Você se sente nervoso ou agitado? mas distingue-se de transtornos de ansie-
Você já sentiu-se com medo, angustiado ou tenso? dade pela presença de desorientação, de
De qualquer coisa em particular?
comprometimento da memória, da aten-
Você evita certas atividades ou pessoas por causa do
medo? ção e da concentração, flutuação do nível
Você já sentiu um nó na garganta ou nó no poço de seu de consciência e percepções alteradas, in-
estômago quando fica chateado? cluindo alucinações, delírios ou ilusões. 5
Você tem medo de fechar os olhos à noite por medo de
morrer em seu sono?
Depressão
Você está sempre preocupado com a morte ou como vai
morrer? O humor deprimido, tristeza, dor e sen-
Adaptado de Roth AJ, Massie MJ, Redd WH. Consultation for sações de antecipação de perda são respostas
the cancer patient. In: Jacobson JL, Jacobson AM, editors. adequadas à doença avançada e ao morrer.
Psychiatric Secrets. 2nd ed. Philadelphia: Hanley & Belfus
Inc; 2000. pp. 412–425. No entanto, sentimentos de desesperança,
desamparo, inutilidade, culpa, falta de pra-
associados com a depressão e ansiedade e, zer e ideação suicida (mesmo leve ou passiva)
assim, evita confundir sintomas físicos em estão entre os melhores indicadores de sín-
pacientes clinicamente doentes.5 dromes depressivas nesses pacientes.15
Em pacientes com doenças terminais, Há uma considerável sobreposição entre
a ansiedade também pode ser uma mani- os sintomas neurovegetativos ou somáticos
festação de depressão ou delírio. Cada vez de depressão maior (por exemplo, fadiga,
mais, a depressão e ansiedade são vistos insônia, anorexia e perda de peso) e aqueles
como síndromes que existem de forma associados com qualquer doença grave e/ou
contínua, e existe uma sobreposição da sin- seu tratamento. Isto levou alguns a excluir
tomatologia desses dois estados. Depressão esses sintomas a partir de critérios diagnós-

Quadro 22.1 - Critérios diagnósticos pelo DSM-IV para depressão


Cinco (ou mais) dos seguintes sintomas presentes durante um período de 2 semanas e que representam uma alteração do estado
funcional anterior. Pelo menos um dos sintomas sendo humor deprimido ou perda de interesse ou de prazer. (Nota: Não incluir
sintomas nitidamente devidos a uma condição médica geral ou delírios incongruentes, com humor ou alucinações)

•H umor deprimido na maior parte do dia, quase todos os dias (ou, alternativamente, humor irritável em crianças e adolescentes)
• Acentuada diminuição do interesse ou prazer em todas ou quase todas as atividades, quase todos os dias
• Perda significativa de peso não intencional, ganho de peso, ou diminuição ou aumento do apetite
A
• Insônia ou hipersonia quase todos os dias
• Agitação ou retardo psicomotor quase todos os dias
• Fadiga ou perda de energia quase todos os dias
• Sentimentos de inutilidade ou culpa excessiva ou inapropriada quase todos os dias
• Capacidade diminuída de pensar ou concentrar-se ou indecisão quase todos os dias
•P ensamentos recorrentes de morte (não apenas medo de morrer), ideação suicida recorrente sem um plano específico, ou uma
tentativa de suicídio ou um plano específico para cometer suicídio
B Os sintomas não satisfazem os critérios para um Episódio Misto
Os sintomas causam sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo nas áreas social, ocupacional ou outras áreas importantes da
C
funcionalidade
D Os sintomas não se devem aos efeitos fisiológicos diretos de uma substância ou condição médica geral
Os sintomas não são melhor explicados por luto, ou seja, após a perda de um ente querido, os sintomas persistem por mais de
E dois meses ou são caracterizados por acentuado prejuízo funcional, preocupação mórbida com desvalia, ideação suicida, sintomas
psicóticos ou retardo psicomotor
Adaptado pela American Psychiatric Association. Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders, 4th ed, Text
Revision. American Psychiatric Association, Washington, DC 2000.

211

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Capítulo 22 - Depressão e ansiedade

ticos para a depressão em pacientes clinica- doenças clínicas. Como o tratamento com es-
mente doentes.1 tes agentes é relativamente benigno e bem to-
Os critérios mais utilizados para diagnos- lerado, os clínicos devem ter um baixo limiar
ticar a depressão em pacientes doentes não para início da terapia. Psicoestimulantes, em
terminais são aqueles descritos no Manual comparação com outros antidepressivos, têm
Diagnóstico e Estatístico de Transtornos um início mais rápido da atividade e são a
Mentais (DSM-IV-TR).16 opção inicial preferida para pacientes em Cui-
Uma anamnese cuidadosa é o método pa- dados Paliativos, cuja expectativa de vida seja
drão-ouro para avaliar se os pacientes estão menor do que dois a quatro meses, ou para
clinicamente deprimidos. No entanto, uma aqueles que precisem de tratamento urgente.4
simples pergunta: "Você está deprimido na O primeiro passo no tratamento da de-
maior parte do tempo nas últimas duas se- pressão é aliviar os sintomas descontrolados,
manas? ", e outros métodos de triagem abre- principalmente a dor. Todos os pacientes de-
viados parecem ser tão eficazes quanto ins- vem ter uma avaliação médica completa para
trumentos na identificação dos pacientes que avaliar possíveis condições médicas contri-
necessitam de uma avaliação mais aprofun- buintes para o humor deprimido.4
dada para a depressão. Além da terapia medicamentosa, in-
A prevalência de depressão maior em tervenções psicossociais eficazes incluem
indivíduos com câncer varia de 3 a 38%.17,18 psicoterapia individual ou de grupo, hip-
Esta ampla variabilidade é explicada pela noterapia, terapia cognitivo-comporta-
falta de acordo quanto aos critérios de diag- mental, terapia existencial e os grupos de
nóstico apropriados para serem utilizados na auto-ajuda. 24
definição de doença avançada, as diferenças Como resultado, a terapia para a depres-
na população de doentes (dados demográfi- são nestes pacientes é geralmente baseada
cos, tipo e estágio da doença, o tratamento nas evidências sobre tratamentos eficazes em
versus nenhum tratamento), e variação nos pacientes com câncer ou em populações de
métodos de avaliação. Em geral, as taxas são cuidados primários com ou sem doença físi-
mais elevadas em populações com câncer ca ou problemas de saúde menos graves. Em-
avançado, maiores níveis de deficiência e/ou bora haja uma falta de estudos controlados
dor não controlada.17,19,20 que suportam a eficácia da terapia combi-
Mesmo quando são usados os critérios nada, a maioria dos especialistas recomenda
mais rigorosos, a depressão é diagnosticada uma abordagem que combina psicoterapia de
em cerca de 7%, e depressão menor em 11% apoio com o paciente e a família e o uso cri-
dos pacientes com câncer avançado.18,19,20 A terioso de medicamentos antidepressivos.25
prevalência de depressão em pacientes com Uma revisão sistemática dos antidepres-
câncer em estágio terminal situa-se entre 13 sivos usados no tratamento da depressão em
e 26 %.20,21,22 Da mesma forma, pacientes com Cuidados Paliativos, que incluiu 25 ensaios
outras doenças médicas avançadas também clínicos randomizados controlados com pla-
parecem ter taxas elevadas de depressão. cebo, demonstrou benefício significativo do
tratamento sobre o placebo dentro de quatro
MANEJO a cinco semanas, com a melhoria contínua ao
longo do tempo.26
Depressão Diversas classes de fármacos podem
A depressão maior em Cuidados Paliativos ser usadas:
ou em pacientes terminais é tratável. O perfil • Psicoestimulantes (por exemplo, dex-
mais favorável de efeitos colaterais dos antide- troanfetamina, metilfenidato e modafinil)
pressivos mais recentes (por exemplo, inibido- • Inibidores seletivos da recaptação da
res seletivos da recaptação da serotonina) tem serotonina
facilitado o seu uso em idosos e portadores de • Antidepressivos Tricíclicos

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Capítulo 22 - Depressão e ansiedade

• Inibidores da recaptação da serotonina fluoxetina, sertralina, paroxetina, citalo-


e noradrenalina pram, escitalopram e nortriptilina), e devem
• Moduladores de serotonina (por exem- ser preferidas para doentes que não conse-
plo, trazodona) guem engolir comprimidos.4
• Antidepressivos atípicos (por exemplo,
bupropiona e mirtazapina) Ansiedade
• Inibidores da monoamina oxidase O manejo mais eficaz da ansiedade mui-
(IMAO), que raramente são usados em tas vezes envolve psicoterapia, terapia com-
Cuidados Paliativos portamental e farmacológica. Exploração
dos medos do paciente sobre a progressão
Os agentes mais comumente usados em da sua doença, as dificuldades psicossociais
pacientes em Cuidados Paliativos são os psi- e a morte, muitas vezes ajudam a aliviar um
coestimulantes, inibidores da recaptação de substancial grau de ansiedade do paciente. À
serotonina e antidepressivos tricíclicos. Não medida que o indivíduo entra na fase paliati-
há nenhuma evidência de que qualquer clas- va e cada vez mais torna-se consciente do en-
se particular de antidepressivos seja preferí- curtamento de sua vida, suas preocupações
vel para pacientes em Cuidados Paliativos.4 podem mudar ou se intensificar. Os doentes
A razão principal que explica porque os podem tornar-se cada vez mais focados em
inibidores da recaptação de serotonina são preocupações sobre o sofrimento e a morte.
geralmente selecionados para terapia inicial Ansiedade sobre o aumento da dependência,
em pacientes em Cuidados Paliativos depri- mudanças no estado civil, funcionamento
midos não é por terem demonstrado maior da família ou do seu papel social, preocupa-
eficácia, mas por causa de seu perfil mais fa- ções espirituais e problemas financeiros po-
vorável de efeitos colaterais e o perigo signifi- dem aumentar ou diminuir, dependendo do
cativamente menor com overdose.27,28 grau em que o paciente tenha trabalhado nas
Para os pacientes em Cuidados Paliativos, questões relacionadas à mortalidade.5
os fatores que influenciam a escolha do agente Para os pacientes apresentando ansiedade
inicial, além do perfil de efeitos colaterais, são de leve intensidade, o uso de técnicas psico-
a quantidade de tempo disponível para o tra- lógicas sozinhas podem ser suficientes para
tamento, condições clínicas coexistentes e sin- auxiliar no seu manejo. As discussões sobre
tomas, e as propriedades farmacológicas (por os medos e ansiedade a respeito da morte são
exemplo, meia-vida, interações medicamento- eficazes em aliviar essa condição clínica.5
sas e disponibilidade de formulação líquida).4 As intervenções psicológicas para a an-
Em indivíduos com tempo de vida mais siedade em pacientes com câncer são clas-
curto (semanas a meses) ou depressão gra- sificadas em três categorias: psicocompor-
ve necessitando de tratamento urgente, o tamentais, cognitivo-comportamentais e
melhor tratamento seria o uso de psicoesti- de grupo. 5
mulantes de ação rápida.4 Pacientes muito Para o tratamento de transtorno do pâni-
debilitados e cansados podem experimentar co, os benzodiazepínicos (alprazolam e clo-
melhora no humor e energia dentro de 24 a nazepam) e antidepressivos (como, inibidores
48 horas do início do tratamento.4 da recaptação da serotonina, antidepressivos
Os efeitos colaterais podem por vezes ser tricíclicos e inibidores da monoaminaoxida-
usados como vantagem nos pacientes. Por se) têm demonstrado eficácia.5
exemplo, indivíduos com depressão, além de
insônia ou agitação, podem beneficiar-se do CONCLUSÃO
uso de antidepressivos mais sedativos, como A fase paliativa de uma doença terminal
a trazodona e a mirtazapiana.4 traz novos desafios no manejo do sofrimento
Formulações líquidas estão disponíveis psíquico em geral.4 Além do sofrimento emo-
para alguns antidepressivos (por exemplo, cional inerente ao diagnóstico da doença de

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Capítulo 22 - Depressão e ansiedade

Tabela 22.1 - Principais fármacos usados no tratamento da depressão em Cuidados Paliativos


Fármaco Dose Dose Particularidades Efeitos
inicial máxima Colaterais
Psicoestimulantes
Metilfenidato 2,5 mg 5 a 10 mg Útil no tratamento de depressão em indivíduos Insônia, nervosismo, agitação, palpitações, aumento
(liberação 2 vezes ao 2 com expectativa de vida de semanas a meses, ou da pressão arterial, anorexia, tremor, boca seca.
imediata) dia vezes ao dia que necessitem de alívio imediato dos sintomas Risco de descompensação cardíaca em pacientes
(apatia, anedonia, anorexia, hipersonia). Neutraliza com cardiopatia.
Dextroanfe- 5 mg 5 a 15 mg a sedação associada aos opioides. Início de ação
tamina pela manhã 2 vezes ao em 24 a 48 horas. Aumentar a dose, se necessário,
dia após 1-2 dias.
Inibidores seletivos da recaptação da serotonina (ISRS)

Citalopram 10 mg 20 a 40 mg Efeito antidepressivo e ansiolítico. Geralmente, bem Risco dose dependente de prolongamento do
ao dia ao dia tolerados. Não sedativos, baixo risco de distúrbios intervalo QT. Sintomas de descontinuação podem
do sono ou efeitos colaterais sexuais. Possuem ocorrer na ausência de redução gradual da dose
poucas interações medicamentosas significativas. antes das suspensão.
Escitalopram 5 mg 10 a 20 mg Sintomas de descontinuação podem ocorrer na
ao dia ao dia ausência de redução gradual.
Sertralina 25 mg 50 a 100 mg Não sedativo, baixo risco de insônia, ausência de Sintomas gastrointestinais são os mais frequentes,
ao dia ao dia efeitos cardiovasculares significativos. incluindo diarreia. Biodisponibilidade oral variável.
A solução oral contém álcool. Sintomas de
descontinuação podem ocorrer na ausência de
redução gradual da dose.
Fluoxetina 10 mg 20 a 40 mg Pode ser útil para o tratamento de doentes Meia-vida e metabólitos ativos com efeitos
ao dia ao dia deprimidos com anedonia ou hipersonia. Redução prolongados requerendo semanas para atingir
gradual da dose não é necessária devido à sua o nível sérico desejado, prolongando o tempo
meia-vida longa. necessário para avaliar o efeito do ajuste da dose.
Menos tolerada do que a sertralina.
Paroxetina 10 mg 20 a 40 mg Efeito sedativo; possivelmente útil para pacientes Efeito anticolinérgico fraco. Pode causar
ao dia ao dia deprimidos ou ansiosos com insônia. constipação, boca seca ou sonolência. Sintomas
de descontinuação mais graves, na ausência de
redução gradual da dose.
Inibidores da recaptação da serotonina e noradrenalina

Venlafaxina 37,5 mg 75 a 225 mg Útil no tratamento de pacientes deprimidos Insônia. Pode causar aumentos dose-dependentes
ao dia ao dia melancólicos com anedonia ou hipersonia. Útil na pressão arterial (principalmente na diastólica)
para pacientes com comorbidades associadas e na frequência cardíaca. Associada a sintomas
a condições dolorosas, tais como a neuropatia de descontinuação mais graves, na ausência de
diabética. redução gradual da dose.
Duloxetina 10 a 20 mg 20 a 60 mg Útil para pacientes com comorbidades associadas Interações medicamentosas significativas.
ao dia ao dia a condições dolorosas, tais neuropatia induzida por
quimioterapia, ou dor crônica. Levemente sedativo.
Baixo risco de insônia.
Antidepressivos atípicos

Bupropiona 75 mg de 150 mg Pode ser útil para o tratamento de doentes Aumento pressão arterial diastólica dose-
manhã, 2 vezes ao deprimidos com baixo consumo de energia e de dependente, insônia, constipação, boca seca,
inicialmente, dia apatia. Baixo risco de toxicidade cognitiva. Ação tontura.
em seguida, dopaminérgica pode ser vantajosa para pacientes Deve ser evitado em distúrbios convulsivos e
duas vezes deprimidos com doença de Parkinson. pacientes deprimidos com agitação.
por dia
Mirtazapina 7,5 mg 15 a 60 mg Efeito anti depressivo, sedativo e estimulante do Sonolência, ganho de peso. Meia-vida prolongada
apetite. Útil para pacientes com insônia ou que e metabólitos ativos. Risco de acumulação na
podem se beneficiar de ganho de peso. insuficiência renal e/ou insuficiência hepática.
Trazodona 12,5 a 25 25 a 100 Usado em baixas doses, como um adjuvante dos Sedação, hipotensão ortostática, náuseas, déficit
mg, 30 a mg, 30 a ISRS para o tratamento da insônia. cognitivo.
60 minutos 60 minutos
antes de se antes de
deitar pelo deitar pelo
seu efeito seu efeito
hipnótico hipnótico
Antidepressivos tricíclicos

Nortriptilina 10 mg 10 a 100 mg Levemente sedativo. Pode ser útil para pacientes Não são bem tolerados em pacientes em Cuidados
à noite à noite ou em melancólicos, ansiosos, deprimidos que não Paliativos devido aos efeitos anticolinérgicos,
duas doses responderam aos antidepressivos de primeira linha. incluindo boca seca, delirium, constipação
ao dia Útil para pacientes com comorbidades associadas a intestinal, retenção urinária ou alterações visuais.
quadros dolorosos. Concentração sérica terapêutica: Pode ser fatal em casos de overdose. Pode causar
50 a 150 ng / mL. arritmia ou hipotensão ortostática. Interações
medicamentosas significativas.

base, a depressão ou a ansiedade podem exa- a adesão ao tratamento, e é um fator de risco


cerbar os efeitos físicos da doença, tais como para alta precoce do serviço de saúde. Está as-
dor, fadiga, falta de apetite e distúrbio do sono. sociada com o aumento de incapacidades, pior
Depressão associada à doença física dificulta prognóstico e maior mortalidade.26

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Capítulo 22 - Depressão e ansiedade

Tabela 22.1 - Principais fármacos usados no tratamento da depressão em Cuidados Paliativos


Fármaco Dose inicial Particularidades Efeitos Colaterais

Benzodiazepínicos

Alprazolam 0,25 – 1 mg Meia vida de 6 a 27 horas. Sonolência, tontura/vertigem, visão turva, cefaléia, depressão,
3 vezes ao dia insônia, nervosismo/ansiedade, confusão, síncope, acatisia, tremor,
rigidez, alteração do peso, comprometimento da memória/amnésia,
Lorazepam 0,5 – 2 mg Meia vida de 10 a 20 horas. falta de coordenação, boca seca, obstipação, diarreia, náuseas,
3 vezes ao dia vômitos, sialorréia, taquicardia, palpitações,e manifestações
autonômicas. São comumente envolvidos em casos de overdose de
Diazepam 5 – 10 mg Meia vida de 20 a 50 horas. Presença drogas e abuso de substâncias. Sobredosagem grave pode causar
3 vezes ao dia de metabólitos ativos (a meia-vida do depressão respiratória e estupor ou coma. Qualquer redução abrupta
metabólito ativo pode exceder 50-100 ou excessivamente rápida da dose de benzodiazepinicos entre
horas). os usuários crônicos podem produzir abstinência ou delirium. Os
sintomas e sinais de abstinência podem incluir tremores, ansiedade,
distúrbios de percepção, disforia, psicose e convulsões.

Antihistamínicos sedativos

Hidroxizine 10 - 50 mg - Sedação, excitação, constipação, efeitos anticolinérgicos (secura na


3 vezes ao dia boca, retenção urinária e confusão mental no idoso).

Difenidramina 25 – 75 mg -
2 vezes ao dia

Neurolépticos

Haloperidol 0,5 – 1 mg Dose máxima de 30mg ao dia Interação com inibidores potentes da CYP 2D6 (como, fluoxetina,
2 vezes ao dia paroxetina, bupropiona) e potentes indutores da CYP (como,
carbamazepina); prolongamento do intervalo QT.

Olanzapina 2,5 – 5 mg Dose máxima de 40mg ao dia Interação com inibidores potentes da CYP1A2 (como, fluvoxamina)
à noite e indutores da CYP (como, carbamazepina); Prolongamento do
intervalo QT.

Quetiapina 25 – 50 mg Dose máxima de 1200mg ao dia Interação com inibidores potentes da CYP3A4 (por exemplo,
à noite claritromicina) e indutores da CYP (por exemplo, carbamazepina);
Prolongamento do intervalo QT.

Hipnóticos não benzodiazepínicos

Zolpidem 5 - 10 mg Pico de ação de 1 a 2 horas. Baixo a moderado risco de interação medicamentosa. É


a noite metabolizado em parte pela CYP3A4.

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Agitação e delirium 23
CAPÍTULO

Kate Adriany Santos


Raquel Loiola Moreira
Maisa Carla Kairalla

INTRODUÇÃO tico e Estatístico de Transtornos Mentais


O delirium ou estado confusional agudo (DSM-IV), o delirium é definido como uma
está entre os transtornos mentais mais co- síndrome cerebral orgânica caracterizada
muns encontrados em pacientes com proble- por uma disfunção cerebral global que in-
mas de saúde, especialmente entre os idosos e clui pertubações da consciência e atenção,
naqueles com doenças avançadas. Está asso- e das funções cognitivas básicas (pensa-
ciado a muitas condições médicas complexas mento, percepção e mémoria). O distúrbio
e pode ser de difícil reconhecimento.1,2 ocorre num período curto de tempo e tende
Delirium é a complicação neuropsiquiá- a flutuar no decorrer do dia. Outras caracte-
trica mais comum em pacientes com doença rísticas que podem acompanhar o delirium
avançada, ocorrendo em até 85% dos pacien- são a alteração do comportamento psico-
tes nas últimas semanas de vida. Apesar de motor, a mudança no ritmo sono-vigília e
alguns estudos terem identificado a agitação distúrbios emocionais, incluindo medo, de-
como uma característica central do delirium pressão, euforia, ou perplexidade.3
entre 13% a 46% dos pacientes, outros estudos
demonstram que até 80% dos pacientes pró- EPIDEMIOLOGIA
ximos do fim da vida desenvolvem delirium O delirium afeta 20% a 30% das pes-
hipoativo, sem agitação. Tanto o delirium soas com câncer, doença pulmonar obs-
hiperativo como o hipoativo são prenúncios trutiva crônica e em estágios finais de
de morte iminente e estão associados a uma doença hepática. Esta prevalência aumen-
maior morbidade em pacientes com doença ta para 44% em pacientes com câncer em
avançada, causando sofrimento para os pa- estágio avançado e para 83% nos pacien-
cientes, familiares e equipe de saúde.1,2 tes durante os seus últimos dias de vida.
Delirium está associado a uma maior taxa
DEFINIÇÃO de mortalidade durante e após a interna-
Delirium é o distúrbio cognitivo que re- ção. Estudos mostram que a mortalidade
sulta na alteração do estado mental, descri- após a alta hospitalar é 62% a 111% mais
to como prejuízo da consciência e cognição. elevada do que a dos idosos que não apre-
Baseado nos critérios do Manual Diagnós- sentaram delirium. 2,3,4

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Capítulo 23 - Agitação e delirium

A prevalência de delirium em todas as in- implica em prejuízo cognitivo. O cortisol


ternações varia de 14% a 24%. Delirium é a modula a atividade do sistema límbico, o que
complicação mais frequente em idosos hos- pode explicar algumas disfunções cognitivas
pitalizados, com taxas que variam de acordo apresentadas durante o quadro de delirium.8
com os fatores de risco do paciente. No pós
-operatório ocorre em 15% a 53% dos pacien- FATORES DE RISCO
tes mais idosos, e em 70% a 87% daqueles em O delirium é um distúrbio multifatorial.
UTI. Em instituições de longa permanência, Vários estudos têm identificado os fatores
ocorre em até 60% dos pacientes.4,5 A preva- de risco mais importantes para o delirium,
lência de delirium na comunidade é de ape- os quais foram classificados em dois grupos:
nas 1% a 2%, porém aumenta com a idade, fatores predisponentes e fatores precipitan-
chegando até 14% entre maiores de 85 anos.3,4 tes. Os fatores predisponentes caracterizam
A mortalidade entre os pacientes hospi- os idosos como mais vulneráveis ao desen-
talizados com delirium varia de 22% a 76%, volvimento do delirium e os fatores precipi-
semelhante às taxas observadas entre os tantes são os responsáveis pelo desencadea-
pacientes com infarto agudo do miocárdio mento de delirium.2,4,9
ou sepse. 3,4 Os fatores predisponentes mais co-
muns são (Tabela 23.1)2: idade avançada,
FISIOPATOLOGIA sexo masculino, preexistência de demên-
A fisiopatologia do delirium é pouco cia e depressão, déficit visual e auditivo,
compreendida. A maioria das teorias é dependência funcional, desnutrição e de-
simplificada. As principais hipóteses estão sidratação, polifarmácia (especialmente
relacionadas com o papel dos neurotrans-
Tabela 23.1 - Fatores predisponentes para delirium
missores, inf lamação e estresse crônico.
Demográficos
Estudos eletrocardiográficos mostraram
• Idade > 65 anos
lentificação difusa no traçado eletroen- • Sexo masculino
cefalográfico dos pacientes com delirium, Estado cognitivo
sugerindo tratar-se de distúrbio generali- • Demência
zado das funções corticais. 2,4,6 • História prévia de delirium
• Depressão
Entre os neurotransmissores, a acetilcoli-
Déficit sensorial
na é o mais importante no delirium. Com o
• Déficit auditivo e visual
envelhecimento, há uma diminuição na sua
Redução da ingesta oral
liberação, bem como uma redução na ação
• Desidratação
dos receptores muscarínicos. A intoxicação • Desnutrição
por drogas anticolinérgicas produz delirium, Drogas
levando a um alentecimento difuso no traça- • Polifarmácia
do eletroencefalográfico.6,7 • Drogas psicoativas
• Abuso de álcool
O excesso dopaminérgico também pare-
Comorbidades
ce contribuir para o delirium, possivelmente
• Doença grave ou terminal
devido a sua influência na regulamentação • Múltiplas comorbidades
da liberação de acetilcolina. Drogas dopami- • História de AVC
• Doenças neurológicas
nérgicas (levodopa e bupropiona) são consi- • Doença renal crônica ou hepática
deradas como fatores precipitantes de deli- • Fratura ou trauma
rium. Por outro lado, os antipsicóticos (anta- Estado funcional
gonistas da dopamina) tratam efetivamente • Imobilidade
os sintomas do delirium.7 • História de quedas
• Constipação
O hipercortisolismo (que ocorre no • Privação de sono
estresse, após cirurgias, na síndrome de Adaptado de Saxena S, Lawley D, Delirium in the elderly:
Cushing e com o uso de esteróides exógenos) A clinical review. Postgrad Med J. 20092.

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Capítulo 23 - Agitação e delirium

Quadro 23.2 - Fatores precipitantes analgésicos, opioides, drogas anticolinér-


Condições e doenças associadas gicas), dor mal controlada. Entre os fatores
• Infecções, febre, choque, doença aguda grave, ambientais, cita-se a restrição física e o ca-
anemia, IAM, ICC, hipoxemia, infecção urinária, teter vesical.8,9
distúrbios metabólicos, doenças endócrinas (hipo
ou hipertireoidismo, hiperparatireoidismo), retenção
urinária, constipação intestinal, hipoalbuminemia QUADRO CLÍNICO
Cirúrgicas O delirium pode ser dividido em 04 ti-
• Ortopédicas, cardíacas, circulação extracorpórea pos: hiperativo (21%), hipoativo (29%), misto
Drogas (43%), não classificado (7%).7
• Overdose, sedativos, drogas anticolinérgicas, O delirium hiperativo caracteriza-se
anticonvulsivantes, síndrome de abstinência por álcool
ou benzodiazepínicos por uma maior atividade psicomotora e é o
Ambientais/situacionais tipo de delirium mais comumente reconhe-
• Admissão em UTI, restrição física, cateter vesical, cido. Está associado aos efeitos adversos
estresse emocional, privação de sono de drogas anticolinérgicas, intoxicações
Doenças neurológicas medicamentosas e abstinência. É definido
• AVC, TCE, HSA, meningite, encefalite, epilepsia pela presença de três ou mais das seguintes
IAM: Infarto agudo do miocárdio
características10, 11: hipervigilância, inquie-
ICC: Insuficiência cardíaca congestiva
UTI: Unidade de terapia intensiva tação, fala alta ou rápida, raiva ou irrita-
AVC: Acidente vascular cerebral bilidade, impaciência, xingamentos, can-
TCE: Traumatismo crânio encefálico
toria, risos, euforia, perambulação, distra-
HSA: Hemorragia subaracnóide
Adaptado de Saxena S, Lawley D, Delirium in the elderly:
ção, pesadelos e pensamentos persistentes.7
A clinical review. Postgrad Med J. 20092. O delirium hipoativo caracteriza-se por
menor atividade psicomotora. É menos reco-
drogas psicoativos), abuso de álcool, múl- nhecido pelos médicos, devido à ausência de
tiplas comorbidades, fragilidade e condi- interrupções ou comportamentos bizarros.
ções médicas severas.9 Os pacientes podem parecer lentos, letárgi-
Os fatores precipitantes mais comuns cos e confusos. Delirium hipoativo caracte-
são (Tabela 23.2)2: infecções, desidratação, riza-se pela presença de quatro ou mais das
distúrbios metabólicos (distúrbios do sódio seguintes características10,11: diminuição do
e cálcio), condições neurológicas agudas estado de vigília, fala lenta, letargia, diminui-
(acidente vascular cerebral), hipóxia, cirur- ção da atividade motora e do olhar, apatia.2,7
gias, principalmente cardíaca e ortopédica, O delirium misto é caracterizado por
drogas (especialmente benzodiazepínicos, componentes hipoativos e hiperativos. Já o

Quadro 23.3 - Critérios diagnósticos para


Delirium adaptados segundo DSM-IV*
(A)
Perturbação da consciência (isto é, redução da clareza da consciência em relação ao ambiente), com redução da capacidade
de direcionar, focalizar, manter ou deslocar a atenção
(B)
Uma alteração na cognição (tal como déficit de memória, desorientação, perturbação da linguagem) ou desenvolvimento de
perturbação da percepção que não é mais bem explicada por demência preexistente, estabelecida ou em evolução

(C)
A perturbação desenvolve-se ao longo de curto período de tempo (em geral de horas a dias), com tendência a flutuações no
decorrer do dia
(D)
Existem evidências, a partir da história, exame físico ou achados laboratoriais, de que a perturbação é causada por
consequências fisiológicas diretas de condição médica geral, intoxicação com substância ou retirada de substância
*O diagnóstico de delirium requer a presença dos 4 critérios

Adaptado de Saxena S, Lawley D, Delirium in the elderly:


A clinical review. Postgrad Med J. 20092.

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Capítulo 23 - Agitação e delirium

delirium não classificado define-se pela au- O médico deve obter um histórico deta-
sência de componente motor, de modo que lhado da família e dos cuidadores do estado
os pacientes não preenchem nem os critérios mental de base do paciente. Em pacientes
do hiperativo e nem do hipoativo.7 idosos portadores de demência, o diagnós-
tico de delirium torna-se de difícil reconhe-
DIAGNÓSTICO cimento, sendo muitas vezes pouco diagnos-
No contexto dos Cuidados Paliativos na ticado. Assim, o conhecimento do estado
população idosa, o delirium é de etiologia cognitivo prévio do paciente é essencial para
multifatorial, sendo um indicativo de pro- a avaliação do delirium. No exame físico, de-
blemas médicos subjacentes, tais como in- ve-se procurar evidências de infecção, desi-
fecções, distúrbios eletrolíticos, falência de dratação ou falência de algum órgão.1,12,16
órgãos, dor não controlada, efeitos adversos Efeitos adversos de medicações precisam
de medicações, abstinência a medicações de ser revistos como uma possível causa de de-
uso contínuo, podendo ser ainda um predi- lirium. Opioides, corticosteroides, benzodia-
tor de morte iminente.2,12 zepínicos e anticolinérgicos, frequentemente
Segundo o DSM-IV, existem quatro ca- utilizados na prática do cuidado paliativo,
racterísticas essenciais para o diagnóstico são comumente associados ao delirium.1
de delirium: desatenção, mudança súbita Quadros de desnutrição e desidratação,
na cognição, perturbação aguda e flutuan- comuns em pacientes geriátricos, contri-
te da consciência e presença de uma causa buem para maior suscetibilidade a efeitos ad-
médica subjacente. versos de medicamentos, devido a alteração
O Confusion Assessment Method (CAM) da farmacocinética e da farmacodinâmica
é uma ferramenta de triagem, de rápida e dessa população. Além disso, a distribuição
fácil aplicação que ajuda a identificar as e metabolização de drogas (principalmente
características necessárias para o diagnós- opioides) também deve ser considerada nos
tico de delirium, sendo útil na distinção pacientes que evoluem com insuficiência re-
de quadros demenciais. O diagnóstico de nal ou hepática.17,18
delirium requer a presença dos seguintes A abstinência de medicamentos de uso
critérios: início agudo com curso flutuan- crônico é outro fator que favorece o quadro
te e desatenção, associados ao pensamen- de delirium em pacientes geriátricos.16,18
to desorganizado ou alteração do nível de Testes laboratoriais podem identificar
consciência.13,14,15 anormalidades metabólicas (por exemplo,

Quadro 23.4 - Confusion assessment method (CAM) versão em português para o diagnóstico de delirium*
Critérios Avaliação
1 Início agudo Há evidência de uma mudança aguda do estado mental de base do paciente?
a) O paciente teve dificuldade em focalizar sua atenção, por exemplo,
distraiu-se facilmente ou teve dificuldade em acompanhar o que estava sendo dito?
2 Distúrbio da atenção
b) Se presente ou anormal, este comportamento variou durante a entrevista, isto é,
tendeu a surgir e desaparecer ou aumentar e diminuir de gravidade?
Pensamento O pensamento do paciente era desorganizado ou incoerente, com a conversação dispersiva
3
desorganizado ou irrelevante, fluxo de ideias pouco claro ou ilógico, ou mudança imprevisível do assunto?
Em geral, como você classificaria o nível de consciência do paciente:
•A  lerta (normal)
•V  igilante (hiperalerta, hipersensível a estímulos ambientais, assustando-se facilmente)
Alteração do nível
4 • L etárgico (sonolento, facilmente acordável)
de consciência
•E  sturpor (dificuldade para despertar)
•C  oma
• Incerto
O diagnóstico de delirium requer a presença dos critérios 1 e 2 associado ao critério 3 ou 4
*Adaptado de: Fabbri et al. Validity and reability of the Portuguese version of the confusion assessment method (CAM)
for the detection of delirium in the elderly; Arq Neuropsiquiatr. 2001; 59 (2-A): 175-179.15

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Capítulo 23 - Agitação e delirium

hipercalcemia, hiponatremia) ou infecciosas. que o delirium pode ser reversível em até


Eletrocardiograma e marcadores de necro- 50% dos casos e que o uso de uma aborda-
se miocárdica podem diagnosticar infarto gem sistemática para a avaliação do paciente
agudo do miocárdio. Em alguns casos, um em Cuidados Paliativos com delirium pode
eletroencefalograma (para excluir status identificar potencialmente fatores reversí-
epiléptico, crises convulsivas), exames de veis e minimizar a gravidade do delirium.
imagens cerebrais (para descartar metásta- Desse modo, dar-se ao paciente em fase
ses cerebrais, hemorragia intracraniana ou terminal uma melhora de sua qualidade de
isquemia) e punção lombar (para descartar vida, bem como uma morte digna.16,18,19
meningite) podem ser apropriados.1,2 Intervenções não farmacológicas repre-
No entanto, quando diante de um pa- sentam um aspecto importante do manejo
ciente idoso com delirium em fim de vida, do delirium. Hidratação e nutrição, oferta de
o médico deve fazer um abordagem indivi- oxigênio, manutenção da função intestinal
dualizada e criteriosa de tais investigações. e vesical adequadas, otimização da higiene
Tal abordagem deve ser guiada pelas metas do sono, estímulo à mobilização, tratamen-
de atendimento, avaliando-se os riscos e be- to da dor, orientação frequente e correção
nefícios da solicitação dos exames, devendo de déficits visuais e auditivos, são medidas
ser solicitados somente os que irão conduzir fundamentais no controle do delirium.1,6,12,13
a estratégias específicas.1,6,15 Quando possível, a restrição física deve
ser evitada, uma vez que se trata de um fator
TRATAMENTO de risco independente para manutenção do
O tratamento dos sintomas de delirium quadro de delirum. Apresentam-se como al-
deve ser iniciado com avaliação e identifi- ternativas à restrição física a manutenção de
cação das possíveis etiologias envolvidas, um acompanhante familiar, a realização de
corrigindo as causas reversíveis subjacentes modificações ambientais para se aumentar a
e reconhecendo se o evento é um prenún- sensação de familiaridade, o estabelecimen-
cio de morte iminente. Para estabelecer a to de uma iluminação adequada, bem como
reversibilidade potencial de um delirium, é o controle da temperatura ambiente.1,6,12,19,20
importante saber o diagnóstico principal do A revisão criteriosa da prescrição é fun-
paciente e suas comorbidades, prognóstico, damental, já que algumas drogas - como
status funcional e metas de tratamento.6 agentes anticolinérgicos, quimioterápicos,
Em Cuidados Paliativos de pacientes antipsicóticos, corticoides - são potencial-
com uma doença crônica, progressiva e in- mente causadoras de delirium e muitas de-
curável, a presença de delirium limita e di- las tornam-se desnecessárias na fase final
ficulta o plano terapêutico. Estudos indicam de vida. 2,7 O uso de opioides de forma não

Quando 23.5 - Manejo Clínico e Prevenção de Delirium


Critérios Avaliação
Associações, interações, altas doses, drogas inapropriadas;
Drogas e dor
controle inadequado da dor
Eletrólitos (distúrbios hidroeletrolíticos) Principalmente desidratação, distúrbios do sódio e cálcio
Lack of drugs (abstinência / falta de drogas) Álcool, sedativos
Infecções Principalmente dos tratos urinário e respiratório
Redução dos sentidos / Restrição Baixa acuidade visual, déficit auditivo; restrição ao leito
Intracraniana (causas intracranianas) Infecção, hemorragia, tumor, isquemia
Urinary / Faecal retention (retenção urinária e fecal)
Bexigoma, uso de sonda vesical, fecaloma
/ Uremia
Miocárdio: infarto, arritmia, insuficiência cardíaca descompensada
Miocárdio / Pulmão
Pulmão: exacerbação de doença pulmonar obstrutiva crônica, hipóxia
*Adaptado de: Marcantonio ER. Clinical management and prevention deliirum. Psychiatry. 2007; 7(1).19

223

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Capítulo 23 - Agitação e delirium

criteriosa estabelece uma forte associação CONSIDERAÇÕES FINAIS


com o quadro de delirium, principalmente A ocorrência de delirium em idosos em
hiperativo e consequentemente com maior Cuidados Paliativos é angustiante para os
necessidade de uso de sedação.17,18,19 pacientes, cuidadores e familiares, e pode ter
O haloperidol é a droga de escolha um impacto negativo na qualidade de vida
para controle de agitação psicomotora restante desses pacientes.
no delirium devido a sua ampla evidên- A abordagem para a avaliação de delirium
cia, alta potência, menor efeito sedativo, é complicada por uma série de fatores: a na-
disponibilidade da forma farmacêutica e tureza multifatorial, os inúmeros fatores de
falta de metabólitos ativos. Deve-se ini- risco médicos predisponentes, os efeitos ad-
ciar tratamento com doses baixas (0,5-1,0 versos neuropsiquiátricos dos medicamentos
mg), com aumento gradual até controle paliativos e as mudanças farmacocinéticas.
da agitação. Pode ser utilizado por via Apesar da necessidade de realizar uma
oral, subcutânea, ou intramuscular.19,20,21 abordagem sistemática para a avaliação do
Antipsicóticos atípicos também são delirium, devem ser considerados os objeti-
frequentemente utilizados: risperidona vos específicos de atendimento do paciente
0.5 mg -1mg/dia; olanzapina 2.5–5.0 mg/ geriátrico em Cuidados Paliativos.
dia; quetiapina 25 mg -100mg/dia. São ad-
ministrados por via oral.1,2,7 REFERÊNCIAS
Se nenhuma resposta for observada 1. BREITBART W, ALICI Y. Agitation and
durante 24 a 48 horas de administração Delirium at End of Life. JAMA. 2008 dez.
de doses plenas de haloperidol, outros 300(24):2898-2910.
neurolépticos mais sedativos, como a 2. SAXENA S, LAWLEY D. Delirium in the
olanzapina ou clorpromazina, são alter- elderly: a clinical review. Postgrad Med J.
nativas potenciais em pacientes com si- 2009. 85:405–13.
nais e sintomas persistentes de delirium 3. BOOKBINDER M, MCHUGH ME. Symp-
refratários ao tratamento. Pacientes que ton Management in Palliative Care. Nurs
não melhoram com pelo menos dois agen- Clin N Am. 2010. 311–317.
tes neurolépticos diferentes podem se be- 4. INOUYE SK. Delirium in older persons.
neficiar de sedação parenteral agressiva, New England Journal of Medicine. 2006.
incluindo-se o uso de infusões subcutâ- 354(11):1157–1165.
neas de midazolam. Este benzodiazepíni- 5. POPEO DM. Delirium in older adults. Mt
co altamente lipossolúvel é muito potente Sinai J Med. 2011. 571–582.
e tem uma meia-vida curta, permitindo a 6. IRWIN SA, PIRRELLO RD, ET AL. Cla-
titulação rápida. 2,19,21 rifying delirium Management: Practical,
Evidence-Based, Expert Recommendations
PREVENÇÃO of Clinical Practice. Journal of Palliative
Devido sua alta incidência em idosos e Medicine. 2013. 16(4):423-434.
natureza multifatorial do delirium, inter- 7. MOYER DD. Review article: Terminal de-
vir nos fatores predisponentes modificáveis lirium um geriatric patients with cancer at
é uma estratégia importante a ser adotada end of life. American Journal of Hospice &
nesse grupo de pacientes. Evitar desidrata- Palliative Medicine. 2011. 28(1):44-51.
ção, privação de sono, constipação intestinal 8. M ARTINS S, FERNANDES L. Delirium in
e retenção urinária, bem como estimular elderly people: a review. Frontiers in Neu-
deambulação, corrigir déficits sensoriais e rology. 2012. 3:1-11.
realizar prescrição criteriosa de medicações, 9. BRITISH GERIATRIC SOCIETY. Clinical
são intervenções que diminuem o risco de guidelines for the prevention, diagnosis
delirium nesses pacientes.1,12 and management of delirium in older peo-

224

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Capítulo 23 - Agitação e delirium

ple in hospital. 2006. Disponível em: http:// 16. FABBRO ED, DALAL S, BRUERA E.
www.bgs.org.uk/Publications/Clinical%20 Symptom Control in Palliative Care—
Guidelines/clinical_1-2_fulldelirium.htm Part III: Dyspnea and Delirium. J Palliat
10.MEAGHER DJ, O'HANLON D, O'MAH- Med. 2006. 9(2).
ONY E, CASEY PR, TRZEPACZ PT. Rela- 17. 
AGAR M, DRAPER B, PHILLIPS PA,
tionship between symptoms and motoric PHILLIPS J, COLLIER A, HARLUM J,
subtype of delirium. J Neuropsychiatry CURROW D. Making decisions about
Clin Neurosci. 2000. 12(1):51–56. delirium: A qualitative comparison of
11. ROOIJ SE, SCHUURMANS MJ, MAST decision making between nurses working
RC, LEVI M. Clinical subtypes of deli- in palliative care, aged care, aged care
rium and their relevance for daily clinical psychiatry, and oncology. Palliat Med.
practice: a systematic review. Int J Geriatr 2012. 26(7) 887–896.
Psychiatry. 2005. 20(7):609–15. 18. 
LEONARD M, RAJU B, CONROY M,
12. INOUYE SK, ZHANG Y, JONES RN, DONNELLY S, TRZEPACZ PT, SAUN-
KIELY DK, YANG F, MARCANTONIO DERS J, MEAGHER D. Reversibility of deli-
ER. Risk factors for delirium at dischar- rium in terminally ill patients and predictors
ge: development and validation of a pre- of mortality. Palliat Med. 2008. 22:848.
dictive model. Arch Intern Med. 2007. 19. M ARCANTONIO ER. Clinical manage-
167(13):1406-1413. ment and prevention deliirum. Psychiatry.
13. RYAN K, LEONARD M, GUERIN S, 2007. 7(1).
DONNELLY S, CONROY M, MEAGHER 20. ZIMMERMAN K, RUDOLPH J, SALOW
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method in the palliative care setting; Pal- Care Patients: Focus on Pharmacothera-
liat Med. 2009. 23:40. py. AM J Hosp Palliat Care. 2011. 28:501.
14. WEI LA, FEARING MA, STERNBERG 21. AGAR M, CURROW D, PLUMMER J,
EJ, INOUYE SK. The Confusion Assess- SEIDEL R, CARNAHAN R, ABERNA-
ment Method: a systematic review of cur- THY AP. Changes in anticholinergic load
rent usage. J Am Geriatr Soc. 2008. 56:823. from regular prescribed medications in
15. FABBRI ET Al. Validity and reability of palliative care as death approaches. Palliat
the Portuguese version of the confusion Med. 2009. 23(3):257-265.
assessment method (CAM) for the detec- 22. EELES E, ROCKWOOD K. Delirium in
tion of delirium in the elderly. Arq Neu- the Long-Term Care Setting: Clinical and
ropsiquiatr. 2001. 59(2-A): 175-179. Research Challenges; J Am Med Dir As-
soc. 2008. 9:57–161.

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As últimas 48 horas 24
CAPÍTULO

Ana Beatriz Galhardi Di Tommaso


Márcio Tomita da Rocha Lima
Maysa Seabra Cendoroglo

INTRODUÇÃO gressivas, surgem alguns sinais e sintomas


O termo as últimas 48 horas faz referên- cuja identificação é importante para orien-
cia aos sintomas que permeiam os últimos tação dos familiares. A seguir listamos os
momentos da vida de um paciente com uma mais frequentes:
doença terminal. Falar em horas, no entanto, • Alterações do padrão respiratório: difi-
parece objetivo demais em um momento tão culdade respiratória com aumento da fre-
pessoal e particular, impossível de se prever quência e superficialidade, por vezes com
ou determinar. Por esse motivo, apesar de respiração de Cheyne-Stokes, evoluindo
ainda falarmos nas tais 48 horas, esse perío- para respiração agônica e “ronco da mor-
do pode durar dias. te” (sororoca). Os familiares e cuidadores
De todos os pacientes que morrem, me- podem se sentir aflitos com tais mudan-
nos de 10% morrem repentinamente e de ças, imaginando sensação de sufocamen-
forma inesperada, os 90% restantes morrem to. Sendo assim, orientá-los que o paciente
depois de um longo período de doença com não está sufocado ou desconfortável e que
piora gradual até a morte.2,6 Os últimos dias a administração de oxigênio pode não ser
de vida são assunto de muitos estudos, quase benéfica, ajuda a trazer algum conforto
todos relacionados a pacientes com câncer.1 para familiares e cuidadores.2,3,6
Entretanto, a maioria dos idosos não mor- • Alterações cardiovasculares, com dimi-
rem em decorrência de câncer, mas sim de- nuição da frequência cardíaca e da pressão
vido à associação da idade avançada com as arterial, acarretando pele fria e cianose de
complicações no estágio final de uma doença extremidades.2,3
crônica.1,5 Doença cardíaca ou respiratória • Diminuição do nível de consciência, que
e demência são causas frequentes de morte pode ser resultado de distúrbios metabó-
nessa faixa etária.1 licos e fisiológicos irreversíveis. A comu-
nicação diminui e os familiares frequen-
SINAIS E SINTOMAS DE MORTE temente acham essa situação angustiante.
IMINENTE Experiências sugerem que sua consciência
À medida que a morte se aproxima, pode ser maior que a capacidade em res-
principalmente no curso de doenças pro- ponder. Portanto, é prudente aconselhar

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Capítulo 24 - As últimas 48 horas

família e cuidador a conversar com o pa- ciais ou soro fisiológico.2,3


ciente como se ele ou ela estivesse cons- • Ocorrência de delirium, que pode se apre-
ciente, estimulando o toque ou outra de- sentar como confusão, inquietação e/ou
monstração de afeto com que estão acos- agitação, com ou sem inversão do ciclo
tumados.2,3,6 sono-vigília. Para a família e os cuida-
• Perda da capacidade de deglutir, ocor- dores que não entendem a situação, esse
rendo acúmulo de saliva e secreções da delirium pode ser torturante e, embora o
orofaringe, provocando a impressão de cuidado prévio possa ter sido excelente, se
asfixia e favorecendo a ocorrência de o delirium for mal manejado a recordação
broncoaspiração. Quando o paciente se dos familiares provavelmente será de uma
tornar incapaz de engolir, deve-se, então, morte horrível e dolorosa.2,3,4
cessar a ingesta oral. A administração de • Sensação de dor: a dor física pode se tor-
escopolamina pode diminuir ou elimi- nar mais intensa, mas as dores emocio-
nar o som decorrente desse acúmulo de nais, sociais e espirituais também devem
secreção (“sororoca”), assim como a atro- ser consideradas e tratadas.3 Quando
pina pode ser igualmente efetiva, apesar possível deve-se oferecer auxílio psico-
de eventualmente acarretar excitação lógico e espiritual tanto para o paciente
cardíaca e no sistema nervoso central. quanto para os familiares.
Tentativas de aspiração, além de serem • Diminuição da ingesta oral, com dimi-
extremamente desconfortáveis para o pa- nuição da aceitação de alimentos e líqui-
ciente, podem ser ineficazes e causar an- dos. A anorexia pode ser útil e benéfica,
gústia aos familiares que acompanham o já que a cetose resultante da não ingesta
procedimento.2,3 de alimentos pode levar a uma sensação
• Sensação de fadiga e fraqueza intensas, de bem-estar e diminuir o desconforto,
levando o paciente a ficar sonolento a pelo efeito que o pH mais baixo promo-
maior parte do tempo e pouco se mover ve no sistema nervoso central mimeti-
no leito. Tal imobilidade pode provocar zando a ação de opioides (efeito “opioide
uma pressão contínua em determinada like”). A alimentação enteral ou paren-
área da pele, particularmente em proemi- teral não melhoraria o controle dos sin-
nências ósseas, e favorecer a isquemia da tomas e nem prolongaria a vida. Além
pele, dor e o aparecimento de úlceras por disso, a desidratação nas últimas horas
pressão.2,3,6 de vida pode estimular a liberação de
• Perda do controle esfincteriano, po- endorfina e promover sensação de bem
dendo ocorrer tanto incontinência uri- -estar. Para minimizar a sensação de
nária e fecal, como retenção urinária e sede, pode-se molhar os lábios com gaze
constipação. A incontinência pode ser embebida em água. A higiene oral, nasal
bastante angustiante para os familia- e conjuntival são importantes, e deve-se
res, caso não tenham sido avisados que ter cautela na hidratação intravenosa já
poderia ocorrer na evolução do quadro. que a mesma pode piorar edema, des-
Se o débito urinário for grande, com ne- conforto respiratório e aumentar secre-
cessidade de limpeza e trocas de fralda ções orotraqueobrônquicas.2,3,6
frequentes, a sondagem vesical pode ser • Ocorrência de insuficiência renal, em fun-
útil na prevenção de lesões de pele e re- ção da diminuição da perfusão do rim. O
dução da demanda dos cuidadores. 2,3 débito urinário diminui, sendo a oligúria
• Dificuldade em fechar os olhos, provo- e anúria normais nessa fase e os fluidos
cando exposição conjuntival enquanto parenterais incapazes de revertê-la.2,3
o paciente dorme. Para manutenção da Muitos pacientes não oncológicos são
umidificação, pode-se fazer uso de lubri- cuidados em instituições de longa perma-
ficantes oftalmológicos, lágrimas artifi- nência, mas os dados disponíveis sugerem

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Capítulo 24 - As últimas 48 horas

que o padrão dos seus sintomas na fase fundamentais para o controle de deter-
terminal difere dos pacientes com câncer. minada doença. Caso as medicações se-
Nas últimas 48 horas de vida de pacientes jam apenas de caráter preventivo a longo
institucionalizados, dor e sintomas respi- prazo (por exemplo: hipolimemiantes ou
ratórios são os mais encontrados, mas tais ácido acetilsalicílico para um indivíduo
sintomas podem ser determinados pela com alto risco cardiovascular) podemos
doença de base.1 Esse tema será detalha- considerar suspendê-las, priorizando me-
damente abordado em um outro capítulo dicações de conforto.
deste livro. A via de administração dependerá da
situação clínica e da droga a ser administra-
CUIDADOS COM ÚLCERAS da, sendo importante considerar que alguns
POR PRESSÃO pacientes serão capazes de tomar medica-
O cuidado com as áreas expostas à pres- mentos oralmente até próximo da morte,
são é uma questão importante no que se re- enquanto outros, não. Nestes casos, a via
fere aos Cuidados Paliativos, visto o risco de subcutânea pode ser uma alternativa eficaz,
desenvolvimento de úlceras por pressão em assim como a via retal, devendo-se evitar a
decorrência da mobilidade reduzida e da via intramuscular pela dor ocasionada.3
perda de peso. Colchões de ar e travesseiros Sendo assim, algumas classes de medi-
apropriados podem ser algumas das manei- cações podem ser fundamentais ao final
ras de prevení-las.7 da vida (posologia e mecanismos de ação
A mudança de posição do paciente na serão minuciosamente descritos ao longo
fase final de vida, entretanto, é controver- deste livro):
sa. Pode ser benéfica de várias formas, já • Opioide (Morfina)
que proporciona um contato mais próximo • Antiemético/ansiolítico (Haloperidol)
por meio do toque, diminui a pressão na- • Anticolinérgico (Hioscina)
quela região de tecido e assegura uma boa • Sedativo/tranquilizante (Midazolam/
higiene e o cuidado com a pele. Entretanto, Diazepam)
embora possa diminuir a dor nas áreas sob • Antifúngico (Nistatina solução oral)
pressão, o reposicionamento pode contri-
buir para desconforto e dor ao se movi- CONCLUSÃO
mentar o corpo e membros.7 Em doentes em fase final de vida, é co-
Sendo assim, a frequência da mudança mum o aparecimento de determinados sin-
de decúbito nos últimos dias de vida pode tomas nos momentos que antecedem a mor-
ser diminuída ou aumentada, na dependên- te, período denominado como as últimas 48
cia dos sintomas físicos apresentados pelo horas.
paciente, bem como da resposta da equipe Nos últimos dias ou horas de vida, o
de enfermagem e familiares a esses sinto- doente progressivamente passa a interagir
mas. Deve-se respeitar a autonomia do pa- menos com o meio externo e com as pes-
ciente, caso o mesmo expresse que não quer soas, parece distanciar-se, voltando-se mais
ser mobilizado. Além disso, o espaçamento para si. Tem dificuldade para se comunicar,
das mudanças de decúbito pode ser uma não consegue mais se alimentar e se movi-
boa alternativa nos casos em que o paciente mentar. Apresenta olhar mais fixo e fácies
apresenta-se aparentemente confortável e com pouca expressão. É como se estivesse
com fácies tranquila.7 se preparando para sua partida.
Explicar aos familiares o que ocorre
MEDICAÇÕES NA FASE FINAL DE VIDA pode ajudá-los a compreender a irrever-
Deve-se reconsiderar, nessa fase, o uso sibilidade do quadro e auxiliá-los nesse
de medicamentos (hipoglicemiantes, anti momento difícil de despedida, permitindo
-hipertensivos, vitaminas) que antes eram uma morte serena e tranquila.

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Capítulo 24 - As últimas 48 horas

REFERÊNCIAS a portuguese palliative care unit: does


1. BRANDT HE, OOMS ME, DELIENS L ET it differ from elsewhere? J Palliat Med.
AL. The last two days of life of nursing home 2003. 6(6):895-900.
patients - a nationwide study on causes of 5.LYNN J, ADAMSON DM. Living well at
death and burdensome symptoms in the the end of life - Adapting health care to
Netherlands. Palliat Med. 2006. 20:533-40. serious chronic illness in old age. RAND
2. FERRIS FD, VON GUNTEN CF, EMA- Health. 2003. 1-19.
NUEL LL. Competency in end-of-life 6. PLONK WM, ARNOLD RM. Terminal
care: last hours of life. J Palliat Med. 2003. care: The last weeks of life. J Palliat Med.
6(4):605-13. 2005. 8(5):1042-54.
3. K IRA CM. As últimas 48 horas. In: CRE- 7. 
SEARLE C, MCINERNEY F. Nurses’
MESP – Cuidado Paliativo, São Paulo. decision-making in pressure area mana-
2008. 337-353. gement in the last 48 hours of life. Int J
4. GONÇALVES JF, ALVARENGA M, SIL- Palliat Nurs. 2008. 14(9):432-8.
VA A. The last forty-eight hours of life in

230

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Parte 3
Situações críticas em Cuidados Paliativos

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Manejo de sangramentos
em Cuidados Paliativos 25
CAPÍTULO

Katia Emi Nakaema


Thiago Xavier Carneiro

INTRODUÇÃO penia: causada por invasão da medula óssea


Os sangramentos ocorrem em 6 a 10% ou mielofitíse e trombocitopenia por seques-
dos pacientes com câncer avançado. Podem tro hepático e esplênico, além de trombocito-
ser extremamente estressantes para os pa- penia por medicações (tabela 25.1).
cientes e seus cuidadores1, sendo uma lem- 4) Déficits nutricionais: a incidência de
brança constante da doença e de seu caráter deficiência de vitamina B12 é semelhan-
progressivo.2 te em pacientes com câncer avançado e na
Ocorrem na forma de hemoptise, epista- população idosa. Prevalência de deficiência
xe, hematúria, sangramento vaginal ou retal, de folato pode chegar a 30%, ocorre redução
hematêmese, melena ou de lesões de pele na ingestão e absorção de vitamina K e defi-
ulceradas. Podem também manifestar-se na ciência de zinco.
forma de petéquias, equimoses ou hemato- 5) Medicamentos: o uso de anticoagu-
mas. Raramente, ocorrem como um evento lantes, principlamente a warfarina, tem sido
hemorrágico catastrófico.2,3,4 associado ao aumento na incidência de san-
As principais causas de sangramentos são3: gramentos. A prescrição deve ser revisada
1) Invasão pelo câncer: fatores angiogê- com atenção ao uso desnecessário de agen-
nicos secretados pelo tumor levam à maior tes antiplaquetários e antiinflamatórios não
vascularização e maior chance de sangra- hormonais.
mento. Os tumores sólidos podem causar 6) Distúrbios da coagulação: coagulação
erosões que envolvem pequenos e grandes intravascular disseminada, fibrinólise pri-
vasos (tumores de cabeça e pescoço, pulmão, mária, medicamentos e doença hepática.
gastrointestinal). 7) Outras doenças avançadas, como a
2) Relacionadas ao tratamento: mucosites doença renal. A uremia causa defeito na fun-
secundárias a radioterapia e quimioterapia, ção plaquetária, levando a sangramentos.3,5
doença do enxerto contra o hospedeiro após A intervenção deve basear-se na possível
transplante de medula óssea e trombocitope- causa do sangramento, se há chance de re-
nia após quimioterapia e radioterapia. versibilidade, no prognóstico da doença, no
3) Falência da medula óssea e trombocito- estado de performance do paciente, nas te-

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Capítulo 25 - Manejo de sangramentos em Cuidados Paliativos

Tabela 25.1 - Exemplos de medicações que causam trombocitopenia 5


Procainamida Anfotericina B Cimetidina Ouro
Quinidina Rifampicina Ranitidina Heparina
Trimetoprim- Anti-inflamatórios
Abciximab Acetaminofeno
sulfametoxazol não hormonais
Eptifibatide Vancomicina Amrirone Hidroclorotiazida
Tirofiban Carbamazepina Efalizumab Quinina

rapias prévias e nas preferências do mesmo. Tabela 25.2 - Recomendações para manejo
Deve-se discutir com o paciente sobre planos de sangramentos 1,3
de ação no caso de ocorrer sangramentos, vi- Medidas Locais Medidas Sistêmicas
sando respeitar os desejos do próprio e sua Plasma e derivados
Tampão
qualidade de vida.1,3 do sangue

Se o objetivo do tratamento é paliativo, o Curativo compressivo Transfusão de plaquetas

manejo deve conter medidas para parar o san- Agentes


Vitamina K
hemostáticos tópicos
gramento, sem que sejam feitas medidas res- Agentes adstringentes DDAVP
suscitativas. Deve-se focar em parar o sangra- Modificações posturais Fator VIIa recombinante
mento, quando possível, e controlar sintomas Radioterapia Agentes antifibrinolíticos
desagradáveis. Uma revisão de todos os medi- Embolização paliativa
camentos em uso e de outras doenças associa- Endoscopia
das deve ajudar a identificar causa ou fatores
associados. Exemplo: uso de anticoagulantes,
antiinflamatórios não hormonais.1,3
Pequenos sangramentos podem ser pre- MEDIDAS LOCAIS
núncios de um evento hemorrágico catas- O uso de tampões é útil no controle de
trófico e deve-se preparar o paciente e seus sangramento em órgãos ocos, como nariz,
familiares para esta possibilidade. Contudo, vagina e reto. Em geral, é utilizado em com-
é importante evitar medo e ansiedade desne- binação com intervenções farmacológicas.
cessários. No caso de epistaxes, podem ser utilizados
Algumas medidas não medicamentosas de- agentes vasoconstritores como epinefrina e
vem ser orientadas aos familiares e cuidadores nitrato de prata. Em sangramentos vaginais,
se o paciente estiver em domicílio ou à equipe tampões embebidos em acetona ou formali-
em caso de instituições ou enfermarias. na 4-5% podem ser utilizados. A formalina
• uso de toalhas e recipientes escuros também pode ser utilizada em lesões cutâ-
para tornar o sangramento menos neas ulceradas e na retite actínica (lesões
evidente. retais causadas pela radiação). Enemas de
• orientar a comprimir o local de sangra- sucralfato a 10%, duas vezes por dia, são efe-
mento se possível. tivos para sangramentos retais causados por
• posicionar o paciente em caso de he- radiação. Se possível, a frequência das trocas
moptise ou hematêmese maciça. deve ser reduzida e deve-se dar preferência a
• disponibilizar medicamentos sedativos materiais não aderentes.1,3
para tratamento da ansiedade.3 Os curativos compressivos incluem o fil-
Neste assunto, há poucos estudos ran- me transparente, espumas, curativo de hi-
domizados e as recomendações baseiam-se drogel, hidrocolóides e alginatos. Os curati-
em relatos de casos, preferências pessoais, vos de alginato são os únicos que apresentam
disponibilidade de recursos e custos. As propriedades hemostáticas.1,3
principais recomendações estão resumidas Os agentes hemostáticos tópicos são os
na tabela 25.2.3 selantes de fibrina, que são derivados de

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Capítulo 25 - Manejo de sangramentos em Cuidados Paliativos

componentes do plasma, purificados, contém sanguíneo em determinados vasos através da


fibrinogênio, trombina e diferentes quantida- injeção de material hemostático. É um méto-
des de fator XIII. Os selantes tentam mimeti- do efetivo no controle de sangramento de tu-
zar as últimas fases da cascata de coagulação mores de cabeça e pescoço, bexiga, próstata,
e quanto maior a quantidade de fator XIII, colo do útero, pulmão, hepatocelular, renal,
melhor a chance de parar o sangramento e tumor neuroendócrino e tumores metastá-
menor a recorrência (níveis acima de 60U/ ticos para fígado, osso, pulmão e vagina. A
ml). Exemplos: Gelfoam, Floseal, celulose escolha do material hemostático dependerá
oxidada, e trombina misturada à espuma de do calibre do vaso e do tempo desejado de
gelatina. Forma-se um coágulo sintético em duração da oclusão.3,6,7
toda a extensão da lesão, com duração de 2 A embolização é restrita a áreas onde os
a 5 dias.1,3 vasos sanguíneos são acessíveis ao cateter e
Agentes cauterizantes e vasoconstritores a embolização não resulta em isquemia de
são boas alternativas em casos de sangra- órgãos principais.1 A terapia endovascular é
mento localizado, de origem capilar. A epi- uma opção terapêutica em sangramentos de
nefrina pode ser usada, mas com cautela. tumores de cabeça e pescoço, urogenitais e
As prostaglandinas E2 e F2 têm sido usadas pulmão. São utilizadas micropartículas, in-
para controle de cistite hemorrágica. Nitrato jetadas em sistema arterial identificado atra-
de prata, formalina 2-4% também têm ação vés de imagens de neurorradiologia.10 É uma
cauterizante em lesões de reto e bexiga.1,6 intervenção guiada por imagem precisa, com
Entre os agentes adstringentes, o nitrato acesso mínimo, anestesia local, pouco des-
de prata apresenta boa alternativa, pois é de conforto e rápida recuperação.7
fácil aplicação e de custo acessível. Apresen-
ta ação antibacteriana e coagulante. O sul- MEDIDAS SISTÊMICAS
fato de alumínio apresenta ação em endo- O uso de hemocomponentes, princi-
télio, reduzindo edema, inflamação e exsu- palmente derivados do plasma, é frequente
datos e pode ser usado em irrigação vesical para correção de sangramentos causados
contínua.1,3 por deficiência dos fatores de coagulação. As
As medidas posturais visam minimizar principais situações em Cuidados Paliativos
os sintomas decorrentes do sangramento são coagulação intravascular disseminada
quando medidas locais e sistêmicas não são (CIVD), doença hepática em fase terminal
mais efetivas. Posicionar o paciente em decú- ou sangramento secundário ao uso de warfa-
bito lateral do lado do foco de sangramento rina. Os derivados do plasma utilizados são:
pode evitar aspiração pulmonar para o pul- plasma fresco congelado e crioprecipitado.3
mão contralateral em caso de hemoptises.3 O plasma fresco congelado é reserva-
A radioterapia para controle de sangra- do para pacientes com expectativa de vida
mento é uma modalidade muito utilizada em maior que dias a semanas, pacientes nos
tumores ginecológicos, pulmonares, tumores quais o efeito da warfarina deve ser revertido
de pele superficiais, tumores de estômago, be- rapidamente e pacientes que necessitam de
xiga e de reto. As doses ideais não estão deter- procedimento invasivo de urgência e, quan-
minadas para todos os tipos de tumores.1,3,8,9 do necessário, no tratamento da CIVD.5
Os métodos endoscópicos podem ser uti- A transfusão de hemácias está indica-
lizados em sangramentos de trato gastroin- da quando a anemia resultante da perda
testinal e pulmão, possibilitando eletrocoa- sanguínea exacerba sintomas como fadiga
gulação, injeção de epinefrina, etanol, salina e dispneia.
gelada, coagulação através de microondas, A transfusão de plaquetas em pacientes
laser ou plasma de argônio.1,3 com câncer avançado (principalmente he-
A quimioembolização transcateter é um matológico) está indicada quando ocorre
método que consiste em diminuir o fluxo sangramento contínuo cutâneo ou mucoso,

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Capítulo 25 - Manejo de sangramentos em Cuidados Paliativos

caracterizando sangramento por disfunção esplênico e portal.1 É usado na prevenção de


plaquetária (como em gengivorragia, peté- sangramento perioperatório de neoplasia de
quias, sangramento intenso por trato gas- pâncreas. Dose de 50 a 100 mcg, 2 vezes ao
trointestinal ou gênito-urinário) na vigência dia, titulada até 600mcg/dia.1
de plaquetopenia.1,3 É importante verificar o O fator recombinante de coagulação VIIa
adequado rendimento plaquetário, que pode (FVIIa) foi inicialmente validado para uso
estar prejudicado se a etiologia da plaque- em pacientes com hemofilia ou trombopatias
topenia for imune. O adequado cálculo do adquiridas. Recentemente, diversos estudos
incremento plaquetário é relativamente com- tem sugerido seu benefício no trauma ou
plexo e tema específico em hemoterapia. De sangramentos intracranianos, mesmo com
modo prático, uma transfusão plaquetária coagulograma normal. Seu uso ainda deve
deve incrementar ao menos 10.000 plaquetas ser restrito na prática clínica e o maior risco
em um adulto. A resposta clínica à tranfusão de trombose associado a sua utilização deve
também deve ser avaliada. A dose habitual- ser sempre lembrado. Atualmente o seu ele-
mente utilizada é de 1U para cada 10kg de vado custo é um dos principais fatores limi-
peso para plaquetas randômicas ou 1U isola- tantes para seu uso.3
da para plaquetas obtidas por aférese. Os agentes antifibrinolíticos inibem con-
A administração de vitamina K deve ser versão de plasminogênio em plasmina, retar-
feita se houver suspeita de deficiência da dando a fibrinólise. Não há consenso sobre
mesma, principalmente em sangramentos o benefício de seu uso rotineiro para con-
por uso de warfarina ou síndromes colestá- trole de sangramentos. Podem ser utilizados
ticas, nas quais há prejuízo da absorção desta como adjuvantes, associado a outras terapias,
vitamina. A vitamina K é necessária para a principalmente para sangramentos mucosos,
produção hepática dos fatores da coagulação especialmente menorragia e epistaxe. Os
II, VII, IX e X. A administração pode ser via agentes disponíveis são: ácido tranexâmico e
oral (via de escolha) ou intravenosa (resevada ácido aminocapróico.
para colestase ou quando é necessário maior O ácido tranexâmico é dez vezes mais
velocidade de ação). A dose é de 2-10mg, de 1 efetivo in vitro e apresenta menor incidência
a 4 vezes ao dia, dependendo da intensidade de efeitos adversos.2 A administração pode
do sangramento e nível de alteração da ativi- ser via oral ou endovenosa. Os principais
dade de protrombina ou RNI.3 efeitos colaterais são de trato gastrointestinal
É importante interpretar de maneira ade- (náusea, vômito e diarreia) e dose-dependen-
quada a causa do sangramento, não atribuin- tes. Podem ocorrer também rash, sonolência,
do sempre a alterações em exames comple- cefaléia, vertigem, zumbido, congestão nasal
mentares. Um paciente com contagens pla- e hiperemia conjuntival, mas são pouco fre-
quetárias acima de 10.000 dificilmente terá quentes. A dose do ácido tranexâmico por
um sangramento espontâneo e, se estiver via oral é de 1g, três vezes ao dia e a dose en-
sem sintomas, deve ser apenas observado. Se dovenosa é de 10mg/kg, 3 a 4 vezes por dia,
houver um sangramento ativo, pode se bene- para infundir em 1 hora.
ficiar de transfusão, mas devemos procurar A dose do ácido aminocapróico é 1 a 2
lesões subjacentes. Pacientes com contagens g, três a quatro vezes por dia. Após o fim do
plaquetárias acima de 30.000 dificilmente se sangramento, deve-se continuar o tratamen-
beneficiarão de transfusão, com exceção de to por mais 7 dias. A dose endovenosa é de 4
sangramentos em sistema nervoso central ou a 5 g em 250 ml de soro fisiológico infundi-
oftalmológicos. O mesmo raciocínio deve ser dos em 1 hora, seguidos de 1g/hora em 50 ml
usado para alterações do coagulograma. de soro fisiológico por horas ou até controle
Análogos da somatostatina (octreotide) do sangramento.
têm sido usados no controle de sangramento Há pouquíssimos relatos de tromboem-
do trato gastrointestinal alto. Reduz o fluxo bolismo relacionados ao uso de antifibrinolí-

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Capítulo 25 - Manejo de sangramentos em Cuidados Paliativos

ticos. A principal contraindicação é a presen- 2. DEAN A, TUFFIN P. Fibrinolytic Inhibi-


ça de hematúria, pelo risco de obstrução das tors for Cancer-Associated Bleeding Pro-
vias urinárias por coágulos. blems. Journal of Pain and Symptom Ma-
O uso tópico de antifibrinolíticos tam- nagement. 1997. vol 13, n.1. 20-24.
bém pode ser considerado. Há relatos de seu 3. PROMMER E. Management of bleeding in
uso em pacientes com hematúria controlada the terminally ill patient. Hematology. June
após instilação vesical e casos de sangramen- 2005. 10(3):167-175.
to colônico controlado após instilação retal.2 4. HARRIS DG, NOBLE SIR. Management
of Terminal Hemorrhage in Patients with
CONSIDERAÇÕES ESPECIAIS Advanced Cancer: A systematic Literature
HEMORRAGIA TERMINAL ou CA- Review. Journal of Pain and Symptom Ma-
TASTRÓFICA: é o termo utilizado para de- nagement. 2009. vol.38, n.6. 913-927.
nominar um evento hemorrágico maior, de 5. DELOUGHERY TG. Management of Ac-
origem arterial, que provavelmente resultará quired Bleeding Problems in Cancer Pa-
em morte em um período curto de tempo, tients. Emerg Med Clin N Am 27. 2009.
como minutos. Caracterizada por perda san- 423-444.
guínea de mais de 1,5 litros em 30 segundos. 6. GHAHESTANI SM, SHAKHSSALIM N.
É um evento pouco frequente em Cuidados Palliative Treatment of Intractable He-
Paliativos, porém, produz consequências maturia in Context of Advanced Bladder
emocionais catastróficas em pacientes, cui- Cancer. Urology Journal. 2009. Vol.6, n.3.
dadores, familiares e profissionais da saúde 149-156.
envolvidos no cuidado. Incidências de 3 a 7. HAGUE J, TIPPETT R. Endovascular Te-
12% são relatadas em pacientes com câncer chniques in Palliative Care. Clinical Onco-
avançado.4,11 logy 22. 2010. 771-780.
Por definição, o tempo de ação para pro- 8. HASHIMOTO K, MAYAHARA H, TA-
porcionar conforto e suporte ao paciente é KASHIMA A, NAKAJIMA TE, KATO
muito curto. As melhores evidências na lite- K, HAMAGUCHI T, ITO Y, YAMADA Y,
ratura atual baseiam-se em opiniões de espe- KAGAMI Y, ITAMI J, SHIMADA Y. Pal-
cialistas. As principais recomendações foram liative radiation therapy for hemorrhage of
agrupadas da seguinte maneira4: unresectable gastric cancer: a single insti-
1) Identificar pacientes com risco de apre- tute experience. J Cancer Res Clin Oncol.
sentar este evento, informar e preparar fami- 2009. 135:1117-1123.
liares e cuidadores. 9. LEE JA, LIM DH, PARK W, AHN YC, HUH SJ.
2) Medidas gerais de suporte (toalhas es- Radiation therapy for gastric cancer bleeding.
curas, compressão do sítio hemorrágico, po- Tumori. 2009. 95:726-730.
sicionamento do paciente em decúbito lateral 10. SESTERHENN AM, IWINSKA-ZELDER
em caso de hematêmese ou hemoptise). J, DALCHOW CV, BIEN S, WERNER JA.
3) Uso de medicações sedativas de rápida Acute haemorrhage in patients with ad-
ação, como midazolam, 2,5mg a 5mg intra- vanced head and neck cancer: value of en-
venoso ou subcutânea. Se necessário,repetir dovascular therapy as palliative treatment
a dose após 10-15 minutos.1 option. The Journal of Laryngology and
Otology. 2006. 120:117-124.
REFERÊNCIAS 11. HARRIS DG, FINLAY IG, FLOWERS S,
1. PEREIRA J, PHAN T. Management of Blee- NOBLE SIR. The use os crisis medication
ding in Patients with Advanced Cancer. The in the management of terminal haemor-
Oncologist. 2004. 9:561-570. rhage due to incurable cancer: A qualitati-
ve study. Palliative Medicine. 2011.

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Síndrome da Compressão Medular 26
CAPÍTULO

Karen Andrade Norremose


Matheus Fernandes de Oliveira

INTRODUÇÃO Os sítios primários encontrados com


As doenças crônicas e o câncer são con- maior frequência são mama, próstata,
sideradas causas importantes de morbidade pulmão, cólon e rim. Outros possíveis fo-
e mortalidade. As neoplasias compreendem cos são: tireóide, bexiga, testículo, larin-
a terceira causa de morte no Brasil. O diag- ge e vesícula biliar. Linfoma e mieloma
nóstico precoce é a arma mais importante múltiplo também são causas comuns de
para garantir a efetividade terapêutica.1-4 síndrome de compressão medular. Exis-
Até 40% dos pacientes com câncer po- te variação da prevalência dependendo
derão desenvolver metástases ósseas e a do perfil da população avaliada, uma vez
coluna vertebral, devido a sua extensão, que tumores de linhagem hematopoiéti-
contiguidade com principais cavidades ca são mais frequentes em pacientes jo-
corporais e rica vascularização, é o prin- vens. 5,6,11,12,13,14
cipal sítio ósseo acometido. Dentre os pa- O sítio de maior incidência de compres-
cientes com metástases espinhais, 5 a 10% são medular é a coluna torácica, chegando
poderão apresentar compressão medular a acometer 70% dos pacientes, existindo
e 10% destes serão sintomáticos. 5-12 compressão acima de um nível em mais de
Estudos mostram que as metástases es- 20% dos casos. A preferência pela coluna
pinhais são mais comuns a partir da quarta torácica se explica por ser a porção da co-
década de vida, atingindo um pico na sexta luna vertebral de maior extensão, ser con-
década e voltando a diminuir, provavel- tígua ao tórax, que é fonte das principais
mente devido ao viés de falecimento dos etiologias malignas, como mama e pulmão.
pacientes mais idosos.5 Destarte, a doença Além disso, existe riqueza de irrigação ar-
metastática espinhal e a compressão me- terial e drenagem venosa, favorecendo im-
dular são principalmente encontradas em plantes tumorais emboligênicos. Por fim,
populações geriátricas. Não existe diferen- o diâmetro do canal vertebral na coluna
ça entre os sexos.5-10 torácica é o menor em toda coluna verte-

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Capítulo 26 - Síndrome da Compressão Medular

bral. Desta forma, lesões pequenas e poten- evoluindo com dano neurológico rapida-
cialmente assintomáticas na coluna cervical mente progressivo.9
e lombar podem ser sintomáticas na coluna
torácica. A coluna lombar é o segundo sítio QUADRO CLÍNICO
mais comum (30%), seguido pela cervical e A dor é o sintoma mais frequente, poden-
sacral (10-20% e 10%, respectivamente). A do estar presente em mais de 90% dos casos.
coexistência de metástases em níveis distin- Geralmente representa um sinal sentinela,
tos da coluna é um achado comum (cerca de pois antecede a disfunção neurológica irre-
70% dos casos), traduzindo o perfil de disse- versível. É progressiva, estando relacionada
minação do tumor.5,10,11,12 ao nível da lesão medular e é de caracterís-
Tumores vertebrais primários, como cor- tica mecânica, piorando com manobras que
doma, condrossarcoma, sarcoma de Ewing, diminuam o canal medular e aumentem o
cisto ósseo aneurismático, histiocitose das volume do plexo venoso, como, por exemplo,
células de Langerhans, granuloma eosinofí- a de Valsalva.1-12
lico (Síndrome de Hans-Schuller-Christian), A natureza da dor pode ser puramente
entre outros, também são associados com axial, por comprometimento da estrutura
compressão medular extrínseca. Meningio- física da coluna vertebral ou pode ser ra-
mas, tumores de bainha neural, astrocitomas dicular, quando há compressão de raízes
e ependimomas podem causar a síndrome nervosas. Nesse último caso, a dor pode ir-
com compressão intrínseca, porém com mes- radiar para dermátomos e miótomos torá-
ma sintomatologia. Outras causas de síndro- cicos e/ou lombossacrais, simulando uma
me compressiva medular são hemorragias ciatalgia. Mesmo assim, a dor é um sinal de
intrarraquianas, traumatismo raquimedular, certa forma favorável, pois localiza o insul-
infecções da coluna vertebral (espondilodis- to neoplásico e conduz à investigação, além
cites, abscessos e empiemas) e herniações de representar ainda alguma viabilidade de
agudas de disco intervertebral. tecido nervoso.1-12
No entanto, seguindo o objetivo do capi- A paresia é o segundo sintoma mais
tulo, iremos detalhar a discussão sobre me- frequente, em aproximadamente 75% dos
tástases espinhais com compressão medular. casos. Pode aparecer gradualmente ou de
forma aguda, traduzindo a evolução da
FISIOPATOLOGIA compressão medular. Devido à disposição
A invasão pelo tumor pode acontecer medular das fibras motoras, a musculatu-
em diferentes graus. Em uma fase inicial, a ra proximal é inicialmente mais afetada e,
ocupação do espaço epidural pode não deter- com a evolução, a musculatura distal tam-
minar compressão direta na medula, porém bém é comprometida. O paciente pode de-
promove alteração da coluna liquórica, esta- senvolver um quadro típico de claudicação
se venosa, insulto isquêmico progressivo por secundária à paraparesia, evoluindo para
diminuição de aferências e eferências vascu- parada de deambulação e paraplegia. Os
lares. Esses fatores levam à morte neuronal, reflexos tendinosos profundos geralmente
destruição das bainhas dos nervos, formação estão exaltados.1-12
de edema medular e liberação de neurotrans- Vale lembrar que o quadro clínico vai
missores e mediadores da inflamação que são depender do sítio da compressão. Dessa
responsáveis pela continuação de hipóxia, is- forma, compressão cervical pode determi-
quemia, dano tissular neurológico e percep- nar tetraparesia, transtornos sensitivos nos
ção da dor.1,2,3,4 quatro membros e, em alguns casos, alte-
Em uma fase mais avançada, pode exis- rações respiratórias por comprometimento
tir compressão direta da medula espinhal e do plexo cervical e nervo frênico (que iner-
plexo venoso epidural, determinando uma va o diafragma). No caso de compressão
agressividade muito acentuada dos sintomas, torácica, existe quase sempre comprome-

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Capítulo 26 - Síndrome da Compressão Medular

timento dos membros inferiores simetrica- mo e exposição ocupacional, estado geral do


mente. Nos casos de compressão lombar, o paciente e exame físico atencioso são funda-
comprometimento é de membros inferio- mentais para o diagnóstico.1-12
res e com característica assimétrica. Como Para quantificação do acometimento ós-
a medula se estende até aproximadamente seo e medular pela metástase, o método de
L2, abaixo desse nível a compressão se dá escolha é a ressonância magnética de toda
na cauda equina, e não na medula. Des- a coluna com utilização de contraste endo-
sa maneira, a clínica passa a favorecer os venoso. Os principais achados são de pro-
quadros periféricos, com lateralização dos cessos expansivos hipointensos em T1 e T2
sintomas e predomínio de funções autonô- com realce pós injeção de contraste, deter-
micas (continência fecal e urinária; função minando destruição de estruturas adjacen-
sexual). As disfunções vesicais, intestinais tes e compressão de canal vertebral (Figura
e sexuais são geralmente comuns em todos 26.1). A medula pode estar afilada devido à
os cenários.1-12 compressão e a coluna liquórica pode estar
A perda das funções sensitivas abai- interrompida.1-12
xo do nível da lesão comprova a evolução Pela característica disseminada das me-
grave do quadro e é chamado de nível sen- tástases vertebrais, é sempre recomendável
sitivo. Geralmente, na coluna torácica, o realização de ressonância magnética de toda
nível sensitivo acometido encontra-se dois a coluna, pois além da lesão que causa os sin-
níveis abaixo da lesão.1-12 tomas podem existir outras de igual impor-
Quando o comprometimento neurológi- tância terapêutica.1-12
co torna-se irreversível, todas as funções são A tomografia e radiografia simples po-
perdidas. Devido à perda do tônus autonô- dem ajudar na avaliação do comprometi-
mico, é comum o aparecimento de quadros mento ósseo. A radiografia simples de coluna
vasomotores, como hipotensão e bradicardia pode mostrar alterações ósseas, tais como,
além de quadros tróficos como livedos, sudo- colapsos vertebrais, lesões blásticas ou líticas,
rese e queda capilar.1-12 destruição do pedículo vertebral em torno de
A velocidade de instalação dos sintomas 70% dos casos.1-12
indica a severidade dos danos e a probabili-
dade de reverter o quadro clínico de paresia Figura 26.1. Exemplos de acometimento
está inversamente relacionado ao tempo de metastático espinhal. Em A, nota-se compressão
manutenção do mesmo: assim sendo, uma torácica da medula espinhal por uma metástase
de linfoma não Hodgkin. Destaca-se o realce
paresia instalada em menos de 24 horas tem homogêneo após injeção de contraste. Em B,
grande chance de ser revertida, de 24-48h metástase lombar de um tumor misto testicular
pode ainda ser revertida, mas após 48 horas (seminoma + não seminoma).
o nível de lesão já se torna avançado e poten-
cialmente irreversível.1-12

DIAGNÓSTICO A
O diagnóstico se baseia na história e nos
achados clínicos e neurológicos presentes e
que indicam o nível medular afetado. Uma
história oncológica prévia em um paciente
com déficit de força nos membros inferiores
deve sempre ser considerada. No entanto,
em até 25% dos casos, a compressão medular B
pode ser a primeira manifestação da doen-
ça oncológica. Nestes casos, a forte suspeita
clínica, comorbidades, hábitos como tabagis-

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Capítulo 26 - Síndrome da Compressão Medular

O estadiamento tumoral com tomogra- TRATAMENTO FARMACOLÓGICO


fias de tórax e abdome/pelve; cintilografia A dexametasona é recomendada na
óssea; marcadores tumorais sanguíneos; dose inicial de 10mg IV em bolus. Após
ultrassonografia de próstata, colo uterino o bolus, recomenda-se manter a dose de
e tireóide; mamografia; endoscopia diges- 4mg a cada 6 horas durante o tratamen-
tiva alta e baixa podem diagnosticar o sítio to radioterápico, reduzindo progressiva-
primário e avaliar a extensão da doença. mente após o seu término. Estudo recente
Atualmente a utilização do PET CT vem mostrou que dosagem em bolus de 100mg
substituindo muitas dessas técnicas.1-12 e 10mg não possuem diferenças estatís-
ticas. A dexametasona age reduzindo o
TRATAMENTO edema vasogênico e a liberação de fatores
Embora a compressão medular seja fre- inflamatórios que são gerados devido ao
quentemente de instalação insidiosa, deve processo de compressão.1-13
ser tratada como uma emergência, pelo po- Devido à utilização de corticoesteróides
tencial de lesão irreversível e alta morbida- e ao estresse funcional ao qual o paciente
de. O tratamento pode ser dividido em tra- se submete, é recomendado associar-se me-
tamento clínico de suporte, farmacológico, dicamento inibidor da bomba de prótons,
cirúrgico, adjuvante e paliativo. assim como o controle rigoroso dos níveis
de glicemia, da pressão arterial e dos ele-
TRATAMENTO CLÍNICO DE SUPORTE trólitos no sangue. Os bloqueadores de re-
Recomenda-se que o paciente seja in- ceptor H2 de histamina, como ranitidina,
ternado imediatamente para completa ava- são opções interessantes, causando menos
liação do status da doença. O paciente deve osteopenia a longo prazo.1-8
receber analgesia conforme esteja sintomá-
tico, evitando-se, quando possível, opióides TRATAMENTO CIRÚRGICO
e medicações que causem diminuição de O tratamento cirúrgico nas metásta-
motilidade gastrointestinal.1-12 ses espinhais continua controverso. As
Deve haver cuidado com o decúbito, possibilidades terapêuticas variam de tra-
uma vez que em muitos casos a mobili- tamento conservador e adjuvância com
dade pode estar prejudicada favorecendo quimioterapia e radioterapia à ressecção
aparecimento de úlceras por pressão. De- cirúrgica completa. Também pode ser uti-
pendendo do grau de comprometimento lizada descompressão paliativa, sem res-
neurológico, pode haver retenção vesical e secção total do tumor e sem estabilização
fecal, sendo necessária a sondagem vesical da coluna.5-13
de demora e utilização de agentes emo- O quadro clínico geral, quantificado
lientes fecais. Devido a diferentes graus pela escala de Karnofsky ou KPS; o esta-
de imobilidade, estes pacientes são de do neurológico, avaliado pela escala de
alto risco para desenvolvimento de trom- Frankel; a situação da doença sistêmica
bose venosa profunda. A profilaxia pode (estadiamento) e a estabilidade da lesão
ser feita através do uso de meias elásticas (associação com cifose ou lordose acen-
compressíveis, dispositivos de compressão tuadas) são parâmetros utilizados.
pneumática ou uso de heparina.1-4 Como uma regra geral, em pacientes
Em casos avançados, a plegia dos com estado clínico bom, déficit neurológi-
membros pode levar a dores por imobi- co incompleto, doença pouco disseminada
lidade, posicionamento vicioso e calcifi- e instabilidade mecânica da lesão, geral-
cações heterotópicas. Dessa forma, a ava- mente opta-se por ressecção da lesão, vi-
liação com fisioterapia e fisiatria é parte sando citorredução e correção da instabi-
fundamental do tratamento. lidade com instrumentação da coluna. Em

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Capítulo 26 - Síndrome da Compressão Medular

casos com estado clínico deteriorado, déficit TRATAMENTO PALIATIVO


neurológico completo e doença sistêmica O tratamento paliativo consiste em me-
avançada, a conduta mais conservadora é didas clínicas e cirúrgicas para cuidados do
adotada.5-13 paciente oncológico grave levando em con-
Salienta-se que, como aproximadamente sideração os princípios da bioética. Alguns
60% dos tumores metastáticos espinhais são fundamentos da terapia paliativa são: comu-
hipervascularizados, a embolização préope- nicação transparente com o paciente e famí-
ratória dos principais pedículos vasculares lia, multidisciplinaridade e compreensão da
pode ser uma ferramenta interessante.14 natureza do sofrimento.1-4
Em casos de fraturas patológicas secun- No paciente com compressão medular,
dárias aos tumores metastáticos, está bem a potencialidade de sequelas físicas e psico-
documentado o valor das técnicas de verte- lógicas é muito alta, devido ao comprome-
broplastia e/ou cifoplastia, que consistem no timento clínico, neurológico e funcional. O
preenchimento percutâneo da vértebra com alívio da dor, a compreensão da doença em
material sintético com densidade óssea (ci- suas fases de evolução, o suporte psicológico
mento sintético), permitindo reestabelecer a e espiritual e a participação de equipe mul-
arquitetura da coluna vertebral e diminuir o tidisciplinar são fatores que colaboram para
quadro álgico relacionado à fratura.15,16 um acompanhamento mais humanizado.1-4
O tratamento cirúrgico também se apli- A família e o paciente devem receber su-
ca quando o diagnóstico for duvidoso, sem porte e orientação tanto em regime ambula-
anatomia patológica prévia ou quando exis- torial quanto hospitalar. A inserção social,
te progressão da lesão e piora neurológica a ocupacional e a qualidade de vida até a morte
despeito do tratamento radioterápico. devem ser os principais objetivos.1-41.

TRATAMENTO ADJUVANTE PROGNÓSTICO


A radioterapia tem um papel central no O prognóstico dos pacientes com me-
tratamento da compressão medular malig- tástase vertebral e compressão medular é,
na. Realizada junto com a administração conceitualmente, reservado. Independente
da dexametasona apresenta resultados im- do sítio primário ser de característica mais
portantes: descomprime o tecido nervoso agressiva (por exemplo, mesotelioma de
por citorredução tumoral, diminui o déficit pleura) ou indolente (próstata), a simples
neurológico em 45-60% dos casos, reverte a
paresia em 11-20% dos casos, controla a dor Figura 26.2 - Escore prognóstico de Bauer.
em 70% dos casos e estabiliza a progressão A somatória dos fatores prognósticos
determina a conduta terapêutica
local da neoplasia.5-13
Um estudo recente mostrou que a radio- Escore de Bauer
terapia combinada com a cirurgia é o trata- Pontos Fatores prognósticos positivos
mento padrão ouro nos casos de metástases 1 Ausência de metástases viscerais
espinhais.13 Porém, em casos de pacientes 1 Ausência de tumor de pulmão

com condição clínica deteriorada, múltiplas 1 Metástase óssea única

comorbidades e perfil cardiopulmonar ruim, 1


Tumor primário = mama, rim, linfoma,
mieloma múltiplo
a radioterapia isolada constitui-se em ferra-
menta fundamental.13 Pontuação Objetivo Estratégia
do Escore terapêutico Cirúrgica
Em todos os casos, o tratamento do foco
0-1 Suporte Sem cirurgia
primário com quimioterapia e radioterapia Descompressão
também é advogado, para otimização da 2 Paliação
dorsal simples
terapia no foco metastático e o controle dos Controle Descompressão
3-4
implantes em outros sítios. local e fixação

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Capítulo 26 - Síndrome da Compressão Medular

5. BOTELHO RV, OLIVEIRA MF, ROTTA


presença de acometimento vertebral e JM. Quantification of vertebral involvement
compressão medular traduz agravamen- in metastatic spinal disease. The Open Or-
to sistêmico da doença oncológica com thopaedics Journal. 2013. 7:201-206.
agressividade. A sobrevida destes pacien- 6. AKBAR M, AYACHE A, EICHLER M,
tes pode variar bastante, mas tem uma KLOTZ M, WIEDENHÖFER B, LEHNER
média de 1 ano após o diagnóstico.17,18,19 B. Management of spinal metastases, stra-
Vários sistemas de classificação vem tegies and surgical indications. Orthopade.
sendo propostos no intuito de prever o 2012 Aug. 41(8):632-9.
prognóstico estimado dos pacientes de 7. 
PATON GR, FRANGOU E, FOURNEY
acordo com a extensão da doença oncológi- DR. Contemporary treatment strategy for
ca e, dessa forma, programar as estratégias spinal metastasis: the "LMNOP" system.
terapêuticas. Geralmente os parâmetros Can J Neurol Sci. 2011. 38(3):396-403.
avaliados são o status clínico geral, o status 8. SCIUBBA DM, PETTEYS RJ, DEKUTOS-
neurológico, o estadiamento tumoral e o KI MB, FISHER CG, FEHLINGS MG,
tipo histológico.1,17,18,19 ONDRA SL, RHINES LD, GOKASLAN
Dentre eles destacam-se a escala de ZL. Diagnosis and management of metas-
Tokuhashi, Tomita, Van der Linden, Siou- tatic spine disease. J Neurosurg Spine. 2010
tos, Bauer. A escala de Bauer é mais simples Jul. 13(1):94-108.
de aplicar e apresenta o maior valor preditivo 9. HESSLER C, BURKHARDT T, RAI-
entre as escalas mencionadas.17,18,19 MUND F, REGELSBERGER J, VETTO-
RAZZI E, MADERT J, EGGERS C. Dyna-
Existe um consenso de que, quando o
mics of neurological deficit after surgical
prognóstico estimado é maior que 1 ano,
decompression of symptomatic vertebral
a terapia com cirurgia radical e adjuvân-
metastases. Spine (Phila Pa 1976). 2009
cia deve ser aplicada. Em casos onde o Mar. 15:34(6):566-71.
prognóstico é de 6 meses a 1 ano, a cirur- 10. DELANK KS, WENDTNER C, EICH
gia paliativa de descompressão simples HT, EYSEL P. The treatment of spinal
pode ser utilizada acrescentando-se adju- metastases. Dtsch Arztebl Int. 2011 Feb.
vância. Em outros casos com prognóstico 108(5):71-90.
limitado menor que 3-6 meses, pode-se 11. SHIUE K, SAHGAL A, CHOW E, LUTZ
utilizar a radioterapia isolada.17,18,19 ST, CHANG EL, MAYR NA, ET AL. Ma-
nagement of metastatic spinal cord com-
REFERÊNCIAS pression. Expert Rev Anticancer Ther.
1. LOBLAW D, LAPERRIERE N. Emergency 2010. 10(5):697-708.
treatment of malignant extradural spinal 12. CHOI D, CROCKARD A, BUNGER C,
cord compression: an evidence-based gui- HARMS J, KAWAHARA N, MAZEL
deline. Journal of Clinical Oncology. 1998. C, ET AL. Global Spine Tumour Study
16:1613-24. Group. Review of metastatic spine tumor
2. ROMERO P, MANTEROLA A, MAR- classification and indications for surgery:
TINEZ E, VILLAFRANCA E, DOMIN- the consensus statement of the Global
GUEZ MA, ARIAS F. Compréssion Medu- Spine Tumour Study Group. Eur Spine J.
lar. An Sist Sanit Navar. 2004. 24:156-62. 2010. 19(2):215-22.
3. COORDENAÇÃO INSTITUCIONAL DE 13. FURLAN JC, CHAN KK, SANDOVAL
REINALDO AYER DE OLIVEIRA. Cuida- GA, LAM KC, KLINGER CA, PAT-
do Paliativo. São Paulo: Conselho Regional CHELL RA, LAPORTE A, FEHLINGS
de Medicina do Estado de São Paulo. 2008. MG. The combined use of surgery and ra-
4. ACADEMIA NACIONAL DE CUIDA- diotherapy to treat patients with epidural
DOS PALIATIVOS. Manual de Cuida- cord compression due to metastatic disea-
dos Paliativos. Rio de Janeiro: Diagra- se: a cost-utility analysis. Neuro Oncol.
phic. 2009. 2012 May. 14(5):631-40.

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Capítulo 26 - Síndrome da Compressão Medular

14. K ATO S, MURAKAMI H, MINAMI T, 17. 


OLIVEIRA MF, BARROS BA, ROTTA
DEMURA S, YOSHIOKA K, MATSUI O, JM, BOTELHO RV. Tokuhashi scoring
TSUCHIYA H. Preoperative emboliza- system has limited applicability in the
tion significantly decreases intraoperative majority of patients with spinal cord com-
blood loss during palliative surgery for pression secondary to vertebral metasta-
spinal metastasis. Orthopedics. 2012 Sep. sis. Arq Neuropsiquiatr. 2013.
35(9):e1389-95. doi: 10.3928/01477447- 18. 
HESSLER C, VETTORAZZI E, MA-
20120822-27. DERT J, BOKEMEYER C, PANSE J.
15. LIM BG, LEE JY, LEE MK, LEE DK, KIM Actual and predicted survival time of
JS, CHOI SS. Kyphoplasty for the treat- patients with spinal metastases of lung
ment of vertebral compression fractures cancer: evaluation of the robustness of the
in a cancer patient with neurological de- Tokuhashi score. Spine (Phila Pa 1976).
ficits and anterior vertebral wall destruc- 2011. 20:36(12):983-9.
tion. Pain Physician. 2011. 14(6):539-44. 19.  WIBMER C, LEITHNER A, HOFMANN
16. AGHAYEV K, PAPANASTASSIOU ID, G, CLAR H, KAPITAN M, BERGHOLD
VRIONIS F. Role of vertebral augmen- A, ET AL. Survival analysis of 254 pa-
tation procedures in the management of tients after manifestation of spinal me-
vertebral compression fractures in can- tastases: evaluation of seven preoperative
cer patients. Curr Opin Support Palliat scoring systems. Spine (Phila Pa 1976).
Care. 2011 Sep. 5(3):222-6. doi: 10.1097/ 2011. 36(23):1977-86.
SPC.0b013e328349652d.

245

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Manejo da síndrome de
veia cava superior 27
CAPÍTULO

Lucíola de Barros Pontes


André Daniel Tavares

INTRODUÇÃO (22%) e pelos linfomas do tipo não Hodgkin


A síndrome da veia cava superior (12%).1,3 Outros tumores incluem metástases
(SVCS) representa uma série de sinais e de câncer de mama, tumores germinativos,
sintomas clínicos decorrentes da obstrução mesotelioma e timoma.1,3 Especificamente na
ao fluxo sanguíneo no trajeto da veia cava população geriátrica, a neoplasia de pulmão
superior (VCS).1 representa a principal causa devido à maior
Atualmente, os processos neoplásicos incidência deste tumor frente aos demais
são responsáveis por cerca de 90% dos após os 60 anos de idade.3
casos da síndrome. 2 Neste capítulo, serão A trombose venosa de etiologia benigna,
revisados aspectos da fisiopatologia e apre- principalmente precipitada pela presença de
sentação clínica da SVCS, com foco no ma- catéteres intravasculares e marcapassos, re-
nejo paliativo dos sintomas decorrentes da presenta a segunda causa da síndrome, con-
etiologia neoplásica. tribuindo com cerca de 20-35% dos casos.2,4

ETIOLOGIA FISIOPATOLOGIA
Nas últimas décadas, graças ao avanço da A partir da obstrução do fluxo sanguíneo
antibioticoterapia, causas infecciosas como a na VCS, há um aumento pressórico no siste-
mediastinite fibrosante por fungos e aneuris- ma venoso cefálico, levando à lenta formação
mas da aorta torácica por sífilis tornaram-se de uma rede venosa colateral alternativa de
raras2,3, emergindo as neoplasias como prin- drenagem até o átrio direito.3
cipais causas de SVCS. Os sintomas se desenvolverão a depender
Os tumores de localização intra-torácica da velocidade de obstrução da VCS, se a mes-
são responsáveis por cerca de 60-85% das ma é completa ou parcial e se houve tempo
causas de SVCS2, geralmente diagnosticados hábil para a formação de colaterais, o que
durante a investigação de massas mediasti- geralmente requer algumas semanas.5 Ti-
nais. O câncer de pulmão não pequenas cé- picamente, pacientes com tumor de pulmão
lulas é a malignidade mais relacionada à sín- pequenas células, devido à alta taxa de repli-
drome, responsável por 50% dos casos, segui- cação da neoplasia, costumam desenvolver
do pelo câncer de pulmão pequenas células sintomas de instalação abrupta.3

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Capítulo 27 - Manejo da síndrome de veia cava superior

MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS E O objetivo principal do manejo é o alí-


DIAGNÓSTICO vio rápido dos sintomas e o tratamento da
O diagnóstico clínico é feito a partir de si- causa de base, que, como dito anteriormen-
nais e sintomas característicos de obstrução te, dependerá do tipo e estadio do tumor,
venosa central. A dispneia é a manifestação além de questões clínicas relevantes, como
mais frequente, acompanhada de edema e performance status.
rubor facial, caracteristicamente exacerbado Classicamente, a SVCS é conhecida
ao decúbito, e presença de circulação colate- como uma emergência oncológica, reque-
ral no pescoço e tórax.3,6 Outros sintomas in- rendo início imediato de radioterapia (RT).
cluem tosse, edema de membros superiores, Atualmente, entretanto, esse conceito vem
dor torácica, disfagia e, em casos mais graves, sendo reformulado, pois há alternativas tão
edema cerebral, com cefaléia, confusão men- eficazes quanto a RT para controle dos sin-
tal e coma.3,6 Nos casos em que há sintomas tomas, como os stents endovasculares, e tem
neurológicos, é necessário excluir a presença sido reconhecida a importância da obtenção
de metástases cerebrais antes de atribuir o do diagnóstico histológico antes do início de
quadro clínico unicamente à síndrome. qualquer tratamento definitivo, uma vez que
É importante ressaltar que o tempo de a irradiação do tumor pode atrapalhar a con-
duração dos sintomas não piora o prognósti- firmação histológica.7
co nem interfere na resposta ao tratamento.1 As únicas situações que requerem início
A tomografia de tórax com contraste en- imediato de RT, mesmo antes da confirma-
dovenoso é o exame complementar mais in- ção etiológica da neoplasia, se restringem a
formativo, sendo possível identificar a etiolo- pacientes com estridor laríngeo por obstru-
gia e o nível da obstrução.1,3 ção central das vias aéreas ou edema laríngeo
Uma vez sugerida a presença de maligni- severo e àqueles pacientes em coma devido à
dade, a definição do diagnóstico histológico é edema cerebral.1
fundamental, pois o prognóstico do paciente Não há estudos randomizados compa-
e o manejo terapêutico difere a depender da rando a eficácia do uso de stents endovascu-
histologia do tumor.1,3,6 lares, RT e quimioterapia (QT) sistêmica na
paliação dos sintomas.8 Recomenda-se que,
TRATAMENTO após avaliação clínica, o manejo inicial seja
Apesar do prognóstico do paciente com a guiado pela severidade dos sintomas e pela
SCVS por etiologia maligna ser reservado, com sensibilidade da neoplasia responsável pela
uma sobrevida mediana de 6 meses3, a taxa de síndrome ao tratamento radio e quimiote-
controle de sintomas é alta e alcançada preco- rápico, segundo algoritmo sugerido por Yu e
cemente após o início do tratamento.1 colaboradores (Tabela 27.1; Figura 27.1).6

Tabela 27.1 - Sistema de classificação de gravidade para a Síndrome de Veia Cava Superior
Grau Sintomas Incidência (%) Definição
0 Assintomático 10 Sinais radiográficos de obstrução na ausência de sintomas clínicos
1 Leve 25 Edema na face e pescoço, cianose e pletora facial
Edema na face e pescoço com sintomas associados (disfagia, tosse,
2 Moderado 50
distúrbios visuais, dificuldade de movimentação da cabeça e mandíbula)
Edema cerebral leve a moderado (cefaléia e tontura),
3 Severo 10 edema de laringe leve a moderado e diminuição da reserva
cardiovascular (síncope após o decúbito)
Edema cerebral acentuado (confusão e coma), estridor laríngeo
4 Muito severo 5 e comprometimento cardiovascular grave (síncope sem fatores
precipitantes, hipotensão, insuficiência renal)
5 Fatal <1 Morte
Adaptado de Yu JB et al. J Thorac Oncol 20086.

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Capítulo 27 - Manejo da síndrome de veia cava superior

Figura 27.1 - Algoritmo de manejo da Síndrome da Veia Cava Superior

Avaliação Clínica + TC de
tórax com contraste =
SVCS Etiologia Neoplásica

Sintomas Grau 4 Sintomas Grau 1,2,3

Diagnóstico histológico,
Stent estadiamento, discussão
endovascular multidisciplinar, avaliação
na urgência geriátrica, plano de
tratamento

Tumores com sensibilidade Pacientes com baixo PS


Tumores altamente radio-
intermediária à radio-quimio ou tumores com baixa
quimio sensíveis (linfoma,
(pulmão não pequenas sensibilidade à radio-quimio
pulmão pequenas células)
células) (mesotelioma)

Sintomas Grau 1 e 2 Sintomas Grau 3 Sintomas Grau 1 e 2 Sintomas Grau 3

Tratamento definitivo Radioterapia


Radioterapia
(semelhante ao recomendado +/- Stent endovascular
(considerar stent associado)
para pacientes sem a SVCS) Quimioterapia paliativa

Adaptado de Yu JB et al. J Thorac Oncol 20086 TC = tomografia SVCS = síndrome da veia cava superior PS =
performance status.

TERAPIA DE SUPORTE QUIMIOTERAPIA


A elevação do decúbito deve ser imple- Para pacientes com tumores de pulmão
mentada para alívio da pressão no segmen- pequenas células e linfomas não Hodgkin
to cefálico.1 com sintomatologia grau 1 e 2, a QT costuma
O uso de corticoides é importante no ser o manejo inicial mais adequado.6 Esses
cenário de neoplasias responsivas a estas tumores são altamente sensíveis à QT7, com
drogas, como os linfomas não Hodgkin e melhora dos sintomas em 01 a 02 semanas
timomas, sendo sugerido dexametasona após início do tratamento e paliação dura-
4mg, endovenoso, a cada 6 horas.1,3,9 Para doura.3,9 Mesmo no contexto de Cuidados
as demais neoplasias, como o câncer de Paliativos, após avaliação geriátrica adequa-
pulmão, em que o corticóide não tem ativi- da, há esquemas de QT eficazes e seguros a
dade anti-tumoral, não há indicação.9 Nos serem propostos para tratamento.10,11
casos de edema laríngeo, os corticoides po- No planejamento terapêutico do câncer de
dem ser utilizados para reduzir o inchaço, pulmão pequenas células pode ser necessário
porém essa recomendação é baseada ape- o uso de RT concomitante ou sequencial à QT,
nas em experiências de relatos de casos.9 mas este tipo de abordagem deve ser reservada
O uso de diuréticos é controverso e apenas para pacientes em que o intuito do tra-
não há estudos randomizados que com- tamento é curativo.6 Para esse tipo específico
provem sua eficácia, não devendo ser uti- de tumor, a apresentação com a SVCS não pa-
lizado rotineiramente. 3 rece piorar o prognóstico dos pacientes.6

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Capítulo 27 - Manejo da síndrome de veia cava superior

Já nos casos de câncer de pulmão não pe- de tratamento incluía a dose total de 12 Gy
quenas células, a velocidade de resposta à QT dividida em 2 frações de 6 Gy, com intervalo
isolada não é tão alta. Assim, pacientes com de 01 semana entre cada aplicação, em regi-
sintomas grau 3 devem receber inicialmente me ambulatorial. Dessa forma, com apenas
RT paliativa para alívio sintomático, muitas 02 aplicações, a taxa de controle de sintomas
vezes necessitando de stent endovascular até encontrada pelos autores foi de 87%, com
que os efeitos dos demais tratamentos sejam 39% e 74% dos pacientes relatando alívio to-
percebidos.6 Para aqueles com sintomatolo- tal dos sintomas após a primeira e a segunda
gia mais leve, a abordagem dependerá do es- dose, respectivamente.
tadio do tumor, geralmente envolvendo QT
para os tumores metastáticos e tratamento STENTS ENDOVASCULARES
combinado com quimio-radioterapia para os O implante de stents promove o rápido
localmente avançados.6 alívio sintomático, com cerca de 90% dos pa-
cientes relatando melhora nos sintomas.17,18 A
oclusão total da VCS não é uma contra-in-
RADIOTERAPIA dicação ao procedimento, feito por via per-
A RT é particularmente útil para tumores cutânea. A recorrência da sintomatologia
radiossensíveis, como o câncer de pulmão, ocorre em média em 13% dos casos17, geral-
causando alívio dos sintomas por diminuir mente causada por nova obstrução tumoral
o volume tumoral. Em alguns casos os sin- ou trombose, e costuma ser manejada com
tomas podem melhorar nas primeiras 72 ho- uma segunda intervenção.
ras do tratamento.9 Em revisão sistemática Seu uso está indicado para pacientes
incluindo 46 estudos9, a RT aliviou comple- com sintomas grau 4, para paliação rápida
tamente os sintomas causados pela síndro- em pacientes que ainda não possuem o diag-
me dentro de 02 semanas em 78% e 68% dos nóstico histológico e no caso de sintomas
pacientes com tumores de pulmão pequenas recorrentes após manejo inicial com quimio
e não pequenas células, respectivamente. No e radioterapia.6
entanto, aproximadamente 20% dos pacien- Após o implante do stent, é necessário an-
tes não apresentaram melhora.9,12. Nesses ca- ti-coagulação por um curto período de tem-
sos e para tumores pouco radiossensíveis, o po.18 Não há consenso sobre a estratégia mais
implante de um stent endovascular deve ser adequada, porém uma alternativa consiste
considerado.6 na dupla anti-agregação plaquetária (clopi-
É importante ressaltar que um curto dogrel 75mg associado à aspirina 100mg) por
atraso no início da RT para obtenção de um período de 03 meses.3,17,18
diagnóstico histológico definitivo, em si-
tuações em que não há urgência, não pare- CONCLUSÃO
ce alterar a mortalidade ou a taxa de palia- O manejo paliativo da SCVS de etiologia
ção de sintomas.13 maligna deverá ser guiado pela gravidade dos
O tratamento paliativo consiste em fra- sintomas e pelas características da neoplasia
ções diárias de 1.8-2 Gy, 5x/semana, durante de base. O tratamento inclui medidas de su-
1-3 semanas, a depender do tipo de neopla- porte e planejamento radio/quimioterápico,
sia, do campo de tratamento e do uso con- com opção de implante de stent endovascular
comitante de QT3. Para idosos com baixo em casos específicos. Após avaliação geriá-
performance status, a alternativa de RT com trica, para pacientes com baixo performance
curso reduzido tem se mostrado eficaz.14,15,16 status e/ou considerados vulneráveis ou frá-
Estudo conduzido por Lonardi e col.15 ava- geis deve-se dar preferência a esquemas de
liou 23 pacientes com idade ≥ 70 anos com radioterapia com curso reduzido e quimiote-
SVCS relacionada a tumores sólidos. O plano rapia adaptada.

250

Miolo.indd 250 17/04/2014 14:11:32


Capítulo 27 - Manejo da síndrome de veia cava superior

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251

Miolo.indd 251 17/04/2014 14:11:32


Obstrução intestinal maligna 28
CAPÍTULO

Thayse Pavan

INTRODUÇÃO ciente, que, na maioria das vezes, podem ser


A obstrução intestinal maligna (OIM) é classificadas em obstruções mecânicas ou
uma complicação oncológica frequente em funcionais. Com esta informação, poderá ser
alguns tipos de tumores, sendo responsável traçado o plano terapêutico.6,7
por uma deterioração importante da quali- As obstruções mecânicas ocorrem em
dade do fim de vida desses pacientes.1 sua maioria por oclusão tumoral, que pode
Essa entidade pode ocorrer em até 50% ser intrínseca, pelo crescimento intra-lumi-
das pacientes com cânceres de ovário e 25% nal do tumor; ou extrínseca, por compressão
daqueles com câncer colorretal metastático, externa do lúmen por massas ou aderências.
sendo também encontrada em portadores de Em uma minoria de pacientes, a oclusão
câncer de pâncreas, estômago, mama, mela- pode ocorrer por espessamento da parede do
noma, entre outros.2 órgão, como nos casos de linite plástica.1,6,7
Por definição, a OIM é caracterizada pelo Geralmente, obstruções mecânicas impe-
surgimento de alterações clínicas ou radio- dem o fluxo intestinal em um ou alguns pon-
lógicas de obstrução intestinal em pacientes tos isolados, o que as torna mais responsivas
com câncer intra-abdominal incurável ou ao tratamento com medidas locais, como ci-
com doença peritoneal metastática e denota rurgias, stents e dilatações.6,7
uma sobrevida mediana de somente 30 a 90 Por outro lado, a OIM funcional é res-
dias após diagnosticada.3,4 ponsável pela maioria dos episódios em pa-
Pacientes com câncer também podem ser cientes em fim de vida e corresponde a uma
acometidos por outras causas de obstrução entidade com acometimento intestinal mais
intestinal, como distúrbios metabólicos e difuso. Podem ocorrer por neuropatia para-
obstruções benignas por aderências pós-ci- neoplásica ou, principalmente por infiltração
rúrgicas ou actínicas, que não serão o alvo tumoral do mesentério, músculos, nervos e/
principal deste capítulo.5 ou plexos intra-abdominais, que irão dificul-
tar a passagem dos alimentos por prejuízo
CLASSIFICAÇÃO à motilidade. Os implantes peritoneais são
É importante definir o motivo que está geralmente múltiplos e acometem diversos
causando os sintomas obstrutivos do pa- pontos da cavidade, caracterizando a carci-

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Capítulo 28 - Obstrução intestinal maligna

nomatose peritoneal, que é responsável por Ganha mais acurácia quando acrescido de
quadros obstrutivos que raramente respon- contraste para estudar a motilidade, grau e
dem às medidas cirúrgicas.6,7 sítio de obstrução. O exame contrastado com
Bário aumenta a detecção de obstruções dis-
FISIOPATOLOGIA tais, já que não é absorvível e permanece no
A OIM consiste em um processo cíclico trânsito por período prolongado, enquanto
que se inicia com a redução da velocidade de que os meios de contraste solúveis em água
progressão do conteúdo intestinal por algum possibilitam uma boa visualização proximal
obstáculo. Ocorre, então, um aumento da e podem servir como auxílio terapêutico na
contração abdominal com cólicas que tentam resolução de obstruções parciais por promo-
vencer a obstrução. Isso determina distensão ver redução do edema luminal.11,12
de alças e aumento da secreção de água e ele- A endoscopia digestiva alta (EDA) e a
trólitos para o lúmen o que culmina em dor colonoscopia ajudam definir a causa de obs-
e surgimento de náuseas e vômitos. Os danos trução proximal e distal, respectivamente,
causados ao epitélio intestinal geram uma visualizada por outros exames de imagem e
resposta inflamatória com edema, produção promovem o tratamento para aqueles candi-
e liberação de prostaglandinas e polipeptí- datos à colocação de próteses metálicas au-
deos intestinais vasoativos que pioram a dis- toexpansivas (stents).13,14,15
tensão e a dor, perpetuando o quadro.8
TRATAMENTO
QUADRO CLÍNICO Apesar da OIM ser um quadro clínico
Os sintomas geralmente são graduais e comum na prática diária do paciente com
progressivos, já que as obstruções inicialmen- câncer, existem poucos estudos prospectivos,
te são parciais e são caracterizados por cólicas, aleatorizados que comparem as medidas tera-
náuseas, vômitos e distensão abdominal, que pêuticas entre si e qual o seu impacto na me-
tendem a melhorar com evacuações ou elimi- lhora da qualidade de vida desses indivíduos.1
nação de flatos.1,2 Os principais objetivos do tratamen-
Os sinais e sintomas vão depender da altura to consistem em resolver a dor, reduzir ao
da obstrução. Obstruções esofágicas promo- máximo a frequência de vômitos, eliminar
vem disfagia, e, assim como as obstruções gás- náuseas e, idealmente, permitir o retorno da
tricas e em intestino proximal, são caracteriza- alimentação via oral e a alta hospitalar para
das por vômitos precoces e em grande quanti- cuidados domiciliares.4
dade. Já obstruções no intestino distal são mais Ao examinar o paciente com quadro
caracterizadas pela dor abdominal e, quando oclusivo intestinal, primeiramente deve-se
apresentam vômitos estes são tardios e fecalói- excluir obstruções agudas com emergên-
des. Alguns doentes podem manifestar quadro cias cirúrgicas. Descartar, também, causas
diarréico intercalado com a constipação, deno- de íleo medicamentoso por alcalóides da
minado diarreia por transbordamento.1,2,9 vinca, opioides e antagonistas 5-HT3 ou
distúrbios eletrolíticos e metabólicos, que
EXAMES DE IMAGEM deverão ser corrigidos.1,8
A tomografia computadorizada de abdome Algumas particularidades deverão ser
possui alta sensibilidade e especificidade para o analisadas para nortear o tratamento, como
diagnóstico e principalmente para definição da o performance status do paciente, suas prin-
causa e local de obstrução. É um exame rápido, cipais comorbidades, além do padrão e o lo-
que vem tornando-se de fácil acesso, sendo a cal da obstrução. Somado a isso, como o ter-
primeira escolha sempre que disponível.10 mo câncer é usado para nomear um grupo
A realização do Raio X ortostático e em de doenças muito heterogêneas, é importante
posição supina avalia a distensão de alças in- conhecer a história natural da neoplasia de
testinais e a presença de níveis hidroaéreos. base, seu estadiamento, prognóstico e pos-

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Capítulo 28 - Obstrução intestinal maligna

síveis tratamentos futuros e assim analisar abordagem pode contribuir para paliação de
prós e contras em relação à biologia tumoral sintomas. A cirurgia é rotineiramente con-
e, principalmente qualidade de vida.16,17 traindicada em pacientes com ascite e naque-
les com carcinomatose generalizada, caracte-
MEDIDAS GERAIS rizada por obstruções parciais, intermitentes
Como medida inicial sugere-se suspender e múltiplas, já que possui alta taxa de morta-
a ingesta oral. O paciente deverá receber re- lidade e complicações, com pouca resolutivi-
posicão de fluidos intravenosos ou por hipo- dade e alta recorrência do quadro obstrutivo
dermóclise, somente o necessário para repor em curto período de tempo.16,17
as perdas, já que esta medida não melhora os Quando realizadas, as cirurgias mais co-
sintomas de xerostomia ou sede. Em média, muns são bypass ou ostomias, que têm como
um litro a um litro e meio de solução salina principais complicações infecções, deiscên-
com eletrólitos e glicose são suficientes para cias, fístulas e abscessos. As ostomias distais
manter o balanço sem aumentar o volume de são indicadas para pacientes com obstruções
líquido abdominal.8 baixas, porém como as ostomias jejunais são
A passagem de sonda nasogástrica (SNG) de alto débito e corroboram para distúrbios
para descompressão de gás e líquidos em obs- hidroeletrolíticos importantes, estas devem
truções proximais pode promover alívio dos ser evitadas.1,17
sintomas frequentemente e, portanto, é consi-
derado tratamento inicial em vários centros. EDA
Sendo mantida aberta até que o volume de dre- Prótese metálica autoexpansiva (Stent):
nagem aproxime-se de 100 ml/dia. Entretanto, Indicados para pacientes com ponto único de
em virtude de ser causa de grande desconforto obstrução, até o duodeno proximal, com alta
para paciente e familiares, esta medida deverá taxa de resolução de sintomas de náuseas e
ser postergada sempre que possível.4,8 retorno da aceitação oral. Oferecem resulta-
O uso rotineiro de NPP não é indicado dos mais rápidos e com menos complicações
pelo frequente número de efeitos colaterais e a curto prazo que o tratamento cirúrgico,
ausência de benefícios para o paciente com porém com maiores chances de retorno da
curta sobrevida.18 obstrução. Neste caso, pode ser passado novo
Para controle da xerostomia e da sede, stent ou tratamento local com laser de argô-
medidas como pequenos goles de água ou nio. Outra complicação menos frequente é a
consumir gelo podem contribuir para o alí- migração, que ocorre em pacientes que apre-
vio de sintomas. Aos pacientes refratários a sentam resposta ao tratamento oncológico,
todas as medidas, pode ser oferecido a con- com redução da massa tumoral.13,14
fecção de gastrostomia endoscópica per- Gastrostomia Endoscópica Percutânea
cutânea (PEG) descompressiva e permitido (PEG) descompressiva: Indicado para pa-
retorno da ingesta via oral, visando conforto cientes com múltiplos sítios de obstrução por
e manutenção do prazer da alimentação.19, 20 carcinomatose, portadores de doença rapida-
mente progressiva, com performance ruim e
CIRURGIA expectativa de vida menor que 30 dias. Os
O tratamento cirúrgico somente deverá pacientes que foram refratários às medidas
ser realizado quando houver indicação preci- clínicas iniciais se beneficiam com medidas
sa, principalmente em pacientes com obstru- paliativas para controle de sintomas e a PEG
ção mecânica única. Mesmo assim, sempre é uma alternativa mais conveniente que a
discutir e avaliar aspectos como status fun- SNG, podendo ser usada inclusive para man-
cional, comorbidades e estado nutricional.16,17 ter a dieta oral como medida de conforto. São
Considerar cirurgia naqueles com boa contraindicações relativas à sua confecção, a
funcionalidade, doença indolente, expectati- ascite de grande monta e massas tumorais
va de vida maior que 60 dias e quando esta extensas na parede gástrica.1

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Capítulo 28 - Obstrução intestinal maligna

COLONOSCOPIA mepromazina (6.25-50 mg/dia SC, SL) e a


A colonoscopia com implantação de stent clorpromazina (50-100 mg a cada 8 horas
metálico é capaz de melhorar os sintomas IM). A olanzapina (2,5 – 20mg/dia,SL), um
obstrutivos distais em até 75% das vezes. antipsicótico atípico que bloqueia diversas
Suas maiores limitações são as obstruções vias do aparecimento de náuseas, foi estu-
em cólon direito e as obstruções extrínsecas, dada como alternativa para pacientes que
tendo como principal complicação a reeste- mantêm náuseas e vômitos a despeito dos
nose, geralmente por crescimento tumoral.15 antieméticos habituais e corticoides com
bons resultados.1,4,22,24-26
TRATAMENTO FARMACOLÓGICO Os medicamentos que reduzem a secreção
O tratamento farmacológico da OIM abdominal são da classe dos anticolinérgicos
deve ser direcionado aos sintomas de cada (butilbrometo de escopolamina 40-120mg/
paciente, sempre evitando o uso de medidas dia, SC ou IV) e análogos de somatostatina.
tóxicas ou fúteis. Na maioria dos casos, o uso Os análogos da somatostatina (Octreotide
de antieméticos, analgésicos, corticosteroi- 0,2 – 0,9mg/dia SC ou IV ou Lanreotide LA
des, anticolinérgicos e análogos de somatos- 30mg cada 14 dias IM) promovem inibição
tina são necessários em associação para se da secreção hormonal e de fluidos intestinais
obter um resultado satisfatório.1,4,21 e pancreáticos, promovendo vasoconstrição,
O controle de dor abdominal contínua redução da motilidade gastrointestinal e ab-
pode ser manejado de acordo com a escada sorção de água e eletrólitos. Isso resulta em
analgésica da Organização Mundial de Saú- redução da congestão e do conteúdo intralu-
de, descrita no capítulo de controle da dor minal o que comprovadamente reduz sinto-
deste livro, sendo frequentemente necessário mas e o tempo necessário de SNG. É um tra-
o uso de opioides. Sempre priorizar adminis- tamento bem tolerado, porém seu custo é fa-
trações subcutâneas, intravenosas ou trans- tor limitante no Brasil e por isso é geralmente
dérmicas pela limitação do uso da via oral. reservado como tratamento de segunda linha
Associar anticolinérgicos (butilbrometo de em pacientes refratários.27-30
escopolamina 40-120mg/dia, SC ou IV) para O uso de corticoides na OIM é controver-
pacientes que apresentem dor em cólica.1,22, 23 so. Promovem um efeito analgésico e antiemé-
Para o controle de náuseas e vômitos é in- tico adicional e redução do edema peritumo-
dicado combinação de medicamentos que re- ral, melhoram o controle de sintomas e o fun-
duzam a secreção intestinal, como antiemé- cionamento do intestino, porém sem impactar
ticos com diferentes mecanismos de ação.1,22 em prognóstico. A dose adequada também é
Os antieméticos comuns, como os pro- incerta (Dexametasona 4-16 mg/dia). Na prá-
cinéticos (metoclopramida 60-240 mg/dia tica os corticosteroides são usados inicialmen-
SC ou IV), são as drogas de escolha para o te e suspensos caso não promovam benefício
tratamento inicial, porém são contraindica- após alguns dias de uso.4,24,25
dos em casos de obstrução intestinal total,
em pacientes com cólicas ou que estejam re- QUIMIOTERAPIA
cebendo anticolinérgicos. Também são utili- O uso da quimioterapia pode ser indi-
zadas com este fim as drogas anti-histamíni- cado em casos selecionados. Para pacientes
cas como o dimenidrinato (50-100 mg SC ou com obstrução funcional por comprome-
IV) e fenotiazidas (prometazina 5-15mg/dia). timento peritoneal de doença e portadores
Pode ser associado o uso de drogas neurolép- de neoplasias classicamente quimiossensí-
ticas, mais comumente o haloperidol (5-15 veis e que sejam virgens de tratamento ou
mg/dia SC ou IV), que é um antagonista sele- que estejam sem tratamento oncológico há
tivo do receptor da dopamina com atividade período prolongado, a quimioterapia pode
anticolinérgica e causa menos sedação que as obter resposta com significativa resolução
fenotiazidas; e em menor frequência a levo- de sintomas.16,21,31

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Capítulo 28 - Obstrução intestinal maligna

CONCLUSÕES 8. R IPAMONTI C, MERCADANTE S. Patho-


A obstrução intestinal maligna, na maio- physiology and management of malignant
ria das vezes, denota uma aproximação do bowel obstruction. Oxford Textbook of
fim da vida, sendo sempre importante dis- Palliative Medicine. 2004. 496-506.
cutir com pacientes e familiares o eventual 9. R IPAMONTI C, BRUERA E. Palliative ma-
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Capítulo 28 - Obstrução intestinal maligna

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258

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Hipercalcemia 29
CAPÍTULO

André Daniel Tavares


Renato Laks

INTRODUÇÃO ósseas, tumores de células escamosas de


O cálcio é um mineral que exerce fun- cabeça e pescoço e câncer de tireóide.
ções vitais para o organismo, participando
das transmissões nervosas, contratilida- Classificação:
de muscular, função cardíaca e esqueléti- A hipercalcemia associada às maligni-
ca. Os seus níveis séricos são rigidamente dades pode ser classificada em: hipercalce-
controlados através de hormônios, como o mia osteolítica local (HOL); hipercalcemia
paratormônio (PTH), a vitamina D e a cal- humoral maligna (HHM); hiperparatireoi-
citonina, e de transportes passivos e ativos dismo ectópico; e 1,25 dihidroxivitamina D
presentes no intestino, rins e ossos. produzida pelo tumor.1
No entanto, existem medicações e esta-
dos clínicos que reduzem a eficácia dos me- 1. H
 ipercalcemia osteolítica local (HOL):
canismos homeostáticos, com consequente Produção de fatores de crescimento e
aumento da predisposição de alterações do citoquinas liberados a partir da matriz
cálcio, como a desidratação, uso de diuréti- óssea durante o processo de reabsorção,
cos tiazídicos e síndrome da imobilidade.1 ou produzidos pelas células ósseas ou
Apesar desses eficazes mecanismos de pelas células do sistema imune. Estudos
homeostase, a hipercalcemia é frequen- em câncer de mama mostram que de-
te em portadores de neoplasias malignas, terminadas citoquinas (como o PTHrP,
sendo descrita em 20 a 30% dos pacientes IL- 6, IL-11) influenciam as células os-
com câncer em alguma etapa da doença, e teoblásticas à produzir RANKL. A pro-
indicando pior prognóstico. dução de RANKL pelas células ósseas
Os principais tumores malignos que aumenta a formação e a atividade dos
cursam com aumento dos níveis séricos osteoclastos.4 O processo é amplificado
de cálcio são os tumores sólidos e as neo- pela liberação de fatores de crescimento
plasias hematológicas, destacando-se as (TGFb, IGF-1) armazenados na matriz
neoplasias de pulmão, mama e o mieloma durante o processo de reabsorção óssea,
múltiplo.1 Outras etiologias neoplásicas que estimulam as células malignas, rei-
que devem ser lembradas são as metáteses niciando o processo.

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Capítulo 29 - Hipercalcemia

2.  Hipercalcemia humoral maligna não os da paratireóide. A tendência


(HHM): Secreção pelo tumor de fato- atual é englobar esses raros casos no
res calcemiantes que são levados pela grupo HHM. O hiperparatireoidismo
circulação aos órgãos-alvo (osso e rins). assim caracterizado tem sido descrito
Corresponde a 80% dos casos de hiper- em tumores de ovário9,10,11, carcinoma
calcemia associada à malignidade.5 Em- pulmonar de pequenas células metastá-
bora possam ser incluídas nesta defini- tico11, carcinoma escamoso de pulmão,
ção a excessiva produção de PTH ou de timoma, tumor neuroendócrino indife-
1,25-dihidroxivitamina D, habitualmen- renciado e carcinoma papilífero de tireói-
te o termo HHM é restrito à produção de5. No entanto, deve-se sempre lembrar
de PTHrP, o qual exerce seus efeitos de da possibilidade de que o paciente com
forma autócrina ou parácrina. Somente neoplasia maligna apresente também hi-
nas malignidades produtoras de PTHrP perparatireoidismo primário.
os elevados níveis circulantes atuarão nos 4. 
1,25 dihidroxivitamina D produzi-
receptores PTH1 no rim e no osso, assim da pelo tumor: Aumento da absorção
produzindo hipercalcemia.3 intestinal de cálcio consequente ao au-
A grande reabsorção esquelética difusa mento da 1,25 dihidroxivitamina D.
será a principal fonte de cálcio a gerar Também pode ser englobada no grupo
hipercalcemia. Ao contrário do hiper- HHM. Os linfomas são os tumores mais
paratireoidismo primário, o aumento da comumente envolvidos, como os linfo-
osteólise osteoclástica não é contraba- mas T associados ao HTLV1 2, linfomas
lançado por estímulo osteoblástico, ca- de ovário13, linfomas de células B confi-
racterizando desacoplamento da remo- nado ao baço14 e disgerminoma.
delação.2,5 Nos rins, o excesso de PTHrP
promove fosfatúria (com consequente hi- SINTOMATOLOGIA
pofosfatemia), mas não estimula a síntese Predominam os sintomas relacionados ao
de 1,25 dihidroxivitamina D. Seu principal sistema nervoso central como declínio pro-
efeito renal é o aumento da taxa de reabsor- gressivo da capacidade cognitiva, estupor e
ção tubular de cálcio e consequente menor coma. As alterações na função renal (incapa-
excreção fracionária de cálcio na urina, o cidade de concentrar a urina levando à po-
que contribui para a hipercalcemia.12,13 liúria) e no trato gastrointestinal (anorexia,
Os tumores que habitualmente secretam náuseas e vômitos) causam desidratação e
PTHrP são os de células escamosas (cabe- agravam a hipercalcemia.
ça, pescoço, esôfago, cérvix, pulmões, pân- Alterações no sistema cardiovascular e os-
creas), carcinoma de rim, bexiga, ovário, teomuscular, tais como hipertensão, bradicar-
endométrio, mama e os linfomas associa- dia, encurtamento do intervalo QT, bloqueio
dos ao HTLV-1. Entretanto, pelo fato de di- AV, assim como fraqueza muscular, dores ós-
versos órgãos terem o potencial de produzir seas e artralgias, fazem parte do quadro.
PTHrP, em tese todos os tumores malignos As complicações neurológicas e renais
podem causar HHM. Corroborando este são proporcionais ao grau da hipercalcemia,
fato, a hipercalcemia associada ao PTH-rP considerado de pequena intensidade quando
tem sido descrita também no melanoma o cálcio total está entre 10,5 a 11,9mg/dL, mo-
metastático6, em carcinoma anaplástico de derado quando o cálcio está entre 12 e 13,9mg/
tireóide cujas células apresentam padrão dL, e grave quando igual ou acima de 14mg/
misto papilar e escamoso7, em carcinoma dL. A velocidade de elevação do cálcio sérico
de cólon com metástases cutâneas8 e neo- e o grau de comprometimento neurológico e
plasias endócrinas pancreáticas.9 cognitivo prévio, principalmente nos idosos,
3. H  iperparatireoidismo ectópico: Pro- costumam estar diretamente relacionados à
dução de PTH por outros tumores que gravidade das manifestações clínicas.1,15

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Capítulo 29 - Hipercalcemia

INVESTIGAÇÃO LABORATORIAL gestão de alimentos e fluidos causada pela


O diagnóstico baseia-se no cálcio total anorexia, náuseas e pelos vômitos. A hiper-
(Cálcio sérico corrigido > 11 mg/dl). Na pre- calcemia, por si só, reduz a capacidade tubu-
sença de hipoalbuminemia, podemos ter ní- lar renal de reabsorver água por mecanismo
veis falsamente baixos de cálcio e o seu valor mediado pelos receptores de cálcio (diabetes
deve ser corrigido adicionando-se 0,8mg/dL insipidus nefrogênico), o que agrava ainda
ao cálcio total dosado para cada mg/dL que a mais a hipercalcemia e a desidratação. Por
albumina for menor que 4mg/dL. outro lado, a redução da filtração glomerular
reduz a capacidade renal de excretar cálcio,
Ca corrigido = Ca dosado + 0,8 (4-albumina) um círculo vicioso que precisa ser rompido.
Assim, hidratar o paciente com solução sali-
A segunda etapa é dosar PTH sérico, que na é uma etapa fundamental do tratamento.
estará suprimido na maioria das hipercalce- A expansão do volume circulante aumenta
mias associadas à malignidade. PTH inapro- a carga filtrada de cálcio ofertada aos túbu-
priadamente normal ou alto em um paciente los renais e inibe diretamente a reabsorção
com câncer nos remete à pesquisa de hiper- de água, sódio, fósforo e cálcio nos túbulos
paratireoidismo primário ou pode ser um proximais, favorecendo a excreção de cálcio
raro caso em que o PTH é produzido pela urinário.1,15 A infusão salina deve ser progra-
neoplasia (já descrito acima). mada para 200 a 500 mL por hora, e o limite
do volume e da velocidade da infusão é deter-
TRATAMENTO minado pela função renal e cardíaca. Pode-se
Embora o tratamento da hipercalcemia associar diuréticos de alça, como a furosemi-
não modifique a evolução da doença malig- da, para aumentar ainda mais a calciúria e
na de base, é fundamental para melhorar as permitir continuar com a hidratação endo-
condições clínicas do paciente na vigência do venosa.
tratamento antineoplásico.1 Reposição de fosfato: A hipofosfatemia é
Medidas gerais: Remover o cálcio da ali- comum em decorrência do efeito fosfatúrico
mentação parenteral, interromper medica- do PTHrP nas HHM, do uso de diuréticos de
mentos que contribuem para a hipercalce- alça, da própria hipercalcemia ou da menor
mia (suplementação de cálcio e vitamina D, ingestão alimentar. A reposição de fosfato
lítio, diuréticos tiazídicos), além de reduzir auxilia a reduzir a reabsorção óssea e deve
sedativos para melhorar o nível de cons- ser feita preferencialmente por via enteral,
ciência e favorecer a deambulação, sempre reservando-se a reposição endovenosa para
que possível.1,15 situações especiais pelos riscos de insuficiên-
Hidratação: Os pacientes habitualmente cia renal, hipotensão e hipocalcemia grave.1
encontram-se desidratados, pela menor in- Glicocorticoides: Quando o excesso de
1,25 dihidroxivitamina D está envolvido na
Tabela 29.1 - Bifosfonatos usados no Brasil no gênese da hipercalcemia, o tratamento pode
tratamento da hipercalcemia da malignidade, incluir glicocorticoides para reduzir a ab-
com respectivas doses para aplicação intravenosa19
sorção intestinal. Recomenda-se prednisona
Medicamento Dose 60mg/dia via oral por 10 dias.1,15
60-90 mg diluídos em 50 a 200ml
Medicamentos antireabsortivos: Comba-
Pamidronato de solução salina ou glicose a 5%. ter a osteólise é fundamental, e os bisfosfona-
Infundir durante 2 horas tos são os medicamentos mais eficientes para
Ácido
4 mg diluídos em 50 ml de solução esse fim, pelo seu reconhecido efeito apoptó-
zoledrônico
salina ou glicose a 5%. Infundir tico e antiproliferativo sobre os osteoclastos.
durante 15 minutos
Eles devem ser iniciados tão logo detectada
Ibandronato
6 mg diluídos em 200ml de solução a hipercalcemia, preferindo-se a via veno-
salina. Infundir durante 1-2 horas
sa devido à pobre absorção por via oral. Nos

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Capítulo 29 - Hipercalcemia

Estados Uinidos, a experiência é com o pami- 8.LUH JY, HAN ES, SIMMONS JR,
dronato e o ácido zoledrônico, enquanto em WHITEHEAD RP. Poorly differentia-
outros países, principalmente europeus, uti- ted colon carcinoma with neuroendo-
liza-se ibandronato e clodronato. No Brasil, crine features presenting with hyper-
contamos com os três primeiros. Doses e mo- calcemia and cutaneous metastases:
dos de administração constam da tabela 29.1.19 case report and review of the literature.
A redução da calcemia é observada após 2 Am J Clin Oncol. 2002. 25:160-3.
a 4 dias, é progressiva e geralmente atingi-se 9. MATSEN SL, YEO CJ, HRUBAN RH,
níveis séricos adequados em 7 dias. O efeito CHOTI MA. Hypercalcemia and pan-
do bisfosfonato persiste por apenas uma a três creatic endocrine neoplasia with ele-
semanas e novo curso pode ser instituído se vated PTH-rP: report of two new cases
o tratamento antineoplásico não tiver sido su- and subject review. J Gastrointest Surg.
ficiente para deter a causa da hipercalcemia. 2009. 9:270-9.
10. CHEN L, DINH TA, HAQUE A.
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Capítulo 29 - Hipercalcemia

Metabolic Bone Diseases and Disor- induced by concurrently elevated pa-


ders of Mineral Metabolism. 5th ed. rathyroid hormone and parathyroid
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263

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Obstrução maligna das vias aéreas 30
CAPÍTULO

Alisson Venazzi
Alessandra Garcia Braz

Tabela 30.1 - Causas de Obstrução de


INTRODUÇÃO vias aéreas relacionadas a malignidade
A dispneia causada por obstrução ma- Lingua
Carcinoma de Células Escamosas
ligna das vias aéreas é um sintoma habitual- Hematoma Sublingual
mente de instalação insidiosa e progressiva, Celulite Lingual
de caráter inespecífico1, que acarreta em Abscesso retrofaríngeo
Laringe
perda importante da qualidade de vida con- Câncer escamoso e não escamoso
forme sua evolução2. Mais comumente rela- Hematoma
Estenose
cionado à neoplasia pulmonar primária1,3,4 Edema
ou acometimento metastático de diferentes Pregas vocais
tipos histológicos e sítios primários, espera- Carcinoma de Células Escamosas
se que durante a história natural da doença, Injúria de nervos, por invasão tumoral local
Injúria de nervos por compressão de nervo craniano
30% dos pacientes com neoplasia pulmonar por tumores intracraniano
desenvolvam sintomas decorrentes de obs- Traquéia
trução das vias áereas4,5. Desses, 35% mor- Tumores de células escamosas
Linfoma de Hodgkin
rem por asfixia, hemoptise ou pneumonia Sarcoma de Kaposi
pós-obstrutiva3,5. Tendo isso em mente, a Compressão extrínseca por tumores de Tireóide
mensagem mais importante desse capítulo Compressão extrínseca por Carcinoma de Tireóide
Pulmões
é que, independente da expectativa de vida
Compressão de vias aéreas extrínseca
prevista, enquanto o paciente estiver vigil e Tampão mucoso
consciente, todas as medidas possíveis devem Bola fúngica
Neoplasia maligna Epitelial
ser adotadas com o intuito de manter a pa- Carcinoma de células escamosas
tência de vias aéreas e, assim, proporcionar Adenocarcinoma
Carcinoma de grandes células
ventilação/perfusão adequada. É fundamen- Carcinoma de pequenas células
tal a conscientização de profissionais ligados Neoplasia maligna Mesenquimal
à oncologia e Cuidados Paliativos de que a Sarcoma de partes moles
Condrocarcinoma
abordagem de neoplasias torácicas, primá- Linfoma
rias ou secundárias, deve incluir, desde seu Carcinoma indiferenciado
Mesotelioma
início, o rastreamento contínuo de obstrução
Mediastino
de vias aéreas e inclusão de medidas preco- Linfonodomegalia
ces para reversão dessa obstrução assim que Adaptado de K. Chen et al1

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Capítulo 30 - Obstrução maligna das vias aéreas

indentificada. Recentes dados na literatura moral progressivo). Pode se apresentar com


indicam ainda que a instituição precoce de uma ampla gama de sintomas ou até mesmo
medidas paliativas associadas à terapia sis- assintomático, desde dispneia moderada até
têmica com propósito curativo, acarreta em insuficiência respiratória aguda.
aumento importante da qualidade de vida e A hipótese de obstrução maligna de vias
diminuição de sintomas depressivos6. aéreas deve ser levantada em qualquer pa-
Entre as opções terapêuticas paliativas ciente com diagnóstico de neoplasia apre-
atuais, contamos com terapia sistêmica qui- sentando queixa de dispneia, associada ou
mioterápica, radioterapia desobstrutiva, te- não a infecções de repetição, hemoptise e
rapias endobrônquicas e abordagens cirúr- incapacidade de manter decúbito dorsal. A
gicas paliativas, com o objetivo de manter dispneia progressiva pode, inclusive, ser a
potência de vias aéreas e melhorar qualida- primeira manifestação de um câncer não
de de vida7. diagnosticado.1 Vale ressaltar que a dispneia
Neste capítulo, serão revisados aspec- por obstrução menor que 75% do diâmetro
tos da fisiopatologia e apresentação clínica, das vias aéreas12 é comumente diagnosticada
com foco no manejo paliativo dos sintomas erroneamente como asma, atrasando assim o
decorrentes da obstrução maligna das vias diagnóstico e possível tratamento adequado
aéreas, assim como a abordagem de urgência (vide figura 30.2).
dos sintomas. A manifestação clínica da obstrução de
vias aéreas depende tanto da localização
ETIOLOGIA quanto da severidade da obstrução, podendo
A causa mais frequente de obstrução ma- resultar tanto da compressão extrínseca da
ligna de vias aéreas é a compressão relacio- traquéia ou da árvore brônquica, quanto da
nada ao câncer de pulmão3. A compressão infiltração intraluminal da árvore brônquica
de vias áreas pode ser causada por obstrução pelo tumor. Devemos levar em conta, ain-
extrínseca ou intrínseca, por tumor primá- da, o impacto que as comorbidades (doença
rio ou focos secundários, por linfonodome- pulmonar obstrutiva crônica, insuficiência
galias8, assim como por obstruções infeccio- cardíaca congestiva, etc), assim como a per-
sas relacionadas à imunossupressão, causada formance status do paciente, terão na mani-
tanto pela neoplasia quanto pelo tratamento festação dos sintomas.
sistêmico. Sendo assim, devem ser conside- Os principais sintomas encontrados na obs-
rados ainda a obstrução por bolas fúngicas, trução das vias aéreas são a dispneia, tosse seca,
micetomas ou obstrução por infecção das sibilância, estridor e, frequentemente, pneumo-
vias aéreas relacionadas à imunossupressão nia de repetição13. De forma didática, podemos
ou pneumonias pós-obstrutivas de repetição. englobar os achados clínicos em "Síndrome
Há ainda relatos de obstrução de vias áreas
por Sarcoma de Kaposi, uma complicação
comum da Síndrome da Imunodeficiência Figura 30.1 - Fisiopatologia das obstruções
de vias aéreas de etiologia maligna
Adquirida9,10. Adiante nesse capítulo, abor-
daremos as opções terapêuticas para as prin-
cipais causas de obstrução de vias áereas de
etiologia maligna.

MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS
E DIAGNÓSTICO
A obstrução de vias aéreas pode ser in-
trínseca, extrínseca ou mista (conforme figu-
ra 30.1), fixa ou dinâmica (quando relaciona- (1) Intrínseca (2) Extrínseca (3) Mista

da a edema peritumoral ou crescimento tu- Reproduzido de Folch, E., & Mehta, A. C 11

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Capítulo 30 - Obstrução maligna das vias aéreas

Figura 30.2 - RX de tórax de indivíduo com tumor de


pulmão eo obstrução de via aérea 1. paciente sem dispneia, em tratamento
curativo, com evolução presumida para
obstrução;
2. paciente com dispneia, com diagnóstico de
malignidade definida, já em tratamento;
3. paciente sem diagnóstico de maligni-
dade na instalação da dispneia, com
achado de doença malígna avançada
durante a investigação. É importante
ainda dividir a obstrução em intrínse-
ca, extrínseca ou mista (algoritmo su-
gerido acima).
O tratamento definitivo envolve a remo-
ção mecânica da obstrução em associação
Paciente, 59 anos, DPOC tabágico, diagnosticada
com laser, coagulação com laser de argônio ou
há quatro meses com carcinoma espinocelular com eletrocauterização, colocação de stent ou abla-
obstrução de 80% da luz bronquica evidenciado
em broncoscopia diagnóstica prévia, admitida em
ção com radiação ou terapia fotodinâmica15.
Hospital Terciário após radioterapia desobstrutiva Quando realizado precocemente, a abor-
com queixa de dispneia progressiva e dor torácica
atribuídos a descompensação de DPOC. RX de
dagem da obstrução central apresenta resul-
tórax (acima) evidenciou nódulo filar à direita, com tados imediatos, iminentemente na quali-
atelectasia restritiva de pulmão direito, associado a
linfonodomegalia subcarinal
dade de vida do paciente, com baixa taxa de
complicações relacionadas ao procedimento
Traqueal" - que consiste em tosse, dispneia e es- relatadas na literatura (abaixo de 5%).15, 16
tridor - e “Síndrome Mediastinal Superior", que Os objetivos do tratamento desta condi-
ocorre quando há compressão da árvore tra- ção são, em ordem de prioridade:
queobronquial, coração e vasos da base, resul- • obter uma via aérea permeável;
tando em tosse, estridor, dispneia e ortopnéia. • preservar a função glótica para prote-
A presença de estridor ocorre quando o diâ- ger a via contra aspiração e;
metro das vias aéreas (traquéia ou laringe) é de • manter uma qualidade da voz aceitável.17
5mm ou menor, resultando em característico
som agudo durante a respiração. Outro achado Tratamento paliativo não-invasivo
possível é a Síndrome da Veia Cava Superior, Corticoesteróides
associada à obstrução de vias aéreas14. Essa sín- O uso de corticoides é importante no
drome é abordada de forma mais completa em cenário de neoplasias responsivas a estas
capítulo específico desse livro. drogas, como os linfomas não Hodgkin e ti-
A pneumonia pós-obstrutiva é diagnosti- momas, sendo sugerido dexametasona 4mg,
cada em aproximadamente 30% dos pacien- endovenoso, a cada 6 horas.18 Para as demais
tes com obstrução malígna de vias aéreas13. neoplasias, como o câncer de pulmão, em
Nesses pacientes o exame físico comumente que o corticóide não tem atividade antitumo-
evidencia frêmito ou crepitantes como resul- ral, não há indicação específica.19 Nos casos
tado da atelectasia distal à obstrução parcial de edema de vias aéreas na região do tumor
seguida de pobre reexpansão pulmonar. os corticoides (dexametasona 16mg IV) po-
dem ser utilizados para reduzir o inchaço,
TRATAMENTO PALIATIVO porém essa recomendação é baseada apenas
Na escolha do tratamento paliativo em em experiências de relatos de casos.20
pacientes com obstrução maligna de vias
aéreas é importante, para fins didáticos, di- Nebulização de adrenalina
ferenciar o momento do diagnóstico ou sus- Segundo Remington e Meakin21, o estí-
peita de obstrução maligna em: mulo de receptores alfa-adrenérgicos causa-

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Capítulo 30 - Obstrução maligna das vias aéreas

ria vasoconstrição, resultando em redução Nd:YAG, a eletrocauterização, crioterapia


do edema da laringe peritumoral. Apesar de broncoscópica, colocação de Stent de vias aé-
haver relatos de caso22 de resposta terapêuti- reas e remoção mecânica para o reestabeleci-
ca adequada à nebulização com adrenalina mento das vias aéreas.26,27
1:1000 em estridores resistentes a cortico- Entre as outras técnicas endoscópicas, es-
terapia, causados por obstrução malígna de tão a ressecção endoscópica com pinça, dila-
vias aéreas, não há estudos randomizados tação, eletroauterização, laser, braquiterapia
que comprovem a eficácia da nebulização de endobrônquica e terapia fotodinâmica. O
adrenalina em estridores secundários a obs- emprego de broncoscopia flexível pode ofe-
trução malígna. recer importantes dados sobre a obstrução,
porém como a manipulação das vias aéreas
Heliox deve ser evitada ao máximo em pacientes
O problema relacionado à oxigenação com dispneia de etiologia obstrutiva, esse
do paciente com diminuição do lúmen das procedimento deve ser reservado para obje-
vias aéreas costuma ser causado pelo flu- tivo terapêutico, quando possível.1
xo turbulento resultado da obstrução das Broncoscopia é essencial na avaliação do
vias aéreas. O fluxo turbulento é menos paciente com obstrução de via aérea central
eficiente que o laminar e pode manifestar- e que pode ser candidato a colocação de uma
se como aumento no esforço ventilatório23. endoprótese. Existem diversas modalida-
Como a densidade do Hélio é 1/3 do oxigê- des paliativas para as lesões irressecáveis de
nio, esse gás resulta na redução no número vias aéreas. O Tumor ou tecido de granula-
de Reynold e aumenta a tendência ao fluxo ção pode ser desobstruído através de res-
laminar, possuindo menor resistência do secção mecânica com o uso do bisel da ex-
fluxo. O Heliox é uma mistura de 70/80% tremidade do broncoscópio rígido ou com
de Hélio e 20/30% de oxigênio. a pinça de biopsia. Este procedimento pode
Curtis et al24 reportaram caso de paciente ser ampliado através de vaporização a laser.
que foi poupado de ventilação mecânica in- Estenoses benignas ou malignas podem ser
vasiva usando Heliox por 48 horas, enquanto dilatadas através de olivas de dilatação ou
a quimioterapia e radioterapia reduziam o tubos de broncoscópio rígido sequenciais de
tamanho do tumor e obstrução. diâmetros classificados por tamanho cada
vez maior, ou balão hidrostático de dilatação.
Morfina via oral Todavia, os pacientes portadores de com-
Apesar de ter grande benefício na disp- pressão extrínseca ou malácia não tem outra
neia e diminuição do desconforto respira- estratégia endoscópica a não ser a endopróte-
tório do paciente oncológico, a morfina não se de via aérea. A endoprótese também pro-
possui ação na fisiopatologia da dispneia por porciona complemento à ressecção de uma
obstrução de vias aéreas.25 lesão endoluminal, se a terapia inicial falha
ou apresenta falência precoce.28 As técnicas
Tratamento paliativo invasivo/ endoscópicas para o tratamento paliativo de
terapia endobrônquica vias aéreas não são mutuamente excludentes.
Broncoscopia terapêutica Cada uma dessas modalidades, incluindo a
A broncoscopia é o exame padrão ouro correção cirúrgica definitiva, deve estar dis-
para diagnóstico de obstrução malígna das ponível e deve ser considerada pelo médico
vias aéreas.26 Além de ter grande utilidade que avalia o paciente com sintomas de obs-
na investigação, tem inúmeros benefícios na trução de vias aéreas centrais. Geralmente, a
abordagem terapêutica, com diferentes mo- endoprótese é aplicada somente quando fa-
dalidades que serão abordadas a seguir. lharam as outras estratégias.
Entre as abordagens broncoscópicas pa- Amjadi et al29, em estudo prospectivo
liativas disponíveis, constam o uso de laser realizado somente com pacientes com obs-

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Capítulo 30 - Obstrução maligna das vias aéreas

trução maligna de vias aéreas sem associação ca não recoberta pode ser colocada sobre o
de outras técnicas terapêuticas que pudessem orifício brônquico sem prejudicar a venti-
impactar nos escores de qualidade de vida, lação. Os modelos recobertos são úteis para
usando instrumento validado de medição o tratamento paliativo de fistulas malig-
de qualidade de vida, evidenciaram estabili- nas entre o trato respiratório e o esôfago.
zação dos escores de qualidade de vida após Esta fístula requer a inserção concomitante
broncoscopia intervencionista com objetivo de endopróteses no esôfago e na via aérea.
paliativo de patência de vias aéreas em pa- O modelo recoberto com uma película de
cientes com câncer. Vale ressaltar que, le- plástico evita o crescimento de granulo-
vando em conta a causa de obstrução ma- mas e tumor maligno entre as malhas33, já
ligna ser progressiva, a estabilização dos que o trauma da mucosa brônquica cau-
escores de qualidade de vida é um resulta- sado pela passagem da endoprótese pode
do importante. ocasionar formação de tecido de granula-
ção e posterior reestenose. 34, 35
Endopróteses ou stents A única contraindicação absoluta para o
Endoprótese de vias aérea de silicone ou uso de stents no manejo da obstrução de vias
metálica autoexpansível proporciona uma aéreas é quando a obstrução é causada pela
paliação segura e durável, em 80% a 95% dos compressão extrínseca por um aneurisma,
pacientes adequadamente selecionados.17, 30 posto que a colocação do stent acarretaria em
As principais vantagens da endoprótese de risco de erosão da parede do vaso e, portanto,
silicone são: o reposicionamento e a remoção hemorragia catastrófica.11, 36
simples, com as desvantagens da difícil apli- No que tange os pacientes com obstrução
cação e da migração ou obstrução da endo- malígna de vias aéreas, o maior benefício das
prótese de silicone.31 Endopróteses metálicas endopróteses metálicas autoexpansíveis é o
autoexpansíveis apresentam as vantagens fato delas necessitarem de broncoscopia fle-
da fácil aplicação, ajuste aos contornos das xível, exigindo apenas anestesia local. Com
vias aéreas, relação diâmetro interno e exter- isso é possível realizar o procedimento man-
no baixa, e estabilidade da endoprótese. Em tendo o paciente vigil. As endopróteses de
compensação, apresenta como desvantagens: silicone, por sua vez, exigem colocação com
o crescimento do tumor ou granulomas en- broncoscopia rígida e anestesia geral. A de-
tre as malhas não recobertas nas extremida- cisão entre próteses de silicone ou metálica
des da endoprótese metálica ou no espaço leva em conta o estado pré-operatório do pa-
entre duas endopróteses; e a dificuldade ou
impossibilidade de reposicionar a endopróte- Tabela 30.1 - Indicações para colocação de próteses
(stents) em vias aéreas por obstrução maligna
se metálica ou de remover, uma vez liberado
completamente dentro da via aérea. Indicação para colocação de endopróteses (stents)
em vias aéreas
Não há consenso na literatura a respeito
Obstrução das vias aéreas por compressão
do tipo de prótese a ser usada em estenoses 1
brônquica extrínseca ou crescimento submucoso
malígnas, entretanto a melhora na qualidade Obstrução por tumor endobrônquico quando
de vida com redução dos sintomas ao insti- 2 a potência do lúmen é < 50% após terapia
endobrônquica*
tuir essa medida paliativa para pacientes em
Crescimento tumoral endobrônquico
estágio terminal já foi comprovada.32 3 agressivo apesar de repetitivos tratamentos
As próteses metálicas são de primei- endobrônquicos*
ra escolha nas estenoses malígnas de vias 4
Perda do suporte cartilaginoso por invasão
aéreas, estando as próteses de silicone re- tumoral
Inserção sequencial de stents esofágicos e/ou de
servadas a casos isolados. São disponíveis 5
vias aéreas para fístulas traqueoesofágicas
na versão recoberta e não recoberta (cada * Terapia endobronquica: Yag Laser, Braquiterapia, tunelização com
tipo de endoprótese e suas especificidades Argonio ou alça diatérmica

descritas a seguir). A endoprótese metáli- Adaptado de tabela de P. Lee and A.C. Metha5.

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Capítulo 30 - Obstrução maligna das vias aéreas

ciente e sua capacidade de suportar a aneste- Endoprótese de gianturco


sia. Outro caso em que as próteses metálicas Prótese formada por um espiral contínuo
são preferíveis é quando há compressão ex- de monofilamento de aço inoxidável disposto
trínseca e esta é tal que causaria deformação em forma de “zigue-zague” de 5 a 10 cama-
da prótese de silicone.37, 38 das, formando um cilindro 42. Ela possui,
Por fim, quando há colapso pulmonar ainda, ganchos em sua porção distal e pro-
por tempo maior que duas semanas, a passa- ximal, com o objetivo de ancorar a prótese
gem de stent demonstra pouco benefício na na parede da traquéia e impedir a migração.
reexpansão do parênquima39, podendo até
mesmo acarretar em risco aumentado de in- Endoprótese auto-expansível
fecção no pulmão colabado, por acúmulo de Endoprótese de malha de poliéster
secreção após o procedimento. revestida (polyflex)
Endoprótese de malha de poliéster reves-
Endoprótese de silicone rígido tida de silicone.43
Endoprótese de montgomerry
A Endoprótese de Montgomery é com- Próteses dinâmicas
posta por dois tubos ocos que se intersec- Prótese dinâmica de rusch
cionam em forma de “T”. A coluna vertical Prótese em tubo de silicone em forma de
permanece na traquéia e deve atravessar toda “Y”, com tubo central simulando a traquéia,
extensão da estenose, enquanto o braço late- seguida de uma bifurcação com um prolon-
ral se projetará pelo óstio de uma traqueos- gamento direito curto e esquerdo longo simu-
tomia. Algumas endopróteses modificadas lando a anatomia da árvore brônquica. A parte
possuem braço lateral com ranhuras e anel superior, que é posicionada na traqueia, conta
de silicone que é usado para impedir a mi- com implantes metálicos semelhantes a anéis
gração da endoprótese ao ser preso justo à incompletos da traquéia e a membrana poste-
pele. Essa endoprótese possui ainda uma rior dessa prótese pode sofrer invaginação du-
cobertura na ponta voltada para a traqueos- rante a tosse para facilitar o fluxo do muco.44, 45
tomia com o objetivo de impedir o fluxo de
ar e, assim, permitir fonação. Assim como as Yag laser
demais próteses, ela deve ser disposta ultra- Atualmente, o Neodímio-Yttrium Alu-
passando totalmente a extensão da lesão e/ mínio Garnet (YAG-ND) é o laser mais co-
ou constrição (pelo menos 10mm40), com o mumente usado para abordagem endobrôn-
objetivo de impedir reestenoses secundárias quica.46 Grande benefício do YAG laser é a
a formação de tecido de granulação. A ponta capacidade de vaporizar o tecido e sua exce-
proximal não deve ficar sobre a laringe sub- lente coagulação concomitante, além dos be-
glótica, para evitar a formação de uma anel nefícios imediatos quando comparados com
de que pode levar à formação de granuloma. radioterapia e braquiterapia.
A ponta final deve manter uma distância mí-
nima da carina, evitando assim a irritação Eletrocauterização
da mesma, o que pode levar à formação de Em relação às demais formas de citorre-
granulomas. dução mecânica, a eletrocauterização é bara-
ta e de fácil uso no dia a dia, associado a bai-
Endoprotese de dumont (stent em y) xo risco de perfuração das vias aéreas devido
Uma adaptação da prótese em “T” de à baixa penetração da energia térmica criada
Montgomery, a Endoprótese de Dumont pela diferença de voltagem entre o bisturí e o
possui protuberâncias na porção externa do tecido a ser cauterizado.47 A eletrocauteriza-
stent, com o objetivo de inibir a migração da ção é bastante adequada para reconquistar pa-
prótese.41 Há uma variação da prótese sem a tência de vias aéreas em combinação com citor-
porção destinada à traqueostomia. redução mecânica e colocação de endoprótese.

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Capítulo 30 - Obstrução maligna das vias aéreas

Terapia fotodinâmica com


o tumor. É a melhor opção terapêutica no
plasma de argônio
caso de dispneia recorrente após radiotera-
Outra possibilidade terapêutica paliativa pia prévia. 52
em obstruções malignas das vias aéreas con- Apesar da braquiterapia apresentar re-
siste na coagulação por plasma de argônio, sultados semelhantes à outras formas de
demonstrando benefícios em até 67%, com citoredução mecânica (tunelização e bisela-
taxa de complicações de 3,5%.48 mento com broncoscopia rígida, terapia fo-
todinâmica, crioterapia broncoscópica, etc),
Crioterapia broncoscópica seus efeitos são mais duradouros, posto atuar
Opção terapêutica indicada em pacientes na proliferação celular e diminuição do tu-
com obstrução maligna que não toleram res- mor com efeito citotóxico radioativo local.53
secção cirúrgica e apresentem piora da fun- Apesar dos benefícios, a taxa de complicação
ção respiratória. Como as outras técnicas, grave, como hemoptise fatal, em braquitera-
não está indicada para obstrução extrínseca. pia em altas doses é alta, chegando a 50% de
As contraindicações são as mesmas da bron- acordo com as séries de casos estudados.54
coscopia com anestesia/ sedação. Realizado
por broncoscopia rígida ou flexível, o proce- Quimioterapia
dimento destrói o tecido tumoral por séries As indicações para quimioterapia paliati-
repetidas de congelamento/ descongelamen- va são especificas de acordo com o tipo his-
to da lesão. Alivia a obstrução maligna de via tológico. Sobre essa modalidade terapêutica, é
aérea intraluminal em até 90% dos casos.49 É importante lembrar que a quimioterapia pode
segura e bem tolerada ser uma causa de dispneia devido a sua toxici-
dade ao parênquima pulmonar.56 No caso do
Radioterapia externa surgimento desse efeito colateral, a quimiote-
A radioterapia externa é capaz de dimi- rapia paliativa deve ser descontinuada.
nuir sintomas de obstrução maligna central
em qualquer topografia. Para pacientes com ABORDAGEM EMERGENCIAL DA
neoplasia pulmonar avançada ou metastática, OBSTRUÇÃO MALÍGNA DE VIAS AÉREAS
a radioterapia externa é bem tolerada e pode re-
sultar em diminuição da dispneia em até 60% Intubação com fibra-óptica,
dos casos.50 É importante notar que a dose de sem sedação
radiação usada para fins paliativos é menor, po- Quando o paciente é admitido com disp-
rém dividida em maio número de sessões. neia importante em rápida progressão, há in-
viabilidade na colocação de endoprótese e a
Braquiterapia progressão para obstrução completa das vias
A principal indicação de braquiterapia aéreas é dada como certa, a melhor opção é a
— uma forma de radioterapia em que altas realização de intubação acordado, com o uso
doses de radiação são guiadas para o tumor de fibra óptica e fino tubo endotraqueal (5.0
com menor volume e dose para o tecido que ou 6.0F).57, 59 Com isso é possível assegurar a
circunda o tumor, diminuindo assim lesões via aérea. É importante sempre lembrar que a
ao tecido adjavente — é a desobstrução brôn- tentativa repetida de garantia das vias aéreas
quica devido a lesão maligna endobrônquica com laringoscopia direta seguida de intu-
onde o componente intrínseco predomina bação orotraqueal pode acarretar em fecha-
sobre o componente extrínseco. Ou seja, a mento completo das vias aéreas por edema
lesão é predominantemente mucosa/submu- ou até mesmo hemorragia da área de cons-
cosa.51 A braquiterapia é uma modalidade te- trição. Caracteriza-se via aérea difícil a de
rapêutica mais localizada, acometendo mais um paciente com insuficiência respiratória
especificamente o tumor sem comprometer por obstrução malígna das vias aéreas, justi-
grande área de tecido saudável circundando ficando assim a solicitação da presença de um

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Capítulo 30 - Obstrução maligna das vias aéreas

anestesiologista59 ou profissional com maior associadas à obstrução, que contribuem para


experiência para a garantia de obtenção de via a dispneia, como: pneumonia, uma comum
áerea definitiva na sala de emergência. complicação em pacientes terminais com
câncer de pulmão devido à diminuição da
Cricotireoidotomia capacidade de depuração da secreção das
Opção terapêutica preferível em casos de vias aéreas baixas; edema agudo pulmonar;
paciente com insuficiência respiratória agu- exacerbação de pneumopatias prévias, assim
da por obstrução malígna após insucesso na como em pacientes evoluindo com fadiga
intubação orotraqueal58,59, já que há aumento muscular devido à caquetização. No caso dos
na taxa de mortalidade com a tentativa repe- pacientes com dispneia por obstrução malig-
tida de intubação nessa população, tanto por na de vias aéreas, as indicações do uso do VNI
obstrução completa quanto por lesão do tu- nas descompensações agudas de comorbida-
mor seguida de sangramento.58 É fundamen- des são as mesmas que nas demais populações.
tal que seja realizado por profissional treina-
do e com experiência no procedimento. CONCLUSÃO
O objetivo do tratamento paliativo em
Circulação extracorporea / ecmo pacientes com obstrução maligna de vias
Paciente com obstrução de via aérea com aéreas é, portanto, manter o paciente com
potencial para obstrução completa, sem res- permeabilidade de vias aéreas, preconizando
posta aos demais métodos mecânicos pode ser ventilação espontânea e evitando, até quando
incluído em bypass femoro-femural (circula- for possível, fatores que possam interferir nos
ção extracorporea) seguido da medida defini- mecanismos fisiológicos de ventilação (i.g.:
tiva para o câncer.59 Chao et al60 relataram anestesia geral, uso de sedação com depres-
caso bem-sucedido de mulher de 21 anos com sores do bulbo respiratório, etc). O uso de
tumor mediastinal massivo que foi mantida medidas paliativas para a patência ou resta-
por três dias em circulação extracorpórea até belecimento das vias aéreas apresenta benefí-
que a concomitante quimioterapia realizada cio inegável e imenso ganho ao paciente em
permitisse a diminuição do tumor. relação à qualidade de vida. Estudos recen-
tes6 demonstram ainda que a adoção precoce
Ventilação mecânica de medidas paliativas, associadas à terapia
não invasiva (VMNI) sistêmica com propósito curativo, acarreta
Apesar de já ser considerado primeira em melhora da qualidade de vida e, possivel-
opção no manejo ventilatório de pacientes mente, em aumento da sobrevida.64 Vale lem-
com doença pulmonar obstrutiva crônica brar que como não há consenso na literatura
(DPOC)61 e edema agudo pulmonar por In- para uniformização de conduta e compara-
suficiência Cardíaca Congestiva (ICC) que ção com estudos clínicos randomizados en-
evoluem com insuficiência respiratória agu- tre as diferentes opções terapêuticas. A deci-
da ou até mesmo em pacientes em Cuidados são do tratamento a ser adotado deve ser feita
Paliativos onde a intubação orotraqueal ou pelo médico assistente, levando em conta as
ventilação mecânica invasiva (VMI) não é idiossincrasias do paciente e a experiência do
uma opção62, a VNI possui pouco benefício profissional (cirurgião, broncoscopista, anes-
terapêutico para pacientes com insuficiência tesiologista,radioterapeuta, etc) para conduta
respiratória aguda causada por obstrução mais adequada ao paciente.
maligna de vias aéreas, posto a causa da obs-
trução ser mecânica e a pressão positiva ao REFERÊNCIAS
final da expiração (PEEP) não ser capaz de 1. CHEN, M. D., M. D. VARON, AND M. D.
sobrepor esse efeito de massa. Entretanto, é WENKER. Malignant airway obstruction:
consenso na literatura que a VNI está indi- recognition and management. The Journal
cada e apresenta bons resultados para causas of emergency medicine 16.1. 1998. 83-92.

272

Miolo.indd 272 17/04/2014 14:11:35


Capítulo 30 - Obstrução maligna das vias aéreas

Tabela 30.2 - Recomendações para a abordagem lar Carcinoma. Anticancer research 33.4.
de pacientes com insuficiência respiratória aguda
por obstrução malígna de vias aéreas
2013. 1761-1764.
9. HADIQUE, SARAH, M. B. B. S. Prasoon
Recomendações para Obstrução de vias aéreas
na Sala de Emergência
Jain, and Atul C. Mehta. Therapeutic Bron-
Evitar a manipulação de vias aéreas, uso de choscopy for Central Airway Obstruction.
1 relaxantes musculares, drogas supressoras do Interventional Bronchoscopy. Humana
bulbo encefálico e anestesia geral
Press. 2013. 143-176.
Realizar manobras incluindo o reposicionamento
do paciente para decúbito lateral, posição
10. GREENBERG, JEFFREY E., M. A. FIS-
prona ou sentada; avaliar aplicação de pressão CHL, AND J. R. BERGER. Upper air-
expiatória final positiva (PEEP) por máscara facial way obstruction secondary to acquired
2 se houver indicação ou comorbidades que possam
contribuir para a insuficiência respiratória aguda; immunodeficiency syndrome-related
avaliar a administração de corticosteroides se Kaposi's sarcoma. CHEST Journal 88.4.
sibilância associada ou suposição de edema de
vias aéreas associado à obstrução 1985:638-640.
3 Intubação com fibra óptica, sem sedação 11. FOLCH, ERIK, AND ATUL C. MEHTA.
Broncoscopia rígida para colocação de stent Airway interventions in the tracheobron-
4 endobrônquico deve ser acessível se a patência chial tree. Seminars in respiratory and
imediata das vias aéreas não for obtida
critical care medicine. vol.29, n.4. Thieme
ECMO como medida temporária para
5
manutenção da vida Medical Publishers, 2008.
Diagnóstico etiológico deve ser obtido com 12. CHEN TF, BRAIDLEY PC, SHNEERSON
6 urgência após estabilização das vias aéreas, a fim JM, WELLS FC. Obstructing tracheal li-
de instituir tratamento definitivo com rapidez
poma: management of a rare tumor. Ann
Adaptado de Phua et al1, 59, 63.
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273

Miolo.indd 273 17/04/2014 14:11:35


Capítulo 30 - Obstrução maligna das vias aéreas

31. CAVALIERE S, VENUTA F, FOCCOLI


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Capítulo 30 - Obstrução maligna das vias aéreas

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Parte 4
Controle dos sintomas refratários

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Sedação paliativa 31
CAPÍTULO

Amanda Aranha
Clineu de Mello Almada Filho

INTRODUÇÃO bastante conhecida entre os profissionais que


Pacientes em fases avançadas de doenças, trabalham com Cuidados Paliativos. Porém,
oncológicas ou não, podem apresentar sinto- infelizmente, ainda pode ser fator de confu-
mas de difícil controle, sejam eles físicos ou são entre leigos e profissionais de saúde de
psicoexistenciais, gerando extremo sofrimen- outras áreas.5,7
to para paciente e família. Na grande maioria Essa modalidade terapêutica pode ser
dos casos, tal sintomatologia pode ser contro- bastante eficaz, chegando a atingir taxas de
lada com sucesso. Porém, em alguns pacientes sucesso de mais de 90% de controle para al-
o controle completo não é atingido, ou seja, guns sintomas. Sua prevalência é bastante
tornam-se refratários. Para esses casos a seda- variada, pela falta de padronização e diferen-
ção paliativa é uma opção.1,2 ças socioculturais, podendo ser encontrada
A sedação paliativa é um tema relativa- de 3,1% a 52% nos diferentes serviços.5,8
mente novo, os primeiros dados de literatura
datam de 1990 e, desde então, poucos estu- CONCEITOS
dos foram realizados. Os estudos existentes Sedação paliativa é a administração de-
não apresentam padronizações (drogas, do- liberada de medicamentos sedativos com
ses, definições, populações, guidelines), difi- o objetivo de aliviar sintomas intoleráveis e
cultando a interpretação dos dados obtidos. refratários reduzindo o nível de consciência
Muito dessa dificuldade em desenhar estu- do paciente com doença avançada terminal,
dos representativos e controlados esbarram após decisão conjunta com paciente ou, na
em questões éticas e legais.3-5 impossibilidade, com seu responsável.1,3,7,9
Inicialmente denominada sedação termi- Sintoma refratário é considerado aquele
nal, rapidamente essa terminologia foi aban- que não pode ser adequadamente controla-
donada devido à margem de interpretações do, independente das inúmeras e repetidas
errôneas que causava, levando a impressão tentativas de encontrar um tratamento tole-
de que a sedação poderia ser utilizada para rável; quando todas as outras modalidades
“terminar a vida”.6 terapêuticas (farmacológicas e não farma-
Porém, diferentemente da eutanásia, a cológicas) falharam em aliviar o sintoma
sedação paliativa não tem como objetivo mesmo na presença de equipe especializa-
abreviar a vida e atualmente essa distinção é da na área. 3,10

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Capítulo 31 - Sedação paliativa

Difere-se do sintoma difícil de tratar, pois mento. Dados de literatura apontam que em
independente do esforço da equipe de Cuida- cerca de 80% dos pacientes esses sintomas
dos Paliativos, a sintomatologia não pode ser apresentam piora crescente e progressiva nes-
adequadamente controlada sem comprome- sa fase. E que apenas 30% dos sintomas que
ter o nível de consciência do paciente.2 necessitam sedação são sintomas novos.11,14
Os sintomas refratários mais prevalen-
CLASSIFICAÇÃO DA SEDAÇÃO tes são dor (52% - 96%), delirium agitado
Não obrigatoriamente a sedação palia- (24% - 95%) e dispneia (39% - 40%), além
tiva é profunda e contínua. Ela deve ser in- de sofrimentos existenciais. Outros sin-
dividualizada e titulada até que se alcance o tomas também encontrados são náuseas e
alívio do sintoma, ressaltando que o objetivo vômitos, fadiga, convulsão e inquietude,
final é sedar o sintoma e não necessariamen- porém qualquer sofrimento que se torne
te o paciente.11 refratário teria indicação de ser tratado.
Uma das maiores dificuldades de com- Em cerca de metade dos pacientes, mais de
paração entre os estudos no tema é exata- um sintoma pode ser encontrado e, segun-
mente o tipo de sedação paliativa aplicada. do alguns autores, até 25% dos pacientes
Alguns estudos não especificam as modali- podem apresentar pelo menos quatro sin-
dades incluídas, outros excluem um ou ou- tomas refratários concomitantes.7,11
tro tipo, não permitindo uma comparação Além de sintomas crônicos, alguns sinto-
direta entre eles.3 mas de início mais abrupto podem ser indica-
A sedação paliativa pode ser didatica- ção de sedação paliativa, como hemorragias
mente classificada entre: maciças, convulsões, mioclonias e dispneia
• Superficial: quando o paciente ainda súbita. Nesses casos, o consentimento do res-
pode manter um nível de consciência ponsável pode se tornar mais difícil, uma vez
que o permita se comunicar de alguma que uma decisão rápida necessita ser tomada,
forma. Também chamada sedação pro- porém, este sempre deve ser tentado.15
porcional. O sofrimento psicoexistencial também é
• Profunda: quando a inconsciência é uma constante nessa fase de doença e todo o
atingida parcial ou inteiramente. Ou- suporte deve ser oferecido, com auxílio psi-
tras denominações encontradas seriam cológico e espiritual, embora muitos dos ca-
sedação total ou sedação pesada. sos permaneçam como sintomas refratários.
• Intermitente: permite períodos em que Até 27% dos casos de sedação paliativa são
o paciente permanece alerta. iniciados por sofrimento pscioexistencial ex-
• Contínua: a sedação e inconsciência clusivamente, como ansiedade, angústia, fal-
são mantidas de forma permanente até ta de sentido ou sentir-se um fardo, medo de
o falecimento do paciente. se tornar dependente e isolamento. Situações
• Primária: o objetivo inicial e principal em que o único sintoma necessitando seda-
da administração do medicamento é a ção é o emocional, são difíceis de conduzir
diminuição do nível de consciência. e não há consenso na literatura. Alguns au-
• Secundária: a sedação é efeito farmaco- tores evitam a sedação nesses casos, mas em
lógico de medicações usadas para con- contrapartida, muitos acreditam se tratar de
trole de um sintoma específico, como uma indicação precisa. Os casos de sedação
uso de opioides para dor ou antipsicó- exclusivamente por sintomas não físicos vêm
ticos para delirium.2,11-13 aumentando nos últimos anos.3,5,11,14
Delirium é um problema comum e, quan-
INDICAÇÕES do na forma agitada, pode conferir um pior
Pacientes em fase final de vida podem prognóstico quanto ao controle efetivo da
experimentar uma gama de sintomas, físicos sintomatologia e ao aparecimento de compli-
e emocionais, que trazem demasiado sofri- cações oriundas da sedação. O delirium exa-

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Capítulo 31 - Sedação paliativa

cerba a dor e traz sofrimento para o paciente por si e o paciente perceberá a gravidade do
e a família. Portanto, deve ser prontamente caso quando vir toda a equipe reunida, jun-
tratado.7,16 tamente com a família, a seriedade com que
Morte iminente com intenso sofrimen- serão passadas as informações, a expressão
to também indica sedação paliativa, a fim de todos os presentes, além da percepção de
de prover uma morte digna e tranquila. Tal que o tratamento não é mais suficiente para
situação não é o habitual, uma vez que a abrandar seu sofrimento. Todavia, é im-
maioria das mortes não necessita sedação. portante deixar o paciente confortável para
Todos os casos devem ser cuidadosamente questionar aquilo o que gostaria de saber, des-
analisados e individualizados e, naqueles em sa maneira todas as dúvida podem ser esclare-
que houver sofrimento intenso, dificuldade cidas pela equipe de Cuidados Paliativos.5,7,11
respiratória ou agitação, indica-se a sedação.5 Em circunstâncias em que o paciente ain-
Todos os pacientes avaliados para início da mantém-se consciente e lúcido, sua vonta-
de sedação paliativa devem obrigatoriamente de é a que deve prevalecer. Em caso de não
estar em fase final de doença. Todas as pos- apresentar mais autonomia, o mais indicado
síveis causas reversíveis devem ter sido aven- é procurar saber quais eram suas vontades e
tadas e adequadamente tratadas. A avaliação buscar o consentimento da família e respon-
de equipe especializada é mandatória, já sáveis. Tudo deve ser devidamente registrado
que alguns sintomas podem não estar sendo em prontuário.5,8,11
completamente controlados por médicos ge-
neralistas. A tentativa de se trocar o opioide MEDICAÇÕES
sempre é válida, uma vez que sua toxicidade Algumas classes de medicamentos po-
pode ser a causa do sintoma dito refratário. dem ser utilizadas com o objetivo de sedação.
Antes de iniciar a sedação paliativa, deve-se Os mais utilizados são os benzodiazepínicos
ter certeza de que todas as medidas cabíveis e, dentre eles, o midazolam. Barbitúricos,
foram tentadas, inclusive as não farmacoló- opioides, anticonvulsivantes e antipsicóticos
gicas e a sedação intermitente.1,5,7,11,16 também são utilizados.7,11
Apesar de não haver consenso quanto as
CONSIDERAÇÕES ÉTICAS doses, duração da sedação ou esquema me-
Não é objetivo da sedação paliativa abre- dicamentoso, algumas orientações devem
viar o tempo de vida, embora em uma mino- ser seguidas, como utilizar sedativos segu-
ria dos casos isso possa ocorrer. É o chamado ros, sempre iniciar com dose baixa e titular
duplo efeito, em que a intenção é tratar um de acordo com a intensidade dos sintomas,
sintoma não controlado, objetivando alívio a resposta individual e os antecedentes pes-
do sofrimento, mas pode haver redução da soais do paciente, além da experiência pro-
sobrevida do paciente como consequência fissional da equipe de Cuidados Paliativos.5,14
da terapêutica implantada. Nesse contexto, O midazolam é o mais utilizado para in-
a sedação paliativa difere da eutanásia, pois duzir sedação por apresentar diversas van-
os objetivos iniciais são completamente dis- tagens, entre elas, seu rápido início de ação,
tintos, já que a eutanásia visa provocar uma fácil titulação, meia vida curta e presença de
morte rápida como forma de alcançar a ces- antídoto (flumazenil). Permite ainda sua as-
sação do sofrimento.2,8,11 sociação a outras drogas e administração via
Sempre que houver indicação de sedação subcutânea. Segundo estudos, sua dose média
paliativa essa modalidade deve ser previa- varia de 18,5mg a 40mg/dia, porém, há relatos
mente discutida com o paciente e a família, de pacientes que chegaram a receber 450mg ao
pontuando-se os benefícios, possíveis riscos dia. Doses mais altas são geralmente necessá-
e opções. Nem sempre é necessário, ou ade- rias em pacientes mais jovens, que já faziam
quado, expor explicitamente toda a situação uso prévio de benzodiazepínicos, sem icterícia
ao paciente. A contextualização falará muito e que fazem uso prolongado da sedação.5,7,8,12

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Capítulo 31 - Sedação paliativa

Os opioides são outra classe bastante essa finalidade, 10 a 15% das sedações palia-
prescrita, mas não devem ser utilizados para tivas habituais falham em aliviar adequada-
sedação primária. Sua indicação é princi- mente os sintomas e, nessas ocasiões, o pro-
palmente em casos em que já era necessária pofol pode ter uma indicação mais precisa.14
sua administração para controles de outros
sintomas, como dispneia ou dor, e acaba-se EFICÁCIA E SEGURANÇA
utilizando como sedação secundária. Mes- A sedação paliativa é uma modalidade te-
mo nessas situações, cerca de 40% dos casos rapêutica relativamente segura e eficaz, com
necessitam alterar a medicação por controle descrição de taxas de até 90% de sucesso.12,17
insatisfatório dos sintomas, tendo o midazo- Os instrumentos de avaliação dos sinto-
lam como principal escolha. Caso seja indis- mas não são padronizados e em alguns ca-
pensável manter o opioide, deve-se reduzir a sos são escalas subjetivas, o que dificulta a
dose antes de associar o benzodiazepínico.5,11 comparação dos dados. Além do fato de as
Barbitúricos são sedativos potentes, populações analisadas serem, em geral, res-
porém com efeitos colaterais importantes, tritas a alguns serviços e instituições, não se
como instabilidade cardiovascular e respi- sabendo ao certo se é possível a generaliza-
ratória, além de rápida tolerância, inviabi- ção de tais dados.12
lizando seu uso mais disseminado em seda- Após iniciada a sedação, cerca de 80%
ção paliativa.5,8,11 dos pacientes chegam à sedação profunda
Os antipsicóticos, dentre eles o halope- em menos de 120 minutos e menos da meta-
ridol e clorpromazina, não são sedativos e, de volta a acordar, quando utilizado midazo-
portanto, não tem um bom efeito quando lam, fenobarbital ou associação de ambos.12
utilizados para esse fim, exceto em casos de O controle total da sintomatologia é al-
delirium agitado, quando podem ser conside- cançado de 60 minutos a 48 horas após o
rados uma boa opção. Devem ser utilizados início da sedação. Sendo esse intervalo uma
para controle de sintomas e, consequente- questão importante, já que o inicio da seda-
mente podem causar sedação secundária. ção gera uma expectativa na família e os ca-
Contudo, quando utilizados isoladamente sos em que o alivio rápido dos sintomas não
chegam a falhar em metade dos casos, quan- ocorre, acarretam um estresse emocional
do devem ser substituídos ou combinados a bastante grande.5,12,18
um benzodiazepínico.3,5,7,11 Também são descritos bons resultados
O fenobarbital também é citado por al- com sedação intermitente. Com a ressalva de
guns autores, mas não é mais eficaz do que que o acompanhamento deve ser ainda mais
o midazolam para induzir sedação. Também rigoroso, a fim de evitar a oscilação do con-
não se mostrando superior em mantê-la.12 trole dos sintomas. Apesar disso, muitas das
O propofol é um anestésico geral com sedações intermitentes acabam por ser con-
dados ainda bastante restritos em literatura vertidas para contínua em fase final de vida.2
paliativa. É um sedativo que apresenta meia As famílias também relatam resulta-
vida curta (30-60 minutos), metabolização dos satisfatórios, embora mantenham uma
hepática e não renal, rápida titulação até exaustão emocional, por vezes associada a
doses necessárias, além de veloz reversão ao sentimentos de culpa. Raramente julgam se
se interromper sua infusão. Seus principais tratar de um ato indigno ou ineficaz, mas ex-
efeitos adversos são depressão respiratória, pressam vontade de se despedir antes de ini-
hipotensão, efeito inotrópico negativo, além ciado o procedimento e de serem informados
de dor no local de administração. Seu uso pela equipe de que a sedação era a melhor,
torna-se restrito uma vez que necessita mo- muitas vezes a única opção.5
nitoração e presença de equipe devidamente A sedação pode apresentar alívio ineficaz
treinada e habilitada enquanto durar sua in- em 17% dos casos, sendo que a taxa de sin-
fusão. Apesar dos dados ainda limitados para tomas intoleráveis após quatro horas costu-

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Capítulo 31 - Sedação paliativa

ma ser ainda menor, com náusea tendendo a quência, com expectativa não ultrapassando
nulo, dispneia próximo de 10%, delirium gra- uma semana na imensa maioria dos casos.
ve 4% e dor em torno de 2%. Por isso, alguns Ventafridda demonstrou sobrevida de dois
autores salientam a necessidade de reavalia- dias, Morita et al de 3,9 dias, Stone et al 1,3
ção do diagnóstico nos casos de dor refratá- dias. Seis por cento dos pacientes falecem logo
ria a altas doses de opioides.12 após iniciada a sedação. Não se sabe ao certo
Os efeitos adversos mais comuns em de- se por progressão da doença ou pelo potencial
corrência da sedação são sonolência e dimi- de redução de sobrevida. Foi demonstrado
nuição da comunicação. Apenas 7% dos pa- ainda que a sobrevida é maior nos pacientes
cientes sedados por mais de quatro horas ain- que receberam pelo menos uma semana de se-
da mantêm a habilidade de se comunicar de dação do que naqueles que não a receberam ou
alguma maneira. Mas essa arresponsividade que receberam por até 48 horas.4,7,11
em relação aos não sedados só se torna signi-
ficativa nos últimos três dias de vida. Alguns SUPORTE NUTRICIONAL E HÍDRICO
dos sedativos mais utilizados podem causar Uma vez iniciada a sedação, alguns pa-
tolerância, necessitando aumento progressi- cientes ainda apresentam nível de consciên-
vo de doses, principalmente quando usados cia suficiente para manterem aporte nutri-
por períodos mais longos.12 cional e hídrico via oral. Contudo, a maioria
Efeitos colaterais mais graves apresen- perde essa capacidade e uma decisão deve
tam prevalência de 22%, como aspiração, ser tomada em relação a manter ou não uma
bradipnéia, agitação por efeito paradoxal, administração artificial. Embora não haja
instabilidade cardiovascular, depressão res- concordância universal e o tema seja contro-
piratória e parada cardiorrespiratória, sendo verso, a maioria tende a respeitar a vontade
a última descrita em cerca de 4% dos casos. prévia do paciente.8
Os efeitos adversos ditos graves são mais co- O suporte artificial pode ser considerado
muns em pacientes com delirium agitado e tratamento fútil, uma vez que interfere no
pior status.11,12 processo natural de morte, pode acarretar
sofrimento adicional e não altera a mortalida-
SOBREVIDA de.7,8
O objetivo da sedação paliativa não é alte- Uma tendência é manter a situação en-
rar tempo de sobrevida e é isso que demons- contrada anteriormente à sedação, ou seja,
tra a maioria dos estudos. Redução da expec- pacientes que já estavam em uso de meios
tativa de vida pode acontecer, porém em ca- artificiais, em geral, tem a terapêutica manti-
sos isolados, não em nível populacional. Esse da; em média, 20% a 69% optam por manter,
é um efeito presumido, mas não comprovado enquanto que 24% a 44% acabam reduzindo
da sedação, já que alguns estudos não de- o aporte artificial após a sedação.5,12,19
monstraram alteração de sobrevida estatisti- O suporte artificial é poupado em torno
camente significativa em pacientes sedados e de 35-64% das ocasiões, sendo que em alguns
não sedados.1,5,12 serviços a hidratação parenteral pode chegar
Noventa e um por cento dos médicos pa- a zero. A decisão de manter o paciente sem
liativistas que utilizaram essa modalidade aporte nutricional ou hídrico pode ser mais
terapêutica estimam ter reduzido a sobrevi- fácil nos casos em que a ingestão já se encon-
da dos pacientes em no máximo 24 horas e trava bastante reduzida antes da sedação.1
98% em menos de uma semana. A redução
do tempo de sobrevida secundário à sedação PARTICULARIDADES EM GERIATRIA
paliativa é o chamado duplo efeito, já expla- Como os Cuidados Paliativos foram ini-
nado anteriormente.5 cialmente direcionados aos pacientes porta-
Um período relativamente curto entre dores de câncer, a literatura para pacientes
inicio da sedação e morte é descrito com fre- sem malignidade é menos rica. Entretanto,

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Capítulo 31 - Sedação paliativa

desenvolveu-se uma demanda e interesse Resumindo, apesar da diferença fisiopa-


mundial em paliar outros tipos de doenças in- tológica entre câncer e demência, não foram
curáveis e progressivas, sendo que a demência encontradas diferenças estatísticas entre es-
se encaixa perfeitamente nesse contexto.1,20 sas populações. A única ressalva é em relação
Pela escassez de trabalhos, torna-se à sobrevida estimada no momento em que
mais difícil estabelecer expectativa de vida surge a indicação de sedação paliativa, que
dessa população. E a dificuldade em esti- nos idosos demenciados é menor (em torno
mar tempo de sobrevida pode atrapalhar de sete dias). Porém, quanto à terapêutica, os
a aplicação da sedação paliativa, que, por resultados são bastante semelhantes. Talvez
definição, deve ser iniciada apenas em fase pelo fato de os pacientes portadores de neo-
final de vida (consideradas por alguns au- plasias malignas serem em sua maioria ido-
tores em duas semanas).1 sos também.1
Felizmente, alguns estudos observacio- Assim sendo, poderiam os dados obtidos
nais de sedação paliativa em idosos já vêm em pesquisas de populações com neoplasias
sendo desenhados e aplicados, principal- malignas serem, em parte e com cautela, ex-
mente em instituições de longa permanência. trapolados para esses idosos? Fica a dúvida,
Os resultados obtidos apontam que a popula- aguardando futuras pesquisas nesse campo.
ção que recebe essa modalidade terapêutica
é preferencialmente feminina, muito idosos, REFERÊNCIAS
com presença de pelo menos dois sintomas 1. VAN DEIJCK RHPD, KRIJNSEN PJC,
refratários e com expectativa de vida que não HASSELAAR JGJ, VERHAGEN SCAH-
ultrapassa sete dias.1 HVM, VISSERS KCP, KOOPMANS
Após iniciada a sedação, 89% experi- RTCM. The Practice of Continuous Pallia-
mentam alívio completo dos sintomas, com tive Sedation in Elderly Patients: A Nation-
sobrevida média de 2,8 dias. Apenas 2% ne- wide Explorative Study Among Dutch Nur-
cessitam sedação muito profunda, sendo que sing Home Physicians. Journal of the Ame-
47% mantêm nível de consciência entre aler- rican Geriatrics Society. 2010. 58(9):1671–8.
ta e resposta a estímulo físico.1 2. OLSEN ML, SWETZ KM, MUELLER PS.
Ethical decision making with end-of-life
Dentre as drogas utilizadas, o midazolam
care: palliative sedation and withholding
é a primeira escolha (91% dos casos). Com
or withdrawing life-sustaining treatments.
sua dose inicial média de 31mg/dia e dose
Mayo Clinic Proceedings. 2010.
final média de 48mg/dia. Opioides são os se- 3. MORITA T, TSUNETO S, SHIMA Y. De-
gundo mais utilizados, com morfina presen- finition of sedation for symptom relief: a
te em até 64% de todas as sedações, sempre systematic literature review and a propo-
em administração subcutânea, com dose ini- sal of operational criteria. J Pain Symptom
cial média de 47mg e final de 65mg diários. Manage. 2002.
Haloperidol (18%) e associação de opioide e 4. VENTAFRIDDA V, RIPAMONTI C, DE
benzodiazepínico (65%) também são recor- CONNO F. Symptom prevalence and con-
rentes em sedação paliativa de pacientes com trol during cancer patients' last days of life.
demência avançada.1 Journal of Palliative Care. 1990.
Os sintomas refratários mais relatados 5. CLAESSENS P, MENTEN J, SCHOTS-
foram dor, ansiedade, exaustão, dispneia e MANS P. Palliative sedation: a review of
delirium. Sendo que 82% apresentavam ao the research literature. J Pain Symptom
menos dois desses. Dado que não difere do Manage. 2008.
restante da literatura.1 6. MORITA T, TSUNETO S, SHIMA Y. Pro-
Antes de iniciada a sedação, 17% não posed definitions for terminal sedation.
apresentava ingestão hídrica e nutricional, The Lancet. 2001.
enquanto que 82% ingeriam menos de 500 7. FAINSINGER RL, LANDMAN W, HOS-
mililitros por dia.1 KINGS M, BRUERA E. Sedation for un-

284

Miolo.indd 284 17/04/2014 14:11:36


Capítulo 31 - Sedação paliativa

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multicenter, prospective, observatio- 20. BARFORD KL, D'OLIMPIO JT. Symp-
nal study conducted on specialized tom management in geriatric oncology:
palliative care units in Japan. J Pain practical treatment considerations and
Symptom Manage. Elsevier. 2005. current challenges. Current treatment
30(4):320–8. options in oncology. 2008.

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Parte 5
Estratégias Adjuvantes em Cuidados Paliativos

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Cirurgia paliativa 32
CAPÍTULO

Mariana De Carvalho Da Silva


Helio Toshio Ouki

INTRODUÇÃO Nos últimos anos, os Cuidados Paliativos


Todo médico deve ser capaz de controlar têm recebido maior ênfase principalmente
sintomas de doenças avançadas e solicitar no tratamento de doenças oncológicas e crô-
avaliação e acompanhamento de especialis- nicodegenerativas.2 A assistência ao paciente
tas em Cuidados Paliativos, se necessário. com doenças graves e avançadas se faz agora
Quando o tratamento específico de doenças numa nova perspectiva, mais atraente, com
subjacentes não é possível, os sintomas que abordagem multidisciplinar, baseada em evi-
causam desconforto devem ser aliviados com a dências na qual as decisões são centradas no
utilização de terapia farmacológica e não far- paciente, e não mais na doença. Promovendo
macológica (fisioterapia, acupuntura, TENS). A o alívio dos sintomas, minimizando a mor-
avaliação do paciente por outras especialidades bidade, melhorando domínios não físicos,
quando os sintomas não respondem à interven- houve uma redefinição positiva para cirurgia
ções convencionais é de grande importância, paliativa.3
pois podem ser propostas condutas específi- Cirurgia paliativa ainda não possui uma
cas que auxiliam no controle do desconforto definição consistente na literatura atual.3
e melhoram a qualidade de vida. O anestesista Pode ser definida de acordo com a intenção
poderá realizar bloqueios nervosos para dor préoperatória (41% das vezes), de acordo com
crônica assim como o ortopedista poderá, na o prognóstico individual de cada pacien-
estabilização de fraturas, promover alívio da te (27% das vezes) ou até mesmo de acordo
dor causada em geral pelo desvio. Fraturas de com a evolução no pós-operatório (32% das
coluna podem ser estabilizadas por neuroci- vezes).4,5 O termo cirurgia paliativa pode ser
rurgiões ou ortopedistas levando ao controle usado então para:
da dor causada pela compressão radicular. • Descrever uma cirurgia de doença mi-
Nas questões relacionadas ao cuidado no croscópica ou com lesão residual 3: aqui
fim da vida, a medicina paliativa juntamen- temos o conceito de ressecção oncoló-
te com outras especialidades, é fundamental gica – R0: ressecção completa, R1: le-
para que os desejos do paciente sejam honra- são residual microscópica (geralmente
dos, fazendo com que o paciente e sua famí- margem comprometida, visto na peça
lia tenham a certeza de que estão recebendo cirúrgica, pelo patologista), R2: cirur-
todo o cuidado possível.1 gia com lesão residual macroscópica.

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Capítulo 32 - Cirurgia paliativa

Nem sempre as ressecções incompletas • Restabelecimento de função: obstrução bi-


são paliativas de princípio. Dependen- liar, gastrointestinal ou de vias aéreas; he-
do da situação, tratam-se as margens morragias, nutrição ou falência renal.
com intenção curativa com nova ressec- • Controle de sintomas: dor, úlceras por
ção ou radioterapia. pressão, cirurgia citorredutora para con-
• Descrever uma cirurgia de doença recor- trole de síndromes paraneoplásicas ou
rente ou persistente.3 Neste caso, devemos infecções de parede.
lembrar que recidiva de doença pode ser • Ablação endócrina: orquiectomia, hi-
tratada também de forma curativa. pofisectomia, adrenalectomia ou oofo-
• Cirurgia baseada no controle dos sinto- rectomia.
mas e qualidade de vida.3, 6 O aumento da
sobrevida torna-se um objetivo secundá- PERIOPERATÓRIO DO PACIENTE IDOSO
rio.4 Aqui temos o principal objetivo da Comparando com a proporção global da
cirurgia paliativa. população total, os idosos necessitam e uti-
Uma série de declarações e iniciativas lizam mais os serviços de saúde, incluindo
educacionais sugere que o campo da cirur- procedimentos cirúrgicos. Vários estudos
gia está em permanente modificação, vi- revelaram que o aumento das comorbidades,
sando uma transformação na qual o deses- polifarmácia, fragilidade fisiológica e outros
pero decorrente da falta de cura torna-se fatores podem aumentar potencialmente as
uma esperança de minimizar o sofrimento complicações e efeitos adversos nesta po-
com importante impacto na qualidade de pulação. O tratamento cirúrgico de adultos
vida dos pacientes.4 mais velhos é multidimensional e se estende
Pacientes com câncer ou doenças avan- bem além da técnica cirúrgica programada.11
çadas experimentam vários sintomas que A principal característica do envelheci-
estão intimamente associados ao estado mento populacional é a fragilidade e devido
psicológico, aflição e à qualidade de vida.7 a isso, essa população crescente tem desafia-
A prevalência dos sintomas pode ser in- do os cuidados no fim da vida.12 Fragilidade
fluenciada por características demográficas pode ser considerada como uma vulnera-
e clínicas como: sítio primário do câncer, bilidade variável a fatores estressantes em
o estágio da doença e características indi- pessoas de uma mesma idade levando ao
viduais, como idade, gênero e desempenho aumento do risco de morte, institucionaliza-
funcional.8 A incidência de ansiedade, náu- ção e até mesmo, uma resposta desfavorável à
sea e vômitos diminui, por exemplo, com intervenção médica e cirúrgica devido à pre-
o envelhecimento.9 Este capítulo fará uma sença de múltiplas doenças.13. Muitos idosos
abordagem geral sobre cirurgia paliativa com o avanço de doenças incuráveis acabam
voltada principalmente para idosos. recebendo tratamentos altamente agressivos,
com poucas chances de sucesso e na maio-
OBJETIVOS DA CIRURGIA PALIATIVA ria das vezes, prolongam o sofrimento antes
São objetivos da cirurgia paliativa:6,10 da morte.14 Mesmo com o avanço da tecno-
• Controle de sintomas presentes ou futuros. logia, cuidados preventivos são importantes
• Controle da dor. em pessoas mais velhas, quando fragilidade
• Manutenção da independência ou função. e demência estiverem presentes, fazendo-se
• Melhora da imagem corporal. necessário atendimento e planejamento indi-
• Diminuição dos cuidados com o paciente. vidualizado visando assegurar um padrão de
• Facilitação de outros tipos de tratamen- intervenções para cada problema de saúde,
to, como quimioterapia ou radioterapia. que refletirá nas metas globais de cuidado e
prognóstico. Deve-se levar em consideração
INDICAÇÕES DE CIRURGIA PALIATIVA se procedimentos onerosos resultarão em be-
São indicações gerais de cirurgia paliativa:6, 10 nefícios clinicamente significativos.13

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Capítulo 32 - Cirurgia paliativa

Além de realizar uma história completa e Embora esta avaliação abrangente possa
exame físico do paciente, a avaliação préope- exigir maiores recursos e tempo para sua exe-
ratória ideal do paciente geriátrico deve se- cução em comparação à avaliação convencio-
guir algumas recomendações específicas:15 nal, estas medidas adicionais são justificadas
• Avaliar a capacidade cognitiva do pacien- pelos benefícios de identificar pacientes de
te e a capacidade de compreender a cirur- alto risco, melhorando a comunicação entre
gia antecipada. o cirurgião e o paciente e prevenindo os efei-
• Rastreio do paciente para a depressão. tos adversos potenciais no perioperatório.15
• Identificar os fatores de risco do paciente Em relação ao pós-operatório, além das
de desenvolver delirium pós-operatório. complicações usuais previstas em adultos jo-
• Investigação do abuso/dependência de ál- vens, o paciente idoso ainda pode apresentar
cool e outras substâncias. outras complicações sendo ainda maiores em
• Avaliação cardiológica préoperatória de idosos frágeis, como aumento do tempo de
acordo com o American College of Car- internação e necessidade de institucionaliza-
diology/ American Heart Association al- ção permanente devido à perda importante
goritmo para pacientes submetidos a ci- da funcionalidade.16 Quando ocorre uma
rurgia não cardíaca. complicação, uma cascata de eventos adver-
• Identificar os fatores de risco do paciente sos se inicia e resulta em incapacidade, per-
para complicações pulmonares pós-ope- da da independência, redução da qualidade
ratórias e programar estratégias adequa- de vida, aumento dos custos nos cuidados
das de prevenção. de saúde, além de aumentar a mortalidade.17
• Avaliação do estado funcional e histórico Desta forma, observa-se que avaliação pré-
de quedas. via da fragilidade pode ajudar os pacientes e
• Avaliar presença de fragilidade. os médicos na tomada de decisões quanto a
• Avaliar o estado nutricional do paciente e fazer ou não uma cirurgia paliativa tentan-
considerar intervenções préoperatórias, se do evitar desta forma, piora da qualidade de
o paciente está em risco nutricional grave. vida após o procedimento.16
• Histórico preciso das medicações utili-
zadas e considerar ajustes perioperatório DILEMAS ÉTICOS E MORAIS
apropriados. Atentar à polifarmácia. Cuidar de pacientes com câncer abrange
• Determinar metas e expectativas de tra- numerosos pontos de decisão que envolve
tamento do paciente no contexto dos pos- paciente, família e equipe da área da saúde.
síveis resultados do tratamento. Existem diversas modalidades de tratamento
• Avaliar o suporte familiar e social do para neoplasias malignas de tumores sólidos,
paciente. como cirurgia, quimioterapia e radioterapia
• Realizar exames diagnósticos necessá- cada uma com seu potencial e toxicidade que
rios no pré-operatório com foco em pa- podem influenciar na sobrevivência e sinto-
cientes idosos. mas dos pacientes. A escolha do tratamento
• Em oncologia, utilizamos uma escala de adequado pode ser influenciada pelo paciente,
performance status (PS) para indicar os por suas preferências de tratamento, suas co-
tratamentos cirúrgicos, radioterápicos morbidades, sua experiência e pela tendência
e quimioterapia: PS0: atividade normal; dos vários médicos envolvidos no cuidado. As
PS1: sintoma da doença, mas deambula e decisões também sofrem influência das práti-
leva seu dia a dia normalmente; PS2: Fora cas locais e regionais além do conhecimento
do leito mais de 50% do tempo; PS3: No disponível. Dada a complexidade global do cui-
leito mais de 50% do tempo, carente de dar do paciente com doença avançada e com
cuidados mais intensivos; PS4: acamado. probabilidade de cura muito reduzida, os pa-
Em geral, até PS2, há possibilidade de tra- cientes muitas vezes dependem de seus médi-
tamento oncológico. cos para orientação na escolha do tratamento.18

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Capítulo 32 - Cirurgia paliativa

Dilemas éticos na prática da cirurgia pa- cia apenas. A cirurgia paliativa torna-se
liativa pelos cirurgiões:4, 18 apenas um meio e não um fim em si mes-
• Fornecer informação honesta, sem des- mo. É importante ser sensível à autono-
truir a esperança. mia e dignidade do paciente.4
• Preservar a escolha do paciente • O impulso para 'fazer o possível': os pa-
• Uso de diretrizes avançadas. cientes e seus familiares tendem a pensar
• Retenção/ retirada de tratamentos de que tudo o possível deve ser feito. Quando
suporte de vida. alguma intervenção cirúrgica é proposta,
• Paciente e família com diferentes obje- muitos acreditam qua ainda há alguma
tivos. coisa a fazer. Ao contrário, se não for pro-
• Interrupção de suporte de vida posta nenhuma cirurgia acham que os mé-
• A incerteza sobre o prognóstico do pa- dicos já desistiram deles ou até mesmo que
ciente. os tratam como se estivessem mortos. Uma
• Medo de causar a morte por excesso de questão difícil é saber se o indíviduo con-
analgésicos. segue avaliar criticamente o impacto de
‘fazer tudo o possível’ na sua situação clí-
IMPLICAÇÕES MORAIS DA nica. Muitos pacientes possuem uma cren-
CIRURGIA PALIATIVA ça ilimitada e irreal nos modernos trata-
• Dever de ajudar: o dever de ajudar é um mentos propostos pela medicina moderna.
impulso moral básico em medicina, uma Tendem a pensar que as possibilidades são
obrigação essencial para todos os profissio- muitas e os riscos são poucos. A cirurgia
nais de saúde. O dever de cuidar dos fracos paliativa muda o foco da cirurgia clássica,
e com sofrimento constante torna-se um onde o paternalismo sede lugar à autono-
desafio. Todas estas tarefas parecem ser re- mia do paciente. O desafio surge quan-
levantes na cirurgia paliativa. Dessa forma, do a eficácia e eficiência são incertas. A
ao cuidar de um paciente vulnerável que cirurgia paliativa vem como importante
é fraco ou da dor do mesmo, onde a evi- instrumento psicológico e emocional
dência de eficácia e eficiência é limitada, le- para que não percam a esperança ou se
vando em consideração as expectativas do sintam ‘desistidos’.4
paciente e dos familiares, o cirurgião deve • A autonomia do paciente e as informações:
fazer o possível para ajudar levando em a autonomia do paciente tornou-se um
consideração os princípios da beneficência princípio moral fundamental na medicina
e não maleficência.4 moderna. No entanto, o registro da auto-
• Benevolência e vulnerabilidade: o dever de nomia e consentimento informado ocorre
agir e ajudar estão intimamente ligados a pouco na prática clínica. Uma ação autô-
uma virtude vital da medicina que é a be- noma é intencional, voluntária e realiza-
nevolência. Dessa forma, enfrentar pacien- da com a compreensão da situação, assim
tes em Cuidados Paliativos exige compai- como das consequencias de suas decisões.
xão. No entanto, mesmo que compaixão Isto tende a ser um desafio na cirurgia pa-
e benevolência possam estar relaciona- liativa. Como proporcionar a verdadeira
das com a sensibilidade moral e boas informação sem tirar a esperança do pa-
intenções do cuidador, estas são con- ciente? Alguns trabalhos mostraram que
dições necessárias mas não suficientes os pacientes se lembram apenas de alguns
para uma boa ajuda. Benevolência exige pedaços da informação, além de ter enor-
consciência de que as ações benevolentes me dificuldade em perceber sua real situa-
realmente ajudam o paciente que precisa. ção, o que pode gerar várias intercorrên-
O ideal da caridade não é cego. Assim, in- cias na evolução clínica. A diferença entre
tervenções drásticas sem provas suficientes informar e persuadir, persuadir e mani-
não podem ser justificadas pela benevolên- pular, manipular e coagir, não é sempre

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Capítulo 32 - Cirurgia paliativa

clara. A falta de alternativas faz com que o ferente do que o paciente considera possível.
paciente confie nas palavras e decisões dos • Os pacientes podem sentir que eles estão
profissionais de saúde que cuidam deles. 'desistindo' de uma operação que não é viá-
A obtenção do consentimento informado vel ou consideradas como inúteis.
é um desafio na medida que devemos per- • Alternativas paliativas à cirurgia são mal
guntar a um paciente doente se o mesmo é apreciadas por muitos pacientes e as infor-
capaz de cuidar dos seus próprios interes- mações podem ser tendenciosas.
ses de forma autônoma e voluntária. Se a • Os doentes podem estar sob pressão subs-
condição do paciente deteriora, o consen- tancial de membros da família.
timento prévio ainda é válido? O que fazer
se o paciente não parece ser receptivo à EVIDÊNCIAS CIENTÍFICAS
informação relevante e é incapaz de tomar DA CIRURGIA PALIATIVA
decisões? Quão responsáveis são as deci- Há uma falta importante de evidências
sões dos familiares num momento de tanta documentadas em cirurgia paliativa. A in-
tristeza e desespero em cuidar do pacien- dicação para realização dos procedimentos
te? Por outro lado existe ainda o ‘direito de varia não só entre países como também entre
não saber’. Reconhece-se que muitos pa- hospitais. Em particular, há pouco conheci-
cientes preferem não saber sobre sua con- mento sobre a prevenção de sintomas no pós
dição e confiar em seus médicos na tomada -operatório imediato em cirurgia paliativa.
da melhor decisão. A desafiadora questão Essa falta de conhecimento sobre efeitos, ris-
aqui é se uma pessoa que não quer ter in- cos e prevenção são de relevância moral. Um
formações sobre assuntos vitais afetando procedimento que visaria melhora clínica
sua própria vida pode atuar de forma au- pode acabar reduzindo consideravelmente a
tônoma. Além disso, existe um risco que qualidade de vida do paciente indo totalmen-
"o direito de não saber" pode ser utilizado te contra os princípios dos Cuidados Palia-
pelo cirurgião como uma desculpa para a tivos. Procedimentos que visem o bem-estar
cirurgia em situação irregular, explorató- do paciente mesmo que com pouca evidência
ria ou fútil. é considerado um ato moral. É considerado
imoral a não realização destes procedi-
DESAFIOS PARA A AUTONOMIA mentos ou aqueles considerados inúteis ou
DO PACIENTE COM CÂNCER prejudiciais.19
EM CIRURGIA PALIATIVA4 Devido às evidências científicas limitadas
• As evidências científicas sobre os resulta- em relação aos efeitos positivos do tratamento
dos e os riscos são limitadas. paliativo cirúrgico observa-se cada vez mais
• Os pacientes são particularmente vulnerá- uma redução da indicação de procedimentos
veis e muitas vezes têm uma reduzida capa- que trariam benefícios aos pacientes. A pre-
cidade de compreender informações sobre venção dos sintomas em Cuidados Paliativos
as opções, resultado e o risco. acaba sendo subestimada sendo a teoria do
• O estado de saúde pode mudar rapidamente. ‘fazer o possível’ imperativa para justificati-
• O risco vinculado a certos procedimentos va dos mesmos onde os benefícios devem ser
marginais pode ser substancial (mortalida- considerados contra os riscos (beneficência)
de perioperatória, infecção pós-operatória, preservando sempre a autonomia.4
morbidade). A falta de relatos científicos deve estimu-
• Existe uma confiança considerável de que lar as publicações onde os cirurgiões devem
o sistema de saúde faz tudo possível, sem relatar suas experiências com avaliação crí-
qualquer análise crítica do que ‘tudo possí- tica sobre indicar ou não o procedimento
vel’ significa em relação ao risco e benefício. novamente após os resultados observados.
O que o cirurgião entende quando o pacien- O desafio da incerteza é relevante em cirur-
te pede para fazer tudo possível pode ser di- gia paliativa não só por não poder estimar

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Capítulo 32 - Cirurgia paliativa

os sintomas pós-operatórios, como também moderna. No que diz respeito à clínica do


pela incerteza de não tratar os sintomas paciente, as cirurgias paliativas tornam-
eventualmente propostos. Quando não exis- se prioridades pela gravidade do mesmo.
tirem evidências adequadas, a autonomia do No entanto, pode-se argumentar que de-
paciente deve prevalecer.4 veria haver um limite no qual tratamento
Por outro lado, também se observa uma curativo deve ser mais importante do que
dificuldade na padronização de estudos so- o paliativo. É claro que não. Ambas devem
bre cirurgia paliativa devido alguns pontos receber a mesma priorização uma vez que
principais, como:4 representam motivos diferentes com obje-
• Os resultados e efeitos encontrados serão tivos iguais, aumentar a qualidade de vida
os mesmos se comparados procedimentos dos pacientes.4
realizados em hospitais gerais e clínicas es-
pecializadas? CONCLUSÃO
• Com a padronização da técnica operatória Como o envelhecimento da população se
a variabilidade técnica reduzirá o desem- expande a cada dia, os pacientes mais velhos
penho cirúrgico? tornam-se cada vez mais candidatos à pro-
• Mudança rápida do estado de saúde dos sujei- cedimentos cirúrgicos. A decisão cirúrgica
tos da pesquisa mudando consequentemente nesta população torna-se um desafio devido
os objetivos considerados previamente. a heterogeneidade do estado de saúde dos
• Viés de tratamento. idosos e à escassez de ferramentas eficazes na
• Viés de seleção. previsão do risco operatório.20
• Dificuldade na randomização de pacientes Apesar de avanços anestésicos e médicos/
• Variabilidade encontrada entre a técnica cirúrgicos, os pacientes idosos continuam a
cirúrgica dos cirurgiões. sofrer com mais resultados pós-operatórios
• Avaliação da eficácia (avaliação do método adversos se comparado à população mais
em condições ideais). jovem. Isto ocorre principalmente devido
• Avaliação da efetividade (avaliação do mé- inúmeras comorbidades e redução da reserva
todo em condições usuais). fisiológica (fragilidade). Ainda não existe um
• Avaliação da eficiência (avaliação da eficá- consenso sobre qual a melhor forma de ava-
cia relacionada com os custos). liar e diagnosticar idosos no perioperatório
• Pode ser difícil de obter o consentimento afim de se tentar reduzir ao máximo as com-
informado em pacientes graves. plicações pós-operatórias, e dessa forma não
• A avaliação dos efeitos de intervenções ci- reduzir a qualidade de vida destes pacientes.4
rúrgicas em comparação com "não trata- Torna-se cada vez mais necessário a edu-
mento" é considerada imoral. cação moral e reflexão ética por todos os en-
• Uso de pacientes com condições graves e volvidos no tratamento cirúrgico paliativo,
terminais é considerado imoral em proto- bem como levar em consideração a condição
colos clínicos na maioria das vezes. física, emocional e existencial do paciente.
• A falta de conhecimento também tem im- Cirurgia paliativa é um desafio na relação
plicações na definição de prioridades. Ge- médico-paciente.4
ralmente os princípios básicos para prio-
rização baseiam-se na gravidade, necessi- REFERÊNCIAS
dade e custo-benefício. Como em cirurgia 1. LUCHI RJ, GAMMACK JK, NARCISSE VJ,
paliativa não se sabe ao certo os resultados 3RD, STOREY CP, JR. Standards of care in
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liativa é um problema geral da medicina gton DC. 2001.

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Capítulo 32 - Cirurgia paliativa

Figura 32.1 - Tomada de decisão clínica em Cirurgia Paliativa21

Fatores que incluenciam Processo Opções de tratamento Impacto na qualidade de vida

Bem-estar físico e Psicológico


• Identificar objetivos •C  irurgia paliativa sintomas •A nsiedade
•R  econhecer valores •Q  uimioterapia •C apacidade funcional •D epressão
Paciente
•R  econhecer •R  adioterapia •F orça e fadiga •D iversão e lazer
alternativas • T ratamentos •D ormir e descansar •A flição e dor
•P  esar risco X combinados •N áusea •F elicidade
Família benefício •O  utros tratamentos •A petite •M edo
• T ratamento não •C onstipação •C ognição e atenção
invasivo •D or

Qualidade de vida

Equipe de Saúde Bem-estar Social Bem-estar Espiritual


•D  ificuldade no procedimento paliativo •E ncargo financeiro •E  sperança
•D  uração da internação •S obrecarga do •S  ofrimento
• T empo de recuperação cuidador •S  ignificado da dor
•C  hance de alcançar objetivos paliativos a curto prazo •P apéis e relações •R  eligiosidade
•D  urabilidade esperada da intervenção proposta •A feto e sexual • T ranscedência
•P  rogressão da doença •F unção
•A parência

Fatores adicionais
•B aixa morbidade
•P rognóstico
•S atisfação do paciente com o tratamento
Fonte: Ferrell BRP et al. Patient and Surgeon Decision •S obrevivência
Making Regarding Surgery for Advanced Cancer. •S atisfação do cuidador, qualidade de vida, e os encargos
•R esultados do sistema de saúde (custo)
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Radioterapia paliativa 33
CAPÍTULO

Sílvia Cláudia dos Santos Braga


Helena Regina Comodo Segreto
Roberto Araújo Segreto
Rodrigo Souza Dias

A radioterapia pode ser conceituada como Os sítios primários dos tumores mais fre-
o uso clínico da radiação ionizante para fins quentes são mama e pulmão. Metástases ce-
terapêuticos. É produzida em aparelhos ou rebrais de tumores uroginecológicos ou gas-
obtida de radioisótopos naturais ou artificiais. trintestinais são raras. Pacientes com diag-
Seu principal objetivo é concentrar dose pre- nóstico de melanoma tem uma maior chance
cisa em um volume alvo (tecido doente) e pre- de evoluírem com metástases cerebrais.1,2,7,8
servar o tecido normal adjacente. O diagnóstico além da história clínica,
O objetivo da radioterapia paliativa em exame físico e neurológico, pode ser feito atra-
pacientes com diagnóstico de câncer sem pos- vés de exames como tomografia computado-
sibilidade de cura é melhorar a qualidade de rizada ou ressonância magnética de crânio.
vida. Este tratamento aumenta a sobrevida, Quando o sítio primário é desconhecido, de-
porém, não deve ser utilizado para prolongar ve-se proceder a biopsia da lesão cerebral. 1,2,7,8
o processo de morte. Vários fatores devem ser No tratamento de metástases cerebrais,
considerados na decisão de administrar ou corticosteroides são administrados com o
não o tratamento, como sobrevida, a gravi- intuito de diminuir os sintomas relacionados
dade e duração dos efeitos colaterais, possível ao edema perilesional muito frequente em
internação para tratamento de complicações, lesões metastáticas. Para lesão única, o trata-
e o custo-benefício para o doente. 1,2 mento consiste em cirurgia, dependendo da
A radioterapia em Cuidados Paliativos é localização da metástase, seguido de radiote-
mais frequentemente utilizada no tratamen- rapia em encéfalo total, ou ainda radioterapia
to de metástases ósseas, metástases cerebrais em encéfalo associado ou não a um reforço
ou medula espinhal e recorrências ou metás- de dose com radiocirurgia. Nos casos de le-
tases viscerais, entre outros. sões múltiplas, emprega-se a radioterapia em
encéfalo, seguida ou não de radiocirurgia em
METÁSTASES CEREBRAIS lesões residuais, dependendo do número e de
As metástases cerebrais múltiplas estão suas dimensões.1,2,7,8
associados a cefaléia e alterações focais. Os O prognóstico dos pacientes com metás-
pacientes muitas vezes apresentam alterações tases cerebrais depende da idade, do índice de
de comportamento e da memória. Karnofsky, do status sistêmico da doença, do

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Capítulo 33 - Radioterapia paliativa

número de lesões e do volume da maior lesão. As células neoplásicas podem envolver o


A radioterapia em encéfalo deve ser feita com osso por extensão direta do tumor primário,
campos paralelos e opostos, com doses de como ocorre no tumor de rinofaringe com
30Gy, com fração de 3Gy/dia ou 40Gy com acometimento da base de crânio; extensão
fração de 2Gy/dia. A sobrevida mediana para direta através de lesão secundária, como em
maioria dos pacientes tratados com corticoides metástases paraórticas com envolvimento de
é de 2 meses, e aumenta para 3 a 6 meses com vértebras lombares; e disseminação hemato-
a radioterapia. Aqueles pacientes selecionados, gênica, que é o mais importante e mais fre-
com metástase única, bom performance status quente mecanismo de acometimento ósseo.
e sem doença sistêmica, submetidos a ressecção A maioria das complicações relacionadas
cirúrgica e radioterapia apresentam sobrevida as metástases ósseas são causadas por osteólise
mediana de 16 meses.1,2,7,8 mediada por osteoclastos. Dor e alteração da
mobilidade ocorrem em 65 a 75% dos pacien-
COMPRESSÃO DE MEDULA ESPINHAL tes. A dor óssea pode ser nociceptiva ou neu-
A compressão de medula espinhal ocor- ropática. Algumas vezes, os dois componentes
re tardiamente, e é um evento pré-terminal, podem estar presentes. O mecanismo de me-
com sobrevida mediana de 3 meses. Os pa- lhora da dor após a radioterapia ainda não está
cientes apresentam queixa de dor em re- completamente esclarecido. Acredita-se que a
gião dorsal, sendo a coluna torácica o sítio diminuição do processo inflamatório tem pa-
de compressão mais frequente. Apesar de pel relevante e quando é tardia e duradora, seria
prognóstico não favorável, pacientes com decorrente da morte celular.1,2,6,9
diagnóstico de linfoma, mieloma ou tumo- Fratura de ossos longos ocorre em 10 a
res responsivos a hormonioterapia podem 20% em pacientes com metástases ósseas, e
apresentar melhor controle.3,5 acontece mais frequentemente em lesões lí-
Além da história clínica e do exame físi- ticas. Hipercalcemia pode ser observada em
co, a ressonância magnética é relevante para o 10 a 15% dos casos, e é comum nos pacien-
diagnóstico da compressão medular. O princi- tes portadores de câncer de mama, pulmão,
pal fator prognóstico para a resposta ao trata- cabeça e pescoço, carcinoma de células re-
mento é a deambulação. Pacientes que deam- nais, mieloma múltiplo e leucemia/linfoma
bulam tem sobrevida mediana de 7 meses e de células T. Hipercalcemia maligna tem um
aqueles que não deambulam de 1,5 mês.3,5 prognóstico ruim, com sobrevida mediana
A cirurgia para descompressão está indi- de 1 a 3 meses. Os sintomas clínicos incluem
cada em pacientes com fratura de vértebra, alterações neuropsiquiátricas, renais e sinto-
paraplegia de evolução aguda, lesões pouco mas cardiovasculares.1,2
radiossensíveis, falta de resposta a corticos- Bifosfonatos tem sido utilizados no trata-
teróide, ou aqueles que não tem diagnóstico mento da hipercalcemia e em pacientes com
histopatológico de câncer. A utilização de metástases ósseas sem hipercalcemia. Eles
corticoides melhora a dor e os sintomas neu- inibem a reabsorção óssea e interrompem o
rológicos em alguns casos. A grande maioria ciclo vicioso de reabsorção óssea e estímulo
dos pacientes devem receber radioterapia, do crescimento da metástase. Mais do que
com múltiplos esquemas de fracionamento: 20% dos pacientes tratados com bifofonatos
40Gy em 20 frações, 30Gy em 10 frações, mostram mineralização das lesões líticas.1,2
20Gy em 5 frações e 8 Gy em dose única.3,5 A cirurgia deve ser realizada quando
é detectada alteração que possa facilitar a
METÁSTASES ÓSSEAS ocorrência de uma fratura, como em lesões
A sobrevida de pacientes com metástases que acometem mais do que 50% do diâmetro
ósseas é prolongada e o crescimento descon- do osso, ou localizadas em ossos de sustenta-
trolado das lesões podem resultar em graves ção, especialmente na região peritrocantérica
e persistentes sintomas incapacitantes.1,2,6,9 do fêmur e que são predominantemente os-

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Capítulo 33 - Radioterapia paliativa

teolíticas. A cirurgia estabiliza fraturas e le- broncoscopia para diagnosticar e topografar


sões com risco de fratura. Nos casos de lesões a origem do sangramento. A mesma dose de
em vértebras, a cirurgia deve ser utilizada 30Gy em 10 frações é utilizada, com finali-
quando déficits neurológicos progressivos ou dade hemostática. Em casos de pacientes não
achatamento de vértebras estiver presentes.1,2 submetidos a tratamento prévio, e com doen-
Quando analisada a aplicação da radiote- ça localizada, pode ser utilizado esquemas
rapia com finalidade paliativa, as metástases com frações iniciais de 3Gy, num total de 3-4
ósseas constituem o maior grupo. A radio- aplicações, para melhora aguda dos sinto-
terapia localizada é indicada para pacientes mas, e a partir de então, frações de 1,8-2Gy
com metástases sintomáticas e para diminuir por dia até a dose final preconizada. 1,2,4,5,9
a dor, risco de fratura e alterações neuroló- Quanto aos tumores de esôfago, poucos
gicas. Diversos esquemas de fracionamento pacientes são candidatos a tratamento cura-
estão disponíveis, e os mais empregados são tivo. Para paliação de sintomas obstrutivos,
esquemas de 8Gy em dose única, 20Gy em 5 próteses, sonda nasoenteral, ou gastrostomia
frações, 30Gy em 10 frações e 40Gy em 20 estão indicados. A associação de radioterapia
frações. A radioterapia é capaz de promover e quimioterapia concomitante pode promo-
reossificação em 65 a 85% dos pacientes com ver alívio dos sintomas, porém, o uso de ape-
lesões líticas e permite melhora dos sintomas nas uma das modalidades terapêuticas pro-
em 50 a 60% dos casos. A utilização de cam- duz pouco resultado.1,2,4,5,9
pos alargados, como em hemicorpo, deve ser Sangramento e obstrução urinária po-
empregada em lesões ósseas disseminadas e dem ocorrer em recidivas de tumores retais,
sintomáticas, não controladas com narcóti- de bexiga, próstata ou colo uterino. Em pa-
cos, em pacientes com idade menor que 75 anos cientes não irradiados previamente, 10 fra-
e índice de Karnofsky maior que 70%. A dose ções de 3Gy devem ser empregadas. Nos ir-
varia de 6Gy para a parte superior do hemicor- radiados anteriormente, a reirradiação pode
po e de 7Gy para o hemicorpo inferior.1,2,6,9 provocar complicações importantes que in-
terferem na qualidade de vida dos pacientes
RECORRÊNCIAS E METÁSTASES e sua indicação depende de fatores como ex-
VISCERAIS tensão da lesão, campos e dose de radiação
A radioterapia promove poucas mudan- previamente utilizada.1,2,4,5,9
ças em relação a sobrevida e a qualidade de Sangramento ginecológico pode ser
vida geral dos pacientes. É utilizada na pa- resultante de tumores de vulva, vagina
liação de sintomas causados pelo câncer de ou colo de útero. Os procedimentos reco-
pulmão, obstrução esofágica, sangramento mendados são de curativos compressivos
e obstrução urinária, dor pélvica, metástase e tampão vaginal. Nos sangramentos mais
hepática, sangramento ginecológico e gas- intensos recomenda-se transfusão de con-
trointestinal, metástase linfática e lesões em centrado de hemácias e rigorosa hidratação
base de crânio. endovenosa. A radioterapia deve ser inicia-
Pacientes com tumores avançados de da precocemente, após confirmação histo-
pulmão podem apresentar lesões endobron- patológica do tumor, podendo-se utilizar
quicas que podem provocar atelectasia e doses altas por fração inicialmente, substi-
dispneia. Tanto a radioterapia externa como tuídas posteriormente por frações clássicas
a endobrônquica podem ser usadas com efi- de 1,8 a 2Gy até se atingir a dose total para
cácias semelhantes. Geralmente a dose para a patologia, conforme sítio e tipo histológi-
radioterapia externa paliativa é de 30Gy em co do tumor.1,2,4,5,9
10 frações, a melhora dos sintomas ocorre
em 50% dos casos, e a sobrevida mediana é REFERÊNCIAS
de 9 meses. Hemoptise também é um sinto- 1. K ATZ A ET AL. Tratado de Oncologia.
ma frequente. Se possível, deve se proceder à Vol.1, cap.13. Atheneu. 2013. P.131-9.

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Capítulo 33 - Radioterapia paliativa

2. SALVAJOLI JV, SOUHAMI L, FARIA SL. 6. GIGLIO A & KALIKS R. Oncologia: análise
Radioterapia em Oncologia, 2º ed. Capítulo de casos clínicos. 2.ed. Manole. 2007. 53-55.
3 e 4. Atheneu. 2013. P.61-83. 7. PATCHELL RA ET AL. Postoperative ra-
3. K AGAN AR. Palliation of brain and spi- dioterapia in the treatment of single metas-
nal-cord metástases. In Perez CA, Brady tasis to the brain: a randomized trial. Jama.
LW, Halperin EC, Schimidt-Ullrich RK. 1998. 4:1485-9.
Principles and practice of radiation onco- 8. ANDREWS DW ET AL. Whole brain ra-
logy. Philadelphia: Lippincott Williams & diation therapy with or without stereotatic
Wilkins. 2004. 2373-2382. radiosurgery boost for patients with one
4. POLLOCK RE ET AL. UICC manual de three brain metastasis: phase III results of
oncologia clinica, 8.ed. São Paulo, Fundação the RTOG 9508 randomised trial. Lancet.
Oncocentro de São Paulo. 2006. p.758-762. 2004. 2:1665-72.
5. FORONES NM ET AL. Guia de Medicina 9. GOLDMAN L, AUSIELLO D, CECIL M.
Ambulatorial e Hospitalar de Oncologia. Tratado de Medicina Interna. 22ºEd. Edito-
1ºed. Barueri, SP: Manole. 2005. p.413-416. ra Elsevier. Vol.1. 2005. 1196-99.

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Contribuição da medicina física e de
reabilitação na abordagem do paciente
em Cuidados Paliativos
34
CAPÍTULO

Marcia C M Macêdo
Marcelo A Starling
Milene S Ferreira

INTRODUÇÃO namento terapêutico e influencia inclusive


Os objetivos da Medicina Paliativa e da a inclusão em Cuidados Paliativos. A litera-
Medicina de Reabilitação convergem entre tura mostra que outros parâmetros além de
si. Ambas propõe um cuidado integral ao in- idade, sexo e raça, podem ser úteis e até mais
divíduo. No primeiro caso, indivíduos com precisos para aferir a sobrevida de pacientes
doenças fora da possibilidade de cura; no se- geriátricos, tais como incapacidade para ati-
gundo caso, indivíduos com incapacidades vidades de vida diária e velocidade da mar-
decorrentes de uma determinada doença. cha7, comorbidades e medidas funcionais8. O
Ambas são atividades multidisciplinares e bom status funcional de base e o baixo risco
com o objetivo comum de promover o má- cardiovascular se correlacionam com a pre-
ximo de bem-estar físico e emocional do servação da capacidade física e cognitiva em
paciente e de seus familiares.1,2 O declínio nonagenários.9 Em uma coorte com 11701
funcional costuma fazer parte da evolução indivíduos, o instrumento testado e validado
da doença de pacientes em cuidado paliati- para medir risco de mortalidade, contem-
vo.3 Essa perda da funcionalidade tem sido plou os itens sexo, idade, medidas funcionais
descrita pelos pacientes como um dos fato- e comorbidades.3
res que mais interfere em sua qualidade de A fisiatria é a área da medicina especiali-
vida.1,4 Apesar disso, o desempenho funcio- zada no tratamento e prevenção da incapaci-
nal ainda tem recebido pouca atenção nesse dade. O apoio do fisiatra à equipe de Cuida-
contexto. Um levantamento sobre questioná- dos Paliativos pode ser útil em várias fases:
rios utilizados em Cuidados Paliativos para 1. 
Avaliação funcional para direciona-
avaliar qualidade de vida, mostrou aborda- mento terapêutico.
gem muito pequena acerca de funcionalida- 2. Identificação precoce de fatores sub-
de.5 Não raro pacientes são subestimados, clínicos para a incapacidade, a fim de
do ponto de vista funcional, em virtude da prevenir a perda funcional.
gravidade de sua doença. 3. Definição do prognóstico de recupe-
A avaliação funcional em paciente com ração funcional e da adequada reabi-
doenças que ameaçam a vida deve ser tão litação; quando existe incapacidade já
precoce quanto o diagnóstico. Em pacien- instalada.
tes geriátricos ela ajuda a definir o direcio- 4. Conforto.

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Capítulo 34 - Contribuição da medicina física e de reabilitação na abordagem do paciente em Cuidados Paliativos

O diferencial da avaliação fisiátrica é que 4. Compensação em calçado, pois evoluiu


além da avaliação clínica, neurológica, or- com deformidade em equino devido a
topédica, social, ambiental, o fisiatra realiza retração da área de enxerto e à própria
também a avaliação funcional e biomecânica imobilidade (prescrita pelo fisiatra)
permitindo o diagnóstico tanto da incapaci- 5. Treino de marcha com andador delta
dade quanto das capacidades residuais.1,2 em ambiente abrigado e posteriormen-
Pode parecer contraditório falar de reabi- te em ambiente acidentado
litação no contexto das doenças fora de pos- 6. Trabalho fonoaudiológico devido a
sibilidade terapêutica. Mas exatamente este é rouquidão, secundária à entubação
o papel do fisiatra, tratar não a doença, mas prolongada
sim, as consequências da mesma, propor- 7. Trabalho psicológico a fim de fortalecer
cionando conforto, autonomia e bem-estar. estratégias de enfrentamento. Aborda-
Para isso, é necessária a atuação sinérgica de gem esta feita também com familiares
uma equipe multiprofissional2, como ilustra- 8- Recuperação de peso para eutrofia
do no caso clinico a seguir. Quadro 34.1 - Resultados após 30 dias de
reabilitação
CASO CLÍNICO Inicial Final
SRPA, sexo feminino, 62 anos, aposentada. SPPB 0 7
Antecedentes: adenocarcinoma de colon com TUG 0 25 seg
metástase hepática diagnosticado em 2010, MIF 55 93
hipertensão arterial sistêmica, transplantada Rouquidão Presente Ausente
renal em 1985. Até então totalmente indepen- Peso 52 55
dente para todas atividades, dentro e fora de SPPB (short performance physical battery), MIF (medida
casa. Deu entrada em pronto-socorro com de independência functional), TUG (time up and go test).

quadro sugestivo de sepse, tendo como foco, Conclusão: paciente recebe alta com in-
celulite em membro inferior esquerdo. Inter- dependência em autocuidados e para marcha
nada imediatamente em UTI, onde permane- com andador. A mesma manteve esta auto-
ceu por 3 meses devido a várias complicações. nomia até o dia de sua morte, que ocorreu 5
Posteriormente ficou mais 1 mês em semi-in- meses após a alta.
tensiva e após estabilidade clínica foi transfe- O SPPB é um instrumento de recomen-
rida para uma unidade de reabilitação. dação internacional para avaliação de per-
Na admissão da Unidade de Reabilitação, formance física do idoso. Pacientes que pon-
passou por avaliação fisiátrica e de equipe tuam menos que 9 apresentam maior pro-
multiprofissional, na qual identificou-se que, babilidade de sofrer quedas, hospitalização,
apesar da sobrevida baixa (cerca de três me- declínio funcional e morte. Possui 3 domí-
ses), existia o potencial de resgate da autono- nios de avaliação: força muscular, equilíbrio
mia para retorno ao domicilio e às atividades e velocidade de marcha.10
sociais desejadas pela paciente. No TUG mede-se o tempo que o idoso
Foram identificados como principais leva para levantar-se de uma cadeira, andar
pontos a serem trabalhados: por 3 metros em velocidade habitual, com
1. Ganho de força muscular global (fisio- ou sem auxiliar de marcha, e retornar para
terapia 2x/dia) a cadeira. A execução do mesmo em tempo
2. Necessidade de treino funcional espe- maior que 15 segundos prediz risco para
cífico (terapia ocupacional diária) quedas e perda funcional.11
3. Uso de faixa abdominal para garantir se- A Medida de Independência Funcional
gurança na movimentação, pois a mesma (MIF) é um instrumento de avaliação de
apresentava ferida abdominal cirúrgica incapacidade de pacientes com restrições
em processo de cicatrização por segunda funcionais de origem variada. Seu objetivo
intenção (prescrita pelo fisiatra) primordial é avaliar de forma quantitativa

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Capítulo 34 - Contribuição da medicina física e de reabilitação na abordagem do paciente em Cuidados Paliativos

a carga de cuidados demandada por uma uma região corpórea e/ou tecidos adjacentes,
pessoa para a realização de atividades mo- que pode estar relacionada a alteração de
toras e cognitivas de vida diária. Entre as sensibilidade e/ou irradiação característica
atividades avaliadas estão os autocuidados, (Quadro 34.2).17 Uma apresentação aguda
transferências, locomoção, controle esfinc- pode ocorrer após um evento ou trauma es-
teriano, comunicação e cognição social, que pecífico, enquanto a forma crônica geral-
inclui memória, interação social e resolução mente resulta de má postura ou sobrecarga
de problemas. Cada uma dessas atividades é muscular.16
avaliada e recebe uma pontuação que parte Uma vez identificado o músculo disfun-
de 1 (dependência total) a 7 (independência cional, o paciente deve ser colocado numa
completa), assim a pontuação total varia de posição confortável que favoreça o relaxa-
18 a 126. É importante ressaltar que a MIF mento desse músculo. Utiliza-se agulha de
não é um instrumento auto-aplicável e que acupuntura, cujo comprimento depende da
exige treinamento para sua utilização. Este profundidade do músculo. A espessura de
será realizado a fim de detectar perda fun- 0,25 a 0,30 mm de diâmetro favorece a téc-
cional, alertando a equipe quanto ao risco de nica. Uma vez localizado o ponto gatilho, e
evolução para fragilidade e dependência.12 com a pele devidamente higienizada com ál-
Tais instrumentos são úteis no diagnós- cool a 70%, mantem-se o ponto gatilho fixo
tico e prognóstico funcional, assim como com dois dedos de uma das mãos e insere-se a
no auxílio ao direcionamento terapêutico e agulha com a outra mão. O paciente deve ser
acompanhamento. avisado da possibilidade de uma contração
muscular involuntária ou sensação desagra-
ARSENAL TERAPÊUTICO dável quando a agulha alcançar o ponto gati-
A seguir serão descritos recursos terapêuti- lho. Em seguida, é realizado um movimento
cos da Medicina Física e de Reabilitação, úteis de pistonagem, cerca de dez oscilações, com
na garantia do conforto e preservação funcio- alguma mudança de direção da agulha, se
nal desta população de pacientes, com a vanta- necessário. É recomendado o alongamento
gem adicional de redução da polifarmácia. ativo ou passivo do músculo agulhado após
o procedimento. O agulhamento de pon-
AGULHAMENTOS to gatilho secundário e/ou satélite pode ser
Agulhamento seco é uma técnica ambu- necessário.15,18 Vários estudos demonstram
latorial indicada para quebrar o ciclo vicioso a melhora dos sintomas com agulhamento
na síndrome dolorosa miofascial, que é uma seco para dor cervical19,20, dor temporoman-
síndrome comum e subdiagnosticada na po- dibular13,21, lombalgia22, cefaléia23 e outras
pulação.13-16 Consiste em dor em músculos de dores locorregionais.
Quadro 34.2 - Critérios diagnósticos da
SDM (Síndrome Dolorosa Miofascial) BLOQUEIOS ANESTÉSICOS
Critérios maiores Critérios menores Anestésicos locais podem, além de cau-
Bandas de tensão
Evocação da reação sar anestesia, agir diretamente sobre outros
contrátil visualmente ou à
muscular
palpação
receptores e suas vias de sinalização que
Dor intensa nos PGs em Reação contrátil ao
estão envolvidos nos processos de inflama-
uma banda de tensão agulhamento dos PGs ção, ativação plaquetária, nocicepção e dor
Demonstração periférica.24 Bloqueios anestésicos permitem
eletromiográfica de
Reprodução da dor à
atividade elétrica
tratamento da dor com redução da polifar-
pressão do nódulo
característica de nódulo mácia e promove uma analgesia a curto e mé-
doloroso
doloroso em uma banda de dio prazo.25,26 Essa técnica é aplicável a uma
tensão
ampla variedade de condições, tais como
Anormalidade sensitiva na
Limitação da ADM
distribuição de um PG à síndrome dolorosa miofascial26, síndrome
decorrente da dor
compressão correspondente complexa de dor regional27, dor nociceptiva,

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Capítulo 34 - Contribuição da medicina física e de reabilitação na abordagem do paciente em cuidados paliativos

como osteoartrose de quadril25 e lombalgias, A incidência de resistência à droga por


inclusive por fratura patológica.28 As técnicas produção de anticorpos é de 1 a 5%.
variam de acordo com o local e objetivo. Em Preconiza-se um intervalo mínimo en-
geral, o procedimento pode ser realizado à tre as aplicações de 3 meses, a fim de
beira do leito ou ambulatoriamente. Utiliza- evitar esta resistência.31
se na maioria dos casos lidocaína a 0,5-1%, Efeitos colaterais:
sem vasoconstrictor, mas outros anestésicos • Relacionados à indicação /dose/técnica
podem ser utilizados, a exemplo da bupiva- • Dor local
caína em combinação com clonidina.24 A téc- • A lergia
nica deve ser limpa nos bloqueios musculares • Sintomas influenza like
e asséptica nos demais bloqueios. Na infiltra- Contra indicações:
ção de ponto gatilho, fixa-se a área de tensão • Doença do neurônio motor
muscular exatamente como na técnica do • Gravidez e lactação
agulhamento seco. Então, transfixa-se a pele • Infecção local
até chegar ao centro do ponto de tensão mus- • CI relativas: uso de aminoglicosídeos,
cular, quando o paciente em geral sente um cloroquina.
desconforto. Por vezes, é possível visualizar Indicações:32-46
a contração muscular involuntária (twitch). • Estrabismo
Após a aspiração, infiltra-se o anestésico, de • Blefaroespasmo
forma estática ou em leque. Em média, inje- • Espasmo hemifacial
ta-se 2 ml da solução. Podendo chegar a 4 ml, • Distonias
como na técnica do bloqueio anestésico de • Dissinergia detrusora
Fischer.29 A curva de aprendizado é rápida. • Espasticidade
Há vários atlas e manuais de bloqueios anes- • Hiperidrose
tésicos, bem como treinamentos, para habi- • Migrânea crônica
litar o médico a agregar essa ferramenta no • Bruxismo / trismo
tratamento de dor. • Hipercontratilidade do esfincter anal
interno
TOXINA BOTULÍNICA • Acalasia
Descrita pela primeira vez em 1989, trata- • Sialorréia
se de uma neurotoxina produzida a partir da • Dor
fermentação do Clostridium botulinum, uma No contexto do paciente em Cuidados Pa-
bactéria anaeróbia, gram-positiva.30,31 liativos, a toxina pode ser considerada como
Ações: opção terapêutica nas seguintes situações:
• Inibe a liberação de acetilcolina na fen- dor32-35, espasticidade36-40, distonias, trismo
da sináptica. Não modifica a condução 41,42
, sialorréia 43-46. Condições que gerem des-
elétrica ou a síntese da acetilcolina, sen- conforto, disfunção ou risco de deformidades.
do assim promove a redução da contra-
ção muscular sem causar paralisia.31 PRESCRIÇÃO DE EXERCÍCIOS
• Ação inibitória em nociceptores, pro- A prescrição de exercício físico deve ser
movendo a inibição da liberação de sempre individualizada, de acordo com as
neuropetídeos (glutamato, substância variáveis fisiológicas, respeitando os limites
P,CGRP) responsáveis pela neurotrans- funcionas, de cada paciente. Após a liberação
missão e sensibilização das vias perifé- médica, a prescrição deverá conter: adequa-
ricas e centrais da dor, resultando em ção ao tipo de atividade física, duração, in-
ação antinflamatória e analgésica.32-35 tensidade e frequência do exercício. Impor-
O início de ação da droga é de 7 dias tante não sobrecarregar com o excesso de
após a aplicação, com pico em 15 dias. exercícios e sempre disponibilizar um tempo
A duração do efeito é de 4 a 6 meses. de recuperação como uma terapia nutricional

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Capítulo 34 - Contribuição da medicina física e de reabilitação na abordagem do paciente em cuidados paliativos

adequada. Uma forma interessante e já bem e/ou auxiliar função.58 Órteses de posiciona-
descrita é alternar os exercícios anaeróbios, mento devem ser prescritas para prevenir
que visam o aumento da resistência e força deformidades, sobretudo em pacientes com
muscular com os exercícios aeróbios, que atitudes articulares indesejadas que induzem
visam a melhora do condicionamento car- contratura em pouco tempo. A contratura,
diovascular.47 A Atividade Física tem atraído por sua vez, pode causar dor e dificuldades
interesse na área dos Cuidados Paliativos48. de higiene, por exemplo. Uma órtese de posi-
Tem sido demonstrado que a funcionalidade cionamento, como é o caso da suropodálica,
assim como a função física estão entre os de- pode auxiliar na função da marcha concomi-
terminantes mais importantes na qualidade tantemente.59,60 A imobilização é útil no caso
de vida dos pacientes em Cuidados Palia- de fratura patológica, como metástases verte-
tivos.49,50 brais que gerem instabilidade da coluna.
Dentre os sintomas mais comuns que os Auxiliares de locomoção são prescritos
pacientes enfrentam estão a perda da função para compensar alterações como dor, fadi-
física e a funcionalidade, de etiologia multi- ga, déficit de equilíbrio, instabilidade arti-
fatorial. A fadiga, juntamente com a perda da cular, fraqueza muscular e sobrecarga es-
força muscular, contribui para esses fenôme- trutural. A bengala tem como propriedade
nos.51,52 A importância de ser manter móvel aumentar a base de apoio e adiciona infor-
está ligada a manutenção da independência mação sensorial. Deve ser utilizada na mão
funcional nestes pacientes, e tem-se dado contralateral ao membro inferior afetado e
cada vez mais atenção à atividade física como a altura ideal é no nível do trocante maior,
uma intervenção de qualidade de vida.53 Pu- quando cotovelo fica flexionado entre 20-
blicações recentes têm avaliado programas 30 graus. As muletas tem uma função adi-
de atividade física em pacientes em estágio cional de propulsão e permitem uma maior
terminal.54-57 Após avaliação criteriosa, pro- descarga de peso. A muleta Lofstrand per-
gramas individuais são desenvolvidos para mite uma maior mobilidade em relação às
os participantes utilizando prescrições para axilares, porém não suportam tanta des-
atividade aeróbia, treinamento de força e carga de peso como estas últimas e neces-
equilíbrio.53 Os resultados mostraram uma sitam de um melhor controle de tronco.
melhora emocional e uma redução da fadiga. Ambas devem ser usadas bilateralmente.
55-57
A manutenção da função física e inde- Andadores devem ser prescritos nos casos
pendência nas atividades de vida diária são em que se deseja maior estabilidade e segu-
importantes fatores para pacientes em Cui- rança, no entanto limitam a reciprocação
dados Paliativos. Mais estudos são necessá- de membros inferiores e a velocidade da
rios para investigar o potencial benefício das marcha. 58
modalidades de exercícios na qualidade de A cadeira de rodas consiste em um siste-
vida e funcionalidade.56-57 ma de suporte postural. Não deve ser consi-
derada apenas como um facilitador de trans-
PRESCRIÇÃO DE ÓRTESES, PRÓTESES, porte, e sim um meio terapêutico. A cadeira
AUXILIARES DE MARCHA, CADEIRAS DE adequada favorece a interação com o meio,
RODAS previne deformidades e desconforto, favo-
O conhecimento para a prescrição de rece as funções de comunicação, respira-
meios auxiliares, cadeira de rodas, órteses, ção e deglutição.61,62
adaptações e mobiliários para pacientes em Componentes da prescrição de cadeira :61,62
Cuidados Paliativos é útil não só na preser- • Base estrutural.
vação da função residual, mas também para • Assento.
conservação de energia e segurança.58 • Encosto.
As órteses podem atender a 3 propósitos • Apoio de membros superiores.
básicos: imobilização, prevenir deformidades • Apoio para membros inferiores.

305

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Capítulo 34 - Contribuição da medicina física e de reabilitação na abordagem do paciente em cuidados paliativos

• Aro. 8. LEE SJ, LINDQUIST K, SEGAL MR,


• Adaptações: Compensações para defor- COVINSKY KE. Development and va-
midades; apoio de tronco, cabeça, pés lidation of a prognostic index for 4-year
• Acessórios: Almofadas, aros de propul- mortality in older adults. JAMA. 2006.
são, suportes. 295(7):801-8.
Todo recurso como órteses, próteses, ca- 9. 
NEWMAN AB, ARNOLD AM, SA-
deira de rodas ou auxiliares de marcha exi- CHS MC, IVES DG, CUSHMAN M,
gem treino com profissional especializado, STROTMEYER ES, DING J, KRIT-
para garantir a adaptação e o uso adequado CHEVSKY SB, CHAVES PH, FRIED
do mesmo. LP, ROBBINS J. Long-term function
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physical activity trials in cancer sur-

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Espiritualidade e cuidados
paliativos em idosos 35
CAPÍTULO

Ana Paula Maeda de Freitas


Clarice Cavalero Nebuloni
Denise Piva
Lia Antonioli
Thaila Maki Hiraga

INTRODUÇÃO penúltimo lugar quanto à oferta de Cuida-


O Brasil começa a acordar para a inver- dos Paliativos3.
são da pirâmide demográfica. Hoje o número Dentro da perspectiva holística do cui-
de pessoas com mais de 60 anos ultrapassa dado, que envolve as dependências físicas,
20 milhões1. De acordo com as projeções, psicológicas e espirituais, enfocamos a di-
em 2025 o Brasil será o 6º país do mundo mensão espiritual da vida humana presente
quanto ao contingente de idosos, alcançan- na relação entre cuidador e cuidado.
do 32 milhões de indivíduos com 60 anos ou
mais2. Diante destes números, alguns ques- DIMENSÃO HOLÍSTICA E ÉTICA
tionamentos adquirem visibilidade notória e EM CUIDADOS PALIATIVOS
passam a incluir a agenda de discussões so- De acordo com Andrade, “o cuidador é o
bre ações direcionadas ao atendimento às ne- indivíduo que exerce a função de cuidar, isto
cessidades básicas e principalmente voltadas é: realiza determinadas atividades direciona-
para o bem-estar desta população. das ao cuidado pessoal de outrem que apre-
Neste capítulo nos propusemos a levantar senta certo grau de dependência”4. Segundo
alguns aspectos relacionados ao cuidado di- Mendes, os cuidadores podem ser classifica-
rigido ao indivíduo doente com mais de 60 dos de acordo com os papéis executados ou
anos, em situação de finitude, sendo atendi- com a função realizada, podendo ser deno-
do em instituições hospitalares ou em domi- minados: cuidador formal, informal, princi-
cílio por cuidadores, enquanto profissionais pal, secundário, voluntário e familiar5.
paliativistas ou não, de acordo com a atual A atuação do cuidador está diretamente
realidade brasileira. relacionada com o que a Organização Mun-
Importante ressaltar que, em um estudo dial da Saúde definiu em relação ao conceito
realizado pelo Economist Intelligence Unit, de Cuidados Paliativos nos seguintes termos:
entre os países pesquisados o Brasil ocupa o “são cuidados ativos e totais do paciente cuja

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Capítulo 35 - Espiritualidade e cuidados paliativos em idosos

doença não responde mais ao tratamento nar o máximo de conforto ao paciente sob
curativo. Trata-se de uma abordagem de cui- Cuidados Paliativos, ajudando-o a vivenciar
dado diferenciada que visa melhorar a qua- o processo de morrer com dignidade, para
lidade de vida do paciente e seus familiares que utilize da melhor forma possível o tempo
por meio da adequada avaliação e tratamento que lhe resta. Isto significa ajudar o ser hu-
para alívio da dor e sintomas, além de pro- mano a buscar qualidade de vida, quando
porcionar suporte psicossocial e espiritual” 6. não é mais possível acrescer quantidade 10.
Entendemos que muitos dos Cuidados Tal situação leva a uma busca por tera-
Paliativos aplicam-se perfeitamente à me- pias alternativas e um modelo de assistência
dicina curativa, bem como, por outro lado, à saúde integral, o qual visualiza o ser hu-
o desenvolvimento dos Cuidados Paliativos mano na sua totalidade, nos aspectos biop-
dentro de uma visão holística pode influen- sicossociocultural e espiritual, inseridos no
ciar positivamente outras formas de cuida- contexto de vida, com suas crenças, valores e
dos de saúde, ao valorizar aspectos que fica- características que precisam ser valorizados
ram em segundo plano, a partir do domínio em uma conduta terapêutica multiprofissio-
da medicina científico-tecnológica, tais como nal, semelhante ao que acontece na medicina
as dimensões humanas e ético-espirituais da oriental há milênios 11,12,13.
pessoa humana 7. As intervenções de cuidado com o pa-
Uma ética do cuidado e das virtudes apre- ciente se apresentam permeadas pela pos-
senta-se como apropriada e necessária em tura frente ao morrer: “como o ser-cuida-
Cuidados Paliativos. A ética do cuidado en- dor percebe o ser-que-precisa-ser-cuida-
fatiza essencialmente a natureza vulnerável do”. Pela compreensão da possibilidade
e dependente dos seres humanos. Portanto, existencial do não-ser (morte) é que os
enfatiza que a ética não somente diz respeito médicos, enfermeiros, fisioterapeutas, psi-
ao processo de decidir, mas envolve a quali- cólogos, entre tantos outros profissionais
dade das relações, tais como continuidade, que trabalham com o paciente fora de pos-
abertura e confiança. A ética das virtudes sibilidades terapêuticas ou em estado grave
critica o enfoque ético baseado nas decisões a poderão experienciar o cuidado autêntico
partir do caráter, enfatizando a importância com este ser que adoece podendo se com-
de ações virtuosas 8. prometer com uma assistência que não vise
Seguindo os quatro princípios definidos única e exclusivamente à cura, mas que fa-
por Beauchamp e Childress, ou seja, o res- voreça o cuidado do paciente como um ser
peito pela autonomia, beneficência, não ma- pleno de humanidade, com necessidades
leficência e justiça, bem como em todas as afetivas, sociais e com o direito de viver seu
outras áreas dos cuidados de saúde, os médi- morrer com dignidade e respeito. Nesse
cos e outros profissionais do cuidado devem sentido, a filosofia de Cuidados Paliativos
respeitar a autonomia do paciente ao concor- pode se apresentar como um caminho para
darem com as prioridades e objetivos do cui- melhor assistir a pessoa em seu morren-
dado com os pacientes e cuidadores, não es- do, pois, segundo esta proposta, o cuidar é
conder a informação desejada pelo paciente sempre possível, ainda que a cura não faça
e respeitar os desejos do paciente de não ser parte de seu horizonte de possibilidades 14 .
tratado quando o tratamento simplesmente
nada mais faz do que prolongar o processo ESPIRITUALIDADE E
do morrer 7,9. CUIDADOS PALIATIVOS
Como afirmamos anteriormente, as di-
ATUAÇÃO DA EQUIPE DE mensões da espiritualidade são vistas hoje
CUIDADOS PALIATIVOS como ferramentas integrantes dos cuidados
A atuação da equipe interdisciplinar é em uma perspectiva holística de atendimen-
primordial e indispensável para proporcio- to integral e abrangente.

312

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Capítulo 35 - Espiritualidade e cuidados paliativos em idosos

Entendemos que a espiritualidade é uma O cuidado espiritual é um domínio es-


reflexão sobre o significado de vida. É a ca- sencial de qualidade dos Cuidados Palia-
pacidade do indivíduo de se ligar consigo tivos, de acordo com o National Consensus
mesmo, com as outras pessoas e com um ser Project (NCP) for Quality Palliative Care,
superior, de transcender a si mesmo, ao tem- sendo abordadas sete categorias baseadas em
po e ao espaço, ou a capacidade da atenção evidências: avaliação espiritual, modelos de
e do cuidado com as gerações mais jovens, cuidado espiritual, planos de tratamento es-
com as pessoas em geral e com o mundo em piritual, treinamento da equipe interdiscipli-
que vive. Ela transcende ideologias, dogmas nar, melhoria da qualidade, desenvolvimento
e instituições. Funciona como recurso inter- pessoal e profissional e certificado 19.
no do indivíduo acionado pelo contato com a
natureza, com as artes, com a experiência de CUIDADOS PALIATIVOS E
doação de si ou engajamento em causas que ESPIRITUALIDADE EM IDOSOS
visam o bem coletivo 15. Existe considerável evidência que as pes-
A espiritualidade constrói-se nos contex- soas idosas sofrem desnecessariamente em de-
tos socioculturais e históricos, estruturando corrência de uma falta de avaliação ampla, tra-
e atribuindo significado a valores, comporta- tamento adequado de seus problemas e acesso a
mentos e experiências humanas, e por vezes programas de Cuidados Paliativos 20.
materializa-se na prática de um credo reli- Numa perspectiva integradora, os Cuida-
gioso específico. A interligação entre a reli- dos Paliativos e os valores fundamentais da
giosidade/espiritualidade e a saúde remonta geriatria coincidem: o paciente está no centro
aos primórdios da história, em que os po- dos cuidados, a perspectiva é de uma aborda-
deres da “cura” estavam nas mãos que lida- gem interdisciplinar, holística e compreen-
vam com o espírito (sacerdotes, xamãs, etc), siva, além de paciente e família serem vistos
a quem era reconhecido saber para tratar os como uma única unidade de cuidados. Uma
males do corpo 16. prioridade é garantir na medida do possível
Assim é que atualmente as relações entre a independência funcional e qualidade de
a espiritualidade e a saúde emergem como vida, avaliação regular e formal que assegure
uma área relevante na investigação atual, a identificação e tratamento das intercorrên-
tanto no âmbito das ciências humanas como cias no momento certo 7.
das ciências naturais 17,18. Contudo, não se A dimensão do cuidado inclui fenômenos
encontra consenso na literatura sobre o con- vitais como as experiências espirituais, filosó-
ceito de espiritualidade, sendo que muitas ficas, éticas e morais. Enquanto estamos cui-
vezes surge numa associação direta a prática dando, mobilizamos sentimentos nossos e da
de uma religião. No entanto, a religiosidade pessoa a qual estamos assistindo como a força
e a espiritualidade são conceitos diferentes. vital, a energia e a alma. Esse enfoque torna
A religiosidade refere-se ao grau de partici- mais explícito que o processo de cuidar impli-
pação e adesão às crenças e práticas de um ca uma relação existencial e espiritual 21.
sistema religioso 18. O conceito de espirituali- A espiritualidade e a religiosidade em
dade é mais amplo do que o de religiosidade. idosos parecem auxiliar positivamente no
A espiritualidade é vista como um processo enfrentamento de eventos de perdas, ou
dinâmico, pessoal e experiencial, que pro- resiliência, decorrentes do processo de en-
cura a atribuição e significado no sentido da velhecimento, como a perda financeira, de
existência, podendo coexistir ou não dentro um corpo saudável, da sua independência
da prática de um credo religioso 18. Assim e autonomia, de familiares e amigos e da
alguns autores sugerem que a religião é ins- vida em si 22,23. Há evidências que indicam
titucional, dogmática e restritiva, enquan- que várias dimensões da espiritualidade
to que a espiritualidade é pessoal, subjetiva e religiosidade podem melhorar o estado
e enfatiza a vida 17. subjetivo de bem-estar, diminuir os níveis

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Capítulo 35 - Espiritualidade e cuidados paliativos em idosos

de depressão e angústia e reduzir a morbi- sentem deste enfrentamento temendo olhar-se


dade e a mortalidade 24 . no espelho da própria finitude 30.
A espiritualidade revela-se um forte in- Em estudo conduzido por Balboni et al.
dicador de resiliência na superação das ad- para determinar fatores que contribuíam
versidades, como capacidade de encontrar para a prescrição infrequente de cuidado es-
significado na vida a partir da fé 23. piritual por enfermeiros e médicos para pa-
Os comportamentos religiosos são bas- cientes em fase terminal nos Estados Unidos,
tante frequentes na idade avançada. Os verificou-se que o primeiro destes fatores
profissionais da saúde que trabalham com seria a raridade de treinamentos. Os autores
estas pessoas devem estar alertas sobre a ressaltam a importância da formação pro-
importância e a função da religião como fissional com as habilidades fundamentais
visão de mundo e estratégia para enfrentar necessárias em cuidado espiritual não só
o estresse 25. de médicos da equipe e o avanço da com-
A espiritualidade e a força que alguns ido- preensão centrada no paciente. Sugerem trei-
sos encontram ao expressar a sua fé religiosa namentos de rotina com coleta da história
podem explicar o por que deles não se depri- espiritual, os papéis de cada profissional na
mirem e serem capazes de manter a esperan- equipe, engajamento entre paciente e profis-
ça, enfrentando eficazmente doenças como sional nas práticas espirituais como orações,
câncer 26. A fé em Deus cresce quando as pes- sempre reconhecendo a existência de visões
soas ficam mais velhas, aumentando assim a diferentes sobre espiritualidade 31.
leitura da Bíblia e participação em cultos 27. No Brasil especificamente, ao serem ava-
Outro aspecto que merece destaque diz liados cursos sobre espiritualidade e saúde
respeito às situações que envolvem o cuidar em escolas médicas públicas e privadas, ape-
de pessoas idosas em estado terminal de vida. nas 40% apresentaram cursos ou conteúdos
Nestas situações, torna-se muito importante sobre o assunto nos currículos, mesmo sendo
que o profissional esteja preparado, auxilian- um país religioso/espiritual. Infelizmente,
do através do diálogo e da escuta no processo o ensino sobre espiritualidade e saúde não
de aceitação da doença, minimizando me- é padronizado e poucas escolas oferecem a
dos, oferecendo apoio e conforto ao paciente oportunidade aos alunos para realmente pra-
e a família. Nesses momentos em que a cura ticarem o que aprendem 32.
do corpo não é mais alcançável, Huf (2002) Em uma revisão bibliográfica verificou-se
destaca a importância do resgate da espiri- o predomínio de estudos relacionados à saúde,
tualidade como meio de transformar os mo- medicina e espiritualidade nas escolas médicas
mentos de angústia, respeitando as crenças norte-americanas e canadenses. Poucos estu-
da pessoa, priorizando a busca pela paz inte- dos foram encontrados na Europa, América
rior, procurando promover o bem-estar, ape- Latina e Ásia, e há uma carência de pesquisas
sar da inevitabilidade do sofrimento. A auto- sobre esse campo na África e Austrália 33.
ra considera que vivenciar a espiritualidade Em um das mais prestigiadas bases de da-
inclui exercitar a fé, a esperança, o altruísmo, dos médica, chamada Scielo (Scientific Elec-
a solidariedade, aceitando a finitude como tronic Library Online – http://www.scielo.
uma experiência que propicia sensibilizar-se br/), usando a palavra de busca “espirituali-
com o outro e encontrar um significado para dade” foram encontrados 0 artigos em 1999,
a sua própria existência 28,29. 7 artigos em 2005 e 18 artigos em 2010 32.
Resgatar o humano dentro do processo de Novos estudos e currículos com espiritua-
morte e do morrer, embora essencial à perspec- lidade e saúde fora da América do Norte são
tiva do cuidado à pessoa e não apenas ao corpo necessários para investigar o papel da espiri-
biológico, não se apresenta como tarefa fácil, tualidade na saúde global e a melhor forma de
visto que os seres humanos como um todo e os resolver esta questão importante na educação
profissionais da saúde em sua maioria se res- médica mundial e nos cuidados clínicos 33.

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Capítulo 35 - Espiritualidade e cuidados paliativos em idosos

noticias/2010/07/100714_qualidade_mor-
CONSIDERAÇÕES FINAIS te_ir.shtml?print=1.
Diante das evidências apresentadas em 4. ANDRADE L. DESVELOS. Trajetórias no
pesquisas atuais e da definição da Organi- limiar da vida e da morte. Cuidados palia-
zação Mundial da Saúde no que se refere ao tivos na assistência domiciliar. Holambra:
suporte psicossocial e espiritual oferecido Editora Setembro. 2011.
no cuidado paliativo, enquanto abordagem 5. MENDES PBMT. Cuidadores: heróis anô-
diferenciada e holística com melhoria da nimos do cotidiano. Dissertação de mestra-
qualidade de vida e alívio da dor e sintomas, do em Serviço Social. PUC/SP, 1995.
considera-se de fundamental importância a 6. World Health Organization. Definition os
ênfase na abordagem espiritual no tratamen- Palliative Care Geneva. 2006. Disponível
to de pacientes com mais de 60 anos. em: www.who.int/cancer/palliative/defini-
Entendemos também que cuidador e tion/en.
cuidado envolvem-se em uma dimensão 7. PESSINI L; BERTACHINI L. Novas pers-
que inclui valores éticos e fenômenos vitais, pectivas em Cuidados Paliativos: ética, ge-
como as experiências espirituais, pois duran- riatria, gerontologia, comunicação e espi-
te o cuidado são mobilizados sentimentos e ritualidade. O mundo da saúde. São Paulo,
forças interiores que tornam explícito que o 2005. 29(4):491-509.
processo do cuidar implica em uma relação 8. PESSINI L. Envelhecimento e dignidade
existencial e espiritual. humana: ame o(a) idoso(a) que você é ou
Assim, em uma proposta de ampliar ho- está nascendo em você! In Pasqualotti A,
Portella MR, Tetinelli La, organizadores.
rizontes e construir novos rumos para a qua-
Envelhecimento humano: desafios e pers-
lidade do atendimento e reconhecendo os
pectivas. Passo Fundo: Universidade de
evidentes benefícios do cuidado espiritual,
Passo Fundo. 2004.
enquanto domínio essencial no cuidado pa- 9. BEAUCHAMP T; CHILDRESS J. Prin-
liativo oferecido ao idoso que desta forma cípios de ética biomédica. São Paulo:
pode alcançar melhores estados subjetivos de Loyola, 2002.
bem-estar, diminuindo consequentemente 10. ARAÚJO MMT; SILVA MJP. A comuni-
os níveis de depressão e angústia, é que nos cação com o paciente em Cuidados Palia-
debruçamos sobre este tema não para esgo- tivos: valorixando a alegria e o otimismo.
tá-lo, mas com a proposta de que ele sirva de Rev Esc Enferm USP. 2007. 41(4):668-74.
reflexão para estudos futuros. 11. VASCONCELOS, EM. A espiritualidade
no cuidado e na educação em saúde. São
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de 190.755.799 pessoas. Disponível em: 2010. 4(3):49-55.
http://www.ibge.gov.br/home/presidencia/ 13. PANZINI RG, ROCHA NS, BANDEI-
noticias/noticia_visualiza.php?id_noti- RA DR, FLECK MPA. Qualidade de vida
cia=1866&id_pagina=1. e espiritualidade. Rev Psiq Clín. 2007.
2. Ministério da Saúde. Portal da saúde, 2012. 34(1):105-115.
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sobre idoso. Disponível em: http://por- em situação de morte: algumas reflexões.
talsaude.saude.gov.br/portalsaude/noti- Simpósio: Morte: valores e dimensões.
cia/7533/162/brasil-integrara-pesquisa-in- 2005. 38(1):49-54.
ternacional-sobre-idoso.html. 15.  SOMMERHALDER, C.; GOLDSTEIN,
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ranking de qualidade de morte. Disponí- sidade na vida adulta e na velhice. Tratado
vel em: http://www.bbc.co.uk/portuguese/ de geriatria e gerontologia. Ed.2. Rio de

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Capítulo 35 - Espiritualidade e cuidados paliativos em idosos

Janeiro: Guanabara Koogan. 2006. Coletiva. 2008. 05(24):173-77.


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L; Bertachini L. Novas perspectivas em disciplinar que atua em Cuidados Paliati-
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Atuação do assistente social enquanto
mediador no processo de luto 36
CAPÍTULO

Dayane Alves da Silva


Ismária Carvalho Dos Santos
Marcela Teodoro Lazarini
Naira Dutra Lemos

“o luto exprime socialmente a inadaptação à a cultura e religião das sociedades. Alguns


morte, mas, ao mesmo tempo, ele é [...] pro- estudiosos abordam as variações de atitudes e
cesso social de adaptação que tende a fechar ideologias do homem diante desse processo e
a ferida dos indivíduos sobreviventes”. ressaltam que tais mudanças incidiram lenta-
Morrim1 mente, passando por períodos de estabilidade.
Segundo Ariès1 (1982) na idade média a
Neste capitulo discorremos sobre o papel morte era vista como algo simples, natural
do assistente social na assistência ao luto e e justo, destino de todo ser vivo. Quando o
desdobramentos advindos da morte. indivíduo a pressentia, recolhia-se em seu
Inicialmente, trazemos um breve resga- ambiente familiar, preparava-se acompanha-
te histórico das mudanças na visão acerca do de seus familiares e amigos, pedia perdão
da morte objetivando compor elementos por suas culpas e legava seus bens. O doente
para compreender as manifestações huma- cumpria um ritual de morte, desprendido de
nas diante do processo de morte na socie- caráter dramático.
dade contemporânea. De acordo com o mesmo autor, a partir do
Posteriormente, abordamos aspectos con- século 18 o homem começa a pensar na mor-
ceituais sobre o luto e a vivência desse proces- te do outro, do individuo que compartilha o
so que embasam nossa discussão sobre a atua- seu cotidiano e o foco passa a ser na família:
ção profissional. essa transformação ocorre devido à mudan-
ça na concepção de família, a qual passa a
REPRESENTAÇÕES DA MORTE E O LUTO ser baseada no afeto. Inaugura-se o culto ao
Ao longo do processo histórico a visão cemitério, e a morte passa a ser enxergada
da humanidade a respeito da morte passou como uma vilã que cumpre a função de banir
por profundas transformações e sua repre- o homem de sua família, de sua vida. Nesse
sentatividade varia também de acordo com período o luto era exagerado, dramático.

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Capítulo 36 - Atuação do assistente social enquanto mediador no processo de luto

Na eminência da morte, afixava-se um expulsa. Em contrapartida, os países


aviso de luto na entrada da casa, costume que predominantemente rurais, que, aliás,
substituía a exposição do corpo ou do caixão eram muitas vezes católicos, permane-
à frente da porta. Com a casa fechada manti- ceram-lhes fiéis. O interdito da morte
nha-se aberta apenas uma entrada, passagem parece ser solidário com a moderni-
por onde dade, acompanhando os progressos da
industrialização, da urbanização e da
“[...] entravam todos os que, por ami- racionalidade. A sociedade produziu
zade ou convenção, se sentiam obri- os meios eficazes para se proteger das
gados a uma última visita. Seguia-se tragédias quotidianas da morte, a fim
um longo desfile de pêsames, um lento de ficar livre para prosseguir em suas
cortejo, saudado à passagem, acompa- tarefas sem emoções nem obstáculos.
nhava o caixão ao cemitério; dos pa- Três fenômenos acompanham o trata-
rentes e amigos à família[...]. Depois, mento da morte na modernidade, se-
lentamente, a vida retomava seu curso gundo os sociólogos e historiadores da
normal e já não restavam senão visitas morte, quais sejam:
espaçadas ao cemitério. O grupo social
tinha sido atingido pela morte e reagi- 1. A ocultação da morte, isto é, o seu
ra coletivamente, a começar pela famí- banimento da sociedade. Tudo ocor-
lia mais próxima, estendendo-se até o re como se a morte não existisse, e tal
círculo mais amplo das relações e das ideia é veiculada pelos meios de comu-
clientelas. [...] não era apenas um indi- nicação de massa.
víduo que desaparecia, mas a socieda- 2. A transferência para o hospital,
de que era atingida e que precisava ser onde a morte é escondida.
cicatrizada”. (Áries, 1982, p. 612-613)2 3. A extinção do luto.

Em meados do século 19, a morte se Se a morte priva de sentidos a vida, ela


transforma em tabu, o doente assume papel própria deve ser banida para o bem de to-
de vítima, alguém que deve ser poupado de dos. Estes estudos subsidiam nossas reflexões
conhecer a gravidade de sua doença, pou- quanto ao entendimento das manifestações
pando-o da exposição. E com o transcorrer do luto, demonstradas recorrentemente por
do tempo já não se morre mais em casa, mor- usuários e seus familiares nos serviços em
re-se no hospital; e, se antes a morte era pú- que atuamos. Reações de perplexidade e
blica, agora se torna privada, propriedade da ceticismo podem ser compreendidas como
medicina. reflexo da ideologia moderna, que esconde,
Em “O recalcamento da morte na con- maquia e extingue a morte do nosso campo
temporaneidade”, TAMURA2 diz que: visual cotidiano.

[...] até o começo do século XX, as DEFININDO O LUTO


funções atribuídas à morte e à atitu- O luto é a fase da intensa expressão de
de diante da morte eram praticamen- sentimentos em consequência da perda.
te as mesmas em toda a extensão da Conforme ideias apresentadas por Parkes3
civilização ocidental. Esta unidade (1998, p.199), é a fase de aperceber-se, de
foi rompida após a Primeira Guerra tornar real o fato da perda ou conjunto de
Mundial. As atitudes tradicionais fo- reações diante de uma perda de algo ou al-
ram abandonadas pelos Estados Uni- guém, também definido como a “Sucessão
dos e pelo noroeste da Europa indus- de quadros clínicos que se mesclam e se
trial, sendo substituídas por um novo substituem” (Ibd. p.23).
modelo do qual a morte foi como que

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Capítulo 36 - Atuação do assistente social enquanto mediador no processo de luto

Sua dor “é tanto parte da vida quanto a Há situações em que os indivíduos se pre-
alegria de viver; é talvez o preço que pagamos param para a morte que se aproxima e outros
pelo amor, o preço do compromisso” (Ibd. p.23). investem total energia na sobrevivência, sen-
do ambivalentes os sentimentos. Esse prepa-
Esse processo é mesclado por diferen- ro não é somente para a morte como evento
tes fases, conforme apresentado na obra final, mas para todo o processo de morrer.
de ROSS (1996). São elas: negação e isola- Em pacientes com prognósticos sem pos-
mento (primeiro estágio), falar da dor evi- sibilidade de cura pode-se falar no luto de si
dencia o fato que se quer esquecer; raiva mesmo. Isto é, perda de si e a perda da pessoa
(segundo estágio), expresso por compor- que se era e das relações construídas ao longo
tamentos agressivos; barganha (terceiro da vida. Fonseca (2004) citado por Kovacs et
estágio), faz-se promessas, juramentos de al, 2009, p.228 5,
troca de algo significativo para o indivi-
duo em troca da vida; depressão (quarto Pacientes sem possibilidades de trata-
estágio), sensações de tristeza, profunda mento curativo também lidam com a
angústia; e aceitação (quinto estágio), vi- perda das pessoas a quem ama as per-
sualização de novas possibilidades e ca- das temporárias, as quais ocorrem, por
minhos a serem explorados. conta das hospitalizações e as perspecti-
Essas etapas classificadas pela autora va das perdas definitiva a separação por
podem ser sucessivas, refratárias e conco- morte, deixando as pessoas queridas.
mitantes. Há que se ter cautela ao classi-
ficá-las, pois se manifestam subjetivamen- Trabalhar o luto antecipatório possibilita
te. Os sentimentos podem mostrar-se de a elaboração da perda antes da morte. E esse
diversas formas e em momentos distintos. processo poderá diminuir o sofrimento e os
Intrínsecos aos atores envolvidos no pro- mais doloridos sentimentos decorrentes da
cesso de morte, sendo pacientes, familia- perda dos nossos entes queridos.
res, amigos e profissionais. Seguindo as ideias do autor citado, a ela-
Ressaltamos que “Vivenciar o luto é o boração de cada um desses processos neces-
processo que ocorre antes da morte. É o que sita de tempo e de envolvimento, semelhan-
acontece quando no processo de doença as tes ao processo de luto que se instala quando
perdas já estão sendo vividas antes da mor- se perde alguém próximo.
te, tanto pela pessoa quanto pelos familiares” Por meios das ideias destes autores, que
(Kovacs4, 2009, p. 227). definem e desenham os diferentes retratos
Esse processo, segundo Rolland (1991) presentes no processo do luto, bem como
citado por Kovacs et al 2009, p. 227 5a, é de- afirmam a importância da elaboração e do
nominado luto antecipatório, e, no cuidado a envolvimento no ato de vivenciar o luto, al-
familiares de pacientes com doenças graves, cançamos a compreensão necessária para
crônicas, degenerativas e sem possibilidade visualizar o espaço que o profissional assis-
de cura, desdobram tarefas advindas de cada tente social ocupa em um serviço de saúde
etapa do adoecimento. Tais etapas propiciam enquanto membro da equipe multiprofissio-
longos períodos os quais se iniciam no prog- nal. Ainda, enquanto profissional da área da
nóstico, se estendendo ao tratamento, levan- saúde, que trabalha pautado não apenas em
do os familiares à verdadeira exaustão. Nes- seus princípios éticos e legais, mas pautado
te momento a ambivalência de sentimentos em políticas que visam à humanização do
pode se manifestar, como: o desejo da sobre- atendimento, entre outras ações.
vivência do parente e o desejo de sua morte
para o alívio de seu sofrimento. Surgem im- SERVIÇO SOCIAL NA
portantes conflitos, podendo ressaltar a ver- ASSISTÊNCIA AO LUTO
gonha e até mesmo a culpa. O serviço social é reconhecido e legitima-

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Capítulo 36 - Atuação do assistente social enquanto mediador no processo de luto

do como profissão da esfera da saúde, através Assim, podemos destacar dois nichos de
das resoluções do Ministério da Saúde n° 218 atuação profissional:
de 6/3/1997 e do Conselho Federal de Serviço A. Orientações quanto às questões buro-
Social – CFESS n° 383 de 29/03/19995. Estu- cráticas e objetivas.
dos revelam que esta área é uma das prin- B. Acolhimento e escuta qualificada no
cipais empregadoras de assistentes sociais. que tange às questões subjetivas vi-
Assim como em outros campos de atuação, sando contribuir para a facilitação da
na saúde, o serviço social recebe diversas vivência do processo de luto, tanto an-
demandas advindas do contexto social e terior quanto posterior à morte.
econômico. A particularidade do trabalho
neste campo está ligada à atuação pautada na Para compreendermos melhor como se
concepção de saúde multidimensional. Sig- dá o trabalho do assistente social na saúde:
nifica compreender o processo saúde – doen- “na atenção àqueles que sem possibilidade
ça como parte intrínseca aos determinantes terapêutica de cura ou mesmo em fase ter-
biopsicossociais dos indivíduos. minal é fundamental conhecermos algu-
mas características do exercício profissional
(...) Em seu sentido mais abrangente, dessa categoria” (Lemos 2009, p.1158). Cabe
a saúde é a resultante das condições citar as atribuições e competências segundo
de alimentação, habitação, educação, a lei regulamentadora da profissão “Enca-
renda, meio ambiente, trabalho, trans- minhar providências e prestar orientação so-
porte, emprego, lazer, liberdade, acesso cial a indivíduos, grupos e à população” (Lei
e posses de terra e acesso a serviços de 8.662/1993, Art 4º, III)9.
saúde. (Brasil;1986, p.4).6 Sejam em modalidades de atendimento
hospitalar, ambulatorial, ou domiciliar, se faz
Essa perspectiva amplia as possibili- necessário identificar as demandas que nem
dades de intervenção profissional, pois sempre se apresentam de maneira explícita.
não se restringe a ações apenas de cunho Para tanto, um dos instrumentos utilizados
burocrático ou tarefeiro em relação à as- é a avaliação socioeconômica, quando abor-
sistência aos usuários, mas objetiva “[...] damos características da dinâmica familiar,
compreender os aspectos sociais, econômi- do suporte social e econômico, das relações
cos e culturais que interferem no processo pessoais, vínculos com a família nuclear, ex-
saúde-doença, que remetem à busca de tensa ou família não consanguínea etc, para
estratégias para o enfrentamento destas compreendermos a disposição ou ausência
questões”. (Parâmetros para Atuação do da rede de apoio do usuário, a visão do usuá-
Assistentes Sociais na Saúde 2009, Brasí- rio e seus familiares no que se refere ao diag-
lia, CFESS 6). nóstico e suas implicações e de qual prisma
O assistente social deve desempenhar pa- enxergam a possibilidade de morte. E, poste-
pel de ator subsidiário de mediações: de re- riormente, compartilharmos e trabalharmos
flexões que podem auxiliar na elaboração dos conjuntamente com a equipe os aspectos le-
sentimentos presentes no processo de luto vantados diante dos relatos e da nossa per-
dos sujeitos envolvidos (usuário, familiares e cepção profissional. Além disso, “Orientar
a equipe de saúde). indivíduos de grupos de diferentes segmentos
Nesse sentido, ele, enquanto profissional sociais no sentido de identificar recursos e de
habilitado a fazer a análise da conjuntura fazer uso dos mesmos no atendimento e na de-
macro/micro societária e subjetiva dos sujei- fesa de seus direitos” e “Planejar, organizar e
tos atendidos, trabalha com vistas ao enfreta- administrar benefícios e serviços sociais” (Lei
mento das manifestações da questão social7, n°8.662 Art. 4° V e VI)10.
que permeiam o nosso cotidiano, inclusive No momento em que ocorre a morte, os
na morte e em situações que a antecedem. familiares buscam auxílio no que se refere

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Capítulo 36 - Atuação do assistente social enquanto mediador no processo de luto

aos procedimentos objetivos para viabilizar morte que, em determinados pontos de vis-
o sepultamento e às questões dos direitos ta, podem se confrontar com a nossa opinião
previdenciários. enquanto profissionais (que também somos
Ainda, encontramos nos “Parâmetros dotados de valores e princípios). No entanto,
para Atuação de Assistentes Sociais na Saú- enquanto assistentes sociais, nos cabe subsi-
de” que cabe ao profissional: diar as decisões imprimindo nossa opinião
fundamentada em parâmetros profissionais,
Realizar em conjunto com o médico o mas respeitando sempre a subjetividade dos
atendimento à família e/ou responsável usuários e a forma como vivenciam o mo-
em casos de óbito, cabendo ao assistente mento do luto.
social o apoio necessário para o enfren- Muitas vezes nos deparamos com situa-
tamento da questão e, principalmente, ções em que a pessoa que faleceu era a pro-
esclarecer a respeito dos benefícios e di- vedora financeira da família. Familiares que
reitos referentes à situação, previstos no deixaram de trabalhar para exercer papel de
aparato normativo e legal vigente, tais cuidador da pessoa enferma e viviam dos
como os relacionados à previdência so- rendimentos desta advindos de aposentado-
cial, ao mundo do trabalho [licença] e ria e ou benefícios sociais. Como reflexo da
aos seguros sociais [DPVAT], bem como sociedade desigual em que vivemos, um nú-
informações sobre sepultamento gratui- mero significativo de famílias já vive em vul-
to, translado [com relação a usuários de nerabilidade social, situação agudizada após
outras localidades], entre outras garan- o falecimento deste provedor financeiro.
tias de direitos. (CFSS 2009, pag. 28)6 Nesse sentido, o trabalho assume caráter
socioeducativo especialmente no período
O momento da morte de um ente querido que antecede a morte e por meio de relação
é uma situação em que familiares/amigos es- dialógica busca o fortalecimento do indiví-
tão de uma maneira geral fragilizados e des- duo ou grupo para traçar novas perspectivas
norteados quanto aos procedimentos a serem de vida após a morte da pessoa cuidada.
realizados. O ideal é que as orientações bu- Cabe explicitar que não existe uma fór-
rocráticas sejam direcionadas para o sujeito mula ou procedimento fechado da maneira
que dentre os membros que compõem o su- correta de como agir. As condutas não são
porte social (familiares, amigos, instituições, engessadas, variam de acordo com o momen-
comunidade) seja o identificado como o mais to, situação e possibilidades visualizadas no
“preparada para lidar com a situação”. decorrer do atendimento. Porém ressaltamos
Ademais, cabe citarmos o Código de Éti- a importância de se ter clareza das atribui-
ca profissional do Assistente Social de 1993, ções que norteiam a ação profissional, pois
que garante a o assistente social muitas vezes é solicitado
para exercer atividades que não lhe compe-
Plena informação e discussão sobre tem, como convocar o responsável para in-
as possibilidades e consequências das formar sobre óbito.
situações apresentadas, respeitando Destarte, é de extrema importância o es-
democraticamente as decisões dos/as tabelecimento de vínculos com os usuários
usuários/as, mesmo que sejam contrá- e familiares, criando uma comunicação de
rias aos valores e às crenças individuais forma clara, objetiva e acolhedora, de modo
dos/as profissionais [...] (Art. 5º, b)10. a disponibilizar e expor nossos limites e pos-
sibilidades enquanto assistentes sociais.
Cada indivíduo traz elementos constitu-
tivos da sua cultura, religião e religiosidade REFERÊNCIAS
que interferem nas decisões relacionadas aos 1. Morin,E. O homem e a morte. 2. ed.Europa
tratamentos médicos, na forma de enxergar a -América:Mem Martins:, 1988; 80.

321

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Capítulo 36 - Atuação do assistente social enquanto mediador no processo de luto

2. Áries P. O Homem Diante da Morte. Fran- 13 de março de 1993. Publicada no Diário


cisco Alves, 1982. Oficial da União, CFESS, 1997
3. Tamura C. O recalcamento da morte na 7. Brasil. Relatório Final da 8° Conferência
contemporaneidade. Publicação de Alu- Nacional de Saúde. 1986 .[Acessado em 28
nos de Graduação e Pós-Guaruação do de maio de 2013]. Disponível em :http://
Instituto de Estudos da Linguagem – Uni- conselho.saude.gov.br/biblioteca/Relato-
camp [periódicos na internet]. Atualizado rios/relatorio_8.pdf
em 2007. [ Acesso em 09 de jun de 2013]. 8. Moura, Santos, Silva. Serviço Social & Ido-
Disponível em: http://www.unicamp.br/iel/ sos – Materialização dos pressupostos da
site/alunos/publicacoes/textos/r00007.htm. profissão no cotidiano de trabalho na saú-
4. Parkes, CM. Luto: estudos sobre a perda na de, Trabalho de conclusão de curso- PUC
vida adulta. Summus. 1998; 199. 2012 ; 2
5. Kovacs MJ. Perdas e o processo de luto. In: 9. Lemos ND. Cuidados paliativos discutindo
Incontri D, Santos FS, organizadores. A a vida, morte e o morrer. O Serviço Social e
Arte de Morrer- Visões Plurais. Comenius, a Morte;115 -123. Atheneu, 2009 -115.
2009; 227-228 10. LEI N° 8.662, DE 7 DE JUNHO DE 1993.
6. CONSELHO FEDERAL DE SERVIÇO SO- [Acesso em 30 de maio de 2013] Dispo-
CIAL (CFESS). Código de Ética profissio- nível em: http://www.planalto.gov.br/cci-
nal do assistente social. Resolução n.273, de vil_03/leis/L8662.htm

322

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Parte 6
Cuidados paliativos em situações específicas

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Cuidados paliativos
nas demências avançadas 37
CAPÍTULO

Ana Beatriz Galhardi Di Tommaso


Kátia Emi Nakaema

Podemos definir as demências como sín- demência de Alzheimer, que corresponde a


dromes adquiridas caracterizadas por sig- aproximadamente 60% dos casos, seguida
nificante deterioração das habilidades cog- da demência vascular e demência por cor-
nitivas do indivíduo, que levam ao declínio pos de Lewy. A chamada demência mista,
funcional progressivo e causam extremo im- coexistência de Alzheimer com comprome-
pacto no dia a dia do portador. Apesar de não timento vascular, é também reconhecida
ser uma patologia exclusiva da população ge- como uma grande causa de síndromes de-
riátrica, sua prevalência aumenta muito com menciais em idosos.
a idade, variando de 1% aos 60 anos até mais Na tabela 37.1 trazemos de forma sim-
de 20% aos 85 anos1. plificada a apresentação clínica e as dife-
Não há dados sobre a prevalência de pa- renças neuroanatômicas principais entre as
cientes com diagnóstico de demência no Bra- demências mais prevalentes na população
sil, porém sabemos que a parcela da população geriátrica1.
idosa está aumentando consideravelmente em
nosso país. No último Censo realizado pelo CONCEITO DE SÍNDROME
governo federal em 2010, observou-se um DEMENCIAL AVANÇADA
crescimento na participação relativa da popu- A demência avançada é caracterizada
lação com 65 anos ou mais, que era de 4,8% por comprometimento cognitivo severo,
em 1991, passando a 5,9% em 2000 e chegando inabilidade para deambular, dificuldade de
a 7,4% em 2010. A expectativa é que em 2050, deglutição, anorexia, perda de peso, incon-
29,75% da população brasileira tenha mais de tinência fecal e urinária e perda funcional
60 anos de idade – Quadro 37.12. progressiva, evoluindo com dependência
completa e restrição ao leito. Esse estágio
APRESENTAÇÃO CLÍNICA corresponde a valores do Mini Exame do
DAS DEMÊNCIAS Estado Mental menores que 9 (em uma es-
Muitas condições clínicas e doenças cala que vai até 30 pontos)3.
neurológicas podem se manifestar como Pneumonia e outras infecções, bem como
síndromes demenciais. A mais prevalente problemas alimentares, são as principais
das demências na população geriátrica é a causas de morte desses indivíduos4, todas

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Capítulo 37 - Cuidados paliativos nas demências avançadas

Quadro 37.1 - Projeção da população brasileira com idade acima de 60 anos de 1980 até 2050
32,00

25,60

19,20

12,80

6,40

0,00
1983

1988
1984
1985

2000

2043
1980

1990

2006

2048
1982

1986

1996
1994

1998
1999

2004

2008
2009

2044
1989

2003

2040

2045
1992
1993

2002

2005

2033

2046
2038

2050
1995

2034
2030

2035
1981

1987

2012

2018
2020

2028
2029

2036

2042
2013

2022

2032

2039
2023

2049
1991

2001

2015

2025
2026
1997

2019
2007

2011

2014

2021

2037
2024

2027

2031
2010

2016

2041

2047
2017
Fonte: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE)- Série POP305- Revisão 2008.
Projeção da população – grupos especiais de idade.

Tabela 37.1 - Características dos diversos tipos de demência1


Alzheimer Isquemia Subcortical/ Demência Vascular Demência por Corpúsculos
Demência Vascular secundária a múltiplos de Lewy
infartos cerebrais ou lesão
única em área estratégica
Tipo de demência Cortical Subcortical Cortical Cortical
Alteração de •Comprometimento precoce •Dificuldades na •Variável, de acordo com a •Comprometimento da
memória de memória episódica, recuperação de região acometida memória episódica menos
deficiência posterior de informações armazendas presente nas fases iniciais,
memória semântica torna-se evidente com a
progreção da doença
Manifestações •Distúrbio de linguagem •Retardo psicomotor •Heterogênero, variando •Regra de um ano: menos
principais progredindo para mutismo •Desatenção de acordo com o número, de 1 ano entre o início de
•Desorientação •Síndrome desexecutiva localização e/ou extensão parkinsonismo e demência
visuoespacial e objeto das lesões •Pode progredir mais
•Dificuldades de •Início abrupto, dentro rapidamente do que a
manipulação de objetos de 3 meses de evento doença de Alzheimer
•Reconhecimento de objetos cerebrovascular •Prejuízos executivo e
prejudicado •Progressão gradual visuespaciais precoces
•Disfunção executiva •Flutuações na atenção,
cognição ou o estado de
alerta
Sintomas •Presentes nos casos •Frequentes: depressão, •Alucinações visuais vivas e
neuropsquiátricos moderados e avançados apatia, labilidade detalhadas
emocional •Distúrbio do sono REM
(50%)
Sinais •Podem estar presentes nas •Suave ou sutil: marcha •Sinais neurológicos focais •Parkinsonismo esportâneo
neurológicos fases avançadas: oposição, magnética, perda de evidentes, variando de (75% dos casos)
paratonias, parkinsonismo, reflexos posturais, acordo com a localização •Disfunção autonômica
mioclonia, convulsões incontinência urinária das lesões no início da doença
tônico-clônicas (hipotensão postural que
pode causar síncope e
quedas)
•Sensibilidade a
neurolépticos grave (<50%)
Adaptado de: David Lussier, Marie-Andrée Bruneau, Juan Manuel Villalpando. Management of End-Stage Dementia.
Prim Care Clin Office Pract 38 (2011) 247–2641

consequências diretas do estado de depen- co5-8 e recentemente um grupo do Hebrew Se-


dência funcional completa e imobilidade de- nior Life Institute for Aging Research de Bos-
correntes da própria demência em si. ton (EUA) publicou um artigo que estimou
Diversos estudos demonstraram a alta a mortalidade dessa população de 25% em
mortalidade de pacientes com esse diagnósti- seis meses com média de vida de 1,3 anos4,

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Capítulo 37 - Cuidados paliativos nas demências avançadas

números que podem ser comparados com a Cabe, portanto, ao profissional da área da
expectativa de vida de pacientes com neo- saúde orientar familiares e cuidadores sobre
plasia de mama metastática9 ou insuficiência os passos a serem enfrentados e as possíveis
cardíaca classe funcional IV10. escolhas de cuidados baseando-se sempre na
Não só os indicadores de mortalidade se literatura médica e nos princípios éticos.
assemelham aos dos pacientes com câncer Outros capítulos neste livro abordam de
metastático, como os sintomas que os indiví- forma mais detalhada os diversos aspectos
duos com demência avançada experimentam citados abaixo. Na sequência abordamos de
antes de morrer, dentre eles dispneia, dor e forma mais sucinta as situações clínicas co-
agitação (37.2) 4, 11,12,13. muns nessa fase da vida e o que a literatura
Por conta de todos esses fatos cada vez médica atual traz de recomendação:
mais se enfatiza a importância de uma abor- 1. Ressuscitação Cardiopulmonar: a chance
dagem paliativa exclusiva adequada aos por- de um idoso sobreviver a uma reanima-
tadores de demência avançada, tanto para o ção cardíaca é, em geral, extremamente
bem-estar do paciente quanto de seus fami- baixa (0,8%), exceto se o ritmo cardíaco
liares e cuidadores. for o de fibrilação ventricular e a assistên-
cia for feita imediatamente em ambiente
CUIDADOS E INTERVENÇÕES hospitalar.14 A chance de sobrevivência
ADEQUADAS NO CONTEXTO DAS de um paciente com demência avançada
SÍNDROMES DEMENCIAIS AVANÇADAS neste contexto é praticamente nula. Caso
Não parece haver nada mais polêmico em isso ocorra, o indivíduo passa a sofrer as
geriatria do que as intervenções que devem consequências da reanimação, dentre elas
ou não ser feitas em um contexto de demên- dor, dependência de ventilação mecânica,
cia avançada. Nosso país ainda não tem a dentre outros comprometimentos irrever-
cultura de encorajar que indivíduos saudá- síveis. O curioso, no entanto, é que apro-
veis e sem comprometimento cognitivo ex- ximadamente 45% desses indivíduos ain-
pressem seus desejos de cuidados no final da da são reanimados antes de falecer, versus
vida antecipadamente. Sem uma manifestação 15% dos indivíduos com câncer terminal15.
clara na vida adulta, o idoso demenciado perde a A decisão de não reanimação cabe ao mé-
capacidade de escolher o que gostaria para a sua dico assistente e deve ser antes discutida e
saúde e para a sua vida em função do compro- trabalhada com a família e responsáveis e
metimento cognitivo irreversível que o acomete. não no momento da parada cardíaca.

Quadro 37.2 - Prevalência de sintomas em residentes de instituições


de longa permanência com demência avançada13
Mitchel et al.4 Di Giulio et al.11 Aminioff e Adunsky12
Proporção de pacientes com
Proporção de pacientes Proporção de pacientes
sintomas nos 18 meses que
Detalhes do estudo nos últimos 30 dias de vida na última semana de vida
antecederam sua morte
(estudo retrospectivo) (estudo retrospectivo)
(estudo prospectivo)
Número de pacientes
323 141 71
estudados
Dispneia (%) 46 36 –
Dor (%) 40 46 18
Úlceras por pressão (%) 39 27 70
Agitação (%) 54 20 72
Aspiração (%) 41 – –
Problemas para
86 – 95
se alimentar (%)
Adaptado de: Elizabeth L. Sampson. Palliative care for people with dementia. British Medical Bulletin 2010; 96: 159–17413

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Capítulo 37 - Cuidados paliativos nas demências avançadas

2. A
 limentação por via artificial – sonda GTM, necessidade de contenção, dentre
nasoenteral (SNE)/ gastrostomia (GTM)/ outros. Caso a família mantenha o inte-
nutrição parenteral (NP): talvez esse seja resse em alimentar o indivíduo de forma
o tema mais polêmico quando falamos de artificial, a equipe deve ter cuidado com a
decisões de final de vida no contexto das oferta de grandes volumes e cabe aumentar
demências avançadas. No passado a não os intervalos entre uma dieta e outra para
indicação de sonda nasoenteral ou gas- possibilitar uma melhor digestão do ali-
trostomia era vista como abandono tanto mento ofertado.
por leigos quanto por profissionais da saú- b. Prevenção de úlceras por pressão no final
de. Nas últimas décadas, diversos grupos da vida: O mesmo grupo acima citado pu-
ao redor do mundo dedicaram-se a estu- blicou em outra revista americana de reno-
dar os reais benefícios e os potenciais ris- me recentemente que o uso de alimentação
cos da prescrição de alimentação artificial artificial no final da vida desses indivíduos
no final da vida desses pacientes. Alguns promove aumento do risco de aparecimen-
aspectos levantados na tentativa de escla- to de úlceras por pressão, possivelmente
recer as grandes dúvidas acerca desse tema por conta da necessidade de restrição ao
estão listados abaixo: leito sem que o indivíduo consiga, nesta
a. R
 elação entre alimentação artificial e au- fase, absorver os nutrientes da forma espe-
mento de sobrevida: em recente estudo rada17. Diversos outros estudos já demos-
publicado na revista da Sociedade Ame- traram esse mesmo desfecho18.
ricana de Geriatria, Teno e col. acompa- c. Melhora da qualidade de vida e de sinto-
nharam por oito anos 36.192 indivíduos mas psiquiátricos: não há qualquer evidên-
com diagnóstico de demência avançada, cia que sugira que a alimentação artificial
todos residentes de todas as instituições promova melhora comportamental ou
de longa permanência americanas, com o conforto/qualidade de vida18. Como já des-
objetivo de comparar a sobrevida daqueles crito acima, pode-se até piorar o bem-estar
que foram submetidos à colocação de SNE caso o indivíduo tenha de ser contido ou
ou GTM (1.956 indivíduos) com os que apresente refluxo gastroesofágico em fun-
não receberam nutrição artificial (34.536 ção da dieta.
indivíduos). Não houve qualquer diferen- 3. Hidratação parenteral: por conta da au-
ça estatística com relação à perda de peso, sência de evidências científicas, a decisão
problemas de deglutição, funcionalidade de hidratação por via parenteral cabe aos
e sobrevida. Todos apresentaram os mes- profissionais de saúde e familiares, de
mos desfechos em tempos semelhantes16. acordo com o contexto clínico do idoso.
Isso reforça o fato de que a indicação de Indivíduos desidratados com desconfor-
alimentação artificial com o objetivo de to em função da hipovolemia ou mesmo
ganho de peso, nutrição e aumento de dias aqueles em face de uma doença aguda
de vida não pode mais ser sustentada. Sa- potencialmente reversível podem se bene-
be-se que, no entanto, para muitas famílias ficiar de hidratação cautelosa para confor-
a oferta alimentar, seja ela por qualquer to. Lembrando sempre que a sensação de
via, representa carinho, cuidado. Quan- sede deve ser ativamente avaliada e pode
do enfrentamos esse tipo de situação, de- ser minimizada com a umidificação dos
ve-se propor uma longa conversa com os lábios ou oferta de pequenas quantidades
envolvidos (familiares, amigos, equipe de de líquido por via orall1.
saúde), para se pontuar também os riscos 4. H ospitalização diante de um evento agu-
de oferecermos dieta nessa condição clíni- do: deve-se avaliar com muita cautela os
ca, pontuando o aumento da incidência de reais benefícios de uma transferência para
pneumonia aspirativa, riscos de infecções uma unidade hospitalar diante de um even-
locais tanto com uso de SNE quanto com to agudo (tais como infecção, desidratação,

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Capítulo 37 - Cuidados paliativos nas demências avançadas

quedas, delirium). Sabe-se que pacientes Tabela 37.3 - Uso apropriado de medicações
moradores de instituições de longa perma- na fase final das síndromes demenciais1
nência portadores de demência avançada Sempre apropriados Raramente apropriados
apresentam maior risco de mortalidade e •A  nalgésicos •A
 ntiandrogênios
desfechos desfavoráveis (infecções, deli- •A  ntidiarreicos •B
 isfosfonatos
•A  ntieméticos •M
 inerais e suplementos
rium, úlceras por pressão) quando hospita- • L axantes vitamínicos
lizados15,19,22. Deve-se sempre compartilhar •B  roncodilatadores •H
 eparina
inalatórios •W
 arfarina
a decisão de transferência com a família •A  nsiolíticos •E
 stimulantes do apetite
ou responsável legal, esteja o paciente em • Antiepiléticos •R
 elaxantes bexiga
casa ou em uma instituição de longa per- •E  xpectorantes
• L ubrificante colírios
manência, ponderando sempre os riscos e • T ratamento de úlceras
os reais benefícios da transferência. Acre- de pressão

ditamos que o indivíduo deve ficar no local Eventualmente apropriados Nunca apropriados
onde possa ser oferecido o melhor conforto • Inibidores da bomba •M
 edicamentos
sempre. Caso não haja possibilidade de cui- de protões hipolipemiantes
•B  loqueadores dos •A
 ntiagregantes
dados de saúde em casa, por exemplo, uma receptores histamina-2 plaquetários excluindo
unidade hospitalar de baixa complexidade •A  nti-hipertensivos aspirina
•A  nti-isquêmicos •A
 ntiestrogênios
pode ser bastante adequada. Lembrando •D  iuréticos •H
 ormônios sexuais
sempre que leitos em unidades de alta com- • Corticosteroides •Q
 uimioterapia citotóxica
inalatórios •A
 ntagonistas hormonais
plexidade (unidades de terapia intensiva, •A  ntipsicóticos
por exemplo) devem ser reservados para •A  ntidepressivos
pacientes críticos com possibilidade de re- •H  ipoglicemiantes
•H  ormônios tireoidianos/
versão da doença de base. antitireoidianos
5. Tratamento de doenças agudas: não existe • Corticosteroides
•C  olchicina e alopurinol
uma regra que determine quais doenças de- •D  igoxina
vem ou não ser tratadas. A equipe de saúde Adaptado de: Parsons C, Hughes CM, Passmore AP, et al.
deverá avaliar se existem sintomas descon- Withholding, discontinuing and withdrawing medications in
dementia patients at the end of life: a neglected problem
fortáveis em consequência da patologia agu- in the disadvantaged dying? Drugs Aging 2010;27:435–49
da e, juntamente com familiares, ponderar e Holmes HM, Sachs GA, Shega JW, et al. Integrating
palliative medicine into the care of persons with advanced
os benefícios de um tratamento curativo ou dementia: identifying appropriate medication use. J Am
uma abordagem de conforto exclusivo. Geriatr Soc 2008;56:1306–11.
6. Tratamento de doenças crônicas: a deci-
são de não se prescrever medicações para
doenças crônicas ainda é bastante difícil progressão das demências de Alzheimer,
em nosso país. Igualmente difícil é a sus- Lewy e determinadas demências vascula-
pensão de drogas usadas cronicamente no res é bem descrito em fases iniciais e mo-
momento em que o paciente atinge um deradas da doença. Da mesma forma, o uso
nível mais avançado de demência. Usa- da memantina está bem indicado em fases
mos em nosso dia a dia o conceito de anos moderadas das demências. O uso de qual-
necessários para efeito real da medicação: quer um deles deve ser suspenso quando
drogas que apresentam efeito benéfico em não se consegue o benefício clínico espe-
longo prazo (por exemplo: hipolipemian- rado, em geral nos casos mais avançados
tes, antiandrogênicos etc) são desencoraja- quando não se tem mais indicação formal
das21. Na tabela 37.3 trazemos um resumo de prescrição (teoricamente MEEM <9, no
de medicações e suas indicações nesse con- caso dos inibidores da acetilcolinesterase, e
texto de saúde. <3 para a memantina). Em recente estudo,
7. Tratamento específico das síndromes de- 80% dos médicos responsáveis por hospices
menciais: o benefício do uso de inibidores descontinuavam essas medicações no mo-
de acetilcolinesterase na lentificação da mento da admissão em suas instituições.

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Capítulo 37 - Cuidados paliativos nas demências avançadas

No entanto, 30% deles observaram piora patients with advanced dementia: lack of
comportamental ou avanço mais acelerado benefit of tube feeding. Arch Intern Med.
da deterioração cognitiva após a suspen- 2001. 161:594-9.
são22. Em nosso país, devemos levar em 6. MORRISON RS, SIU AL. Survival in
conta sempre as condições financeiras dos endstage dementia following acute illness.
indivíduos, a dificuldade de administração JAMA. 2000. 284:47-52.
e a resposta individual ao uso das drogas. 7. MITCHELL SL, KIELY DK, HAMEL MB,
Mais uma vez, as decisões devem ser com- PARK PS, MORRIS JN, FRIES BE. Estima-
partilhadas com familiares ou responsá- ting prognosis for nursing home residents
veis pelo idoso. with advanced dementia. JAMA. 2004.
291:2734-40.
CONCLUSÃO 8. M ARSH GW, PROCHODA KP, PRIT-
Os cuidados no final da vida de indiví- CHETT E, VOJIR CP. Predicting hospice
duos demenciados ainda representam um appropriateness for patients with demen-
grande desafio para os geriatras do Brasil e tia of the Alzheimer’s type. Appl Nurs Res.
do mundo. A indicação de Cuidados Palia- 2000. 13:187-96.
tivos exclusivos parece ser mais difícil neste 9. FABIO E, BIGANZOLI L. Breast cancer. In:
contexto de saúde, quando comparado com Glare PC, Christakis NA, eds. Prognosis in
doentes acometidos por neoplasias igual- advanced cancer. Oxford, England: Oxford
mente terminais. University Press. 2008. 123-32.
As decisões esbarram em crenças, costu- 10. NOHRIA A, LEWIS E, STEVENSON LW.
mes e hábitos culturais que vão muito além Medical management of advanced heart
dos artigos científicos. Sugerimos sempre um failure. JAMA. 2002. 287:628-40.
diálogo franco com todos os envolvidos nos 11.  DI GP, TOSCANI F, VILLANI D ET
cuidados desses indivíduos, sejam familia- AL. Dying with advanced dementia in
res, amigos ou profissionais de saúde. long-term care geriatric institutions: a
A regra é usarmos sempre o bom senso retrospective study. J Palliat Med. 2008.
nas escolhas, priorizando conforto físico ao 11:1023–8.
paciente e serenidade para os familiares ou 12. A MINOFF BZ, ADUNSKY A. Dying de-
responsáveis legais. mentia patients: too much suffering, too
little palliation. Am J Hosp Palliat Care.
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5. M EIER DE, AHRONHEIM JC, MORRIS V. Does Feeding Tube Insertion and Its Ti-
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High shorter mortality in hospitalized 2012. 60(10):1918-21.

330

Miolo.indd 330 17/04/2014 14:11:39


Capítulo 37 - Cuidados paliativos nas demências avançadas

17. JOAN M. TENO, PEDRO GOZALO, 20. THOMPSON RS, HALL NK, SZPIECH
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ANA T. Fulton, Vincent Mor. Feeding nursinghome- acquired pneumonia. J
Tubes and the Prevention or Healing Am Board Fam Pract. 1997. 10:82–7.
of Pressure Ulcers. Arch Intern Med. 21. HOLMES HM, SACHS GA, SHEGA JW,
V.172, n.9. 2012. ET AL. Integrating palliative medicine
18. BRIDGET CANDY, ELIZABETH L into the care of persons with advanced
SAMPSON, LOUISE JONES. Enteral dementia: identifying appropriate me-
tube feeding in older people with advan- dication use. J Am Geriatr Soc. 2008.
ced dementia: Findings from a Cochrane 56:1306–11.
systematic review. International Journal 22. SHEGA JW, ELLNER L, LAU DT, ET
of Palliative Nursing. 2009. V.15, n.8. AL. Cholinesterase inhibitor and N-me-
19. MCCARTHY M, ADDINGTON-HALL thyl-D-aspartic acid receptor antagonist
J, ALTMANN D. The experience of dying use in older adults with end-stage de-
with dementia: a retrospective study. Int mentia: a survey of hospice medical di-
J Geriatr Psychiatry. 1997. 12:404–9. rectors. J Palliat Med. 2009. 12:779–83.

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Síndrome da imobilidade 38
CAPÍTULO

Félix Martiniano de Magalhães Filho


Rodrigo Flora

INTRODUÇÃO anos, cerca de 13% têm dificuldade em rea-


Nas últimas décadas a população geriá- lizar atividades do cotidiano, outros 9% di-
trica vem crescendo progressivamente. No ficuldade para tomar banho, 8% em andar e
Brasil, segundo dados do IBGE, no ano de 6% para realizar transferências quando estão
2010, as pessoas com mais de 60 anos repre- sentados ou deitados. As taxas de quem pos-
sentavam 10,7% da população, e a expectati- sui esses problemas aumentam progressiva-
va de vida média ao nascer já é quase de 75 mente após 65 anos e sobem acentuadamente
anos nos dias atuais. E a projeção é de que em após 80 anos, de modo que mais de 34% das
2025 essa população alcance 15,6% do total pessoas não institucionalizadas com mais
de brasileiros. E dentro deste grupo desta- de 85 anos têm problema de mobilidade. Li-
cam-se os idosos com mais de 75 anos, que mitações na mobilidade podem afetar a in-
trazem consigo alterações crônico-degene- dependência pessoal, levando à necessidade
rativas, apresentam um acentuado declínio de ajuda de terceiros e afetar a qualidade de
funcional e tornam-se fragilizados, sendo vida, o que pode inferir na saúde futura, fun-
esta idade um divisor de águas depois da cionalidade e sobrevida. Como outras sín-
qual incapacidade, imobilidade e mortalida- dromes geriátricas, distúrbios de mobilidade
de crescem rapidamente. Neste grupo, boa são causados por doenças e deficiências em
parte dos idosos vai passar os últimos anos múltiplos órgãos e sistemas, por isto, a avalia-
de suas vidas confinados ao leito, levando à ção e gestão requerem múltiplas perspectivas
síndrome da imobilidade, representando um e disciplinas.3
enorme sofrimento existencial e afetando Idosos frágeis, com dificuldades na mo-
todos à sua volta com cuidados que visem bilidade, dependentes para as atividades de
diminuir tanto o sofrimento físico quanto o vida diária (AVD), vivem geralmente em ins-
psicológico deste indivíduo. E, como é uma tituições, são incapazes de se movimentar,
condição sem retorno, essa síndrome está sofrem com a polifarmácia e desnutrição, são
intrinsecamente ligada ao que chamamos de geralmente confinados ao leito e, devido a
Cuidados Paliativos.1,2 esta imobilidade, adquirem ou evoluem para
Problemas com a mobilidade em idosos outras complicações, que chamamos de sín-
são comuns. Nos Estados Unidos, entre pes- drome da imobilização (SI). Semelhante a ou-
soas não institucionalizadas com mais de 65 tras doenças prolongadas em fase terminal,

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Capítulo 38 - Síndrome da imobilidade

tais como neoplasias e AIDS, a SI representa presença de déficit cognitivo médio a grave,
a derradeira fase de vida para muitos idosos, além de múltiplas contraturas. No critério
fase esta que necessita de abordagem com menor consideramos sinais de sofrimento
medidas de conforto e promoção de qualida- cutâneo ou úlceras de decúbito, disfagia leve
de de vida tanto para o indivíduo como para a grave, dupla incontinência e afasia. O pa-
seus familiares, através de prevenção e alívio ciente é considerado portador da SI quando
do seu sofrimento, com identificação preco- tem as características do critério maior e pelo
ce, avaliação e tratamento impecável da dor e menos duas do critério menor.2
outros problemas de natureza física, psicos-
social e espiritual.2,4 CAUSAS DE IMOBILIDADE
Independente da causa de imobilida-
DEFINIÇÃO E CRITÉRIOS DA SI de, mesmo por curtos períodos de tempo, a
Mobilidade é a capacidade de mover o imobilização resulta em condições pioradas
próprio corpo através do espaço. Caminhar dos sistemas cardiovascular, osteomuscular
é a tarefa de mobilidade fundamental para e respiratório e do metabolismo. O estado
a vida humana, que ainda inclui se virar na psíquico também pode ressentir do imobi-
cama, subir escadas, correr, manter-se senta- lismo, sendo frequente a depressão, apatia,
do e levantar-se.3 déficit cognitivo e ansiedade. Na prática, não
Deficiência de mobilidade é causada por se observa uma linha divisória nítida entre
processos patológicos, que levam a deficiências imobilidade e SI, mas sim um largo espectro
de órgãos e alterações funcionais, limitando a que iria de casos leves até os mais graves.2
vida dos idosos a papéis como o de ser cuidado. O fator determinante para a SI vai mui-
A SI é causada por problemas com a força, re- to além das diversas patologias ditas como
sistência, coordenação, equilíbrio e amplitude causa, mas o confinamento prolongado no
dos movimentos, que podem ser originados leito, que dá origem à síndrome de desuso,
por numerosos processos patológicos.3 é o principal fator causal. Não ter atividade
Imobilidade pode ser definida como uma física, seja por falta de iniciativa ou desejo,
restrição ou limitação do movimento para imposição dos cuidadores, por monotonia do
desempenhar AVD em virtude de diminui- ambiente ou por doenças físicas ou psiquiá-
ção das funções motoras, caracterizadas por tricas, induz o indivíduo a um descondicio-
fatores que comprometem a independência, namento global, o que leva a um agravo da
culminando no estado de incapacidade ou sua condição física, cognitiva e emocional.
fragilidade.5 Como o envelhecimento é uma fase de maior
Síndrome de imobilidade é definida por fragilidade e dependência, o repouso ou o
Pietro de Nicola como derivada principal- confinamento no leito passou a ser, de ma-
mente pelo fato de que todos os órgãos e neira errônea, uma prática e conduta univer-
aparelhos podem ressentir-se, gravemente, sal praticada pelos cuidadores e familiares,
da própria imobilidade e de suas consequên- visando à “proteção” do idoso de acidentes,
cias, a começar pela deterioração intelectual para poupar energia, restabelecimento de
e comportamental, dos estados depressivos, doenças ou mesmo para poupar trabalho.
dos distúrbios cardiovasculares, respiratórios, Esse repouso prolongado é o ponto de parti-
digestivos e metabólicos, constipação intesti- da para a mudança de comportamento e má
nal, hipotonia muscular, osteoporose, desnu- qualidade de vida, com rápido e grave des-
trição, distúrbios metabólicos, contratura e gaste. Após essa fase, tirá-los do leito torna-
negativação do balanço nitrogenado. Trata-se, se difícil, pois eles choram, gritam e agridem
portanto, de todo um complexo de alterações diante de qualquer tentativa.2,5
que repercute negativamente sobre o organis- Os fatores determinantes da SI podem
mo, tendo origem na imobilidade.2 incluir as seguintes condições, muito pre-
O critério maior para definir a SI é a valentes em idosos, que levam ao repouso

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Capítulo 38 - Síndrome da imobilidade

prolongado no leito: qual se reduz por absorção a massa óssea, le-


• Disfunções osteoarticulares: osteoar- vando à hipercalcemia e um consequente ba-
trose, sequelas de fraturas com imobili- lanço negativo de cálcio.5 Outro agravante não
zação prolongada, doenças reumáticas, raro é o aparecimento de fraturas decorrentes
metástases ósseas, doenças dos pés; de pequenos traumas ou movimentos bruscos
• Doenças musculares: polimialgia, des- durante procedimentos e manipulação de pa-
nutrição, fibrosite; cientes com a síndrome da imobilidade.
• Doenças cardiorrespiratórias: DPOC, A imobilidade causa um processo degene-
ICC, Cardiopatia isquêmica; rativo na musculatura, alterando diretamente
• Doenças vasculares: sequelas de TVP, a força muscular, diminuindo a resistência e
insuficiência arterial; aumentando a fadiga. A força exercida pela
• Doenças neuropsíquicas: depressão, gravidade nos ossos e tecidos de apoio é re-
demência, neuropatia periférica, AVC, duzida. Os músculos dos membros inferio-
ELA e Parkinson; res, que exercem a função de resistir à força
• Iatrogenia medicamentosa: neurolép- da gravidade, são os primeiros a se tornarem
ticos, ansiolíticos, hipnóticos, anti-hi- fracos e atrofiados. A diminuição na ativida-
pertensivos, isolamento social e inade- de muscular pode comprometer a irrigação
quação do espaço físico; sanguínea, diminuir a síntese proteica, levan-
• Déficit neurossensorial: cegueira, sur- do à atrofia das fibras musculares tipo I e II.
dez.2,5 Consequentemente, ocorre a diminuição da
força muscular, do número de sarcômeros
CONSEQUÊNCIAS DA IMOBILIDADE e do torque. O paciente passa a ter uma falta
A imobilidade desencadeia uma suces- de coordenação pela fraqueza generalizada,
são de eventos patológicos, com deterioração resultando em má qualidade do movimento.9
progressiva de vários sistemas. Ela pode ser Em repouso absoluto, um músculo perde cer-
causada por vários fatores ou doenças que se- ca de 10% de sua força por semana. Se uma
rão apenas a ponta de um iceberg, com con- pessoa ficar em repouso e imobilizada entre 3
sequências desastrosas para o idoso. Aborda- e 5 semanas, poderá perder 50% de sua força
remos de forma resumida algumas das con- muscular. Resumindo, a perda de força mus-
sequências da SI. cular varia de 1 a 2% por dia na imobilização.5
Outra consequência da imobilização que
Sistema músculoesquelético envolve músculos e tecidos moles são as con-
Um dos principais sistemas acometidos é traturas. Elas ocorrem quando os músculos
o músculoesquelético. Nele, podem aparecer não têm a atividade necessária para manter
osteoporose, fratura, atrofia e fraqueza mus- a integridade de suas funções e são definidas
cular, contratura, artrose e anquilose. como perda de amplitude articular de movi-
No osso, a imobilidade causa diminui- mento devido à limitação articular, muscular
ção intensa da massa óssea, e essa redução da ou de tecido mole. As contraturas musculares
utilização do sistema muscular causa intensa e de tecidos moles são mais associadas com a
perda de cálcio (0,4 a 0,7% de perda de cálcio imobilidade. Os fatores que influenciam nas
orgânico total/mês de imobilidade no leito).6,7,8 contraturas são: a posição do membro, a du-
O equilíbrio ósseo é mantido entre a formação ração da imobilização e a mobilização das
óssea (atividade osteoblástica) e a reabsorção partes não afetadas.9
óssea (atividade osteoclástica). Sua morfolo- Na articulação, o líquido sinovial lubrifi-
gia e densidade dependem da força aplicada ca e nutre a cartilagem, mas, para que tenha
sobre o osso, imposta pela tração do tendão circulação dos nutrientes, síntese e degrada-
e pela força da gravidade; e sua perda leva a ção da matriz e estímulos aos sensores elé-
um aumento da atividade osteoclástica e uma tricos e mecânicos da articulação, necessita
diminuição da atividade osteoblástica, com a do movimento. Logo, com a imobilidade há

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Capítulo 38 - Síndrome da imobilidade

atrofia da cartilagem com desorganização não são incomuns. As regiões mais acometi-
celular nas inserções ligamentares, prolifera- das são as úmidas e intertriginosas. As mico-
ção do tecido fibrogorduroso e consequente ses são porta de entrada para infecções bac-
espessamento da sinóvia e fibrose capsular.9 terianas e devem ser evitadas com uma boa
higiene, nutrição adequada, exposição ao sol,
Sistema tegumentar uso de roupa de material poroso e tempera-
Algumas alterações fisiopatológicas ocor- tura ambiente agradável.2
rem na pele com o envelhecimento, como a
diminuição da vascularização e espessura da Sistema respiratório
epiderme, além de perda de vigor e elasticida- Durante a imobilidade, ocorre uma dimi-
de da derme. Essas alterações podem ser agra- nuição do volume de ar corrente, do volume
vadas com a imobilidade prolongada, tornan- minuto, da capacidade pulmonar total e do
do a pele friável e inelástica, facilitando lesões volume expiratório forçado ao redor de 25%
dermatológicas como úlceras de decúbito, a 50%.5 Devido à fraqueza da musculatura
dermatite amoniacal, lacerações e micoses. intercostal e abdominal, a amplitude de mo-
As úlceras de decúbito têm incidência ele- vimentos do diafragma e a expansibilidade
vada de até 20% em idosos acamados e mor- torácica estão diminuídas o que resulta em
talidade de até 70% ao ano.2 O fator desen- uma respiração superficial. Associado a estas
cadeante é a compressão tecidual. Portanto, mudanças, ocorre diminuição da função mu-
uma pressão superior a 32 mmHg por mais cociliar e do reflexo da tosse (seis vezes menor
de 2 horas pode desenvolver isquemia dos no idoso que no adulto), acumulando secreção
vasos sanguíneos, causando anóxia, morte pulmonar.
celular e reação inflamatória em cadeia, re- Com todas estas modificações, as compli-
sultando em necrose tecidual. Elas desen- cações respiratórias são mais frequentes. Des-
volvem com maior frequência nas proemi- taca-se a broncopneumonia, com incidência
nências ósseas que sustentam o peso, cuja aproximada de 15% nos idosos hospitalizados,
pressão, num curto período de imobilização que ainda apresentam piores desfechos clíni-
nas regiões sacral e calcânea, é de 70 mmHg cos funcionais ou óbito durante o seguimen-
e de 45 mmHg, respectivamente. Além disso, to.10 Na maioria dos estudos epidemiológicos, o
a umidade, a desnutrição, a desidratação, a Streptococcus pneumoniae é o organismo mais
má higiene, as doenças crônicas e a falta de provável da pneumonia comunitária, sendo
mobilidade articular também são fatores que talvez o Haemophilus influenzae o segundo,
predispõem à necrose tecidual. principalmente em portadores de DPOC. Já
A dermatite amoniacal é muito frequente no idoso com SI e que geralmente vive em ins-
em pacientes com síndrome da imobilidade tituição ou tem passagem por vários hospitais,
devido ao contato da pele com a urina. O uso bacilos Gram-negativos são os agentes mais
de fraldas geriátricas, muitas vezes neces- prováveis, dentre eles, Legionella pneumophila,
sário, pode agravar as lesões, pois o fato de Pseudomonas, Proteus e Klebsiella.2
algumas serem revestidas com plástico cria
um ambiente propício para a proliferação de Sistema gastrointestinal
bactérias que modificam a ureia em amônia. Este sistema é afetado globalmente pela SI.
As lacerações na pele do idoso imobiliza- A constipação está frequentemente presente e
do, principalmente braços e pernas, são co- causa intenso sofrimento ao idoso. Os movi-
muns devido ao constante atrito sobre o leito, mentos peristálticos diminuem, o trânsito in-
associado a pouca elasticidade da pele, a falta testinal fica mais lento, as fezes endurecem e se
de tecido de sustentação e a pele ressecada.2 acumulam no reto e sigmoide, levando à for-
Quando se associa má higiene, colchão mação de fecalomas.5 Outros fatores que con-
não poroso, suor, urina e restos de alimentos tribuem para a constipação no idoso acamado
em pacientes acamados, as lesões por micose são fraqueza da musculatura abdominal, uso

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Capítulo 38 - Síndrome da imobilidade

de substâncias anticolinérgicas, ingestão me- alteração associada à contratura de quadril e


nor de líquidos e fibras, além de muitas vezes joelho predispõem a estase venosa profunda.
ficar sobre a cama na hora de evacuar. Para agravar, um estado de hipercoagula-
Na imobilidade ocorre aumento de eli- bilidade é induzido por redução do volume
minação urinária e fecal de minerais, di- plasmático e desidratação frequente em ido-
minuição da oferta e ingestão de líquidos e sos acamados. A incidência é sempre elevada
nutrientes que leva o paciente a um desfecho de TVP nestes pacientes e devemos manter
desfavorável, com desidratação crônica e atenção constante para esta situação, fazendo
desnutrição proteico-calórica. Para agravar, prevenção e profilaxia com movimentação
em muitas situações os cuidadores não estão constante dos MMII e uso de medicamentos
preparados para saber se a quantidade que como a heparina de baixo peso molecular
oferecem é suficiente para uma adequada nu- quando necessário.
trição do idoso acamado. Quando se nota, o
paciente já está em estado de caquexia. Deve- Sistema metabólico
mos estar atentos, para identificarmos o mo- Sistema comprometido no imobilismo
mento adequado da abordagem do uso de via com grande predomínio do estado catabólico
alternativa para nutrição enteral. e aumento na eliminação de sódio, potássio,
cálcio, fósforo, enxofre e nitrogênio. Há di-
Sistema urinário minuição da secreção de hormônio antidiu-
No paciente acamado a pressão intra-ab- rético com consequente aumento do volume
dominal diminui e o esvaziamento da bexiga urinário piorando o estado de hidratação do
fica comprometido, proporcionando retenção idoso. E ainda, o aumento do cortisol que fa-
urinária e favorecendo o surgimento de infec- cilita o catabolismo.
ções urinárias de repetição. Concomitante, o
uso de fraldas geriátricas e a pouca ingestão de Sistema nervoso
líquidos também favorecem infecções.2 O fato de perder a autonomia, não ter estí-
Na síndrome da imobilidade também se mulos cerebrais, não ter atividades de lazer e
observa alta prevalência de pacientes com depender de terceiros para realizar qualquer
incontinência, pois na maioria das vezes são tarefa faz com que a imobilidade interfira de
portadores de condições prévias como doen- forma direta no comportamento do paciente,
ça de Alzheimer e Parkinson. propiciando maior frequência de irritabilida-
de, quadros confusionais, inversões do ciclo
Sistema cardiovascular sono-vigília, depressão e alterações cogniti-
A imobilidade predispõe o sistema car- vas como as demências.
diovascular à ocorrências de algumas comor-
bidades como hipotensão postural, trombose CONCLUSÃO
venosa profunda e isquemias arteriais agu- Os indivíduos que chegam a SI são, em
das dos MMII. geral, idosos fragilizados que, por necessi-
A hipotensão arterial tem etiologia mul- dade, internam-se em hospitais ou vivem em
tifatorial. Além da presença nos idosos de instituições onde o ambiente não familiar, o
rigidez das artérias e baixa resposta dos re- repouso prolongado e forçado, a desnutrição,
ceptores adrenérgicos, a imobilidade prolon- a iatrogenia e as comorbidades transformam
gada reduz a sensibilidade dos receptores de o ancião em um ser dependente. Por vezes
pressão. Com isso, não ocorre aumento de curam-se da sua doença de base, porém sua
frequência cardíaca e vasoconstrição arterial independência e mobilidade estão irremedia-
para elevar o débito cardíaco, causando má velmente comprometidas. Um número signi-
perfusão cerebral e síncope. ficativo de idosos perde sua independência
Na imobilidade, o idoso perde o efeito de física, ficando confinado ao leito após trata-
bomba da musculatura da panturrilha. Esta mento hospitalar prolongado. Esses idosos

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Capítulo 38 - Síndrome da imobilidade

possuem uma alta taxa de mortalidade, em Paliativos. Cabe a todos da equipe multipro-
torno de 40%. A causa mortis é quase sempre fissional e à família o papel de cuidar do bem
falência múltipla de órgãos, mas, por vezes, -estar físico, psíquico e espiritual, levando
uma causa específica pode ser encontrada, conforto e serenidade a esse paciente.
sendo a pneumonia, a embolia pulmonar e a Como a SI já é uma condição que pres-
septicemia as mais frequentes.2 supõe medidas de conforto com Cuidados
O paciente com imobilidade requer uma Paliativos, não temos muitos artigos cientí-
ação interdisciplinar e multiprofissional, ficos e estudos associando as duas condições
exigindo formação de equipes em que a rea- especificamente, já que é uma síndrome que
bilitação é entendida inclusive em seus as- necessariamente requer paliação como parte
pectos preventivos, visando à recuperação do tratamento.
e manutenção funcional quando possível,
ou evitando piora das incapacidades e sur- REFERÊNCIAS
gimento de novas complicações e conse- 1. IBGE. Tábuas de mortalidade ambos os se-
quências da SI. A prevenção da imobilidade xos. 2012.
é uma preocupação de toda equipe e não 2. LEDUC MMS. Imobilidade e Síndrome da
apenas de um componente. O médico ge- Imobilização, Tratado de Geriatria e Ge-
riatra neste caso tem a função de gerenciar rontologia, Editora Atheneu. 3a ed. 2011.
toda equipe, mantendo harmonia e unidade (96):1100-08.
de pensamento, além de fazer a integração 3. STUDENSKI S, CATERINA R, BRACH J.
com cuidadores e familiares, para decidir Mobility, Hazzard’s Geriatric Medicine and
em conjunto quando da hora de medidas Gerontology, 2009 by The McGraw-Hill
Companies sixth edition. (115):1397-410.
paliativas exclusivas.5
4. WORLD HEALTH ORGANIZATION.
A SI avançada é por si só uma condição
Better palliative care for older people. Ge-
de Cuidados Paliativos, visto que é um mo-
neva: WHO. 2004.
mento de grande sofrimento para o paciente 5. SIQUEIRA AB, CORDEIRO RC. Imobi-
e seus familiares sem possibilidade de rever- lidade, Guias de medicina ambulatorial e
são. É a fase em que a degradação da quali- hospitalar da Unifesp-EPM Geriatria e Ge-
dade de vida chega ao limite do tolerável ou rontologia. Editora Manole Ltda 2ª edição.
aceitável, um caminho sem volta, e para o pa- 2011. (22):319-28.
ciente a morte acaba sendo a melhor solução 6. CREDITOR MC. Hazard of hospitalization
diante dos sofrimentos.2 of elderly. Ann Inter Med. 1993. 118-219.
Neste contexto, irreversível, não se justi- 7. 
MILLER M. Iatrogenic and nursisgenic
fica manter a vida a qualquer custo, prolon- effects of prolonged immobilization of the
gando sofrimentos, como internação em UTI aged. J Am Geriatric Soc. 1975. 23(8).
e procedimentos invasivos desnecessários, 8. HARPER MC, LYLES MY. Physiology and
que não visem apenas o bem-estar do indi- complications of bed rest. J Am Geriatric
víduo. Cabe a toda equipe multiprofissio- Soc. 1988. (36):1047-54.
nal medidas de conforto para os familiares 9. VENTURA MM. Cuidados paliativos em
e para o paciente em sua finitude, nas quais portadores de demência em fase avançada.
entram as medidas paliativas. Aptare. 2013. 18-22.
O bom senso, a conversa e integração mul- 10.  M AZZEO RS, CAVANAGH P, EVANS
tiprofissional e o diálogo com a família podem WJ, FIATARONE M, HAGBERG J,
trazer mais dignidade e menos sofrimento no MCAULEY E ET AL. Exercise 0and physi-
fim da vida do paciente idoso, com síndrome cal activity for older adults. Rev Bras Ativ
Fís Saúde. 1998. 1(3):48-78.
de imobilidade e com indicação de Cuidados

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Cuidados paliativos
na doença de Parkinson 39
CAPÍTULO

Juliana Lianzza Fernades Silva


Milene Roldan Hirai

INTRODUÇÃO dificuldade de deglutição, sialorreia, inconti-


A doença de Parkinson (DP) é uma enfer- nência fecal e urinária, constipação intestinal,
midade degenerativa progressiva que cursa disfunção cognitiva, fadiga, transtornos do
principalmente com a destruição de neurô- humor, dor, disfunção erétil, dentre outros4,7.
nios dopaminérgicos localizados na substân-
cia negra1,2,4,5,7. Corresponde a uma das desor- EVOLUÇÃO DOS CUIDADOS
dens neurodegenerativas mais prevalentes em NA DOENÇA DE PARKINSON
indivíduos acima de 60 anos1,4. Sua prevalên- A mais recente definição de Cuidados Pa-
cia cresce junto com o aumento da expectati- liativos pela Organização Mundial da Saúde
va de vida da população1,4. As manifestações (OMS) é:4,8
clínicas e a progressão são bastante variáveis
entre os indivíduos acometidos, além disto o “Uma abordagem que melhora a qua-
grau de incapacidade pode ser flutuante tanto lidade de vida dos pacientes e suas
ao longo do curso da doença quanto ao longo famílias que enfrentam problemas as-
do dia4. Quando o paciente apresenta sinto- sociados com doença ameaçadora de
mas como necessidade de buscar auxílio mé- vida, por meio de prevenção e alívio
dico, estima-se que 80% dos neurônios dopa- do sofrimento, através da identificação
minérgicos já tenham degenerado7. precoce e avaliação cautelosa, asso-
Existem quatro sintomas cardinais que ciando o tratamento da dor e de outros
marcam a doença de Parkinson: rigidez, tre- problemas de ordem física, psicossocial
mor de repouso, bradicinesia e instabilidade e espiritual”.
postural; sendo necessário para o diagnósti-
co a presença de bradicinesia ou tremor de Essa definição abrange não apenas indiví-
repouso e pelo menos mais um dos outros duos com câncer sem possibilidade de cura,
sintomas5,7. mas pessoas com diagnóstico de doenças não
Além dos sinais cardinais, há diversos oncológicas e com uma longa trajetória, in-
distúrbios associados tanto motores como de cluindo as doenças crônicas e degenerativas4.
outros sistemas, como: fala hipofônica, micro- As necessidades dos pacientes com doen-
grafia, distúrbios do sono, marcha festinante, ça de Parkinson e seus familiares são seme-

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Capítulo 39 - Cuidados paliativos na doença de Parkinson

lhantes às de pacientes em Cuidados Paliati- racterísticas do paciente, como: que tipo de


vos habituais (com câncer avançado), à medi- informação ele está pronto para receber, se
da que a doença progride e deixa o paciente é uma pessoa que gosta de fazer planos para
mais dependente4 . No momento do diagnós- o futuro e se tem interesse em obter infor-
tico, sentimentos de perda e incertezas sobre mações detalhadas sobre o quadro clínico
o futuro atormentam não só os pacientes, para auxiliar no planejamento da vida com
como seus cuidadores4 . A progressão da a doença14. Nessa fase, frequentemente apa-
doença desencadeia temores sobre como será recem associados sintomas não motores, tais
o suporte oferecido em relação a questões como depressão e distúrbios do sono14. Pa-
financeiras, físicas e psicossociais4 . Para o cientes recém-diagnosticados podem ter sua
paciente, há risco de isolamento social e difi- autoestima abalada e apresentar preocupa-
culdade de estabelecer quais cuidados neces- ções sobre o trabalho, segurança financeira e
sita, já que este vai apresentando dificuldade o impacto disso na família4,16.
em comunicar seus problemas. Além disso, Na doença moderada, ocorre diminuição
aparece o sentimento de impotência à medi- da eficácia das medicações antiparkinsonia-
da que a dependência de seus cuidadores tor- nas, predispondo a flutuações motoras com
na-se maior4 . O suporte psicológico quanto a mobilidade-imobilidade (fenômeno on-off),
estes sentimentos de perdas e medo do futuro fenômenos de congelamento (freezing) e wea-
é fundamental no suporte dos pacientes com ring-off (reaparecimento ou piora de um sin-
Parkinson e dos seus cuidadores4 , com o ob- toma da DP, que ocorre comumente duas ou
jetivo de melhorar a qualidade de vida desses mais horas após uma dose de levodopa16.
pacientes e de seus familiares2 . Essa fase constuma apresentar discinesias
Deve-se ter em mente que tratamento e distonias, podendo ocorrer a progressão bi-
visando prolongamento da vida e Cuidados lateral dos sintomas, provocando instabilidade
Paliativos são cuidados paralelos e não ex- e predispondo a quedas e fraturas. Podem sur-
cludentes16 . À medida que a doença progride, gir quadros álgicos, disfunção urológica, di-
a proporção entre estes cuidados vai modi- sautonomia e alterações do humor16. Aumen-
ficando-se, de modo que as intervenções te- tam as queixas de sintomas de ansiedade devi-
rapêuticas tornam-se menos efetivas, pois do às fases de desligamento e congelamento16.
aumentam as intercorrências e sintomas da Há impacto na dimensão psicossocial, sendo
doença¹,². Observa-se claramente um declí- importante o suporte multiprofissional e te-
nio do desempenho motor, que refletirá no rapia de grupo4,5,6. Todo este conjunto de sin-
comprometimento da capacidade de realizar tomas torna o paciente mais dependente para
as atividades de vida diária, aumentado pro- as atividades de vida diária, surgindo também
gressivamente o grau de dependência.1, 2, 6 como problema a sobrecarga do cuidador (na
A média de duração da doença a partir maioria das vezes, o cônjuge)4, 9,16.
do diagnóstico é em torno de 15 anos1, 2, 4 . As No estágio avançado, a terapia de pro-
fases da doença podem ser divididas em: pre- longamento da vida é substituída lentamente
coce, moderada e grave, utilizando-se a esca- por medidas paliativas. A prioridade passa a
la Hoehn and Yahr (HY – Degree of Disability ser o manejo de sintomas, como: dor, fadiga,
Scale) para classificá-las de acordo com a gra- náuseas, vômitos, constipação, agitação, alu-
vidade dos sintomas3. cinações, disartria, disfagia, enfim sintomas
Na fase precoce, os pacientes apresentam comuns na fase avançada da doença. Nessa
boa função motora e cognitiva, normalmente fase, a família beneficia-se bastante da ava-
são totalmente engajados na vida social, tra- liação de profissional especialista em Cuida-
balhando e contribuindo para a sociedade14. dos Paliativos e da reavaliação das diretrizes
Essa é a fase ideal para iniciar a abordagem avançadas3,6,16. As alucinações, agitações e
de diretrizes avançadas, porém, para iniciar discinesias estão muito associadas ao uso de
essa abordagem, deve-se saber algumas ca- medicações dopaminérgicas, sendo este o

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Capítulo 39 - Cuidados paliativos na doença de Parkinson

momento de avaliar a diminuição e até a reti- Tratamento farmacológico


rada destas medicações2,16. Entende-se como Deve-se avaliar cada sintoma cuidadosa-
fase predominantemente paliativa quando o mente; se é causado pela evolução da doen-
paciente não tolera a terapia dopaminérgica ça ou por efeito adverso de medicação10. Na
adequada, não apresenta condições de sub- doença avançada, os pacientes também po-
meter-se à terapia cirúrgica, além de apre- dem experimentar um aumento da sensibi-
sentar comorbidades em grau avançado². A lidade a pequenas alterações na L-Dopa ou
atuação da equipe multiprofissional é de fun- tornarem-se mais propensos a reações adver-
damental importância nessa fase; fonoaudió- sas a medicamentos antiparkinsonianos10.
loga para tentar reabilitar a disfagia e disar-
tria, fisioterapeuta para manter o máximo de Complicações motoras
independência em casa, enfermagem para Hipocinesia, acinesia e wearing-off
fazer orientações de cuidados e assistente so- Deve-se tentar fracionar a dose total de L-
cial para vincular o paciente e a família aos Dopa que o paciente está usando em 6 a 8 ve-
recursos da comunidade16. zes ao dia, com intervalo de 2 a 2,5 horas, ao
Pacientes com doença de Parkinson invés de aumentar o valor total1,10, 11,12. A dose
moderada a grave podem ser incluídos nos da manhã deve ser um pouco maior que as
níveis 3 a 5 da escala de Hoehn and Yahr³. demais (para produzir ‘ignição’), assim como
Nessa fase, há intensas manifestações físicas a dose do final da tarde11. A dose para cada
e psicológicas. O nível de sofrimento em de- paciente deve ser individualizada1,10, 11, 12.
corrência desses sintomas é semelhante ao de A levodopa de liberação prolongada é
pacientes com câncer em estágio avançado³. mais indicada para a hipocinesia noturna,
já que, ao ser administrada durante o dia,
Escala de Hoehn e Yahr
o tempo de início de ação é mais prolon-
1
Envolvimento unilateral, com mínimo ou nenhum gado1,11,12 .
comprometimento funcional
Visando aumentar a meia vida da L-Dopa,
2
Envolvimento bilateral ou moderado, sem pode-se associar ao seu uso inibidores daca-
comprometimento do balanço
tecol-o-metiltransferase (COMT) (tolcapone
Doença bilateral: incapacidade leve a moderada 100mg três vezes ou entacapone 200mg, no
3 com comprometimento dos reflexos posturais;
fisicamente independente
máximo 8 a 10 doses no dia)1,12.
Os inibidores da COMT podem ser ad-
Doença causando incapacidade severa; ainda ministrados com ou sem alimentos. O tolca-
4 capaz de andar e de permanecer em pé sem
assistência pone só deve ser utilizado no caso de outras
alternativas terem sido inefetivas e deve-se
5 Confinado à cama ou à cadeira de rodas
monitorizar as enzimas hepáticas durante
os seis primeiros meses de uso12. Deve-se ter
TRATAMENTO atenção em orientar os familiares sobre os se-
O tratamento possui abordagem farma- guintes efeitos colaterais: alucinações, disci-
cológica e não farmacológica. Por questões nesia, náuseas, vômitos, diarreia e coloração
didáticas, o tratamento farmacológico será alaranjada da urina 12.
dividido em abordagem de sintomas moto- Os inibidores da monoamina oxidase B
res e suas complicações e de outros sintomas (IMAO-B) (selegilina e a rasagilina) também
associados à doença. Daremos ênfase ao con- podem ser utilizados11. A selegilina exerce efei-
trole de sintomas que impactem na qualidade to moderado sobre o fenômeno wearing-off 12.
de vida do binômio paciente-família, sempre A apomorfina é um potente agonista do-
buscando adaptar as medidas às necessida- paminérgico indicado como dose de resgate
des do paciente inseridas em seu contexto em casos de acinesia ou hipocinesia súbita, a
socioeconômico e espiritual. dose varia de 2 a 10mg ao dia, via subcutâ-
nea, com início de ação em 5 a 10 minutos e

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Capítulo 39 - Cuidados paliativos na doença de Parkinson

duração de 45 a 90 minutos. Deve ser usado avançada que desenvolvem demência, deve-
associado com antieméticos, como a dompe- se avaliar de forma cautelosa a real necessida-
ridona com ação agonista dopaminérgica pe- de do tratamento da discinesia1,11,12.
riférica ou com a trimetobenzamida11,12. Pode ocorrer padrão bifásico de manifes-
tação dos sintomas, variando de acordo com
Acinesia aguda a fase on-off, sendo na primeira com movi-
Estado acinético agudo que pode durar mentos de tremor e discinéticos e na segunda
vários dias, tem a característica de não res- com tendência à distonia12.O manejo desse
ponder ao tratamento farmacológico anti- fenômeno é difícil. É orientado fragmentar a
parkinsoniano, podendo ocorrer inclusive dose diária total de L-Dopa, o que resulta em
em pacientes não tratados previamente com mais picos de dose e pode consequentemente
levodopa12. Esse quadro é diferente da acine- piorar a discinesia12. Para contornar essa pio-
sia e/ou hipocinesia citada acima. Deve-se ra, pode-se reduzir um pouco de cada dose
pesquisar fatores desencadeantes, como in- para associar um agonista dopaminérgico12.
fecções (resfriados, gastroenterites) ou outras Deve-se evitar levodopa de liberação prolon-
intercorrências médicas (fraturas ósseas, pós gada em pacientes com discinesia grave, pois
-operatório), sendo o tratamento relacionado sua a absorção é lenta e a discinesia tende a
ao controle do fator desencadeante12. aumentar progressivamente durante a tarde
e a noite12.
Discinesia
Caracteriza-se por movimentos corei- Distonia
formes involuntários envolvendo pescoço, Pode acometer membros, face, tronco e
braços, tronco e cabeça. Acomete pacientes pescoço12. Seu tratamento depende de alguns
em estágio avançado da doença que fazem fatores: aparecimento no início da manhã ou
uso de levodopa por longo período, 30% a no pico da dose da levodopa, quantidade de
40% dos pacientes com 5 anos de tratamento grupos musculares acometidos ou se o pacien-
farmacológico e 60% após 10 anos de uso de te nunca foi tratado1. A distonia no início da
L-Dopa. Seu aparecimento está associado ao manhã é tratada com levodopa de liberação
pico de dose da levodopa, entre 60 a 90 minu- prolongada administrada na noite anterior1,12.
tos após sua administração.1,11,12 Quando a apresentação ocorre no pico da dose
Estratégias de prevenção incluem fra- de levodopa, deve-se optar por fracionar a
cionar a dose total diária e associar outras dose diária total1,12. Quando a distonia é focal,
drogas antiparkinsonianas, como: IMAO–B ou seja, apenas em um músculo ou provoca
(inibidores de MAO B), inibidores de COMT disfunção urinária ou sialorreia, pode-se op-
e agonistas dopaminérgicos. Pode-se asso- tar por toxina botulínica1. Nesse caso, o início
ciar amantadina 100mg a 300mg 1 a 3 vezes de ação é de 3 a 4 dias, tendo o aumento pro-
ao dia, tendo atenção aos principais efeitos gressivo do seu efeito nas três semanas seguin-
adversos: livedo reticular, edema periféri- tes, necessitando de reaplicação a cada três
co, alucinações e psicose. Vários estudos meses em média1. Baclofeno, anticolinérgicos
demonstraram seu efeito em curto prazo (8 e benzodiazepínicos também podem ser utili-
meses até 1 ano), e a retirada esteve associada zados, porém deve-se ter cuidado com efeito
com piora da discinesia em alguns casos. Po- colateral de prejuízo da cognição1.
de-se utilizar também a clozapina em baixas
doses (12,5 mg a 75mg/dia), porém com bai- Falha de resposta à levodopa
xo nível de evidência. Nesse caso, é necessá- Fracionar a dose total diária utilizada; re-
rio colher leucograma com contagem de neu- forçar administração do medicamento longe
trófilos nos 6 primeiros meses de tratamento de refeições (principalmente daquelas com
com clozapina devido ao risco de supressão alto teor proteico); avaliar se está ocorrendo
da medula óssea12. Em pacientes com doença comprometimento da absorção (Ex: gastro-

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Capítulo 39 - Cuidados paliativos na doença de Parkinson

paresia), podendo-se associar a domperidona com a finalidade de identificar a depressão1.


para melhorar este efeito; indicar dieta com Não há consenso na literatura sobre qual é
baixo teor proteico em caso de pacientes com a droga de primeira escolha, sendo a droga
doença bastante avançada11, 12 . escolhida a critério médico, após pesar riscos
-benefícios, possíveis efeitos colaterais e inte-
Complicações não motoras rações medicamentosas1, 11,13,14. A recomenda-
Alucinações e psicose ção é iniciar com inibidor seletivo da recepta-
Acometem até 40% dos pacientes em es- ção de serotonina (ISRS), tendo cuidado, pois
tágio avançado da doença. Na maior parte podem exacerbar sintomas dopaminérgicos,
dos casos, são secundárias ao uso prolongado além do risco de desencadear síndrome se-
de medicações dopaminérgicas ou ao apare- rotoninérgica quando há associação com
cimento de demência1,11,13. Deve-se inicial- IMAOs, como a selegilina11,13,14. Neste caso, a
mente excluir intercorrências médicas como dose da selegilina pode ser mantida em 10mg/
causa destes distúrbios (constipação, desi- dia para evitar a crise e deve-se recomendar
dratação, infecção, distúrbios hidroeletro- dieta sem queijos e vinhos13. Dentre os ISRS,
líticos, acidente vascular cerebral), tal qual a sertralina está menos envolvida em exacer-
fazemos no delirium, para que então possam bar sintomas parkinsonianos, quando com-
ser realizadas as modificações no tratamento parada à fluoxetina e à paroxetina13. Na im-
farmacológico1,11,13. possibilidade de se utilizar um ISRS, pode-se
Após a investigação e exclusão de inter- optar pelo uso de antidepressivo tricíclico,
corrências clínicas, deve-se diminuir as do- sendo a nortripitilina a mais recomendada,
ses ou suspender o uso das medicações que na dose máxima de 75mg/dia, tendo atenção
podem induzir ou potencializar os sintomas aos efeitos adversos anticolinérgicos e cardía-
psicóticos, de acordo com a seguinte ordem cos13,14. A mirtazapina pode ser uma opção,
hierárquica: anticolinesterásicos, inibidores principalmente quando associado ao quadro
da MAO, amantadina, agonistas dopaminér- inapetência, perda de peso e insônia14.
gicos e, eventualmente, levodopa1,13.
As medicações antipsicóticas recomen- Ansiedade
dadas são a clozapina ou quetiapina em bai- Não há escalas validadas para rastreio
xas doses, com cuidado de monitorizar os da ansiedade na doença de Parkinson. Den-
leucócitos nos primeiros 6 meses ao utilizar tre os principais transtornos associados em
clozapina (risco de leucopenia e agranulo- pacientes não demenciados, encontram-se:
citose)1,11,13. A medicação indicada como fobias e síndrome do pânico14. A Academia
primeira escolha é a quetiapina e a dose Brasileira de Neurologia (ABN) recomenda a
recomendada é de 12,5 mg a 100mg13, 11. Os nortriptilina como o medicamento com mais
principais efeitos colaterais são sedação e evidência de eficácia para tratar os sintomas
hipotensão ortostática10. ansiosos na depressão associada à doença de
Parkinson. Entretanto, deve-se ter cautela
Depressão com seus efeitos colaterais anticolinérgicos.
Afeta cerca de 40% dos pacientes com Não há evidências suficientes para sustentar
a doença em estágio avançado1,11,13. Ocor- ou refutar o uso de outras drogas ou modali-
re principalmente nos períodos off, sendo o dades terapêuticas no tratamento de ansieda-
controle destas flutuações motoras (on-off) de associada à DP14. Alguns autores citam o
importante para a melhora do quadro de- uso de benzodiazepínicos por curto período,
pressivo11,14. Como ocorre principalmente pesando-se o risco de quedas11,13.
em estágios avançados, nos quais o paciente
apresenta dificuldade de comunicação, é im- Distúrbios do sono na doença de Parkinson:
portante avaliar o paciente de perto e buscar O transtorno comportamental do sono
informações com familiares e cuidadores*, REM (TCSREM), é um distúrbio de sono

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Capítulo 39 - Cuidados paliativos na doença de Parkinson

caracterizado pela ocorrência de intensa to com medidas não farmacológicas como:


atividade muscular durante a fase de sono evitar mudança de posição muito rápida,
REM, com ocorrência de sonhos vívidos. O dormir com cabeceira elevada em 20° a 30°,
clonazepam é a droga de eleição no trata- não permanecer em pé quando estiver com
mento desse transtorno, exceto em pacientes sintomas de hipotensão, usar meias elásticas
portadores de síndrome da apneia obstrutiva e/ou bandagens de compressão abdominal,
do sono. Neste caso, o pramipexol é o mais evitar exposição a altas temperaturas (ba-
indicado14. nhos muito quentes, sauna, exercícios físicos
Na síndrome das pernas inquietas, apesar vigorosos), garantir ingesta hídrica adequada
de não haver estudos controlados, as drogas (de 2 a 2,5 L/d), aumento da ingesta de sal (até
recomendadas para tratamento são o prami- 8 gramas/dia em pacientes sem insuficiência
pexol e a levodopa 14. cardíaca, cirrose e/ou hipertensão arterial) e
Na insônia, a dose noturna de levodopa/ reavaliar medicações de uso habitual (tanto
carbidopa pode ser útil em pacientes com para DP como para outras comorbidades)14.
distúrbios motores, como acinesia e tremo- O tratamento farmacológico quando há
res. Benzodiazepínicos, especialmente zopi- falha nas orientações anteriores inclui: flu-
clone e zolpidem por curtos períodos são efi- drocortisona na dose inicial de 0,1 mg/dia,
cazes, mas devem ser evitados em pacientes aumentando progressivamente até no máxi-
com déficits cognitivos ou instabilidade pos- mo 2,0 mg/dia, até que aconteça o controle
tural significativos e distúrbios respiratórios dos sintomas (cautela em pacientes com al-
do sono14. bumina sérica baixa e estimular ingesta ade-
Na sonolência diurna excessiva, após quada de potássio na dieta); midodrina em
afastar causas de privação crônica ou apneia monoterapia na dose inicial de 2,5 mg de 2 a
do sono e o uso de medicamentos sedativos, 3 vezes ao dia, aumentando até 10 mg 3 vezes
pode-se utilizar a modafinila. Os pacientes ao dia, ou em terapia combinada (fludrocor-
referem melhora com o seu uso, apesar de tisona), ou ainda desmopressina spray nasal
não haver alterações na polissonografia14. 10μg a 40μg ou via oral 100μg a 400μg (aten-
ção com hiponatremia)14. A midrodina está
Distúrbios do trato gastrointestinal contraindicada em insuficiência cardíaca
Para a gastroparesia está indicado o uso grave, história de acidente vascular cerebral
da domperidona, pois é antagonista dopa- ou acidente isquêmico transitório, insufi-
minérgico e não atravessa a barreira hema- ciência renal aguda, feocromocitoma, reten-
toencefálica, estando a metoclopramida e a ção urinária e tireotoxicose14.
cisaprida contraindicadas1,14.
Lembrar que está indicado o tratamento Disfunção urológica
do H. pylori, pois este diminui a absorção São frequentes sintomas irritativos e obs-
medicamentosa, devido à gastroduodenite14. trutivos, sendo importante descartar hiper-
A constipação deve ser conduzida com plasia prostática benigna em homens. Para os
aumento da ingesta hídrica e dieta rica em sintomas irritativos, pode-se utilizar drogas
fibras. Se houver persistência dos sintomas anticolinérgicas (cuidado com glaucoma,
após estas medidas, pode-se usar laxativos constipação e delirium), como a oxibutinina
emolientes (docusato de sódio), irritantes (2,5 a 15 mg/dia), a oxibutinina de longa ação
(bisacodil) e/ou laxativos osmóticos (lactu- e transdérmica (5 a 30 mg/dia) e a tolterodina
lona)1,14. (longa ação, 2 a 4mg/dia, dose única). Pode-
se associar imipramina em casos de falha te-
Hipotensão ortostática rapêutica14. A injeção intravesical de toxina
Pode ser secundária ao uso de medica- botulínica (TB) tem sido cada vez mais uti-
ções ou em consequência da evolução natural lizada nos pacientes com bexiga hiperativa
da doença1. A prioridade é fazer o tratamen- refratária aos anticolinérgicos11,14.

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Capítulo 39 - Cuidados paliativos na doença de Parkinson

Dor gidez e postura flexionada e também pode


As principais causas de dor na DP avan- melhorar o desempenho em algumas tarefas
çada são a rigidez e distonia (sintomas mo- motoras. Assim, deve-se incentivar a práti-
tores) que acometem os membros inferiores1. ca de exercícios para melhorar o equilíbrio,
Na dor que piora no estágio off, o tratamento flexibilidade e força (caminhadas rápidas, tai
tem como objetivo deixar o paciente em fase chi chuan, natação e exercícios aeróbicos na
on. Se a dor não estiver relacionada à admi- água)15. A Academia Americana de Neurolo-
nistração da medicação, deve-se manejá-la gia (AAN) publicou diversas modalidades de
de acordo com as recomendações do proto- fisioterapia como provavelmente eficazes em
colo de dor (seguindo recomendações) da melhorar o resultado funcional para pacien-
OMS, buscando classificar o tipo de dor e sua tes com doença de Parkinson: reabilitação
intensidade para instituir a terapia mais ade- multidisciplinar com componentes de fisio-
quada. O tratamento da dor é abordado em terapia e terapia ocupacional, treinamento
capítulo específico deste livro. em esteira com suporte de peso corporal,
treinamento do equilíbrio e de resistência,
Tratamento não farmacológico com feedback visual (espelho), auditivo (me-
Educação trônomo) e tátil.15
A perspectiva de ter uma doença neuro-
lógica crônica e progressiva é assustadora. A Disfagia e disartria
instrução é essencial a fim de proporcionar Serão abordados no capítulo Abordagem
ao doente e a sua família conhecimento sobre fonoaudiológica na doença de Parkinson.
a doença.15
No entanto, recomenda-se precaução em RETIRADA DE DROGAS
pacientes recentemente diagnosticados com Nas fases avançadas da doença, pode ha-
sintomas leves e um futuro incerto no que ver a necessidade de retirar as drogas dopa-
diz respeito à progressão; super exposição minérgicas devido à falta de eficácia em con-
precoce pode ser potencialmente perturba- trolar sintomas motores e aumento da sen-
dora, principalmente quando não se tem cer- sibilidade aos efeitos indesejáveis (motores e
teza do diagnóstico.15 Conhecimento em tor- não motores), tais como alucinações2. Como
no dos sintomas específicos está disponível recomendação geral, a retirada da medicação
através de livros e outros materiais escritos deve ser realizada com a ajuda do neurolo-
para o público leigo, através de organizações gista ou geriatra com grande experiência em
de doença de Parkinson (regionais, nacionais manejar doença de Parkinson2. Sempre que
e internacionais), que publicam panfletos possível, a retirada da droga deve ser gradual,
educativos e organizam simpósios para os a fim de atingir o melhor equilíbrio entre alí-
pacientes e suas famílias15. Existem cartilhas vio dos sintomas e efeitos secundários míni-
disponíveis online com orientações aos fami- mos. Essa situação requer reavaliações fre-
liars e cuidadores no site da associaçao brasi- quentes para ajuste de doses com a finalidade
leira de DP que pode ser acessado através do de manter o equilíbrio.2
endereço: www.parkinson.org.br.
INSTITUCIONALIZAÇÃO
Atividade Física Em fase avançada, a dependência para ati-
Exercício físico regular promove uma vidades de vida diária passa a ser importante.
sensação de bem-estar físico e mental, sendo Isto requer atenção contínua de um cuidador
importante para DP devido à sua natureza 2,16
. Nessa fase, a institucionalização pode ser
crônica e suas limitações motoras progres- uma alternativa, quando a família não con-
sivas associadas.15 O exercício não altera a segue prover o cuidado adequado em casa.2, 16
evolução natural da doença, mas pode aliviar No Reino Unido e nos Estados Unidos, existe
alguns efeitos ortopédicos secundários à ri- a opção de instituições que são para pacientes

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Capítulo 39 - Cuidados paliativos na doença de Parkinson

em paliativos exclusivos, os hospices2,16. Neste tors, Rev PLOS one. vol 7. 2012. Dis-
momento, é importante que já tenham sido ponível em: http://www.plosone.org/
discutidas diretrizes antecipadas em uma article/info%3Adoi%2F10.1371%2F-
fase mais precoce da doença, com o paciente journal.pone.0046327.
lúcido e podendo tomar decisões, pois é rea- 4. 
PETER L HUDSON, CHRISTINE
lizada a transferência do cuidado para equipe TOYE, LINDA J KRISTJANSON. Would
de paliativos que deve priorizar o principio people with Parkinson's disease bene-
da autonomia (desejo do paciente) em deci- fit from palliative care? RevPalliat Med.
sões como via de alimentação, controle de 2006. 20: 87/94. Disponível em: http://
sintomas (dor, dispneia, náuseas, vômitos), pmj.sagepub.com/content/20/2/87.
ordens de não reanimação, indicação de uni- 5. PATRICIA A. KOPLAS, HEIDI B.
dade de terapia intensiva e via área avançada. GANS, MARY P. Wisley, Quality of
Life Parkinson’s Disease, Journal of ge-
LUTO rontology: Medical sciences. 1999. v.54,
A morte de um paciente com DP é um n.4. 197-202.
momento em que os familiares/cuidadores 6. FERNANDA SOARES SILVA, JULIA-
precisam de apoio para redefinição de seus NA VITÓRIA PABIS CABRAL PABIS,
papéis sociais e para reorganizar a vida, já ANICLEIDE GOMES DE ALE. Evolu-
que estavam em função de cuidar há muitos ção da doença de Parkinson e compro-
anos, muitos convivendo com o isolamen- metimento da qualidade de vida. Revis-
to social.16 Encaminhamento para acon- ta Neurociencia. 2010. 18(4):463-468.
selhamento de luto é essencial para ajudar 7. 
JOSÉ ELIAS SOARES PINHEIRO.
a família e cuidador a fazer uma transição Doença de Parkinson e outros Transtor-
bem-sucedida. Para as famílias de pacientes nos do movimento, Tratado de Geriatria
que não tiveram Cuidados Paliativos no fim e gerontologia, Rio de Janeiro, 3º Ed,
da vida, serviços de luto estão disponíveis Guanabara Kogan. 2011. Cp.23, 289-291.
através de organizações religiosas e sem fins 8. SUE HALL, HRISTINAPETKOVA,
lucrativos.16 AGIS D. TSOUROS, MASSIMO COS-
TANTINI AND IRENE J. Higginson
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1. JOHAN LOKK1 AND AHMAD DEL- care for older people: better practices,
BARI. Clinical aspects of palliative World Health Organization. 2011.
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BMC Palliative Care. 2012. Marian McLaughlin. An exploration
2. The National Collaborating Centre into the palliative and end-of-life expe-
for Chronic Conditions (UK), Cap 11, riences of carers of people with Parkin-
Palliative care in Parkinson’s disease, son's disease. Palliat Med. 2010. 24:731.
Parkinson's Disease: National Clinical Disponível em: http://pmj.sagepub.
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ment in Primary and Secondary Care, 10. SARA VARANESE, ZOE BIRN-
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(UK). 2006. NICE Clinical Guidelines, DRO DI ROCCO. Treatment of Ad-
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ncbi.nlm.nih.gov/books/NBK48497/ son’s Disease, Dec. 2010.
3. IRENE J. HIGGINSON, WEI GAO, 11. ELDAD MELAMED, ILANZIV,
TARIQ ZAFFERSALEEM. Symptoms RUTH DKALDETTI. Manegement
and Quality of Life in Late Stage Par- of motor complications in advanced
kinson Syndromes: A Longitudinal Parkinson’s disease, Movement Disor-
Community Study of Predictive Fac- ders. V.22. 2007. s379-384.

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Capítulo 39 - Cuidados paliativos na doença de Parkinson

12. DANIEL TARSY, HOWARD I HUR- cologic management of Parkinson


TIG, JOHN F DASHE. Motor fluc- disease. Uptodate. This topic last up-
tuations and dyskinesia in Parkinson dated. Out 23, 2012.
disease. Uptodate. Ago 9, 2012. 16. LISETTE K. BUNTING-PERRY. Pal-
13. DANIEL TARSY, HOWARD I HUR- liative Care in Parkinson’s Disease:
TIG, JOHN F DASHE. Management Implications for Neuroscience Nur-
of comorbid problems associated with sing. Journal of Neuroscience Nur-
Parkinson disease. Jul 2 2012. sing. April 2006. V.38, N.2. S106-113.
14. ELZA DIAS-TOSTA, CARLOS RO- 17. 
CHEYLLAFABRICIA M SOUZA,
BERTO DE MELLO RIEDER, VAN- HELAYNECAROLYNE P ALMEIDA,
DERCI BORGES,YLMAR CORREA JOMÁRIO BATISTA SOUSA, PEDRO
NETO. Doença de Parkinson Reco- HENRIQUE COSTA, YONARASO-
mendações, Academia Brasileira de NALY S SILVEIRA, JOÃO CARLOS L
Neurologia, São Paulo, 2010. 1 ª ed. BEZERRA. A Doença de Parkinson e
Omnifarma editora. o Processo de Envelhecimento Motor:
15. DANIEL TARSY, HOWARD I HUR- Uma Revisão de Literatura. RevNeu-
TIG, JOHN F DASHE. Nonpharma- rocienc 2011. 19(4):718-723.

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Abordagem fonoaudiológica
na doença de Parkinson 40
CAPÍTULO

Karina Pereira
Tereza Loffredo Bilton

O objetivo deste capítulo, de caracteriza- que há uma evolução dos sintomas disfági-
ção da abordagem fonoaudiológica na doen- cos com a progressão da doença, além do
ça de Parkinson (DP), é abordar os principais fato de tais alterações serem notadas em to-
sintomas relacionados à doença e a sua in- das as fases da deglutição. Desse modo, na
terface com a fonoaudiologia, como as ne- fase oral, pode haver tremor nos órgãos fo-
cessidades de adaptação da consistência ali- noarticulatórios, dificuldade na formação e
mentar da dieta em cada estágio da doença, ejeção do bolo para orofaringe; na fase farín-
a terapia de deglutição, voz e articulação de gea, as alterações podem estar relacionadas a
uma forma abrangente, discutindo também a desordens da propulsão do bolo na faringe,
questão do limite terapêutico na abordagem alteração da mobilidade laríngea com estase
em Cuidados Paliativos. em recessos piriformes e valécula, com risco
Sabe-se que na DP a incapacidade gradual de aspiração e penetração laríngea; e na fase
que a própria doença provoca faz com que esofágica, pode haver estase de alimento ou
cada vez mais haja sensibilização de pesquisas atraso na abertura da transição faringoeso-
que buscam a cura e controle medicamentoso fágica. De maneira paralela às alterações fi-
eficaz e duradouro, além de terapias que pos- siológicas, há a necessidade de adaptação das
sam auxiliar na remissão ou estabilização dos consistências alimentares em cada estágio da
déficits apresentados. A intervenção fonoau- doença, seguindo as manifestações clínicas,
diológica na DP é frequente e, além de abordar com foco na otimização da deglutição segu-
as alterações relacionadas à fala, voz e degluti- ra e eficaz. Na fase inicial da doença de Par-
ção, relaciona-se à intervenção nos distúrbios kinson, a dificuldade de deglutição muitas
de linguagem, especialmente na compreensão vezes manifesta-se com relação aos líquidos,
de sentenças, embora ainda seja infrequente e os principais sintomas podem estar relacio-
pois tais alterações ainda não são dissemina- nados à falta de controle entre deglutição e
das e claras na literatura1. respiração, ingestão de grande quantidade
de líquido por oferta ou mesmo devido às al-
DISFAGIA E DISARTRIA NO PARKINSON terações fisiológicas já antes descritas, como
A disfagia a redução da elevação laríngea, dificultando
Ao se tratar das alterações fisiológicas da o processo de proteção de vias aéreas, a fim
deglutição na doença de Parkinson, sabe-se de prevenir a aspiração do alimento. Na fase

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Capítulo 40 - Abordagem fonoaudiológica na doença de Parkinson

moderada da doença de Parkinson, há piora minuição da intensidade vocal e alteração da


do quadro de disfagia, em que se pode obser- qualidade vocal (voz áspera,  rouca, soprosa
var dificuldades relacionadas às consistên- e trêmula).
cias sólida e líquida. Uma alternativa já nesta A fala, caracterizada pela disartria hipo-
fase da doença é que a consistência da dieta cinética, no que se refere à fisiologia da fona-
do paciente com DP já seja modificada, op- ção, relaciona-se com uma rigidez muscular,
tando por alimentos mais amolecidos e umi- acarretando fechamento incompleto das pre-
dificados, além de técnicas terapêuticas que gas vocais, movimentos de adução e abdução
auxiliem no processo de deglutição, como assimétricos, dificuldade de sonorização e
solicitar que o paciente degluta com força, dessonorização. A percepção dessas modifi-
realize tosse toda vez que houver alteração cações podem ser identificadas por mudan-
na voz após deglutição (“voz molhada”), bem ças na fonação. Interferindo na ressonância,
como outras estratégias de limpeza de reces- o funcionamento velofaríngeo pode ser nor-
sos faríngeos, como pigarro e escarro. mal ou rígido. No caso de rigidez, ocorre fe-
Na fase avançada da doença, pelo en- chamento reduzido, e, na percepção, há de se
volvimento do aspecto cognitivo, a disfagia observar voz normal ou hipernasal. Em casos
passa a ser grave. O paciente passa a não ter de maior comprometimento, a nasalização
controle oral do alimento, além de altera- pode atingir diversos segmentos fonêmicos.
ções em nível faríngeo e esofágico também Na articulação, pode haver fraqueza no con-
serem bastante notáveis, pelo próprio caráter trole muscular, rigidez, aceleração, tremor de
progressivo da doença. É nesta fase que ge- lábios e língua e uma articulação imprecisa2.
ralmente há a opção pela via alternativa de A expressão facial encontra-se prejudicada
alimentação, como a gastrostomia. A opção pelo enrijecimento dos músculos. Pode-se ob-
pela via alternativa de alimentação não deve servar nos pacientes com doença de Parkin-
ser um fator impeditivo na consideração do son um olhar fixo, com face rígida, não se
“prazer alimentar” e no aspecto psicológico identificando muitas vezes se o portador está
que a questão da alimentação norteia esta e alegre ou triste.
outras doenças crônico-degenerativas. Dessa
forma, estímulos táteis, térmicos e gustativos REABILITAÇÃO FONOAUDIOLÓGICA –
devem ser oferecidos ao paciente mesmo que CONSIDERAÇÕES GERAIS
em uso de sonda nasoenteral ou gastrosto- No que se refere à reabilitação fonoau-
mia, considerando-se a não oferta de volume, diológica dos pacientes com DP, esta visa a
e sim a de um sabor, considerando sempre o otimização da  coordenação pneumofonoar-
parâmetro de segurança alimentar, sob a su- ticulatória,  voz,  fala, mastigação e degluti-
pervisão de um fonoaudiólogo. Nestes casos, ção. É muito importante o reconhecimento
vale ressaltar a importância da abordagem precoce das alterações, para o início da abor-
multiprofissional no cuidado ao paciente, dagem terapêutica com maior possibilidade
sendo que a visão de humanização em saúde de sucesso.
deve ser norteadora para aproximar família e Algumas técnicas terapêuticas fonoau-
equipe no cuidado ao paciente. diológicas gerais serão descritas a seguir:
• Automassagem (rosto, pescoço e ombros)
A disartria • Exercícios que visem a otimização da ex-
Ao se tratar das alterações motoras causa- pressão facial, auxiliando na transmis-
das pela doença de Parkinson (tremor, rigidez são da mensagem. Os movimentos faciais
e bradicinesia), deve-se fazer relação direta (como elevar a testa, aproximar as sobran-
com a dificuldade na coordenação pneumo- celhas, enrugar o nariz, fazer sorriso e bico
fonoarticulatória, ou seja, com o processo de “aberto” e “fechado”) devem ser executados
inspiração – produção da voz – fala, causan- para facilitar a articulação das palavras.
do cansaço e falta de ar para falar, além de di- • Exercícios articulatórios para articular

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Capítulo 40 - Abordagem fonoaudiológica na doença de Parkinson

melhor as palavras, falando mais devagar. uso de um produto colutório (enxaguató-


Exagerar a articulação, principalmente das rio bucal). As próteses dentárias devem ser
vogais, dará grande diferença, sabendo-se sempre retiradas à noite, escovadas com
que todas as palavras da língua portuguesa sabão neutro e mantidas secas até o dia
possuem vogais; abertura da boca e movi- seguinte. É muito importante o acompa-
mentação da língua e articulação de sons nhamento odontológico desses pacientes
Ex:/la/ /la/; ler em voz alta – leitura falada; em todas as fases da doença, uma vez que a
leitura com sobrearticulação (manchetes perda de peso associada à desnutrição cau-
de jornais). sa frouxidão das próteses dentárias, que
• Exercícios fonatórios com foco na ideia de necessitam, além da reavaliação por um es-
“falar forte, falar alto”, segundo o Lee Sil- pecialista, muitas vezes de uso de produto
verman Voice Treatment (SLVT), que é um fixador para mantê-la fixada durante o dia.
dos métodos de tratamento fonoaudiológi-
co indicados para a doença de Parkinson. Conclui-se que ainda há escassa literatura
Trata-se de um programa de tratamento sobre aspectos de deglutição mais alterados
intensivo cujo treinamento estimula os em cada fase da doença de Parkinson. No
pacientes a realizarem exercícios simples entanto, o controle sintomático do ponto de
e repetitivos apoiados na produção de voz vista não farmacológico, neste caso consi-
forte. Diante das alterações sensoriais, os derando-se a terapia fonoaudiológica como
pacientes são constantemente solicitados aliada a esse processo, é muito eficaz na es-
a monitorarem a intensidade da voz e o tabilização do quadro e melhora da inteligi-
esforço empregado para produzi-la, o que bilidade de fala, comunicação, alimentação,
culmina na melhoria da propriocepção a deglutição e qualidade de vida do paciente
partir da audição3. com doença de Parkinson. Deve-se, ainda,
• Melhora da higiene oral: é importante discutir sobre técnicas terapêuticas mais efi-
para toda a equipe médica e multiprofis- cazes em cada estágio da doença, de forma a
sional realizar orientações de higiene oral garantir condutas mais coesas e eficazes no
em todas as fases da DP, uma vez que pode tratamento da enfermidade.
haver formação de placas orofaríngeas fa-
vorecendo o risco de broncoaspiração. Aos REFERÊNCIAS
pacientes que possuem dentes próprios 1. AGONILHA, D.C. Sentence Compre-
é importante a realização da higiene oral hension in individuals with Parkin-
com escova de dentes, sempre com pouca son’s Disease [dissertation]. São Paulo.
quantidade de pasta, otimizando também Faculdade de Medicina, Universidade
a escovação da língua para prevenir o acú- de São Paulo. 2008. 98p.
mulo de sujeira e microorganismos. Aos 2. ORTIZ, KARIN ZAZO (ORG). Distúr-
pacientes usuários de próteses dentárias, é bios neurológicos adquiridos: fala e de-
importante orientar sobre a escovação de glutição. 2º ed. Barueri, SP: Manole. 2010.
preferência com escova de cerda mais ma- 3. SKODDA S, SCHLEGEL U. Speech rate
cia, de maneira que permita a leve escova- and rhythm in Parkinson’s disease.
ção da gengiva e língua, sempre aliada ao Mov Disord. 2008. 23:985-92.

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Cuidados paliativos
em insuficência cardíaca 41
CAPÍTULO

Mariana de Carvalho da Silva


Julliana Lianzza Fernandes Silva
Roberto Dischinger Miranda

INTRODUÇÃO
A Insuficiência cardíaca (IC) é uma sín- dados Paliativos entram neste cenário, cada
drome clínica complexa resultante de uma vez mais frequente, com o objetivo de aliviar
desordem cardíaca estrutural ou funcional o sofrimento e angústia dos pacientes e seus
que compromete a função ventricular de familiares.5
enchimento e/ou ejeção.1 Desta forma, a IC
Figura 1 – Modelo esquemático do estágio
pode ser classificada em IC com fração de C e D da Insuficiência Cardíaca
ejeção preservada (muito prevalente entre os
idosos, aparecendo em mais de 50% dos ca-
sos) e IC com fração de ejeção reduzida.2 Excelente
Cuidados Paliativos
Dentre as doenças cardiovasculares, a
IC é a terceira causa total e a primeira de in-
Capacidade Funcional

2
3
ternação por motivos cardiovasculares em
pacientes com mais de 65 anos no Brasil, de Tratamento para
insuficiência
acordo com dados do Datasus.3 Além disso, 1 Cardíaca 4 5

o tempo de permanência hospitalar e read-


missões são mais frequentes entre os idosos Óbito

com IC se comparados aos mais jovens, em Tempo

decorrência principalmente das várias co- Morte Súbita


Transplante ou Dispositivo de Assistência Ventricular
morbidades existentes neste grupo popula-
Morte súbita pode ocorrer em qualquer momento da
cional, o que contribui ainda para o aumento doença.
da mortalidade.4 (1) Sintomas iniciais da IC e início do tratamento.
(2) Platô de estabilização da doença após início do
Apesar do grande avanço no tratamento tratamento
e aumento da sobrevida, a IC continua sendo e/ou dispositivo mecânico.
(3) D eclínio da capacidade funcional variável com
uma doença incurável na maioria dos casos exacerbações intermitentes que respondem à terapia
(figura 1). Desta forma, muitos acabam che- de resgate.
(4) IC estágio D com sintomas refratários e capacidade
gando ao estágio final da doença, experimen- funcional limitada.
tando sintomas refratários e hospitalizações (5) Fim da vida.

frequentes no último ano de vida. Os Cui- Adaptado de Goodlin SJ, et al6.

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Capítulo 41 - Cuidados paliativos em insuficência cardíaca

INSUFICIÊNCIA CARDÍACA NO IDOSO mais antiga e mais empregada na prática clí-


A doença aterosclerótica coronaria- nica é a classificação funcional estabelecida
na (DAC) e a hipertensão arterial sistêmi- pela New York Heart Association, porém com
ca (HAS), principais causas de IC, têm alta limitações para identificar a classe funcional
prevalência entre os idosos e frequentemen- em idosos com IC pela inespecificidade do
te coexistem no mesmo paciente, tornando quadro clínico e inatividade física. Já a clas-
assim o idoso mais suscetível ao desenvolvi- sificação proposta pela ACC/AHA leva em
mento de IC.7 consideração a presença de sintomas e car-
As manifestações clínicas da IC são im- diopatia estrutural, estratificando a disfun-
precisas e frequentemente atípicas na po- ção ventricular em estágios, de acordo com
pulação geriátrica devido à sobreposição sua evolução e progressão (Tabela 1). Obser-
de alterações cardiovasculares próprias do va-se que apenas os estágios C e D corres-
envelhecimento, redução da atividade física pondem à forma sintomática das disfunções
e capacidade funcional, além da alta preva- ventriculares, sendo o último a forma mais
lência de comorbidades associadas. Fadiga, avançada da doença.
cansaço, dispneia e baixa tolerância ao es-
forço são manifestações frequentes, porém INSUFICIÊNCIA CARDÍACA TERMINAL
nem sempre presentes nos idosos com IC. Não existe uma definição universalmente
Já dispneia paroxística noturna e ortopneia aceita sobre o estágio terminal da IC. Atual-
são mais específicas.7 Entre as manifesta- mente, acredita-se que este estágio corres-
ções atípicas com maior frequencia, pode- ponda aos pacientes no estágio D (cardiopa-
mos citar sonolência, náusea, dores abdo- tia estrutural avançada, com sintomatologia
minais, perda de apetite, confusão mental, exuberante, em repouso, apesar da terapêu-
insônia e delirium.8 tica otimizada).
Todo paciente com IC deve ser estratifi- A The Heart Failure Society of America
cado segundo sua gravidade a fim de traçar define como IC em estágio terminal os pa-
estratégias para avaliar e orientar a terapêu- cientes com IC em estágio avançado e sin-
tica assim como estimar seu prognóstico. A tomas persistentes em repouso, apesar da

Tabela 1 - Classificação da IC pela presença de cardiopatias estruturais (ACC/AHA)


ou pela capacidade funcional (NYHA)
ACC/AHA: Estágios NYHA: Classes funcionais
Estágio Descrição Classe Descrição
Presença de fatores de risco para IC, tais
como hipertensão, diabetes mellitus ou DAC, Sem
A
porém sem sintomas, sinais ou evidência de correspondência
anormalidade estrutural
Ausência de sintomas e/ou sinais de Sem limitação para atividades físicas.
B IC. Presença de cardiopatia estrutural I Atividades habituais não causam
correlacionada à IC dispneia, cansaço ou palpitações
Discreta limitação para atividades físicas.
II Atividades habituais causam dispneia,
cansaço ou palpitações
Presença de sintomas e/ou sinais de IC Importante limitação para atividades
C
associados à cardiopatia estrutural físicas.
III Atividades com intensidades inferiores às
habituais causam dispneia, cansaço ou
palpitações
Cardiopatia estrutural avançada, com Limitação para qualquer tipo de atividade
D sintomatologia exuberante, em repouso, apesar IV física.
da terapêutica otimizada Sintomas de IC em repouso.
IC – insuficiência cardíaca; ACC – American College of Cardiology; NYHA – New York Heart Association.
Adaptado de: II Diretrizes em Cardiogeriatria da Sociedade Brasileira de Cardiologia, 2010.

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Capítulo 41 - Cuidados paliativos em insuficência cardíaca

otimização das terapias não farmacológica The Seattle Heart Failure Model considera
e farmacológica, sendo evidenciadas uma ou um modelo multivariado em que dados clí-
mais das seguintes situações: 9 nicos como idade, sexo, pressão arterial sis-
• Hospitalizações frequentes (3 ou mais tólica, classe da NYHA, presença de doença
por ano). isquêmica cardíaca e peso são utilizados para
• Piora da qualidade de vida com incapa- estimar a sobrevida média em 1, 2 ou 5 anos,
cidade para realizar suas atividades de possibilitando uma melhor programação do
vida diária. tratamento, inclusive quanto ao benefício da
• Necessidade de medicações endoveno- adição de medicamentos e resultados.13 Em
sas intermitentes ou contínuas. pacientes hospitalizados, outro modelo dis-
• Necessidade de dispositivos artificiais. ponível é o do estudo OPTIMIZE-HF que
utiliza para predizer a mortalidade: idade
O tratamento moderno para IC acabou avançada, frequência cardíaca elevada na ad-
modificando o curso da doença e atenuou missão, níveis aumentados de sódio e creati-
sintomas. No entanto, os pacientes muitas nina sérica e baixa pressão arterial sistólica.14
das vezes não toleram a terapia otimizada por Esses modelos são úteis para estimar o
causa das comorbidades já existentes e efei- prognóstico, no entanto, os resultados devem
tos colaterais do tratamento, muito comuns ser individualizados. Pacientes com sintomas
nessa faixa etária além de recusarem proce- refratários, sofrimento e aflição importante,
dimentos invasivos após avaliação criterio- independente do prognóstico, podem se be-
sa dos riscos e benefícios do procedimento. neficiar de uma abordagem paliativa.10
Dessa forma, o cuidado paliativo deve ser
abordado o quanto antes, independente do DIRETRIZES ANTECIPADAS EM
estágio em que o paciente se encontra, prin- INSUFICIÊNCIA CARDÍACA –
cipalmente se as possibilidades terapêuticas PARTICULARIDADES DA DOENÇA
específicas já tiverem escassas.10 A IC é uma doença crônica e progressiva
e tanto o paciente como seus familiares de-
PROGNÓSTICO DA vem ser orientados sobre sua evolução e pro-
INSUFICIÊNCIA CARDÍACA postas de tratamentos ao longo dos estágios.
Vários estudos têm tentado encontrar Através das diretrizes avançadas, o paciente e
marcadores sejam eles bioquímicos, hemodi- sua família deverão ser orientados bem como
nâmicos e até mesmo funcionais para predi- esclarecidos quanto a um planejamento indi-
zerem um pior prognóstico do paciente com vidualizado da doença, visando tomadas de
IC. Alguns já foram bem identificados como decisões (tratamento, medidas invasivas de
idade, insuficiência renal, caquexia cardíaca, suporte à vida e reanimação, por exemplo) ao
anemia, hipotensão, hiponatremia, grau da longo do tempo, com base em valores e prefe-
disfunção sistólica, arritmia sintomática e rências individuais.15
hospitalizações recorrentes.11 Quando um paciente com insuficiência
Na IC, a maioria dos pacientes morre da cardíaca avançada começa a apresentar fa-
própria progressão da doença, no entanto, a lha terapêutica com medicações orais e não
morte súbita pode ocorrer em todas as fases preenche critérios para transplante cardíaco
da doença. O paciente com IC e classe fun- ou suporte circulatório mecânico deve ser
cional II, por exemplo, possui mortalidade feita uma transição para os Cuidados Palia-
de 5% a 10% ao ano, sendo que 80% destas tivos. A assistência médica através de uma
acontecem de forma repentina. Já os pacien- comunicação clara e aberta tem por base
tes com IC e classe funcional IV apresentam dois objetivos. Um visa a abordagem espe-
mortalidade de até 50% ao ano, sendo que cífica em relação ao prognóstico, incertezas
30% são súbitas e a maioria por falência car- inerentes e sobre as possibilidades de varia-
díaca propriamente dita.12 ções durante a trajetória de doença, incluin-

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Capítulo 41 - Cuidados paliativos em insuficência cardíaca

do até morte súbita. O outro visa avaliar as fissionais de saúde como os pacientes acabam
vontades do paciente e seus familiares sejam superestimando o prognóstico.22
no âmbito médico, psicossocial e até mesmo
espiritual, sendo respeitado o princípio da TRATAMENTO
autonomia sempre.16 A insuficiência cardíaca avançada repre-
Existem dois tipos principais de tomada senta um estágio da doença bastante sinto-
de decisão que devem ocorrer em preparação mático. As queixas mais comuns são disp-
para os cuidados de fim de vida: decisão em neia, dor, edema e fadiga.23 Outras causas de
situações de emergência (por exemplo, insu- sofrimento incluem isolamento, dificuldade
ficiência respiratória ou parada cardíaca) e de acesso a serviços de saúde especializados,
decisão no caso de piora clínica, no manejo além da incerteza sobre o prognóstico da
dos sintomas.17 Essas decisões variam muito doença e sua expectativa de vida.24 A maior
entre os pacientes com diferentes doenças em parte dos sintomas apresentados pelos pa-
fase terminal, e normalmente pacientes com cientes com insuficiência cardíaca avançada
insuficiência cardíaca são muito mais propen- é devido à própria fisiopatologia da doença.
sos a desejar medidas mais invasivas como Dessa forma, terapia otimizada de acordo
ressuscitação cardiopulmonar.18 Além disso, com a tolerabilidade do paciente faz parte
verificou-se que os pacientes com insuficiên- da base do tratamento desses pacientes.18 Em
cia cardíaca não são suscetíveis a alterar suas particular, os inibidores da enzima converso-
preferências mesmo depois de internações por ra de angiotensina (IECA) e diuréticos, além
descompensações ao longo da evolução da da redução da ingestão de sódio, são funda-
doença.19 Assim, é conveniente abordar essas mentais para redução do edema e congestão,
questões no início do curso da doença.20 melhorando os sintomas e a qualidade de
Devido à trajetória imprevisível e à má vida. Os β-bloqueadores estão relacionados
percepção da gravidade da doença pelos pa- à redução das taxas de mortalidade e hospi-
cientes, cria-se cada vez mais barreiras para talização. A espironolactona também possui
um planejamento eficaz dos cuidados com papel importante no controle dos sintomas e
antecedência.21 Percebe-se que tanto os pro- evolução da insuficiência cardíaca.6

Figura 41.2 - Relação entre sintomas e suas potenciais causas em pacientes com insuficiência cardíaca

Comorbidades Insuficiência cardíaca


Diabetes, doença pulmonar crônica, depressão

Sintomas

Sintomas concomitantes Sintomas típicos


Náusea, boca seca, dor, constipação, sonolência etc Dispneia, fadiga, edema

Polifarmácia

Fonte: Adaptado de David B. Bekelman et al, 2007.

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Capítulo 41 - Cuidados paliativos em insuficência cardíaca

Inicialmente devemos procurar resolver suplementar só é benéfica em pacientes com


os sintomas devido à descompensação de hipoxemia não reduzindo a dispneia em pa-
outras doenças pré-existentes. A causa espe- cientes não hipoxêmicos. 31
cífica dos sintomas muitas vezes é difícil de Figura 43.3 - Terapias paliativas devem ser
ser identificada, especialmente em pacientes adicionadas de forma gradual às terapias
tradicionais no controle da dispneia de pacientes
idosos com múltiplas comorbidades e poli- com IC avançada
farmácia (figura 42.2). Se após identificação
de uma causa específica, tratamento ade-
Dispneia refratária
quado e ajuste da terapia para insuficiência
cardíaca (IECA, β-bloqueador, espironolac- Terapia paliativa ( das doses
3
de opioides, benzodiazepínicos,
tona, diurético) o paciente ainda mantiver inotrópicos EV)
sintomático, devemos fazer uma abordagem
Piora da dispneia
dos mesmos seguindo os princípios dos Cui-
dados Paliativos.25 Terapia adjuvante 2
Dessa forma, o tratamento paliativo da com opioide
insuficiência cardíaca começa com uma ava- Piora da dispneia
liação padronizada e individualizada em que
serão avaliados os sintomas com instrumen- Otimização das terapias 1
tos específicos a fim de dimensionar a ampli- convencionais (IECA, diurético)

tude com que comprometem a funcionalida-


de do paciente e sua qualidade de vida.26 Adaptado de: Rocker et al, 2009.

ABORDAGEM DOS SINTOMAS: Dor


CONSIDERAÇÕES ESPECIAIS PARA A sensação de dor é uma queixa comum
PACIENTES COM INSUFICIÊNCIA em pacientes com insuficiência cardíaca
CARDÍACA independentemente da fase da doença. A
prevalência de dor aumenta com a piora da
Dispneia classe funcional, de acordo com a New York
Dispneia é um sintoma bastante comum Heart Association (69% dos pacientes com
experimentado por pacientes com insufi- classe funcional III e 89% dos pacientes com
ciência cardíaca avançada (35% nos últimos classe funcional IV).32
3 a 6 meses de vida e 60% nos últimos 3 dias A insuficiência cardíaca é uma doença
de vida).27 A base da terapia encontra-se na que afeta principalmente os idosos que fre-
diurese e vasodilatação a fim de diminuir a quentemente apresentam uma carga aumen-
congestão pulmonar. Para isso, podemos uti- tada de comorbidades médicas, o que pode
lizar IECA, nitratos de duração prolongada, contribuir ou causar dor individualmente.
hidralazina e diuréticos.28 No entanto, os pa- Apesar da fisiopatogenia da dor em pacien-
cientes podem apresentar hipotensão e dis- tes com insuficiência cardíaca não ser ainda
função renal, dentre outros fatores que po- bem definida, considera-se que tanto o pro-
dem limitar a utilização destas terapias. No blema cardíaco quanto as outras comorbida-
caso de dispneia refratária, opioides em bai- des contribuam para o aparecimento da dor.
xas doses podem ser utilizados.29 Os opioides Entre as possíveis causas de dor em pacien-
podem auxiliar tanto na dispneia quanto no tes com insuficiência cardíaca destacamos:
controle de outros sintomas como dor que doença articular degenerativa, lombalgia
frequentemente se sobrepõe. Os benzodia- crônica, ansiedade, depressão e estresse psi-
zepínicos podem ser utilizados como agentes cossocial, sugerindo um caráter multifatorial
de segunda linha, uma vez que apresenta- para a mesma.33, 34
ram resultados inferiores se comparados aos Embora haja uma alta prevalência de dor
opioides30 (figura 3). A terapia com oxigênio em pacientes com insuficiência cardíaca, o

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Capítulo 41 - Cuidados paliativos em insuficência cardíaca

uso de opioides é desproporcionalmente bai- limitado na IC terminal, uma vez que podem
xo nestes pacientes. Um recente estudo mos- causar prolongamento do intervalo QT além
trou que 22% dos pacientes com IC terminal de efeitos anticolinérgicos, como boca seca e
usavam opioides em comparação com 50% hipotensão ortostática, efeitos colaterais des-
dos pacientes com câncer.35 As razões para favoráveis no paciente com IC.18
esta disparidade não são claras, no entanto,
a razão para tal fato pode ser pela subestima- INOTRÓPICOS ENDOVENOSOS, CDI
ção da dor em pacientes com insuficiência E DISPOSITIVO DE ASSISTÊNCIA
cardíaca pelos prestadores de cuidados de VENTRICULAR ESQUERDA (LVAD):
saúde. O manejo específico da dor em insu- QUANDO INDICAR OU SUSPENDER
ficiência cardíaca tem sido pouco estudado. Planejamento de questões no fim da vida
Os princípios gerais do tratamento da dor se representa um desafio constante para os pro-
aplicam em pacientes com insuficiência car- fissionais de saúde no que diz respeito aos
díaca (ver no capítulo específico sobre dor pacientes com insuficiência cardíaca. Isto
neste livro). Os opioides são a base da terapia está relacionado, em parte, aos avanços da
e devem ser titulados de acordo com as ne- tecnologia médica como uso de inotrópicos
cessidades. No entanto, um cuidado especial endovenosos e os dispositivos utilizados no
deve ser dado ao uso de metadona para es- tratamento de insuficiência cardíaca como o
ses pacientes, uma vez que pode prolongar o dispositivo de assistência ventricular esquer-
intervalo QT. Eletrocardiogramas devem ser da e o desfibrilador implantável cardioversor
solicitados periodicamente se houver neces- (CDI). Estas novas técnicas possuem seus
sidade do uso da mesma.36 próprios dilemas na gestão de pacientes em
Os anti-inflamatórios não hormonais de- Cuidados Paliativos no fim da vida.18
vem ser evitados se possível em todos os pa-
cientes com insuficiência cardíaca devido à Inotrópicos endovenosos
maior propensão de retenção de fluidos e sódio, A terapia inotrópica endovenosa contí-
podendo descompensar a doença de base.37 nua (dobutamina) pode ser considerada para
paliação dos sintomas no final da vida de
Depressão pacientes com IC avançada. Existe recomen-
A depressão é altamente prevalente entre dação dessa terapia para tratamento palia-
os pacientes com insuficiência cardíaca avan- tivo em pacientes que apresentam sintomas
çada. Cerca de 1 em cada 5 pacientes apresen- refratários, sempre levando em consideração
ta critérios maiores de depressão.38 Em vá- que a mesma promove o aumento do risco
rios estudos houve associação entre depres- de morte súbita, além de acelerar o remo-
são e piora do quadro clínico de pacientes delamento ventricular.28 Uma meta-análise
com IC avançada. Além disso, os sintomas concluiu que os pacientes não apresentaram
depressivos estão fortemente correlaciona- melhora significativa dos sintomas e apresen-
dos com diminuição da qualidade de vida e taram risco aumentado de morte.39 Embora
aumento da dor. Apesar da necessidade óbvia exista um risco aumentado de morte súbita,
do tratamento da depressão nesses pacientes, este pode ser aceitável em pacientes com IC
há evidências limitadas sobre quais medi- avançada, com a melhora sintomática. Na
cações devem ser utilizadas. Os inibidores decisão sobre o uso de inotrópico endoveno-
da recaptação de serotonina ainda são con- so deve ser levada em consideração a auto-
siderados medicações de primeira escolha nomia do paciente por decidir o que prefere:
para tratamento da depressão nesses casos. uma expectativa de vida menor com menos
A maioria dos estudos dos antidepressivos sintomas ou aumento da expectativa de vida
não englobou pacientes com IC avançada. Os independente dos sintomas.40 Em relação
antidepressivos tricíclicos, que habitualmen- ao custo-benefício do uso desta medicação,
te já são evitados em idosos, têm um papel também foi visto que, apesar de diminuir o

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Capítulo 41 - Cuidados paliativos em insuficência cardíaca

número de exacerbações e admissões hos- em 2 anos.44 Com as melhorias na tecnologia


pitalares, os custos com a infusão do medi- médica, pacientes com LVAD têm apresenta-
camento foram maiores do que a economia do aumento na expectativa de vida e muitos
com a diminuição das internações quando acabam em algum momento necessitando
utilizadas por mais de 60 dias.41 dos Cuidados Paliativos. Como tal, muitos
pacientes com LVAD precisarão passar pelo
Cardioversor desfibrilador processo de decisão sobre sua descontinua-
implantável (CDI) ção. Ao contrário dos CDI, que podem ser
São dispositivos utilizados na prevenção desativados sem efeito imediato, a suspensão
primária ou secundária de morte por arrit- do LVAD resulta em descompensação rápi-
mias ventriculares fatais. No entanto, o CDI da e consequentemente acelera o processo de
não melhora os sintomas na IC avançada, morte. Este cenário clínico tem sido compa-
podendo criar ainda mais complicações de- rado à retirada do tubo endotraqueal num
vido a descargas inadequadas aplicadas pelo paciente com suporte ventilatório invasivo,
dispositivo. Portanto, quando um paciente se embora os pacientes com LVAD na maioria
aproxima do fim da vida, em decorrência da das vezes estão alertas e acordados. Apesar
falha progressiva da bomba cardíaca, o im- de todos os dilemas éticos, a autonomia do
plante de CDI não é indicado.28 Além disso, paciente ainda deve ser seguida. Num pe-
a desativação do dispositivo deve ser uma queno estudo, observou-se que os principais
decisão compartilhada entre paciente, fami- motivos que faziam o paciente ou seus fa-
liares e o profissional de saúde na tentativa miliares optarem por desligar o dispositivo
de evitar sofrimento. Para isso, deve ser dis- foram: infecção/sepse, acidente vascular ce-
cutido antes da implantação do mesmo sobre rebral, câncer, insuficiência renal e iminên-
a possível necessidade de desativação com o cia da falência cardíaca.45 Este estudo tam-
avançar da doença. No entanto, dados indi- bém mostrou que a média de tempo entre a
cam que os prestadores de cuidados de saúde desativação e a morte do paciente foi de 20
não discutem com seus pacientes sobre a pos- minutos, indicando que um plano cuidado-
sibilidade de desativação do CDI. Um estudo so para conforto e apoio após desativação
recente constatou que apenas 1 em cada 4 do mesmo se faz necessário. Apesar de não
parentes mais próximos relatou que um mé- haver recomendações específicas para deter-
dico havia discutido sobre a desativação do minar quando a descontinuação desse dis-
dispositivo antes do familiar falecer.42 Dessa positivo deve ser feita, observa-se que a piora
forma, para evitar descargas inadequadas e da qualidade de vida ou sinais de falência de
o sofrimento do paciente, a discussão sobre sistemas ou órgãos devem provocar discus-
a desativação do CDI deve ocorrer antes da são sobre a interrupção do dispositivo. Tal
colocação do mesmo e ser periodicamente como é recomendado com CDIs, os cenários
conversado principalmente quando o pa- possíveis em torno da desativação devem ser
ciente tem indicações de Cuidados Paliativos discutidos antes da implantação.18
devido à doença avançada.43
APOIO AO CUIDADOR
Dispositivo de assistência Cuidadores formais e informais (fami-
ventricular esquerda (LVAD) liares, parceiros, amigos) são essenciais no
Este dispositivo foi originalmente desen- cuidado do paciente. Os cuidadores desem-
volvido como uma ponte do paciente com penham um papel importante ajudando os
doença cardíaca avançada com indicação pacientes mais velhos com insuficiência car-
de transplante cardíaco. Porém está sendo díaca a gerenciarem suas múltiplas comorbi-
utilizado cada vez mais em pacientes sem dades e medicamentos. O cuidado paliativo
indicação de transplante. A sobrevida atual também engloba uma atenção especial ao
estimada no estudo Heart Mate II foi de 58% cuidador fazendo parte das estratégias de

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Capítulo 41 - Cuidados paliativos em insuficência cardíaca

2. M ASOUDI FA HE, SMITH G, FISH RH,


tratamento, atendendo às suas necessidades STEINER JF, ORDIN DL, ET AL. Gen-
psicossociais e envolvendo-os no tratamento der, age, and heart failure with preserved
do paciente.26 left ventricular systolic function. J Am Col
Cardiol. 2003. 41:217-23.
CONCLUSÃO 3. FM AF. O que vem ocorrendo com a insu-
O aumento da expectativa de vida e con- ficiência cardíaca no Brasil. Arq Bras Car-
sequentemente do número de pacientes ido- diol. 2005. 85:155-6.
sos com insuficiência cardíaca vai exigir cada 4. ABRAHAM WT FG, ALBERT NM,
vez mais atenção por parte dos profissionais STOUGH WG, GHEORGHIADE M,
de saúde.26 A insuficiência cardíaca avança- GREENBERG BH, ET AL. On behalf of the
da apresenta altas taxas de morbidade e de OPTIMIZE-HF investigators and coordi-
mortalidade. Há uma grande necessidade de nators. Predictors of in-hospital mortality
tratamento paliativo tanto para o sofrimen- in patients hospitalized for heart failure.
to físico como para o emocional ao longo do Journal of the American College of Cardi-
processo da doença. Uma boa comunicação ology. 2008. 52(5):347-56.
garantirá melhor compreensão da doença, 5. A DAMS KF, JR., ZANNAD F. Clinical
diminuindo a angústia gerada pelas incer- definition and epidemiology of advanced
tezas do prognóstico. Existem atualmente heart failure. American heart journal.
poucos estudos sobre a abordagem de sinto- 1998 Jun;135(6 Pt 2 Su):S204-15. PubMed
mas específicos apresentados por pacientes PMID: 9630086.
6. GOODLIN SJ, HAUPTMAN PJ, ARNOLD
com insuficiência cardíaca avançada. Uma
R, GRADY K, HERSHBERGER RE, KUT-
melhor investigação sobre as modalidades
NER J, ET AL. Consensus statement: Palli-
do tratamento paliativo específico para estes
ative and supportive care in advanced heart
pacientes será necessária no futuro.18 failure. Journal of cardiac failure. 2004 Jun.
A abordagem paliativa, portanto, deve 10(3). 2009. PubMed PMID: 15190529.
consistir em medidas farmacológicas e com- 7. GRAVINA CF RR, FRANKEN RA, FREI-
portamentais a fim de reduzir substancial- TAS EV, LIBERMAN A, ET AL. Sociedade
mente os sintomas promovidos pela própria Brasileira de Cardiologia. II Diretrizes em
insuficiência cardíaca assim como o controle Cardiogeriatria da Sociedade Brasileira de
dos sintomas gerados pelas outras comor- Cardiologia. Arq Bras Cardiol. 2010. 95(3
bidades preexistentes. Agindo dessa forma supl.2):1-112.
haverá melhora da qualidade de vida tanto 8. DAYER M, COWIE MR. Heart failure:
para os pacientes como familiares, além de diagnosis and healthcare burden. Clinical
reduzir consideravelmente os custos de saúde medicine. 2004 Jan-Feb. 4(1):13-8. PubMed
e internações frequentes.26 PMID: 14998260.
9. A MERICA HFSO. Section 8: disease man-
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360

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Capítulo 41 - Cuidados paliativos em insuficência cardíaca

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Cuidados paliativos em
doença respiratória avançada 42
CAPÍTULO

Maria Carolyna Fonseca Batista


Licia Caldas Figueiredo
Bruno Beraldo
Flávio Ferlin Arbex

INTRODUÇÃO
Este capítulo tem como objetivo levantar reduções na ordem de 8% a 10% por década,
as principais questões e particularidades en- a partir dos 40 anos de idade.
volvidas no cuidado do paciente idoso com Tais alterações estruturais levam a alte-
pneumopatia avançada, não oncológico. rações na função pulmonar: observa-se a re-
dução progressiva da capacidade vital (CV)
O ENVELHECIMENTO e da capacidade inspiratória (CI) e aumen-
E O SISTEMA RESPIRATÓRIO to do volume residual (VR) – a capacidade
O processo de envelhecimento pode va- pulmonar total (CPT) pouco se altera. Há
riar entre indivíduos, mas é um fenômeno também alterações neuro-hormonais, como
que atinge todos os seres humanos, gerando uma diminuição da resposta ventilatória às
uma série de mudanças tanto morfológicas variações das pressões parciais do oxigênio
quanto funcionais em todos os sistemas.1 (PaO2) e do dióxido de carbono (PaCO2) no
No sistema respiratório, particularmente, sangue. Em resumo, com o envelhecimento,
sabemos que o desenvolvimento se estabili- as respostas à hiperóxia, hipóxia, hipercap-
za entre 20-25 anos. A partir deste momen- nia, hipocapnia, broncoconstrição e bron-
to inicia-se um declínio funcional, marcado coaspiração estão reduzidas em relação ao
pelo enrijecimento da caixa torácica, perda adulto jovem.
da retração elástica dos pulmões, diminui- Todas essas alterações podem resultar em
ção da complacência pulmonar e fraqueza piora da relação ventilação-perfusão (V/Q) e
dos músculos respiratórios.2 A diminuição das trocas gasosas. Uma leve diminuição da
da força de musculatura respiratória com a PaO2 é esperada com a progressão da idade.
idade pode ser explicada principalmente por A PaO2 decai cerca de 4% por década de vida
sarcopenia associada ao processo de enve- após os 30 anos, podendo ser estimada atra-
lhecimento.3 Vários autores têm documenta- vés da seguinte fórmula:
do essa diminuição em indivíduos de várias
origens étnicas, incluindo o Reino Unido4, A PaO2 ideal para a idade: PaO2 = 100 – (idade/3)
EUA5, Brasil6 e China7, e estima-se que haja

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Capítulo 42 - Cuidados paliativos em doença respiratória avançada

Quadro 42.1 - As principais alterações envolvidas no envelhecimento do Sistema Respiratório


Alterações estruturais e funcionais no tórax e pulmões com o envelhecimento
Sistema Alterações estruturais Função
Superfície alveolar Capacidade de difusão, Espaço morto fisiológico
Capacidade de oxigenação
Espaço morto anatômico
Dilatação dos bronquíolos e ductos alveolares
Da proteólise de elastina Instabilidade traqueobrônquica
Pulmões
Reorientação das fibras elásticas Fechamento precoce das pequenas vias aéreas
Superfactante Alteração nos volumes pulmonares
Alteração de ventilação perfusão
Capacidade de oxigenação
Tórax Flexibilidade, perda de massa muscular Volume corrente e frequência respiratória
Adaptado de (8).

Essas alterações fisiológicas são fatores às necessidades e procedimentos envolvidos


fundamentais para entendermos que a per- com o cuidado e às possíveis barreiras na
da da funcionalidade do sistema respiratório comunicação frente às comorbidades asso-
faz parte do envelhecimento. Segundo levan- ciadas, demência principalmente. É essa uma
tamento publicado em 2010, as duas causas das razões por que se preconiza a antecipa-
mais frequentes de internação de pacientes ção das diretivas avançadas, tema a ser abor-
idosos (60 anos ou mais) nos hospitais do dado em outro capítulo deste livro.11
SUS são a insuficiência cardíaca e coronaria- A decisão mais importante e talvez a
na e as doenças pulmonares, que se revezam mais difícil seja identificar o momento de
como a primeira e a segunda causa2,9; fazendo iniciar ou mesmo propor os Cuidados Pa-
indispensável a implementação de medidas liativos. De forma geral, o cuidado paliativo
apropriadas para auxiliar na manutenção da deve estar disponível quando os cuidados
saúde e qualidade de vida desses pacientes.10 curativo-restaurativos se iniciam e manter-
se até depois que os tratamentos que pro-
CUIDADOS PALIATIVOS NO PACIENTE longuem a vida sejam retirados.12 A OMS
IDOSO COM DOENÇA RESPIRATÓRIA enfatiza que a intervenção paliativa deva ser
A definição e o papel de quem trabalha incorporada preferencialmente em um es-
com Cuidados Paliativos vem passando por tágio precoce da doença, juntamente com o
uma constante atualização. Hoje, podemos tratamento específico.13
dizer que Cuidados Paliativos é uma es- A doença pulmonar avançada (DPA) é de-
pecialidade interdisciplinar que visa apri- finida como toda doença pulmonar crônica
morar a qualidade de vida dos pacientes e não neoplásica, cujo portador em geral é ido-
famílias que enfrentam problemas associa- so, tem grande limitação para realizar tare-
dos com doenças avançadas – não limita- fas de vida diária, função pulmonar e trocas
das ao fim da vida – através da prevenção e gasosas bastante reduzidas e eventualmente,
do alívio de sofrimento, possibilitando por estado mental-social deteriorado. A maioria
identificação precoce e avaliação correta, o dos pacientes é portador de DPOC estádio
tratamento da dor e outros sintomas de or- IV (SBPT/GOLD - VEF1 < 30% do predito),
dem física, psicossocial e espiritual, junta- isolada ou associada a outras pneumopatias,
mente com as preferências e valores de cada seguida das fibroses pulmonares, doenças de
paciente e sua família. circulação pulmonar, bronquiectasias exten-
No paciente idoso, o Cuidado Paliativo sas, doenças neuromusculares, fibrose cística
apresenta algumas particularidades tanto no e muitas outras14. Tratam-se de doenças com
que se refere ao perfil dos pacientes quanto curso variável de comprometimento de fun-

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Capítulo 42 - Cuidados paliativos em doença respiratória avançada

cionalidade e qualidade de vida, sendo que, Talvez devido à própria percepção da DPOC
na dimensão física destas doenças, a dispneia pelo paciente como uma doença não fatal e
é o seu sintoma cardinal. Outros sintomas pelo fato da maioria ter sofrido com a doença
comumente associados são tosse, hipersecre- por um longo período e aprendido de alguma
ção brônquica, sibilância, fadiga e anorexia. forma a conviver com ela, sem grande per-
Na DPOC (Doença Pulmonar Obstruti- cepção ou declínio de sua qualidade de vida
va Crônica), as exacerbações de etiologia in- e funcionalidade.
fecciosa fazem parte da evolução natural da A ATS (American Toracic Society) publi-
doença, aumentando, nessa ocasião, a proba- cou em 2008 um documento abordando o
bilidade de óbito e piorando a qualidade de cuidado paliativo em pacientes com doen-
vida. Outras patologias, como a FIP (Fibro- ças respiratórias avançadas, identificando
se Pulmonar Idiopática), podem apresentar o papel do médico que assiste a esse paci-
exacerbações sem causa definida que, por sua ente e sua família. Este documento aponta
vez, também apresentam importante contri- que as decisões para pacientes com doen-
buição na morbimortalidade dos pacientes. ças pulmonares avançadas devem também
Na DPOC, a perda de massa muscular, abordar, inclusive, a ventilação mecânica
osteoporose, dor, elevação do risco de trom- e o transplante de pulmão. Estes assuntos
bose, déficit cognitivo, distúrbio do sono e precisam ser tratados com sensibilidade,
cardiopatias (fibrilação atrial, insuficiência levantando suas vantagens e desvantagens,
cardíaca e hipertensão arterial) são outras atentando para a possibilidade de se passar
comorbidades/sensações envolvidas e inti- menos tempo com a família de acordo com
mamente relacionadas com a dispneia, ge- a decisão tomada17.
rando uma importante carga psicológica e A recomendação é a de que a tomada de
contribuindo para o surgimento ou mesmo decisão no momento final da vida deve ter
agravamento de depressão, ansiedade e medo três elementos principais.
“de um dia faltar o ar”, como colocam mui-
tos pacientes, podendo gerar sintomas com 1. 
O esforço sincero e compassivo do
maiores proporções que o esperado pelas al- médico de informar o paciente (ou fa-
terações funcionais.15-16 miliar substituto, responsável, caso o
Já as consequências sociais são, em sua paciente não tenha a capacidade de to-
maioria, relacionadas às limitações na vida mar decisões) que ele ou ela está com
cotidiana, afetando paciente e família. risco iminente de morrer, caso essa seja
Um estudo inglês realizado por Ed- a condição.
monds et al. em 2001 comparou as necessi- 2. Abordar o paciente ou substituto sobre
dades por Cuidados Paliativos entre pacien- o seu tratamento, sobre a escolha de
tes pneumopatas crônicos não oncológicos receber apenas ou principalmente os
versus pacientes oncológicos. Os resultados Cuidados Paliativos e de descontinuar
observados foram que os pacientes que fa- as intervenções de prolongamento da
leceram por pneumopatias crônicas não on- vida.
cológicas experimentaram sintomas físicos e 3. Administrar e coordenar a prestação
psicossociais tão graves quanto os pacientes de Cuidados Paliativos ao paciente jun-
oncológicos e por um período mais prolon- to à equipe e à família próximo ao final
gado de tempo, experimentaram mais disp- da vida.
neia, menos acesso a Cuidados Paliativos
sistematizados e menos informação sobre Dessa forma, fica claro que a doença
seu prognóstico.17-20 Outros estudos com respiratória no idoso não se trata apenas do
DPOC21-22 têm demonstrado que os próprios manejo de sintomas, mas de um real escla-
pacientes são relutantes em discutir assuntos recimento e preparo desse paciente e de sua
sobre Cuidados Paliativos com o seu médico. família para o enfrentamento de suas inter-

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Capítulo 42 - Cuidados paliativos em doença respiratória avançada

corrências em todas as esferas, física, espi- pacientes. Sabemos que, apesar de a dispneia
ritual e psicosocial, devendo o cuidado e a aumentar com o grau de disfunção, pacientes
abordagem dos Cuidados Paliativos se darem com doenças obstrutivas têm discrepância
logo no diagnóstico, permitindo ao paciente entre o grau de dispneia e a gravidade da li-
e à sua família participarem da tomada de mitação ao fluxo aéreo. A graduação da disp-
decisões e assim buscarem um atendimento neia influencia e prevê a qualidade de vida
digno, priorizando a qualidade de vida e sua relacionada à saúde e à sobrevivência de uma
funcionalidade.15,21,23 forma mais ampla do que as medidas fisio-
lógicas, de forma que podemos dizer que a
AVALIAÇÃO FUNCIONAL dispneia tem melhor correlação com quali-
DO PACIENTE PNEUMOPATA dade de vida e com sobrevida em portadores
A avaliação funcional do paciente pneu- de DPOC, em comparação à gravidade fun-
mopata não é importante apenas para seu cional, expressa pelo VEF1.14,24-25
diagnóstico, mas para seguimento da tera- Existem mais de 30 escalas diferentes
pêutica e planejamento de cuidados. para avaliação da dispneia. Há escalas uni-
O principal exame é a espirometria. A dimensionais, que levam em conta somente
espirometria é um teste que auxilia tanto um aspecto da dispneia, sendo também usa-
na prevenção quanto no diagnóstico e na das para graduar fadiga como a escala ana-
quantificação dos distúrbios ventilatórios, lógica visual (VAS)26 e a escala de Borg27 e
provendo informações que auxiliam tam- instrumentos multidimensionais ancorados
bém na decisão terapêutica. Deve ser parte às atividades como o índice de dispneia ba-
integrante da avaliação de pacientes com sal de Mahler (BDI)28 e a escala de dispneia
sintomas respiratórios ou doença respirató- da Universidade de San Diego, Califórnia
ria conhecida.14 (SoBQ)29, que consideram diversos aspectos
Quando necessária, a medida de volu- da dispneia, sendo que esta última contempla
mes pulmonares (pletismografia ou diluição o seu aspecto emocional.
dos gases) auxilia no diagnóstico de doenças Em uma revisão realizada por Dourado
restritivas, além de possibilitar uma melhor et al., publicada em 2009 no Jornal Brasi-
avaliação de pacientes com obstrução ao flu- leiro de Pneumologia sobre a aplicação de
xo aéreo (permitindo medidas como espaço escalas de dispneia e de qualidade de vida
morto, resistência das vias aéreas e volumes em DPOC30, os autores concluíram que uma
pulmonares). escala unidimensional pode ser utilizada de
A medida da difusão do monóxido de forma adequada associada a escalas especí-
carbono (DCO) pode ser útil, em alguns ca- ficas de qualidade de vida. Por outro lado,
sos, devido à sua associação com a dessatu- a graduação da dispneia dos pacientes com
ração no exercício e melhor correlação com DPA com escalas de dispneia multidimensio-
os sintomas. nais melhores acompanham a efetividade da
terapêutica a ser instituída.
AVALIAÇÃO DA QUALIDADE Os questionários mais usados são os se-
DE VIDA E DISPNEIA guintes:
Uma das formas de dimensionar o esta-
do de saúde e as repercussões que a doença Short-Form 36 (SF-36)
causa aos pacientes, a fim de correlacioná-los O The Medical Outcomes Study 36 – Item
com qualidade de vida ou evolução do qua- Short Form Health Survery (SF-36) é um ins-
dro e avaliar o efeito de alguma intervenção, trumento de avaliação de qualidade de vida
é através de questionários. Nas doenças res- validado, de fácil administração e compreen-
piratórias, esses questionários avaliam ini- são. É um questionário multidimensional,
cialmente a dispneia no contexto da doença e formado por 36 itens, englobados em 8 com-
traçam um paralelo da qualidade de vida dos ponentes ou domínios: capacidade funcional,

366

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Capítulo 42 - Cuidados paliativos em doença respiratória avançada

aspectos físicos, dor, estado geral da saúde, que assiste o doente reconhecer cada um
vitalidade, aspectos sociais, aspectos emo- deles e iniciar o correto manejo, visando o
cionais e saúde mental. Ele pode ser sinteti- conforto dele34 .
zado em dois componentes, mental e físico.
Apresenta um escore final de 0 a 100, no qual DISPNEIA
zero corresponde ao pior estado geral e 100 Apesar de todos os questionários, a ava-
ao melhor estado de saúde.31-32 liação da dispneia continua a ser um desafio
em função de ser uma sensação eminente-
Questionário de Vias Aéreas 20 (AQ-20) mente subjetiva caracterizada, essencialmen-
O AQ20 é um questionário específico te, pela percepção desconfortável da respira-
para doenças respiratórias de caráter obstru- ção ou receio de não conseguir respirar.
tivo, também validado e que permite avaliar É um sintoma comum em diversas doen-
a resposta de uma intervenção. A sua grande ças avançadas sob Cuidados Paliativos, aco-
vantagem é a praticidade de aplicação por le- metendo cerca de 21-90% dos pacientes em
var de 4 a 5 minutos. São 20 itens, engloban- Cuidados Paliativos. Vale ressaltar que cerca
do respostas com sim / não / não se aplica, de 24% dos pacientes que apresentam disp-
podendo o resultado variar de 0 (melhor) a neia não apresentam nenhuma patologia
100% (pior). A sua grande limitação é não cardiopulmonar.35 Nesse contexto, a ava-
possuir um ponto de corte ou variação mí- liação adequada deve englobar a compreen-
nima para se avaliar a melhora ou piora após são de sua intensidade, angústia e impacto
determinada intervenção.33 funcional para o doente a fim de identificar
fatores potencialmente reversíveis e monito-
Questionário Saint George rar a resposta frente às intervenções. É fun-
na Doença Respiratória (SGRQ) damental que se avalie não só a intensidade
O SGRQ é um questionário de 76 itens (fraca, moderada ou acentuada), mas as suas
englobando três áreas: sintomas, atividades características, os fatores desencadeantes, o
e impacto da doença no dia a dia do pacien- ritmo de evolução, fatores de melhora e pio-
te. Em geral, sua aplicação se dá por volta de ra, além da identificação da doença que leva
20 minutos e a dispneia é avaliada de forma ao sintoma, sempre individualizando a sua
indireta por outros sintomas como tosse, ex- abordagem.
pectoração e sibilância.30 A próxima etapa depois de tentar avaliar
de forma apropriada é explicar ao paciente,
AVALIAÇÃO E MANEJO família e equipe assistente que o sintoma
DOS PRINCIPAIS SINTOMAS pode ser controlado e existem medidas apro-
Os sintomas mais frequentemente apre- priadas e não invasivas para o seu controle,
sentados por pacientes com doença pulmo- antes de partir para a sedação, ideia comum
nar avançada incluem: dispneia, tosse, dor de que se tem como única alternativa em ca-
e hipersecreção brônquica. Cabe a equipe sos de doença avançada.

Quadro 42.2 - Classificação e conduta na dispneia

Dispneia fraca Dispneia moderada Dispneia acentuada

• T ratamento das doenças de base • T ratamento das doenças de base • T ratamento das doenças de base
• T ratamento dos fatores • T ratamento dos fatores • T ratamento dos fatores
psicossociais psicossociais psicossociais
•C  odeína 30mg 4/4h •R  eabilitação pulmonar •R  eabilitação pulmonar
•O  pioides •V  entilação facial
•C  onsiderar o uso de ansiolíticos •A  nsiolíticos
•O  pioides
•V  entilação não invasiva

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Capítulo 42 - Cuidados paliativos em doença respiratória avançada

Tendo causas corrigíveis, é possível con- Tabela 42.1. Dosagem inicial dos principais opioides
trolar de forma mais rápida e fácil. O trata- para controle da dor e da dispneia (*DPOC e
Cardiopatas devem começar com 1/2 dose)
mento das doenças de base inclui tratar ane-
mia, derrame pleural, insuficiência cardíaca, Agentes
Uso
Uso oral Intervalo
obstrução aérea reversível e hipoxemia, além endovenoso

do tratamento de obstrução ou compressão Metadona 2,5 - 10mg 5 - 10mg 4 - 12h


brônquica.17, 36
Morfina 2 - 10mg 5 - 10mg 4h
Algumas medidas gerais não farmaco-
lógicas podem ajudar a dar mais conforto e Codeína – 30mg 4h
incluem: técnicas de relaxamento e suporte Adaptado de (40).
psicossocial, acupuntura e acupressão (pres-
são com os dedos nos pontos de acupuntura), vez que existe um componente emocional
modificação do nível de atividade e o uso de importante presente nesse sintoma. A droga
auxiliares de banho e cadeiras de rodas para mais utilizada para controle desse sintoma é
aumentar a autonomia dos pacientes e suas o midazolan em doses baixas, de 5 a 10 mg
famílias, além do uso de um ventilador com em 24h.15-16,36
ar frio soprando no rosto.37-38 A sedação paliativa é outra medida que
Outro item importante no tratamento pode ser levantada para aqueles pacientes nos
da dispneia é a reabilitação pulmonar, que estágios finais em que os sintomas persistem
inclui a prática de atividades físicas, supor- apesar de tentadas as medidas convencionais.
te nutricional, estratégias respiratórias, uso É mais comumente utilizada em casos de dor,
de oxigênio suplementar (quando indicado) dispneia, delirium hiperativo e convulsões.
e medidas farmacológicas para obstrução de Maiores detalhes serão abordados em outro
vias aéreas.36,39 capítulo deste livro.
Além das medidas gerais já descritas para
a dispneia, algumas medidas farmacológicas INDICAÇÃO DE OXIGÊNIO
podem ajudar a amenizar esse sintoma. En- DOMICILIAR PROLONGADA
tre essas drogas, estão os opioides e os benzo- Além de aumentar a sobrevida dos pacien-
diazepínicos. Sabe-se que existem receptores tes com DPOC, a indicação de oxigênio domi-
opioides no SNC e por todo sistema respi- ciliar prolongada (ODP) comprovadamente
ratório, porém o mecanismo de ação dessas melhora a qualidade de vida, aumenta a tole-
drogas no controle da dispneia ainda não rância ao exercício, reduz o número de hos-
está completamente elucidado.15-16, 36, 40 pitalizações, melhora o estado neuropsíquico
É recomendado o uso de opioides de forma dos pacientes, reduz a policitemia e atenua a
sistêmica como primeira linha no tratamento progressão da hipertensão pulmonar.41
de dispneia (grade 1A), sendo a morfina a dro- Quando prescrita, a suplementação de
ga de escolha para os casos graves e a codeína oxigênio nas outras causas de insuficiência
para os casos leves, virgens de tratamento. Na respiratória segue, atualmente, as mesmas
tabela abaixo está descrita a dose inicial de al- recomendações da DPOC, sendo recomen-
guns opioides para uso no controle da dor e da dado para alívio da dispneia apenas em
dispneia. Vale lembrar que podem ser dadas pacientes hipoxêmicos ao repouso ou aos
doses de resgate nos intervalos entre as toma- mínimos esforços41-42. A gasometria arterial
das programadas e devem-se titular as doses em ar ambiente é imprescindível para a in-
totais diárias cuidadosamente, com aumentos dicação e prescrição da ODP. Pode ser pres-
de 50% a cada 24 horas.15-16, 36 crita provisoriamente nas exacerbações da
Para pacientes em que a dispneia for re- DPOC, mas esta somente deve ser mantida
fratária ao uso de opioides ou acompanhada após a confirmação da presença de hipoxe-
de ansiedade, os benzodiazepínios podem mia na fase estável da doença, seguindo as
ser empregados de maneira adjuvante, uma indicações clássicas:

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Capítulo 42 - Cuidados paliativos em doença respiratória avançada

Tabela 42.3 - Dosagem inicial dos principais


1) PaO2 < 55 mmHg ou saturação arterial de medicamentos de uso inalatório para controle
oxihemoglobina (SaO2 ) < 88% em ar ambiente da tosse
e em repouso; ou
Agente Uso inalatório Intervalo
Bupivacaína 5ml (solução 0,25%) 8h
2) PaO2 = 56 - 59 mmHg em ar ambiente e em
Xilocaína 5ml (solução 2%) 6h
repouso, com evidências clínicas de cor pulmonale
ou hematócrito >55%. Codeína – 30 mg
Adaptado de (40).

TOSSE Podem também ser usados anestésicos lo-


Ocorre por estímulos sensoriais (mecâni- cais, de forma inalatória, conforme tabela 42.3.
cos, químicos, inflamatórios e imunológicos)
na árvore traqueobrônquica e pode ser um HIPERSECREÇÃO DE VIAS AÉREAS
sintoma transitório ou persistente. É impor- Do ponto de vista não farmacológico,
tante determinar o diagnóstico diferencial e é fundamental o trabalho integrado com o
o tratamento de potenciais causadores para fisioterapeuta através de técnicas para ade-
tosse como, por exemplo, efeito secundário quar o posicionamento da cabeça e da via
de fármacos, insuficiência cardíaca, o refluxo aérea, de modo a facilitar a drenagem de
gastroesofágico ou o gotejamento pós-nasal secreções, evitando acúmulo e consequen-
de rinossinusopatia. te piora do desconforto, além de respiração
A tosse produtiva pode ser controlada por ruidosa (“sororoca”).
meio de fisioterapia respiratória, com mano- Lembrar que a aspiração de vias aéreas é
bras de higiene brônquica ou indicar muco- um procedimento doloroso e desconfortável
líticos (como a n-acetilcisteína). São funda- para o paciente e deve ser empregado com
mentais orientações quanto à alimentação e critério, precedido de analgesia de resgate.
hidratação (horários, quantidade oferecida e Pode-se conseguir redução da quantidade
postura) e atentar-se à higiene bucal e, em al- de secreções com o uso de corticosteroides,
guns casos, realizar a avaliação da deglutição principalmente em pacientes com asma. Ou-
do doente a fim evitar broncoaspiração. tra classe de medicamentos que pode ajudar
A tosse seca e irritativa pode ser tratada são os antibióticos macrolídeos e medicações
com opioides, sendo a codeína o principal anticolinérgicas. Lembrando que, se o muco
fármaco utilizado para essa finalidade. A for muito espesso, seu uso pode dificultar a
dose preconizada é de 15mg a 30mg a cada 4 eliminação da secreção. (Tabela 42.4)
horas. É importante ressaltar que o uso con-
comitante de medicações laxativas pode ser DOR
necessário devido à constipação que normal- O manejo da dor será abordado em outro
mente está associada ao uso de codeína. capítulo deste livro. Vale a pena, no entan-

Tabela 42.4 - Dosagem inicial dos principais medicamentos para controle da hipersecreção de vias aéreas
Agentes Uso endovenoso Uso oral Uso subcutâneo Intervalo

Amitriptilina – 10-50mg à noite

Propantelina – 15mg 8h

Butilbrometo de escopolamina 10 mg 10mg 10 mg 4-6h

Colírio Atropina 1% 2 gotas em cada 6-12h



*atentar para taquicardia canto da boca (conforme resposta)

Adaptado de (40).

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Capítulo 42 - Cuidados paliativos em doença respiratória avançada

to, ressaltar a prevalência desse sintoma em Tabela 42.5 - Critérios de indicação


pacientes com doenças pulmonares e a fal- de transplante pulmonar
ta de acompanhamento. Recentemente, na Idade adequada: até 55, 60, 65 anos, respectivamente,
Conferência Internacional da ATS em 2013, para cardiopulmonar, pulmonar bilateral e pulmonar
um grupo de pesquisadores da Universidade unilateral

do Novo México apontou que pacientes com Doença avançada clinicamente e funcionalmente
Outras terapias inefetivas ou indisponíveis
DPOC são usuários crônicos de opioides de
Expectativa de vida limitada pela doença pulmonar
curta e longa ação e apresentam alto risco
Estado nutricional adequado
para desenvolvimento de dor crônica (dor
Perfil psicossocial e suporte familiar adequado
persistente por um período superior há 6 me-
Cobertura financeira adequada para a cirurgia e cuidados
ses), estando atrás apenas de pacientes com pós-operatórios
osteoartrose e artrite reumatoide. A dor nes-
tes pacientes é, muitas vezes, multifatorial,
incluindo componente neuropático, muscu- Tabela 42.6 - Contraindicações absolutas
ao transplante pulmonar
lar, inflamatório e mecânico.34,43
O trabalho americano em particular ava- Doença maligna nos últimos 2 anos
(exceto câncer de pele não melanoma)
liou 15.904 pacientes com DPOC e 7952 com
Infecção pelo HIV
outras doenças crônicas e concluiu que pa- Infecção por vírus B ou C da hepatite com evidência
cientes com DPOC possuem um componen- de hepatopatia significativa
te de dor inflamatório maior quando com- Tabagismo atual ou cessação há menos de 6 meses
parados a outros pacientes com dor crônica Abuso de álcool ou outras drogas
e que a presença de dor não está relaciona- Doença psiquiátrica grave
da ao grau de comprometimento pulmonar, Má aderência ao tratamento documentada
podendo estar presente em qualquer fase da Ausência de suporte familiar e social
doença.43 Obesidade ou desnutrição
Em resumo, a dor talvez seja um sintoma
ainda subestimado no tratamento global des-
Tabela 42.7 - Diretrizes para inclusão em lista
ses pacientes e que mereça acompanhamento nas principais doenças pulmonares
e manejo clínico mais adequado.
DPOC: índice BODE entre 7 e 10, ou pelo menos 1 dos
seguintes: história de hospitalização por exacerbação
TRANSPLANTE PULMONAR com hipercapnia aguda (PaCo2 < 50mmHg), hipertensão
pulmonar ou cor pulmonale VEF1<20% ou DLCO <20% ou
O transplante pulmonar apresentou um distribuição homogênea do enfisema
grande avanço nas últimas décadas e repre- FPI: evidência histológica ou radiológica de FPI e uma
senta hoje uma alternativa eficaz no trata- das seguintes condições: DLCO <40% do previsto ou
queda de 10% CVF em 6 meses de seguimento ou
mento de doenças pulmonares avançadas em oximetria <80% durante teste de caminhada de 6 minutos
algumas situações. Dentre as indicações para ou faveolamento da TC de alta resolução (Escore de
o transplante figuram vários tipos de doen- fibrose>2)

ças pulmonares, desde a doença pulmonar Fibrose cística: VEF1<30% ou declínio rápido da função
pulmonar se VEF1 > 30% e/ou qualquer das seguintes
obstrutiva crônica (DPOC) (35%), fibrose condições: aumento das necessidades de oxigênio
pulmonar idiopática (20%) e fibrose cística suplementar ou hipercapnia ou hipertensão pulmonar.
(15%) até causas menos comuns como pneu- *Mulheres e < 18 anos têm pior prognóstico – considerar
inclusão precoce
mopatias relacionadas a doenças do tecido
Hipertensão Pulmonar Idiopática: classe funcional NYHA
conjuntivo e até câncer de pulmão.44 III ou IV apesar de terapia medicamentosa máxima ou
Apesar do crescente número de transplan- distância percorrida no teste de 6 minutos <350m ou
em declínio; falha à terapia com epoprostenol EV ou
tes realizados a cada ano em todo mundo, a equivalente; índice cardíaco <2L/min/m2;pressão de átrio
escassez de órgãos ainda é uma realidade e, direito >15mmHg
aliada às menores taxas de sobrevida em com- Sarcoidose: classe funcional NYHA III ou IV e qualquer
condição das seguintes: hipoxemia em repouso;
paração aos transplantes de outros órgãos hipertensão pulmonar; pressão de átrio direito > 15mmHg
sólidos, o transplante pulmonar deve ser rea- Adaptados de (45, 46).

370

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Capítulo 42 - Cuidados paliativos em doença respiratória avançada

lizado em pacientes selecionados e seguindo res and voluntary ventilation. Braz J Med
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idade avançada diminui os índices de sobre- 7. CHEN HI, KUO CS. Relationship between
vida após o transplante, sendo que, hoje em respiratory muscle function and age, sex,
dia, a maioria dos centros que realizam trans- and other factors. J Appl Physiol (1985).
plante pulmonar estabeleceram um limite de 1989. 66(2):943-8.
65 anos para a indicação do procedimento. 8. TSEVAT J, DAWSON NV, WU AW, LYNN
Os pacientes devem ser limitados pela doença J, SOUKUP JR, COOK EF, ET AL. Health
values of hospitalized patients 80 years or
(Classe Funcional III e IV), porém não podem
older. HELP Investigators. Hospitalized
estar profundamente debilitados.45-47
Elderly Longitudinal Project. JAMA. 1998.
Os pacientes elegíveis são em sua maio-
279(5):371-5.
ria aqueles que evoluem com piora clínica
9. PRINCIPE-RODRIGUEZ K, RODRI-
apesar de todas as alternativas de tratamento GUEZ-CINTRON W, TORRES-PALA-
conhecidas já estarem sendo utilizadas, inde- CIOS A, CASAL-HIDALGO J. Substituted
pendentemente do tipo de doença pulmonar judgement: should life-support decisions be
avançada que apresentam (tabela 42.6). De- made by a surrogate? P R Health Sci J. 1999.
vem ter limitação nas suas atividades diárias 18(4):405-9.
e expectativa de vida inferior a dois anos e 10. HAMEL MB, TENO JM, GOLDMAN L,
seguir os critérios específicos para cada con- LYNN J, DAVIS RB, GALANOS AN, ET
dição pulmonar de base, que envolvem ca- AL. Patient age and decisions to withhold
racterísticas clínicas, capacidade de exercí- life-sustaining treatments from seriously
cio, valores de volumes pulmonares, escores ill, hospitalized adults. SUPPORT Inves-
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Cuidados paliativos em doenças
neurológicas em idosos (não Demência
de Alzheimer e não Parkinson)
43
CAPÍTULO

Ianna Lacerda Sampaio Braga


Pedro Braga Neto

INTRODUÇÃO lizando as necessidades de cada paciente.


As doenças crônicas não transmissíveis Esclarecer a doença para o paciente e poder
(DCNT) correspondem a cerca de 72% das permitir que ele decida particularidades do
mortes no Brasil, dentre elas encontram-se: cuidado é uma forma de fazer cuidado pa-
doenças cardiovasculares, doenças respira- liativo em doenças crônicas. Torna-se, por-
tórias crônicas, diabetes, câncer e doenças tanto, um instrumento indispensável para
neurodegenerativas1. Diante do aumento das um médico que sabe diferenciar a doença do
DCNT e de seus efeitos para o país, o Minis- doente e o doente que tem uma doença única
tério da Saúde protagonizou, em 2011-2012, e particular3.
junto a outras instituições de relevância nacio- Com esta visão, discernir quando um
nal e internacional, a construção do Plano de paciente com LTCN necessitará de um olhar
Ações Estratégicas para o Enfrentamento das paliativo ou curativo é complexo. Acaba ten-
DCNT no Brasil. Dentre as doenças crônicas do uma subjetividade implícita que culmina
abordadas, encontram-se as condições neuro- com discussões éticas prolongadas e exaus-
lógicas de longo prazo (Long term neurological tivas. Com as diretivas antecipadas de von-
conditions – LTNC). Almeja-se, nos próximos tade, regulamentadas pelo Conselho Federal
dez anos, o desenvolvimento e a implanta- de Medicina através da resolução nº 1.995/12,
ção de políticas públicas efetivas, integradas, o paciente poderá expressar e ter o seu desejo
sustentáveis e baseadas em evidências para a de tratamento realizado pelo seu médico as-
prevenção e o controle das DCNT e seus fa- sistente, desde que sejam respeitados os prin-
tores de risco, incluindo o fortalecimento dos cípios éticos da profissão. Quando o paciente
serviços de saúde, a partir dos eixos: vigilân- não pode ou não deixou expresso o seu dese-
cia, informação, avaliação e monitoramento; jo, esta decisão passa genericamente por dois
promoção da saúde; cuidado integral2. Este pontos: a gravidade da doença e a funcionali-
eixo do cuidado integral inclui a avaliação dos dade do paciente. Portanto, em cada um dos
pacientes na perspectiva de cuidado paliativo. tópicos abaixo, iremos ressaltar os fatores
O olhar curativo, com intenção de reabi- determinantes da gravidade da doença e sua
litação e o cuidado paliativo devem coexistir pouca perspectiva de reversão e aspectos es-
desde o início do diagnóstico, individua- pecíficos da funcionalidade e cognição.

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Capítulo 43 - Cuidados paliativos em doenças neurológicas em idosos (não Demência de Alzheimer e não Parkinson)

DOENÇA CÉREBRO VASCULAR espontâneo, enquanto que o secundário está


O acidente vascular encefálico (AVE) é associado a uma vasculopatia como a má
uma síndrome clínica caracterizada pelo formação arteriovenosa (MAV) ou outros fa-
rápido desenvolvimento de sinais clínicos tores como uso de anticoagulantes. O AVEh
de déficits neurológicos focais ou globais. A primário pode estar relacionado à angiopa-
definição de AVE agrega lesões isquêmicas tia amiloide, sendo uma associação comum
e hemorrágicas, com subtipos adicionais em com pacientes com doença de Alzheimer.
cada categoria. A incidência e a mortalidade Além disso, a hipertensão arterial é o princi-
variam muito diante dos diversos subtipos pal fator de risco relacionado a sangramento,
de AVE, refletindo as diferenças subjacentes principalmente associado a sangramentos
em fisiopatologias e etiologias4. Atualmente, localizados no putamen, região subcortical,
o AVE é a principal causa de mortalidade no tálamo, ponte e cerebelo9.
Brasil, com taxas de mortalidade ajustadas Uma outra forma de AVE hemorrágico é a
maiores do que em outros países da América hemorragia subaracnoide (HSA). Trata-se de
Latina5,6. AVE isquêmico (AVEi) é o subtipo uma emergência médica que acarreta em alta
mais frequente (72,9%), seguido por AVE he- taxa de mortalidade e morbidade. A maior
morrágico (AVEh), que pode ser por hemor- parte dos casos não traumáticos está associa-
ragia intracerebral (15,2%) ou hemorragia do a ruptura de aneurisma cerebral. A apre-
subaracnoide (HSA) (6%). Há ainda o ataque sentação clínica geralmente é de uma cefaleia
isquêmico transitório (AIT) (3%) e o AVE de instalação súbita, associada a rebaixamen-
indeterminado (2,9%). A mortalidade intra to do nível de consciência. Aproximadamente
-hospitalar de paciente com AVE é em torno 10% dos pacientes morrem antes de chegar à
20,9% nos estudos nacionais6. emergência e cerca de 50% dos pacientes apre-
De acordo com os critérios de classifica- sentaram sequelas motoras, cognitivas e com-
ção etiológica de TOAST, podemos dividir o portamentais importantes10.
AVEi em 5 subtipos: aterosclerose de grandes Em 2002, o Ministério da Saúde publicou
vasos, oclusão de pequenos vasos, cadioem- uma portaria que institui a linha de cuidado
bolismo, outras causas e etiologia indefinida. do AVE, bem como as diretrizes clínico as-
Um estudo recente investigou a mortalidade sistenciais sobre AVE no âmbito do Sistema
e prognóstico de pacientes com AVEi. A taxa Único de Saúde (SUS)11. Neste referencial teó-
de mortalidade de pacientes com AVEi car- rico, o tratamento do paciente, as indicações
dioembólico foi quase 2 vezes maior do que de trombólise, a investigação diagnóstica e as
nos outros subtipos. Enquanto isso, pacientes indicações para reabilitação estão claras. Po-
com oclusão de pequenos vasos tiveram me- rém não estão descritos quais pacientes de-
lhor prognóstico. Além disso, pacientes mais verão ser tratados em unidades de cuidados
jovens, mulheres, não diabéticos e aqueles crônicos complexos, que consistem em uni-
com menor déficit neurológico na admissão dades com leitos de clínica médica voltados
(escala do National Institute of Health Stroke para cuidados clínicos prolongados, sem in-
Scale - NIHSS) e maior índice de massa cor- dicação de seguimento neurológico contínuo
poral apresentaram maior chance de sobre- e sem condições clínicas de alta hospitalar.6 
vivência após AVE.7,8 Diante desta heterogeneidade de doen-
O AVEh apresenta uma maior mortalida- ças dentro dos AVEs agudos, fica difícil sa-
de quando comparado com os AVE isquêmi- ber quais pacientes devem ter indicação de
cos, com casos fatais em 25-48% dos pacien- Cuidados Paliativos. Dois parâmetros muito
tes. Representa cerca de 6 a 14% de todos os utilizados na literatura citam a extensão do
casos de AVE. AVEh intraparenquimatoso é AVE e o grau de comprometimento pré e
definido como sangramento que ocorre no pós AVE, como marcadores importantes de
parênquima cerebral, podendo ser dividido prognóstico4. Um dos modelos utilizados é o
em primário ou secundário. O primário é local e a extensão de acometimento do AVE,

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Capítulo 43 - Cuidados paliativos em doenças neurológicas em idosos (não Demência de Alzheimer e não Parkinson)

que é avaliado pela escala de NIHSS. O AVEh dianas. A pontuação da escala é dada em seis
e HSA geralmente são mais graves, com níveis (0 a 6) e precisa ser colhida através de
maior mortalidade em 30 dias e maior inca- breve entrevista13 . Pacientes com pontuação
pacidade quando comparados com os AVEis entre 4 e 5 devem ser avaliados por comissões
(40% de mortalidade para AVEh em 30 dias, de Cuidados Paliativos.
contra 15% para AVEi) 12. Outra maneira é A escala de Barthel, traduzida e adapta-
relacionada a quanto o AVE comprometeu da, avalia a independência do paciente para
as atividades de vida diária do indivíduo, atividades básicas de vida: alimentação, ba-
sempre avaliadas antes e após o tratamento nho, cuidado pessoal, capacidade de se ves-
padrão da fase aguda. Caneda et al. avaliou tir, ritmo intestinal, ritmo urinário, uso do
a confiabilidade e a concordância das escalas banheiro, transferência cadeira-cama e vice-
mais utilizadas mundialmente para avaliar o versa, mobilidade e subir escadas (Anexo 3).
grau de comprometimento do AVE. As esca- Foi desenvolvida para monitorar o desempe-
las de Rankin, o Índice de Barthel e a NIHSS nho de pacientes internados por um tempo
demonstraram boa confiabilidade e concor- prolongado, com condições de paralisia antes
dância em suas versões em português13. e depois do tratamento e para indicar os cui-
Para avaliação da gravidade do AVEi, dados de saúde necessários. Na reabilitação,
utiliza-se a NIHSS, traduzida e adaptada13 tem sido usado para prever o tempo de inter-
(Anexo 1). A escala de AVEi do NIHSS é um nação, estimar prognósticos, antecipar con-
instrumento de uso sistemático que permi- sequências da alta e como um instrumento
te uma avaliação quantitativa dos déficits de avaliação16.
neurológicos relacionados com o AVE. Essa Dupreez et al., em 2008, realizou uma ava-
escala foi inicialmente desenhada como ins- liação entre beneficiários idosos do Medicare
trumento de investigação para medir o esta- dos Estados Unidos que estavam em hospitais
do neurológico inicial nos ensaios clínicos da com diagnóstico de AVEs agudos pelo CID 9.
fase aguda do AVE. Atualmente, a escala é Ele dividiu os grupos em várias característi-
utilizada rotineiramente na mensuração clí- cas demográficas, como: idade, gênero, raça e
nica da extensão do AVE, na determinação uso de ventilação mecânica e de gastrostomia,
do tratamento mais apropriado e na previsão dentre outros. Os resultados mostraram que
do prognóstico do doente. A NIHSS é uma es- havia um número maior de mulheres com ida-
cala com 15 itens de exame neurológico para de média de 83 anos, caucasianas, com multi-
avaliação do efeito do AVE agudo no nível de morbidades e tempo de hospitalização maior
consciência, linguagem, negligência, perda que 7 dias. Nestes pacientes o uso de ventila-
de campo visual, movimentos oculares, força ção mecânica e de sonda de gastrostomia foi
muscular, ataxia, disartria e perda sensitiva. considerado fator de gravidade específico para
A avaliação completa de um doente requer essa população. Metade desses pacientes teve
menos de 10 minutos. Acima de 22 pontos hospitalização prévia e as comorbidades mais
após 24 horas do AVE tem um valor predi- comuns foram: hipertensão (69%), arritmias
tivo positivo de 98% para morte ou incapa- cardíacas (57%), insuficiência cardíaca con-
cidade grave14. gestiva (ICC) (41%), distúrbios hidroeletrolíti-
A escala de Rankin modificada (RSm) cos (39%), demência (29%), doença pulmonar
(Anexo 2) é uma escala aplicada baseada no obstrutiva crônica (DPOC) (24%) e diabetes
avaliador que mensura o grau de comprome- mellitus não complicada (DM) (22%). Alguns
timento pré e pós o AVE. É utilizada como fatores foram altamente preditores de indica-
desfecho primário em trabalhos clínicos ção de hospice, como: idade avançada, sexo
randomizados para novos tratamentos para feminino, tempo de hospitalização maior que
AVE em emergência15. A pontuação é basea- 3 dias. O uso de ventilação mecânica e de son-
da na impressão dos pacientes de cuidar deles da de gastrostomia diminuíam a indicação de
mesmos durante as atividades diárias e coti- hospice, já que estes pacientes acabavam mor-

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Capítulo 43 - Cuidados paliativos em doenças neurológicas em idosos (não Demência de Alzheimer e não Parkinson)

rendo no hospital antes de serem transferidos. têm um papel no cuidado dos pacientes com
Dentre as comorbidades, aqueles com demên- AVE e devem ser sistematicamente forneci-
cia tinham maior chance de serem referidos das com base na necessidade20. Setenta e qua-
para hospices, enquanto aqueles com diabete tro por cento das mortes por AVE e 54% dos
mellitus não complicada e doenças valvares encaminhamentos para hospices não foram
cardíacas diminuíam as chances de hospice. acompanhados por médicos paliativistas12.
Vale ressaltar que neste trabalho 52% dos pa-
cientes morreram no hospital.17 DOR
Estudos nacionais corroboram esses fa- Dor crônica ocorre em 25% dos pacientes
tores de risco. Idade mais avançada, sexo fe- que sobreviveram a AVE e interfere na rea-
minino, a presença de diabetes e hipertensão bilitação com prejuízo na qualidade de vida.
e a perda da consciência foram fatores que Os principais preditores deste sintoma são:
determinaram maior risco de declínio fun- sexo feminino, jovens, alto NIHSS e níveis
cional (RSm 3-6). Neste estudo, o modelo de elevados de hemoglobina glicada.
regressão logística multivariada mostrou que Existem quatro síndromes principais re-
a perda de consciência associava-se a um ris- lacionadas a dor:
co 30% maior de piora funcional no momen- 1. As dores centrais (Central Pos Stroke
to da alta, enquanto cada década a mais de Pain - CPSP),
vida aumentava em 12% este risco e, por fim, 2. A dor no ombro hemiplégico (Hemiple-
a avaliação funcional ruim à admissão au- gic Shoulder Pain - HSP),
mentava em 22% este risco6. Outro trabalho 3. A espasticidade dolorosa
recente descreve como os principais fatores 4. Cefaleias tensionais21
independentes para indicação de Cuidados
Paliativos precoce em pacientes com AVEi A CPSP é uma síndrome de dor neuro-
de artéria cerebral média (ACM) recente: a pática que aparece semanas ou meses após
gravidade da disfagia, idade avançada (>70 o AVE, como uma consequência direta da
anos), infarto de ACM esquerda, valor da lesão, afetando a topografia corresponden-
escala NIHSS na admissão (superior a 16), te22. A prevalência é de 1% a 12% e é mais
administração de alteplase® intra-arterial e prevalente em áreas responsáveis pela sen-
impossibilidade de fazer a primeira avaliação sação de dor ou seu processamento (região
da deglutição18. Várias ferramentas têm sido bulbo lateral, região ventroposterior do
estudadas para melhorar a precisão prognós- tálamo e córtex sensorial)21. A dor pode ser
tica após AVE, mas nada substituirá a avalia- espontânea ou evocada, contínua ou inter-
ção médica caso a caso e o bom senso19. mitente. Sensações de alodinia, disestesias
e hiperalgesias são comuns. O tratamento é
PRINCIPAIS SINTOMAS RELACIONADOS desafiador, faltando dados para que ele seja
À DOENÇA CEREBROVASCULAR baseado em evidência. Os tratamentos não
Uma revisão crítica da literatura em 2012 farmacológicos podem ter algum benefício.
revelou que muitos pacientes que morreram Os mais utilizados são estratégias de coping
após ter um AVE não receberam um contro- ou enfrentamento e terapias comportamen-
le sintomático ótimo; a equipe que cuidava tais21. Entre os antidepressivos tricíclicos,
desses pacientes não conseguia percebê-los o a amitriptilina (75mg/dia) é a droga de es-
suficiente para reduzir os seus danos psico- colha, porém o trabalho que a consagrou
lógicos; houve dificuldade, por parte de cui- tinha somente 15 pacientes com menos de
dadores informais, de saber notícias sobre as 75 anos23. Os antidepressivos inibidores da
condições médicas do paciente e a experiên- recaptação de noradrenalina e serotonina
cia de cuidar era angustiante para a família são efetivos para neuropatia periférica do-
e cuidadores, com assistência insuficiente. lorosa 21. Os analgésicos opioides geralmente
Assim, intervenções de Cuidados Paliativos não ajudam este tipo de dor. Em pacientes

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Capítulo 43 - Cuidados paliativos em doenças neurológicas em idosos (não Demência de Alzheimer e não Parkinson)

que não respondem aos medicamentos, a missão, mas o número é reduzido para 20%
estimulação magnética transcraneana pode e 10% da urinária e fecal, respectivamente,
ter algum benefício 24. após 6 meses do evento. São mais prevalentes
A HSP geralmente se desenvolve sema- com o aumento da idade, gravidade do AVE,
nas a meses após o AVE e sua prevalência diabetes e outras comorbidades O tratamen-
aumenta com o grau de deficiência motora. to consiste em reabilitação e evitar sondas de
O tratamento é baseado em fisioterapia, uso Foley para evitar infecções.27
de gelo, calor, massagem com analgésicos
tópicos e cirurgia que mantém o ombro no CONVULSÕES PÓS AVE E EPILEPSIA
seu local anatômico. Ao contrário da CPSP, AVE é a principal causa de convulsão em
há uma boa recuperação, com melhora após idosos. Entre 5% a 12% dos pacientes irão so-
6 meses na maioria dos casos 22.. A prevenção frer uma ou mais convulsões após um AVE.
é o melhor tratamento para evitar a espasti- O risco de desenvolver epilepsia está associa-
cidade dolorosa, através de fisioterapia, posi- do a convulsões que se iniciam após duas se-
cionamentos antiespasmódicos e variação de manas do AVE, com diminuição importante
exercícios motores. Não existe evidencia de da qualidade de vida e aumento do estresse
tratamento para a população idosa e os medi- do cuidador. A diretriz da American Heart
camentos geralmente usados estão nas listas Association (AHA) não recomenda o uso de
de medicamentos inapropriados para ido- anticonvulsivantes preventivos para esses
sos25. O uso de injeções locais de toxina botu- pacientes27. Os medicamentos mais utiliza-
línica pode ser recomendado para pacientes dos são: a lamotrigina (boa tolerabilidade e
selecionados em particular para os membros eficácia em idosos), a carbamazepina (baixo
superiores com melhora da função22. custo, mas alto poder de efeitos colaterais
como hiponatremia) e gabapentina (boa to-
FADIGA lerabilidade e efetivo também em dor neuro-
Tem prevalência acima de 50% e está pática)28.
relacionada com diminuição da sobrevida
a longo prazo. Tem estreita relação com de- DISTÚRBIOS DO SONO
pressão e incapacidade. É mais frequente em Mais da metade dos pacientes sofrem de
idosos, mulheres e parece estar relacionada distúrbio do sono, definido por dez a mais
com a extensão da lesão cerebral. O trata- pausas respiratórias (apneias) que duram
mento não farmacológico consiste em dieta, mais de 10 segundos por hora. O mais co-
exercício e uso de tecnologias assistidas. Dro- mum é a apneia obstrutiva do sono, que pode
gas psicoestimulantes podem ser úteis, mas ser causa ou consequência do AVE, já que é
devem ser usadas com cautela por poderem considerada uma causa importante e modi-
causar eventos vasculares. Modafinil não foi ficável de AVE. O tratamento é relacionado
estudado em idosos e metilfenidato é usado por equipe multidisciplinar, geralmente com
com tratamento paliativo em fadiga associa- o uso de CPAP22.
da a HIV ou câncer, mas não tem boa respos-
ta para a fadiga pós AVE22. DEPRESSÃO
Depressão após AVE afeta 1/3 dos sobre-
INCONTINÊNCIA viventes de AVE e deve ser reconhecida de
Incontinências fecal e urinária são sub- forma precoce, uma vez que impede a reabi-
diagnosticadas em pacientes pós AVE e são litação, reduz a qualidade de vida e aumenta
associadas com aumento da mortalidade, a mortalidade após AVE29. Não se sabe se an-
incapacidade e institucionalizações. Além de tidepressivos podem preveni-la. O tratamen-
reduzirem significativamente a qualidade de to farmacológico leva à redução de escalas
vida de idosos26. Cerca de 50% dos pacientes depressivas, mas o efeito na função cognitiva
com AVE apresentam incontinência à ad- ou melhora funcional são ainda incertos. Mais

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Capítulo 43 - Cuidados paliativos em doenças neurológicas em idosos (não Demência de Alzheimer e não Parkinson)

recentemente, tem sido sugerido que os anti- O cuidado paliativo destas principais
depressivos apresentam efeitos diretos sobre doenças que acometem idosos será abordado
o cérebro melhorando a neuroplasticidade, a a seguir.
neurogênese e a diferenciação neuronal. Tais
evidências são iniciais e ainda estão sendo in-
vestigadas. Apesar desta incerteza, os medica- Figura 43.1 - Interação entre neurologia, reabilitação
e Cuidados Paliativos no manejo de pacientes com
mentos com melhores efeitos são os inibidores doenças neurológicas crônicas (LTNC)
da recaptação seletiva de serotonina30.

OUTRAS CONDIÇÕES NEUROLÓGICAS Manejo ativo


Reabilitação
LTNCs são condições de doença ou Neurologia
Diagnóstico
das doenças
Prevenção de
Reabilitação de
declínio cognitivo,
déficits de
agravo à saúde que afetam o sistema nervo-
Investigação
complicações comunicação e
Tratamentos
a longo prazo condições estáveis
específicos
so central para o resto da vida dos pacientes. Controle
Elas podem ser divididas de acordo com o de sintomas

início do acometimento e sua evolução. Doença


Rapidamente
Reabilitação
Neuropaliativa
• Início súbito (p.ex.: AVE, trauma de Progressiva

medula espinhal)
• Intermitentes (p. ex.: epilepsia) Cuidados paliativos
Cuidados e planejamento

• Progressivas (p. ex.: esclerose múlti- no fim da vida


Suporte espiritual

pla (EM), doença do neurônio motor


(DNM), doença de Parkinson e outras
doenças neurodegenerativas) Modificado de Turner- Stokes et Al (31).

• Condições estáveis com ou sem dege-


neração associada à idade (p. ex.: polio-
mielite ou paralisia cerebral) ESCLEROSE LATERAL AMIOTRÓFICA
A esclerose lateral amiotrófica (ELA) é
Na Inglaterra, desde 2005, houve o in- uma doença caracterizada por um processo
centivo à criação de locais específicos para degenerativo progressivo nos neurônios mo-
o tratamento de indivíduos com LTNC, com tores superiores e inferiores. É a doença do
atendimento multidisciplinar e com intera- neurônio motor mais comum no mundo. A
ção entre as especialidades médicas neuro- predominância de sintomas do neurônio mo-
logia, fisiatria e Cuidados Paliativos. O neu- tor superior é de melhor prognóstico para os
rologista seria responsável pela investigação pacientes. Trata-se de uma doença relativa-
de casos novos, para a prescrição de drogas mente rara com incidência variando de 1 a 4
modificadoras da doença. O fisiatra acompa- pessoas para cada 100 mil habitantes em cau-
nha os casos que necessitem de reabilitação. casianos. A etiologia ainda é desconhecida na
Os paliativistas cuidam de pacientes com so- grande maioria dos casos. Somente 5-10% dos
brevida menor que 6 a 12 meses, atuando no pacientes apresentam quadro genético bem
manejo de sintomas, auxiliando no planeja- caracterizado. Os sintomas da doença podem
mento e suporte de cuidados no fim da vida e começar com fraqueza em membros progres-
apoio ao luto. Neste local, além do tratamen- siva ou acometimento da musculatura bulbar.
to de quadros agudos, há programas de tra- Geralmente, o prognóstico é bem reservado,
tamento para espasticidade, incontinência, com sobrevida média de 3 anos independente
dor, quedas e outras condições específicas do tratamento clínico realizado32,33.
para estes doentes. Além disso, o local é aces- Pacientes com ELA costumam permane-
sível, já que a maioria dos pacientes necessita cer conscientes até os últimos dias de vida,
de cadeiras de rodas ou órteses. Estabelece-se portanto a aplicação dos conceitos relacio-
um contato próximo da equipe com a família nados à aquisição de opinião do paciente,
e os cuidadores (Figura 43.1)31. de quanto ele quer continuar com tentativas

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Capítulo 43 - Cuidados paliativos em doenças neurológicas em idosos (não Demência de Alzheimer e não Parkinson)

curativas deve ser obtida enquanto se possa mes na DFT. Quase metade dos casos apre-
conversar sobre o assunto, na ausência de sentou a variante comportamental enquanto
emergências, prevendo terapêuticas fúteis. que o restante dos pacientes apresentam de-
Em um levantamento, em pacientes que op- clínio da linguagem, podendo caracterizar-
taram pela traqueostomia, indicada quando se como prejuízo na fluência (afasia progres-
eles apresentavam 32% da capacidade vital siva não fluente) ou prejuízo na compreensão
forçada prevista e/ou quando a medida do das palavras e memória semântica (demência
volume de ar era menor que 1,3L, houve au- semântica). Existe grande sobreposição en-
mento da sobrevida em 12 meses para os pa- tre estas síndromes, parkinsonismo atípico
cientes com menos de 60 anos e de 3,5 meses e doença do neurônio motor35. Geralmente,
para aqueles com mais de 60 anos. Todos os essas variantes apresentam curso clínico rá-
pacientes que foram traqueostomizados fo- pido, por isso as decisões com o próprio pa-
ram acompanhados no domicilio34. ciente devem ser tomadas no início do diag-
nóstico.
DEMÊNCIA FRONTOTEMPORAL
A demência frontotemporal (DFT) carac- CONCLUSÃO
teriza-se por uma relativa seletividade na de- É de grande importância o adequado
generação dos lobos frontal e/ ou temporal. conhecimento sobre o diagnóstico e evolução
É substancialmente menos comum do que a das doenças neurodegenerativas pela equipe
doença de Alzheimer (DA), com prevalência de saúde para que se possa instituir trata-
estimada em torno de 15 para cada 100 mil mentos que melhorem a qualidade de vida do
habitantes para pacientes abaixo dos 65 anos. paciente, incluindo a reabilitação e Cuidados
Apesar do início da doença ser tipicamente Paliativos, individualizando as necessidades.
na sexta década de vida, ela pode acontecer O trabalho em conjunto de diferentes espe-
na terceira década de vida ou nona década cialidades médicas e equipe multidisciplinar
de vida. A prevalência de DFT na população é fundamental para a prevenção e tratamento
mais idosa deve muito provavelmente estar de incapacidades e de sintomas desagradá-
subestimada. Existem três principais síndro- veis, promovendo bem-estar ao doente.

Anexo 1 - Escala de AVE DO NIH (NIHSS)

ESCALA DE AVE DO NIH (NIHSS)

1a. N
 ível de consciência • 0 respondeu a ambas corretamente
0 alerta (se o paciente responder com entusiasmo) • 1 respondeu a uma corretamente (ou é incapaz
1 sonolento (se o paciente não estiver alerta, mas de falar devido a uma entubação endotraqueal ou
obedece ao menor estímulo dado, pergunta ou disartria)
responde) • 2 respondeu a ambas incorretamente (ou a
2 estuporoso (se o paciente não estiver alerta, mas pacientes afásicos e estupor que não entende)
requer repetidos estímulos para atender, ou é Escore do Componente 1b: _____________________
obnubilado e requer forte ou estímulo doloroso para
fazer determinado movimento (não esteriotipado). 1c. Comandos
3 letárgico (se o paciente responde somente com Peça ao paciente para abrir e fechar os olhos e para
reflexo motor ou respostas autonômicas ou é abrir e fechar a mão (não parética). Substitua outro
totalmente insensível) comando 1-passo se as mãos não podem ser usadas.
Escore do Componente 1a: _____________________ Dê créditos por tentativas de respostas limitadas pela
fraqueza. Deve usar gestos para comunicar.
1b. Perguntas • 0 obedece a ambos corretamente
Pergunte ao paciente o mês e sua idade. Não dê crédito • 1 obedece a um corretamente
parcial. Analise somente a resposta inicial. Não ajude o • 2 ambos incorretamente
paciente com sinais verbais ou não verbais. Escore do Componente 1c: _____________________

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Capítulo 43 - Cuidados paliativos em doenças neurológicas em idosos (não Demência de Alzheimer e não Parkinson)

2. Visão • 3 nenhum esforço contra a gravidade


Apenas teste movimentos horizontais. Use manobras • 4 nenhum movimento
voluntárias ou reflexivas, mas não use testes calóricos. • X sem condições de exame (somente se o membro
• 0 normal é amputado ou a junta testada é imobilizada)
• 1 paralisia parcial da visão (se o contemplar Escore do Componente 5: _______________________
fixamente é anormal em ambos os olhos mas Escore do Componente 6: _______________________
melhora com uma manobra oculocefálica, ou é
anormal em apenas um olho) 7,8. Perna motor direita e perna motor esquerda
• 2 divergência forçada (se o paciente tem desvio Peça ao paciente para estender cada perna
forçado ou total contemplar fixamente de ambos os individualmente 30 graus em posição supino e segurar
olhos que não responde a manobra oculocefálica) por 5 segundos completos. Deve usar gestos.
Escore do Componente 2: ______ • 0 nenhuma flutuação
• 1 flutuar (se a perna baixar antes dos 5 segundos,
3. Campos visuais mas não bater na cama ou outro suporte)
Teste todos os quatro quadrantes por confrontação • 2 algum esforço contra a gravidade (se o paciente
(contando os dedos usando 1, 2, ou 5 dedos). Pode usar levanta a perna, mas não pode estendê-la
ameaça visual se necessário. Duplique a estimulação completamente, ou se a perna flutua até a cama
simultaneamente para visão e anote a presença outro suporte)
ou ausência de extinção em resposta a questão 13 • 3 nenhum esforço contra a gravidade
(negligência). • 4 nenhum movimento
• 0 nenhuma perda visual (ou cegueira monoocular • X sem condições de exame (somente se o membro
sem déficit de campo visual no outro olho) é amputado ou a junta testada é inarticulada)
• 1 hemianopsia parcial (ou quadrantanopsia) Escore do Componente 7: ______________________
• 2 hemianopsia completa Escore do Componente 8: ______________________
• 3 hemianopsia bilateral (ou para cegueira, incluindo
cegueira cortical) 9. Membro ataxia
Escore do Componente 3: ______________________ Teste com os olhos abertos. Peça ao paciente para
executar manobras dedo-nariz-dedo e calcanhar-joelho
4. Paresia facial bilateralmente. Analise a ataxia somente se presente
Peça ao paciente para sorrir e fechar os olhos. Pode sem proporção de fraqueza. Não analise ataxia em
usar gestos. Pontue simetria da careta para estímulos pacientes que não podem compreender comandos ou
dolorosos em pacientes que não podem seguir que tenham membros paralisados. Em pacientes cegos
comando. teste braços tocando o nariz de posição estendida.
• 0 movimento normal • 0 ausente
• 1 paresia secundária (para prega nasolabial • 1 presente em 1 membro
apagada ou sorriso assimétrico) • 2 presente em 2 ou mais membros
• 2 paresia parcial (para total ou quase total paralisia • X sem condições de exame (somente se o membro
da parte baixa da face) é amputado ou a junta testada é imobilizada)
• 3 paralisia completa (para ausência de movimento Escore do Componente 9: ______________________
em ambos parte de cima, testa, e parte de baixo da
face) 10. Sensorial
Escore do Componente 4: ______________________ Teste a sensibilidade usando uma “picada de alfinete”,
pode utilizar estímulos dolorosos se o paciente é
5,6. Braço motor direito e braço motor esquerdo obnubilado ou afásico. Somente analise sensação
Peça ao paciente para estender cada braço perdida que é devido ao derrame cerebral. Teste braços
individualmente 45 graus se supino ou 90 graus se (não mãos), pernas, tronco e face.
sentado e segurar por 10 segundos completos. Deve • 0 normal
usar gestos. • 1 perda parcial (se o paciente sente a alfinetada
• 0 nenhuma flutuação no lado afetado a um grau inferior que no lado
• 1 flutuar (se o braço baixar antes dos 10 segundos, não afetado ou se o paciente sente o toque, mas
mas não bater na cama ou outro suporte) não a alfinetada no lado afetado ou se o paciente
• 2 algum esforço contra a gravidade (se o paciente faz movimentos propositadamente ao estímulo
levanta o braço mas não pode estendê-lo dolorosos)
completamente, ou se o braço flutua até a cama • 2 perda completa (se o paciente não está sendo
outro suporte) ciente ao toque ou não responde ao estímulo

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Capítulo 43 - Cuidados paliativos em doenças neurológicas em idosos (não Demência de Alzheimer e não Parkinson)

doloroso (incluindo paciente em coma) ou que tenha • 2 incompreensível ou pior [se a fala está tão
perda sensorial bilateral) inarticulável que seja incompreensível (na ausência
Escore do Componente 10: _____________________ de ou sem proporção para qualquer afasia) ou é
mudo devido a uma anartria]
11. Melhor Linguagem • X sem condições de exame (somente se o paciente
Da escala, peça ao paciente para descrever o que é entubado ou tem qualquer outra barreira física
está acontecendo na figura, dar nome aos itens e ler para falar)
as palavras e frases. Se o paciente tem perda visual, Escore do Componente 12: ____________________
coloque os objetos em suas mãos e peça ao paciente
para identificá-los. Peça ao paciente entubado ou 13. Negligência/Desatenção
disártrico para escrever. Também use informação sobre Negligência é somente analisada se presente e então
função de linguagem obtida em outras partes do exame. nunca é intestável.
• 0 nenhuma afasia • 0 nenhuma negligência (para qualquer paciente que
• 1 leve a moderada afasia (se o paciente é capaz de pareça atender em ambos os lados, mesmo que
comunicar algo apesar de algumas anormalidades afásico)
em fluência, nomeação, repetição ou obedecer a • 1 negligência parcial [se o paciente tem meia
comandos) desatenção ou extinção ao estímulo simultâneo
• 2 afasia severa (se a comunicação é fragmentada e bilateral a uma das seguintes modalidades: visual,
requer muita interferência do paciente, perguntando espacial, tátil, audível, pessoal (incluindo negação
e adivinhando) da doença ou anosognosia)]
• 3 mudo (ou tem afasia global, ou está em coma) • 2 negligência completa (se o paciente tem semi-
Escore do Componente 11: ____________________ atenção a mais de uma modalidade, não reconhece
sua própria mão, ou se orienta somente de um lado
12. Disartria do espaço)
Peça ao paciente para ler as palavras e frases do
questionário. Escore do Componente 13: _____________________
• 0 articulação normal Escore total da escala NIH Stroke (0-42): __________
• 1 leve a moderada disartria [se o paciente pronuncia Escore do Componente 13: _____________________
indistintamente qualquer palavra, mas pode ser Escore total da escala NIH Stroke (0-42): __________
entendido (mesmo com alguma dificuldade)]

Anexo 2
Escala de Rankin modificada

Escore Classificação Descrição

0 Assintomático Regressão dos sintomas

1 Sintomas leves Capaz de realizar suas tarefas e atividades habituais prévias

Incapaz de realizar todas as suas atividades habituais prévias,


2 Incapacidade leve
mas capaz de realizar suas necessidades habituais sem ajuda
Requer alguma ajuda para realizar suas atividades,
3 Incapacidade moderada
mas é capaz de andar sem ajuda

4 Incapacidade moderada a grave Incapaz de andar e de realizar suas atividades sem ajuda

Limitado a cama, incontinente, requer cuidados de enfermagem


5 Incapacidade grave
e atenção constantes

6 Óbito

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Capítulo 43 - Cuidados paliativos em doenças neurológicas em idosos (não Demência de Alzheimer e não Parkinson)

Anexo 3 - Escala de Barthel

Avaliação do grau de independência nas atividades da vida diária

1) Como você realiza as suas refeições? 7) Como você vai ao banheiro?


( ) 10 Independente. Capaz de comer por si só em ( ) 10 Independente. Entra e sai sozinho e não
tempo razoável. A comida pode ser cozida ou necessita de ajuda por parte de outra pessoa.
servida por outra pessoa. ( ) 5 Necessita ajuda. Capaz de mover-se com uma
( ) 5 Necessita de ajuda para se cortar a carne, pequena ajuda; é capaz de usar o banheiro.
passar a manteiga, porém é capaz de comer Pode limpar-se sozinho.
sozinho. ( ) 0 Dependente. Incapaz de ter acesso a ele ou de
( ) 0 Dependente. Necessita ser alimentado por outra utilizá-lo sem ajuda maior.
pessoa.
8) Como você realiza as suas transferências (cama,
2) Como você toma seu banho? poltrona, cadeira de rodas)?
( ) 5 Independente. Capaz de se lavar inteiro , de ( ) 15 Independente. Não requer ajuda para sentar-se
entrar e sair do banho sem ajuda e de fazê-lo ou levantar-se de uma cadeira nem para entrar
sem que outra pessoa supervisione. ou sair da cama.
( ) 0 Dependente. Necessita de algum tipo de ajuda ( ) 10 Mínima ajuda. Incluindo uma supervisão ou uma
ou supervisão. pequena ajuda física.
( ) 5 Grande ajuda. Precisa de uma pessoa forte e
3) Como você se veste? (Parte superior e inferior do treinada.
corpo) ( ) 0 Dependente. Necessita um apoio ou ser
( ) 10 Independente. Capaz de vestir- se e despir-se levantado por duas pessoas. É incapaz de
sem ajuda. permanecer sentado.
( ) 5 Necessita ajuda. Realiza todas as atividades
pessoais sem ajuda mais da metade das tarefas 9) Como você realiza a deambulação (locomoção,
em tempo razoável. caminhar) ?
( ) 0 Dependente. Necessita de alguma ajuda. ( ) 15 Independente. Pode andar 50 metros ou seu
equivalente em casa sem ajuda ou supervisão.
4) Como você realiza seus asseios? Pode utilizar qualquer ajuda mecânica exceto
( ) 5 Independente. Realiza todas as atividades andador. Se utilizar uma prótese, pode colocar a
pessoais sem nenhuma ajuda; os componentes prótese nela e tirar sozinha.
necessários podem ser providos por alguma ( ) 10 Necessita ajuda. Necessita supervisão ou uma
pessoa. pequena ajuda por parte de outra pessoa ou
( ) 0 Dependente. Necessita alguma ajuda. utiliza andador.

5) Como é sua evacuação? 10) Como você realiza a subida e descida de escadas?
( ) 10 Continente. Não apresenta episódios de ( ) 10 Independente. Capaz de subir e descer um piso
incontinência. sem ajuda ou supervisão de outra pessoa.
( ) 5 Acidente ocasional. Menos de uma vez por ( ) 5 Necessita ajuda. Necessita ajuda e supervisão.
semana necessita de ajuda para colocar ( ) 0 Dependente. É incapaz de subir e descer
enemas ou supositórios. degraus.
( ) 0 Incontinente. Mais de um episódio semanal.
Valores:
6) Como é sua micção. Como você a realiza? Severa: < 45 pontos
( ) 10 Continente. Não apresenta episódios. Capaz de Grave: 45 – 49 pontos
utilizar qualquer dispositivo por si só (sonda, Moderada: 60 – 80 pontos
urinol, garrafa). Leve: 80 – 100 pontos
( ) 5 Acidente ocasional. Apresenta no máximo Pontuação total: ________________________________
um episódio em 24 horas e requer ajuda
para a manipulação de sondas ou de outros
dispositivos.
( ) 0 Incontinente. Mais de um episódio em 24 horas.

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Capítulo 43 - Cuidados paliativos em doenças neurológicas em idosos (não Demência de Alzheimer e não Parkinson)

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Cuidados Paliativos
em Hematologia 44
CAPÍTULO

Thiago Xavier Carneiro

“Algumas neoplasias são quase dem responder muito bem ao tratamento


sempre curáveis, outras são sistêmico e obter cura. A presença de lesões
habitualmente incuráveis mas disseminadas com acometimento de diver-
a maioria está entre as duas sos órgãos que habitualmente significam
possibilidades.” incurabilidade ou irressecabilidade para
tumores sólidos não impedem tratamen-
As neoplasias hematológicas apresentam to curativo em pacientes com linfomas de
características singulares quando compara- bom prognóstico. Fatores prognósticos em
das a “tumores sólidos” ou neoplasias de ori- hematologia envolvem exames específicos
gem epitelial. Manifestações clínicas, proba- como citogenética e marcadores molecu-
bilidade de cura e intensidade do tratamento, lares. Através de ferramentas laboratoriais
rotinas de cuidado são extremamente pecu- e escores clínicos o risco da doença e uma
liares. Conceitos habitualmente utilizados na estimativa de prognóstico é estabelecida
oncologia clínica não podem ser extendidos ao diagnóstico. No entanto, a cura ainda é
para neoplasias hematológicas.1 uma possibilidade, mesmo quando a doença
Neste contexto, o estabelecimento da apresenta alto risco e mesmo quando não há
atenção voltada para o paciente sem possi- resposta a linhas iniciais de tratamento.2
bilidade de cura é também peculiar e com
desafios específicos. Para discutir este tema Maior possibilidade de
alguns conceitos sobre o tratamento oncoló- remissões duradouras
gicos em hematologia devem ser abordados: Alguns linfomas indolentes ou o mie-
loma múltiplo avançados não podem ser
Maior possibilidade de cura curados. No entanto, tratamentos disponíveis
Uma das primeiras particularidades de possibilitam remissão completa da doença, a
neoplasias hematológicas é a maior possi- ponto desta não ser detectável por exames
bilidade de remissão completa prolongada, laboratoriais ou de imagem. Enquanto na
o que também pode ser chamado de cura. oncologia clínica quimioterapia comumente
Pacientes idosos com leucemia aguda po- visa redução ou estabilidade das lesões

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Capítulo 44 - Cuidados Paliativos em Hematologia

tumorais, a remissão completa da doença é ocorre devido infecções e toxicidade, de


frequente na hematologia. Neste momento, maneira súbita, e não por evolução lenta da
o paciente não apresenta qualquer mani­ neoplasia. A possibilidade de morte duran-
festação da doença e consegue ter qualidade te o tratamento deve ser sempre menciona-
de vida normal. Estes períodos de remissão da, mesmo em doenças de bom prognósti-
são variáveis, mas podem durar até décadas. co, se quimioterapia de alta intensidade for
Quando há refratariedade à quimioterapia utilizada. 5
ou recaída, ainda há possibilidade de trata- Existem, portanto, três grupos de pacien-
mento agressivo com novos períodos de re- tes no que diz respeito ao desfecho em on-
missão prolongada.3 cologia e a distinção entre eles é ainda mais
clara na hematologia. O primeiro grupo pos-
Necessidade de quimioterapia sui pacientes jovens e ativos que deverão ser
mais agressiva tratados com quimioterapia agressiva para
Com o intuito de atingir resultados satis- atingir a cura. Nestes pacientes o cuidado
fatórios como os mencionados, a intensidade paliativo não tem lugar e as dificuldades
do tratamento quimioterápico para neopla- do tratamento são superadas pela obten-
sias hematológicas é incomparável dentro ção da cura. No outro extremo, um grupo
da oncologia. O tratamento curativo está, possui pacientes idosos ou dependentes que
portanto, diretamente vinculado a quimio- não podem receber tratamento curativo, ou
terapia agressiva. O sofrimento decorrente possuem doença conhecidamente incurável.
do tratamento hematológico se manifesta Esse grupo receberá quimioterapia paliativa
através de náuseas, mucosite, anorexia, ne- e Cuidados Paliativos são o alicerce do trata-
cessidade de muitas medicações, internações mento.4 (Tabela 44.1)
prolongadas e o mais variado espectro de in- Na hematologia, a imensa maioria dos pa-
tercorrências infecciosas.4 cientes está em um terceiro grupo, localizado
entre estes dois primeiros, no qual o desfe-
Mortalidade relacionada ao tratamento cho final não é tão claro quando iniciamos o
A toxicidade relacionada ao tratamento tratamento. Neste grupo, apesar da intenção
com intenção curativa tem sua manifesta- curativa do planejamento terapêutico, com
ção extrema na morte do paciente em de- maior frequencia o desfecho final é a morte
corrência de alguma intercorrência clínica. precoce. Portanto, Cuidados Paliativos não
Não é incomum que pacientes em remissão podem ser negligenciados.
completa da neoplasia evoluam a óbito du- Dentro deste contexto, a implementação
rante quimioterapias com finalidade de in- de Cuidados Paliativos em hematologia en-
tensificar o tratamento. É importante res- contra um importante desafio: o momento
saltar esta peculiaridade de pacientes on- adequado de início. Enquanto a morte é um
cohematológicos: frequentemente a morte assunto que deve ser abordado desde o iní-

Tabela 44.1 - Sobrevida de pacientes oncohematológicos quando refratários ao tratamento habitual

Mediana sobrevida Mediana de Desfecho


Doença
livre de progressão sobrevida global em 1 ano

Leucemia Aguda (não candidato Todos mortos


Inexistente 3 meses
a tratamento curativo) em 1 ano

6,4 meses para


Linfomas 2,8 meses 65% mortos
linfomas agressivos

Mieloma Múltiplo 5 meses 9 meses 60% mortos

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Capítulo 44 - Cuidados Paliativos em Hematologia

cio em neoplasias sabidamente incuráveis, leucemia linfoblástica aguda possuem uma


a esperança de cura e remissão prolongada estratificação de risco e esquemas de trata-
que existe na hematologia leva o médico a mento ainda mais complexos, mas em pa-
frequentemente não abordar o assunto com cientes jovens e de bom prognóstico a sobre-
o paciente e a família. Mesmo quando o faz, vida livre de doença em 5 anos pode também
o grau de expectativa da família comumente chegar a 60%.8
não é ajustado e a possibilidade de cura pre- O tratamento destas doenças frequen-
valece enquanto há negação da chance do temente envolve quimioterapia agressiva
óbito. Esses fatores fazem da morte na hema- e transplante de medula óssea. Índices de
tologia um evento inadequadamente súbito mortalidade relacionada ao tratamento po-
que poderia ter sido melhor abordado com dem ser muito elevados, fazendo da quimio-
cuidados específicos.6 terapia paliativa uma opção para pacientes
O pensamento paliativo em hematologia, idosos ou com muitas comorbidades. No
por culpa de diversos fatores, é esquecido. entanto, com a evolução do suporte clínico
Exatamente em uma especialidade que lida no passar dos anos, os tratamentos curativos
rotineiramente com a morte. O crescimento puderam ser oferecidos para um grupo cada
dos Cuidados Paliativos e a presença de mé- vez maior de pacientes. Hoje, quimioterapia
dicos atentos para o suporte no fim da vida com transplante de medula óssea podem ser
pode transformar uma especialidade conhe- realizados até mesmo em pacientes com mais
cida pela dor e pelo sofrimento. A presença de 80 anos.9
de equipes especializadas facilitaria estes Intercorrências infecciosas são tratadas
processos nos serviços de oncohematologia, agressivamente e mesmo quando muito gra-
com cuidado multiprofissional guiado por ves, o suporte não pode ser diminuído, já que
decisões oncológicas definitivas feitas pelo existe possibilidade de cura da doença.10
médico hematologista.7 Quando o câncer se torna refratário a
várias linhas de quimioterapia, o prognós-
LEUCEMIAS AGUDAS tico se torna muito ruim. A suspensão do
O diagnóstico de leucemia aguda é um suporte clínico agressivo deve ser discutida
dos mais dramáticos da medicina. É feito de com a família neste momento, mas a deci-
maneira súbita, pode ocorrer em qualquer são é muito difícil, visto que os pacientes
faixa etária e determina um desfecho que podem estar clinicamente muito bem e a
vai desde a cura, com uma vida normal, sem chance de cura nunca passa a ser inexisten-
sequelas, até a morte precoce. O tratamento te. Idade, vontade do paciente e da família,
é intensivo, deve ser iniciado imediatamen- além de performance status do pacien-
te, requer internação hospitalar prolongada te, são fatores que devem ser considerados.
e está associado a muitos efeitos colaterais. No fim, a instituição de tratamento não
Diferente de outras neoplasias é impossível curativo é uma decisão a ser adotada pelo
precisar tempo de vida, pois a morte fre- hematologista e a família. Neste momento
quentemente é súbita e relacionada ao tra- a quimioterapia tem menor intensidade e o
tamento.2 suporte transfusional é rotineiro. A falência
Pacientes com leucemia mielóide aguda medular com anemia, neutropenia e plaque-
terão seu risco estratificado conforme exa- topenia acentua-se progressivamente. Inter-
mes ao diagnóstico. A chance de cura des- corrências infecciosas ocorrerão com maior
tes pacientes de um modo geral é de 40%. frequência e maior gravidade e devem ser
Em pacientes jovens e de bom prognóstico, tratadas até que o status performance não
a chance de cura pode chegar até 70%. Em seja mais adequado. A partir deste momen-
pacientes idosos ou de mau prognóstico, a to, deve-se discutir quando o suporte passa
probabilidade cai para 10%. Pacientes com a ser apenas uma terapia fútil.7 (Tabela 44.2)

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Capítulo 44 - Cuidados Paliativos em Hematologia

Tabela 44.2 - Terapias de suporte possivelmente após o fim do tratamento, sendo que a maior
fúteis que devem ser discutidas em parte destes pacientes nunca terá uma recaí-
oncohematologia no fim da vida da. Mesmo quando há recaída, possibilidade
Transfusão de concentrado de hemácias de tratamento agressivo com bons resulta-
Transfusão de plaquetas dos pode ser obtida. Novamente, Cuidados
Hidratação venosa
Paliativos devem predominar quando várias
linhas de tratamento são ineficazes. Quimio-
Antibioticoterapia profilática ou em tratamento
terapia paliativa é, então, iniciada e Cuidados
Medicamentos alto custo (voriconazol, anfotericina Paliativos devem orientar a maioria das deci-
lipossomal, fator VIIr)
sões clínicas.12
Exames laboratoriais de rotina
O linfoma não Hodgkin folicular é o
protótipo dos linfomas indolentes. Estes
LINFOMAS linfomas não podem ser curados com qui-
Nunca é demais ressaltar que o termo mioterapia, no entanto, em casos extremos
linfoma designa uma ampla gama de doen- o transplante de medula óssea pode atingir
ças com características muito diferentes. A este objetivo. Como o transplante é extrema-
história natural destas doenças também é mente agressivo e arriscado, quimioterapia
extremamente distinta. Serão descritos os com anticorpo monoclonal deve ser utliliza-
principais tipos. da. Esta estratégia confere remissão prolon-
O linfoma de Hodgkin é o protótipo dos gada, podendo a recaída ocorrer apenas mui-
linfomas de bom prognóstico. Mesmo quan- tos anos após o primeiro tratamento. Mesmo
do a doença está disseminada e com com- quando há recaída, novo tratamento pode
prometimento de vários órgãos, a cura ainda resultar em muitos outros anos de remissão.
tem grandes chances de ser obtida. Aliás, o Pacientes com respostas parciais e assinto-
conceito de metástase não se aplica na hema- máticos com menor carga tumoral podem
tologia, visto que as doenças são sempre con- não precisar de tratamento em linfomas in-
sideradas de acometimento sistêmico, apesar dolentes e podem permanecer anos com a
de, ocasionalmente, o tratamento local poder doença estável, apenas com observação clíni-
ser utilizado. Mesmo pacientes com doen- ca. Por este motivo, Cuidados Paliativos não
ça disseminda e fatores de pior prognóstico são mencionados em um primeiro momento.
possuem chance de cura de até 50%. O tra- Alguns pacientes terão doença de comporta-
tamento é ambulatorial e de leve intensida- mento agressivo e pouco responsiva a diver-
de. Não resposta ao tratamento não exclui a sas linhas de quimioterapia. O transplante de
chance de cura e mesmo com quimioterapia medula deve ser considerado, pois pode ser
de segunda linha e transplante de medula uma opção de cura. Quando há doença re-
óssea, remissões prolongadas ou cura podem fratária a diversas linhas e perda progressiva
ser obtidos. É incomum um paciente com lin- de performance status, Cuidados Paliativos
foma de Hodgkin ser tratado com estratégia devem predominar. Em linfomas, sintomas
paliativa exclusiva. Tratamento não curativo do fim da vida incluem sintomas constitucio-
só deve ser discutido muito tardiamente nes- nais, efeito de massa de linfonodos e falência
ta doença, quando há falência a muitas linhas medular por infiltração de doença ou toxici-
de quimioterapia, após inclusive transplante dade da quimioterapia.3
de medula óssea.11
O linfoma não Hodgkin difuso de gran- MIELOMA MÚLTIPLO
des células B é o protótipo dos linfomas O mieloma múltiplo é uma doença com
agressivos. Seu tratamento deve ser rápido diversas particularidades dentro da hema-
e o objetivo deve ser a remissão completa da tologia, com características bem específicas.
doença. Aproximadamente 50% dos pacien- Inicialmente, o paciente deve ser informa-
tes ainda estarão livres da doença em 5 anos do que a doença não possui cura. Portanto,

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Capítulo 44 - Cuidados Paliativos em Hematologia

Cuidados Paliativos passam a ter um papel nal de vida, o paciente com mieloma múltiplo
importante em estágios mais precoces da pode exigir da equipe uma ampla gama de
doença.13 cuidados para controle da dor e do sofri-
De acordo com exames laboratoriais es- mento decorrentes principalmente da grave
pecíficos o prognóstico do paciente pode doença óssea associada.14
ser estimado ao diagnóstico. Usualmente,
o paciente responderá a primeira linha de REFERÊNCIAS
quimioterapia e permanecerá em remissão 1. CHENG BHW, SHAM MMK, CHAN KY,
por anos, com adequada qualidade de vida. LI CW, AU HY. Intensive Palliative Care for
O transplante de medula óssea deve ser con- Patients With Hematological Cancer Dying
siderado como estratégia de primeira linha, in Hospice: Analysis of the Level of Medical
pois aumenta o tempo de remissão. A recaída Care in the Final Week of Life. Am. J. Hosp.
irá ocorrer com intervalo variável conforme Palliat. Care. 2013.
as características biológicas da neoplasia. 2. FERRARA F, SCHIFFER C A. Acute mye-
Quando a doença voltar a apresentar ativida- loid leukaemia in adults. Lancet. 2013.
de clínica ou laboratorial, quimioterapia de 381(9865):484–95.
3. FEDERICO M, BELLEI M, MARCHESEL-
segunda linha deve ser iniciada. O tempo e o
LI L, LUMINARI S, LOPEZ-GUILLERMO
grau de resposta ao tratamento são progres-
A, VITOLO U, ET AL. Follicular lympho-
sivamente menores. No fim da vida, a insu-
ma international prognostic index 2: a new
ficiência medular predispõe a infecções e o prognostic index for follicular lymphoma
suporte transfusional pode ser necessário. A developed by the international follicular
doença renal também pode estar presente e lymphoma prognostic factor project. J.
a discussão sobre a realização ou não de he- Clin. Oncol. 2009. 20;27(27):4555–62.
modiálise deve ser abordada com a família e 4. ESTEY EH. Acute myeloid leukemia: 2013
o paciente.13 update on risk-stratification and manage-
O tratmento da dor é um tema de parti- ment. Am. J. Hematol. 2013. 88(4):318–27.
cular importância em pacientes com mielo- 5. R AM R, WOLACH O, VIDAL L, GAF-
ma múltiplo. Virtualmente todos os pacientes TER-GVILI A, SHPILBERG O, RAANANI
terão dor no curso da doença. A dor pode ter P. Adolescents and young adults with acute
origem neuropática decorrente do tratamen- lymphoblastic leukemia have a better out-
to ou compressão medular e origem somática come when treated with pediatric-inspired
devido a fraturas patológicas que se tornam regimens: systematic review and meta-a-
disseminadas com a evolução da neoplasia. nalysis. Am. J. Hematol. 2012. 87(5):472–8.
Habitualmente estas fraturas são responsá- 6. MCGRATH P. Qualitative findings on the
veis pela limitação física acentuada destes experience of end-of-life care for hemato-
pacientes. O manejo da dor é abordado em logical malignancies. Am. J. Hosp. Palliat.
capítulo específico deste livro. O uso de an- Med. 2002. 1;19(2):103–11.
tiinflamatórios deve ser evitado no mieloma 7. 
SEXAUER A, CHENG MJ, KNIGHT L,
múltiplo, pelo risco de exacerbação da insu- RILEY AW, KING L, SMITH TJ. Patter-
ns of Hospice Use in Patients Dying from
ficiência renal. Avaliação em conjunto com
Hematologic Malignancies. J. Palliat. Med.
equipe de ortopedia pode ser necessária para
2014. 17(2):1–5.
o tratamento de dor persistente e intratá-
8.MULLIGHAN CG. The molecular genetic
vel, principalmente lombar. Neste contexto makeup of acute lymphoblastic leukemia.
vertebroplastia e cifoplastia podem ser rea- Hematology Am. Soc. Hematol. Educ. Pro-
lizadas com técnicas pouco invasivas. A ra- gram. 2012. 2012:389–96.
dioterapia também pode ser utilizada para 9. 
GARDIN C, TURLURE P, FAGOT T,
controle de lesões líticas sintomáticas, sendo THOMAS X, TERRE C, CONTENTIN N,
recomendado utilização de doses únicas de 8 ET AL. Postremission treatment of elderly
Gy, com boa resposta temporária. Na fase fi- patients with acute myeloid leukemia in

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Capítulo 44 - Cuidados Paliativos em Hematologia

first complete remission after intensive in- ving rituximab for diffuse large B cell
duction chemotherapy: results of the multi- lymphoma: an overview of systematic
center randomized Acute Leukemia French reviews. Ann. Hematol. 2013. (11):1451–9.
Association (ALFA) 9803 trial. Blood. 2007. 13. SNOWDEN J A, AHMEDZAI SH, ASH-
109(12):5129–35. CROFT J, D’SA S, LITTLEWOOD T,
10. SARKOZY C, GARDIN C. Outcome of ol- LOW E, ET AL. Guidelines for supportive
der patients with acute myeloid leukemia care in multiple myeloma 2011. Br. J. Hae-
(AML) in first relapse. Am. J. 2013. 1–28. matol. 2011. 154(1):76–103.
11. ANSELL SM. Hodgkin lymphoma: 2012 14. 
TERPOS E, MORGAN G, DIMOPOU-
update on diagnosis, risk-stratification, LOS M A, DRAKE MT, LENTZSCH S,
and management. Am. J. Hematol. 2012. RAJE N, ET AL. International Myeloma
87(12):1096–103. Working Group recommendations for
12. LINDENMEYER LP, HEGELE V, CA- the treatment of multiple myeloma-re-
REGNATO JP, WUST D, GRAZZIOTIN lated bone disease. J. Clin. Oncol. 2013.
L, STOLL P. Follow-up of patients recei- 20;31(18):2347–57.

392

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Parte 7
Situações polêmicas em Cuidados Paliativos

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Cuidados paliativos
no ambiente domiciliar 45
CAPÍTULO

Iara Alvite Romano


Carolina Lou de Melo
Ligiane Rezende Corral

CUIDADOS PALIATIVOS ferência por morrer em casa e seus familiares


EM DOMICÍLIO tinham maior habilidade de lidar com ques-
De acordo com Silva1, a casa é muito mais tões de fim de vida em relação aos que mor-
do que um abrigo, ela promove a criação de reram em outros locais. Surpreendentemente,
laços e pertencimento entre os moradores, é sintomas dolorosos não foram os mais recor-
o local de repouso, privacidade e intimidade. rentes no fim de vida. Os mais prevalentes fo-
O domicílio com sua singularidade, objetos ram incontinência, perda de peso e delirium.5
dotados de significado, memórias domésticas Um estudo com seguimento de 2 anos,
e a presença de familiares tende a tornar o mostrou que os pacientes com doenças
espaço agradável e acolhedor ao idoso. como Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica
A maioria dos estudos mostra que grande (DPOC), Insuficiência Cardíaca (IC) e neo-
parte dos entrevistados com doenças crôni- plasias avançadas, que receberam Cuidados
cas e neoplásicas avançadas prefeririam fale- Paliativos multidisciplinares em domicílio,
cer em casa.2,3,4 apresentavam maiores níveis de satisfação,
Os pacientes que morrem em domicílio utilizavam menos recursos de saúde (hospita-
são em geral mulheres, tem pobre status fun- lização, serviços de emergência), e tinham um
cional, relatam baixos níveis de dor, expres- custo duas vezes menor em relação ao grupo
sam desejo de falecer em domicílio, tem boas que não recebeu cuidados domiciliares7.
relações familiares, moram com os cuidado- É importante ressaltar que pacientes e
res, tem bom suporte social e possuem mais familiares podem mudar o desejo de morrer
de um cuidador3,5,6. A opinião dos cuidado- em casa conforme a progressão da doença
res em querer que o paciente tenha sua morte alcança o seu fim, pela maior prevalência de
no ambiente domiciliar e um bom estado de sintomas e dificuldade de controle no domi-
saúde do cuidador também são preditores de cílio. Dessa forma, o atendimento domiciliar
morte no domicílo5. em Cuidados Paliativos tem como objetivo
Em Brink5, et al uma amostra de 536 pa- principal fornecer suporte ao paciente e fa-
cientes, a maioria dos idosos com doenças miliares, para que o indivíduo permaneça
neoplásicas avançadas, que receberam Cuida- em casa o máximo de tempo possível, pre-
dos Paliativos no domicílio apresentavam pre- servando os valores familiares e as relações

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Capítulo 45 - Cuidados paliativos no ambiente domiciliar

sócio culturais, sem necessariamente morrer • Dar orientações quanto às situações de


em casa. Além disso, visa reduzir a deman- emergência
da por atendimento hospitalar e seus custos, • Orientar os familiares e cuidadores
sem perder a qualidade do acompanhamen- sobre sinais e sintomas que comu-
to; reduzir o tempo de internação hospitalar mente antecedem a morte e quais me-
e os riscos de infecção hospitalar. didas devem ser adotadas em caso de
Os principais pré-requisitos para sucesso morte no domicílio.
nos Cuidados Paliativos domiciliares são3,6: A maioria dos procedimentos para pro-
1. Desejo
 do paciente e o suporte familiar; longar vida em pacientes terminais são des-
2. Assistência de equipe de cuidadores e necessários, causam estresse, dor e descon-
profissionais de saúde preparados para forto para o paciente e sua família. Além dis-
cuidados de fim de vida; so, para o controle da maioria dos sintomas
3. Possibilidade de serem realizadas visi- de fim de vida não são necessários procedi-
tas frequentes de médicos e outros pro- mentos complexos7,9.
fissionais; Um novo modelo de Cuidados Paliati-
4. Serviço de contato (telefônico ou ele- vos integra medidas paliativas e curativas,
trônico, por exemplo) 24 horas para para controle dos sintomas, associado a um
resolução de dúvidas e intercorrências. modelo de assistência psicossocial, multi-
5. Suporte de hospitais gerais e de reta- profissional com objetivo único de preservar
guarda próximos para admissão de pa- funcionalidade, reinserir o paciente no meio
cientes com sinais e sintomas de difícil sócio-familiar, melhorar sua qualidade de
manejo em casa8. vida e de seus familiares e proprocionar uma
Para a prática de Cuidados Paliativos em morte assistida10,11.
ambiente domiciliar existem condições míni-
mas indispensáveis, como ambiente digno (dis- A EQUIPE MULTIPROFISSIONAL NOS
ponibilidade de água potável e energia elétrica, CUIDADOS PALIATIVOS DOMICILARES
ventilação, cama, adequadas condições de hi- Equipe multiprofissional consiste em um
giene) e presença de cuidador responsável. grupo de vários profissionais, sejam eles da
São estratégias fundamentais no ma- saúde ou não, comprometidos com a prática
nejo dos pacientes com doenças avançadas dos Cuidados Paliativos. Além das interven-
em domicílio 4,6: ções técnicas passíveis de serem realizadas,
• Orientar cuidadores e familiares ante- faz parte da abordagem paliativa a eficiente
cipadamente quanto aos sintomas que comunicação entre os membros da equipe, o
podem vir a aparecer com a progressão idoso e os familiares. Acredita-se que assim,
da doença; o indivíduo será visto de forma global, sendo
• Explicar benefícios e efeitos colaterais respeitadas suas singularidades, autonomia,
das medicações, assim como adequada dignidade e direito de opinar nas decisões a
posologia; serem tomadas sobre qualquer intervenção
• Ter via de acesso disponível para a ad- que se faça necessária, sendo esta a melhor
ministração de medicações (via oral, forma de se promover os Cuidados Paliativos
via sonda nasoenteral/gastrostomia, em Domicílio12.
subcutânea, retal) Pelo fato de não haver possibilidade de
• Disponibilizar medicações para as di- cura da doença de base para o paciente que
versas demandas clínicas, além de apa- esteja sob a abordagem paliativa, o foco será
relhagem de suporte (oxigênio, nebuli- o idoso e o seu bem-estar a curto prazo. É
zador e aspirador) se necessário; preciso que seja feito o controle dos sintomas
• Orientar como agir em caso de inter- já instalados e visitas domiciliares rotineiras
corrências agudas, como convulsão, com o objetivo de avaliar o idoso e, desse
dispneia, delirium, dor intensa; modo, prever possíveis efeitos adversos que

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Capítulo 45 - Cuidados paliativos no ambiente domiciliar

possam emergir em decorrência da doença, tegrada, praticando a escuta e a comunicação


objetivando portanto, a qualidade de vida13. de modo eficientes, valorizando o indivíduo,
Assim, é função da fisioterapia atuar evi- sua singularidade, suas crenças e respeitan-
tando contraturas, desconfortos respirató- do, principalmente, suas vontades, sendo o
rios, tentar manter a mobilidade e força. idoso em Cuidados Paliativos o protagonis-
A enfermagem tem grande importância ta da ação e da intervenção, decidindo como
na prevenção e tratamento de úlceras por pretende passar seu período restante de vida.
pressão e infecção e para auxiliar na admi-
nistração de medicamentos. SUPORTE AO CUIDADOR DO IDOSO
A fonoaudiologia pode intervir para EM SITUAÇÃO DE TERMINALIDADE
adaptar alimentos que proporcionem prazer Considera-se que cuidar de idosos de-
com segurança, evitando ou minimizando os pendentes é um evento da vida normativo
possíveis problemas decorrentes de disfagia do curso de vida familiar, o que tem relação
sem impedir o indivíduo de ingerir aquilo direta com a existência de uma norma socio-
que lhe agrada. Cabe ao fonoaudiólogo tam- cultural, segundo a qual cabe aos filhos o pa-
bém treinar cuidadores e pacientes para que pel de cuidar dos pais idosos15.
sejam feitos exercícios com o intuito de pro- Cuidar de uma pessoa dependente é uma
teção de aspiração de saliva e diminuição de tarefa complexa e exige esforço pessoal e de-
secreção de cavidade oral. terminação. Diversos estudos apontam que
O mesmo fará a equipe de nutricionis- os cuidadores de doentes crônicos depen-
tas ao priorizar a dieta para conforto, tra- dentes estão sujeitos a tensões que debilitam
balhando para resgatar e fortalecer o valor sua saúde física e mental, em decorrência da
simbólico do alimento, estimular a reunião necessidade de assumir novos papéis, além
à mesa como exercício de satisfação pessoal, da aceitação da redução das atividades como
estreitando laços familiares e promovendo trabalho e lazer16,17.
sociabilidade14. Cuidadores costumam conviver com
O serviço social é muito importante quan- significativo aumento de sobrecarga física,
to ao auxílio e orientações de caráter social, emocional, social, financeira e existencial
para que o acesso a serviços e direitos não especialmente quando a doença do paciente
fique impossibilitado. Cabe ao assistente so- está com seu curso avançado18.
cial dar suporte quanto direitos a auxílios do É importante lembrar que a presença de
governo, organização familiar determinando um familiar com pouco tempo de vida no
responsabilidades de cuidadores e familiares, domicílio traz em geral intenso estresse ao
auxílio à procura de referências de saúde em paciente e familiares, o que demanda por
caso de emergência, planejamento de medidas parte da equipe que os assistem, habilidades
burocráticas pós-óbito, dentre outros. no sentido de ajudá-los a lidar com a diversas
A terapia ocupacional pode auxiliar na situações que podem surgir19.
instrumentalização do indivíduo com fer- Diante da finitude de um familiar podem
ramentas ou estratégias que prolonguem surgir sentimentos como tristeza e desespero
a interação dele com o ambiente de forma que, por fazerem parte do processo de mor-
autônoma13. Adaptação de talheres e copos, rer, possibilitam o entendimento da morte
reorganização da posição de mobílias, ajustes como algo inevitável, que trará alívio tanto
de roupas para facilitar seu uso, adaptação de para o familiar quanto para o idoso18,21.
horários mais confortáveis para as atividades A relação de afeto entre cuidador e o
do dia a dia são umas das muitas medidas a doente torna-se um fator que ameniza as di-
serem tomadas pelo terapeuta ocupacional. ficuldades que o cuidar impõe, porém quan-
Portanto, a abordagem de Cuidados Pa- do a escolha do cuidador baseou-se em sen-
liativos em domicílio terá melhor eficácia se timentos de obrigação moral a aceitação da
for realizada por equipe multiprofissional in- finitude torna-se mais difícil18.

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Capítulo 45 - Cuidados paliativos no ambiente domiciliar

Acolher e respeitar o cuidador, que mui- qualidade ao idoso e oferecendo suporte a


tas vezes, encontra-se sem condições para família para enfrentamento das dificuldades
essa tarefa de cuidado, pelo medo de lidar advindas do cuidar23,24.
com a proximidade da morte faz parte da A assistência domiciliária compreende
abordagem paliativa. Dentre as ferramentas visitas realizadas pela equipe multiprofissio-
que devem ser desenvolvidas pelos profissio- nal, com finalidade de avaliar suas necessi-
nais que atuam no domicílio: discussão com dades e de seus familiares e do ambiente em
cuidadores sobre situações esperadas, inter- que vivem com objetivo de traçar um plano
corrências, manejo de sintomas, suporte em assistencial para reabiltação do idoso visando
caso de intercorrências clínicas, como pro- sua indepedência24. Além disso, há disponi-
ceder em caso de óbito, ajuda a minimizar bilidade de orientação por telefone, reuniões
angústias18,20. familiares e atendimento do serviço social.
Além disso na atenção ao cuidador, é ne- Um estudo restrospectivo realizado com
cessário oferecer condições de alívio de so- pacientes atendidos pelo Padi, mostrou que
brecarga, estabelecendo cumplicidade, além a maioria dos idosos assistidos pelo progra-
de estimular busca de apoios informais como ma tinha mais de 80 anos, eram portadores
amigos, vizinhos, apego à espiritualidade de incontinência urinária, semi-dependentes
como tentativa de alívio e consolo para o so- para atividades de vida diárias (AVD’s), aca-
frimento18,20,22. mados. Comprometimento cognitivo estava
Assim a chave para um atendimento do- presente em 42% deles e todos necessitavam
miciliar bem-sucedido em pacientes com de um cuidador para realizar AVD’s23.
doenças avançadas e em terminalidade, A partir desses dados pode-se concluir
consiste em uma boa parceria entre equipe que esses idosos possuem características de
profissional, paciente e cuidador, disponibili- fragilidade que podem levar ao declínio da
zando tempo para uma incursão domiciliar, qualidade de vida, das funções orgâncias
estando disponível e presente nas diversas com evolução para terminalidade e morte,
etapas do adoecimento e da morte no am- tornando-se indispensável o suporte geron-
biente domiciliar. tológico nesse processo, com objetivo de ma-
nutenção da familiaridade, dignidade e per-
EXPERIÊNCIA DO PROGRAMA manência no conforto de seus lares o maior
DE ATENDIMENTO DOMICILIAR tempo possível.
DO IDOSO DA UNIFESP/EPM
O Programa de Assistência Domiciliária REFERÊNCIAS
(Padi) implantado em São Paulo em 1999 foi 1. Silva MCC. A casa: para além do morar uma
criado no Complexo Unifesp (Universida- relação de sociabilidade. Revista NUPEM,
de Federal de São Paulo/Escola Paulista de Campo Mourão. 2011, jan/jul. v. 3, n. 4
Medicina), a partir da demanda para atendi- 2. Hall S, Petkova H, Tsouros AD, Costantini
mento aos idosos usuários da Disciplina de M, Higginson IJ; World Health Organiza-
Geriatria e Gerontologia, cujas condições clí- tion, Regional Office for Europe. Denmark.
nicas e sociais estavam impedindo o acesso Palliative care for older people: better prac-
ao atendimento ambulatorial23. tices. 2011. p. 1-59
O Padi tem como metas prestar assistên- 3. McWhinney IR,Bass M,Orr Vanessa. Fators
associated with location of death(Home or
cia a idosos no domicílio, através do traba-
Hospital) of patients referred to a Palliative
lho de uma equipe interdisciplinar, visando
care team.Can Med Assoc J.Fev 1995;152(3)
a recuperação e/ou manutenção clínica, pro-
4. Baillargeon L. Palliative Care Home.Cana-
movendo individualização e humanização dian Family Physician.Editorial 2003 Vol49
do atendimento, reduzindo internações e 5. Brink P,Smith TF. Determinants of Home
re-internações, capacitando cuidadores e fa- Death in Palliative Home Care: Using the
miliares para prestação de assitência de boa interRAI Palliative Care to Assess End-

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Capítulo 45 - Cuidados paliativos no ambiente domiciliar

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14. Corbeau JP. Alimentar-se no hospital: as fil clínico – demográfico doas pacientes
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Terapia antimicrobiana
em Cuidados Paliativos 46
CAPÍTULO

Carolina Toniolo Zenatti


Roberto Muniz Junior

INTRODUÇÃO Não raro estes pacientes necessitarão de


Com o aumento da expectativa de vida e um plano de Cuidados Paliativos por tem-
opções mais abrangentes de controle de na- po prolongado, diferentemente de outras
talidade, o Brasil observa o envelhecimento situações com prognóstico reservado, de
de sua população, levando ao aumento de mais rápida evolução.1-3
doenças degenerativas associadas ao pro-
cesso de envelhecimento. Doenças cardio- ALTERAÇÕES IMUNOLÓGICAS
vasculares, neoplásicas, demências e outros Imunosenescência pode ser definida
processos degenerativos do sistema nervoso como o declínio da função imune que ocor-
central são a grande demanda do serviço de re naturalmente com o envelhecimento. Não
saúde e figuram entre as maiores causas de decorre, portanto, da doença de base, estado
óbito neste país. nutricional, exposição a agentes tóxicos ou
Além disso, estas doenças são associadas desordens genéticas. Tanto a imunidade hu-
ao aumento dos custos em saúde, perda de moral quanto a celular sofrem declínio com a
independência e qualidade de vida e neces- idade, a última em maior grau, porém com o
sidade de cuidados especiais. Se a gravidade declínio dos títulos de anticorpos, as respos-
destes quadros não bastasse, os idosos são tas vacinais também diminuem.4
especialmente suscetíveis a quadros infec- Pacientes com doenças crônicas em está-
ciosos diversos que, além de deteriorarem gios terminais ou sem prognóstico estão mais
ainda mais sua condição de saúde de forma suscetíveis a infecções, pois já esgotaram
importante, ainda levam ao aumento de in- suas reservas funcionais e seus mecanismos
ternações e óbitos. de defesa estão mais prejudicados, levando
Estes pacientes, portadores de condi- ao debate sobre o tratamento de infecções em
ções crônico-degenerativas e suas limita- fases finais de doença.5
ções, são elegíveis para Cuidados Paliati- Muitos avanços ocorreram na prevenção,
vos. Neste momento, o objetivo terapêutico diagnóstico e tratamento das doenças infec-
não é a cura do processo patológico, mas ciosas, porém elas ainda são responsáveis por
sim a tentativa de prover conforto, me- 30% das mortes dos idosos e estão entre as
lhora da qualidade de vida e morte digna. principais causas de hospitalização.6

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Capítulo 46 - Terapia antimicrobiana em Cuidados Paliativos

A elevada taxa de mortalidade por doen- médicos sobre as questões éticas e legais em
ças infecciosas, quando associadas ao enve- relação a introdução, retirada ou manuteção
lhecimento, parece ser decorrente de uma da antibioticoterapia. A decisão é baseada na
soma de fatores nos quais se incluem: menor percepção do médico e da equipe multidis-
capacidade de reserva funcional, alterações ciplinar, das características individuais, na
do sistema imune intrínsecas ao envelheci- busca do equilíbrio entre os efeitos benéficos
mento e concomitância de doenças crônico- e riscos relacionados às opções terapêuticas
degenerativas, ou seja, diminuição da reserva disponíveis para cada paciente.4,7
funcional.4 São poucos os estudos que indicam os
O diagnóstico de infecção pode ser difícil, reais benefícios da indicação dos antibióti-
uma vez que nos pacientes idosos frequente- cos, mas a literatura atual demonstra que os
mente faltam sinais e sintomas clássicos dos médicos optam pelo uso de antibióticos para
processos infecciosos, como febre ou altera- a gestão de sintomas específicos. Alguns es-
ções do perfil hematológico. Os sinais mais tudos, no entanto, mostram que esses mes-
comuns da doença infecciosa no idoso são mos sintomas podem ser manejados com ou-
inespecíficos como quedas, delirium, ano- tras drogas, com menos efeitos colaterais que
rexia, ou fraqueza generalizada. No entanto, os antimicrobianos.7
no contexto geriátrico, estes mesmos sinais Além disso, as pessoas com idade avan-
podem fazer parte da doença de base ou çada apresentam particularidades farma-
surgirem em doenças não-infecciosas. Essas cocinéticas e farmacodinâmicas, alterações
alterações na apresentação do quadro infec- que interferem diretamente nos processos
cioso acabam dificultando e atrasando o pro- de absorção, distribuição, metabolização e
cesso de diagnóstico e, consequentemente, eliminação dos fármacos, de modo que uma
retardam o tratamento. Isto se correlaciona dada dose de um determinado medicamento
diretamente com o aumento de morbimorta- é capaz de produzir no paciente idoso uma
lidade destes pacientes.6 resposta diferente, por vezes inesperada, da-
quela observada em um paciente jovem do
DECISÃO PELO USO DOS ANTIBIÓTICOS mesmo sexo e de peso similar. Atenta-se que
os efeitos adversos das drogas são 2,5 vezes
Vantagens e desvantagens mais frequentes nos idosos do que em popu-
Existe a necessidade de definir os reais lações de outras faixas etárias.8
objetivos no uso do tratamento antimicro- Existem medicamentos cujo risco poten-
biano nessa fase do cuidado, sendo mais um cial para idosos é superior ao seu provável
dilema de decisão no plano de paliação. Os benefício, o que deu origem ao conceito de
antibióticos auxiliam o sistema imunológico medicamentos considerados potencialmente
do organismo no combate dos microorganis- impróprios para idosos e a periódica elabo-
mos invasores. O sucesso terapêutico signifi- ração das listas de fármacos que devem ser
ca o retorno à saúde de base, mas este resul- evitados nessa população. Muitos são os po-
tado não é possível na fase final das doenças. tenciais efeitos colaterais dos antibióticos, se-
Essa modalidade de medicamentos não guem os mais comuns divididos por classe de
é considerada um tratamento agressivo, di- antibiótico9:
ferentemente, por exemplo, da ressuscita- • Penicilinas: neurotoxicidade, convul-
ção cardiopulmonar, da alimentação e da sões, nefrotoxicidade, nefrite inters-
hidratação artificiais, porém há resulltados ticial, febre sem explicação, diarreia e
conflitantes onde o tratamento com antimi- outras alterações gastrointestinais.
crobianos pode prolongar a sobrevida em al- • Cefalosporinas: menor neurotoxicida-
guns casos, o que nem sempre é o objetivo do de que penicilinas, porém podem cau-
plano de paliação. Além disso, na prática clí- sar delirium em idosos (especialmente
nica, ainda há uma grande incerteza entre os o cefepime), nefrite intersticial aguda,

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Capítulo 46 - Terapia antimicrobiana em Cuidados Paliativos

além de serem potentes indutores de re- A dapsona é insolúvel em pH neutro. Além


sistência bacteriana. disso, o aumento na absorção de antimicro-
• Carbapenêmicos: neurotoxicidade, bianos ácido lábil (eritromicina, penicilinas)
prin­cipalmente no caso do imipenem – também é possível, resultando no aumento
cilastina. da concentração plasmática e de reações ad-
• Quinolonas: disglicemias, delirium, versas. Trabalhos da literatura mostram que,
prolongamento do QT e arritimias. em pacientes com gastroparesia (comum em
• Macrolídeos: prolongamento do inter- diabéticos), ocorre menor absorção de cipro-
valo QT. floxacina.6,9
• Clindamicina: principal antibiótico re- Dessa forma, a administração transdér-
lacionado à colite pseudomembranosa. mica de drogas tornou-se procedimento im-
• Metronidazol: neuropatia periférica portante para a utilização de medicamentos,
quando usado por tempo prolongado. particularmente nos idosos. A absorção per-
• Vancomicina: nefrotoxicidade. A van- cutânea requer não apenas a difusão da dro-
comicina apresenta vantagem de poder ga por meio do extrato córneo, mas também
ter seu nível sérico dosado. a captação pela microcirculação e posterior
• Teicoplanina: nenhuma penetração em disponibilidade para a circulação sistêmica.
sistema nervoso central, porém menor No entanto deve-se atentar que há muitas al-
nefrotoxicidade em relação à vancomi- terações na morfologia e função da pele que
cina. No entanto, não se pode dosar seu podem comprometer a penetração da dro-
nível sérico. ga no idoso, entre estas, o ressecamento do
• Polimixinas: nefrotoxicidade. extrato córneo, alterações na atividade das
• Sulfas: mielotoxicidade, nefrotoxicida- glândulas sebáceas e na composição lipídica
de, formação de cálculos renais, hiper- das camadas superficiais. Assim, com o au-
calemia. mento da idade, pode haver grande barreira
• Aminoglicosídeos: nefrotoxicidade e para absorção de drogas, principalmente as
otoxicidade. hidrossolúveis.6,9

CUIDADOS ESPECIAIS Alterações na distribuição


NA ADMINISTRAÇÃO A proporção de massa magra e adiposa,
a água total do corpo e as proteínas contri-
Alterações na absorção buem para a variação no volume de distribui-
A absorção de drogas é um processo pre- ção das drogas. Com o processo de envelhe-
dominantemente passivo, que ocorre princi- cimento, ocorre um aumento da proporção
palmente no intestino delgado. Este proces- de tecido adiposo em relação ao peso corpo-
so está prejudicado em pacientes com idade ral nos idosos, acompanhada de diminuição
avançada, devido alterações fisiológicas da água corpórea. Estas mudanças afetam
como redução do fluxo sanguíneo, redução o volume de distribuição e a meia vida dos
na área do intestino delgado, aumento do antimicrobianos, de acordo com a lipo e hi-
tempo de esvaziamento e redução da motili- drossolubilidade dos mesmos.
dade gástrica.6,9 A redução no fluxo sanguíneo também
A capacidade de secreção gástrica de ácido influencia na distribuição: geralmente, é
clorídrico pelo estômago diminui com o avan- mantido a níveis próximos do normal nos
ço da idade, resultando em elevação do pH e, músculos esqueléticos, artérias coronarianas
consequentemente, afetando a ionização, so- e cerebrais, porém diminui nos rins, fígado e
lubilidade e absorção de muitas drogas.6,9 trato gastrintestinal.
Antimicrobianos como o itraconazol, Alterações nos níveis de proteína plasmá-
cetoconazol, sulfonamidas e pirimetamina tica nos idosos como a albumina, sobretudo
exibem reduzida absorção nestas condições. nos estados de desnutrição, também afetam

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Capítulo 46 - Terapia antimicrobiana em Cuidados Paliativos

a distribuição de drogas. A albumina, entre Outra via envolvida no processo de elimi-


as proteínas do sangue, é a principal proteína nação é o sistema hepato-biliar, que no idoso
para ligação das drogas (ácidas); por isso, a também tem seu transporte reduzido.6,9
redução em seus níveis pode resultar em au-
mento da fração de droga livre. CONCLUSÃO
O metronidazol é um dos medicamen- A antibioticoterapia do paciente em cui-
tos para o qual a redução da ligação pro- dado paliativo é uma decisão complexa, que
teica diminui o volume de distribuição. As deve levar em conta diversos fatores na esco-
concentrações plasmáticas de sulfadiazina lha do medicamento certo para cada pacien-
aumentam significativamente em pacientes te. A disponibilidade e resposta à medicação
que recebem outros medicamentos, quando são mais imprevisíveis, apresentam múltiplas
comparados a pacientes que não recebem doenças graves, usam diversas medicações
múltiplas drogas, caracterizando o desloca- para controle dos sintomas, tem estado de hi-
mento da ligação proteica e a disponibilidade dratação e nutrição alterados, o que os torna,
de droga livre. impreterivelmente, vulneráveis a efeitos ad-
versos, intoxicações e resistência bacteriana.
Alterações no metabolismo Por outro lado, auxiliam na melhora dos sin-
O fígado é um dos principais órgãos en- tomas e cura de infecções.
volvidos no metabolismo de drogas. É es- Assim, a decisão terapêutica deve ser
perada uma redução no metabolismo pela idealizada para cada paciente, levando-se
diminuição do fluxo sanguíneo hepático, da em conta sua situação social, econômica e o
massa hepática e da atividade enzimática no momento de evolução da doença, para que
idoso, o que leva ao comprometimento do sejam tomadas decisões em relação à neces-
clearance de medicamentos. sidade do tratamento e provê-lo da melhor
Há evidências de que drogas que depen- forma.10
dem dos processos de acetilação e hidrólise
(sistema enzimático de fase I) têm o seu me- REFERÊNCIAS
tabolismo reduzido, enquanto que as enzi- 1. CONSELHO REGIONAL DE MEDICINA.
mas envolvidas no processo de conjugação e Cuidado Paliativo / Coordenação Institu-
glicuronização (sistema enzimático de fase II) cional de Reinaldo Ayer de Oliveira. São
não apresentam alteração de suas atividades, Paulo, CREMESP. 2008.
justificando, assim, o emprego mais seguro de 2. MINISTÉRIO DA SAUDE / INSTITUTO
drogas com metabolismo fase II no idoso.6,9 NACIONAL DO CANCER. Cuidados Pa-
liativos Oncológicos: controle de sintomas.
Alteração na excreção Centro de Suporte Terapêutico Oncológico
A excreção renal é a principal via de / CSTO, São Paulo. 2001.
3. LAM PT, CHAN KS, TSE CY, LEUNG
eliminação de muitos antimicrobianos,
MW. Retrospective Analysis of Antibiotic
como os aminoglicosídeos e beta lactâmi-
Use and Survival in Advanced Cancer Pa-
cos. O processo normal de avanço da idade
tients with Infections. Journal of Pain and
afeta intensamente a função renal e, con- Symptom Management. 30 (6). 2005.
sequentemente, acarreta modificações na 4. CACÃO, J.C.; GODOY, M.R.P.; VILLAS
eliminação destes medicamentos. A taxa de BOAS, P.J.F. Vacinação em Idosos: Dados
filtração glomerular sofre declínio gradual atuais. São Paulo.2003. Congresso Paulista
com o aumento da idade. Estas mudanças de Geriatria e Gerontologia. Disponível em:
fisiológicas na função renal do idoso são http://www.emv.fmb.unesp.br/PDF/Vaci-
coincidentes com o aumento na incidência na%E7%E3o%20idoso%20GERP03.PDF.
de processos patológicos envolvendo este 5. STIEL S ET AL. Antibiotics in palliati-
órgão (infecção do trato urinário, hiperten- ve medicine- results from a prospective
são, diabetes etc.).6,9 epidemiological investigation from the

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Capítulo 46 - Terapia antimicrobiana em Cuidados Paliativos

HOPE survey. Support Care Cancer. paciente idoso sob o aspecto da utilização
2012. 20:325–333. de antimicrobianos: repercussão ao siste-
6. MOREIRA IPB, AMADO LEB, BERSANI ma público de saúde brasileiro (SUS). Rev
ALF, BERSANI-AMADO CA, CAPAR- Ciênc Farm Básica Apl. 2011. 32(3):305-
ROZ-ASSEF SM. Principais aspestos do 311.
tratamento das infecções no idoso. Cienc 9. GUIMARÃES, T. Uso de antimicrobianos
Cuid Saude. 2007. 6(Suplem. 2):488-495. nos idosos. Prática Hospitalar. v.7, n.42.
7. Enck RE. Antibiotic Use in End-of-Life 2005.
Care: A Soft Line? American Journal of 10. ACADEMIA NACIONAL DE CUIDA-
Hospice & Palliative Medicine. Editorial DOS PALIATIVOS. Manual de Cuidados
27(4). 237-238. 2010. Paliativos. Rio de Janeiro, Adiagraph.
8. CAZARIM, M.S.1; ARAÚJO, A.L.A. O 2009.

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Alimentação artificial
em Cuidados Paliativos 47
CAPÍTULO

Guilherme Liausu Cherpak


Lucíulo Melo
Tamyris Gonçalves

Alimentação artificial pode ser definida símbolo de compaixão, amor, carinho e es-
como a administração de nutrientes através perança, ou simplesmente, entendido como
de uma cânula intravenosa, a nutrição paren- cuidado básico, principalmente na cultura
teral, ou por um tubo enteral, a nutrição ente- latino-americana. É comum a idéia, tanto
ral, que pode ocorrer via sonda nasogástrica, pelos pacientes como por familiares, que a
nasoenteral, gastrostomia ou jejunostomia. manutenção e o aumento de ingestão hídrica
O uso ou não de tais artifícios na tentativa e alimentar protelam a deteriorização física
de manter bom estado nutricional em Cuida- imposta por doenças avançadas.5, 6
dos Paliativos traz importantes discussões à A interrupção da alimentação (artificial
tona: quando e por que manter nutrição em ou não), desse modo, pode trazer sentimen-
pacientes em Cuidados Paliativos e quando e to de medo e abandono e suscitar a idéia de
por que descontinuar a ingestão alimentar.1 que a redução da ingestão acelera processo de
É notório que pacientes em Cuidados morte, prevalente em culturas ocidentais.5
Paliativos têm ingestão oral reduzida ou Além de questões individuais, discussões
mesmo não se alimentam. Comumente, éticas sobre a suspensão ou não instituição
isso decorre de comprometimento cogniti- da alimentação artificial são recorrentemen-
vo grave em demências em fase avançada ou te levantadas O debate ético sobre alimenta-
por anorexia-caquexia, comuns em doen- ção artificial foi amplificado na década de 50,
ças avançadas ou terminais, ou mesmo por quando os princípios bioéticos começaram
obstrução do trato gastrintestinal. Estima- a ser definidos. A questão que se impunha
se que um terço dos americanos residentes na ocasião, e permanece de certo modo até
em instituições de longa permanência com hoje, era se a alimentação artificial simples-
comprometimento cognitivo importante mente correspondia a um tratamento médi-
são alimentados através de tubos enterais. O co, podendo ser suspenso, ou se a mesma é
questionamento feito anteriormente é cons- moralmente diferente dos demais cuidados
tante na Abordagem Paliativa.1, 2, 3, 4, 5 médicos, constituindo uma provisão básica
O ato de alimentar carrega importante de conforto, e devia ser mantida a despeito
significado emocional, psicológico e cultural da recusa de tratamentos médicos. As razões
tanto para família quanto para o paciente. É pelas quais a manutenção da alimentação ar-

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Capítulo 47 - Alimentação artificial em Cuidados Paliativos

tificial ser defendida por muitos bioeticistas plicações. O uso de catéteres nasoenterais está
passa pelos aspectos simbólicos previamente relacionado com pneumonia aspirativa, náu-
citados, e mesmo pela suposição, à época, de seas, diarreia, aumento de secreções respirató-
que a interrupção de meios artificiais para rias, sinusites, além de serem desconfortáveis,
nutrição poderia ser causalmente responsá- alterarem a mecânica da deglutição e muitas
vel pela morte do paciente. Eticamente, tam- vezes causarem o uso de contenção mecânica
bém se discute quem e como fazer decisões ou química. Gastrostomias, por sua vez, po-
acerca de tal tema quando o paciente não tem dem estar associadas a infecções cutâneas e/
mais condições de discernimento.2, 3 ou intra-abdominais, vazamentos, obstruções
e refluxo. Estas complicações estão resumidas
INSTITUIÇÃO DE ALIMENTAÇÃO na tabela 47.1 a seguir. 1, 4, 7, 8, 9, 10, 11, 12
ARTIFICIAL EM CUIDADOS PALIATIVOS Não há evidência também de melhora de
Atualmente, não há indicações médicas parâmetros nutricionais, como peso, índice
claras para instituição de alimentação arti- de massa corporal, hematócrito, colesterol,
ficial no fim de vida. Geralmente, a mesma níveis de hemoglobina e albumina, com uso
ainda é prescrita em fase final de vida para de vias alternativas de alimentação. Em re-
prevenir desidratação e demonstrar conti- visão da Cochrane, indivíduos com demên-
nuidade de suporte para o próprio paciente cia mesmo recebendo alimentação por son-
e familiares.1, 7 da com adequado aporte calórico e proteico
Revisão sistemática publicada pela Co- apresentaram perda de peso e diminuição
chrane em 2008 (análise de quatro trials grave de massa muscular e adiposa. 7, 8, 10, 11
prospectivos não controlados e uma revisão No entanto, a falta de evidência não im-
sistemática da Cochrane – ausência de estu- plica contraindicação. A alimentação artifi-
dos prospectivos randomizados e controla- cial pode e deve ser utilizada em Cuidados
dos ou prospectivos controlados) concluiu, Paliativos geralmente como uma tentativa,
pela insuficiência qualitativa de estudos, que após consideração de seus benefícios e riscos,
não se pode fazer recomendações objetivas para atingir uma meta específica, enquanto o
para o uso de alimentação artificial em Cui- paciente é monitorizado regularmente sobre
dados Paliativos.2 efeitos positivos e adversos desta conduta.
Evidências científicas tem resultados di- Estudos prospectivos não controlados su-
versos, a maioria não demonstrou aumento gerem que pacientes com bom performance
de sobrevida ou melhora em qualidade de status e com sobrevida estimada em meses a
vida com instituição de alimentação artificial. anos talvez se beneficiem de vias alternativas
Mesmo na demência avançada, apesar da in- para alimentação. 2,3
dicação rotineira de vias alternativas de ali- Vários fatores, alguns já citados, tem in-
mentação, não existem evidências científicas fluência na instituição de alimentação arti-
de que a nutrição enteral promova benefício ficial. Estudo realizado em Taiwan com pa-
nas úlceras por pressão, tempo de sobrevida, cientes terminais reportou que as variáveis
mortalidade, qualidade de vida, funcionali- que mais influenciaram na decisão de iniciar
dade ou comportamento. Coorte prospectiva alimentação artificial foram: crença sobre os
publicada no Journal of the American Geria- benefícios que a alimentação artificial pode
trics Society (JAGS), em 2012, com mais de 36 causar, percepção sobre a capacidade de cui-
mil idosos residentes em instituições de longa dado pelos familiares, percepção positiva da
permanência (ILP) americanas, não demons- medida pelo médico assistente. 6
trou aumento de sobrevida com a inserção O médico é citado em vários estudos
de gastrostomia em pacientes com demência como tendo a maior influência na decisão da
avançada. 4, 7, 8, 9, 10, 11, 12, 13 instituição da alimentação artificial. A deci-
Ademais, a alimentação artificial é rela- são sobre manutenção de alimentação, com a
cionada com considerável aumento de com- instituição de meios alternativos – cateteri-

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Capítulo 47 - Alimentação artificial em Cuidados Paliativos

tabela 47.1 - Complicações relacionadas às vias alternativas de alimentação


Tipos de efeitos Sonda nasoenteral Gastrostomia e/ou
Ambos
adversos (SNE) jejunostomia
Deiscência da ferida; sangramento
Erosão/necrose; Epistaxe; Faringite
no sítio de inserção; Fechamento/
e/ou esofagite; Locação do tubo no
estenose da ostomia; Lesão de pele;
pulmão ou cérebro; Otite média/ Migração do tubo; Desconforto
Locais/Mecânicos Hematoma; Extravasamento de
sinusite; Retirada frequente da SNE
conteúdo gástrico para a cavidade
pelo paciente
abdominal
Fístula broncopleural/
traqueoesofágica; Hemotórax;
Hidrotórax; Pnemotórax;
Erosão do tubo para dentro da
Perfuração traqueobrônquica; Aspiração
Pleuropulmonares cavidade pleural
Pneumonite; Abscesso pulmonar;
Pneumomediastino; Obstrução das
vias aéreas; Infusão intrapulmonar
Perfuração/Prolapso/Fístula
gástrica; Pneumoperitôneo;
Pneumatose intestinal; Ìleo
Diarreia; Sangramento
Perfuração esofágica/ duodenal; paralítico; Evisceração; Dilatação
gastrointestinal; Obstrução
Abdominais Estenose esofágica; Esofagite de gástrica aguda; Intussuscepção,
intestinal; Náuseas/vômitos;
refluxo defeitos na parede gástrica;
Esofagite de refluxo
Laceração esofágica; Peritonite;
Celulite; Fasciíte necrotizante;
Abscesso abdominal subfrênico
Infusão excessiva de fluidos;
Restrição mecânica; Anorexia/
Agitação; Necessidade frequente de perda de peso; Distúrbio
reposicionamento da SNE; Aumento Arritmia; Laringoespasmo; Choque; metabólico; Perda do prazer
Outros
de secreção com necessidade Mediastinite e dos aspectos sociais da
frequente de aspiração alimentação; Perda da
dignidade; Alteração da
aparência
Traduzido e adaptado de Tube Feeding in Patients With Advanced Dementia: A review of the evidence JAMA. 1999; 282 (14):
1365 - 1370.

zação nasoenteral1, gastrostomia ou até mes- da mesma acerca dos fatos e tome ações na
mo nutrição parenteral – ou a suspensão de tentativa de diminuir a ansiedade esperada
alimentação deve, entretanto, ser discutida diante do processo decisório. 5
multidisciplinarmente e tomada em conjun-
to com a família do paciente (uma variedade FAMILIARES E PACIENTES
de estudos sugeriu que pacientes, familiares E A ALIMENTAÇÃO ARTIFICIAL
e equipe assistente raramente estão concor- Diante da redução de ingestão alimentar,
dantes sobre alimentação artificial), levando comum em pacientes em Cuidados Palia-
em consideração sempre os princípios bioé- tivos, pode-se identificar comportamentos
ticos de autonomia e não maleficência. É distintos a tal situação de estresse e ansie-
comum cuidadores e familiares citarem ra- dade. Há famílias que insistem em forçar a
zões lógicas e racionais para manutenção de alimentação, com a intenção de amenizar
alimentação, quando é importante ter ciên- progressão da doença e estender sobrevida.
cia que, além disto, existem aspectos mais Geralmente, com tais crenças, está associado
profundos (sociais, culturais, psicológicos e um baixo nível de aceitação e sensibilização
emocionais) a serem considerados. As deci- sobre uma morte eventual do paciente. Ape-
sões compartilhadas, portanto, serão únicas, sar da intenção, a insistência e pressão pela
pois serão resultado do delicado e intricado ingestão alimentar pode acarretar sentimen-
complexo psicossocial, religioso, cultural, to de culpa, solidão e desamparo nos pacien-
clínico e ético de cada indivíduo. 1, 5, 6 tes. Há famílias que entendem e aceitam me-
É importante que a equipe de profis- lhor a evolução do paciente com anorexia e,
sionais de saúde informe pertinentemente assim, conseguem dispor melhor de tempo e
sempre a família, confirme a compreensão energia para outras atividades de cuidado. 5

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Capítulo 47 - Alimentação artificial em Cuidados Paliativos

Familiares e pacientes tendem a interpre- à fadiga da musculatura, favorecendo aspira-


tar alimentação artificial como continuidade ção e desconforto. 15, 16
do cuidado, para preservação da vida, com- Algumas estratégias mostram-se eficazes
bate à doença e prevenção de morte por ina- para serem tentadas em lugar da conversão
nição. Estudos mostram pouco nível de co- para alimentação enteral. Previamente a estas
nhecimento tanto por pacientes e familiares tentativas, são válidas avaliações fonoaudioló-
acerca de reais benefícios e riscos de meios gica e nutricional com o objetivo de fazê-las
alternativos de alimentação. 5 da forma mais segura e eficaz em termos de
As percepções da família e do paciente prevenção de aspiração e manutenção do es-
quanto à nutrição tem influência na relação tado nutricional. São elas: 15, 16
com a equipe de cuidado. Como há poucas
ferramentas para o manejo do estado nutri- Para prevenir confusão e melhorar acei-
cional, a equipe de cuidado tende a focar es- tação na hora da refeição:
forços em sintomas com maior possibilidade • Manter uma rotina no horário das re-
de controle. Familiares e pacientes podem feições em ambiente calmo.
perceber tal fato como negligência, e um obs- • Reforçar o uso de óculos e próteses
táculo se formar na relação com os profissio- auditivas, checar o ajuste das próteses
nais de saúde. 5 dentárias.
• Favorecer o uso de contrastes ao invés
SUPORTE NUTRICIONAL de estampas em pratos e jogos ameri-
EM CUIDADOS PALIATIVOS canos.
Há vários fatores que podem impactar no • Dar dicas sobre quais os passos seguin-
status nutricional de pacientes em Cuidados tes (mastigar, engolir, abrir a boca).
Paliativos, como conhecimento das necessi- • Preservar hábitos ou rituais prévios, ser
dades nutricionais, suporte emocional para o paciente e tolerante.
paciente e o impacto direto e severidade pró- • Favorecer a independência – usar uten-
prias das doenças. 14 sílios adaptados, encher copos pela
Estratégias podem ser utilizadas por metade, colocar a mão sobre a mão do
profissionais de saúde no manejo de pa- indivíduo para ensinar/lembrar do mo-
cientes em Cuidados Paliativos, várias delas vimento.
abordadas previamente em capítulo especí- • Evitar alimentos muito quentes ou
fico. Aconselhamento e orientação dietética muito frios.
deve ser oferecida para todos pacientes em • Caso apresente agitação ou recusa não
Cuidados Paliativos, com objetivo de man- contornáveis, pular a refeição, tentando
ter hábitos alimentares apropriados, mas compensar nas seguintes ou com lan-
de acordo com as necessidades e anseios de ches.
cada indivíduo. 14
Para combater a falta de apetite:
ESTRATÉGIAS PARA • Fracionar as refeições.
ALIMENTAÇÃO NÃO ARTIFICIAL • Ter lanches sempre à disposição.
A tentativa de manutenção de alimen- • Se possível, aumentar a atividade física.
tação por via oral sem o cuidado adequado, • Se necessário, utilizar suplementos nu-
pode ao invés de ajudar, contribuir para as tricionais.
complicações da disfagia. Uma oferta de ali- • Respeitar as preferências dietéticas do
mento em porções maiores do que a boca e indivíduo.
a musculatura do indivíduo são capazes de
lidar e podem levar a um aumento do resíduo Para evitar complicações da disfagia:
pós-deglutição e à entrada de alimento na via • Oferecer a refeição em posição adequada.
aérea. A oferta rápida do alimento pode levar • Lembrar constantemente o passo seguinte.

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Capítulo 47 - Alimentação artificial em Cuidados Paliativos

• Oferecer pequenas porções. mentação assistida com cuidado, mesmo em


• Utilizar a dieta na consistência/textu- ambiente de ILP: uso da ajuda de voluntários
ra/umidade adequadas. e/ou familiares; separar os pacientes por grau
• Evitar alimentos que favoreçam a aspi- de dependência, permitindo que um mesmo
ração (amendoim, milho, pipoca). cuidador alimente 3 a 4 indivíduos; favorecer
a alimentação/hidratação em conjunto com
Polifarmácia também é um fator que atividades lúdicas, aumentando a aceitação.15
pode estar relacionado com a diminuição da Frente ao impacto sociossanitário que
aceitação alimentar por parte do idoso. Pode tem as complicações do uso exagerado de
relacionar-se com rebaixamento do nível de alimentação artificial por vias alternativas,
consciência, boca seca, constipação e náuseas o uso de técnicas para a manutenção da via
que podem contribuir para uma baixa acei- oral, com o máximo de independência pos-
tação alimentar. O tratamento de condições sível, mostra-se importante. Alimentar um
clínicas também é importante. Depressão, idoso dependente é uma tarefa árdua e de pa-
parkinsonismo, lesões da mucosa oral são ciência, mas provê ao mesmo tempo o prazer
problemas clínicos tratáveis que implicam do paladar e o convívio social, configurando
em baixa ingesta. 15 benefícios, que vão além do estado nutricio-
O ambiente deve ser levado em conta. nal, especialmente em Cuidados Paliativos.
Odores e barulho podem atrapalhar a refei- Trata-se de um esforço multidisciplinar com
ção. Distrações visuais também. De preferên- benefícios evidentes.
cia, a refeição deve ser feita em local de conví-
vio, e não no quarto para favorecer o lado de CESSAÇÃO DE ALIMENTAÇÃO
evento social da refeição, lembrando sempre ENTERAL/ORAL EM CUIDADOS
de preservar os rituais/hábitos alimentares PALIATIVOS
do indivíduo. 15 Em pacientes idosos em Cuidados Paliati-
Deve-se sempre lembrar o indivíduo dos vos é alta a prevalência do uso de alimentação
passos seguintes na alimentação (mastigar artificial. Ressalta-se o aumento considerável
engolir, abrir a boca), assim como estar aten- da utilização da gastrostosmia percutânea,
to a possíveis complicações, como a presença devido à baixa invasão e menor taxa de com-
de resíduos alimentares pós-deglutição ou a plicações quando comparada com a catete-
ocorrência de engasgos. Portanto, é muito rização nasoenteral. Aqueles pacientes que
importante que aquele que alimenta o idoso, se mantém sendo alimentados por via oral,
tenha a atenção focada, evitando distrações cursam com diminuição progressiva da in-
ou socializações com outros cuidadores. 15 gesta, que, eventualmente, acarreta em perda
O posicionamento durante e após as re- de peso e desnutrição. 12, 15, 18, 19, 20, 21, 22
feições também é muito importante na pre- Questão que se impõe é qual o limite para
venção de aspirações, evitando o decúbito tais intervenções? Até quando manter uma
dorsal durante e logo após o idoso ter sido nutrição artificial já instalada, ou forçar uma
alimentado. 15, 16 alimentação por via oral? Devemos manter
Percebe-se que a alimentação de um ido- indefinidamente a alimentação ou existe evi-
so dependente leva bastante tempo e esfor- dência para suspensão da mesma?
ço, que nem sempre consegue ser dado, es- No que tange a alimentação por via oral,
pecialmente num ambiente de instituição de deve-se seguir as estratégias para aumento da
longa permanência (ILP). Nestes ambientes, ingesta, já descritas neste capítulo e em capí-
dada a frequência de alta relação paciente/ tulo anterior. Seguindo estas recomendações,
cuidador, as refeições são apressadas e por prolonga-se a aceitação por boca, mas respei-
isso arriscadas. 15, 16, 17 tando a vontade do paciente de alimentar-se;
Existem alguns programas alimentares caso essa vontade não exista, mesmo após o
descritos com o objetivo de manter uma ali- estímulo, não se deve forçar a alimentação.

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Capítulo 47 - Alimentação artificial em Cuidados Paliativos

Evitar desconforto na hora da refeição, ou ca evidência de que haja desconforto para o


que a própria refeição seja um desconforto, indivíduo. 23, 24, 27, 28, 29, 30
faz parte da paliação. 15, 16, 18, 19, 21, 23 Grande parte da preocupação com a para-
Catéteres para alimentação tem várias da da hidratação vem do medo de sofrimen-
nuances a serem discutidas e sua retirada to, da sensação de sede. Porém sabe-se que
pode ser considerada por alguns como ces- a sede tem pobre relação com a hidratação,
sação dos esforços, como comentado pre- e que a administração parenteral de fluidos
viamente. Deve-se lembrar de, sempre que não alivia a sede. Cuidados com a boca e a
possível, tentar converter para dieta por via umidificação da cavidade oral, de preferência
oral, seguindo estratégias para uma segura com alimentos gelados com sabor (água com
dieta assistida. Em casos em que a dieta não gotas de limão, laranja ou hortelã) ou mesmo
é possível, o uso do cateter para alimentação gelo ou sorvetes, por sua vez tem grande fun-
deve ser repensado, discutido com equipe ção em melhorar o sintoma. 27, 28, 29, 30
multiprofissional e família, tendo em mente A desidratação terminal por sua vez tem
os aspectos relatados. 15, 20, 21, 22, 23, 24, 25 grande benefício em alívio de sintomas con-
Estudo com enfermeiras de cuidado pa- gestivos, sensação de afogamento e do edema.
liativo mostrou que pacientes que cessaram Também tem efeito benéfico por diminuir a
voluntariamente o uso de nutrição enteral e quantidade de fluidos corporais, levando a
oral, tiveram uma melhor qualidade de mor- menos diarreia, micções (que levariam a ne-
te, em sua avaliação subjetiva. No entanto, cessidade de cateterização se retenção ou a
não há estudos randomizados, duplo-cegos sujidade em fraldas), tosse, broncorreia, náu-
que defendam esta evidência. 26 sea e vômitos. 7, 24, 31
Sabe-se que após cessar a administração Um possível benefício de hidratação ar-
de dieta a sobrevida varia bastante, de acordo tificial em pacientes terminais é a melhora
com as comorbidades do paciente. A maioria do delirium e da tontura causados por me-
dos pacientes, na literatura, morreu em uma tabólitos ativos de opioides e outras drogas.
semana, porém sobrevidas de até seis sema- Esta melhora se dá em pacientes com função
nas foram relatadas. Dificilmente a cessação renal preservada e vem com o custo de pos-
da alimentação é a causa da morte, e sim um sivelmente aumentar a quantidade de urina e
passo até ela. O fato de que o paciente não secreções, já citados, levando a efeitos contra
aceita alimentos por via oral, mesmo com -paliativos. Além disto, a hidratação por via
esta estratégia otimizada é um marcador de intravenosa é relacionada a dor pela punção
gravidade e de terminalidade. Sabe-se ainda venosa, com necessidade frequente de troca
que o jejum e sua consequente cetogênese de sítio do acesso e restrição de mobilidade. 7
tem efeito benéfico sedativo/analgésico. 7, 23, 24 Um estudo multicêntrico, randomizado,
Idealmente, o uso de nutrição artificial duplo-cego, em pacientes oncológicos, pu-
deve ser abordado nas diretivas avançadas blicado em 2013, chegou a conclusão de que
do paciente, e sempre respeitadas, se estas não havia diferença significativa em controle
existirem. Se utilizar alimentação através de sintomas e sobrevida entre pacientes que
de catéteres for a vontade do paciente, assim receberam 1000 ml de solução fisiológica
deve ser feito. No entanto, na ausência de di- contra os que receberam 100 ml (placebo),
retivas, devemos abordar os familiares dis- mostrando que não há evidência científica de
cutindo sobre os benefícios e riscos das duas benefício da hidratação em fase terminal. 24
abordagens, oral ou enteral. 7, 15, 23, 24
Com relação a hidratação, a medida que o ALTERAÇÕES METABÓLICAS
indivíduo se aproxima do fim da vida, a von- ASSOCIADAS AO JEJUM
tade de ingerir líquidos diminui assim como O jejum naturalmente pode provocar
a de alimentar-se. Isto pode gerar desconfor- alterações metabólico-hormonais no corpo
to para a família e cuidadores, porém há pou- humano, como a cetose, a hipernatremia

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Capítulo 47 - Alimentação artificial em Cuidados Paliativos

ou hiperosmolaridade, etc, que culminam te porque não há evidência de alta qualidade


com diminuição da taxa metabólica basal. para guiá-las. As diretivas avançadas do in-
Algumas dessas mudanças que ocorrem no divíduo devem sempre ser respeitadas, assim
metabolismo relacionadas ao jejum promo- como as vontades daquele tiver sido indicado
vem uma sensação de bem-estar e reforçam para tomar as decisões, na ausência de direti-
a sensação de anorexia. A cetose associada ao vas. É importante expor as informações exis-
jejum é bastante relacionada com a anorexia. tentes para que a decisão, compartilhada, vise
Porém, no contexto de uma abordagem palia- sempre o bem-estar, conforto e qualidade de
tiva, ressalta-se a relação da β-endorfina, um vida de cada paciente.
opioide endógeno, com a regulação da fome
e com a adaptação fisiológica do organismo REFERÊNCIAS
humano para o jejum. Essa, e possivelmente 1. STILES E. Providing artificial nutrition and
outras substâncias naturais não especificadas hydration in palliative care. Nurs. Stand.
são implicadas com uma analgesia natural 2013. 27(20):35–42.
que ocorre no jejum. 32, 33, 34 2. GOOD P, CAVENAGH J, MATHER M,
Também é descrito na literatura que a sen- RAVENSCROFT P. Medically assisted
sação de conforto e a anorexia associadas ao nutrition for palliative care in adult pa-
jejum podem ser revertidas com pouca oferta tients. Cochrane Database Syst. Rev. 2008.
de carboidratos. Postula-se até que pequenas (4):CD006274.
quantidades de comida são relacionadas à 3. BRODY H, HERMER LD, SCOTT LD,
GRUMBLES LL, KUTAC JE, MCCAM-
importante sensação de fome, ao passo que,
MON SD. Artificial nutrition and hydration:
no jejum, a sensação de fome chega a desapa-
the evolution of ethics, evidence, and policy.
recer. O jejum total também é associado com
J. Gen. Intern. Med. 2011. 26(9):1053–8.
sensação de euforia. 33, 34 4. DELEGGE MH. Alimentação por sonda
Podem ocorrer algumas alterações tam- em pacientes com demência: onde estamos?
bém relacionadas ao jejum como arritmias, Clin Nutr Pract. 2009. 24(2)214-216.
neutropenia, fraqueza muscular, que no con- 5. DEL RÍO MI, SHAND B, BONATI P, PAL-
texto de doenças terminais não podem ser MA A, MALDONADO A, TABOADA P,
consideradas como desfechos desfavoráveis. ET AL. Hydration and nutrition at the end
As mesmas não são correlacionadas com dor of life: a systematic review of emotional
ou outros sintomas estressores. 34 impact, perceptions, and decision-making
A constatação destas alterações, que po- among patients, family, and health care sta-
dem se confundir até com a evolução de pa- ff. Psychooncology. 2012. 21(9):913–21.
cientes em Cuidados Paliativos, se somam 6. CHAI HZ, RADHA KRISHNA LK, WONG
aos tantos outros fatores para serem conside- VHM. Feeding: What It Means to Patients
radas no processo decisório da alimentação and Caregivers and How These Views In-
artificial. fluence Singaporean Chinese Caregivers’
Decisions to Continue Feeding at the End
CONCLUSÃO of Life. Am. J. Hosp. Palliat. Care. 2013.
A alimentação artificial, a cessação da ali- 00(0):1–6.
mentação e hidratação em pacientes idosos 7. 
DANIS M, ARNOLD RM, DIZON DS.
terminais em geral traz grande controvérsia Stopping artificial nutrition and hydration
entre famílias e equipes de cuidado. Além de at the end of life. In: UpToDate, Basow, DS
(Ed), UpToDate, Waltham, MA. 2013.
implicações éticas e legais, aspectos culturais
8. SAMPSON EL, CANDY B, JONES L. En-
de cada região e mesmo individuais devem
teral tube feeding for older people with ad-
ser considerados. Como todas as interven-
vanced dementia. Cochrane Database Syst.
ções em cuidado paliativo, o risco de possí- Rev. 2009. (2):CD007209.
veis malefícios deve ser bastante ponderado 9. MURPHY LM, LIPMAN TO. Percutaneous
frente aos possíveis benefícios, principalmen- endoscopic gastrostomy does not prolong

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Capítulo 47 - Alimentação artificial em Cuidados Paliativos

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Cuidados paliativos em
unidade de terapia intensiva 48
CAPÍTULO

Carla Bezerra Lopes Almeida


Guilherme Liausu Cherpak
Antonio Capone Neto

INTRODUÇÃO corrências potencialmente reversíveis. Entre-


Os Cuidados Paliativos (CP) são inter- tanto, a realidade tem se mostrado diferente.
venções destinadas aos pacientes que estão O envelhecimento da população e o melhor
em situação de terminalidade da vida1,2. controle das enfermidades crônico degene-
Todos os pacientes, independente da idade, rativas têm modificado o perfil dos pacien-
com diagnóstico de uma doença ameaçadora tes admitidos nas UTIs. Por outro lado, pa-
à vida são candidatos aos CP11. A faixa etária cientes agudamente enfermos podem evoluir
dos idosos é a que com maior frequência está com falência de múltiplos órgãos e sistemas e
sujeita a essas intervenções, principalmente se tornarem terminais dentro das UTIs5.
aqueles com diagnóstico de doenças crôni- Dessa forma, o médico intensivista é fre-
cas, tais como demência, neoplasia, cardio- quentemente exposto ao dilema de “prolon-
patia, pneumopatia e nefropatia4. gar X salvar vidas”. Não preparados para essa
Apesar dos avanços tecnológicos e me- questão, os profissionais de saúde muitas ve-
lhorias no diagnóstico, tratamento e prog- zes subestimam o conforto daquele que sofre
nóstico de várias doenças, muitas ainda de uma doença terminal, privando o paciente
permanecem incuráveis e são cronicamente de qualidade de vida5.
progressivas, levando à morte. Grande parte O estudo Support coletou informações de
dessas mortes ocorre dentro de hospitais e, familiares e pacientes idosos gravemente enfer-
em particular, nas unidades de terapia inten- mos e concluiu que 55% dos mesmos estiveram
siva (UTIs)4. conscientes nos três dias antecedentes à morte;
A medicina intensiva destina-se a diag- 40% sofreram dores insuportáveis; 80% fadiga
nosticar, tratar e manter doentes em iminen- extrema e 63% apresentaram extrema dificul-
te risco de vida, porém com doenças ou inter- dade de tolerar o sofrimento físico e emocio-

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Capítulo 48 - Cuidados paliativos em unidade de terapia intensiva

nal6. Mesmo nas UTIs, onde a administração São crescentes na literatura médica as evi-
de fármacos, como analgésicos e sedativos, é dências demonstrando que a incorporação
menos temida, pacientes tem frequentemente do modelo paliativista nas UTIs, em comple-
recordações de dor e sofrimento7. mentação ao tradicional modelo de resgate
O uso de tecnologia médica intervencio- de vida, oferece benefícios significativos aos
nista em pacientes idosos em estado terminal pacientes críticos, suas famílias e equipe as-
necessita ser associado aos Cuidados Paliati- sistente. Salienta-se que estes benefícios não
vos como medida de suporte clínico na tera- são experimentados apenas por pacientes
pia intensiva. Esse recurso auxilia nas deci- terminais e por aqueles com doenças agudas
sões no final da vida e direciona a atenção da que não sobrevivem à UTI, mas também por
equipe de saúde para garantir o conforto do aqueles sobreviventes para os quais nenhuma
paciente e a satisfação da família4. medida de resgate à vida foi limitada15.
Os Cuidados Paliativos são um conjunto O uso de intervenções não farmacoló-
de medidas de intervenção, independente dos gicas, como fisioterapia, fonoaudiologia,
motivos da admissão, que asseguram con- psicologia, técnicas de relaxamento e mu-
forto ao paciente e que podem ser executadas sicoterapia, podem promover bem-estar
simultaneamente às atividades intervencio- enquanto o paciente permanece sob o tra-
nistas e curativas na UTI. Os profissionais que tamento intensivo12. O respeito à autonomia
cuidam de pacientes com determinadas doen- do enfermo e de sua família, estimulando-os
ças de maior gravidade estão cientes de que o a participar das decisões, é também inicia-
prognóstico é ruim, com alto risco de morte e tiva que pode contribuir para minimizar as
difícil recuperação do estado de saúde prévio3. angústias que a terapêutica medicamentosa
A equipe multiprofissional das UTIs deve não é capaz de atingir.
estar preparada para o reconhecimento de Os Cuidados Paliativos podem e devem
quando os cuidados curativos ou restaurati- ser oferecidos concomitantemente aos cuida-
vos irão aumentar o sofrimento do paciente e dos curativos/restaurativos, pois não são ex-
quando deve ser optado pelos Cuidados Pa- cludentes para a prevenção e tratamento do
liativos plenos5. sofrimento de pacientes e seus familiares 13, 14.
É inquestionável que todo e qualquer
tratamento instituído deve seguir os princípios CONTROLE DE SINTOMAS
da autonomia, beneficência, não maleficência Uma das estratégias utilizadas pelo mode-
e justiça5. Considerando o aumento do núme- lo paliativo para obter o alívio de sofrimento
ro de idosos na terapia intensiva, é fundamen- dos pacientes é o controle dos sintomas que
tal melhorar a capacitação do profissional de estes apresentam como consequência direta
saúde para enfrentar os desafios que envolvem das doenças e seus tratamentos5.
a terminalidade da vida4. A abordagem eficaz dos sintomas é im-
De acordo com o consenso sobre fim da portante em todas as fases da doença crítica.
vida em UTI, publicado em 2004, pelas prin- O plano de controle dos sintomas não segue
cipais sociedades de Medicina Intensiva da protocolo pré-definido, mas deve ser baseado
Europa e América do Norte8, estes desafios nas necessidades específicas de cada paciente5.
consistem em evitar os excessos de tratamen- O treinamento adequado da equipe para
tos que prolongam o sofrimento em busca de a abordagem dos sintomas é fundamental.
uma cura inalcançável e adiam a introdução A identificação da presença de sintomas em
de tratamentos que busquem o conforto5. pacientes críticos é um desafio imposto pela
diminuição das capacidades comunicativas
BENEFÍCIOS dos pacientes, seja por alteração do nível de
Os Cuidados Paliativos ampliam o arse- consciência e comprometimento cognitivo,
nal terapêutico para além das tecnologias de seja pela presença de tubos endotraqueais e
cuidados tradicionais da UTI4. traqueostomias.5 Quando os pacientes não

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Capítulo 48 - Cuidados paliativos em unidade de terapia intensiva

podem relatar seus sintomas, os médicos po- xamento). Conjuntamente à abordagem far-
dem subtratar a dor e o sofrimento por causa macológica, a identificação de causas desen-
da dificuldade em identificar comportamen- cadeadoras de dor que possam ser tratadas
tos que indiquem desconforto16. também é essencial. O controle da hiperten-
Os sintomas mais observados em pacien- são intracraniana, drenagem de abscessos,
tes críticos foram fadiga (74,7%), boca seca toracocentese e paracentese de alívio, repo-
(70,8%) e ansiedade (57,9%). A dor esteve pre- sicionamento no leito, estabilização de fratu-
sente em 40,4% e a dispneia em 43,9%. Destes ras, tratamento de monilíase oral e esofágica,
sintomas, boca seca foi o sintoma de maior e de mucosites são exemplos de medidas que
intensidade; no entanto, o sintoma gerador podem ser necessárias para o alívio da dor5.
de maior sofrimento foi dispneia, seguida Em terapia intensiva, os opioides são as
por medo, confusão e dor5. drogas de primeira linha para controle da
dor. Entre os opioides mais utilizados em
Manejo dos sintomas mais UTI destacam-se a morfina, o fentanil e a
prevalentes em pacientes críticos metadona5. Outras classes de drogas podem
O controle dos sintomas em Cuidados ser utilizadas como coadjuvantes no trata-
Paliativos será abordado em capítulos espe- mento com opioides ou mesmo como dro-
cíficos. Esta seção tem como objetivo dar um ga principal no tratamento da dor como os
visão geral sobre os principais sintomas ob- agonistas alfa-2-adrenérgicos, a cetamina e
servados no ambiente de terapia intensiva e corticoides16,17.
sua abordagem.
Dispneia
Dor Dispneia é definida como um sintoma
Dor na UTI é muitas vezes relacionada subjetivo de alteração da respiração ou de
a causas iatrogênicas, procedimentos e in- respiração desconfortável16. O desconforto
tervenções. Procedimentos moderadamen- respiratório, ao contrário da subjetividade
te ou severamente desconfortáveis que são da dispneia, é avaliado pela equipe de saúde
comumente realizados na UTI incluem as- através de dados objetivos, como a presença
piração, mudança de decúbito, inserção do de hipoxemia, taquipneia, fala entrecortada
cateter, tratamento de feridas e a presença e uso de musculatura acessória 5. Achados
de tubos endotraqueais16. Em pacientes crí- comportamentais de desconforto respira-
ticos, umas das grandes dificuldades impos- tório em pacientes em ventilação mecâni-
tas à avaliação da dor é a limitação das capa- ca são, em ordem decrescente de frequên-
cidades comunicativas dos pacientes. Como cia: taquipneia e taquicardia, expressão de
alternativa, dados indiretos da presença da medo, uso da musculatura acessória, respi-
dor podem ser utilizados na tentativa de ração paradoxal diafragmática e batimento
identificação deste sintoma, tais como agi- de asa do nariz16.
tação, padrão de movimentos corporais, Em pacientes que estão em ventilação es-
presença de tensão muscular, face de dor, pontânea a introdução de suporte ventilatório,
taquicardia, hipertensão, sudorese e assin- invasivo e não invasivo, para o tratamento da
cronia com o ventilador5. causa de exarcebação da dispneia pode ser
A abordagem de outras formas de sofri- considerada desde que o benefício potencial
mento que contribuem para a dor, tais como destas modalidades seja realmente esperado.
o medo e ansiedade, por exemplo, pode ser Esta é uma análise que depende de um pro-
parte integrante do plano de cuidados a ser cesso de tomada de decisão que leva em con-
desenvolvido pela equipe, sendo que este ta múltiplos fatores, tais como prognóstico
plano pode envolver tanto medidas farma- (estágio da doença, grau de funcionalidade),
cológicas como não farmacológicas (apoio desejos prévios do paciente, entendimento e
psicológico, apoio religioso, técnicas de rela- aceitação prognóstica por parte da família e

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Capítulo 48 - Cuidados paliativos em unidade de terapia intensiva

equipe. Cabe lembrar que o suporte ventilató- otimizados antes que sedativos sejam utiliza-
rio não é abordagem de alívio de sintomas em dos16. Deve-se lembrar que retenção urinária
si. Ao contrário de ser fonte de conforto, a sua e fecal podem ser causa de delirium, deven-
introdução geralmente vai exigir ajustes de se- do ser tratadas. A remoção de contenções,
dação e analgesia para garantir boa adaptação preservação do sono, redução do ruído e da
do paciente a este suporte. O suporte ventila- iluminação e presença de um membro da fa-
tório é medida de suporte orgânico e não de mília são estratégias que podem reduzir os
controle de sintomas5. efeitos negativos do delirium e minimizar a
A abordagem farmacológica da dispneia necessidade de sedação16.
baseia-se no uso de opioides17. As drogas mais Neurolépticos, tais como o haloperidol,
comumente utilizadas em UTI para esse fim risperidona e quetiapina, são eficazes na re-
são a morfina e o fentanil, podendo também dução de agitação induzida pelo delirium.
ser administrada a metadona5. Embora a sedação seja uma marca do tra-
A melhor abordagem é individualizar o tamento para a agitação no delirium, sendo
tratamento com base na causa da dispneia, o muitas vezes necessária, no fim da vida, a sua
nível de consciência do paciente e as neces- utilização priva o paciente e sua família de
sidades dos mesmos. Algumas abordagens possíveis interações significativas antes da
tratam o sintoma diretamente e, assim, pro- morte, por isso deve ser utilizada como últi-
longam a vida. Estes incluem, por exemplo, mo recurso16.
suplementação de oxigênio, corticosteroides, A ausência de controle do quadro, a des-
diuréticos, e broncodilatadores. Outras abor- peito das medidas farmacológicas e não far-
dagens, como a administração de opioides, macológicas apropriadas, pode indicar a ne-
também causam conforto, mas podem di- cessidade de sedação paliativa5.
minuir o nível de consciência. Os médicos
devem atuar em conjunto com os pacientes Boca seca
e as famílias para determinar a melhor abor- A literatura tem apontado boca seca como
dagem, ou a combinação de abordagens, para queixa frequente e causadora de sofrimento
cada paciente de forma individual16. significativo em pacientes críticos. Desidra-
tação, respiração com a boca aberta ou ma-
Delirium nutenção da boca semiaberta devido à pre-
O delirium é uma das condições mais pre- sença de tubo endotraqueal, uso de máscara
valentes tanto em pacientes críticos quanto de ventilação não invasiva e uso de medica-
em pacientes próximos da morte. Costuma ser ções que tenham efeito anticolinérgico, como
evento agudo, caracterizado por flutuações do hioscina, morfina, amitriptilina e diuréticos,
nível de consciência e perda da atenção5. são exemplos de fatores que contribuem para
É uma condição relativamente comum o aparecimento deste sintoma5.
em pacientes internados em UTI, sobretudo A reavaliação da necessidade de manu-
em idosos, como consequência de determina- tenção de medicações que tenham efeito
da condição médica, intoxicação ou retirada anticolinérgico, a hidratação dos lábios com
de sedativos, uso de medicações, hipoxemia, agentes umectantes, cuidados com a higiene
distúrbios metabólicos, sepse, desidratação oral, introdução de saliva artificial, oferta
ou, mais frequentemente, por uma combi- de líquidos em pequenos goles e gelados, em
nação desses fatores. Pode requerer o uso de forma de gelo ou sorvetes (quando possível e
anti-psicóticos e sedativos, até restrições físi- tolerado), são abordagens sugeridas pela lite-
cas para promover a segurança do paciente e ratura para controle desse sintoma5.
evitar a sua auto-mutilação5,16.
Sintomas angustiantes, tais como dor ou Sintomas de difícil controle
dispneia, podem contribuir para o delirium, Apesar dos esforços da equipe, alguns
e a analgesia e outros tratamentos devem ser sintomas serão refratários ao tratamento.

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Capítulo 48 - Cuidados paliativos em unidade de terapia intensiva

De acordo com a literatura, as situações que de cuidar, e sim cuidar intensivamente, com
mais comumente indicam o início de seda- um foco diferenciado. Estes mitos também
ção paliativa são: dor incontrolável, dispneia confundem a integração do cuidado paliati-
refratária e delirium agitado. Menos frequen- vo com o cuidado curativo intensivo. A cren-
temente, é também indicada no tratamento ça de que se deve optar entre investimento
paliativo de vômitos incoercíveis, tosse refra- total ou não-investimento é uma falácia, pois
tária e urgências como hemorragias maciças, ambos não são autoexcludentes. Os cuida-
asfixias e convulsões refratárias5. dos curativo e paliativo caminham paralela-
Nestas situações, quando os sintomas re- mente, complementando-se. À medida que o
fratários forem fonte de grande sofrimento cuidado curativo intensivo falha e mostra-se
físico ou mesmo existencial para o paciente, fútil, gradualmente muda-se o enfoque do
a equipe deve considerar a sedação paliativa, cuidado para a paliação.4,18,20,21
temporária ou definitiva, como medida de Para que seja oferecido adequado cui-
conforto5. dado paliativo de forma complementar ou
exclusiva, torna-se necessária a presença de
DESAFIOS PARA A IMPLANTAÇÃO profissionais com experiência neste cuidado,
Os conhecimentos atuais acerca dos porém estes raramente são vistos nas UTI.
Cuidados Paliativos reforçam a necessida- O paliativista tem habilidades em manejo
de de sua implantação e inclusão no plano de sintomas e contato com a família que por
de cuidados em todas as etapas do contato vezes faltam aos intensivistas. Tem também
com o serviço de saúde, desde o ambulató- uma ótica diferenciada com relação ao pa-
rio, passando pelo pronto-socorro e enfer- ciente, mais focada neste, de forma integral,
maria, até a UTI. Percebe-se, no entanto, e não na doença.3,4,20,21,22
que nas UTIs atualmente pratica-se muito A comunicação entre a equipe de saúde e a
pouco esta abordagem. As dificuldades para família dos pacientes em ambientes de terapia
a implantação relacionam-se ao paciente e intensiva é fundamental para o modo como a
sua família, à comunicação com a equipe, ao família interpreta o quadro clínico, lida com a
próprio ambiente da UTI, a atual integração situação e desenvolve a relação com a equipe.
com o cuidado curativo e à gestão do servi- O ambiente de UTI comumente causa aflição
ço de saúde. 4,18,19,21,22,23 na família por impor distância do paciente e
O primeiro grande empecilho é a identifi- restrição do contato com o médico assisten-
cação de quais são os pacientes candidatos ao te, tanto em tempo quanto em relação médi-
cuidado paliativo. Faltam protocolos que fa- co-paciente. O momento do contato com os
cilitem esta identificação. O desconhecimen- familiares deve ser adequadamente valoriza-
to da equipe de saúde acerca das indicações do pela equipe de saúde, pois é fundamental
de paliação leva a obstinações terapêuticas e para o bom suporte à família, de forma a tran-
dificultam a implantação de medidas de con- quilizar, dar apoio e passar informações que
forto. Com a medicalização da morte, grande nem sempre são agradáveis. No entanto, essa
parte dos leitos de UTI no Brasil e no mundo comunicação vem sendo prejudicada pela ina-
é ocupada por pacientes que não tem prog- bilidade de médicos em comunicar más no-
nóstico que justifique a sua admissão.4,19,21 tícias e por expectativas irreais e percepções
Grandes mitos relacionados à paliação alteradas dos familiares com relação à doença
também emperram a aplicabilidade. As dis- e tratamento. Falta aos médicos o treinamento
torcidas percepções da equipe e da população para manter uma conversação mais próxima
em geral sobre morte, fim da vida e ortota- com os parentes do paciente, assim como ga-
násia dificultam a abordagem de cuidado pa- rantir a uniformidade do discurso da equipe
liativo. Deve ficar claro tanto para a família multiprofissional.4,18,19,20,21,22,23
e paciente quanto para a própria equipe de O próprio ambiente de terapia intensiva
saúde que paliar não é abandonar nem deixar prejudica o entendimento e a aplicabilidade

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Capítulo 48 - Cuidados paliativos em unidade de terapia intensiva

de Cuidados Paliativos. A UTI é um ambien- de futilidade de medidas. Deve-se fortalecer


te em geral desprovido de privacidade, com também a prática da elaboração, ainda que
muitos ruídos e interrupções. Carregado de em nível ambulatorial, de diretivas avança-
tecnologia, dificulta o entendimento da futi- das, como forma de evitar distanásias.21,22
lidade das medidas, pois por muitos anos foi Quebrar tabus também é importante.
regida pela filosofia de “salvar a todo custo”. É Medidas de educação populacional são vá-
também um lugar pouco receptivo à família, lidas para definir as diferenças entre euta-
não sendo permitida a permanência de acom- násia, distanásia e ortotanásia. Esta medida
panhantes na maioria dos hospitais, faltando também pode ser tomada no ambulatório,
um espaço privado para a comunicação entre quando do diagnóstico de doença crônica
equipe e família. O ambiente então promove incurável, mostrar gradualmente para o pa-
uma morte solitária, despida, com paraferná- ciente que a morte faz parte da vida, além
lia tecnológica fútil ao redor. 4,19,20,22,23 de que nem sempre será um inimigo a ser
Outro paradigma é o de gestão, pois ges- vencido. Devem ser tomadas medidas popu-
tores menos instruídos podem interpretar a lacionais de definição e exposição das vanta-
implantação de cuidado paliativo como au- gens do cuidado paliativo. O mito de que o
mento do custo, por necessitar de mudanças cuidado paliativo exclui o cuidado curativo
estruturais e de equipe (com necessidade de também precisa ser combatido. Deve ser bem
funcionários especializados). No entanto, os definido que são medidas complementares e
estudos mostram que a implantação de cui- intercambiáveis. Estas medidas são difíceis
dado paliativo tende a reduzir os custos de de aplicar, pois entram em méritos culturais,
saúde, à medida que poupa recursos finan- no entanto, se forem gradualmente aplicadas,
ceiros com a racionalização de exames e in- vislumbra-se um futuro do cuidado paliativo
tervenções, evitando futilidade.4 mais factível e aceito pela população.19,20,22,23
Os desafios são grandes e muitos. De- A equipe de saúde da UTI deve incluir
mandam uma mudança estrutural radical alguém com expertise em paliativismo. Esta
das UTIs, com o objetivo de torná-las mais medida pode facilitar a implantação, além de
humanas e dignas para o paciente. Isso sig- servir como foco multiplicador do conheci-
nifica que há muito a ser feito. Estratégias mento. Pesquisas de custo-efetividade desta
de mudança devem ser elaboradas para que medida, assim como das outras que implan-
a aplicação do paliativismo em ambientes de tam o cuidado paliativo em UTI mostram a
terapia intensiva seja possível. eficácia em reduzir custos, uma vez que eco-
nomiza procedimentos desnecessários.20,21,23
ESTRATÉGIAS PARA A IMPLANTAÇÃO Para intervir na comunicação é essencial
Grandes são os desafios à implantação de o melhor treinamento das equipes no trato
Cuidados Paliativos numa unidade de tera- com as famílias assim como melhorar a co-
pia intensiva. A elaboração de estratégias que municação intraequipe. Uma equipe que fala
visem superá-los envolve reestruturações em uníssono favorece a fidelização da família.
importantes e radicais por muitas vezes. Afe- Visitas regulares familiares, de preferência
tam tanto a infraestrutura física, de pessoal com o mesmo profissional e o mesmo fami-
até uma promoção de educação dentro da liar como porta-vozes de ambas as partes. O
comunidade. Isto inclui alterações até a nível porta-voz da equipe deve preocupar-se com
ambulatorial.4,20,21,22,23 sua linguagem verbal e não verbal, atento para
Para promover uma melhor identificação usar uma linguagem compreensível por lei-
dos pacientes que tem indicação de cuidado gos, demonstrar empatia, assim como passar
paliativo podem ser desenvolvidos protoco- segurança com sua atitude corporal e gestos.
los institucionais, definindo algumas carac- É importante frisar que não significa frieza, e
terísticas de terminalidade, como forma de sim promover o toque e reagir de acordo com
sensibilizar a equipe para o discernimento as emoções da família.18,19,21,22,23

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Capítulo 48 - Cuidados paliativos em unidade de terapia intensiva

Objetivando evitar a criação de expecta- ca pela perspectiva de aumento da sobrevida


tivas irreais por parte da família, é cabível, ou qualidade de vida24,25.
quando da internação do paciente na UTI, A retirada do paciente do ambiente de
traçar junto às famílias os objetivos da inter- terapia intensiva também é uma opção pos-
nação. Além de promover maior sensação de sível, uma vez que tenha sido definida a sus-
segurança, facilita a percepção dos parentes pensão de cuidados extraordinários para o
de que as medidas curativas passam a não paciente e objetive-se um melhor conforto e
surtir efeito e aceitar melhor a mudança do proximidade com a família25.
foco do tratamento para a paliação.20,23
O ambiente da UTI também precisa ser TERAPIA FÚTIL OU POTENCIALMENTE
adaptado para situações de paliação, tanto INAPROPRIADA
para promover o conforto do paciente como O termo “fútil” refere-se a tratamentos
da família. Para o paciente que tem defini- que não podem cumprir os objetivos médi-
do o foco paliativo do tratamento, deve-se cos do paciente. Estes são definidos por meio
criar mecanismos para que possa ter mais de discussões cuidadosas entre o médico e o
privacidade e ser menos perturbado por ro- paciente e/ou os seus representantes. Os mé-
tinas de UTI. É válido também considerar a dicos não devem rotular intervenções como
presença fixa de um acompanhante ou en- fúteis, simplesmente porque eles acreditam
tão permitir visitas mais frequentes, dimi- que o tratamento não é rentável ou pensam
nuindo a solidão, no momento que o indi- que os benefícios potenciais são muito im-
víduo mais necessita de apoio e amparo, no prováveis ou muito pequenos para compen-
momento de sua vida em que está mais fra- sar os encargos financeiros26.
gilizado e com medo. Para estes pacientes é O termo “potencialmente inapropriado”
recomendável reduzir o aparato tecnológico refere-se a tratamentos que poderiam ser
que o cerca, quando possível. Estes apare- empregáveis, mas, na opinião dos médicos,
lhos geram ansiedade e são fontes de ruído. não devem ser realizados devido a conside-
Para conforto e privacidade dos familiares, rações éticas. Estes incluem tratamentos que
podem-se desenvolver salas de conferência, são extremamente improváveis para atingir
nas quais seria possível realizar as conversas os objetivos do paciente, representam uma
com os parentes.19,20,21,23 alocação injusta de recursos escassos, ou tra-
tamentos destinados a alcançar um objetivo
Admissão em UTI que é contrário ao que o médico acredita que
A admissão do paciente geriátrico em seria apropriado. Portanto, as decisões sobre
UTI é uma medida que deve levar mais fa- as intervenções potencialmente inapropria-
tores em conta do que a admissão de um pa- das requerem julgamentos complexos, consi-
ciente adulto jovem. Os critérios de indicação derando concepções diversas e pessoais dos
de UTI (instabilidade clínica, necessidade de médicos, dos pacientes e dos representantes,
monitoramento intensivo ou suporte intensi- que dão significado à vida26.
vo à vida) ganham nova perspectiva quando Em geral, quando um médico julga uma
se põe o prognóstico e o custo de se isolar da solicitação de um tratamento considerado
família. A internação em UTI traz a necessi- ser fútil ou potencialmente inapropriado,
dade de seguir as regras da unidade, onde ge- o paciente e seus representantes devem ser
ralmente não é permitida a presença de fami- envolvidos em discussões quanto à funda-
liares e não é possível fornecer um ambiente mentação, os objetivos e a finalidade do tra-
calmo e confortável ao paciente. Levando tamento solicitado. Essas situações muitas
estes aspectos em consideração, a decisão de vezes surgem devido à má comunicação em
internar um paciente em Cuidados Paliativos relação ao prognóstico e a meta terapêutica
em UTI torna-se ainda mais relativa, pois o entre a equipe de saúde envolvida e o pacien-
custo emocional, social e físico, não se justifi- te e/ou os seus representantes. Menos comu-

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Capítulo 48 - Cuidados paliativos em unidade de terapia intensiva

mente, podem surgir tais pedidos por causa para o prolongamento da vida, o alí-
de divergências entre os médicos, o paciente vio da dor e do sofrimento, para a pre-
e/ou seus substitutos sobre quais as metas de venção de dependência prolongada de
atendimento devem ser atendidas em função suporte de vida, e/ou garantia de uma
de uma situação médica grave26. morte pacífica.
Os Cuidados Paliativos são uma especia- • Discussão de opções de tratamentos
lidade médica interdisciplinar que se con- medicamente razoáveis ​​disponíveis
centra na prevenção e alívio do sofrimento e para alcançar as metas de atendimen-
no apoio a melhor qualidade de vida possível to, incluindo uma avaliação dos riscos
para os pacientes que estão enfrentando uma e benefícios de cada tratamento. Esta
doença grave com risco de morte, e suas fa- pode ser uma discussão difícil, dado
mílias. Além do gerenciamento de sintoma, que os médicos e os pacientes (ou seus
outros objetivos principais de suporte palia- representantes), ocasionalmente dis-
tivo abrangente incluem o estabelecimento cordam sobre se os riscos de danos su-
de metas de atendimento que estão em sinto- peram as chances de benefício. Duran-
nia com os valores e preferências do paciente, te essas discussões, intervenções fúteis
comunicação consistente e sustentada entre não devem ser oferecidas.
o paciente e todos os envolvidos em seu cui-
dado; psicossocial, espiritual, e apoio práti- Quando toda essa abordagem não leva
co, tanto para os pacientes e seus cuidadores a um consenso ou se há alguma incerteza
familiares e coordenação entre os locais de sobre se é ou não um tratamento fútil (ex-
atendimento26. presso por qualquer membro da equipe de
Aspectos importantes que devem ser tratamento), os médicos devem procurar
abordados junto ao paciente, seus familiares uma segunda opinião de um profissional de
e a equipe de saúde: 26 saúde qualificado e independente. Se o con-
• Delimitação cuidadosa da situação mé- flito não pode ser resolvido, apesar disso,
dica do paciente e seu prognóstico. um processo formal de resolução de confli-
• Os médicos devem se comunicar usan- tos deve ser iniciado26.
do uma linguagem culturalmente sen- Proporcionar terapia fútil vai contra a
sível esforçando-se para evitar a termi- obrigação ética de médicos para atuarem em
nologia médica, o que pode garantir benefício de seus pacientes e de se absterem
uma discussão facilmente compreendi- de prejudicá-los. Os médicos têm um interes-
da por todas as partes envolvidas. se legítimo em proteger a integridade de sua
• Discussão das preferências de trata- profissão e de sua confiabilidade, o que seria
mento pelo paciente, seus valores rela- prejudicada se as intervenções clínicas admi-
cionados com a saúde, e seus interes- nistradas não puderem beneficiar o paciente26.
ses. A vontade do paciente deve ditar o Os médicos não devem simplesmente
atendimento prestado em situação de concordar com pedidos de tratamentos que
cuidados intensivos. Quando os pacien- eles acreditam violarem a boa prática médica
tes não comunicarem diretrizes claras por causar danos ao paciente e levar a uma
sobre as preferências de tratamento, os alocação injusta de recursos médicos escas-
médicos devem facilitar um processo sos. Alternativamente, os médicos devem
no qual os representantes façam julga- evitar tomar decisões unilaterais de recu-
mentos sobre qual via de tratamento é sar o tratamento solicitado, mesmo que eles
mais consistente com os valores e inte- acreditem que é impróprio. Pode haver in-
resses do paciente. certezas sobre o que é legítimo no tratamen-
• Determinação dos objetivos do trata- to considerado adequado, principalmente em
mento e os cuidados com o paciente e/ pacientes que estão perto do fim da vida, e os
ou os seus representantes. Isto pode ser médicos sozinhos podem não estar bem po-

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Capítulo 48 - Cuidados paliativos em unidade de terapia intensiva

2. BURLÁ C. Paliação: cuidados ao fim da


sicionados para fazer tais julgamentos. Além vida. In: Freitas EV, Py L, Cançado FA, Doll
disso, a identificação de indivíduos com uma J, Gorzoni ML, organizadores. Tratado de
doença terminal que estão ativamente mor- geriatria e gerontologia. 2ª ed. Rio de Janei-
rendo nem sempre é simples26. ro: Guanabara Koogan. 2006. p.1079-88.
3. GHERARDI C, CHAVES M, CAPDEVILA
CONCLUSÃO A, TAVELLA M, SARQUIS S, IRRAZA-
O aumento da população geriátrica no BAL C. La muerte en un servicio de terapia
Brasil e no mundo faz com que haja também intensiva: influencia de la abstencion y re-
um aumento do número de pacientes idosos tiro del soporte vital. Medicina (B. Aires).
em UTIs. Vários destes pacientes são can- 006;66(3):237-41.
didatos ao cuidado paliativo, no entanto, a 4. FONSECA AC, MENDES JUNIOR WV,
cultura de que a paliação e intensivismo são FONSECA MJM. Cuidados paliativos para
excludentes dificulta sua aplicabilidade.4,18 idosos na unidade de terapia intensiva: Re-
Os benefícios de uma maior penetração visão sistemática. Rev Bras Ter Intensiva.
das práticas paliativistas num ambiente de 2012. 24(2):197-206.
UTI se refletem tanto para os pacientes como 5. MORITZ, RD. Cuidados Paliativos nas
para as famílias. Existe benefício inclusive Unidades de Terapia Intensiva. 1ª. Ed. São
para aqueles pacientes que não necessaria- Paulo: Editora Atheneu. 2012. p.1.
mente estão em fase de terminalidade da 6. SIQUEIRA JE. Defenindo e aceitando a
doença. Cuidado paliativo e curativo cami- terminalidade da vida. In Motriz RD (Câ-
mara Técnica sobre Terminalidade da Vida
nham paralelamente.12,13,14,15
e Cuidados Paliativos do Conselho Federal
Implantar técnicas de cuidado paliativo
de Medicina). Conflitos bioéticos do viver
significa manejar melhor sintomas que cau-
e do morrer da morte. Brasilia. CFM. 2011.
sam desconforto aos pacientes, e assim dimi- p.15-24.
nuir o estresse relacionado com a internação 7. PUNTILLO KA; ARAI S RN; COHEN NH;
em ambiente de medicina intensiva. Sintomas ET AL. Symptoms experienced by intensive
prevalentes nestas unidades, como dispneia, care unit patients at high risk of dying. Crit
dor, boca seca e delirium são vistos sob uma Care Med. 2010. 38(11):2155-2160.
nova ótica se o paliativismo é valorizado.5,16 8. CARLET J, THIJS LG, ANTONELLI M,
Tornar realidade uma UTI com vi- CASSEL J, COX P,HILL N, HINDS C, PI-
são paliativista não é fácil. A cultura do MENTEL JM, REINHART K, THOMP-
paciente, da família e da equipe, assim como SON BT. Challenges in end-of-life care in
a comunicação entre estes podem dificultar the ICU. Statement of the 5th Internatio-
a implantação. O ambiente também impõe nal Consensus Conference in critical care:
dificuldades, além dos paradigmas atuais de Brussels, Belgium. April 2003. Intensive
gestão hospitalar.19,21,22,23 Care Med. 30:770-784.
É necessário o desenvolvimento de téc- 9. WRIGHT M, WOOD J, LYNCH T ET AL.
nicas, o empenho de gestores e equipes de Mapping levels of palliative care develo-
saúde para aplicar o cuidado paliativo nas pment: Associação Latino Americana de
unidades de terapia intensiva visando um Cuidados Paliativos. Circular Nº 32. 2007.
cuidado ao paciente otimizado, assim como Disponível em: http://cuidadospaliativos.
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Capítulo 48 - Cuidados paliativos em unidade de terapia intensiva

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2008. 178:269-275. intensive care unit: Responding to re-
19. MORITZ RD, LAGO PM, SOUZA RP, ET quests for futile or potentially inappro-
AL. Terminalidade e Cuidados Paliativos priate therapies. In: Up To Date, Basow,
na unidade de terapia intensive. Rev Bras DS (Ed), UpToDate, Waltham, MA. 2013.

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Cuidados paliativos
na sala de emergência 49
CAPÍTULO

Juliana Marília Berretta


Lara Miguel Quirino Araújo

O Brasil vem passando no último século uma situação de Cuidados Paliativos e insta-
por uma importante mudança na sua pirâ- lar um plano de ação adequado, consideran-
mide etária, com crescimento progressivo do o bem-estar físico, psíquico e espiritual do
da população idosa. A consequência é um paciente e seus familiares.
aumento da prevalência de doenças crônico
degenerativas como insuficiência cardíaca, ABORDAGEM INICIAL
doença pulmonar obstrutiva crônica, insufi- A abordagem inicial do paciente idoso no
ciência renal, neoplasias, síndromes demen- serviço de emergência tem particularidades
ciais e quadros sequelares. Esse panorama que não se restringem à investigação da sua
populacional e de morbidade traz consigo queixa principal, mas avançam na identifica-
complicações próprias que podem ser soma- ção da necessidade de Cuidados Paliativos e
dos a eventos agudos usuais, apresentando avaliação de prognóstico (sobrevida). A pre-
um novo perfil de paciente ao pronto-socor- sença de familiares e cuidadores se faz neces-
ro: o idoso, com critérios de paliação, com sária na maioria das vezes, como uma impor-
uma emergência clínica ou cirúrgica. tante fonte de informações. A relação médi-
Dados do Datasus revelam que nos últi- co-“paciente/família” começa no momento
mos 20 anos, a porcentagem de indivíduos do primeiro contato e um vínculo deve ser
com 60 anos ou mais que foram internados estabelecido, mesmo no ambiente pouco favo-
passou de 16 para 23%1, sendo que, na maio- rável da unidade de emergência. A percepção
ria das vezes, o pronto-socorro é a porta de do paciente e seus familiares sobre seu estado
entrada destes pacientes no hospital. Um le- de saúde e seus desejos em relação a medidas
vantamento sobre idosos falecidos mostrou terapêuticas e intervenções devem ser ques-
que 75% procuraram uma unidade de emer- tionados em momento oportuno, da mesma
gência nos últimos seis meses de vida, 51% no forma que a informação sobre quem são os
último mês de vida e visitas repetidas foram médicos que assistem ao paciente e o desejo
frequentes2. Assim, o médico emergencista e possibilidade de se fazer contato com esse
passa a ter um novo desafio, que não se limita médico responsável pelos cuidados habituais.
aos conhecimentos técnicos sobre o quadro A condição clínica aguda que motivou a
clínico agudo, mas se estende em reconhecer ida do paciente à unidade de emergência pode

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Capítulo 49 - Cuidados paliativos na sala de emergência

ser diretamente relacionada à sua doença de indicadores de reservas fisiológicas e do es-


base ou a outra condição clínica. Os princi- tágio mórbido em que o paciente se encon-
pais motivos que levam um idoso ao pronto- tra, sendo capaz de responder às seguintes
socorro são: doenças cardíacas, neoplasias, questões3:
acidente vascular cerebral e doenças pulmo-
nares.3 No caso das neoplasias, as principais • Qual é a emergência médica e se ela é
situações de emergência incluem: compres- potencialmente reversível?
são medular, síndrome da veia cava superior, • Qual é a extensão de sua doença de base
hipercalcemia, obstrução intestinal, dispneia e seu prognóstico?
ou falência respiratória, delirium. Em relação • Qual é o perfil funcional recente do pa-
à sintomatologia, os principais sintomas são: ciente e qual será o seu provável estado
agitação/confusão, ansiedade, constipação, funcional após o tratamento oferecido
diarreia, náuseas e vômitos, dor, prurido, es- no pronto-socorro?
tomatites e secreções orais.3,4 (Ao longo deste • Quais são os riscos do tratamento ofe-
manual foram estabelecidas as diretrizes de- recido?
talhadas do manejo destas situações.). • Quais são os desejos do paciente e seus
A conduta imediata e o plano de cuida- familiares quando informados sobre os
dos, paliativos ou curativos, dependem da riscos e benefícios do plano terapêutico?
condição física e cognitiva usual do pacien-
te. Portanto, procura-se saber seu estado IDENTIFICAÇÃO DE CUIDADOS
cognitivo usual, funcionalidade (sua inde- PALIATIVOS
pendência no desempenho das atividades A multimorbidade confere uma particu-
da vida diária), autonomia, interação com laridade ao atendimento do idoso na sala de
o meio em que vive, presença de comorbi- emergência, retratada por um quadro clínico
dades e medicações de uso habitual. O exa- multifatorial no qual síndromes geriátricas
me físico inicial deve contemplar seu estado se somam a descompensações de suas doen-
nutricional, presença de úlceras de pressão, ças de base. Com isso, temos cenários e con-
contraturas musculares, uso de dispositivos dutas diversas do habitualmente encontrado
de nutrição (sondas enterais, gastrostomia), em pacientes de outras faixas etárias. A ca-
sinais de incontinência, mobilidade e nível pacidade de mudar o paradigma existente de
de consciência. (Quadro 49.1) tratamento para doença crônica é uma opor-
Espera-se que ao final da avaliação, o tunidade para a medicina paliativa, especifi-
emergencista seja capaz de reconhecer os camente no serviço de emergência3.

Quadro 49.1 - Abordagem inicial do idoso na Sala de Emergência

Abordagem Inicial do Idoso


na Sala de Emergência

Funcionalidade usual Cognição usual Indicadores de baixa reserva

•D
 iagnóstico da •É
 acamado? Há quanto • T em problema de •E
 stado nutricional
descompensação aguda, tempo? memória? •Ú
 lceras de pressão
comorbidades, medicações •P
 recisa de ajuda para •C  onversa com clareza sobre •U
 so de sonda enteral ou
em uso comer e tomar banho? algum assunto? gastrostomia
•G  eralmente sabe a data e •U
 so de fralda
onde está? •M
 últiplas contraturas
•R  econhece pessoas musculares
próximas? •M
 obilidade

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Capítulo 49 - Cuidados paliativos na sala de emergência

Conhecer o perfil da evolução dos grupos Insuficiência Cardíaca Congestiva e Doença


de doenças e principalmente o momento em Pulmonar Obstrutiva Crônica, cursam com
que o paciente se encontra, ajuda o emergen- perda funcional gradativa e progressiva ao
cista nas suas decisões no pronto-socorro. longo do tempo, assim como aquelas doenças
No entanto, não existe consenso em relação a que já têm em seu diagnóstico a presença da
essa evolução funcional do paciente de acor- perda de capacidade funcional e fragilidade,
do com sua condição clínica de base. como as Demências.
Na Figura 49.1, temos um modelo da tra- Outro modelo sugere que a demência seja
jetória da funcionalidade dos pacientes até a única doença que tem um padrão de inca-
a morte nos principais grupos de doenças5. pacidade persistente e intenso. Neste modelo,
Neste modelo, algumas condições cursam os pacientes com as outras condições, como o
com a morte súbita, como Infarto Agudo do câncer, doenças com falência orgânica e sín-
Miocárdio fulminante e Acidente Vascular drome de fragilidade, distribuem-se de forma
Cerebral, sem perda funcional prévia. Nas imprevisível em diferentes perfis de trajetória
doenças ditas “terminais”, como um câncer da incapacidade funcional, indo desde sem ne-
agressivo, o paciente vem relativamente bem nhuma incapacidade, passando por pacientes
até iniciar um breve período de tempo (ge- em processo acelerado de perda de capacidade,
ralmente nos últimos 6 meses de vida) com outros com rápida catastrófica perda de capa-
intensa e rápida perda funcional. As doen- cidade, outros com progressiva e outros com
ças que cursam com falência orgânica, como perda persistente da capacidade funcional.6

Quadro 49.1 - Trajetórias propostas para a morte (Referência 6)

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Capítulo 49 - Cuidados paliativos na sala de emergência

O Center of Advance Palliative Care elabo- A escala Palliative Performance Scale


rou um painel de critérios para auxiliar o mé- (PPS)10 permite estimar a sobrevida do pa-
dico a identificar pacientes com alta probabi- ciente em aproximadamente um ano. São
lidade de indicação de Cuidados Paliativos7,8. considerados cinco domínios que se relacio-
nam entre si na determinação do prognós-
Quadro 49.2 - Critérios para sugerir a necessidade tico: deambulação, atividade e evidência de
de Cuidados Paliativos na abordagem inicial do doença, autocuidado, aceitação da dieta e
paciente nível de consciência. Os critérios devem ser
A. Condição potencial de limitação ou risco de vida avaliados de cima para baixo e da esquerda
Doença limitante ou com alta taxa de mortalidade:
para a direita, considerando sempre a melhor
demência, falência renal crônica, câncer metastático, desempenho (“performance”) do paciente
cirrose ou sepse, falência de múltiplos órgãos, trauma em cada um.
grave.

B. Critérios primários COMUNICAÇÃO


1) Questão surpresa: Você não se surpreenderia se este Infelizmente, um cenário comum no
paciente morresse em 12 meses? Brasil é a abordagem de Cuidados Paliativos
2) Intercorrências: Mais do que uma visita à emergência pela primeira vez com o paciente e seus fa-
ou internação hospitalar pelo mesmo motivo nos
últimos meses? miliares no pronto-socorro. Mas mesmo em
3) Dificuldade de controle de sintomas: Intensidade de outros países, as múltiplas visitas ao hospi-
moderada a severa de sintomas físicos e psicológicos? tal fazem com que o paciente, no seu último
4) Requisição de cuidados: Dependência funcional/ ano de vida, veja o emergencista com maior
suporte domiciliar complexo como ventilação e
antibióticos? frequência do que seu médico da atenção
5) Declínio funcional: Intolerância à alimentação ou primária3 e a maioria das decisões de não
perda de peso não intencional? executar reanimação cardiopulmonar é es-
C. Critérios secundários tabelecida após múltiplas discussões den-
tro do hospital. Apenas 11% dos pacientes
1) Admissão em instituição de longa permanência.
se apresentaram na unidade de emergência
2) Idoso com dano cognitivo com fratura de quadril.
3) Câncer metastático ou localmente avançado incurável.
com essa decisão documentada e surpreen-
4) Uso de oxigênio domiciliar.
dentemente mesmo na oncologia, onde a
5) Parada cardíaca extra-hospitalar. medicina paliativa é mais difundida, os pa-
6) Intervenção prévia ou atual de Cuidados Paliativos cientes com doença disseminada se apresen-
7) Suporte social limitado (doença mental crônica, taram da mesma forma12.
estresse familiar, angústia do cuidador). A grande maioria das propostas de abor-
8) Nenhum histórico de planejamento de cuidados dagem desse tema com o paciente e o fami-
avançados (discussão/documento).
liar não foi desenvolvida no Brasil, portanto,
não refletindo as particularidades de nossa
cultura, perfil religioso, comportamental e
AVALIAÇÃO DO PROGNÓSTICO crenças. Além disso, a rapidez com que as
Predizer e avaliar as necessidades e a evo- decisões muitas vezes precisam ser tomadas
lução do paciente muitas vezes é um desafio deixa um tempo reduzido para o diálogo, au-
para o emergencista, que aborda na grande mentando o desafio de conversar com uma
maioria dos casos um quadro agudo em um família cujo vínculo não foi antes estabeleci-
paciente não acompanhado ambulatorial- do9. Um caminho para este diálogo é conhe-
mente por ele. A determinação precoce do cer a percepção do paciente em relação a sua
prognóstico é um passo que deve ser consi- doença, o conhecimento dos familiares sobre
derado para o planejamento dos cuidados do o quadro clínico, o que esperam da evolução
fim da vida e algumas ferramentas ajudam da situação ao qual se encontram, e informar
a determinar esse processo na unidade de as possibilidades de se estabelecer um plano
emergência9. de ação de Cuidados Paliativos e, finalmente,

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Capítulo 49 - Cuidados paliativos na sala de emergência

Quadro 49.3 – PPS: Palliative Performance Scale11


Ingestão
PPS Deambulação Atividade e evidência de doença Autocuidado Nível da consciência
alimentar
Atividade normal e trabalho;
100% Completa Completo Normal Completo
sem evidência de doença
Atividade normal e trabalho;
90% Completa Completo Normal Completo
alguma evidência de doença
Atividade normal com esforço; Normal ou
80% Completa Completo Completo
alguma evidência de doença Reduzida
Incapaz para trabalho; Normal ou
70% Reduzida Completo Completo
doença significativa Reduzida
Incapaz para lazer e trabalhos Normal ou Completo ou
60% Reduzida Assistência ocasional
domésticos; doença significativa Reduzida períodos de confusão
Maior parte do tempo Incapacitado para qualquer Requisição considerável Normal ou Completo ou
50%
sentado ou deitado trabalho; doença extensa de assistência Reduzida períodos de confusão
Completo ou
Maior parte do tempo Incapaz para a maioria das Assistência Normal ou
40% sonolência +/-
acamado atividades; doença extensa predominante Reduzida
confusão
Completo ou
Incapaz para qualquer atividade; Normal ou
30% Totalmente acamado Assistência completa sonolência +/-
doença extensa Reduzida
confusão
Completo ou
Incapaz para qualquer atividade; Mínimo a
20% Totalmente acamado Assistência completa sonolência +/-
doença extensa pequenos goles
confusão
Inapto para qualquer atividade; Cuidados com a
10% Totalmente acamado Assistência completa Sonolência ou Coma
doença extensa boca somente
0% Morte

a decisão em conjunto. Podemos dizer que entanto, cabe lembrar que o Serviço de Ve-
uma boa comunicação no pronto-socorro em rificação de Óbitos pode ser acionado para
relação a idosos em situação crítica é baseada a emissão da Declaração de Óbito, em qual-
em três pilares: (a) metas de cuidado e deci- quer das situações acima, caso o médico não
são centrada no paciente, (b) planejamento consiga correlacionar o óbito com o quadro
de suporte avançado e (c) transição para Cui- clínico concernente ao acompanhamento re-
dados Paliativos3. gistrado nos prontuários ou fichas médicas
dessas instituições.
DECLARAÇÃO DE ÓBITO No caso de pacientes privados (isto é, não
Situação comum é a dúvida na emissão da vinculados a uma instituição), a declaração
declaração de óbito, no caso de morte natu- de óbito deve ser emitida pelo médico que vi-
ral, de um paciente que se encontra no pron- nha prestando assistência ao paciente, sem-
to-socorro e não houve tempo para conhecer pre que possível, em todas as situações, in-
a sequência de acontecimentos que levaram clusive para pacientes em acompanhamento
à morte. O médico designado pela institui- domiciliar e, na sua falta, pelo médico subs-
ção que prestava assistência a pacientes em tituto ou plantonista para óbitos de pacientes
Cuidados Paliativos sob regime ambulatorial internados em regime hospitalar.
tem o dever de emitir a declaração de óbito, É boa prática médica fornecer ao paciente
segundo o manual “A Declaração de Óbito ambulatorial sob Cuidados Paliativos (ou aos
– documento necessário e importante”13 do seus familiares) laudo médico atualizado em
Ministério da Saúde. Entende-se, portanto, relação a seus diagnósticos, tratamento pro-
que um paciente que falece no pronto-socor- posto e prognóstico, para que as condutas em
ro de uma instituição na qual realizava seu uma situação de emergência sejam as mais
acompanhamento ambulatorial, tem o direi- assertivas possíveis e haja tranquilidade por
to de ter sua declaração de óbito preenchida parte do médico substituto em emitir o ates-
pelo médico que o assistiu nessa situação. No tado de óbito.

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Capítulo 49 - Cuidados paliativos na sala de emergência

6. GILL TM, GAHBAUER EA, HAN L, ALLO-


CONCLUSÃO RE HG. Trajectories of disability in the last year
A necessidade de se aplicar os princípios of life. N Engl J Med. 2010. 362(13):1173-80.
da medicina paliativa mostra-se como uma 7. WEISSMAN DE, MEIER DE. Identifying
realidade cada vez mais frequente nos pron- patients in need of a palliative care asses-
tos socorros. A abordagem deste novo cená- sment in the hospital setting: a consensus
rio, principalmente na população geriátrica, report from the center to advance palliative
nos leva a um desafio que consiste numa prá- care. J Palliat Med 2011. 14:1–5.
tica médica ampla em um ambiente muitas 8.QUEST TE, BRYANT EN, ET AL. Palliati-
vezes inóspito, caótico e pouco favorável a ve Care emergency department screening
uma relação médico “paciente/família” ideal. tool. A technical assistance resource from
A diversidade dos quadros clínicos e a com- the IPAL-EM Project, Center to Advance
plexidade do paciente idoso com perspecti- Palliative Care. Disponível em: http://ipal.
va de manejo paliativo tornam as condutas, capc.org/downloads/ipal-em-palliative-care
em grande parte dos casos, individualiza- -ed-screening-tool.pdf.
das. Com isso, o objetivo deste capítulo não 9. LAMBA S. Early Goal-Direct Palliative The-
é criar algoritmos e guias pré-estabelecidos rapy (EGPT): A step to move palliative care
para tal prática, mas fornecer informações upstream. J Palliat Med. 2009. 12(9):767.
que orientem e ajudem o emergencista na to- 10. ANDERSON F, DOWNING G, HILL J,
mada de decisões na unidade de emergência. CASORSO L, LERCH N. Palliative per-
formance scale: A new tool. J Palliat Care.
1996. 12(1):5-11.
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Society; 2006. Disponível em: http://victo-
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riahospice.com/files/attachments/2Ba1Pal-
gency department in last month of life; most
liativePerformanceScaleENGLISHPPS.pdf.
admitted to hospital, and many die there.
12. LAMBA S, NAGURKA R, MURANO T,
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ZALENSKI R J, COMPTON S. Early iden-
3. ROSENBERG M, LAMBA S, MISRA S. Pal-
tification of dying trajectories in emergency
liative Medicine and Geriatric Emergency
department patients: potential impact on
Care. Clin Geriatr Med. 29(2013)1-29.
hospital care. J Palliat Med 2012. 15:392-395.
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13. A Declaração de Óbito: Documento neces-
cia. Rev. Bras Cuid Paliat. 2009. 2(3):21-27.
sário e importante / Ministério da Saúde,
5. GLASER B, STRAUSS AL. Adaptado de
Conselho Federal de Medicina, Centro
Time for Dying. Chicago, IL: Aldine Pu-
Brasileiro de Classificação de Doenças. 3a
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ed. Brasília: Ministério da Saúde. 2009.

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