Você está na página 1de 5

UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA MARIA

CENTRO DE ARTES E LETRAS


DEPARTAMENTO DE ARTES VISUAIS
CURSO DE ARTES VISUAIS
ARTE GLOBAL II
TATIANE DE OLIVEIRA ELIAS

Jamille Marin Coletto

OKEKE-AGULU, Chika; ENWEZOR, Okwui. Situando a Arte Contemporânea


Africana. Contemporary African Art Since 1980. Grafiche Damiani, Bologna, 2009.
p.10

“Durante as duas últimas décadas tem havido uma onde de interesse pelo trabalho de
artistas africanos contemporâneos. Uma das principais razões para essa sucessão de
eventos é o impacto da globalização sobre a arte e a cultura contemporânea.” p. 23

“Para ser claro, a generosidade aparente dos contextos artísticos internacionais, que tão
prontamente acolheram artistas africanos e outros, poderia ser atribuída menos a uma
mudança de feeling sobre a competência artística de regiões marginais e mais a um
reposicionamento estratégico e adaptação aos ventos globais de mudança que
derrubaram muros ideológicos por volta do final dos anos 1980 e início dos 1990.” p. 23

“A desestruturação de um sistema bipolar do poder contribui, além do mais, para o


estabelecimento de uma série de reconfigurações dialéticas e históricas que re-mapeou
os circuitos culturais, políticos e econômicos que teriam um efeito profundo sobre a
globalização no final do século XX e início do XXI.” p. 23

“[...] a exposição Magiciens de la Terre, organizada por Jean-Hubert Martin em 1989


no Centro Pompidou, em Paris, é justamente citada como um momento paradigmático
que ajudou a quebrar a fronteira da marginalidade dos artistas africanos, ao apresentar o
seu trabalho ao lado do trabalho de seus pares internacionais. Desde 1989, dentre os
espaços mais importantes para a valorização da arte africana contemporânea estão
várias inciativas de exposições abrangentes desenvolvidas no início e meados da década
de 1990 em várias cidades africanas.” p. 23

“Outros espaços foram se abrindo quando o escultor figurativo senegalês Ousmane Sow
e o artista nigeriano de instalações Mo Edoga tornaram-se os primeiros africanos a
serem incluídos na prestigiada exposição Documenta 9 (1992). Desde então, os artistas
africanos têm participado de todas as exposições Documenta subsequentes (10, 11, 12),
que são realizadas em Kassel, na Alemanha.” p. 24
“Essas atividades, juntamente com muitas outras que não estão listadas, têm contribuído
para cristalizar o sério interesse acadêmico e curatorial nesse campo. Com essa nova
atenção, várias mudanças importantes são imediatamente perceptíveis nos circuitos
discursivos de avaliação curatorial e histórica da arte contemporânea africana como
campo de estudo.” p. 24

“Isso exige uma nova perspectiva e a necessidade de uma nova lente analítica para o
estudo da arte contemporânea africana.” p. 25

“Mas aqui fazemos uma pausa para refletir – passo dado pelo filósofo Mundimbe –
sobre a ‘ideia de África com a qual trabalhamos. Prontamente reconhecemos isso: para
alguns artistas, ser identificado como um ‘artista africano’ pode ser uma marca
incapacitante para negociar os limites do poder que informa todo um complexo cultural
mundial. Até certo ponto, ‘a ideia de África’ pode ser superficialmente incapacitante
para alguns artistas porque a África tem sido mais frequentemente representada em
termos de negação epistemológica, da qual nenhum lucro pode ser tabulado na
contabilidade do capital cultural e artístico. Acrescente-se a isso o fato de que há
milênios, e também na mídia, a África tem sido interpretada como marginal, limitada à
esfera artística e de poder institucional, por isso faz sentido alguns artistas se sentirem
desconfortáveis em ser identificados como tal. Mas somente até certo ponto, pois há
também o inverso, a tendência de superidentificação, a ponto de surgir um
essencialismo construído sobre um sentimento de autenticidade, em relação a qual
alguns artistas africanos são vistos estar em falta seja por raça, região ou residência.” p.
25

“Em nossa abordagem, no entanto, a África representa uma multiplicidade de espaços


culturais moldados por forças sociais, politicas e econômicas que não privilegiam uma
única forma de conceituar uma identidade africana.” p. 25

“Mais concretamente, a arte africana contemporânea detona um campo complexo de


produção artística, pesquisa, interpretação, e o repositório de uma rica descoberta
intelectual no cruzamento das mudanças culturais, políticas, sociais e análises
epistemológicas nas quais a África é significantemente interpelada.” p. 25

“Mas convocar uma paisagem discursiva tal como a arte africana contemporânea não
implica em misturar essas sensibilidades díspares, situações culturais, experiências
históricas e modelos politizados de subjetividade e subjetivação (que é o
posicionamento estratégico que um artista adota nesse campo) num quadro unificado de
identidade cultural. Ao contrario, a ideia de identidade africana que empregamos não é
um termo absoluto, e sim maleável. Ele se refere a ambas as situações culturais e
geográficas, e aos modos de subjetivação, dimensões de identificação e estratégias
éticas. Nenhum desses é sungular. Uma identidade africana pode sugerir anto em
relações étnicas, nacionais, e condições linguísticas, quanto estratégias éticas,
ideológicas e políticas. Uma identidade africana pode ser entendida como parte de um
repertório de práticas, estratégias e subjetividades que ligam tradições culturais e
arquivos culturais, que se subtendem em espações geoculturais e geopolíticos, em
experiencias transnacionais e de diáspora. Nesse sentido não há nenhuma contrução
totalizante que defina o centro desse projeto.” p. 25

“Nesse contexto, o termo ‘africano’ empregado aqui é abrangente. Ele acomoda


derrapagens, incompletudes, excentricidades, idiossincrasias e ambivalências. Ele não
deve ser entendido em termos etnocêntricos, nacionais, regionais, ou mesmo
continentais em si, mas sim como uma rede de posições e filiações, estratégias e
filosofias que representam a multiplicidade das tradições culturais e arquivos
disponíveis e explorados consistentemente pelos artistas para moldas a sua posição
artística, de modo que reflita o repertório difuso de formas e conceitos artísticos que
designamos como arte africana contemporânea. Ao mesmo tempo, o termo ‘africano’ é
também temporal, em particular na maneira que engendra ou nega apegos emocionais
no presente. Trata-se da forma da África no mundo hoje.” p. 26

“Ao mesmo tempo, o objetivo é revelar – através da evidencia das obras representadas e
discutidas aqui – o fato de que o termo arte africana contemporânea tem uma base
histórica na qual a nossa premissa se baseia e é, portanto, um estímulo para a analise
seria e o engajamento tanto de profissionais de arte quanto do público.” p. 26

“Assim, o foco principal é o reconhecimento da existência desse campo e suas


implicações históricas para análise da arte africana em geral.” p. 26

“[...] de modo que o estudo da arte contemporânea africana tornou-se uma área central
da investigação acadêmica no conhecimento da história da arte africana. Como esses
estudos expandem os dados disponíveis sobre práticas e discursos, esse campo tem sido
impregnado com formas e métodos de análise teóricos, estéticos e sociais numa nova
história das artes na África.” p. 27

“[...] quando a arte africana consequentemente emergiu? Será que surgiu como
consequência da crise da arte tradicional africana devido ao colonialismo? Ou foi por
causa do encontro com novos paradigmas de produção artística gerados por respostas
africanas para a modernidade europeia?” p. 27

“Terry Smith nos da um guia útil afirmando que a arte contemporânea é a arte
preocupada em estar no seu tempo. Arthur Danto, por outro lado, vê a arte
contemporânea, em seu sentido sempre crescente de intemporalidade, como pós
históricos compelida aos estilos. Smith e Danto não dizem exatamente a mesma coisa: o
primeiro é estritamente preocupado com questões de temporalidade, enquanto o outro se
concentra na censura de períodos históricos.” p. 27

“Mas será que essas duas interpretações ajudam a definir o que queremos dizes por
contemporâneo quando usadas estritamente em analise aplicada à África? A resposta
geralmente é sim, especialmente se entendemos a arte africana na era do colonialismo e
em encontro com a modernidade europeia como, por reflexo, um encontro de categorias
de tempo e uma marcha em direção a um paradigma pós histórico, onde os estilos
tradicionais já não designam as coordenadas estéticas de produção artística. Ao mesmo
tempo, podemos ver também a convergência de estilos tradicionais e paradigmas
contemporâneos como ocorrendo simultaneamente, mas com duas vertentes distintas:
um que reflete sua conexão com um passado histórico e outra estabelecendo sua
separação em relação a esse passado.” p. 27-28

“[...] talvez possamos permitir no mínimo que a arte africana contemporânea venha
tanto no final da arte tradicional (aparentemente, pré-colonial) como no final do
colonialismo; quer dizer, a sua condição de existência no presente é pós-colonial.” p. 28

“Com as concorrentes reivindicações do passado e a separação do presente em relação a


ele, a paisagem discursiva de arte africana contemporânea foi moldado de acordo com a
luta entre dois campos de conhecimento que abordaram o seu conteúdo através de
diferentes e divergentes abordagens. Durante os últimos 40 anos, grande parte do debate
que se concentrou sobre a questão da arte na África ocorreu em duas principais arenas:
no museu etnográfico e no museu de arte. Na primeira arena, estudiosos e curadores
muitas vezes fazem pouca distinção entre arte contemporânea e obras que são mais
apropriadamente artesanato, tal como trabalhos de cerâmica, cestaria, tecidos tingidos e
design de brinquedos. É importante ressaltas aqui que o termo ‘artesanato’ não denota
necessariamente uma pratica inferior à arte contemporânea. Mas deve ser reconhecido
que esses dois tipos de processos criativos operam em distintos sistemas discursivos e
circulam em diferentes economias culturais, a saber no mercado de suvenires e material
utilitarista, por um lado e me circuitos de exposição em galerias de arte contemporânea
e, de outro, em sistemas de museus de arte e etnografia. Nós, de modo algum,
conferimos o circuito do museu uma esfera superior de recepção cultural.” p. 28

“Até recentemente, a capacidade do museu etnográfico de empunhar discursiva


autoridade sobre os objetos, as praticas e o significado foi dominante. Isso fez dele um
formidável polo discursivo do campo artístico e o locus primário da interpretação
curatorial. Outorgado, o museu etnográfico operava em grande parte imutavelmente
desse modo, porque o museu de arte como tal mostrou pouco interesse na categoria da
arte africana contemporânea [...].” p. 29
No entanto, nos últimos anos, a autoridade discursiva do museus etnográfico e o poder
interpretativo que exercia foram desgastados pelo surgimento de projetos curatoriais
contemporâneos que funciona na arena do museu de arte. Por conseguinte uma
memorável atenção curatorial e seu foco na arte contemporânea fez com que o modelo
de exposição temporária em larga escala em museus de arte fosse uma arena
indiscutível para o enquadramento teórico e histórico da arte africana contemporânea.”
p. 29

Você também pode gostar