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Reformulação

para a Escuta Ativa: um instrumento da Empatia

Quando eu era criança, um de meus professores muitas vezes me repreendia por falar demais. Dizia
me: "Meu filho, você sabe por que Deus lhe deu dois ouvidos e uma boca? Porque você deve escutar
mais e falar menos". Finalmente, meu professor não estava totalmente errado. No entanto, a
maioria das pessoas tem grande dificuldade quando se trata de praticar a escuta ativa. Vários
provérbios nos lembram que se a palavra é de prata o silencio é de ouro, ou que é melhor rodar sete
vezes a língua na boca antes de responder, ou que falar é despender enquanto ouvir é adquirir, etc.
Nessa altura é importante entender que a escutar significa mais do que ouvir. A audição é o
resultado de um processo fisiológico que nos permite decodificar sons, sem mais: nós ouvimos um
estrondo de trovão, uma sirene ou o riso de uma criança. Escutar é o resultado de um processo
psicológico complexo durante o qual recebemos e interpretamos as mensagens verbais e não
verbais. Ouvir é passivo, escutar é ativo.

De acordo com os trabalhos de Diane Bone (1988), sabemos que existem duas grandes tendências.
Há os indivíduos que são movidos principalmente pelo desejo de influenciar outras pessoas ou o
ambiente e aqueles que são movidos pelo desejo de ajudar as outras pessoas.

Para os primeiros: impacientes e dominantes, parece urgente dizer ou fazer; enquanto eles não tem
incorporado a escuta ativa, eles a consideram como um obstáculo, uma restrição que dificulta a
realização de seus projetos.

Os segundos: genuinamente curiosos, movidos pela atenção às pessoas e às coisas, eles são
receptivos e mostram interesse frente as situações e aos outros. No entanto, por certo pudor ou
excessivo respeito, nem sempre ousam formular perguntas.

Além dessas duas atitudes, existe também um poderoso filtro chamado de interpretação. O ser
humano para sobreviver está equipado de uma "peneira" que serve de referencial para a
interpretação. Sempre que encontra uma pessoa ou enfrenta uma situação, a compara com o que
́
ele já vivenciou pessoalmente ou por vivencia de outras pessoas , e a julga em alguns centésimos de
segundo, a natureza do que está na frente dele. É esta avaliação rápida, instintiva, que muitas vezes
permite-lhe ter os reflexos que o protegem. O problema reside quando nossa avaliação do outro, ou
da situação, se transforma em juízo definitivo. "Fulano só́ fala besteiras"." Muita gente já ́ tentou e
nunca deu certo". Etc. Porque ouvir mais, porque ficar alerta aos sinais quando nossa opinião está
estabelecida? Porque "perder mais tempo" enquanto "já ́ sabemos"?

Para quebrar nossos preconceitos, a escuta ativa é uma poderosa ferramenta. Portanto para
qualquer indivíduo ela não é natural. No inicio, ela se aparenta a um instrumento "estranho", como
um violino para o músico ou a uma raquete para o jogador de tênis: este instrumento perturba,
atrapalha e limita. Em seguida, com a prática, para o violonista ajuda a sublimar um som, para o
tenista um movimento, e no caso, a relação com os outros graças a um autentico conhecimento.

Portanto a escuta ativa vale ouro, pelo menos por quatro virtudes:

• Nos permite coletar informações para tomar decisões mais justas.


• Ela nos impede de dizer ou fazer coisas de forma inábil ou inadequada.
• Sempre que formulamos uma série de perguntas completas e esclarecedoras ou
parafraseamos as palavras do interlocutor, deixamos claro que estamos realmente
interessados no que ele tem a dizer. Então, abrimos a porta para uma relação baseada na
confiança e no respeito mutuo.
• Ela cria um clima de calma e respeito propiciando o bem-estar de todos.
Quem domina a escuta ativa tem uma vantagem considerável frente a maioria das situações
profissionais ou pessoais que encontra. Durante uma entrevista de emprego, uma negociação, uma
apresentação ou a resolução de um conflito, a escuta ativa permite elaborar e utilizar argumentos
valiosos para convencer, tranquilizar, se adaptar, agir de forma adequada e desarmar conflitos com
eficiência e uma facilidade desconcertante para o neófito.

Da mesma maneira que é impossível se tornar um violinista virtuoso sem repetir continuamente as
suas gamas, ou se tornar um esportista de elite sem treinar, o mesmo acontece com a escuta ativa.
Se o treino é indispensável, o talento, a predisposição natural, é imprescindível. A predisposição à
escuta pode ser detectada em testes psicométricos.

Então, se a pessoa tiver certo talento, aqui estão algumas regras (simples):

• Parar de pensar quando o outro fala para ouvir o que ele diz e o que ele não diz,
• Evitar quebrar o silêncio quando ele termina de falar para levá-lo a dizer mais do que tinha a
intenção de contar,
• Com sinais verbais e não, encorajar o interlocutor a se expressar mais,
• Mostrar o entendimento, ou seja, provar ao outro que o que ele disse foi entendido, sem
portanto emitir qualquer julgamento: reformular (Rogers, 1966), (à seguir)
• Continuar o discurso sem quebras ou oposição sistemática.

O que está por traz destes pontos é a capacidade de ir além das crenças e preconceitos, de ser
paciente, de entender o ponto de vista do outro, de ficar focado no assunto, de evitar as distrações,
de encontrar uma solução favorável para todos,...

Isto é perfeitamente possível depois de treinar por centenas de vezes para quem tem talento. Para
quem tem menos talento será necessário treinar milhares de vezes. Outros dificilmente conseguirão
escutar apesar de treinar. Todos podem aprender as técnicas da reformulação (ver página seguinte),
até conseguirão dar a impressão de dominar a escuta ativa, mas a empatia não tem nada a ver com
uma questão de técnica (Fontgalland, 2012) e sim, com o interesse pelos outros. O seu sucesso
profissional, em última análise, depende de sua capacidade de ouvir e de se comunicar. Pela pratica
da escuta ativa, você aumenta significativamente a sua eficiência e eficácia.

Entendeu a mensagem? Escutou as dicas? Então, boa pratica e sucesso!

R. Oswald e F. Barroso (Junho de 2015)

Extraído de (http://www.moityca.com.br/pdfs/Escuta%20ativa%20_1_.pdf)

Notas bibliográficas:

Bone, D. (1988), The Business of Listening. Los Altos, CA: Crisp PublicationS Inc., 67 pág.

Fontgalland, R. C. & Moreira, V. (2012). Da empatia à compreensão empática: evolução do conceito


no pensamento de Carl Rogers. Memorandum, V. 23, pág. 32-56. (Acesso 03.07.2015)
(http://www.fafich.ufmg.br/memorandum/revista/wp-content/uploads/2012/11/fontgallandmoreira01.pdf)

Rogers R. C. & Kinget G. M. (1966), Psychothérapie et Relations Humaines, Paris, Publications


Universitaires de Louvain, 154 pág.
As técnicas de reformulação de acordo com Carl Rogers (1966)

Reformular as frases do interlocutor permite que ele reconheça como em um espelho a imagem do
que ele disse e se sentir entendido, desta forma encorajado a se expressar mais. Rogers foi o criador
da técnica da reformulação para entrevistar e não interrogar os indivíduos. Seguem as técnicas:

Espelhar Para verificar se entendemos corretamente e fazer que nosso interlocutor


perceba isto, podemos parafrasear, repetindo, em termos equivalentes, a
maioria do que foi dito.

Por exemplo:" Se eu entendi corretamente, você quer dizer ..."


Ser o eco Para determinar o significado dado ao que parece ser uma "palavra-chave"
é possível retomar a palavra.

Por exemplo: "A avaliação pode ser perigosa. O que você entende por
perigosa?"...
Clarificar Em uma tentativa de destacar o que está confuso, disperso, desorganizado,
é necessário "traduzir" as diferentes pecas de informação, sintetizando o
essencial.

Por exemplo: "O ponto crucial do problema, em tudo o que você diz, pode
ser que você não está de acordo com nossa forma de trabalhar. Tem algo
mais?"...
Inverter Para levantar o que está implícito em uma formulação e incitar a mudar o
ponto de vista: se reorganizam as ideias revertendo a figura e o fundo.

Por exemplo: "De acordo com sua percepção se torna impossível trabalhar
num ambiente onde ninguém compartilha as informações. Quais são as
informações relevantes que você comunica aos seus colegas?"...
Deduzir ou Para verificar uma hipótese, para ajudar o interlocutor a explicar sua
Induzir posição repetimos o que foi dito e formulamos uma hipótese.

Por exemplo: "Você me diz que quer ganhar mais. Quer dizer que você quer
assumir mais responsabilidade?"...
Apoiar Para ajudar o interlocutor a explicar sua posição repetimos o que foi dito e
perguntamos para obter informações suplementares.

Por exemplo: "Você está me dizendo que os recursos técnicos são


insuficientes. Em que esta falta de recursos impede o alcance das
metas?"...
Contornar o Para orientar a discussão em termos mais objetivos se valorizam mais os
viés elementos concretos deixando de lado sentimentos e opiniões.
emocional
Por exemplo: "Para que possa entender as razões de nossa incompetência,
o que realmente aconteceu?"...
Interrogar Para trazer o interlocutor a encontrar ele mesmo a solução do problema é
possível retornar a sua pergunta ou converter suas afirmações em
perguntas.

Por exemplo: "Se eu entendi bem a sua dúvida é se você decide de ..."

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