Você está na página 1de 34

UNIVERSIDADE FEDERAL RURAL DA AMAZÔNIA

INSTITUTO DA SAÚDE E PRODUÇÃO ANIMAL


COORDENAÇÃO DO CURSO DE MEDICINA VETERINÁRIA

SARAH RAIOL MACEDO TEIXEIRA

ISOLAMENTO DE Escherichia coli


EM PIOMETRA FELINA: RELATO DE CASO

BELÉM – PARÁ
2023
SARAH RAIOL MACEDO TEIXEIRA

ISOLAMENTO DE Escherichia coli


EM PIOMETRA FELINA: RELATO DE CASO

Trabalho de conclusão de curso


apresentado como requisito para
obtenção do título de Bacharel em
Medicina Veterinária pela Universidade
Federal Rural da Amazônia.
Orientador: Prof. Dr. Alexandre do
Rosário Casseb

BELÉM - PARÁ
2023
SARAH RAIOL MACEDO TEIXEIRA

ISOLAMENTO DE Escherichia coli


EM PIOMETRA FELINA: RELATO DE CASO

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado como requisito para obtenção do título de


Bacharel em Medicina Veterinária pela Universidade Federal Rural da Amazônia.
Orientador: Prof. Dr. Alexandre do Rosário Casseb

Data da Aprovação:___/___/______
Banca Examinadora:

___________________________________
Orientador
Profº Dr. Alexandre do Rosário Casseb
Universidade Federal Rural da Amazônia

____________________________________
Membro 1
Profª Drª Conceição de Maria Almeida Vieira
Universidade Federal Rural da Amazônia

____________________________________
Membro 2
Profº Dr. Leonildo Bento Galiza da Silva
Universidade Federal Rural da Amazônia
Dedico esse trabalho em memória à minha mãe, Sonia do
Socorro Vilhena Raiol. Fostes a minha fortaleza mesmo
que em outro plano, és o meu exemplo até os dias de
hoje. Nós conseguimos!

AGRADECIMENTOS

Agradeço a Deus por todo amparo em minha vida, por segurar minhas mãos quando
não me achava capaz, por derramar suas bênçãos sobre minha família, agradeço por tanto, que
estas páginas não seriam suficientes para descrever.
Aos meus pais, Raimundo Costa Macedo Neto e Sonia do Socorro Vilhena Raiol,
que trabalharam dia e noite para oferecer o melhor a mim e meus irmãos, que me ensinaram
sobre trabalho e esforço. Agradeço por sempre acreditarem em mim. Pai, obrigada por ser
meu melhor amigo e me apoiar em todas as minhas empreitadas da vida.
Ao meu esposo, Hudson Palheta Teixeira, por estar ao meu lado e tornar meus dias
mais leves, por me ajudar e ser exemplo de Médico Veterinário. Agradeço por me amar
mesmo durante esse período estressante de conclusão de curso, foram dias difíceis pra você
também e eu te amo demais por isso.
Ao meu filho, Joseph Macedo Teixeira, por me proporcionar esse super poder que é
de ser mãe, por me dar forças para enfrentar toda e qualquer situação. Minha maior motivação
diária é você.
A minha tia, Marta Silvana, por ter sido meu braço direito cuidando com tanto amor
do meu filho para que eu pudesse realizar minhas atividades, por diversas vezes ficar até mais
tarde para que pudesse escrever este trabalho.
A minha madrasta, Rosângela Macedo, por me ajudar com as atividades do dia a dia,
por ser uma vó presente para o Joseph e junto ao meu pai, me apoiar também.
A minha sogra, Alice Palheta, por desde o início cuidar de mim como sua filha,
principalmente nos dias em que estive doente e com todo suporte quando me tornei mãe, pela
amizade sincera e carinho dado a mim.
Aos meus irmãos, Cléo Carvalho e Ronan Macedo, vocês sempre foram grandes
incentivadores dos meus estudos, mesmo à distância me trazem alegria e conforto, sei que são
meu abrigo onde quer que estejam Amo vocês e suas famílias.
As minhas amigas, Lauany Pureza e Danielle Santos, pelo apoio diário, pelas
palavras de incentivo e por diversas vezes me ajudarem a aliviar o fardo de tantas
responsabilidades. Lau, você também é um grande exemplo para mim, que agora continuemos
a crescer juntas como parceiras nesta profissão.
A minha amiga, Elyne Santiago, você foi essencial durante a graduação, obrigada por
dispor do seu tempo e sua casa para me ensinar madrugadas adentro os conteúdos que perdia
devido ao trabalho, por sempre lembrar de mim nos trabalhos em grupo, nas palestras, no
estágio. Sua amizade foi um presente que a UFRA me deu.
Aos meus amigos da UFRA, eu não conseguiria enfrentar estes anos de graduação
sozinha, muitas vezes vocês me salvaram de perder uma prova, um trabalho, um ponto extra,
todos os pequenos gestos contribuíram para que eu chegasse até aqui. Desejo sucesso a todos.
Ao meu orientador, professor Alexandre do Rosário Casseb, por se dispor a me
ajudar neste momento decisivo e pela paciência em lidar com as minhas indecisões ao longo
deste trabalho. Obrigada por ser gentil, todos precisamos de professores assim.
A empresa J Henrique, por me proporcionar um ESO tão enriquecedor, em especial à
Danielle Góes e à Camille Yumi pelos dias descontraídos e cheios de troca de conhecimento
durante as rotas, não poderia ter escolhido outro estágio.
RESUMO

A piometra é uma doença mediada pelo desequilíbrio hormonal devido a fatores tanto
endógenos quanto exógenos, desencadeando o acúmulo de líquido no lúmen uterino e
imunossupressão do órgão, favorecendo a colonização de bactérias na região. Em gatas é
observada de forma rara, porém o uso de inibidores de cio predispõe a ocorrência da piometra
nesta espécie. A piometra pode ser classificada de acordo com a patência da cérvix, quando
observada secreção vaginal purulenta é denominada aberta, ou seja, há extravasamento do
fluido intrauterino pela cérvix, ou na ausência de secreção e notável distensão abdominal, é
classificada como piometra fechada. Os sinais clínicos variam de acordo com a apresentação
clínica da doença, podendo o animal apresentar dor, febre, poliúria e polidipsia, anorexia,
diarreia e vômito, além da presença ou não de secreção vaginal. A Escherichia coli é o
microrganismo mais comumente isolado em amostras de conteúdo provindo do útero com
piometra. Este trabalho objetivou relatar o caso de uma gata jovem, sem raça definida, que
apresentou sinais clínicos de piometra aberta após aplicações de inibidor de cio pela tutora. O
animal em questão foi submetido ao tratamento cirúrgico de ovário-histerectomia, depois da
avaliação clínica pela médica veterinária e realização de hemograma que constatou uma
leucocitose acentuada, característica em casos de piometra. O relato descreve a abordagem
clínica inicial, os achados durante a cirurgia e resultado de cultura bacteriana e antibiograma
para direcionar a terapêutica. A conduta adotada mostrou-se eficaz, visto a gata retornou bem
para a retirada de pontos após 10 dias do procedimento cirúrgico.

Palavras chave: infecção uterina; gata; microrganismo; inibidores de cio.


ABSTRACT
Pyometra is a disease mediated by hormonal imbalance due to both endogenous and
exogenous factors, triggering the accumulation of fluid in the uterine lumen and
immunosuppression of the organ, favoring the colonization of bacteria in the region. In female
cats it is rarely observed, but the use of estrus inhibitors predisposes the occurrence of
pyometra in this species. Pyometra can be classified according to the patency of the cervix,
when purulent vaginal secretion is observed, it is called open, that is, there is leakage of
intrauterine fluid through the open cervix, or in the absence of secretion and notable
abdominal distention, it is classified as closed pyometra. The clinical signs vary according to
the clinical presentation of the disease, and the animal may present pain, fever, polyuria and
polydipsia, anorexia, diarrhea, and vomiting, besides the presence or absence of vaginal
secretion. Escherichia coli is the microorganism most commonly isolated from samples of
uterine contents with pyometra. This study aimed to report the case of a young cat, without
defined breed, that presented clinical signs of open pyometra after heat inhibitor applications.
The animal in question was submitted to ovary-hysterectomy surgical treatment, after clinical
evaluation by the veterinarian and a blood count that showed a marked leukocytosis,
characteristic in cases of pyometra. The report describes the initial clinical approach and the
findings during surgery and the results of bacterial culture and antibiogram to direct the
therapy. The adopted management proved to be effective, since the cat returned well for stitch
removal 10 days after the surgical procedure.

Keywords: uterine infection; cat; microorganism; estrus inhibitors.


LISTA DE TABELAS
Tabela 1 - Resultados do hemograma do paciente.........................................................22
Tabela 2 – Resultados de antibiograma da amostra de conteúdo uterino da paciente…26
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 - Endocrinologia do ciclo estral da gata............................................................16
Figura 2 - fisiopatologia da HEC/Piometra.....................................................................17
Figura 3 - Diâmetro abdominal da paciente: aproximadamente 52 cm...........................24
Figura 4 - Pesagem do útero com piometra.....................................................................24
Figura 5 - Retirada do conteúdo intrauterino...................................................................25
Figura 6 - Exsudato purulento de coloração amarronzada com presença de sangue.......25
SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO..............................................................................................................12
2. OBJETIVOS...................................................................................................................13
2.1 Objetivo geral...................................................................................................................13
2.2 Objetivo específico....................................................................,......................................13
3. REVISÃO DE LITERATURA......................................................................................14
3.1 Fisiologia do ciclo estral das gatas.................................................................................14
3.2 Piometra...........................................................................................................................16
3.2.1 Fisiopatologia.................................................................................................................17
3.2.2 Etiologia.........................................................................................................................19
3.2.3 Sinais clínicos................................................................................................................19
3.2.4 Diagnóstico....................................................................................................................20
3.2.5 Tratamento.....................................................................................................................21
3.3 Administração de Contraceptivos.................................................................................22
3.4 Cultura Bacteriana e Antibiograma.............................................................................22
4. RELATO DE CASO.......................................................................................................23
5. DISCUSSÃO...................................................................................................................28
6. CONCLUSÃO................................................................................................................30

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
13

1. INTRODUÇÃO
A piometra é uma das afecções mais comuns na clínica de pequenos animais,
sendo de maior prevalência em fêmeas caninas do que felinas. É caracterizada pelo
acúmulo de secreção purulenta no lúmen uterino, proveniente de uma hiperplasia
endometrial cística (HEC) associada a uma infecção bacteriana. Embora possa se
manifestar em qualquer idade, sua maior incidência está em fêmeas senis, acima de 9
anos, acentuando, ainda, os riscos nas cadelas e gatas que nunca pariram, em
comparação às que já obtiveram uma ou mais ninhadas no decorrer da vida. Sua
patogenia ainda não está totalmente elucidada, porém, a complexidade do processo e
suas manifestações clínicas requerem atenção no meio profissional, visto que os
animais correm sérios riscos de vida quando a afecção está estabelecida (AMORIM,
2015; MARTINS, 2007; SAPIN et al, 2017).
A piometra é uma doença mediada pela progesterona, detectada, na maioria dos
casos, durante a fase de diestro, em que a concentração sérica do hormônio encontra-
se mais elevada, promovendo um acúmulo de secreção endometrial no lúmen uterino,
favorecendo o crescimento bacteriano no local. Sinteticamente, os inibidores de cio a
base de progesterona, bem como fármacos similares, podem ser agentes causadores,
em alguns casos, do desenvolvimento de piometra em gatas não fecundadas
(SERRADO, 2021; MACHADO, 2017).
A piometra aberta é caracterizada pelo extravasamento do exsudato purulento
presente no útero pela vagina, correndo menos riscos de ruptura uterina, visto que o
órgão não apresentará distensão em demasia. Em contrapartida, a oclusão da cérvix na
piometra fechada não permitirá essa drenagem, apresentando distensão exagerada do
útero pelo acúmulo de fluido, consequentemente tornando a parede uterina mais fina,
aumentando as chances de ruptura e extravasamento da secreção infectada para a
cavidade abdominal, elevando as chances de sepse na piometra fechada (SERRADO,
2021).
Estima-se que, aproximadamente, 80% dos casos de piometra possuem
resultado positivo para isolamento bacteriano. O agente etiológico de maior evidência
isolado do conteúdo uterino na piometra é a Escherichia coli. Fêmeas acometidas pela
afecção podem apresentar dor, distensão abdominal, secreção vaginal - piometra de
cérvix aberta, vômito, febre, anorexia, poliúria, leucocitose - observada no momento
14

do diagnóstico, hipotensão, e em casos mais agravados, choque séptico que pode levar
o paciente a óbito (BARNI, 2012; MARTINS, 2007; SERRADO, 2021; SILVEIRA,
2007).
O tratamento mais indicado é o cirúrgico, após estabilizar o quadro do animal
por meio do tratamento clínico. Utiliza-se a técnica cirúrgica de ovário-histerectomia
(OH) para retirar os ovários e o útero, inviabilizando assim, os riscos de infecções
uterinas futuras (AMORIM, 2015).
Portanto, este trabalho tem como objetivo relatar um caso de piometra felina, a
qual foi anteriormente sujeita a aplicações de anticoncepcional, submetida ao
tratamento cirúrgico, e realizado exame de cultura e antibiograma, a fim de direcionar
melhor o tratamento. Correlacionando o desenvolvimento da piometra ao uso de
contraceptivos e corroborando com a maior incidência de E. coli isolada em conteúdo
uterino em piometra.

2. OBJETIVOS

2.1 Objetivo Geral


Relatar o caso clínico de uma gata atendida em uma clínica privada que
aparentava histórico e sinais clínicos característicos de piometra após sucessivas
aplicações de inibidores de cio pela tutora.

2.2 Objetivos Específicos

 Explanar acerca da piometra em gatas;


 Explanar acerca da influência do uso de contraceptivos sobre a enfermidade;
 Explanar acerca da importância do exame de cultura bacteriana e antibiograma na
terapêutica da doença;
15

3. REVISÃO DE LITERATURA

3.1 Fisiologia do Ciclo Estral das Gatas

As fêmeas apresentam ciclo estral como parte de sua vida reprodutiva, suas
características e períodos variam de acordo com cada espécie. A gata, do mesmo modo
que outras fêmeas de mamíferos domésticos como éguas e ovelhas, apresenta a
característica de ser poliéstrica sazonal, ou seja, seu ciclo reprodutivo se organiza de
maneira que a fêmea manifeste atividade sexual durante um espaço de tempo limitado
durante o ano. Sua ciclicidade é controlada pelo fotoperíodo, em torno de 12 a 14
horas de luz, em condições naturais, as gatas param de ter ciclos durante os meses de
inverno. Entretanto, o fornecimento de luz artificial alterará o ciclo de gatas
confinadas dentro de casa, de modo que estas poderão apresentar atividade sexual
durante o ano todo. Essa espécie possui ovulação induzida pela cópula que provoca a
liberação do hormônio luteinizante (LH), responsável pela ovulação, no entanto, em
alguns casos observou-se que a ovulação espontânea pode ocorrer esporadicamente
(AMORIM, 2015; DA SILVA, 2020; GIMÉNEZ ET AL.,2006; LITTLE, 2011;
NELSON E COUTO, 2015; SANTOS, 2022; SILVA, 2020).
O ciclo estral consiste em etapas marcadas por modificações ovarianas,
hormonais e comportamentais a fim de que ocorra o estro, permitindo a cópula para
que se decorra a prenhez com o nascimento de prole viável. Levando em consideração
as estruturas ovarianas, podemos dividir o ciclo estral em duas fases, a fase folicular
durante o proestro e estro em que ocorre o desenvolvimento, maturação e ovulação
dos folículos ovarianos; e a fase lútea, que compreende o metaestro e diestro, onde
ocorrerá a formação e o funcionamento de um corpo lúteo. Por fim, o período de
inatividade sexual, denominado anestro. Ressalta-se que as gatas possuem uma fase
específica, o interestro, que consiste no período entre um estro não ovulatório e um
novo ciclo estral (AMORIM, 2015; SANTOS, 2022; SERRADO, 2021; SILVA,
2020).
16

A fase de proestro dura em média 2 dias, sua curta duração e ausência de sinais
evidentes na genitália externa dificultam a identificação deste período. Compreende o
início do desenvolvimento folicular e síntese de estrogênios que entram na circulação
sanguínea, as concentrações de estradiol se elevam à medida que os folículos
aumentam de tamanho, sintetizando e secretando os estrógenos. Em relação ao
comportamento da gata, nota-se a vocalização, atitudes afetuosas, roçar com a cabeça
e rolar no chão. A fêmea atrai o macho, porém não permite a cópula (AMORIM,
2015; DA SILVA, 2020; DUKES, 2017; KLEIN, 2014; SANTOS, 2022).
Posterior ao período supracitado, inicia-se o estro, caracterizado pela
receptividade sexual da fêmea, este possui duração média de 2 a 19 dias. O
comportamento durante o estro possui correlação direta com a fase folicular, em que
os folículos produzem e secretam altos níveis de estrogênios para a circulação,
atingindo o pico de concentração plasmática de estradiol no meio do estro. Observa-se
que a gata apresenta comportamento de vocalização, lateralização da cauda,
arqueamento da coluna vertebral, rolamento no chão, tremor e rigidez do corpo ou
cauda, também pode haver corrimento vaginal. As gatas ovulam quando há estímulo,
como a cópula. A ovulação é um reflexo neuroendócrino principiado por estímulos
mecânicos de receptores na região vaginal e na cérvix, liberando uma onda de
hormônio luteinizante (LH). Ademais, a ovulação espontânea pode ocorrer em torno
de 48% das gatas (AMORIM, 2015; BARNI, 2012; DA SILVA, 2020; NELSO E
COUTO, 2015).
Todavia, na ausência de cópula ou ovulação espontânea ocorre o interestro,
compreendido como o período de intervalo entre um estro não ovulatório e um novo
ciclo estral. O interestro é um dos aspectos que diferencia o ciclo estral das gatas em
relação às outras fêmeas domésticas. Ainda há divergências quanto ao tempo médio de
duração deste período, relatado de 8 a 22 dias entre os pesquisadores. Os níveis de
estrogênios e progesterona permanecem baixos na circulação durante esta fase, e a
fêmea geralmente não apresenta sinais de atividade sexual (DA SILVA, 2020;
JOHNSTON et al., 2001; KUTZLER, 2007)
O metaestro, compreende o período de desenvolvimento do corpo lúteo
funcional no qual as células da teca iniciam a produção e secreção da progesterona. As
concentrações elevadas de progesterona são observadas a partir de 24 a 48h após a
ovulação, por volta de 2 a 3 dias após a monta. Nesta fase a fêmea não aceita mais a
17

monta pelo macho. No caso das gatas, essa fase só ocorre posterior à cópula com
fertilização do óvulo liberado, decorrendo-se a gestação (DA SILVA, 2020; NELSON
E COUTO, 2015; SERRADO, 2021).
O diestro é denominado como o período de dominância da progesterona, ocorre
após o metaestro com o corpo lúteo maduro, quando sucede-se a ovulação. Nesta fase,
a gata pode estar prenhe ou em pseudociese (ovulou, mas não houve fecundação), no
segundo caso, a fase luteínica pode ter duração de 30 a 40 dias. Em termos endócrinos,
a progesterona liberada nesse período inibe a secreção do hormônio liberador de
gonadotrofina (GnRH) do hipotálamo, por conseguinte, o LH e hormônio folículo
estimulante (FSH) da hipófise. O período total do diestro varia de 35 a 70 dias,
iniciando imediatamente após a cópula, durante o qual a gata não demonstra
comportamento sexual. Ao final do diestro, a gata poderá retornar para o período de
proestro ou sobrevir o anestro, dependendo do fotoperíodo. Nesta fase torna-se mais
favorável o desenvolvimento da HEC, influenciada pela alta concentração da
progesterona e consequentes alterações causadas por este hormônio (AMORIM, 2015;
BARNI, 20212; DA SILVA, 2020; FELDMAN E NELSON, 2004; SANTOS, 2022).
Na ausência de acasalamento ou ovulação espontânea, decorre-se o anestro, que
compreende a fase de inatividade sexual, dessa forma, a fêmea não demonstra
interesse e repele o macho. Tem duração de aproximadamente 90 dias, em estações de
dias curtos. As concentrações plasmáticas de estrogênios e progesterona permanecem
em níveis basais durante todo o período (BARNI, 2012; DA SILVA, 2020; SANTOS,
2022).
A figura 1 a seguir ilustra as nuances endocrinológicas ao longo do ciclo estral.
A começar pelo proestro (aumento do FSH e estrógeno) que estimula o crescimento e
amadurecimento dos folículos ovarianos. No estro há o pico de estrógeno,
influenciando no comportamento da gata. No interestro os hormônios permanecem em
níveis basais, retornando posteriormente para o proestro. Ocorre um pico de estrógeno,
havendo a cópula e liberando o LH, procedendo a ovulação. No diestro observa-se
uma alta concentração de progesterona.
Figura 1 – Endocrinologia do ciclo estral da gata.
18

Fonte: RANGEL, 2018

3.2 PIOMETRA
A piometra é um processo inflamatório do útero, que na cadela e nas gatas
ocorre com maior frequência na fase de diestro, período em que a concentração sérica
de progesterona está fisiologicamente mais elevada. É caracterizada pelo acúmulo de
secreção purulenta no lúmen uterino, proveniente da HEC, que sempre está associada
à infecção bacteriana. Esta patologia é mediada principalmente pelo desequilíbrio
hormonal em que o endométrio é exposto à atividade exagerada e anormal ao estímulo
crônico e repetido da progesterona. A administração de progestágenos exógenos
podem ainda, favorecer a instalação da HEC, o que explica o aumento da incidência
de piometra em animais que recebem estes fármacos durante o diestro (AMORIM,
2015; BARNI, 2012; FELDMAN, 2004).
Uma vez que as alterações no útero são acarretadas, as bactérias se tornam
coadjuvantes do processo, havendo a instalação do processo infeccioso. Os animais
podem apresentar a piometra de maneira aberta ou fechada, de acordo com a patência
da cérvix, a forma de apresentação influencia grandemente na severidade da doença,
diagnóstico, prognóstico e no tratamento a ser realizado (AMORIM, 2015; BARNI,
2012; CONRADO, 2009; GÜLLICH, 2015; FELDMAN, 2004; JUNIOR, 2019).
A piometra aberta é caracterizada pelo extravasamento do exsudato purulento
presente no útero pela vagina, correndo menos riscos de ruptura uterina, visto que o
órgão não apresentará distensão em demasia. Em contrapartida, a oclusão da cérvix na
piometra fechada não permitirá essa drenagem, apresentando distensão exagerada do
útero pelo acúmulo de fluido, consequentemente tornando a parede uterina mais fina,
aumentando as chances de ruptura e extravasamento da secreção infectada para a
19

cavidade abdominal, elevando as chances de sepse na piometra fechada. A piometra


fechada geralmente é diagnosticada tardiamente devido à ausência de secreção na
região vaginal, e as fêmeas acabam por apresentar mais danos sistêmicos pelo tempo
de reabsorção das toxinas provenientes da infecção bacteriana (SERRADO, 2021).

3.2.1 Fisiopatologia

Como explanado anteriormente, o período de diestro concentra maiores níveis de


progesterona no organismo da fêmea. A progesterona, por sua vez, influencia
consideravelmente o endométrio uterino, estimulando o crescimento e secreção pelas
glândulas endometriais, instaurando a HEC à medida que o lúmen uterino acumula fluidos
provenientes deste processo. Além disso, a progesterona afeta a resposta dos leucócitos à
instalação de agentes infecciosos no útero e reduz a contratilidade do miométrio. Em vista
disso, o útero torna-se um ambiente favorável para a colonização de bactérias, geralmente
provenientes do trato geniturinário (CONRADO, 2009; NELSON E COUTO, 2015).
A figura 2 a seguir resume de forma esquemática a fisiologia patológica da piometra.

Figura 2 – fisiopatologia da HEC/Piometra.


20

Fonte: HAGMAN, 2004

Esta enfermidade tem menor ocorrência em gatas, visto que elas precisam copular para
induzir a ovulação, desenvolver o corpo lúteo para assim produzir e secretar a progesterona.
Não obstante, pode-se ocorrer a ovulação espontânea, aumentando a probabilidade de
desenvolver a HEC em fêmeas não prenhe. Pontua-se, ainda, que há uma relação considerável
entre o início dos sinais clínicos da piometra e o cio recente em cadelas e gatas (AMORIM,
2015; NELSON E COUTO 2015).
Portanto, em termos fisiológicos, a piometra pode instaurar-se em função de mudanças
hormonais ocorridas naturalmente ao longo do ciclo estral, podendo acentuar as chances de
ocorrência da doença em fêmeas senis e nulíparas, pois os efeitos são acumulativos ao longo
de repetidos ciclos estrais (CONRADO, 2009; SERRADO, 2021).
Ademais, de maneira exógena, a utilização de fármacos progestágenos com finalidade
de inibir o cio, evitar a gestação ou por fins terapêuticos, podem influenciar no aumento da
incidência de piometra em gatas, já que envolvem os mesmos mecanismos de ação da
progesterona produzida pelo organismo, reproduzindo o processo de desenvolvimento da
piometra descrito anteriormente (FERNANDES, 2020; SERRADO, 2021).
21

3.2.2 Etiologia

Os eventos desencadeados pelo processo endócrino supracitado, culminam em um


ambiente propício para a proliferação de bactérias provenientes do trato geniturinário e região
perianal da fêmea, em virtude do acúmulo de secreção no lúmen uterino e inibição da resposta
leucocitária. A Escherichia coli está presente na flora normal, e é o principal agente etiológico
isolado do conteúdo uterino na piometra, cerca de 90% dos casos. No mais, outros
microrganismos podem ser isolados, em menor frequência, a exemplo de Streptococcus sp,
Staphylococcus sp e Klebisiella sp (CONRADO, 2009; MARTINS, 2007).
Embora não haja estudos que comprovem a correlação entre o agente etiológico e a
gravidade dos sinais clínicos, observa-se que úteros infectados por cepas de E. coli
apresentavam lesões mais graves, pois esta possui o fator citotóxico necrosante 1 (CNF 1), um
importante mecanismo de virulência da bactéria em questão. Ainda, as endotoxinas são
desprendidas para a circulação sanguínea durante o crescimento e morte de bactérias gram-
negativas, elas são capazes de estimular consideravelmente a síntese de prostaglandinas,
principalmente a PgE2, contribuindo para a imunossupressão do útero durante o diestro, essas
endotoxinas são também responsáveis pelos sinais sistêmicos da doença. Clinicamente, além
do aspecto grave da lesão, nota-se um exsudato espesso, fétido, viscoso, opaco e de coloração
vermelho-amarronzado quando o útero possui infecção por de E. coli (JUNIOR, 2019;
MACHADO, 2017; PADILHA, 2010; SAPIN et al., 2017).

3.2.3 Sinais Clínicos

O tipo de piometra apresentada irá influenciar diretamente os sinais clínicos


manifestados pelo animal, levando-se em consideração a piometra aberta ou fechada,
que é influenciada e caracterizada de acordo com patência da cérvix. Na piometra
aberta, há a presença típica de secreção sanguinolenta a mucopurulenta advinda da
vagina, observada geralmente no período de quatro a oito semanas após o estro, o
animal também pode apresentar sinais clínicos como letargia, depressão, anorexia,
vômito e diarreia (AMORIM, 2015; BARNI, 2012; FELDMAN, 2004).
Já na piometra fechada, observa-se, com maior ênfase, a distensão abdominal e
útero aumentado de tamanho, além de sinais clínico como: depressão, letargia,
inapetência, polidipsia com ou sem poliúria, desidratação e perda de peso. Nesta
22

última, por não haver secreção purulenta sendo liberada, dificulta o diagnóstico em
tempo hábil, aumentando os riscos de o animal vir a óbito devido ao choque séptico e
possível rompimento do útero (AMORIM, 2015; BARNI, 2012; FELDMAN, 2004).

3.2.4 Diagnóstico

O diagnóstico pode ser dado com base na anamnese, sinais clínicos e exames
complementares. A suspeita deve ser levada em consideração em qualquer gata que não tenha
sido esterilizada, que receba a administração de inibidores de cio, que apresente sinais clínicos
e achados laboratoriais compatíveis com a afecção. Os exames mais utilizados na rotina
clínica são hemograma e ultrassonografia. No hemograma, é comum observar leucocitose,
neutrofilia absoluta com graus variados de imaturidade celular, hipoproteinemia e
hiperglobulinemia, além de anemia, decorrente do processo inflamatório crônico
(BIGLIARDI et al., 2004; FELDMAN, 2004).
O exame de imagem permite avaliar o tamanho do útero, dimensionando o órgão e a
iminência de um possível rompimento da estrutura uterina, principalmente na piometra do
tipo fechada. Além disso, é possível avaliar a integridade do endométrio, espessura da parede
uterina e as glândulas endometriais císticas. A ultrassonografia é imprescindível na avaliação
do conteúdo uterino, a presença de acúmulo de líquido no lúmen, também é possível
diferenciar a piometra de um útero gravídico, viabilizando o diagnóstico independentemente
do tipo de piometra, aberta ou fechada (GÜLLICH, 2015; SILVEIRA, 2007).

3.2.5 Tratamento

O tratamento mais indicado é o cirúrgico, após estabilizar o quadro do animal


por meio do tratamento clínico que envolve fluidoterapia intravenosa,
antibioticoterapia e glicocorticoides. Utiliza-se a técnica cirúrgica de ovário-
histerectomia (OH) para retirar os ovários e o útero, inviabilizando assim, os riscos de
infecções uterinas futuras (AMORIM, 2015).
Em casos de piometra de cérvix aberta, o médico veterinário pode optar pela
utilização de antibióticos e prostaglandinas no tratamento, de forma natural com a
PGF2α ou sintética com o cloprostenol. Estes compostos lipídicos possuemtpotencial
efeito sobre o estímulo da motilidade uterina em cadelas e gatas, aumentando a
pressão uterina em virtude do efeito miotônico promovido. O conteúdo presente no
23

útero movimenta-se então em direção à cérvix, devido a distribuição de receptores de


prostaglandina no miométrio, promovendo o esvaziamento do conteúdo uterino. Por
outro lado, em casos de piometra de cérvix fechada, o tratamento com PGF2α não é
recomendado, tendo em vista que a contratilidade acentuada do miométrio pode
ocasionar a ruptura uterina ou provocar uma peritonite secundária, devido ao
extravasamento de exsudato purulento pelo oviduto (AMORIM, 2015; NELSON E
COUTO, 2015).

3.3 ADMINISTRAÇÃO DE CONTRACEPTIVOS

A administração de contraceptivos é um dos métodos mais utilizados para


diminuir a superpopulação de gatos no Brasil e no mundo, devido ser acessível,
facilmente encontrado e de baixo custo. São representados principalmente por
progestágenos, acetado de medroxiprogesterona, acetato de megestrol e a poligestona,
que são derivados sintéticos da progesterona, administrados de forma oral ou
parenteral, com a finalidade de prevenir ou inibir o cio. (ARAÚJO et al., 2016;
SOUZA et al., 2014).
Os derivados sintéticos da progesterona, são fármacos de atividade prolongada,
que inibem ou diminuem a liberação de Hormônio Liberador de Gonadotrofina
(GnRH), inibindo a secreção do Hormônio Luteinizante (LH) e Hormônio Folículo
Estimulante (FSH), inviabilizando o crescimento, maturação do folículo ovariano e
ovulação, consequentemente inibindo o estro. Quando utilizados de forma
indiscriminada, por mínima que seja a dose, podem causar diversas reações adversas,
tais como o aumento de peso, diabetes, hiperplasia mamária, neoplasia mamária,
hiperplasia endometrial cística e piometra. (ARAÚJO et al., 2016; FERNANDES et
al., 2020; ROMAGNOLI, 2003).
Uma resposta a progesterona exógena que seja exagerada, prolongada ou
inadequada, resultará numa Hiperplasia Endometrial Cística (HEC), com acúmulo de
líquido no interior das glândulas endometriais e lúmen uterino, deixando o útero, desta
forma, mais susceptível a infecção bacteriana secundária e consequente piometra. Os
animais com piometra exibem 100% de HEC, demonstrando a correlação da mesma,
com a piometra (OLIVEIRA, et al., 2008).
A incidência do desenvolvimento da piometra em cadelas pode ser até três
vezes maior do que em gatas, isso porque as fêmeas caninas normalmente apresentam
24

uma fase lútea mais longa, e as felinas só apresentam essa fase quando são induzidas a
ovular. No entanto, a administração de contraceptivos progestágenos podem predispor
o aparecimento da infecção uterina e elevar a incidência da afecção na gata. É sabido
que a progesterona além de propiciar o acúmulo de líquido uterino, suprime a
atividade do miométrio e administração de inibidores de cio, principalmente no estro e
diestro, aumenta os riscos de tal cenário e instalação da piometra (FEELDAN, 2004;
MACHADO, 2017).

3. 4 Cultura e Antibiograma

Isolar o microrganismo presente na infecção uterina é um importante


instrumento para direcionar o tratamento posterior à cirurgia, garantindo uma melhor
resposta do paciente frente a nocividade do quadro infeccioso instaurado pela
piometra, para isto realiza-se o exame de cultura bacteriana. A primícia do exame é a
coleta do conteúdo presente no útero, utilizando um swab e 5 ml da secreção para
depositar no meio de cultura. A amostra é então semeada por meio do método de
esgotamento em Ágar sangue e Ágar MacKonkey, mantendo-a incubada a 37ºC por 48
horas. Após o crescimento da cultura bacteriana, faz-se a preparação do esfregaço em
lâmina para análise morfotintorial, bioquímica e sorológica, a fim de caracterizar o
gênero e espécie da bactéria isolada (BARELLA et al., 2018; PASSOS et al., 2016).
A técnica de coloração de Gram é utilizada para diferenciar Gram-positivas e
Gram-negativas, aplicando agentes químicos cristal violeta, lugol, álcool-acetona e
fucsina básica. A E. coli é uma bactéria qualificada como bacilos Gram-negativos,
anaeróbicos facultativos e não esporulados. Por fim, realiza-se os testes em meio de
Tríplice Açúcar Ferro (TAF ou TSI), cujo objetivo é diferenciar o gênero da
enterobactéria analisada e discernir esta família de outros bacilos Gram-negativos.
Esta diferenciação é feita em virtude da distinção na fermentação dos carboidratos
presentes no meio e da produção de sulfureto de hidrogênio (BARELLA et al., 2018;
JERICÓ, 2015; PASSOS et al., 2016).
O antibiograma é um teste importante para orientar o médico veterinário na
terapêutica, sendo elaborada de forma direcionada a fim de minimizar a seleção e a
dispersão de agentes resistentes, também aumentando a eficácia do tratamento. Após
isolar a bactéria em questão, realiza-se testes de sensibilidade do microrganismo aos
fármacos antimicrobianos por meio do método Kirby-Bauer (disco-difusão), este é o
25

método mais utilizado, embora se utilize outros, como: E-test, Sistema Vitek (Bio-
Meriuex) e diluição seriada. O método de disco-difusão consiste na deposição de
discos de papel impregnados com antibiótico sobre a superfície do Ágar já semeado,
de forma uniforme. Ocorrerá a difusão do antibiótico no meio de cultura, formando
um gradiente de concentração ao redor dele, o material é então levado para incubação.
Em seguida, observa-se a formação ou não de halo de inibição, medindo o diâmetro
em mm e correlacionando o halo de inibição com a sensibilidade ou resistência do
microrganismo analisado, isto é feito comparando os diâmetros anotados a partir da
tabela de valores preconizados pelo CLSI (Clinical & Laboratory Standard Institute),
classificando a bactéria como sensível, intermediária ou resistente ao antimicrobiano
testado (PADILHA, 2010; PASSOS et al., 2016).

4. RELATO DE CASO

Uma gata de aproximadamente 2 anos, sem raça definida, pesando 3,300 kg,
foi levada para atendimento veterinário no dia 04/08/2021. Durante a anamnese a
tutora informou que administrava Inibidex injetável (Acetato de Medroxiprogesterona)
em seu animal, e relatou que meses atrás notou a distensão abdominal da gata, porém,
em suas palavras, a barriga “secou após soltar uma secreção podre” pela vulva. A
queixa principal durante o atendimento era de que a gata estava apresentando aumento
da região abdominal novamente, e que se iniciou após uma nova aplicação do inibidor
de cio há cerca de 3 meses. O animal havia reduzido a frequência e quantidade da
alimentação, porém estava urinando e defecando normalmente. No exame físico
constatou-se uma quantidade considerável de secreção purulenta na região vaginal da
paciente. A tutora optou por não realizar tratamento parenteral no consultório. A
médica veterinária julgou melhor iniciar um tratamento paliativo antes dos resultados
do hemograma, foram prescritas as seguintes medicações orais: PetSporin 75 mg (1
comp/BID/7dias), Meloxicam 0,5 mg (1 comp/SID/5 dias), Glicopan pet (2,5
ml/BID/10 dias), Dipirona gotas 500mg/ml (5 gotas/TID/4 dias).
Ainda durante o atendimento, realizou-se coleta de amostra de sangue para
hemograma, os resultados estão dispostos na tabela 1 a seguir.
ERITROGRAMA RESULTADO REFERÊNCIA

Hemácias 7,02 (milhões/mm³) 5,5 – 10,0 (milhões/mm³)


26

Hemoglobina 12,1 (g/dL) 8,0 – 14,0 (g/dL)


Hematócrito* 44,6 % 24,0 – 45,0 %
V. C. M.* 63,5 fL 39,0 – 55,0 fL
H. C. M. 17,2 pg 13,0 – 18,0 pg
C. H. C. M. 27,1 % 31,0 – 35,0 %
LEUCOGRAMA

Leucócitos totais* 76,3 (mil/mm³) 5,5 – 19,5 (mil/mm³)


Bastonetes* 9 % (6.867/mm³) 0 – 3 % (0 – 300/mm³)
Segmentados 36 % (27.468/mm³) 60 – 77 % (3.000 - 11.800)
Basófilos* 2 % (1.526/mm³) 0 – 1 % (0 – 170)
Eosinófilos* 43 % (32.809/mm³) 2 – 12 % (60 – 1.250)
Linfócitos típicos 8 % (6.104/mm³) 12 – 30 % (1.000 - 4.800)
Linfócitos Reativos 0% (0/mm³) 0%
Monócitos 1 % (763/mm³) 3 – 10% (60 – 1.300)
PLAQUETOGRAMA

Plaquetas* 185 (mil/m³) 200 – 800 (mil/m³)


Observações: 20 % eosinófilos em bastão; alterações tóxicas +; macroplaquetas +++
Tabela 1 - Resultados do hemograma do paciente
Os resultados do hemograma foram liberados pelo laboratório no dia
05/08/2021. Verificou-se algumas alterações significativas que corroboraram com a
suspeita de piometra no animal. No eritrograma, observou-se hematócrito próximo ao
limite máximo e V. C. M. elevado. No leucograma, notou-se leucocitose acentuada,
com neutrofilia e desvio a esquerda. Verificou-se também leve trombocitopenia com
agregados plaquetários. Atentando para os achados pontuados pelo laboratório: 20%
eosinófilos em bastão, macroplaquetas e presença de alterações tóxicas.
O animal foi encaminhado para realizar a cirurgia de ovário-histerectomia,
porém devido as condições financeiras da tutora e a urgência do caso, a mesma não
pôde pagar o exame de ultrassonograma para o pré-operatório, em razão do valor da
cirurgia a ser paga. O procedimento cirúrgico foi agendado para o dia 10/08/2021.
No dia do procedimento a gata apresentava diâmetro abdominal aumentado. Ao
realizar a cirurgia foi removida a estrutura uterina repleta de fluido, pesando
aproximadamente 1,800 kg, representando cerca de 54% do peso total do animal antes
do procedimento cirúrgico. Ao encerrar e liberar a paciente do centro cirúrgico,
27

esvaziou-se o conteúdo presente no útero, observou-se que a secreção possuía odor


fétido e coloração amarronzada com presença de sangue. Foi coletado amostra com
swab para exame de cultura e antibiograma.
A gata obteve um pós-operatório sem intercorrências, o antibiótico receitado
após a cirurgia foi Amoxicilina + Ácido Clavulânico. A paciente retornou para
retirada de ponto após 10 dias da cirurgia.
As imagens a seguir são registros do diâmetro abdominal da paciente no dia da
cirurgia, da pesagem do útero com piometra e da retirada do conteúdo intrauterino
com exsudato purulento amarronzado com presença de sangue.

Figura 3 - Diâmetro abdominal da paciente: aproximadamente 52 cm

Fonte: arquivo pessoal


28

Figura 4 – Peso do útero da gata com piometra

Fonte: arquivo pessoal

Figura 5 – Conteúdo intrauterino da gata com piometra


29

Fonte: arquivo pessoal

Figura 6 – Exsudato purulento de coloração amarronzada com presença de


sangue

Fonte: arquivo pessoal

Na cultura bacteriana o microrganismo isolado foi a Escherichia coli,


ratificando os aspectos do exsudato observados no dia da cirurgia com os citados na
literatura. No antibiograma, foi constatado que a bactéria apresentava resistência a 4
antibióticos, sensibilidade a 5 e sensibilidade intermediária (sensível aumentando a
exposição) a 1. Os resultados estão dispostos na tabela 2 a seguir.
ANTIMICROBIANO PONTÂNCIA DOS RESULTADO
DISCOS µg
Amoxicilina + Ác. 30 Sensível
Clavulânico
Aztreonam 30 Sensível
Ampicilina 10 Resistente
Ciprofloxacina 05 Resistente
Cloranfenicol 30 Sensível
30

Gentamicina 10 Resistente
Levofloxacina 05 Resistente
Meropenem 10 Intermediário
Tetraciclina 30 Sensível
Sulfametoxazol + 25 Sensível
Trimetoprim
Tabela 2 – Resultados de antibiograma da amostra de conteúdo uterino da paciente

5. DISCUSSÃO
O animal relatado é uma gata jovem, de aproximadamente 2 anos, embora as
chances de ocorrência de piometra em felinas domésticas jovens sejam relativamente
baixas em comparação as cadelas, a gata em questão recebeu sucessivas aplicações de
acetato de medroxiprogesterona, predispondo o desenvolvimento da doença, como
afirmado por Machado (2017).
A presença de secreção purulenta na região vaginal indica que a cérvix do
animal encontra-se aberta, portanto, como citado por Amorim (2015) e Barni (2012),
classifica-se como uma piometra aberta, ainda, o sinal clínico de diminuição de apetite
é condizente com os sinais clínicos relatados pelos autores. A poliúria e diarreia em
gatas não é um sinal comumente observado, segundo Mateus & Eilts (2010), a
31

prevalência é de 9% e 16%, respectivamente. Portanto, a paciente mesmo não


apresentando esses sinais, permaneceu sob suspeita de piometra.
A leucocitose acentuada, com neutrofilia e desvio a esquerda constatada no
hemograma é o achados mais comum em piometra em gatas de acordo com Barni
(2012), em vista disso, optou-se por manter o tratamento oral com o intuito de atenuar
a infecção e encaminhar o animal para a cirurgia de ovário-histerectomia, indicada
como o tratamento de eleição pela maioria dos autores.
Embora a distensão abdominal seja uma característica prevalente na piometra
fechada, verificou-se um acúmulo inabitual de líquido no útero da paciente em
questão, expandindo a região abdominal, apesar da liberação de secreção vaginal. Fato
esse constatado apenas no dia da cirurgia, pois não foi feito exame de imagem como a
ultrassom.
O isolamento de Escherichia coli no exame de cultura bacteriana reitera o que
autores como Fernandes (2020) e Martins (2007) alegam a respeito da prevalência de
E. coli em até 90% dos casos de piometra. O acometimento por esta bactéria também
pode estar associado ao uso do contraceptivo progestágeno, visto que o microrganismo
está presente na floral vaginal. Como explicado por Fernandes (2020), o útero
encontra-se altamente exposto à progesterona aplicada, em consequência disso, uma
deficiente resposta leucocitária, favorecendo a infecção pelo agente que chega ao
órgão por via ascendente.
Em relação ao resultado do antibiograma, não há disseminação de estudos
estatísticos em relação ao resultado em felinos para que seja feito um comparativo no
presente trabalho. Voltando para o resultado da paciente, verifica-se que a bactéria é
resistente à uma porcentagem considerável dos antibióticos testados. No mais, o
antimicrobiano escolhido para o tratamento pós cirúrgico foi escolhido
adequadamente.
O caso relatado não condiz em parte com o consenso entre os autores a respeito
da importância de exames de imagem para o diagnóstico da piometra, pois é pertinente
que haja o diagnóstico diferencial de prenhez e avaliação do útero enfermo, além dos
sinais clínicos observados. Porém, as questões financeiras da tutora e o quadro clínico
da gata motivaram a realização do procedimento cirúrgico sem ter feito o exame.
32

6. CONCLUSÃO
Em conclusão, a piometra é uma doença multifatorial de importância na rotina
clínica de pequenos animais. A ocorrência em gatas muitas vezes se dá pela
administração de inibidores de cio, predispondo uma infecção que em condições
naturais teriam menores chances de ocorrer, tendo em vista seu ciclo estral. Em suma,
o caso de piometra felina relatado reitera o que é descrito na literatura quanto aos
sinais clínicos característicos, aspectos do exsudato da infecção uterina por E. coli e
resultados dos exames realizados, e reforça que o uso indiscriminado de inibidores
hormonais de cio é danoso à saúde das fêmeas domésticas.

7. REFERÊNCIAS

AMORIM, Thábata Priscila Rocha Nunes. Casuística de piometra em caninos e felinos


atendidos no Hospital Veterinário da Universidade Federal de Campina Grande, Campus de
Patos-PB, durante o período de 2010 a 2014. 2015.
33

ARAÚJO, Estéfane Kelly Dias et al. Principais patologias relacionadas aos efeitos adversos
do uso de fármacos contraceptivos em gatas. Pubvet, v. 11, p. 207-312, 2016.
BARNI, Brunna de Souza. Hiperplasia endometrial cística em cadelas e gatas. 2012.
BIGLIARDI, E. et. al. (2004). Ultrasonography and Cystic HyperplasiaPyometra
Complex in the Bitch. Reproduction in Domestic Animals, 39(3), p. 136–140.
CONRADO, Francisco de Oliveira. Aspectos clínico-patológicos da piometra. 2009.
DA SILVA, Lúcia Daniel Machado. Considerações sobre a reprodução da gata. Ciência
Animal, v. 30, n. 4, p. 57-69, 2020.
DUKES, H. Fisiologia Dos Animais Domésticos. 13 ed. São Paulo:Guanabara Koogan.,1594
p., 2017.
FELDMAN, E. C. O complexo hiperplasia endometrial cística/piometra e infertilidade em
cadelas. ETTINGER, SJ; FELDMAN, EC Tratado de medicina interna veterinária:
doenças do cão e do gato, v. 5, p. 1632-1649, 2004.
FELDMAN, E.C.; NELSON, R.W. Canine and Feline Endocrinology and Reproduction.
3rd ed. Missouri: Saunders, 2004. 1089p.
FERNANDES, Eglesia Rodrigues Leite; COSTA, Tairine Melo; LEITE, D. F. S. S. Uso de
fármacos contraceptivos e seus efeitos colaterais em cães e gato: Revisão de
literatura. Revista Científica de Medicina Veterinária, v. 15, n. 34, p. 1-14, 2020.
GIMÉNEZ, F. et al. Fisiología reproductiva y control de los ciclos estrales en la gata
doméstica. Analecta Veterinaria, v. 26, 2006.
GÜLLICH, Bruna et al. Piometra em gata diagnosticado através de ultra-sonografia
abdominal - relato de caso. XX seminário interinstitucional de ensino, pesquisa e extensão.
Unicruz. 2015.
JERICÓ, Márcia Marques. Tratado de medicina interna de cães e gatos / Márcia Marques
Jericó, Márcia Mery Kogika, João Pedro de Andrade Neto. - 1. ed. P. 2615 – 2625. (2015).
JOHNSTON, S.D; ROOT-KUSTRITZ, M.V; OLSON, P.N.S. Canine and Feline
Theriogenology. 1a ed., Philadelphia: W.B. Saunders Company, 2001. 591p.
JUNIOR, Pedro Bona. Complexo Hiperplasia Endometrial Cística Diagnóstico e
tratamento. Revista Científica Multidisciplinar Núcleo do Conhecimento. Ano 04, Ed. 07,
Vol. 05, pp. 100-108. Julho de 2019.
KLEIN, B. Cunningham Tratado de Fisiologia Veterinária. 5 ed. São Paulo:
Guanabara Koogan. 1619 p., 2014.
KUTZLER, M.A. Estrus induction and synchonization in canids and felids.
Theriogenology, v.68, n.3, p.354-374, 2007.
LITTLE, S. E. Feline Reproduction and Pediatrics: feline reproduction. The Cat: Clinical
Medicine and Management. Ottawa: Saunders Elsevier, 2011. Cap. 8.p. 1195-1226
MACHADO, Inês Fernandes. Piómetra na cadela e na gata: diferenças e semelhanças.
2017. Tese de Doutorado. Universidade de Lisboa (Portugal).
34

MARTINS, Danilo Gama. Complexo hiperplasia endometrial cística/piometra em


cadelas: fisiopatogenia, características clínicas e laboratoriais e abordagem terapêutica.
2007.
NELSON, Richard W. (Richard William), C. Guillermo Couto, 1953. Medicina interna de
pequenos animais. Tradução: Cintia Raquel Bombardieri, Marcella de Melo Silva et. al. 5.
Ed – Rio de Janeiro: Elsevier. 2015.
OLIVEIRA, P.C. et al. Avaliação histológica e hormonal de cadelas normais e com
complexo hiperplasia endometrial cística/piometra Vet. e Zootec. V.15,n.1, 2008,p 150-
159.
PADILHA, Luciana Cristina. Análise do perfil bioquímico e hematológico em fêmeas
caninas acometidas por piometra e cultura e antibiograma do conteúdo intrauterino.
2010.
ROMAGNOLI, S. Clinical approach to infertility in the queen.Journal of Feline
Medicine and Surgery, v.5, p.143-146, 2003.
SANTOS, Roberta Ramos dos. Aspectos da foliculogênese em gatas domésticas (Felis
catus). 2022.
SAPIN, Carolina et al. Patologias do sistema genital feminino de cães e gatos. Science and
Animal Health, v. 5, n. 1, p. 35-56, 2017.
SILVEIRA, Daniele da Silva et al. Piometra em caninos e felinos: perfil leucocitário,
prevalência nas espécies e sinais clínicos. In: congresso de iniciação científicapesquisa e
responsabilidade ambiental. 2007.
SILVA, E. Fisiologia do Ciclo Estral dos Animais Domésticos. E-book., p.6., 2020.
SERRADO, Fernanda Camardelli. Influência dos contraceptivos na ocorrência de piometra e
o curso da enfermidade. 2021.
SOUZA, J.P.M, et al. Uso de contraceptivos de origem hormonal e quadro
hematológico na incidência da piometra canina. Vet. e Zootec. 2014 jun.; 21(2): 275-
278.

Você também pode gostar