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Apontamentos sobre a

Igreja de Tabuado, Marco de


Canaveses
João Rebuge*

RESUMO ABSTRACT
Neste texto enfoca-se aspetos esquecidos da his- In this paper the focus is in forgotten elements of the
tória de Tabuado, freguesia na qual se implanta a history of Tabuado, parish where the Parish Church
Igreja Paroquial do Salvador de Tabuado, classi- of the Saviour of Tabuado is implanted, classified
ficada como Imóvel de Interesse Público. Cons- by the Portuguese State as a Public Interest Build-
truída na transição entre o românico e o gótico, ing. Built in the transition between the Roman-
tem características arquitetónicas distintivas. esque and the Gothic, this Church has distinctive
Pretende-se recordar elementos arquitetónicos characteristics. It aims to remind us of architectur-
entretanto desaparecidos. Com esse fim, apresen- al features that meanwhile where destroyed, by the
ta-se uma releitura das Memórias Paroquiais de 1960’s, with the historical restoration developed by
1758. Na confrontação da leitura com elementos the General Directorate for Buildings and National
fotográficos existentes no Sistema de Informa- Monuments. With that in purpose a new reading of
ção para o Património Arquitetónico foi possível the parish memories of 1758 is presented. Between
identificar um Carneiro, cripta de inumação, sob a the reading of the information contained in that
capela-mor desta Igreja. Esta estrutura foi conde- document, and of the photos existing in the Portu-
nada pela intervenção da Direção-Geral dos Edi- guese Information System for the Built Heritage,
fícios e Monumentos Nacionais. it was possible to identify a funerary crypt, under-
neath the main chapel of this Church.

PALAVRAS-CHAVE KEYWORDS
Tabuado; Memórias Paroquiais de 1758; Igreja Pa- Tabuado; parish memories of 1758; Parish Church
roquial do Salvador de Tabuado; família padroei- of the Saviour of Tabuado; patroness family; fune-
ra; prática funerária em Carneiro. rary structure.

* Arqueólogo. Colaborador do Gabinete de Património e


Arqueologia da Câmara Municipal de Lousada.

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1. INTRODUÇÃO

Inicia-se o presente artigo pelo questionário referente às chamadas Memórias Paro-


quiais de 1758, decorrentes do terramoto de 1755, pois este é o evento que marca a época
e o que leva o Marquês de Pombal a inquirir sobre a situação de Portugal. Apresenta-
-se, em seguida, a proposta de transcrição da resposta do pároco de Tabuado à época,
o abade Alberto de Almeida de Azevedo e Vasconcelos. Essa resposta está datada de
dia 20 de abril de 1758. Consultou-se a transcrição realizada por José Viriato Capela,
Henrique Matos e Rogério Borralheiro (2009, pp. 410-411). No entanto, procedeu-se a
uma nova transcrição, “de acordo” com o documento original e, posteriormente, pro-
curou-se passar o texto para uma leitura mais atualizada do mesmo, tendo em atenção
o trabalho agora realizado e tendo como referência a obra atrás referida, dada a sua
atualidade e correção.
Em seguida, procede-se à transcrição do documento1 no qual se encontram as res-
postas do pároco de Tabuado à data. Este documento servirá como meio de fundamen-
tação do restante artigo. No entanto, recrutam-se outros elementos, quando se demons-
tram justificados.

2. FORMULAÇÃO DA I PARTE DO INQUÉRITO

Aqui apenas se transcreve a I Parte, porque, como se pode observar abaixo, é apenas
às primeiras vinte e sete questões que o pároco do couto de Tabuado atribui neces-
sidade de responder, ou seja, à primeira parte do Inquérito. Decisão justificada pelas
características que este atribui à orografia da paróquia, a qual tutela. Estas servirão
de justificação para não responder tanto às questões da II Parte, como da III Parte.
A II Parte respeitava às “Serras”, com treze perguntas, e a III Parte aos “Rios”, com
vinte questões. Mas, reitera-se, como se mencionou atrás, que apenas no que concerne
à “Terra”, parte com vinte e sete perguntas, o abade encontrará justificação para res-
ponder. Assim, transcrevem-se as perguntas constantes dessa secção do Inquérito, para
uma melhor contextualização das respostas.

3. I PARTE: O QUE SE PROCURA SABER DA TERRA

1. Em que província fica, a que bispado, comarca, termo e freguesia pertence.


2. Se é d’el-Rei, ou de donatário, e quem o é ao presente.
3. Quantos vizinhos tem, e o número de pessoas.
4. Se está situada em campina, vale, ou monte e que povoações se descobrem
dela, e quanto distam.

1
[S.a.], 1722-1832. Memórias Paroquiais. Dicionário geográfico de Portugal, Tomo 36, T 1. Tabuado, Gouveia de
Riba Tâmega. [manuscrito digitalizado]. Lisboa: Arquivo Nacional – Torre do Tombo. Acessível em: <https://
digitarq.arquivos.pt/details?id=4241809> [Consultado em 13 de setembro de 2017].

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JOÃO REBUGE | APONTAMENTOS SOBRE A IGREJA DE TABUADO, MARCO DE CANAVESES

5. Se tem termo seu, que lugares, ou aldeias compreende, como se chamam,


e quantos vizinhos tem.

6. Se a Paróquia está fora do lugar, ou dentro dele, e quantos lugares, ou al-


deias tem a freguesia, e todos pelos seus nomes.

7. Qual é o seu orago, quantos altares tem, e de que santos, quantas naves
tem; se tem Irmandades, quantas e de que santos.

8. Se o Pároco é cura, vigário, ou reitor, ou prior, ou abade, e de que apresen-


tação é, e que renda tem.

9. Se tem beneficiados, quantos, e que renda tem, e quem os apresenta.

10. Se tem conventos, e de que religiosos, ou religiosas, e quem são os seus


padroeiros.

11. Se tem hospital, quem o administra e que renda tem.

12. Se tem casa de Misericórdia, e qual foi a sua origem, e que renda tem; e o
que houver de notável em qualquer destas coisas.

13. Se tem algumas ermidas, e de que santos, e se estão dentro ou fora do lu-
gar, e a quem pertencem.

14. Se acode a elas romagem, sempre, ou em alguns dias do ano, e quais são
estes.

15. Quais são os frutos da terra que os moradores recolhem com maior abun-
dância.

16. Se tem juiz ordinário, etc., câmara, ou se está sujeita ao governo das justi-
ças de outra terra, e qual é esta.

17. Se é couto, cabeça de concelho, honra ou beetria.

18. Se há memória de que florescessem, ou dela saíssem, alguns homens in-


signes por virtudes, letras ou armas.

19. Se tem feira, e em que dias, e quanto dura, se é franca ou cativa.

20. Se tem correio, e em que dias da semana chega, e parte; e, se o não tem, de
que correio se serve, e quanto dista a terra aonde ele chega.

21. Quanto dista da cidade capital do bispado, e quanto de Lisboa, capital do


Reino.

22. Se tem algum privilégio, antiguidades, ou outras coisas dignas de memó-


ria.

23. Se há na terra, ou perto dela alguma fonte, ou lagoa célebre, e se as suas


águas têm alguma especial virtude.

24. Se for porto de mar, descreva-se o sítio que tem por arte ou por natureza,
as embarcações que o frequentam e que pode admitir.

25. Se a terra for murada, diga-se a qualidade dos seus muros; se for praça de

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armas, descreva-se a sua fortificação. Se há nela, ou no seu distrito algum
castelo, ou torre antiga, e em que estado se acha ao presente.
26. Se padeceu alguma ruína no terramoto de 1755, e em quê, e se está repa-
rada.
27. E tudo o mais que houver digno de memória, de que não faça menção o
presente interrogatório.

4. TRANSCRIÇÃO DAS MEMÓRIAS PAROQUIAIS2

N. 5 [] 17
Taboado/
[…] Gouvea Sobre Tamega/
C es./
1. Em a provincia de Entre Dôuro,/ e Minho, no Bisp.º do Porto, Commarca/ de
Guimarães e ; termo do concelho de/ Gouvea Sima Tamega estâ situada/ a freguesia do
Salvador de Taboado/
2. Da terra desta freguesia saõ Donna-/tarios os Reverendos Abbades della/ por
Doaçoens do Primeiro Rey de Portu-/gal D. Affonso Henriques; e no tempo/ prezente
he Donnatario o Reverendo Ab-/bade Alberto de Almeyda Azevedo, e/ Vasconcellos
3. Tem esta freguesia cento e nove vezinhos/ duzentas e nove pessoas mayores e sin/
coenta e oito menores quazados foi o nu-/mero de trezentas e quarenta pessoas
4. Estâ situada em valles de circuito/ de huma legoa em redondo, naõ se desco-/
brem della mais povoaçois do que a rezi-/dencia, e parte da freguezia de Saõ Mar-/
tinho de Soalhaéns com q.e parte em distan/cia de meya legoa
5. Tem termo seu porque toda a freguezia he/ couto, e se compoem de quinze Aldeas
que com/prehende a mesma freguezia a Saber, Sancta/ Maria, Outeyro, Varzea, Sam
Thiago,/ Sam Mamede de Novois, Penna, Cazal,/ Canhoeñs, Vendas, Villa Nova, Pouza-
da,/ Caloura, Ladario, Quelhe e Cabo Villa./
[] a/
//
18
[]
a Aldea de Sancta Maria tem dezanove/ vezinhos, a Aldea de Outeyro tem deza-/
nove vezinhos, a Aldea da Varzea tem três/ a Aldea de Sam Thiago tem quatro vezi/

2
[S.a.], 1722-1832. Memórias Paroquiais. Dicionário geográfico de Portugal, Tomo 36, T 1. Tabuado, Gouveia de
Riba Tâmega. [manuscrito digitalizado]. Lisboa: Arquivo Nacional – Torre do Tombo. Acessível em: <https://
digitarq.arquivos.pt/details?id=4241809> [Consultado em 13 de setembro de 2017].

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nhos a de Sam Mamede tem tres vezinhos/ e a Aldea de Novois tem dous vezinhos/ a
da Penna hum só vezinho, a do Cazal/ dois a de Canhoeñs vinte e nove a das/ Vendas
tem sinco, a da Villa Nova dois/ a de Pouzada sinco a de Caloura dois/ a do Ladario seis
a Aldea de Quelhe/ Cabo Villa tem nove vezinhos; que a/ todos faz a conta de cento e
nove vezinho/ como se dice no 3.º asima

6. A parrochia estâ sepparada das Al-/deas: porem no meio da circonferencia/ del-


las, que todas Sam as que aSsima ficam/ denominadas e numeradas

7. O Orago desta Parrochia he o Salvador/ do mundo, tem quatro altares dos quoais/
hum he o mayor aonde está o SanctisSimo/ Sacramento no Sacrario com sua confra-/
ria, e a immagem do Salvador Padroeiro/ da freguezia, e tem mais o Menino Deos,/ e
Sancta Luzia, e dois colletrais hum de/ Nossa Senhora do Rozario com sua confra/ria;
outra de S.ta Anna e Sam Sebas-/tiam com sua confraria; e huma Cappella/

[] de//

[] 19

[]

de jezus dentro da mesma Igr.a com Sua/ confraria aonde se acha o Senhor da/ Ago-
nia; e a senhora do pes da Crus; êsta/ Cappella he do Padroeiro desta igreja/ que sam os
herdeiros do fidalgo Antonio/ Gonçallo Correa de Sousa Montenegro.

8. O Parocho he Abbade por apresenta/çaô. do dicto Antonio Gonçallo Padroeiro/


della e hoje o sam seus herderos e sobre/ qual delles o hâ de ser corre letigeo entre/
eles. Rende êsta Abbadea no tempo prezente/ p.a o Abbade quatrozentos mil reis.

9. Naõ tem Beneficiados alguñs.

10. Naõ tem Conventos.

11. Naõ tem Hospital.

12. Naô tem Caza de Misericordia.

13. Tem esta freguezia do Salvador de Taboado/ sette Cappellas, fora a que estâ den-
tro de nossa/ Igr.a de q.e já se foi mensam;/ junto ao Lu-/gar de S.ta Maria; estâ a Cappella
de/ S.ta Maria que deu nome áquella Al-/dea de Sancta Maria; he esta capella do/ Povo
desta dita freguezia; na Aldea da/ Varzea está outra Cappella de Nossa Sr.a/ do Pillar, e
he Cappella particular que/ pertence aos herd[…] do Ld.º Goncallo de Ma-/gallaes sita
a pê das Casas dos mesmos her-/deiros: Na Aldea de Sam Thiago estâ a/ Cappella de
Sam Thiago que hé particullar/ e dos herdeiros do dito Antonio Gonçallo de//

21

[]

de Sousa Correa Montenegro Padroeiro/ desta igr.a ou Parochia esta, sita perto das/
casas dos mesmos herdios; Na aldea de No-/vois estâ outra Cappella de S.ta Anna,/ que
tambem he particular da Caza que/ nesta Aldea tem os mesmos herdeiros do/ dito fi-
dalgo An.to Gonçallo Padroeiro des-/ta Parochia; Na Aldea do Cazal estâ/ outra Cappel-
la particullar da Caza do/ Rd.º Padre Maurio: Correa de Sousa/ Montenegro Sobrinho

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REVISTA OPPIDUM N.º 11 - 2018/2019

integitimo do mes-/mo fidalgo e Padroeiro; junto â Aldea/ do Ladario estâm duas


Cappellas sitas/ ao pé da estrada que vay p.a o Porto; hu-/ma he de S.to Antonio que
he do Povo/ da freguezia, e tem sua confraria das Al-/mas do Purgatorio de que he
orago o mês-/mo S.to Antonio e a outra he de S.to Ama-/ro que pertence aos Abbades
desta Paro-/chia

14. A dita Cappella de S.to Amaro tem Ro/mage de concurso no seu dia 15 de ja/
neiro; e em nenhuma das mais Cappellas/ asima ditas hâ Romage de concurso/ em
tempo algum.

15. Hê esta freguesia abundante de man-/timêntos, e de fructos que se colhem


em/ mais abundancia. Saõ Milho grosso,/ Centeyo, Feijoens, e vinho verde; e dos/
mais generos he diminuta a colheita tam-/bem dá boas fructas temporas. Casta-/
nhas, e landres e Azeyte//

21

[]

16. Tem esta frg.a e couto de Taboado juis or-/dinario que Conhece todo o civel e
or-/phons, e naô do crime; porque deste co-/nhece o juis do con.lo de Gouvea Sima
Ta/mega q.e tambem he juis ordinario que/ conhece do civel e crime no seu con.lo e/
neste coutto e nessa sua jurisdiçam na/ matr.a do crime taõ e som.te

17. He esta freguesia de Taboado couto que/ no crime está sujeito ao dito con.lo
de Gou-/vea em civel vaô as Appellações p.a/ o seu ouvidor e deste pr.a á Rellaçam/
do Porto, e naô he sujeito a outra ju-/risdiçam de fora, porque seu ouvidor he/ do
mesmo coutto.

18. Naô. se acordam os prezentes que desta/ freguezia florecem se varoens insig-
nes.

19. Naô tem feira alguma.

20. Naô há nesta terra Correio, e se serve/ do correio da Villa de Amarante ou/ da
Villa de Arrifana de Sousa; que/ ambas estas villas distam desta terra/ duas Legoas; e
lâ se vaô Lansar as/ cartas nas quintas fr.as, e se vaô. bus-/car nas Segundas feiras de
cada Sem-/mana.

21. Dista esta freguesia do coutto de Taboado/

[] da//

22

[]

Da Cid.de do Porto, qe he a cappital do/ Bisp.º nove legoas, e de Lisboa cessen-/


ta legoas.

22. Tem esta freguesia o Privilegio de se/ poder centar o Padroeiro della sendo/
Leigo na Cadeira ao Arco da Igr.a no Lu-/gar do Parocho, e nessa pessoa nam com/
penna de excomunhaõ; e tem toda a familia/ dos Montenegros Padroeiros desta Igr.a
o/ seu simiterio em Carneiro de Bacho/ da Cappella mayor da mesma Parrochia/ ou

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JOÃO REBUGE | APONTAMENTOS SOBRE A IGREJA DE TABUADO, MARCO DE CANAVESES

Igreja
23. Naô ha nesta terra nem lagoa celebre,/ nem de especial virtude nem nas suas/
vezinhansas, todas as fontes saô de boas/ e cristalinas. agoas de m.to bom gosto e/
salutíferas.
24. Naô tem porto de mar porque lhe fica dis-/tante nove legoas.
25. Achamse nesta terra duas torres anti-/guas huma na Aldea de Novois que/ he
dos Montenegros, outra na Aldea da Penna do fidalgo An.to de Vasconce-/llos; e se
acham ao presente semi ruina.
26. Naô padece esta terra ruina alguâ./ no terramoto do anno de 1755 serto que/ o
tremor da terra foi m.to grande e estron/dozo que deixaria perto de mea hora//
[] 23
27. Naô ha couza digna de memoria da q.l/ se possa fazer mensam./
Nesta freguesia do Salvador de Taboa-/do naô. há serra; porque estâ situada em/
vales como já se dice; e se perto tem al-/gum montes estes sám de pessoas particu/
llares que os cultivam, e afructam de Cen-/teyo, e nelles se criam alguns gados miu-
dos/ como sam Anhos e cabritos, e tambem nelles/ ha alguma Cassa que consta de
Coelhos, Le-/bres e Perdizes./
Naô tem esta freguezia Rio algum/ que nella nassa, e por ella entre, e por iSso/
se naõ faz mensam deles neste capitulo./ o que pertence âs freguesias vezinhas/ por
onde elles passam./
E nesta forma fica satisfeito com o q.e/ se manda declarar por itens numerados,/ e
se podia dizer conforme a capacid.e da/ terra. Taboado e de Abril 20. de 1758./
Abb.e Alberto de Almd.a de Azd.o e Vas.los//
[]//

5. INFORMAÇÃO DESTACADA

Como se pode constatar, são vários os elementos passíveis de realce e de análi-


se logo à partida. Desde logo, o pároco não vê necessidade de responder às II e III
Partes, concretamente no que se refere a “Serras” e “Rios”, não existindo, segundo o
mesmo, nenhum exemplo, em Tabuado, desses elementos orográficos, tal como se
constata da leitura da transcrição que se expõe anteriormente. Nesse documento, o
abade Alberto de Almeida de Azevedo e Vasconcelos, que, como referido, é, em 1758,
o pároco do couto de Tabuado, argumenta o porquê das justificações que encontra,
as quais expõe em duas notas escritas após a sua resposta a cada uma das vinte e sete
perguntas da I Parte do Inquérito.
No entanto, é outro o aspeto que se deseja destacar das Memórias Paroquiais de
Tabuado. A preponderância da linhagem padroeira, à época, da Igreja Paroquial do
Salvador de Tabuado: a família Montenegro. Assim, destaca-se o seguinte trecho da
resposta à pergunta 22: “Tem esta freguesia o Privilegio de se/ poder centar o Pa-

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droeiro della sendo/ Leigo na Cadeira ao Arco da Igr.a no Lu-/gar do Parocho (…)”,
sendo certo que qualquer outra pessoa teria a sanção máxima, no que concerne à Igreja
Apostólica Romana, ou seja, a excomunhão, em caso de aí se sentar. No entanto, tal não
se verifica em Tabuado, pois, como refere o pároco: “(…) e nessa pessoa nam com/ pen-
na de excomunhão (…)”.
Desta passagem se documenta a importância do representante da família Montene-
gro na organização social de Tabuado, pois era essa a família que detinha o padroado
do couto, apesar de a ordem de Santo Agostinho – assim aponta Crispiniano da Fonseca
(1957, p. 2) – deter o domínio administrativo do mesmo. Este autor comprova isto refe-
rindo uma carta de couto dada por D. Teresa e, posteriormente, por seu filho, primeiro
rei de Portugal, D. Afonso Henriques (Fonseca, 1957, p. 2).
Sublinha-se sobretudo o facto de este conjunto familiar ter o seu lugar de sepulcro
com as características particulares que se mencionam: “(…) e tem toda a familia/ dos
Montenegros Padroeiros desta Igr.a o/ seu simiterio em Carneiro de Bacho/ da Cappel-
la mayor da mesma Parrochia/ ou Igreja (…)”.
A existência de um local de sepultamento familiar em Carneiro (Freitas, 1972, p.
17-18) para os membros da linhagem padroeira da Igreja Paroquial do Salvador de Ta-
buado pressuporia a existência de uma câmara/cripta/jazigo sob a capela-mor do dito
templo.
Esta estrutura sepulcral foi confirmada tendo como base o registo fotográfico resul-
tante da intervenção realizada pela Direção-Geral dos Edifícios e Monumentos Nacio-
nais (DGEMN), no ano de 1967.
Nessas fotografias pode-se observar a existência de uma câmara/cripta/jazigo sob
a capela-mor da Igreja. Pode-se também verificar que o acesso se realizaria por um
lanço de escadas, maciças e em pedra, que se localizaria sob o lajeado da capela-mor.
Este sepulcro estaria assinalado por uma epígrafe, parcialmente visível numa das lajes.
A existência deste Carneiro pode ainda ser atestada pela descrição realizada por
Crispiniano da Fonseca (1957, p. 20): “Trata-se de uma vasta necrópole, onde, como
tivemos ocasião de verificar há anos, quando a mesma foi aberta, se encontraram sepul-
tados mais de uma dezena de cadáveres de padroeiros e, certamente pessoas de famí-
lia”. Necrópole cuja entrada se situava sob a capela-mor e estava assinalada. Utilizando
novamente as palavras do autor atrás referido: “No pavimento, sob o arco cruzeiro en-
contra-se a inscrição seguinte: «Esta é a porta da sepultura do padroeiro»” (Fonseca,
1957, p. 19). Ambas as menções feitas por Crispiniano da Fonseca baseiam-se na sua
observação pessoal dos elementos referidos, atualmente desaparecidos.
Para a regularização do piso da capela-mor da Igreja Paroquial do Salvador de Ta-
buado, necessidade documentada no processo de intervenção da DGEMN (1967), de-
verá ter-se procedido à colmatação do Carneiro da família Montenegro, pois, desde o
início século do XX, esta tem um jazigo edificado no cemitério paroquial de Tabuado.
O início da utilização deste jazigo encontra-se atestado nos livros de registo existen-
tes na Junta de Freguesia de Tabuado, reportando-se a primeira inumação ao ano de
1908. Até aí, as inumações, com exceção da família padroeira, que possuía o menciona-

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JOÃO REBUGE | APONTAMENTOS SOBRE A IGREJA DE TABUADO, MARCO DE CANAVESES

1 2

3 4

FIGURA 1. Entrada para a escada de acesso ao Carneiro existente sob o lajeado da capela-mor da Igreja.
Vista parcial de laje epigrafada que servia para selar a estrutura e que simultaneamente escondia o
acesso ao lanço de escadas para atingir o interior do mesmo ([S.a.], 1967a).
FIGURA 2. Acesso ao Carneiro sob o piso lajeado da capela-mor da Igreja ([S.a.], 1967b).
FIGURA 3. Carneiro sob a capela-mor da Igreja e cachorros de sustentação do pavimento ([S.a.], 1967c).
FIGURA 4. Base direita de arco triunfal entre a capela-mor e o corpo da Igreja, onde se pode observar,
parcialmente, a estrutura em Carneiro sob a capela-mor ([S.a.], 1967d).

do Carneiro, ocorriam predominantemente no interior da Igreja. Só na impossibilidade


de tal acontecer é que ocorreriam no adro. Tal é possível atestar com a consulta dos
livros de registo de óbitos da Paróquia de Tabuado, existentes no Arquivo Distrital do
Porto3.

6. APONTAMENTO FINAL

Com o presente trabalho pretende-se resgatar para a memória a existência da es-


trutura de sepulcro que tem vindo a ser mencionada, ou seja, o Carneiro da família
Montenegro. Caso a existência da mesma ainda subsista e seja consensualizada entre

3
[S.a.], 1587-1911. Paróquia de Tabuado: Registos de Óbitos. [manuscrito digitalizado]. Porto: Arquivo Distrital
do Porto. Acessível em: <http://pesquisa.adporto.pt/details?id=478419> [Consultado em 13 de setembro de
2017].

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a comunidade paroquiana, o seu estudo seria de particular interesse, apesar de se ter
dada como segura a sua colmatação, em 1967. No entanto, esta não surge discriminada
no capítulo “III Trabalhos Efectuados” do Boletim da Direcção-Geral dos Edifícios e
Monumentos Nacionais (Freitas, 1972, pp. 19-20).
Em simultâneo, procura-se atestar o papel de destaque desempenhado pela família
Montenegro naquela que é a atual freguesia de Tabuado. A relevância desta família é
constatável pela localização do Carneiro, único local de sepulcro existente na Igreja
Paroquial do Salvador de Tabuado.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

FONTES MANUSCRITAS

[S.a.], 1587-1911. Paróquia de Tabuado: Registos de Óbitos. [manuscrito digitalizado].


Porto: Arquivo Distrital do Porto. Acessível em: <http://pesquisa.adporto.pt/details
?id=478419> [Consultado em 13 de setembro de 2017].
[S.a.], 1722-1832. Memórias Paroquiais. Dicionário geográfico de Portugal, Tomo 36, T
1. Tabuado, Gouveia de Riba Tâmega. [manuscrito digitalizado]. Lisboa: Arquivo Nacio-
nal – Torre do Tombo. Acessível em: <https://digitarq.arquivos.pt/details?id=4241809>
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[S.a.], 1967a. Igreja Paroquial do Tabuado / Igreja do Salvador. [documento fotográ-
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em 13 de setembro de 2017].
[S.a.], 1967b. Igreja Paroquial do Tabuado / Igreja do Salvador. [documento fotográ-
fico] IPA.00004938, FOTO.00053766. Lisboa: Direção-Geral do Património Cultural.
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[S.a.], 1967c. Igreja Paroquial do Tabuado / Igreja do Salvador. [documento fotográ-
fico] IPA.00004938, FOTO.00053768. Lisboa: Direção-Geral do Património Cultural.
Acessível em: <http://www.monumentos.gov.pt/Site/APP_PagesUser/SIPAArchives.
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em 13 de setembro de 2017].
[S.a.], 1967d. Igreja Paroquial do Tabuado / Igreja do Salvador. [documento fotográ-
fico] IPA.00004938, FOTO.00053771. Lisboa: Direção-Geral do Património Cultural.

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JOÃO REBUGE | APONTAMENTOS SOBRE A IGREJA DE TABUADO, MARCO DE CANAVESES

Acessível em: <http://www.monumentos.gov.pt/Site/APP_PagesUser/SIPAArchives.


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BIBLIOGRAFIA

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REVISTA OPPIDUM N.º 11 - 2018/2019

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