Livro Didático e Língua Portuguesa: Parceria Antiga e Mal Resolvida
Em meados do século XIX, a disciplina Língua Portuguesa não fazia parte
do currículo da escola brasileira, situação que desagradava alguns educadores. A crítica de Frasão sugere que, em pleno Segundo Reinado, leitura e redação de texto em língua materna não desfrutavam ainda da importância curricular que para tais atividades insinuava. Na Constituinte de 1923, livro didático, escola, professores e leitura estrelavam momentos polêmicas. Os legisladores, ao discutirem leitura e livro didático, inscrevem a discursão no contexto geral da precariedade que, herdada da Colônia, vai persistir por muito tempo, apontam tal despreparo como crônico e desalentadoramente irremediável, os baixos salários pela falta e despreparo dos professores, a infraestrutura em que o assunto livro didático cruza com leitura, escrita e Língua Portuguesa, como preocupação dos primeiros legisladores brasileiros que discutiam o sistema escolar a ser implantado no Brasil. Rui Barbosa aponta a baixa qualidade do livro didático, criticando também os métodos de ensino de língua materna, vinculando a inadequação do ensino patrocinado pela escola brasileira do século passado ao fato de a escola lidar com língua materna como se esta estrangeira fosse. Só fala de livro quem tem a intimidade de ter nascido em meio a eles. O que levanta questão maior: se todos os depoimentos lamentam a precariedade da presença de livros e de leitura dentro e fora das relações na vida dos bens- nascidos. O que esperar das relações que com a escrita e a leitura mantinham brasileiros pobres? Esta questão continua a aturdir educadores que nela tropeçam; por isso, a reflexão sobre semelhanças e diferenças entre as situações vividas por professores de ontem e de hoje pode ser sugestiva. Se hoje a pedagogia oficial tende a envolver a censura a certos livros e não outros configura movimento mais sofisticado do que, por exemplo, expulsos os jesuítas, no século XVIII, proibiu sua pedagogia, o que incluía os livros didáticos nela inspirados. No fim do século, explodem questões fulcrais da relação entre livros, escola e produção cultural: a profissionalização do intelectual e a correspondente implantação e desenvolvimento de mecanismos, praxes e acordos que, regulando as relações do escritor com o capital e com o mercado, modernizam a inserção social da produção cultural assim engendrada. Esta obra se ocupa da política que envolve o livro didático, acompanhando seus desdobramentos, os quais se relacionam diretamente com as condições de produção e consumo desse material. João Batista e seus coautores apontam que o didático representa fatia bastante considerável dos livros produzidos e consumidos no país; que data de 1938 os primeiros esforços brasileiros de centralização das providências relativas ao livro. O livro se encerra propondo uma pauta para o debate, privilegiando nela o binômio centralização/descentralização e salientando a necessidade de envolvimento dos professores em todas as instâncias. Por centrar no professor a questão do livro didático, A política do livro didático retorna, reencaminha e arremata a discussão do ensino de escrita e de leitura, de língua e de literatura. Como linguagem e como mercadoria, obras didáticas identificam-se à fina malha social pela qual circulam e por via da qual se transformam em discurso e interagem socialmente. E a moral dessa história é que nem somos culpados, nem estamos sozinhos: vivemos um momento particular da história do livro didático brasileiro, que é longa, cheia de desacertos e desencontros, de algumas apostas e esperanças.