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orais e escritos, como também enriquecer a capacidade de percepção do
mundo através da compreensão e produção de textos. Assim, a didatização
dos gêneros textuais merece uma reflexão especial, por se tratar de uma
questão importante e substancial na construção do conhecimento linguístico-
textual do aluno. Segundo Dolz e Schneuwly (1997):
3
segundo, focalizaremos no trabalho com os gêneros textuais na escola. Por
fim, faremos uma análise da proposta com o trabalho de gêneros textuais
expressa nos livros didáticos selecionados, abrangendo tanto o manual do
professor como o livro do aluno, a fim de expor os resultados acerca dos
procedimentos didáticos de inserção dos gêneros textuais nos livros didáticos.
“os gêneros literários (...) sempre foram estudados pelo ângulo artístico-
literário de sua especificidade, das distinções diferenciais intergénericas (nos
limites da literatura), e não enquanto tipos particulares de enunciados, com
os quais contudo têm em comum a natureza verbal (lingüística).” (p. 280)
4
(jurídicos, políticos) encobria porém a natureza lingüística do enunciado.” (p.
280)
5
autor ressalta que “o discurso se molda sempre à forma do enunciado que
pertence a um sujeito falante e não pode existir fora dessa forma” (p. 293).
Desse modo, o discurso incorpora dois elementos, sendo determinado
tanto pelo fato de que procede de alguém, como pelo fato de que se dirige para
alguém. Nessa perspectiva, o gênero se constitui justamente como produto da
interação do locutor e do ouvinte, ou seja, todo discurso serve de expressão de
um em relação ao outro. Trata-se do dialogismo interacional, que se constitui
como um princípio do discurso. Segundo Bakhtin (2000), “o índice substancial
(constitutivo) do enunciado é o fato de dirigir-se a alguém, de estar voltado para
o destinatário.” (p. 320). O destinatário assume um papel relevante no processo
discursivo, uma vez que:
“Os outros, para quais meu pensamento se torna, pela primeira vez, um
pensamento real (e, com isso, real para mim), não são ouvintes passivos,
mas participantes ativos da comunicação verbal. Logo de início, o locutor
espera deles uma resposta, uma compreensão responsiva ativa. Todo
enunciado se elabora como que para ir ao encontro dessa resposta.”
(BAKHTIN, 2000:320)
6
perceber o seu próprio enunciado, o gênero do discurso geralmente se dirige a
um interlocutor que não se limita a compreender o locutor. A totalidade
acabada do enunciado proporciona a possibilidade de compreendê-lo de modo
responsivo.
Na relação falante/ouvinte é produzida uma estrutura comunicativa que
se configurará em formas padrões relativamente estáveis de um enunciado,
que são os já denominados gêneros do discurso. Seguindo a teoria
bakhtiniana, Dolz e Schneuwly (2004) defendem que:
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“Os textos organizam-se sempre dentro de certas restrições de natureza
temática, composicional e estilística, que os caracterizam como
pertencentes a este ou aquele gênero. Desse modo, a noção de gênero,
constitutiva do texto, precisa ser tomada como objeto de ensino.” (p.23)
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que na escola realizamos algumas seleções de quais propriedades dos
gêneros textuais ressaltar para os alunos e os modos como iremos fazê-lo, que
implicam em maior ou menor distanciamento das práticas sociais nas quais tais
gêneros circulam. Na verdade, eles defendem que se faz necessário
instrumentalizar os alunos para usos autênticos da linguagem, expondo-os a
verdadeiras situações de comunicação, sem perdermos de vista a necessidade
de reflexão sobre tais textos fora dessas situações de comunicação.
Em suma, como mencionamos, os instrumentos com os quais a
sociedade legitima suas práticas discursivas e atua nos diversos domínios da
atividade humana são os gêneros. Portanto, o conhecimento do gênero é uma
ferramenta muito importante para o desenvolvimento das competências
lingüísticas do indivíduo. Cabe à escola propiciar aos alunos atividades que os
façam aprender a escolher o gênero adequado a cada situação comunicativa,
promovendo atividades com diferentes gêneros e diferentes destinatários e
enfocando os efeitos comunicativos.
Para se pensar o ensino dos gêneros de acordo com os ciclos/séries,
Dolz et al. (2004) propõem, em seus estudos, um agrupamento desses gêneros
de acordo com sua tipologia e capacidades de linguagem a serem
desenvolvidas pelos alunos em cada ciclo/série: gêneros da ordem do narrar;
da ordem do relatar, da ordem do expor, da ordem do argumentar; e, da ordem
do descrever ações.
Segundo Dolz et al (2004), a aprendizagem da expressão oral e escrita é
considerada como um conjunto de aprendizagens específicas de gêneros
textuais variados. Dessa forma, o ensino de cada agrupamento de gêneros
exige reflexões sobre aspectos lingüísticos, estruturais e interacionais. “Os
tempos verbais, por exemplo, não são os mesmos quando se relata uma
experiência vivida ou quando se escrevem instruções para a fabricação de um
objeto.”(p. 120)
Nesse sentido, os agrupamentos são tomados como base no processo
de construção de progressões, pois para que funcionem, é necessário que:
9
3. sejam relativamente homogêneos quanto às capacidades de linguagem
implicadas no domínio dos gêneros agrupados.”(p. 121)
10
sua proposta de projetos pedagógicos de leitura e produção de gêneros
discursivos, Lopes – Rossi (2006) ressalta que:
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alunos identificarem as dificuldades decorrentes das características específicas
dos gêneros e os elementos lingüísticos mais apropriados para determinada
produção.
Para ampliar a capacidade dos alunos no domínio dos gêneros, as
propostas de leitura e produção de textos orais ou escritos devem propiciar um
olhar diferenciado sobre determinados gêneros textuais. Dessa forma, a
compreensão dos gêneros considerando o domínio social, sua função
comunicativa, sua natureza heterogênea, seu conteúdo, estrutura
composicional e estilo são elementos necessários para desenvolver as
competências de leitura e escrita do aluno.
Dado o exposto, os gêneros se constituem como práticas de linguagem
e devem ser utilizados como instrumentos de mediação da estratégia de ensino
e como material de trabalho para o ensino da textualidade.
Esclarecida a noção de gênero e sua relação com a escola, passaremos
agora à terceira dimensão do nosso trabalho: como se dão os procedimentos
didáticos de inserção dos gêneros textuais nos livros didáticos do Ensino
Fundamental I, pertencentes à Coleção “Português: uma proposta para o
letramento”.
3. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
A coleção de Livros Didáticos do Ensino Fundamental de Magda
Soares: “Português uma proposta para o letramento” (volumes: 1, 2, 3 e 4)
constitui o material para análise neste trabalho, visto que a coleção escolhida
foi aprovada pelo PNLD e se enquadra no bloco das coleções organizadas por
unidades temáticas sensíveis a gênero/tipo de texto.
De acordo com o Guia do Livro Didático 2007 de Língua Portuguesa, a
coleção de Magda Soares: “Português uma proposta para o letramento”
apresenta uma articulação de temas com o estudo de gêneros, suportes, mídia,
contextos ou funções da linguagem. Ainda segundo o Guia, a coleção:
“incorpora contribuições recentes das teorias sobre o ensino da língua escrita
centradas nas noções de letramento e de gênero, tomando-as como
fundamento e finalidade para o ensino de língua portuguesa.” (p. 186) Portanto,
nossa escolha parte da premissa de que a coleção a ser analisada deve estar
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articulada com a noção de língua como prática social e com propostas de
trabalho associadas aos gêneros.
Como já foi mencionado, a preocupação principal deste projeto consiste
em investigar os procedimentos didáticos de inserção dos gêneros textuais nos
livros didáticos. Nessa perspectiva, os procedimentos utilizados para a
pesquisa foram divididos em três fases: análise do manual do professor,
levantamento dos gêneros textuais abordados na coleção e análise do trabalho
didático com os gêneros textuais.
Primeiramente, faremos uma análise da proposta com o trabalho de
gêneros textuais expressa no manual do professor, observando os seguintes
aspectos: a concepção de gênero subjacente ao manual, as orientações
didáticas para o trabalho com gêneros textuais e os objetivos expressos para o
trabalho com gêneros.
No segundo momento, fizemos um levantamento dos gêneros textuais
presentes nos livros. Para isso, elaboramos uma tabela contendo os gêneros
textuais encontrados nos Livros Didáticos e suas distribuições nas respectivas
unidades e páginas. Isso nos possibilitará saber quais gêneros textuais estão
inseridos nos livros, como se organizam as seqüências didáticas e as
propostas de atividades com os gêneros textuais e quais as dimensões e/ou
características que são enfocadas.
Por último, analisamos a abordagem didática dos gêneros nos livros.
Observamos, nesta análise, como os gêneros são tratados nos livros: se
explicitam as características dos gêneros; se apresentam alguma
conceituação, se levam os alunos a refletir sobre os gêneros ou se optam pela
apresentação de conceitos prontos; se trazem questões de compreensão sobre
os gêneros; se há relação entre as atividades de produção e o trabalho
anterior, enfim, refletir se as propostas dos livros estão sugerindo uma
abordagem acerca do funcionamento dos gêneros textuais, contribuindo assim
para sua produção e compreensão.
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letramento”, de Magda Soares, “destaca-se um cuidadoso trabalho de
fundamentação, com a apresentação dos conceitos-chave e da orientação
metodológica.”(p.188). Além disso, o MP também expõe os eixos de ensino
com objetivos, orientações metodológicas e sugestões bibliográficas.
Nesse sentido, a autora preocupa-se em explicar os pressupostos
teóricos que embasam o projeto pedagógico do livro, destacando que a
finalidade do ensino de Português é o letramento. Utiliza e destaca a
concepção de língua como discurso, uma vez que considera “a língua como
processo de interação (inter-ação) entre sujeitos, processo em que os
interlocutores vão construindo sentidos e significados ao longo de suas trocas
lingüísticas, orais ou escritas” (SOARES, 1999b:05)
Também ressalta a relevância de trazer propostas baseadas em práticas
discursivas, nas quais a inserção dos diferentes gêneros e tipos é necessária
para desenvolver a capacidade lingüística do aluno. Dentre os objetivos do
ensino de Português, destacamos no MP os que se referem especificamente
aos gêneros textuais:
14
(BAKHTIN, 2000:320). Nessa perspectiva, o destinatário assume um papel
relevante no MP, uma vez que existe uma preocupação em reconhecer as
propriedades comunicativas de cada um dos gêneros, ressaltando seus efeitos
comunicativos, em função dos interlocutores nas situações concretas de
comunicação.
Nesse sentido, a autora considera que faz-se necessário
instrumentalizar os alunos para usos autênticos da linguagem, expondo-os a
verdadeiras situações de comunicação, sem perdermos de vista a necessidade
de reflexão sobre tais textos fora dessas situações de comunicação.
No MP também constatamos uma preocupação da autora em propor
uma grande variedade de gêneros para o desenvolvimento da linguagem oral,
tais como: “debate (argumentação), seminário, exposição, relato de
experiência, notícias, apresentações de regras e instruções, entrevistas,
depoimento.” (SOARES, 1999b:23).
No que concerne às propostas de trabalho com as modalidades oral e
escrita, a autora destaca que estão organizadas por unidades temáticas
associadas a uma diversidade de gênero:
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anteriormente, que a introdução de um gênero na escola sob a ótica didática
resultará numa variação do gênero de referência, uma vez que consiste numa
dinâmica do ensino-aprendizagem. (Cf. Dolz e Schneuwly, 2004:81)
Dado o exposto, podemos concluir que o MP apresenta pressupostos
teóricos em bibliografia contemporânea, revelando estar em consonância com
as recentes teorias lingüísticas sobre variação, texto e discurso,
sociointeracionismo, letramento e com a teoria de gêneros. A diversidade de
gêneros e a ênfase nos seus aspectos discursivos e semânticos orientadas
pelo Manual se configuram em uma compreensão ampla da linguagem como
prática social que, segundo Dolz e Schneuwly (2004), “quanto mais precisa a
definição das dimensões ensináveis de um gênero, mais ela facilitará a
apropriação deste como instrumento e possibilitará o desenvolvimento de
capacidades de linguagem diversas que a ele estão associados.” (p. 89) Como
sugestão, o MP poderia trazer informações sobre alguns gêneros inseridos no
livro do aluno, as quais poderiam ser úteis ao professor. Poderia, sobretudo,
ressaltar os objetivos didáticos referentes aos gêneros mais usados, de modo a
facilitar a percepção, pelo professor, de quais dimensões textuais estão sendo
foco de reflexão para o aluno.
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(24), capa de livro (21), reportagem (20), tirinha (20), texto didático (17),
apresentação (13), anúncio (08), legenda (06), HQ (05), carta (05), crônica
(04), anúncio classificado (04), artigo (03), nota informativa (03), orientações de
comportamento (03), trava-língua (03), artigo de opinião (02), capa de revista
(02), ficha catalográfica (02), logomarca (02), receita (02), regulamento (02),
notícia (02) e outros4 (23).
Podemos perceber que o material textual é diversificado. Os gêneros
selecionados são de diversas esferas de circulação: burocrática (ficha
catalográfica), jornalística (reportagem), literária (poema), didático-pedagógica
(verbete), divulgação científica (nota informativa) e cotidiano (trava-língua).
Podemos constatar também que o material textual que compõe os LDs é
de extrema qualidade, havendo indicação dos suportes originais dos textos.
São inseridos, nos livros, textos bem escritos, com variedade de temas
relevantes e adequados às faixas etárias.
Em suma, os livros abordam os gêneros de diferentes esferas sociais e
apresentam uma grande variedade de suportes (revistas, jornais,
enciclopédias) e de autorias. Nesse sentido, percebemos uma preocupação da
autora dos LDs em contemplar as necessidades de múltiplos letramentos
exigidos por uma sociedade contemporânea. Rojo (2003) ressalta que “muitas
vezes, o LD é o único material de leitura disponível nas casas destes alunos do
Ensino Fundamental e, por isso mesmo, é importantíssimo para o seu processo
de letramento que esses textos sejam de qualidade.” (p.83).
Nos LDs constam numerosas e variadas propostas de leitura e produção
de gêneros. As atividades, de modo geral, possuem clareza na sua formulação
e trazem contribuições significativas para o desenvolvimento da capacidade
lingüística dos alunos. Uma ressalva, no entanto, pode ser levantada quanto à
apresentação dos textos que aparece no topo de algumas páginas: algumas
vezes são indicados os nomes dos gêneros (poema, V. 2, p.24), outras vezes,
o tipo textual predominante (descrição, V. 2, p. 197) e outras vezes, a função
lingüística (texto informativo, V. 3 p. 28).
Para analisar os procedimentos didáticos de inserção dos gêneros
textuais nos livros didáticos, optamos por uma metodologia qualitativa em que
4
Gêneros textuais que aparecem uma ou duas vezes nos livros didáticos.
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o tratamento didático realizado com alguns gêneros textuais foi mais
profundamente investigado. Assim, utilizamos como primeira estratégia
identificar os gêneros textuais mais freqüentes nos livros: poema (37), conto
(30), verbete (23), capa de livro (21), reportagem (20) e tirinha (20). Dentre
esses, selecionamos quatro gêneros que pudessem refletir maior variedade
quanto às finalidades sociais e tipologias. Dessa forma, decidimos explorar
mais cuidadosamente o trabalho realizado com os gêneros poema (37), conto
(30), reportagem (20) e tirinha (20). Os dois primeiros, que foram os mais
freqüentes, contemplariam os textos da ordem do narrar (contos e alguns
poemas) e dariam conta de reflexões sobre recursos estéticos da esfera
literária e do mundo infantil. A reportagem, que oscila entre os textos da ordem
do argumentar e do relatar, contemplaria os recursos lingüísticos mais usados
nos textos temáticos de esferas sociais jornalísticas. A tirinha, também da
ordem do narrar, porém com base icônica, contemplaria as capacidades de
articulação entre textos verbais e não verbais e recursos expressivos que
aproximam fortemente as práticas orais e escritas de linguagem.
5.1. POEMA
Ao realizarmos a análise do gênero poema nos LDs, constatamos que a
autora se preocupa em apresentá-lo e distribuí-lo de forma equilibrada e
progressiva nos quatro volumes da coleção: V. 1 (07), V.2 (08), V. 3 (08) e V. 4
(14). A cada volume, o trabalho didático com esse gênero torna-se mais
aprofundado e seqüenciado. Nos volumes 1 e 2, constatamos uma
preocupação em evidenciar os contextualizadores do poema, sua estrutura e
sua funcionalidade. Nos volumes 3 e 4, percebemos um maior aprofundamento
dos recursos lingüísticos usados no gênero, sempre articuladas às propostas
de leitura, interpretação oral e escrita e produção textual. Como já discutimos
anteriormente, segundo Dolz e Schneuwly (2004), “a retomada dos mesmos
gêneros, em etapas posteriores, é importante para se observar o efeito do
ensino a longo prazo e para assegurar uma construção contínua” (p.125)
A indicação do nome do gênero (poema) é feita várias vezes no livro do
aluno, facilitando o reconhecimento do gênero em outras situações, mesmo
não escolares:
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Livro 2 pág. 127
Livro 1 pág. 10
A autora parece reconhecer que a indicação do nome do gênero e a
exploração dos contextualizadores são aspectos relevantes no ensino do
gênero textual. Assim como ela, consideramos que isso favorece o
reconhecimento de outros textos pertencentes ao mesmo gênero e,
conseqüentemente, a apropriação das características próprias do gênero em
estudo.
Além desses aspectos, a autora também reconhece a necessidade de
refletir sobre a forma composicional do gênero. A partir dessa dimensão
textual, podemos perceber suas características: tipo de linguagem, posição do
enunciador, seqüências discursivas. (Dolz e Schneuwly, 2004:75).
Em suma, percebemos que, nos quatro volumes, as atividades são
voltadas tanto para a interpretação do poema como também para a exploração
dos seus aspectos composicionais e sócio-discursivos. Como exemplo,
podemos citar o estudo do poema “O negrinho do pastoreio” (pág. 158 a 162,
do livro 3).
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Primeiramente, a autora, na unidade “Você acredita? Mistérios e
Crendices”, apresenta uma preparação para a leitura com um pequeno texto
didático informando que o poema está no livro Cantos de Encantamento, do
autor Elias José. Nessa apresentação, explora o próprio sumário do livro com
perguntas direcionadas sobre os significados de Encantamentos da Terra e da
Água, sobre a estrutura do sumário e de antecipações à leitura do poema O
negrinho do pastoreio. Ainda na apresentação, ela pede ao professor que
recorde a biografia do autor que foi trabalhada na unidade 2. Assim, ela
contextualiza a obra, ajudando os alunos a relacionar o texto às condições de
produção e ao seu suporte, ou seja, enfoca aspectos sociodiscursivos.
Logo após, sugere ao professor que realize a leitura oral do poema para
que os alunos percebam o ritmo, a sonoridade, a musicalidade e
expressividade. Ressalta, assim, os recursos lingüísticos e expressivos do
gênero, ou seja, alguns de seus aspectos composicionais.
Em seguida, propõe uma interpretação oral com perguntas direcionadas
às confirmações de hipóteses levantadas pelos alunos. Nessa atividade, a
autora sugere ao professor que trabalhe com seus alunos o fato de o texto
literário sempre criar e modificar, nunca reproduzir e nem repetir. No caso do
poema em estudo, o negrinho do pastoreio cuida das crianças que vivem sem
proteção, ao contrário da lenda original. Em seguida, ela propõe que os alunos
leiam silenciosamente o poema, relacionando a ilustração com o que diz cada
estrofe. Nessa atividade, existe uma definição de verso e estrofe. Por fim,
sugere a realização de uma interpretação escrita do poema. Mais uma vez,
enfoca aspectos composicionais, de modo articulado às reflexões sobre a
temática, estabelecendo relações de intertextualidade com outros textos.
A partir do exemplo acima citado, podemos perceber que a autora
apresenta aspectos relevantes na abordagem do gênero poema: temática,
forma composicional, recursos estilísticos, contextualização da obra. Outras
seqüências de atividades mostram que tais preocupações reaparecem ao
longo dos quatro anos de uso da coleção.
5.2. CONTO
No que concerne ao gênero textual conto, constatamos também que
existe uma preocupação da autora em apresentá-lo nos quatro volumes da
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coleção: V.1 (05), V. 2 (10), V. 3(09) e V. 4 (06), com maior freqüência nos
volumes 2 e 3. Em cada volume, a autora propõe um trabalho mais
aprofundado e seqüenciado, explorando as diversas características do gênero.
Em relação às características estruturais dos contos, a autora ressalta
no MP que o gênero de cada texto é indicado no livro do aluno. Em relação
aos contos, é usada, em várias unidades, a nomenclatura “narrativa”,
principalmente no topo da página. Vejamos o exemplo abaixo:
Livro 1 pág. 65
21
autora propõe uma produção textual contextualizada, na qual os alunos são
convidados a contar um caso de apelido. Na atividade de produção, ela orienta
o que seria interessante escrever nesse caso. Na sugestão para o professor,
indica o objetivo da produção: organizar um manual de apelidos. Ainda sugere
um procedimento de revisão textual: a revisão entre os colegas de classe.
Livro 3 pág. 49
22
quem era escritor Cervantes e seu personagem Dom Quixote. Posteriormente,
a autora indica que o aluno realize a leitura do conto “Uma história de Dom
Quixote”, de Moacyr Scliar para descobrir um outro jeito de ver suas
desventuras. Em seguida, na atividade de interpretação escrita a aluno é
convidado a refletir sobre os dois jeitos de ver a aventura de dom Quixote com
os moinhos de vento. Na atividade de produção textual o aluno é convidado a
escrever uma notícia, utilizando as duas interpretações de um mesmo fato:
Dom Quixote enfiando sua pá de um moinho de vento:
5.3. REPORTAGEM
Assim como ocorre com o poema e o conto, o gênero reportagem
também é apresentado nos quatro volumes da coleção: V. 1 (01), V. 2 (04), V.
3 (08) e V. 4 (07). No entanto, parece haver uma idéia de que ele seria mais
adequado para o segundo ciclo (3a e 4a séries). As dimensões e complexidades
das características da reportagem são modificadas no decorrer dos volumes e
os objetivos das atividades são aprofundados a cada volume.
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Na análise, constatamos que as reportagens encontradas nos LDs, em
sua grande maioria, possuem indicação do gênero e seu suporte original.
Percebemos que o livro do aluno está em consonância com o MP, uma vez que
se preocupa em preservar as características de apresentação gráfica do
gênero original sempre que possível (Cf. Soares, 1999b:10). Os textos
reproduzidos de modo semelhante aos originais permitem que os alunos
tenham a oportunidade de construir uma série de significados ao reconhecerem
as características originais de um determinado gênero. Segundo Marcuschi
(2002), “o trabalho com os gêneros textuais é uma extraordinária oportunidade
de se lidar com a língua em seus mais diversos usos autênticos no dia-a-dia.”
(p.35)
No que concerne aos objetos de reflexão sobre os aspectos sócio-
discursivos do gênero reportagem, percebemos nos LDs uma preocupação
com o reconhecimento do plano textual geral dos gêneros, os tipos de discurso
e de seqüências mobilizadas. Nesse sentido, a proposta de trabalho com o
gênero reportagem está direcionada aos elementos sócio-discursivos básicos
desse gênero: para quê, para quem, em que esfera e qual o suporte.
A indicação do contexto social de circulação tem presença significativa
nos LDs, uma vez que os alunos são convidados a refletir sobre as
características sócio-discursivas dos gêneros textuais. Como exemplo,
podemos citar o estudo da reportagem “Marcas registradas que não
escolhemos” (pág. 8 a 16 do livro 3).
Primeiramente, a autora propõe a leitura do trecho da reportagem
supracitada. Nesse estudo, ela indica o suporte original do texto a ser
trabalhado, além de apresentar uma cópia reduzida do jornal. Como já
dissemos, tal procedimento leva os alunos a se aproximarem das práticas de
linguagem em que tais textos circulam.
Em seguida, sugere a identificação dos contextualizadores da
reportagem (onde ela foi publicada, em que data...). Também indica que o
professor trabalhe o conceito de reportagem e mostre aos alunos um jornal,
identificando nele o que é uma reportagem. Assim, o conceito do gênero vai
sendo construído gradativamente pelos alunos, com apoio da professora.
Ao indicar ao aluno a leitura completa da reportagem, a autora sugere ao
professor que faça uma comparação da forma como a reportagem se
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apresenta no livro e sua reprodução original reduzida. Por fim, a autora propõe
uma interpretação escrita da mesma.
Com o exemplo acima, podemos perceber fatores pertinentes às
condições de produção e circulação da reportagem. Nesse sentido, gênero é
estudado como produto da interação do locutor e do ouvinte, ou seja, está
subjacente à atividade os princípios de que todo discurso serve de expressão
de um em relação ao outro. (Cf. Bakhtin, 2000:320)
Outro exemplo que podemos citar sobre a discussão da funcionalidade
do gênero é o estudo sobre uma reportagem que aparece no volume 4 (pág. 22
a 26):
Livro 4 pág. 23
25
Dessa forma, percebemos que a opção da autora é de não formular
conceitos prontos e acabados sobre o gênero textual, assim como foi
observado no estudo dos contos, mas sim de propor uma reflexão sobre suas
principais características e funcionalidade.
5.4. TIRINHA
As tirinhas encontradas nos LDs estão distribuídas da seguinte forma: V.
1 (08), V. 2 (06), V. 3 (02) e V.4 (04). No primeiro volume, o trabalho com as
tirinhas geralmente está associado às atividades de vocabulário ou de reflexão
sobre a língua. Nos demais, são apresentadas, em sua grande maioria,
associadas às atividades de interpretação escrita.
Na indicação do nome do gênero que aparece no topo de algumas
páginas consta a denominação “história em quadrinhos”. No entanto, no livro 1
(p.18), a autora chama a atenção que tira é uma história em quadrinho com
apenas três ou quatro quadrinhos e, nos enunciados das atividades, ressalta
que se trata de um tirinha. Vejamos o exemplo abaixo:
Livro 1 pág. 18
Como nos outros gêneros textuais, as reflexões sobre os suportes
textuais e a contextualização das condições de produção do texto são
freqüentes. Como exemplo, podemos citar o estudo sobre uma tirinha do
Menino Maluquinho (Livro 1, pág. 18 a 20). Primeiramente, a autora faz uma
apresentação sobre o Menino Maluquinho ao lado de uma capa de livro. Nessa
apresentação, ela destaca o nome do autor, Ziraldo, e as principais
características do Menino Maluquinho. Na sugestão para o professor, indica
que seja ressaltado onde são encontradas as tirinhas (jornais, revistas ou em
livros). Em seguida, propõe para o aluno uma leitura silenciosa de uma tirinha
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do Menino Maluquinho. Também sugere ao professor que uma menina
represente a professora da tirinha e um menino represente o personagem
Lúcio. O objetivo dessa representação é levar o aluno a perceber a estrutura
dialogada da tirinha. A autora ainda ressalta que o terceiro balão não é para ser
lido, pois se trata de um balão de pensamento. Nessa parte da seqüência, são
enfocados aspectos composicionais e alguns recursos expressivos típicos do
gênero em estudo.
Em seguida, propõe uma interpretação oral com perguntas que exploram
os contextualizadores da tirinha e a representação dos desenhos e textos.
Logo após, na atividade de interpretação escrita, propõe ao aluno, através de
perguntas, a identificação do significado de diferentes formas de balões.
Também sugere ao professor que traga revistas de HQ para mostrar a
variedade de tipos de balões.
Com o exemplo acima citado, podemos perceber que as atividades são
direcionadas para identificação e apropriação das características sócio-
discursivas e estruturais do gênero textual tirinha. Há constantemente a
exploração dos recursos lexicais, frasais e das estruturas gráficas da tirinha
necessárias a formação de um leitor capaz de construir sentidos do texto. As
tirinhas analisadas nos LDs estão articuladas à complexidade dos conteúdos,
aos objetivos propostos em cada volume e às dimensões trabalhadas. Com
isso, percebemos uma preocupação da autora em apresentar propostas de
atividades bem estruturadas, permitindo que o aluno perceba características do
gênero, bem como sua funcionalidade.
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A partir da análise dos dados e da fundamentação teórica desta
pesquisa, podemos tecer algumas considerações acerca da abordagem dos
gêneros textuais na coleção “Portuguës: uma proposta para o letramento”.
Nos exemplos citados no decorrer da análise, constatamos que as
atividades são direcionadas para favorecer uma mestria dos gêneros e das
situações de comunicação. A escolha dos mesmos gêneros e seu
aprofundamento nos quatro volumes revela uma preocupação da autora com a
progressão acerca do conhecimento e funcionamento dos gêneros textuais.
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Nessa perspectiva, a abordagem didática proposta na coleção permite
que o aluno se aproprie das principais características dos gêneros, uma vez
que define o estilo e orienta o processo de seleção de recursos lexicais e
morfossintáticos no interior cada texto. As seqüências de atividades didáticas
para planificar o ensino de gêneros são bem elaboradas, seqüenciadas e
possuem objetivos precisos para que os aprendizes construam
progressivamente conhecimentos sobre os gêneros. Há, portanto, atendimento
ao princípio de que “é através dos gêneros que as práticas de linguagem
materializam-se nas atividades dos aprendizes”. (DOLZ e SCHNEUWLY,
2004:74)
A autora opta por estratégias de reflexão sobre as principais
características e funcionalidades dos gêneros textuais. Quando nas atividades
dos LDs são discutidas as condições de produção e circulação dos gêneros,
propicia-se aos alunos a oportunidade refletir sobre os aspectos sócio-
discursivo do gênero.
Algumas mudanças, no entanto, poderiam ser propostas para facilitar o
trabalho com gêneros textuais ao serem utilizados os livros analisados:
a) indicar no topo de algumas páginas as nomenclaturas mais
freqüentemente usadas na sociedade para os diferentes gêneros
textuais (por exemplo, a palavra conto em lugar de narrativa);
b) trazer informações no MP sobre os principais gêneros com que a
coleção irá trabalhar, ressaltando aspectos composicionais e
sociodiscursivos, assim como os objetivos didáticos;
c) indicar o gênero textual e/ou finalidade e não a tipologia nas atividades
de produção textual;
d) propor atividades de produção de textos de mesmo gênero que está
sendo analisado no eixo da leitura.
Por fim, ressaltamos que a didatização dos gêneros textuais merece
uma reflexão especial, por se tratar de uma questão importante e substancial
na construção do conhecimento linguístico-textual do aluno, sendo necessário
desenvolver estudos que aprofundem as reflexões aqui iniciadas.
28
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
29
SCHNEUWLY, Bernard. DOLZ, Joaquim et al.. Gêneros orais e escritos na
escola. São Paulo: Mercado das Letras, 2004. 278p.
SCHNEUWLY, Bernard. DOLZ, Joaquim. Gêneros escolares – Das práticas
de linguagem aos objetos de ensino. 1997.
SOARES, Magda. Português: Uma proposta para o letramento. São Paulo:
Moderna, 1999a. 215p.
SOARES, Magda. Português: Uma proposta para o letramento. Manual do
Professor. São Paulo: Moderna, 1999b. 32p.
30
ANEXOS
ANEXO 1
Gênero LD 1 LD 2 LD 3 LD 4 Total
poema 07 08 08 14 37
conto 05 11 09 06 31
verbete 03 10 04 07 24
capa de livro 05 08 06 02 21
reportagem 01 04 08 07 20
tirinha 08 06 02 04 20
texto didático 05 01 01 10 17
apresentação 02 04 05 02 13
anúncio 02 02 01 03 08
legenda 01 02 - 03 06
HQ - 03 02 - 05
carta - - - 05 05
crônica - 02 01 01 04
anúncio - 03 - 01 04
classificado
artigo(frag.) - - 03 - 03
instrução - 03 - - 03
nota informativa 02 01 - - 03
orientações de 02 01 - - 03
comportamento
trava-lingua - 03 - - 03
artigo de opinião - - - 02 02
capa de revista - 02 - - 02
ficha catalográfica 01 01 - - 02
logomarca - - 02 - 02
receita 02 - - - 02
regulamento - 02 - - 02
notícia 01 - - 01 02
outros 10 03 06 04 23
267
31