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Conversão Eletromecânica de Energia I (ESP1048)

Prof. Dr. Luiz Fernando Freitas-Gutierres

Roteiro de Simulação III


1 Introdução
Nesta atividade, os seguintes tópicos sobre conversão eletromecânica de energia são abordados:
fluxo magnético concatenado Λ, autoindutância L (denominada, também, indutância própria), histe-
rese magnética, propriedades dos materiais magnéticos e modelagem de máquinas elétricas.
Os objetivos, o embasamento teórico e as tarefas desta aula prática são detalhados na sequência.

1.1 Objetivos

• Modelar máquinas elétricas por meio de representações com elementos RLC (resistores, indu-
tores e capacitores) e seus acoplamentos.

• Determinar características de magnetização em dispositivos eletromagnéticos.

• Utilizar ferramentas computacionais para a resolução de problemas de conversão eletromecâ-


nica de energia.

2 Embasamento teórico
A forma mais usual de representar as propriedades de um material ferromagnético é por meio de
gráficos (curvas de magnetização e ciclos de histerese magnética) que relacionam a variação da indu-
ção magnética B com o campo magnético H (COEY, 2010; FIORILLO, 2004; JILES, 1991). Alternativa-
mente, gráficos da magnetização M versus H são também utilizados na literatura especializada (IDA,
2015). Entretanto, eles são empregados em circunstâncias específicas e contêm a mesma informação
que os primeiros uma vez que B = µ0 ( H + M ), dado µ0 = 4π · 10−7 H/m como a permeabilidade
magnética do espaço livre.
Os materiais ferromagnéticos são classificados como moles (ou doces) e duros (JILES, 1991). Meios
magnéticos moles caracterizam-se por um fácil alinhamento dos seus domínios magnéticos, resul-
tando em baixos níveis de força coercitiva (ou coerciva) e, costumeiramente, ciclos de histerese mais
estreitos como ilustra a Figura 1. Já os meios magnéticos duros são também chamados de ímãs perma-
nentes e o alinhamento dos seus momentos magnéticos é, consideravelmente, resistente à influência
de campos magnéticos externos. Por isso, demonstram altos níveis de força coercitiva quando compa-
rados aos materiais magnéticos doces (veja a Figura 1). Além de que apresentam grandes capacidades
de retentividade magnética.
A adequação de um material ferromagnético para uma determinada aplicação de Engenharia Elé-
trica depende, principalmente, das características verificadas em seu ciclo de histerese magnética
(SUDHOFF, 2014). Nesse sentido, materiais para aplicações com transformadores precisam de gran-
des permeabilidades magnéticas e reduzidas perdas por histerese para atingir requisitos mínimos de
rendimento. Materiais para eletroímãs necessitam ter baixos patamares de remanência e de coerciti-
vidade para assegurarem que a magnetização possa ser anulada conforme for demandado. Materiais
para ímãs permanentes necessitam de grandes níveis de remanência e de coercitividade para manter
a magnetização o quanto for preciso.

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[T]
Meio magnético
doce ou mole

Meio magnético
duro

[A/m]

Figura 1: Ciclos típicos de histerese para meios magnéticos moles e duros.

As perdas por histerese provocadas em um material ferromagnético por um campo de excitação


gerado em Corrente Alternada (CA) podem ser mensuradas por um sistema como o ilustrado na
Figura 2. Observe que o enrolamento está disposto uniformemente ao redor de um núcleo toroidal
que possui comprimento médio e área da seção transversal iguais a l e S respectivamente. Quando
exposto ao campo de excitação, existe um atrito molecular que resiste às reorientações contínuas dos
domínios magnéticos do material. Com isso, energia é dispendida em forma de calor conforme o
material é imposto aos ciclos de magnetização.
Na Figura 2, a tensão ν da fonte de alimentação é igual a


ν = Ri + N , (1)
dt
em que R é a resistência elétrica equivalente e N é o número de espiras da bobina. Além disso, i é a

Figura 2: Esquema para a medição das perdas por histerese magnética em um material ferromagné-
tico.

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corrente elétrica e ϕ é o fluxo magnético no núcleo toroidal.


A potência instantânea suprida ao sistema é dada por


νi = Ri2 + Ni · (2)
dt
Levando em conta a Lei de Ampère Hl = Ni e que ϕ = BS, a Equação 2 pode ser reescrita como:

dB
νi = Ri2 + NiS ,
dt
Ni dB
νi = Ri2 + Sl , (3)
l dt
dB
νi = Ri2 + HV ,
dt
em que V = Sl é o volume do núcleo ferromagnético. O termo Ri2 representa as perdas no cobre e o
termo Wh = HVdB/dt corresponde às perdas por histerese magnética (em J).
As perdas por histerese magnética por unidade de volume Wh/m3 = Wh /V podem ser calculadas
por meio de:
∫ ∫ [ ] [ ] [ ] [ ]
dB A A Wb A J 1 J
Wh/m3 = H dt = HdB T = = = · (4)
dt m m m2 m A m2 m3
Levando em conta a Equação 4, conclui-se que a área contida no interior do ciclo histerético repre-
senta a energia por unidade de volume associada ao processo de orientação dos domínios magnéticos
em um material ferromagnético. A Figura 3a apresenta a etapa com campo H ascendente, exigindo
uma densidade volumétrica de energia representada pela área “abc”. Quando o campo H retorna
para zero (etapa descendente), parcela dessa energia é devolvida ao circuito e é quantificada como a
área “bcd”. A outra fração de energia não é recuperada e, em contrapartida, é armazenada no material
ferromagnética para garantir o fluxo residual.
As perdas totais por histerese magnética Ph (em W) são resultado do produto da área do ciclo

[T] [T]

b b
c c
d

[A/m] [A/m]

(a) (b)
Figura 3: Estudo das perdas por histerese magnética através da área gráfica. (a) Etapa ascendente
com área “abc”. (b) Etapa descendente com área “bcd”.

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Wh/m3 , da frequência operacional f e do volume do núcleo V. Em geral, os fabricantes especificam as


perdas por histerese magnética em W/m3 em função da densidade de fluxo magnético B e para uma
faixa de frequências.
Em alguns simuladores computacionais, como o Finite Element Method Magnetics (FEMM), versão
4.2 (MEEKER, 2019), o usuário pode informar apenas a curva normal de magnetização que, como
ilustra a Figura 4, retrata os valores máximos de indução magnética B̆ e de campo magnético H̆ para
diferentes níveis de excitação senoidal. Entretanto, esse gráfico de valor único não é capaz de retratar
as perdas por histerese magnética visto que elas estão relacionadas com a área do ciclo histerético.
Para tanto, utiliza-se o conceito de uma permeabilidade complexa µ̇ = µ′ − jµ′′ uma vez que existe
uma defasagem angular entre as componentes fundamentais de indução magnética B e de campo
magnético H. Indica-se ainda que a parte imaginária µ′′ está associada com as perdas por histerese
magnética e mais detalhes são fornecidos a seguir.

Indução magnética
[T]
Permeabilidade magnética
[H/m]

[A/m]
Figura 4: Curva normal de magnetização e permeabilidade típicas de um material ferromagnético.

Se uma intensidade de campo magnético senoidal H (ωt) é exercida sob um material ferromagné-
tico, uma indução magnética B (ωt) é gerada, em que ω = 2π f é a frequência angular (em rad/s). A
primeira harmônica de B (ωt) é uma onda senoidal que demonstra um atraso angular de γ (denomi-
nado, também, ângulo de histerese). Para encaminhar o conceito de uma permeabilidade complexa
µ̇, requer-se, primeiramente, estabelecer os campos H e B em notação complexa (formatos retangular
e exponencial):

H (ωt) = H̆ sin (ωt) ,


( )
ℑ Ḣ = H (ωt) = H̆ sin (ωt) ,
( ) (5)
ℜ Ḣ = H̆ cos (ωt) ,
Ḣ = H̆e jωt ,

B (ωt) = B̆ sin (ωt − γ) ,


( )
ℑ Ḃ = B (ωt) = B̆ sin (ωt − γ) ,
( ) (6)
ℜ Ḃ = B̆ cos (ωt − γ) ,
Ḃ = B̆e jωt−γ ,

em que H̆ e B̆ são, respectivamente, as amplitudes dos sinais de intensidade de campo magnético


H (ωt) e de indução magnética B (ωt).

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A partir da relação entre os campos H e B definidos nas Equações 5 e 6, a permeabilidade complexa


µ̇ é dada por

Ḃ B̆
µ̇ = = e− jγ = µ̆e− jγ · (7)
Ḣ H̆
A Equação 7 pode ser transformada para o formato retangular da seguinte maneira

B̆ B̆
µ̇ = cos γ − j sin γ = µ′ − jµ′′ ,
H̆ H̆
µ′′
tan γ = ′ ,
µ (8)
µ′ = µ̆ cos γ,
µ′′ = µ̆ sin γ·
Destaca-se que tan γ proporciona uma medida entre as energias perdida e devolvida ao circuito
(como explanou-se, anteriormente, com ênfase na Figura 3). Outra maneira de entender isso e também
o conceito de permeabilidade complexa é traduzi-lo para um “equivalente elétrico” (RL em série) por
meio dos seguintes procedimentos

S
L = µ̇ ,
l (9)
S S
Z = jωL = jω µ̆ cos γ + ω µ̆ sin γ·
l l
A Equação 9 revela que as perdas podem ser estimadas como:

1 S
Ph = ω µ̆ sin γ Ĭ 2 , (o FEMM 4.2 trabalha apenas com valores de pico)
2 l
1 ( )
Ph = ω µ̆Sl sin γ H̆ 2 , H̆ = Ĭ/l
2
Ph 1
= Ph/m3 = ω µ̆ sin γ H̆ 2 , (10)
Sl 2
1 B̆ 2 ( )
Ph/m3 = ω sin γ, B̆ = µ̆ H̆
2 µ̆
1 B̆2
Ph/m3 = ω γ· (sin γ ≈ γ, para ângulos pequenos)
2 µ̆
A estratégia adotada pelo FEMM 4.2 para contabilizar a histerese magnética em suas modelagens
computacionais é aproximar o ciclo a uma elipse inclinada, vide Figura 5. A permeabilidade µ̆ =
B̆/ H̆ = tan θ é o coeficiente angular do maior eixo da elipse, assim como os pontos extremos ( H̆, B̆)
fornecidos pelo usuário são utilizados como os limites no primeiro e terceiro quadrantes para uma
certa condição de excitação senoidal.
Para um problema magnetostático não linear, o usuário deve informar a curva normal de magne-
tização e, se desejar estimar as perdas por histerese magnética, o parâmetro ϕhmax , deg como indicam
as Figuras 6 e 7. Esse parâmetro é o ângulo γ (γmax ) no qual a permeabilidade máxima µmax ocorre
para os pontos ( H̆, B̆) da curva normal de magnetização (veja o comportamento da permeabilidade
demonstrado na Figura 4). Com isso, o FEMM 4.2 podera γ para diferentes condições operacionais
em função da permeabilidade efetiva por meio de

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Figura 5: Aproximação do ciclo de histerese magnética através de uma elipse.

Figura 6: Configuração das propriedades de um material ferromagnético não linear no FEMM 4.2.

µ
γ = γmax · (11)
µmax
Infelizmente, os ângulos γ (para uma condição específica) e γmax são, raramente, informados pelos
fabricantes e devem ser estimados pelo usuário em laboratório ou por meio de ciclos de histerese
magnética disponibilizados em catálogos técnicos. Segundo Stoll (1974), os ângulos de histerese γ

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giram em torno de 0◦ e 20◦ para materiais magnéticos moles e essa faixa de valores pode ser utilizada
quando faltam informações ao projetista.
Outra alternativa para o cálculo do ângulo de histerese γ envolve o método de Lissajous utilizado
em osciloscópios para cálculos de defasagens angulares. Com base na Figura 5, o ângulo γ é obtido
com uso de
( )
Hc
γ = arcsin · (12)

Figura 7: Curva normal de magnetização resultante da interpolação dos pontos fornecidos pelo usuá-
rio.

3 Tarefas e relatório
Faça o que se pede a seguir:

1. Modelar um circuito magnético no FEMM 4.2 como o apresentado no vídeo desta aula prática.
Recomenda-se a presença de pelo menos um enrolamento, um núcleo retangular e um entre-
ferro.
Cada discente possui a liberdade para definir as características construtivas do enrolamento
que modelará e, dentro do possível, deve justificar as suas escolhas a partir de catálogos de
fabricantes e/ou relatórios.

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2. Informar as perdas por histerese magnética e por correntes parasitas para estímulos em CA (60
Hz) que não provocam a saturação do material.

3. Informar as perdas por histerese magnética e por correntes parasitas para estímulos em CA
(outros níveis de frequência operacional) que não provocam a saturação do material.

4. Informar as perdas por histerese magnética e por correntes parasitas para estímulos em CA (60
Hz) que provocam a saturação do material.

5. Desenvolver análises das perdas por histerese magnética e por correntes parasitas alterando a
espessura das lâminas do núcleo ferromagnético.

Observações:

q Utilizar, obrigatoriamente, o modelo de relatório proposto para esta atividade.

q Enviar o arquivo do relatório no formato pdf e, compactados para zip, os arquivos de simulação
e/ou scripts desenvolvidos. Empregue este formato para nomear os arquivos:

+ Para o relatório: PrimeiroNomeÚltimoSobrenome-Sim02-Rel.pdf.


Exemplo: Fulano de Beltrano Sicrano =⇒ FulanoSicrano-Sim02-Rel.pdf.
+ Para o arquivo zip: PrimeiroNomeÚltimoSobrenome-Sim02-Arq.zip.
Exemplo: Fulano de Beltrano Sicrano =⇒ FulanoSicrano-Sim02-Arq.zip.

Em caso de dúvidas, entre em contato através do e-mail institucional.

4 Referências bibliográficas
COEY, J.M.D. Magnetism and Magnetic Materials. 1. ed. Reino Unido: Cambridge University Press, 2010.
FIORILLO, F. Characterization and Measurement of Magnetic Materials. 1. ed. Reino Unido: Elsevier Aca-
demic Press, 2004.
IDA, N. Engineering Electromagnetics. 3. ed. Estados Unidos: Springer, 2015.
JILES, D. Introduction to Magnetism and Magnetic Materials. 1. ed. Estados Unidos: Springer, 1991.
MEEKER, D.C. FEMM: Finite Element Method Magnetics. Versão 4.2. [S.L.], 21 abr. 2019.
Disponível em: <http://www.femm.info/wiki/HomePage>. Acesso em: 01 nov. 2020.
STOLL, R.L. The Analysis of Eddy Currents. 1. ed. Reino Unido: Oxford University Press, 1974.
SUDHOFF, S.D. Power Magnetic Devices: A Multi-Objective Design Approach. 1. ed. Estados Unidos: John
Wiley & Sons–IEEE Press, 2014.

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