Durante toda a minha existência considerei como um grande
“NÃO” cuidar de outras coisas. Não digo de pessoas, porque dessas eu cuido, até porque, se não o fizesse, já tinha no meu pé a Patrulha dos Pequenos Príncipes mandando todas as possíveis indiretas pelos stories. Estou falando dos outros seres viventes. Cuidar de cachorro? Não, obrigado. Cuidar de planta? Amigo, já matei um cacto e uma suculenta, que são plantas que sobrevivem até às pias de lavabo, atingidas, muitas vezes, pela espuma do sabonete líquido aroma lavanda comprado em garrafas de cinco litros num empório de essências, e obrigadas a conviver com os palitinhos de cheiro – artificial – bambu, comprados na mesma lojinha que a garrafona de sabonete. O máximo de água que recebem são as gotas respingadas pelo sacudir das mãos dos visitantes que ficaram constrangidos de desenrolar a toalhinha branca bordada que está dobrada na bandeja espelhada com lateral de pérolas. Foi esse o meu erro: coloquei água demais no mini vasinho. Ou talvez o erro tenha sido colocá-las na sala, longe do sabonete líquido e do cheiro de bambu? Morreram de solidão, então, as coitadas. Não tinha a intenção de me tornar um serial killer do reino Plantae, então voltei ao “Não quero cuidar de plantas”. Minha mãe, daí, me deu uma palmeira ráfia. Se você não sabe qual é a ráfia, é aquela que fica num vaso marrom ou bege, ao lado da poltrona cor creme na sala de espera do dentista. Surpreendentemente, ela vingou. Cresceu bem, ficava bonita tampando a parte torta da pintura na parede. Ela, se mostrando melhor que um participante irrelevante de reality show, além de apenas ser planta, cumpria muito bem uma necessidade estética. E poderia ser regada uma vez na semana. Ótimo, resolvi tentar. Depois de um tempo, me animei e comprei uma jiboia, que também é muito fácil de cuidar. Se você não sabe qual é a jiboia, é aquela que dá folhas verde-esbranquiçadas em cordão, pendurada na garagem da sua avó ao lado da samambaia, ou na sala com estética boho chic de qualquer colega de trabalho que usa um bullet journal. Comecei a gostar de acompanhar o crescimento daquelas folhas, tentar perceber quando precisavam ser regadas antes do dia pré-estabelecido, ou depois. E joguei na terra um tomate cereja meio murcho que não dava pra comer. Ele brotou no vaso da ráfia. Fiquei empolgadíssimo, torcendo pra que ele durasse mais que o feijão de algodão da primeira série. O broto foi crescendo com folhas, precisou de um vaso maior e de um fio para sustentar o seu comprimento, tudo isso fiz. Nem sinal de tomatinho. Pesquisei na internet quanto tempo, em média, levava para os primeiros sinais de frutificação. Entre noventa e cento e vinte dias, disse o moço do YouTube. O tomateiro já tem mais que isso. A outra menina do TikTok disse que alguns frutos que compramos no supermercado contém sementes que dão folhas, mas não frutificam, porque podem ser modificados geneticamente. Será que é o caso do meu tomateiro? Dá folhas, cresce, enraíza, mas nada de dar tomates? Passei um tempo olhando pra ele, como se fizesse essa pergunta pra ele e ele fosse me responder. Daí, olhei pra mim, e me fiz a mesma pergunta: será que eu sou um tomateiro transgênico?