Você está na página 1de 120

2

crítica em movimento:
\O vão entre a crítica e o circo

1
crítica em movimento:
\O vão entre a crítica e o circo

Memória e Pesquisa | Itaú Cultural

Crítica em movimento: o vão entre a crítica e o circo / organização Itaú


Cultural; [textos Valmir Santos, Alice Viveiros de Castro, Fátima Pontes,
Daniel de Carvalho Lopes e Erminia Silva]. - São Paulo : Itaú Cultural,
2021. - (Crítica em movimento ; 2)
931 Kb ; PDF

ISBN 978-65-88878-08-8

1. Crítica. 2. Artes da cena. 3. Teatro. 4. Dança. 5. Circo. I. Instituto


Itaú Cultural. II. Título.

CDD 792.015

Bibliotecário Jonathan de Brito Faria - CRB-8/8697

2
PT Transformações da prática
e do pensar crítico
__ 4

Valmir Santos

Exercício de acrobacia mental: __ 10


crítica, estética e circo
Alice Viveiros de Castro

“O vão entre a crítica e o circo”: __ 20


uma história cheia de percalços!
Fátima Pontes

Respeitável público: falem bem, __ 40


falem mal, mas falem de mim
Daniel de Carvalho Lopes
Erminia Silva

Endereços na internet __ 56

Ficha técnica __ 58

Versión en español __ 60

3
crítica em movimento:
\O vão entre a crítica e o circo

Transformações da prática
e do pensar crítico Valmir Santos1

1. Jornalista, crítico A fortuna crítica de uma obra corresponde ao campo de pensamento que
e cocurador do
ela instaurou quando veio a público editada, gravada, filmada, esculpida,
Crítica em Movimento.
Idealizador e editor pintada, apresentada ou performada. Os oito cadernos concebidos espe-
do site Teatrojor- cialmente para a quarta jornada Crítica em Movimento desejam inverter um
nal – Leituras de
pouco essa expectativa ao articular 24 textos no âmbito justamente do fa-
Cena desde 2010.
É doutorando em zer crítico. São visões heterogêneas do que consiste e de como se desdo-
artes cênicas pela bra em criações em circo, dança e teatro, com variantes para intervenção
Universidade de
São Paulo (USP),
e performance. Sabemos o quanto as circunstâncias históricas, sociopolí-
onde também rea- ticas e culturais envolvem praticantes e partícipes, artistas, pesquisadores
lizou mestrado na e, claro, espectadores-leitores.
mesma área.

Realizado anualmente desde 2017 pelo Itaú Cultural (IC), o ciclo de debates
discute a recepção das artes da cena e o imprescindível diálogo entre públi-
cos, criadores e críticos. Em 2021, neste periclitante contexto da pandemia,
o estímulo ao pensamento contorna a impossibilidade do encontro presen-
cial por meio da veiculação de conteúdos reflexivos em texto e podcast.

Além de ampliar o acesso, busca-se perenizar as discussões das três edi-


ções passadas, que abordaram a prática da crítica à luz de problemas des-
se ofício e contaram com a apresentação de espetáculos. Entre as pautas
abarcadas estavam a precarização do trabalho no âmbito do jornal impres-
so e a busca pela sustentabilidade em contraponto ao mero diletantismo;
o consistente avanço da análise na internet com ganas de reinvenção de
estilo; e a adoção de novos procedimentos e de ideias consonantes com
os estudos universitários e a inquietude da cena brasileira contemporâ-
nea. Também foram abordadas as realidades sociais de sujeitos colocados
à margem e ancorados na dramaturgia de Plínio Marcos, bem como um re-
corte latino-americano e caribenho com obras e reflexões de representan-
tes da Argentina, do Chile e de Cuba.

Dado o insólito cenário do ano anterior, marcado pela irrupção global do


novo coronavírus, uma das alternativas foi elaborar uma publicação on-li-

4
\editorial

ne, com oito itinerários de escritas realizados por 25 pessoas do universo


das artes da cena.

Cada volume enfeixa três análises estimuladas pelos seguintes motes: 1)


o papel da crítica de teatro no Brasil – do jornal impresso à plataforma di-
gital; 2) o vão entre a crítica e o circo; 3) estados da crítica de dança; 4)
espaços digitais empenhados em artes cênicas; 5) a dificuldade da crítica
em contracenar com o teatro de rua; 6) a cena engajada no contexto con-
temporâneo; 7) teatros peculiares na mão dupla com Cuba e Brasil; e 8)
panorama do teatro latino-americano visto da ponte.

Neste segundo caderno, portanto, você percorre o tema “O vão entre a crí-
tica e o circo”, explorado por artistas e pesquisadores de Pernambuco e São
Paulo afeitos às artes circenses.

Coordenadora-executiva da Escola Pernambucana de Circo (PE) – uma das


referências nacionais em pedagogia do circo social, fundada em 1985 e se-
diada no bairro da Macaxeira, no Recife –, Fátima Pontes admite que há
muita gente pesquisando e escrevendo sobre as artes circenses atualmen-
te, mas pouco se sabe a respeito da crítica dos respectivos espetáculos.

Por isso, ela se pergunta como deve se sentir uma pessoa especializada em
artes e cultura ao escrever sobre as artes circenses de forma crítica. Seria
necessário ter especialização para tanto? “Pergunto isso porque não é fácil
transcrever para o papel todas as questões relacionadas às artes circenses
presentes num espetáculo, num número, numa performance. Como trazer
para a escrita crítica tudo aquilo que comecei falando sobre as artes circen-
ses? Como falar sobre a destreza do artista, a estética do espetáculo, os fi-
gurinos, as músicas? É possível diferenciar o circo contemporâneo e o itine-
rante/tradicional daquele que é feito nos projetos de circo social, que tem
nas suas trupes a forma de expressar o seu trabalho pedagógico com crian-
ças, adolescentes e jovens? Como analisar criticamente um artista circense
da nova geração, que tem acesso a muita informação e tecnologia, ao lado
dos artistas mais velhos, que se mantêm com seus números e espetáculos
cheios de tradições?” Provocadora, Fátima é também artista do picadeiro, e
reflete sobre seus primeiros anos de vida e a condição de espectadora que
a levou a tomar gosto pelo ofício artístico e se tornar uma formadora.

5
crítica em movimento:
\O vão entre a crítica e o circo

Após pinçar do dicionário palavras-chave como “crítica”, “estética”, “acro-


bacia” e “arte”, a atriz e especialista em circo Alice Viveiros de Castro (SP)
declara, com bom humor e inteligência: “Sou acrobata mental. Penso o cir-
co, salto e me equilibro tentando conhecer a história das artes circenses e
o papel que elas têm na nossa sociedade. São milênios de acrobacias em
todas as culturas, em todos os tempos. Descobri que era impossível lutar
pela valorização das artes circenses sem conhecer sua história e seus per-
sonagens. Acrobata mental, muito prazer”.

Em sua opinião, não é possível ter uma visão crítica quando não se conhece
a história de uma arte nem as diferenças estéticas com que ela se desen-
volve. “Nas últimas décadas do século passado o circo viveu um período
de revolução estética muito importante. Infelizmente, a falta de conhe-
cimento sobre as artes circenses criou equívocos que ressoam até hoje.
A França chamou o movimento de ‘novo circo’. Isso transformaria os que
tinham outro tipo de espetáculo em ‘velho circo’? No Brasil, a ignorância
absoluta dos nossos jornalistas fez com que espetáculos que se identifica-
vam com essa experiência estética fossem tratados como teatro. E é circo,
tudo circo! Quem é capaz de realizar proezas que desafiam a gravidade
é circense. A ignorância irrita”, confessa Alice, dando seu testemunho de
como viu surgirem a carioca Intrépida Trupe, em 1986, e toda uma coleção
de equívocos que atribui a parte da imprensa – seja por não reconhecer o
talento circense nato do “grupo capaz de fazer proezas de alto nível”, seja
por cair em tergiversações, como “grupo de teatro e dança que utiliza téc-
nicas circenses”.

Ao comentarem a respeito do circo no Brasil do século XIX e de sua difu-


são sob o regime do Império, a professora e pesquisadora Erminia Silva e
o pesquisador Daniel de Carvalho Lopes, ambos do site Circonteúdo (SP),
permitem um contraste com a realidade do século XXI. Naquele período,
essa arte constituía “uma das formas mais frequentes e atrativas de di-
vertimento para a sociedade, reunindo os mais variados grupos sociais. Ao
longo dos anos 1800, centenas de companhias viajavam por todo o país,
vindas de turnês por outros continentes”, conforme os autores.

“Esses diversos circos, cada um com uma maneira própria de produzir e


organizar seus espetáculos, se relacionaram intensamente com a vida so-

6
\editorial
Transformações da prática e do pensar crítico

cial e urbana do período e, consequentemente, receberam ‘enxurradas’


de público – termo comum nos jornais para tratar do sucesso que algu-
mas companhias estavam obtendo na época. Por causa de suas atrações e
de sua magnitude (muitos circos possuíam dezenas de animais e artistas
e mesmo navios próprios para o transporte da companhia, como o Circo
Grande Oceano), assim como por mobilizarem o imaginário de homens,
mulheres e crianças de mil maneiras, foram também tema de ‘enxurradas’
de crônicas, críticas, notas, sátiras e charges de praticamente todas as
produções bibliográficas da época, principalmente as jornalísticas”, reca-
pitulam Erminia e Lopes.

E ainda situam: “Assim, como podemos observar por meio dos exemplos
aqui apresentados, os espetáculos circenses, seus artistas e suas realiza-
ções no Brasil ao longo do século XIX e, claro, no início do século XX foram
frequentemente contemplados por parte da imprensa e da crítica em di-
versificadas publicações. Falaram bem, falaram mal, mas sempre falaram
do circo. Diante da multiplicidade das produções circenses e de sua perma-
nente reinvenção, o circo sempre esteve sob os holofotes da opinião públi-
ca e estampado nas páginas de jornais, revistas, folhetins e até mesmo em
publicações voltadas para a educação ou a produção cultural artística”.

Os demais escritos presentes na publicação on-line são assinados pela


atriz Alice Guimarães, do Teatro de Los Andes (Bolívia); pelo encenador Al-
temar Di Monteiro, do grupo Nóis de Teatro (CE); pelo artista-pesquisador e
professor chileno radicado em Fortaleza Héctor Briones (CE); pela docente,
produtora e gestora cultural Andrea Hanna (Argentina); pela atriz e pes-
quisadora teatral Camila Scudeler (Colômbia); pelo jornalista e crítico de
dança Carlinhos Santos (RS); pelo artista transdisciplinar e crítico de dança
Daniel Fagus Kairoz (SP); pelo ator e crítico de teatro Diogo Spinelli, do site
Farofa Crítica (RN); pelo ator, diretor e professor de teatro Edson Fernando,
do site Tribuna do Cretino (PA); pelo ator e diretor Fernando Cruz, do Tea-
tro Imaginário Maracangalha (MS); pela jornalista e crítica de teatro Ivana
Moura, do blog Satisfeita, Yolanda? (PE); pelo ator e pesquisador teatral
Lindolfo Amaral, do Grupo Imbuaça (SE); pelo diretor Luis Alonso-Aude, do
grupo Oco Teatro Laboratório e do Festival Internacional Latino-Americano de
Teatro da Bahia (FilteBahia/BA); pelo pedagogo, crítico de teatro e pesquisa-
dor Luvel García Leyva (Cuba); pela atuadora e pesquisadora Marta Haas,

7
crítica em movimento:
\O vão entre a crítica e o circo

da Tribo de Atuadores Ói Nóis Aqui Traveiz (RS); pela atriz e agitadora cul-
tural Nena Inoue (PR); pela diretora e dramaturga Fernanda Júlia Onisajé,
do Núcleo Afrobrasileiro de Teatro de Alagoinhas (BA); pela jornalista e crí-
tica de teatro Pollyanna Diniz, do blog Satisfeita, Yolanda? (PE); pelo crítico
de teatro e jornalista Macksen Luiz (RJ), atuante no Jornal do Brasil (1982-
-2010), colaborador de O Globo (2014-2018) e criador de um blog de críticas
com seu nome (2011); pela pesquisadora em dança, bailarina e professora
Rosa Primo (CE); e pela artista-pesquisadora e professora Walmeri Ribeiro,
do projeto Territórios Sensíveis (RJ).

Como se vê e se lê, é uma produção textual que se pretende geográfica


e ideologicamente não hegemônica. Ela se derrama sobre o fazer crítico,
suas potências e seus impasses nesta quadra da história do Brasil, em que
as já insuficientes políticas públicas para as artes e a cultura enfrentam
ataques beligerantes.

Escuta ativa

Em simbiose com os cadernos, o podcast Crítica em Movimento chama o


público em geral a ativar a escuta reflexiva por meio de cinco episódios.
Cada um deles traz uma pergunta para os convidados. No primeiro, Mack-
sen Luiz e a crítica de teatro, pesquisadora e artista Daniele Avila Small,
da Questão de Crítica – Revista Eletrônica de Críticas e Estudos Teatrais, ambos
atuantes no Rio de Janeiro e de distintas gerações, respondem à pergun-
ta: “Quais são os enfrentamentos da prática da crítica de teatro hoje?”. O
tópico perpassa a precarização do trabalho remunerado, a migração do
fazer crítico para a internet e como expandir a conversa com públicos, ar-
tistas e gestores culturais, com mediação do jornalista e crítico de teatro
que escreve estas linhas.

No segundo episódio, a pesquisadora, artista e docente Lourdes Macena


(CE) e o ator e diretor Rogério Tarifa (SP) se dedicam à questão: “Como a crí-
tica se relaciona com a noção do popular nas artes cênicas?”. Com media-
ção do pesquisador e professor Diógenes Maciel (PB), é um diálogo acerca
da recepção de expressões culturais emanadas do povo, muitas vezes em
oposição ao conhecimento formal, às normas e às ambições dos poderes
políticos e econômicos em jogo na sociedade.

8
\editorial
Transformações da prática e do pensar crítico

“Qual é a percepção de quem cria a respeito do trabalho da crítica?” – eis o


ponto do terceiro episódio. Para respondê-lo, foram ouvidos artistas de cole-
tivos cênicos dos mais longevos do país: Tânia Farias, da Tribo de Atuadores
Ói Nóis Aqui Traveiz (RS), fundada em 1978, e o dramaturgo e diretor Edyr
Augusto Proença, do Grupo Cuíra (PA), formado em 1982. A mediá-los, a pes-
quisadora, performer e jornalista Maria Fernanda Vomero (SP). Essa triangu-
lação vai sondar como as suas respectivas criações são miradas por quem es-
creve crítica em suas regiões ou para além delas, uma vez que as realidades
social, política e econômica do Brasil apresentam contrastes e convergências.

A pesquisadora e docente Walmeri Ribeiro (RJ) e o ator Pedro Wagner, do


Grupo Magiluth (PE), ruminam sobre como exercer olhares e escutas a par-
tir da cena remota. A crítica de teatro e jornalista Luciana Romagnolli, edi-
tora do site Horizonte da Cena (MG), medeia os desafios da análise diante
dos procedimentos artísticos que emergem dos tempos atuais e abrem
precedentes para uma nova ideia de presença e corpo mediado.

Por fim, o último episódio discute qual é o lugar da resistência na formação


da crítica a partir dos olhares de Henrique Saidel (RS) e Dodi Leal (BA), ar-
tistas que radicam pesquisa, criação e docência em suas lidas cotidianas.
Sob mediação da jornalista, crítica de teatro e professora Julia Guimarães
(MG), os artistas prospectam de que maneira o estudo e o exercício da críti-
ca podem implicar procedimentos de escrita e de pensares tão expandidos
quanto a pulsante produção contemporânea.

O programa pode ser acessado no site itaucultural.org.br ou tocado no seu


aplicativo de podcasts favorito.

Evoé.

.:. Este texto é de exclusiva responsabilidade de seus autores e não reflete necessariamente
a opinião do Itaú Cultural.

9
crítica em movimento:
\O vão entre a crítica e o circo

Exercício de acrobacia mental:


crítica, estética e circo Alice Viveiros de Castro¹

1. Atriz e diretora Como diria o Velho Faceta:² primeiro do que tudo, segundo do que nada, va-
de teatro e de
mos ao dicionário para algumas definições simples, quase simplistas.
espetáculos
circenses. Autora
do livro O Elogio da Crítica: examinar obra de arte ou ciência, costumes, comportamentos e
Bobagem: Palhaços
suas características, nomeando sem preconceitos e com detalhes.
no Brasil e no Mundo
(Editora Família
Bastos, 2005). Estética: no kantismo, estudo dos juízos por meio dos quais os seres huma-
Representou a
área do circo no
nos afirmam que determinado objeto, artístico ou natural, desperta uni-
Conselho Nacional versalmente um sentimento de beleza ou sublimidade.
de Política Cultural
do Ministério da
Cultura (2006-
Acrobacia: arte de dançar sobre a corda e, por extensão, tudo o que apre-
-2012). Em 2013, senta dificuldades análogas às dos acrobatas em suas atividades.
publicou o artigo
“Acrobatas da
Serra da Capivara – Acrobata: akróbatos, no sentido de “aquele que anda na ponta dos pés”.
27.000 anos
de proezas e
Arte: produção consciente de obras, formas ou objetos voltados para a ex-
equilíbrios circenses”
na Revista Ensaio pressão da subjetividade humana, de nossos sentimentos e opiniões, assim
Geral (UFPA/ETD). como para retratar nossas experiências, transmitir informações e semear
beleza, divertimento e reflexão.³
2. Constantino Leite
Moisakis (1925- Sou uma acrobata mental.⁴ Criei esse termo para dar conta da pergunta: “O que é
-1986), conhecido que você faz no circo?”. Não sabia muito bem como explicar o que eu estava fazen-
como Velho Faceta,
foi um dos maiores
do ali. Entrei no circo por meio das lutas sindicais, das discussões sobre políticas
mestres de pastoril públicas para a cultura. Sou atriz, sempre fui, mas de repente estava lá. O que eu
de seu tempo. Tem fazia no circo? Acabei descobrindo: sou acrobata mental. Penso o circo, salto e me
discos gravados que
mostram bem sua equilibro tentando conhecer a história das artes circenses e o papel que elas têm
irreverência e iden- na nossa sociedade. São milênios de acrobacias em todas as culturas, em todos
tidade de palhaço.
os tempos. Descobri que era impossível lutar pela valorização das artes circenses
sem conhecer sua história e seus personagens. Acrobata mental, muito prazer.
3. Todas as defini-
ções são baseadas Demorei muito para compreender o porquê do desinteresse pelas artes circen-
em verbetes do
ses. Qual é a origem do menosprezo, do preconceito? Ainda não entendi muito
Grande Dicionário
Houaiss. bem, mas estou tentando.

10
Fiz faculdade de teatro. Tive muitas aulas sobre história do teatro e sobre 4. Erminia Silva e
Verônica Tamaoki são
história da arte. Comprei e li os três volumes de História Social da Literatura e
minhas companheiras
da Arte, do Arnold Hauser.⁵ Sei que essa minha fase de estudos acadêmicos de acrobacia mental.
foi há muitos anos, mas a verdade é que o circo continua fora da linha da Além de pesquisar e
estudar o circo, acro-
história das artes.
batas mentais par-
ticipam de lutas por
Os espetáculos populares também não fazem parte dessa linha. Não quero mais respeito e apoio,
seja da academia, seja
entrar aqui na discussão do que é “espetáculo popular”. Acho que dá para dos intelectuais e dos
compreender o sentido do termo nesse contexto. Se eu dependesse dos governos. Criamos um
livros e dos críticos, não teria ideia do que é um teatro de mamulengo, não Comitê Pró-Criação da
Associação Nacional
saberia que Antônio José da Silva, o Judeu, era bonequeiro e todos os seus de Acrobatas Mentais,
textos foram escritos para bonecos. Não conheceria o pastoril, os reisados, o CPCANAM. Quem
está no circo precisa
nada saberia da riqueza rítmica do Brasil. Não saberia o quanto os mouros
ter humor, sempre.
deixaram na nossa história, não conheceria nossos arquitetos populares
tão criativos – e isso sem falar nas culturas de tantos outros povos.
5. Em 1976, Arnold
Hauser era o máximo
Muitos vão pensar que minha ignorância era abissal, e eu concordo. Não do máximo, e seus
era falta de interesse; sempre tentei ler tudo o que me caía nas mãos sobre livros – ainda não tra-
duzidos – eram caros,
arte, fui rato de sebo a vida toda. Mas não sabia como buscar informações
muito caros.
sobre algo que nem imaginava que deveria conhecer.

6. Circo, como
Quando comecei a trabalhar com Luiz Mendonça é que passei a compreen-
teatro, tem dois
der o mundo que não conhecia. As artes são muitas, muitas mais. Artistas significados: a casa
existem de todos os tipos, em todos os cantos. Ninguém vai dar conta de onde se realiza
o espetáculo e o
entender e conhecer tudo, mas podemos ir muito além dessa história das
espetáculo que se
artes que foram reconhecidas como importantes por pessoas que se reco- realiza comumente
nheciam como importantes. nesse espaço. As
artes circenses exis-
tem muito antes da
Conheço pouco, muito pouco, mas abri meus olhos para as artes e ampliei criação do espaço
esse plural em múltiplas vertentes. Não dá para tentar conhecer a história circo, assim como
o teatro.
das artes com julgamentos de qualidade, sem se dar conta das diferentes
formas e meios. Sem reconhecer a influência do tempo, do entorno e do
objetivo de cada obra, espetáculo ou expressão.

E o circo,⁶ como é que fica na história da arte? Por que não está nos livros,
na história oficial? Como acrobata mental, tenho ensaiado algumas possí-
veis respostas. E, como toda acrobata, corro o risco de cair no chão, mas
vale a pena tentar. Lá vou eu.

11
crítica em movimento:
\O vão entre a crítica e o circo

Tudo o que não pode ser feito pela elite ou apreciado exclusivamente por
ela não tem importância.

A definição de qualidade das artes sempre foi um atributo que coube às eli-
tes, em todas as eras. As grandes festas populares, os desfiles dos exércitos
vitoriosos, as festas da colheita, os cortejos religiosos eram todos bancados
por uma elite para o deleite do povo. Lá estavam faraós, sacerdotes, reis, no-
bres de todo tipo. Divertiam-se também, mas aquilo era para o populacho.

A importância dos mecenas nos ajuda a compreender um pouco como se


deu essa divisão entre o que é arte e o que não é, entre o que é nobre e o
que é apenas entretenimento, uma arte menor.

Até hoje, ter ou não recursos para sobreviver e criar é fundamental para
qualquer artista. Músicos, compositores, literatos, poetas, escultores, pin-
tores e tantos outros artistas das artes nobres podiam ao menos disputar
um lugar ao sol. Dependiam do desejo da elite, do reconhecimento de al-
gum mecenas. Igrejas e templos de todas as épocas precisavam impres-
sionar seus fiéis e reforçar sua relação com o mágico, o divino, o inefável.
Quem pagava a conta tinha todo o interesse em valorizar “seus artistas”,
“suas obras”, exibindo sua riqueza e seu “bom gosto”.

Quem escolheu os gravadores e pintores das pirâmides? Quem decidia que


artista faria a rica marchetaria e as delicadas pinturas da arte chinesa?
Alguém sempre tem a palavra final, alguém sempre decide o que é bom, o
que é belo, o que está à altura do “dono” da obra.

O caso do balé clássico é emblemático. A humanidade sempre dançou. De


festas de casamento a rituais religiosos, tudo era motivo para dançar. Nas
cortes, dançava-se muito também, ainda que com mais luxo, modos refina-
dos e regras distintas das danças dos plebeus.

No início do século XVI, surge nas cortes italianas o balé. Levado para a
França pela rainha Maria de Médici, o balé encontra ali seu público mais
apaixonado. A corte francesa acolheu encantada a delicadeza e a sutileza
de seus movimentos. Outro ponto importante é que o balé necessitava das
orquestras, permitindo à elite ostentar seu prestígio com “seus” músicos e
“seu” corpo de baile. Estava criado o espetáculo de dança da elite.

12
Exercício de acrobacia mental: crítica, estética e circo

A divisão de classes, direitos e regalias sempre fez parte da história e, por- 7. Os que jogam são
os que se apresen-
tanto, também da história da arte. Existe certa hierarquia nas artes, como
tam. Na cultura
bem explicita o conceito do cinema como a sétima delas. As outras são ar- popular, brincar, jogar
quitetura, escultura, pintura, música, poesia e dança. e representar são
a mesma coisa. Na
linguagem culta, não
Artistas circenses apresentavam-se em grandes festas da elite também. A temos o “to play” do
imagem de malabaristas e cuspidores de fogo era comum nos banquetes inglês nem o “jouer” do
francês.
medievais ou nos simpósios gregos. A diferença é que eles não eram consi-
derados artistas. Com a nobre exceção dos bobos e bufões, não encontra-
mos referências a artistas do circo bancados por mecenas de qualquer tipo.
São muitas as referências aos grupos ambulantes de teatro que realizavam
proezas acrobáticas, dançavam comicamente e cantavam canções licen-
ciosas ou românticas, mas todos estavam sempre de passagem: recebiam
seu pagamento e seguiam caminho. Saltimbancos sobreviviam das moedas
jogadas no chapéu.

Voltamos ao ponto: por que as artes do circo não são tratadas como
arte? Não sei e não tenho a pretensão de responder, estou tateando,
buscando pistas.

Na hierarquia das artes a comédia está bem abaixo da tragédia. Os assun-


tos transcendentais, as histórias edificantes, as grandes passagens da his-
tória, os dramas humanos e dos deuses estão na tragédia. A comédia trata
dos quiproquós e confusões do dia a dia. São cornos, velhos babões, ava-
rentos, mulheres tagarelas, o soldado covarde, o soldado valente, a moci-
nha ingênua e o rapaz que quer se casar com ela.

De maneira geral, podemos colocar os personagens da tradição cô-


mica em dois grandes grupos: os que comem e os que não têm o que
comer e vão passar toda a história tentando resolver seu problema.
São personagens que atravessaram milênios. Na Grécia Antiga eram
os deikelistai – os que mostram, os que jogam.⁷ Mímicos dóricos, poe-
tas iâmbicos, parasitas, todos, de alguma forma, usavam esses tipos
caricatos que chegam aos nossos dias. Os lazzi da Commedia dell’Arte,
herdeiros da farsa atelana e da comédia romana: são os roteiros que,
de tão conhecidos, não precisavam ser escritos. Os personagens eram
os mesmos, com pequenas variações, dependendo da região de origem
e da época.

13
crítica em movimento:
\O vão entre a crítica e o circo

Os atores acrobatas palhaços podiam fazer o mesmo personagem toda a


vida. Arlequins, pantaleões, doutores, polichinelos, colombinas, as amas e
as velhas são figuras que se perpetuaram ao longo dos tempos. A comédia
repete infinitamente as mesmas situações básicas e, por mais que tudo pa-
reça diferente, os sentimentos humanos são os mesmos. Sempre tentamos
rir de nós mesmos.

Comediantes, saltimbancos, acrobatas, músicos, dançarinos e o que mais


for necessário: assim são os artistas circenses. Esse teatro popular das
praças e das feiras não fazia diferença entre cada uma das habilidades de
um artista. Nos espetáculos entrelaçavam-se saltos, piruetas, cançonetas,
poesia, histórias cômicas ou românticas, animais em exposição ou adestra-
dos. Todos itinerantes, vindos de lugar nenhum, indo para um lugar qualquer.

Na luta por apoio financeiro e prestígio, cada ramo da arte tentava ser re-
conhecido como algo especial e que merecia tratamento diferenciado. O
teatro era especial, e não podia ser igualado aos saltimbancos de feira. A
competição era tão grande que, na França, por um longo período, só era
permitido falar e tocar instrumentos em cena nos teatros oficiais que ti-
nham permissão do rei. Portanto, os saltimbancos se reinventaram. Cria-
ram a cena do lado de fora da barraca. Um apresentador fazia o resumo da
peça e apresentava os personagens. Lá dentro, muita mímica e até mesmo
uso de cartazes, como aconteceria no cinema mudo séculos mais adian-
te. Instrumentos insólitos acabaram se transformando em grande atração.
Tocar serrote, dançar com guizos afinados, tamboretes, pandeiros, coro de
buzinas: inventava-se tudo para garantir a alegria do público.

O circo moderno, com maravilhosos cavalos e cavaleiros, inúmeras proezas


e figuras cômicas, foi criado por Philip Astley em 1778, em Londres. No início
era apenas um terreno cercado onde o público pagante podia apreciar evo-
luções de cavalos e cavaleiros, números com malabaristas, músicos, equili-
bristas, acrobatas e palhaços. Em 1779, Astley constrói seu anfiteatro com
picadeiro de 13 metros de diâmetro e condições de apresentar números
fascinantes, com todo o tipo de habilidade e variedade das artes circenses.

Na França, já em 1782, Charles Hughes e Charles Dibdin inauguram uma


casa de espetáculos com um picadeiro e um palco, com o nome de Royal Cir-
cus. Essa é a primeira vez que se usa a palavra “circo” no sentido moderno.

14
Exercício de acrobacia mental: crítica, estética e circo

Esse espetáculo com a diversidade dos saltimbancos e a perícia dos cava- 8. O trapézio de
voos foi criado por
leiros é sucesso em toda a Europa e logo chega às Américas. Cabe lembrar
Jules Léotard, ginasta
que artistas equestres, ilusionistas, acrobatas, trapezistas e aramistas já francês, em 1859.
vinham ao Brasil desde o início do século XVIII. Apresentavam-se em tea- O acrobata saía de
um trapézio (o que
tros, nas ruas ou nos “círculos de touradas”. No início do século XIX, famílias
chamamos hoje de
de artistas vindas, na sua maioria, da Europa resolveram ficar por aqui e trapézio fixo, que
montaram seus circos. balança mas não tem
altura) para outro e
deste para um tercei-
Não vou contar a história do circo. Nem posso, sei pouco. Sabemos muito ro, fazendo movimen-
pouco ainda. O importante é perceber que o circo, assim como o teatro e tos acrobáticos a cada
passada.
qualquer outra forma de arte, tem sua história, transforma-se, reinven-
ta-se e segue. As artes circenses, assim como a arte da interpretação,
estão presentes desde sempre e, ao longo dos tempos, passaram por
várias mudanças estéticas. O espetáculo do circo do século XVIII não é
igual ao do circo de lona, criado por J. Purdy Brown em 1825, nos Estados
Unidos. O circo de lona é o símbolo do espetáculo itinerante, a marca dos
novos saltimbancos.

Cada avanço tecnológico abre inúmeras possibilidades para as artes cir-


censes. A “novidade” é parte delas. A “grandiosidade” também. O “apara-
toso” é parte das artes circenses. As lonas crescem, passam a ter dois mas-
tros e já podem apresentar o trapézio voador, que antes só era possível nos
anfiteatros. Com a popularização do número criado por Léotard,⁸ acroba-
tas foram inventando dificuldades, elaborando o número e transformando
o trapézio. O aparelho de voos hoje é imenso e fica a uma grande altura.
Criou-se o portô, que ampara o volante, que se lança do trapézio. As trupes
de hoje realizam triplos saltos mortais e outros movimentos que parece-
riam impossíveis para o jovem Léotard e seus contemporâneos.

Não dá para ter uma visão crítica quando não se conhece a história nem as
diferenças estéticas de uma arte que se desenvolve. O trapézio, por exem-
plo, é um aparelho em que artistas se apoiam para realizar proezas. Mas o
que faz o número não é o aparelho nem o fato de artistas serem capazes
de realizar determinada dificuldade técnica. O que faz o número, o que faz
do trapézio uma das imagens mais memoráveis do circo é o voador, é o vo-
lante. A música, a presença, o tempo, a escolha da série, a capacidade de
encantar: isso é arte. É preciso conhecer o número de trapézio para com-
preender a qualidade do trapezista.

15
crítica em movimento:
\O vão entre a crítica e o circo

9. Cito a Intrépida Nas últimas décadas do século passado o circo viveu um período de re-
Trupe como
volução estética muito importante. Infelizmente, a falta de conhecimento
exemplo perfeito
dessa confusão sobre as artes circenses criou equívocos que ressoam até hoje. A França
entre o que é ou chamou o movimento de “novo circo”. Isso transformaria os que tinham ou-
não circo, mas
tro tipo de espetáculo em “velho circo”? No Brasil, a ignorância absoluta
poderia citar Circo
Mínimo, Acrobáticos dos nossos jornalistas fez com que espetáculos que se identificavam com
Fratelli, Teatro de essa experiência estética fossem tratados como teatro. E é circo, tudo cir-
Anônimo e muitos
co! Quem é capaz de realizar proezas que desafiam a gravidade é circense.
outros nomes.
A ignorância irrita.

Acompanhei de perto essa história. Estava lá quando começou a Intrépida


Trupe,⁹ em 1986. Um grupo de jovens recém-formados pela Escola Nacio-
nal de Circo Luiz Olimecha viajou para o México levando consigo artistas
que vinham da dança, da capoeira e de um curso de dublês ministrado por
Breno Moroni no Parque Lage. Todos participavam do Circo Voador mon-
tado no Arpoador, na beira da praia. Nenhum deles era de família circense.
Nenhum deles nasceu numa barraca ao lado da lona. Eram jovens urbanos
que gostavam de um tipo de música, que se vestiam como outros jovens da
cidade e tinham uma bagagem cultural parecida.

A Intrépida Trupe, apesar de não ter a tradição circense, trazia no seu re-
pertório alguns números de grande dificuldade técnica. Equilíbrio no rola-
-rola com a volante apoiada na cabeça do equilibrista, número de forma-
tura de Claudia Goudá e Ricardo Camilo na Escola de Circo, é um que nunca
mais vi igual. Outros que merecem destaque são o tango com perna de pau
e a monociclista em altura de Felicity Simpson e Hector Combo. Números
que exigiam domínio técnico apurado e eram pura poesia.

Os jovens driblavam as dificuldades técnicas transformando-as em opor-


tunidades criativas. O número de trapézio triplo não era espetacular tec-
nicamente, mas as trapezistas nadavam no ar, e isso era lindo. Essas ideias
eram algo diferente, chamaram atenção e criaram um olhar.

A imprensa carioca resolveu chamar a Intrépida Trupe de “grupo de teatro


e dança que utiliza técnicas circenses”. Até hoje usam esse tipo de designa-
ção para se referir a um grupo capaz de fazer proezas de alto nível.

16
Exercício de acrobacia mental: crítica, estética e circo

As acrobacias circenses são dançadas desde sempre. Há uma coreografia em


cada movimento e os artistas representam o tempo todo. Entram em cena
e se impõem ao público. São personagens. O homem forte não é tão forte, a
bailarina tão delicada no trapézio tem músculos trabalhados e muita força.

A Intrépida Trupe é um grupo de circenses e, como todos os circenses, é her-


deira dos saltimbancos. O circo, por si, é um espetáculo de circo-dança-teatro-
-música-e-mais-alguma-coisa. No circo cabem cinema, show, televisão, tudo.

A ignorância transformou o que seria um interessante estudo para a crítica


numa briga por espaço e recursos. O final dos anos 1980 marcou uma nova
estética no circo – mais uma. Outro olhar para a criação do espetáculo,
mais um estilo dos tantos que o circo desenvolveu ao longo de sua história.
Como em qualquer arte, as escolhas estéticas são múltiplas e algumas ve-
zes pontuais, outras vezes tão marcantes que se transformam num movi-
mento, influenciando toda uma geração.

Ao mesmo tempo estão em cartaz o Cirque du Soleil e o Cirque d’Hiver


Bouglione. São contemporâneos. O público pode escolher qual prefere ou
mesmo assistir aos dois. São diferentes estilos e seus espetáculos são com-
pletamente diversos; no entanto, é tudo circo! É tudo arte circense. A di-
ferença está na escolha estética e, é claro, nas possibilidades financeiras.

Quando vamos começar a pensar seriamente as mudanças estéticas que


atravessam as artes do circo? Vamos viajar na história para tentar entender o
que significou o Ringling Brothers and Barnum & Bailey Circus criar o gigan-
tesco espetáculo com três picadeiros? Como isso impactou os outros circos?
E a criação das lonas suspensas, sem mastro, mudou alguma coisa nos espe-
táculos? Acho fascinante o entrelaçamento das questões tecnológicas com as
artísticas nas artes circenses. As artes do circo são fascinantes mesmo.

.:. Este texto é de exclusiva responsabilidade de seus autores e não reflete necessariamente
a opinião do Itaú Cultural.

17
crítica em movimento:
\O vão entre a crítica e o circo

Para saber mais

No site do Circonteúdo – o Portal da Diversidade Circense (circonteudo.


com) estão a melhor bibliografia, livros, teses de mestrado e de doutorado
e artigos para download, histórias de artistas, vídeos e depoimentos. Entrar
no Circonteúdo é mergulhar profundamente no circo e nas artes circenses.

O Centro de Memória do Circo, no Centro Histórico de São Paulo, é um mu-


seu vivo do circo e das artes circenses, com inestimável acervo material e
imaterial. Local de cursos, palestras e espetáculos, é um espaço vivo aberto
a pesquisadores e ao público em geral. Imperdível.

18
Exercício de acrobacia mental: crítica, estética e circo

Referências

CASTRO, Alice Viveiros de. O elogio da bobagem: palhaços no Brasil e no mundo.


Rio de Janeiro: Editora Família Bastos, 2005.

CIRCONTEÚDO. Concepção: Crioula Design, 2018. Disponível em: https://


www.circonteudo.com/. Acesso em: 28 set. 2020.

19
crítica em movimento:
\O vão entre a crítica e o circo

“O vão entre a crítica e o circo”:


uma história cheia de percalços!
Fátima Pontes¹

1. Graduada em Olho a página em branco… Penso em como vou conseguir escrever sobre
artes cênicas
“o vão entre a crítica e o circo”. Daí que penso em como escrevo em ge-
pela Universidade
Federal de ral. Meu orientador no mestrado, João Francisco de Souza – cuja falta me
Pernambuco causa tristeza, pois era alguém que entendia minha escrita –, dizia: “Ela
(UFPE), fez
escreve como quem está conversando com outra pessoa”. Eu morria de rir,
mestrado na área
de educação pela porque achava que era assim que se deveria escrever para que as pessoas
mesma instituição. entendessem, todas elas. Depois de um tempo, ele aceitou minha forma
Atua como atriz,
produtora cultural
de escrever e não quis mais que eu a mudasse para a dissertação, porque:
e professora de “Se ninguém escrever diferente na academia, vai se tornando tudo uma
teatro. Coordena, única coisa... Vá, faça do seu jeito”. E é assim que, depois de pensar muito,
há 20 anos, as áreas
executiva e artística
escrevo este texto: de forma que pareça uma conversa entre mim e meus
da ONG Escola amigos e amigas do circo e de outros lugares, da forma como gosto de con-
Pernambucana de
tar histórias ou estórias.
Circo, consolidada
em Recife em 24
anos de atividades Daí que penso agora em como, na verdade e antes de entrar no tema, des-
ininterruptas. A
crever de forma simples e rápida toda a magia que as artes circenses pos-
organização é
vinculada à Rede suem quando tomam de rebote o seu público. Vem à mente, então, a pri-
Circo do Mundo meira vez que vi um circo, quando ainda era criança e nem sei quantos anos
Brasil, de cujo
tinha – 6, 7, 10 anos? Sei lá! Não me lembro mesmo, nem do nome do circo,
colegiado gestor
faz parte, que tem mas acho que era um desses que usam nomes “estrangeiros”, o que acho
parceria com o uma delícia de poesia.
programa Cirque du
Monde, do Cirque
du Soleil, sendo As lembranças são confusas – não sei se lembro a que, de fato, assisti ou o
um dos centros que quero recordar –, por hoje eu fazer parte desse mundo circense e querer
de referência
na instrução de que ele seja sempre encantador, mágico e alegre. Mas me lembro de alguma
formadores em coisa que me tomou naquele dia: quando assisti a um espetáculo do circo, ele
circo social.
me tomou pelo coração, pela garganta, pelo peito, pela alma. Toda a graça
e a leveza da trapezista, a destreza dos malabaristas, a graça sem fim dos
palhaços sempre tirando sarro de alguém da plateia, o cheiro da serragem,
o encantamento com a lona cheia de estrelinhas (tinha furos também; a luz
passava por eles e ia parar no picadeiro), e havia os animais. Nesse, eram os

20
cachorros amestrados, cavalos e um leão que me deu medo – mas mais medo
do adestrador do que do leão, porque ele fazia muitas caretas ao conduzir o
animal para as suas peripécias, que o público aplaudia entusiasmado.

Hoje, há mais de 20 anos trabalhando com as artes circenses, ainda sinto


o mesmo que senti quando criança ao ver um espetáculo de circo: fico bo-
quiaberta, com frio na barriga, arrepiada, entusiasmada, esfuziante, ele-
trizada, apaixonada. Mesmo que seja aquele circo que muita gente chama
de “cirquinho”, aquele “pobrezinho”, que fica lá nos “cafundós de Judas”,
como se fala aqui em Pernambuco quando algo é muito, muito longe. Sinto
sempre que algo de mágico atingiu alguma pessoa da plateia e os artistas
– os mesmos que muitas vezes vendem as guloseimas na frente do circo, no
pano de roda. “Já reparou como circo tem cheiro de pipoca?”, dizia Amanda,
personagem de um espetáculo que montamos aqui em Recife em 2008,
chamado Ilusão – um Ensaio Melodramático Circense, na Escola Pernambucana
de Circo. E, realmente, assim como o cinema, o circo também tem cheiro de
pipoca! E a maçã do amor? Só se faz daquele tipo no circo! E os brinquedos?
O intervalo do espetáculo serve a isso, à venda desses produtos, e também
tem uma magia, um encantamento. É o momento em que se ri ou conversa
sobre os números que já foram apresentados e os que ainda estão por vir.
Vamos voltar para a plateia, o espetáculo vai continuar!

E ele sempre continuou, mesmo agora, em tempos tão difíceis – 2020, que
ano! Momentos que jamais pensamos que iríamos viver em pleno século
XXI, como se não bastassem todos os outros tormentos que as artes cir-
censes sempre sofreram, desde o começo dos anos 1990 até hoje. A falta
de terrenos nos grandes centros urbanos há muito empurrou os pequenos
e médios circos para os interiores dos estados, e os grandes para os esta-
cionamentos dos shoppings.

Minhas lembranças me levam para quando comecei a trabalhar no circo. Fui


empurrada para dar aulas de teatro na Escola Pernambucana de Circo, em
Recife, no começo dos anos 2000 – e é de onde falo e escrevo, porque só sei
falar e escrever a partir de onde venho e estou no mundo. Nada entendia
daquela arte; até hoje acredito que pouco sei, porque todos os dias aprendo
mais e mais com todos os que fazem artes circenses, dos mais novos aos mais
velhos. Quanta sabedoria de todos e todas elas! No entanto, o encantamento
que acredito ter tido na primeira vez que fui ao circo continua o mesmo.

21
crítica em movimento:
\O vão entre a crítica e o circo

Adoro ver os meus meninos e meninas da Escola Pernambucana de Circo


e de outros projetos de circo social treinando, aprendendo, se desafiando,
se superando, pesquisando, encontrando novas formas de fazer de novo
o que sempre foi feito. Vejo isso na maioria das centenas de circenses que
hoje conheço e com quem convivo, de todas as categorias: itinerantes, in-
dependentes, de rua, de trupes, grandes companhias, pequenas compa-
nhias, grupos, artistas solo, enfim, tudo isso ainda me encanta. Esse é o
motivo de continuar remando nessas ondas que vão e vêm, como o mar
que tanto amo!

Assim, chego a pensar em como se sente um crítico especializado em artes


e cultura ao escrever sobre as artes circenses de forma crítica. Será que ele
tem que ter especialização em circo para fazer isso? Pergunto isso porque
não é fácil transcrever para o papel todas as questões relacionadas às ar-
tes circenses presentes num espetáculo, num número, numa performance.
Como trazer para a escrita crítica tudo aquilo que comecei falando sobre
as artes circenses? Como falar sobre a destreza do artista, a estética do
espetáculo, os figurinos, as músicas? É possível diferenciar o circo contem-
porâneo e o itinerante/tradicional daquele que é feito nos projetos de circo
social, que tem nas suas trupes a forma de expressar o seu trabalho peda-
gógico com crianças, adolescentes e jovens? Como analisar criticamente
um artista circense da nova geração, que tem acesso a muita informação
e tecnologia, ao lado dos artistas mais velhos, que se mantêm com seus
números e espetáculos cheios de tradições?

Como diz minha amiga – graças a Deus – e companheira de tantas trocas


de experiências e conhecimentos, a doutora Erminia Silva: “Circo é circo!”.
Concordo com ela, porque também acredito que a expressão do que é apre-
sentado é dita por quem está apresentando, seja bom, seja ruim, ótimo ou
excelente aos olhos de quem aprecia. Quem está atuando é que sabe o por-
quê de seus fazeres – “Cada um sabe a dor e a delícia de ser o que é”, como
diz o grande Caetano Veloso. Embora existam distinções entre os fazeres e
as formas circenses de se apresentar, todos têm o mesmo objetivo: trazer
para a plateia o frio na barriga, o arder das mãos em aplausos calorosos.
Ah, a difícil tarefa de não enlouquecer pensando: “Como ele(a) consegue
fazer isso?”. Será que os críticos, tendo de pensar na forma de escrever,
assim como eu no começo deste texto, conseguem entender o que são as
artes circenses? Sem querer ser pedante, mas já sendo, acredito que não.

22
“O vão entre a crítica e o circo”: uma história cheia de percalços!

E, logicamente, não é que os críticos não queiram escrever sobre circo, mas 2. A primeira dessas
cartas foi traduzida
acho que a especificidade da arte circense dificulta esse processo de escri-
por Erica Stoppel,
ta da linguagem das artes cênicas, que no meu entendimento é a mais difícil do Circo Zanni
de fazer sem ter a tal técnica, mesmo que imatura. Não existe possibilidade (SP), com o título
“A necessidade de
de fazer malabares sem, de alguma forma, manter os objetos no ar; não tem
uma redefinição”.
como fazer acrobacias sem rolar no chão de forma direcionada para o salto Disponível em:
mortal ou algo mais espantoso ainda. Enfim, a diversa expressão da linguagem https://panisecircus.
com.br/abril-
circense exige um treinamento de meses ou até de anos para a sua destreza. retrato-de-casal-
de-acrobatas-
Isso sem tirar o mérito dos cantores, atores, dançarinos e bailarinos que em-intimo-erica-
stoppel-e-a-
também trabalham muito para mostrar suas habilidades. Mas é que o circo carta-ao-circo-da-
tem o tal do risco iminente, e isso, sim, é difícil descrever, principalmente dramaturga-bieke/.
Acesso em:
sem entender que risco é esse. Não é só da queda, é de tanta coisa que nem
21 out. 2020.
sempre nos damos conta. E nós fazemos parte do mercado, então, imagine
quem não faz, quem não pesquisa artes circenses, quem não escreve sobre
isso sistematicamente.

A dramaturga belga Bauke Lievens, em uma série de cartas que escreveu


em 2016 voltadas para os artistas circenses, fala sobre a sua destreza:

O Circo, com o seu amor pela habilidade física


e a sua tradição de colocar o público no pica-
deiro, não tenta criar uma ilusão. Em vez disso,
concentra-se em um verdadeiro encontro de
corpos. Não há uma quarta parede. Aconteça o
que acontecer, faz isso em tempo real, no aqui
e agora da grande lona. Não há história, mas
uma sucessão de atos. Com exceção dos palha-
ços, não há persona dramática.²

Isso reforça a especificidade das artes circenses e a dificuldade de enten-


dê-las de uma maneira, digamos, formal. O circo se reinventa o tempo todo
– embora muitos achem que ainda estamos presos nos séculos passados,
quando o circo chegou ao Brasil. Já outros creem que o circo se “perdeu”
– principalmente os artistas de circos itinerantes e o público leigo, que gos-
tam do chamado “circão”, aquele feito ali na frente do público, “nu e cru”.
Isso é mais frequente ainda quando são aqueles espetáculos de circo con-
temporâneo, sobretudo aqueles ditos “cabeçudos”.

23
crítica em movimento:
\O vão entre a crítica e o circo

Ainda bem que hoje em dia tem muita gente pesquisando e escrevendo
sobre artes circenses. Mas muito pouco se sabe sobre crítica dos espe-
táculos circenses. Inclusive, discorremos sobre isso no seminário Crítica
em Movimento promovido pelo Itaú Cultural em 2017, do qual participei
com Erminia Silva e Rodrigo Matheus. Chegamos à conclusão de que, in-
felizmente, não existe uma produção robusta de críticas de espetáculos
circenses. Eu e Rodrigo Matheus – Erminia disse que não queria se meter
nisso – ficamos de pensar uma forma de dar conta dessa lacuna, mas o
tempo passou e nunca mais falamos sobre isso. Disse “infelizmente” por-
que o mercado ainda sofre com essa carência que deixa em aberto regis-
tros históricos das andanças de circos itinerantes, companhias, grupos e
trupes do Brasil afora.

Quem também fala sobre essa lacuna é José Carlos de Andrade, em artigo
escrito em 2016 para o Sesc São Paulo:

Se por um lado a sobrevivência dos circos de


lona, sobretudo os populares, é um desafio
para os artistas e para os gestores que tra-
balham com a política pública, por outro sur-
ge nas últimas décadas uma nova geração, a
partir de uma novidade relativamente recente
que são as escolas – as de circo propriamente
ditas e também as escolas de teatro, onde as-
pectos particulares do repertório circense são
foco de aprendizado e treinamento, como é o
caso das diversas técnicas de clown. Como qua-
se sempre acontece, esta ampliação não tem
sido correspondida com muito rigor pela críti-
ca, sobretudo a jornalística. Ainda que a refle-
xão acadêmica tenha multiplicado especializa-
ções e estudos em torno do circo tradicional ou
das novas formas da arte circense, a produção
contemporânea mais cotidiana continua sendo
vista através de instrumentos críticos ainda re-
lativamente carentes de um repertório especí-
fico a respeito desta arte. Raramente ouvimos
falar de uma “crítica de circo”. O mais comum

24
“O vão entre a crítica e o circo”: uma história cheia de percalços!

é observarmos críticos de teatro escrevendo 3. O circo, o teatro


e a crítica: uma his-
sobre espetáculos circenses ou que envolvem
tória de encontros
técnicas circenses. E muitas vezes com pouco e desencontros.
ou nenhum deslocamento na direção do circo Disponível em:
https://www.sescsp.
propriamente dito.³
org.br/online/
artigo/10017_O+
Um dos pontos interessantes tocados por Andrade é a dificuldade de a crí- CIRCO+O+TEATRO+
E+A+CRITICA+
tica entender a técnica circense. E, como falei no início deste texto, é difícil UMA+HISTORIA+
escrever sobre o que não se consegue compreender. Além disso, aponto DE+ENCONTROS+
também que os circos itinerantes têm, sim, uma dramaturgia, já que o ro- E+DESENCONTROS.
Acesso em:
teiro de apresentação dos números não deixa de ser dramatúrgico, como 24 set. 2020.
nos circos ditos contemporâneos:

Por um lado, este quadro se justifica pela di- 4. Idem.


ficuldade em reconhecermos os aspectos pró-
prios de linguagem que vêm dali, apesar de ela
ser, como vimos, tão antiga quanto a própria
história do país. E por outro tem a ver também
com aquela tendência da cena atual, de deses-
tabilizar gêneros e oferecer ao olhar do crítico,
cada vez mais, “experiências cênicas” ao invés
de criações cujas coordenadas formais estejam
restritas a alguma área mais específica. De todo
modo uma crítica jornalística especializada em
geral ainda caminha, se comparada ao traba-
lho de criação artística, na retaguarda de um
pensamento vivo, presente e que se manifesta
nas suas variadas formas de acontecer, seja no
sentido de recolocar a tradição, seja no sentido
de experimentar cruzamentos inusuais.⁴

Então posso dizer que, diante do meu entendimento e das pesquisas que
fiz para a escrita deste texto, esse problema para a classe circense, da
incompreensão da crítica, tem sido um pouco mais discutido nos últimos
anos – os textos que cito datam de 2016 e 2017. Em março de 2012, porém,
em artigo publicado na Rebento – Revista de Artes do Espetáculo, Rodrigo Mo-
rais Leite discorre sobre Décio de Almeida Prado, o circo e outros gêneros
“menores”, como chama. Apresenta algumas considerações sobre as críti-

25
crítica em movimento:
\O vão entre a crítica e o circo

cas que o autor fazia sobre teatro e circo, embora nesse aspecto refira-se
muito mais ao circo no teatro:

Dividido em quatro partes – “As crônicas”, “Um


crítico elitista e conservador”, “O teatro e a sal-
vação pelo popular” e “O palhaço no teatro” –,
este trabalho aborda, inicialmente, as críticas
que Décio de Almeida Prado escreveu sobre
espetáculos de circo, passando, em seguida,
ao exame de alguns pressupostos teóricos de
sua historiografia para, enfim, se deter sobre
as críticas de teatro com elementos circenses
(LEITE, 2012).

O que fica mais uma vez evidente é que, já naquela época, de 1946 até
1968, quando escrevia para o jornal O Estado de S. Paulo, Décio falava muito
mais sobre os elementos circenses que estavam presentes nos espetáculos
de teatro do que propriamente dos espetáculos de circo:

Com efeito, embora o teatro prevalecesse de


modo incontestável, nos primeiros tempos de
sua atividade de crítico do “Estadão”, Décio de
Almeida Prado, vez ou outra, cedia espaço para
tratar de outras manifestações de arte cênica,
como o circo (LEITE, 2012).

Ainda segundo Rodrigo Morais Leite:

Quando passou a se chamar simplesmente


“Teatro”, sua seção naquele jornal – não assi-
nada, como era comum na imprensa da época –
intitulava-se “Palcos e Circos”. Essas aberturas
a espetáculos de diversa ordem não se mante-
ve no decorrer do tempo: à medida que os anos
foram se passando, elas foram se tornando
cada vez mais raras, até que o teatro adquiris-
se pleno monopólio, daí a mudança do nome da
coluna a partir de 1959 (LEITE, 2012).

26
“O vão entre a crítica e o circo”: uma história cheia de percalços!

Ressalto ainda como o autor analisa a escrita de Décio sobre o circo, especificamente:

Das poucas “crônicas” que o crítico paulista es-


creveu, nessa fase relativamente curta de sua
longa carreira intelectual, a respeito de espetá-
culos especificamente de circo, pois outra coi-
sa é teatro com elementos circenses, somente
duas foram salvas do esquecimento destinado
a gêneros por excelência jornalísticos (portan-
to efêmeros) como a crítica e a crônica, adqui-
rindo sobrevida nas páginas supostamente
perduráveis do livro impresso. Antes, porém,
de citá-las, um pequeno parêntese: grafamos
“crônicas” com aspas por dois motivos: em pri-
meiro lugar porque, à época em que elas foram
escritas, esse termo tinha uma conotação mais
ampla, designando também o que hoje é deno-
minado somente de crítica; em segundo lugar
porque as críticas de Décio de Almeida Prado
que tratam de circo são, na verdade, muito
mais crônicas do que críticas, de acordo com
o sentido algo restrito que a palavra adquiriu
mais recentemente (LEITE, 2012).

Uma coisa relevante das crônicas/críticas de Décio de Almeida Prado é sua


forma de descrever o circo como “cansado”, “sedentário” e “resignado”, po-
rém sem mencionar de que circo estava falando. Seria um circo moderno?
Um circo no estilo “novo circo”? Não sei, não fica claro no artigo. Mas obser-
vamos que, desde lá, se falava de uma forma “antiga” de fazer circo, mais
relacionada aos circos itinerantes, como ainda é hoje em dia, infelizmente.
Vale a pena reforçar, porém, que o autor do artigo reconhece as limitações
de Décio para falar das artes circenses:

[...] lacunas, contradições e analogias temerá-


rias que até esta altura do trabalho procura-
mos expor, retiradas de uma porção mínima da
obra de Décio de Almeida Prado, não se devem,
é importante ressaltar, a incompetência técni-

27
crítica em movimento:
\O vão entre a crítica e o circo

ca. O problema, acreditamos, é de ordem diver-


sa. Preliminarmente, pelo fato de ele ter sido,
no máximo, um analista de circo bissexto, isto
é, um crítico de teatro que de vez em quando
escrevia sobre um espetáculo de circo, e mes-
mo assim num período relativamente curto de
uma carreira de vinte e dois anos, não produziu
e, por conseguinte, não refletiu o necessário à
elaboração de uma teoria da matéria em ques-
tão. Embora, muito provavelmente, entendesse
o suficiente do assunto, suas observações a res-
peito dele não obedeciam a nenhuma platafor-
ma conceitual, por mais ampla que fosse. É isso,
basicamente, o que explica, senão justifica, as
incongruências supracitadas (LEITE, 2012).

Portanto, mais uma vez constatamos que escrever sobre crítica circense
nunca foi fácil. Talvez por isso a escassez dos textos de crítica, principal-
mente por sua especificidade técnica e estética. Além disso, existe o cará-
ter do valor financeiro do empreendimento circense: quanto mais barato,
ou seja, quanto mais o circo for de pequeno e médio porte, mais difícil é que
algum jornalista vá deixar seu lugar para ir assisti-lo. Afinal, esses circos se
encontram mais frequentemente nos interiores dos estados e nas perife-
rias dos centros urbanos.

Falo isso do circo itinerante, mas também posso mencionar as companhias


de circo de grande porte que, mesmo tendo essa característica, não re-
cebem a devida atenção do jornalismo crítico. Se isso é verdade para os
grandes, é ainda mais real para as pequenas companhias, grupos e trupes
circenses, principalmente se forem oriundos de projetos de circo social.

Mas, para não dizer que não falei das flores, trago uma história do Seminá-
rio Internacional de Crítica Teatral, realizado por uma produtora de Recife em
2011. Nós, da Trupe Circus – um grupo profissional da Escola Pernambuca-
na de Circo –, tivemos o espetáculo Círculos que Não se Fecham... Experimento
no 1 avaliado criticamente nesse evento. A montagem tratava de questões
da juventude, principalmente aquelas relacionadas à violência sofrida pe-
los jovens de todas as classes sociais, mas enfocando aqueles das periferias

28
“O vão entre a crítica e o circo”: uma história cheia de percalços!

urbanas (violência de gênero, na escola, no futebol, contra a mulher etc.).


Trazíamos o olhar da juventude contemporânea como ponto de partida,
num mix de dança, música e teatro.

Porém, o espetáculo foi criticado por jornalistas que escreviam sobre teatro,
já que o seminário era de crítica teatral, e não sobre circo. Por isso, as críti-
cas trazem muitas avaliações sobre os elementos teatrais e pouco ou quase
nada sobre as artes circenses. Pelo menos nos sentimos um pouco contem-
plados e até felizes por receber um olhar crítico ao nosso trabalho artístico
depois de 11 anos montando espetáculos com a trupe. E parou por aí.

Depois desse espetáculo, já montamos mais quatro e não tivemos a pre-


sença de jornalistas na plateia nem críticas sobre as exibições – o que é
uma pena, porque sabemos o quanto isso é importante para um trabalho
artístico. As escritas elaboradas no seminário fizeram com que nos avaliás-
semos e revíssemos coisas que estávamos nos propondo com a encenação.

Ah! Vale ressaltar duas coisas: primeiro, que essas escritas não foram es-
pontâneas, já que os críticos não foram nos ver por livre e espontânea von-
tade. Elas existiram porque os críticos convidados tinham que escrever
sobre os espetáculos a que assistiam e que eram escolhidos pela organiza-
ção do seminário. Por isso, entramos no “bolo” dos espetáculos analisados
criticamente. Segundo: entramos numa edição do seminário chamada de
Teatro Fora do Eixo; então, entendemos que a escolha se deveu ao tema
que seria debatido naquele ano, no qual nosso espetáculo se encaixava
porque era visto como circo-teatro e realizado em nossa sede, na periferia
da cidade de Recife.

As escritas foram dos jornalistas, professores e autores teatrais Márcio


Bastos, Jorge Bandeira, Paulo Vieira e Márcio Braz. E, embora esses críticos
escrevessem mais sobre teatro, eles tiveram certo cuidado no olhar sobre
o nosso espetáculo e sobre as artes circenses provindas dele, como colocou
Márcio Braz:

É cada vez mais raro estarmos diante de uma


catarse coletiva em espetáculos de artes
cênicas no Brasil. Muitos se entregam ao
apelo do melodrama, ao susto-espetáculo, a

29
crítica em movimento:
\O vão entre a crítica e o circo

5. Disponível em: performers exacerbadas e a dramas cerebrais.


http://seminariocri
Mas não foi o que vimos no espetáculo “Círculos
ticateatral.blogspot.
com/2011/08/ que não se fecham... experimento n. 1”, onde a
leitura-critica- emoção, a tensão e o calor do circo estiveram
circulos-que-nao-
presentes num espetáculo bem dirigido, cheio
se_7579.html.
de momentos instigantes, climas dramáticos
e, principalmente, contagiante pela alegria de
6. Disponível em: seus intérpretes.⁵
http://seminariocri
ticateatral.blogspot.
com/2011/08/ Já Paulo Vieira traz mais esta análise teatral:
leitura-critica-
circulos-que-nao-
O ponto verdadeiramente frágil do espetáculo
se_31.html.
se encontra no nível interpretativo, quando em
algumas cenas parte do elenco é chamado pela
direção para representar, seja a professora re-
pressora, sejam policiais ou alunos rebeldes.
Vê-se que aí se necessita de um trabalho espe-
cífico melhor elaborado, mesmo que sejam os
atores alunos de uma escola de circo, não de
teatro, mas uma vez que se propõem a traba-
lhar teatralmente, então que se trabalhe téc-
nicas interpretativas do mesmo modo que se
fez com malabares, trapézio e outras técnicas
circenses, ou mesmo a coreografia das danças
hip hop.⁶

Márcio Braz, embora fale sobre o ritmo e pouco sobre a arte circense, traz
ainda certo preconceito ao falar do circo tradicional, que também chama
pejorativamente de “velho circo”:

O que mais chamou a atenção foram os climas


criados pela encenadora Fátima Pontes. A se-
quência dos quadros foi pensada de modo a
produzir um ritmo, uma respiração. De momen-
tos bruscos pintados ao som de rap e passos de
dança de rua a outros de extrema singeleza e
outros mais de humor, o espetáculo tornou-se
agradável e sem inspirar o cansaço. A emoção

30
“O vão entre a crítica e o circo”: uma história cheia de percalços!

“jogada” do chamado “velho circo” ou circo tra- 7. Ver nota de roda-


pé número 5.
dicional deu vez a emoção concentrada e ob-
jetivada oriunda do “novo circo” envolvendo
ainda mais a plateia já bastante entusiasmada
pelas peripécias dos intérpretes.⁷

Esse trecho da crítica tensiona mais uma vez as divisões entre as diversas
formas de expressão das artes circenses, já que em muitos casos fica evi-
dente esse clima de disputa de “quem é o melhor”. Quem teria como dis-
tinguir exatamente o chamado circo tradicional/itinerante (porque teria as
técnicas mais antigas) do “novo circo” (que dizia trazer inovações como as
coreografias, o próprio teatro, a dança e um mix de tecnologias) e do “con-
temporâneo” (no qual se diz imperar a dramaturgia e a subjetividade dos
temas abordados pelas performances)?

Vamos relembrar a dramaturga belga Bauke Lievens, citada lá no começo


do texto? Não precisamos nos definir, precisamos refletir não sobre o que
fazemos, mas sobre como fazemos para agradar e continuar encantando o
público com as artes circenses.

O tratamento dado a esse chamado circo contemporâneo, caracterizado


pela junção de tecnologias de alto valor monetário com as técnicas e os
roteiros circenses, é bastante diferente. Isso fica evidente nas apresenta-
ções da companhia canadense Cirque du Soleil, que já veio seis vezes ao
Brasil e sempre teve seus espetáculos analisados criticamente por jornalis-
tas especializados em teatro. Sem me estender muito sobre esse assunto,
podemos refletir mais uma vez que não interessa à crítica especializada o
que existe de expressões circenses no próprio país, principalmente se elas
forem mais “pobres”. Como sempre, é mais valorizado o que vem de fora.
Daí seguimos com nosso “tupiniquismo”.

Encontrei uma única crítica mais severa a um dos espetáculos do Cirque


du Soleil, que foi justamente de uma pessoa de circo, Hugo Possolo – artis-
ta, palhaço e um dos fundadores da Companhia Parlapatões, de São Paulo.
Hugo incluiu não só a crítica à encenação, mas também ao próprio fazer
circense e sua desvalorização no país. Por isso, acho importante trazer tre-
chos apenas dessa crítica e não daquelas sobre os outros cinco espetáculos
da companhia no Brasil, redundantes na sua rasgação de seda ao show, aos

31
crítica em movimento:
\O vão entre a crítica e o circo

artistas e às suas técnicas. Sim, realmente eles são todos excelentes, o que
não poderia ser diferente em se tratando da maior companhia de circo do
mundo, que usa cenários caros, música sempre ao vivo e altas tecnologias
de luz e efeitos visuais. Bom... Trouxe Hugo Possolo:

[O espetáculo do Cirque du Soleil] Saltimbanco


tem 15 anos. É o Brasil recebendo o fim da linha
das turnês internacionais. Talvez uma crítica a
esta altura não faça diferença, mas não posso
deixar passar ao largo o valor simbólico que gera,
a visibilidade que dignifica a atividade. O proble-
ma é saber se o circo brasileiro desfrutará disso.
A força dos números engole a dramaturgia. A
aventura de um menino que se transforma no
saltimbanco do título não chega a se cumprir. E
o espetáculo de variedades passa a obedecer à
fórmula mais tradicional, o que não é nenhum
demérito. Traz os altos e baixos de números não-
-integrados entre si. Coreografias coletivas de
gestos uníssonos empobrecem números primo-
rosos. Caso dos palhacinhos-malas que roubam a
atenção enquanto queremos ver a equilibrista no
arame. Sempre saí alegre do circo. Desta vez, saí
um pouco angustiado por constatar o provincia-
nismo de uma elite que desconhece nossos maio-
res talentos, criatividade e valores. Hesitei, pen-
sando que achariam que escrevo por inveja. Não
tenho que temer dar minha opinião. Se não des-
se, morreria como artista. Quem empreende não
tem medo de parecer despeitado. Os covardes,
que desistem dos sonhos, é que ficam no ranço
da reclamação. Doloroso é saber que, talvez, o
que venha a instigar o público serão perguntas
como: por que a pipoca é R$ 12? Por que o esta-
cionamento é R$ 20? São as dúvidas do mundo
do consumo. A globalização atropela até mesmo
o circo. E a arte que se vire para concluir que a co-
lonizada miséria nos pertence (POSSOLO, 2006).

32
“O vão entre a crítica e o circo”: uma história cheia de percalços!

É lógico que, para os padrões socioeconômicos do Brasil, é caro assistir


ao Cirque du Soleil, mesmo podendo dividir o valor dos ingressos em dez
vezes, como faria o público mais pobre se quisesse ou pudesse comparecer.
Já os mais abastados vão lá assistir ao tão sonhado espetáculo e fazer sua
“social” – afinal, é chique ir ao Cirque du Soleil.

Porém, os próprios artistas circenses têm pouco acesso a esses espetácu-


los e a outros que são apresentados nas grandes capitais, porque muitos
estão correndo atrás do seu sustento para o outro dia. Hoje, muitos cir-
cos de pequeno e médio porte estão cobrando ingressos de 5 ou mesmo
2 reais, costurando dia e noite, mais uma vez, suas lonas furadas. Compa-
nhias, grupos e trupes estão correndo atrás de contratações para se man-
ter fazendo circo, a arte que escolheram para a vida.

Mas a realidade é que está difícil; 2020 trouxe algo novo para o mundo do
circo: a tal da pandemia de covid-19. Isso complicou a situação circense
ainda mais: virou o mundo de cabeça para baixo, circos fechados há mais de
seis meses – então, o que era pouco virou quase nada. Outro mundo come-
çou a existir, um que todos chamam de “novo normal”. Ainda não sei dizer o
que é para mim, só sei que estou na luta, junto com os circenses, junto com
a minha equipe da Escola Pernambucana de Circo, na Câmara Setorial de
Circo do estado de Pernambuco, tentando resistir. E estamos conseguin-
do. Vale ressaltar que, neste momento tão difícil, é grande o número de
artistas circenses de todas as classes e categorias se ajudando. É triste e
ao mesmo tempo lindo. Vamos lá! Um pouquinho daqui e outro dali, vamos
seguindo juntos e juntas! Que povo guerreiro é esse de circo!

Desde que me entendo por gente, ouço falar que o “circo está morrendo”.
Nunca ouvi falar que o teatro ou a dança estão morrendo, mas sobre o circo
sempre ouvi e vi muita coisa nesse sentido. Depois de observar debates,
palestras e discussões, e estando hoje por dentro da história, percebo que
essa “estória” sempre foi uma jogada para levar o circo cada vez mais para
a marginalização.

Mas aí já é outra história e outro texto. O que importa mesmo é que o


circo está vivíssimo e passando por mais um período difícil da história
mundial firme e forte, lutando aos trancos e barrancos, mas sempre gra-
cioso e mágico.

33
crítica em movimento:
\O vão entre a crítica e o circo

É lógico que, no fazer circense, sempre houve “vãos” entre os diversos


segmentos: circo itinerante/tradicional, escolas, grupos, trupes,
companhias, artistas independentes e de rua. Mas, hoje, isso está mais
– digamos assim – tranquilo. Para nós mesmos da Escola Pernambucana
de Circo, é muito bom estar ao lado de circos com os quais já desenvol-
vemos trabalhos. Alguns estão em andamento, como Disney (Alhandra/
PB), Alves (Caruaru/PE), Montagem Circus (Santa Rita/PB), Empyre Circus
(Parnamirim/RN) e suas respectivas proprietárias: Francisca, Gardênia, Jo-
siline e Madalena – olhe aí as mulheres comandando os circos itinerantes,
que maravilha. Como é bom também estar junto de Cia. 2 em Cena (Recife/
PE), Carcará (Cabo de Santo Agostinho/PE), Garrett Circus (Recife/PE), Devir
(Recife/PE) e Casulo (Recife/PE), entre outras companhias, grupos, espaços
de formação e artistas independentes e de rua.

Os circos estão reabrindo aos poucos, seguindo as medidas de segurança dos


órgãos de saúde de cada local, de cada capital, de cada cidadezinha, de cada
recanto. Grupos, trupes, companhias e artistas independentes e de rua tam-
bém estão procurando seus caminhos, incluindo muito o uso da internet: gra-
vam espetáculos, disponibilizam os já gravados, criam coisas novas, procuram
se reinventar. O importante é estarmos fazendo circo. Fazendo, encantando,
emocionando, se superando, se excedendo, se mostrando, se “amostrando”. Fa-
zendo mesmo que a crítica não veja nada disso. Poucos escreverão sobre tudo
que está acontecendo, sobre toda a grandeza artística do circo neste período.

Embora as artes circenses – assim como as outras expressões artísticas –


não precisem da crítica para sobreviver, seria bom que alguém, algum críti-
co mesmo, mas bem sensato, bem coerente, bem amoroso, bem atencioso,
bem carinhoso, fosse assistir a um espetáculo de circo neste momento e
pudesse escrever não somente com seu olhar crítico, mas com seu olhar
humano. Isso, sim, iria ficar para a história. Mas, enquanto isso não aconte-
ce, sigamos... E, com todo o meu amor, viva o circo brasileiro!

.:. Este texto é de exclusiva responsabilidade de seus autores e não reflete necessariamente
a opinião do Itaú Cultural.

34
“O vão entre a crítica e o circo”: uma história cheia de percalços!

Apêndice

1. João Francisco de Souza era sociólogo e professor catedrático do Centro


de Educação da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). Falecido em
2008, ministrava disciplinas voltadas para a educação popular e era coor-
denador do Núcleo de Ensino, Pesquisa e Extensão em Educação de Jovens
e Adultos e membro da Academia Pernambucana de Letras. É autor de mais
de dez livros sobre educação popular e multiculturalismo.

2. Erminia Silva possui graduação em serviço social pela Pontifícia Universi-
dade Católica de Campinas (PUC/Campinas) e em história pela Universidade
Estadual de Campinas (Unicamp), com mestrado em história e doutorado
em história da cultura pela mesma instituição. É autora dos livros Circo-
-Teatro: Benjamim de Oliveira e a Teatralidade Circense no Brasil (Altana, 2007) e
Respeitável Público...: o Circo em Cena (Funarte, 2009). Desenvolve atividades
de formação e de pesquisa na Escola Nacional de Circo (Funarte/RJ), é co-
coordenadora do grupo de estudo e pesquisa das artes circenses Circus
(FEF/Unicamp) e coordenadora, junto com Daniel de Carvalho Lopes, do site
Circonteúdo, que possui um vasto banco de dados sobre a arte circense no
Brasil e tem sido referência para trabalhos acadêmicos no campo da histó-
ria da cultura e das artes cênicas.

3. Bauke Lievens é uma dramaturga belga formada em teatro pela Univer-


sidade de Gante (UGent) e em filosofia da arte contemporânea pela Uni-
versitat Autònoma de Barcelona. É professora e pesquisadora no departa-
mento de drama da Royal Academy of Fine Arts (Kask), da School of Arts
em Gante, na Bélgica, onde atualmente trabalha no projeto de pesquisa
artística The Circus Dialogues. Como dramaturga freelancer, colabora em
várias companhias de circo, dança e teatro, como Un Loup pour l’Homme
e Floor Van Leeuwen (Schwalbe). Desde 2015, também faz seu próprio tra-
balho, criando Aneckxander (2015) e Raphaël (2017) ao lado de Alexander
Vantournhout. É autora de dois livros sobre pesquisa artística em circo e
faz parte do conselho editorial da revista Rekto:Verso.

4. Rodrigo Matheus é trapezista, diretor e dramaturgo circense e profes-


sor de técnicas circenses. É fundador e diretor do Circo Mínimo, além de
um dos fundadores do Centro de Formação Profissional em Artes Circenses
(Cefac) e da Central do Circo.

35
crítica em movimento:
\O vão entre a crítica e o circo

5. José Carlos de Andrade é bacharel em jornalismo pela Pontifícia Univer-


sidade Católica de Minas Gerais (PUC/Minas), licenciado em história pela
Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e especialista em literatura
e crítica literária pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/
SP). Possui mestrado em artes cênicas pela Universidade Estadual Paulista
(Unesp), com dissertação chamada Décio de Almeida Prado e a Historiogra-
fia Teatral Brasileira.

6. Márcio Bastos é jornalista cultural. Passou pela Folha de Pernambuco e atual-


mente escreve sobre arte e cultura para o Jornal do Commercio de Pernambuco.

7. Jorge Bandeira é crítico, dramaturgo, encenador, naturista e professor


da Universidade Federal do Amazonas (Ufam).

8. Paulo Vieira possui licenciatura em educação artística pela Universida-


de Federal da Paraíba (UFPB), mestrado em artes e área de concentração
em teatro pela Universidade de São Paulo (USP) e doutorado em artes pela
mesma instituição. Atua como professor associado e coordenador do mes-
trado profissional em artes da UFPB.

9. Márcio Braz é bacharel em comunicação social com habilitação em jor-


nalismo pela Universidade Católica de Brasília (UCB), com licenciatura ple-
na em pedagogia pelo Instituto de Educação Superior Ascensão (Iesa/DF) e
em sociologia pela Faculdade Alfamérica (Alfa/SP). É especialista em orien-
tação educacional pelo Prodeesp/DF e em educação com ênfase na diver-
sidade e cidadania na educação de jovens e adultos pela Universidade de
Brasília (UnB).

10. Hugo Possolo cursou comunicação social na Faculdade Cásper Líbero e


história na Universidade de São Paulo (USP), ao mesmo tempo que aprendia
técnicas circenses no Circo Escola Picadeiro. Fundou, em 1991, o grupo Par-
lapatões de São Paulo, em que também atua. É hoje o secretário de Cultura
do município de São Paulo.

36
“O vão entre a crítica e o circo”: uma história cheia de percalços!

Referências

BORTOLETO, M. A. C. (org.). Introdução à pedagogia das atividades circenses. Jun-


diaí: Fontoura, 2008.

CAMAROTTI, Marco. O palco no picadeiro: na trilha do circo-teatro. Recife: Fun-


dação de Cultura da Cidade do Recife, 2004.

CONSTÂNCIO, Rudimar. Circo social: a experiência da Escola Pernambucana de


Circo. 2010. Monografia (Especialização em Ensino de Arte) – Universidade
Federal de Pernambuco, Recife, 2010.

COSTA, Eliene Benício Amâncio. Saltimbancos urbanos: a influência do circo na


renovação do teatro brasileiro nas décadas de 80 e 90. 1999. Tese (Doutora-
do em Artes) – Universidade de São Paulo, São Paulo, 1999.

DUPRAT, R. M.; BORTOLETO, M. A. C. Educação física escolar: pedagogia e di-


dática das atividades circenses. Revista Brasileira de Ciências do Esporte, São Pau-
lo, v. 29, n. 2, 2007.

FERREIRA, Claudia Márcia (coord.). Circo – tradição e arte. Rio de Janeiro: Museu
de Folclore Edison Carneiro: Funarte/Instituto Nacional do Folclore, 1987.

GALLO, Fabio Dal. Circo, educação e a cena contemporânea. GT2 – Pluralida-


des Culturais Materiais e Imateriais. III Seminário Internacional Interlinkplus, Uni-
versidade do Estado da Bahia (Uneb), Salvador, 2008.

LEITE, Rodrigo Morais. Décio de Almeida Prado, o circo e outros gêneros “me-
nores”. Rebento: Revista de Artes do Espetáculo, São Paulo, n. 3, 2012.

MALARD, Letícia. Hoje tem espetáculo: Avelino Fóscolo e seu romance. Belo Ho-
rizonte: Editora UFMG, 1987.

MALARD, Letícia. O circo social e a universalidade da linguagem circense. GT2


– Pluralidades Culturais Materiais e Imateriais. III Seminário Internacional Inter-
linkplus, Universidade do Estado da Bahia (Uneb), Salvador, 2008.

POSSOLO, Hugo. Globalização atropela o circo. Folha de S.Paulo, 4 ago. 2006.

37
crítica em movimento:
\O vão entre a crítica e o circo

SILVA, Erminia. O circo: sua arte e seus saberes. O circo no Brasil do final do
século XIX a meados do século XX. 1996. Dissertação (Mestrado em História)
– Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Campinas, 1996.

SILVA, Erminia. Saberes circenses: ensino/aprendizagem em movimentos e


transformações. In: BORTOLETO, M. A. C. (org.). Introdução à pedagogia das ativi-
dades circenses. Jundiaí: Fontoura, 2008.

SILVEIRA, Cléia. Circo: educando com arte. Rio de Janeiro: Fase, 2001.

SILVEIRA, Cléia. Revista Circo do Mundo Brasil: uma proposta metodológica em


rede. Rio de Janeiro: Fase, 2003.

38
“O vão entre a crítica e o circo”: uma história cheia de percalços!

39
crítica em movimento:
\O vão entre a crítica e o circo

Respeitável público:
falem bem, falem mal,
Daniel de Carvalho Lopes¹
mas falem de mim Erminia Silva²

1. Doutor em educa- Começaremos este texto com a expectativa de que ele seja um agradável
ção pela Faculdade
encontro com todas, todos e todes, pois, nas distâncias impostas nos tem-
de Educação da
Universidade de pos bicudos e insalubres do ano de 2020, nada mais reconfortante que a
São Paulo (FE/USP), possibilidade de estar junto de alguém. Ademais, é nos encontros que a
mestre em artes
linguagem circense se faz e se refaz cotidianamente, em cada rua, praça,
pela Universidade
Estadual Paulista teatro ou picadeiro. Assim sendo, que este texto seja um agradável encon-
(Unesp) e graduado tro para a ida a alguns espetáculos circenses.
em educação física
pela Universidade
Estadual de Cam- E que espetáculos seriam esses? Seriam aqueles que, por sermos pesquisa-
pinas (Unicamp). dores das histórias do circo, são múltiplos e se processam de muitas e mui-
Integra o grupo de
estudo e pesquisa
tas maneiras diferentes ao longo da história e, obviamente, até os dias de
das artes circenses hoje. São aqueles que estão em constante mudança, carregando elemen-
Circus [Faculdade tos de outras épocas e fazeres, gerando permanentemente novas buscas
de Educação Física
(FEF) da Unicamp] e estéticas. E, se assim eles são e estão sendo, é porque esses espetáculos
o Grupo de Estudos conversam e se misturam todos os dias com tudo o que os cerca: pessoas,
e Pesquisas em
tecnologias, culturas, políticas, estéticas, sociedades etc.
Gesto, Expressão e
Educação (Gepgee),
da FE/USP. Cocoor- E o que dizem sobre eles? Bem, dizem variadas coisas e desde muito tem-
denador do site
po! Se olharmos para o Brasil do século XIX, perceberemos que era cons-
Circonteúdo, é edu-
cador de circo social tante os jornais da época falarem sobre eles.³ Falarem bem, falarem mal,
na Instituição de mas falarem abundantemente! E aqui vale mais uma pergunta: por quê?
Incentivo à Criança
e ao Adolescente de
Mogi Mirim (ICA). O circo, nesse período, se constituiu como uma das formas mais frequentes
e atrativas de divertimento para a sociedade, reunindo os mais variados
grupos sociais. Ao longo dos anos 1800, centenas de companhias viajavam
por todo o país, vindas de turnês por outros continentes. Entre muitas de-
las, podemos citar: Circo Olímpico Francês, da família Fouraux, Circo Chia-
rini, Circo Temperani, Circo Spinelli, Circo Casali, Companhia Equestre Ita-
liana, de Luigi Guillaume, Companhia de Cavalinhos Guilherme Southby e
também o Circo Olímpico da Rua da Guarda Velha, construído em alvenaria
no centro do Rio de Janeiro e que perdurou por mais de 50 anos, recebendo
apresentações de artistas do seu próprio grupo e de outras companhias.

40
Esses diversos circos, cada um com uma maneira própria de produzir e or- 2. Doutora e mestra
em história social
ganizar seus espetáculos, se relacionaram intensamente com a vida social
da cultura pela
e urbana do período e, consequentemente, receberam “enxurradas” de pú- Unicamp, cocoor-
blico – termo comum nos jornais para tratar do sucesso que algumas com- denadora do grupo
Circus e do Gepgee.
panhias estavam obtendo na época. Por causa de suas atrações e de sua
É autora de Circo-
magnitude (muitos circos possuíam dezenas de animais e artistas e mes- -Teatro: Benjamim de
mo navios próprios para o transporte da companhia, como o Circo Grande Oliveira e a Teatralida-
de Circense no Brasil
Oceano), assim como por mobilizarem o imaginário de homens, mulheres
(Altana/Funarte,
e crianças de mil maneiras, foram também tema de “enxurradas” de crôni- 2007) e cocoor-
cas, críticas, notas, sátiras e charges de praticamente todas as produções denadora do site
Circonteúdo.
bibliográficas da época, principalmente as jornalísticas.

Para ficar mais claro, apresentaremos aqui algumas delas. O Circo Chiarini, di- 3. Ver: Silva (2007 e
2009); Lopes (2015);
rigido pelo artista equestre Giuseppe Chiarini, esteve no Brasil em dois mo-
e Lopes e Silva (2015).
mentos diferentes, de 1869 a 1872 e de 1875 a 1877, e era uma grande compa-
nhia circense que apresentava números equestres e acrobáticos, com animais
4. Os títulos dos jor-
selvagens e pantomimas. Uma vez no Rio de Janeiro, seu íntimo envolvimento
nais citados neste
com a sociedade fluminense rendeu variadas publicações em jornais e revistas: texto encontram-se
registrados com a
grafia da época.
Mestre Chiarini vai em maré de rosas. A variedade
de espetáculos e o mérito da companhia chamam
numerosa concorrência ao circo da Guarda Velha
(A Vida Fluminense,⁴ 23 abr. 1870, p. 132).

Teve ontem duas enchentes a companhia Chia-


rini. Os artistas trabalharam perfeitamente. O
público deu visíveis demonstrações de apreço
ao mérito dos acrobatas e ginastas. Viu-se ali
a melhor sociedade fluminense (Jornal da Noite,
11 set. 1871, p. 3).

Não cessa o Sr. Chiarini de monopolizar os es-


pectadores e com isto bem andam insatisfei-
tos os empresários da Phenix e do Ginásio. São
leis das compensações humanas. A Phenix e o
Ginásio já tiveram suas épocas de reinado da
moda, e em breve terão de novo, temos fé nisso
e com isso consolamos ambas as empresas (D.
Pedro V, 12 nov. 1871, p. 4).

41
crítica em movimento:
\O vão entre a crítica e o circo

5. Para mais Como podemos observar por meio dessas citações, Chiarini conquistou o
informações, variado público da corte, tendo em vista a presença da “melhor sociedade
ver: Cafezeiro e
Gadelha (1996, fluminense” nos espetáculos. Isso não era uma exclusividade dessa com-
com a transcrição panhia, pois vários outros empreendimentos circenses contavam com a
da solicitação de
frequente presença das Senhoras Majestades Imperiais. Até mesmo o cir-
João Caetano dos
Santos); Souza co que Chiarini ocupou nesse período, o Circo Olímpico da Rua da Guarda
(2002); e Velha, era muito frequentado por dom Pedro II. O imperador acabou por
Silva (2007).
ceder o terreno onde foi construído o que seria nomeado futuramente de
Teatro Imperial D. Pedro II, mas sobre esse espaço trataremos mais tarde. É
importante agora, entre as críticas apresentadas sobre os espetáculos do
Circo Chiarini, ressaltar aquela que informa que os empresários da Phenix
e do Ginásio, dois importantes teatros do Rio de Janeiro, andavam insatis-
feitos por Chiarini “monopolizar os espectadores”.

Os circos ofereciam forte concorrência aos espetáculos teatrais do período


e as rivalidades eram explícitas. Por esse motivo, João Caetano dos Santos,
ator, ensaiador e empresário, figura expoente do “teatro de cunho nacio-
nal”, aderindo à ideia de que o circo era um mero divertimento, sem caráter
educativo, e afastava o público dos espetáculos teatrais, em 1862 solicitou
ao Marquês de Olinda que companhias circenses e de espetáculos com ani-
mais não pudessem trabalhar nos dias de “teatro nacional”, sendo ainda
obrigadas a pagar um imposto caso o fizessem. Seu propósito, com essa
enérgica ação, era o de regenerar e preservar o “teatro nacional”, conside-
rado em decadência naquele momento.⁵

João Caetano não estava sozinho em suas posturas críticas e contrárias


aos circos. Em fins do século XIX, o dramaturgo, poeta, escritor, crítico e
jornalista Arthur Azevedo ficou contrariado com a estreia da grande com-
panhia do circense Frank Brown no Theatro São Pedro de Alcântara, que,
conforme anunciavam as propagandas do espetáculo, transformou o tea-
tro em circo (O Paiz, 23 abr. 1894, p. 4).

Azevedo, em sua coluna intitulada Palestra, professou suas ácidas críticas à


companhia:

42
Respeitável público: falem bem, falem mal, mas falem de mim

A cidade reanima-se. A pouco e pouco vai se


desvanecendo a sinistra lembrança dos bom-
bardeios e tiroteios que ainda há dois meses
nos sobressaltavam.
Espero que a companhia equestre do S. Pedro
de Alcântara venha consolar definitivamente
o Zé-povinho, que é doido por peloticas, e dá
mais apreço a Rosita de La Plata [artista eques-
tre do circo] que à própria Sarah Bernhardt
[atriz francesa].
Entretanto, para os espíritos mais refinados aí
está o Mancinelli, com uma companhia lírica de
primeira ordem (O Paiz, 28 abr. 1894, p. 1).

O modo de se referir aos espetáculos circenses pelo termo “peloticas” era


comum no período e fazia menção à manipulação de bolas, ou seja, ao jogo
de malabares. Arthur Azevedo utilizava essa expressão com o intuito de
passar uma ideia desqualificadora tanto do circo quanto do gosto do públi-
co, o qual acusava de preferir esses divertimentos em detrimento do que
considerava um “teatro sério”. Assim, o autor explicita o quanto os espetá-
culos de circo cativavam e disputavam o mesmo público que frequentava
os teatros.

Suas críticas não paravam por aí. Em seus escritos, ele sempre retomava as
tensões que mantinha em relação às companhias circenses que “invadiam”
os “templos do teatro nacional”:

[...] anuncia-se que mais uma vez, e não será


com certeza a última, o glorioso e venerado
teatro S. Pedro de Alcântara será transformado
em circo de cavalinhos.
Quando as mais poderosas razões tivéssemos
para supor que entramos definitivamente numa
época de transformação moral, bastava, para
nos convencer do contrário, a inconsciência
feroz com que se insulta assim o teatro digno,
pela tradição, de ser considerado um monu-

43
crítica em movimento:
\O vão entre a crítica e o circo

6. Grifo nosso. mento histórico, intimamente ligado à funda-


ção de nossa nacionalidade. Não falo do seu
passado artístico, porque no Rio de Janeiro
a arte, ao que parece, é uma recomendação
negativa.
Por isso, bem-vinda seja a “Caravana”, essa nova
associação fundada por iniciativa de Coelho
Netto, que vem, na realidade, ensinar a nossa
gente a respeitar o espólio sagrado dos nos-
sos avós, e fazer com que ela se envergonhe de
mostrar a D. Carlos I, não artistas, mas cachor-
ros, cavalos e macacos, no teatro construído
por D. João VI.
É preciso notar que, para fazer a fortuna de
uma companhia equestre, um teatro não vale um
circo.⁶ A prova aí está no popular Spinelli, que
já deu duzentos e tantos espetáculos conse-
cutivos, e o seu circo ainda se enche todas as
noites, e é a alegria do nosso bairro mais po-
puloso. Vá o Spinelli para S. Pedro, e verá como
tudo lhe corre torto (O Paiz, 12 ago. 1907, p. 3).

Contudo, as ferrenhas posturas de Arthur Azevedo e João Caetano não lo-


graram êxito efetivo, e, como podemos ver numa crítica do ano de 1872
direcionada ao Circo dos Irmãos Pereira, a concorrência entre as produções
teatrais e circenses persistia:

Companhia ginástica. Se as companhias dra-


máticas e líricas que tem ultimamente visitado
a nossa cidade se tem retirado sem saudades
de nós, e fazendo mesmo um juízo muito des-
favorável a nosso respeito, o mesmo, de certo,
não podem dizer as companhias equestres e
ginásticas, que tem feito as delícias do nosso
beau monde [belo mundo].
De todas elas, a que nos deixou impressão mais
saudosa foi, com certeza, a de Chiarini.
O público, neste ponto, tem mostrado o seu

44
Respeitável público: falem bem, falem mal, mas falem de mim

bom senso, porque aos amantes das mágicas é


justo que protejam os cavalinhos. Chiarini teve
a glória de ver a mais bela sociedade do Rio to-
das as noites nas suas reuniões, e isto, o que
é extraordinário, por três meses consecutivos.
Compreendendo o gosto e a civilização do povo
fluminense por esta espécie de divertimen-
to, e testemunhas das ovações da companhia
Chiarini, de que então faziam parte, os irmãos
Pereira resolveram organizar uma companhia
com uma parte de figuras e animais da compa-
nhia italiana e inauguraram ante ontem os seus
espetáculos no circo da rua do Espírito Santo.
É muito menor o pessoal de que dispõe hoje a
companhia, é certo também que há entre eles
artistas de mérito.
Pouco diremos sobre a execução dos trabalhos
executados pelos diversos artistas, mesmo
porque o público já teve ocasião de apreciar.
Seria, contudo, uma grave injustiça da nossa
parte se esquecêssemos de mencionar parti-
cularmente o nome de Mlle. Pereira.
Já na última vez que trabalhou no trapézio, ela
demonstrara grande beleza e segurança de
movimento; ante ontem, porém, reconhece-
mos que ela tem se aplicado muito depois da
sua última estada nessa cidade.
Trabalhando agora só, no trapézio, mostrou ela
ainda mais confiança do que quando trabalha-
va em duo; além de muita elegância em todas
as suas posições, executa ela movimentos ar-
riscadíssimos, prolongando a situação a ponto
de causar vertigens no auditório, que lhe pediu
por muitas vezes que os terminasse.
No entanto, o sorriso que lhe pairava nos lábios
e os seus continuados agradecimentos feitos
com as mãos, que na maior parte das vezes se
achavam livres, provam evidentemente a muita

45
crítica em movimento:
\O vão entre a crítica e o circo

confiança que em si possui, e animava os es-


pectadores, que temiam a todo o momento vê-
-la despenhar-se daquelas alturas.
Mlle. Pereira é deveras uma princesa do ar; a
este respeito a imprensa não nos enganou. O
resto dos artistas poderão em outras noites
mimosear-nos com alguns trabalhos novos; os
que executaram na noite de sábado, não apre-
sentaram nem movimento nem atração.
O espaço marcado para servir de arena, pare-
ce-nos menor que no tempo de Chiarini; não
julgamos que o haver menos artistas seja a
razão para isso, em compensação, está mais
bem iluminado.
Como o público gosta desta espécie de diverti-
mento, e os Srs. Pereira procuram, com alguns
trabalhos difíceis satisfazer a sua curiosidade,
é muito de esperar que a resolução da compa-
nhia em visitar-nos seja coroado de um exce-
lente sucesso.
Pela nossa parte é o que lhe desejamos (Correio
do Brazil, 2 dez. 1872, p. 1).

Por meio da crítica apresentada, para além da evidência da concorrência


entre as companhias teatrais e circenses, vale mencionar outra temática
frequente nas publicações diversas sobre os circos do período. Os artistas
circenses (sejam eles pessoas ou animais) e seus números sempre foram
muito destacados nas publicações periódicas oitocentistas. Não faltaram
linhas dedicadas, em especial, à representação da mulher circense, enal-
tecendo sua coragem, beleza e delicadeza nos números equestres, de tra-
pézio, de malabarismo ou acrobáticos. A respeito dos artistas e das atra-
ções, novamente, uma crítica referente ao Circo Chiarini é bem ilustrativa:

Sábado à noite estreou no magnífico circo do


Sr. Batholomeu, à rua da Guarda Velha, a com-
panhia equestre do Sr. Chiarini.
Raras vezes terá a expectativa pública sido
mais completa e brilhantemente satisfeita.

46
Respeitável público: falem bem, falem mal, mas falem de mim

A afluência era enorme: o circo que acomoda


milhares de espectadores estava literalmente
cheio. O auditório estava mais escolhido do que
o costuma ser o que frequenta tais espetáculos.
Cumpre confessar que o Sr. Chiarini se ocupa
as cem bocas da fama e não a obriga mentir. Os
trabalhos que apresenta são perfeitos.
O programa dos primeiros espetáculos de que
podemos dar notícias foi habilmente organiza-
do, pontualmente preenchido e admiravelmen-
te executado.
Os cavalos da companhia são magníficos e al-
guns, como o Ab-del-Kader e o Othelo, de rara
beleza de formas e de pelo.
Admira, mais do que isso, surpreende deveras
o ensino desses animais.
Vê-se que o Sr. Chiarini aprendeu com os melho-
res mestres e que conhece perfeitamente todos
os recursos e segredos da arte que professa.
Só com os seus cavalos pode ele oferecer aos
verdadeiros amadores da hípica espetáculos
dos mais interessantes.
A um gesto, a um monossílabo, proferido à
meia voz, Othelo, ou Turco, cavalinho andaluz
de graciosas e elegantes formas, obedecem ao
mestre como seres altamente inteligentes.
Os exercícios de Ab-del-Kader montado à ama-
zona pela elegante e hábil escudeira Catharina
Holloway são por si coisa para ver e admirar.
Sem o mais leve esforço, com a maior delica-
deza, cedendo a um simples movimento de
rédeas, o inteligente animal executa todos os
passos possíveis aos de sua espécie, inclusive
marcar com as mãos caminhando o compasso
de uma polca e depois de uma valsa.
Dentre os artistas da companhia que já estrearam,
citaremos como sumamente notáveis – Theo-
doro Cuba, o morenito que faz diabruras sobre

47
crítica em movimento:
\O vão entre a crítica e o circo

três cavalos em pelo e por fim sobre quatro,


trazendo calçadas botas de montar; o jovem
Elie que na corda tesa depois dos mais arroja-
dos equilíbrios com maromba e sem ela, acaba
dando três saltos mortais de costas firmando-
-se sempre na corda em um pé só; W. Carlo, que
depois de fazer sobre uma e muitas garrafas
os mais delicados e difíceis equilíbrios, coloca
a boca de uma garrafa sobre a boca da outra,
firma a cabeça sobre o fundo desta e sem mais
ponto de apoio gira em todos os sentidos e dis-
para dois tiros de pistola; G. Ross, que unido
ao mesmo Carlos faz exercícios ginásticos de
maior perfeição e destreza; finalmente Belém
Cuba, a morenita que num cavalo em pelo e sem
rédeas executa com audácia e desgarro a corri-
da denominada – grande ato principal.
Dizemos por último que o exercício dos quatro ca-
valeiros e quatro damas dirigidos por Sr. Chiarini
com que se abriu o espetáculo é de mais brilhan-
te efeito: a precisão e elegância dos movimentos,
a rapidez das manobras, a riqueza dos vestuários
dão a esta cena alguma coisa de fantástico.
O Sr. Chiarini monta nessa ocasião um admi-
rável animal que se chama Monte-Christo. Os
espetáculos da companhia Chiarini divertem,
interessam e não corrompem.
O pai, o filho, o marido que se respeita a si e à sua
família pode lá ir com ela, sem receio de a ver corar
ou de ter de dar explicações de gestos cínicos ou
de palavras dúbias (A Reforma, 9 nov. 1869, p. 3).

Chiarini realizou seus espetáculos no circo estável da Rua da Guarda Velha,


de propriedade do artista e empresário Bartholomeu Corrêa da Silva. Essa
importante edificação, posteriormente batizada de Teatro Imperial D. Pe-
dro II, como mencionamos, e de Theatro Lyrico, ficou em plena atividade na
capital do império dos anos iniciais de 1860 até o começo de 1934, quando
foi demolida. Não somente por ser um circo que teve um longo período
de vida na cidade, mas principalmente pelos constantes espetáculos que

48
Respeitável público: falem bem, falem mal, mas falem de mim

promovia e acolhia e pela intensa atuação de Bartholomeu Corrêa da Silva 7. Sobre algumas
das diversas apre-
como empresário, o Circo Olímpico da Rua da Guarda Velha e sua compa-
sentações realiza-
nhia foram frequentemente tratados nos periódicos fluminenses: das por Bartholo-
meu e outros circos
no espaço do Circo
Companhia equestre:
Olímpico da Rua
Duas coisas nos surpreenderam quando entra- da Guarda Velha,
mos no circo da Guarda Velha; a primeira foi o ver: Souza (2002);
Silva (2007); Lopes
soberbo interior, ainda incompleto, do edifício, (2015); Lopes e
que contrasta com a insignificância do exte- Silva (2015); e
rior; a segunda foi, como é natural, a perfeição Vieira (2015).

dos trabalhos da companhia Chiarini.


Reservado estava a uma celebridade equestre
estrangeira vir revelar-nos a existência entre nós
de um magnífico teatro, que a inteligente per-
severança de um homem laborioso vai erigindo,
a custa sabe Deus de que esforços, e à sombra
de excessiva modéstia – criminosa modéstia –,
quisermos dizer, porque a numerosa e brilhante
sociedade que agora frequenta o circo do Sr. Bar-
tholomeu Corrêa da Silva, tê-lo-ia de há muito ani-
mado e auxiliado, em sua monumental empresa.
O público fluminense tem de agradecer ao Sr.
Bartholomeu Corrêa a construção do circo, e ao
Sr. Chiarini a sua descoberta: o Sr. Chiarini foi o
Colombo do Circo Bartholomeu.
Falamos da perfeição dos trabalhos da compa-
nhia equestre italiana.
Não especializaremos. O público tem aplaudido
principalmente o Sr. Chiarini e a Sra. Laura Ruiz,
cavaleiros de alta escola; e todos são unânimes
em dizer que possui o Sr. Chiarini excelentes
cavalos, cavalos-tipo (Semana Illustrada, 21 nov.
1869, p. 3.735).

Ao longo de várias décadas, o Circo Olímpico da Rua da Guarda Velha apre-


sentou espetáculos organizados pela própria companhia de artistas de
Bartholomeu, como também sediou espetáculos de vários outros circos,
grupos circenses,⁷ festejos e atrações variadas, sendo que a incorporação
de artistas era permanente:

49
crítica em movimento:
\O vão entre a crítica e o circo

8. Correio Mercantil, Penna e Bastos são realmente dois artistas cé-


14 mar. 1856.
lebres. Os trabalhos de acrobacia e alta ginásti-
ca que executam dão-lhes merecidos triunfos.
9. Dezeseis de Julho, O Sr. Bartholomeu engrandeceu bastante a sua
28 mar. 1870, p. 2.
companhia com a aquisição daqueles acroba-
tas que tão grandes enchentes estão promo-
10. A Vida Fluminense, vendo ao Circo Olímpico, esplêndido edifício
2 abr. 1870, p. 105.
que muito honra a capital do império, e que
conseguiu erguer à custa de sacrifícios (Diario
do Rio de Janeiro, 1 jan. 1871, p. 3).

Nesses espetáculos, como podemos observar pela citação acima, sempre


estiveram presentes os mais variados números ginásticos e acrobáticos.
Bartholomeu, em razão tanto de suas apresentações como acrobata quan-
to das de sua companhia, recebeu críticas positivas logo no início de sua
carreira, em coluna publicada no Correio Mercantil assinada por “O saltim-
banco independente”.⁸ A motivação da coluna ocorreu, no entanto, por
causa da publicação de uma nota na edição de 9 de março de 1856 do jor-
nal assinada por “Um brasileiro nato”, que se indignava com o fato de as
autoridades terem permitido o “escândalo” de uma “companhia de ridícu-
los saltimbancos” apresentar, numa “tosca e ordinária barraca”, uma peça
intitulada D. Pedro no Cerco do Porto, que tem como personagem “o fundador
deste Império, o Sr. D. Pedro I”. Mediante essa reprovação, o autor da co-
luna, em defesa de Bartholomeu, ressaltou o seu caráter e a qualidade de
sua atuação como circense, dizendo que “mais por amor à ginástica, e da
arte que abraçou, a têm exercido com louvor geral”, mesmo podendo “viver
independente da profissão que exerce”.

Mas, como mencionamos, os jornais brasileiros do século XIX trataram do cir-


co por meio de diferentes produções bibliográficas: crônicas, sátiras, infor-
mativos, propagandas, notas de agradecimento, solicitações do público etc.

Um exemplo interessante dessas formas textuais é referente ao palhaço


Sr. Ronland, “o qual, por si só, é capaz de divertir o público toda a noite”:⁹

No gênero palhaço é fora de dúvida que nunca


veio ao Brasil um só que, à ligeireza dos saltos,
originalidade das posições e profusão de rati-
ces, reúna, como o Sr. Ronland, a elasticidade

50
Respeitável público: falem bem, falem mal, mas falem de mim

muscular e essa destreza natural tão necessá- 11. Spleen, na língua


ria ao verdadeiro CLOWN.¹⁰ Sobre esse artista, inglesa, corres-
ponde ao órgão
foi publicado o seguinte diálogo em uma espé- humano denomina-
cie de coluna humorística de notas e notícias: do baço. A cone-
xão entre o baço
e a melancolia é
– O que tens? estás tão sorumbático! oriunda da medici-
– Não sei explicar-te o que sinto! Vivo triste, mi- na grega e da teoria
dos humores.
santropo... parece que estou atacado de spleen!¹¹
– Eu indico-te um remédio; experimenta-o, e
estou certo que tirarás bom resultado.
– Faze-me este favor e ficar-te-ei sumamente grato.
– Toma três vezes por semana pílulas de Ronland.
– E onde encontrarei este remédio?
– No Circo Chiarini (Dezeseis de Julho, 24 abr. 1870, p. 2).

Outro exemplo de publicação ambientada no tema do circo e que reflete a


assimilação, por parte da sociedade, de seu linguajar e imaginário é a se-
guinte sátira de cunho político:

No Circo Chiarini a autoridade prende um cam-


bista por monopolizar os bilhetes.
Vem o Sr. Duque, deputado, de luneta carrega-
da e vermelhão nas faces, e diz à autoridade:
– É ilegal o seu ato... não há razão para seme-
lhante arbitrariedade... este homem é inocen-
te... ganha a sua vida...faz licitamente o seu
negócio. Prenda-o se quiser, mas defendê-lo-ei
mesmo à custa do próprio sangue!
– Que fazes, Duque? Para quê semelhante opo-
sição à ordem da autoridade?
– (À parte) Cala-te, pateta: as eleições estão à
porta, e eu preciso de gente (O Figaro, 15 jan.
1876, p. 19).

Por fim, ainda em relação aos artistas e atrações do Circo Chiarini e às va-
riadas publicações periódicas referentes aos circos, destaca-se também a
equestre Catalina Holloway. Além da recorrente menção a ela em diversas
propagandas do circo e em textos de diferentes gêneros publicados em
jornais, em sua temporada no Brasil, a artista “protagonizou” um curioso

51
crítica em movimento:
\O vão entre a crítica e o circo

episódio pelo fato de seu sobrenome coincidir com o nome dado a uma es-
pécie de remédio da época:

A propósito do circo de cavalinhos:


O Sr. Chiarini pede-me que declare que a “peti-
te Catalina Holloway” de que tanto falam seus
anúncios, não é a inventora das pílulas de mes-
mo nome, que se encontram à venda por aí, e
que dizem ser excelentes para todas as molés-
tias havidas e por haver.
Feita a declaração, resta-nos esperar pacientes
as próximas primeiras provas públicas da com-
panhia equestre italiana... isenta de pílulas (A
Vida Fluminense, 16 out. 1869, p. 1.016).

Não é para menos o olhar atento da imprensa para os espetáculos circen-


ses, uma vez que até apresentações de balonismo foram realizadas em
circos tanto na capital do império quanto em cidades do Nordeste. Para
ilustrar de maneira um pouco mais detalhada em que consistiam esses
números de ascensão aerostática, contamos com uma nota do Correio Mer-
cantil a respeito da ascensão do artista Julio Buislay, realizada em Recife:

Ontem presenciou a nossa população um espe-


táculo inteiramente novo para ela. Quero falar
da ascensão do artista acrobático Julio Buislay,
o qual, conforme anunciara, subiu às regiões
etéreas arrebatando pelo seu Montgolfier.
Uma imensa multidão, reunida no campo das
Princesas, saudou o intrépido aeronauta com
gritos prolongados vivas e repetidos aplau-
sos. Eram seis horas da tarde, pouco mais ou
menos, quando o balão, em que achava-se
aquele artista, subiu suavemente buscando o
lado do sul impelido pelo vento, que soprava
para o Norte.
Não estando completamente cheio começou
logo a baixar, indo depor o corajoso viajante
nas proximidades do Colhos.

52
Respeitável público: falem bem, falem mal, mas falem de mim

Durante o trajeto o insigne artista fez diversas 12. Apesar de não


termos encontrado
evoluções sobre o seu trapézio, oferecendo aos
informação sobre
olhos da população admirada a realização de o autor do texto,
um espetáculo, para o qual há cerca de um ano Romão (2016) in-
forma que a autoria
havia sido convidada por Elias Bernardi, que
é de João Pedro de
aqui foi sempre infeliz em suas tentativas. O Aquino, diretor do
povo seguiu em direção ao lugar para onde ca- Colégio Aquino, de
maneira que, em se-
minhava o balão, e de lá trouxe o Sr. Julio Buis-
guida no artigo, ele
lay no meio de constantes aplausos e ovações menciona a si mesmo
(Correio Mercantil, 2 nov. 1862, p. 1). em terceira pessoa.

Contudo, é importante pisarmos firme o chão e lembrarmos de que nem


13. O Globo, 18 jul.
sempre os circos, seus espetáculos e os próprios artistas receberam elogios 1876, p. 3.
ou foram objeto de divertidas sátiras ou brincadeiras editoriais, conforme
mencionamos ao tratar das posturas de João Caetano e Arthur Azevedo.
As práticas e os saberes circenses foram vistos criticamente no período por
defensores de práticas de ginástica pautadas por um viés higienista, edu-
cativo e respaldado no discurso da ciência, disputando saberes e poderes
sobre os corpos.

Como exemplo, temos um artigo de 1876 denominado “Um dia de alegria”,


em que o autor, do qual não temos a identificação,12 tece inicialmente crí-
ticas aos poderes públicos por não compreenderem “a necessidade im-
prescindível de dar desenvolvimento ao estudo da ginástica em todos os
estabelecimentos de ensino, à imitação do que se pratica em o Norte da
Europa, e principalmente Suécia e Alemanha”.¹³ Na sequência, destaca po-
sitivamente as ações individuais de Abílio César Borges, diretor do Colégio
Abílio, e de João Pedro de Aquino, diretor do Colégio Aquino, por tomarem
a ousada iniciativa “nas reformas necessárias à regeneração do ensino” e
por compreenderem que “a maior e mais urgente de todas as medidas era
preparar os meninos para serem homens, na verdadeira acepção que se dá
a esta palavra, nos países de mais energia, vigor e força de vontade”. Ele
também enfatiza:

Ainda há entre nós muita gente que não compre-


ende o alcance e a importância do estudo da ginás-
tica e de todos os exercícios físicos, e esse infeliz
preconceito partilhado até por certas camadas so-

53
crítica em movimento:
\O vão entre a crítica e o circo

ciais que por sua colocação já devem perceber que


se não pretende habilitar as crianças para trabalhar
nos circos e teatros, mas sim desenvolver lhes as
forças, dando flexibilidade aos músculos, habituan-
do os meninos a não recearem qualquer esforço e
a não verem perigo nas coisas mais insignificantes
da vida prática e material: em suma, não se quer
formar acrobatas, mas homens fortes, vigorosos,
ágeis e corajosos (O Globo, 18 jul. 1876, p. 3).

Outro caso é o do político, jurista e jornalista Rui Barbosa. Em seus pare-


ceres referentes à reforma do ensino primário no ano de 1883, ele defen-
dia a inclusão do método sueco de ginástica nas instituições de instrução
pública, em razão de suas características pedagógicas e de sua formação
moral, higiênica e disciplinadora embasada nos preceitos da ciência (MO-
RENO, 2001). Ele explicitava claramente o distanciamento que os exercí-
cios físicos deveriam assumir em relação às manifestações circenses e seus
protagonistas: “Não pretendemos formar acrobatas, nem Hércules, mas
desenvolver na criança o quantum de vigor físico essencial ao equilíbrio da
vida humana, a felicidade da alma, a preservação da pátria e a dignidade da
espécie” (MORENO, 2001, p. 132).

Assim, como podemos observar por meio dos exemplos aqui apresenta-
dos, os espetáculos circenses, seus artistas e suas realizações no Brasil ao
longo do século XIX e, claro, no início do século XX foram frequentemente
contemplados por parte da imprensa e da crítica em diversificadas publi-
cações. Falaram bem, falaram mal, mas sempre falaram do circo. Diante da
multiplicidade das produções circenses e de sua permanente reinvenção, o
circo sempre esteve sob os holofotes da opinião pública e estampado nas
páginas de jornais, revistas, folhetins e até mesmo em publicações volta-
das para a educação ou a produção cultural artística.

Por fim, aqueles espetáculos a que esperamos um dia poder assistir jun-
tos levados por este texto/encontro são os mesmos que, há muito tempo,
encontraram um vão entre a crítica e o circo e, sabidos e intrépidos que
eram, deram sobre ele um salto mortal duplo com pirueta, aterrissando
confiantes e sempre renovados do outro lado, arrancando sonoros e calo-
rosos aplausos das multidões.

54
Respeitável público: falem bem, falem mal, mas falem de mim

.:. Este texto é de exclusiva responsabilidade de seus autores e não reflete necessariamente
a opinião do Itaú Cultural.

Referências

CAFEZEIRO, Edwaldo; GADELHA, Carmem. História do teatro brasileiro: um per-


curso de Anchieta a Nelson Rodrigues. Rio de Janeiro: Editora UFRJ: Eduerj:
Funarte, 1996.

LOPES, Daniel de Carvalho. A contemporaneidade da produção do Circo Chiarini no


Brasil de 1869 a 1872. 2015. Dissertação (Mestrado em Artes Cênicas) – Instituto
de Artes da Universidade Estadual Paulista (IA-Unesp), São Paulo, 2015.

LOPES, Daniel de Carvalho; SILVA, Erminia. Circos e palhaços no Rio de Janeiro:


império. Rio de Janeiro: Grupo Off-Sina, 2015.

MORENO, Andrea. Corpo e ginástica no Rio de Janeiro: mosaico de imagens e tex-


tos. 2001. Tese (Doutorado em Educação) – Faculdade de Educação da Uni-
versidade Estadual de Campinas (FE/Unicamp), Campinas, 2001.

ROMÃO, Anna Luiza Ferreira. Entre escolas, clubs e sociedades: as gymnasticas


tecidas por professores no Rio de Janeiro (1850-1900). 2016. Dissertação
(Mestrado em Educação) – Faculdade de Educação da Universidade Federal
de Minas Gerais (FaE/UFMG), Belo Horizonte, 2016.

SILVA, Erminia. Circo-teatro: Benjamim de Oliveira e a teatralidade circense no


Brasil. São Paulo: Altana; Rio de Janeiro: Funarte, 2007.

SILVA, Erminia. Respeitável público...: o circo em cena. Rio de Janeiro: Funarte, 2009.

SOUZA, Silvia Cristina Martins de. As noites do ginásio. Teatro e tensões cultu-
rais na corte (1832-1868). Campinas: Editora da Unicamp, Cecult, 2002.

VIEIRA, Francisco. O Theatro Lyrico: palco e picadeiro. Rio de Janeiro: 19 Design, 2015.

55
crítica em movimento:
\O vão entre a crítica e o circo

Endereços na internet
No emaranhado de algoritmos que se tornou a vida dos mortais neste planeta,
achamos por bem reunir endereços na internet voltados para a prática da críti-
ca nas áreas de circo, dança, teatro e demais variantes que instauram presença.

A relação a seguir inclui fontes de pesquisa e consulta seminais para a pro-


dução de análise. São blogs, sites, revistas eletrônicas e portais que rea-
limentam quem faz e quem frui artes cênicas (considerando-se que toda
lista pressupõe lacunas).

Individuais, coletivas ou institucionais, as iniciativas evidenciam uma alen-


tada rede de espaços imbuída de registrar e pensar parte considerável das
criações vindas a público em diferentes regiões do Brasil e, inclusive, no
exterior. Um inventário provisório à maneira de bússola.

Agora Crítica Teatral | www.agoracriticateatral.com.br (Porto Alegre)


Alzira Revista – Teatro & Memória | www.alzirarevista.wordpress.com (São Paulo)
Antro Positivo | www.antropositivo.com.br (São Paulo)
Aplauso Brasil | www.aplausobrasil.com.br (São Paulo)
Artezblai – el Periódico de las Artes Escénicas | www.artezblai.com (Bilbao)
Bacante | www.bacante.com.br (São Paulo)
Blog da Cena | www.blogdacena.wordpress.com (Belo Horizonte)
Blog do Arcanjo | www.blogdoarcanjo.com (São Paulo)
Bocas Malditas | www.bocasmalditas.com.br (Curitiba)
Cacilda | www.cacilda.blogfolha.uol.com.br (São Paulo)
Caixa de Pont[o] – Jornal Brasileiro de Teatro | caixadeponto.wixsite.com/site (Florianópolis)
Cena Aberta | www.cenaaberta.com.br (São Paulo)
Circonteúdo – o Portal da Diversidade Circense | www.circonteudo.com (São Paulo)
Conectedance | www.conectedance.com.br (São Paulo)
Crítica Teatral | www.criticateatralbr.com (Rio de Janeiro)
Da Quarta Parede | www.daquartaparede.com (São Paulo)
Daniel Schenker | www.danielschenker.wordpress.com (Rio de Janeiro)
DocumentaCena – Plataforma de Crítica | www.documentacena.com.br (diferentes cidades)
Enciclopédia Itaú Cultural | enciclopedia.itaucultural.org.br (São Paulo)

56
Farofa Crítica | www.farofacritica.com.br (Natal)
Farsa Mag | www.farsamag.com.ar (Buenos Aires)
Filé de Críticas | filedecriticas.blogspot.com (Maceió)
Folias Teatrais – Letras, Cenas, Imagens e Carioquices | foliasteatrais.com.br (Rio de Janeiro)
Horizonte da Cena | www.horizontedacena.com (Belo Horizonte)
Ida Vicenzia – Crítica de Teatro e Cinema | idavicenzia.blogspot.com (Rio de Janeiro)
Idança.net | www.idanca.net (São Paulo)
Ilusões na Sala Escura | www.ilusoesnasalaescura.wordpress.com (São Paulo)
Karpa | www.calstatela.edu/al/karpa (revista eletrônica latino-americana editada em Los Angeles)
Lionel Fischer | lionel-fischer.blogspot.com (Rio de Janeiro)
Macksen Luiz | macksenluiz.blogspot.com (Rio de Janeiro)
Nacht Kritik | www.nachtkritik.de (Berlim)
Notícias Teatrales | www.noticiasteatrales.es (Madri)
O Teatro como Ele É | www.oteatrocomoelee.wordpress.com (Belém)
Observatório do Teatro | www.observatoriodoteatro.uol.com.br (São Paulo)
Observatório dos Festivais | www.festivais.com.br (Belo Horizonte)
Palco Paulistano | palcopaulistano.blogspot.com (São Paulo)
Panis & Circus | www.panisecircus.com.br (São Paulo)
Parágrafo Cerrado | www.paragrafocerrado.46graus.com/ (Cuiabá)
Pecinha É a Vovozinha! | www.pecinhaeavovozinha.com.br (São Paulo)
Primeiro Sinal | primeirosinal.com.br/ (Belo Horizonte)
Qorpo Qrítico | www.ufrgs.br/qorpoqritico (Porto Alegre)
Quarta Parede | www.4parede.com (Recife)
Questão de Crítica – Revista Eletrônica de Críticas e Estudos Teatrais |
www.questaodecritica.com.br (Rio de Janeiro)
Revista Barril | www.revistabarril.com (Salvador)
Ruína Acesa | ruinaacesa.com.br (São Paulo)
Satisfeita, Yolanda? | www.satisfeitayolanda.com.br (Recife)
Teatro para Alguém | www.teatroparaalguem.com.br (São Paulo)
Teatrojornal – Leituras de Cena | www.teatrojornal.com.br (São Paulo)
Tribuna do Cretino | www.tribunadocretino.com.br (Belém)
Tudo, Menos uma Crítica | www.medium.com/@fernandopivotto (São Paulo)
Válvula de Escape | www.escapeteatro.blogspot.com (Porto Alegre)
Vendo Teatro – uma Plataforma para Falar sobre Teatro em Pernambuco |
www.vendoteatro.com (Recife)

57
crítica em movimento:
\O vão entre a crítica e o circo

Ficha técnica
NÚCLEO DE ARTES CÊNICAS

Gerência
Galiana Brasil

Coordenação
Carlos Gomes

Produção
Felipe Sales

Cocuradoria
Valmir Santos

NÚCLEO ENCICLOPÉDIA

Gerência
Tânia Rodrigues

Coordenação
Glaucy Tudda

Produção
Karine Arruda

58
NÚCLEO DE COMUNICAÇÃO E RELACIONAMENTO

Gerência
Ana de Fátima Sousa

Coordenação
Carlos Costa

Edição
Ana Luiza Aguiar (terceirizada), Milena Buarque e Valmir Santos
(cocurador)

Produção editorial
Pamela Rocha Camargo e Victória Pimentel

Design
Estúdio Lumine (terceirizado)

Supervisão de revisão
Polyana Lima

Revisão do português
Karina Hambra e Rachel Reis (terceirizadas)

Tradução para o espanhol


Atelier das Palavras Tradução Interpretação Ltda. (terceirizado)

Revisão do espanhol
Atelier das Palavras Tradução Interpretação Ltda. (terceirizado)

59
crítica em movimento:
\La brecha entre la crítica y el circo

60
ES Transformaciones de la práctica __ 62
y del pensar crítico
Valmir Santos

Ejercicio de acrobacia mental: __ 68


crítica, estética y circo
Alice Viveiros de Castro

«La brecha entre la crítica __ 78


y el circo»: ¡una historia llena
de contratiempos!
Fátima Pontes

Respetable público: que hablen __ 98


bien o mal, lo importante es
que hablen de mí
Daniel de Carvalho Lopes
Erminia Silva

Direcciones de internet __ 116

Ficha técnica __ 118

61
crítica em movimento:
\La brecha entre la crítica y el circo

Transformaciones de la práctica
y del pensar crítico Valmir Santos1

1. Periodista, crítico La fortuna crítica de una obra corresponde al campo de pensamiento que
y cocurador de
instituyó cuando se hizo pública a través de edición, grabación, escultura,
Crítica em Movimento.
Creador y editor pintura, presentación e interpretación. Los ocho cuadernos diseñados es-
del sitio web Tea- pecialmente para la cuarta jornada Crítica em Movimento tienen el objetivo
trojornal - Leituras
de invertir un poco esta expectativa al articular 24 textos justo en el ámbi-
de Cena desde
2010. Es docto- to del hacer crítico. Son visiones heterogéneas de en qué consiste y cómo
rando en artes se despliega en creaciones en circo, danza y teatro, con variantes para in-
escénicas de la
Universidad de São
tervención y performance. Sabemos cuánto las circunstancias históricas, so-
Paulo (USP), donde ciopolíticas y culturales involucran a practicantes y participantes, artistas,
también realizó una investigadores y, por supuesto, espectadores-lectores.
maestría en esa
misma asignatura.
Realizado anualmente por Itaú Cultural, desde 2017, el ciclo de debates abor-
da la recepción de las artes escénicas y el diálogo imprescindible entre pú-
blico, creadores y críticos. En 2021, en este contexto difícil de la pandemia,
el estímulo al pensamiento supera la imposibilidad del encuentro presencial
por medio de la circulación de contenidos reflexivos en texto y podcast.

Además de ampliar el acceso, se busca perpetuar las discusiones de las tres


ediciones anteriores, que abordaron la práctica de la crítica a la luz de proble-
mas del oficio e incluyeron la presentación de espectáculos. Entre los temas
tratados se encuentran la precarización del trabajo en el ámbito del periódico
impreso y la búsqueda de la sostenibilidad como contrapunto al mero diletan-
tismo; el constante avance del análisis en Internet, con el deseo de reinventar el
estilo; y la adopción de nuevos procedimientos e ideas en consonancia con los
estudios universitarios y la inquietud de la escena brasileña contemporánea.
También se abordaron las realidades sociales de sujetos marginados y anclados
en la dramaturgia de Plínio Marcos, así como una selección latinoamericana y
caribeña de obras y reflexiones de representantes de Argentina, Chile y Cuba.

Ante el insólito escenario del año anterior, marcado por el brote global del
nuevo coronavirus, una de las alternativas fue desarrollar una publicación
en línea, con ocho itinerarios de escritos realizados por 25 personas del
universo de las artes de la escena.

62
\editorial

Cada volumen reúne tres análisis estimulados por los siguientes temas: 1)
El papel de la crítica teatral en Brasil - del periódico impreso a la plataforma
digital; 2) La brecha entre la crítica y el circo; 3) Estados de la crítica de dan-
za; 4) Espacios digitales dedicados a las artes escénicas; 5) La dificultad de
la crítica de coprotagonizar con el teatro callejero; 6) La escena militante en
el contexto contemporáneo; 7) Teatros peculiares en la doble vía con Cuba y
Brasil; y 8) Panorama del teatro latinoamericano visto desde el puente.

Por lo tanto, en este segundo cuaderno se explora el tema «La brecha entre
la crítica y el circo», explorado por artistas e investigadores de Pernambuco
y São Paulo vinculados a las artes circenses.

Coordinadora ejecutiva de la Escola Pernambucana de Circo (Pernambuco)


—uno de los referentes nacionales en pedagogía del circo social, fundada
en 1985 y con sede en el barrio Macaxeira, en Recife—, Fátima Pontes ad-
mite que actualmente hay mucha gente investigando y escribiendo sobre
artes circenses, pero poco se sabe sobre la crítica de los respectivos espec-
táculos.

Por eso, ella se pregunta cómo debe sentirse una persona especializada en
artes y cultura al escribir críticamente sobre las artes circenses. ¿Sería nece-
sario tener una especialización para eso? «Pregunto esto porque no es fácil
transcribir al papel todos los temas relacionados con las artes circenses pre-
sentes en un espectáculo, un número, una performance. ¿Cómo puedo llevar al
escrito crítico todo lo que comencé a hablar sobre las artes circenses? ¿Cómo
hablar de la destreza del artista, la estética del espectáculo, el vestuario, la
música? ¿Es posible diferenciar el circo contemporáneo y el itinerante/tra-
dicional del que se hace en los proyectos de circo social, que tienen en las
troupes su forma de expresar el trabajo pedagógico con niños, adolescentes
y jóvenes? ¿Cómo analizar críticamente a un artista circense de la nueva ge-
neración, que tiene acceso a mucha información y tecnología, al lado de los
artistas mayores, que se mantienen con sus números y espectáculos llenos
de tradiciones?». Provocadora, Fátima también es una artista de la pista, y
reflexiona sobre sus primeros años y la condición de espectadora que la llevó
a adquirir el gusto por el oficio artístico y convertirse en formadora.

Después de sacar del diccionario palabras clave como «crítica», «estética»,


«acrobacia» y «arte», la actriz y especialista en circo Alice Viveiros de Cas-

63
crítica em movimento:
\La brecha entre la crítica y el circo

tro (São Paulo) declara, con buen humor e inteligencia: «Soy una acróbata
mental. [...] Pienso sobre el circo, salto y me equilibrio, tratando de conocer
la historia de las artes circenses y el papel que juegan en nuestra socie-
dad. Hay milenios de acrobacias en todas las culturas, en todos los tiempos.
Descubrí que era imposible luchar por la valorización de las artes circenses
sin conocer su historia y sus personajes. Soy acróbata mental, mucho gusto
en conocerle».

En su opinión, no se puede tener una visión crítica si no se conoce la histo-


ria de un arte o las diferencias estéticas con las que se desarrolla. «En las
últimas décadas del siglo pasado, el circo vivió un período de revolución
estética muy importante. Desafortunadamente, la falta de conocimiento
sobre las artes circenses ha creado equivocaciones que todavía resuenan
hoy. Francia denominó el movimiento “nuevo circo”. ¿Esto convertía a los
que tenían otro tipo de espectáculo en “viejo circo”? En Brasil, el descono-
cimiento absoluto por parte de nuestros periodistas hizo que los espectá-
culos que se identificaban con esta experiencia estética se trataran como
teatro. ¡Y es circo, es todo circo! Los que son capaces de realizar hazañas
que desafían la gravedad son del circo. La ignorancia fastidia», confiesa
Alicia, dando testimonio de cómo vio emerger a la carioca Intrépida Trupe,
en 1986, y toda una colección de equivocaciones que atribuye a una parte
de la prensa, ya sea por no reconocer el talento circense natural del «gru-
po capaz de realizar hazañas de alto nivel» o por caer en tergiversaciones
como «grupo de teatro y danza que utiliza técnicas circenses».

Al comentar sobre el circo en el Brasil del siglo XIX y su difusión bajo el


régimen del Imperio, la profesora e investigadora Erminia Silva y el investi-
gador Daniel de Carvalho Lopes, ambos del sitio web Circonteúdo (São Pau-
lo), permiten un contraste con la realidad del siglo XXI. En ese período, esa
arte era «una de las formas de entretenimiento más frecuentes y atractivas
para la sociedad, reuniendo a los más variados grupos sociales. A lo largo
de los años 1800, cientos de compañías viajaron por todo el país, proceden-
tes de giras por otros continentes», según los autores.

«Estos diversos circos, cada uno con su propia forma de producir y orga-
nizar sus espectáculos, se relacionaban intensamente con la vida social
y urbana de la época y, en consecuencia, recibían “inundaciones” de pú-
blico, término común en los periódicos para referirse al éxito que algunas

64
\editorial
Transformaciones de la práctica y del pensar crítico

compañías lograban en ese momento. Por sus atracciones y su magnitud


(muchos circos tenían decenas de animales, artistas e incluso sus propios
barcos para el transporte de la compañía, como el Circo Grande Oceano),
así como por movilizar el imaginario de hombres, mujeres y niños de miles
de maneras, también fueron objeto de “inundaciones” de crónicas, críti-
cas, notas, sátiras y caricaturas de prácticamente todas las producciones
bibliográficas de la época, principalmente las periodísticas», recuerdan Er-
minia y Lopes.

Y agregan: «Así, como podemos observar en los ejemplos aquí presentados,


los espectáculos circenses, sus artistas y sus sucesos en Brasil a lo largo del
siglo XIX y, por supuesto, a principios del siglo XX fueron frecuentemente
contemplados por una parte de la prensa y de la crítica en diversas publica-
ciones. Hablaron bien, hablaron mal, pero siempre hablaron del circo. Ante
la multiplicidad de producciones circenses y su permanente reinvención, el
circo siempre ha estado en el punto de mira de la opinión pública e impreso
en las páginas de periódicos, revistas, folletines e incluso en publicaciones
dirigidas a la educación o la producción cultural artística».

Los demás escritos presentes en la publicación en línea están firmados por


la actriz Alice Guimarães, del Teatro de Los Andes (Bolivia); el director Alte-
mar Di Monteiro, del grupo Nóis de Teatro (Ceará); el artista-investigador
y profesor chileno radicado en Fortaleza Héctor Briones (Ceará); la profe-
sora, productora y gestora cultural Andrea Hanna (Argentina); la actriz e
investigadora teatral Camila Scudeler (Colombia); el periodista y crítico de
danza Carlinhos Santos (Rio Grande do Sul); el artista transdisciplinario y
crítico de danza Daniel Fagus Kairoz (São Paulo); el actor y crítico de teatro
Diogo Spinelli, del sitio web Farofa Crítica (Rio Grande do Norte); el actor,
director y profesor de teatro Edson Fernando, del sitio web Tribuna do Cre-
tino (Pará); el actor y director Fernando Cruz, del Teatro Imaginário Mara-
cangalha (Mato Grosso do Sul); la periodista y crítica de teatro Ivana Moura,
del blog Satisfeita, Yolanda? (Pernambuco); el actor e investigador teatral
Lindolfo Amaral, del Grupo Imbuaça (Sergipe); el director Luis Alonso-Aude,
del grupo Oco Teatro Laboratório y del Festival Internacional Latinoamericano
de Teatro de Bahia (FilteBahia/BA); el pedagogo, crítico de teatro e investiga-
dor Luvel García Leyva (Cuba); la actuadora e investigadora Marta Haas, de
la Tribo de Atuadores Ói Nóis Aqui Traveiz (Rio Grande do Sul); la actriz y
agitadora cultural Nena Inoue (Paraná); la directora y dramaturga Fernanda

65
crítica em movimento:
\La brecha entre la crítica y el circo

Júlia Onisajé, del Núcleo Afrobrasileiro de Teatro de Alagoinhas (Bahia); la


periodista y crítica de teatro Pollyanna Diniz, del blog Satisfeita, Yolanda?
(Pernambuco); el crítico de teatro y periodista Macksen Luiz (Río de Janei-
ro), que actúa en el periódico Jornal do Brasil (1982-2010), es colaborador de
O Globo (2014-2018) y creador de un blog de críticas con su nombre (2011);
la investigadora de danza, bailarina y profesora Rosa Primo (Ceará); y la
artista-investigadora y profesora Walmeri Ribeiro, del proyecto Territórios
Sensíveis (Río de Janeiro).

Como se ve y se lee, es una producción textual que pretende ser geográfi-


ca e ideológicamente no hegemónica. Se vuelca sobre el hacer crítico, sus
potencias y sus dificultades en esta época de la historia de Brasil, en la que
las ya insuficientes políticas públicas para las artes y la cultura enfrentan
ataques beligerantes.

Escucha activa

En simbiosis con los cuadernos, el podcast Crítica em Movimento convoca al


público en general a activar la escucha reflexiva a través de cinco episo-
dios. Cada uno de ellos plantea una pregunta a los invitados. En el primero,
Macksen Luiz y la crítica de teatro, investigadora y artista Daniele Avila
Small, de Questão de Crítica – Revista Eletrônica de Críticas e Estudos Teatrais, am-
bos actuantes en Río de Janeiro y de diferentes generaciones, responden
a la pregunta: «¿Cuáles son los enfrentamientos de la práctica de la crítica
teatral actuales?». El tema recorre la precarización del trabajo remunerado,
la migración del hacer crítico a la Internet y cómo ampliar la conversación
con públicos, artistas y gestores culturales, con la mediación del periodista
y crítico de teatro que escribe estas líneas.

En el segundo episodio, la investigadora, artista y profesora Lourdes Ma-


cena (Ceará) y el actor y director Rogério Tarifa (São Paulo) se dedican al
tema: «¿Cómo se relaciona la crítica con la noción de lo popular en las artes
escénicas?». Con la mediación del investigador y profesor Diógenes Maciel
(Paraíba), se trata de un diálogo sobre la recepción de expresiones cultu-
rales que emanan del pueblo, muchas veces en oposición al conocimiento
formal, las normas y las ambiciones de los poderes políticos y económicos
que están en juego en la sociedad.

66
\editorial
Transformaciones de la práctica y del pensar crítico

«¿Cuál es la percepción de quienes crean acerca del trabajo de la crítica?»


- este es el tema del tercer episodio. Para contestarlo, se escuchó a artis-
tas de colectivos escénicos entre los más longevos del país: Tânia Farias,
de la Tribo de Atuadores Ói Nóis Aqui Traveiz (Rio Grande do Sul), fundada
en 1978, y el dramaturgo y director Edyr Augusto Proença, del Grupo Cuí-
ra (Pará), graduado en 1982. Como mediadora, la investigadora, artista de
performance y periodista Maria Fernanda Vomero (São Paulo). Este trío dis-
cutirá cómo sus respectivas creaciones son vistas por quienes escriben crí-
tica en sus regiones o fuera de ellas, teniendo en cuenta que las realidades
social, política y económica de Brasil presentan contrastes y convergencias.
La investigadora y profesora Walmeri Ribeiro (Río de Janeiro) y el actor Pe-
dro Wagner, del Grupo Magiluth (Pernambuco), discuten «¿Cómo mirar y
escuchar desde la escena remota?». La crítica de teatro y periodista Lu-
ciana Romagnolli, editora del sitio web Horizonte da Cena (Minas Gerais),
media los desafíos del análisis frente a los procedimientos artísticos que
emergen en la actualidad y sientan precedentes para una nueva idea de
presencia y cuerpo mediado.

Finalmente, en el último episodio se analiza «¿Cuál es el lugar de la resis-


tencia en la formación de la crítica?» desde la mirada de Henrique Saidel
(Rio Grande do Sul) y Dodi Leal (Bahia), artistas que manejan la investiga-
ción, la creación y la docencia en su vida cotidiana. Bajo la mediación de la
periodista, crítica de teatro y profesora Julia Guimarães (Minas Gerais), los
artistas exploran cómo el estudio y el ejercicio de la crítica pueden abarcar
procedimientos de escritura y pensamiento tan expandidos como la palpi-
tante producción contemporánea.

Se puede acceder al programa en el sitio web itaucultural.org.br o reprodu-


cirlo en su aplicación de podcast favorita.

Evoé.

.:. Este texto es responsabilidad exclusiva de sus autores y no refleja necesariamente la


opinión de Itaú Cultural.

67
crítica em movimento:
\La brecha entre la crítica y el circo

Ejercicio de acrobacia mental:


crítica, estética y circo Alice Viveiros de Castro¹

1. Actriz y Como diría Velho Faceta:² ante todo, ante nada, consultemos el diccionario
directora de teatro
para encontrar algunas definiciones simples, casi simplistas.
y espectáculos
circenses. Autora
del libro O elogio da Crítica: Examinar obra de arte o ciencia, costumbres, comportamientos y
bobagem: palhaços
sus características, nombrando sin prejuicios y en detalle.
no Brasil e no mundo
(Editora Família
Bastos, 2005). Estética: En el kantismo, estudio de los juicios mediante los cuales los seres
Representó el
sector del circo en
humanos afirman que un determinado objeto, artístico o natural, despier-
el Consejo Nacional ta universalmente un sentimiento de belleza o sublimidad.
de Política Cultural
del Ministerio de
Cultura (2006-2012).
Acrobacia: Arte de bailar sobre la cuerda y, por extensión, todo lo que pre-
En 2013, publicó el senta dificultades análogas a las de los acróbatas en sus actividades.
artículo Acrobatas Acróbata: Akróbatos, en el sentido de «el que camina de puntillas».
da Serra da Capivara –
27.000 anos de proezas
e equilíbrios circenses Arte: Producción consciente de obras, formas u objetos destinados a ex-
[Acróbatas de Serra
presar la subjetividad humana, nuestros sentimientos y opiniones, así
da Capivara: 27.000
años de hazañas y como retratar nuestras experiencias, transmitir información y sembrar be-
equilibrios circenses] lleza, diversión y reflexión.³
en la Revista Ensaio
Geral (UFPA/ETD).
Soy una acróbata mental.⁴ Acuñé este término para contestar a la pregunta:
«¿Qué hace usted en el circo?». No sabía muy bien cómo explicar lo que yo
2. Constantino
Leite Moisakis (1925- hacía allí. Entré al circo a través de luchas sindicales y discusiones sobre polí-
1986), conocido ticas públicas para la cultura. Soy actriz, siempre lo he sido, pero de repente
como Velho Faceta,
estaba allí. ¿Qué hacía yo en el circo? Lo descubrí: soy un acróbata mental.
fue uno de los más
grandes maestros de Pienso sobre el circo, salto y me equilibrio, tratando de conocer la historia de
pastoril [manifesta- las artes circenses y el papel que juegan en nuestra sociedad. Hay milenios
ción folclórica que
mezcla música, baile
de acrobacias en todas las culturas, en todos los tiempos. Descubrí que era
y teatro] de su tiem- imposible luchar por la valorización de las artes circenses sin conocer su his-
po. Hay discos gra- toria y sus personajes. Soy acróbata mental, mucho gusto en conocerle.
bados que muestran
bien su irreverencia e
identidad de payaso. Tardé mucho en comprender la razón de la falta de interés en las artes cir-
censes. ¿Cuál es el origen del menosprecio, del prejuicio? Todavía no acabo
de entenderlo, pero lo estoy intentando.

68
Me licencié en teatro. Tuve muchas clases de historia del teatro e historia 3. Todas las defini-
ciones se basan en
del arte. Compré y leí los tres volúmenes de Historia Social de la Literatura y el
entradas del Grande
Arte, de Arnold Hauser.⁵ Sé que esta etapa de mis estudios académicos fue Dicionário Houaiss.
hace muchos años, pero la verdad es que el circo sigue estando fuera de la
línea de la historia de las artes. 4. Erminia Silva y
Verônica Tamaoki
son mis compañeras
Los espectáculos populares tampoco forman parte de esta línea. No quiero
de acrobacia mental.
entrar aquí en la discusión de lo que es el «espectáculo popular». Creo que Además de investigar
se puede comprender el significado del término en este contexto. Si fuera y estudiar el circo, los
acróbatas mentales
por los libros y los críticos, yo no tendría ni idea de lo que es un teatro mamu-
participan en luchas
lengo [de títeres], no sabría que Antônio José da Silva, el judío, era titiritero por más respeto y
y que todos sus textos fueron escritos para títeres. No conocería el pastoril, apoyo, ya sea de la
academia, de los
los reisados, no sabría nada de la riqueza rítmica de Brasil. No sabría cuánto intelectuales o de los
aportaron los moros a nuestra historia, no conocería a nuestros arquitectos gobiernos. Creamos el
populares tan creativos, sin mencionar las culturas de tantos otros pueblos. Comitê Pró Criação da
Associação Nacional
de Acrobatas Mentais,
Muchos pensarán que mi ignorancia era abismal, y estoy de acuerdo. No o CPCANAM [Comité
para la Creación de la
era por falta de interés, siempre he intentado leer todo lo que caía en mis
Asociación Nacional
manos sobre arte, toda la vida he sido un ratón de librerías de segunda de Acróbatas Men-
mano. Pero no sabía cómo buscar información sobre algo que ni siquiera tales]. Quienes están
en el circo siempre
me imaginaba que debería conocer.
deben tener humor.

Cuando comencé a trabajar con Luiz Mendonça, empecé a comprender el


5. En 1976, Arnold
mundo que no conocía. Las artes son muchas, muchas más. Existen artistas de Hauser era el máximo
todo tipo, en cada rincón. Nadie podrá entender y conocer todo, pero podemos de los máximos y sus
libros, todavía no tra-
ir mucho más allá de esta historia de las artes que fueron reconocidas como
ducidos, eran caros,
importantes por personas que se reconocían a sí mismas como importantes. muy caros.

Conozco poco, muy poco, pero abrí mis ojos a las artes y amplié este plu- 6. El circo, como
ral en múltiples vertientes. No se puede intentar conocer la historia de las teatro, tiene dos
significados: la casa
artes con juicios de calidad sin darse cuenta de las diferentes formas y me-
donde se desarrolla
dios. Sin reconocer la influencia del tiempo, del entorno y del objetivo de el espectáculo y el
cada obra, espectáculo o expresión. espectáculo que ha-
bitualmente se realiza
en este espacio. Las
¿Y cómo queda el circo ⁶ en la historia del arte? ¿Por qué no está en los artes circenses ya
libros, en la historia oficial? Como acróbata mental, he estado ensayando existían mucho antes
de la creación del es-
algunas posibles respuestas. Y, como cualquier acróbata, corro el riesgo de pacio circo, así como
caerme al suelo, pero vale la pena intentarlo. Allá voy. el teatro.

69
crítica em movimento:
\La brecha entre la crítica y el circo

Todo lo que la élite no puede hacer o disfrutar exclusivamente, no tiene importancia.

La definición de calidad de las artes siempre ha sido un atributo que ha


correspondido a las élites, en todas las eras. Las grandes fiestas populares,
los desfiles de los ejércitos victoriosos, las fiestas de la cosecha, los cor-
tejos religiosos eran todos patrocinados por una élite para el disfrute del
pueblo. Allí estaban faraones, sacerdotes, reyes, nobles de todo tipo. Ellos
también se divertían, pero aquello era para el pueblo.

La importancia de los mecenas nos ayuda a comprender un poco cómo se


produjo esta división entre lo que es arte y lo que no lo es, entre lo que es
noble y lo que es solo entretenimiento, un arte menor.

Hasta hoy, el tener o no los recursos para sobrevivir y crear es fundamental


para cualquier artista. Músicos, compositores, literatos, poetas, escultores,
pintores y muchos otros artistas de las artes nobles podían al menos com-
petir por un lugar bajo el sol. Dependían del deseo de la élite, del recono-
cimiento de algún mecenas. Iglesias y templos de todas las épocas tenían
que impresionar a sus fieles y fortalecer su relación con lo mágico, lo divino,
lo inefable. Quienes pagaban la factura tenían todo el interés en valorar a
«sus artistas», «sus obras», exhibiendo su riqueza y su «buen gusto».

¿Quién eligió a los grabadores y pintores de las pirámides? ¿Quién decidía


cuál artista haría la rica marquetería y las delicadas pinturas del arte chi-
no? Alguien siempre tiene la última palabra, alguien siempre decide qué es
bueno, qué es bello, qué está a la altura del «dueño» de la obra.

El caso del ballet clásico es emblemático. La humanidad siempre ha bailado.


Desde bodas hasta rituales religiosos, todo era motivo para bailar. En las
cortes también se bailaba mucho, aunque con más lujo, modales refinados
y reglas diferentes a las de los bailes de los plebeyos.

A principios del siglo XVI, surgió el ballet en las cortes italianas. Llevado a
Francia por la reina María de Médici, el ballet encontró allí a su público más
apasionado. La corte francesa acogió encantada la delicadeza y sutileza de
sus movimientos. Otro punto importante es que el ballet necesitaba las or-
questas, que le permitían a la élite mostrar su prestigio con «sus» músicos
y «su» cuerpo de baile. Se creó el espectáculo de danza de la élite.

70
Ejercicio de acrobacia mental: crítica, estética y circo

La división de clases, derechos y privilegios siempre ha sido parte de la his- 7. Los que juegan
son los que se
toria y, por tanto, también de la historia del arte. Existe una cierta jerarquía
presentan. En la
en las artes, como lo explica bien el concepto del cine como el séptimo arte. cultura popular,
Las otras son arquitectura, escultura, pintura, música, poesía y danza. jugar y actuar son
lo mismo. En el
lenguaje culto, no
Artistas circenses también se presentaban en grandes fiestas de la élite. tenemos el «to play»
La imagen de malabaristas y tragafuegos era común en los banquetes del inglés ni el «jou-
er» del francés.
medievales o simposios griegos. La diferencia es que ellos no eran consi-
derados artistas. Con la noble excepción de los bobos y bufones, no en-
contramos referencias a artistas de circo patrocinados por mecenas de
ningún tipo.

Hay muchas referencias a los grupos de teatro ambulantes que realizaban


hazañas acrobáticas, bailaban cómicamente y cantaban canciones licen-
ciosas o románticas, pero todos siempre estaban de paso: recibían su pago
y seguían su camino. Los saltimbanquis sobrevivían gracias a las monedas
tiradas al sombrero.

Volvamos al tema: ¿por qué las artes circenses no se tratan como arte? No
lo sé y no pretendo contestarlo, solo estoy tanteando, buscando pistas.

En la jerarquía de las artes, la comedia está muy por debajo de la tragedia.


Temas trascendentales, historias edificantes, grandes momentos de la his-
toria, dramas humanos y de los dioses están en la tragedia. La comedia tra-
ta de las equivocaciones y confusiones de la vida cotidiana. Son cornudos,
viejos verdes, avaros, mujeres charlatanas, el soldado cobarde, el soldado
valiente, la chica ingenua y el muchacho que quiere casarse con ella.

En general, podemos clasificar a los personajes de la tradición cómica en


dos grandes grupos: los que comen y los que no tienen nada que comer y
se pasarán toda la historia intentando solucionar su problema. Son perso-
najes que atravesaron milenios. En la Grecia Antigua eran los deikelistai - los
que muestran, los que juegan.⁷ Mimos dóricos, poetas yámbicos, parásitos,
todos, de alguna manera, usaban estos tipos caricaturescos que llegan a la
actualidad. Los lazzi de la Commedia dell’Arte, herederos de la farsa atelana
y la comedia romana: son los guiones que, al ser tan conocidos, no necesi-
taban ser escritos. Los personajes eran los mismos, con pequeñas variacio-
nes, según la región de origen y la época.

71
crítica em movimento:
\La brecha entre la crítica y el circo

Los actores acróbatas payasos podían interpretar al mismo personaje du-


rante toda su vida. Arlequines, pantaleones, doctores, polichinelas, colom-
binas, amas y ancianas son figuras que se han perpetuado en el tiempo.
La comedia repite infinitamente las mismas situaciones básicas y, por mu-
cho que todo parezca diferente, los sentimientos humanos son los mismos.
Siempre tratamos de reírnos de nosotros mismos.

Comediantes, saltimbanquis, acróbatas, músicos, bailarines y todo lo que


se necesite: así son los artistas circenses. Este teatro popular de las plazas
y ferias no diferenciaba entre las habilidades de un artista. En los espectá-
culos se entrelazaban saltos, piruetas, cancionetas, poesía, historias cómi-
cas o románticas, animales en exhibición o adiestrados. Todos itinerantes,
procedentes de ningún lugar, que iban a alguna parte.

En la búsqueda de apoyo financiero y prestigio, cada rama del arte inten-


taba ser reconocida como algo especial que mereciera un tratamiento dife-
renciado. El teatro era especial y no podía equipararse a los saltimbanquis
de ferias. La competencia fue tan grande que, en Francia, durante mucho
tiempo, solo se permitía hablar y tocar instrumentos en el escenario de los
teatros oficiales que tenían la autorización del rey. Por tanto, los saltimban-
quis se han reinventado. Crearon la escena fuera de la carpa. Un presenta-
dor presentaba la obra y a los personajes. Dentro de la carpa, mucha mímica
e incluso el uso de carteles, como pasaría en el cine mudo siglos después.
Los instrumentos insólitos terminaron convirtiéndose en una gran atrac-
ción. Tocar serrucho, bailar con cascabeles afinados, taburetes, panderetas,
coro de bocinas: se inventaba de todo para asegurar la alegría del público.

El circo moderno, con maravillosos caballos y jinetes, numerosas hazañas y


figuras cómicas, fue creado por Philip Astley en 1778, en Londres. Al principio
era solo un terreno vallado donde el público pagador podía apreciar los mo-
vimientos de los caballos y jinetes, espectáculos con malabaristas, músicos,
equilibristas, acróbatas y payasos. En 1779, Astley construyó su anfiteatro
con una pista de 13 metros de diámetro y condiciones de presentar fascinan-
tes espectáculos, con todo tipo de destreza y variedad de las artes circenses.

En Francia, en 1782, Charles Hughes y Charles Dibdin inauguraron una casa


de espectáculos con una pista y un escenario, llamada Royal Circus. Fue la
primera vez que se utilizó la palabra circo en el sentido moderno.

72
Ejercicio de acrobacia mental: crítica, estética y circo

Este espectáculo con la diversidad de los saltimbanquis y la experiencia 8. El trapecio al vue-


lo fue creado por
de los jinetes fue un éxito en toda Europa y luego llegó a las Américas.
Jules Léotard, un
Cabe recordar que desde principios del siglo XVIII ya venían a Brasil artistas gimnasta francés,
ecuestres, ilusionistas, acróbatas, trapecistas y funámbulos. Se presenta- en 1859. El acró-
bata pasaba de un
ban en teatros, en las calles o en los «círculos de toros». A principios del
trapecio (lo que hoy
siglo XIX, familias de artistas procedentes, en su mayoría, de Europa deci- llamamos trapecio
dieron quedarse aquí y abrieron sus circos. fijo, que se balan-
cea, pero no tiene
altura) a otro y de
No contaré aquí la historia del circo. Ni siquiera puedo hacerlo, pues sé este a un tercero,
poco sobre ella. Todavía sabemos muy poco. Lo importante es darse cuen- haciendo movi-
mientos acrobáticos
ta de que el circo, al igual que el teatro y cualquier otra forma de arte, tie- a cada paso.
ne su historia, se transforma, se reinventa y continúa. Las artes circenses,
así como el arte de la interpretación, siempre han estado presentes y, a lo
largo del tiempo, han tenido varios cambios estéticos. El espectáculo del
circo del siglo XVIII no es el mismo que el del circo en carpa, creado por J.
Purdy Brown en 1825, en Estados Unidos. El circo en carpa es el símbolo del
espectáculo itinerante, la marca de los nuevos saltimbanquis.

Cada avance tecnológico abre innumerables posibilidades para las artes


circenses. La «novedad» es parte de ellas. La «grandiosidad» también. Lo
«aparatoso» forma parte de las artes circenses. Las carpas aumentaron,
pasaron a tener dos mástiles y ahora podían presentar el trapecio volador,
que antes solo era posible en los anfiteatros. Con la popularización del
espectáculo creado por Léotard,⁸ los acróbatas han inventado dificulta-
des, mejorando el espectáculo y transformando el trapecio. El trapecio al
vuelo actual es inmenso y está a gran altura. Se creó al portor, que soporta
al ágil, que se lanza del trapecio. Las troupes de hoy realizan triples sal-
tos mortales y otros movimientos que parecerían imposibles para el joven
Léotard y sus contemporáneos.

No se puede tener una visión crítica si no se conoce la historia o las diferen-


cias estéticas de un arte en desarrollo.

El trapecio, por ejemplo, es un aparato en el que los artistas se apoyan para


realizar hazañas. Pero no es el aparato que hace el espectáculo, ni el hecho
de que los artistas sean capaces de superar una determinada dificultad
técnica. Lo que hace el espectáculo, lo que hace del trapecio una de las
imágenes más memorables del circo es el que vuela, el ágil. La música, la

73
crítica em movimento:
\La brecha entre la crítica y el circo

presencia, el tiempo, la elección de la serie, la capacidad de encantar: esto


es arte. Hay que conocer el espectáculo de trapecio para comprender la
calidad del trapecista.

En las últimas décadas del siglo pasado, el circo vivió un período de revo-
lución estética muy importante. Desafortunadamente, la falta de cono-
cimiento sobre las artes circenses ha creado equivocaciones que toda-
vía resuenan hoy. Francia denominó el movimiento como «nuevo circo».
¿Esto convertía a los que tenían otro tipo de espectáculo en «viejo circo»?
En Brasil, el desconocimiento absoluto por parte de nuestros periodis-
tas hizo que los espectáculos que se identificaban con esta experiencia
estética se trataran como teatro. ¡Y es circo, es todo circo! Los que son
capaces de realizar hazañas que desafían la gravedad son del circo. La
ignorancia fastidia.

Seguí esta historia de cerca. Estaba allí cuando comenzó la Intrépida Tru-
pe,⁹ en 1986. Un grupo de jóvenes recién egresados de la Escola Nacional
de Circo Luiz Olimecha viajó a México llevándose con ellos a artistas pro-
cedentes de la danza, la capoeira [mezcla de artes marciales y danza] y de
un curso de dobles impartido por Breno Moroni en el Parque Lage. Todos
participaban en el Circo Voador instalado en Arpoador, en la playa. Ninguno
de ellos pertenecía a una familia circense. Ninguno de ellos había nacido en
una tienda de campaña al lado de la carpa. Eran jóvenes urbanos a los que
les gustaba un tipo de música, que vestían como los demás jóvenes de la
ciudad y tenían un bagaje cultural similar.

Intrépida Trupe, aunque no tiene la tradición circense, trajo en su reper-


torio algunos espectáculos de gran dificultad técnica. Equilibrio en la ta-
bla de equilibrio con el ágil apoyado en la cabeza del equilibrista —nú-
mero de graduación de Claudia Goudá y Ricardo Camilo en la Escola de
Circo— es algo que nunca he visto igual. Otros que merecen destacarse
son el tango sobre zancos y la monociclista en altura, de Felicity Simpson
y Héctor Combo. Espectáculos que requerían un gran dominio técnico y
eran pura poesía.

Los jóvenes superaban las dificultades técnicas convirtiéndolas en oportu-


nidades creativas. El espectáculo del trapecio triple no era espectacular en
términos técnicos, pero los trapecistas nadaban en el aire y eso era hermo-

74
Ejercicio de acrobacia mental: crítica, estética y circo

so. Estas ideas eran diferentes, llamaron la atención y crearon una mirada. 9. Cito a Intrépida
Trupe como un
La prensa de Río de Janeiro decidió denominar a Intrépida Trupe como un
ejemplo perfecto
«grupo de teatro y danza que utiliza técnicas circenses». Hoy todavía uti- de esta confusión
lizan este tipo de designación para referirse a un grupo capaz de realizar entre lo que es o no
es circo, pero podría
hazañas de alto nivel.
mencionar Circo
Mínimo, Acrobáti-
Siempre se han bailado las acrobacias circenses. Hay una coreografía en cada cos Fratelli, Teatro
de Anônimo y
movimiento y los artistas actúan todo el tiempo. Entran en escena y se impo-
muchos otros.
nen al público. Son personajes. El hombre fuerte no es tan fuerte, la bailarina
tan delicada en el trapecio tiene músculos definidos y mucha fuerza.

Intrépida Trupe es un grupo circense y, como todos los grupos circenses, es


heredera de los saltimbanquis. El circo, en sí mismo, es un espectáculo de
circo-danza-teatro-música-y-algo-más. El circo abarca cine, espectáculo,
televisión, todo.

La ignorancia transformó lo que sería un interesante estudio para la crítica


en una disputa por espacio y recursos. El final de los años 1980 marcó una
nueva estética en el circo, una más. Otra mirada a la creación del espectá-
culo, un estilo más entre los muchos que el circo ha desarrollado a lo largo
de su historia. Como en todo arte, las elecciones estéticas son múltiples y
algunas veces puntuales, otras veces son tan marcadas que se convierten
en un movimiento que influye en toda una generación.

Al mismo tiempo están en cartelera el Cirque du Soleil y el Cirque d’Hiver Bou-


glione. Son contemporáneos. El público puede elegir cuál prefiere o incluso
ver ambos. Son estilos diferentes y sus espectáculos son completamente di-
versos, sin embargo, ¡es todo circo! Es todo arte circense. La diferencia está
en la elección estética y, por supuesto, en las posibilidades financieras.

¿Cuándo vamos a empezar a pensar seriamente en los cambios estéticos


que atraviesan las artes circenses? ¿Vamos a viajar a través de la historia
para tratar de entender qué significó la creación del gigantesco espectácu-
lo con tres pistas por parte de Ringling Brothers y Barnum & Bailey Circus?
¿Cómo esto impactó a otros circos? ¿La creación de las carpas suspendidas,
sin mástil, cambió algo en los espectáculos? Me parece fascinante el entre-
lazamiento de cuestiones tecnológicas y artísticas en las artes circenses.
Las artes del circo son realmente fascinantes.

75
crítica em movimento:
\La brecha entre la crítica y el circo

.:. Este texto es responsabilidad exclusiva de sus autores y no refleja necesariamente la


opinión de Itaú Cultural.

Para conocer más

En el sitio web de Circonteúdo —el Portal de la Diversidad Circense (<www.


circonteudo.com>)— están la mejor bibliografía, libros, tesis de maestría y
doctorado, además de artículos para descarga, historias de artistas, videos
y testimonios. Entrar en Circonteúdo es sumergirse profundamente en el
circo y las artes circenses.

El Centro de Memória do Circo [Centro de Memoria del Circo], en el centro


histórico de São Paulo, es un museo vivo del circo y las artes circenses, con
un invaluable acervo material e inmaterial. Lugar de cursos, conferencias
y espectáculos, es un espacio vivo abierto a investigadores y público en
general. Imperdible.

76
Ejercicio de acrobacia mental: crítica, estética y circo

Referencias

CASTRO, Alice Viveiros de. O elogio da bobagem: palhaços no Brasil e no mun-


do. Río de Janeiro: Editora Família Bastos, 2005.

CIRCONTEÚDO. Concepción: Crioula Design, 2018. Disponible en: <https://


www.circonteudo.com/>. Accedido el 28 de septiembre de 2020.

77
crítica em movimento:
\La brecha entre la crítica y el circo

«La brecha entre la crítica


y el circo»: ¡una historia llena
de contratiempos! Fátima Pontes¹

1. Graduada en ar-
tes escénicas por la
Miro la página en blanco… Pienso en cómo podré escribir sobre «la brecha
Universidad Federal
de Pernambuco entre la crítica y el circo». Entonces pienso en cómo escribo habitualmente.
(UFPE), tiene una Mi orientador en la maestría, João Francisco de Souza —cuya ausencia me
maestría en el área
entristece, pues era alguien que entendía lo que yo escribía—, dijo: «Ella
de educación de la
misma institución. escribe como quien habla con otra persona». Me moría de la risa, porque
Actúa como actriz, yo creía que esa era la forma como debería escribir para que las personas
productora cultural
y profesora de tea-
me entendieran, todas ellas. Después de algún tiempo, él aceptó mi forma
tro. Desde hace 20 de escribir y ya no quería que la cambiara para la tesis, porque: «Si nadie
años, coordina las escribe diferente en la academia, todo se convierte en una sola cosa... Ve,
áreas ejecutiva y ar-
tística de la ONG Es-
hazlo a tu manera». Y así es como, después de pensar mucho, escribo este
cola Pernambucana texto: de manera que parezca una conversación mía con mis amigos y ami-
de Circo, consolida-
gas del circo y de otras partes, de la manera como me gusta contar histo-
da en Recife en 24
años de actividades rias o cuentos.
ininterrumpidas. La
organización está
Por eso ahora pienso en cómo, en realidad y antes de entrar en el tema,
vinculada a la Rede
Circo do Mundo describir de forma sencilla y rápida toda la magia que tienen las artes cir-
Brasil, que forma censes cuando toman de rebote a su público. Recuerdo, entonces, la prime-
parte del colegiado
ra vez que vi un circo cuando era niña. Yo ni siquiera sé cuántos años tenía,
gestor, que tiene
una alianza con el ¿6, 7, 10 años? ¡No lo sé! De verdad, no recuerdo ni siquiera el nombre del
programa Cirque du circo, pero creo que era uno de esos que tienen nombres «extranjeros», lo
Monde, del Cirque
du Soleil, y es uno
que me parece un deleite de poesía.
de los centros de
referencia en la for- Los recuerdos son confusos —no sé si recuerdo lo que realmente vi o lo
mación de formado-
res en circo social. que quiero recordar—, debido a que hoy soy parte de este mundo circen-
se y quiero que siempre sea encantador, mágico y alegre. Pero recuerdo
algo que me invadió ese día: cuando vi un espectáculo de circo, me invadió
el corazón, la garganta, el pecho y el alma. Toda la gracia y ligereza de la
trapecista, la destreza de los malabaristas, la gracia sin fin de los payasos,
que siempre están burlándose de alguien del público, el olor a serrín, el en-
canto con la carpa llena de estrellitas (también había agujeros, por los que

78
pasaba la luz y alcanzaba la pista) y había los animales. En este, eran los
perros adiestrados, caballos y un león, que me daba miedo —aunque yo le
tenía más miedo al entrenador que al león, porque hacía muchas muecas al
conducir al animal en sus trucos—, que el público aplaudía con entusiasmo.
Hoy, aunque llevo más de 20 años trabajando con las artes circenses, to-
davía siento lo mismo que sentí cuando era niña al ver un espectáculo de
circo: me quedo con la boca abierta, siento mariposas en el estómago, se
me pone la piel de gallina, me siento entusiasmada, feliz, emocionada y
apasionada. Aunque sea ese circo que muchos llaman «cirquito», ese «po-
brecito», que está «donde Cristo perdió la alpargata», como se dice cuan-
do algo está muy, muy lejos. Siempre siento que algo mágico le sucedió a
alguien en la audiencia y a los artistas, los mismos que a menudo venden
golosinas frente al circo, junto a la carpa. «¿Te has dado cuenta de que el
circo huele a palomitas de maíz?», decía Amanda, personaje de un espec-
táculo que presentamos aquí en Recife en 2008, llamado Ilusão – um Ensaio
Melodramático Circense, en la Escola Pernambucana de Circo. Y, realmente,
al igual que el cine, ¡el circo huele a palomitas de maíz! ¿Y la manzana de
caramelo? ¡Solo se hace de este tipo en el circo! ¿Y los juguetes? El inter-
valo del espectáculo sirve para esto, para vender estos productos, y tam-
bién tiene una magia, un encanto. Es el momento en el que la gente se ríe
o habla de los números que se han presentado y los que están por venir.
Volvamos a la audiencia, ¡el espectáculo continuará!

Y siempre ha continuado, incluso ahora, en tiempos tan difíciles: 2020,


¡vaya año! Momentos que nunca pensamos que viviríamos en pleno siglo
XXI, como si no fueran suficientes todos los demás tormentos que siempre
han sufrido las artes circenses, desde principios de los años 1990 hasta la
actualidad. La escasez de terrenos en los grandes centros urbanos hace
mucho empujó a los circos pequeños y medianos al interior de los estados,
y a los grandes a los estacionamientos de los centros comerciales.

Mis recuerdos me llevan a cuando empecé a trabajar en el circo. Fui empujada a


dar clases de teatro en la Escola Pernambucana de Circo, en Recife, a principios
de los años 2000, y es de ahí que hablo y escribo, porque solo puedo hablar y
escribir sobre el lugar de donde vengo y donde estoy en el mundo. De ese arte
yo no entendía nada y aún hoy creo que sé poco, porque cada día aprendo más
y más de todos los que hacen artes circenses, desde los más jóvenes hasta los
más mayores. ¡Cuánta sabiduría de todos y todas ellas! Sin embargo, el encanto

79
crítica em movimento:
\La brecha entre la crítica y el circo

que creo que tuve la primera vez que fui al circo sigue siendo el mismo.

Me encanta ver a mis chicos y chicas de la Escola Pernambucana de Circo y de


otros proyectos de circo social practicando, aprendiendo, desafiándose, supe-
rándose, investigando, encontrando nuevas formas de volver a hacer lo que
siempre se ha hecho. Esto lo veo en la mayoría de los cientos de artistas del cir-
co que conozco hoy y con los que convivo, en todas las categorías: itinerantes,
independientes, callejeros, troupes, grandes compañías, pequeñas compañías,
grupos, artistas en solitario, en fin, todo esto todavía me encanta. Esta es la
razón para seguir remando en estas olas que van y vienen, ¡como en el mar
que tanto amo!

Así, a veces pienso en cómo se siente un crítico especializado en artes y


cultura al escribir sobre las artes circenses de manera crítica. ¿Él debe te-
ner experiencia en circo para hacerlo? Pregunto esto porque no es fácil
transcribir al papel todos los temas relacionados con las artes circenses
presentes en un espectáculo, un número, una performance. ¿Cómo puedo
llevar al escrito crítico todo lo que comencé a hablar sobre las artes circen-
ses? ¿Cómo hablar de la destreza del artista, la estética del espectáculo,
el vestuario, la música? ¿Es posible diferenciar el circo contemporáneo y el
itinerante/tradicional del que se hace en los proyectos de circo social, que
tienen en sus troupes la forma de expresar su trabajo pedagógico con niños,
adolescentes y jóvenes? ¿Cómo analizar críticamente a un artista circense
de la nueva generación, que tiene acceso a mucha información y tecnolo-
gía, al lado de los artistas mayores, que se mantienen con sus números y
espectáculos llenos de tradiciones?

Como dice mi amiga —gracias a Dios— y compañera de tantos inter-


cambios de experiencias y conocimientos, la doctora Erminia Silva: «¡El
circo es circo!». Estoy de acuerdo con ella, porque también creo que el
que dice cuál es la expresión de lo que se presenta es el que presenta,
ya sea bueno, malo, óptimo o excelente a los ojos de quienes lo aprecian.
El que actúa es el que conoce el porqué de sus actos, «cada uno conoce
el dolor y el placer de ser lo que es», como dice el gran cantante Caeta-
no Veloso. Aunque hay distinciones entre los actos y formas circenses
de presentarse, todos tienen el mismo objetivo: llevar al público el cos-
quilleo en el estómago y el ardor en las manos causado por los cálidos
aplausos. Ah, la difícil tarea de no volverse loco pensando: «¿Cómo él/
ella puede hacerlo?». ¿Pueden los críticos, al tener que pensar en cómo

80
«La brecha entre la crítica y el circo»: ¡una historia llena de contratiempos!

escribir, al igual que yo al principio de este texto, llegar a entender qué 2. La primera de
estas cartas fue
son las artes circenses? Sin querer ser pedante, pero sin dejar de serlo,
traducida por Erica
creo que no. Stoppel, del Circo
Zanni (São Paulo),
con el título «A
Y, por supuesto, no es que los críticos no quieran escribir sobre el circo,
necessidade de uma
pero creo que la especificidad del arte circense dificulta este proceso de redefinição» [La
escritura del lenguaje de las artes escénicas, que a mi entender es el más necesidad de una
redefinición]. Dis-
difícil de realizar si no se tiene esta técnica, aunque sea inmadura. No hay ponible en: <https://
posibilidad de hacer malabares sin mantener de alguna manera los objetos panisecircus.com.br/
en el aire; no hay forma de hacer acrobacias sin rodar por el suelo de mane- abril-retrato-de-ca-
sal-de-acrobatas-
ra dirigida para el salto mortal o algo aún más sorprendente. Por último, la -em-intimo-erica-s-
expresión diversa del lenguaje circense requiere practicar durante meses o toppel-e-a-carta-ao-
-circo-da-dramatur-
incluso años para obtener destreza.
ga-bieke/>. Accedido:
21 oct. 2020.
Esto sin quitarles el mérito a los cantantes, actores, danzarines y bailari-
nes, que también trabajan mucho para mostrar sus habilidades. Pero es
que el circo tiene ese riesgo inminente, y eso sí es difícil de describir, sobre
todo si no se entiende cuál es el riesgo. No es solo de caída, es de tantas
cosas que no siempre nos damos cuenta. Y somos parte de ese mercado,
así que imagine los que no lo son, que no investigan las artes circenses, que
no escriben sobre esto de forma sistemática.

La dramaturga belga Bauke Lievens, en una serie de cartas que escribió en


2016 dirigidas a artistas circenses,² habla de su destreza:

El circo, con su amor por la habilidad física y su


tradición de colocar al público en la pista, no
intenta crear una ilusión. En lugar de eso, se
centra en un verdadero encuentro de cuerpos.
No hay una cuarta pared. Pase lo que pase, lo
hace en tiempo real, en el aquí y ahora de la
gran carpa. No hay historia, sino una sucesión
de actos. A excepción de los payasos, no hay
persona dramática (LIEVENS, 2016).

Esto refuerza la especificidad de las artes circenses y la dificultad de


comprenderlas de manera, digamos, formal. El circo se reinventa todo el
tiempo, aunque muchos piensan que todavía estamos atrapados en los
siglos pasados, cuando el circo llegó a Brasil. Otros, a su vez, creen que

81
crítica em movimento:
\La brecha entre la crítica y el circo

3. O circo, o teatro e a el circo «se perdió», principalmente los artistas de circos itinerantes y el
crítica: uma história de
público laico, a quienes les gusta el llamado «gran circo», el que se hace
encontros e desencon-
tros. Disponible en: allí frente al público, «sin adornos». Esto es aún más frecuente cuando
<https://www.ses- se trata de los espectáculos de circo contemporáneo, especialmente los
csp.org.br/online/
llamados «cabezones».
artigo/10017_O+-
CIRCO+O+TEA-
TRO+E+A+CRI- Afortunadamente, hoy en día hay mucha gente investigando y escribien-
TICA+UMA+HIS-
TORIA+DE+EN-
do sobre las artes circenses. Pero se sabe muy poco sobre crítica de los
CONTROS+E+DE- espectáculos circenses. Incluso discutimos esto en el seminario Crítica em
SENCONTROS>. Movimento, promovido por Itaú Cultural en 2017, en el que participé jun-
Accedido:
24 sep. 2020.
to con Erminia Silva y Rodrigo Matheus. Llegamos a la conclusión de que,
lamentablemente, no existe una producción robusta de críticas de espec-
táculos circenses. Yo y Rodrigo Matheus —Erminia dijo que no quería invo-
lucrarse en esto— quedamos de pensar en cómo cubrir esta brecha, pero
pasó el tiempo y nunca volvimos a hablar de eso. Digo «lamentablemente»
porque el mercado aún padece esta carencia que deja pendientes registros
históricos de los desplazamientos de circos itinerantes, compañías, grupos
y troupes por todo Brasil.

José Carlos de Andrade también habla de esta brecha, en un artículo escri-


to en 2016 para Sesc São Paulo:³

Si por un lado la supervivencia de los circos de


carpa, especialmente los populares, es un de-
safío para los artistas y gestores que trabajan
con políticas públicas, por otro lado ha surgido
en las últimas décadas una nueva generación,
resultado de una novedad relativamente re-
ciente, que son las escuelas, las denominadas
escuelas de circo y también las escuelas de tea-
tro, donde aspectos particulares del repertorio
circense son el enfoque del aprendizaje y la
formación, como es el caso de las diversas téc-
nicas de clown. Como casi siempre ocurre, esta
expansión no ha sido correspondida con mucho
rigor por la crítica, especialmente la periodísti-
ca. Si bien la reflexión académica ha multiplica-
do las especializaciones y los estudios en torno

82
«La brecha entre la crítica y el circo»: ¡una historia llena de contratiempos!

al circo tradicional o las nuevas formas del arte


circense, la producción contemporánea más
cotidiana se sigue viendo a través de instru-
mentos críticos todavía relativamente caren-
tes de un repertorio específico sobre este arte.
Rara vez escuchamos hablar de una «crítica
de circo». Lo más común es observar cómo los
críticos de teatro escriben sobre espectáculos
circenses o que involucran técnicas circenses.
Y muchas veces con poco o ningún desplaza-
miento en dirección al propio circo (ANDRADE,
2016).

Uno de los puntos interesantes abordados por Andrade es la dificultad de


la crítica para comprender la técnica circense. Y, como dije al principio de
este texto, es difícil escribir sobre lo que no se puede comprender. Además,
también señalo que los circos itinerantes sí tienen una dramaturgia, ya que
el guion de presentación de los números sigue siendo dramatúrgico, como
en los denominados circos contemporáneos:

Por un lado, este escenario se justifica por la


dificultad para reconocer los aspectos propios
del lenguaje que provienen de allí, aunque él es,
como hemos visto, tan antiguo como la propia
historia del país. Por otro lado, también tiene
que ver con esa tendencia del panorama actual,
de desestabilizar géneros y ofrecer a la mirada
del crítico, cada vez más, «experiencias escéni-
cas» en lugar de creaciones cuyas coordenadas
formales se restringen a alguna área más espe-
cífica. De todos modos, una crítica periodística
especializada en general sigue caminando, si
se compara con el trabajo de creación artística,
por detrás de un pensamiento vivo, presente
y que se manifiesta en sus variadas formas de
ocurrir, ya sea en el sentido de reubicar la tra-
dición o en el sentido de experimentar cruces
inusuales (ANDRADE, 2016).

83
crítica em movimento:
\La brecha entre la crítica y el circo

Entonces puedo decir que, teniendo en cuenta mi comprensión y las in-


vestigaciones que hice para escribir este texto, este problema para el sec-
tor circense, de la falta de comprensión de la crítica, se ha discutido un
poco más en los últimos años —los textos que menciono datan de 2016
y 2017—. Sin embargo, en marzo de 2012, en un artículo publicado en Re-
bento - Revista de Artes do Espetáculo, Rodrigo Morais Leite habla sobre Décio
de Almeida Prado, el circo y otros géneros «menores», como él los llama.
Presenta algunas consideraciones acerca de las críticas que hacía el autor
sobre el teatro y el circo, aunque en este aspecto se refiere mucho más al
circo en el teatro:

Dividido en cuatro partes —«As crônicas» [Las


crónicas], «Um crítico elitista e conservador»
[Un crítico elitista y conservador], «O teatro e
a salvação pelo popular» [El teatro y la salva-
ción por lo popular] y «O palhaço no teatro»
[El payaso en el teatro]—, este trabajo aborda
inicialmente las críticas que escribió Décio de
Almeida Prado sobre espectáculos de circo, pa-
sando después a examinar algunos supuestos
teóricos de su historiografía para, finalmente,
detenerse en las críticas de teatro con elemen-
tos circenses (LEITE, 2012).

Lo que se evidencia una vez más es que, en aquel entonces, desde 1946
hasta 1968, cuando escribía para el periódico O Estado de S. Paulo, Décio ha-
blaba mucho más de los elementos circenses presentes en los espectácu-
los de teatro que de los espectáculos de circo mismos:

De hecho, aunque el teatro prevaleció de ma-


nera incontestable, en los primeros tiempos
de su actividad como crítico de Estadão, Décio
de Almeida Prado, en ocasiones, abría espacio
para tratar otras manifestaciones del arte es-
cénico, como el circo (LEITE, 2012).

También según Rodrigo Morais Leite:

84
«La brecha entre la crítica y el circo»: ¡una historia llena de contratiempos!

Cuando pasó a denominarse simplemente


«Teatro», su sección en ese periódico —sin fir-
ma, como era habitual en la prensa de la épo-
ca— se titulaba «Palcos e Circos» [Escenarios
y Circos]. Estas aperturas a espectáculos de
diversa índole no se mantuvieron en el tiem-
po: con el paso de los años, se fueron hacien-
do cada vez más escasas, hasta que el teatro
adquiriera el monopolio completo, por eso el
nombre de la columna cambió a partir de 1959
(LEITE, 2012).

Resalto también cómo el autor analiza el escrito de Décio sobre el circo,


específicamente:

Las pocas «crónicas» que el crítico paulista


escribió, en esta etapa relativamente corta
de su larga carrera intelectual, sobre espectá-
culos específicamente circenses —porque es
otra cosa el teatro con elementos circenses—,
sólo dos se salvaron del olvido destinado a los
géneros periodísticos por excelencia (por lo
tanto, efímeros), como la crítica y la crónica,
adquiriendo supervivencia en las páginas su-
puestamente perdurables del libro impreso.
Sin embargo, antes de citarlas, abro un pe-
queño paréntesis: escribimos «crónicas», en-
tre comillas, por dos razones: primero porque,
en el momento en que fueron escritas, este
término tenía una connotación más amplia,
designando también lo que hoy se llama sólo
crítica; en segundo lugar, porque las críticas
de Décio de Almeida Prado que tratan del cir-
co son, en realidad, mucho más crónicas que
críticas, según el significado algo restringido
que la palabra ha adquirido más recientemen-
te (LEITE, 2012).

85
crítica em movimento:
\La brecha entre la crítica y el circo

Algo relevante en las crónicas/críticas de Décio de Almeida Prado es su


manera de describir el circo como «cansado», «sedentario» y «resigna-
do», pero sin mencionar a qué circo se refería. ¿Sería un circo moderno?
¿Un circo al estilo «nuevo circo»? No lo sé, no queda claro en el artículo.
Pero observamos que, desde entonces, se hablaba de una forma «an-
tigua» de hacer circo, más relacionada con los circos itinerantes, como
sigue siendo hoy, lamentablemente. Vale la pena resaltar, sin embargo,
que el autor del artículo reconoce las limitaciones de Décio para hablar
de las artes circenses:

[...] brechas, contradicciones y analogías te-


merarias que hasta este punto del trabajo he-
mos tratado de exponer, extraídas de un frag-
mento mínimo de la obra de Décio de Almeida
Prado, no se deben, es importante destacar, a
la incompetencia técnica. Creemos que el pro-
blema es de otro orden. De manera preliminar,
por el hecho de que él fue, como máximo, un
analista de circo bisiesto, es decir, un crítico de
teatro que ocasionalmente escribía sobre un
espectáculo de circo, y además en un período
relativamente corto de veintiún años de carre-
ra, no produjo y, por consiguiente, no reflejó lo
necesario para la elaboración de una teoría del
asunto en cuestión. Aunque lo más probable
es que entendiera bastante del tema, sus ob-
servaciones sobre él no obedecían a ninguna
plataforma conceptual, por amplia que fuera.
Esto es básicamente lo que explica, si no jus-
tifica, las inconsistencias antes mencionadas
(LEITE, 2012).

Por lo tanto, una vez más, descubrimos que escribir sobre la crítica circense
nunca fue fácil. Quizás se deba a eso la escasez de textos de crítica, princi-
palmente por su especificidad técnica y estética. Además, está el carácter
del valor económico del emprendimiento circense: cuanto más barato, es
decir, cuanto más pequeño y mediano es el circo, más difícil es que cual-
quier periodista se mueva para ir a verlo. Al fin y al cabo, estos circos se

86
«La brecha entre la crítica y el circo»: ¡una historia llena de contratiempos!

encuentran con mayor frecuencia en el interior de los estados y en las pe-


riferias de los centros urbanos.

Digo esto del circo itinerante, pero también puedo mencionar las grandes
compañías de circo que, si bien tienen esta característica, no reciben la de-
bida atención del periodismo crítico. Si esto es cierto para los grandes, es
aún más real para las pequeñas compañías, los grupos y las troupes circen-
ses, sobre todo si proceden de proyectos de circo social.

Pero, para que no digan que no hablé de flores, les traigo una historia del
Seminario Internacional de Crítica Teatral realizado por una productora de Reci-
fe en 2011. Nosotros, de la Trupe Circus, un grupo profesional de la Escola
Pernambucana de Circo, tuvimos el espectáculo Círculos que Não se Fecham...
Experimento n° 1 evaluado críticamente en ese evento. El montaje trataba
temas de la juventud, principalmente los relacionados con la violencia que
sufren los jóvenes de todas las clases sociales, pero con enfoque en los
de los suburbios urbanos (violencia de género, en la escuela, en el fútbol,
contra las mujeres, etc.). Traíamos la mirada de la juventud contemporánea
como punto de partida, en una mezcla de danza, música y teatro.

Sin embargo, el espectáculo fue criticado por periodistas que escribían sobre
teatro, ya que el seminario era sobre crítica teatral y no sobre circo. Por eso, las
críticas traen muchas evaluaciones sobre los elementos teatrales y poco o casi
nada sobre las artes circenses. Al menos nos sentimos un poco contemplados
e incluso felices de recibir una mirada crítica sobre nuestro trabajo artístico
después de 11 años de presentar espectáculos con la Trupe. Y ahí quedó.

Después de este espectáculo, hemos presentado cuatro más y no hubo la


presencia de periodistas en la audiencia ni críticas sobre las presentacio-
nes, lo cual es una lástima, porque sabemos lo importante que es esto para
el trabajo artístico. Los escritos elaborados en el seminario nos hicieron
evaluar y revisar las cosas que nos proponíamos con la puesta en escena.

¡Ah! Vale resaltar dos cosas: primero, que estos escritos no fueron
espontáneos, ya que los críticos no fueron a vernos por su propia voluntad.
Ellos existieron porque los críticos invitados tenían que escribir sobre los
espectáculos a los que asistían y que eran elegidos por la organización del
seminario. Por eso entramos en el conjunto de los programas analizados
críticamente. Segundo: entramos en una edición del seminario denominada

87
crítica em movimento:
\La brecha entre la crítica y el circo

Teatro Fora do Eixo [Teatro Fuera del Eje], entonces entendimos que la
elección se debió al tema que se debatiría ese año, con el que tenía que ver
nuestro espectáculo, que se consideraba un circo-teatro y se realizaba en
nuestra sede, en la periferia de la ciudad de Recife.

Los textos fueron escritos por los periodistas, profesores y autores teatrales
Márcio Bastos, Jorge Bandeira, Paulo Vieira y Márcio Braz. Y si bien estos críti-
cos escribían más sobre teatro, tuvieron algún cuidado al analizar nuestro es-
pectáculo y las artes circenses que surgieron de él, como dijo Márcio Bastos:

Es cada vez más raro presenciar una catarsis


colectiva en espectáculos de artes escénicas en
Brasil. Muchos se entregan al reclamo del me-
lodrama, al «susto-espectáculo», a performan-
ces exacerbadas y a dramas cerebrales. Pero
no fue lo que vimos en el espectáculo «Círculos
que não se fecham... experimento n. 1», donde
la emoción, la tensión y la calidez del circo es-
tuvieron presentes en un espectáculo bien di-
rigido, lleno de momentos fascinantes, climas
dramáticos y, sobre todo, contagioso por la ale-
gría de sus intérpretes (BASTOS, 2011).

A su vez, Paulo Vieira trae este análisis teatral:

El punto verdaderamente frágil del espectáculo


está en el nivel interpretativo, cuando, en algunas
escenas, la dirección llama a parte del elenco a re-
presentar, ya sea la maestra represora, la policía o
los alumnos rebeldes. Se puede observar que ahí
se necesita un trabajo específico mejor elabora-
do, aunque sean los actores alumnos de una es-
cuela de circo, no de teatro, pero una vez que se
proponen trabajar teatralmente, entonces deben
trabajar con técnicas interpretativas de la misma
forma que se hizo con los malabares, el trapecio y
otras técnicas circenses, o incluso la coreografía
de los bailes de hip-hop (VIEIRA, 2011).

88
«La brecha entre la crítica y el circo»: ¡una historia llena de contratiempos!

Márcio Braz, si bien habla de ritmo y poco de arte circense, todavía muestra
algún prejuicio al hablar del circo tradicional, al que también llama peyora-
tivamente «viejo circo»:

Lo que más llamó la atención fueron los climas


creados por la directora Fátima Pontes. La se-
cuencia de las escenas fue diseñada para produ-
cir un ritmo, una respiración. Desde momentos
repentinos pintados al son de rap y pasos de baile
urbano hasta otros de extrema sencillez y otros
más humorísticos, el espectáculo se volvió agra-
dable y sin causar cansancio. La emoción «suel-
ta» del llamado «viejo circo» o circo tradicional
dio lugar a la emoción concentrada y objetivada
que se originó en el «nuevo circo», involucrando
aún más al público ya bastante entusiasmado
por la actuación de los intérpretes (BRAZ, 2011 ).

Este fragmento de la crítica vuelve a tensar las divisiones entre las distin-
tas formas de expresión de las artes circenses, ya que en muchos casos se
evidencia este clima de disputa de «quién es el mejor». ¿Quién podría dis-
tinguir exactamente el llamado circo tradicional/itinerante (porque tendría
las técnicas más antiguas) del «nuevo circo» (que decía traer innovaciones
como la coreografía, el mismo teatro, la danza y una mezcla de tecnologías)
y del «contemporáneo» (en el que se dice que prevalece la dramaturgia y la
subjetividad de los temas abordados por las performances)?

Recordemos a la dramaturga belga Bauke Lievens, mencionada al principio


del texto. No tenemos que definirnos, necesitamos reflexionar no sobre lo
que hacemos, sino sobre cómo lo hacemos para complacer y seguir encan-
tando al público con las artes circenses.

El tratamiento que se le da al llamado circo contemporáneo, caracte-


rizado por la combinación de tecnologías de alto valor monetario con
técnicas y guiones circenses, es bastante diferente. Esto se evidencia en
las presentaciones de la compañía canadiense Cirque du Soleil, que ya
ha venido a Brasil en seis ocasiones y siempre ha tenido sus espectácu-
los analizados críticamente por periodistas especializados en teatro. Sin

89
crítica em movimento:
\La brecha entre la crítica y el circo

profundizarme mucho en este tema, podemos pensar una vez más que
a la crítica especializada no le importa lo que existe en las expresiones
circenses en el propio país, especialmente si son más «pobres». Como
siempre, se valora más lo que viene de fuera. Entonces seguimos con
nuestro nacionalismo.

Encontré una sola crítica más severa a uno de los espectáculos del Cirque
du Soleil, que fue precisamente de una persona de circo, Hugo Posso-
lo, artista, payaso y uno de los fundadores de la Companhia Parlapatões,
de São Paulo. Hugo incluyó no solo la crítica a la puesta en escena, sino
también al mismo hacer circense y su desvalorización en el país. Por eso,
creo que es importante traer fragmentos solo de esta crítica y no de las
de los otros cinco espectáculos de la compañía en Brasil, redundantes
en sus elogios al espectáculo, a los artistas y sus técnicas. Sí, todos ellos
son realmente excelentes, lo que no podría ser diferente al tratarse de la
compañía de circo más grande del mundo, que utiliza escenarios caros,
música siempre en vivo y alta tecnología de luces y efectos visuales. Bue-
no... traje a Hugo Possolo:

[El espectáculo del Cirque du Soleil] Saltimban-


qui tiene 15 años. Brasil recibe la última de las
giras internacionales. Quizás una crítica en este
punto no marque la diferencia, pero no puedo
pasar por alto el valor simbólico que genera, la
visibilidad que dignifica la actividad. El proble-
ma es saber si el circo brasileño lo disfrutará. La
fuerza de los números devora la dramaturgia. La
aventura de un niño que se convierte en el sal-
timbanqui del título no llega a cumplirse. Y el
espectáculo de variedades pasa a obedecer a la
fórmula más tradicional, lo que no es un deméri-
to. Trae los altibajos de números no integrados
entre sí. Coreografías colectivas de gestos al uní-
sono empobrecen números preciosos. Caso de
los payasitos pesados que nos roban la atención
mientras queremos ver al equilibrista en el alam-
bre. Siempre he salido alegre del circo. Esta vez,
salí un poco angustiado al ver el provincianismo

90
«La brecha entre la crítica y el circo»: ¡una historia llena de contratiempos!

de una élite que no conoce nuestros mayores


talentos, creatividad y valores. Dudé, pues creía
que pensarían que escribo por envidia. No debo
tener miedo a dar mi opinión. Si no la diera, mo-
riría como artista. Los que emprenden no tienen
miedo a parecer rencorosos. Los cobardes, que
renuncian a los sueños, son los que tienen ren-
cor a las quejas. Es doloroso saber que, quizás, lo
que instigará al público serán preguntas como:
¿por qué las palomitas de maíz cuestan R$ 12?
¿Por qué el estacionamiento cuesta R$ 20? Son
las dudas del mundo del consumo. La globaliza-
ción atropella incluso al circo. Y el arte que se las
arregle para concluir que la miseria colonizada
nos pertenece (POSSOLO, 2006).

Claro que, para los estándares socioeconómicos de Brasil, es caro asistir al


Cirque du Soleil, aunque se puede pagar la entrada en diez cuotas, como
lo haría el público más pobre si quisiera o pudiera asistir. A su vez, los más
pudientes van allí para ver el tan soñado espectáculo y «socializar»; al fin y
al cabo, es elegante ir al Cirque du Soleil.

Sin embargo, los mismos artistas del circo tienen poco acceso a estos y
a otros espectáculos que se presentan en las grandes capitales, porque
muchos de ellos están buscando su sustento para el día siguiente. Actual-
mente, muchos circos pequeños y medianos venden entradas por cinco o
incluso dos reales, cosiendo día y noche, una vez más, la carpa agujereada.
Compañías, grupos y troupes buscan contrataciones para seguir haciendo
circo, el arte que han elegido para la vida.

Pero la realidad es que está difícil, 2020 ha traído algo nuevo al mundo
del circo: la pandemia de COVID-19. Esto complicó aún más la situación del
circo: puso el mundo patas arriba, los circos cerraron durante más de seis
meses y entonces lo poco se convirtió en casi nada. Otro mundo comenzó
a existir, uno que todos llaman la «nueva normalidad». Todavía no sé decir
lo que es para mí, solo sé que estoy luchando, junto con los artistas circen-
ses, junto a mi equipo de la Escola Pernambucana de Circo, en la Cámara
Sectorial de Circo del estado de Pernambuco, tratando de resistir. Y lo esta-

91
crítica em movimento:
\La brecha entre la crítica y el circo

mos logrando. Cabe resaltar que, en este momento tan difícil, hay un gran
número de artistas circenses de todas las clases y categorías que se están
ayudando unos a otros. Es triste y al mismo tiempo hermoso. ¡Sigamos ade-
lante! Un poquito de aquí y otro poquito de allá, ¡seguimos juntos y juntas!
¡Oh, esta gente del circo es muy guerrera!

Desde muy pequeña, escucho que «el circo se está muriendo». Nunca es-
cuché que el teatro o la danza se estén muriendo, pero siempre escuché y vi
muchas cosas en este sentido. Después de observar debates, conferencias
y discusiones, y al estar hoy dentro de la historia, me doy cuenta de que
este «cuento» siempre ha sido una jugada para llevar al circo cada vez más
a la marginación.

Pero esta es otra historia y otro texto. Lo que realmente importa es que el
circo está muy vivo y atraviesa firme y fuerte otro período difícil en la histo-
ria mundial, luchando a pasos agigantados, pero siempre hermoso y mágico.

Es lógico que, en las actividades circenses, siempre hubo «brechas»


entre los diferentes segmentos: circo itinerante/tradicional, escuelas,
grupos, troupes, compañías, artistas independientes y callejeros. Pero
hoy, esto es más, digamos, tranquilo. Para nosotros, de la Escola Per-
nambucana de Circo, es muy bueno estar al lado de circos con los que
ya hemos desarrollado trabajos. Algunos están en marcha, como Dis-
ney (Alhandra/Paraíba), Alves (Caruaru/Pernambuco), Montagem Circus
(Santa Rita/Paraíba), Empyre Circus (Parnamirim/Rio Grande do Norte) y
sus respectivas propietarias: Francisca, Gardênia, Josiline y Madalena -
he aquí mujeres al mando de los circos itinerantes, ¡qué maravilla! Tam-
bién es muy bueno estar junto con Cia. 2 em Cena (Recife/Pernambuco),
Carcará (Cabo de Santo Agostinho/Pernambuco), Garrett Circus (Recife/
Pernambuco), Devir (Recife/Pernambuco) y Casulo (Recife/Pernambu-
co), entre otras compañías, grupos, espacios de formación y artistas in-
dependientes y callejeros.

Los circos están reabriendo poco a poco, siguiendo las medidas de seguri-
dad de los organismos de salud de cada lugar, cada capital, cada pequeño
pueblo, cada rincón. Grupos, troupes, compañías y artistas independientes
y callejeros también buscan sus caminos, incluido mucho uso de Internet:
graban espectáculos, ponen a disposición los ya grabados, crean cosas

92
«La brecha entre la crítica y el circo»: ¡una historia llena de contratiempos!

nuevas, tratan de reinventarse. Lo importante es que estamos haciendo


circo. Haciendo, encantando, emocionando, superándonos, excediéndo-
nos, presentándonos y «muestreándonos». Haciendo, aunque la crítica no
vea nada de esto. Pocos escribirán sobre todo lo que está sucediendo, so-
bre toda la grandeza artística del circo en este período.

Si bien las artes circenses —al igual que otras expresiones artísticas— no
necesitan la crítica para sobrevivir, sería bueno que alguien, algún crítico
realmente, pero muy sensato, muy coherente, muy afectuoso, muy atento,
muy cariñoso, fuera a ver un espectáculo de circo en este momento y es-
cribiera no solo con su mirada crítica, sino con su mirada humana. Esto sí
pasaría a la historia. Pero, hasta que esto suceda, sigamos adelante... Y, con
todo mi amor, ¡viva el circo brasileño!

.:. Este texto es responsabilidad exclusiva de sus autores y no refleja necesariamente la


opinión de Itaú Cultural.

Apéndice

1 João Francisco de Souza fue sociólogo y profesor titular en el Centro de


Educación de la Universidad Federal de Pernambuco (UFPE) y falleció en
2008. Impartió asignaturas centradas en la educación popular y fue coor-
dinador del Núcleo de Enseñanza, Investigación y Extensión en Educación
de Jóvenes y Adultos y miembro de la Academia Pernambucana de Letras.
Es autor de más de diez libros sobre educación popular y multiculturalismo.

2 Erminia Silva es licenciada en Servicio Social por la Pontificia Univer-
sidad Católica de Campinas (PUC/Campinas) y en Historia por la Univer-
sidad Estatal de Campinas (Unicamp), con una maestría en Historia y un
doctorado en Historia de la Cultura de la misma institución. Es la autora
de los libros Circo-teatro: Benjamim de Oliveira e a Teatralidade Circense no Brasil
(Altana, 2007) y Respeitável Público... O Circo em Cena (Funarte, 2009). De-
sarrolla actividades de formación e investigación en la Escola Nacional de
Circo (Funarte, Río de Janeiro), es cocoordinadora del grupo de estudio e

93
crítica em movimento:
\La brecha entre la crítica y el circo

investigación de las artes circenses Circus (FEF/Unicamp) y coordinadora,


junto con Daniel de Carvalho Lopes, del sitio web Circonteúdo, que cuenta
con una amplia base de datos sobre el arte circense en Brasil y es un refe-
rente para trabajos académicos en el campo de la historia de la cultura y
las artes escénicas.

3 Bauke Lievens es una dramaturga belga licenciada en Teatro en la Uni-


versidad de Gante (UGent) y en Filosofía del Arte Contemporáneo en la
Universitat Autònoma de Barcelona. Es profesora e investigadora en el de-
partamento de drama de la Royal Academy of Fine Arts (Kask) School of
Arts en Gante, Bélgica, donde actualmente trabaja en el proyecto de inves-
tigación artística The Circus Dialogues. Como dramaturga independiente,
colabora con varias compañías de circo, danza y teatro, como Un Loup pour
l’Homme y Floor Van Leeuwen (Schwalbe). Desde 2015, también realiza su
propio trabajo, creando Aneckxander (2015) y Raphaël (2017), junto a Alexan-
der Vantournhout. Es autora de dos libros sobre investigación artística en
circo y forma parte del consejo editorial de la revista Rekto:Verso.

4 Rodrigo Matheus es trapecista, director y dramaturgo circense, además


de profesor de técnicas circenses. Es el fundador y director del Circo Míni-
mo, así como uno de los fundadores del Centro de Formação Profissional
em Artes Circenses (CEFAC) y de la Central do Circo.

5 José Carlos de Andrade es licenciado en Periodismo por la Pontificia Uni-


versidad Católica de Minas Gerais (PUC/Minas), graduado en Historia por la
Universidad Federal de Minas Gerais (UFMG) y especialista en Literatura y
Crítica Literaria por la Pontificia Universidad Católica de São Paulo (PUC/
SP). Tiene una maestría en Artes Escénicas de la Universidad Estatal Pau-
lista (UNESP), con una disertación denominada Décio de Almeida Prado e a
Historiografia Teatral Brasileira.

6 Márcio Bastos es periodista cultural. Trabajó en el periódico Folha de Per-


nambuco y actualmente escribe sobre arte y cultura para el periódico Jornal
do Commercio de Pernambuco.

7 Jorge Bandeira es crítico, dramaturgo, director, naturista y profesor de


la Universidad Federal de Amazonas (UFAM).

94
«La brecha entre la crítica y el circo»: ¡una historia llena de contratiempos!

8 Paulo Vieira es licenciado en Educación Artística por la Universidad Fe-


deral de Paraíba (UFPB), tiene una maestría en Artes y Área de Concentra-
ción en Teatro por la Universidad de São Paulo (USP) y un doctorado en Ar-
tes por la misma institución. Actúa como profesor asociado y coordinador
del máster profesional en artes de la UFPB.

9 Márcio Braz es graduado en comunicación social con una licenciatura


en Periodismo de la Universidad Católica de Brasilia (UCB) y en Pedagogía
del Instituto de Educação Superior Ascensão (Iesa/Distrito Federal), y en
Sociología de la Faculdade Alfamérica (Alfa/São Paulo). Es especialista en
Orientación Educativa por Prodeesp/DF y en Educación con énfasis en Di-
versidad y Ciudadanía en la educación de jóvenes y adultos por la Universi-
dad de Brasilia (UnB).

10 Hugo Possolo estudió Comunicación Social en la Facultad Cásper Líbero


e Historia en la Universidad de São Paulo (USP), mientras aprendía técnicas
circenses en el Circo Escola Picadeiro. En 1991, fundó el grupo Parlapatões
de São Paulo, en el que también actúa. Hoy es el Secretario de Cultura de la
ciudad de São Paulo.

Referencias

BORTOLETO, M. A. C. (Org.). Introdução à pedagogia das atividades circenses. Jun-


diaí: Fontoura, 2008.

CAMAROTTI, Marco. O palco no picadeiro: na trilha do circo-teatro. Recife: Fun-


dação de Cultura da Cidade do Recife, 2004.

CONSTÂNCIO, Rudimar. Circo social: a experiência da Escola Pernambucana de


Circo. Monografía de especialización en enseñanza de arte por la Universi-
dad Federal de Pernambuco, Recife, 2010.

COSTA, Eliene Benício Amâncio. Saltimbancos urbanos: a influência do circo na re-


novação do teatro brasileiro nas décadas de 80 e 90. Tesis doctoral en Artes por la
Universidad de São Paulo, São Paulo, 1999.

95
crítica em movimento:
\La brecha entre la crítica y el circo

DUPRAT, R. M; BORTOLETO, M. A. C. Educação física escolar: pedagogia e di-


dática das atividades circenses. Revista Brasileira de Ciências do Esporte, v. 29, n. 2.
São Paulo: Autores Associados, 2007.

FERREIRA, Claudia Márcia (Coord.). Circo – tradição e arte. Río de Janeiro: Museu
de Folclore Edison Carneiro, Funarte/Instituto Nacional do Folclore, 1987.

GALLO, Fabio Dal. Circo, educação e a cena contemporânea. GT2 – Pluralida-


des Culturais Materiais e Imateriais, III Seminário Internacional Interlinkplus, Uni-
versidade do Estado da Bahia (Uneb), Salvador, 2008.

LEITE, Rodrigo Morais. Décio de Almeida Prado, o circo e outros gêneros “me-
nores”. Rebento: Revista de Artes do Espetáculo, n. 3, São Paulo, 2012.

MALARD, Letícia. Hoje tem espetáculo: Avelino Fóscolo e seu romance. Belo Horizon-
te: Editora UFMG, 1987.

______________. O circo social e a universalidade da linguagem circense. GT2


– Pluralidades Culturais Materiais e Imateriais, III Seminário Internacional Inter-
linkplus, Universidade do Estado da Bahia (Uneb), Salvador, 2008.

POSSOLO, Hugo. Globalização atropela o circo. Folha de S.Paulo, 4 ago. 2006.

SILVA, Erminia. O circo: sua arte e seus saberes. O circo no Brasil do final do
século XIX a meados do século XX. Tesis de maestría en Historia por la Univer-
sidad Estatal de Campinas (Unicamp), Campinas, 1996.

____________. Saberes circenses: ensino/aprendizagem em movimentos e


transformações. En: BORTOLETO, M. A. C. (Org.). Introdução à pedagogia das ati-
vidades circenses. Jundiaí: Fontoura, 2008.

SILVEIRA, Cléia. Circo: educando com arte. Río de Janeiro: Fase, 2001.

____________. Revista Circo do Mundo Brasil: propuesta metodológica en red. Río de


Janeiro: Fase, 2003.

96
«La brecha entre la crítica y el circo»: ¡una historia llena de contratiempos!

97
crítica em movimento:
\La brecha entre la crítica y el circo

Respetable público: que hablen


bien o mal, lo importante
Daniel de Carvalho Lopes¹
es que hablen de mí Erminia Silva²

1. Doctor en Comenzaremos este texto con la expectativa de que sea un encuentro


Educación por
agradable con todas, todos y todes, pues, en las distancias impuestas en
la Facultad de
Educación de la los tiempos difíciles e insalubres de este año 2020, no hay nada más recon-
Universidad de São fortante que la posibilidad estar junto a alguien. Además, es en los encuen-
Paulo (FE/USP),
tros donde el lenguaje circense se hace y rehace a diario, en cada calle, pla-
Magíster en Artes
por la Universidad za, teatro o pista. Por lo tanto, que este texto sea un encuentro agradable
Estadual Paulista para ir a algunos espectáculos circenses.
(Unesp) y graduado
en educación física
por la Universidad ¿Y qué espectáculos serían estos? Serían los que, al ser investigadores de las
Estadual de historias del circo, son múltiples y se procesan de muchísimas formas distintas
Campinas (Unicamp).
Es miembro del
a lo largo de la historia y, obviamente, hasta la actualidad. Son los que están en
grupo de estudio constante cambio, cargando elementos de otras épocas y hechos, generando
e investigación de permanentemente nuevas búsquedas estéticas. Y, si así lo son y están, es por-
artes circenses
Circus (FEF/Unicamp) que estos espectáculos conversan y se mezclan todos los días con todo lo que
y del Grupo de los rodea: personas, tecnologías, culturas, políticas, estéticas, sociedades, etc.
Estudos e Pesquisas
em Gesto, Expressão
e Educação (Gepgee, ¿Y qué dicen de ellos? Bueno, dicen varias cosas ¡y desde hace mucho tiem-
FE/USP) [Grupo po! Si miramos al Brasil del siglo XIX, notaremos que los periódicos de la
de Estudios e
época hablaban constantemente de ellos.³ ¡Hablaban bien o mal, pero ha-
Investigaciones en
Gesto, Expresión blaban en abundancia! Y aquí hay otra pregunta: ¿por qué?
y Educación].
Cocoordinador
del sitio web
Durante este período, el circo fue una de las formas de entretenimiento
Circonteúdo, más frecuentes y atractivas para la sociedad, reuniendo a los más variados
es educador de grupos sociales. A lo largo de los años 1800, cientos de compañías viajaron
circo social en
la Instituição de
por todo el país, procedentes de giras por otros continentes. Entre muchas
Incentivo à Criança de ellas, podemos mencionar: Circo Olímpico Francés de la familia Fouraux,
e ao Adolescente
Circo Chiarini, Circo Temperani, Circo Spinelli y Circo Casali; la Compañía
de Mogi Mirim
(ICA) [Institución Ecuestre Italiana de Luigi Guillaume, la Companhia de Cavalinhos Guilherme
de Incentivo a Southby y también el Circo Olímpico de Rua da Guarda Velha, construido en
la Infancia y la
mampostería en el centro de Río de Janeiro, donde estuvo más de 50 años,
Adolescencia].
con presentaciones de artistas de su propio grupo y de otras compañías.

98
Estos diversos circos, cada uno con su propia forma de producir y organizar 2. Doctora y Magíster
en Historia Social de
sus espectáculos, se relacionaban intensamente con la vida social y urbana
la Cultura por la Uni-
de la época y, en consecuencia, recibían «inundaciones» de público, térmi- versidad Estadual de
no común en los periódicos para referirse al éxito que algunas compañías Campinas (Unicamp),
cocoordinadora del
lograban en ese momento. Por sus atracciones y su magnitud (muchos cir-
grupo de estudio
cos tenían decenas de animales, artistas e incluso sus propios barcos para e investigación de
el transporte de la compañía, como el Circo Grande Oceano), así como por las artes circenses
(FEF/Unicamp) y del
movilizar el imaginario de hombres, mujeres y niños de miles de maneras,
Grupo de Estudos e
también fueron objeto de «inundaciones» de crónicas, críticas, notas, sá- Pesquisas em Gesto,
tiras y caricaturas de prácticamente todas las producciones bibliográficas Expressão e Educa-
ção (Gepgee, FE/USP)
de la época, principalmente las periodísticas. [Grupo de Estudios
e Investigaciones en
Para que quede más claro, presentaremos algunas de ellas aquí. El Circo Chia- Gesto, Expresión y
Educación]. Es autora
rini, dirigido por el artista ecuestre Giuseppe Chiarini, estuvo en Brasil en dos de Circo-teatro: Ben-
periodos, de 1869 a 1872 y de 1875 a 1877, y era una gran compañía circen- jamim de Oliveira e a
teatralidade circense
se que presentaba números ecuestres y acrobáticos, con animales salvajes
no Brasil (Altana/
y pantomimas. En una ocasión, en Río de Janeiro, su estrecha relación con la Funarte, 2007) y co-
sociedad fluminense resultó en varias publicaciones en periódicos y revistas: ordinadora del sitio
web Circonteúdo.

A Maestro Chiarini le va a las mil maravillas. La


variedad de espectáculos y el mérito de la com-
3. Vea: Silva (2007 y
pañía atraen a un gran público al circo de Guarda 2009); Lopes (2015) y
Velha (A Vida Fluminense,⁴ 23 de abr. 1870, p. 132); Lopes y Silva (2015).

Ayer la compañía Chiarini tuvo dos inundacio-


4. Los titulares de los
nes. Los artistas trabajaron perfectamente. El periódicos citados en
público dio demostraciones visibles de aprecio el texto, en portu-
gués, están registra-
por los méritos de acróbatas y gimnastas. Allí dos con la ortografía
estuvieron integrantes de la mejor sociedad de la época.
fluminense (Jornal da Noite, 11 sep. 1871, p. 3);

El Sr. Chiarini no deja de acaparar a los espectado-


res, por lo que los empresarios de Phenix y Ginásio
están muy descontentos. Son leyes de las compen-
saciones humanas. Phenix y Ginásio han tenido su
época de reinado de moda, y pronto lo volverán a
tener, tenemos fe en esto y así confortamos a am-
bas empresas (D. Pedro V, 12 nov. 1871, p. 4).

99
crítica em movimento:
\La brecha entre la crítica y el circo

5. Para más Como podemos observar en estas citas, Chiarini conquistó al variado públi-
información, co de la corte, teniendo en cuenta la presencia de integrantes de la «mejor
vea: Cafezeiro y
Gadelha (1996, con sociedad fluminense» en los espectáculos. Esta no era una característica
la transcripción exclusiva de esta compañía, ya que varias otras compañías circenses con-
de la solicitud de
taban con la presencia frecuente de Sus Majestades Imperiales. Incluso el
João Caetano dos
Santos); Souza circo que acogió a Chiarini durante ese período, el Circo Olímpico de Rua da
(2002) y Silva Guarda Velha, fue muy frecuentado por don Pedro II. El emperador cedió
(2007).
el terreno donde se construyó el que después se denominaría Teatro Im-
perial D. Pedro II, pero de este espacio nos ocuparemos más adelante. Es
importante ahora, entre las críticas presentadas sobre los espectáculos del
Circo Chiarini, resaltar la que informa que los empresarios de Phenix y de
Ginásio, dos importantes teatros de Río de Janeiro, estaban descontentos
debido a que Chiarini «había acaparado a los espectadores».

Los circos ofrecían una fuerte competencia a los espectáculos teatra-


les de la época y las rivalidades eran explícitas. Por ello, João Caetano
dos Santos, actor, ensayador y empresario, figura destacada del «teatro
de carácter nacional», se adhirió a la idea de que el circo era un mero
entretenimiento, sin carácter educativo, que alejaba al público de los
espectáculos teatrales y, en 1862, solicitó al Marqués de Olinda que no
se permitiera a las compañías de circo y de espectáculos con animales
trabajar en los días de «teatro nacional»; y que, si lo hicieran, estarían
obligadas a pagar un impuesto. Su propósito con esta enérgica acción
era regenerar y preservar el «teatro nacional», que en ese momento se
consideraba en decadencia.⁵

João Caetano no estaba solo en sus posturas críticas y contrarias a los cir-
cos. A finales del siglo XIX, el dramaturgo, poeta, escritor, crítico y perio-
dista Arthur Azevedo se puso molesto por el debut de la gran compañía de
circo Frank Brown en el Theatro São Pedro de Alcântara, que, según anun-
ciaba la publicidad del espectáculo, transformó el teatro en circo (O Paiz, 23
abr. 1894, p. 4).

Azevedo, en su columna titulada Palestra, profesó sus ácidas críticas a


la compañía:

La ciudad se reanima. Poco a poco se desvanece


el siniestro recuerdo de los bombardeos y tiroteos

100
Respetable público: que hablen bien o mal, lo importante es que hablen de mí

que hace tan solo dos meses nos sobresaltaban.


Espero que la compañía ecuestre de S. Pedro de
Alcântara consuele definitivamente al pueblo, al
que le encantan las bolitas y que aprecia más a
Rosita de La Plata [artista ecuestre de circo] que
a la propia Sarah Bernhardt [actriz francesa].
Sin embargo, para los espíritus más refinados
hay Mancinelli, con una compañía lírica de pri-
mer orden (O Paiz, 28 abr. 1894, pág. 1).

La forma de referirse a los espectáculos circenses con el término «bolitas»


era común en la época y hacía referencia a la manipulación de bolas, es
decir, al juego de malabares. Arthur Azevedo utilizaba esta expresión para
transmitir una idea descalificadora tanto del circo como del gusto del pú-
blico, al que acusaba de preferir estos entretenimientos en detrimento de
lo que consideraba un «teatro serio». Así, el autor evidencia cuánto los es-
pectáculos circenses cautivaban y disputaban al mismo público que asistía
a los teatros.

Sus críticas no se detuvieron ahí. En sus escritos, siempre volvía a las ten-
siones que mantenía con las compañías de circo que «invadían» los «tem-
plos del teatro nacional»:

[...] se anuncia que, una vez más, y seguramen-


te no será la última, el glorioso y venerado tea-
tro S. Pedro de Alcântara se convertirá en un
circo de caballitos.
Cuando teníamos las más poderosas razones
para suponer que definitivamente habíamos
entrado en una época de transformación mo-
ral, era suficiente, para convencernos de lo
contrario, la feroz inconsciencia con la que se
insulta así al teatro digno, por la tradición, de
considerarse un monumento histórico, íntima-
mente ligado a la fundación de nuestra nacio-
nalidad. No me refiero a su pasado artístico,
porque en Río de Janeiro el arte parece ser una
recomendación negativa.

101
crítica em movimento:
\La brecha entre la crítica y el circo

6. La negrita Por eso, bienvenida «Caravana», esta nueva


es nuestra. asociación fundada por Coelho Netto, que en
realidad viene a enseñar a nuestra gente a res-
petar la sagrada herencia de nuestros abuelos
y hacerla avergonzarse de mostrarle a D. Carlos
I perros, caballos y monos, en lugar de artistas,
en el teatro construido por D. João VI.
Cabe señalar que, para hacer la fortuna de una
compañía ecuestre, un teatro no vale un cir-
co.⁶ La prueba está en el popular Spinelli, que
ya ha presentado más de doscientos espectá-
culos consecutivos, pero su circo sigue llenán-
dose todas las noches y es la alegría de nuestro
barrio más poblado. Que vaya Spinelli a S. Pe-
dro y verá como todo le sale mal (O Paiz, 12 ago.
1907, p. 3).

Sin embargo, las fuertes posturas de Arthur Azevedo y João Caetano no


lograron un éxito efectivo y, como podemos ver en una crítica del año 1872
dirigida al Circo dos Irmãos Pereira, persistía la competencia entre las pro-
ducciones teatrales y circenses:

Compañía gimnástica. Si las compañías dra-


máticas y líricas que han visitado recientemen-
te nuestra ciudad se han ido sin extrañarnos, e
incluso con una opinión muy desfavorable so-
bre nosotros, lo mismo, seguramente, no pue-
den decir las compañías ecuestres y gimnásti-
cas, que han hecho las delicias de nuestro beau
monde [hermoso mundo].
De todas ellas, la que más echamos de menos
es seguramente la de Chiarini.
El público, en este punto, ha mostrado su senti-
do común, porque a los amantes de la magia les
parece justo proteger a los caballitos. Chiarini
tuvo la gloria de ver cada noche en sus reunio-
nes a la más bella sociedad de Río de Janeiro
y, lo que es extraordinario, durante tres meses

102
Respetable público: que hablen bien o mal, lo importante es que hablen de mí

consecutivos. Entendiendo el gusto y la civili-


zación de los ciudadanos fluminenses por este
tipo de entretenimiento, y al ser testigos de
las ovaciones a la compañía Chiarini, de la que
formaban parte en ese entonces, los hermanos
Pereira decidieron organizar una compañía con
una parte de figuras y animales de la compa-
ñía italiana e inauguraron anteayer sus espec-
táculos en el circo de la Rua do Espírito Santo.
La compañía tiene hoy una plantilla mucho me-
nor y también es cierto que hay artistas de mé-
rito entre ellos.
Diremos poco sobre la ejecución de los traba-
jos realizados por los diversos artistas, incluso
porque el público ya ha tenido la oportunidad
de apreciarlos. Sin embargo, sería una grave
injusticia de nuestra parte si nos olvidáramos
de mencionar particularmente el nombre de
Mlle. Pereira.
La última vez que trabajó en el trapecio, ella
había demostrado una gran belleza y movi-
mientos seguros; anteayer, sin embargo, reco-
nocemos que se ha esforzado mucho después
de su última estancia en esta ciudad.
Trabajando sola ahora, en el trapecio, mostró
incluso más confianza que cuando trabajaba
en pareja; además de mucha elegancia en to-
das sus posiciones, ejecuta movimientos muy
arriesgados, prolongando la situación hasta el
punto de provocar vértigos en la audiencia, que
muchas veces le pidió que los interrumpiera.
Sin embargo, la sonrisa en sus labios y sus
continuos agradecimientos con las manos,
que en la mayor parte del tiempo estaban li-
bres, evidencian la gran confianza que tiene
en sí misma y animaban a los espectadores,
quienes temían todo el tiempo verla caerse de
aquella altura.

103
crítica em movimento:
\La brecha entre la crítica y el circo

Mlle. Pereira es de hecho una princesa del aire;


en este sentido la prensa no nos ha engañado.
El resto de los artistas podrán, en otras noches,
obsequiarnos con nuevos trabajos; los que eje-
cutaron el sábado por la noche no presentaron
movimiento ni atracción.
El espacio destinado a la arena nos parece más
pequeño que en la época de Chiarini y no pen-
samos que la menor cantidad de artistas sea la
razón de esto; en cambio, está mejor iluminado.
Como al público le gusta este tipo de entrete-
nimiento, y los Srs. Pereira buscan, con algu-
nos trabajos difíciles, satisfacer su curiosidad,
es muy de esperar que la decisión de la com-
pañía de visitarnos sea coronada por un exce-
lente éxito.
Por nuestra parte, es lo que le deseamos (Co-
rreio do Brazil, 2 dic. 1872, p. 1).

A través de la crítica presentada, además de la evidente competencia entre


las compañías teatrales y circenses, cabe mencionar otro tema frecuen-
te en las diversas publicaciones sobre los circos de la época. Los artistas
de circo (ya sean personas o animales) y sus números siempre se han des-
tacado mucho en las publicaciones periódicas ochocentistas. No faltaron
escritos dedicados, en especial, a la representación de la mujer circense,
ensalzando su valentía, belleza y delicadeza en números ecuestres, de tra-
pecio, malabares o acrobáticos. En cuanto a los artistas y las atracciones,
nuevamente, una crítica al Circo Chiarini es bastante ilustrativa:

El sábado por la noche debutó en el magnífico


circo del Sr. Batholomeu, en la Rua da Guarda
Velha, la compañía ecuestre del Sr. Chiarini.
Rara vez se ha satisfecho la expectativa del pú-
blico de manera más completa y brillante.
La concurrencia fue enorme: el circo, con ca-
pacidad para miles de espectadores, estaba
literalmente lleno. El público estaba más se-
leccionado de lo que suele ser el que asiste a

104
Respetable público: que hablen bien o mal, lo importante es que hablen de mí

estos espectáculos.
Hay que confesar que el Sr. Chiarini llena las
cien bocas de la fama y no las obliga a mentir.
Los trabajos que presenta son perfectos.
El programa de los primeros espectáculos que
podemos mencionar ha sido hábilmente orga-
nizado, puntualmente completado y admira-
blemente ejecutado.
Los caballos de la compañía son magníficos y
algunos, como Ab-del-Kader y Othelo, tienen
una rara belleza en su forma y pelaje.
Causa más que admiración, sorprende mucho
la enseñanza de estos animales.
Se ve que el Sr. Chiarini aprendió de los mejores
maestros y conoce a la perfección todos los re-
cursos y secretos del arte que profesa.
Solo con sus caballos puede ofrecer a los ver-
daderos aficionados al hipismo los más intere-
santes espectáculos ecuestres.
A un gesto, a un monosílabo, dicho en voz baja,
Othelo o Turco, caballito andaluz de formas
gráciles y elegantes, obedecen al amo como
seres sumamente inteligentes.
Los ejercicios de Ab-del-Kader montado a la
amazona por la elegante y hábil escudera Ca-
tharina Holloway son en sí mismos algo que
ver y admirar.
Sin ningún esfuerzo, con mucha delicadeza, ce-
diendo a un simple movimiento de riendas, el
inteligente animal realiza todos los pasos po-
sibles para los de su especie, incluido el marcar
con las manos al caminar el compás de una pol-
ca y luego el de un vals.
Entre los artistas de la compañía que han de-
butado, mencionaremos como sumamente no-
tables a Theodoro Cuba, el morenito que hace
diabluras sobre tres caballos en pelo y final-
mente sobre cuatro, con botas de montar; el

105
crítica em movimento:
\La brecha entre la crítica y el circo

joven Elie que, sobre la cuerda floja, después


de los más audaces equilibrios con y sin barra,
acaba haciendo tres saltos mortales de espal-
das, siempre apoyándose en un pie en la cuer-
da; W. Carlo, que después de hacer los más deli-
cados y difíciles equilibrios sobre una o muchas
botellas, coloca la boca de una botella sobre la
boca de otra, apoya su cabeza en el fondo de
esta y, sin otro punto de apoyo, gira en todas
direcciones y dispara dos tiros de pistola; G.
Ross, quien junto al mismo Carlo hace ejercicios
gimnásticos de mayor perfección y destreza;
finalmente, Belém Cuba, la morenita, quien, so-
bre un caballo en pelo y sin riendas, realiza con
audacia y desenvoltura la denominada carrera,
gran acto principal.
Por último, decimos que el ejercicio de los cua-
tro jinetes y las cuatro damas dirigidos por el
Sr. Chiarini, con el que abrió el espectáculo,
tiene el efecto más brillante: la precisión y ele-
gancia de los movimientos, la rapidez de las
maniobras y la riqueza de las prendas de vestir
aportan a esta escena algo de fantástico.
En esta ocasión, el Sr. Chiarini monta un admi-
rable animal llamado Monte-Christo. Los es-
pectáculos de la compañía Chiarini divierten,
interesan y no corrompen.
El padre, el hijo, el marido que se respeta a sí
mismo y a su familia puede ir con ella, sin mie-
do a verla sonrojarse o a tener que explicar
gestos cínicos o palabras dudosas (A Reforma, 9
nov. 1869, p. 3).

Chiarini realizó sus espectáculos en el circo estable de la Rua da Guarda


Velha, propiedad del artista y empresario Bartholomeu Corrêa da Silva.
Este importante edificio, posteriormente denominado Teatro Imperial D.
Pedro II, como mencionamos, y Theatro Lyrico, se mantuvo en plena acti-
vidad en la capital del imperio desde principios de 1860 hasta principios

106
Respetable público: que hablen bien o mal, lo importante es que hablen de mí

de 1934, cuando fue demolido. No solo por ser un circo que tuvo una larga
vida en la ciudad, sino principalmente por los constantes espectáculos que
promovía y acogía y la intensa actuación de Bartholomeu Corrêa da Silva
como empresario, el Circo Olímpico de la Rua da Guarda Velha y su compa-
ñía aparecieron con frecuencia en los periódicos fluminenses:

Compañía ecuestre:
Dos cosas nos sorprendieron cuando entramos en el
circo de la Guarda Velha; la primera fue el soberbio
interior, aún incompleto, del edificio, que contrasta
con la insignificancia del exterior; la segunda fue,
como es natural, la perfección de los trabajos de la
compañía Chiarini.
Estaba reservado para una celebridad ecuestre ex-
tranjera que viniera a revelarnos la existencia de un
magnífico teatro entre nosotros, que la inteligente
perseverancia de un hombre trabajador va erigien-
do, a costa no se sabe de qué esfuerzos, y a la som-
bra de una excesiva modestia ―criminal modestia―,
queremos decir, porque la numerosa y brillante so-
ciedad que ahora frecuenta el circo del Sr. Bartho-
lomeu Corrêa da Silva, lo habría animado y ayudado
desde hace tiempo en su monumental empresa.
El público fluminense debe agradecer al Sr. Bartho-
lomeu Corrêa por la construcción del circo y al Sr.
Chiarini por su descubrimiento: el Sr. Chiarini fue el
Colón del Circo Bartholomeu.
Hablamos de la perfección de los trabajos de la
compañía ecuestre italiana.
No especializaremos. El público ha aplaudido prin-
cipalmente al Sr. Chiarini y la Sra. Laura Ruiz, caba-
lleros de alta escuela; y todos son unánimes al decir
que el Sr. Chiarini tiene excelentes caballos, caba-
llos tipo (Semana Illustrada, 21 nov. 1869, p. 3.735).

Durante varias décadas, el Circo Olímpico de la Rua da Guarda Velha pre-


sentó espectáculos organizados por la propia compañía de artistas de Bar-
tholomeu, además de acoger espectáculos de varios otros circos, grupos

107
crítica em movimento:
\La brecha entre la crítica y el circo

7. Sobre algunas circenses,⁷ celebraciones y varias atracciones, siendo permanente la incor-


de las diversas poración de artistas:
presentaciones
realizadas por
Bartholomeu y otros Penna y Bastos son realmente dos artistas fa-
circos en el espacio
mosos. Las acrobacias y la alta gimnasia que
del Circo Olímpico
de la Rua da Guarda realizan les proporcionan merecidos triunfos. El
Velha, vea: Souza Sr. Bartholomeu engrandeció mucho su compa-
(2002); Silva (2007);
ñía al adquirir a esos acróbatas que promueven
Lopes (2015); Lopes
y Silva (2015) y enormes inundaciones en el Circo Olímpico, un
Vieira (2015). espléndido edificio que honra mucho a la capital
del imperio, y que logró erigir a costa de sacrifi-
cios (Diario do Rio de Janeiro, 1 ene. 1871, p. 3).
8. Correio Mercantil,
14 mar. 1856.
En esos espectáculos, como podemos ver en la cita anterior, siempre han
estado presentes los más variados números gimnásticos y acrobáticos.
Bartholomeu, tanto por sus presentaciones como acróbata como por las
de su compañía, recibió críticas positivas al principio de su carrera, en una
columna publicada en Correio Mercantil y firmada por «O saltimbanco Inde-
pendente» [El saltimbanqui independiente].8 Sin embargo, la motivación
de la columna fue la publicación de una nota en la edición del 9 de mar-
zo de 1856 en el periódico firmada por «Um brasileiro nato» [Un brasileño
de nacimiento], quien se indignaba por el hecho de que las autoridades
habían permitido el «escándalo» de que una «compañía de saltimbanquis
ridículos» presentara, en un «carpa tosca y ordinaria», una obra titulada D.
Pedro no Cerco do Porto, cuyo personaje es «el fundador de este Imperio, el
Sr. D. Pedro I». A través de esta desaprobación, el autor de la columna, en
defensa de Bartholomeu, resaltó su carácter y la calidad de su actuación
circense, diciendo que «más por amor a la gimnasia y al arte que abrazó, la
ha ejercido con honores», aunque puede «vivir independientemente de la
profesión que ejerce».

Pero, como mencionamos, los periódicos brasileños del siglo XIX abordaron
el circo por medio de diferentes producciones bibliográficas: crónicas, sá-
tiras, boletines, anuncios publicitarios, notas de agradecimiento y solicitu-
des del público, entre otras.

Un ejemplo interesante de estas formas textuales se refiere al payaso Sr.


Ronland, «quien, por sí solo, es capaz de entretener al público toda la no-

108
Respetable público: que hablen bien o mal, lo importante es que hablen de mí

che»,⁹ y que: «En el género payaso, es indudable que nunca ha venido a Bra- 9. Dezeseis de Julho,
28 mar. 1870, p. 2
sil uno que, a la ligereza de los saltos, la originalidad de las posiciones y la
profusión de jocosidades, reúna, como el Sr. Ronland, la elasticidad muscu-
lar y esa habilidad natural tan necesaria para el verdadero CLOWN».¹⁰ So- 10. A Vida Fluminense,
bre este artista, se publicó el siguiente diálogo en una especie de columna 2 abr. 1870, p. 105.

humorística de notas y noticias:


11. Spleen, na língua
- ¿Qué tienes? ¡estás tan taciturno! inglesa, corres-
ponde ao órgão
- ¡No puedo explicarte cómo me siento! Estoy humano denomina-
siempre triste, misántropo... ¡parece que estoy do baço. A cone-
xão entre o baço
mal del spleen!¹¹
e a melancolia é
- Te recomiendo un remedio; pruébalo y estoy oriunda da medici-
seguro de que obtendrás un buen resultado. na grega e da teoria
dos humores.
- Hazme este favor y te estaré muy agradecido.
- Toma tres veces por semana las pastillas de Ronland.
- ¿Y dónde encontraré este remedio?
- En el Circo Chiarini (Dezeseis de Julho, 24 abr.
1870, p. 2).

Otro ejemplo de publicación ambientada en el tema del circo y que refleja


la asimilación por parte de la sociedad de su lenguaje e imaginario es la
siguiente sátira política:

En el Circo Chiarini, la autoridad arresta a un


revendedor por monopolizar las entradas.
El Sr. Duque, diputado, viene con un catalejo
cargado y la cara enrojecida, y le dice a la au-
toridad:
- Su acto es ilegal... no hay razón para tal arbi-
trariedad... este hombre es inocente... se gana
la vida... hace sus negocios legalmente. ¡Arrés-
tenlo si quieren, pero yo lo defenderé aún a
costa de mi sangre!
- ¿Qué haces, Duque? ¿Por qué semejante opo-
sición al orden de la autoridad?
- (A un lado) Cállate, tonto: las elecciones es-
tán en la puerta, y necesito a gente (O Figaro, 15
ene. 1876, p. 19).

109
crítica em movimento:
\La brecha entre la crítica y el circo

Finalmente, también en cuanto a los artistas y atracciones del Circo Chiari-


ni y las varias publicaciones periódicas referentes a los circos, también des-
taca la ecuestre Catalina Holloway. Además de las constantes menciones a
ella en diversos anuncios del circo y en textos de diferentes géneros publi-
cados en periódicos durante su estancia en Brasil, la artista «protagonizó»
una situación curiosa debido a que su apellido coincide con el nombre de
una especie de medicina de la época:

Sobre el circo de caballitos:


El Sr. Chiarini me pide que declare que la «peti-
te Catalina Holloway», de la que tanto se habla
en sus anuncios, no es la inventora de las pas-
tillas de mismo nombre, que están disponibles
para la venta por ahí y que se dice que son ex-
celentes para todas las enfermedades padeci-
das y por padecer.
Después de hacer la declaración, solo podemos
esperar con paciencia las próximas primeras
pruebas públicas de la compañía ecuestre ita-
liana... libre de pastillas (A Vida Fluminense, 16
oct. 1869, p. 1.016).

No es de extrañar la mirada atenta de la prensa a los espectáculos circen-


ses, ya que incluso se hicieron presentaciones en globos aerostáticos en
circos de la capital del imperio y de las ciudades de la región noreste. Para
ilustrar un poco más en detalle en qué consistían estos números de ascen-
sión aerostática, tenemos una nota del Correio Mercantil sobre la ascensión
del artista Julio Buislay, que tuvo lugar en Recife:

Ayer nuestra población fue testigo de un espec-


táculo completamente nuevo para ella. Quie-
ro hablar de la ascensión del artista acrobático
Julio Buislay, que, como había anunciado, subió
a las regiones etéreas cargado por su Montgol-
fier. Una inmensa multitud, reunida en el Cam-
po das Princesas, recibió al intrépido aeronau-
ta con gritos, prolongados vítores y repetidos
aplausos. Eran aproximadamente las seis de la
tarde cuando el globo, en el que se encontra-

110
Respetable público: que hablen bien o mal, lo importante es que hablen de mí

ba el artista, se elevó suavemente buscando el 12. Aunque no en-


contramos informa-
lado sur impulsado por el viento, que abundaba
ción sobre el autor
en el norte. del texto, Romão
(2016) informa que el
autor es João Pedro
Al no estar completamente lleno, el globo luego
de Aquino, director
comenzó a descender, haciendo que el valiente del Colégio Aquino,
viajero aterrizara en las cercanías de Colhos. de manera que lue-
go, en el artículo, se
Durante el recorrido, el insigne artista ejecutó menciona a sí mismo
varios movimientos en su trapecio, ofreciendo en tercera persona.
a los ojos de la admirada población un espec-
táculo, al que había sido invitada aproximada-
mente un año antes por Elias Bernardi, quien
13. O Globo, 18 jul.
aquí siempre ha fracasado en sus intentos. La 1876, pg. 3.
gente se movió hacia el lugar al que se dirigía
el globo y de allí trajo al Sr. Julio Buislay en me-
dio de constantes aplausos y ovaciones (Correio
Mercantil, 2 nov. 1862, p. 1).

Sin embargo, es importante hincar los pies en el suelo y recordar que los
circos, sus espectáculos y los propios artistas no siempre han recibido elo-
gios ni han sido objeto de divertidas sátiras o bromas editoriales, como
mencionamos al hablar de las posturas de João Caetano y Arthur Azevedo.
En la época, las prácticas y los saberes circenses fueron vistos de forma crí-
tica por los defensores de las prácticas de la gimnasia guiadas por un sesgo
higienista, educativo y respaldado por el discurso de la ciencia, disputando
saberes y poderes sobre los cuerpos.

Como ejemplo, hay un artículo de 1876 denominado Um Dia de Alegria [Un


Día de Alegría], en que el autor, del cual no se conoce la identidad,¹² ini-
cialmente critica a las autoridades públicas, que no comprenden «la nece-
sidad imprescindible de desarrollar el estudio de la gimnasia en todos los
establecimientos educativos, como se hace en el norte de Europa, especial-
mente en Suecia y Alemania».¹³ Luego, destaca positivamente las acciones
individuales de Abílio César Borges, director del Colégio Abílio, y João Pedro
de Aquino, director del Colégio Aquino, debido a que tomaron la audaz ini-
ciativa «en las reformas necesarias para la regeneración de la educación» y
entendieron que «la mayor y más urgente de todas las medidas era prepa-
rar a los niños para ser hombres, en el verdadero sentido de la palabra, en
los países con más energía, vigor y fuerza de voluntad». También enfatiza:

111
crítica em movimento:
\La brecha entre la crítica y el circo

Todavía hay mucha gente entre nosotros que


no comprende el alcance y la importancia del
estudio de la gimnasia y de todos los ejercicios
físicos, y este lamentable prejuicio es compar-
tido incluso por ciertos estratos sociales que,
por su posición, ya se habrán dado cuenta de
que lo que se propone nos es capacitar a los
niños para trabajar en los circos y teatros, sino
desarrollar su fuerza, proporcionando flexi-
bilidad a sus músculos, acostumbrando a los
niños a no temer ningún esfuerzo y a no ver
peligro en las cosas más insignificantes de la
vida práctica y material: en fin, no se quiere
formar a acróbatas, sino a hombres fuertes,
vigorosos, ágiles y valientes (O Globo, 18 jul.
1876, p. 3).

Otro caso es el del político, jurista y periodista Rui Barbosa. En sus opi-
niones sobre la reforma de la educación primaria en 1883, defendía la in-
clusión del método sueco de gimnasia en las instituciones de educación
pública, en virtud de sus características pedagógicas y su formación mo-
ral, higiénica y disciplinaria, basada en los preceptos de la ciencia (MORE-
NO, 2001). Él explicaba claramente la distancia que debía haber entre los
ejercicios físicos y las manifestaciones circenses y sus protagonistas: «No
pretendemos formar a acróbatas, ni Hércules, sino desarrollar en el niño
la cantidad de vigor físico esencial para el equilibrio de la vida humana, la
felicidad del alma, la preservación de la patria y la dignidad de la especie»
(MORENO, 2001, p. 132).

Así, como podemos observar en los ejemplos aquí presentados, los espec-
táculos circenses, sus artistas y sus sucesos en Brasil a lo largo del siglo XIX
y, por supuesto, a principios del siglo XX fueron frecuentemente contem-
plados por una parte de la prensa y de la crítica en diversas publicaciones.
Hablaron bien, hablaron mal, pero siempre hablaron del circo. Ante la mul-
tiplicidad de producciones circenses y su permanente reinvención, el circo
siempre ha estado en el punto de mira de la opinión pública e impreso en
las páginas de periódicos, revistas, folletines e incluso en publicaciones di-
rigidas a la educación o la producción cultural artística.

112
Respetable público: que hablen bien o mal, lo importante es que hablen de mí

Finalmente, esos espectáculos que esperamos algún día poder ver juntos
llevados por este texto/encuentro son los mismos que, hace mucho tiem-
po, encontraron una brecha entre la crítica y el circo y, sabios e intrépidos
que eran, hicieron sobre ella un doble salto mortal con pirueta, aterrizan-
do seguros y siempre renovados al otro lado, arrancando fuertes y cálidos
aplausos de la multitud.

.:. Este texto es responsabilidad exclusiva de sus autores y no refleja necesariamente la


opinión de Itaú Cultural.

Referencias

CAFEZEIRO, Edwaldo; GADELHA, Carmem. História do teatro brasileiro: um percurso


de Anchieta a Nelson Rodrigues. Río de Janeiro: Editora UFRJ: Eduerj: Funarte, 1996.

LOPES, Daniel de Carvalho. A contemporaneidade da produção do Circo Chia-


rini no Brasil de 1869 a 1872. Tesis de maestría en artes escénicas por el Ins-
tituto de Artes da Universidade Estadual Paulista (IA-Unesp), São Paulo, 2015.

LOPES, Daniel de Carvalho; SILVA, Erminia. Circos e palhaços no Rio de Janeiro:


império. Río de Janeiro: Grupo Off-Sina, 2015.

MORENO, Andrea. Corpo e ginástica no Rio de Janeiro: mosaico de imagens


e textos. Tesis doctoral en Educación por la Facultad de Educación de la Uni-
versidad Estatal de Campinas (FE/Unicamp), Campinas, 2001.

ROMÃO, Anna Luiza Ferreira. Entre escolas, clubs e sociedades: as gymnasti-


cas tecidas por professores no Rio de Janeiro (1850-1900). Tesis de maestría
en Educación por la Facultad de Educación de la Universidad Federal de Mi-
nas Gerais (FaE/UFMG), Belo Horizonte, 2016.

SILVA, Erminia. Circo-teatro: Benjamim de Oliveira e a teatralidade circense no Brasil.


São Paulo: Altana; Río de Janeiro: Funarte, 2007.

____________. Respeitável público...: O circo em cena. Río de Janeiro: Funarte, 2009.

113
crítica em movimento:
\La brecha entre la crítica y el circo

SOUZA, Silvia Cristina Martins de. As noites do ginásio. Teatro e tensões cultu-
rais na corte (1832-1868). Campinas: Editora da Unicamp, Cecult, 2002.

VIEIRA, Francisco. O Theatro Lyrico: palco e picadeiro. Río de Janeiro: 19 Design, 2015.

114
Respetable público: que hablen bien o mal, lo importante es que hablen de mí

115
crítica em movimento:
\La brecha entre la crítica y el circo

Direcciones de internet
En la maraña de algoritmos en la que se convirtió la vida de los mortales en este planeta,
pensamos que sería bueno reunir direcciones de Internet dirigidas a la práctica de la crítica
en las áreas de circo, danza, teatro y otras variantes que se hacen presentes.

La siguiente lista incluye fuentes de investigación y consulta fundamentales para la pro-


ducción de análisis. Son blogs, sitios web, revistas electrónicas y portales que realimentan a
quienes hacen y a quienes disfrutan de las artes escénicas (teniendo en cuenta que toda lista
supone brechas). 

Individuales, colectivas o institucionales, las iniciativas evidencian una fuerte red de espacios
imbuida de registrar y pensar una parte considerable de las creaciones que se hacen públicas
en diferentes regiones de Brasil e incluso en el exterior. Un inventario provisional a la manera
de brújula.

Agora Crítica Teatral | www.agoracriticateatral.com.br (Porto Alegre)


Alzira Revista – Teatro & Memória | www.alzirarevista.wordpress.com (São Paulo)
Antro Positivo | www.antropositivo.com.br (São Paulo)
Aplauso Brasil | www.aplausobrasil.com.br (São Paulo)
Artezblai – el Periódico de las Artes Escénicas | www.artezblai.com (Bilbao)
Bacante | www.bacante.com.br (São Paulo)
Blog da Cena | www.blogdacena.wordpress.com (Belo Horizonte)
Blog do Arcanjo | www.blogdoarcanjo.com (São Paulo)
Bocas Malditas | www.bocasmalditas.com.br (Curitiba)
Cacilda | www.cacilda.blogfolha.uol.com.br (São Paulo)
Caixa de Pont[o] – Jornal Brasileiro de Teatro | caixadeponto.wixsite.com/site (Florianópolis)
Cena Aberta | www.cenaaberta.com.br (São Paulo)
Circonteúdo – o Portal da Diversidade Circense | www.circonteudo.com (São Paulo)
Conectedance | www.conectedance.com.br (São Paulo)
Crítica Teatral | www.criticateatralbr.com (Rio de Janeiro)
Da Quarta Parede | www.daquartaparede.com (São Paulo)
Daniel Schenker | www.danielschenker.wordpress.com (Rio de Janeiro)
DocumentaCena – Plataforma de Crítica | www.documentacena.com.br (diferentes cidades)
Enciclopédia Itaú Cultural | enciclopedia.itaucultural.org.br (São Paulo)

116
Farofa Crítica | www.farofacritica.com.br (Natal)
Farsa Mag | www.farsamag.com.ar (Buenos Aires)
Filé de Críticas | filedecriticas.blogspot.com (Maceió)
Folias Teatrais – Letras, Cenas, Imagens e Carioquices | foliasteatrais.com.br (Rio de Janeiro)
Horizonte da Cena | www.horizontedacena.com (Belo Horizonte)
Ida Vicenzia – Crítica de Teatro e Cinema | idavicenzia.blogspot.com (Rio de Janeiro)
Idança.net | www.idanca.net (São Paulo)
Ilusões na Sala Escura | www.ilusoesnasalaescura.wordpress.com (São Paulo)
Karpa | www.calstatela.edu/al/karpa (revista eletrônica latino-americana editada em Los Angeles)
Lionel Fischer | lionel-fischer.blogspot.com (Rio de Janeiro)
Macksen Luiz | macksenluiz.blogspot.com (Rio de Janeiro)
Nacht Kritik | www.nachtkritik.de (Berlim)
Notícias Teatrales | www.noticiasteatrales.es (Madri)
O Teatro como Ele É | www.oteatrocomoelee.wordpress.com (Belém)
Observatório do Teatro | www.observatoriodoteatro.uol.com.br (São Paulo)
Observatório dos Festivais | www.festivais.com.br (Belo Horizonte)
Palco Paulistano | palcopaulistano.blogspot.com (São Paulo)
Panis & Circus | www.panisecircus.com.br (São Paulo)
Parágrafo Cerrado | www.paragrafocerrado.46graus.com/ (Cuiabá)
Pecinha É a Vovozinha! | www.pecinhaeavovozinha.com.br (São Paulo)
Primeiro Sinal | primeirosinal.com.br/ (Belo Horizonte)
Qorpo Qrítico | www.ufrgs.br/qorpoqritico (Porto Alegre)
Quarta Parede | www.4parede.com (Recife)
Questão de Crítica – Revista Eletrônica de Críticas e Estudos Teatrais |
www.questaodecritica.com.br (Rio de Janeiro)
Revista Barril | www.revistabarril.com (Salvador)
Ruína Acesa | ruinaacesa.com.br (São Paulo)
Satisfeita, Yolanda? | www.satisfeitayolanda.com.br (Recife)
Teatro para Alguém | www.teatroparaalguem.com.br (São Paulo)
Teatrojornal – Leituras de Cena | www.teatrojornal.com.br (São Paulo)
Tribuna do Cretino | www.tribunadocretino.com.br (Belém)
Tudo, Menos uma Crítica | www.medium.com/@fernandopivotto (São Paulo)
Válvula de Escape | www.escapeteatro.blogspot.com (Porto Alegre)
Vendo Teatro – uma Plataforma para Falar sobre Teatro em Pernambuco |
www.vendoteatro.com (Recife)

117
crítica em movimento:
\La brecha entre la crítica y el circo

Ficha técnica
NÚCLEO DE ARTES ESCÉNICAS

Gerencia
Galiana Brasil

Coordinación
Carlos Gomes

Producción
Felipe Sales

Cocuraduría
Valmir Santos

NÚCLEO ENCICLOPEDIA

Gerencia
Tânia Rodrigues

Coordinación
Glaucy Tudda

Producción
Karine Arruda

118
NÚCLEO DE COMUNICACIÓN Y RELACIÓN

Gerencia
Ana de Fátima Sousa

Coordinación
Carlos Costa

Edición
Ana Luiza Aguiar (subcontratada), Milena Buarque y Valmir Santos
(cocurador)

Producción editorial
Pamela Rocha Camargo y Victória Pimentel

Diseño
Estúdio Lumine (subcontratado)

Supervisión de la revisión
Polyana Lima

Revisión del portugués


Karina Hambra y Rachel Reis (subcontratadas)

Traducción al español
Atelier das Palavras Tradução Interpretação Ltda. (subcontratado)

Revisión del español


Atelier das Palavras Tradução Interpretação Ltda. (subcontratado)

119
Adiós Paraguay | foto: Comunicação IC

Você também pode gostar