A pintura A primeira Missa no Brasil (1860) de Victor Meirelles é uma
obra emblemática, que é estampada na maioria dos livros didáticos sob a justificativa de representar a primeira cerimônia religiosa católica realizada num recém-descoberto Brasil. Entretanto, se aprofundando brevemente no histórico desse célebre quadro, pode-se descobrir muito sobre os objetivos por trás de sua produção: uma trajetória cheia de nacionalismo, romantismo e manipulação de fatos passados. Entender essa obra é entender Victor Meirelles: esse catarinense ganhou, logo no início de sua carreira, uma viagem à Europa patrocinada pela Academia Imperial de Belas Artes (AIBA), lá ele continuou em constante contato com esse órgão e sempre se alinhou a ele. É claro que suas artes também se alinhariam a essa instituição e, consequentemente, ao Segundo Reinado. Na obra de Meirelles se nota claramente a mão do governo vigente na época, dentro das pinceladas há intensão clara. Mas qual seria essa intensão? A criação de um mito fundador. É o esforço para construir uma história oficial para uma nação, livre de contradições ou quaisquer empecilhos. Os indígenas representados por Meirelles são calmos, selvagens, curiosos e de certa forma passivos em relação aos portugueses, as novas tradições são aceitadas por eles sem a menor objeção. Já os lusitanos são brilhantes, limpos, heroicos e fortes, a cultura deles penetra no Brasil de maneira fácil e rápida. Entretanto, a realidade é completamente diferente. O mito fundador não leva em conta os milhares de mortos, o genocídio, o sangue, os quilômetros de floresta devastados por uma exploração inconsequente da terra, a condição maltrapilha em que os navegadores se encontravam ao chegar na América e a guerra e destruição que esse choque abrupto entre culturas causou. É, portanto, inegável o valor histórico de A primeira Missa no Brasil, porém também é irrefutável a manipulação, os objetivos ocultos e as mentiras que esse quadro representa. Atualmente, o Brasil aos poucos vem conseguindo perceber todos esses erros e vem produzindo obras que em verdade representam o que aconteceu aqui no século XVI: um capítulo tão importante, sangrento e idealizado da história brasileira.