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MODA

O BASTARDO: "CRESCI OUVINDO QUE


GENTE COMO EU NÃO PODIA FAZER
ARTE"
Jovem artista da baixada fluminense ganhou
bolsa para estudar em Paris e está com
exposição solo em São Paulo

03.DEZ.21 8 MINUTOS
POR AUGUSTO MARIOTTI

O BASTARDO VESTE GUCCI EM TODAS AS FOTOS. FOTOS: CRISTIANO MADUREIRA; STYLING: FLÁVIA POMMIANOSKY E DAVI RAMOS; ASSISTENTE DE STYLING: MARCO ANTONIO; BELEZA:
RODRIGO BERNARDO (CAPA MGT)

Natural de Mesquita, município da Baixada Fluminense, no Rio de Janeiro, o artista O


Bastardo (23 anos) começou sua incursão pela arte por meio do graffiti aos 15 anos, até que,
aos 18 anos, ganhou uma bolsa de estudos para frequentar o curso de videoarte na Escola de
Artes Visuais do Parque Lage, onde sua mãe trabalha e foi e ainda é um celeiro de nomes de
destaque da arte brasileira. Ele acabou sendo notado pela artista e professora Suzana Queiroga
que acabou virando sua professora de pintura e foi uma das responsáveis por abrir a cabeça do
artista para as artes.

A pandemia colocou a École des Beaux-Arts de Paris em seu caminho. Ele estava na França em
lockdown e resolveu aplicar para uma bolsa e residência de artes plásticas na tradicional escola
de artes parisiense. Acabou sendo o único artista sulamericano aprovado em sua turma.

“Cresci ouvindo que gente como eu não podia fazer arte, que isso era coisa pra gente rica, da
Zona Sul” afirma O Bastardo em nossa conversa pelo Zoom.

As pinturas de Bastardo retratam uma série de figuras negras que alcançaram um lugar de
destaque em suas áreas de atuação, como ícones do grande escalão da indústria da música
como Mano Brown, Kayne West, Playboi Carti e Travis Scotti, como também figuras anônimas,
que são colocadas lado a lado na exposição Pretos de Griffe, na Casa Triângulo.

Essas pinturas inéditas buscam normalizar o sucesso de pessoas pretas por meio de suas
conquistas para que cada vez mais os jovens negros acreditem que é possível ser aquilo que
desejam. A própria trajetória do O Bastardo muitas vezes se confunde com sua própria
pesquisa artística.

O ensaio exclusivo que acompanha essa entrevista tem fotos de Cristiano Madureira e styling
da dupla Flávia Pommianosky e Davi Ramos.

O que te inspira a pintar?

Acho que tem diferentes ambientes que me movem e me inspiram. A música é algo muito
presente na minha vida, tanto pessoal como de artista, dos ídolos que eu tenho e que retratei
como Mano Brown, Travis Scott, Playboy Carti. Esses caras do rap, do trap têm um papel
dentro da comunidade preta muito importante que às vezes pode ser subestimado por um
outro grupo que não consegue codificar e se conectar com eles. Eu ainda vejo muito grafitti
online, principalmente lettering que é o que eu mais me amarro ainda. Tem uma comunidade
enorme de lettering no Brasil. Aqui a gente tem o pixo, que lá fora é uma extensão da outra, e
aqui são várias camadas, do grapixo em São Paulo, o Bomb Vandal, o Wild Style…aqui é mais
fragmentado mas corre junto. Tem muita coisa que eu carrego do graffiti, toda urgência de
produzir, eu não faço desenho por exemplo. Geralmente a galera que pinta tem essa rotina de
desenhar e eu não gosto. Minha parada de colorir, de camadas, não tenho estudo de cor, de
técnica, de nada. Essa urgência de pintura na raça, como se eu tivesse num muro na rua. ‘A
melhor pincelada é a primeira’ essa frase do De Kooning me marcou muito.

Você me falou dos OSGEMEOS e acabou de citar uma frase do De Kooning. Você
gostaria de ser comparado a algum artista?

Pra mim nacional é o Arjan Martins. Lá de fora o Henry Taylor e o Karry James Marshall. Se eu
fosse fazer uma exposição queria estar ao lado desses caras, nessa curadoria. Ficaria hiper
honrado, uma realização pessoal de estar presente num espaço e trocar com eles.

O BASTARDO EM SEU ATELIÊ EM SÃO PAULO VESTE LOOK COMPLETO GUCCI

A moda é um elemento bastante presente em suas pinturas. Que papel ela ocupa
dentro do seu imaginário, nas suas referências?

Ela se conecta por vetores diferentes. Eu me apego muito a questão da transversalidade que
algumas pessoas representam, como Mano Brown, Playboy Carti, eles saem de um espaço, de
uma periferia, de um gueto, de uma comunidade com uma série de problemáticas e vão pra um
outro lugar dentro da sociedade, atravessando diversas camadas e espaços e voltam pra essa
comunidade como esse símbolo de possibilidades e de transversalidade e de libertação de certa
forma. Me apeguei muito a isso na minha infância e adolescência. Me lembro muito de me
apegar a caras como Kanye West e outros artistas pretos que eram esse símbolo, e foi
importante pra mim decodificar isso e realizar que minha realidade não era quem eu era,
minha realidade era o momento em que tava vivendo. Até ir pra França eu nunca tinha saído
do meu Estado. É muito forte, é sistêmico, é bizarro. Então me apoiar nesses caras, ouvi-los,
vê-los, serve de apoio moral e inspiração para pintar e pensar em coisas mais arrojadas, fora de
um sistema dizendo o que você tem que fazer. em paralelo tem toda essa relação com a moda. O
Kanye, a Beyoncé sempre tiveram essa conexão com a moda, e eu lembro que eu comecei a usar
o Tumblr em 2010 e tive muito contato com moda, eu comprava roupa no camelô e tava vendo
umas paradas lá que eu nem sabia que existiam. Acabei fazendo muito contato pelas redes
pelas coisas que eu usava e fui pegando cada vez mais gosto por moda. Eu comecei a ir em
brechós, que era super difícil encontrar na baixada. Em 2016 eu usava uma saia com estampa
de tigre até os pés pra ir numa festa no meu bairro, por exemplo.

Como era ser assim em Mesquita?

Cara a gente lidava com isso em bando. Eu não tinha muitos amigos heterossexuais, e a gente
nem pensava muito nesse lance da violência, da lgbtfobia. Com o tempo a gente passa a ignorar
a violência para poder sobreviver, assim como um cara da periferia no Parque Lage, no Jardim
Botânico. Isso acaba se tornando uma forma de resiliência. Na Zona Sul eu sofro várias
situações de racismo pesadíssimas e minha cabeça vira uma chave para me proteger. Depois de
dois anos no Parque Lage comecei a prestar mais atenção no que está sendo dito, no lugar que
tão tentando me colocar.

E você traduz isso de alguma forma na sua produção artística?

Claro, acho que é inevitável. Tem formas diferentes de você militar, lutar e reivindicar coisas.
Desde que comecei essa fase figurativa eu comecei a pensar em como retratar pessoas pretas,
como eu ia falar sobre o lugar de onde eu venho, de como falar de negritude e eu não me sentia
preparado para fazer isso. Eu via outros artistas que estavam reféns do mercado, produzindo
caricaturas do que é uma vivência imaginária da periferia e meu medo era cair nesse limbo. Eu
ficava muito ofendido de ver esses trabalhos, porque eu sou periférico, ao mesmo tempo que eu
ainda não sabia como eu ia retratar tudo isso, tentando de certa forma fazer oposição a essa
coisa meio obscura e trazer uma outra perspectiva para reivindicar coisas. Tem um problema
sério de resumir a periferia à violência policial, a pobreza, como se preto periférico fosse só
pobre, miserável e bandido. Os artistas que estão fazendo denúncia do que se passa nas
periferias não são palatáveis porque isso é visceral, é muito forte. Então fica o espaço pra galera
que tá fazendo caricatura disso e isso me incomoda. Daí eu comecei a produzir a série “Preto de
Griffe”, que não se trata sobre ser mainstream, de 30 obras tem 24 que são pessoas anônimas, e
eu quebro essa hierarquia entre eles. Tem esse cara que representa essa relação de mundos
possíveis e realidades diferentes dentro de sua comunidade local e tem esse cara que tá no
mainstream, que faz isso em massa, mas pra mim não tem hierarquia, os dois exercem o
mesmo papel que é comunicar que você pode tentar ser o que você quiser, imaginar, ir atrás,
você não é onde você tá pisando. Ponto.

Você não está condenado a permanecer onde está.

Não! O problema no Brasil é que muitas vezes você cresce e morre dentro de um sistema
dizendo pra você que é aquilo, que você tem que ficar ali, que você vai morrer ali. Isso é muito
forte. Então esses ícones todos representam uma saída de certa forma, e uma série de outras
coisas, que podem ser subestimadas por aqueles que nasceram e cresceram com todos os
privilégios. Mas pra quem não… Se eu não tivesse tido contato com esses caras talvez hoje eu
não estive aqui, não tivesse exposição, não tivesse nada. Algumas coisas que podem ser
detalhes pra um pode ser sinônimo de ponte pra outros. Me senti na responsabilidade de puxar
esse bonde aqui. Lá fora isso já acontece. Africanos vão pra Europa e já representam a figura
preta dentro de situações sem ter que fazer caricaturas de figuras cheias de estereótipos e ainda
assim fazem suas reivindicações.

A primeira vez que me vi dentro de um museu foi quando vi um trabalho do Arjan. Que não era
um resumo escroto, perverso do que é periferia. Eu quero justamente cortar esse ciclo vicioso
que tá aí mais pra alimentar fetiche de elite, do que qualquer outra coisa.

Eu quero que um moleque preto entre num museu e veja meu trabalho, essas figuras, e que eu
quebre essas distâncias que são colocadas entre ele e lugares em que ele poderia se imaginar na
vida, que poderia ser ele ali.

A exposição Pretos de Griffe abriu dia 20.11 e segue até 29 de janeiro na Casa Triângulo (rua
Estados Unidos, 1324 – Jardins, São Paulo)

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