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CONFERÊNCIA NACIONAL DOS BISPOS DO BRASIL

CRISTÃOS LEIGOS E LEIGAS NA IGREJA E NA SOCIEDADE

SAL DA TERRA E LUZ DO MUNDO (MT 5, 13-14)

UMA ESPIRITUALIDADE ENCARNADA

A espiritualidade responde ao desejo e à busca do rosto de Deus e da comunhão com ele. Uma
espiritualidade encarnada caracteriza-se pelo seguimento de Jesus, pela vida no Espírito, pela
comunhão fraterna e pela inserção no mundo. Não podemos querer um Cristo sem carne e sem
cruz. Não se trata de fugir das realidades temporais para encontrar Deus, mas de encontra-lo ali,
em seu trabalho perseverante e ativo, iluminados pela fé. É preciso discernir e rejeitar a
“tentação de uma espiritualidade intimista e individualista, que dificilmente se coaduna com as
exigências da caridade, com a lógica da encarnação”. A espiritualidade cristã sempre terá por
fundamento os mistérios da encarnação e da redenção de Jesus Cristo. Este enfoque deve
permear a formação laical desde o processo da iniciação cristã. 184

A partir de Jesus Cristo, os cristãos leigos e leigas infundem uma inspiração de fé e de amor nos
ambientes e realidades em que vivem e trabalham. Em meio à missão, como “sal, luz e
fermento”, sempre cheia de tensões e conflitos, buscam testemunhar sua identidade cristã, como
“ramos da videira” na comunidade de fé, oração e partilha. O Concílio Vaticano II recomenda
que os leigos alimentem sua espiritualidade na Palavra de Deus e na Eucaristia, “fonte e centro
de toda a vida cristã”. Nela, os cristãos apresentam a Deus, por Jesus Cristo, o louvor de suas
vidas, nutrem a fé, a esperança e a caridade, expressão a fraternidade e são enviadas novamente
em missão. 185

A oração e a contemplação são fundamentais na vida dos cristãos. É preciso cultivar um espaço
interior dinamizado por um espírito contemplativo que ajude a cuidar da integridade da
consciência e do coração e dê sentido cristão ao compromisso e às atividades. Aí, é possível um
encontro significativo com o Deus revelado em Jesus Cristo, que nos permite descobrir que
“somo depositários de um bem que humaniza”, que nos ajuda a viver uma vida nova e,
portanto, a buscar esta vida nova para todos. 186

O verdadeiro trabalhador da vinha nunca deixa de ser discípulo. Ele sabe que Jesus caminha,
fala, respira e trabalha com ele. Experimenta a importância de caminhar com Jesus, e está
convencido de que constrói o novo mundo à luz do Evangelho. A experiência do encontro
pessoal com Jesus, sempre renovada, é a única capaz de sustentar na missão. Por isso, ele deve
dedicar tempo à oração sincera, que leva a saborear a amizade e a mensagem de Jesus,
especialmente por meio da leitura orante da Palavra de Deus e da participação nos sacramentos.
187

O encontro com Jesus Cristo leva a uma espiritualidade integral. Esta contempla a conversão
pessoal, o discipulado, a experiência comunitária, a formação bíblico-teológica e o
compromisso missionário. No encontro com Jesus Cristo vivo, descobre-se e vivencia-se o
mistério trinitário. A natureza missionária da Igreja é fruto dessa vida trinitária revelada aos
discípulos, os quais participam da obra de Deus mundo. Conduzidos pelo Espírito Santo, são
seguidores de Jesus Cristo e testemunha de sua ressurreição quinado vivem o mandamento do
amor recíproco a ponto de estarem unidos neste mesmo amor que manifesta a presença de
Cristo e a celebram nos sacramentos. 188

Em virtude do Batismo, que está na origem do sacerdócio comum dos fieis, os cristãos leigos e
leigas são chamados a viver e a transmitir a comunhão com a Trindade, fonte de nossa vida
comunitária e do amor transbordante que devemos testemunhar. “A experiência de um Deus
uno e trino, que é unidade e comunhão inseparável, permite-nos separar o egoísmo para nos
encontrarmos plenamente no serviço ao outro. A experiência batismal é o ponto de início de
toda espiritualidade cristã que se funda na Trindade”. 189

O Apóstolo Paulo destaca o fundamento trinitário da vida em comunidade, feita de diversidade


e de unidade. O Deus uno e trino é a fonte e o modelo de toda a vivência comunitária. “Há
diversidade de dons, mas o Espírito é o mesmo. Há diversidade de ministérios, mas o Senhor é
o mesmo. Há diferentes atividades, mas é o mesmo Deus que realiza tudo em todos” (1Cor
12,4-6). 190

Os primeiros cristãos eram um só coração e uma só alma, e juntos viviam e testemunhavam a


novidade do Evangelho (At 2,42-45; 4,32-35). Um desafio para os cristãos leigos e leigas e
superar as divisões e avançar no seguimento de Jesus Cristo, aprendendo e praticando as bem-
aventuranças no Reino, o estilo de vida do Mestre Jesus: seu amor e obediência filial ao Pai, sua
compaixão diante da dor humana, seu amor serviçal até o dom de sua vida na cruz: “Se alguém
quiser vir após mim, renuncie a si mesmo, tome a sua cruz e siga-me” (Mc 8,34). A cruz indica
o rumo de vida para o cristão, como força para a superação permanente dos males, do
sofrimento e da morte, como enfrentamento e superação das divisões e dominações, como
esperança de recreação misteriosa e pascal das relações humanas e da vida dom mundo. E a
Igreja, “sob a ação do Espírito Santo, não deixe de renovar-se a si mesma até que pela cruz
chegue à luz que não conhece ocaso”. 191

Os cristãos leigos e leigas que vivem em circunstâncias adversas, impossibilitados de uma


atuação mais concreta, não se sintam do lado de fora da única missão da Igreja e tenham a
consciência de que o sofrimento também é uma realidade aberta para a evangelização. Por meio
do sofrimento, digam com São Paulo: “completo, na minha carne, o que falta às tribulações de
Cristo em favor do seu Corpo que é a Igreja” (Cl 1,24). Por isso, tendo como referência o
mistério do sofrimento de Cristo, realizem sua vocação de ser fonte de amor, luz e força para a
Igreja e para a humanidade. 192

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