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Uma Louca Viagem – Volume I

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Uma Louca Viagem – Volume I

Copyright © 2016 por Albert Eije Barreto Mouta


Todos os direitos reservados. Nenhuma parte deste
livro pode ser utilizada ou reproduzida sob
quaisquer meios existentes sem autorização por
escrito do autor.

Este livro é uma obra de ficção. Nomes,


personagens, empresas, organizações, lugares,
acontecimentos e incidentes são todos produtos da
imaginação do autor ou usados de modo ficcional.
Qualquer semelhança com pessoas reais, vivas ou
mortas, acontecimentos ou lugares é mera
coincidência.

Diagramação e Capa: Albert Eije.


Revisão: Kelly Cristina e Kevin Mouta.

As imagens utilizadas no livro são de domínio


público.

Este livro é uma obra digital.

Primeira edição: 01 de janeiro de 2016.

O autor pode ser contatado através do e-mail:


alberteije@gmail.com

Dedico este livro à minha família.

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Uma Louca Viagem – Volume I

0 – Alienação [+]
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Uma Louca Viagem – Volume I

0 – Alienação [+]
Brasil. O maior país da América Latina. O quinto
maior país do mundo em área territorial. Possui
mais de 200 milhões de habitantes. O lar de uma
diversidade de animais selvagens, ecossistemas e
de vastos recursos naturais.

Quando o dia amanhece, a maioria dos brasileiros


já está de pé. Acordam cedo para ir ao trabalho.
É o dia 22 do mês, uma segunda-feira.

Em Brasília, aquela constante sensação de “céu


no chão”, dia claro, sem chuvas. Trânsito intenso.
Metrô lotado.

Os paulistanos estão no corre-corre, como


sempre. Uma cidade com 12 milhões de
habitantes parece um ecossistema vivo. Muitos
países não possuem essa quantidade de pessoas.

Salvador recebe alegremente os turistas. Muitos


estão no Elevador Lacerda em busca do
pelourinho e das famosas igrejas da capital.

Porto Velho “acorda” para mais um dia quente e


úmido. Quem sai na rua logo procura um ar-
condicionado.

E assim, os brasileiros entram na sua rotina diária


e semanal. São culturas diversas num mesmo
país. Tanta coisa diferente! Mas também muitas
coisas em comum. Uma coisa é certa, quase todo
brasileiro carrega consigo um celular.

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Uma Louca Viagem – Volume I

0 – Alienação [+]
Pense bem, se você quisesse enviar uma
mensagem para todos os brasileiros, qual seria a
melhor maneira de atingir a grande maioria
deles? Pela TV? Não! Embora existam TVs em
praticamente todos os lares brasileiros, as
pessoas não estão em casa ao mesmo tempo.
Mesmo que existam TVs no trabalho, tem muita
gente na rua, em trânsito. Pelo rádio? Também
não. Não é a maioria das pessoas que ouve rádio.

A forma mais fácil de mandar uma mensagem


para todas as pessoas, de modo que elas
recebam a mensagem ao mesmo tempo, é
através do celular. É claro que alguns ficarão de
fora. Mas, pelo menos, a mensagem vai chegar
para a maioria.

Foi com esse pensamento que L3F0V resolveu


que enviaria uma mensagem impactante para os
brasileiros. E naquela manhã do dia 22 de agosto
de 2016, uma mensagem foi enviada para todos
os celulares do Brasil:

“Estou doente. Preciso de socorro


urgente.”
'A ajuda está a caminho'.
L3F0V

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Uma Louca Viagem – Volume I

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As pessoas olharam para seu celular ou
smartphone e não compreenderam do que se
tratava. Muitos acharam que era engano. Como
era de se esperar, muitos correram para as redes
sociais para postar a mensagem, mas tiveram
uma desagravável surpresa: as redes sociais
estavam fora do ar.

Não levou muito tempo para que todos


percebessem que toda a Internet estava fora do
ar. E o pior, era apenas no Brasil.

A maioria das pessoas ficou sem ter o que fazer.


Os bancos fecharam as portas. A bolsa de valores
interrompeu o pregão. Os grandes supermercados
fecharam as portas e mandaram os funcionários
pra casa. E assim, todos os serviços que
dependiam da rede foram abruptamente
interrompidos. O caos.

Ninguém entendia exatamente o que estava


acontecendo. A Internet estava fora. Os telefones
também não funcionavam. Mas a boa e velha TV
estava lá. E foi pra ela que se voltaram as
atenções.

A imprensa não sabia de nada. Só havia


desinformação. Alguns especulavam que era um
ataque terrorista. Outros diziam que era o ataque
de algum grupo hacker. Havia quem dissesse que
era apenas uma falha na estrutura e que tudo
voltaria ao normal o mais rápido possível. Essa
era, também, a versão oficial do governo.

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Uma Louca Viagem – Volume I

0 – Alienação [+]
A imprensa internacional voltou sua atenção para
o Brasil. Lá fora tudo está funcionando
normalmente. Apenas no Brasil que estava
ocorrendo a tal pane.

Felipe Silva, um jornalista de São Paulo, estava


intrigado com a mensagem que todos receberam
antes da pane ocorrer. Evidentemente que
existiam outros especulando sobre a mensagem.
Mas Felipe estava obcecado por ela. Felipe
sempre escreve sobre tecnologia e assuntos afins.
Nos últimos meses vinha escrevendo sobre o
mundo underground da rede, sobre a Deep Web.

Foi através de suas investigações que ele


conheceu o hacker “u4ni0r”, que passou a se
corresponder com o repórter enviando muitas
informações interessantes. Felipe estava louco
para entrar em contato com o u4ni0r, mas não
podia, visto que a Internet estava fora.

E então toca o seu telefone.

— Alô.
— Felipe.
— Sim, quem fala?
— Imaginei que você quisesse falar comigo nessa
situação.
— u4ni0r?
— uhum.
— Cara! Que loucura! Como é o seu nome? Onde
posso encontrá-lo?

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— (risos) Como sempre fazendo as perguntas
erradas.
— É verdade. Você sabe o que está acontecendo?
Porque a Internet está fora do ar? Quem está por
trás disso?
— Sei que houve um ataque. Que a infraestrutura
de comunicações está sob controle de um hacker
ou de um grupo que se autodenomina L3F0V.
— Meu Deus! E você conhece esse grupo? É um
ataque de hackers de fora do país? O que eles
querem?
— Eu não sei. Nunca ouvi falar desse L3F0V.
— E seus amigos? Não tem nenhuma informação
sobre ele?
— Não. Por enquanto estamos no escuro. Quando
eu tiver mais informações eu te digo.
— Valeu. Fico no aguardo.

Enquanto isso, em Brasília, o Presidente convoca


o Ministro da Justiça e o Ministro da Defesa. Eles
já sabem que existe alguma coisa errada, mas
ainda não entendem o que está ocorrendo de
fato.

— Uma investigação precisa ser iniciada


urgentemente. — Exigiu o presidente.
— Sem dúvida senhor. — Concordou o Ministro da
Justiça, seguido dos militares.
— O que você pretende fazer? — Pergunta o
presidente diretamente ao Ministro da Justiça.
— Vou acionar os melhores profissionais da
Polícia Federal e pedirei ajuda a ABIN para saber
quem está por trás disso.

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Uma Louca Viagem – Volume I

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— Faça isso agora. Precisamos que a situação
volte ao normal imediatamente. — O presidente
estava tenso.

No Congresso Nacional, os políticos, senadores e


deputados, cada um na sua devida tribuna,
revesavam fazendo discursos inflamados, na
maioria incoerentes. Pessoas que falam do que
não entendem tem grande chance de dizer
asneiras. E a maioria do que foi dito nessas casas
durante as horas em que o país estava “no
escuro” pode ser chamado de asneira.

L3F0V se divertia enquanto assistia o desenrolar


dos acontecimentos.

No Rio de Janeiro, uma equipe de segurança de


TI discutia sobre os acontecimentos. A equipe era
formada por quatro membros. Três deles
trabalhavam na Receita Federal e resolveram sair
para montar sua própria empresa, a Thoth
Security. Esse nome, aliás, foi escolhido pelo
quarto membro, que dispunha do capital inicial
para abrir a empresa e entrou no negócio,
trazendo vários clientes importantes já no início.

— Isso não é bom.


— Eu sei Adriana. Mas pra nossa empresa, trata-
se de uma oportunidade.
— Não Erick. Isso não é bom pra ninguém. Uma
falha de segurança numa empresa é bom para os
negócios. Uma falha de segurança num país
inteiro, é o caos.

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Uma Louca Viagem – Volume I

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— Que nada Adriana. Eu só vejo coisas boas. O
país precisa ser sacudido. As pessoas estão muito
letárgicas. E além disso, todo mundo vai querer
se sentir mais seguro. Só vejo vantagens pra
gente.
— A Bíblia fala de tempos assim. Insegurança.
Incertezas. É um passo para o fim.
— Ah não Adriana, lá vem você de novo com essa
história de bíblia. — Jean, que até agora só
observava a conversa entre Adriana e Erick,
resolve se pronunciar. — Pelo amor de Deus. O
mundo é louco mesmo. O mundo é assim porque
nós somos assim. Quer saber onde é o inferno? É
aqui mesmo! Sempre foi! Quer saber quando o
mundo acaba? Quando você morre. Quando você
morrer o mundo vai acabar pra você. Agora para
com essa história de bíblia, que isso enche o
saco.

Luiz apenas observava os outros três. Sempre


quieto. Muito inteligente, mas sem personalidade
forte. Quando a Adriana falou sobre a Bíblia e o
fim dos tempos ele pensou: “é verdade, pode ser
que estejamos chegando perto do fim”. Começou
até mesmo a pensar o que já tinha feito da vida.
Quando o Jean retrucou bruscamente o que a
Adriana estava falando e desdenhou da Bíblia, ele
pensou: “é mesmo, nada a ver esse lance de
bíblia”. Pouco se envolvia em assuntos
“polêmicos” e acabava ficando do lado de quem
gritasse mais.

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Uma Louca Viagem – Volume I

0 – Alienação [+]
— Temos de iniciar um novo serviço. Traçar um
novo plano de defesa para nossos clientes e
cobrar por isso. — Erick só estava interessado em
como lucrar com os acontecimentos. De fato,
estava excitado com tudo o que estava
ocorrendo.
— Isso se a Internet voltar né. Eu acho que o
Brasil é só o começo. O próximo passo será
derrubar a rede no mundo todo. Aí sim, será o
fim do mundo. — Adriana continuava com medo
daquela situação.
— Seria bom mesmo! Que comece logo a terceira
guerra mundial. Quero ver uma bomba nuclear
sendo jogada no oriente médio, pra dizimar
aqueles animais. — Jean, como sempre, pecando
pelos seus excessos.

Luiz não falava nada. Mas começou a pensar no


novo serviço para alavancar os negócios da
empresa, enquanto imaginava uma bomba
nuclear explodindo e o mundo em guerra. “Seria
bom ou ruim?”, ele se perguntava.

Às 22 horas daquele dia inesquecível, a situação


voltou ao normal. A Internet estava novamente
funcional. Tudo estava onde deveria estar.

O presidente convocou uma coletiva de imprensa


para fazer um pronunciamento à nação. Suas
palavras foram as seguintes:

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Uma Louca Viagem – Volume I

0 – Alienação [+]
“Povo brasileiro,

Passamos por um momento de sufoco. Tivemos


um problema na infraestrutura de
comunicações, o que deixou o país sem
Internet até as 22 horas deste dia.

Afirmo que o sufoco já passou. É hora de


retomarmos nossa rotina. Estamos seguros.
Não há com o que se preocupar.

Muito obrigado e boa noite.”

— Isso é o que você pensa.

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Uma Louca Viagem – Volume I

I – Ponto de Partida [+]


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Uma Louca Viagem – Volume I

I – Ponto de Partida [+]


Domingo. Primeiro dia da semana. 28 de Agosto
de 2016.

Brasília não é exatamente o que poderíamos


chamar de Cidade Turística. Mas é impressionante
o número de pessoas que visita a capital federal
para conhecer os prédios públicos arquitetados
por Oscar Niemeyer: Palácio da Alvorada, Edifício
do Congresso Nacional, Catedral de Brasília,
Prédios dos Ministérios, Palácio do Planalto,
Supremo Tribunal Federal, Palácio do Itamaraty,
etc. As visitas costumam ocorrer aos sábados e
domingos.

Os prédios estão recheados de obras de arte.


Dentre os artistas que fizeram tais obras,
podemos citar Di Cavalcanti, Athos Bulcão,
Rubem Valentim, Sérgio Camargo, Maria Martins
e Alfredo Volpi.

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Uma Louca Viagem – Volume I

I – Ponto de Partida [+]


Mas naquela manhã uma obra de arte diferente
de tudo o que existiu na capital federal surgiu na
frente do Edifício do Congresso Nacional. A
“escultura” estava no gramado, entre o espelho
d'água, o prédio e a rampa. Estava à esquerda da
rampa para quem olha de frente para o prédio,
quase em frente à semiesfera do senado.

De longe dava pra perceber que se tratava de


uma cruz com um “boneco” pendurado. Alguns
curiosos tentaram chegar perto, mas a polícia já
havia feito um cerco no local. Algumas fotos
foram tiradas de longe. Parecia algum tipo de
protesto feito contra o governo.

Toca um telefone.

— Senhor presidente.
— Sim.
— A situação vai piorar. Pode ficar fora de
controle. — O assessor do presidente explicou do
que se tratava a “escultura” em frente do prédio
do congresso.
— Reúna a cúpula de segurança.
— Sim, senhor presidente.

Reunidos no Palácio da Alvorada estão o


Presidente da República, os Ministros da Justiça e
da Defesa, o Presidente da Câmara dos
Deputados e o Presidente do Supremo Tribunal
Federal.

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Uma Louca Viagem – Volume I

I – Ponto de Partida [+]


Logo que todos estão reunidos, adentra no recinto
um membro da ABIN que está investigando os
acontecimentos do “apagão digital” que ocorreu
no país dias antes. Ele traz um vídeo e pede
autorização para apresentá-lo para as autoridades
ali presentes.

O vídeo mostra que a tal “escultura” que se


encontra na frente do prédio do Congresso se
trata de uma pessoa crucificada. Mas não se trata
de qualquer pessoa, é o próprio Presidente do
Senado que está ali!

As autoridades presentes já sabiam que o


Presidente do Senado havia sido encontrado
morto e que seu corpo estava na frente do prédio
do Congresso. Mas não imaginavam que a cena
era tão grotesca.

Após assistirem ao vídeo completo, ainda


perplexos, ouviram o agente da ABIN. Tratava-se
de um Agente Técnico de Inteligência de nível
intermediário. Ainda assim, era o cara mais
inteligente da agência. Parece que nascera
praquilo.

— Senhores, passarei o vídeo pausadamente para


tentar explicar com o que estamos lidando.
— Isso é mesmo necessário. — Questionou o
Presidente da Câmara.
— Pode continuar. — Ordenou o Presidente da
República. — Como é o seu nome jovem?
— Alex.

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Uma Louca Viagem – Volume I

I – Ponto de Partida [+]


Alex era um jovem brilhante. Quando criança
desmontava e montava os celulares da família ou
qualquer dispositivo eletrônico que encontrasse
pela frente. Era versado em eletrônica e na
linguagem dos computadores. Um hacker nato.
Tinha apenas 20 anos. Mas era avesso a estudos.
Não queria fazer faculdade. Pra ele, o estudo
autodidata já bastava. Além disso, o que um
professor de faculdade que sabe menos do que
ele teria para lhe ensinar? Nada!

O Alex não estava sozinho nessa investigação.


Desde que ocorrera o “apagão digital” que o
Ministro da Justiça havia solicitado à Polícia
Federal uma equipe para desvendar o mistério.
Os dois melhores homens da instituição foram
encarregados da investigação: um delegado e um
perito criminal da área de TI.

Havia um quarto homem com eles. Tratava-se de


um membro da Polícia do Senado Federal. Como
o corpo havia sido descoberto nas dependências
do Edifício do Senado Federal, tal polícia
reclamava o direito de jurisdição e investigação
do crime.

— Como vocês podem ver, o Presidente do


Senado está crucificado. No entanto, não se trata
de uma crucificação padrão. Sua mão esquerda
está para cima, ao passo que sua mão direita está
para baixo. Na sua testa podemos observar um
número oito que foi feito com um ferrete.

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Uma Louca Viagem – Volume I

I – Ponto de Partida [+]


— Com um ferro de marcar gado? — Perguntou o
Presidente do STF.
— Isso mesmo. — Respondeu o Alex. E
continuou: — Pelo exame prévio que fizemos, ele
ainda estava vivo quando essa marcação foi feita.

Comoção na sala. Alguns levam as mãos à boca,


outros à cabeça. Estão perplexos. Olhos
arregalados.

— O que significa esse oito na testa dele?


— Ainda não sabemos, senhor. — Respondeu o
delegado da PF para o Ministro da Defesa.

O delegado Pedro era um homem experiente,


com seus 52 anos. Farejava como ninguém uma
cena de crime. Era, sem dúvida, o melhor
delegado da Polícia Federal. Embora passasse dos
50, ninguém percebia isso. Negro, alto, parecia
ter uns quarenta e poucos. Sempre sério. Voz
firme e grave. Estava muito preocupado com o
que estava acontecendo. E pior: não tinha ideia
do porquê de aquilo estar ocorrendo. Ele era o
encarregado da investigação.

Vídeo pausado.

— Continue, filho. — Fala o Presidente da


República olhando para o Alex.
— No peito do Senador, podemos ver uma série
de algarismos que foram entalhados por uma
lâmina. Pelo que parece são algarismos romanos:
CXXI, CXL, CXLVII, CLXXI, CCXVII e CCCXV.

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Uma Louca Viagem – Volume I

I – Ponto de Partida [+]


— Vocês já traduziram esses algarismos? —
Perguntou o Presidente da República.
— Sim, senhor. Representam os seguintes
números:

CXXI – 121
CXL – 140
CXLVII – 147
CLXXI – 171
CCXVII – 217
CCCXV – 315

— São artigos do código penal, sem dúvida. —


Afirmou o Presidente do STF.
— Então o Senador foi julgado e executado pelos
seus supostos crimes?
— É o que parece senhor Presidente da Câmara.
— Respondeu o delegado Pedro. — Pouco abaixo
do umbigo podemos ver a assinatura do bandido
entalhada na carne do Senador morto: L3F0V.
— Isso é um absurdo. Estamos lidando com um
justiceiro então? E como é que esse cara
conseguiu pregar uma cruz com um Senador da
República em frente ao Edifício do Congresso
Nacional? — O Presidente da Câmara dos
Deputados estava muito nervoso e com medo.
— Como anda a investigação sobre o “apagão
digital” Pedro?

O Presidente da República também estava


nervoso, mas tentava manter as aparências.

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Uma Louca Viagem – Volume I

I – Ponto de Partida [+]


— Bem Senhor Presidente, nós sabemos que o
grupo hacker conhecido como L3F0V conseguiu
enviar uma mensagem para todos os celulares
através das operadoras de telefone. Eles
invadiram os servidores e mandaram a
mensagem de lá, como se fosse uma mensagem
legítima enviada pelas próprias operadoras. Em
relação a como eles conseguiram parar a
Internet, a explicação será fornecida pelo Alex.

— De fato, eles tomaram o controle de todos os


backbones do país e deixaram um programa
rodando, de modo que uma tentativa de reinício
faria com que os principais servidores
começassem uma formatação forçada. Sabemos
disso porque foi tentado um reinício no Norte e
muitos dados foram perdidos, foi quase um
desastre. A única coisa que os técnicos puderam
fazer foi aguardar o fim da contagem regressiva
que aparecia na tela, visto que não tinham mais
controle do sistema e todas as tentativas de
retomar o controle era vista pelo programa que
rodava como uma ameaça, que tratava de apagar
vários dados como retaliação. Uma tentativa
forçada de controle teria sido devastadora. No
final da contagem regressiva, as coisas voltaram
ao normal e foi possível remover o programa que
havia tomado o controle de toda a infraestrutura
de rede do país.

— Certo. Disso tudo eu já sabia.

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Uma Louca Viagem – Volume I

I – Ponto de Partida [+]


— O que! E como é que eu não estou sabendo de
nada disso Senhor Presidente? — O Presidente da
Câmara continuava nervoso, apreensivo e ficou
indignado por não conhecer todos os detalhes do
ataque sofrido.
— Essa informação foi passada para os
dispositivos dos Chefes da União. O senhor anda
com o seu? Estamos enfrentando um problema de
segurança nacional. É bom não causar pânico.
Toda informação de natureza secreta sempre será
enviada para o seu dispositivo senhor Presidente
da Câmara. — O Presidente da República parecia
calmo ao explicar a situação para o Presidente da
Câmara, mas ele estava muito preocupado.

O telefone do delegado Pedro toca.

— Sim. Com licença senhores, preciso atender.

Alguns minutos depois ele volta com novidades.

— Era o legista. Temos novidades. — Ele pega um


papel onde anotou o que o legista havia falado. —
A mão direita do Presidente do Senado estava
fechada. Dentro dela havia uma esfera amarela.
Na mão esquerda havia um palito de dentes. No
intestino ele encontrou uma moeda de um real.
Da sua garganta ele tirou um pequeno punhal e
do seu ânus uma pequena taça. Abaixo da sua
língua havia um símbolo marcado. O legista
enviou algumas fotos para o meu celular. Vejam.

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Uma Louca Viagem – Volume I

I – Ponto de Partida [+]

— Todos estavam aterrorizados com aquilo.


— Acho que sei do que se trata. — Era a primeira
vez que o membro da Polícia do Senado se
manifestava. — Quando foi lançado o primeiro
filme do Harry Potter…
— Ahh, pelo amor de Deus. Isso aqui é coisa séria
meu filho. Vai falar de Harry Potter! Tenha santa
paciência. — O Presidente da Câmara
interrompeu bruscamente o jovem, que se calou
de imediato.
— Calma excelência! Deixe o homem falar.
Continue jovem. — Intercedeu o Presidente do
STF.
— …Bom, eu tinha 10 anos na época do primeiro
filme. Fiquei todo empolgado e comecei a estudar
magia, feitiçaria, bruxaria. Realmente eu entrei
de cabeça nesse mundo. Não virei bruxo, nem
feiticeiro. Mas posso dizer que estamos diante de
símbolos que remetem à bruxaria.

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Uma Louca Viagem – Volume I

I – Ponto de Partida [+]


— Como assim? — Perguntou o delegado Pedro.
— É comum, na bruxaria, o domínio dos quatro
elementos: terra, ar, fogo e água. Esses
elementos são representados através de
símbolos. Os símbolos que foram colocados no
corpo do Senador fazem alusão aos elementos. O
punhal representa o Ar, a moeda representa a
Terra, a taça representa a Água e o palito de
dentes representa o Fogo.
— E o que seria a esfera amarela?
— Aí eu não sei. Pode ser a alusão a um quinto
elemento.
— humm. Mas o que isso tudo tem a ver com um
grupo hacker que tirou a Internet do ar e matou
um Senador? Isso quer dizer que além de hackers
eles são bruxos, satanistas ou coisa parecida? —
O Presidente da República não conseguia associar
os fatos.
— Isso eu também não sei dizer. — Respondeu
com tristeza o jovem.
O Ministro da Justiça olhou firmemente para o
delegado Pedro e disse:

— Pedro, você tem que pegar esses caras o mais


rápido possível. Use tudo o que precisar para
pegá-los.
— Senhor Ministro, precisamos ser discretos. Uma
loucura como essas na imprensa pode trazer o
caos para o país. Gostaria de solicitar apenas
mais um ativo para minha investigação.
— Do que se trata?
— Desse jovem que tem conhecimentos de
bruxaria. Ele pode ficar na minha equipe?

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Uma Louca Viagem – Volume I

I – Ponto de Partida [+]


— Bom, isso está fora da minha alçada. —
Informou o Ministro.
— Não se preocupem senhores. Eu já recebi
autorização de meus superiores para investigar o
caso e colaborar com os demais poderes.
— Pois muito bem, — continuou Pedro — então
você vai tentar descobrir o que cada um desses
símbolos realmente significa e se eles fazem
alusão ao “apagão digital”. Além disso, deverá
tentar antecipar os próximos passos do grupo
L3F0V. Alex, você e o Valdir — o perito da PF —
continuem buscando pistas digitais. Temos que
pegar os membros desse grupo. Quanto a mim,
irei descobrir se alguém viu alguma coisa na
última noite e se existe alguma gravação nas
câmeras dos prédios e ruas que possam ajudar.
Excelências, quando tiver alguma novidade
entrarei em contato convosco imediatamente.

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Uma Louca Viagem – Volume I

II – Hipocrisia [-]
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Uma Louca Viagem – Volume I

II – Hipocrisia [-]
Nova mensagem na caixa de entrada. Felipe Silva
acessa sua caixa e observa que existe uma
mensagem do u4ni0r:

“Um vídeo acabou de subir para o Youtube. É de


arrepiar. Clique no link e assista o mais rápido
possível”.

Felipe acessou o link e observou que se tratava


de um vídeo de exatos dois minutos. No vídeo
existe uma pessoa sentada numa cadeira com
uma espécie de livro na mão. Não dá pra ver de
imediato quem é a pessoa. Ela usa um véu. Está
vestida com uma espécie de túnica vermelha ou
um lençol, não dá pra ver direito.

Logo surge uma voz no vídeo que diz:

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Uma Louca Viagem – Volume I

II – Hipocrisia [-]
“Políticos brasileiros, seu julgamento
começou. Vocês, quase todos, são ladrões,
bandidos. Acharam que poderiam cometer
vários crimes a vontade e que nunca seriam
pegos, afinal, vocês protegem uns aos
outros e criaram a tal imunidade
parlamentar que os fazem diferentes dos
demais criminosos. Mas isso acabou! Nos
links abaixo todos os brasileiros e demais
cidadãos do mundo poderão baixar um
documento que contém os nomes e os crimes
cometidos por vocês, políticos bandidos.
Por enquanto eu vou apenas disponibilizar
os nomes e os crimes, que vão de formação
de quadrilha, desvio de dinheiro público
até pedofilia e assassinato, dentre muitos
outros. Eu tenho os documentos que provam
todos os crimes que ali estão, sejam
documentos escritos, áudios e vídeos
comprovando os fatos. Por enquanto eu vou
me concentrar na esfera federal. Os nomes
e crimes do documento em anexo são de
senadores e deputados federais, além de
membros do poder executivo. Todos vocês,
citados nesse documento, tem até o dia 27
próximo para fazer um discurso à nação,
reconhecendo os crimes, renunciando ao
cargo e se entregando à justiça. Se assim
o fizerem, escaparão do meu julgamento.
Escolham o seu caminho.”

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Uma Louca Viagem – Volume I

II – Hipocrisia [-]
Na publicação aparece o nome do usuário: L3F0V.
Não dá pra saber se é uma voz feminina ou
masculina. A voz está embaralhada.

Felipe Silva está arrepiado. Será mesmo? Ele


baixa o documento. Está lá! O nome de quase
todos os senadores, deputados federais,
ministros.

— Meu Deus!

Os nomes estão organizados numa tabela com


duas colunas. Na coluna da esquerda está o
nome. Na da direita os crimes cometidos.

— Isso deve ser um blefe. Não é possível que


esses caras sejam todos bandidos desse naipe.
Será?!

O telefone toca.

— Felipe.
— u4ni0r, que loucura!
— Tem como você ir para Brasília?
— Brasília! Pra que?
— Eu descobri o local de onde o vídeo foi
publicado. Talvez possamos encontrar o L3F0V lá.
— Sério? Claro, eu vou, preciso desse furo! Posso
ir daqui há alguns dias. Você também viajará pra
lá?
— Eu já estou aqui.
— E onde é o local?

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Uma Louca Viagem – Volume I

II – Hipocrisia [-]
— Melhor não falar por telefone. Ative o GPS do
seu telefone e baixe a App que vou te mandar
agora. Quando você estiver em Brasília eu te
encontro, não se preocupe. Espere meu contato.

Em Brasília, o telefone do delegado Pedro toca.

— Pedro, temos que remover esse vídeo do


Youtube. — O Ministro da Justiça acha que pode
fazer tal coisa.
— Senhor Ministro, isso é impossível. O vídeo já
viralizou, muitas pessoas já baixaram para seu
computador pessoal, já espelharam em outros
sites de vídeos e no próprio Youtube com outros
nomes. Não tem como.
— Você tem alguma pista desse lunático?
— Sim senhor. O Alex descobriu que o vídeo foi
publicado no Youtube de um ponto aqui em
Brasília.
— Como assim?
— Ele filtrou o tamanho do vídeo antes de ser
compactado pelo Youtube e depois mapeou os
uploads no país que se assemelhavam ao exato
tamanho do vídeo. Encontramos apenas um
upload feito momentos antes de o vídeo ser
publicado.
— Tá, não entendi muita coisa, mas percebi que
vocês tem uma pista. É quente?
— Acreditamos que sim. Quando tiver alguma
novidade eu lhe aviso de imediato, não se
preocupe.
— Você não me retornou sobre os vídeos de
vigilância da morte do Presidente do Senado.

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Uma Louca Viagem – Volume I

II – Hipocrisia [-]
— Senhor, eu ainda estou aguardando os vídeos
de dois prédios próximos à Torre de TV, que já é
bem distante do prédio do Congresso. Todos os
demais vídeos das câmeras de rua e dos prédios
próximos ao Congresso estão sem um trecho ou
não filmaram aquele local. É um beco sem saída.
— OK. Mantenha-me informado.

Após falar com o delegado Pedro, o Ministro da


Justiça se reúne com o Ministro da Defesa e o
Presidente da República. Estão com medo.
Cogitam pedir ajuda a uma nação forte que tenha
meios para capturar os membros do grupo
hacker. Os ministros trocam ideias enquanto o
presidente ouve atentamente.

— Estados Unidos? China? Rússia?


— São as três melhores opções.
— Provavelmente os americanos sejam a melhor
opção.
— Se não forem eles que estão por trás disso.
— E por que estariam? Não fornecemos nenhuma
resistência aos seus interesses no país. Não tem
motivos pra isso.
— Talvez não oficialmente, através do governo.
Pode ser uma das agências agindo através de
interesses de grupos financeiros.
— Difícil saber.
— Rússia?
— Eles tem um setor de inteligência fabuloso.
Mas os chineses têm melhores hackers. Mas como
faríamos para nos ajudarem? Será mesmo o
momento desse movimento?

30
Uma Louca Viagem – Volume I

II – Hipocrisia [-]
O presidente ouve tudo. Não se pronuncia. Pensa
numa maneira de tirar o país dessa enrascada. É
sabido que a maioria dos políticos tem “mau
feitos” no currículo. Mas serem expostos dessa
forma? O que os militares vão pensar disso?
Como o mercado financeiro vai agir depois dessa?
A situação pode ficar rapidamente fora de
controle. Algo precisa ser feito. E rápido!

Um novo vídeo é publicado no Youtube. Um


conhecido grupo hacker ativista se pronuncia
sobre os acontecimentos. Trata-se do grupo
vIgIl4t3 [vigilate]. No vídeo eles congratulam o
grupo L3F0V por ter exposto os políticos daquela
forma, algo que o próprio vIgIl4t3 não conseguira
fazer durante anos de ativismo. Mas avisam para
o L3F0V ter cuidado. Não concordam com o
assassinato frio do Presidente do Senado.
Afirmam que se tal ato radical se repetir, eles se
sentirão compelidos a caçá-los e uma guerra
entre os grupos pode ter início.

Numa mansão do Lago Sul, em Brasília, um grupo


de políticos se reúne para discutir a questão.
Trata-se de um grupo que faz parte de uma
ordem secreta muito antiga, que vem assumindo
cargos políticos desde o tempo do Império.

— Quais as nossas opções?


— Bom, nossos nomes estão lá. Não sabemos se
os hackers tem os documentos que dizem ter.
Mas fomos expostos.

31
Uma Louca Viagem – Volume I

II – Hipocrisia [-]
— E quais as chances de os hackers terem esses
documentos?
— Poucas, muito poucas.
— O que me preocupa é o crime atribuído a mim.
Só existe um: pedofilia. Todos aqui sabem que eu
sou um pedófilo inveterado. Mas tem um detalhe:
eu não falo disso com ninguém, não acesso sites
sobre o assunto. Não anoto nada em lugar
nenhum. Apenas vocês sabem disso. O que me
deixa muito preocupado. Me leva a crer que
temos um traidor aqui.
— Impossível. Somos irmãos unidos por um laço
que não pode ser quebrado jamais. Além disso,
todos os nossos nomes estão lá. Então qual o
sentido dessa traição? Temos que continuar
confiando uns nos outros.
— O que temos de fazer é pegar esses hackers
antes que a polícia o faça. Precisamos eliminá-los
o quanto antes.
— E como faremos isso?
— Meu filho tem uma empresa no Rio de Janeiro.
Eles prestam consultoria na parte de segurança.
São hackers. Vamos contratá-los para pegar o
grupo L3F0V.
— Eles são bons?
— Sim.
— E como vamos contratá-los? Informalmente?
— Sim. Meu filho já conhece seus “amigos”. Tem
lá seus problemas, mas fazem tudo por dinheiro.
Deixo que ele explique a situação a eles. Eles
pegam o L3F0V e depois sofrem um acidente, os
três é claro. Meu filho já conhece nossa ordem e
em breve fará parte de nossas fileiras.

32
Uma Louca Viagem – Volume I

II – Hipocrisia [-]
— Acho muito arriscado.
— É isso, ou esperar que as provas sejam
publicadas pelo L3F0V.
— E você acha que eles podem pegá-los em tão
pouco tempo?
— E temos outra alternativa? Vamos ter que
tentar!

L3F0V ouvia tudo atentamente. E, como sempre,


gravava todas as conversas. Durante vários
meses ele enviou presentes para todos os
políticos. Relógios de ouro, brincos de prata,
anéis de formatura que as pessoas adoram
colocar no dedo, pins, broches, prendedores de
gravata, canetas banhadas a ouro, tablets. Foram
muitos, muitos presentes. Os “remetentes” eram
vários: um admirador secreto, um eleitor feliz,
um correligionário satisfeito, um patrocinador de
campanha agradecido. Enfim, os políticos
orgulhosos, e burros, recebiam os presentes e
tratavam de usá-los no dia a dia. Mal sabiam que
um dispositivo de escuta, e algumas vezes de
vídeo, estava anexado ao presente. Dessa forma,
L3F0V os espionava e descobria todos os seus
podres.

No dia seguinte, no Rio de Janeiro, Erick chegava


mais cedo ao escritório para preparar uma
reunião de emergência.

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Uma Louca Viagem – Volume I

II – Hipocrisia [-]
— Galera, eu convidei vocês para essa reunião
porque a situação ficou complicada. Como vocês
sabem, o meu pai é um Senador da República.
Minha família está na política há décadas.
— Sim, e o nome do seu pai apareceu na lista do
L3F0V.
— Isso mesmo Adriana. Ele pediu a nossa ajuda.
— E como é mesmo que vamos poder ajudá-lo?
— Bom Jean, a coisa é mais complicada do que
parece.

Erick conta a história de sua família e da ordem


secreta a qual pertence. Conta como essa ordem
vem influenciando os assuntos políticos do país e
de como isso beneficia alguns grupos financeiros
do exterior.

Após ouvirem atentamente toda a história, Erick


conta que a ordem deseja que eles localizem os
membros do grupo L3F0V antes das autoridades.
Se assim o fizerem, não se preocupariam em
trabalhar mais pelo resto da vida. Ele mostra a
cifra de 8 dígitos que cada um irá receber após
cumprir a tarefa.

— Eu tô dentro. — Jean nem pensou direito.


Quando viu a grana que ia receber, aceitou de
imediato.

Luiz já ia dizer que estava dentro quando Adriana


se manifestou.

34
Uma Louca Viagem – Volume I

II – Hipocrisia [-]
— Tenho medo. Vamos nos meter numa
investigação do governo, da polícia federal.
Realmente podemos ficar sem trabalhar pelo
resto da vida, só que atrás das grades e esse
número de 8 dígitos pode ser a nossa
identificação na prisão.

Luiz agora ficou dividido. “Ficar milionário é


excelente. Não trabalhar mais pelo resto da vida.
Viajar pelo mundo. Fazer o que quiser da vida.
Mas com o risco de ser preso? Hummm”. Ele
estava visivelmente dividido em seus
pensamentos.

— Acho que devemos fazer uma votação. —


Sugeriu o Erick. — Eu voto a favor.
— Eu também.
— Faltam vocês dois. Adriana, pense bem, o que
temos a perder? Estamos atrás de criminosos. Se
durante o processo a polícia nos descobrir, qual o
problema? Somos uma empresa de segurança.
— Sim, mas o nosso objetivo é garantir a
segurança de outras empresas e pessoas e não
de caçar hackers. Mas que se dane, por essa
grana aí eu vou enfrentar os meus medos.
— Eu também voto a favor. — Luiz finalmente se
manifestou.

Em Brasília:

— Alex, alguma novidade?


— O Valdir conseguiu rastrear o local de onde o
vídeo foi postado, Pedro.

35
Uma Louca Viagem – Volume I

II – Hipocrisia [-]
— Sério? Me dê uma boa notícia.
— Foi a partir da UNB, na Asa Norte.
— Puts! Tinha que ser né. A UNB tem 505 mil
metros quadrados de área construída e 40 mil
alunos. Tem um local específico?
— Não no momento. Teremos que investigar in
loco. Pegar os dados trefegados e descobrir qual
o endereço MAC responsável por subir o vídeo.
Daí torcer para que seja um endereço MAC
autêntico que leve a uma máquina real que possa
ter sido utilizada por um dos membros do L3F0V.
— Não parece muito promissor, mas se é o que
temos, vamos lá.
— Eu vou ficar por aqui.
— Por que Breno?
— Estou quase chegando lá em relação à
simbologia usada pelo grupo L3F0V.
— Já tem alguma teoria?
— Sim, mas é muito cedo para falar. Vão pra UNB
que eu vou verificar se minha tese faz algum
sentido.

Breno tinha 25 anos. Jamais imaginou que


acabaria na Polícia do Senado. Antes mesmo de
se formar em Direito, fez um concurso de nível
técnico para o Senado, para policial, com salário
de quase 15 mil reais. Passou em primeiro lugar.
Além de muito inteligente, era muito bonito.
Moreno, 1,85m, forte, malhava constantemente
desde os 18 anos.

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Uma Louca Viagem – Volume I

II – Hipocrisia [-]
Breno era muito sonhador. Passava horas jogando
RPG com amigos ou no computador e era
fascinado por bruxos, elfos, demiurgos e esses
entes do mundo da magia. E ali estava ele,
trabalhando como policial e imerso no mundo
mágico que tanto gostava. Mas esse “jogo” era
diferente. E ele corria contra o tempo para achar
uma solução, se é que havia uma.

No Congresso os políticos faziam discursos


mirabolantes. Aqueles que tiveram seu nome
vazado no documento subiam na tribuna e
falavam de ética e moral. Diziam que os
terroristas, que estavam querendo destruir o
país, deveriam ser presos imediatamente.

A imprensa estava agitada. Nos jornais não se


falava em outra coisa. Analistas passavam horas
discutindo o tema. Várias entrevistas eram feitas
com os políticos que tinham seu nome envolvido.
Todos negavam. Pediam as provas. Falavam que
se tratava de um bando de vândalos. Que os
bandidos eram esses que queriam fazer o país de
refém e tinham assassinado o Presidente do
Senado.

Analistas financeiros criavam peças falando do


fim do país e de como uma recessão severa se
aproximava. Prometiam mundos e fundos para
vender suas ideias. Bolsa em queda. Dólar em
alta.

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Uma Louca Viagem – Volume I

II – Hipocrisia [-]
Alguns membros de alta patente das forças
armadas discutiam se era o momento de tomar
as rédeas da situação. Mas o consenso era o de
apoio ao governo na busca pelos hackers, que
agora eram chamados de terroristas.

No Congresso, os deputados e senadores


discutiam uma lei antiterrorismo para punir com
as mais severas penas aqueles que estavam
praticando tais atos.

Uma parte da população estava em festa. Será


que veriam finalmente os políticos sendo
julgados? Qual seria o próximo passo do L3F0V?
O que ele faria no dia 27 caso os políticos não
fizessem o que ele exigira?

38
Uma Louca Viagem – Volume I

III – Idealismo [+]


39
Uma Louca Viagem – Volume I

III – Idealismo [+]


E então aconteceu. Às 20:10 do dia 21 daquele
louco e inesquecível mês de setembro de 2016, a
principal rede de TV teve sua programação
interrompida.

Primeiro a tela ficou preta durante três minutos.


Logo após isso, uma figura sentada numa cadeira
apareceu. Era similar à figura vista no vídeo
publicado no Youtube, mas não era igual.

A câmera então começou a focar a figura de baixo


para cima, num rito que durou exatos três
minutos. Durante esse período foi possível
observar que a pessoa estava sentada numa
espécie de trono. Seu corpo estava coberto por
uma túnica ou um lençol azul e vermelho.

Sua mão direita segurava uma espécie de brasão


com uma águia. O objeto parecia um escudo. Sua
mão esquerda segurava um cetro ou um bastão
com um globo e uma cruz na parte superior.
Sobre a sua cabeça tinha uma coroa. O homem
ali sentado era o Presidente da Câmara dos
Deputados. Ele não estava amordaçado, mas não
falava nada. Parecia estar imobilizado.

E então, surge a voz, aquela mesma do vídeo que


foi postado no Youtube:

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Uma Louca Viagem – Volume I

III – Idealismo [+]


“Parece que os políticos bandidos desse
país ainda não entenderam com o que estão
lidando. Vocês não tem saída. A
oportunidade de vocês renunciarem e se
entregarem foi dada para que o mundo visse
o quanto vocês, porcos, são sujos. Você
jamais admitiriam que são criminosos.
Mentiriam até o fim, mesmo que as provas
fossem disponibilizadas para todos. Para
provar que estou certo, estou
disponibilizando todas as provas que os
incriminam. Eu já sei que vocês, ainda
assim, não darão o braço a torcer. Não se
entregarão. Vocês são bandidos da pior
espécie. Mas agora, toda a população terá
acesso às mesmas provas que eu tenho.
Muitos ainda me considerarão pior bandido
que vocês. Mas é só questão de tempo para
essa opinião mudar. Vocês devem estar se
perguntando o que faz esse representante
de vocês aqui, sentado nesse trono. Ele
está aqui para eu mostrar para vocês o que
vai acontecer com os bandidos que não se
entregarem.”

Então aparece uma figura no vídeo. Parece um


homem. Está com uma túnica preta e um capuz.
Parece um executor medieval. Então se aproxima
do Presidente da Câmara por trás e corta a sua
garganta. Uma cena forte. O político morre em
frente as câmeras. O sinal retorna.

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Uma Louca Viagem – Volume I

III – Idealismo [+]


As coisas chegaram num nível alarmante. Logo
após a execução ao vivo, muitas pessoas saem às
ruas. Algumas para comemorar o feito. A maioria
para repudiar a cena grotesca.

Muitos começam a baixar o conteúdo que L3F0V


disponibilizou como prova. Muitos gigas de
documentos, vídeos, áudios. É muita coisa para
analisar.

Alguns setores da imprensa começam a publicar


parte do material, a mostrar parte do conteúdo
na TV e em seus sites.

As forças armadas se posicionam a favor do


governo, assim como o poder judiciário.
Defendem que é preciso um julgamento justo,
mesmo que existam culpados, eles não podem
ser declarados culpados antes de uma
investigação completa. Ambos afirmam que a
prioridade do país deve ser capturar os membros
do grupo L3F0V.

O Presidente da República faz uma declaração à


nação informando que a prioridade do país é
pegar o L3F0V, que não é possível ficar à mercê
de um grupo terrorista e que vai solicitar ajudar
externa, de uma nação que esteja pronta para
lutar contra o terrorismo. Todos devem se unir
para pegar os terroristas.

Em um hotel de Brasília. Três batidas na porta.

42
Uma Louca Viagem – Volume I

III – Idealismo [+]


— Não pedi serviço de quarto.
— Não é serviço de quarto.

Felipe Silva abre a porta e se depara com uma


mulher loira, de aproximadamente 1,70m, muito
bonita. Olhos castanhos. Cabelos lisos.

— Posso entrar?
— Do que se trata senho...moça. — Ele meio que
gagueja na hora. Afinal, a mulher é um
espetáculo. Ela vai entrando e falando.
— E aí, ficou muito chateado pela espera?
— Como assim?
— Ainda não sabe quem eu sou né? Eu que pedi
pra você vir pra cá!
— u4ni0r?! Eu poderia esperar qualquer coisa,
menos isso! Sua voz parecia de homem.
— Sim, mas sou mulher. E já vou avisando que
gosto de mulher, então tira esse sorriso bobo da
cara. Se arruma, vamos pra UNB.
— Pra UNB? Fazer o que?
— Eu estou monitorando a equipe que está atrás
do L3F0V. Eles conseguiram filtrar a máquina que
subiu o vídeo para o Youtube. Precisamos
investigar e achar alguma pista.

— Já estamos há alguns dias por aqui Alex. Você


e o Valdir não conseguiram muita coisa.
Chegaram nessa máquina aí, mas não temos
nada. Não temos provas que mostram quem
utilizou essa máquina no momento que o vídeo
foi publicado no Youtube.

43
Uma Louca Viagem – Volume I

III – Idealismo [+]


— Eu sei Pedro. Mas precisamos continuar
investigando. Ele deve ter deixado alguma pista.
Na verdade, acho até que ele nos trouxe até aqui
por alguma razão.
— Eu estou sendo pressionado Alex. O ministro
está louco! O nome dele não consta na lista dos
políticos criminosos, mas ele precisa acabar com
essa confusão o mais rápido possível. O país está
entrando num buraco sem fundo. Alguns setores
da sociedade estão apoiando os atos terroristas e
exigindo que esses políticos renunciem. Temo por
uma guerra civil. Agora, com a morte do
Presidente da Câmara, as coisas se complicaram.
Você assistiu ao vivo o que houve?
— Sim.
— Você estava em casa?
— Sim.
— Eu te liguei durante a transmissão e você não
atendeu. Liguei para o telefone da sua casa e
também para o seu celular.
— Ahh, estava no banho. Só vi sua ligação hoje.
Como íamos nos encontrar mesmo, não retornei.
Imaginei que seria sobre a morte do Presidente
da Câmara.
— Pessoal, vamos dar uma volta, espairecer a
cabeça. Estamos passando muitas horas aqui
nesse laboratório. Precisamos de ar.
— Muito bem Valdir, vamos caminhar um pouco
pelo campus e trocar algumas ideias.
— O Breno tem alguma novidade?
— Sim. Ele acha que os símbolos têm alguma
coisa a ver com o baralho do tarô, mas ainda está
montando o caso para nos apresentar.

44
Uma Louca Viagem – Volume I

III – Idealismo [+]


— É a nossa chance. Eles estão saindo.
— u4ni0r. É meio arriscado. Afinal, qual é o seu
nome?
— Maia.
— Sério?! Nem sei do que é melhor te chamar.
— Vamos.

Eles entram no laboratório e Maia logo vê o


computador que deve analisar. Ele está
bloqueado. Ela tenta uma primeira senha. Nada.
Tenta novamente. Não consegue.

— Droga. Vou ter que reiniciar esse computador


com o meu disco para ter acesso aos dados.

— Parem! Afastam-se do computador. Mostrem


as mãos.

O Alex tinha implantando um sistema de


segurança específico naquele computador. Caso
alguém tentasse acessá-lo, uma mensagem seria
enviada para seu smartphone. Foi o que ocorreu.
Com o susto, ao levantar da cadeira, Maia
derrubou o monitor do computador, um monitor
HP de 19 polegadas, modelo HP w1907. O
monitor ficou caído na mesa, com a tela para
cima.

— Calma! Meu nome é Felipe Silva. Sou jornalista


de São Paulo. — Felipe foi colocando a mão
dentro do bolso...
— Pare! Mais um movimento e eu vou atirar. — O
delegado Pedro não estava de brincadeira.

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Uma Louca Viagem – Volume I

III – Idealismo [+]


— Calma amigo, só quero tirar minha
identificação.
— Eu não sou seu amigo e você está numa cena
de crime. E estamos falando de segurança
nacional.
— Valdir, pegue os documentos dos dois.

O Valdir pegou os documentos do Felipe Silva,


mas Maia não portava nenhum tipo de
documentação.

— Cadê seus documentos moça?


— Eu fui assaltada. Levaram minha bolsa com
tudo.
— É verdade senhor. Somos de São Paulo, ela é
minha secretária. Foi assaltada assim que
chegamos em Brasília.

O delegado Pedro analisou os documentos do


Felipe. Tudo certo.

— O senhor está liberado. E você está presa.


— Como assim senhor? Eu já lhe disse, ela é
minha secretária.
— Tem algo de errado aqui, senhor Felipe. Ela vai
presa e eu estou querendo lhe prender também.
— Pedro! Tem alguma coisa aqui. — Alex
percebeu que havia um adesivo na parte de baixo
do monitor.
— O que é isso Alex?
— Parecem letras gregas.
— Isso faz parte do número de série desse
computador?

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Uma Louca Viagem – Volume I

III – Idealismo [+]


— Não, sem dúvida não faz. Além disso, abaixo
dessas letras temos uma assinatura bem pequena
que nos informa quem é o autor.

Pedro chega mais perto e pode ver o que está ali


escrito: L3F0V.

— Então a pista que tanto procurávamos não


estava no computador, estava no monitor.
— É isso mesmo senhor.
— E o que são essas letras? Temos que mandar
para o Breno analisar.
— Essas letras são conhecidas como tetragrama.
— E como é que você sabe disso moça? — Pedro
estava desconfiado dela.
— Eu já estudei teologia. O tetragrama é algo
comum nos estudos bíblicos. São quatro letras
hebraicas que representam o nome de Deus.
— Isso está ficando cada vez mais esquisito.
Afinal, o que esses hackers querem? São
fanáticos religiosos além de tudo? — De vez em
quando Pedro pensava alto e não se apercebia
que outros podiam ouvir seus “pensamentos”.

Um telefone toca. É o celular do delegado Pedro.

— Preciso da presença de sua equipe no Palácio


do Planalto imediatamente.
— Mas senhor...
— Imediatamente Pedro. Onde você está?
— Na UNB.

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Uma Louca Viagem – Volume I

III – Idealismo [+]


— Vocês tem 30 minutos para estarem aqui, os
quatro. — O Ministro da Justiça desligou o
telefone bruscamente.
— Soltem ela. Deixem os dois irem. Vamos
embora.

Enquanto isso, o grupo hacker vIgIl4t3 postava


novo vídeo na Internet com a seguinte
mensagem:

“L3F0V, você é um bandido, o verdadeiro


criminoso, um terrorista.

Saiba de uma coisa: estamos em guerra!

Na verdade, é melhor definir nossa


situação como uma caçada, onde nós somos
os caçadores e você é a presa.

Prepare-se, seus dias estão contados!”

Reunidos numa mansão no Lago Sul, os políticos


da ordem secreta analisavam suas opções.

— Hackear um satélite? Como isso foi possível?


— Não existe segurança total excelência.
— Ainda não estou à vontade com a sua presença
aqui meu jovem.
— Meu filho está atrás desses loucos. Ele tem
direito de estar aqui conosco.
— Ele tem o direito, mas não a idade.

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Uma Louca Viagem – Volume I

III – Idealismo [+]


— Por favor senhores. A situação é crítica. Vamos
esquecer de pormenores por enquanto. Erick,
você tem alguma novidade?
— Na verdade tenho. Por isso solicitei essa
reunião com os senhores.
— Do que se trata?
— Estamos bem próximos de pegar o L3F0V.
— Acho melhor pedirmos ajuda para nossos
irmãos no exterior. Talvez deixar o país.
— Não podemos deixar o país excelência. O
acordo com o executivo e o judiciário é de pegar
o L3F0V como prioridade, mas não podemos
deixar o país sob nenhuma circunstância.
— E se fugirmos?
— É pior. Temos que pegar esse grupo e eliminá-
lo e depois costurar um acordo com os demais
poderes para que tudo seja abafado e para
retomarmos nossa velha rotina. Esse é o
caminho.
— Esse é um caminho impossível. Esse grupo
pode ser grande e estar espalhado pelo mundo.
Talvez nunca consigamos pegá-lo.
— Se me permitem.
— Claro Erick, fale.
— Ao invadir o satélite da TV, o L3F0V deixou
uma pista. Acreditamos que não foi proposital, foi
descuido. Talvez um membro menos capacitado
do grupo tenha feito esse hack. O fato é que
temos a localização de onde o hack foi feito.
— E o que estamos esperando? Vamos mandar
alguns homens lá para dizimá-los!

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Uma Louca Viagem – Volume I

III – Idealismo [+]


— Temos que ter cuidado. Os membros desse
grupo são muito inteligentes. Isso também pode
ser uma armadilha. Os hackers mais famosos do
mundo declararam guerra contra eles e ainda
assim não conseguiram identificar ninguém ainda.
Estou pensando em levar minha equipe para
investigar o local. Se houver algum mecanismo
de segurança, pretendendo desativar. Daí
entramos em contato com vocês para enviarem
uma equipe de matadores.

Erick, na verdade, pretendia mostrar o seu valor


para aqueles velhos. Queria pegar os membros do
L3F0V ele mesmo, ainda que precisasse enganar
os velhos e sua própria equipe no processo.

— Pois bem, faça isso filho. Realize a tal


investigação e desarme qualquer tipo de alarme.
Veja se é uma armadilha. Mas não entre em
confronto. No menor sinal de perigo saia de lá
com sua equipe. Senhores, meu filho resolverá
essa situação!

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Uma Louca Viagem – Volume I

IIII – Tetragrama [+]


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Uma Louca Viagem – Volume I

IIII – Tetragrama [+]


O Presidente da República convocou todos os
governadores para uma reunião em Brasília. O
país precisaria ficar unido politicamente frente
aos últimos acontecimentos e a ameaça que
estava enfrentando.

Nas principais capitais do país, vários protestos


estavam em andamento. Haviam passeatas
gigantes, com milhares de pessoas. Uns pediam a
saída imediata de todos os políticos e novas
eleições. Outros afirmavam que a única saída
para o Brasil seria uma intervenção militar, onde
os militares tomariam o poder, julgariam os
criminosos e convocariam novas eleições. O povo
estava dividido. A maioria estava com medo!

Antes da reunião com os governadores, porém, o


presidente precisava se atualizar em relação à
investigação que estava em andamento.

Foi então que recebeu, no Palácio do Planalto, a


equipe que estava responsável pela investigação:
delegado Pedro, Alex, Valdir e Breno.

— E então senhores, alguma novidade? —


Perguntou diretamente o presidente. Junto dele
estavam os ministros da justiça e da defesa.
— Sim. — Respondeu o delegado Pedro. — Nós
temos uma teoria para os símbolos que os
terroristas estão usando. Se a teoria se
confirmar, poderemos nos antecipar aos próximos
movimentos do grupo.

52
Uma Louca Viagem – Volume I

IIII – Tetragrama [+]


— Vá em frente. — Solicitou um presidente
curioso.
— O Breno vai explicar.

Breno então pegou seu notebook e conectou na


rede. Como estavam na Sala de Reuniões
Presidencial, ele compartilhou a imagem com os
demais computadores dali.

Na tela surgiu a imagem de três cartas de baralho


de tarô, numeradas de I a III, com os seguintes
nomes: O MAGO, A SACERDOTISA e A
IMPERATRIZ.

53
Uma Louca Viagem – Volume I

IIII – Tetragrama [+]


Breno olhou para os presentes, que estavam com
uma cara fechada e os braços cruzados. Ficou
meio tímido, querendo desistir do que ia falar.
Olhou para o delegado Pedro, que acenou com a
cabeça, como que dissesse: “vá em frente,
mostre a eles o que você sabe”. Então ele
começou a falar:

— Minha investigação mostra que o grupo L3F0V


está usando a simbologia do tarô. Aqui podemos
ver as três primeiras cartas do tarô de Marselha.
Existem várias versões diferentes de cartas de
tarô e vários “decks”, ou seja, várias combinações
para as diferentes cartas. Segundo meu estudo, o
tarô de Marselha é o que mais se aproxima do
tarô primitivo. Se o L3F0V está realmente usando
a simbologia do tarô, é bem provável que esteja
utilizando o de Marselha.

Breno tirou uma caixa do bolso contendo um deck


do baralho de Marselha, desses que é fácil
comprar nessas lojas exotéricas de shopping. O
baralho continha apenas os Arcanos Maiores. Ele
retirou o baralho e mostrou a todos. Deixou que
os presentes fossem passando o baralho entre
eles.

— E o que o leva a crer que esses terroristas


estão usando o tarô? Por que eles fariam isso?
— A razão eu ainda não sei senhor presidente.
Mas eu vou mostrar para vocês porque eu acho
que eles estão usando o tarô como simbologia.

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Uma Louca Viagem – Volume I

IIII – Tetragrama [+]


Ele então avança um slide. A carta O MAGO
aparece sozinha.

— Observem essa figura. Primeiro vamos analisar


os símbolos. Vejam o chapéu. Ele está na cabeça
do mago, como é de se esperar, e forma o
símbolo do infinito, o mesmo símbolo que foi
marcado na testa do Presidente do Senado.
Acredito que essa carta tem a ver com aquele
ataque em específico. O Presidente do Senado
estava crucificado, com a mão esquerda para
cima e a mão direita para baixo. Na imagem
podemos observar que o mago está com as mãos
na mesma posição. Dentro da mão direita dele
havia uma esfera amarela, assim como há uma
esfera na mão do mago. Na mão esquerda do
Senador havia um palito de dentes, assim com o
mago segura uma espécie de vareta. Debaixo da
língua do senador havia um símbolo. Trata-se da
letra Aleph, a primeira letra do alfabeto hebraico.
Essa letra é associada à primeira carta do baralho
do tarô, O MAGO, e representa o início de alguma
coisa, o ponto de partida.

— Certo, mas haviam outros objetos encontrados


no corpo do senador. — Lembrou o Ministro da
Defesa.

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Uma Louca Viagem – Volume I

IIII – Tetragrama [+]


— De fato senhor. Assim como eu mencionei
naquela ocasião, os demais artefatos representam
mesmo os quatro elementos: terra, ar, água e
fogo. Ocorre que tais elementos também estão
presentes no tarô. O tarô é composto por 78
cartas, sendo que 52 delas nós conhecemos
muito bem: as que vão de Ás a 10, junto com
Valete, Dama e Rei. Sabemos que tais cartas
possuem quatro naipes: paus, ouros, copas e
espadas. Essas cartas são chamadas de Arcanos
Menores, ao passo que as que estou
apresentando nos slides, que são comumente
utilizadas por cartomantes, são chamadas de
Arcanos Maiores.
— E o que isso tem a ver com os objetos
encontrados no corpo do senador?
— Senhor presidente, vamos recordar dos
objetos. Dois deles eu já mencionei aqui, a esfera
amarela, que, pelo que parece, foi colocada lá
apenas para associar o senador à carta do mago.
O palito na mão esquerda, que também associa
ao mago, pois este tem uma vareta na sua mão.
Além desses, foram encontrados uma moeda de
um real no seu intestino, um punhal em sua
garganta e uma pequena taça em seu ânus. O
punhal representa o Ar, a moeda representa a
Terra, a taça representa a Água e o palito de
dentes representa o Fogo.
— Isso foi o que você falou naquela ocasião. —
Lembrou o presidente.

56
Uma Louca Viagem – Volume I

IIII – Tetragrama [+]


— Exato. E qual a relação dos elementos com o
baralho? Os naipes do baralho representam
também os elementos: Paus representa o Fogo.
Copas representa a Água. Espadas representa o
Ar. Ouros representa a Terra. Ao colocar tais
objetos no senador, o L3F0V estava querendo
mostrar qual simbologia utilizaria durante seus
ataques.
— Interessante. — O presidente estava intrigado.
Todos na sala se entreolhavam pensativos. Breno
continuou.
— Tem mais. Cada carta do baralho tem
significados positivos e negativos. A carta em si
representa o início de alguma coisa. Acredito que,
na visão do L3F0V, significa o início da mudança
que ele está forçando o país a fazer através dos
seus ataques. O mago representa, em seus
aspectos positivos, alguém com energia, força de
vontade, criatividade e dedicação aos ideais. Isso
poderia se aplicar ao próprio L3F0V, na visão
dele. Nos aspectos negativos, o mago representa
um charlatão, impostor, mentiroso e explorador
de inocentes. Isso poderia representar o próprio
senador morto, pois seus crimes também foram
talhados na sua carne, bem como todos os
políticos que serão jugados pelo L3F0V, conforme
a vontade dele.
— Que loucura! — O Ministro da Justiça ouvia
perplexo e não segurava seus pensamentos.
— Então esses loucos estão usando esse baralho
para arquitetar seus ataques. Qual a motivação
deles?

57
Uma Louca Viagem – Volume I

IIII – Tetragrama [+]


— Senhor ministro, o que eles querem dar a
entender é que a motivação é política. Uma
mudança no país feita de forma heroica. Tanto é
que eles mencionaram da última vez que o país
ainda ficaria do lado deles. Não sabemos ainda se
existe algum grupo financeiro ou algum outro país
por trás dos ataques. Pode mesmo ser obra de
hackers que querem ver uma mudança forçada
nas instituições ou que querem trazer o caos ao
país.
— Muito bem Pedro, e o que podemos fazer para
pegá-los? — A preocupação primária do
presidente era pegar logo os terroristas.
— Nós não temos pistas que nos levem aos
hackers, por enquanto. Mas podemos tentar
antever os seus ataques através das cartas. O
Breno vai explicar como.
— Nesse terceiro slide observamos a carta
número dois: A SACERDOTISA. Se nosso
raciocínio estiver correto, essa carta tem relação
com o vídeo que o L3F0V lançou desmascarando
os políticos através de seus crimes. Essa carta
também é chamada de PAPISA, ou seja, um papa
feminino. Pelo que parece, houve um papa do
sexo feminino. Dizem que uma mulher ocupou a
cadeira de São Pedro sob o nome de João VIII.
Pelo que falam, a papisa teria ficado grávida de
um dos seus familiares e, como não se recolheu
na época devida, o parto ocorreu em plena rua,
durante uma procissão entre a igreja de São
Clemente e o palácio de Latrão. Com a dramática
descoberta do engano, o enfurecido séquito papal
teria assassinado Joana e seu filho.

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Uma Louca Viagem – Volume I

IIII – Tetragrama [+]


— História interessante. Provavelmente uma
lenda. Mas o que isso tem a ver com o vídeo
lançado pelo L3F0V e a lista de políticos e crimes
que ele disponibilizou na Internet?
— Então, pelo que pude pesquisar, essa carta
pode representar algo que parece, mas não é. E
também que, quando há a descoberta da
verdade, o resultado pode ser fatal. Dessa forma,
o L3F0V mostra claramente que os políticos que
posam de éticos na verdade são criminosos da
pior estirpe e que em breve terão que prestar
contas, assim como a “papisa” Joana, que foi
morta pelos próprios seguidores. Por isso ele deu
um prazo limite para eles confessarem seus
crimes e se entregarem. Do contrário, acredito
que eles serão mortos, todos que estão na lista.
— Olha, sequestrar e matar duas autoridades
importantes é muito difícil, e esses terroristas
conseguiram. Mas, matar todos os políticos
daquela lista? Quase todos os deputados e
senadores da república? Estamos falando de
quase 600 pessoas! Isso é impossível!
— Impossível é aquilo que ainda não vimos
senhor ministro. — Alex citou essa frase que tirou
de algum livro ou filme que assistiu. Pedro olhou
pra ele de forma estranha, tentando compreender
porque havia falado aquilo.
— Outra coisa que chama atenção, e o Breno não
citou, é o fato de o interlocutor do vídeo estar
sentado numa cadeira com uma espécie de livro
na mão. Tinha um véu e estava coberto com um
lençol vermelho. Parece simbolizar o personagem
da carta.

59
Uma Louca Viagem – Volume I

IIII – Tetragrama [+]


— É verdade Valdir.

O Presidente da República olhou para o Ministro


da Justiça e pediu que entrasse em contato com
as autoridades legislativas para aumentar a
segurança de cada parlamentar. Solicitou ainda
que este mobilizasse a Força Nacional de
Segurança Pública.

Vendo que o tempo passava rápido e observando


que Breno queria continuar, o presidente solicitou
que ele assim o fizesse.

— No próximo slide vemos a figura da


IMPERATRIZ. Essa carta está relacionada à morte
do Presidente da Câmara. O simbolismo utilizado
é evidente. O Presidente da Câmara aparecia
sentado num trono. Ele estava coberto por um
pano azul e vermelho. Segurava um escudo com
uma águia na mão direita e um cetro na mão
esquerda. Usava uma coroa. Enfim, são os
mesmos símbolos da carta da imperatriz.
— E o que essa carta representa Breno?
— Bom, senhor presidente, essa é a parte difícil.
Ela representa muita coisa, tanto no sentido
negativo quanto no positivo. No sentido positivo
indica sabedoria, discernimento, idealismo, ação,
planejamento, iniciativa. No sentido negativo
indica inatividade, desperdício de poderes,
infidelidade, fracasso.

Breno fez uma pequena pausa.

60
Uma Louca Viagem – Volume I

IIII – Tetragrama [+]


— Não sei exatamente o que o L3F0V quis usar
com essa carta. Podem ter sido várias coisas,
aplicando a ele mesmo, ao deputado morto, ao
país. Enfim, o que importa é que nós descobrimos
que ele usa esse simbolismo e, quem sabe,
podemos descobrir seus próximos passos.
— Certo, e vocês já tem alguma teoria dos
próximos passos dele?
— Na verdade, senhor ministro, vou tratar disso
agora. Veja o próximo slide. Trata-se da carta do
IMPERADOR. Na UNB o Alex achou um símbolo
que remete ao tetragrama hebraico. De acordo
com minhas pesquisas, a carta do imperador está
relacionada ao tetragrama.

61
Uma Louca Viagem – Volume I

IIII – Tetragrama [+]


L3F0V ouvia tudo e pensava: “Parece que esse
Breno é bem inteligente. Ou será que eu deixei as
pistas tão às claras que qualquer fanboy do Harry
Potter consegue decifrar? De qualquer forma, as
coisas estão saindo conforme planejado.”

— E o que a carta do imperador pode nos dizer


sobre o próximo passo dos terroristas?
— Bom, senhor ministro, podemos analisar os
aspectos positivos e negativos da carta. Analisar
sua simbologia. Combinar isso com os ataques
anteriores e traçar o perfil do L3F0V, tentando
prever o que fará em seguida.
— Certo Alex. E vocês já fizeram isso com
quantas cartas?
— Na verdade senhor, o Breno nos contou suas
descobertas no caminho para cá. Tudo está
ocorrendo muito rápido. Não tivemos muito
tempo ainda para analisar a carta do imperador,
sequer as demais.

O Presidente olhava para a carta pensativo.

— Breno, o que você pode me adiantar sobre


essa carta?
— Bom, nos aspectos positivos da carta, temos
realização, efeito, honestidade, apoio e
segurança. Nos aspectos negativos temos
bloqueio, impedimento, indecisão, incompetência,
autoritarismo, tirania, teimosia e autodestruição.
Algo interessante a ser observado é que essa
carta está relacionada ao Poder Executivo.

62
Uma Louca Viagem – Volume I

IIII – Tetragrama [+]


— Poder Executivo?
— Sim senhor. Pode significar um ataque direto a
alguém do poder executivo.
— Isso tudo é muito vago. Não podemos tomar
qualquer decisão ou montar qualquer estratégia
com base nisso. Pedro, precisamos de mais. O
que temos aqui é importante, é coerente, mas
não é o suficiente.
— Concordo, senhor ministro. Estamos
trabalhando incansavelmente para pegá-los.

Enquanto ainda falavam, foram chamados a


atenção para um movimento que ocorria lá fora,
na frente do Palácio do Planalto, na pista, entre o
Palácio e a Praça dos Três Poderes.

Ali estava parado um ônibus escolar. O ônibus


tinha cor amarela e faixa preta com o nome
ESCOLAR nas laterais e na parte de trás. De
dentro do Palácio era possível ver o ônibus e
alguma movimentação. O motorista estava na
porta e fazia sinais para alguns policiais que
tentavam chegar perto.

— Eu vou ver do que se trata. Fiquem aqui.


— Tudo bem Pedro, tenha cuidado.
— Claro, senhor ministro. Pode deixar.

Quando Pedro chegou mais perto para observar o


que estava acontecendo, se deparou com uma
cena intrigante. O homem que estava na porta do
ônibus usava um colete por cima do terno.

63
Uma Louca Viagem – Volume I

IIII – Tetragrama [+]


Ele gritava que a polícia não chegasse muito
perto, que colocassem uma tribuna ali perto da
porta com alguns microfones e câmeras, pois ele
tinha um comunicado a fazer. Ao olhar mais
atentamente, Pedro viu que se tratava do
governador do Acre.

Olhando atentamente para dentro do ônibus,


conseguiu ver que os demais governadores
estavam ali, em pé, de frente para as janelas,
cada um com um colete por cima do terno.
Haviam 11 governadores do lado direito e outros
11 governadores do lado esquerdo, além do
governador do Acre que tinha dirigido o ônibus
até ali. Faltavam quatro governadores. Mas Pedro
não podia pensar neles naquele momento.

Pedro então tomou a frente e perguntou para o


governador do Acre do que se tratava tudo
aquilo. O governador falou, quase chorando, que
não havia muito tempo. Ou eles traziam a
tribuna, microfones e câmeras, ou todos os
governadores seriam explodidos.

Pedro então pediu para trazerem uma tribuna de


dentro do Palácio do Planalto e solicitou que
vários repórteres colocassem microfones em cima
dela. Além disso, pediu para vários funcionários
de imprensa que estavam com suas câmeras que
as posicionassem perto da tribuna, com foco em
quem falaria ali, e se distanciassem.

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Uma Louca Viagem – Volume I

IIII – Tetragrama [+]


Feitos os preparativos, o governador do Acre se
aproximou com um papel na mão. Seu colete
tinha uma luz verde piscando. Ao passo que
andava, a luz foi piscando cada vez mais forte e
ficou laranja. Ele parou. Teria que falar dali
mesmo. Os demais governadores continuavam
em pé, dentro do ônibus, olhando para a janela.
As luzes de seus coletes também estavam de cor
laranja. Muitos choravam. Alguns pareciam estar
rezando ou fazendo algum tipo de prece.

O governador do Acre começou então a falar:

“Fomos capturados pelo L3F0V. Aqui estamos


nós, 23 governadores, representando tudo o
que há de pior na administração política
do Brasil. Somos ladrões, isso é um fato.
Somos também assassinos, a maioria de nós.
Somos responsáveis por boa parte das
mazelas que sofrem as populações de nossos
Estados. Estamos aqui, todos nós, usando
um colete com explosivos mortais. Caso nos
distanciemos, os coletes explodem ao mesmo
tempo. Fazemos um apelo ao L3F0V e à
população que nos perdoem pelos nossos
crimes. Nós vamos pagar o que devemos.
Tenham piedade.”

Enquanto o governador lia aquilo, o delegado


Pedro tentava compreender o que se passava ali.
“Essas palavras são do L3F0V ou do próprio
governador? O que ele pretende com isso? Vai
humilhá-los e soltá-los ou vai matar a todos?”.

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Uma Louca Viagem – Volume I

IIII – Tetragrama [+]


Não dava pra saber. Pedro observou que um dos
governadores dentro do ônibus havia saído da sua
posição original. Ele estava em pânico.

Enquanto isso, o Alex, dentro do Palácio do


Planalto, falou para os presentes que era melhor
se precaverem.

— Como assim, Alex?


— Temos 23 governadores. Eles estão em pânico.
Estão conectados pelo fato de serem
governadores, bandidos e de terem um colete
explosivo. Se um deles de afastar, os demais
morrem. Não sabemos o tamanho da explosão.
Pode até mesmo afetar quem está em volta e
quem sabe afetar o prédio do palácio.

O presidente ouviu tudo. Olhou para o Ministro da


Justiça e perguntou:

— Como está o esquadrão antibombas? Tem


notícias sobre os explosivos?
— Estão a postos, mas não temos como saber
qual o tipo de explosivo até termos contato com
ele. Pode ser qualquer coisa. Pode ser até mesmo
nada.
— Um blefe?
— É possível.
— Acho difícil. Com tudo o que eles fizeram até
agora, um blefe nessa altura do campeonato
parece fora de cogitação. Posicione atiradores de
longa distância e dê ordem para abater qualquer
governador que saia da formação.

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Uma Louca Viagem – Volume I

IIII – Tetragrama [+]


— Como assim, senhor? — O Ministro da Justiça
parecia não acreditar no que estava ouvindo.
— É isso mesmo. Eu entendi o que o Alex quis
dizer. Melhor perder um do que todos.

E ocorreu que aquele governador em pânico saiu


do ônibus, enquanto o governador do Acre ainda
falava. Coletes com luz laranja.

O governador do Acre interrompeu o discurso e


pediu pra ele voltar pra dentro.

— Você tá louco? Quer que a gente morra?


— A gente já tá morto! Mesmo que a gente
escape dessa, o que será do nosso futuro?

O governador do Acre percebeu que o seu colega


estava desorientado. Ele ficou pensando no que
fazer. O governador em pânico correu. Depois de
três ou quatro passos um tiro foi dado e ele foi
abatido, ali, pra todo mundo ver.

O governador do Acre correu pra dentro do


ônibus. Encarou seus colegas governadores. A luz
dos coletes ficou vermelha. Todos explodiram.

Aquela foi uma explosão diferente. Os coletes


foram feitos para causar o máximo de dano a
quem os estava usando. As janelas do ônibus
também sofreram o impacto, na maioria causado
pelas partes dos corpos que passaram por elas.

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Uma Louca Viagem – Volume I

IIII – Tetragrama [+]


Do lado externo ninguém sofreu nada. Nada
físico, diga-se de passagem, pois quem
presenciou aquele acontecimento, quem viu
aquelas cenas, terá pesadelos pelo resto da vida.

Dentro do ônibus ficou uma espécie de sopa de


sangue e ossos. Não dava pra saber quem era
quem. Fora do ônibus, na pista, era possível
encontrar algumas mãos, dedos, pés, e até uma
cabeça. Horrível!

Esse era o golpe mais profundo jamais aplicado


no país. Anteriormente apenas o Governo Federal
estava sendo atacado. Agora os Estados sentiam
a mão pesada do L3F0V, que dizimou seus
governadores.

Quatro governadores, porém, haviam escapado.


L3F0V os havia poupado por serem pessoas
honestas. Não havia nada que desabonasse sua
conduta. Parece que havia alguma esperança
para o país, afinal.

— E agora Maia? A coisa está ficando cada vez


mais complicada. Será que esses loucos vão
matar todos os políticos?
— Todos não, afinal quatro governadores estão
vivos. Acho que eles só vão matar aqueles que
merecem.
— O que? Não acredito no que estou ouvindo.
Você concorda com o que esses loucos estão
fazendo?

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Uma Louca Viagem – Volume I

IIII – Tetragrama [+]


— Ora Felipe, quem nunca quis que esses
políticos se dessem mal? São um bando de
ladrões mesmo. São indivíduos da pior espécie
que só entram no mundo da política para tirar
proveito. Algo precisa ser feito. É claro que não
concordo em matar todo mundo que é bandido e
nem em matar todos os políticos, mas talvez
assim a sociedade acorde e os ladrões que se
tornam políticos tenham medo de continuar nessa
vida de safadeza.
— Se queremos construir uma sociedade melhor,
temos que nos concentrar na educação Maia, e
não voltarmos à idade média, onde um inquisidor
atribuía a culpa a alguns e os jogavam na
fogueira.
— Bom, teremos tempo para falar sobre tudo isso
quando pegarmos o L3F0V.
— Como assim? Você tem uma pista dele? Você
tem contato com eles Maia? Seja sincera.
— Claro que não. Ele ou eles não deixam muitos
rastros. Mas eles deixaram um e eu vou segui-lo.
Aliás, nós vamos. Pega o carro.

Na mente da maioria ainda não ficara claro se


L3F0V era uma pessoa ou um grupo. Afinal de
contas, uma pessoa só não conseguiria realizar
tantos atos sem ajuda. Então, evidentemente, se
tratava de um grupo. Mas, seria um grupo com
vários líderes? Ou havia uma cabeça pensante
que tomava as decisões e passava para seus
subalternos?

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Uma Louca Viagem – Volume I

IIII – Tetragrama [+]


O Presidente não viu alternativa. Solicitou ao
Ministro da Defesa que decretasse Lei Marcial.
Solicitou ao Ministro da Justiça que colocasse
todos os homens da Força Nacional de Segurança
Pública nas ruas de todo o país.

— O povo precisa se sentir seguro. Ao ver os seus


governantes sendo mortos covardemente,
entrarão em pânico. Não podemos perder o
controle da situação.

O celular do Alex emitiu um bip.

— Opa. Tenho novidades.

Pedro entrava na sala depois de presenciar a


carnificina do lado de fora a tempo de ouvir o que
ele tinha para falar.

— Eu deixei um programa rodando no meu


computador rastreando o hack que foi feito no
satélite. Agora eu tenho uma localização.
Devemos ir pra lá imediatamente Pedro.
— Sim. Valdir, Breno, vamos os quatro.
— Não querem ajuda?
— Se concentrem com os problemas que estão à
porta senhores. Se tivermos novidades, entramos
em contato. Saberemos nos virar.

Já dentro do carro, o delegado Pedro perguntou


para o Alex para onde estavam indo.

— 913 Sul. Prédio do antigo hospital particular.

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Uma Louca Viagem – Volume I

IIII – Tetragrama [+]


— Esse prédio está abandonado há anos. Pelo que
sei está cheio de mendigos.
— Pois é, mas foi de lá que o hack no satélite foi
feito, sem dúvidas.
— Então, pé na tábua Valdir.

Enquanto isso, no Palácio do Planalto, o


presidente olhava as cartas de tarô que tinham
sido deixadas pelo Breno. Ele buscava a carta de
número cinco. Quando a encontrou, ficou olhando
pra ela por alguns instantes. “O que será que vem
agora?”, pensou com seus botões.

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Uma Louca Viagem – Volume I

V – Religião [+]
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Uma Louca Viagem – Volume I

V – Religião [+]
Era quase madrugada. Erick e seus companheiros
observavam o prédio do antigo hospital.

— Algum sinal?
— Sim Adriana. Tem um sinal vindo do terceiro
andar.
— Vocês acham que tem alguém aí? Que esse tal
de L3F0V está dentro desse prédio imundo?
— Seria um excelente esconderijo Luiz. Eu boto fé
que a gente devia entrar lá e pegar ele.
— Calma Jean. Nós nem sabemos se é ele ou ela
ou eles ou elas. Precisamos saber com o que
estamos lidando.
— Você está certa Adriana. Mas o Jean também
está, precisamos entrar para investigar mais de
perto.
— Isso é loucura Erick.
— Pense na grana que vamos receber amiga.
Loucura é não conseguir essa grana por medinho.

— O que estamos fazendo aqui Maia?


— O hack feito no satélite pelo L3F0V teve origem
nesse prédio. Usar um computador na UNB é uma
coisa. Mas esse prédio abandonado realmente
pode ser o covil do L3F0V.
— Será? E o que faremos?
— Acho que teremos que entrar.
— Mas como? Todas as entradas estão fechadas.
Esse prédio está abandonado. Até as entradas de
ar-condicionado estão bloqueadas.
— Daremos um jeito.

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Uma Louca Viagem – Volume I

V – Religião [+]
A equipe do Erick estava posicionada num prédio
que ficava do outro lado da via W5, quase de
frente para o prédio abandonado do hospital.
Maia e Felipe haviam estacionado o carro na via
W4, que fica do outro lado da via W5, de modo
que eles não foram vistos pela equipe do Erick.
Uns analisavam o prédio pela frente e os outros
pelos fundos.

Foi quando o carro que o Valdir dirigia se


aproximou do prédio pela W5. Eles não estavam
num carro oficial para não chamar atenção. A
equipe do Erick avistou o carro parando na frente
do prédio e viu que quatro homens desceram
dele.

Erick pensou: “É isso, é o grupo L3F0V. Vou


matá-los. Então terei o meu lugar na ordem de
forma antecipada e merecida.”

— O sinal vem do terceiro andar. Existe apenas


uma pessoa no prédio e também está no terceiro
andar.
— Tem certeza Alex?
— Sim. Fiz todo o mapeamento enquanto
vínhamos pra cá. O sensor térmico aponta
somente essa pessoa no prédio. Deve ser ele.
Vamos entrar.
— Isso está com cara de armadilha. Não estou
gostando nenhum pouco.
— Pedro, não temos tempo a perder.

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Uma Louca Viagem – Volume I

V – Religião [+]
— Você não está pensando direito Alex. Porque
um cara como o L3F0V ficaria num prédio desses
abandonado e sozinho?
— Ora, exatamente por isso, porque ninguém
esperaria que ele fizesse isso.
— Pessoal, acho que esse cara não age sozinho.
Embora tenha apenas uma pessoa no prédio,
pode ser ele ou um de seus lacaios. Pode
aparecer mais gente enquanto estivermos lá
dentro.
— É verdade Valdir. Eu e o Alex vamos entrar.
Breno, observe a frente do prédio. Valdir, vá para
os fundos. Qualquer movimento suspeito vocês
nos avisam. Não fiquem à vista, escondam-se.

Ao chegar nos fundos do prédio, Valdir se depara


com Maia e Felipe tentando entrar.

— Vocês de novo! Como conseguiram chegar


aqui? Vocês colocaram uma escuta na gente?
— Não amigo, nós seguimos uma pista e aqui
estamos.
— Aqui é perigoso. Vão embora ou vou avisar ao
delegado Pedro. Acho que ele não será tão
complacente com vocês dessa vez.

Enquanto ainda falavam, ouviram tiros de dentro


do prédio.

— Valdir, Breno, subam aqui, precisamos de


apoio urgente, eu e o Alex estamos sendo
atacados.

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Uma Louca Viagem – Volume I

V – Religião [+]
O grupo do Erick havia encontrado uma
passagem subterrânea que levava ao prédio e
interceptou o Pedro e o Alex no segundo andar.
Assim que o Erick avistou os dois, sacou uma
pistola e começou a atirar. Adriana, Luiz e Jean
ficaram atônitos. Não esperavam que Erick
estivesse armado.

Após o primeiro tiro, o delegado Pedro sacou sua


arma e atirou na direção de onde os tiros
estavam vindo. Nesse momento, Erick já estava
atrás de uma parede atirando, mas não avisou o
seu grupo que faria isso. Eles foram pegos de
surpresa. Jean se jogou no chão e puxou Adriana
no reflexo.

Logo depois viram o corpo do Luiz cair com um


tiro no olho e outro no peito. Morte instantânea.

— Erick, para com isso cara! A gente vai morrer!


Não estamos armados! — Jean agora estava
aterrorizado.

Mas Erick não ouvia. Já estava recarregando a


pistola. Não tinha nenhum tipo de treinamento. O
máximo que tinha feito era dado alguns tiros no
Clube de Tiro Esportivo. Ele não contava que
estivesse enfrentando pessoas altamente
treinadas no lado de lá.

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Uma Louca Viagem – Volume I

V – Religião [+]
Adriana estava apavorada. Quando Erick começou
a atirar de novo ela levantou e saiu correndo.
Levou um tiro nas costas do próprio Erick. O tiro
pegou no coração. Ela ficaria ainda viva por
alguns instantes, mas seus últimos suspiros
seriam dados naquele chão imundo.

Valdir e Breno estavam subindo as escadas. Erick


avistou os dois.

Valdir era um perito de TI. Tinha o treinamento


devido em combate, mas não ligava muito pra
isso. Seu foco era em TI. Talvez por conta disso
tenha sido tão afoito. Ele levou um tiro na cabeça
desferido pelo Erick.

— Eles mataram o Valdir! Delegado Pedro, eles


mataram o Valdir! — Breno repetia no rádio.

Quando o Erick ouviu “delegado Pedro”, seu corpo


gelou. Ele estava enfrentando as pessoas erradas.
Precisava sair dali. Ele olhou para o Luiz morto.
Viu Adriana caída, imóvel. Pensava: “Como é que
eu vou sair daqui?”. Foi então que ele olhou para
o Jean e teve uma ideia.

— Jean. Precisamos sair daqui. Esse pessoal que


está atirando é da polícia.
— O que? E agora Erick?
— Calma, eu tenho um plano. Venha até aqui.

Jean se arrastou até onde o Erick estava.

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Uma Louca Viagem – Volume I

V – Religião [+]
— Levanta.

Assim que ele levantou o Erick desferiu um golpe


com uma faca na barriga dele. Um golpe desses
não costuma matar na hora. Jean olhou para ele
sem entender porque ele tinha feito aquilo. Ele
então virou o Jean e o empurrou na direção
oposta. E gritou:

— Vou matar todos vocês!

Nesse momento o delegado Pedro avistou uma


pessoa indo em direção a eles. Jean tentava falar
alguma coisa, mas não tinha forças. Ele tinha
medo que Erick atirasse por trás. Sua esperança
seria pedir ajuda da polícia que ali estava.

Mas os membros da polícia estavam com os


nervos a flor da pele. Afinal, um dos seus havia
morrido através das mãos desses loucos. Quando
viram o Jean se aproximando, não pensaram
duas vezes. Atiraram. Tanto o Alex, quanto o
delegado Pedro atiraram nele várias vezes.

Foi a oportunidade para o Erick fugir. Ele limpou


suas digitais da arma e a soltou no chão e voltou
pelo mesmo caminho que havia entrado.

Breno subiu as escadas que levavam ao segundo


andar e viu os três mortos.

— Cadê o Valdir?
— Está morto delegado. Lá nas escadas.

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Uma Louca Viagem – Volume I

V – Religião [+]
Ao se aproximarem do corpo, lá estavam o Felipe
e a Maia.

— Eles estavam lá fora delegado, xeretando.

— Não temos nada a ver com isso amigo.


Estamos apenas querendo...
— Um furo. Eu sei repórter, vocês só querem um
furo. É só disso que se trata para vocês.

Pedro estava visivelmente abatido. Ele não


esperava perder seu parceiro dessa forma. Ele
havia trabalhado com Valdir em vários casos.

— O Valdir tinha esposa e dois filhos. Era muito


trabalhador. Muito inteligente e esforçado. Não
merecia morrer dessa forma. Agora vamos ver os
vagabundos que foram responsáveis por isso.

Os três subiram a escada. Os outros dois


acompanharam, mas “de fininho” para não serem
enxotados dali. Parecia que o delegado Pedro
ainda não tinha se apercebido da situação. Por
que ele não os expulsava logo dali? Por que não
os prendia logo?

— São dois homens e uma mulher delegado.


— Quantas armas?
— A mulher não tem armas. Esse aqui de óculos
também não.
— E esse daí que matamos por último Alex?
— Esse, além de não ter armas, ainda está com
uma faca enfiada na barriga.

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Uma Louca Viagem – Volume I

V – Religião [+]
— Tem uma arma aqui delegado!
— Onde Breno?
— Aqui no chão. Vou coletar para a perícia pegar
as digitais.
— Temos que identificar esses corpos o mais
rápido possível.
— Será que trabalham para o L3F0V delegado?
— É isso que temos que descobrir Breno.

— Esse aqui eu conheço.


— Como assim repórter?
— No ano passado enfrentamos uma situação de
falha de segurança no jornal em São Paulo e
contratamos uma empresa do Rio de Janeiro para
prestar consultoria pra gente. Eles enviaram um
cara para resolver o assunto. Um tal de Luiz. É
esse cara aqui, tenho certeza absoluta.

Enquanto ele falava, o delegado Pedro percebeu


que Maia não estava entre eles.

— Cadê a moça?

— É melhor vocês virem aqui em cima!

Os quatro sobem correndo até o terceiro andar.


Ao chegarem lá se deparam com vários corpos de
mendigos. O mau cheiro está forte.

— É delegado, agora sabemos o que houve com


os mendigos que habitavam o prédio.
— Sim Breno, lamentável.

80
Uma Louca Viagem – Volume I

V – Religião [+]
— Esse é o corpo que vocês devem observar. —
Maia aponta para um corpo que se encontra
sentado numa cadeira.
— Esse cara está vivo! É dele a assinatura de
calor que recebemos anteriormente.
— Sério? Não parece. — Maia parece surpresa
com o fato daquele homem ainda estar vivo.
— Alex, você trouxe a lanterna? Preciso filmar
isso.
— Não Breno.
— Eu tenho uma.
— Pois ligue sua lanterna repórter. Breno, filme
com cuidado, pode ser uma armadilha. Qualquer
pista que observar fale na hora.
— Se ele estiver vivo, temos que chamar uma
ambulância.
— Só depois que nos certificarmos que não se
trata de uma armadilha repórter. Agora ligue a
lanterna.

O repórter Felipe ligou sua lanterna e eles


puderam ver com mais detalhes aquela cena
surreal.

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Uma Louca Viagem – Volume I

V – Religião [+]
Tratava-se de um homem, sentado numa cadeira.
O homem era muito gordo, devia pesar uns 150
quilos no mínimo. Estava sem as mãos e sem os
pés. Parecia que haviam sido removidos
cirurgicamente. Na sua cabeça havia uma coroa,
parecida com uma tiara. Seu braço direito estava
colado junto ao corpo, na altura do peito, ao
passo que o braço esquerdo estava levantado ao
lado da cabeça. Nos punhos dava para ver o
desenho de uma cruz. Não era uma cruz comum,
parecia aquela cruz que vemos nas caixas de
primeiros socorros, mas na cor preta. Seu braço
esquerdo conseguia ficar erguido porque estava
pregado numa espécie de bastão que estava
fixado no chão e ia até a altura da cabeça. No
topo do bastão pode-se ver uma cruz de sete
pontas. Está coberto por um pano azul, sendo que
um pequeno pedaço de pano vermelho foi
colocado sobre os ombros.

— Sem dúvida esse cenário faz referência à carta


do Papa.
— Carta do Papa? Isso tem a ver com tarô? —
Perguntou Maia com uma cara de surpresa.

O delegado Pedro ficou chateado quando o Breno


falou sobre as cartas, revelando parte da
investigação. Mas agora era tarde. Se aquela
moça e o repórter pudessem ajudar, que
ajudassem. Se fossem atrapalhar, ele os
prenderiam.

82
Uma Louca Viagem – Volume I

V – Religião [+]
Breno ficou meio assustado depois que falou
sobre a carta e viu a reação de Maia. Olhou para
o delegado Pedro, que acenou com a cabeça,
indicando que não havia problema.

— Parece que não existem armadilhas.


— Tem certeza Alex?
— Sim, vamos olhar mais de perto.

Alex começou a analisar o corpo mais de perto e


percebeu que os olhos haviam sido retirados,
assim como a língua. Os ouvidos estavam
furados. Ou seja, o homem não poderia falar,
ouvir, ver, pegar ou andar, nada disso. Cruel.

— Ele não tem mais esperança. Está morrendo. É


uma questão de minutos agora.

Dentre as muitas atribuições de Alex, ele tinha


feito um treinamento com os melhores socorristas
e paramédicos dos Estados Unidos, num
intercâmbio ocorrido há alguns anos.

Alex removeu a coroa.

— Espere aí. Eu conheço esse cara! É um


deputado! Tenho certeza. É o presidente do
conselho de ética. Ele se orgulha de ser o político
mais honesto do Brasil.
— Calma repórter. Breno, está filmando tudo.
— Sim senhor.

83
Uma Louca Viagem – Volume I

V – Religião [+]
Quando Alex removeu a coroa, deu pra notar uma
palavra entalhada na testa do tal deputado, agora
morto: “saligia”. Ele falou a palavra em voz alta.

— O que significa isso Breno?


— Não sei. Nunca ouvi falar disso senhor. Vou
pesquisar na Internet.
— Não precisa. Essa palavra representa as iniciais
das palavras que denominam os sete pecados
capitais em latim.
— E como é que você sabe disso moça?
— Eu leio quase 100 livros por ano.
— Engraçado você ter mencionado o Papa. —
Falou Felipe olhando para o Breno.
— E o que é que tem de engraçado nisso
repórter?
— É que esse deputado era um Padre e se
envolveu na política. Daí ele ganhou o mandato
para Deputado Federal. Não foi só ele, existem
alguns padres e freis que participaram do último
pleito. A Igreja Católica é contra essa atitude. A
Igreja Católica no Brasil, através de um
arcebispo, publicou uma norma que determinou a
suspensão do uso da ordem de todos os padres
que estivessem envolvidos na política partidária.
Assim, eles ficaram impedidos de celebrar os
sacramentos, sobretudo missas e confissões, pelo
período da campanha política ou durante todo o
período de mandato para o qual tenham sido
eleitos. Um colega do jornal cobriu essa matéria e
eu acompanhei o caso. Esse deputado era um dos
tais que foi impedido.

84
Uma Louca Viagem – Volume I

V – Religião [+]
— Isso talvez queira dizer que o ataque do L3F0V
dessa vez foi direcionado para um político
religioso. Talvez, na visão dele, política e religião
não devam se misturar.
— Pode ser isso mesmo Breno. Mas porque ele
colocaria essa palavra dos sete pecados capitais
na testa desse deputado?
— Pelo que estou pesquisando aqui sobre a carta
do Papa, essa cruz de sete pontas pode
representar as sete virtudes ou os sete pecados
capitais.
— Tem mais coisa aqui pessoal.
— O que é Alex?

Alex havia retirado os panos que cobriam o morto


e viu algumas marcas no seu peito.

— Essas marcas foram entalhadas na carne,


similar ao que foi feito com o Presidente do
Senado. São códigos e estão dispostos da mesma
forma que essa cruz de sete pontas, um está
acima e os demais estão abaixo, em duas
colunas. Os códigos estão em pares. São
coordenadas, sem dúvida. Breno, traça essa
primeira coordenada no teu dispositivo e veja
onde dá.
— Estranho. É exatamente onde estamos.

Os cinco se entreolharam. Olharam para os lados,


para baixo. Estavam raciocinando. O que aquilo
queria dizer? Alguém falaria primeiro para dar sua
opinião. E foi o repórter.

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Uma Louca Viagem – Volume I

V – Religião [+]
— Eu já sei. Esse deputado é o primeiro morto.
Existem outros seis que estão nas coordenadas
no peito dele.
— Pensei a mesma coisa repórter. Imagino que
ele queira matar sete políticos que estejam
vinculados aos pecados capitais.
— Isso mesmo senhor, foi o que eu pensei
também. Provavelmente esse primeiro esteja
ligado ao pecado da gula, por ser tão gordo. O
restante da simbologia no corpo seria para
vincular à carta do Papa.
— Pode ser isso mesmo Breno. Como o L3F0V
está punindo políticos e chegou numa carta que
remete à religião, não ficaria surpreso se os
demais corpos encontrados sejam de políticos
religiosos.
— Tem mais uma coisa.
— O que é moça?
— A palavra na testa dele, que remete aos
pecados capitais. Provavelmente esse deputado
represente os sete pecados e ao mesmo tempo
apenas o primeiro, o que aponta para a primeira
letra da palavra “saligia”. As demais coordenadas
devem combinar com as demais letras.
— E qual seria a ordem dos pecados moça?
— Soberba, em latim superbia. Avareza, em latim
avaritia. Luxúria, em latim luxuria. Inveja, em
latim invidia. Gula, em latim gula. Ira, em latim
ira. Preguiça, em latim arcidia. As primeiras letras
das palavas no latim formam a palavra que está
na testa dele: “saligia”.
— Você lê 100 livros por mês e ainda decora tudo
isso?

86
Uma Louca Viagem – Volume I

V – Religião [+]
— Eu tenho memória fotográfica.
— Então você quer dizer que esse deputado
representa tanto os sete pecados capitais como
apenas o primeiro deles, a soberba?
— Sim Breno. Isso explicaria a razão da palavra
se encontrar na testa dele e também de a
primeira coordenada apontar exatamente para
onde ele se encontra, que é aqui onde nós
estamos nesse exato momento.
— Tem mais uma coisa. — Alex agora examinava
as costas do defunto. — Tem um versículo bíblico
escrito nas costas dele: Isaías 14:12.
— Isso só confirma o que eu já falei, que esse
deputado aí representa o pecado da Soberba, do
Orgulho. Esse versículo fala de Lúcifer, que é
vinculado ao pecado capital do Orgulho.
— Certo moça, parece que você tem razão.
— E agora delegado? O que faremos? Alertamos
os ministros e o presidente?
— Estamos sem tempo Alex. Talvez essas
coordenadas tenham corpos, talvez não. Podem
conter pistas ou armadilhas. Precisamos de
respostas concretas. Não quero mais levar
“achismos” para o presidente. Breno, as outras
seis coordenadas apontam pra onde?

Breno vai traçando cada uma das coordenadas e


informando sua localização. Desconsiderou a
primeira, visto que se tratava do local onde já
estavam:

87
Uma Louca Viagem – Volume I

V – Religião [+]
2. Estádio Nacional.
3. UNB.
4. Parque Ecológico Dom Bosco.
5. Lago Sul.
6. Jardim Botânico.
7. Base Aérea. Mais especificamente no Hospital
de Força Aérea.

— Acabei de marcar os pontos no mapa. Nossa!


Os pontos formam...
— Uma Estrela Setenária. — Completou Maia.

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Uma Louca Viagem – Volume I

V – Religião [+]
— E o que é isso moça?
— Foi utilizada nos primórdios do cristianismo
dentro da magia cristã. Os padres do deserto
utilizavam como instrumento meditativo e de
autoanalise. São Tomás de Aquino utilizou a
Estrela Setenária para desenvolver seu trabalho
sobre as virtudes e os defeitos do homem, o que
nos traz aos pecados capitais. Sete pontas, sete
pecados.
— É Breno, parece que você achou sua alma
gêmea desses assuntos malucos. Essa moça é
doida que nem você.

Breno riu e já estava olhando Maia com um olhar


um pouquinho diferente. Tinha algumas
“borboletas” na sua barriga também. Maia
desconversou.

— E agora? O que o senhor vai fazer?


— Bom moça, somos cinco e temos seis pontos
para analisar. Está amanhecendo. Nosso tempo
está acabando. Se cada um de nós fosse para um
ponto ganharíamos tempo. Mas, ao mesmo
tempo, é muito arriscado.

Todos afirmaram que estavam dispostos a correr


o risco.

— Muito bem. Vocês tem um carro?


— Sim, estamos no meu carro. Mas o Felipe está
com um carro alugado no hotel. Ele pode dispor
dele.

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Uma Louca Viagem – Volume I

V – Religião [+]
— OK. Vão até o hotel e peguem o carro. Você
fica com o ponto 2 repórter e você vai até o ponto
3 moça. Vou conseguir outros dois carros aqui
perto. Daí seguirei para o ponto 4. Breno vai para
o ponto 5 e o Alex para o ponto 6. Filmem tudo,
mas não percam muito tempo. Temos que nos
encontrar no ponto 7 antes das 15 horas. Isso
nos dá algumas horas para analisar o que temos
no ponto 7 e fazermos um apanhado geral antes
de eu me encontrar novamente com o presidente,
o que deve ocorrer logo mais a noite. Lembrem-
se: temos que manter a discrição. Não sabemos o
que vamos encontrar, tenham cuidado. Ficaremos
em contato direto uns com os outros.
— E o Valdir, o que faremos com o corpo dele?
— Vou acionar o Ministro da Justiça para enviar
uma pequena equipe pra cá para fazer a perícia
completa desse local. Eles deverão coletar os
corpos, incluindo o do Valdir. É o que posso fazer,
dadas as circunstâncias.

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Uma Louca Viagem – Volume I

VI – Infidelidade [-]
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Uma Louca Viagem – Volume I

VI – Infidelidade [-]
— Seu filho já ligou?
— Ainda não. Já tentei entrar em contato com ele
e com seus companheiros, mas não tenho
retorno.
— O tempo está acabando. Amanhã já é o dia 27.
O que faremos?
— Receio que teremos que seguir o protocolo de
segurança definido.
— Sim. Pelo menos no prédio do Congresso
estaremos todos a salvo.
— O Ministro da Defesa avisou que o Exército
ficará em volta do prédio. Não tem como haver
um ataque lá. Será o lugar mais seguro do país.
— Estou preocupado com o Erick. Estou com um
mal pressentimento.
— Bom, agora é esperar ele entrar em contato.
— Eu deveria tê-lo forçado a dizer a localização.
— Agora é tarde. Segundo o Ministro da Defesa,
devemos chegar ao prédio do Congresso antes da
meia-noite, ainda no dia 26.
— Esses caras conseguiram o que queriam. Nos
colocar como reféns dentro de um prédio. E o que
garante que eles não nos atacarão no dia 28 ou
em qualquer outro dia?
— Segundo o Ministro, eles estão chegando cada
vez mais perto de pegar os terroristas. Se
passarmos do dia 27 e nada ocorrer, a população
verá que ainda temos o controle da situação,
mesmo que seja com a ajuda das forças armadas.
Será uma derrota para o L3F0V.
— Entendi. É o jeito então. Espero que, até lá, eu
tenha notícias do Erick.

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Uma Louca Viagem – Volume I

VI – Infidelidade [-]
— (risos) Vocês estarão exatamente onde eu
gostaria que estivessem. E todos juntinhos, para
terem o mesmo fim. — L3F0V, que ouvia tudo o
que eles falavam, estava confiante no seu plano.

No Palácio do Planalto, o presidente estava


reunido com os ministros da defesa e da justiça.
Vários outros ministros esperavam para saber as
novidades. Líderes de diversos partidos, aliados e
da oposição, também estavam lá para ficar em
sintonia com o governo. Afinal, estavam todos no
mesmo barco e estavam com muito medo.

Não muito longe dali, Felipe chegava no Estadio


Nacional.

— Como é que eu vou encontrar um corpo aqui?


Será mesmo um corpo o que estou procurando?

Felipe deu algumas voltas de carro por ali, sem


perceber nada diferente. Pensou em pedir para
entrar no estádio e investigar lá por dentro. Mas
como conseguiria tal autorização? O que falaria?
Que estava fazendo uma matéria sobre o estádio?
É, poderia ser. Ele resolveu descer do carro e
andar um pouco pelo estacionamento para
organizar as ideias. Foi quando avistou um carro
oficial estacionado ali, um pouco escondido. Ele
resolveu se aproximar do carro e já viu que tinha
algo estranho.

93
Uma Louca Viagem – Volume I

VI – Infidelidade [-]
No capô do carro tinha uma imagem desenhada,
parecia mais um adesivo grande colado.
Certamente um carro oficial do governo não teria
nada parecido com aquilo. A imagem era confusa.
Era uma criatura com pernas estranhas e uma
cauda de serpente. Tinha três cabeças, sendo
uma de homem cuspindo fogo, uma de carneiro e
uma de touro. Montava um leão com asas.

Felipe não era muito religioso, mas seus pais


tinham se convertido há alguns anos como
evangélicos e ele, de vez em quando, frequentava
os cultos. Alguma coisa acaba ficando na cabeça
da pessoa. Ele estava com receio do que estava
vendo nesse caso. Mas, um jornalista
investigativo não pode ter preconceitos. Precisa
investigar e mostrar as coisas como elas são. Ele
imaginava como seria o seu artigo. Talvez
escrevesse até um livro. Quais prêmios ganharia?
Tudo isso passava por sua cabeça durante aquele
momento. Estava excitado. Ansioso.

Ele tratou de tirar várias fotos e filmar tudo


aquilo. Não dava pra ver o que tinha dentro do
carro. Ele abriu a porta da frente. Nada. Mas
tinha alguém sentado atrás.

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Uma Louca Viagem – Volume I

VI – Infidelidade [-]
Sim, era um corpo. Ele identificou logo o corpo.
Tratava-se de um deputado federal evangélico,
um pastor. O deputado estava nu, com uma
boneca inflável ao lado. Na sua boca foi deixado
um pênis de borracha, desses que se compra em
lojas eróticas. Seus braços estavam cheios de
pulseiras de bijuteria. Seu pescoço estava cheio
de correntes, também de bijuteria. Cada um de
seus dedos tinha três anéis. Ele estava com um
pênis de borracha enfiado no ânus. Nas suas
costas havia um versículo da bíblia:
Deuteronômio 30:15.

Felipe filmou tudo. Estava quase vomitando. O


mau cheiro do corpo ainda não estava forte, mas
a cena dava náuseas. Ele entrou em contato com
o delegado Pedro e contou o que vira. Pedro disse
que mandaria uma equipe e pediu para ele se
dirigir para o ponto 7.

Maia já estava na UNB e recebeu as informações


do Felipe. De fato, estavam eles atrás de corpos.
Era quase certo que eram corpos de políticos
envolvidos com religião de alguma forma. Dois
corpos comprovavam isso, além de todos os
sinais.

A localização dada a Maia a levou para perto da


faculdade de Educação Física na UNB. Mais
precisamente perto de várias quadras que ficam
entre a faculdade e o lago.

95
Uma Louca Viagem – Volume I

VI – Infidelidade [-]
Ela caminhou por ali durante um tempo sem
encontrar nada que fosse diferente ou estranho,
até que avistou uma estátua da altura de uma
pessoa, perto de uma árvore.

Havia alguns alunos ali junto com um professor,


já no final de uma aula. Ela perguntou
discretamente para o professor que estátua era
aquela. Ele disse que nunca tinha visto aquela
estátua, até o dia anterior ela não estava ali.
Provavelmente era mais uma das loucuras do
Reitor.

Maia então se aproximou da estátua. A estátua


representava uma mulher horrível, com as roupas
rasgadas, seios de fora, cobras na cabeça, como
a medusa, comendo um fruto, parecido com a
maçã. Maia fez uma pesquisa rápida na Internet.
Tratava-se de uma gravura do século 16 feita por
Sebastián de Covarrubias que recebeu o título “A
Inveja”.

Maia entrou em contato com Pedro.

— Encontrei.
— De quem é o corpo?
— Na verdade, não é um corpo. É uma estátua
que representa a Inveja. A estátua foi feita com
base numa tela do século 16.
— Tem alguma pista?
— Na barriga dela tem um versículo bíblico:
Provérbios 14:12.
— OK. Tire fotos, filme tudo e vá para o ponto 7.

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Uma Louca Viagem – Volume I

VI – Infidelidade [-]
E assim ela fez.

Pedro já estava no Parque Ecológico Dom Bosco


quando recebeu os contatos de Felipe e Maia. Mas
não conseguira encontrar nada até então. Ora,
ele procurava por um corpo. Mas quando Maia
falou que achou uma estátua, sua mente ficou
mais aberta. Poderia estar procurando por outra
coisa. Ele então se aproximou de uma pirâmide
que se encontra no parque e finalmente viu algo
estranho.

A pirâmide tinha recebido um adesivo grande com


o desenho de uma figura macabra. Era um
monstro horrível sentado numa cadeira ou banco
de madeira, com chifres, orelhas pontudas. Pés e
mãos com garras imensas. Nu. O braço direito
descansava sobre a perna direita com a mão
apontando para baixo. Não dava pra ver o braço
esquerdo, mas era possível enxergar a mão
esquerda que segurava a própria cauda pelas
costas.

— Que loucura. Esses doidos estão com a cabeça


onde? Isso é coisa do Diabo!

Abaixo da figura sombria havia a indicação de um


texto da bíblia: Mateus 7:13-14.

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Uma Louca Viagem – Volume I

VI – Infidelidade [-]
Pedro entrou em contato com Breno e contou o
que viu. Perguntou se ele já havia tido sucesso.
Ele disse que sim, e que já estava se dirigindo
para o ponto 7. Pedro confirmou que também
estava indo pra lá.

Provavelmente o trabalho do Breno foi o mais


fácil. Ele se dirigiu ao ponto marcado no Lago Sul.
Tratava-se da casa de um Senador, que é
também evangélico. Isso já dizia muita coisa. Ele
então começou a observar a casa e logo viu uma
pichação com a palavra “mamon”, seguida de um
texto bíblico: Deuteronômio 30:19. Ele filmou e
tirou fotos.

O trabalho do Alex não foi assim tão fácil.


Provavelmente foi o mais difícil. Ele foi para o
ponto de localização que se encontrava dentro do
jardim botânico de Brasília. O local é imenso.
Todos já haviam chegado ao ponto 7, menos o
Alex, que ainda não havia localizado o que estava
procurando no ponto 6. Ele recebe uma chamada.

— Alex, o ponto onde você está foi marcado para


a Gula. Procure algo que tenha a ver com esse
pecado capital.
— Certo Maia. Estou ciente disso. Mas está muito
difícil. Não vejo nada de estranho. A não ser...
— O que foi?
— Eu vi um boi morto cheio de moscas aqui
perto. Foi o que vi de mais estranho aqui.
— Então é isso. O deus da gula é Belzebu e seu
símbolo...

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Uma Louca Viagem – Volume I

VI – Infidelidade [-]
— Já sei, é um boi.
— Não! São as moscas.

Pedro assume o diálogo.

— Alex, investigue esse animal morto. Caso não


encontre nada, venha pra cá. Já vamos entrar no
Hospital de Força Aérea.

Alex encontra o boi morto. Tem muitas moscas e


o mal cheiro é insuportável. Mas realmente tem
algo estranho ali. O boi pode ser avistado através
de uma cerca e está de costas. Ele então pula a
cerca para se aproximar do animal. Grande é a
surpresa quando ele percebe que o animal não
tem vísceras, mas sim um corpo humano morto
na sua barriga.

Ele tira o corpo de dentro da barriga do boi. O


corpo está dentro de um saco plástico bem
resistente. Ele rasga o saco e retira o corpo. Ele
vê logo que se trata de um Deputado Federal
muito conhecido, um pastor evangélico. Sua boca
está cheia de moscas mortas. Suas costas contêm
um texto bíblico entalhado na carne: Jeremias
21:8. Alex avisa a Pedro, que informa que vai
enviar uma equipe forense pra lá também.

99
Uma Louca Viagem – Volume I

VI – Infidelidade [-]
No Hospital de Força Aérea, Pedro está com
dificuldades de entrar para iniciar a investigação
no local. O diretor não entende o que ele quer
fazer ali. A segurança no prédio é total. Na
concepção do diretor, não existe possibilidade de
ter havido uma falha de segurança.

Pedro é forçado a pedir que o Ministro da Defesa


interceda. Finalmente consegue autorização para
entrar. O lugar é enorme. A noite está chegando.
Pedro tem um faro investigativo apurado. Ele
percebe um burburinho diferente entre as
pessoas que trabalham ali. Resolve perguntar o
que está havendo.

Um enfermeiro mostra para Pedro do que se


trata. Naquela tarde, por volta das 15 horas, os
que trabalhavam ali receberam uma mensagem
ao mesmo tempo no celular.

A mensagem era a seguinte: “Para Pedro: Salmos


1:1”. Após a mensagem, cada celular emitiu um
som irritante e ficou travado.

Quem passou pela experiência ficou muito


irritado.

O burburinho era por conta desse evento. O povo


ali se perguntava quem era o tal Pedro e por que
eles haviam recebido aquela mensagem. Teria
algo a ver com a mensagem que o país inteiro
havia recebido anteriormente?

100
Uma Louca Viagem – Volume I

VI – Infidelidade [-]
Mas aquela equipe já sabia a resposta. A
mensagem foi enviada diretamente para o
delegado Pedro. Mas como isso era possível?
Como L3F0V sabia que Pedro estaria ali às 15
horas? Todos se entreolhavam e pensavam coisas
similares, menos Alex, que ainda não havia
chegado.

— Temos que ir para o Palácio do Planalto. Breno,


contate o Alex e peça para ele ir diretamente pra
lá.

Enquanto Breno conversa com Alex, Pedro se


intromete para lembrá-lo que deve subir as fotos
e vídeos para o servidor seguro para que o Breno
consiga preparar a apresentação para o
presidente no caminho para o Palácio do Planalto.

— Vocês dois não poderão ir conosco para o


Palácio do Planalto. Não preciso nem dizer que
tudo o que ocorreu hoje é totalmente sigiloso. É
questão de segurança nacional. Repórter, você
terá o seu furo, mas agora não é a ocasião.
Entendidos?
— Claro delegado Pedro, não se preocupe.

Quando eles chegaram no Palácio do Planalto, já


estava escuro. Muita gente estava lá. Foram
direto para a sala onde estavam o presidente e os
ministros da justiça e defesa. Mas dessa vez
estavam lá também várias lideranças políticas do
país. Pedro ficou pouco à vontade quando viu
tanta gente.

101
Uma Louca Viagem – Volume I

VI – Infidelidade [-]
— Onde está o Alex, delegado Pedro?
— Está a caminho, senhor presidente.
— Meus sentimentos pelo Valdir. Era uma boa
pessoa.
— Sim senhor. Mas encontraremos o responsável
pela morte dele e dos demais. Onde podemos
apresentar o material?
— Aqui mesmo Pedro. Esses senhores já estão a
par dos acontecimentos e merecem saber tudo o
que foi descoberto hoje.
— Muito bem. Breno, é sua vez.

Breno então começa a mostrar tudo o que foi


gravado durante o dia. Os presentes reagem ao
que veem com medo, agitação, raiva. Sentem-se
impotentes. Tantas excelências e não podem
fazer nada para parar o que está havendo? Sim,
estão totalmente impotentes.

Alex chega e entrega um pendrive para o Pedro.

— Um guarda me entregou. Disse que viu você


deixar cair e pediu para eu lhe dar.

Pedro nunca vira aquele pendrive na vida. Mas


não dava tempo de ver o que tinha nele naquele
momento. Botou no bolso.

102
Uma Louca Viagem – Volume I

VI – Infidelidade [-]
Em resumo, Breno explicou o que significava cada
elemento que tinham encontrado. A explicação
dada para o primeiro deputado foi a mais
extensa, pois envolvia explicar a ligação dele com
a carta do Papa e também com os sete pecados
capitais, sendo que o deputado representava
tanto os sete pecados em conjunto, como apenas
um deles, no caso, o orgulho.

A seguir ele explicou o que significava cada


detalhe do que fora encontrado nos demais
pontos.

— Estádio Nacional: primeiro vemos o carro


oficial do governo utilizado pelo deputado. Essa
imagem que estamos vendo refere-se a
Asmodeus, um dos sete príncipes do inferno. Ele
representa o pecado conhecido como luxúria.
Dentro do carro vemos o corpo do deputado com
vários itens que remetem a esse pecado capital.

— UNB: essa estátua foi feita com base na


gravura denominada Inveja de Sebastián de
Covarrubias feita no século 16. Não preciso dizer
qual é o pecado capital em questão né?

— Parque Ecológico Dom Bosco: essa imagem


tenebrosa que estamos vendo é de Belfegor, um
dos sete príncipes do inferno. Ele representa a
preguiça.

— Lago Sul: a palavra “mamon”. Representa o


pecado da ganância ou avareza.

103
Uma Louca Viagem – Volume I

VI – Infidelidade [-]
— Jardim Botânico: um dos piores, na minha
opinião. Um boi com um corpo humano dentro.
Representa a gula. O fato de haver muitas
moscas no local, inclusive moscas mortas na boca
do deputado encontrado, faz referência a
Belzebu, um dos sete príncipes do inferno. Ele
representa a gula.

— Hospital de Força Aérea: uma mensagem


recebida que foi endereçada diretamente para o
delegado Pedro. Os celulares que receberam a
mensagem ficaram travados, inutilizados. Todos
ficaram irritados. Isso poderia representar a Ira, o
pecado que estava faltando.

Depois da apresentação do Breno, choveram


perguntas. Todos já compreendiam o simbolismo
que L3F0V estava usando, mas uma coisa não se
encaixava. O que tinham a ver aqueles textos
bíblicos com os crimes capitais?

Vejamos:

Deuteronômio 30:15 - Vês aqui, hoje te tenho


proposto a vida e o bem, e a morte e o mal;

Provérbios 14:12 - Há um caminho que ao


homem parece direito, mas o fim dele são os
caminhos da morte.

104
Uma Louca Viagem – Volume I

VI – Infidelidade [-]
Mateus 7:13-14 - Entrai pela porta estreita;
porque larga é a porta, e espaçoso o caminho que
conduz à perdição, e muitos são os que entram
por ela; E porque estreita é a porta, e apertado o
caminho que leva à vida, e poucos há que a
encontrem.

Deuteronômio 30:19 - Os céus e a terra tomo


hoje por testemunhas contra vós, de que te tenho
proposto a vida e a morte, a bênção e a
maldição; escolhe pois a vida, para que vivas, tu
e a tua descendência,

Jeremias 21:8 - E a este povo dirás: Assim diz o


Senhor: Eis que ponho diante de vós o caminho
da vida e o caminho da morte.

Salmos 1:1 - Bem-aventurado o homem que não


anda segundo o conselho dos ímpios, nem se
detém no caminho dos pecadores, nem se
assenta na roda dos escarnecedores.

— Bom senhores. Eu pensei sobre esses textos


bíblicos enquanto preparava essa apresentação
no caminho pra cá. Esses textos são uma pista
para a sexta carta do tarô: Os Namorados ou
Amantes.

105
Uma Louca Viagem – Volume I

VI – Infidelidade [-]

— Observem na carta que temos um homem e


duas mulheres. Dentre as muitas explicações
dadas a essa carta, temos a questão dos dois
caminhos. Os textos bíblicos deixados pelo L3F0V
falam de caminhos que devem ser escolhidos.
Estou certo que tem correlação. Essa carta
costuma ser associada à letra “Y”, que mostra
uma bifurcação. Ou seja, a pessoa começa num
caminho e logo se vê diante de uma escolha. Mas
o que eu sei vai só até aí. Não temos mais
elementos para prever o que vai ocorrer.
— Acho que temos.
— Quais Pedro?

Pedro põe a mão no bolso e pega o pendrive.


Estranhamente existe um Y desenhado nele.

106
Uma Louca Viagem – Volume I

VI – Infidelidade [-]
— Eu recebi esse pendrive há pouco. Me
informaram que eu deixei cair, mas nunca o vi.
Ele tem um Y desenhado. Acho que quer dizer
alguma coisa. Breno, veja o que tem nele.

Breno insere o pendrive no notebook e observa


que contém apenas um vídeo. Ele executa o vídeo
e todos ficaram chocados com o conteúdo.

Uma pessoa com uma máscara se apresenta,


num local escuro, não dá pra saber onde é. A voz
está embaralhada, não se sabe se é homem ou
mulher. O foco está no rosto, que usa uma
máscara. Ele diz:

“Olá, eu sou o L3F0V. Essa mensagem é para


o Presidente da República. A carta dos
Namorados é para o senhor. Ou seja, o
senhor tem uma decisão a tomar. Todos aqui
sabem que o senhor é um homem íntegro. Uma
ovelha no meio de lobos. O senhor merece
governar esse país, mas não com essa corja
que aí se encontra. O senhor deve decidir
agora se fica do lado deles ou do lado do
povo. Os textos são claros: essa é uma
decisão de vida ou morte. Boa sorte.”

Um alvoroço ocorre na sala. Palavras como


“absurdo”, “terrorista”, “desgraçado” e muitos
palavrões podem ser ouvidos.

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Uma Louca Viagem – Volume I

VI – Infidelidade [-]
O Presidente da República fica pensativo e depois
se volta a todos para falar. O Ministro da Justiça
pede silêncio a todos.

— Caros, vivemos numa república democrática.


Temos um governo de coalizão. Esse louco me
apresentou dois caminhos: ficar do lado de vocês
ou do lado do povo. Mas eu vejo apenas um
caminho aí, afinal, vocês são representantes do
povo. Sendo assim, estou com vocês para o que
der e vier.

Muitos aplausos. Gritaria. Vivas.

— (risos) Senhor presidente. Péssima escolha.


Agora seu destino está selado. — L3F0V já sabia
o que aconteceria muito em breve com todos
eles.

— Muito bem. Seguindo o plano de segurança,


vamos todos para o Edifício do Congresso
Nacional. Façamos discursos para elevar o moral
da nação. Estaremos lá eu e o vice-presidente.
Todos verão que os poderes executivo e
legislativo, alvos do ataque desses terroristas,
estão juntos para defender a democracia e as
instituições democráticas do país. — Concluiu o
presidente.

Todos então se dirigiram para o prédio do


Congresso Nacional. Enquanto isso, Pedro chama
Alex e Breno.

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Uma Louca Viagem – Volume I

VI – Infidelidade [-]
— Vamos encontrar com o repórter e a moça.
Precisamos revisar tudo o que temos. Deixamos
passar alguma coisa. São muitos os detalhes.
Cinco cabeças pensam melhor.

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Uma Louca Viagem – Volume I

VII – Realização [+]


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Uma Louca Viagem – Volume I

VII – Realização [+]


Faltando algumas horas para o dia 27, estavam
lá, no Edifício do Congresso Nacional, quase todos
os parlamentares: senadores e deputados, além
do Presidente da República e seu vice. Quase
todos os ministros do executivo estavam lá
também. O setor judiciário não estava
representado. Não existiam ameaças ao setor que
levassem seus membros a ficarem sitiados
daquela forma. A segurança em volta do prédio
era notável. Milhares de homens estavam ao
redor do prédio. As forças armadas foram
convocadas para ajudar na segurança. Era
possível ver tanques. Alguns caças rasgavam o
céu acima do edifício.

Do lado de dentro, os políticos se revesavam na


tribuna, fazendo discursos para a nação. As TVs
câmara e senado jamais foram assistidas por
tantas pessoas ao mesmo tempo. Mas os
discursos eram vazios. Nenhum deles sequer
assumiu algum crime ou entregou o mandato.
Eles achavam que iam sair impunes, como
sempre ocorreu.

A presença de pessoas no prédio estava


rigidamente controlada. Apenas alguns repórteres
bem conhecidos puderam entrar. O cordão de
isolamento era grande. Não era fácil chegar perto
do prédio.

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Uma Louca Viagem – Volume I

VII – Realização [+]


Alguns manifestantes tentaram fazer uma
passeata, um protesto. Foram presos, todos eles.
A ordem era clara: “fiquem em casa, quem
chegar perto do prédio do Congresso Nacional
será preso”.

Pedro está com Alex e Breno se dirigindo para o


hotel onde Felipe e Maia se encontram. Ao
chegarem no estacionamento percebem que há
algo errado. Eles podem ver a Maia dentro do
carro, mas ela parece estar desacordada. Eles
correm e constatam que é isso mesmo. Maia está
inconsciente. Eles a retiram do carro e tentam
reanimá-la. Ela acorda.

— Vocês...Eles...
— Calma, Maia. Respire.

Maia então olha para Alex e diz:

— Eles pegaram o Felipe. Levaram ele.


— Eles quem moça?
— Foi tudo muito rápido delegado. — Maia
começa a sentar levando a mão à cabeça,
enquanto tenta lembrar o que houve. — Nós
chegamos no estacionamento e um carro surgiu
rapidamente. Apontaram armas e fizeram um
sinal para sairmos do carro.

Maia faz uma pausa.

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Uma Louca Viagem – Volume I

VII – Realização [+]


— Eu deixei meu carro estacionado umas
quadras daqui e entrei no carro do Felipe para vir
com ele até o hotel. Depois fizeram um sinal para
que colocássemos a mão no capô. Imaginei que
queriam nos revistar. Eles não falaram nada, pelo
menos não enquanto eu estava acordada. Então
um deles me pegou com um pano no rosto.
Imagino que desmaiei, pois não lembro de mais
nada.
— E porque você afirma que eles levaram o Felipe
moça?
— Ora, se ele não está aqui, é porque foi levado.
— Esse pensamento é muito prematuro. Ele pode
estar no hotel, ou mesmo aqui perto
desacordado. Mas por que alguém iria querer
atacar vocês? Isso é muito estranho.
— Na verdade não acho estranho senhor.
— Por que Alex?
— Ora, os caras do L3F0V devem saber que Maia
e Felipe nos ajudaram e quiseram dar uma lição
neles.
— Não sei não Alex. Não parece a forma de agir
do L3F0V. Tudo tem sido muito bem planejado.
Ele está atacando gente poderosa, os políticos
mais poderosos da nação. Por que perderia tempo
com um repórter e sua assistente?

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Uma Louca Viagem – Volume I

VII – Realização [+]


Breno está olhando pra eles pensativo, tentando
achar uma resposta lógica para mais esse desafio
que surgiu. Será que L3F0V poderia ter previsto
aquela reunião, e fez um deles desaparecer só
pra eles perderem mais tempo? Perguntas
aparentemente sem sentido como essa lhe
passavam pela cabeça. Mas ele não falava nada.
Não queria parecer bobo na frente dos demais.

— O que foi Breno?


— Nada senhor, só tentando entender o que se
passa. Tentando achar uma resposta lógica para
mais esse desafio.
— Nosso tempo está acabando pessoal. Daqui há
algumas horas será o dia 27.
— Sim. Mas não há mais nada que possamos
fazer. Pra falar a verdade não há nada que o
L3F0V também possa fazer.
— Por que Alex?
— Ora, o prédio do congresso está mais seguro
que o pentágono. Todos os políticos estão lá
dentro protegidos. O que o L3F0V pode fazer?
Lançar um míssil lá?
— O que ele fará eu não sei Alex, mas ele vai
fazer alguma coisa. Já me informaram que cinco
deputados e dois senadores estão desaparecidos.
Provavelmente ele fará alguma coisa com eles.
— Meu Deus! Será que ele vai fazer alguma coisa
com o Felipe também?

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Uma Louca Viagem – Volume I

VII – Realização [+]


— Calma moça. Nós vamos descobrir onde ele
está. Breno, tem alguma chance, com base nos
símbolos das cartas, do repórter sofrer algum tipo
de ataque? Existe algum indício de que o L3F0V
poderia atacar a imprensa?
— Delegado, a carta atual, a que parece que será
usada no dia 27, é a carta do Carro ou Charrete.
O L3F0V deixou claro para o presidente que a
carta dos namorados era direcionada pra ele,
para uma decisão que ele devia tomar. Então, a
próxima carta é a do Carro. Suponho que seja
essa que ele usará no seu ataque do dia 27.
— Muito bem. Vamos sair desse estacionamento.
Estamos começando a chamar atenção. Mas antes
de pensarmos um pouco mais sobre a carta,
vamos nos separar e dar uma olhada em volta.
Pode ser que o repórter esteja jogado por aqui.

Eles procuram nos arredores. Vão até o quarto


onde Felipe estava hospedado. Nada. Nem sinal
dele.

Eles então se reagrupam e entram no carro da


polícia. Pedro e Alex na frente. Breno e Maia
atrás.

Breno pega o notebook e mostra sua pesquisa


sobre a carta atual: O Carro.

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Uma Louca Viagem – Volume I

VII – Realização [+]


— Muito bem pessoal. Essa carta pode significar
muita coisa. Dentre elas: vitória, triunfo,
realização e conquista. Uma coisa interessante
que vi sobre ela é que pode significar governo
ilegítimo, situação usurpada e perda de controle.
Pode ser que o L3F0V resolva mostrar que os
governantes que aí estão sejam ilegítimos, pois,
apesar de terem sido colocados lá pelo povo, eles
não agem pelo povo, mas apenas por interesses
próprios.

— Sim. Ao humilhar os políticos mais uma vez, o


L3F0V pode cantar vitória, uma espécie de
triunfo.

116
Uma Louca Viagem – Volume I

VII – Realização [+]


— Breno, moça, já tô vendo que não vamos
chegar a lugar nenhum dessa forma.
Compreender como ele usa as cartas depois de
elas serem usadas ou mesmo tentar entender sua
motivação com base nos símbolos das cartas e no
que elas representam, não nos ajuda muito a
pegar os caras. Precisamos de uma pista que nos
leve a eles.

A imprensa cobria tudo com muito interesse. O


país estava parado, de olho na TV e no Youtube.
As redes sociais bombavam. A imprensa
internacional também acompanhava tudo com
muita atenção. O mundo estava de olho naquele
prédio.

Alguns repórteres afirmavam que aquilo era uma


palhaçada. Como poderia um governo chegar a
esse ponto? Mas os políticos sitiados afirmavam
que iriam provar que ninguém tinha nada a
temer, que a segurança do país e de seus líderes
estava garantida e que em breve eles pegariam
os terroristas que vinham ameaçando as
instituições soberanas.

Dentro do prédio do Congresso as conversas de


pé de ouvido mostravam a apreensão dos que
estavam ali.

— Será que vai acontecer alguma coisa?

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Uma Louca Viagem – Volume I

VII – Realização [+]


— Excelência, estamos protegidos aqui. O
exército está lá fora. Pelo amor de Deus, esses
doidos não poderão fazer nada contra a gente
aqui. Já experimentou os canapés? Estão
deliciosos.
— Já, realmente estão uma maravilha. Mas estou
preocupado, mesmo que nada ocorra no dia 27,
como será daqui pra frente? Às vezes me
arrependo do que fiz.
— Se arrepende? Como assim? De que outra
forma você teria comprado aquela casa? E os
apartamentos? E a fazenda? Mesmo que ocorra
alguma coisa, mesmo que sejamos presos, coisa
que acho muito difícil, em alguns meses
estaremos soltos e teremos a grana que está na
Suíça. Vamos curtir o resto da vida.
— Não pude deixar de ouvir a conversa dos
colegas. Eu também estava preocupado. Mas
tendo a pensar de acordo com vossa excelência.
Não vai acontecer nada demais.
— Daqui a pouco o presidente será convidado a
falar à nação e todos devem estar presentes no
plenário.
— Palhaçada. Mas se é pra mostrar pro povão que
estamos unidos, que seja.

Enquanto isso, próximo ao hotel onde o Felipe


estava hospedado, os quatro estavam dentro do
carro, procurando alguma pista para pegar os
membros do L3F0V. Eles revisavam os
acontecimentos, comparavam com as cartas, com
os símbolos. Era muita coisa para analisar.

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Uma Louca Viagem – Volume I

VII – Realização [+]


— Eu comi alguma coisa que me fez mal.
— Tá sentindo alguma coisa Alex?
— Sim. Preciso ir ao banheiro urgente.
— Vai no banheiro do hotel.
— Sim, vou lá, tem um urubu beliscando minha
cueca.

Alex saiu correndo. Maia olhou para Breno e


disse:

— Meio desnecessária essa última frase hein.


— Pois é, acho que ele nem estava mais
raciocinando direito.

Pedro ficou olhando enquanto Alex corria. Ficou


perdido em seus pensamentos.

Meia noite.

O Presidente da República é convidado a proferir


um discurso à nação do plenário da câmara.
Todos os políticos estavam presentes. Ele foi
ovacionado antes de iniciar o discurso. E então
começou:

“Povo brasileiro. Vocês são hoje


representados pelos que aqui estão:
deputados e senadores dessa república.
Estamos sob ataque de um grupo terrorista.
Eles querem o caos. Mas nós faremos o que
diz a nossa bandeira, traremos a Ordem e o
Progresso.”

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Uma Louca Viagem – Volume I

VII – Realização [+]


Foi interrompido por uma série de aplausos e
gritos dos que ali estavam. Os políticos ali
presentes pareciam eufóricos. Dificilmente se viu
políticos de partidos diferentes unidos numa só
causa. Nesse caso, sua própria sobrevivência. Ao
ver a cena, parecia que todos eles pertenciam ao
mesmo partido e estavam ali aplaudindo seu líder
supremo. O presidente continuou:

“Estamos aqui unidos por um bem maior:


mostrar a todos que o país não será refém
de ninguém. Mostramos a quem quiser ver a
nossa segurança, a nossa soberania. Não
será um bando de loucos que vai destruir a
democracia e as instituições democráticas
do nosso Brasil.”

Enquanto o presidente falava, o vidro do Rolex do


vice-presidente, que estava ao seu lado, quebrou.
Demorou alguns segundos para que o nariz do
vice começasse a sangrar. Ele então levou a mão
à boca. Sangue, muito sangue. Vomitou muito
sangue na frente de todos. O presidente olhava
para a cena perplexo. A mesma perplexidade
podia ser vista nos olhos arregalados das
excelências ali presentes.

Mais um pequeno ruído. Dessa vez foi um broche


de uma senadora que se rompeu. Parecia uma
pequena explosão, quase imperceptível.

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Uma Louca Viagem – Volume I

VII – Realização [+]


Enquanto a senadora tentava compreender o que
ocorrera com seu broche lindo que havia ganho
de presente, o presidente começava a vomitar
sangue. Os membros da mesa também. O vice
ainda conseguiu levantar a cabeça uma vez mais,
apenas para ter seus rosto focado pelas câmeras,
que mostravam seus olhos quase derretidos,
esvaindo-se em sangue.

As pequenas explosões ficaram mais constantes:


relógios, anéis, brincos, cintos, prendedores de
gravata, pulseiras. Foi então que os que estavam
ali presentes perceberam que daquela noite não
escapariam. Alguns tentaram correr, mas isso
não era uma boa ideia. Quem se mexia mais
rápido sentia seus intestinos saindo rapidamente
pelo ânus com muito sangue.

Os repórteres que estavam dentro do prédio


fazendo a cobertura inédita se viram numa
situação inusitada. O maior furo de todos os
tempos significava também a sua morte. Alguns
deles, com o nariz sangrando, narraram os fatos
como conseguiam ver, descreviam o cheiro que
estavam sentido e caiam na frente das câmeras,
mortos.

Entre a morte do vice-presidente e da última


pessoa que morreu, passaram-se apenas três
minutos. Foi tudo muito rápido. Se o país e o
mundo estavam chocados com os acontecimentos
de outrora, esse, sem dúvida, ganharia maior
destaque.

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Uma Louca Viagem – Volume I

VII – Realização [+]


Quase mil pessoas morreram em apenas três
minutos. Mas não morreram por conta de um
acidente, de uma tragédia, como um terremoto.
Não, foram brutalmente assassinadas. Todos se
desmancharam em sangue na frente do país e do
mundo.

O telefone do Pedro toca.

— Senhor, já está a par dos acontecimentos?


— Não, estava ocupado. O que houve?
— Ligue a TV!

Pedro liga a TV do carro e se depara com as


cenas horríveis que estão sendo mostradas.

— Precisamos ir pra lá o mais rápido possível.


Cadê o Alex?
— Foi ao Banheiro. Ainda não voltou.
— Que droga! Vai atrás dele Breno.
— Ali vem ele.
— Vamos cara. Dirige esse carro. Vamos pro
Congresso. AGORA!

Alex entra no carro apressado e começa a dirigir.

— O que houve?
— Um ataque no Congresso.
— O que? Como?
— Não sabemos, mas as cenas são grotescas.
Você consegue dirigir? Não está mal?
— Não senhor, estou bem, pode deixar.

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Uma Louca Viagem – Volume I

VII – Realização [+]


Alex não teve tempo de olhar para a TV. Apenas
dirigiu o mais rápido que pode. O hotel ficava
perto, de modo que eles rapidamente chegaram.
Depois de se identificarem conseguiram chegar ao
perímetro interno mantido pelo exército e por
alguns profissionais de saúde.

— Vocês não podem entrar.


— Como assim? Precisamos tentar salvar alguém
e iniciar a investigação o mais rápido possível.
— Não tem como salvar ninguém, estão todos
mortos. E o que quer que os tenha matado,
poderá te matar também no momento que você
entrar lá. Já temos profissionais de saúde com
roupas e equipamentos especiais analisando o
local. Deixe a gente fazer o nosso trabalho e
depois liberamos o local para sua investigação.

Pedro ficou indignado com o que aquela mulher


lhe falara. Mas ela tinha razão. Sua cabeça estava
prestes a explodir. Como os desgraçados tinham
conseguido realizar tal feito? E toda aquela
segurança?

Pedro e os demais estavam parados depois do


espelho d'água, não muito longe da rampa do
congresso. Eles avistaram três pessoas com
trajes especiais saindo do prédio. Eles estavam
sem proteção na cabeça, pois a traziam na mão.
Se aproximam com um sinal de positivo com o
polegar, indicando que a área já estava segura.

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Uma Louca Viagem – Volume I

VII – Realização [+]


Os três profissionais de saúde que saíram do
prédio se aproximaram da chefe de saúde ali
presente. Pedro, Alex, Breno e Maia estão
próximos e ouvem o relato de um deles:

— Foi um gás. Ainda não sabemos qual foi, mas


foi um gás muito venenoso. Agiu em segundos.
Matou em minutos. Pelas leituras realizadas
através dos equipamentos, o gás tinha um DL50
de 0,1 nanograma/kg.
— O que isso significa? — Pedro estava curioso
para entender o que o profissional de saúde
estava falando.
— DL50 significa dose letal. No caso do gás que
foi utilizado, a dose letal é altíssima. Por isso as
pessoas morreram tão rápido.
— Quando poderemos entrar?
— O ambiente agora está limpo. Mas eu não
aconselharia ninguém a entrar lá. Ficarei
traumatizado pelo resto da vida só pela visão que
acabei de ter ali.
— Nós não temos o privilégio de não querer ver
isso filho. É nosso dever investigar e pegar os
responsáveis. Moça, é melhor você ficar por aqui.
Mas se quiser vir conosco, fique à vontade. Alex,
Breno, vamos lá.

Eles então se aproximaram do prédio. Quando


chegaram na entrada principal, já podiam ver ali
alguns corpos no chão. Foram os que quase
conseguiram sair, os que morreram tentando
escapar daquele triste fim.

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Uma Louca Viagem – Volume I

VII – Realização [+]


Não foi possível segurar alguns repórteres que ali
também chegavam para filmar e tirar fotos. Os
oficiais que faziam a segurança estavam tão
aturdidos que acabaram deixando alguns
passarem, como se pensassem: “isso precisa ser
documentado”.

A coisa foi ficando meio confusa, com muita gente


chegando ao mesmo tempo e querendo entrar no
prédio para ver in loco o que tinha ocorrido, tirar
fotos, filmarem. Foi então que o Pedro solicitou
ao comandante que tomasse as rédeas e não
deixasse ninguém entrar no prédio.

Ao voltar sua atenção para a entrada, Pedro


avistou Alex olhando para aquela cena. Alex
parecia estar maravilhado com o que estava
vendo. Ele não conseguia esconder um sorriso
que pairava no seu rosto. Estaria ele admirado
com aquilo? Afinal, o L3F0V realmente havia
conseguido punir aqueles que ele ameaçou. Ele
realmente conseguiu cumprir sua promessa.
Estaria Alex admirando isso? Será que ele nutria
algum sentimento contra aqueles políticos e
estava, lá no fundo, comemorando aquele
desfecho?

Foi então que algumas cenas dos acontecimentos


recentes começaram a invadir a cabeça de Pedro.
Ele pensou:

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Uma Louca Viagem – Volume I

VII – Realização [+]


“Espera aí. Esse cara é um hacker. Ele nos levou
àquela sala da UNB onde ele mesmo achou
aquele adesivo embaixo do monitor. Será que foi
ele que pregou aquilo lá? De vez em quando o
Alex se comportava como alguém que estava do
lado do L3F0V. Mas será? Qual seria a sua
motivação? No ataque ao ônibus com os
governadores, ele pediu para o presidente se
precaver. Ele parecia prever o que iria acontecer.
Ele já sabia de algo e não contou pra ninguém?
Foi ele quem deixou um programa rodando no
satélite e descobriu o local de onde o hack havia
sido feito, o que nos levou ao local da morte do
Valdir. Lembro que quando chegamos lá, ele quis
entrar de qualquer forma, não se importando com
sua segurança ou a segurança dos demais, como
se já soubesse o que encontraríamos lá.
Evidentemente ele não morreu, mas o Valdir não
teve a mesma sorte. Quando fomos procurar as
pistas deixadas no corpo do deputado que lá
estava, os demais conseguiram encontrar suas
pistas e chegaram logo ao ponto de encontro,
mas não o Alex. Ele chegou só depois, depois que
uma mensagem estranha apareceu e foi
endereçada diretamente para mim. Isso responde
o fato de o L3F0V saber quem eu sou e onde eu
estaria naquele momento. Foi ele que me
entregou aquele pendrive com a mensagem do
L3F0V para o presidente. Meu Deus! Como não
pude perceber isso antes! Estava bem debaixo do
meu nariz.”

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Uma Louca Viagem – Volume I

VII – Realização [+]


Pedro sentiu uma adrenalina no seu corpo. Ele
soube naquele instante que estava olhando para
o culpado. Foi então que ele sacou sua arma e
deu voz de prisão para o Alex.

A imprensa já havia mencionado vez ou outra que


uma equipe de elite estava atrás do L3F0V.
Quando Pedro deu voz de prisão na frente das
câmeras, o público pode ver ao vivo aquele que
poderia ser o seu herói sendo preso. Ao prendê-
lo, Pedro pronunciou as seguintes palavras, que
foram vistas por milhares de pessoas via TV:

— Você está preso por suspeita de colaborar com


o assassinato de centenas de homens públicos,
políticos, dessa nação e também pela morte de
inocentes, que embora não fossem públicos, eram
pessoas importantes para o país e para suas
famílias.

Pedro pensava muito mais no seu amigo Valdir


que nos políticos que ali estavam no chão,
mortos. Talvez isso tenha nublado um pouco sua
visão dos acontecimentos.

Alex ficou perplexo. Foi então que alguns dos


pensamentos que passaram na cabeça de pedro
começaram a passar na cabeça do Alex. Ele
rapidamente chegou à mesma conclusão que
Pedro. Ele procurou rapidamente algum
argumento para se defender. Mas ele era
inteligente o suficiente para não dizer nada. Ele
se defenderia no momento certo.

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Uma Louca Viagem – Volume I

VII – Realização [+]


Maia olhou aquela cena com impassividade. Breno
ficou chocado. Ele ainda não conseguia juntar os
pontos. Porque o Pedro está fazendo isso? Ele não
conseguia entender.

Não muito longe dali, vendo tudo aquilo pela TV,


estavam sete homens amarrados num banco.
Eram os dois senadores e os cinco deputados que
não conseguiram chegar no Congresso.

Uma voz cavernosa saiu de uma caixa de som


que estava ao lado deles:

— Sabe por que vocês não estavam lá? Porque


são honestos. Contra vocês eu não encontrei
nada.

Os homens se entreolharam. Alguns derramaram


lágrimas. Afinal, depois de terem sido pisados e
humilhados pelos seus pares por não se
envolverem na lama onde estavam, eles
conseguiram escapar daquele destino cruel.

— Vocês ajudarão a construir um país melhor,


sem aqueles ratos para atrapalhar.

Os homens não puderam falar nada. Estavam


amordaçados.

— Agora vocês vão dormir. Eu vou soltar um


pequeno gás nessa sala apenas para vocês
relaxarem. Depois vocês serão devolvidos ao seu
mundo. Não esqueçam. Eu estarei de olho.

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Uma Louca Viagem – Volume I

VII – Realização [+]


Os homens ficaram apreensivos quando viram o
gás saindo de um buraco no teto. Provavelmente
pensaram que iam morrer. Se debateram. Mas
logo dormiram. Foram deixados no entorno do
Distrito Federal e logo entraram em contato com
as autoridades, que os pegaram.

— Então é assim que termina. Vocês matam


todos os políticos, dão uma lição no mundo e
instauram o caos total no país.

Felipe estava numa cela. O local era claro, com


luz artificial. Não dava pra saber onde estava.
Poderia ser um presídio, um prédio, um buraco no
chão. Ele só sabia que estava numa cela
confortável. No lado de fora da cela ele podia ver
várias TVs, mas apenas uma delas estava ligada e
nela passavam os últimos acontecimentos.

Felipe acompanhou tudo dali, daquela cela. Perto


da TV estava uma pessoa. Foi ela quem falou há
pouco com os políticos que estavam ali
amarrados em outro recinto. A voz, como
sempre, embaralhada. Felipe ainda não tinha
visto a tal pessoa de perto. Era homem ou
mulher? Seria o líder do L3F0V ou apenas mais
um capacho?

— Vocês terroristas são loucos. Não sabem que


agora haverá uma guerra civil? Vocês trouxeram
o caos para o país. E olhe lá se nós não formos
invadidos por uma potência estrangeira com a
desculpa de trazer paz para a nação.

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Uma Louca Viagem – Volume I

VII – Realização [+]


A figura, ainda de costas, finalmente falou.

— Você fala “vocês”. Não existe “vocês”. Existe


apenas eu. Eu sou o L3F0V. Você está aqui para
uma missão e ficará grato em cumpri-la depois
que eu lhe explicar do que se trata.

CONTINUA NO VOLUME II

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