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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE

CURSO DE JORNALISMO

Maria Ylanna Pires Bezerra

DESINFORMAÇÃO E PANDEMIA:
UMA ANÁLISE DE CONTEÚDO JORNALÍSTICO EM CANAIS
DE EXTREMA DIREITA NO TELEGRAM

Trabalho de conclusão de curso


apresentado como requisito parcial para a
conclusão do curso de Comunicação Social
com Habilitação em Jornalismo.
Orientação: Prof. Dr. Antonino Condorelli

Natal
2022
DESINFORMAÇÃO E PANDEMIA:
UMA ANÁLISE DE CONTEÚDO JORNALÍSTICO EM CANAIS DE
EXTREMA DIREITA NO TELEGRAM

Maria Ylanna Pires Bezerra

Monografia apresentada à
Coordenação do Curso de
Jornalismo da Universidade
Federal do Rio Grande do Norte,
como requisito parcial à obtenção
do Título de Bacharel em
Comunicação social – Habilitação
em jornalismo.

Orientador (a): Prof. Dr. Antonino Condorelli

Natal

Fevereiro, 2022
Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN
Sistema de Bibliotecas - SISBI
Catalogação de Publicação na Fonte. UFRN - Biblioteca Setorial do Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes -
CCHLA
Bezerra, Maria Ylanna Pires.
Desinformação e pandemia: uma análise de conteúdo jornalístico
em canais de extrema direita no Telegram / Maria Ylanna Pires
Bezerra. - Natal, 2022.
65f.: il. color.

Monografia (graduação em Jornalismo) - Centro de Ciências


Humanas, Letras e Artes, Universidade Federal do Rio Grande do
Norte, 2022.
Orientador: Prof. Dr. Antonino Condorelli.

1. Pandemia - Monografia. 2. Desinformação - Monografia. 3.


Extrema direita - Monografia. I. Condorelli, Antonino. II.
Título.

RN/UF/BS-CCHLA CDU 070

Elaborado por Heverton Thiago Luiz da Silva - CRB-15/710


UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE
CURSO DE COMUNICAÇÃO SOCIAL – HABILITAÇÃO EM
JORNALISMO

A Monografia “Desinformação e pandemia: uma análise de conteúdo jornalístico em canais de


extrema-direita no Telegram”

elaborada por Maria Ylanna Pires Bezerra

e aprovada por todos os membros da Banca Examinadora foi aceita pelo Colegiado do Curso de
Comunicação Social- Habilitação em jornalismo e homologada pelos membros da banca, como
requisito parcial à obtenção do título de BACHAREL EM JORNALISMO

Natal, 08 de Fevereiro de 2022

BANCA EXAMINADORA

_________________________________________________
Prof. Dr. Antonino Condorelli – Orientador

_________________________________________________
Profa. Dra. Janina Dias Barcelos – Examinadora 1

_________________________________________________
Prof. Dr. Francisco de Assis Duarte Guimarães – Avaliador 2

_________________________________________________
Nome do Professor Examinador 2 (Afiliação)
RESUMO

O presente trabalho tem por motivação o entendimento das dinâmicas de divulgação e


disseminação de desinformação acerca da pandemia de covid-19 no Brasil em canais pré-
selecionados do aplicativo de mensagens Telegram. A pesquisa tem como corpus de análise os
materiais lidos como jornalísticos ou noticiosos veiculados nestes espaços digitais. Além do
exposto, o estudo se limita a realizar uma análise de conteúdo tendo como foco tópicos e temas
também pré-estabelecidos como vacinação, tratamento precoce e distanciamento social. Devido
à atualidade do tema e considerando o presente cenário, a pesquisa se mostranecessária para refletir
sobre o papel da desinformação sob a opinião pública, no comportamento dos brasileiros e no
alcance dos materiais desinformantes dentro da própria plataforma. Tendo como matéria-prima
os materiais compartilhados nos canais de comunicação dos blogueiros de extrema direita Allan
dos Santos e Bernardo Kuster. Foram utilizada as ferramentas metodológicas de categorização,
análise de conteúdo e interpretação de dados com o objetivo de compreender os processos de
comunicação de maneiralinear e apurada.

Palavras-chave: Desinformação. Análise de conteúdo. Covid-19. Telegram. Brasil.


ABSTRACT

The present study is motivated by the spread app of the covid-19 pandemic in Brazil in pre-
selected channels of the Telegram app. The research has as a corpus of analysis of materials read
as journalistic or news broadcast in these digital. In addition, the study is limited to an analysis of
the treatment focus and themes also presented as pre-established, early content and social
distancing. Due to the public relevance of the topic and considering the present scenario, a
research is necessary to reflect on the role of disinformation in the opinion, in the behavior of
Brazilians and in the reach of disinforming materials within the platform itself. Using as raw
material the materials shared in the communication channels of the extreme right bloggers Allan
dos Santos and Bernardo Küster. Methodological tools for categorization, content analysis and
data interpretation were used in order to understand the communication processes in a linear and
accurate way.

Keywords: Misinformation. Content analysis. Covid-19. telegram. Brazil.


SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO .................................................................................................................................. 9

2. DESINFORMAÇÃO, FUNCIONAMENTO E CONTEXTO POLÍTICO DO TELEGRAM NO


BRASIL ..................................................................................................................................................... 13

3. ANÁLISE DE CONTEÚDO ENQUANTO METODOLOGIA ................................................... 19

4. PRÉ-ANÁLISE NA PRÁTICA ....................................................................................................... 22

5. TRATAMENTO DOS RESULTADOS, A INFERÊNCIA E A INTERPRETAÇÃO ............... 27

6. CONCLUSÃO .................................................................................................................................. 63

7. REFERÊNCIAS ............................................................................................................................... 65
9

1. INTRODUÇÃO

Desde 2020 o mundo tem passado por novos desafios políticos, sanitários,
econômicos e sociais impostos pela pandemia da Covid-19. Ainda no referido ano, frente à
situação de calamidade e aos altos índices de contágio, a Organização Mundial da Saúde
(OMS), caracterizava a situação como emergência de saúde pública e anunciava que o
mundo enfrentaria a primeira crise sanitária do século1 (AGÊNCIA BRASIL, 2020). Não
demorou muito para que os efeitos decorrentes desta crise fossem vistos com mais
intensidade e profundidade ao redor do globo.

Com o avanço da curva de contágio e a negligência na implementação de medidas


de contenção e distanciamento social por parte do poder público, o Brasil consolidou-se
como um dos piores países no combate à pandemia1 (G1, 2021). Durante este período, o
uso de notícias falsas e artifícios de desinformação por parte do governo Federal foram
fatores essenciais para o agravamento do quadro no país. Tal fenômeno foi observado tanto
em comunicações oficiais (ou seja, páginas oficiais de órgãos do Governo na internet,
pronunciamentos e falas direcionadas à imprensa), quanto em comunicações extraoficiais
(canais secundários de comunicação, tais como perfis em redes sociais e espaços na rede
ligados ao Governo Federal).

Tendo em vista o impacto da onda de desinformação, que de acordo com o dicionário


Webster é o ato de divulgar “informação falsa deliberadamente e, muitas vezes
secretamente espalhada (com o plantio de rumores), a fim de influenciar a opinião pública
ou obscurecer a verdade” (MERRIAN-WEBSTER, 2013) – sobre o agravamento da
pandemia no Brasil, a presente pesquisa utiliza a análise de conteúdo com base na
metodologia de Bardin, que consiste em “descobrir os ‘núcleos de sentido’ que compõem
a comunicação e cuja presença, ou frequência de aparição podem significar alguma coisa
para o objectivo analítico escolhido” (BARDIN, 1977, p.105). Neste sentido, a pesquisa
teve o intuito de analisar sob as etapas de pré-anáilise, exploração do material colhido e
interpretação dos dados o teor das mensagens divulgadas em canais de extrema direita no
aplicativo de mensagens Telegram, ligados ideologicamente ao Governo Federal.

Para isso, a pesquisa se delimitou na coleta e interpretação de conteúdos e

1
https://agenciabrasil.ebc.com.br/saude/noticia/2020-01/oms-declara-estado-de-emergencia-global-em-razao-do-
coronavirus
10

informações tidas como “noticiosas” veiculadas em dois canais de extrema direita no


Telegram relacionados ao Presidente Jair Bolsonaro.

1 https://g1.globo.com/mundo/noticia/2021/01/28/brasil-e-pior-pais-do-mundo-na-gestao-da-epidemia-de-covid-

19-aponta-estudo-australiano.ghtml
11

nos seguintes canais de comunicação do Telegram: canal do blogueiro Allan dos Santos 4
(122,425 mil inscritos); e canal do youtuber e blogueiro Bernardo Kuster2 (61,646 mil
inscritos).

Posteriormente, o material foi classificado em categorias de análise, que de acordo


para “determinar as relações entre uma determinada característica (conteúdo) das
comunicações e (a) as características do comunicador, (b) as características da audiência,
ou (c) alguma outra característica (de conteúdo ou não) da comunicação.” (JANIS, 1982 p.
53). A escolha dos canais, bem como o meio de comunicação, deve-se a três fatores centrais,
sendo eles:

a) A expressiva quantidade de “inscritos” nos canais citados que, apesar de


representar um número menor do que os “seguidores” em redes sociais como
Twitter, Instagram e Facebook, estão localizados em uma rede sem políticas
claras de moderação de conteúdo3 ou remoção de mensagens de teor
desinformante. Assim como a influência, relevância e histórico relacionado
ao tema de desinformação dos perfis selecionados - dentro do espectro da
direita brasileira;
b) A política e mecanismos internos do aplicativo Telegram que, diferentemente
do WhatsApp, possibilitam o encaminhamento ilimitado de mensagens (o
que facilita a disseminação de informações, inclusive falsas) e também
permitem um número ilimitado de participantes ou inscritos por canal;
c) O crescimento do uso do aplicativo no Brasil, sobretudo por grupos políticos
de direita e extrema direita, como aponta o levantamento feito pelo Núcleo
Jornalismo6 que acompanhou 15 grupos com mais de 643 mil mensagens
trocadas.

4O blogueiro Allan dos Santos é um dos principais aliados do bolsonarismo. Dono do canal Terça Livre, o jornalista é
investigado por dois inquéritos no STF: um sobre disseminação de notícias falsas na internet e o outro por financiamento de
atos antidemocráticos.
5
https://www.nucleo.jor.br/especiais/2021-02-18-telegram-extrema-direita/

2
youtuber do Paraná, diretor do site jornalístico de Olavo de Carvalho, o Brasil Sem Medo e investigado na CPI da
Covid por disseminação de notícias falsas.
3
Regras de conduta e termos de uso que regulam, entre outras coisas, o que pode e o que não pode ser veiculado na
plataforma
12

Sendo assim, a monografia busca respostas para os seguintes questionamentos: qual o teor
predominante nas mensagens analisadas? Como elas se classificam de acordo com os critérios e
categorias pré-estabelecidas? É possível inferir, dentro de um período específico de análise, o
caráter quantitativo e qualitativo das comunicações desinformantes compartilhadas nos canais?
Ademais, o estudo conta com as seguintes hipóteses finais:
• Os canais em questão, tais como as personalidades públicas responsáveis pela divulgação
das informações, reforçam e espalham voluntariamente conteúdos desinformantes;

• Há uma predominância de conteúdos negacionistas que vão de oposição aos temas de


vacinação, distanciamento social e Lockdown, por exemplo, assim como os eixos
temáticos de conteúdo reforçam os posicionamento do Governo Federal sobre
tratamento precoce;
• Há uma predominância de conteúdos totalmente falsos ou fabricados. Assim como o
uso das opiniões pessoais dos emissores como “informação oficial;
• Não há retratações sobre conteúdos sabidamente falsos ou imprecisos sobre a pandemia.

Por fim, o estudo conta com três capítulos de desenvolvimento, sendo eles; I)
Desinformação, funcionamento e contexto político do Telegram no Brasil; II) Análise de
conteúdo enquanto metodologia e III) Tratamento dos resultados, inferência e interpretação.
13

2. DESINFORMAÇÃO, FUNCIONAMENTO E CONTEXTO POLÍTICO DO


TELEGRAM NO BRASIL

2.1 Funcionamento

O aplicativo de mensagens “Telegram”, criado em 2013, é um serviço de comunicação


instantânea russo, com armazenamento em nuvem e disponível para diversos formatos digitais
de acesso: dispositivos móveis (smartphones e tablets), computadores e aplicação Web. Similar
ao sistema de cadastramento do aplicativo de mensagens instantâneas mais popular do Brasil,
o WhatsApp, o usuário do Telegram também utiliza o número de telefone móvel como meio de
confirmação e ativação de conta, a diferença crucial é que no segundo é possível ocultar o
número utilizado. Uma vez criada a conta, o aplicativo permite que os usuários enviem
mensagens privadas, bem como participem de grupos públicos na plataforma. Tais grupos
podem ser criados livremente por usuários do serviço e não possuem restrições de número de
participantes – como acontece no WhatsApp, por exemplo.
No campo do compartilhamento de informações, algumas características presentes no
Telegram podem facilitar o acesso e a disseminação de desinformação, sendo elas: número de
mensagens encaminhadas (limitado no WhatsApp e ilimitado no Telegram), limite de usuários
por grupo de discussão sendo de até 200 mil usuários por grupo e políticas de mediação de
conteúdo que quase não existem na plataforma.
Ademais, a estrutura de grupos públicos também é desmembrada em “canais” (foco de
estudo desta pesquisa), onde a transmição de conteúdo é direcionada pelo criador em questão e
o número de inscritos e participantes é ilimitado. Fatores estes, apontados na literatura de
Ribeiro et al.(2020), por meio do artigo Does Platform Migration Compromise Content
Moderation? como essencial para que usuários migrem de plataformas mais restritivas do ponto
de vista da moderação, para plataformas mais flexíveis.

2.3 Telegram e extrema-direita


Quando observamos o contexto político em perspectiva com as mudanças nos ambientes
digitais, não coincidentemente, eleições e posterior ascenção de líderes de extrema-direita, como
Jair Bolsonaro, têm características de populismo também presentes nestes ciberespaços, tal qual
o percursor e maior representante deste movimento na história política recente, Donald Trump
(GERBAUDO, 2018). Sob o aspecto populista, a literatura nos permite inferir que as figuras ou
partidos inseridos neste espectro do entendimento político:
[...] afirmam que as soluções para os problemas mais prementes do nosso
tempo são muito mais descomplicadas do que o establishment político nos faria acreditar
e que a grande massa das pessoas comuns sabe instintivamente o que fazer. [...] Se os
problemas políticos do nosso tempo são tão fáceis de resolver, por que eles persistem?
Uma vez que os populistas são refratários a admitir que o mundo real pode ser
complicado – que as soluções podem se mostrar esquivas mesmo para pessoas bem
14

intencionadas – eles precisam de alguém para culpar (MOUNK, 2018, p. 7).

Este chamado “populismo de direita”, tem adquirido novas roupagens e características.


Mas para alguns autores, eles continuam mantendo um denominador comum com os regimes
autoritários do século XX (nazismo e facismo), reunindo em uma mesma conjuntura política uma
combinação de nacionalismo e xenofobia. (MUDDE, 2007, p. 19).
Para Griffin (2003, p. 25), compreender as diferenças nessa nova roupagem (quando
comparada extrema-direita tradiconal e a atual configuração da extrema-direita no mundo) é traçar
linhas de racíocinio entre as mudanças adaptativas no que diz respeito à organização e tática de
posicionamento destes novos grupos. Para o autor, a dinâmica em questão faz com que configure-
se uma nova direita, entendida como “direita grupuscular”, definida por grupos menores e mais
dispersos, mas que apresentam uma alta facilidade de associação entre as suas organizações.
Sobre as definições de extrema-direita especificamente no Brasil, alguns autores que
intitulam o movimento mais recente (eleições de 2018) dentro do entendimento popular de “nova
direita”, já postularam algumas características cruciais para o entendimento destes movimentos
(CHALOUB E PERLATTO, 2016). Sendo elas:
1. Tendência mundial de guinada à direita;
2. Estratégia de distanciamento da experiência ditatorial de 1964;
3. Impactos e avanços tecnológicos das telecomunicações e da indústria;
4. Criação de ambientes propícios para a disseminação do pensamento liberal e de direita;
5. Declínio e emergência de governos ideologicamente de esquerda – junto com o favorecimento
das estruturas de polariuzação.
6. Crise no sistema de partidarismo.
Sendo assim, podemos compreender que o bolsonarismo, movimento que reúne
características intínsecas à extrema-direita descritas anteriormente, não se resume ao contexto
brasileiro. Do contrário, possui essência em crescentes movimentos populistas ligados à direita e
extrema-direita que fazem referência a um cenário de aprofundamento do capitalismo, revolução
tecnológica, comunicacional e, sobretudo, digital. O movimento pode ser melhor descrito como:
“(...) Forte nacionalismo, um sistema anti-intelectual de índole reacionária,
que se funda em uma capacidade de mapear, acolher e manipular ressentimentos, e que
opera sob o combustível do conflito constante em prol de um projeto autoritário de
poder. O êxito dessa estratégia política depende da depredação progressiva das
instituições republicanas sem, entretanto, prescindir do gatilho legitimador eleitoral.”
(MENDES, 2019, p. 160)

Os pares do bolsonarismo utilizam de ambientes digitais para formar os núcleos duros e


fomentar a facilitação de associação e identificação de grupos menores. Neste recorte, é possível
observar, tanto na experiência americana como na brasileira, que tais fenômenos políticos
surgiram a partir de ecossistemas digitais de engajamento alto em plataformas como Facebook,
Twitter, Youtube e, mais recentemente estão migrando para o Telegram – onde a falta de
15

políticas de moderação facilita a construção das narrativas conspiracionais defendidas por


algumas dessas figuras.

FIGURA 1- Presença de líderes mundiais no Telegram

Fonte: Levantamento Núcleo Jornalismo, 2021

No Brasil, tal migração foi observada mais fortemente a partir de 2020, quando Meta
Inc. (então Facebook Inc) fez o anúncio de uma moderação de conteúdo mais rígida no que diz
respeito à disseminação de desinformação nas plataformas Facebook e Instagram (LINDNER
E TURTELLI, 2020). Movimento que, na linha do tempo dos fatos recentes do Brasil, veio
após investigações do Superior Tibunal Federal (STF) acerca de uma sub-pasta presidencial –
e seu impacto na pandemia da Covid-19 - conhecida como “gabinete do ódio”: estrutura
responsável pela criação e distribuição de conteúdos digitais falsos em benefício do Governo
Federal e contra adversários ideológicos. (ROSA E MONTEIRO, 2019).

Neste contexto, embora o WhatsApp ainda seja o aplicativo de comunicações


criptografadas mais usado atualmente, é possível perceber picos de uso do Telegram no Brasil
16

que coincidem com o desenrolar e agravamento da pandemia, bem como com o aumento de
comunicações nos canais aqui analisados:

Observamos picos significativos no volume de mensagens no início de 2020 e 2021,


que coincidem com alguns eventos relevantes. O primeiro pode estar relacionado ao
surgimento da crise da pandemia de COVID-19 no Brasil, que teve seu primeiro caso
confirmado em fevereiro de 2020, fato que gerou intensa discussão em diferentes redes
sociais. Já o aumento em 2021 ocorreu simultaneamente a dois eventos: (1) período em
que o WhatsApp alterou suas políticas de privacidade, obrigando os usuários a aceitar
os termos atualizados8 e; (2) criação do canal oficial do Presidente Jair Bolsonaro, que
convidou os seus seguidores a se inscreverem no mesmo. (JÚNIOR et al., 2021, p.4)

Embora existam registros na literatura focados em mapear e compreender a anatomia da


desinformação nestes espaços, como a análise de Resende et al. em (Mis) Information
Dissemination in WhatsApp: Gathering, Analyzing and Countermeasures. In The World Wide
Web Conference (2021), sobre como a informação se espalha no WhatsApp usando imagens de
grandes grupos políticos no Brasil, ou a análise quantitativa de grupos políticos no Telegram
feita por Júnior, Manoel et al. em Towards Understanding the Use of Telegram by Political
Groups in Brazil. (2021), ainda existe um longo percurso teórico para a categorização e
entendimento do teor dos conteúdos desinformantes nestas plataformas.

2.4 O contexto da desinformação


Dado o panorama político e de funcionamento do Telegram, é importante
compreendermos como se categoriza a ideia de desinformação para além da plataforma,
seguindo a literatura. No âmbito internacional, é possível perceber que o termo “desinformação”
pode ser utilizado tanto como a tradução direta do termo em inglês disinformation ou como
tradução de misinformation, tendo distinções consideráveis entre os dois significantes.

De acordo com Fallis (2010), a principal distinção está no fato de que o termo
‘misinformation’ corresponderia a um engano ou ilusão originada no emissor, de maneira não
proposital. Ao passo que, semanticamente, ‘disinformation’, teria correlação com a intenção de
provocar engano acerca de uma informação.
Floridi (2010), também traça uma conceitualização que conversa com Fallis (2010),
quando ele define que “disinformation” é o ato de desinformar intencionalmente, enquanto
misinformation corresponde ao ato de não intencionalmente divulgar uma informação que não
é condizente com a realidade.
Já o dicionário de Oxford, que possui uma definição política – necessária para o
entendimento global desta monografia – define a desinformação como “informação falsa que
tem a intenção de enganar, emitida principalmente via propaganda por uma organização
governamental para um poder rival ou a mídia” (OXFORD UNIVERSITY PRESS, 2018a,
p.1.).
17

Em concordância com a definição, frente às análises realizadas e com o apoio na


literatura, é possível inferir que o bolsonarismo e seus representantes – escolhidos aqui pelas
figuras do blogueiro Allan dos Santos e do jornalista Bernardo Kuster – utilizam da
desinformação nos seus canais do Telegram como meio de manutenção de controle da opinião
pública – sobretudo dos seus núcleos de seguidores - o que justifica-se, nesse caso, graças ao
fenômeno de véis de confirmação conceitualizado a seguir:

[...] as pessoas são consideravelmente mais propensas a ler e compartilhar


artigos de notícias que estão alinhados com suas posições ideológicas. Isso sugere que
as pessoas que recebem notícias do Facebook (ou outras mídias sociais) têm menos
probabilidade de receber evidências sobre o verdadeiro estado do mundo que contraria
uma história ideologicamente alinhada, mas falsa (Allcott & Gentzkow, 2017, p. 221).

Além do caráter político e governamental essencial para compreensão da desinformação


no recorte proposto neste trabalho, é necessário considerar o conceito de “desordem
informacional” – também reconhecida nos materiais colhidos. Na do estudo Information
Disorder: Toward an interdisciplinary framework for research and policy making, três
nomenclaturas e tipologias principais para análise da desindormação são propostas:

a) Informação errada: é quando informações falsas são compartilhadas não


intencionalmente;

b) Desinformação: quando informações falsas são intencionalmente compartilhadas;

c) Informação mal-intencionada: ocorre quando uma informação, apesar de verdadeira,


é compartilhada a fim de tornar pública informações privadas; (WARDLE;
DERAKHASHAN, 2017, p. 5)

Ainda sobre a produção e circulação da desinformação, os autores explicitam suas


fases em: criação, a produção (que ocorre quando o conteúdo é moldado para se tornar um
produto de mídia) e a distribuição. Dessa maneira, cada fase apresenta características próprias
que facilitam a publicização do conteúdo e o impacto desinformante dele em cada destinatário.
Para isso, existem figuras cruciais como: o agente (aquele meio ou pessoa que faz o conteúdo
circular), a mensagem (ou conteúdo veiculado) e o intérprete (o destinatário final da mensagem
que irá realizar a interpretação do conteúdo e, a partir disto, realizará uma ação). (WARDLE e
DERAKSHAN, 2017, p. 22).

Ainda sobre a categorização dos tipos de desinformação, Wardle (2017), que


auxiliou na fundação da ONG First Draft (que realiza um trabalho de apoio à jornalistas e
estudiosos da comunicação no enfrentamento à desinformação) afirma ainda que podem existir
8 tipos de desinformação, sendo:

• Sátira ou Paródia – onde não há a intencionalidade do dano, mas pode haver engano por parte do
receptor;
18

• Conteúdo Enganoso – uso propositalmente enganoso de determinada informação ou grupo de


informações a fim de ludibriar o leitor;
• Conteúdo Impostor – neste caso existe a suplantação de fontes ou informações;
• Conteúdo Fabricado – conteúdo criado exclusivamente para um fim, com teor predominantemente
falso. Ou seja, fabricado com a intenção de enganar o receptor;
• Conexão Falsa – acontece quando as ferramentas de conteúdo que acompanham tal informação não
confirmam este conteúdo. Ou seja, manchetes, imagens ou títulos descritivos que não correspondem
às demais informações;
• Contexto Falso – quando, apesar do conteúdo ser majoritariamente verdadeiro, ele é compartilhado
imbuido de informações de contexto falsas;
• Conteúdo Manipulado – acontece quando há a manipulação proposital de manchetes, imagens ou
informações verdadeiras com o intuito de manipular e ludibriar o destinatário.

Traçando um paralelo entre as definições de desinformação aqui expostas, e


considerando o contexto brasileiro da pandemia, vale salientar que, o Presidente da República,
Jair Bolsonaro, assim como os agentes de mídia e públicos ligados ao bolsonarismo e analisados
nesta pesquisa, foram críticos ferrenhos às medidas de distanciamento social e fechamento do
comércio desde o início das movimentações de contenção do vírus no país – discurso observado
também nos debates públicos e conteúdos veiculados nos canais do Telegram.
19

3. ANÁLISE DE CONTEÚDO ENQUANTO METODOLOGIA


Quando falamos de grupos de direita e extrema-direita no Telegram, é possível observar
mapeamentos de discussões políticas que apresentam crescimento considerável há bastante
tempo (URMAN E KATZ, 2020). No Brasil, esse crescimento no que diz respeito a grupos de
apoio ao Presidente Jair Bolsonaro acontece desde a corrida eleitoral de 2018. Os canais – de
comunicação unilateral, ou seja, mensagens enviadas apenas pelos criadores, com possibilidade
de comentários feitos pelo público - das figuras analisadas (Allan dos Santos e Bernardo Kuster)
se configuram com uma alta movimentação de atividade e com um crescimento considerável de
inscritos.
Visto isto, e com a finalidade de analisar profundamente o teor das comunicações
realizadas nos canais, foi utilizada a metodologia da Análise de Conteúdo de BARDIN (2010),
cumprindo-se as etapas conforme a figura:

FIGURA 2- ETAPAS DA ANÁLISE DE CONTEÚDO

Fonte: BARDIN (1997)

Sendo assim, a metodologia de Análise de Conteúdo aplicada na pesquisa, constitui-se das


seguintes etapas de construção, baseadas em Bardin (2010, p. 280) : a) organização do corpus de
análise; b) codificação e categorização; c) tratamento dos dados, inferência e a interpretação dos
resultados. No que diz respeito à primeira fase, organização do corpus da análise, a etapa é
subdividida em: pré-análise, exploração do material, tratamento dos resultados em bruto – sob a
perspectiva quantitativa- e interpretação dos dados tratados – na ótica qualitativa. É
imprescindível salientar que a pesquisa qualitativa é a ferramenta necessária para adicionar o
20

ponto do significante por trás das mensagens analisadas.


Para Mynayo (2007), o tipo de abordagem qualitativa, além de permitir que a análise de
fenômenos sociais pouco explorados seja realizada, garante a investigação de processos referentes
a grupos específicos (tal qual comunidades e ecossistemas digitais, por exemplo) e instiga o
conhecimento de novas abordagens de análise, categorias e criações de estratégias de
entendimento.
De acordo com os postulados de Oliveira (2008), aplicar a metodologia de análise de
conteúdo varia de acordo com a técnica utilizada e com o objetivo da pesquisa, dependendo
diretamente da base teórica aplicada. Sendo assim, a técnica aplicada escolhida foi a Análise
temática ou categorial, descrita como“unidade de significação que se liberta naturalmente de um
texto analisado segundo certos critérios relativos à teoria que serve de guia à leitura”. (BARDIN,
1977, p. 105).
Na primeira das etapas da pré-análise, é realizada a leitura flutuante, ou seja, o primeiro
contato com o corpus bruto que, após algum recorte, constituíra o material de pesquisa. Em
sequência, ainda na fase de pré-análise são escolhidos os documentos que de fato serão o corpus
de análise de conteúdo. Para isso, de acordo com Bardin (2010), é preciso obedecer algumas
regras de separação e análise do conteúdo, sendo elas: a) regra da exaustividade, que determina
que nenhum documento do corpus deve ser deixado de fora da pesquisa; b) regra da
homogeneidade, que determina que a seleção dos materiais e documentações deve ter o mesmo
tema de análise para que se traçe estratégias de comparação entre os materiais e c) regra da
pertinência, que consiste na correlação que deve existir entre os documentos coletados e os
objetivos de análise.
Neste processo, ainda ocorre a fase de referenciação de índices e elaboração das unidades
de indicadores. É na elaboração desses procedimentos que serão extraídos os elementos
necessários de marcação da comunicação para se captar a essência das mensagens. Também é
aqui que devem ser realizadas as operações de recorte do material em unidades temáticas que
sejam comparáveis entre as categorias, para análise conteudista e posterior registro dos dados.
(BARDIN, 2010).
Por fim, também é realizada na pré-análise a fase de preparação dos materiais coletados
com a finalidade de padronizá-los. Desse modo, é feita, a priori, a edição do corpus, extração das
categorias e quantificação do material, abrindo caminho assim para a fase de exploração do
material, que pode ser caracterizada por: “(...) descrição analítica, a qual diz respeito ao corpus
(qualquer material textual coletado) submetido ao estudo aprofundado, orientado pelas hipóteses
e referenciais teóricos” (MOZZATO; GRZYBOVSKI, 2011, p. 735).
Após a fase de exploração do material descrita anteriormente, deve-se ser realizada a
definição final da catalogação, ou seja, a criação de categorias onde os elementos que constituem
21

a análise serão agrupados, realocados e definidos conforme diferenciações, analogias e critérios


pré-estabelecidos pelo pesquisador, a fim de traçar um caminho lógico à etapa posterior de
inferência. (BARDIN, 2010). Também é nesta fase que são identificadas as unidades de registro
do material, com o intuito de identificar os significantes, as codificações e os sentidos presentes
no material. Em última instância à organização da análise é realizado o tratamento dos resultadis
brutos encontrados, assim como a sua inferência e interpretação. (BARDIN, 2010, p. 127)
Nesta pesquisa, a fim de cumprir as etapas metodológicas minuciosamente explicadas
anteriormente, foram selecionadas para leitura flutuante, codificação, categorização e análise
dos resultados as comunicações em texto e mídia compartilhadas nos canais públicos de
Telegram do blogueiro Allan dos Santos e do jornalista e youtuber Bernardo Kuster. O critério
de seleção dos materiais se deu sobre as comunicações relacionadas aos posicionamentos de
figuras políticas ligadas ao bolsonarismo e a extrema direita acerca dos temas: covid, defesa ou
apresentação do tratamento precoce (cloroquina/hidroxicloroquina) como via de saída da
pandemia; posicionamento de oposição ou crítica às medidas de distanciamento social e, por
fim, posicionamentos acerca da vacinação.

A coleta delimita-se em dados e informações públicas disponíveis nos canais públicos


do Telegram dos agentes citados anteriormente e se esquematiza a partir da seguinte
metodologia:

1) Escolha dos termos e palavras-chaves a serem pesquisados nos canais públicos


selecionados;
2) Ingresso nos canais públicos selecionados;
3) Uso da ferramenta de pesquisa interna do Telegram para localizar as mensagens e
mídias correspondentes às palavras-chaves selecionadas;
4) Coleta dos materiais (de texto e mídia) correspondentes às pesquisas de palavras-
chave dos canais selecionados;
5) Leitura flutuante dos materiais encontrados;
6) Codificação: separação e transformação dos materiais coletados em categoriais para
que sejam descritas as características e unidades cruciais de análise;
7) Categorização: decisão das unidades de análise relevantes para pesquisa;
8) Tratamento dos resultados e discussões.
22

4. PRÉ-ANÁLISE NA PRÁTICA

4.1 Leitura flutuante


A pré-análise deu-se, a priori, na leitura flutuante de todo o corpus de mensagens de texto
e links externos de redirecionamento no período de 23.03.2020 até 29.12.2021 para o canal Állan
dos Santos (data da primeira e última mensagem correlata aos termos de pesquisa no canal) e
18.03.2020 até 29.12.2021 no canal Bernardo Kuster (data da primeira e última mensagem
correlata aos termos de pesquisa) e totalizando 274 mensagens de texto e mídia do tipo.
Dentro desse corpus de leitura flutuante, foi possível localizarmos alguns dados
importantes para a compreensão do conteúdo. O primeiro deles é que parte considerável das
mensagens veiculadas (com algumas alterações de frequência a depender do canal analisado e do
termo pesquisado, por exemplo) apresentava links externos de redirecionamento para sites
pretenciosamente noticiosos ligados à extrema direita. Portanto, com base na metodologia
qualitativa, foi necessário também a utilização de ferramentas de verificação de veracidade de
conteúdo. Ou seja, ainda na leitura flutuante, verificamos alguns conteúdos-chave a partir da
verificação prévia feita em alguns dos conteúdos veiculados por agências de checagem como a a
Agência Lupa, de modo a seguir os critérios e regras de homogeinidade e representatividade
instituídas por Bardin para análises de conteúdo qualitativas (BARDIN, 2004, p. 91).
Devido à fase de pré-analise ainda ter requerido o uso de ferramentas externas de
checagem (como a verificação de informações em materiais de agências de checagem como a
Lupa, bem como citado anteriormente) e para um maior aprofundamento metodológico na
compreensão do caráter de desinformação, mapeamos os conteúdos de texto que apresentavam
link de redirecionamento categorizando-as entre as sete categorias de conteúdos desinformantes
postulados por Wardle e Derakhshan (2017) e Wardle (2019) e já descritos minuciosamente no
capítulo anterior desta monografia.

4.2 Codificação:
Finalizada a fase de leitura flutuante (Bardin, 2004) das mais de 200 mensagens de texto
e links de redirecionamento coletados, realizamos a primeira organização do conteúdo com base
nos critérios: data de veiculação; termo pesquisado; frequência de aparecimento no canal; tipo
de conteúdo (este, com subcategorias em: mensagem de texto, mensagem de texto e link de
redirecionamento, vídeo ou imagem); texto contido na mensagem enviada; link de acesso ao
conteúdo no Telegram; link de redirecionamento externo (em casos onde havia link de
redirecionamento) e alcance desses conteúdos no Telegram, como observados nas imagens de
planilhas abaixo:
23

FIGURA 3- TABELA ALLAN DOS SANTOS- CATEGORIAS PRIMÁRIAS

Fonte: Elaborada pelo autor. Disponível em: https://docs.google.com/spreadsheets/d/1DU_lZu71-


gmE_oBpomP1LO9QxtpEwanmo6W8jEttKMY/edit#gid=1929040959

FIGURA 4- TABELA BERNARDO KUSTER- CATEGORIAS PRIMÁRIAS

Fonte: Elaborada pelo autor. Disponível em:


https://docs.google.com/spreadsheets/d/1LzLCBsTkSOMLYHZw82YBP-
cpWrjUMsVxT2LmY5KVkME/edit#gid=1929040959

A leitura flutuante, assim como a criação das primeiras categoriais de análise do material
bruto, nos possibilitou identificar núcleos secundários de conteúdo para a criação de categoriais
mais específicas e relevantes para a análise. Sendo assim, as categorias de coleta de mensagens –
e as devidas justificativas de escolha – deram-se de acordo com os seguinte grupos de termos de
pesquisa por palavra-chave: “Covid-19” e “Coronavírus” (com a finalidade de colher o máximo
de mensagens gerais sobre o tema); “Lockdown” e “distanciamento social” (devido aos ataques e
posicionamento contrário do Governo Federal e apoiadores às medidas de contenção);
24

“Tratamento precoce”, “Hidroxicloroquina” e “Ivermectina” (sob a justificativa do


posicionamento favorável e incentivo ao uso por parte do Governo e dos apoiadores) ; “Vacina”
e “Vacinação” e “Vachina” (com o objetivo de colher o máximo de informações relacionadas aos
eixos temáticos utilizados para se referir ao grupo de palavras e com o uso de uma variação
discursiva muito comum nos textos, “vachina”.) 4

A separação destes conteúdos por categorias de palavras-chave foi feita também em


planilhas na núvem (Google Sheets) e distribuídas em duas tabelas distintas (uma para cada canal),
como exemplificado na figura 3, figura 4 e figura 5 do tópico anterior. Para se ter o controle e a
diferenciação dos conteúdos por termos, montamos uma coluna relativa a cada termo pesquisado
como na imagem:

FIGURA 6- CATEGORIAS DE PALAVRAS-CHAVE

Fonte: Elaborada pelo autor.

A estrutura dos primeiros códigos gerados a partir da pré-análise, ou seja, a estrutura de


codificação, deu-se a partir do cruzamento do teor dos dados analisados nos dois canais
selecionados, a fim de entender as diferenças – e semelhanças – temáticas que ocorriam em cada
canal do Telegram para cada palavra-chave pesquisada. De acordo com as palavras-chave
selecionadas, estruturamos e classificamos a codificação de acordo com a palavra (ou seja, o
código) e o significante (o significado, temática ou contexto atribuído pelas figuras políticas nos
canais) mais ocorrente em cada canal.
Posteriormente, no capítulo de tratamento dos resultados, inferência e interpretação,
esmiuçamos os dados acima a partir de uma análise quantitativa e qualitativa de ocorrência e
também com base na categorização de contextos e análises de unidades de registros de conteúdos.

4.3 Categorização:
Para Bardin (1977, p. 96), um corpus pode ser definido como “o conjunto dos
documentos tidos em conta para serem submetidos aos procedimentos analíticos”. Sendo assim,
e levando em consideração que a categorização é a fase do processo em que é necessário decidir,
com base nos objetivos centrais da pesquisa, quais serão as unidades de análise escolhidas,
levamos o enfoque da pesquisa para duas vertentes: a primeira, analisar quantitativamente,
mediante o volume de material textual as dinâmicas de construções de narrativas desinformantes.
Ao passo que, qualitativamente, identificamos e produzimos unidades de registro que nos
permitiram caracterizar o debate realizado nos dois canais do Telegram acerca das temáticas da

4
Termo pejorativo utilizado por bolsonaristas para se referir a vacina “CoronaVac” de origem chinesa
25

análise. Para isso, iremos apresentar no capítulo de discussão de resultados, os seguintes quadros
e tabelas de análise:

A) Caracterização qualitativa e descrição geral de conteúdo do canal;


B) Análise quantitativa geral das métricas de alcance, distribuição e tipo de conteúdo do
canal;
C) Quadro de análise de conteúdo quali e quantitativa de temática por termo de palavra-
chave pesquisada;
D) Tabela com a catalogação dos principais tipos de desinformação encontrados nos
materiais tidos como noticiosos.

Neste processo de pesquisa, frente ao corpus selecionado, categorizado e previamente tratado,


estudamos com mais profundidade as unidades de registro que dizem respeito ao contexto
encontrado nas mensagens de textos, validando o exposto sobre significantes: “Os resultados
brutos são tratados de maneira a serem significativos (falantes) e válidos” (BARDIN, 1977, p.
101). Compreendendo que, segundo a definição de outros autores que conversam com a
metodologia de Bardin, a Unidade de Registro também pode ser entendida como “(...) A menor
parte do conteúdo, cuja ocorrência é registrada de acordo com as categorias levantadas”
(FRANCO, 2008, p. 41).
Ainda para Franco (2008), apesar das Unidades de Registros serem a menor parte de um
conteúdo, elas podem constituir uma infinidade de subcategorias que se correlacionam entre si:
palavras pré-selecionadas (como as escolhidas para esta categorização), macro temas de
discussão, itens de documentação etc. Apesar das categorias deste trabalho serem constituídas de
palavras-chave, segundo Bardin, podemos compreender que a unidade de registro aqui descrita
se trata de “tema”, uma vez que: “o tema é a unidade de significação que se liberta naturalmente
de um texto analisado segundo certos critérios relativos à teoria que serve de guia à leitura” (1977,
p. 105).

4.4 Validação das categorias


Para validar as categorias apresentadas, selecionadas e discutidas anteriormente, nos apoiamos
nos postulados metodológicos e regras a seguir:

• Regra da exaustividade: onde é postulado que: “ [...] é preciso terem-se em conta todos
os elementos desse corpus” (BARDIN, 1977, p. 97). Todo o corpus foi meticulosamente
selecionado, categorizado e coletado de maneira a não restar elementos faltantes para a
análise, constituindo-se assim de: registros textuais, links redirecionantes, arquivos de
mídia como fotos, screenshoots, vídeos e manchetes divulgados nos canais analisados;

• Regra da representatividade: que nos recorda da importância da universalidade da


amostragem:“A análise pode efectuar-se numa amostra desde que o material a isso se
26

preste. A amostragem diz-se rigorosa se a amostra for uma parte representativa do


universo inicial” (BARDIN, 1977, p. 97). A amostragem foi selecionada com base nos
critérios de palavras-chave e temáticas já explicitadas aqui;

• Regra da homogeneidade: “Os documentos retidos devem ser homogêneos, quer dizer,
devem obedecer a critérios precisos de escolha e não representar demasiada singularidade
fora destes critérios de escolha” (BARDIN, 1977, p. 98). Devido ao uso homogêneo de
categorização, codificação e uso de unidades de registro temáticas, compreende-se que
esta regra também foi atendida;

• Regra de pertinência: sobre os documentos, expõe: “os documentos retidos devem ser
adequados, enquanto fonte de informação, de modo a corresponderem ao objetivo que
suscita a análise” (BARDIN, 1977, p. 98). Uma vez que os documentos selcionados são
fontes imprescindíveis de investigação, conteúdo e entendimento das dinâmicas de
desinformação, acreditamos que a regra em questão foi contemplada.

Terminada a fase de validação das categoriais escolhidas, iniciou-se o processo de


interpretação, inferência e análise dos resultados obtidos. Neste processo, buscamos correlatar
os quadros de codificação já expostos, as análises temáticas retiradas da pré-categorização e
categorização de maneira a combinar os resultados brutos com os objetivos da análise. A partir
do corpus constituinte da pesquisa, analisamos quali e quantitativamente as mais de 200
mensagens selecionadas nos dois canais do Telegram, organizando uma discussão de resultados
para cada canal e para cada palavra-chave selecionada, como segue no próximo capítulo.
27

5. TRATAMENTO DOS RESULTADOS, A INFERÊNCIA E A INTERPRETAÇÃO

5.1 Allan dos Santos


Antes de nos debruçarmos sobre as análises de conteúdo e conteúdos noticiosos veiculados
nos canais de Telegram escolhidos para esta pesquisa, é preciso compreender a atuação das figuras
públicas e políticas por trás da escolha da análise deste corpus. Desta maneira, iremos realizar
uma apresentação prévia de cada agente de canal analisado, seguido das discussões e inferências
acerca dos dados obtidos e catalogados.
Allan dos Santos é dono do blog de direita “Terça-livre” (que também costumava ser canal
no Youtube) e um dos principais aliados do chamado “núcleo duro” (ou seja, aliados próximos
mais radicais, que não romperam alianças e que mantém a base de apoio popular aquecida) do
Presidente Jair Bolsonaro. Em seus canais no Telegram (Terça-livre e Allan dos Santos), o
blogueiro conta com 174.292 seguidores.

FIGURA 7- VISÃO GERAL DO CANAL TV- TERÇA LIVRE NO TELEGRAM

Fonte: Elaborada pelo autor.

FIGURA 7- VISÃO GERAL DO CANAL ALLAN DOS SANTOS NO TELEGRAM


28

Fonte: Elaborada pelo autor.

Apesar de estar banido das redes sociais, Allan conta com os assinantes do seu conteúdo
exclusivo no domínio www.allandossantos.com, site intitulado pelo próprio autor como “o
conteúdo que as redes sociais temem que chegue até você”, que surgiu após a determinação de
derrubada do domínio tercalivre.com em ação judicial movida pela Google (empresa dona do
Youtube, plataforma onde o blogueiro mantinha um canal com o mesmo nome).

FIGURA 8- TELA DE INÍCIO SITE DE CONTEÚDO EXCLUSIVO

Fonte: Elaborada pelo autor.


29

FIGURA 8- TEXTO DA TELA DE INÍCIO SITE DE CONTEÚDO EXCLUSIVO

Fonte: Elaborada pelo autor.

Além do exposto, Allan dos Santos é investigado em dois inquéritos judiciais de autoria
do Supremo Tribunal Federal (STF). Ainda no ano de 2021, como resultado das investigações
preliminares, o ministro Alexandre de Moraes decretou a sua prisão preventiva e início imediato
do processo de extradição – visto que o mesmo se encontra, desde julho do referido ano, morando
com visto de turista nos Estados Unidos da América (EUA). Dos inquéritos citados anteriormente,
um diz respeito a disseminação de conteúdos falsos na internet e o segundo ao financiamento de
atos antidemocráticos no Brasil.
Ademais aos processos judiciais, as contas do blogueiro nas redes sociais Instagram e
Twitter, respectivamente, foram tiradas do ar mediante ordem judicial ainda em Outubro de 2021.
No Telegram, a conta pessoal de Allan dos Santos (utilizada no corpus desta pesquisa),
consta como existente desde o início de 2020. Ao longo do tempo, o blogueiro angariou 122.6883
inscritos – o que corresponde a um número superior de inscritos ao do canal do Telegram do
próprio “TV Terça Livre”.
Para realizar a análise, a priori, ingressamos no canal do Telegram por meio do link:
https://t.me/AllanDosSantos. Em sequência, foram observadas, analisadas e coletadas mensagens
do período de 23.03.2020 (data da primeira mensagem correlata às palavras-chaves escolhidas
para este corpus) até 29.12.2021 (período de encerramento das coletas para elaboração desta
pesquisa), resultando assim em um corpus de 143 mensagens veiculadas na amostragem temporal
de 1 ano e 8 meses envolvendo as palavras-chave “covid”, “coronavírus”, “lockdown”,
“distanciamento social”, “tratamento precoce”, “Hidroxicloroquina”, “Ivermectina”, “vacina”,
“vacinação” e “vachina”.
O fato dos termos “covid” e “coronavírus” serem identificados de maneiras diferentes no
buscador interno de termos do Telegram, fez com que a variação fosse necessária, uma vez que
30

as palavras não possuem prefixo, sufixo e nem radical semelhante – o que seria facilmente
entendido pelo buscador. Outro termo correlato observado em algumas comunicações dos canais
analisados foi a ocorrência “Vírus chinês”, utilizado para se referir de maneira ofensiva e
xenofóbica ao Coronavírus. Do ponto de vista metodológico, não foi necessário incluir o termo
de maneira literal no levantamento de dados, uma vez que o radical “vírus” seria coletado pelo
buscador em qualquer ocorrência graças ao termo “coronavírus”.
Situação semelhante ocorreu para os termos “vacina” (que é a principal palavra-chave da
categoria) “vacinação” que, apesar de ter radical igual ao do termo anterior, denota ao ato das
campanhas de vacinação e, portanto, merece um destaque temático a parte nas categorias. Já o
termo “vachina”, precisou ser incluso uma vez que não seria detectado pelo buscador na busca
pelos termos “vacina” e “vacinação” e representa um caráter específico da discussão, aquele que
caracteriza o teor xenofóbico já discutido anteriormente.
Após a explanação inicial e, para iniciar a análise dos dados que constituem a narrativa
investigada nesta análise de conteúdo, realizamos uma caracterização quantitativa do canal.
Consideramos, os fatores de: tipo de conteúdo compartilhado (categorizando em mensagens de
texto com link externo; mensagens de texto sem link externo; imagens, vídeos e áudios);
frequência do aparecimento desses tipos de conteúdo no canal e alcance médio de visualizações
no Telegram (informação que é pública) para cada tipo de mensagens. Separamos essa análise
primária na tabela de dados abaixo, a fim de melhorar a visualização geral e, na sequência,
esmiuçamos a metodologia de coleta utilizada:

TABELA 1 – ANÁLISE QUANTITATIVA DAS MÉTRICAS GERAIS DO CANAL


ALLAN DOS SANTOS:

Tipo de conteúdo Frequência de Média de alcance


aparecimento em % por tipo de
conteúdo:
Apenas mensagem 32,5% 25 K
de texto

Mensagem de texto 80,8% 30, 2 K


e link de
redirecionamento
externo
28,2 K
Mensagens de texto 20,2%
e imagens
21 K
Apenas imagens 8%
31

18,9 K
Mensagens de texto 4,1%
e vídeos
15 K
2,1%
Apenas vídeo

1,3% 22,8 K
Áudios

Outros
(compartilhamento
1,4% 15,4 K
de mensagens de
outros canais)

Fonte: Elaborado pelos autores

Para a categorização do tipo de conteúdo compartilhado observamos a atividade do canal


durante o período descrito. Além disso, foram aplicados os cálculos de soma total dos conteúdos
da amostragem do canal – sem considerar o tipo – junto com a soma dos conteúdos categorizados
por tipo e, posteriormente, graças à diferenciação desses números, realizamos o cálculo de
porcentagem da amostra por tipo de conteúdo, em contraste ao total de mensagens correlacionadas
aos temas e palavras-chave no canal.
Com a análise quantitativa total do corpus, foi possível observar que a maior parte do tipo
de conteúdo veiculado por Allan dos Santos no seu canal oficial foi do tipo “Mensagem de texto
e link de redirecionamento externo”, ou seja, um misto entre mensagens escritas pelo autor
(geralmente introduzindo o conteúdo a ser compartilhado através dos links) mais chamada para
sites, vídeo do Youtube ou demais links externos.
Na amostragem do tipo “Mensagem de texto e link de redirecionamento” também foi
observado que a maioria dos links que acompanhavam as mensagens (cerca de 63% deles em
2020 e 48% em 2021) redirecionavam os inscritos do Telegram para o site de conteúdo noticioso
do blogueiro (tercalivre.com). Os links constam tabelados nas planilhas de categorização do
conteúdo disponíveis no fim deste capítulo.
Na sequência de maior frequência de aparecimento, constam links para o Youtube (22,9%
em 2020 e 32,4% em 2021), especialmente para os canais “TV Terça Livre” (desativado por
ordem judicial em outubro de 2021) ou vídeos em outros canais em que o próprio blogueiro tecia
comentários sobre algum tema. Em sequência, vale destaque ainda para links de sites brasileiros
e estrangeiros – em sua maioria de extrema direita - veiculados com frequência no canal (e que
representam cerca de 15% dos links externos veiculados em 2020 e 20% em 2021). Os sites com
maior frequência de aparecimento, assim como os links de redirecionamento que constavam ou
32

na manchete ou na URL palavras-chaves escolhidas para a composição do corpus da pesquisa,


constam no quadro a seguir:
QUADRO 1 - LINKS DE REDIRECIONAMENTO UTILIZADOS NO CANAL ALLAN DOS SANTOS
Site Link de redirecionamento utilizado
The Blaze https://www.theblaze.com/news/bombshell-accusations-
say-who-ignored-key-coronavirus-details-relied-on-
chinese-propaganda
State News https://www.statnews.com/2020/03/17/a-fiasco-in-the-
making-as-the-coronavirus-pandemic-takes-hold-we-are-
making-decisions-without-reliable-data/
Cnbc.com https://www.cnbc.com/2020/02/03/the-flu-has-already-
killed-10000-across-us-as-world-frets-over-
coronavirus.html
Brasil sem Medo https://brasilsemmedo.com/twitter-bloqueia-conta-de-
olavo-de-carvalho-por-12-horas/
DailyMail https://www.dailymail.co.uk/health/article-8875201/Has-
Covid-killed-flu.html
CM Jornal https://www.cmjornal.pt/mundo/amp/mulher-morre-
apos-receber-a-primeira-dose-da-vacina-contra-a-covid-
19
Pub Med https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/34901098/
Fonte: Elaborado pelos autores

Prosseguindo com a análise, inferimos que o segundo tipo de conteúdo mais veiculado foi
“Apenas mensagens de texto” (32,5%). Nestes conteúdos, ainda que o autor apresentasse números
ou informações compartilhadas como noticiosas, havia a ausência de links, imagens, citações,
referenciação ou outros tipos de conteúdo que confirmassem os dados veiculados. Um exemplo
do exposto é a mensagem veiculada em 24.09.2021, reproduzida a seguir e disponível no link:
https://t.me/AllanDosSantos/3659.
“Ex-membro acusa Partido Comunista Chinês de espalhar coronavírus.
Wei Jingsheng, ex-membro do Partido Comunista Chinês, acusa a organização de ter
espalhado o vírus Covid-19 deliberadamente meses antes de notificar oficialmente a
Organização Mundial da Saúde (OMS). A denúncia de Wei Jingsheng foi publicada pelo
DayliMail, nessa quarta-feira (22). De acordo com o denunciante, a China teria utilizado
os Jogos Militares Mundiais como um evento super disseminador do vírus. O evento
aconteceu em outubro de 2019 na cidade de Wuhan, epicentro da pandemia. O torneio
internacional reuniu atletas militares de vários países e, segundo Jingsheng, não por
acaso atletas que estiveram no evento supostamente adoeceram de uma doença
misteriosa.“[Eu sabia] da possibilidade de o governo chinês usar algumas armas
estranhas, incluindo armas biológicas, porque sabia que eles estavam fazendo
experimentos desse tipo”, disse ele. Ainda de acordo com a publicação, Jingsheng disse
que atletas da França, Alemanha e Estados Unidos estavam entre os que adoeceram no
torneio com sintomas semelhantes aos da Covid-19, porém, nunca foram testados para o
vírus. O analista político José Carlos Sepúlveda questionou o fato de a China utilizar a
tribuna da Organização das Nações Unidas (ONU) para se arrogar liderança mundial e,
pior ainda, a imprensa mundo afora não dar a devida publicidade para uma denúncia tão
grave. “Essa é a notícia grave que eu tinha lido, porque estamos falando do membro do
Partido Comunista Chinês. Essa reportagem do DayliMail dá a entender que isso foi
proposital. Ora, nós estamos então diante de mais um aspecto escandaloso e gravíssimo
dessa Pandemia. E, até agora, poucos países tiveram coragem de apontar o dedo à China
para pedir uma investigação completa, séria, do que pode ter sido um crime. Mas não, a
33

China vai à ONU fazer um discurso de que é preciso uma ordem global, que eles têm
solução para tudo. Essa denúncia deveria estar em todas as primeiras páginas do mundo
e não está”, concluiu.””
Em terceiro lugar, observamos que o tipo de conteúdo mais veiculado é “Mensagens de
texto e imagem” com uma taxa de 20,2% de aparecimento. Pela análise, conseguimos chegar à
conclusão que a maior parte dos conteúdos deste tipo são veiculados com sátiras ou ironias
indiretas. Dois exemplos destintos podem ser claramente observados nas mensagens do dia
05.01.2021 com uma crítica a jornalistas (sem teor noticioso) disponível em:
https://t.me/AllanDosSantos/1273 e em 29.12.2021, sobre vacinação, com um recorte fora de
contexto de um Tweet noticioso, disponível no link: https://t.me/AllanDosSantos/4916. Abaixo,
reproduzimos as mensagens que exemplificam:

FIGURA 9- IMAGEM VEICULADA EM “DISTANCIAMENTO SOCIAL”

Fonte: Elaborada pelo autor.

FIGURA 10- PRINT DE TWEET DO THE NEW YORK TIMES VEICULADO NO CANAL ALLAN
DOS SANTOS
34

Fonte: Elaborada pelo autor.

Por conseguinte, os conteúdos compartilhados em ordem de maior aparecimento foram:


“Mensagens de texto e vídeo” com 19,4% de índice de aparecimento – materiais que em sua
maioria representavam mídias enviadas do exterior majoritariamente sobre os temas de passaporte
vacinal (ou seja, a obrigatoriedade de que civis apresentem confirmação de que foram vacinados
para frequentar determinados lugares) e “efeitos colaterais da vacinação”. Alguns exemplos
podem ser vistos nos materiais veiculados em 06.10.2021, intitulado de “Denúncia do Project
Veritas sobre a indústria farmacêutica e a vacina 💉 [LEGENDADO EM PORTUGUÊS]”,
disponível no link: https://t.me/AllanDosSantos/2956. E no material veiculado em 30.12.2021,
com a legenda “A irmã dele foi para o hospital tratar de um cisto no útero, então injetam a vacina
experimental e ela morre de trombose” e disponível no link: https://t.me/AllanDosSantos/4941.

FIGURA 11- PRINT DO VÍDEO “DENÚNCIA DO PROJECT VERITAS SOBRE A INDÚSTRIA


FARMACÊUTICA E A VACINA [LEGENDADO EM PORTUGUÊS]”
35

Fonte: Elaborada pelo autor.

Por fim, o aparecimento de outros materiais do tipo “Imagens”, que correspondem aos
materiais de mídia sem o acompanhamento de mensagens de texto, representaram 8% do índice
de aparecimento, enquanto o tipo de conteúdo “vídeos” (também sem acompanhamento de
mensagens de texto elaboradas pelo blogueiro) foi de 2,1% de taxa de aparecimento e os tipos de
conteúdo intitulados como “outros”, ou seja, áudios enviados por Allan dos Santos e conteúdos
compartilhados de outros canais do Telegram, representam um total de 1,4% dos conteúdos
compartilhados.
No que diz respeito ao teor dos conteúdos acima, observa-se que tanto as imagens quanto
os vídeos compartilhados sem contexto textual, diziam respeito a peças de divulgação ou de
conteúdos fabricados, ou seja, montados exclusivamente para a ocasião e com comunicação visual
mista (imagens com texto ou vídeos legendados, por exemplo). Os conteúdos intitulados como
“outros”, fugiam do corpus da pesquisa do ponto de vista prático – por serem áudios ou materiais
oriundos de outros canais não analisados.
Em última instância, comentaremos as métricas quantitativas de alcance. Ao contrário do
que se pode inferir, os conteúdos com mais alcance não necessariamente são aqueles mais
veiculados – não nesta primeira análise que considera, primordialmente, o tipo de conteúdo e não
apenas as palavras-chave, por exemplo.
Apesar de as maiores médias – ou seja, números obtidos utilizando a fórmula de média
aritmética comum, somando-se todas as médias de visualização de cada tipo de conteúdo e
dividindo pela quantidade de vezes que o tipo de conteúdo aparece na amostra – serem dos tipos
de conteúdo mais veiculados “Mensagens de texto e link de redirecionamento” (com uma média
de 30,2 K de visualizações no Telegram) e “Apenas texto” (com média de 25k de visualizações
por mensagens do tipo), os demais conteúdos que possuem frequência de aparecimento menor,
36

também surpreendem quanto ao alcance na plataforma. A distribuição por média configurou-se


da seguinte maneira: “Mensagem de texto e imagem” com uma média de cerca de 28k de
visualizações; “áudios” 22,8k ,‘Mensagem de texto e vídeo” com 18,9k; “Apenas imagens” 21k;
“outros” 15,4k e “Apenas vídeos” 15k.
Posterior à análise quantitativa dos tipos de conteúdo, realizamos uma análise quantitativa
do conteúdo do ponto de vista das categoriais primordiais, as que dizem respeito às palavras-
chave. Demonstramos os índices na tabela:

TABELA 2 – ANÁLISE QUANTITATIVA DAS PALAVRAS-CHAVES PESQUISADAS

Palavra-chave Frequência de Tipo de conteúdo Média de alcance no


ocorrência (%) majoritário Telegram
Covid; Coronavírus 80% Mensagens de 40,9 K
texto e links de
redirecionamento

19 K
Mensagens de
Lockdown 33%
texto e vídeo

Mensagens de
Distanciamento texto e imagens 15,2 K
social 2,1%

Mensagens de
texto com links
37

Tratamento de 34,8 K
precoce; 15% redirecionamento
Hidroxicloroquina;
Ivermectina
Mensagens de
texto com links
43,2 K
Vacina; Vacinação; de
Vachina 68% redirecionamento

Fonte: Elaborado pelos autores


Chegamos à análise que precede o mapeamento do conteúdo sob a ótica qualitativa, aquela
que diz respeito aos números que norteiam a incidência, o índice de aparecimento e a circulação
interna de determinados temas no canal do Telegram analisado. Para iniciar essa avaliação
quantitativa, respeitamos a regra de homogeneidade, preservando os grupos de palavras-chave de
acordo com as suas temáticas – e não apenas separando-as sem um contexto de eixo temático. Em
sequência, preparamos as categorias de análise, sendo elas “palavras-chave” com a descrição de
cada grupo ou unidade de palavras escolhido para categorização do corpus; “frequência de
ocorrência” que, assim como na análise de tabela anterior, diz respeito ao número em porcentagem
de ocorrência do termo em relação ao corpus; “tipo de conteúdo majoritário” categoria que nos
ajudará a compreender que tipo de conteúdo é mais incidente – ou seja, aparece mais vezes na
amostra – relacionado a cada grupo de palavras-chave e “alcance”, para entendermos a
distribuição por palavra-chave no Telegram.
O resultado mais evidente é que os termos “Covid” e “Coronavírus” são os mais incidentes
na amostra de mensagens analisadas. Isso porquê, para além da temática central das discussões
analisadas, os termos também geralmente estão presentes em outros eixos temáticos como a
discussão sobre distanciamento social ou tratamento precoce, por exemplo. Um indicativo
importante de ser considerado nesta análise é o fato de que além de aparecer em 80% das
comunicações do corpus, essas palavras-chave são veiculadas, em sua maioria, com links de
redirecionamento para sites ou plataformas externas ao Telegram, ressaltando a intenção do autor
em dar um caráter noticioso às informações veiculadas. O alcance na plataforma também é o
segundo maior da classe de palavras-chave, tendo uma média aritmética de 40,9k de visualizações
por mensagens do tipo.
Em sequência no índice de aparecimento nós temos os termos “vacina”, “vacinação” ou
“vachina”, presentes em 68% das mensagens do corpus analisado. Apesar de neste conjunto de
palavras haver uma grande variedade de tipos de conteúdo correlatos (como vídeos, imagens e
áudios, por exemplo), também é notória a superioridade no número de mensagens vinculadas a
links externos. O destaque desta análise vai para a difusão e entrega dessa classe de palavras-
chave na plataforma Telegram, totalizando uma média de 43,2 K.
38

Por fim, como os grupos de palavras-chave com menos domínio nos eixos temáticos nós
temos: Lockdown, com 33% de ocorrência, tipo de conteúdo majoritariamente de mensagens de
texto e vídeo e com alcance médio de 19k por mensagens do tipo. Seguido do grupo de palavras
“tratamento precoce”, ‘hidroxicloroquina” e “ivermectina” (15% de frequência de aparecimento
e 38k de alcance) e com links externos como principal tipo de conteúdo. E, por fim,
“distanciamento social” com 2,1% de aparecimento, tendo como principal tipo de conteúdo
imagens e mensagens de texto e com 15,2 K de média de alcance no canal.
No próximo quadro, daremos início a análise de conteúdo qualitativa das categorias de
palavras-chave, realizando ainda a discussão sobre os eixos temáticos predominantes em cada
uma delas, assim como a exemplificação com conteúdos de texto e mídia coletados no canal:

QUADRO 2- ANÁLISE DE CONTEÚDO QUALITATIVA DE EIXO TEMÁTICO POR TERMO DE


PALAVRA-CHAVE PESQUISADA;
Palavra-Chave Temática principal do canal
Covid; Coronavírus - Fortalecimento das ideias do Governo Federal sobre
baixa letalidade do vírus;
- Defesa da ideia de “vírus chinês” e de teorias
conspiratórias envolvendo países como China e
Rússia;
- Negação do uso de máscaras enquanto medida
protetiva, também chamadas de “fraldas faciais” pelo
blogueiro;
- Alegação de manipulação de informações sobre
letalidade do vírus pela imprensa;
- Pretensas “denúncias” via vídeos, materias ou
depoimentos sobre “falsas mortes” ou “falso colpaso
na saúde”.

Lockdown - Correlação de Lockdown com desempregos e


empobrecimento populacional;
- Crítica a países e governantes que aderiram ao
modelo;
- Vídeos de supostas prisões no exterior por
descumprimento do Lockdown.
Distanciamento social - Reforço do discurso do Presidente e crítica aos
governadores e à imprensa;
Tratamento precoce; Hidroxicloroquina; Ivermectina - Reforço da posição do presidente favorável ao uso de
Hidroxicloroquina;
- Veiculação de materias e estudos em sites de direita
e extrema-direitra sobre o uso do tratamento precoce;
Vacina; Vacinação; Vachina - Desconfiança e negação acerca da eficácia da vacina;
- Uso da retórica de “liberdade individual” contra a
obrigatoriedade da vacina;
- Veiculação de materiais como vídeos, imagens e
“depoimentos” sobre possíveis efeitos colaterais do
uso da vacina;
- Uso de termos como “Vacina Chinesa” e “Vachina”
para se referir ao imunizante Coronavac;
39

- Uso de termos como “picada” e “injeção” para se


referir às vacinas;
- Crítica ao “passaporte vacinal” adotado em algumas
regiões do país;
- Veiculação de conteúdos “noticiosos” relacionando
o uso de vacinas à mortes;
Fonte: elaborada pelo autor.

Chegada a fase de análise de conteúdo propriamente dita do canal Allan dos Santos,
podemos inferir algumas informações baseadas na leitura, coleta, tratamento e categorização dos
materiais do corpus. As primeiras análises dizem respeito ao conteúdo da categoria de palavras-
chave “Covid”; “Coronavírus”. Das 75 mensagens veiculadas no período de 23.03.2020 (primeira
ocorrência de veiculação de mensagens com o uso da palavra-chave) até 29.12.2021 (data da
última ocorrência de mensagens com a palavra-chave no corpus), é cobservada a construção de
duas estratégias de comunicação claras: 1) a criação de um inimigo em comum que sirva para
validação das teorias de conspiração e 2) um sistema de negação de informações oficiais. Esse
fenômeno é bem observado no material “jornalístico” veiculado em 23.03.2020, logo no início da
pandemia no Brasil (disponível no link: https://t.me/AllanDosSantos/203). E, mais tarde, em
27.05.2020 onde é veiculado um conteúdo em vídeo de uma suposta “denúncia” envolvendo uma
morte proposital de uma criança em Touros- RN a fim de “inflar o número de mortes por covid-
19 na cidade”, segundo o blogueiro (conteúdo disponível no link:
https://t.me/AllanDosSantos/505).

FIGURA 12- PRINT MENSAGEM CANAL ALLAN DOS SANTOS


40

Fonte: Elaborada pelo autor.

FIGURA 13- PRINT “VÍDEO DENÚNCIA” VEICULADO NO CANAL ALLAN DOS SANTOS

Fonte: Elaborada pelo autor.


41

Nas mensagens acima, são observadas as duas estratégias descritas, além da presença do
tipo de conteúdo com link de redirecionamento para o TheBlaze. Nos conteúdos, podemos
observar a criação da China enquanto “inimigo”, a negação de informações oficiais através do
uso das estratégias de falso contexto e exagero e o teor de “terror” estabelecido pelo
compartilhamento de um vídeo explícito intitulado como “denúncia”.
Em uma próxima análise, no que diz respeito aos termos “lockdown”(citado em 27
mensagens durante o período de coleta) e “distanciamento social” (com apenas 1 ocorrência de
uso), é possível observar que não há uma predominância da temática. O foco do canal se dá,
basicamente, em comunicações acerca da negação das informações oficiais de letalidade e
contágio do vírus e, mais tarde, na desconfiança e na negação da eficácia das vacinas. Sobre o
grupo de palavras “lockdown” e “distanciamento social”, o que observa-se é o uso de exemplos e
situações estrangeiras que remetam ao “fracasso” ou a “falhas” nessas estratégias de
enfrentamento, assim como o possível uso de “autoritarismo” por parte das autoridades no trato
com quem descumpre as regras de isolamento. É também construída a retórica de que esse
enfrentamento é diretamente ligado ao colpaso econômico e aos níveis de desemprego. A seguir,
separamos alguns materiais “jornalísticos” e “noticiosos” compartilhados dentro dessa categoria
que exemplificam a análise:
FIGURA 14- PRINT MENSAGEM CANAL ALLAN DOS SANTOS

Fonte: Elaborada pelo autor.

FIGURA 15- PRINT VÍDEO “MANIFESTAÇÃO CONTRA LOCKDOWN EM TORONTÓ, CANADÁ”


42

Fonte: Elaborada pelo autor.

Já na análise das palavras-chaves que fazem referência ao tópico de tratamento precoce,


sendo elas “Tratamento precoce”; “Hidroxicloroquina” e “Ivermectina”, ocorridas em 8
mensagens no período analisado, podemos observar a tendência narrativa de reforço do discurso
do Governo Federal. Ou seja, a veiculação de conteúdos relacionados a pesquisas que alegam
atestar a eficácia da cloroquina; pretensos estudos internacionais com a mesma finalidade e relatos
sobre o uso do método de tratamento precoce em redes de saúde (citando em um dos materiais
veiculados, por exemplo, o caso da Unimed que posteriormente prestou esclarecimentos na CPI
da covid sobre a implementação do tratamento precoce). A seguir, alguns exemplos de materiais
que atestam a narrativa:

FIGURA 16- PRINT MENSAGEM VEICULADA NO CANAL ALLAN DOS SANTOS

Fonte: Elaborada pelo autor.


43

Por fim, temos a análise das plavras-chaves relacionadas à vacina, sendo elas “Vacina”,
“Vacinação” e “Vachina”. Os termos tem uma ocorrência de 75 mensagens do tipo veiculadas
durante o período de análise e, através das etapas de leitura flutuante, codificação e categorização
da análise de conteúdo é possível inferir algumas características dos conjuntos de informações e
materiais que compõem esse corpus: a maior parte do conteúdo é acompanhado de link de
redirecionamento externo ao Telegram (majoritariamente sites – já tabelados aqui – e vídeos do
Youtube do extinto canal TV Terça Livre), o teor das mensagens começa com um significante de
desconfiança – com críticas à obrigatoreidade do imunizante - e, ao longo do tempo, vai
evoluindo para discursos negacionistas, uma vez que atribuí, por exemplo, o aumento de número
de mortes à vacinação. Há também, ao longo do corpus, a presença de críticas constantes aos
governadores, principalmente ao governador de São Paulo, João Dória (PSDB) devido à corrida
pela vacinação– o que corrobora com os posicionamentos do Presidente Jair Bolsonaro durante o
mesmo período.
Ao longo da linha do tempo da análise, percebemos que é utilizada também a estratégia
de uso de outros termos – sobretudo com teor pejorativo – para se referir aos imunizantes, sendo
eles “picada” e “injeção”. Em última instância, mas não menos relevante, também é utilizada a
estratégia de uso de “depoimentos” de pessoas que tenham sido vacinadas sobre os possíveis
“efeitos colaterais” da vacinação encontramos depoimentos sobretudo relacionados a mortes. A
seguir, alguns exemplos de como os conteúdos são construídos:

FIGURA 17- PRINT MENSAGEM VEICULADA NO CANAL ALLAN DOS SANTOS

Fonte: Elaborada pelo autor.


44

FIGURA 18- PRINT MENSAGEM VEICULADA NO CANAL ALLAN DOS SANTOS

Fonte: Elaborada pelo autor.

FIGURA 19- PRINT VÍDEO “RELATO” COMPARTILHADO NO CANAL ALLAN DOS SANTOS

Fonte: Elaborada pelo autor.

FIGURA 20- PRINT MENSAGEM VEICULADA NO CANAL ALLAN DOS SANTOS

Fonte: Elaborada pelo autor.

FIGURA 21- PRINT MENSAGEM VEICULADA NO CANAL ALLAN DOS SANTOS

Fonte: Elaborada pelo autor.


45

Para completar a análise qualitativa dos dados, separamos toda a amostragem de


conteúdos que se encaixam como “noticiosos” do canal Allan dos Santos no período de coleta e
distribuímos na tabela a seguir conforme os 7 tipos de desinformação tabulados por Wardle e
Derakhshan (2017) e Wardle (2019).
A análise se deu em conteúdos que apresentavam características de notícia dentro do
corpus, considerando os critérios de noticiabilidade que caracterizam o formato segundo Wolf
(2003): importância do indivíduo (nível hierárquico), influência sobre o interesse nacional, número de
pessoas envolvidas, relevância quanto à evolução futura.
No total, foram analisadas 100 mensagens com características noticiosas dentro do corpus
total de 143 mensagens veiculadas no período. Para a classificação nas categorias de
desinformação recorremos à pesquisa dos dados de cada notícia selecionada em plataformas de
checagem, para as notícias cujas informações não tinham sido checadas previamente por agências,
criamos a categoria “conteúdo inconclusivo”.
A porcentagem dos dados foi obtida através de um cálculo de razão e proporção onde
realizamos da soma da quantidade de conteúdos por cada tipo de desinformação frente ao corpus
geral analisado.

TABELA 3 – DISTRIBUIÇÃO DOS MATERIAIS NAS SETE CATEGORIAS DE


DESINFORMAÇÃO

Tipo de Frequência de
desinformação aparecimento
(%)
Sátira ou 0%
paródia

Conteúdo 7,3%
enganoso

Conteúdo
0%
Impostor

Conteúdo
fabricado 29,8%

Falsa conexão 0%

Contexto falso 47,9%

Conteúdo
manipulado 0%

Conteúdo 15%
inconclusivo
46

Fonte: Elaborado pelos autores


Ao realizarmos a análise qualitativa via tabelação de tipos de desinformção, observamos
alguns padrões que podem ser interessantes para a compreensão do conteúdo como um todo. A
maior parte dos conteúdo veículados (47,9%) diz respeito ao tipo de desinformação por “falso
contexto, que de acordo com Wardle (2019), é o tipo de desinformação mais complexo de rastrear
via tecnologia. Isso porque, desinformações de falso contexto geralmente apresentam dados ou
informações pontuais verdadeiras, mas estas são apresentadas imbuídas de um contexto não
verídico. Como por exemplo, quando ocorre uma eventual morte de alguém vacinado (por uma
razão específica de outro cunho) e essa morte é apresentada como “decorrente da vacina”. É
verdade que houve uma morte e que a pessoa em questão foi eventualmente vacinada, mas é irreal
que esta morte tem correlação direta com o fato do indivíduo estar imunizado contra Covid.
Em segundo lugar, com 29,8% da porcentagem de frequência de aparecimento, temos o
“conteúdo fabricado” que, como a nomenclatura sugere, é criado como um produto midiático com
o único intuito de enganar o leitor, apostando na não-checagem de fatos por parte do receptor e
da não capacidade de distinguir conteúdos noticios verdadeiros por parte dos leitores. No contexto
da pesquisa, foram encontradas imagens e documentos em PDF que se pretendiam “documentos
e informações sigilosas” sobre mortes decorrentes da vacina, o que não condiz com a realidade
dos fatos.
Em sequência, tivemos cerca de 15% do conteúdo analisado como “inclocusivo”, ou seja,
esses conteúdos noticiosos não continham elementos suficientes para pesquisa externa de dados
(geralmente os links não existiam mais disponíveis na web). E por fim, identificamos 7,3% dos
conteúdos como “enganosos”, onde a maioria ou a totalidade dos dados era editada
propositalmente.

5.2 Canal Bernardo Kuster


Bernardo Küster é um youtuber e blogueiro do Paraná ligado à extrema-direita do Brasil.
Nos seus canais de comunicação, Kuster conta com um público de 906 mil inscritos no Youtube,
cerca de 378 mil seguidores no Instagram, 157.961 seguidores do Twitter e 61 mil inscritos no
seu canal do Telegram – objeto desta pesquisa. Atualmente o blogueiro se intitula como
“empreendedor social”, além de ser comentarista da Jovem Pan e editor-chefe do site
(autointitulado como jornal), “Brasil sem Medo,” cujo dono é o guru também da extrema-direita,
Olavo de Carvalho. O conteúdo de Kuster pode ser generalizado como conteúdos de apoio ao
presidente Jair Bolsonaro e disseminação das ideias do conservadorismo e do olavismo. Destaque-
se também as críticas do jornalista à estrutura democrática do Supremo Tribunal Federal e à
disseminação de conteúdos enganosos sobre a pandemia.
Em 2021, por ordem do STF no inquérito das Fake News, Bernardo Kuster teve os seus
47

perfis no Twitter e Instagram bloqueados temporariamente. Ainda no âmbito dos inquéritos, a


CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) da Covid solicitou ao Conselho de Controle de
Atividades Financeiras (Coaf) uma investigação sobre o jornalista relativa a eventuais
movimentações financeiras atípicas envolvendo o trabalho de produção e edição de conteúdo de
Kuster. O pedido foi deferido pelo senador Humberto Costa (PT-PE) e no texto são dois posts do
blogueiro no Twitter, sendo eles sobre isolamento social e uso da Hidroxicloroquina como
tratamento precoce do Covid. Mais recentemente, no dia 26 de outubro de 2021, a CPI da Covid
no Senado aprovou, com um placar de 7 a 4 votos, o relatório final feito pelo senador Renan
Calheiros (MDB-AL), onde eram indicadas 78 pessoas para serem investigadas, dentre elas o
presidente Jair Bolsonaro (PL), Bernardo Küster.
Dada a contextualização, vamos à descrição das análises: ingressamos no canal do
Telegram por meio do link: https://t.me/bkuster. Em sequência, foram observadas, analisadas e
coletadas mensagens do período de 18.03.2020 (data da primeira mensagem correlata às palavras-
chaves escolhidas para este corpus) até 29.12.2021 (período de encerramento das coletas para
elaboração desta pesquisa), resultando assim em um corpus de 134 mensagens veiculadas na
amostragem temporal de 1 ano e 8 meses envolvendo as palavras-chave “covid”, “coronavírus”,
“lockdown”, “distanciamento social”, “tratamento precoce”, “Hidroxicloroquina”, “Ivermectina”,
“vacina”, “vacinação” e “vachina”.

FIGURA 22- PRINT DAS INFORMAÇÕES GERAIS DO CANAL DO TELEGRAM BERNARDO KUSTER

Fonte: Elaborada pelo autor.

No que diz respeito à análise quantitativa dos tipos de conteúdos veiculados no canal do
48

Telegram do blogueiro Bernardo Kuster, chegamos as seguintes inferências baseados nos dados
coletados e apresentados da Tabela 3: o tipo de conteúdo mais compartilhado no canal são
“Mensagens de texto com links de redirecionamento”, cerca de 94,4% de todo o corpus analisado
de 18.03.2020 (data da primeira ocorrência de mensagens com as plavras-chave) até 29.12.2021
(data da última ocorrência de algum termo das palavras-chave em 2021) corresponde ao tipo de
conteúdo descrito, que possui também a maior média de alcance de visualizações na plataforma,
cerca de 30,9 K de visualizações por conteúdo do tipo.
Vale salientar que, nos links de redirecionamento presentes no canal, há um domínio de
links para o site “Brasil sem Medo”, o autointitulado jornal do guru Olavo de Carvalho, no qual
Bernardo Kuster é editor-chefe. O aparecimento de links redirecionando para o site corresponde
a uma taxa de 87% de todos os links veiculados no canal, sendo os demais divididos entre links
de redirecionamento para o próprio canal no Youtube de Bernardo Kuster e matérias de portais
como R7.com, do grupo Record, cujo fundador é o pastor e mepresário brasileiro Edir Macêdo,
alinhado ideologicamente ao bolsonarismo e Terça-livre, blog do também blogueiro Allan dos
Santos.
Na sequência, com uma incidência de 14,2% de aparecimento no corpus do conteúdo,
temos o tipo “Mensagens de texto e imagens”. Os conteúdos desse tipo geralmente são screenshots
de manchetes, tweets ou conteúdos de terceiros, comentados pelo bogueiro e raramente
apresentam intersecção com outros tipos de conteúdo (como a presença de links de
redirecionamento, por exemplo). Conteúdos desse tipo costumam ter um alcance médio de 25,5
K, o que demonstra que apesar da maior incidência de aparecimento, não tem um nível de
engajamento tão alto quanto a categoria anterior. Em paralelo, os conteúdos da categoria “Apenas
mensagem de texto” constituem uma parcela menor do corpus (8,6% com uma média de alcance
de 30k de visualizações por mensagens do tipo), seguidos das porcentagens referentes aos tipos
“Mensagem de texto e vídeos” (4,1% e 33,2K de média de alcance); “Apenas imagens” (3,1% e
18 K de média) e “Apenas vídeo” (1,3% de ocorrência e 22k de média de alcance). O fato do
blogueiro priorizar mensagens de texto e links de redirecionamento, assim como a resposta do
público na média de alcance ser maior nesse tipo de conteúdo, demonstra o caráter “jornalístico”
que o mesmo pretende passar ao conteúdo veiculado – sobretudo se nos atentarmos ao fato dos
links externos redirecionarem ao site “noticioso” no qual o mesmo é editor-chefe.

Tabela 4 – Análise quantitativa das métricas gerais do canal Bernardo Kuster:

Tipo de conteúdo Frequência de Média de alcance


aparecimento em % por tipo de
conteúdo:
Apenas mensagem 8,6% 30 K
de texto
49

Mensagem de texto 94,4% 30, 9 K


e link de
redirecionamento
externo

14,2% 25,5 K
Mensagens de texto
e imagens

Apenas imagens 3,1% 18 K

Mensagens de texto 4,1% 33,2 K


e vídeos

1,3% 22 K
Apenas vídeo

0%
Áudios --------

Outros
(compartilhamento 0%
de mensagens de
outros canais) --------

Fonte: Elaborado pelos autores

Os sites com maior frequência de aparecimento (para além do Brasil sem Medo), assim
como os links de redirecionamento que constavam ou na manchete ou na URL, palavras-chaves
escolhidas para a composição do corpus da pesquisa, constam no quadro a seguir:

QUADRO 3- LINKS DE REDIRECIONAMENTO UTILIZADOS NO CANAL BERNARDO KUSTER


Site Link de redirecionamento utilizado
Conexão política https://conexaopolitica.com.br/ultimas/covid-19-doria-
autoriza-prisao-de-quem-nao-seguir-orientacao-ou-
obedecer-sinal-de-advertencia-em-sp/
Jovem Pan https://jovempan.com.br/noticias/mundo/agua-da-piscina-
inativa-o-coronavirus-em-30-segundos-aponta-
estudo.html
IstoÉ https://www.istoedinheiro.com.br/china-sob-pressao-
depois-que-a-oms-voltou-a-citar-a-tese-de-fuga-da-covid-
19-de-laboratorio/
Exame https://exame.com/mundo/surto-de-covid-19-controlado-
no-japao-sem-isolamento-intriga-especialistas/
Fonte: Elaborado pelos autores

Por conseguinte, assim como na análise do canal anterior, realizamos o levantamento dos
50

dados do conteúdo do ponto de vista qualitativo, considerando as categorias primordiais descritas


na tabela:

Tabela 5 – Análise quantitativa das palavras-chaves pesquisadas

Palavra-chave Frequência de Tipo de conteúdo Média de alcance no


ocorrência (%) majoritário Telegram
Covid; Coronavírus 73% Mensagens de 30,2 K
texto e links de
redirecionamento

21 K
Mensagens de
Lockdown 12,1%
texto e vídeo

Mensagens de
Distanciamento texto e imagens 12,2 K
social 0,8%

Mensagens de
Tratamento texto com links
precoce; de 19,4 K
Hidroxicloroquina; redirecionamento
Ivermectina 14%

Mensagens de
Vacina; Vacinação; texto com links
Vachina de 31,7 K
63,2% redirecionamento

Fonte: Elaborado pelos autores


Nas amostras qualitativas tivemos um corpus de análise de 134 mensagens totais
envolvendo os 5 grupos de palavras-chave pesquisados. Nesse universo de mensagens, como
semelhante ao que ocorreu na análise qualitativa do canal anterior, a frequência de conteúdos mais
recorrentes diz respeito aos termos “Covid” e “Coronavírus” (73% de ocorrência na amostra
analisada) e com uma média de alcance que configurou-se como a segunda maior da análise (30,2
K de média de visualização nas mensagens com as palavras-chave analisadas). Do ponto de vista
da análise de conteúdo propriamente dita, é válido ressaltar que há muitas semelhanças nas
construções narrativas dos textos veiculados no canal Bernardo Kuster, com os textos analisados
anteriormente no canal Allan dos Santos. Assim como o primeiro, Kuster constrói um discurso
ancorado nas ideias de “vírus chinês” e de culpabilização da China, deixando isso explícito em
mensagens como a do vídeo produzido em seu canal no Youtube e compartilhado ainda em
19.03.2020, intitulado de “A culpa é da China - Ponto final”, disponível no link:
https://t.me/bkuster/12.
51

FIGURA 23- PRINT MENSAGEM VEICULADA NO CANAL BERNARDO KUSTER

Fonte: Elaborada pelo autor.

Construir uma narrativa de “inimigo comunista” é essencial para os conteúdos veiculados


aqui. E para além dessa estratégia, dentro do grupo de palavras-chave analisadas ainda é
construída a narrativa de desconfiança dos números de infectados – e da taxa de letalidade do
vírus. A principal diferença na estratégia comunicativa presente aqui, para as estratégias
explanadas na análise de conteúdo do canal Allan dos Santos se deve ao fato de que por priorizar
os links de redirecionamento para o site Brasil sem medo (onde determinados conteúdos só podem
ser acessados na íntegra via pagamento de uma assinatura mensal), o teor dos conteúdos
veiculados priorizam a estrutura de notícia, com a apresentação de supostas fontes internacionais
e pouco uso do recurso de “depoimentos”– ao contrário, neste último ponto, do que foi constatado
na análise do outro canal, onde a incidência de conteúdos do tipo “depoimentos” eram mais
comuns e havia, inclusive, uma chamada para envio de vídeo e “denúncias” por parte dos
inscritos. Outro ponto crucial do entendimento da construção dos conteúdos neste canal é a defesa
do Governo Federal (centralizado na figura de Jair Bolsonaro), o teor “explicativo” que o
blogueiro tenta dar às polêmicas envolvendo a cúpula do Poder Executivo e os ataques aos
Governos Estaduais, sobretudo ao governador João Dória.
A exemplo do teor de conteúdo citado anteriormente, temos as mensagens veiculadas em
07.04.2020, disponíveis nos links: https://t.me/bkuster/130 com o uso do termo “DitaDória” e a
mensagem veiculada em 16.04.2020 sobre a demissão do então Ministro da saúde, Henrique
Mandetta, disponível no link: https://t.me/bkuster/154.
FIGURA 24- PRINT MENSAGEM VEICULADA NO CANAL BERNARDO KUSTER
52

Fonte: Elaborada pelo autor.

FIGURA 25- PRINT MENSAGEM VEICULADA NO CANAL BERNARDO KUSTER

Fonte: Elaborada pelo autor.

Nos tópicos “vacina”, “vacinação” ou “vachina”, presentes em 63,2% e com alcance


médio de 31,7 K, a narrativa de negação da eficácia supera as críticas à obrigatoriedade. Não que
elas não existam, mas na construção do conteúdo veiculado no Telegram do Blogueiro Bernardo
Kuster, essas críticas são “veladas” por conteúdos que mesclam o supostamente informativo com
as opiniões pessoais do blogueiro – ainda que de uma maneira menos explícita do que o observado
no canal Allan dos Santos. Sobre esses conteúdos supostamente informativos, vale destacar o uso
de fontes quase majoritariamente internacionais e a replicação de conteúdos de sites americanos
53

sobre o tema.
O foco também é dividido no reforço de posicionamentos do Governo Federal – mais
presente no canal de Kuster do que na análise anterior. Sendo assim, podemos caracterizar as
narrativas construídas em três frentes específicas: 1) apontamento das ações do Governo Federal
sobre as vacinas, sobretudo das ações contrárias à compra dos imunizantes ou obrigatoriedade de
vacinação pela população (como a declaração emitida em 21.20.2020 pelo Presidente Bolsonaro
sobre não comprar os imunizantes do tipo Coronavac, disponível no link:
https://t.me/bkuster/553):

FIGURA 26- PRINT MENSAGEM VEICULADA NO CANAL BERNARDO KUSTER

Fonte: Elaborada pelo autor.

2) Defesa da ideia de que as vacinas provocam reações graves e mortes (como observado
no conteúdo veiculado em 08.02.2021 e disponível em: https://t.me/bkuster/776 e em 06.05.2021
disponível em: https://t.me/bkuster/1137):

FIGURA 27- PRINT MENSAGEM VEICULADA NO CANAL BERNARDO KUSTER


54

Fonte: Elaborada pelo autor.

E, 3) atribuição de “ineficácia” às vacinas devido ao contágio ser possível mesmo depois


da imunização (como exemplificado no conteúdo acerca do contágio de José Serra em 25.06.2021,
disponível no link: https://t.me/bkuster/1334).

FIGURA 28- PRINT MENSAGEM VEICULADA NO CANAL BERNARDO KUSTER

Fonte: Elaborada pelo autor.

Em sequência, por ordem decrescente, temos: “tratamento precoce”, ‘hidroxicloroquina”


e “ivermectina” (14% de frequência de aparecimento e 19,4k de alcance); “Lockdown” (12,1%
de frequência de aparecimento e 21K de média de alcance) e “distanciamento social” (0,8% de
frequência de aparecimento e 12,2 K de média de alcance).
Ao destrincharmos a análise qualitativa desses conteúdos, conseguimos chegar à novas
camadas de complexidade. Os conteúdos dos termos “Tratamento precoce”, “Hidroxicloroquina”
e “Ivermectina”, por exemplo, fogem do padrão observado até então – ou seja, parte considerável
das mensagens de texto não são acompanhadas de links de redirecionamento externo que
comprovem ou atestem as informações veiculadas, como por exemplo, o conteúdo postado em
14.05.2020 (disponível em https://t.me/bkuster/274) que apresenta uma informação sobre
médicos cubanos que atuam no sistema de saúde da Argentina no enfrentamento ao Covid serem
“agentes de guerrilha”:
55

FIGURA 29- PRINT MENSAGEM VEICULADA NO CANAL BERNARDO KUSTER

Fonte: Elaborada pelo autor.

Além da manutenção e intensificação do discurso de inimigo comunista conforme as


temáticas discutidas no canal, há também uma forte sobreposição de conteúdo opinativo sobre as
mensagens, maior do que os índices observados em outras categorias de análise. Ainda no caso
das mensagens em que constam links, esses redirecionam, em sua maioria, para vídeos de caráter
de opinião produzidos pelo blogueiro Bernardo Kuster em seu canal no Youtube.
Sobre este último tópico, um dos vídeos veiculados no Telegram – com link de
redirecionamento para o Youtube - dentro do recorte das palavras-chave “Tratamento precoce”,
“Hidroxicloroquina” e “Ivermectina”, foi excluído pela plataforma por violar as diretrizes de
comunidade. Dentro da amostra de conteúdos que redirecionavam para o Youtube, o vídeo em
questão se destacava do formato opinativo por ser uma entrevista conduzida pelo blogueiro. A
mensagem com o link foi encaminhada ainda no início da pandemia (04.04.2020, disponível no
link: https://t.me/bkuster/119)
56

FIGURA 30- PRINT MENSAGEM VEICULADA NO CANAL BERNARDO KUSTER

Fonte: Elaborada pelo autor.

Ainda sobre o conteúdo com link de redirecionamento, destaca-se o uso da estratégia de


falso contexto para manutenção da narrativa do tratamento precoce como principal saída para a
pandemia. Um exemplo do exposto é a matéria que foi veiculada em 16.05.2020 (disponível no
link: https://t.me/bkuster/294). Nela, por meio da combinação da legenda da mensagem – que
afirma que não há risco nenhum em tomar hidroxicloroquina contra covid – e da manchete “Desde
2003, 50 estudos comprovam eficácia de cloroquina”, o leitor é conduzido a imaginar que essa
pretensa eficácia e os estudos correlatos garantem a segurança da administração do remédio no
tratamento deste ou de outros vírus respiratórios. O detalhe – não citado na mensagem de texto
do Telegram e nem na linha fina da manchete – é que a eficácia apontada é para outros tipos de
doença (em que a cloroquina já era usualmente aplicada como tratamento).
Além do falso contexto, o conteúdo é restrito para assinantes do jornal Brasil sem Medo,
o que impossibilita que inscritos no Telegram que não assinem o jornal, atestem as informações
relatadas acima.
57

FIGURA 31- PRINT MENSAGEM VEICULADA NO CANAL BERNARDO KUSTER

Fonte: Elaborada pelo autor.

Nas ocorrências de frequência de aparecimento dos termos “Lockdown” e


“distanciamento social”, são predominantes as narrativas de negação da eficácia de ambas as
estratégias de contenção do vírus, assim como a crítica a governadores e países que, na
interpretação do blogueiro, teriam aderido ao Lockdown. Também é presente a construção
retórica de que essas ações minimizam e ferem a liberdade individual, neste contexto, são
compartilhadas também mensagens que questionam posicionamentos supostamente controversos
da Organização Mundial da Saúde (OMS) sobre as medidas de controle da curva de contágio do
vírus e a defesa de que essas estratégias foram as principais causadoras de desigualdades durante
esse período. Na primeira imagem, que corresponde a uma mensagem veiculada com link de
direcionamento para o Youtube, o blogueiro se utiliza da estratégia de argumento de autoridade
ao entrevistar o médico alinhado ao bolsonarismo Antony Wong, conhecido por posicionamentos
pró tratamento precoce e contra medidas de distanciamento social. As mensagens a seguir
confirmam as análises:

FIGURA 32- PRINT MENSAGEM VEICULADA NO CANAL BERNARDO KUSTER


58

Fonte: Elaborada pelo autor.

FIGURA 33- PRINT MENSAGEM VEICULADA NO CANAL BERNARDO KUSTER

Fonte: Elaborada pelo autor.

FIGURA 34- PRINT MENSAGEM VEICULADA NO CANAL BERNARDO KUSTER


59

Fonte: Elaborada pelo autor.

FIGURA 35- PRINT MENSAGEM VEICULADA NO CANAL BERNARDO KUSTER

Fonte: Elaborada pelo autor.


60

No próximo quadro, sintetizamos as temáticas encontradas por categoria de palavra-


chave:
QUADRO 4- ANÁLISE DE CONTEÚDO QUALITATIVA DE EIXO TEMÁTICO POR TERMO DE
PALAVRA-CHAVE PESQUISADA;
Palavra-Chave Temática correlacionada
Covid; Coronavírus - Fortalecimento dos posicionamentos do Governo
Federal;
- Compartilhamento das ações realizadas pelo
Governo Federal
- Defesa da ideia de baixa letalidade e baixo contágio
do vírus;
- Criação de um “inimigo em comum”, por meio da
culpabilização da China;
- Uso de termos como “Vírus chinês” e “Peste
chinesa”;
Lockdown - Crítica às medidas de contenção de contágio
sugeridas pela OMS e descredibilização do ógão;
- Atribuição do Lockdown ao fortalecimento das
desigualdades;
- Crítica ao Governador João Dória sobre o
fechamento parcial de comércios e atividades, com
uso do termo “DitaDória”;
- Veiculação de vídeos de supostas manifestações
internacionais contra Lockdown;
- Incentivo à manifestações e veiculação de atos anti
distanciamento no Brasil.
Distanciamento social - Reforço do discurso do Presidente e crítica aos
governadores;
Tratamento precoce; Hidroxicloroquina; Ivermectina - Veiculação de supostas pesquisas que demonstraríam
a eficácia do tratamento precoce contra a Covid;
- Reforço da posição do Governo Federal sobre o uso
de Hidroxicloroquina;
- Realização de entrevistas no Youtube (com
veiculação no Telegram) com médicos favoráveis ao
uso dos medicamentos.
Vacina; Vacinação; Vachina - Reforço da posição do Governo Federal sobre o
tema, especialmente no que diz respeito ao imunizante
Coronavac;
- Desconfiança quanto à eficácia das vacinas;
- Uso de termos como “Vacina Chinesa” e “Vachina”
para se referir ao imunizante Coronavac;
- Veiculação de conteúdos “noticiosos” relacionando
o uso de vacinas à mortes;
- Veculação de conteúdos “noticiosos” relacionando o
uso de vacinas a um possível aumento ou permanência
da curva de contágio do vírus.
- Uso de termos como “picada” e “injeção” para falar
dos imunizantes.
Fonte: elaborada pelo autor

O próximo e último passo da análise qualitativa dos conteúdos se deu na distribuição dos
materiais supostamente noticiosos conforme os 7 tipos de desinformação tabulados por Wardle e
Derakhshan (2017) e Wardle (2019).
61

A análise se deu em conteúdos que apresentavam características de notícia dentro do


corpus (com a presença de dados, informações, links de redirecionamento etc) das palavras-
chaves analisadas. No total, foram analisadas 100 mensagens com características noticiosas
dentro do corpus total de 134 mensagens (veiculadas na amostra de palavras-chaves selecionadas
no período) no canal Bernardo Kuster. Para a classificação nas categorias de desinformação
recorremos à pesquisa dos dados de cada notícia selecionada em plataformas de checagem, para
as notícias cujas informações não tinham sido checadas previamente por agências, criamos a
categoria “conteúdo inconclusivo”.
A porcentagem dos dados foi obtida através de um cálculo de razão e proporção onde
realizamos da soma da quantidade de conteúdos, depois a quantificação de cada tipo de
desinformação frente ao corpus geral analisado, chegando à porcentagem representativa.

Tabela 6– Distribuição dos materiais nas sete categorias de desinformação

Tipo de Frequência de
desinformação aparecimento
(%)
Sátira ou 0%
paródia

Conteúdo 17,8%
enganoso

Conteúdo
0%
Impostor

Conteúdo
fabricado 0%

Falsa conexão 12%

Contexto falso 50,7%

Conteúdo
manipulado 0%

Conteúdo 10%
inconclusivo

Fonte: Elaborado pelos autores


A maior parte dos conteúdo veículados (50,7%) diz respeito ao tipo de desinformação por
“falso contexto”, ou seja, tanto nas materias do corpus veiculadas no Brasil sem Medo, quanto na
relação de matérias de outros portais compartilhados com mensagens de texto no canal do
Telegram, podemos identificar traços como: manipulação intencional de informações que são
usadas para ‘complementar’ dados apresentados, deduções próprias do autor apresentadas nas
62

mensagens de texto como parte do conteúdo jornalístico veiculado e manchetes que ignoram ou
excluem informações essenciais para a veracidade do contexto do conteúdo (como “Desde 2003,
50 estudos atestam a eficácia da Hidroxicloroquina”, onde não é apontado que os estudos dizem
respeito a outros tipos de doenças na qual a cloroquina já era usada para tratamento).
Em segundo lugar, com 17,8% da porcentagem de frequência de aparecimento, temos o
“conteúdo enganoso” que ocorre quando a maior parte ou todas as informações contidas em um
material supostamente noticioso são falsas. A exemplo, temos o conteúdo veiculado em
25.02.2021 (disponível no link: https://brasilsemmedo.com/novo-estudo-sugere-que-
ivermectina-reduz-hospitalizacoes-e-mortes-por-covid-19-em-ate-75/). Segundo a agência Aos
Fatos5, que realizou a checagem das informações, o conteúdo é majoritariamente falso: “Não é
verdade que um estudo tenha comprovado que a ivermectina foi capaz de reduzir em 75% as
infecções pelo novo coronavírus, conforme alegam postagens nas redes sociais. A pesquisa citada
pelos posts é uma metanálise - revisão que compila resultados de outros estudos - que não chegou
a esse percentual nem foi revisada por pares e que teve a publicação rejeitada pela revista científica
de farmacologia Frontiers.”
Vale salientar que além da ocorrência de conteúdos em texto como o exemplo citado, o
tipo de desinformação por conteúdo enganoso também é identificado nos vídeos do Youtube feitos
por Bernardo Kuster e divulgados em seu canal do Telegram, como por exemplo o vídeo
veiculado em 12.05.2020 (disponível no link:
https://www.youtube.com/watch?v=pyiBxLGGB48) e intulado ironicamente de
“Hidroxicloroquina NÃO funciona”, nele o Youtuber usa a retórica de conspiração para criticar
estudos que demonstram a ineficácia do medicamento frente a Covid-19.
Em sequência, tivemos cerca de 12% do conteúdo analisado como “falsa conexão”, ou
seja, esses conteúdos noticiosos que possui um ou mais elementos (imagens, manchetes, dados
no texto) que não corroboram com o conjunto de informações veiculadas, como o que ocorre no
artigo “A verdade sobre os números da Covid-19” (disponível no link:
https://brasilsemmedo.com/a-verdade-sobre-os-numeros-da-covid-19/), onde o autor, o médico
Alessandro Loiola 6, usa gráficos que não correspondem em sua totalidade com as informações
veiculadas no texto, traçando uma comparação entre mortes no extremo inverno na Europa e
projeções de mortes por coronavírus. E por fim, identificamos 10% de conteúdo “inconclusivo”,
onde os dados e informações veiculados não foram suficientes para identificação do conteúdo em

5
https://www.aosfatos.org/noticias/e-falso-que-estudo-concluiu-que-ivermectina-reduziu-em-75-infeccoes-por-
covid-19/
6
Médico direitista que também compartilhou informações falsas sobre vacina do coronavírus:
https://politica.estadao.com.br/blogs/estadao-verifica/medico-espalha-informacoes-falsas-sobre-seguranca-das-
vacinas-mrna-contra-covid-19/
63

uma das categoriais de desinformação.

6. CONCLUSÃO:

O referido trabalho possibilitou compreender como as dinâmicas de construção,


veiculação e alcance de conteúdos desinformantes sobre a pandemia foram elaboradas em
ambientes digitais sem regras de moderação ou regulação, como o aplicativo de mensagens
Telegram.
Para alcançarmos as análises necessárias, foram definidos dois objetivos claros – que
acreditamos terem sido supridos na pesquisa. O primeiro deles faz referência ao processo de
identicar, categorizar e investigar a circulação desses conteúdos na plataforma – com o auxílio
dos processos de pré-análise, codificação e categorização – os conteúdos veiculados em dois
canais de extrema-direita de figuras públicas do Brasil. O segundo objetivo, congruente com o
primeiro, era de compreender e classificar esses conteúdos em algumas frentes de análise, sendo
elas: quantitativa, qualitativa e análise de classificação dos conteúdos nas sete categorias de
desinformação estabelecidas por Wardle e Derakhshan (2017) e Wardle (2019).
Após seleção da amostra, elaboração das categoriais e pré-análise, realizamos o tratamento
e discussão de dados que atenderam aos objetivos pré-estabelecidos bem como forneceram os
materiais necessários para confirmar as hipóteses discutidas nos capítulos introdutórios e no
recorte teórico escolhido e na revisão prévia de literatura.
Dessa forma, observou-se as tendências de conteúdo de acordo com cada tipo de categoria
escolhida, bem como identificou-se qual era a predominância dos tipos de desinformação que
circulavam nos canais. A análise final chega à conclusão de que o principal tipo de desinformação
utilizado em ambos os canais diz respeito à categoria de “falso contexto”. Ou seja, há a
predominância de utilização de dados verdadeiros imbuídos em cenários distorcidos. Para isso,
também é utilizada a estratégia de argumento de autoridade com entrevistas, materiais inéditos e
colaborações de conteúdo entre, por exemplo, médicos ligados ao bolsonarismo e os blogueiros
analisados. Nos capítulos de tratamento e discussão dos dados, apresentamos a metodologia de
coleta, o tratamento dos dados bem como a discussão detalhada dos eixos-temáticos por categoria
de palavras-chave e a descrição do teor de conteúdo e dos tipos de desinformação com o uso de
exemplos práticos (por meio de quadros, tabelas e figuras) colhidos nos canais do Telegram que
faziam parte deste estudo de caso.
Em consonância com o resultado final da pesquisa, acreditamos ter explorado, investigado
e apresentado de maneira contundente e relevante os principais pontos de discussão propostos
quando o assunto é desinformação no Telegram. Acreditamos que o trabalho de combate à
desinformação, bem como o entendimento dos processos e dinâmicas que a constituem, é
64

imprescindível para salvaguardar as estruturas democráticas.


65

REFERÊNCIAS

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01/oms-declara-estado-de-emergencia-global-em-razao-do-coronavirus. Acesso em: 13
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https://www.aosfatos.org/checagem-de-fatos-ou-fact-checking/. Acesso em: 13 nov.
2021.
AOS FATOS. É falso que estudo concluiu que ivermectina reduziu em 75% infecções
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BARDIN, Laurence. Análise de conteúdo. Lisboa: Edições 70, 2004.

BARDIN, Laurence. Análise de conteúdo. São Paulo: Edições 70, 2010.

G1. Brasil é pior país do mundo na gestão da epidemia de Covid-19, aponta estudo
australiano. Disponível em: https://g1.globo.com/mundo/noticia/2021/01/28/brasil-e-
pior-pais-do-mundo-na-gestao-da-epidemia-de-covid-19-aponta-estudo-
australiano.ghtml. Acesso em: 13 nov. 2021.

ESTADÃO. Medico espalha informações falsas sobre segurança das vacinas mRA
contra Covid-19. Disponível em: https://politica.estadao.com.br/blogs/estadao-
verifica/medico-espalha-informacoes-falsas-sobre-seguranca-das-vacinas-mrna-contra-
covid-19/. Acesso em: 13 nov. 2021.

Cf. GRIFFIN, Roger. From slime mould to rhizome: introduction to the groupuscular
right. Patterns of Prejudice. Londres, Routledge, v. 37, n. 1, 2003. 3 Idem.
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prática política. Insight Inteligência. Rio de Janeiro, v. 1, p. 25-42, 2016.
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Chapel Hill. Proceedings [...]. Illinois: Ideals, 2010. Disponível em:
http://hdl.handle.net/2142/15205. Acesso em: 13 nov. 2021.

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66

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