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ARTIGO DE REVISÃO / REVIEW ARTICLE / DISCUSIÓN CRÍTICA

A influência da visão holística no


processo de humanização hospitalar
The influence of the holistic vision in the hospital humanization
La influencia de la visión holistica en la humanización del hospital

Telma Alves de Almeida Fernandes Leite*


Maria Isabel Strong**

RESUMO: Este trabalho teve como finalidade refletir sobre a influência do emprego da visão holística no processo de humanização da
assistência hospitalar. A metodologia aplicada foi a do levantamento bibliográfico relativo ao assunto, tanto em humanização hospitalar
e paradigma holístico quanto nos pressupostos de outras áreas de conhecimento. Historicamente, as práticas da saúde tiveram seu início
com uma visão mais integrada do ser humano em seu meio. Percebe-se que o processo de desumanização foi resultante de múltiplos
fatores, entre eles pelas ciências exatas, tentando explicar objetivamente o ser humano pela retirada dele de todo o caráter subjetivo,
coisificando-o; pela veneração à tecnologia, mecanizando-o; e pela especialização excessiva, fragmentando-o. A instituição hospitalar
vem sofrendo influências econômicas e culturais. Gerando diversas mudanças que devem ser ponderadas pelo seu potencial intrínseco
de afetar a qualidade da assistência e na relação entre profissionais da saúde e usuário. O conceito de saúde, a formação do profissional
e a forma com que é realizada a gestão dos recursos humanos nos hospitais também podem influenciar a qualidade da assistência. A
visão holística favorece o processo de humanização influenciando os profissionais, os usuários e as relações entre eles.
DESCRITORES: Saúde holística, Administração hospitalar, Humanismo
ABSTRACT: This work aimed to reflect on the influence of employing the holistic vision in hospital assistance humanization process. The
applied methodology was a bibliographical survey on the subject, both regarding hospital humanization in its relation to the holistic
paradigm and assumptions coming from other knowledge areas. Historically, health practices began with an integrated view of human
beings in their environment. One perceives that the dehumanization process resulted from multiple factors, figuring among them exact
sciences effort to explain objectively human beings removing from them all subjective aspects, commodifying them; because of techno-
logy veneration, mechanizing them; and by excessive specialization, fragmenting them. Hospital Institutions are increasingly suffering
economic and cultural influences and this generates several changes that must have evaluated their intrinsic potential to affect the
quality of assistance and the relation between health professionals and users. The health concept, the formation of the professional and
human resources management in hospitals can also influence assistance quality. The holistic vision favors the humanization process,
influencing the professionals, the users and the relationships between them.
KEYWORDS: holistic health, Hospital administration, Humanism
RESUMEN: Este trabajo buscó reflejar acerca de la influencia del empleo de la visión holistica en el proceso de humanización de la ayuda
hospitalaria. La metodología aplicada era un examen bibliográfico en el tema, mirando la humanización del hospital en su relación al
paradigma y a las asunciones holísticos que venían de otras áreas del conocimiento. Históricamente, las prácticas de la salud comenza-
ron con una vista integrada de seres humanos en su ambiente. Uno percibe que el proceso del deshumanización resultó de los factores
múltiples, calculando entre ellos esfuerzo exacto de las ciencias de explicar los seres objetivo humanos que quitaban de ellos todos los
aspectos subjetivos, haciendo de ellos mercancías ; debido a la veneración de la tecnología, mecanizándolos; y por la especialización
excesiva, los fragmentando. Las instituciones hospitalarias sufren cada vez mas influencias económicas y culturales y éstas generan
varios cambios que deben tener evaluado su potencial intrínseco de afectar la calidad de la ayuda y la relación entre los profesionales
de salud y los usuarios. El concepto de salud, la formación del profesional y la gerencia de recursos humanos en hospitales pueden
también influenciar la calidad de la ayuda. La visión holistica favorece el proceso de humanización, influenciando los profesionales, los
usuarios y las relaciones entre ellos.
PALABRAS-LLAVE: Salud holistica, Administración hospitalaria, Humanismo

*Terapeuta ocupacional. Pós-graduada em Administração Hospitalar pelo Centro Universitário São Camilo. telmato@uol.com.br.
**Professora Doutora. Docente responsável pela disciplina de Bioética e Responsabilidade Social do Centro Universitário São Camilo

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A INFLUÊNCIA DA VISÃO HOLÍSTICA NO PROCESSO DE HUMANIZAÇÃO HOSPITALAR

Introdução vez, é definido como aquilo que é natureza (macrocosmo). A saúde deri-
O tema humanização vem des- relativo ao homem ou próprio dele. va desse equilíbrio, cuja ausência cau-
pertando um interesse cada vez Portanto, a humanização pode ser sa a doença e pode resultar na morte”.
maior entre profissionais de diver- entendida como o ato ou ação de A medicina chinesa, por exemplo,
sas áreas. O empenho do Ministério tornar humanas as relações, ou seja, surgiu há pelo menos cinco mil
da Saúde e o comprometimento levar em consideração tudo que é anos, e ainda se mantém inalterada
do pessoal envolvido com o Pro- relativo ao homem ou próprio dele. — como no caso da acupuntura —,
grama Nacional de Humanização E o termo humanismo, segundo mesmo convivendo com a medicina
de Assistência Hospitalar (PNHAH), Molina (2002), “é uma crença no ocidental.
lançado em Brasília em 2001, com- homem, em seu valor [...] na sua Hipócrates, há mais de dois mil
provam que a importância dada à capacidade de progredir e construir anos, também já demonstrava ser
relação humanitária não é apenas uma sociedade melhor”. possuidor de um enfoque mais
mais uma moda e sim, antes de tudo, No caso da influência da visão amplo do processo saúde-doença,
uma necessidade ética para com os holística sobre a humanização da exemplo disso é sua afirmação de
usuários e para com todos os pro- assistência hospitalar, trata-se do que não se deve analisar as doenças
fissionais que atuam no setor da desenvolvimento de uma visão do de forma isolada, mas sim “no ho-
saúde. Conforme afirma Gallian ser humano inserido num contexto mem vítima da enfermidade, com
(2001), “nunca como hoje se faz tão biopsicossocial, como um ser singu- toda a natureza que o rodeia, com
necessária à reflexão histórico-filo- lar que traz consigo uma história todas as leis universais que a regem
sófica para que se possa re-huma- de vida impregnada de valores cul- e com a qualidade individual dele,
nizar a medicina e as ciências da turais, vivenciando um momento que se fixa com segura visão” (apud
saúde em geral”. em que, normalmente, se encontra Jaeger, citado por Gallian, 2001)
Remetendo à máxima de São fragilizado pelo seu problema de Com o Renascimento, a racio-
Camilo de Léllis, e demonstrando saúde e pela própria situação impos- nalidade tomou por paradigma o
o cuidado com a formação humani- ta pela internação, ou seja, é uma universo matemático e mecânico.
tária dos discentes que ingressam fase na qual o indivíduo é retirado A partir do século XVII o homem
na instituição e seu preparo para de seu cotidiano e passa a obedecer começou, como explica Gonçal-
atuar no campo da saúde, o Reitor às regras institucionais. ves (1997), “a considerar a razão
do Centro Universitário São Cami- Este trabalho teve como finali- como único instrumento válido de
lo, Prof. Dr. Pe. Christian de Paul dade refletir sobre a influência da conhecimento, distanciando-se de
de Barchifontaine, pediu, em seu visão holística no processo de hu- seu corpo. [...] Fragmentado em
discurso de abertura dos cursos manização da assistência hospitalar, inúmeras ciências, o corpo passou
do primeiro semestre de 1998, no buscando elementos essenciais a fim a ser um objeto submetido ao con-
campus Ipiranga, que ao trabalhar de dar subsídios a uma reflexão mais trole e à manipulação científica”.
na área da saúde os futuros profis- ampla, procurando atingir uma Mesmo assim, os cientistas da
sionais colocassem “o coração nas compreensão que sirva de apoio e época, segundo Gallian (2001),
mãos”. Explicou que nas mãos te- orientação para a práxis cotidiana “não deixaram de reafirmar o ca-
mos a técnica, mas que para traba- de profissionais da saúde e de admi- ráter amplamente humanístico da
lhar com o ser humano a técnica nistradores hospitalares. medicina, vista não apenas como
não basta, precisamos do coração, ciência, mas também como arte”. E
que é a sede do amor (informação Evolução histórica das explica que “o processo de desuma-
verbal). nização é uma das conseqüências
A visão holística pode ser defi-
práticas de saúde
do divórcio entre a medicina e as
nida como a visão de um determi- Para compreender as mudanças humanidades que ocorreu princi-
nado fenômeno como um todo, ou de paradigmas que vêm orientando palmente a partir de fins do século
seja, que leve em consideração to- as práticas de saúde é importante re- XIX”. O que remete a Molina (2002,
dos os fatores que podem influen- fletir sobre a evolução histórica des- p. 1), quando refere em relação ao
ciar o fenômeno observado. sas práticas. Desde os primórdios, a humanismo, que “infelizmente, por
O termo humanização consti- idéia de saúde e doença no Oriente, diversos motivos, essa fundamental
tui o ato ou ação de humanizar. conforme Leite (1996) “insere-se no característica da ‘arte de cuidar’ do
Humanizar, ou humanar, significa princípio da harmonia do homem bem-estar e da qualidade de vida da
tornar humano. Humano, por sua (microcosmo) consigo mesmo e com a população e de nossos pacientes foi

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desaparecendo”. De acordo com Me- das ciências humanas se desvanecia Especialização


zzomo et al (2003, p. 28) “a cultura no meio médico”. De acordo com o A especialização, que advém da
ocidental evoluiu muito, a ponto de PNHAH (2001), “a evolução do co- visão biomédica no mundo moder-
se tornar arrogante [...] chegando a nhecimento técnico-científico não no, com a expansão do conhecimen-
menosprezar o saber milenar”. tem sido acompanhada por um cor- to se tornou indispensável, porém,
respondente avanço na qualidade conforme enfatiza Medina (1991)
Visão biomédica do contato humano presente em “sabe-se mais sobre o particular sem,
A visão biomédica está funda- toda intervenção de atendimento à contudo, avançar no sentido de um
mentada em princípios filosóficos saúde”. Gallian (2001), vem notan- melhor entendimento de totalidade
que valorizam a eficiência técnica do, a partir de suas observações des-
dos fenômenos humanos e univer-
e o conhecimento científico e ne- te fenômeno, que a maior parte dos
sais”. Em outras palavras, sabe-se
gam a possibilidade de um conhe- médicos e cientistas especialistas em
cada vez mais, de cada vez menos.
cimento metafísico, implantando o saúde da atualidade “continuam
De acordo com Mezzomo et al
realismo científico. Almeida (1999) demasiadamente entusiasmados
(2003), “o excesso de especialização
observa que, “ao estudar o corpo com as novas perspectivas da ciên-
retalha o ser humano e pode redu-
do homem, o cartesianismo produz cia. Não que tais perspectivas não
zi-lo a um quebra-cabeça difícil de
um mecanismo de esquecimento sejam [...] benéficas”.
formar o conjunto. Idéia confirmada
que nos impede de nos misturar- Pessini et al (2003) alertam para o
fato de que a tecnociência tem sido por Martin (2003) quando esclarece
mos e nos confundirmos com o que a especialização “leva à fragmen-
endeusada, e que com isso pode-
corpo, cria a imagem de que o cor- tação do saber médico e do próprio
se notar “ambientes tecnicamente
po é uma máquina”. paciente. Em lugar de tratar a pessoa
perfeitos, mas sem alma e ternura
Os profissionais educados confor- que está doente, o especialista ten-
humana [...] [nos quais] a pessoa
me o paradigma cartesiano-newto- de a tratar a patologia que é da sua
vulnerabilizada pela doença, dei-
niano tendem a analisar as doenças especial competência”. E Gallian
xou de ser o centro das atenções e
sob uma óptica essencialmente foi instrumentalizada em função de (2001) conclui que “o problema é
mecanicista e geralmente não determinado fim”. Chamam ain- [...] a falta de reflexão crítica sobre
consideram aspectos ambientais e da atenção para o fato de que “a ela; sobre suas conseqüências éticas,
emocionais — os conflitos e as difi- manipulação [...] rouba aquilo que sociais, culturais e existenciais”.
culdades existenciais e de adequa- é mais precioso à vida do ser huma- Desta forma, ao mesmo tempo
ção social do indivíduo — em seus no: sua dignidade. Entramos num em que é esclarecedora de certas
diagnósticos. Medina (1991) ressalta círculo vicioso de coisificação das particularidades, a especialização
que o “mau funcionamento é visto pessoas e a sacralização das coisas, torna-se perigosa, na medida em que
exclusivamente como uma avaria inversão cruel dos valores!”. pode levar à perda da visão do todo,
em um mecanismo específico que Com essas mudanças de valores reduzindo o corpo a objeto de inú-
tem que ser reparado por meios fí- torna-se compreensível a tendên- meras ciências, pois toda especiali-
sicos ou químicos.” Martim (2003) cia do profissional ao abandono da zação distante de uma visão ampla
reforça essa opinião afirmando que visão holística em favor de um en- do ser humano em seu mundo leva
“o principal alvo da atenção do pro- foque mais objetivo, até certo ponto à fragmentação, que constitui, aos
fissional da saúde começa a ser a seduzido pela tecnologia, pois, por olhos de Medina (1996), “desrespei-
doença e sua cura. Todas as ener- um lado é considerada mais “cien- to à totalidade e à dignidade do ser
gias são direcionadas no sentido de tífica” e por outro há a demanda do humano”. E acrescenta que é preciso
uma medicina curativa”. próprio usuário, que vive no mesmo desenvolver uma “cosmovisão que
contexto histórico, descrito por Pes- divida menos e una mais”. Pessini
Conhecimento científico sini et al (2003) como uma época de et al (2003) concluem que “surge
e tecnológico “insatisfação com a simplicidade da nesse horizonte a necessidade de
O desenvolvimento tecnológico vida e a busca constante de emoções políticas de humanização”.
foi, conforme afirma Gallian (2001), fortes, [...] [de] crença exacerbada
“redirecionando a formação e a da população de que os exames são Visão empresarial do hospital
atuação do médico, modificando mais eficazes que o conhecimento Para embasar a reflexão sobre
também sua escala de valores. Na do profissional”. Esse mesmo usuá- a humanização da assistência hos-
medida em que o prestígio das ciên- rio, porém, se ouvido com atenção, pitalar torna-se importante estudar
cias experimentais foi crescendo, o clama por transformação. também o contexto institucional,

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pois assim como a forma de atu- vanderia, hotelaria e demais serviços. (2003) afirmam que, “por sua com-
ação dos profissionais, o hospital Seguindo a tendência de outras em- plexidade, o ambiente hospitalar
também vem sofrendo influências presas, visando focar sua atividade impõe a ampliação da discussão
econômicas e culturais, gerando principal, diversos gestores da saúde com a sociedade, a fim de estabele-
diversas mudanças que devem ser têm optado por terceirizar esses ser- cer um quadro ético de referência
ponderadas, com a devida aten- viços, porém, segundo Lepargneur para o cuidado humanizado”.
ção, pelo seu potencial intrínseco (2003), “a entidade dirigente do Para que o processo de huma-
de afetar a qualidade da assistência. hospital não deve esquecer de que nização se torne possível é preciso
Segundo Lepargneur (2003) com ela é responsável pela coordenação avaliar a instituição de saúde de um
essas mudanças, foram se transfor- do conjunto que dela depende, e ponto de vista holístico. Dessa for-
mando “não apenas os custos, mas portanto da fiscalização correta dos ma, conforme enfatizam Faiman et
também a tradicional e ideal rela- serviços terceirizados”. Assim, os ser- al (2003), é imprescindível promo-
ção [do] médico com seu cliente”. viços terceirizados também devem ver uma profunda “transformação
As pessoas, segundo Berrinelli, ser incluídos nos projetos de huma- da cultura institucional, que passa a
Waskievicz, Erdmann (2003) “dei- nização da assistência hospitalar. incluir e valorizar os aspectos subje-
xam de ser o centro das atenções, Mezomo (1979) assegura que a tivos, históricos e socioculturais de
com facilidade, transformadas em humanização hospitalar não deve ser usuários e profissionais, melhoran-
‘objetos’ do cuidado e fonte de lu- “confundida com a simples adoção de do as condições de trabalho e a qua-
cro, perdendo sua identidade pes- uma série de medidas isoladas que lidade do atendimento”, para que,
soal”. O que remete a Martin (2003) visam solucionar problemas especí- conforme Mezzomo et al. (2003),
quando esclarece que no empenho ficos da administração hospitalar”. “o hospital seja um ambiente onde
desmedido em prol da técnica per- O autor entende que a humaniza- o coração tenha vez e [...] os clamo-
feita, o usuário “é transformado ção hospitalar “deve ser integrada res do espírito sejam ouvidos”.
em mero objeto de cuidados e seu no quadro geral e mais amplo da De fato, há de se enfrentar o
conforto e bem-estar físico e mental melhoria das relações entre admi- desafio de conceber estratégias coe-
são subordinados às exigências do nistradores e administrados”. rentes voltadas para potencializar
funcionamento de máquinas ou das Outro fato que merece atenção mudanças na cultura institucional,
restrições econômicas impostas pela é o sistema de normas e rotinas com com um reposicionamento e um
administração hospitalar”. O autor a padronização de procedimentos. contínuo empenho tanto dos
adverte porém que “o científico e o Os protocolos, por um lado, facilitam profissionais que atuam em esta-
econômico devem estar a serviço do na formação de custos, mas segundo belecimentos de saúde, quanto da
ser humano e não o ser humano a Berrinelli, Waskievicz e Erdmann comunidade.
serviço da ciência e da economia”. (2003) “podem levar à rigidez e im-
Berrinelli, Waskievicz e Erdmann pessoalidade da relação, com pou- Visão holística
(2003) afirmam que “no mundo ca demonstração de sensibilidade”. A visão holística enfoca sempre
capitalista e globalizado de hoje, Uma outra postura, que se não for o ser humano do ponto de vista do
a tecnologia é utilizada com fins acompanhada de reflexão favore- microcosmo e do macrocosmo. Do
econômicos, sobrepujando muitas ce a desumanização, é a rigidez na ponto de vista do microcosmo, cada
vezes os padrões éticos e técnicos”. disciplina no que se refere à rotina parte representa o todo, já do pris-
Segundo Martin (2003), “às vezes hospitalar. De acordo com Mezzo- ma do macrocosmo, o todo interage
as conveniências da administração mo et al (2003) “as rotinas, uma com os seus componentes. Nesse
hospitalar e considerações econô- vez implantadas, passam com o sentido, Pessini et al (2003) afir-
micas pesam mais que o bem-estar tempo a ser consideradas certas e mam que “o contexto macro influi
do paciente e do respeito pela sua dificilmente são revistas”. É preciso de modo contundente no condi-
autonomia”. Prossegue dizendo compreender que o usuário que já cionamento e na determinação da
que “o hospital, acompanhando es- se encontra fora de seu lar, de seus cultura, nos relacionamentos no
ta maneira de praticar a medicina, afazeres cotidianos, despido de suas contexto micro das instituições”.
também começa a se especializar”. roupas e pertences, muitas vezes Berrinelli, Waskievicz e Erdmann
A instituição hospitalar possui tem dificuldade em se adaptar às (2003) Complementam dizendo
características de uma empresa que regras e horários da instituição. que o cuidado à vida “não pode
comporta dentro de si várias outras Evidenciando uma visão holística estar desvinculado e descontextua-
empresas, como, por exemplo, la- Berrinelli, Waskievicz e Erdmann lizado dessas circunstâncias, pois

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somente será possível exercê-lo se mente fisiopatológico, a Organização compreender o significado da hu-
compreendermos o ser humano em Mundial de Saúde (OMS) propõe, manização da assistência à saúde.
sua totalidade, nas suas diferenças, em sua Carta Magna de 7 de abril de Jakobi (2004) define humanização
no pluralismo e na diversidade”. 1948, a seguinte definição: “Saúde como “uma nova visão do atendi-
Marques (2004) nota que “toda é um estado de completo bem-estar mento ao paciente, que ‘humaniza’
discussão em torno da falência do físico, mental e social e não apenas no sentido antropológico e psicológi-
conhecimento fragmentado é re- a ausência de afecção ou doença”. E co todos os participantes do evento”.
fletida em uma busca do conheci- Mezzomo et al (2003) afirmam que Ou seja, valoriza a dimensão humana
mento em sua totalidade, [...] a hu- “saúde requer a consideração do ser e subjetiva. E humanizar a assistência,
manidade está tentando resgatar humano em todas as suas dimen- segundo PNHAH (2001) é:
valores para uma nova concepção sões”, e prosseguem dizendo que Aceitar esta necessidade de resga-
de homem/mundo”. Blasco (2004) para um completo bem-estar “não te e articulação dos aspectos sub-
conclui que “vivemos tempos inun- há como não reconhecer a realidade jetivos, indissociáveis dos aspectos
dados de informação, de comuni- transcendental, e espiritual”. físicos e biológicos. Mais do que
cação, e absolutamente desnutridos A 8ª Conferência Nacional de isso, humanizar é adotar uma
de raízes filosóficas”. Saúde, realizada em Brasília em l986, prática em que profissionais e
E é neste cenário, marcado pelo resgata uma concepção ainda mais usuários consideram o conjunto
ampla de saúde, assumindo que esta “é dos aspectos físicos, subjetivos
descontentamento de usuários e pro-
a resultante das condições de alimen- e sociais que compõem o aten-
fissionais, que surge a necessidade
tação, habitação, educação, renda, dimento à saúde. Humanizar
de um resgate dos valores subje-
meio ambiente, trabalho, emprego, refere-se portanto à possibilidade
tivos, que foram se perdendo com
lazer, liberdade, acesso e posse da de assumir uma postura ética de
os avanços da ciência. Para isso é
terra e acessos aos serviços de saúde, respeito ao outro, de acolhimento
fundamental o desenvolvimento de
é assim, antes de tudo, o resultado do desconhecido e de reconheci-
um novo olhar, de uma nova forma das formas de organização social”.
de atuar frente a essa realidade. Não mento dos limites.
Essa forma mais abrangente de
se trata de abandonar as inovações ver a saúde demanda a compreen- Conforme definição do Minis-
científicas e tecnológicas, mas sim são de todos os fatores que balizam tério da Saúde a humanização do
de agregar valores humanos às rela- o desenvolvimento físico, mental e atendimento é a responsabilização
ções que ocorrem nas instituições social e pressupõe uma atuação in- mútua entre os serviços de saúde e
de educação e de saúde, buscando tegral frente a todos os fatores que a comunidade e estreitamento do
uma articulação baseada nos princí- influenciam na saúde e no bem-estar vínculo entre as equipes de profis-
pios éticos, respeitando e valorizan- do ser humano. sionais e a população. Segundo a de-
do todos os seres humanos envolvi- Porém, conforme advertência finição de Faiman et al (2003)
dos nessa teia. Esse parece ser um de Mezzomo et al. (2003), é impor- Humanização é o processo de
anseio neste início de milênio. tante comprometer também o cida- transformação da cultura institu-
dão com a própria saúde. E Capra cional que reconhece e valoriza
Processo saúde-doença (1982) postula que “a assistência os aspectos subjetivos, históricos
Historicamente, os conceitos do à saúde constituirá em restaurar e e socioculturais dos pacientes e
processo saúde-doença também manter o equilíbrio dinâmico de in- profissionais, melhorando as
vêm se alterando. Rezende (1996) divíduos, famílias e outros grupos condições de trabalho e a quali-
postula que “o estado de sanidade sociais. Significará pessoas cuidando dade do atendimento, por meio
se dá na medida em que interagem da própria saúde [...] com a ajuda da promoção de ações que, à
satisfatoriamente o homem e o de terapeutas”. Salienta porém que competência técnica e tecnológi-
meio. Esse intercâmbio, na maioria “essa espécie de assistência à saúde ca, agregam o valor da dimensão
das vezes, é conflituoso, e é no en- não pode ser simplesmente ‘forne- subjetiva dos participantes.
frentamento da adversidade e na re- cida’, ela tem que ser praticada”. Essas definições vêm ao encon-
solução dos conflitos que se estrutu- tro do pensamento de Mezzomo et
ra o ser humano ativo e a idéia dinâ- Humanização e os al (2003), quando chama a atenção
mica de saúde”. para a necessidade da prática de
profissionais da saúde
Transcendendo a visão reducio- uma atitude ética que transcenda a
nista que observa o processo saúde- A fim de dar continuidade a pre- técnica e o conhecimento científico,
doença do ponto de vista estrita- sente reflexão é preciso procurar “uma ética fundamentada na es-

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sência do ser humano, que não do desenvolvimento do conheci- Mantendo a análise do ponto de
perde seus valores e nem diminui mento científico”. E conclui que “só vista holístico pode-se avaliar desde
sua dignidade quando adoece”. se pode falar em verdadeira evolu- a estrutura do processo seletivo até
Para refletir sobre os profissio- ção do conhecimento [...] quando as condições oferecidas nos estágios.
nais da saúde com um enfoque ho- se procura a integração dos saberes As provas dão enfoque à capacidade
lístico é necessário considerar dois que extrapolam o campo eminen- intelectual, não que não seja impor-
fatores que influenciam na forma temente físico-experimental”. tante. Mas existe uma preocupação
com que tais profissionais prestam Segundo Marques (2004), “a em avaliar a vocação humanística
a assistência aos usuários. São eles: a educação que temos dissocia o as- do candidato? Em resposta a esta
formação profissional e a gestão dos pecto material do espiritual, frag- indagação Blasco (2004) argumenta
profissionais da saúde em hospitais. menta o conhecimento e prepara que no passado os indivíduos que
para a competição no mercado de almejavam ser profissionais da saú-
Formação dos profissionais trabalho”. E sugere uma proposta de e freqüentavam as universida-
Considerando de um ponto de transdisciplinar a qual “visa à res- des, tinham já esta atitude reflexiva
vista mais amplo, percebe-se que a tauração da unidade e da integra- implícita. Hoje, por um processo
formação do indivíduo não é ape- ção do conhecimento [...] oposta ao seletivo repleto de deficiências, não
nas a que ocorre na universidade, conformismo e à fragmentação, que [se] conseguem apurar parâmetros
ela se inicia com a educação que es- investe na vida em busca de respos- do que poderia ser a vocação mé-
se sujeito recebe no núcleo familiar, tas para as questões primordiais do dica. Mas se a usina de médicos é
religioso, escolar e nos ambientes Ser em sua totalidade”. Dias (2004) a faculdade de medicina, ela deve
em que participa, inserido em um postula que “a compreensão do to- enfrentar este desafio e suprir, na
contexto histórico, cultural e social. do exige de nós uma visão episte- medida do possível, as deficiências
Assim, torna-se claro o fato de que mológica holística. Isto pressupõe, do processo seletivo.
a pessoa que já recebeu uma forma- naturalmente, um enquadramento Outro ponto importante é o fato
ção básica com caráter humanista não só interdisciplinar, como, di- de que o objeto de estudo dos pro-
terá maior probabilidade de atuar ria até, transdisciplinar”. E conclui fissionais da saúde é o ser humano,
de forma mais humana em sua que “necessitamos [...] construir circunstância que se torna de ex-
profissão. Segundo Blasco (2004), um novo objeto de estudo sobre a trema complexidade na formação
“humanista é o homem que define pessoa humana com base também desses profissionais, em decorrência
atitudes concretas diante da vida, num novo quadro teórico”. de sua natureza subjetiva. O fenô-
fruto de sua reflexão e como conse- Serra (2001) admite que a forma- meno de tornar sujeito em objeto
qüência de uma filosofia que nor- ção educacional dos profissionais se de estudo advém do raciocínio lógi-
teia sua existência”. O autor define encontra “atualmente bastante de- co formal, que para Medina (1991)
humanitarismo como “a capacida- ficiente no que se refere à questão parece “mais bloquear do que abrir
de de comover-se diante da dor e da humanização do atendimento”. perspectivas para a compreensão do
da limitação alheia”. De acordo com o PNHAH (2001) universo e da existência humana”.
Os autores estudados concor- é de fundamental importância “a Conforme Gonçalves (1997),
dam que a formação acadêmica tem revisão da formação dos profissio- o conceito behaviorista causa uma
um papel importante na formação nais”. Segundo Fonseca (2000), a cisão entre o sentimento e a razão.
dos futuros profissionais. Segundo interação entre as diversas ciências O mesmo autor ressalta ainda que:
a argumentação de Gallian (2001), é imprescindível, “compondo assim “Anulando-se o sentimento, anu-
“há uma grande necessidade de se uma visão holística, sinônimo da la-se o corpo, que se torna [...] um
‘re-humanizar’ a medicina. De se interdisciplinaridade, [que] se afas- objeto mecânico que pode ser ma-
desenvolver e fornecer recursos ta da apropriação cartesiana, com- nipulado”. Esse conceito influencia
humanísticos para o processo de pondo [...] um mosaico do saber tanto a educação quanto a saúde.
formação e de atuação do médico integrado por todas as disciplinas”. O resultado desse tipo de forma-
e dos cientistas da saúde em geral”. Gallian (2001) diz que “entender o ção se expressa em usuários sendo
Ele alega que tal necessidade não desenvolvimento histórico e reco- tratados por suas patologias e núme-
se dá exclusivamente por uma de- locar o papel das ciências humanís- ro de leito, e não por seus nomes. E
manda ética, mas também “por ticas no contexto da formação pare- no caso de hospital-escola o des-
uma exigência fundamentalmente ce ser o caminho necessário para a respeito pode ser ainda maior, pois
epistemológica; pela própria lógica (re)humanização da medicina”. segundo Martin (2003), o usuário

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corre o risco de “ser manipulado cebe-se que muitas vezes o ensino ários, ou seja, oferecer um trata-
sem o mínimo respeito pelos seus se torna desumano. O que remete mento humanizado, buscando a
sentimentos, nem mesmo pelo seu ao pedido feito aos docentes pelo promoção de valores destinados a
pudor, como um mero objeto de reitor do Centro Universitário São harmonizar e fortalecer todas as re-
estudo”. Por esse motivo, Gallian Camilo, professor dr. padre Chris- lações que ocorrem no ambiente
(2001) enfatiza que “mais do que tian de Paul de Barchifontaine, em hospitalar. Esta postura deve ter to-
um biólogo, mais do que um na- seu discurso de inauguração dos tal comprometimento e apoio da al-
turalista, o médico deveria ser [...] laboratórios do campus Ipiranga: ta direção e demais lideranças, que
um humanista. Um sábio que, na que não massacrem os seus alunos precisam, ouvir os colaboradores a
formulação do seu diagnóstico, leva (informação verbal), evidenciando fim de identificar as suas necessida-
em conta não apenas os dados bio- mais uma vez a preocupação com a des e procurar supri-las de forma a
lógicos, mas também os ambientais, formação humanitária dos discentes favorecer o seu bem-estar.
culturais, sociológicos, familiares, da instituição, preparando-se para Estudar as carências dos colabo-
psicológicos e espirituais”. atuar no campo da saúde. radores, em seu ambiente de traba-
Assim, torna-se imprescindível Por outro lado, o professor é lho é uma rica fonte de dados que
que os currículos contemplem dis- também muitas vezes colocado em pode fornecer ao hospital informa-
ciplinas que favoreçam a formação situação desumana, o que se torna ções sobre quais são as ações básicas
humanística e que adotem o para- evidente, por exemplo, quando ou-
a serem implementadas. Faiman et
digma holístico, não apenas com o vimos docentes alegando que é hu-
al (2003) citam vários estudos sobre
manamente impossível dar conta
objetivo de suprir a carência oriun- os riscos ocupacionais em profis-
de todo o conteúdo da disciplina
da da formação básica, mas também sionais da saúde, entre eles os aci-
em tão pouco tempo. A faculdade,
porque os desafios éticos gerados pe- dentes físicos, químicos, biológicos,
por sua vez, e por vários motivos,
los avanços da ciência vêm exigindo ergonômicos, e enfatizam os riscos
não se vê em condições de alongar
dos profissionais uma reflexão que à saúde mental, destacando que o
os cursos. Percebe-se que a raiz do
precisa se embasar em valores hu- estresse e a “violência institucional
problema encontra-se nas políti-
manísticos sob um ponto de vista como determinante de sofrimento
cas de ensino, apontando para a
holístico. Blasco (2004) postula que importância da humanização no psíquico no trabalho [...] decorre
o ensino com este enfoque “tem se sistema educacional. Porém, não do modo como historicamente se
mostrado de importância notável cabe a este trabalho aprofundar-se organizam os serviços de saúde,
para o aprendizado deste hábito de nesse tema, mas sim levantar a re- dentro da sociedade capitalista”.
pensar, para treinar a reflexão e fa- flexão sobre a questão. Analisando esse cenário, Martin
cilitar um aprendizado que integra, (2003) refere que em muitos hos-
simultaneamente, a ciência e a arte Gestão dos profissionais da pitais os profissionais “deixam de
ao raciocínio clínico e ao ético”. saúde em hospitais ser profissionais liberais autônomos
De acordo com PNHAH (2001), O segundo fator que exerce in- que recebem honorários e se trans-
no decorrer de todo o processo de fluência na assistência hospitalar é o formam em funcionários assalaria-
“habilitação dos profissionais de tratamento dado aos colaboradores dos da instituição”. E explica que
saúde, devemos considerar a fra- que atuam nos hospitais. A insti- desta forma o profissional “perde
gilização física e emocional provo- tuição hospitalar é uma organiza- muito da sua autonomia. Ele aca-
cada pela doença e as suas conse- ção basicamente humana, assim, ba atendendo apenas aquele que o
qüências na relação entre o profis- pouco adiantaria um bom projeto hospital admite e encaminha para
sional e o usuário”. de humanização se o hospital não ele”. Molina (2002) afirma que “o
Além disso, pode-se refletir contasse com pessoal sensibilizado atual sistema não valoriza a qualida-
sobre a forma como os cursos se e habilitado, pois em tal situação a de da assistência, mas sim a quanti-
organizam. Na maioria dos casos possibilidade de implantar e man- dade” e enfatiza que:
os discentes são cobrados a reali- ter uma assistência humanizada Os trabalhadores da saúde estão
zar grande quantidade de tarefas seria muito remota. se proletarizando ou se tornan-
acadêmicas em curto espaço de Desta forma, é importante prati- do “biscateiros free-lance”. Além
tempo, não raro se ouve estudan- car com todos os profissionais que disso, vêm sendo submetidos a
tes dizendo: “Pensam que sou uma atuam no hospital os mesmos valo- um altíssimo nível de estresse,
máquina!”. Tirando uma porcen- res que se espera deles em relação causado pelas péssimas con-
tagem de queixas infundadas, per- aos colegas de trabalho e aos usu- dições de trabalho, baixíssima

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A INFLUÊNCIA DA VISÃO HOLÍSTICA NO PROCESSO DE HUMANIZAÇÃO HOSPITALAR

remuneração, gigantesca dura- cluída?”. Como resposta a essas in- pacitação e que estimule: a constru-
ção da jornada de trabalho diária dagações, o PNHAH (2001) sugere ção do conhecimento, a criação de
e semanal, falta de tempo para “a humanização das condições de propostas de cunho humanizador,
lazer, leitura e estudo e, não trabalho do profissional de saúde a reflexão, as soluções criativas, o
menos importante, por terem se [...] por meio de uma política de engajamento no trabalho em equi-
tornado os “bodes expiatórios” resgate do respeito e da valorização pe, a cooperação, a integração entre
de todas as mazelas do sistema. da vida humana”. os diversos setores, e que além dis-
O incremento da ciência tecno- Jakobi (2004) afirma que o pro- so ofereça apoio aos colaboradores
lógica e a excessiva especialização fissional precisa de “maturidade para que se sintam motivados como
transformaram, segundo Gallian emocional e pessoal para lidar com sujeitos e agentes de sua prática.
(2001), os profissionais da saúde serenidade e firmeza com um evento
em técnicos, “em função das trans- que apela para a vida e a morte, de- Influência da visão holística
formações nas condições sociais de sencadeando fortes emoções” e ad- na humanização
trabalho, [...] restringindo barbara- verte que por este motivo carecem
mente a disponibilidade deste para de apoio psicológico. O tratamento Estudar o processo de humani-
o contato com o paciente, assim humanizado aos profissionais con- zação por meio da visão holística
como para a reflexão e a formação forme o PNHAH (2001) resulta em auxilia a transcender os limites do
mais abrangente”. Martin (2003) um “indivíduo bem capacitado, atendimento ao usuário e seus fa-
alerta para a dificuldade gerada pe- respeitado como profissional e miliares. De acordo com o PNHAH
lo esquema de plantões, em que como pessoa pela instituição a que (2001) o sucesso de todo o processo
“corre-se o risco de não conseguir pertence, com espaço para ser ou- de humanização “está em fortalecer
desenvolver um relacionamento vido em suas dúvidas, angústias e este comportamento ético de arti-
minimamente interpessoal com necessidades, e com recursos ade- cular o cuidado técnico-científico,
o paciente”. E conclui que “o pa- quados às exigências de seu traba- já construído, [...] com o cuidado
ciente acaba sendo da instituição lho, [estando] mais apto a atender que incorpora a necessidade de ex-
[...] e com isso perdem-se os laços com eficiência e qualidade”. plorar e acolher o imprevisível, o
mais personalizados que humani- Portanto, ao realizar um plane- incontrolável e o singular”. Escla-
zavam a tradicional relação”. jamento para a implementação do rece que “trata-se de um agir inspi-
O PNHAH (2001) aponta co- processo de humanização da assis- rado em uma disposição de acolher
mo fundamental a “contratação tência hospitalar, deve-se ter clara e de respeitar o outro como um ser
de profissionais em número sufi- a idéia de que um colaborador que autônomo e digno”, e afirma que
ciente para atender à demanda [...] é imperioso “repensar as práticas
se sinta valorizado como pessoa, sa-
[por] humanização das condições das instituições de saúde, buscan-
tisfeito profissionalmente, bem
de trabalho. [...] atendimento da do opções de diferentes formas de
informado e sintonizado com os
instituição hospitalar em suas ne- atendimento [...] que preserve este
propósitos da instituição é o melhor
cessidades básicas administrativas, posicionamento ético no contato
agente de mudanças. Para isso:
físicas e humanas”. pessoal e no desenvolvimento de
É fundamental a sensibilização
O trabalho absorve um terço, competências relacionais”.
dos dirigentes dos hospitais para
ou mais, das horas do dia do ser Conforme orientações contidas
a questão da humanização e pa- no PNHAH (2001), o uso de modo
humano que está envolvido em
ra o desenvolvimento de um “competente e eficaz das técnicas em-
algum tipo de atividade profissio-
modelo de gestão que reflita a pregadas no atendimento à saúde
nal, adquirindo grande importân-
cia em sua vida. Os profissionais da lógica do ideário deste processo: deve estar associado a uma forma
saúde, em geral, são pessoas que se cultura organizacional pautada de atendimento que considere e res-
qualificam com o anseio de cuidar pelo respeito pela solidariedade, peite a singularidade das necessida-
das pessoas que os procuram para pelo desenvolvimento da auto- des do usuário e do profissional”. De
manter ou recuperar a saúde. Mas, nomia e da cidadania dos agen- acordo com o documento, humani-
quem cuida de quem cuida? tes envolvidos e dos usuários. zar significa considerar a dimensão
Faiman et al (2003) propõem a (PNHAH, 2001, p. 6) subjetiva “um eficiente instrumento
seguinte reflexão: “Como resgatar Assim, é importante adotar um de compreensão e manutenção da
a subjetividade do paciente se a do sistema de gestão dos recursos hu- saúde do usuário e do profissional
profissional se vê cada vez mais ex- manos que providencie cursos de ca- diante das exigências do trabalho.

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A INFLUÊNCIA DA VISÃO HOLÍSTICA NO PROCESSO DE HUMANIZAÇÃO HOSPITALAR

Humanizar é portanto alcançar be- O autor chama a atenção para o fato [...] traz à tona sua grandeza, sua
nefícios mútuos para a saúde”. E re- de que ao se encontrar hospitalizada, força, sua sabedoria, [...] per-
comenda sua inclusão na práxis pro- “a pessoa enferma manifesta desejos mite a experiência do mistério
fissional. Partindo desse pressuposto e aspirações [nos quais], na vida nor- da vida, da dor e da vitória, do
pode-se refletir sobre a influência mal, muitas vezes nem pensa. São riso e da alegria, [...] dando-lhes
holística de um tratamento humani- necessidades espirituais”. Ele ex- mais profundidade de compre-
zado para a qualidade de vida dos plica que “a realidade da vida abafa ensão do processo da doença e
profissionais e dos usuários. a dimensão espiritual, enquanto o sua prevenção, mais segurança
sofrimento e o risco de vida a reve- para lidar com ele, tornando-os
Usuários dos serviços hospitalares la com intensidade”. E observa que pessoas mais plenas.
Na percepção dos usuários, se- “os pacientes, quase nunca as ver- Conforme o PNHAH (2001) a
gundo Serra (2001) “a capacidade balizam porque os trabalhadores da observância, o respeito e a conside-
demonstrada pelos profissionais de saúde não são vistos como recepto- ração “aos aspectos subjetivos que
saúde para compreender suas de- res dessas realidades”. Desta forma, existem na atividade do profissional
mandas e suas expectativas são fa- pode-se notar a importância da visão constitui uma proteção à sua saúde,
tores que chegam a ser mais valori- holística tão fundamental no atendi- permitindo-lhe agir de modo me-
zados que a falta de médicos, a falta mento humanizado. nos defensivo, mais espontâneo e
de espaço nos hospitais”. Conforme próximo às carências do usuário”.
Mezzomo et al (2003) o usuário Profissionais da área da saúde
Esclarece que, no aspecto “profis-
não se sente satisfeito apenas “com Faiman et al (2003) esclarecem sional, considerar essas dimensões
a competência profissional, que que conceber a humanização apenas permite oferecer a ele melhores
muitas vezes nem consegue saber como uma empreitada a mais que os condições de enfrentar o desgaste
se existe ou não. O que se avalia profissionais devem realizar em prol provocado pelo constante conta-
de imediato [...] é a forma de aten- do usuário “é uma simplificação que to com a dor, com o sofrimento e
dimento, a maneira como as ações desconsidera o fato de que o mesmo com os limites na realização de seu
técnicas são praticadas”. processo de violência social também trabalho”, e afirma que a “disposi-
A grande maioria dos usuários é sofrido pelos profissionais”. Para ção para consideração e respeito da
procuram o hospital por necessida- isso é importante refletir sobre a in- singularidade exige sempre algum
de de recuperar a sua saúde. Eles são fluência do trabalho no processo de grau de adaptação e mudança; em
portanto indivíduos emocionalmen- humanização do indivíduo. Con- contrapartida, abre espaço para a
te mais sensibilizados. Blasco (2004) forme expressa Boff (1999), “pri- criatividade..”.
adverte que “a experiência da doen- mitivamente o trabalho era mais
ça nos reduz a uma dependência de inter-ação do que intervenção”. Relação interprofissional
crianças. Necessitamos ser cuidados, Avaliando a importância do traba- A relação entre os profissionais
e de alguém que nos tire a dor da do- lho significativo para o homem ele é uma questão importante para que
ença e a dor da incerteza”. Por este afirma que “no ser humano [...] o possa existir uma assistência hospita-
motivo, essa assistência deve ser trabalho se transforma em modo- lar holística e humanizada. Há, assim,
pautada na ética, ou seja, deve pro- de-ser consciente e assume caráter a necessidade de um empenho para
curar respeitar a autonomia do usu- de um projeto e de uma estratégia a realização de um trabalho conjunto
ário. Selli (2003) postula que “um com suas táticas de plasmação de si coeso, envolvendo diversos agentes,
atendimento beneficente supõe per- mesmo e da natureza”. desde a recepção do usuário até a alta
mitir que o paciente manifeste seus Segundo Selli (2003), “na prática administração.
desejos e entenda quais benefícios humanitária, a pessoa/profissional A abordagem multidisciplinar,
ele considera deveras importantes se permite ser humana, sentir-se em que é aplicada desde a formação aca-
para si mesmo, como sujeito autô- relação com um outro, também hu- dêmica, é amplamente praticada
nomo e titular de direitos”. mano, manifestar sua sensibilidade, entre os profissionais da saúde. Pa-
Mezzomo et al (2003) explicam criar empatia, estabelecer relação su- ra Ramos (2001), “multidisciplinar
que “a satisfação, pela qualidade hu- jeito/sujeito”. E Jakobi (2004) escla- é sinônimo de um amontoado de di-
mana da assistência, uma vez sentida rece que o processo de humanização ferentes profissionais, de diferentes
pelo usuário, [...] gera bem-estar, se- torna os colaboradores: formações, que não interagem entre
gurança e alívio, potencializando o mais ricos em humanidade, em si”. Explica que “nesse modelo es-
próprio restabelecimento da saúde”. sensibilidade, em afetividade, ses profissionais apenas empurram

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A INFLUÊNCIA DA VISÃO HOLÍSTICA NO PROCESSO DE HUMANIZAÇÃO HOSPITALAR

o problema para outro — ‘Agora (2001), “são fundamentais a cria- ocorre em todas as relações entre
não é mais comigo (médico), agora ção e a sustentação permanente de usuários e profissionais, não po-
é com a assistente social’”, e conclui espaços de comunicação que facili- dendo ser subestimada. Dessa for-
que “isso não é uma equipe, é um tem e estimulem a livre expressão, ma, a visão holística pode fornecer
amontoado de gente competindo a dinâmica do diálogo e o respeito à subsídios para que esta relação seja
entre si”. Ou seja, o trabalho multi- diversidade de opiniões”. humanizadora. Selli (2003) afirma
profissional estabelece fronteiras de A composição de grupos de es- que “o processo relacional estabe-
atuação, incorrendo no risco de ha- tudo e de discussão de casos clíni- lecido na ação [...] humanizada sus-
ver falhas na assistência nos espaços cos e a prática de proceder reuniões cita, na pessoa fragilizada, o desejo
fronteiriços e na visão do usuário com profissionais de todos os níveis de enfrentamento pessoal diante
como um ser humano em interação para encontrar solução de conflitos da situação vivenciada, seja ele
consigo e com o mundo. favorece muito a criação da visão ho- dor, ressignificação ou morte”. E
Para Fonseca (2000), “a visão in- lística, tão necessária ao trabalho chega à conclusão de que “o rela-
terdisciplinar significa a integração em equipe transdisciplinar e, con- cionamento marcado pela atenção
entre os diversos ramos do conhe- seqüentemente, à humanização da humanitária leva a fazer frente à
cimento científico, diferentemente assistência hospitalar. Para isso é própria fragilidade e enfrentar as
da simples colaboração entre as fundamental que os componentes instabilidades a que, como huma-
áreas disciplinares”. Assim, nessa da equipe empenhem-se em man- nos, somos submetidos”.
abordagem, o maior intercâmbio ter um cuidado ético e o espírito Pessini et al (2003) postulam que
entre os profissionais diminui o ris- democrático e participativo. “humanizar a saúde é dar qualidade
co de falhas nas regiões de frontei- à relação profissional da saúde-pa-
ra, pois cada um sabe até onde cada Relação entre profissionais da ciente. É suportar as angústias do
colega está atuando e há uma visão saúde e usuários ser humano diante da fragilidade
mais ampla sobre o caso. De acordo com o PNHAH (2001), do corpo e da mente”. Berrinelli,
Ramos (2001) vai além do en- para que exista profissionalismo na Waskievicz, Erdmann (2003) ar-
foque interdisciplinar, sugerindo assistência é preciso perceber que gumentam que se faz imprescindí-
a abordagem transdisciplinar, que certos aspectos — por exemplo: vel “em cada encontro, a tomada
segundo ele ainda é de difícil com- “sentimentos como afeição, res- de consciência quanto à pluralida-
preensão, em razão da “forma- peito, simpatia, empatia, angústia, de dos modos de viver, e à especi-
ção cartesiana de disciplinas distin- raiva, medo, erotismo e compaixão ficidade da situação vivenciada”.
tas, [...] totalmente independentes são inevitáveis em qualquer conta- E chegam à conclusão de que “se
e isoladas, que mascaram a unidade to humano. Estarão, portanto, pre- acreditarmos nesses pressupostos,
da ciência. [...] O que parece eviden- sentes nas relações nos serviços de que a vida humana, como bem
te nesse modelo de ciência é de se saúde”. Em outras palavras, para fundamental, é resultante de um
vivenciar uma total solidão na prá- que a assistência seja humanizada, conjunto de experiências e vivên-
xis”. E esclarece que o modelo trans- é preciso, em primeiro lugar, acei- cias, teremos maiores condições de
disciplinar “requer uma unificação tar o fato de que profissionais e demonstrar atitudes éticas no agir
conceitual entre as disciplinas”. usuários são seres humanos. E o do- profissional”. Por esses motivos,
Segundo o PNHAH (2001), a cumento explica que “esses aspec- Molina (2002) recomenda aos tra-
abordagem em equipe “transdisci- tos precisam ser reconhecidos, estar balhadores da área da saúde que se
plinar pode contemplar uma va- sob controle e a serviço da compre- conscientizem “da importância do
riedade de enfoques e opções de ensão das necessidades do usuário poder intrínseco da relação com
compreensão dos aspectos subje- e dos profissionais”. Esclarece que o paciente, assim como do teatro
tivos [...] de um modo que seria “esses sentimentos, mesmo que terapêutico, do efeito placebo e da
impossível alcançar apenas com intensos e imprevisíveis, quando tríade ‘informação, apoio e cari-
recurso da visão focal do espe- incorporados adequadamente à nho’ — que possui em muitos ca-
cialista”. Dessa forma, o enfoque atividade do profissional podem sos tanta eficiência quanto as mais
transdisciplinar compõe-se de um se tornar instrumentos valiosos no altas tecnologias”. E Blasco (2004)
conhecimento sem fronteiras que atendimento à saúde”. lembra que o usuário procura no
perpassa todas as disciplinas. Observando do ponto de vista profissional que o atende não só
Para que esse trabalho se de- holístico, torna-se inegável a in- conhecimento técnico e científico
senvolva, de acordo com PNHAH fluência recíproca subjetiva que aliado à experiência, “mas também

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A INFLUÊNCIA DA VISÃO HOLÍSTICA NO PROCESSO DE HUMANIZAÇÃO HOSPITALAR

que seja capaz de apreciar cada pa- humanizada é preciso empatia. porém de igual importância tem-se
ciente como um ser humano que Selli (2003) explica que “o exercí- o estudo do ser humano com todas
tem sentimentos e desejos, que cio profissional humanizado oferece, as suas facetas, em seu meio de re-
possa entendê-lo e ajudá-lo expli- ao destinatário da ação, elementos lação. Assim, qualquer inclinação,
cando-lhe sua doença e amparan- humanos que podem auxiliá-lo nas para um lado ou outro, do que se
do-o no sofrimento”. transições existenciais implicadas considera um todo, incorre no ris-
Para Capra (1982): no processo saúde/doença, vida/ co de um tratamento fragmentado,
O primeiro e mais importante morte”. E prossegue dizendo que a desumanizado e, portanto, aliena-
passo em direção a uma abor- humanização “oferece elementos do e alienante.
dagem holística da terapia será que favorecem o desencadeamento Ao refletir sobre a influência da
considerar o paciente, o mais de um processo de assimilação, en- visão holística no processo de hu-
completamente possível, da ex- frentamento, autotranscendência e manização da assistência hospita-
tensão de seu desequilíbrio. [...] mesmo de ressignificação da vida”. lar, conclui-se que esse tema nunca
Isso significa que seus problemas E Faiman et al (2003) afirmam que estará complemente esgotado, já
terão de ser situados no amplo “o acolhimento do sofrimento do que os elementos dessa interação
contexto de onde promanam, paciente por meio do contato hu- estão em permanente transforma-
o que envolverá um cuidadoso mano, com a possibilidade de con- ção, portanto essa reflexão está em
exame dos múltiplos aspectos constante processo de evolução.
ferir-lhe um sentido mediante uma
da enfermidade pelo terapeuta Ressalta-se como importante
linguagem compartilhada, é em si
e paciente. [...] Só o reconheci- o aprofundamento das reflexões
um cuidado, e tem efeito terapêu-
mento desse contexto — da teia levantadas acerca da influência da
tico”. E concluem que “a aliança de
de padrões inter-relacionados visão holística na formação dos fu-
confiança que se estabelece desta
que levam ao distúrbio — já é al- turos profissionais, com o objetivo
forma é um fator indispensável que
tamente terapêutico, porquanto de reavaliar e criar caminhos possí-
se associa a eventuais outras medi-
diminui a ansiedade e proporcio- veis na educação pautada na ética
das de cunho médico”.
na esperança e autoconfiança. em prol do processo de humani-
zação da assistência. Outro estudo
Faiman et al (2003) explicam Conclusão interessante seria quanto ao estilo
que apoiar e atribuir um significa- de liderança e seus efeitos na assis-
do “...ao sofrimento é reintroduzir A humanização da assistência
tência, partindo do pressuposto de
uma possibilidade de ordem a uma hospitalar analisada sob o prisma que o resgate da humanização hos-
experiência vivida como caos. [...] holístico evidencia que a noção pitalar guarda íntima relação com
Este efeito, exclusivo do contato de qualidade em saúde necessita a mudança dos paradigmas admi-
humano, repercute no paciente e transcender o senso de conformi- nistrativos e com a democratização
no profissional de saúde, que sente dade técnica dos agentes sobre o dos modelos de gestão.
seu trabalho mais profícuo e, por objeto de sua prática, para consi- Considera-se, ainda, um último
que não dizer, mais humano”. derar que um ato técnico se realiza aspecto sobre a influência da visão
Boff (1999) faz uma reflexão in- num campo simbólico de trocas, holística no processo de humaniza-
teressante a quem se dispõe a cuidar, em uma relação intersubjetiva que ção, como visto no decorrer do
postulando que “a relação não é su- se inicia com o acolhimento ao ou- presente estudo. A assistência hu-
jeito-objeto, mas sujeito-sujeito. [...] tro, com a construção do vínculo e manizada é em si um recurso te-
A relação não é de domínio sobre, repercute intensamente em todos rapêutico de extremo valor, que
mas de con-vivência. Não é pura que dela participam pelo princípio não atua em uma simples relação
intervenção, mas inter-relação. [...] da alteridade que ocorre em todo de causa e efeito, mas o envolve
Cuidar é entrar em sintonia com”. contato humano. como uma presença e faz com que
De fato, cuidar é superar a cisão su- Os conhecimentos advindos da todos os envolvidos no processo, se
jeito e objeto. Em outras palavras, visão biomédica são muito impor- tornem mais humanos.
para uma relação genuinamente tantes para a atuação profissional,

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A INFLUÊNCIA DA VISÃO HOLÍSTICA NO PROCESSO DE HUMANIZAÇÃO HOSPITALAR

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Recebido em 8 de novembro de 2005


Versão atualizada em 10 de janeiro de 2006
Aprovado em 2 de fevereiro de 2006

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