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O Recipiendário (O Iniciado)
Eliphas Levi
Esse texto ajuda a estabelecer correlações simbólicas entre a antiga arte-ciência da Magia e o
caráter operativo do personagem do Arcano I do Tarô, o Mago.
Trata-se da transcrição do 1º capitulo, Vol. I, de Dogma e Ritual da Alta Magia, traduzido do
original francês por Rosabis Camaysar e publicado pela Editora Pensamento, pags. 71-81.
Na revisão dessa versão ao português tomamos a liberdade, em algumas passagens, de
atualizar o tratamento verbal e adicionar ilustrações para dar mais fluídez à leitura. [C.K.R.]
1. A
Disciplina - Ensoph - Kether
Quando um filósofo tomou para base de uma nova revelação da sabedoria humana este
raciocínio: "Penso, logo existo", ele mudou de algum modo e à sua vontade, conforme a
revelação cristã, a noção antiga do Ente supremo. Moisés faz dizer ao Ente dos entes: "Eu sou
quem sou". Descartes [filósofo, físico e matemático francês, 1596-1651] faz dizer ao homem: "Eu sou
aquele que pensa", e como pensar é falar interiormente, o homem de Descartes pode dizer
como o Deus de S. João Evangelista: "Eu sou aquele em quem está e por quem se manifesta
o Verbo". In princípio erat verbum.
Que é um princípio? É uma base de palavra, é uma razão de ser do verbo. A essência do
verbo está no princípio: o princípio é o que é; a inteligência é um princípio que fala.
Que é a luz intelectual? É a palavra. Que é a revelação? É a palavra; o ente é o princípio, a
palavra é o meio e a plenitude ou o desenvolvimento, e a perfeição do ente é o fim: falar é
criar.
Porém, dizer "Eu penso, logo existo", é concluir da consequência ao princípio, e recentes
contradições levantadas pelo grande escritor Lamennais [filósofo e escritor político francês, 1782-1854]a
imperfeição filosófica deste método. Eu sou logo existe alguma coisa, nos parece uma base
mais primitiva e mais simples da filosofia experimental.
Eu sou logo o ente existe.
Ego sum qui sum: eis aí a revelação primordial de Deus no homem e do homem no mundo, e
é também o primeiro axioma da filosofia oculta.
O ser é o ser
Esta filosofia tem, pois, por princípio o que existe, e nada tem de hipotético nem de casual.
Mercúrio Trismegisto [ou Hermes Trismegistus, personagem mítico da Antiguidade greco-egípcia] inicia o seu
admirável símbolo, conhecido sob o nome de Tábua de Esmeralda, por esta tríplice afirmação:
"É verdade, é certo sem erro, é absolutamente verdade". Assim, a verdade confirmada pela
experiência em física, a certeza desembaraçada de qualquer mistura de erro em filosofia, a
verdade absoluta, indicada, pela analogia, no domínio da religião ou do infinito, tais são as
primeiras necessidades da verdadeira ciência, e é o que só a magia pode dar aos seus
adeptos.
Mas, antes de tudo, quem é você que tem este livro
entre as suas mãos e o começou a ler?...
No frontispício de um templo que a antiguidade
dedicara ao deus da luz, lia-se esta inscrição em duas
palavras: "Conhece-te a ti mesmo".
Tenho o mesmo conselho a dar a qualquer homem
que queira aproximar-se da ciência.
A magia, que os antigos chamavam o sanctum
regnum, o santo reino, ou o reino de Deus, regnum
Dei, só é feita para os reis e padres; você é padre?
você é rei? O sacerdócio da magia não é um
sacerdócio vulgar e a sua realeza nada tem que
debater com os príncipes deste mundo. Os reis da
ciência são os sacerdotes da verdade, e o seu reino
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Mercurius Trismegistus
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O homem que ama suas ideias e que tem medo de perdê-las, aquele que teme as verdades e
que não está disposto a duvidar de tudo, antes do que admitir qualquer coisa ao acaso, esse
deve fechar este livro, que lhe é inútil e perigoso; ele o compreenderia mal e ficaria
perturbado, mas ficaria muito mais se por acaso o compreendesse bem.
Se você está preso por alguma coisa ao mundo, mais que à razão, à verdade e à justiça; se a
sua vontade é incerta e vacilante, quer no bem, quer no mal; se a lógica o espanta, se a
verdade nua o faz corar; se você se sente ofendido, quando apontam seus erros, condene
imediatamente este livro, e, não o lendo, faça como se ele não existisse para você. Porém não
o difame como perigoso: os segredos que ele revela serão compreendidos por um pequeno
número e aqueles que o compreenderem não o revelarão. Mostrar à noite a luz aos pássaros,
é ocultá-la, pois que ela os cega e torna-se para eles mais obscura do que as trevas. Falarei,
pois, claramente; direi tudo e tenho a firme confiança de que só os iniciados ou os que são
dignos de o ser, lerão tudo e compreenderão alguma coisa.
Há uma verdadeira e uma falsa ciência, a magia divina e a magia infernal, isto é, mentirosa e
tenebrosa. Temos que revelar uma e desvendar outra; temos de distinguir o mago do
feiticeiro e o adepto do charlatão.
O mago dispõe de uma força que conhece, o feiticeiro procura abusar do que ignora.
O diabo — se é permitido num livro de ciência empregar esta palavra desacreditada e vulgar
— o diabo se dá ao mago e o feiticeiro se dá ao diabo.
O mago é o soberano pontífice da natureza, o feiticeiro não passa de um profanador.
O feiticeiro é para o mago o que o supersticioso e o fanático são para o homem
verdadeiramente religioso.
Antes de ir mais longe, definamos claramente a magia. A magia é a ciência tradicional dos
segredos da natureza que nos vem dos magos. Por meio desta ciência, o adepto se acha
investido de uma espécie de onipotência relativa e pode agir de modo que ultrapassa a
capacidade comum dos homens.
É assim que vários adeptos célebres, tais como Hermes
Trismegisto, Osíris, Orfeu, Apolônio de Thyana, e outros
que poderia ser perigoso ou inconveniente mencionar,
puderam ser adorados ou invocados depois da sua morte
como deuses.
É assim que outros, conforme o fluxo e o refluxo da
opinião, que faz os caprichos do êxito, tornaram-se
agentes do inferno ou aventureiros suspeitos, como é
caso do imperador Juliano, de Apuleio, do encantador
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O Alquimista
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Para fazer alguma coisa é preciso saber o que se vai fazer, ou, ao menos, ter fé em alguém
que o sabe.
Mas como arriscarei a minha vida à aventura e seguirei ao acaso aquele que nem mesmo
sabe aonde vai?
No caminho das altas ciências, não convém empenhar-se temerariamente, mas, uma vez no
caminho, é preciso chegar ou perecer. Duvidar é ficar louco; parar é cair; voltar para trás é
precipitar-se num abismo.
Você, pois, que começou a leitura deste livro, se o compreendeis e quer ler até o fim, ele fará
de você um monarca ou um insensato. Quanto a você, faça deste volume o que quiser, não
poderá nem desprezá-lo nem esquecê-lo. Se você é puro, este livro será uma luz; se você é
forte, ele será sua arma; se você é santo, será a sua religião; se você é sábio, ele regulará a
vossa sabedoria.
Mas, se você for malvado, este livro será como que uma tocha infernal; ele despedaçará o
seu peito, rasgando-o como um punhal; ficará na sua memória como um remorso; ele
encherá a sua imaginação de quimeras e o levará pela loucura ao desespero. Se você
procurar rir dele, só poderá ranger os dentes, porque este livro será para você como a lima da
fábula que uma serpente tentou morder e que lhe quebrou todos os dentes.
Comecemos, agora, a série das iniciações.
Disse que a revelação é o verbo. Com efeito, o verbo ou a palavra é o véu do ente e o sinal
característico da vida. Toda forma é véu de um verbo, porque a ideia, mãe do verbo, é a única
razão de ser das formas. Toda figura é um caractere, todo caractere pertence e volta a um
verbo. É por isso que os antigos sábios, cujo chefe é Trismegisto, formularam o seu dogma
nestes termos:
"O que está em cima é como o que está em baixo, e o que está em baixo é como o que está
em cima."
Em outros termos, a forma é proporcional à ideia, a sombra é a medida do corpo calculada
em sua relação ao raio. A bainha é tão profunda quanto o comprimento da espada, a negação
é proporcional à afirmação contrária, a produção é igual à destruição, no movimento que
conserva a vida, e não há um ponto no espaço infinito que não seja centro de um círculo cuja
circunferência se engrandece e se estende indefinidamente no espaço.
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Aleph, a primeira letra do alfabeto da língua sagrada, representa um homem que eleva
uma das mãos ao céu, e abaixa a outra para a terra.
É a expressão do princípio ativo de todas as coisas, é a criação no céu, corresponde à
onipotência do verbo aqui. Esta letra é, por si só, um pentáculo, isto é, um caractere que
exprime a ciência universal.
A letra Alleph pode suprir aos signos sagrados do macrocosmo e do microcosmo, ela explica o
duplo triângulo maçônico e a estrela brilhante de cinco pontas; porque o verbo é um e a
revelação é uma. Deus, dando ao homem a razão, deu-lhe a palavra; e a revelação, múltipla
nas suas formas, mas una no seu princípio, está inteira no verbo universal, intérprete da
razão absoluta.
É o que quer dizer a palavra tão mal compreendida de catolicismo, que, na língua hierárquica
moderna, significa infalibilidade.
O universal em razão é o absoluto, e o absoluto é o infalível.
Se a razão absoluta leva a sociedade inteira a crer irresistivelmente na palavra de uma
criança, esta criança será infalível, da parte de Deus e da parte da humanidade inteira.
A fé não é outra coisa senão a confiança razoável nesta unidade do verbo.
Crer é concordar com o que não se sabe ainda, mas que a razão nos certifica
antecipadamente de saber ou ao menos reconhecer um dia.
São, pois, absurdos os pretensos filósofos que dizem: "Não creio no que não sei".
Pobres homens! Se soubessem, haveria necessidade de crer? Mas posso eu crer ao acaso e
sem razão?
— Não, certamente! A crença cega e ousada é a superstição e a loucura. É preciso crer nas
coisas cuja existência a razão nos força a admitir conforme o testemunho dos efeitos
conhecidos e apreciados pela ciência.
A ciência! Grande vocábulo e grande problema! Que é a ciência?...
Responderemos a esta pergunta no segundo capítulo deste livro.
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